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Universidade Estadual de Londrina EDILAINE CRISTINA DA SILVA EDUCAÇÃO NEOLIBERAL: EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DE DOMINAÇÃO LONDRINA 2009

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Universidade

Estadual de Londrina

EDILAINE CRISTINA DA SILVA

EDUCAÇÃO NEOLIBERAL: EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DE DOMINAÇÃO

LONDRINA

2009

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EDILAINE CRISTINA DA SILVA

EDUCAÇÃO NEOLIBERAL: EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DE DOMINAÇÃO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Londrina. Orientador(a): Prof. Edmílson Lenardão

LONDRINA 2009

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EDILAINE CRISTINA DA SILVA

EDUCAÇÃO NEOLIBERAL: EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DE DOMINAÇÃO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Londrina.

COMISSÃO EXAMINADORA

___________________________________ Prof. Orientador Edmílson Lenardão Universidade Estadual de Londrina

____________________________________ Prof. Eliane Cleide da Silva Czernisz Universidade Estadual de Londrina

____________________________________ Prof. Isabelle Fiorelli Silva

Universidade Estadual de Londrina

Londrina,11 de Novembro de 2009.

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Dedico este trabalho aos meus pais e

familiares que me apoiaram incondicionalmente

em todos os momentos. Que me indicaram o

caminho certo a seguir e que demonstraram

muito amor e apoio em todos os instantes da

minha vida.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por minha vida por me indicar o caminho em

momentos difíceis e por me guiar.

Agradeço ao meu orientador na confeçção do trabalho, por suas

indicações e orientações. Por sua instigante e estimulante inteligência que me

auxiliaram nas discussões deste trabalho. Agradeço pela preocupação e pelo

desprendimento mostrado, pois sem isto com certeza o trabalho não existiria.

Agradeço também aos meus amigos de classe que muito me

ensinaram e acrescentaram para o meu crescimento profissional e também

emocional, com a amizade e o apoio constante.

Agradeço aos professores que desde o primeiro ano demonstraram

muita preocupação com o meu desenvimento e que mostraram o valor e a

importância do curso de Pedagogia e da educação para a nossa sociedade.

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Outro saber que não posso duvidar um momento sequer na minha prática educativo - crítica é o de que, como experiência especificamente humana, a educação é uma forma de intervenção no mundo.

(Paulo Freire)

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SILVA, Edilaine Cristina da. Educação neoliberal: educação como prática de dominação. 2009. 53 fls. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Pedagogia) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2009.

RESUMO O trabalho tem por objetivo expor qual a função da educação na sociedade capitalista. O trabalho busca investigar o papel da educação em ser um meio para perpetuar os ideais capitalistas. Isso ocorre através da transmissão de valores e atitudes que tornam o indivíduo apto para o atual sistema. O trabalho analisa teorias que atrelam e mascaram a função da educação, tornando-a apenas um mecanismo para manter os interesses de poucos. Foi utilizado para a investigação bibliografias e documentos que abordam a temática. Após a investigação do mesmo chegou-se a conclusão que várias tendências ligam a educação ao desenvolvimento econômico como uma maneira de esconder as relações existentes e que é necessário que haja uma discussão para se romper com o estágio no qual nos encontramos. Palavras-chave: Capital humano. Capitalismo. Neoliberalismo. Adaptação.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BM Banco Mundial CEPAL Comissão Econômica para América Latina e Caribe HIV Acquired Imnunological Deficiency Syndrome (Síndrome de deficiência

imunológica adquirida) LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional TCH Teoria do Capital Humano UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 9

2 TEORIA DO CAPITAL HUMANO E OS OBJETIVOS EDUCACIONAIS

CONTEMPORÂNEOS .............................................................................................. 12

2.1 TEORIA DO CAPITAL HUMANO ............................................................................... 12

3 AS AGÊNCIAS MULTILATERAIS E OS ARANTES DA T.CH

CONTEMPORÂNEO ................................................................................................. 18

3.1 EDUCAÇÃO E COMPETITIVIDADE .............................................................................. 26

3.2 EMPREENDEDORISMO E EDUCAÇÃO ......................................................................... 29

3.3 A LDB ................................................................................................................... 36

4 CRÍTICAS ÀS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS .................................................... 39

CONCLUSÃO ........................................................................................................... 49

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 51

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1 INTRODUÇÃO

Pretendemos no presente trabalho abordar um dos papéis que é atribuído direta

ou indiretamente à educação. O que motivou a investigação desse tema foi a situação pela

qual a educação moderna se encontra na sociedade capitalista, principalmente por constatar

que a questão da dominação se potencializa na educação quando esta se volta para o

desenvolvimento social e econômico da sociedade capitalista contemporânea.

Dentre as razões pelas quais resolvemos fazer o estudo, está a posição ocupada

pela educação quando passa a ser um instrumento que esconde o real funcionamento das

relações sociais. Isto ocorre quando nela é depositada a responsabilidade de promover a

mobilidade social e inserir os indivíduos na sociedade capitalista por meio da preparação para

o mercado de trabalho. Neste contexto, o papel da educação restringe-se a formar e fornecer a

mão de obra ou o “capital humano” útil e necessário para a manutenção e ampliação do

capital.

O presente trabalho se estrutura em três capítulos. O primeiro aborda a Teoria

do Capital Humano (TCH), os objetivos educacionais que a escola contemporânea assume

para si no discurso hegemônico oficial e acadêmico e explicita o caráter que aquela teoria tem

de esconder as verdadeiras relações sociais; tal teoria defende que o maior investimento na

educação acarretará maior retorno financeiro para o indivíduo e para o país. Porém,

funcionando como discurso ideológico a serviço do capital, esta teoria mascara e, no limite,

coloca a escola no papel de formadora dos trabalhadores que o sistema requer: um

profissional competente para servir ao mercado, escondendo os motivos da desigualdade

social.

O segundo capítulo analisa as agências internacionais e os “arautos” da TCH

contemporânea. Parte-se da exposição dos objetivos educacionais de dois organismos

internacionais, dos ideais da Teoria da Capital Humano implícitos nestes objetivos, chegando

à influência que provocam nos rumos da educação escolar. Em seguida abordamos a questão

da competitividade que vêm fomentar a individualidade e a concorrência entre os indivíduos.

Analisamos ainda a tendência empreendedorista que vincula a aquisição de diversas

competências como a forma adequada dos indivíduos tornarem-se mais competentes e

poderem assim, ocupar melhores postos no “mercado de trabalho” ou crescerem

profissionalmente. Finalizando o capítulo, faz-se breve análise da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDB 9394/96) evidenciando algumas ideias neoliberais, da Teoria do

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Capital Humano e do empreendedorismo, presentes nesta legislação que fortalecem os

argumentos que arrolamos no sentido da vinculação entre o ideário “mercadológico” e os

princípios e fins da educação nacional.

No terceiro capítulo resgatam-se algumas tendências pedagógicas

contemporâneas, demonstrando sua articulação com princípios de sociedade e ser humano

defendidos pelo sistema econômico capitalista, que acabam por mistificar o papel da educação

ao transformá-la em mecanismo de adaptação ao capitalismo. Os responsáveis pela área

educacional vêem com o objetivo de criar políticas para guiar as ações da escola. O que

vemos é uma grande atuação dos organismos internacionais na indicação de políticas

educacionais, programas e projetos desenvolvidos no âmbito escolar. Estes órgãos atuam sob

forma de financiamento e prognósticos que são incorporados pelas políticas educacionais e

legislação e visam formar um cidadão produtivo, hábil e com valores úteis ao capitalismo.

Este trabalho, portanto, configura-se como uma análise do papel estratégico

ocupado pela educação escolar na sociedade capitalista contemporânea que, com a arrancada

do neoliberalismo nas últimas décadas, ilustra como o Estado tem deixado de investir nas

chamadas políticas sociais, delegando a outrem, à iniciativa privada, suas obrigações e uma

delas é a própria educação. Pretendemos enfocar minha análise no seguinte problema: Como a

educação escolar se torna um instrumento a serviço das classes dominantes e como concretiza

esse papel estratégico na sociedade capitalista brasileira contemporânea por meio da

disseminação e efetivação de projetos político-pedagógicos que produzem a formação de

sujeitos adaptados às demandas da organização atual do trabalho.

É importante discutir e analisar este tema por que a educação escolar é tida

como uma das soluções para os problemas sociais. É necessário conhecê-la melhor, se

quisermos que, de fato, atue nesta direção. As teorias que vinculam a educação escolar ao

desenvolvimento econômico e social subordinam os problemas enfrentados em nossa

sociedade à ausência de maior investimento naquela. Devemos combater a escola como

aparelho ideológico a serviço do capitalismo, devemos questioná-la e procurar alternativas

para superação desta realidade.

A educação atua transmitindo um sistema de valores e ideais úteis para

perpetuar o “status quo”, que fomentam e criam o tipo de homem idealizado pelos capitalistas

para que possam se manter ampliar seu poder.

É pertinente também indagar sobre a educação neoliberal e o conteúdo da

formação dos Pedagogos, uma vez que a eles caberá a responsabilidade pela organização do

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trabalho pedagógico nas escolas públicas que atendem a maior parte da população,

especialmente a de baixa renda.

Com o desenvolvimento desse tema, este trabalho espera cientificamente um

maior aprofundamento sobre os aspectos presentes na educação escolar que ilustram seu papel

de instrumento de dominação a serviço do capital. Espero fornecer uma reflexão que reforce a

importância de uma educação escolar crítica para o aluno e que vislumbre a praticidade para

toda classe dominada. A sociedade está em constante mudança e a cada dia exige-se a

formação de determinado homem que sirva às suas necessidades. Buscaremos também neste

trabalho analisar as políticas que subordinam a educação brasileira para formar determinado

tipo de trabalhador.

Reiteramos, pois, que o objetivo deste Trabalho de Conclusão de Curso é

resgatar as principais teorias que vinculam educação e desenvolvimento social, o tipo de

homem requerido pelo atual estágio do capitalismo e como a escola forma este sujeito

ensinando certas atitudes e valores e, também, debater a hipótese de que a questão da

dominação se potencializa na educação escolar, quando esta se volta para a formação do

cidadão ideal para o desenvolvimento social e econômico estabelecido, obediente e flexível,

quando é preciso.

A metodologia utilizada para a investigação do tema em questão é a análise

documental, fontes secundárias, incluindo leitura de documentos de organismos

internacionais e das políticas educacionais, cotejando o referencial teórico proposto pelos

expoentes oficiais e não-oficiais que defendem o modelo educacional vigente com os críticos

deste modelo.

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2 TEORIA DO CAPITAL HUMANO E OBJETIVOS EDUCACIONAIS

CONTEMPORÂNEOS

2.1 TEORIA DO CAPITAL HUMANO

Tomaremos como pressuposto que, nas sociedades capitalistas avançadas, a

educação escolar está colocada como uma ferramenta para a manutenção do poder do capital.

Frigotto (1993) afirma que a educação na sociedade atual esta articulada com os interesses

capitalistas, pois a educação é um espaço de luta pela hegemonia para possibilitar e oferecer a

classe dominante mecanismos para se manter.

O autor é bastante crítico ao concluir que a educação não apenas passa

conhecimentos para o mercado, mas também articula e desarticula outros conhecimentos para

os interesses dominantes prevalecerem.

Frigotto (1993, p. 44) vai além ao dizer que, “a escola é uma instituição social

que mediante suas práticas no campo do conhecimento, valores, atitudes e, mesmo, por sua

desqualificação, articula determinados interesses e desarticula outros”.

