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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO DORACI CORRÊA DE MELLO NEVES CAMINHOS DO OLHAR CAMPINAS 2005

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DORACI CORRÊA DE MELLO NEVES

CAMINHOS DO OLHAR

CAMPINAS 2005

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DORACI CORRÊA DE MELLO NEVES

CAMINHOS DO OLHAR

Memorial apresentado ao Curso de Pedagogia – Programa Especial para Formação de Professores em Exercício da Região Metropolitana de Campinas, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas, como um dos pré­requisitos para conclusão da Licenciatura em Pedagogia.

CAMPINAS 2005

SUMÁRIO

1. APRESENTAÇÃO..................................................................................................2

2. COMO TUDO COMEÇOU.....................................................................................4 3. INÍCIO DE CARREIRA...........................................................................................8

4. O PROESF ADIANTOU MEU PLANOS...............................................................14

5. CONCLUSÃO.......................................................................................................29

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................31

AGRADECIMENTOS

“O valor das coisas não está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.” (Fernando Pessoa)

A DEUS, pela força.

Meu esposo Joel.

Meus filhos Raquel e Gabriel pelo incentivo, paciência e compreensão durante anos de ausência.

Aos organizadores do PROESF pelo esforço e dedicação em criar um curso tão especial e único.

Aos colegas de grupo pela compreensão, amizade e solidariedade.

A todos muito obrigado!

1

“Passado. Aquilo que já se foi, mas persiste em estar presente nas lembranças guardadas em nossa mente, desde a mais remota infância.

Época que desperta saudades, de poder reviver detalhes, encontros e casualidades

de grande felicidade. Para outros, que a borracha apague as tristezas e frustrações que esse tempo produziu, mas, por favor, eu peço, não permita que se esqueçam das lições

que ele deixou. Passado, são raízes fincadas no da

existência, espaço livre e inabalável para quem nasceu, cresceu e alegria ofereceu. Não fosse o passado eu jamais seria, não

fosse ele eu jamais teria, do que falar, do que sentir e do que compartilhar.

Meu passado, minha escola, meu mestre e minha história.

(Gilberto F. Coelho)

2

APRESENTAÇÃO

Este memorial relata algumas recordações da minha infância, o desejo

de estudar, como era a escola naquele tempo.

Conto o motivo que me levou a ser professora e as diferentes

experiências que tive , que me levaram a optar pela educação infantil, trabalhando

com crianças da faixa etária entre um e seis anos, desde 1995.

Sobre a importância da formação continuada, mas acima de tudo, da

reflexão­ação sobre minha prática, estando aberta a nova idéias, avançando

sempre, porém tendo segurança e confiança no método com o qual estou

trabalhando.

Escrevo que para mim, o que ficou mais forte no decorrer deste curso,

foi a importância do olhar, pois tudo que vemos não é o que parece, depende do

ângulo de onde olhamos.

“Pensar é menos importante que saber, mas é menos interessante que olhar.” (Goethe)

3

“Conhecer o passado para entender o presente e transformar o futuro”

4

1 – COMO TUDO COMEÇOU.

Minha história começa no dia vinte e cinco de setembro de mil

novecentos e setenta e três, tornando­me a quarta filha de meus pais, que dois

anos depois tiveram o último filho, ficando com três meninos e duas meninas.

Meu pai faleceu quando eu tinha quatro anos, ficando a

responsabilidade de nos criar e educar apenas para minha mãe, que conseguiu

cumprir sua missão com êxito, trabalhando como bóia­fria, lavadeira e doméstica.

Recebemos uma educação bastante rígida, com limites claros de até

onde podíamos chegar. Hoje minha mãe sempre diz que tem muito orgulho dos

filhos, pois todos estão bem encaminhados na vida, lembrando que na escola nunca

recebeu reclamação de nenhum dos filhos.

Minha irmã e meus dois irmãos mais velhos começaram a trabalhar

muito cedo, precisando conciliar o trabalho com a escola. Devido ao trabalho, um

deles deixou os estudos na quinta série e nunca mais voltou; o outro concluiu o

segundo grau na firma onde trabalha. Meu irmão caçula concluiu o segundo grau,

minha irmã fez o Magistério e hoje faz o Proesf junto comigo.

Quando criança, meu grande sonho era ir para a escola e foi com muita

alegria que finalmente pude ir estudar na Escola Estadual de Primeiro Grau Prof.

Manoel Teixeira Júnior. Minha professora tinha um nome diferente , jamais conheci

outra pessoa com o mesmo nome: Docha. Ela era enérgica, porém carinhosa. Usei

cartilha “Caminho Suave”, que meus irmãos usaram anteriormente. Antes da

cartilha, vinham os exercícios de coordenação motora para “amolecer a mão” (onda

5

vai, onda vem). Lembro­me que os desenhos ajudavam­me a decorar a lição e

percebendo isso, a professora sempre os cobria para eu não vê­los e ler sozinha.

Na segunda série, o que me marcou foram os castigos para quem não

trouxesse a lição de casa. Como gostava de estudar, para mim a lição de casa não

era uma obrigação, mas um prazer e porisso nunca deixei de fazer as tarefas.

As professoras da terceira e quarta série eram calmas e carinhosas.

Hoje, percebo que naquela época as classes eram divididas de acordo

com o nível cultural e econômico dos alunos, existindo classes de alunos ricos e

pobres, sendo que na própria sala havia divisão de alunos bons, médios e fracos e

estes tinham conhecimento da sua condição (bom, médio ou fraco). Sempre fiz parte

da classe dos pobres.