Trata-se de subordinar a função social da educação de forma controlada para

responder as demandas do capital. A educação se apresenta com um papel estratégico no

contexto neoliberal, formar o trabalhador para o processo de produção. E sendo assim, para o

autor “a educação dos diferentes grupos sociais de trabalhadores deve dar-se a fim de habilitá-

los técnica, social e ideologicamente para o trabalho” (FRIGOTTO, 1993, p. 26).

O autor vai ao encontro do debate em questão ao explicitar a capacidade dessas

políticas de formar o aluno e potencializá-lo para o trabalho desenvolvendo habilidades

técnicas e específicas para adequar o indivíduo a flexibilidade do mercado. E também ao

analisar os valores implícitos na Teoria do Capital Humano (TCH), ao mostrar que os

investimentos na área da educacional têm por objetivo um retorno para o trabalho e para o

capital, o autor expõe a Teoria do Capital Humano como àquela que prega e deposita

fortemente o investimento na educação para provocar uma modificação social.

Nessa teoria, a educação é fundamental para “criar e aumentar” o capital

humano. É o processo educativo que produzirá algumas atitudes e conhecimentos para

capacitar para o trabalho. Sendo assim, a educação é tida como um dos fatores que auxiliam

no desenvolvimento e na distribuição social de renda. As questões de diferença de classes são

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deixadas de lado, pois quem não conseguiu uma posição social melhor deve ser auto

responsabilizado, pois não teve méritos. Frigotto (1993, p. 41) expõe que:

O investimento no “fator humano” passa a significar um dos determinantes básicos para o aumento da produtividade e elemento de superação do atraso econômico. Do ponto de vista macroeconômico, constitui-se no fator explicativo das diferenças individuais de produtividade e de renda e, conseqüentemente, de mobilidade social.

Durante a década de 50 passou-se a postular que deveria privilegiar e investir

mais em “capital humano” do que em recursos físicos para se alcançar uma maior renda

nacional. Levando-se a concluir que esta teoria relacionava o crescimento e o aumento da

renda ao grau de escolarização. E assim sendo, Cunha (1980, p. 16) nos lembra que, “a

educação é reconhecida como uma variável, política estratégica capaz de intensificar o

crescimento da renda, produzir a modernização ou construir uma sociedade justa.”

A partir deste momento a questão da desigualdade social é colocada como

responsabilidade individual, causada por que alguns tiveram mais méritos do que os outros.

Isso explica a estratificação social. A sociedade se divide em estratos, pois, os indivíduos que

mais merecem por seu esforço e maior escolaridade devem assumir o topo da hierarquia

social e ter melhor situação econômica e política. Ocorre a relação direta entre melhor

qualificação profissional e maior escolarização de uma pessoa com a diminuição de sua

pobreza.

Oliveira (1997, p. 91) nos lembra o grande peso colocado na educação, mostra

também que a educação acaba convergindo com a lógica do capital ao preparar pessoas que

sirvam aos interesses deste, reafirmando a Teoria do Capital Humano no seu ato de esconder

as verdadeiras relações sociais existentes, pois:

É depositada na educação a expectativa de que esta possa, através da mobilidade social, melhorar os mecanismos de distribuição de renda e inserção produtiva, através do preparo dos indivíduos para o mercado de trabalho.

Aparece a idéia de educação como salvadora e redentora dos problemas da

sociedade e como aquela que proporciona a ascensão social; a idéia de educação como

promotora da democracia. Como podemos ver em Mello (1995, p. 31) que acredita que:

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A educação é convocada, talvez prioritariamente, para expressar uma nova relação entre desenvolvimento e democracia, como um dos fatores que podem contribuir para associar o crescimento econômico à melhoria da qualidade de vida e à consolidação dos valores democráticos

Os aspectos citados acima são componentes da Teoria do Capital Humano e

querem fazer crer que a educação que promove o desenvolvimento econômico dos seus

indivíduos consequentemente torna-se mais democrática.

Gentili e Silva (1996, p. 12).), afirmam que a função da educação neoliberal é

“atrelar a educação institucionalizada aos objetivos estreitos de preparação para o local de

trabalho”

Além de responder as demandas de mão de obra qualificada, ou seja, o capital

humano, a escola usa uma ideologia neoliberal para transmitir os ideais e valores necessários

para o sistema vigente.

Frigotto (1993, p. 50) nos lembra que a questão da escolaridade torna-se um

determinante no crescimento de um país segundo a Teoria do Capital Humano. A educação

seria então um adestramento reduzido aos interesses do setor econômico, como vemos a

seguir “O raciocínio da concepção do capital humano, tanto do ponto de vista do desenvolvimento

econômico como da renda individual, é que a educação, o treinamento são criadores de capacidade de

trabalho.

Para a Teoria do Capital Humano, investir nos indivíduos e promover o

aumento de sua produtividade pode levar à mobilidade social e melhor distribuição de renda

por meio da preparação adequada para o trabalho. Frigotto (1993, p. 67), afirma que a

educação passa a ser definida

Pelos critérios de mercado, cujo objetivo é averiguar qual a contribuição do “capital humano”, fruto do investimento realizado, para a produção econômica. Assim como na sociedade capitalista os produtos do trabalho humano são produzidos não em função de sua “utilidade”, mas em função da troca, o que interessa, do ponto de vista do mercado.

A Teoria do Capital Humano esconde a desigualdade, mostra-se útil para

mascarar a realidade e manter a consciência alienada, pois esta teoria tenta explicar e

depositar na educação o fator essencial para a produtividade. No campo da educação, a Teoria

do Capital Humano não mostra seus verdadeiros objetivos, pois se coloca como um fator

predominante para o desenvolvimento econômico. Sendo assim, “uma das funções efetivas da

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Teoria do Capital Humano reside não enquanto revela, mas enquanto esconde a verdadeira

natureza dos fenômenos” (FRIGOTTO, 1993, p. 53).

A educação sob a ótica desta teoria torna-se uma mera adaptadora e um

instrumento que responde às necessidades do sistema produtivo para a manutenção e

crescimento do capital. A educação sozinha não é capaz de perpetuar o sistema vigente, mas,

segundo Mészáros (2005, p. 45):

Uma das funções principais da educação formal nas nossas sociedades é produzir tanta conformidade ou consenso quanto for capaz, a partir de dentro e por meio dos seus próprios limites institucionalizados e legalmente sancionados.

A Teoria do Capital Humano coloca-se como mascaradora, pois, coloca o

investimento na educação como um fator predominante para levar uma pessoa a se

desenvolver financeiramente e a levar o seu país a crescer também. Não queremos dizer que

seja ruim o investimento na educação e que isso não promova uma mobilidade social, o que

queremos ressaltar é que a educação é colocada como panacéia para a sociedade, é vista como

atividade que pode e tem a função de sanar todos os problemas sociais.

A Teoria do Capital Humano advoga que o sucesso profissional é devido a

alguns “valores” que a pessoa recebeu que acabam aumentando sua produtividade. Assim,

Aspectos ligados a atitudes, valores, resultado do processo de socialização que se efetiva na escola são mais importantes para a produtividade das pessoas na organização enquanto forneçam hábitos de funcionalidade, respeito á hierarquia, disciplina etc. (FRIGOTTO, 1993, p. 46).

Porém, Kuenzer (1997) expressa a ideia de que a educação, do sistema regular

de ensino, tem uma finalidade clara, que é a de preparar os pobres para atuarem no sistema de

produção, nas profissões de níveis inferiores.

A autora diz que o que ocorre na escola não é o processo de produção e

também reprodução do conhecimento para esta, mas sim uma transmissão de conhecimentos,

com conteúdos esvaziados de criticidade que formam o aluno que é facilmente substituído na

nova ordem do mercado. Porém, a autora nos lembra que a Teoria do Capital Humano postula

que a educação é um fator predominante para a produtividade e para a equalização das

injustiças sociais. E

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Assim, a desigualdade entre os países não é uma questão estrutural, decorrente das relações imperialistas, mas uma questão conjuntural que poderá ser resolvida com o tempo, através de estratégias adequadas, como a formação de recursos humanos e o intervencionismo do Estado no planejamento da educação (KUENZER, 1997, p. 59).

Podemos perceber então que há vínculos e rupturas, principalmente na

fragmentação dos conteúdos para a classe trabalhadora e a falta de criticidade que não é dada

a esta. Os vínculos ocorrem através de uma mediação muitas vezes mascarada, através do

aumento da escolarização, do saber distribuído de forma desigual, da educação tida como

salvadora e aquela que fará uma equalização social.

O objetivo desses vínculos é desqualificar a classe trabalhadora e desapropropriá-

la do saber do seu trabalho. Esses vínculos têm por objetivo responder as demandas do

capital, tornando a escola uma instituição funcional ao capitalismo, pois esta torna se

desqualificada.

Frigotto (1993, p. 224) diz que a escola torna-se funcional ao capitalismo, devido a

sua ineficiência, como o autor aponta:

Sua improdutividade, dentro das relações capitalistas de produção, torna-se produtiva na medida em que a escola é desqualificada para a classe dominada, para os filhos dos trabalhadores, ela cumpre, ao mesmo tempo, uma dupla função na reprodução das relações capitalistas de produção: justifica a situação de explorados e, ao impedir o acesso ao saber elaborado, limita a classe trabalhadora na sua luta contra o capital.

Segundo ele, manifesta-se em um saber que é articulado ao saber específico e

prático que se desenvolve no processo produtivo, através da propagação de ideias necessárias

para a constituição do corpo coletivo do trabalho, na formação de profissionais nas diversas

áreas do saber, que irão atuar como trabalhadores improdutivos.

Essa desqualificação do trabalho escolar é o resultado de teorias que orientam

a forma de organizar e conduzir a prática educativa e de reformas que indicam os rumos das

políticas educacionais.

Esta teoria além de não mostrar as verdadeiras causas das diferenças sociais e

mascará-las, também vem passar que um investimento no fator humano pode fazer um país se

desenvolver e provocar uma mobilização social e levar o indivíduo a uma posição profissional

e social melhor.

Com relação à teoria analisada, Kuenzer (1997) diz que a educação aparece

com um caráter messiânico que é vista como aquela que solucionará os problemas sociais.

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Vemos assim, que o papel da escola de produzir certas atitudes e valores não é um fim em si

mesmo e específico da prática educativa, mas sim, uma prática mediadora que acaba servindo

aos interesses do capital. O que objetiva-se é que a educação responda às demandas impostas

pelo capital.

Segundo a autora, a educação possui um caráter de mediadora e expressa o

mascaramento da Teoria do Capital Humano na medida em que observamos que:

A distribuição do saber é produzido socialmente, e segundo as necessidades do capital, o que permite entender que a sua não democratização expressa pelo seu caráter seletivo e excludente não é uma disfunção, mas a sua própria forma de articulação com o capital. (KUENZER, 1997, p. 22).

E assim, a escola se torna uma instituição de formação onde prevalecem as

relações sociais do processo de produção, geralmente usada como mediadora dos interesses

do capitalismo. A escola oferece o saber deformado, funcional para o capital. Essa

distribuição desigual do saber dentro da escola já é uma reprodução do próprio capitalismo, é

uma maneira de formar valores úteis e pertinentes para o capital nos indivíduos.