Acredito que a série que mais me marcou, foi a quinta série, pois é a

que mais recordo. A mudança brusca de professores, de um passamos para sete,

cada um muito diferente do outro. Nas aulas de Inglês, tínhamos que ficar de pé até

a professora entrar e sentar. Hoje entendo o motivo pelo qual o professor de

Educação Artística dava trabalhos diferentes para suas duas turmas de quinta

série: enquanto minha turma só fazia trabalhos com lápis e papel, a outra sala fazia

bonequinhos com copinhos de “Yakult” e outra atividades que achávamos

interessante. Certo dia um colega questionou o porquê de não fazermos as mesmas

coisas e o professor não respondeu. Na minha inocência de criança, não via o que

hoje vejo, ou seja, o nível econômico muitas vezes determina o que a criança vai

aprender.

A partir da sexta série, passei a estudar na classe dos ricos, não por ter

mudado minha condição econômica, mas por ser a única da quinta série C a ir para

o período da manhã, enquanto alguns permaneceram a tarde, reprovaram ou foram

6

estudar à noite para trabalhar durante o dia e consequentemente logo deixaram a

escola (não sei se voltaram depois). Poucos conseguiram terminar a oitava série

sem reprovar nenhum ano e não sei se algum conseguiu fazer uma faculdade,

porém da turma com a qual estudei da sexta à oitava série, poucos não fizeram

faculdade , mostrando que “a herança cultural, que difere sob dois aspectos,

segundo a classe social é a responsável pela diferença inicial das crianças diante

da experiência escolar e, consequentemente, pelas taxas de êxitos (Bordieu, 2001 –

p.42).

Terminado o antigo ginásio, tive que mudar de escola, pois a anterior

só atendia o primeiro grau. Com a mudança, tive que optar entre Contabilidade e

Magistério, ficando com a última opção.

Hoje vejo que o que aprendi no Magistério já está ultrapassado, dessa

época ficou apenas a lembrança das amizades, dos estágios e de uma aula prática,

quando por uma brincadeira de uma colega a professora me tirou um ponto na nota.

Dos que fizeram o Magistério comigo, poucos seguiram a carreira; a maioria seguiu

rumos bem diferentes.

Concluí o Magistério em mil, novecentos e noventa e um, na Escola

Estadual de Primeiro e Segundo Grau Prof. “Joel Aguiar”, na cidade de Pacaembu.

No ano seguinte deixei minha cidade e seguindo os passos de minha irmã e irmãos,

vim morar em Santa Bárbara d’Oeste.

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“Os fracassos nos ensinam em que ponto devemos melhorar”

(autor anônimo)

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2­ INÍCIO DE CARREIRA

Minha primeira experiência docente foi como professora eventual na

Escola Estadual Joaquim Rodrigues Azenha, em Nova Odessa, na mesma escola

onde minha irmã já lecionava.

Em agosto de mil, novecentos e noventa e três, comecei como

estagiária na Escola Estadual de Primeiro Grau Professora Guiomar Dias Valente,

substituindo professoras de primeira a quarta série, tendo assim oportunidade de

conhecer as diferentes séries.

A escola funcionava em quatro períodos: das 7:00 às 11:00; das 11:00

às 15:00, das 15:00 às 19:00 e das 19:00 às 23:00 horas.

Na época havia a divisão entre classes fortes e fracas, ficando as

melhores com os professores efetivos (Estado) ou com maior pontuação e para os

mais novos ficavam as fracas. Foi em uma dessas que tive minha primeira

experiência com a alfabetização, pois a professora da sala estava grávida e faltava

muito, pois era uma gravidez arriscada. Foi uma experiência difícil, porém

gratificante, pois os alunos estavam bastante atrasados, além de ser uma classe

“fraca”, foram bastante prejudicados com as constantes faltas da professora. Como

estava começando, não sabia nada, fiquei perdida e fui pedir ajuda a uma das

professora que me indicou uma outra colega que tinha uma classe fraca também,

pois a dela era mais adiantada. A outra professora me deu algumas orientações e

comecei a trabalhar com a cartilha, a partir de onde a antiga professora havia

parado. A grande maioria da classe sabia ler palavras simples, mas como não

haviam concluído a cartilha continuaram a segunda série em uma classe fraca. No

9

ano seguinte (1994) ficou uma classe sem professor na escola, então como

estagiária tive que dar aula, até que a classe fosse atribuída na Delegacia de ensino.

Foi uma experiência que jamais esquecerei.

A classe era formada por crianças que davam “problemas” em outras

salas, tanto de comportamento quanto de rendimento. Foi difícil trabalhar com eles,

principalmente por ter pouquíssima experiência. Jamais esquecerei uma menininha

extremamente inteligente, que se expressava bem, mas tinha dificuldades para ler e

não sabia fazer cálculos matemáticos, nem os mais simples. Devagar fui ensinando­

a até que aprendeu. Passado alguns anos, a encontrei na rua e fiquei muito feliz

pois ela disse “Olha mãe, a professora que me ensinou a fazer continha.”

Trabalhei com eles até abril e não desejo para ninguém uma classe

com tantos “problemas” como aquela.

Como todos tinham algum tipo de dificuldade, a auto­estima e

confiança era baixa, pois todos tinham conhecimento que estavam em uma classe

“problema”!

Por mais que me esforçasse, os resultados não eram bons, os

progressos eram mínimos, tornando o trabalho muito desgastante fisicamente e

mentalmente.

Creio que esse tipo de divisão de classes não permite que haja troca

de experiências e aprendizagem entre as próprias crianças, pois conscientes de sua

“rotulação” perdem a vontade de aprender, tornando­se apáticos ou indisciplinados,

fazendo com que a superação de suas dificuldades se torne ainda mais difícil.

Com essa classe aprendi a valorizar o mínimo progresso da criança,

incentivando­a com verdade, mostrando­lhe que é capaz, transmitindo­lhe confiança

e mostrando que acredito verdadeiramente no seu potencial.

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No final de mil, novecentos e noventa e quatro, prestei concurso e

comecei a trabalhar na Prefeitura de Santa Bárbara d’Oeste no dia vinte de

fevereiro de mil, novecentos e noventa e cinco. Os primeiros meses foram

substituindo os professores que faltavam e em agosto assumi minha primeira

classe. Eram crianças com idade entre três e quatro anos, sendo a atividade

favorita da classe o desfile, onde colocavam roupas e calçados de adultos

(existentes na sala) e desfilavam para que a classe escolhesse o mais bonito.

Em mil, novecentos e noventa e seis comecei a trabalhar com uma

turma na faixa etária entre quatro e cinco anos. Esse ano foi um ano de erros e

acertos: lembro me que sentia falta de algo que me orientasse, para que as

atividades não fossem “soltas”, pois cada dia eu dava uma atividade, mas elas não

tinham relação uma com a outra, por exemplo, hoje eu dava uma atividade sobre

meios de comunicação, amanhã sobre meios de transportes e assim passou o ano.

Só no ano seguinte percebi a utilidade do planejamento que fazíamos no inicio do

ano letivo pois ainda não tinha a visão que “O planejamento na escola é um

processo permanente que implica ainda a avaliação constante de seu

desenvolvimento. Planeja­se para alcançar objetivos que ainda não foram

alcançados.” (Gadotti, 2003 – p.36)

Foi muito difícil trabalhar com essa classe. Somado a minha falta de

experiência, havia o excesso de alunos (31 quando a capacidade era para 24

alunos) e a indisciplina da classe. As crianças não paravam sentadas, subiam em

mesas, derrubavam cadeiras e brigavam muito. Para ouvirem­me tinha que gritar o

tempo todo.

11

Com o correr dos dias, percebi que o aluno mais indisciplinado era

muito esperto e inteligente conseguindo executar pequenas tarefas com rapidez e

demonstrando prazer em me ajudar.

Resolvi explorar suas qualidades dando­lhe a responsabilidade de ser

meu ajudante e todos os dias escolher um coleguinha diferente para ajudá­lo.

Creio que acertei em estabelecer essa relação de confiança e

afetividade com ele, pois durante os meses que estive afastada, devido minha

licença maternidade (maio à 3 de setembro), seu comportamento piorou, chegando

a bater na professora que me substituiu.

Quando voltei da licença maternidade restabeleci com meu aluno

nosso “contrato” e seu comportamento voltou a melhorar. Acredito que ao ressaltar

as qualidades, enxergando o lado bom que havia por trás da indisciplina, consegui

criar um elo afetivo muito forte com ele, tornando­o meu aliado, o que tornava meu

trabalho com as demais crianças, um pouco mais fácil.

Nas aulas de Currículo pude perceber que minha atitude , segundo

Rogers (1972, p.109), foram baseadas no apreço, aceitação e confiança de que

essa pessoa é fundamentalmente merecedora de crédito... “O que estamos

descrevendo é o apreço pelo aprendiz como ser humano imperfeito, dotado de

muitos sentimento, muitas potencialidades”.

Desde em meu ingresso na Prefeitura sempre trabalhei com dois

períodos, com crianças na faixa etária entre quatro e seis anos, as diferentes

situações do dia­a­dia, me mostravam que precisava aprender mais, saber mais

para melhor lidar com situações conflitantes, que no Magistério não aprendi ou já

havia esquecido e que se fazia importante relembrar.

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Sentia a necessidade de algo mais, sentia a curiosidade que Paulo

Freire (1996, p. 95) cita “sem a curiosidade que me move, que me insere na busca,

não “aprendo” nem “ensino”, mas por questões financeiras mantive a curiosidade

“guardada”, participando apenas das capacitações oferecidas pela Secretaria

Municipal de Educação.

Os comentários que até dois mil e seis, todo professor precisaria ter

habilitação em Pedagogia para continuar lecionando ou seria dispensado, provocou

uma grande procura pelos cursos de graduação, como ainda não tinha condições de

cursar uma faculdade, junto com meu esposo tracei algumas metas, cuja ordem foi

determinada pelo fator econômico: construir nossa casa, dar um irmão para a

Raquel e quando ele estivesse maiorzinho, iniciaria a faculdade planejada para

começar no ano de dois mil e cinco.

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“Sabe que não acredito que alguém jamais tenha ensinado alguma coisa a outro. Duvido da eficácia do ensino. A única coisa que sei é que quem

quiser aprender, aprenderá. E talvez o educador seja um fatorque facilite, uma pessoa que aprenda as coisas e mostre

aos outros como é empolgante e maravilhoso e os convidem a provarem”

(Carl Rogers)

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3­ O PROESF ADIANTOU MEUS PLANOS.

Tudo corria como planejado, em mil, novecentos e noventa e nove

começamos nossa casa; em dois mil o Gabriel nasceu, até que em dois mil e dois

minha coordenadora deu a notícia do convênio entre as prefeituras da região

metropolitana e a Unicamp. Foi tudo muito rápido: a inscrição, a prova e em agosto

iniciei o Proesf.