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3 AS AGÊNCIAS MULTILATERAIS E OS ARAUTOS DA TEORIA DO CAPITAL

HUMANO CONTEMPORÂNEO

Percebemos o desejo de uma ligação da educação ao sistema econômico na

manifestação dos organismos mundiais através de financiamentos na educação. Torres (2003)

coloca que a visão que o BM (Banco Mundial) tem da educação é para que aja uma integração

entre educação e o econômico. E sendo assim, afirma que:

A educação básica proporciona o conhecimento, as habilidades e as atitudes essenciais para funcionar de maneira efetiva na sociedade sendo, portanto, uma prioridade em todo lugar. Esses atributos incluem um nível básico de competência em áreas gerais tais como as habilidades verbais, computacionais, comunicacionais, e a resolução de problemas. Essas competências podem ser aplicadas a uma grande variedade de empregos e permitir às pessoas adquirir habilidades e conhecimentos específicos orientados para o trabalho, quando estiverem no local de trabalho. Em geral, esse nível básico inclui cerca de oito anos de escolaridade. De fato, em muitos paises, o primeiro ciclo da educação secundaria está sendo combinado com a educação de primeiro grau para conformar uma etapa de educação obrigatória conhecida como “educação básica” (BM 1995, p. 63 apud TORRES, 2003, p.131).

Podemos perceber então, que os órgãos internacionais delineiam o modelo

educacional a ser seguido através de políticas, e segundo estes organismos, seguindo estas

recomendações os países podem alcançar um ótimo patamar educacional e poderão concorrer

plenamente no mercado mundial.

Um organismo internacional que propomos analisar é a UNESCO

(Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) e do mesmo modo

observamos nos documentos da UNESCO (2005 - Educação para Todos: O imperativo da

qualidade. Relatório Conciso), (2006 – Educação para Todos: Alfabetização para a vida.

Relatório Conciso) e (2007 - Bases sólidas: Educação e cuidados na primeira infância.

Relatório Conciso), que há grande ênfase afirmando que os papéis fundamentais da educação

são: construção de atitudes e valores que promovam a cidadania e respeito pela criatividade e

emoção do aluno. A questão do respeito aos direitos do outro e respeito ao cidadão em si é,

nestes casos, para mascarar a exclusão que o capitalismo causa.

A UNESCO (2006, p. 16) argumenta que o investimento na alfabetização nos

países traz vários retornos positivos para estes. Segundo o documento, ocorrem “benefícios

humanos, sociais, culturais, políticos e econômicos”

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A UNESCO (2006, p. 14) foca seus ideais na questão da Alfabetização.

Mesmo neste período da vida educacional já se coloca a educação para promover o

desenvolvimento social de uma pessoa e de uma nação. Para isso ocorrem “as ligações entre

alfabetização, à produtividade e o desenvolvimento socioeconômico e social”. Com relação à

alfabetização os objetivos da UNESCO (2006, p. 5) afirmam que a educação deve fornecer:

Os conteúdos básicos da aprendizagem (como o conhecimento, as habilidades, os valores e as atitudes) necessários para que os seres humanos possam sobreviver desenvolver plenamente suas capacidades, viver e trabalhar com dignidade, participar de forma plena no desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões e continuar a aprender.

Os documentos vêm expressar que, quanto maior o grau de escolaridade de um

indivíduo, maior será o seu salário e também sua ajuda ao país. Mais uma vez temos menção

à Teoria do Capital Humano que vincula a educação ao desenvolvimento econômico. A

UNESCO (2005, p. 2) afirma que os índices de uma renda mais alta estão associados ao um

maior nível educacional. A educação é tida como mecanismo para solucionar os problemas

da sociedade.

Melhor educação contribui para renda mais alta durante toda a vida e para um crescimento econômico mais robusto para o país, além de ajudar os indivíduos a fazerem escolhas mais informadas sobre fertilidade e outras questões importantes para o seu bem-estar.

Na mesma linha de pensamento Torres (2003, p. 131) afirma que

O BM vem estimulando os países a concentrar os recursos públicos na educação básica, que é responsável, comparativamente, pelos maiores benefícios sociais e econômicos e considerada elemento essencial para um desenvolvimento sustentável e de longo prazo assim como para aliviar a pobreza.

As ideias expressas nos documentos referidos, afirmam que os benefícios

econômicos e individuais estão intimamente ligados à questão da escolarização. A educação é

considerada como um fator que coloca as sociedades mais educadas como as mais

desenvolvidas e modernas. Neste contexto segundo Cunha (1980, p. 20) a educação é tida

como a que pode provocar mudanças sociais e esta,

Tem sido julgada, também, como um instrumento privilegiado para a “correção” das iniqüidades existentes na sociedade contemporânea. Através

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das alterações produzidas nas pessoas na época em que elas são suscetíveis de interiorização de hábitos duradouros, pensa-se poder alterar as relações sociais, vale dizer, construir uma sociedade nova.

Percebemos acima pressupostos da Teoria do Capital Humano onde é

depositada na educação a chave para diminuir as desigualdades sociais. E então:

Há uma crença muito difundida, atualmente, de que a educação escolar é um meio eficaz e disponível para que as pessoas possam melhorar sua posição na sociedade. Se as pessoas em pior posição puderem ingressar na escola pública e tiverem motivação para utilizar construtivamente às aquisições intelectuais por elas propiciadas, será certa a melhoria da sua posição (CUNHA, 1980, p. 27).

Igualmente, a Teoria do Capital Humano vincula a escolarização à melhor

qualidade de vida e a uma renda melhor; consequentemente, melhor condição social. Então

vemos que os ideais mostrados pela UNESCO são os mesmos postulados pela Teoria do

Capital Humano, pois segundo esta agência podemos perceber “relações existentes entre

qualidade do ensino, crescimento econômico e renda pessoal” (UNESCO, 2005, p. 10).

Coraggio (2003) aborda o financiamento que ocorre na educação a partir dos

anos 80 e afirma que o Banco Mundial, por meio de suas políticas busca desenvolver as

potencialidades do aluno para responder as demandas do mercado que precisa de

trabalhadores mais flexíveis e como mecanismo de ascensão social para os pobres.

O que ocorre é o enquadramento da educação ao modelo neoliberal com a

relação desta com o mercado. E a educação torna-se um processo no qual o processo de

ensino é colocado como uma empresa que produz os recursos humanos. Como observamos

em Coraggio (2003, p. 107)

Pretende-se que o faça, como qualquer empresa submetida à concorrência, ao menor preço possível. Para definir políticas, o modelo sugere realizar um estudo empírico dos “insumos escolares” e de custos, relacionando suas variações às do nível de aprendizado alcançado.

O que podemos perceber é que as relações sociais ficam em segundo plano e a

educação fica subordinada a política econômica e também as relações capitalistas e a

educação passa a ter um caráter adaptativo a este sistema, formando um cidadão apto para o

sistema vigente.

A UNESCO (2005, p. 6) postula que um dos objetivos que devem ser

alcançados na área educacional é a qualidade. Segundo a agência a má qualidade na educação

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promove a desigualdade e, sendo assim, os países devem se organizar para que seus sistemas

educativos formem os alunos para promover o crescimento econômico.

Uma melhor colocação e competitividade de um país estariam associadas ao

seu desenvolvimento educacional. O país, para concorrer em igualdade com os outros, deve

investir no capital humano de sua população. Também deve analisar se o desempenho

educativo é eficaz para tornar os alunos capacitados e competitivos para o desenvolvimento

nacional. Os países começam a “questionar se os alunos que se formam em seus sistemas

educacionais possuem a capacitação necessária ao crescimento econômico do país”.

Este contexto evidência o viés adaptativo da educação. Os países começam a

analisar se os cidadãos que estão sendo formados estarão aptos a servirem ao

desenvolvimento econômico da nação. Os países começam a questionar se o fator humano

que está sendo formado se enquadrará nos valores impostos pelo sistema vigente.

Um dos princípios dos documentos da UNESCO é a ênfase na educação como

promotora do desenvolvimento emocional, criativo do aluno e respeito aos direitos dos outros.

Os documentos mencionam que os alunos que possuem ideais parecidos com os da escola

tendem a obter melhor nível de aprendizado. Ou seja, os alunos que acatam os ideais e valores

passados pela escola possuem mais chances de se desenvolver. Nota-se que há grande

preocupação com o respeito aos direitos dos outros, com a paz e a tolerância com o ser

humano.

Percebemos no decorrer dos documentos analisados, que esta agência reitera

que os valores e também as atitudes, devem ser enfatizados e resgatados para que se chegar à

democracia e à cidadania. Nesta direção UNESCO (2005, p. 5) expressa que

As pessoas esperam que a escola ajude seus filhos a se desenvolver em termos criativos e emocionais e a adquirir a capacitação, os valores e atitudes necessárias para que eles tenham uma vida produtiva e se tornem cidadãos responsáveis.

O documento Educação para todos: Um imperativo de qualidade (2005, p. 2)

traz então as metas para se atingir um ensino de qualidade a que “dá ênfase ao papel da

educação na promoção de atitudes e valores de cidadania responsável e no cultivo do

desenvolvimento criativo e emocional”. A expressão desses valores na educação são para

chamar o indivíduo para este assumir uma responsabilidade para ajudar seu país a se

desenvolver, são ideais da TCH.

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Os documentos também afirmam que a maior formação amplia as

possibilidades de desenvolvimento pessoal e da nação. Segundo podemos ver no documento

da UNESCO (2005) “O aperfeiçoamento da qualidade da educação contribui para que seja

alcançada uma vasta gama de objetivos de desenvolvimento de natureza econômica e social”

(p.8). A Teoria do Capital Humano expressa que o investimento no fator humano promove

maior remuneração e consequente redução das desigualdades sociais existentes. Esse

investimento no fator humano provocaria grande retorno individual e social para os países. E

para reafirmar isso, Villela (2005, p. 44).) diz que “a educação, sendo a necessidade mais vital

no desenvolvimento da sociedade, pode ser – e com certeza é – a resposta poderosa para

muitos problemas da população do mundo de hoje”

A UNESCO (2005, p. 9) reforça que o investimento no capital humano

provoca o crescimento econômico de um país, o que traz de volta a Teoria do Capital

Humano, afirmando que a questão da escolarização “parece ser um fator importante na

determinação do crescimento-constatação que traz para o centro das atenções a relação entre

uma população educada e a redução da pobreza”.

Os documentos da UNESCO ressaltam que um dos objetivos da educação é

transmitir valores que respeitem a individualidade do outro e a liberdade de agir livremente.

Nesta direção, para a UNESCO (2005, p. 25) coloca que:

O desenvolvimento de capacidades cognitivas, criativas e sociais está invariavelmente incluído, mas há também a preocupação com valores, tanto os globais – respeito aos direitos humanos, ao meio ambiente, paz e tolerância – quanto os definidos em termos mais locais, como a diversidade cultural.

A UNESCO (2006, p. 8) deposita, na má qualidade educacional, a crença na

incidência de algumas doenças entre elas o HIV. Como vemos:

As taxas de infecção por HIV caíram quase pela metade entre mulheres formalmente educadas, mas o declínio foi quase imperceptível entre aquelas sem escolaridade formal. As escolas podem ter um papel ativo na redução da propagação da doença por meio do fornecimento de informações confiáveis e de aconselhamento, além de medidas para prolongar a educação de meninas

Portanto, da função de educar a escola assumiria o papel de solucionar e criar

medidas para amenizar outros problemas sociais. A educação aparece como salvadora e

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redentora dos problemas atuais. Torna-se um meio para diminuir a pobreza e para

conscientizar sobre outros fatores que afligem a sociedade atual.