Lembro­me que quando soube do vestibular falei: “Vou prestar quantos

tiverem, assim ninguém vai dizer que não quis estudar”.

Fiz a prova que por sinal achei muito difícil, sem esperança de passar e

na verdade não queria passar; não naquele momento. Por isso quando soube que

passei, não sabia se ria ou chorava, se ficava feliz ou triste. Se por um lado era a

oportunidade de estudar, de ter meu diploma, por outro, estudando a noite e

trabalhando o dia inteiro, meus filhos pequenos (seis e dois anos) ficariam a maior

parte do tempo sem mim.

O apoio do meu esposo foi fundamental, pois sempre me incentivou a

estudar e durante todo primeiro semestre ele só vinha para casa com as crianças,

que na época ficavam com uma vizinha, depois que eu havia saído para a

faculdade, pois para mim era mais fácil não vê­los, do que ouvi­los chorar pedindo

para eu não ir.

Do segundo ao quinto semestre via­os pela manhã ao acordá­los e a

tarde entre a chegada do trabalho e a saída para a faculdade.

No sexto semestre estou trabalhando de manhã, ficando com meus

filhos no período da tarde.

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Não ficar com a família, a falta de tempo para as leituras e o sono

foram as maiores dificuldades que enfrentei durante o curso, mas foi muito bom,

cresci mais como pessoa e como profissional. A disciplina de Multiculturalismo me

ajudou a ver as coisas de outra forma, a enxergar por entrelinhas a ter e manter

minha opinião mesmo sendo diferente do outro.

Antes do curso meu lema era “se mandar ir eu vou, se mandar ficar eu

fico”. Como dizia minha mãe: “é melhor engolir do que cuspir”, porisso sempre

engoli, para mim tudo estava bom, sempre abaixei a cabeça e fiquei quieta, assim

nunca causei, nem tive “problemas”.

Hoje já não consigo “engolir” tão fácil sem argumentar e questionar,

não posso me acomodar e esquecer que o mundo gira a todo instante, que a certeza

de ontem é a dúvida de hoje, que tudo que aprendemos a dez anos atrás, já está

ultrapassado, mas também não posso embarcar em “modismos pedagógicos”, sem

a devida reflexão, sem ter certeza do que estou fazendo. “ É pensando criticamente

a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática” (Freire, 1996

– p.43).

Como ninguém ensina o que não sabe, preciso me aventurar a

aprender sempre mais e essa deveria ser a função da nossa formação continuada,

capacitações, formação em serviço e outros termos que na teoria visam melhorar a

qualidade da educação, mas que na realidade muitas vezes não acrescentam quase

nada pois muitas reformas educacionais são formuladas por economistas para ser

implementadas por educadores, não havendo a participação dos professores e

impostas de cima para baixo.

A formação do professor é uma exigência da L.D.B. (art. 87 da Lei n.º

9394/96 ), sendo a “apoiada” pela Unesco e Banco Mundial.

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Segundo Vieira (2002, p.36), “as iniciativas de política educacional

desenvolvidas com recursos do Banco Mundial vão desde construções e reformas

até financiamento de sistema de avaliação com Saeb 1 com objetivo de apoiar o

Brasil a reduzir a pobreza e aumentar a escolaridade do pobre.”

Em todo o Brasil são financiados projetos educacionais, sendo o

Fundescola (Fundo de Fortalecimento da Escola) a “maior” atividade financiada pelo

banco na área de educação. Financiam também projetos de formação como:

Programa de Formação de Professores em Exercício (Proformação), Programa de

Gestão da Aprendizagem Escolar (Gestar), Formação de gestores como o caso do

programa de apoio aos secretários de educação (Prasem).

Como o Banco investe dinheiro em projetos educacionais, os

economistas formulam reformas que não consideram as diferenças sociais e

culturais entre os povos. “Técnicos do Banco Mundial que assessoram projetos

brasileiros, por exemplo, não raro subscrevem sem constrangimento “receitas”

adotadas nos países da África Subsaariana para realidades complexas como a

nossa.” (Vieira, 2002 – p.41)

Esquecem­se que os professores não são apenas reprodutores de

idéias; que cada um já possui uma bagagem de conhecimentos adquiridos ao longo

de toda sua vida profissional; que apesar de possuir estruturas semelhantes cada

escola é diferente, pois recebem grupos de alunos com condições econômicas e

culturais diferentes, portanto os resultados obtidos nas propostas nunca serão

iguais, quando submetidos à prática , algumas alterações serão necessárias,

adaptando a proposta a realidade em que a escola está inserida.

1 Saeb ­ Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica

17

Não se pode acreditar em que uma ruptura total das práticas usuais

possam ser facilmente substituídas por novas propostas. As alterações de prática

acontecem ao longo de toda vida do professor, infiltrando­se nos procedimentos

anteriores, sofrendo ajustes, sendo testadas e confrontadas com a realidade

diariamente.

Creio que as propostas de melhoria da qualidade da educação,

incentivadas pelo Banco Mundial, perdem sua eficácia ao desconsiderar a

participação dos professores nas discussões e definições de políticas educativas,

restando aos educadores apenas executar propostas formuladas por economistas

que desconhecem o universo educacional.