Esse ideário é aprofundado mais recentemente pela UNESCO (2007, p. 24),

quando a agência afirma que “a educação deve ser considerada em uma dimensão integral nos

programas desenhados para combater problemas de saúde e nutrição nas crianças”.

É postulado que os indivíduos devem receber conteúdos para desenvolver os

valores úteis para sobreviver, desenvolver suas habilidades, ou seja, devem receber os valores

que os ajudem a se desenvolver na atual situação dada do contexto em que viveu: no caso do

sistema capitalista, os indivíduos devem desenvolver suas capacidades para responder as

demandas do capital.

Os documentos trazem programas e projetos no modelo do bem- estar -social

que seriam responsabilidade do Estado por meio de políticas públicas. Como no modelo

neoliberal, o governo não assume algumas funções, surgem estes projetos financiados por

outros setores da sociedade, que não o Estado, para atender a população menos favorecida. E,

segundo o documento da UNESCO (2007, p. 25), “A provisão de bons cuidados e apoio à

primeira infância é essencial para todas as crianças, mas, de suma importância para as pobres

e vulneráveis, para compensar suas desvantagens”.

Essas políticas objetivam fortalecer uma das características (neo) liberais que é a

igualdade: a ideia de que, embora não pertençamos à mesma classe social, todos têm os

direitos iguais no recebimento de uma educação de qualidade. Os objetivos do financiamento

dessas políticas na educação mascaram a desigualdade na distribuição da educação entre as

diferentes classes sociais. Para Frigotto (1993, p. 24) a educação tem o caráter de atender os

desafios atuais da sociedade. E para o autor, a escola “insere-se no movimento geral do capital

e, neste sentido, a escola se articula com os interesses capitalistas”

Segundo a UNESCO (2007, p. 22), a função educacional desses programas é

atender e trazer retornos imediatos e futuros para a população. “Os benefícios imediatos e de

longo prazo fazem desses programas uma estratégia eficaz, em função de seus custos, para a

redução da pobreza e da compensação das desvantagens”.

É enfatizado que a oportunidade dada para os indivíduos por meio de

programas para a primeira infância proporciona desenvolvimento econômico em longo prazo.

Assim é exposto no documento que devido a estes programas, ocorre um “impacto positivo

sobre a saúde, nutrição e os resultados da aprendizagem, os programas para primeira infância

representam um bom investimento no capital humano” (UNESCO, 2007, p.24).

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Podemos perceber que, para a UNESCO, os cuidados que devemos ter em

oferecer programas que cuidem e valorizem a infância estão ligados a interesses futuros.

Também para a Teoria do Capital Humano, o investimento neste capital humano traz um

retorno financeiro futuro.

Ainda destacando o papel das agências internacionais, percebemos em

Miranda (1997, p.38). “uma preocupação dos órgãos internacionais que se colocam a tarefa de

pensar a ordem e a democracia no mundo é evitar que o processo de globalização gere mais

pobreza e exclusão, comprometendo a estabilidade social e a paz mundial”

Em 1990 a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL),

elaborou uma proposta para ajustarem a economia e estabilizarem a economia com o novo

paradigma de desenvolvimento e a nova ordem mundial instalada. E assim Miranda (1997, p.

39) expressa que o documento sugere que

Indivíduos, setores sociais e países devam se tornar competitivos, ou seja, devam adequar-se às exigências do mercado. A competitividade autêntica (que se distingue da competitividade perversa baseada na degradação do valor do trabalho, do meio e da qualidade de vida) deve pautar-se, segundo o documento, pelos investimentos em capital humano, buscando convergência entre competitividade e sustentabilidade social, entre crescimento econômico e eqüidade social.

Podemos perceber que assim como a UNESCO, a CEPAL acredita que existe

o vínculo entre recursos humanos e educação. Sabemos que este organismo internacional

influencia as políticas educacionais brasileiras e, sendo assim, o eixo central deste órgão

acaba por passar os ideais de que a educação promove o desenvolvimento e também uma

equidade social.

O BM também vê o investimento na educação como uma maneira de provocar

uma mudança social na vida dos indivíduos. E para Miranda (1997, p. 40),

Na definição das políticas educacionais na América Latina, assume papel decisivo o Banco Mundial com sua defesa explícita da vinculação entre educação e produtividade, numa visão claramente economicista.

Ou seja, as políticas educacionais na América Latina são orientadas por

documentos destes organismos internacionais. E valores como equidade, qualidade total e

cidadania passam a configurar nas políticas de nossa região. Passa a figurar um novo

paradigma do conhecimento relacionado à questão da informação, dos avanços tecnológicos.

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A produção e também a difusão do conhecimento são tidos como determinantes para o

desenvolvimento econômico de um país.

Os saberes e os valores adquiridos são muito divulgados pelas estas agências e

“é valorizada a capacidade do indivíduo de construir seu próprio processo de aprendizagem,

desenvolvendo atitudes e habilidades como autonomia, auto-avaliação contínua, criatividade,

responsabilidade compartilhada, policognição (MIRANDA, 1997, p. 42)”.

Nas últimas décadas as mudanças tecnológicas e o avanço da informática

fizeram com que mudasse as exigências de qualificação do novo trabalhador e isso delineia

que o indivíduo deve ser educado para ser mais competitivo. E Miranda (1997, p. 44)

expressa que

Na América Latina, a defesa da centralidade da noção de conhecimento vai se fazendo presente nos rumos que a educação vem tomando, não apenas nas propostas das agências internacionais, como já foi indicado, mas também por projetos de lei, documentos e discursos oficiais e iniciativas diversas.

A partir desta ideia, podemos supor que os organismos internacionais

encontram na educação uma ferramenta para atender às demandas do mercado de trabalho.

Assim como já foi exposto anteriormente, a educação é meio para formar os recursos

humanos exigidos para sustentar as necessidades produtivas do capitalismo. A educação

adaptada às demandas do capital passa conhecimentos e valores úteis para adaptar o indivíduo

ao mercado. Podemos assim, refletir sobre o questionamento de Miranda (1997, p. 45), no

qual a autora faz a seguinte indagação:

O que há de se questionar é se essa concepção de centralidade do conhecimento não viria responder a uma exigência de racionalidade mais instrumental (funcional, imediata, adaptativa) dos processos produtivos, comprometendo as possibilidades de universalização de conhecimentos?

Teorias como a do capital Humano e do Empreendedorismo passam a orientar

programas e projetos que direcionarão as políticas educacionais. Entendemos que esta lógica

“mercantil” desqualifica o trabalho educacional.

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3.1 EDUCAÇÃO E COMPETITIVIDADE

Decorrente dos princípios da Teoria do Capital Humano, vemos que quanto

maior capacitação, maior escolarização, mais “competitivos” os indivíduos serão.

Frigotto (1993, p. 134) lembra que pode haver vínculos e rupturas da educação

com o sistema econômico-capitalista e com o papel que esta exerce nas relações capitalistas.

O autor diz então que a escola “parece constituir, dentro desse processo, uma mediação

necessária e produtiva para a manutenção das relações capitalistas de produção”. Sendo

assim, a escola é tida como mediadora entre a educação e o capitalismo e como um meio para

tornar os indivíduos mais competentes.

Analisando a premissa de que a escola deve preparar o aluno e formá-lo para

que se torne mais competitivo, com isso tornando seu país mais competitivo economicamente

também, é ilustrativa a observação de Mello (1995, p. 43), para quem a educação é

Fator importante para a qualificação dos recursos humanos requeridos pelo novo padrão de desenvolvimento, no qual a produtividade e a qualidade dos bens e produtos são decisivas para a competitividade internacional.

Podemos perceber aqui os ideais expressos na Teoria do Capital Humano, pois,

deposita-se na educação uma alternativa para redimir a população da pobreza e provocar

mudanças econômicas e elevar o país ao patamar de desenvolvimento econômico desejado.

Assim sendo, os países buscam estratégias para se tornarem mais competitivos

mundialmente. Mello (1995, p. 30) afirma que os países

Promovem reformas em seus sistemas educacionais, com a finalidade de torná-los mais eficientes e eqüitativos no preparo de uma nova cidadania, capaz de enfrentar a revolução tecnológica que está ocorrendo no processo produtivo e seus desdobramentos políticos, sociais e éticos

Da escola passa-se a exigir a função de passar algumas informações e códigos

para tornar os alunos mais competitivos. Para a autora, é importante que o indivíduo seja

formado e domine habilidades para estarem aptos para o mundo do trabalho:

Formação de competências sociais, como liderança, iniciativa, capacidade de tomar decisões, autonomia no trabalho, habilidade de comunicação, constituem novos desafios educacionais (MELLO, 1995, p. 34).

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Reiteramos que a questão da competitividade é posta como fator importante

para elevar o país ao patamar de desenvolvido. Assim temos que o sujeito competitivo é o

sujeito empreendedor e, neste caso, é relevante que desenvolva a criatividade, a iniciativa,

habilidades cognitivas e outras competências. A educação escolar é, pois, o meio excelente

para criar essas habilidades. E, segundo Mello (1995, p. 30), tornou-se necessário que a

educação “adquira centralidade nas pautas governamentais e na agenda dos debates que

buscam caminhos para uma reestruturação competitiva da economia, com equidade social.”

A escola assume neste cenário, a função de transmitir um ideário particularista e

imediatista voltado para o mercado. Assim sendo, cada aluno terá que adquirir um “pacote”

de competências desejadas pelo mercado. O conceito de qualificação, antes visto como um

posicionamento de eficiência produtiva, afasta-se do conceito anterior em que servia para

organizar as relações de trabalho e assume a noção de competência. O conceito anterior de

qualificação é substituído pelo de competência. O predomínio da competência coincide com

a competitividade e com a busca exagerada dos benefícios pessoais, ou seja, fomenta-se o

individualismo. Deste modo

A complexidade do mundo moderno e os efeitos da globalização exigem que o processo educativo estimule novos conhecimentos, habilidades, competências e valores, promovendo o desenvolvimento do potencial empreendedor que todo ser humano traz consigo, independentemente da educação proporcionada pelas instituições-família, escola e sociedade (VILLELA, 2005, p. 14).

Neste ponto, novamente assistimos à Teoria do Capital Humano, pois se visa à

formação de indivíduos muito competentes e cujas competências devem resultar em retorno

pessoal, individual. Como consequência, vemos que este retorno decorre dos méritos e dos

esforços próprios. Os indivíduos que não conseguem ter os “bons” retornos é por que não

foram suficientemente competentes.

Ocorre a ligação da ideia de qualificação, a noção de que quanto mais

escolaridade e um diploma uma pessoa tiver mais chance um país terá de ser

socioeconomicamente desenvolvido, ocorre a ideia de que deve haver uma permanência ainda

maior nas escolas.

A questão de um país ser estável depende do desenvolvimento de

competências que auxiliem o indivíduo a se adaptar as exigências que são impostas no

mercado globalizado. Villela (2005, p. 44) acreditando na coerência das explicações da T.C.

H afirma que:

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A estabilidade social e política mundial depende muito do desenvolvimento de estratégias bem sucedidas que permitam lidar com os crescentes problemas de ordem social, econômica e ambiental. Entretanto, esse cenário de tantas contradições e incertezas cria a necessidade de que sejam acrescentados novos elementos às habilidades humanas disponíveis. A educação deve, portanto, desenvolver essas competências comportamentais exigidas pela sociedade.