Segundo Candau (1999, p.37)

“O banco prioriza em suas recomendações e conclusões, investimentos nos seguintes aspectos: aumento do tempo de instrução, por meio da ampliação do ano escolar, da flexibilização e adequação de horários; reforço do dever de casa; oferta de livros didáticos, considerados expressão operativa do currículo e elementos compensadores dos baixos níveis de formação docente; melhoria dos conhecimentos dos professores, privilegiando­ se a formação continuada em detrimento da formação inicial, e estimulando­se os sistemas de educação à distância.”

A meu ver o banco acaba incentivando a desqualificação do professor

ao considerar o livro didático como elemento compensador dos baixos níveis de

formação docente. Como vimos na faculdade, quando analisamos os livros didáticos

com a professora Ernesta Zamboni, os mesmos são uma excelente forma de manter

uma ideologia dominante, passando através de imagens e textos uma sociedade

irreal. Não que o professor não deva utilizar o livro didático, mas utilizá­lo de forma

criativa, contextualizando com a realidade a qual sua escola está inserida.

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Acredito que a formação inicial é a base de todo profissional, por isso

ela deve ser sólida, sendo “ o momento chave da construção de uma socialização

e de uma identidade profissional (Scheibe, 2002 – p.55); ao se privilegiar a

formação continuada corre­se o risco de ter um professor duplamente

desqualificado, pois as atuais políticas educacionais não garantem uma formação de

qualidade, por não dar ao agente principal da formação o direito de participar, de

opinar sobre sua própria formação. “Professores são silenciados por políticas que

não levam em conta as condições reais do trabalho docente.” (Bueno, 2002 – p.189)

Assim como o Banco Mundial, a L.D.B. (art. 87 da Lei 9394/96)

também estimula o sistema de ensino à distância, que ao meu ver, é uma formação

deficiente, trazendo menor conhecimento ao professor, pois não permitem a troca

de experiência, esclarecimentos de dúvidas e socialização entre os professores em

formação, como pude vivenciar no Proesf é muito importante para o crescimento

profissional do educador, essa troca de experiência.

Com certeza é um sistema de formação em massa econômica, porém

a vantagem fica apenas no lado financeiro, a qualidade da formação é bem menor.

Confirmando minha fala, minha diretora Maria das Dores Pinheiro, ao terminar seu

curso de Psicopedagogia pelo Instituto IESDE relatou: “Eu aprendi muito, mas

acho que aprenderia mais com um professor presente; as aulas eram muito rápidas

e não havia tempo para as discussões.”

“Para o banco, investimentos: em infra­estrutura, laboratórios, salário

dos professores, e quantidade de alunos são desestimulados.” (Candau,1999 –

p.37)

Acredito que o banco desestimula investimentos nas áreas mais

importantes para se atingir uma educação de qualidade a ser oferecida ao aluno.

19

Devido aos baixos salários o professor precisa trabalha em duas ou mais escolas,

consequentemente a qualidade de seu trabalho cai, pois ele está cansado

fisicamente e mentalmente, com jornadas desgastantes de trabalho, sem tempo

para a família, lazer e para seu próprio aperfeiçoamento profissional. Os baixos

salários dificultam a aquisição de materiais didáticos e a participação em cursos de

formação que ajudam o professor a melhorar sua prática.

De acordo com Vieira (2002, p. 25),

“O fenômeno dos baixos salários e da conseqüente evasão de pessoal qualificado afeta tanto países desenvolvidos como aqueles em desenvolvimento. Do ponto de vista individual, os professores vêem­se diante de impossibilidades materiais de atualização. O acesso à Internet ainda é privilégio de poucos. Os cursos de formação, não raro, passam ao largo das necessidades reais das escolas onde atuam. Na rede privada, deparam­se com alunos com possibilidades de acesso e bens culturais que ultrapassam as suas. Na rede pública, a carência cultural é limitadora de suas possibilidades de intervenção.”

A grande quantidade de alunos por turma não permite que o professor

dê à todos atendimento individual, por mais que o professor faça capacitações e

cursos; aplicar na prática o que aprendeu é difícil, pois como os alunos são muitos e

com diferentes dificuldades, atender a todos de forma satisfatória, torna­se quase

impossível.

Creio que a ausência de participação dos educadores na elaboração

de políticas educacionais, a desconsideração da experiência do professor e o

desrespeito às diferenças sociais e culturais do país, permite que as políticas

educacionais que visam a melhoria da qualidade da educação fiquem apenas no

papel.

20

“Talvez este seja o primeiro e maior dos desafios a serem enfrentados:

como retirar o professor da condição de eterno excluído dos processos de inovações

educacionais”. (Amaral, 1988 – p.52)

Cada pessoa possui idéias diferentes quando o tema é: Como melhorar

a formação? A seguir, destaco como alguns autores pensam a respeito do assunto.

Para Giroux e McLarem (1999), três fatores são fundamentais. O

primeiro deles seria analisar as escolas em suas particularidades históricas e

relacionais; segundo, valorizar e absorver as linguagens que os alunos trazem para

as escolas e o terceiro e último, refletir sobre os valores, as ideologias e os

princípios estruturais que dão sentido às histórias, à cultura e as subjetividades do

cotidiano escolar.

Para Bueno (2002), percebe­se a necessidade de uma formação de

professores integrando aspectos pessoais, organizacionais, coletivos e pedagógicos,

uma formação orientada pela reflexão sobre o vivido, pela interpretação teórica da

prática, pela partilha coletiva, pelo rompimento com os esquemas tradicionais

curriculares, valorizando­se a transdisciplinariedade e conhecendo­se e discutindo­

se experiências curriculares inovadoras para a formação de professores,

desenvolvidas tanto no Brasil como no exterior.