Os ideários que o mercado quer são buscados na formação dos alunos, objetivando-

se a construção de sujeitos críticos, participativos e autônomos. Tais competências dariam ao

trabalhador a capacidade de encarar situações adversas, especialmente da área profissional,

pois aquelas são baseadas na flexibilidade e asseguradas por atributos tais como,

responsabilidade, autonomia, polivâlencia e capacidade de se comunicar. Portanto, mantém-se

a “essência” formativa tanto na preparação de sujeitos “qualificados” quanto “competentes”,

uma vez que a matriz de ambos os modelos está vinculado. Existe uma proximidade entre os

conceitos de qualificação e competência, o trabalhador sairia da lógica de ter uma

qualificação para a lógica de ser competente e também qualificado.

A educação volta-se para ao mercado na medida em que busca formar o

indivíduo competente para se servir eficientemente às demandas. Isso ocorre segundo Ramos

(2002, p. 59),

Sobre uma materialidade de relações, organizações processos e instituições que, ao mesmo tempo, condicionam e reprimem as subjetividades, levando-as a atuar segundo a lógica do capital, inibindo a plena objetivação do indivíduo humano como personalidade consciente, crítica e solidária.

Nesta questão de formar as competências, a escola tem um papel de manter o

consenso da individualidade e não permitir que os indivíduos questionem qual a validade

dessa noção de competência. E então se passa a defender o desenvolvimento de competências

para propiciar uma formação que responda as demandas do capitalismo. A partir disso, a

educação passa a produzir ou reproduzir um sistema de valores para responder ao padrão das

competências. Essa mudança do conceito de competência ocorre também no âmbito

educacional e deve voltar-se para a formação de um novo indivíduo para servir o capital. E

assim,

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A valorização das competências individuais dos trabalhadores inscreve-se, portanto, no marco do individualismo liberal e de subjetividades otimizadas. E se a escola deve voltar-se para o desenvolvimento dessas competências, perde importância sua participação, assim como de todos os elementos culturais, na formação da consciência de uma nova concepção de mundo (RAMOS, 2002, p. 303).

A educação torna-se responsável por transmitir os ideais de competência. Cabe

à educação fornecer os instrumentos para os indivíduos se adaptarem ao “mundo em

mudança”.

Segundo Delors (1998, p 89), “a educação deve transmitir, de fato, de forma

maciça e eficaz, cada vez mais saberes e saber-fazer evolutivos, adaptados à civilização

cognitiva, pois são bases das competências do futuro”.

O Relatório Jacques Delors foi feito a pedido da Organização das Nações

Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e contou com o auxílio de especialistas

de todo o mundo. Este relatório Educação: um tesouro a descobrir foi iniciado em março de

1993 e foi finalizado em setembro de 1996. Este foi um relatório para a UNESCO da

Comissão Internacional sobre a educação para o século XXI. O Relatório Jacques Delors

vem destacar os quatro pilares essenciais para a educação, buscando ser uma forma de

fortalecer as políticas voltadas à educação para todos para promover entre os indivíduos uma

vida digna com uma educação que alcance e promova uma vida mais justa.

Os saberes evolutivos citados servirão para que os indivíduos possam se

atualizar e se adaptar ao sistema capitalista que constantemente se transforma.

3.2 EMPREENDEDORISMO E EDUCAÇÃO

Uma nova maneira de perpetuar os ideais capitalistas passa pela difusão do

empreendedorismo nas escolas que consideramos, seguir a matriz teórica da Teoria Capital

Humano. Segundo Villela (2005, p. 13) três características importantes justificam e devem ser

buscadas por meio do empreendedorismo.

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1-A capacidade individual de empreender, ou seja, tomar a iniciativa e agir, buscando soluções inovadoras para problemas pessoais ou de outros, econômicos ou sociais, por meio de novos empreendimentos. É esse enfoque procedimental que se trabalha na escola com maior ênfase. 2-O processo de iniciar e gerir empreendimentos, isto é, o conjunto de conceitos, métodos, instrumentos e práticas relacionadas com a criação, implantação e a gestão de novos projetos ou organizações. Nesse enfoque, o empreendedorismo é uma metodologia a ser apreendida. 3-O movimento social de desenvolvimento do espírito empreendedor para a geração de emprego e renda, a partir da motivação interna para mobilizar a ação, exercendo direitos e deveres, sentindo-se parte do contexto. Esse enfoque considera o empreendedorismo como fator de cidadania

Os aspectos levantados pela autora demonstram sua vinculação ao ideário

neoliberal, que enaltece o individualismo, fortalece soluções inovadoras, fomenta o

planejamento de projetos e a adaptação às mudanças no mercado. Percebemos que a

educação empreendedora vem com o objetivo de criar no aluno a postura adequada para as

mudanças atuais que o capitalismo pede. Na mesma direção, Villela (2005, p.13) afirma que

as escolas devem:

Organizar uma proposta pedagógica comprometida com o Empreendedorismo exige a adoção de estratégias que favoreçam e incentivem atitudes e posturas como: autonomia, autovalorização, ética, criatividade, cidadania, liderança, diálogo, participação, desenvolvimento de projetos, resolução de problemas, boa utilização da informação e dos recursos, inovação e pioneirismo.

Neste ponto, se fomenta ainda mais a ideia de competências, para que com

estas o indivíduo possa se desenvolver e alcançar sucesso profissional. Segundo a autora é

necessário que o desenvolvimento de competências exista para sustentar o espírito

empreendedor, como observamos no trecho a seguir:

A inserção do Empreendedorismo no currículo visa, em primeiro lugar, a disseminar a cultura empreendedora, a importância do empreendedor na escola e a necessidade de inovar. Isso exige capacitar e orientar os professores para o trabalho com foco na competência empreendedora, promovendo sua integração no desenvolvimento de projetos conjuntos (VILLELA, 2005, p.13).

Para que o empreendedorismo seja organizado nas propostas pedagógicas das

escolas é necessário que estas adotem algumas medidas para incentivar valores como a

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iniciativa nos alunos, a autonomia, a ética, a criatividade, a liderança, a cidadania e a

inovação.

Quando ouvimos falar do Empreendedorismo na escola nos remetemos à ideia

da Teoria do Capital Humano, de guiar pessoas, qualificá-las para o mercado de trabalho e

com isso contribuir para o crescimento do país.

Assim, como o Empreendedorismo na escola, a Teoria do Capital Humano

incentiva a escola a transmitir diversos valores e habilidades funcionais ao sistema econômico

vigente. Como observa Frigotto (1993, p. 40):

O processo educativo, escolar ou não, é reduzido à função de produzir um conjunto de habilidades intelectuais, desenvolvimento de determinadas atitudes, transmissão de um determinado volume de conhecimentos que funcionam como geradores de capacidade de trabalho e, consequentemente, de produção.

O Empreededorismo na escola seria estimulado a partir de projetos de trabalho.

Segundo Villela (2005, p. 18), esses projetos auxiliam no desenvolvimento de várias

competências:

Formulação e a resolução de problemas, a partir do diagnóstico de situações e do desenvolvimento de estratégias analíticas e avaliativas; Tomada de decisões, ao definir o que é relevante para ser incluído no projeto;

Autodireção nas iniciativas para realizar as tarefas de investigação; Imaginação na utilização criativa de recursos, métodos e explicações alternativas aos problemas investigados; Integração e síntese de idéias, experiências e informações de diferentes fontes e áreas de conhecimento; Comunicação interpessoal, ao confrontar as próprias opiniões com outras, através da escrita e de outras formas de representação, responsabilizando-se por elas.

Essas competências são úteis para formar o indivíduo flexível, com a postura

empreendedora que o capitalismo requer. Com relação às competências pede-se que os

indivíduos sejam formados para se adaptar aos constantes avanços pelos quais passamos. O

indivíduo competente possui melhor condição social e com isso se exime da desigualdade

social. Mello (1995, p. 32) corrobora o ponto de vista da justiça criada a partir dos

pressupostos da sociedade “competitiva”.

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Dado o padrão desigual de desenvolvimento tanto no continente como um todo, como no interior de cada país, a preparação do conjunto da sociedade para incorporar os avanços tecnológicos, de modo a utilizá-los para melhorar a qualidade de vida, é condição para evitar a ação de novos elementos de seletividade e desigualdade social

O termo competência passa a representar os objetivos do indivíduo que se

adapta às mudanças e pode melhorar sua vida. E, segundo Villela (2005), como é evidente a

relevância das competências, é necessário que “a escola reveja seus objetivos e que se

organize a partir de uma reflexão sobre a proposta de educação que oferece condições para o

desenvolvimento das competências que fazem o novo acontecer” (p.14).

A autora tenta mostrar a grande necessidade da aliança entre escola e

Empreendedorismo. Lembra que, além dos ideais que orientam a educação atualmente (saber

conhecer, saber fazer, saber ser e saber conviver), a escola deve orientar-se no saber aprender

a empreender.

Para que uma pessoa seja capaz de empreender a própria vida, no todo ou em algum aspecto específico, deve ser estimulada e orientada, através de vivências e conhecimentos diversos, a exercer sua criatividade, utilizando, desde a concepção das idéias até sua completa realização, a multiplicidade de sua inteligência1, suas competências e suas habilidades (VILLELA, 2005, p. 15).

Esse saber (aprender a empreender) acredita-se que levará o aluno a

desenvolver os outros saberes, pelos quais o aluno será orientado a uma educação

empreendedora.

É possível vislumbrar a relevância que certos setores da sociedade atribuem ao

Empreendedorismo. Delors (1998, p. 90) afirma que a educação deve basear-se e organizar-se

em quatro pilares

Aprender a conhecer, isto é adquirir os instrumentos da compreensão, aprender a fazer, para poder agir sobre o meio envolvente; aprender a viver juntos, a fim de participar e cooperar com os outros em todas as atividades humanas; finalmente aprender a ser, via essencial que integra as três precedentes

1 Teoria das Inteligências Múltiplas criada pelo psicólogo Howard Gardner que estudou as diversas profissões em diferentes culturas, analisando as habilidades destes indivíduos na solução de determinados problemas. Segundo Gardner a inteligência é uma alternativa que permite a uma pessoa alcançar uma desempenho maior ou menor em qualquer área que for atuar. Definição de GAMA, Maria Clara S. Salgado (1998).

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Nos ideais do Empreendedorismo são estes saberes que orientam a educação,

querem despertar no outro o espírito empreendedor. Vemos que se configura um novo ideário

educacional e o objetivo é que este se baseie nos quatro pilares que têm orientado a educação

brasileira.

Segundo Delors (1998, p. 90), “uma nova concepção ampliada de educação

devia fazer com que todos pudessem descobrir, reanimar e fortalecer o seu potencial criativo –

revelar o tesouro escondido em cada um de nós”.

Observamos no mesmo ideário do Empreendedorismo, o indivíduo deve

descobrir o empreendedor em si, deve demonstrar os valores que são úteis para fomentar o

desenvolvimento do sistema vigente.

Percebemos no ideário Empreendedorista uma supervalorização do

individualismo e a crença no prolongamento da escolarização como uma possibilidade para o

indivíduo se tornar mais competente. Para Delors (1998, p. 91):

O aumento dos saberes, que permite compreender melhor o ambiente sob seus diversos aspectos, favorece o despertar da curiosidade intelectual, estimula o sentido crítico e permite compreender o real, mediante a aquisição de autonomia na capacidade de discernir.

Este prolongamento da escolarização do indivíduo pode ser visto como um pré-

requisito a mais para este competir e se adaptar ao sistema capitalista que exige um indivíduo

cada vez mais competente. Esta é uma tarefa que a escola cumpre prolongar a escolarização

que é chamada de tercialização da sociedade. Isso ocorre devido às diversas atividades que a

escola articula com o processo de efetivação do capital, causando arbitrariamente a

necessidade das pessoas aumentarem seu grau de escolaridade, para estarem aptos ou

contemporizados para a entrada no mercado. Frigotto (1993, p. 157) expõe que

Uma das funções que a escola pode cumprir é o prolongamento de escolaridade desqualificada, cujos “custos improdutivos”, além de entrarem no ciclo econômico, servem de mecanismos de controle de oferta e demanda de emprego.

Porém, esse prolongamento da escolaridade não garante um acesso a empregos

mais rentáveis. Esse investimento na área educacional significa a entrada deste incentivo

dentro da ótica estratégica de movimento do capital, para sustentar os interesses deste mesmo

capital e, sendo assim, o indivíduo que possui grau mais elevado de escolaridade é

considerado mais competente do que aqueles que não o possuem.

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Segundo Villela (2005), todo professor pode aplicar o Empreendedorismo na

escola baseando-se no fato de que seus pressupostos estão contidos nas leis da educação

brasileira, quando propõe despertar em seu ato de educar maior criatividade e determinação

quanto aos interesses sociais. E segundo a LDB em seu Art. 27 [...] I, é função da educação a

“difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de

respeito ao bem comum à ordem democrática”. Para a autora é obrigação de cada professor

conhecer e se aprofundar nas leis da educação brasileira e o professor deve fazer isso sob a

ótica do Empreendedorismo.

A autora diz que a LDB quer que a escola seja autônoma, adote um modelo

flexível, seja inovadora, democrática e participativa. E, para alcançar esses ideais é necessário

que o Empreendedorismo seja inserido nas escolas.

Em relação à questão da inovação, Mendes (2006) fala que a educação

atualmente deve partir com um caráter de recomeço. E, sendo assim, “precisamos instaurar a

pedagogia do projeto, o qual não se situa apenas pela escola, mas em todos os engajamentos

de nossa práxis” (p.25).

O ideário do Empreendedorismo incentiva a inovação em projetos para tornar

o aluno mais autônomo e criativo.

Os valores ditados para adaptar a escola ao Empreendedorismo são os mesmos

que o capitalismo requer para a sociedade no seu conjunto. O capitalismo requer um

indivíduo que não ameace sua hegemonia, que mantenha uma sociedade harmônica e, para

isso o aluno deve receber alguns valores como: “empreender para a cidadania, colaboração,

amor2 a felicidade, a sensibilidade e, a partir daí, empreender para gerar riquezas materiais”

(VILLELA, 2005, p. 43).

O que vemos na educação empreendedora é que, assim como outras

tendências, deposita na educação a salvação para os grandes problemas do país por meio do

progresso individual. Para minimizar estes problemas passa-se a receita: “educação para

todos,” como notamos no trecho abaixo:

Há uma grande pressão sobre o sistema educacional no sentido de propiciar educação para todos, a qual é necessária para garantir a sobrevivência econômica do país. É preciso integrar a educação e a preparação para o mercado de trabalho, aspecto fundamental para tornar o país competitivo (VILLELA, 2005, p. 44).

2 Com relação à Pedagogia do Amor, ver Gabriel Chalita 2003.

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Percebemos que é depositada na educação a esperança da elevação do país ao

padrão de desenvolvimento econômico desejável e também ao fim dos seus problemas

sociais. Villela (2005, p. 44) afirma que

A estabilidade social e política mundial dependem muito do desenvolvimento de estratégias bem-sucedidas que permitam lidar com os crescentes problemas de ordem social, econômica e novos elementos às habilidades humanas disponíveis. A educação deve, portanto, desenvolver essas novas competências comportamentais exigidas pela sociedade.

O que quer se passar para as pessoas é que elas podem ser bem sucedidas e que

podem crescer financeiramente desde que desenvolvam certas habilidades e competências

requeridas pelo mercado competitivo. A educação empreendedora será capaz de fazer com

que “as pessoas tornem-se mais capazes de empreender a própria vida, no sentido de ter a

motivação interna suficiente para agir” (VILLELA, 2005, p. 44).

Esta educação empreendedora pretende passar a ideia de que o indivíduo deve

gerir suas ações, sua vida e consequentemente sua condição social. O objetivo é que o ideário

do Empreendedorismo se expanda por toda a sociedade. E, conforme Villela (2005, p.15)

coloca:

Cabe à escola propor inovações que servirão à sociedade como um todo. O desafio é oferecer uma educação empreendedora que sirva a todos os alunos, para que, com uma visão sistêmica e consciência cidadã, sejam competentes nas ações de empreender sua própria vida com dignidade e construir uma nova sociedade empreendedora.

Um valor muito presente na educação empreendedora é a solidariedade. Para

Villela (2005, p. 45) a educação tem uma função primordial que é “provocar uma reação em

massa, não apenas para o desenvolvimento econômico, mas principalmente dos aspectos de

humanidade e solidariedade”. Em seu artigo 2º a LDB, expressa que:

A educação, dever da família e do estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Esta última é um valor muito presente no ideário neoliberal. Uma vez que o

Estado não oferece os serviços pelos quais é responsável, quem deve assumir o ônus de ajudar

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os outros são os próprios cidadãos. O Empreendedorismo na escola é mais uma forma de

adequar a educação às tendências gerais do capitalismo contemporâneo.

3.3 A LDB

A seguir faremos algumas considerações visando mostrar a presença do ideário

neoliberal por meio da Teoria do Capital Humano e do empreendedorismo na Legislação da

Educação Brasileira.

Dentre os princípios da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Lei nº.

9394/96 vemos que a educação básica deve fundamentar-se no direito e no exercício da

cidadania e na promoção de atitudes que levem o aluno a conseguir entrar no mercado de

trabalho e adaptar-se acomodar a ele. Assim expressa a LDB:

Art.22: A educação básica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurar lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhes meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores.

Ao analisarmos esta lei, notamos que o foco do ensino na educação básica está

em desenvolver os aspectos físico, intelectual, psicológico e social do aluno para

complementar a ação da família e da comunidade.

Para o ensino fundamental, as diretrizes da lei explicitam dentre os valores

desejados, que o aluno seja formado e adquira conhecimentos e habilidades que fortaleçam

suas atitudes, valores e seus laços de solidariedade humana. O ensino médio é o período de

continuação da educação básica, de preparação básica para o trabalho e está voltado para que

o aluno possa exercer a cidadania. LDB diz que o ensino médio tem por finalidade:

Art. 35 [...] II: A preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a se capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores.

No ensino médio o aluno deve receber valores éticos para que desenvolva sua

autonomia intelectual. Além disso, devem estar antenados às novas mudanças tecnológicas

que sempre aparecem. Notamos ser algo muito útil ao sistema capitalista: ter alguém que se

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transforme conforme as transformações do sistema vigente. Conforme prevê a LDB inciso da

LDB 9394/96, o ensino médio deve levar os estudantes

Art.35 [...]IV: A compreensão dos fundamentos científico-tecnológico dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.

Aqui, a Lei aponta que devido às mudanças tecnológicas constantes, ocorre

demanda por uma formação voltada para responder a.

Art. 35 [...] II: A preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a se capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores.

No ensino médio o aluno deve receber valores éticos para que desenvolva

sua autonomia intelectual. Além disso, devem estar antenados às novas mudanças

tecnológicas que sempre aparecem. Notamos ser algo muito útil ao sistema capitalista: ter

alguém que se transforme conforme as transformações do sistema vigente. Conforme prevê

a LDB inciso da LDB 9394/96, o ensino médio deve levar os estudantes

Art.35 [...]IV: A compreensão dos fundamentos científico-tecnológico dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.

Aqui, a Lei aponta que devido às mudanças tecnológicas constantes, ocorre

demanda por uma formação voltada para responder a estas alterações o que exigirá

escolaridade mais prolongada.

Além disso, o Art.36, no parágrafo 1º, diz que durante o ensino médio devem

ser passados para os alunos os conteúdos e métodos que propiciem o:

[...] I-domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a

produção moderna.

Na perspectiva de alcançar determinadas habilidades, o Art. 32, III, rege que o

ensino fundamental obrigatório e gratuito tem por objetivo a formação básica do cidadão

para:

Art. [...]: O desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores.

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Segundo entendemos, a LDB 9394/96 explicita que a educação básica deve

formar indivíduos para o exercício de profissões técnicas, que não exigem reflexão e nem o

domínio da totalidade de seu trabalho. Os conteúdos são esvaziados de verdadeira

importância, os valores manifestos conduzem os alunos para uma preparação geral inicial para

o mercado de trabalho.

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4. CRÍTICAS ÀS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS VINCULADAS AO MODELO NEOLIBERAL/PÓS-MODERNO

Podemos perceber que as teorias acima analisadas vinculam a educação ao

desenvolvimento econômico e acabam por mascarar as verdadeiras razões das relações

sociais. Percebemos isso no Construtivismo e na Escola Nova, no neoliberalismo divulgando

ideais individualistas e no empreendedorismo.

Em Arce (2005), vemos críticas aos modismos pelos quais a educação passa.

Basta surgir uma nova teoria que promete reerguer a educação e provocar um crescimento do

país que todos aderem. E a tendência em questão é o Construtivismo.

Arce (2005, p. 45), diz que o Construtivismo é um ideário que no fundo

esconde algumas ideias neoliberais, pois tenta passar a ideia de que todos têm o direito ao

ensino e que podem crescer economicamente. Segundo a autora

Como todo ideário neoliberal é baseado na ilusão de que tudo depende apenas do indivíduo, divulga-se a idéia de que o sistema social colocaria acima de tudo os interesses individuais e sua realização, sendo as relações entre os indivíduos reguladas apenas pelo mercado que levaria, através da união de todos distintos, à harmonia social.

Mais uma vez temos ideais do capitalismo contemporâneo; o ideal de fornecer

educação para todos, para a nação se desenvolver e crescer, que também é sustentado pela

Teoria do Capital Humano.

Esses ideais estão presentes nos modismos que influenciam a educação, como

no caso do Construtivismo baseado no escolanovismo, que vê nestes ideais uma maneira de

tornar a sociedade mais aberta à mudança social provocada pela educação. E, sendo assim,

Cunha (1980) expõe que o escolanovismo acredita que, “as classes sociais serão abertas, que

haverá amplas possibilidades de que um indivíduo nascido em uma classe passe para outra,

conforme suas qualidades intrínsecas manifestadas pelo processo educacional” (p.50).

O autor expressa que o papel assumido pela educação é o de construir uma

sociedade aberta, o que passa pelos ideais liberais e assim “comum é a atribuição à educação

do papel de instrumento de correção das desigualdades injustas produzidas pela ordem

econômica” (CUNHA, 1980, p. 55).

Nestes ideais da Escola Nova, percebemos a função que é a de colocar como

papel da educação um instrumento de equalização social, assim como observamos nos ideais

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postulados pela Teoria do Capital. O Construtivismo passa ideais de superação da situação

desigual do mundo, mas não mostra o que realmente acontece.

Sabemos que a educação é um ponto estratégico para disseminar os ideais

capitalistas e a doutrina neoliberal, passando os ideais de que com uma maior qualidade na

educação pode-se alcançar um maior desenvolvimento econômico em cada país.