Para Benassuly (2002), as Secretarias de Educação precisam

reformular a concepção de educação permanente de seus professores e pensar

esse processo vinculado à construção do conhecimento para além de oficinas

tarefeiras.

Para Perrenoud (2000, p.58), o professor deve saber administrar sua

própria formação contínua, sabendo explicitar as próprias práticas, estabelecendo

seu próprio balanço de competências e seu programa pessoal de formação

21

contínua; negociando um projeto de formação comum com os colegas (equipe,

escola, rede); envolvendo­se em tarefas em escala de uma ordem de ensino ou

ensino educativo; acolhendo a formação dos colegas e participando dela.

Em minha concepção, é importante que haja a participação dos

professores na elaboração das políticas educacionais que visam a melhoria da

qualidade da formação dos professores, e melhoria da educação. É preciso que haja

uma junção de todos os elementos acima, pois todos são importantes. Os

professores precisam ter atitude reflexiva sobre os novos conhecimentos e inseri­los

ou não à sua prática pedagógica; mas esse inserir ou não, não depende apenas do

professor, muitas vezes o professor precisa moldar­se aos modelos propostos, nem

sempre ele têm autonomia para utilizar os métodos que acredita serem mais

eficientes.

A formação continuada não pode ser vista como algo, que sozinha,

garante a melhoria e a qualidade da educação, não devendo ser encarada como

instrumento para suprir deficiência ou como complemento da formação inicial, mas

como desenvolvimento profissional que acompanhe o professor durante toda sua

trajetória profissional.

No mundo globalizado que vivemos hoje, as mudanças são constantes

e o professor não pode parar no tempo e achar que pode trabalhar do mesmo modo

que começou. É preciso estar sempre se atualizando, tendo uma atitude reflexiva,

procurando sempre onde pode melhorar sua prática educativa.

“Formar­se não é – como uma visão burocrática poderia, às vezes,

fazer crer – fazer cursos (mesmo ativamente); é aprender, é mudar, a partir de

diversos procedimentos pessoais e coletivos de autoformação.” (Perrenoud, 2000 –

p.160)

22

Como aluna em mil, novecentos e oitenta e sete, vivi uma dessas

inovações educacionais. Estava na oitava série quando a professora de português, a

partir do nada começou a pedir que sentássemos em grupos. A professora

explicava a matéria, fazíamos os exercícios do livro em grupo, porém ela não

corrigia mais (só as provas) , se estivessem errados, tínhamos que encontrar as

respostas sozinhos. A diferença entre “ por acaso” e “ao acaso”, descobri muito

tempo depois, pois quando a professora corrigiu minhas frases com as palavras

citadas acima, disse que estava errado mas nunca me mostrou o certo.

Hoje vejo que esse foi o início do construtivismo, percebo que minha

professora estava tão “perdida” quanto eu, pois pedir para trabalhar em grupos e

não corrigir os erros, não significa deixar de usar o método tradicional e ser

construtivista. Como Coll (2002, p. 137) diz,

Numa perspectiva construtivista, a finalidade última da intervenção pedagógica é contribuir para que o aluno desenvolva a capacidade de realizar aprendizagens significativas por si mesmo numa ampla gama de situações e circunstâncias, que o aluno ‘aprenda a aprender’. “ (Coll, 2002 – p.137)

Creio que minha professora também foi vítima dos “modernismos

pedagógicos” que muitas vezes aplicamos na classe sem a devida reflexão­ação­

reflexão e acabamos tendo atitudes equivocadas por não conhecer totalmente o

método aplicado.

Acredito que nenhuma mudança metodológica aconteça sem mudança

da postura do professor e isso não acontece da noite para o dia, sem reflexão sobre

sua própria prática, buscando em que ponto pode melhorar, em que ponto o “novo”

pode ser incorporado à sua prática docente. Isso deve ser um processo constante,

23

pois as novas idéias não podem ser ignoradas, mas também não podemos fazer de

nossos alunos “cobaias” de experiências metodológicas.

“Saber analisar e explicitar sua prática permite o exercício de uma lucidez profissional que jamais é total e definitiva, pela simples razão de que também temos necessidade, para permanecermos vivos, de nos contar histórias. Uma prática reflexiva não se fundamenta só em saber­analisar, mas em uma forma de “sabedoria” que permite encontrar seu caminho entre a auto­satisfação conservadora e a autodifamação destruidora.” (Perrenoud, 2000 – p.160)

Como professora, em dois mil e dois, meus alunos foram minhas

vítimas das inovações pedagógicas, pois com a mudança de administração, tivemos

algumas mudanças metodológicas que devíamos aplicar na classe.

Desde meu ingresso na prefeitura em mil, novecentos e noventa e

cinco, sempre trabalhava com atividades coletivas , todos desenvolvendo ao

mesmo tempo a mesma atividade, porém em dois mil e dois tivemos algumas

capacitações que “sugeriam” que a autonomia do aluno viesse em primeiro lugar, a

criança deveria escolher o que iria fazer, deveríamos trabalhar com cantinhos onde

cada grupo estaria realizando atividades diferentes de acordo com seu interesse

(pintura, recorte, colagem) e o professor faria intervenção em apenas um grupo por

dia.

Na teoria era muito bonito, mas na prática as coisas não funcionavam

bem, pois eu não tinha certeza do que estava fazendo, não acreditava no método

proposto, mas como era a linha a ser seguida, acabei tentando introduzir os

cantinhos e para mim foi frustrante, pois não concordava com a idéia de que assim

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era possível dar atendimento individualizado para alguns enquanto outros

brincavam.