Para Chauí (1999)

O neoliberalismo não é uma lei natural nem uma fatalidade cósmica nem muito menos o fim da historia. Ele é uma ideologia de uma forma histórica particular assumida pela acumulação do capital, portanto, algo que os homens fazem em condições determinadas, ainda que não o saibam e que podem deixar de fazer se, tomando consciência delas, decidirem organizar-se contra elas.

Nos ideais passados pela doutrina neoliberal à educação é tida como a

salvacionista dos problemas que são provocados pela desigualdade social, e é tido como a que

pode diminuir as injustiças sociais que aí estão, pois se passa a depositar no indivíduo e em

suas condições uma maneira deste se sobressair aos demais.

A ligação orgânica entre as doutrinas e práticas neoliberais e os discursos e práticas da qualidade total encontram, no campo educacional, um lugar estratégico em duplo sentido: No nível da ideologia, a consolidação hegemônica de seus princípios, e no nível da economia, a formação de “recursos humanos” compatíveis com as novas exigências impostas pelo mercado (BUENO, 2003, p. 82).

Vemos que o neoliberalismo e qualidade total em educação se apóiam de certo

modo à TCH, que enfoca a formação de recursos humanos para servir ao mercado e promover

a justiça social.

Nos pressupostos neoliberais a educação torna-se uma mercadoria, que deve

passar ideais de produtividade e eficácia aptas para a organização do mercado. E então Chauí

(1999, p. 48) nos lembra que:

O neoliberalismo, ao afirmar que os imperativos do mercado são racionais e que, por si mesmos, são capazes de organizar a vida econômica, social e política introduz a idéia de competição e competitividade como solo intransponível das relações sociais, políticas e individuais.

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A Teoria do Capital Humano passa-se a valorizar muito o mérito de cada

indivíduo para este conseguir uma posição melhor na sociedade devido à escolarização

alcançada. Como podemos ver em (Gentili apud BUENO, 2003, p. 83) alguns termos:

Cedem lugar à competição e ao mérito individual como metas educacionais finais; ou, de qualquer forma, são reconsiderados meramente como estratégias metodológicas para obter maior rendimento e produtividade.

Podemos notar que o termo qualidade total nesta perspectiva não se vincula às

ideias humanistas, mas sim a competição avassaladora em nossa sociedade. E colocarmos esta

qualidade total como centro do debate acaba tornando-se uma forma de não pensarmos as

razões da desigualdade social. Acabamos pensando somente na formação para fornecer

indivíduos eficientes e acabamos negando o motivo das injustiças sociais.

A Teoria do Capital Humano postula que o investimento que uma nação faz

em seus indivíduos acarreta retornos financeiros no futuro. A educação é tida como fator

fundamental para o desenvolvimento econômico. Sendo assim, a ascensão social de uma

pessoa deve-se à acumulação de bens, maior escolarização e a si próprio devido ao seu

esforço pessoal, sua capacidade, iniciativa e aptidão, os mesmos pressupostos que vemos nos

ideais do Empreendedorismo contemporâneo. Podemos ver esses pontos em comum entre

essas duas linhas de pensamento que valorizam o individualismo e a livre concorrência no

trecho a seguir de Frigotto (1993, p. 61):

Se todos os indivíduos são livres, se todos no mercado de trocas podem vender e comprar o que querem, o problema da desigualdade é culpa do indivíduo. Ou seja, se existem aqueles que têm capital é porque se esforçaram mais, trabalharam mais, sacrificaram o lazer e pouparam para investir

Nesta teoria a individualidade determina, em última instância, a posição

econômica e social em que os indivíduos se encontram. Se este pertence à classe dominada é

devido a si próprio; foi por que não se esforçou tanto quanto os demais que ocupam melhores

posições. Neste contexto o ato educativo passa a ser definido como uma prática

eminentemente política e social, e acaba reduzida a uma tecnologia educacional. A questão

educacional reduz-se apenas a um mero adestramento reduzido a área econômica a preparar

recursos para servir ao capital. Para Kuenzer (1995, p. 50)

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A partir das relações de produções e das novas formas de organização do processo produtivo, são concebidos e veiculados novos modos de vida, de comportamentos, de valores ideológicos. Assim, acresce-se á coerção a busca de consenso através da veiculação de uma nova concepção de mundo correspondente aos interesses do capital

Esta teoria possui um caráter de mascarar a situação atual, pois, defende que a

ascensão social é devido à renda e a escolarização e ao empenho individual. Ignora-se o valor

das análises que consideram relevantes observar ou ponderar as relações as classes sociais,

pois a discussão centra-se na questão individual como causa da pobreza e não como sendo

diferenças do lugar que os indivíduos ocupam nas relações de produção.

Os indivíduos não podem ser considerados pobres por que “merecem”, por que

não se esforçaram, ou por que não frequentaram suficientemente a escola. Entretanto, a Teoria

do Capital Humano reforça que é a escolaridade de um indivíduo que pode determinar sua

posição social.

O cerne da questão agora passa a ser o indivíduo: sua formação e suas escolhas

causas da desigualdade e da pobreza, e não mais os problemas de distribuição do próprio

capitalismo. O que ocorre é uma inversão das causas que promovem a desigualdade entre os

indivíduos, tomando como fator explicativo os resultados sociais, ou seja, as posições reais

ocupadas pelos indivíduos. O pobre é responsável pela pobreza!

A defesa levada a cabo pela TCH é de o investimento na educação proporciona

uma real alternativa para se reverter as desigualdades sociais. Entretanto, não há reflexão

sobre o fato de que este critério educacional está com os objetivos voltados para disseminação

da competitividade e aumento dos ganhos econômicos. Não ocorre a reflexão sobre as

relações de classe, sobre o individualismo que fomenta e é fomentado pela desigualdade

econômica. Deste modo, não há como a educação sozinha ou de modo privilegiado, provocar

melhor distribuição de renda e maior equidade, se o próprio sistema capitalista se sustenta e se

fortalece com esta estrutura desigual e com o modelo de escola pautado na Teoria do Capital

Humano.

Percebemos um ajustamento da educação aos princípios neoliberais. Os lemas

acima citados de respeito ao outro e a tolerância são uma forma de esconder as diferenças

sociais existentes e manter uma situação harmônica com estes ideais. E para Bueno (2003, p.

87) “a esperança de que a modernidade reserva a todos a harmonia social e a busca do

consenso requer que lemas como “solidariedade” e “cooperação” sejam admissíveis apenas

quando estiverem restritos ao aumento da produtividade”.

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Esta qualidade total acaba sendo uma pregação à competitividade para gerar o

aumento da produtividade por que acaba passando a ideia de que esta qualidade pode

aumentar a oportunidade do indivíduo se desenvolver economicamente e diminuir a

desigualdade social. Percebemos nesta teoria e na fala do autor, um caráter totalmente

subjetivista, que acaba centrando no indivíduo a responsabilidade por sua condição.

A educação, neste contexto, se reveste dos conceitos de flexibilidade,

competitividade no ideário neoliberal e torna-se pragmática para servir as necessidades do

mercado. No contexto do neoliberalismo, a educação tem uma postura unidimensional que

acabam por legitimar e reduzir à educação em um ciclo de formação de indivíduos adequados

ao capitalismo e nega o contexto social na qual se dão as relações e a aquisição do saber que

ocorrem:

As características críticas e negativas da razão são anuladas pelo imperativo unidimensional do mercado, que rejeita modalidades de pensamento que possam sugerir a existência de contradições na realidade estabelecida, de forma a fazer, do ato de pensar, o mero favorecimento e reprodução da dominação (BUENO, 2003, p. 89).

Essa ideia neoliberal investida da tendência unidimensional tenta buscar a

conquista através da eficiência, qualidade e excelência e é apenas uma forma de mascarar e

passar a ideia de liberdade que cada indivíduo possui e por isso é responsável por seus atos e

por suas escolhas. Cada pessoa é livre, e ao receber esta educação de qualidade pode crescer

socialmente e assumir uma posição melhor, assim como observamos na Teoria do Capital

Humano e podemos ver isto em Bueno (2003, p. 107):

A educação é anulada em seu papel de gerar o pensamento dialético e de oposição, que poderia promover a liberdade entre os homens, justamente quando se prega a liberdade dos clientes em consumir mercadorias educacionais de qualidade

Podemos perceber então, segundo o autor Bueno (2003, p. 87) que,

Formar indivíduos eficientes, adequados às demandas do futuro perfeito que a qualidade total a todos reservaria, significa endossar o livre mercado como critério único para a definição dos horizontes educacionais.

Ou seja, prega-se o respeito pelo outro ser humano sabendo-se que no

neoliberalismo todos são considerados iguais. Iguais, mas, nem todos têm a mesma condição

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econômica e social. Todos têm direito a educação, mas não a mesma educação. Então se passa

a ideia de que se um indivíduo é pobre e que se não tem as mesmas condições de outros

indivíduos melhor situados socialmente, este deve respeitar os direitos do outro, deve tolerar a

diferença social existente e também negar as condições sociais existentes.

E nesta direção na qual a educação torna-se uma mercadoria “a relação entre

escola e país é puramente mercantil e que deve obedecer às leis do mercado e ser tomada

como qualquer outra relação de consumo” (CHAUÍ, 1999, p. 35).

Nos ideais do antigo liberalismo e no revestido Neoliberalismo, podemos

percebê-los nas teorias que influenciam a educação. Para Cunha (1980) “o individualismo é o

princípio que considera o indivíduo enquanto sujeito que deve ser respeitado por possuir

aptidões e talentos próprios, atualizados ou em potencial” (p.28).

E, neste princípio, o individualismo é valorizado por que a questão social e

posição social do indivíduo são colocadas como condição somente deste indivíduo, por seus

próprios méritos. Sendo assim, o indivíduo é o único responsável por seu fracasso ou por um

sucesso social.

Já o princípio da liberdade, utiliza a mesma questão e posição social para

combater os privilégios que são oferecidos para algumas pessoas em virtude de nascimento.

E, para Cunha (1980), “o princípio da liberdade presume que um indivíduo seja tão livre

quanto outro para atingir uma posição social vantajosa, em virtude de seus talentos e

aptidões” (p.29).

Ou seja, entramos no individualismo novamente, pois o indivíduo é livre e é

delegado a este e somente a este sua condição. Assim como analisamos na Teoria do Capital

Humano, o sucesso de um indivíduo e o progresso que este alcança, pode auxiliar o seu país a

se desenvolver e isto é condicionado pelo potencial do indivíduo e também pela escolarização

de cada um.

Podemos observar nestes pontos dos ideais do neoliberalismo, que a Teoria do

Capital Humano se mascara por trás destes princípios de liberdade e individualismo para

esconder as diferenças e a desigualdade entre as classes e esconder as reais causas da pobreza.

Percebemos no ideário neoliberal e na Teoria do Capital Humano o

reconhecimento das desigualdades sociais e o direito que uma pessoa mais talentosa tem ao

sobressair à outra. E Bueno (2003, p. 105) nos lembra que,

Embora os defensores da ideologia neoliberal apelem ao aperfeiçoamento constante do mundo, envolvido nos padrões da qualidade total e da

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excelência, o resultado concreto da realização de seus pressupostos evidencia a degradação cada vez maior da vida.

A Teoria do Capital Humano contém princípios intrínsecos no neoliberalismo,

no qual a questão da educação está intimamente ligada à posição social em que cada indivíduo

se encontra. Sendo assim, para Cunha (1980, p. 35) a educação,

Pretende contribuir para que haja justiça social, levando a sociedade a ser hierarquizada com base no mérito individual. Donde se conclui que a ascensão ou descensão social do indivíduo estará condicionada à sua educação, ao seu nível de instrução, e não mais ao nascimento ou à fortuna que dispõe.

Historicamente, o neoliberalismo surgiu como uma nova forma para solucionar

e tentar passar pela crise que o capitalismo passou na década de 70, devido ao esgotado

regime de acumulação. E, segundo Gentili (1995, p. 232):

Longe de resultar na opção “natural” a tal processo de recomposição, o neoliberalismo constitui sua expressão histórica dominante cuja funcionalidade consistirá, precisamente, em garantir o restabelecimento desta hegemonia.

E a questão da desigualdade, torna-se algo até certo modo útil para o

neoliberalismo, pois, para conseguir uma posição melhor e sair desta desigualdade as pessoas

devem se esforçar e competir mais. Neste ideário, a educação torna-se uma mercadoria e

então

O neoliberalismo precisa - em primeiro lugar, ainda que não unicamente – despolitizar a educação, dando-lhe um novo significado como mercadoria para garantir, assim, o triunfo de suas estratégias mercantilizantes e o necessário consenso em torno delas (GENTILI, 1995, p. 245).

A questão da qualidade da educação que vemos muito falar ultimamente figura

também como uma mercadoria, como uma propriedade a ser adquirida, pois,

A qualidade como propriedade supõe, em conseqüência, diferenciação interna no universo dos consumidores de educação (que em nossos países já não são todos), tanto como a legitimidade de excluir outros (as maiorias) de seu usufruto (GENTILI, 1995, p. 246).

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O objetivo é tornar os indivíduos mais competitivos, prontos para a

competitividade na sociedade atual, não para alcançarem um cargo mais alto e para ganharem

mais, mas, para servir de peças para se encaixarem nas demandas do capital. O que faz

valorizar ainda mais a individualidade.

Assim como as demais tendências acima vistas, o empreendedorismo também

quer fortalecer o individualismo e, com isso, responsabilizar o indivíduo por seu fracasso e

esconder a desigualdade social e suas reais motivações. O Empreendedorismo segue como

afirmamos, os pressupostos da Teoria do Capital Humano. Se um indivíduo não é bem

sucedido, se não possui boa posição social, é por sua responsabilidade, pois, segundo a Teoria

do Capital Humano há investimento na educação para todos e este é suficiente para que todos

possam empreender no cotidiano e, por meio da capacidade individual alcançar a benesses

sociais.

Revisitamos, pois a Teoria do Capital Humano no momento em que os ideais

do Empreendedorismo afirmam que o desenvolvimento da postura empreendedora nos alunos

irá contribuir para o crescimento individual e do país. Como notamos a seguir na postulação

de Villela (2005, p.14):

Além de oferecer oportunidade de realização pessoal, o Empreendedorismo estimula o aluno a criar uma consciência coletiva, pensando em seu preparo não apenas para obter uma vaga no mercado de trabalho, mas também para contribuir com o desenvolvimento do país. Um jovem inserido no ambiente empreendedor adquire competências técnicas, tornando-se um profissional mais preparado e participativo, com uma postura empreendedora

O Empreendedorismo tende a sustentar a postura individualista e estimular a

iniciativa privada. Com o objetivo de passar o ideário de que, se um indivíduo possui

autonomia para gerir e empreender suas ações, quando ele não faz, não é bem sucedido e deve

assumir a responsabilidade dos indivíduos pelo fracasso, pois este é livre em suas escolhas e

ações! Delors (1998, p. 100) disseminado teses hegemônicas sobre os fins da educação afirma

que esta:

Parece ter como papel essencial, conferir a todos os seres humanos a liberdade de pensamento, discernimento, sentimentos e imaginação de que necessitam para desenvolver os seus talentos e permanecerem, tanto quanto possível, donos do seu próprio destino.

De acordo com estas premissas, as pessoas podem ser donas de suas ações, de

seus pensamentos e são livres para agirem em sociedade e, obviamente, são responsáveis por

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sua condição social. Ou seja, os indivíduos possuem autonomia, visto que esta autonomia no

capitalismo determina seus “papéis sociais”.

Mais uma tendência que vemos surgir é o pós-modernismo, na qual a educação

torna-se um campo cultural e político de lutas pela hegemonia. O pós-modernismo toma os

ideais do neoliberalismo para si e age como resultado dessa doutrina e coloca a fragmentação

como sendo produto do real. E, nesta direção Chauí (1999, p. 49) afirma:

O pós – modernismo, aceita os efeitos do neoliberalismo, tomou-os como verdade única e última, renunciou aos conceitos modernos de racionalidade, liberdade, felicidade, justiça e utopia, mergulhando no instante presente como tempo único e último.

E para o autor Silva (1993), “com o predomínio dos temas pós-modernos, a

preocupação com o conteúdo e a natureza do conhecimento veiculado pelas instituições

educacionais volta com renovada e transformada ênfase” (p.125).

O pós - modernismo é uma visão ou um resumo das condições sociais,

culturais de nossa época provocados pelo capitalismo e pelas novas tecnologias, ou seja, é um

reflexo dos sentimentos e pensamentos do que estamos vivendo e este “rejeita essa noção de

uma consciência unitária, auto-idêntica, auto-reflexiva, racional, homogênea, centrada,

determinada por certas dinâmicas centrais” (SILVA, 1993, p. 129).

O pós-modernismo valoriza a subjetividade que é vista de forma fragmentada e

também descentrada e como o resultado de diversas determinações e, por isso, a consciência

seria sempre parcial e incompleta. E, assim sendo, dependendo da determinação, a

consciência pode ter dois estados. Segundo Silva (1993, p. 129)

De um lado, teríamos o sujeito alienado, inconsciente das determinações sociais de sua alienação, preso às ilusões da ideologia dominante. De outro, o sujeito consciente, lúcido em relação à determinação externa de sua vida e destino social.

O pós-modernismo acaba tendo um caráter mascarador da realidade, pois esta

linha de pensamento torna-se útil ao capitalismo que não quer ver as verdadeiras relações

sociais reveladas. O pensamento pós-moderno une-se ao ideário neoliberal.

Ao afirmar que as antigas idéias de razão, universalidade, consciência, liberdade, sentido da história, luta de classes, justiça, responsabilidade e que as distinções entre natureza e cultura, público e privado, ciência e técnica, subjetividade e objetividade perderam a validade, passa a afirmar como

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realidades únicas e últimas a superfície veloz do aparecer social, a intimidade e a privacidade narcísicas, expostas publicamente sob a forma de propaganda e da publicidade, a competição e a vitória individual a qualquer preço (CHAUÍ, 1999, p. 48).

Segundo Harvey (2007, p. 66), o pós-modernismo

Procurou satisfazer da melhor maneira possível em forma de mercadoria, outros sugerem que o capitalismo, para manter seus mercados, se viu forçado a produzir desejos e, portanto, estimular sensibilidades individuais para criar uma nova estética que superasse e se opusesse às formas tradicionais de alta cultura

O pós-modernismo é tido como a manifestação de um mundo sem estabilidade,

onde o conhecimento constantemente se transforma. É o resultado de novas criações e novas

organizações sociais.

O pós – modernismo quer que aceitemos as reificações e partições, celebrando a atividade de mascaramento e de simulação, todos os fetichismos de localidade, de lugar ou de grupo social, enquanto nega o tipo de metateoria capaz de apreender os processos político-econômicos (HARVEY, 2007, p. 112).

Ou seja, o pós-modernismo também opera como uma maneira de perpetuar os

ideais capitalistas, quando age de forma parcial impedindo a conscientização de alguns fatos

sociais, pois atua de forma insegura e violenta regida pelas leis de mercado e também

fragmentando as relações sociais. Neste sentido:

Pode ter também conseqüências agressivas e conservadoras quando essa desconfiança em relação aos discursos e ao caráter ilusório de todos os discursos nos impede de fazer uma crítica de estruturas sociais que são bem reais e concretas e que tem efeitos concretos e reais sobre as vidas das pessoas e de grupos (SILVA, 1993, p.135).

Como percebemos, várias tendências surgem com o objetivo de vincular a

educação ao desenvolvimento econômico com o anseio de manter o sistema atual, para isso

mascara as relações sociais injustas e levam a educação a distorcer as reais condições nas

quais nos encontramos.

Há teorias que passaram por mudanças e se revestiram de novos ideais. É o

caso do empreendedorismo e do neoliberalismo. Porém, todas continuam com o mesmo viés,

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de adaptar a educação e acabam por perpetuar os ideais e interesses de uma pequena minoria e

consolidar o crescimento do capitalismo.

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CONCLUSÃO

Após as leituras e reflexão sobre a situação da educação atual, seu caráter

adaptativo ao sistema vigente e após as discussões levantadas no presente trabalho, nos

propomos lembrar que este papel da educação atrelada aos interesses econômicos do capital,

leva à perpetuação do sistema capitalista, cujo poder está em poucas mãos.

Este trabalho tentou mostrar no primeiro capítulo que a Teoria do Capital

Humano tem um caráter de mascaramento da realidade, que deposita na educação a chave

para o desenvolvimento econômico de uma pessoa e de uma nação. Porém, como foi

mostrado, esta teoria esconde as relações existentes e fortalece o individualismo e a

competitividade desenfreada. O segundo capítulo tratou do papel que as agências multilaterais

desempenham na educação e quais objetivos estas traçam para o âmbito educacional. Já o

terceiro capítulo teceu uma crítica as tendências pedagógicas que se vinculam aos ideais

neoliberais/ pós-modernos e acabam por penalizar o indivíduo por sua condição e põe a

educação como redentora de todos os males sociais.

As teorias educacionais fomentam e articulam a educação para que sirva à

manutenção do status quo e forme o tipo ideal de homem para este fim. Faz-se necessário,

portanto, levantar as críticas necessárias para que este ciclo de subserviência se rompa.

Para Saviani (2000) é preciso pensar uma educação que busque refletir

criticamente as relações sociais e romper com os mecanismos de adaptação. Assim, “o papel

de uma teoria crítica da educação é dar substância concreta a essa bandeira de luta de modo a

evitar que ela seja apropriada e articulada com os interesses dominantes” (p.30).

Temos que questionar as teorias e práticas que mascaram os propósitos

efetivados pela educação escolar. Temos que buscar os fundamentos de uma escola que leve

os alunos a perceberam a estrutura e funcionamento da sociedade capitalista, tendo então

condições de alterá-la.

A escola tem se constituído em uma instituição reprodutora das relações

sociais de produção, geralmente é usada como mediadora dos interesses do capitalismo.

Saviani (2000, p. 96) nos lembra que deve haver “a possibilidade de se articular uma proposta

pedagógica cujo ponto de referência, cujo compromisso seja a transformação da sociedade e

não sua manutenção, a sua perpetuação”

A educação tem sido influenciada pelos padrões do 'mercado', centra seus

princípios e práticas na racionalidade mercantil, produtividade, competitividade e

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flexibilidade. Ajusta-se aos padrões da “condição pós-moderna”, motivada por valores

midiáticos e por ideais de mistificação da realidade e assim, surge a busca por uma proposta

de educação escolar que reflita a atual situação e proponha uma ruptura visando uma

educação que alcance a todos. O papel dos pedagogos é fundamental neste processo.

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