Eu não acreditava nisso, para mim tudo não passava de uma forma de

camuflar o grande número de alunos por sala e falta de materiais pedagógicos.

Como conseqüência da minha incredulidade no método, as crianças não

correspondiam as expectativas teóricas, havia muita indisciplina e desinteresse

pelas atividades que exigiam mais concentração , confirmando o que Paulo Freire

(1996, p. 76) diz “Preciso conhecer as diferentes dimensões que caracterizam a

essência da prática, o que pode tornar mais seguro no meu próprio desempenho.”

No ano seguinte, a secretaria Municipal de Educação passou por uma

reformulação, não sendo mais exigido que trabalhássemos com cantinhos, mas com

o Referencial Curricular para o Ensino Infantil.

Hoje, após conhecer melhor o método “sugerido” em dois mil e dois,

vejo­o sem tanta desconfiança e descrença, visualizando algumas coisas boas e em

algumas situações trabalhar com os cantinhos, não da forma sugerida, mas da

forma como acredito e tenho segurança.

Antes sempre oferecia o mesmo brinquedo ou material para a classe

toda; hoje reconheço que cada criança possui gostos diferentes, portanto o mesmo

brinquedo ou material pode não agradar a todos. Agora deixo diferentes brinquedos

e materiais nas mesinhas para que escolham com qual vão brincar ou realizar as

atividades propostas.

Nas aulas de educação física, respeito a opinião da criança em não

participar da atividade proposta por não gostar da mesma.

Procuro levar meus alunos a perceberem que o que não queremos

para nós, não devemos fazer ao outro, respeitando o gosto e opinião do colega.

25

Procuro favorecer a autonomia e liberdade, porém com responsabilidade, levando a

criança a refletir sobre seus atos.

Embora não tenha participado do curso, nas discussões em sala e até

mesmo conversando com colegas de trabalho, foi possível perceber outro exemplo

que mostra, como muitas vezes, temos que aplicar uma proposta que não

concordamos totalmente: o PROFA (Programa de Formação de Professores

Alfabetizadores), criado pelo Ministério da Educação e destinado a professores da

Educação Infantil e Ensino Fundamental, incluindo os alfabetizadores de jovens e

adultos. O material do curso é dividido em três módulos, já vem todo pronto, é

composto de textos previamente selecionados, numa determinada seqüência,

acompanham vídeos de forma articulada com os textos. Tudo que os professores

cursistas aprendem deve ser aplicado em sala de aula, visando treinar o professor à

trabalhar com a prática social da leitura.

Na minha cidade; mesmo os professores de ensino infantil, tinham que

aplicar as atividades do PROFA em sala de aula e diagnosticar a fase da escrita da

criança, algo quase impossível com crianças na faixa etária de quatro a seis anos

que ainda não estão sendo alfabetizadas.

Os professores alfabetizadores tinham que utilizar apenas o PROFA

como recurso, não sendo permitido a utilização de outros meios para alfabetizar a

criança , mesmo vendo que o método não atingia a todos, o professor não deveria

mudar e tentar algo diferente com quem não aprendeu.

Na disciplina de Educação Especial, tivemos uma palestra realizada no

dia nove de maio de dois mi e quatro, onde o neurologista Marcos Durant disse que

muitas vezes já recebeu encaminhamento de crianças com dificuldades em

aprender que na verdade tinham problema metodológico e não neurológico, pois

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cada criança é um ser diferente, com cultura e estímulos diferentes, portanto um

único método não atinge a todos da mesma forma, o professor precisa usar

diferentes meios para atingir seu objetivo.

Para os formadores do PROFA, o método era infalível e se não deu

certo com alguma coisa criança, o erro era do professor que não soube aplicá­lo,

esquecendo­se que “...um tratamento uniforme que produz efeitos diferentes pelo

simples fato de que se destina a alunos desigualmente preparados para assimilar o

ensino que recebem”. (Perrenoud,1978 – p.58)

Nesses dois exemplos citados e em toda “mudança sugerida”, o

professor não é levado em conta. Aquilo que ele sabe não vale nada, tudo o que já

aprendeu deve ser jogado fora para se “moldar” às propostas “sugeridas”.

Nas aulas de Gestão, Políticas Educacionais e Avaliação, tivemos

relatos de vivências que mostraram que a angústia que vivi em dois mil e dois com

a imposição da nova metodologia pela Secretaria Municipal de Educação, não era

apenas minha, mas da maioria dos professores que trabalhavam em diferentes

cidades e que também sofrem com as imposições metodológicas decorrentes de

mudanças administrativas, onde muitas vezes, superiores que já foram professores

como nós, esquecem o que viveram na sala de aula e passam a impor as mesmas

mudanças que também questionavam quando professor.

Deixam de levar em conta que

“os professores diferem pela sua formação, a sua experiência, a sua ideologia, a sua concepção pedagógica, a sua personalidade. De uma turma para outra diferem as condições materiais e o enquadramento.” (Bordieu,2001)

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Por isso é muito importante que o professor saiba bem o que quer para

seus alunos, tenha argumentos coerentes que justifiquem sua prática e não perca

de vista seus objetivos, tendo compromisso e convicção com o que quer para seus

educandos.

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“É importante mudar nosso jeito de olhar. Olhar o erro, o problema, com olhos de

carinho... Confiando, acreditando no sucesso de um trabalho e na força de vontade de

educadores, educando e famílias”. (Tânia Q. Dias)

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4 – CONCLUSÃO

Creio que preciso acreditar no que faço, mas ter a mente aberta para

novos caminhos, e jamais perder de vista meu objetivo, não desprezar o que já sei

em detrimento do novo, ter uma atitude reflexiva perante as diversas mudanças

“sugeridas” ou cursos de formação, filtrar o que me serve, tendo consciência de que

“mudar é difícil, mas possível”. (Freire,1996 – p.88)

O Proesf é, em grande parte, o responsável pela visão da importância

da reflexão sobre minha prática e os cursos de formação. A faculdade também me

ajudou a ver o aluno como um todo e não apenas uma determinada característica

dela. Por exemplo, hoje consigo ver atrás da criança indisciplinada o pai alcoólatra, a

mãe ausente, enfim, sua vida fora da escola que muitas vezes justificam seu

comportamento. Percebo que essa criança precisa mais que qualquer outra, da

afetividade e do toque do professor.

As aulas de Psicologia e também Geografia contribuíram para esse

redirecionamento do olhar, vendo o aluno como um todo; como discutimos nas

aulas, tudo o que vemos não é o que parece, depende do ângulo de onde estamos

vendo.

A partir dessa nova visão, meu relacionamento com os pais também

mudou, percebendo­os como pessoas, como parceiros e não como pai ou mãe de

alunos apenas.

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Durante o curso pude aprender bastante sobre as reformas

educacionais e perceber que em busca de atualização muitas vezes, fazemos

cursos mais acessíveis financeiramente, cuja qualidade fica a desejar.

Lembro­me que por diversas vezes pensei: “pelo preço esse curso

deve ser bom “, mas hoje ao ver as mesmas propagandas de curso, completo

meus pensamentos; “bom pra quem?, para produzir ou reproduzirmos?”, ficando

sempre uma dúvida com a intenção por trás das idéias.

Porém a dúvida quanto a qualidade e a intenção dos cursos de

formação não devem interferir na minha busca por aprender mais, tendo claro que

“a tensão entre tradição e a modernidade tem origem na mesma problemática:

adaptar­se sem negar a si mesmo, construir a sua autonomia em dialética com a

liberdade e a evolução do outro, dominar o progresso científico.” (Dellors, 2003 ­

p.14)

Trazendo à memória a angústia, já mencionada no ano de dois mil e

dois, me leva a refletir: que lições tiraria dessa experiência, que aprendizagem pude

ter? A lição e a aprendizagem que para mim ficaram é que a dúvida, a insegurança

é o pior dos caminhos, portanto, antes de seguir o método de alguém, preciso

conhecê­lo, ter segurança e confiança, trilhando o melhor caminho para chegar até o

aluno, oferecendo­lhe uma aprendizagem significativa que o acompanhe por toda

sua vida .

“Daí minha crença que só correndo de novos caminhos pode o

professor descobrir por si mesmo, se é ou não eficiente, se aqueles novos caminhos

lhe convêm ou não.” (Rogers,1972 – p.115)

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALLAL, Linda; CARDINET, Jean; PERRENOUD, Phlilippe. A avaliação formativa num ensino diferenciado – atas do colóquio realizado na Universidade de Genebra, março 1978.

BORDIEU, Pierre. Escritos de Educação. Seleção, Organização, Introdução e Notas Maria Alice Nogueira/Afrânio Catani, 3ª edição, Editora Vozes 2001.

BENASSULY, Jussara Sampaio. A formação de professor reflexivo e inventivo. In Formação de professores: uma crítica à razão e a política hegemônica. Célia Linhares, Maria Cristina Leal (org). Rio de Janeiro. Editora DP&A, 2002.

BUENO, Shirley Neves. Formação de professores e saúde: entre o senso comum e o conhecimento cientifico. in Formação de professores: uma crítica à razão e a política hegemônica. Célia Linhares, Maria Cristina Leal (org). Rio de Janeiro. Editora DP&A, 2002.

CANDAU, Vera Maria. Reformas Educativas Hoje na América Latina. in Currículo: Políticas e práticas, Antonio Flavio Barbosa Moreira (org). Campinas, S.P. Papirus, 1999 (coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico)

COLL, César. Fonte da Teoria. Aprendizagem escolar e construção do conhecimento. Editora Artmed. 2002, 2º edição p. 137

CUNHA, Carlos A. L.; AMORIM, Antonio C. R. (editores) in AMARAL, Ivan. Atas – Encontro de Formação Continuada de Professores de Ciências; p.52, Unicamp, 1988.

DELLORS, Jacques; et al Educação. Um tesouro a descobrir/ Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. Ed. Cortez, 8ª edição, 2003.

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FREIRE, Paulo; Pedagogia da Autonomia – saberes necessários à prática educativa. Editora Paz e Terra, 27ª edição, SP, 1996.

GADOTTI, Moacir. in Revista educatio. Ano 4 nº 24 maio/03 p. 36

PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Tradução: Patrícia Chittoni Ramos. Editora: Artes Médicas Sul, 2000. Porto Alegre.

ROGERS, Carl R. Liberdade para aprender. 2º edição. Interlivros de Minas Gerais. 1972 p.115

TORRES, Rosa M., Melhorar a qualidade da educação básica? As estratégias do Banco Mundial. in O Banco Mundial e as políticas educacionais – Livia de Tommasi, Miriam J. Warde, Sérgio Haddad (org.), Tradução de Monica Corullón, Ed. Cortez, 3ª edição, 2000.