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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE UNESC UNIDADE ACADÊMICA DE HUMANIDADES, CIÊNCIA E EDUCAÇÃO UNA HCE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PPGE EDUARDO ABEL CORAL CAMPO CONCEITUAL MULTIPLICATIVO: UMA ANÁLISE DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS PARA AS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL. CRICIÚMA, MARÇO DE 2010

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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE – UNESC

UNIDADE ACADÊMICA DE HUMANIDADES, CIÊNCIA E EDUCAÇÃO – UNA HCE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGE

EDUARDO ABEL CORAL

CAMPO CONCEITUAL MULTIPLICATIVO: UMA ANÁLISE DOS PARÂMETROS

CURRICULARES NACIONAIS PARA AS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL.

CRICIÚMA, MARÇO DE 2010

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EUARDO ABEL CORAL

CAMPO CONCEITUAL MULTIPLICATIVO: UMA ANÁLISE DOS PARÂMETROS

CURRICULARES NACIONAIS PARA AS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação (PPGE) da Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC), como um dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação.

Orientador: Prof. Dr. Ademir Damazio

CRICIÚMA, MARÇO DE 2010

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EDUARDO ABEL CORAL

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

C787c Coral, Eduardo Abel.

Campo conceitual multiplicativo: uma análise dos

parâmetros curriculares nacionais para as séries iniciais do

ensino fundamental / Eduardo Abel Coral; orientador:

Ademir Damazio. - Criciúma : Ed. do Autor, 2010.

86 f. ; 30 cm.

Dissertação (Mestrado) - Universidade do Extremo

Sul Catarinense, Programa de Pós-Graduação em Educação,

Criciúma (SC), 2010.

1. 1. Ensino de matemática - Currículos. 2. Matemática

2. (Ensino fundamental) - Currículos. I. Título.

3.

4. CDD. 21ª ed. 372.19

5. 1. Ensino de matemática - Currículos. 2. Matemática

6. (Ensino fundamental) - Currículos. I. Título.

7.

8. CDD. 21ª ed. 372.19

Bibliotecária Rosângela Westrupp – CRB 364/14ª -

Biblioteca Central Prof. Eurico Back - UNESC

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Para meus pais: Edesio Coral e Maria Abel

Coral e, meu irmão: Maurício Abel Coral.

Obrigado pela paciência e espera. Tudo se

resolverá.

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AGRADECIMENTOS

Nesse momento, temos que expressar agradecimentos a todos àqueles que

em nossa luta diária colaboraram no processo de aquisição de novos e importantes

conhecimentos.

As palavras tentarão expressar os sentimentos, mas nunca revelarão a

verdadeiro sentido da emoção que foi viver o processo vivido nesse período de

estudos do mestrado.

Dessa forma, sinto-me a vontade para agradecer ao professor Dr. Ademir

Damazio, coordenador do PPGE/UNESC, por sua dedicação total as questões da

educação. Por sua força de vontade e por sua esperança de ver uma sociedade

diferente, pautada na igualdade real de oportunidades.

Ao professor Dr. Ilton Benoni da Silva, por sua paciência e compreensão, com

que orquestrou as sugestões realizadas e a sua vontade de sempre procurar o

melhor, o mais perfeito. Muito obrigado!

Aos demais docentes do PPGE/UNESC, pelo esforço despendido, a fim de

manter viva, a chama do processo educacional justo e emancipador;

Aos docentes do Departamento de Matemática, pelo impulso inicial, proposto

a minha carreira como docente;

A todos os meus familiares, pelo incentivo total aos meus estudos.

Aos mestrandos em Educação da UNESC, por proporcionarem ótimas

discussões sobre a educação brasileira;

A Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC, juntamente com a

FAPESC, por oportunizar e financiar esta capacitação profissional.

EDUARDO ABEL CORAL

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―Na formação do espírito científico, o primeiro

obstáculo é a experiência primeira, a

experiência colocada antes e acima da crítica –

crítica esta que é, necessariamente, elemento

integrante do espírito científico.‖

Bachelard

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RESUMO

O presente estudo buscou interrogar os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para o ensino de matemática nas suas séries iniciais. Como delimitação das possibilidades do estudo, objetivou-se os esforços ao campo conceitual multiplicativo (multiplicação e divisão) na unidade denominada de campo numérico dos naturais para 2º ciclo (3ª e 4ª séries) do ensino fundamental. A modalidade de pesquisa adotada foi análise documental, que focou as características das proposições dos PCNs ao processo de ensino e aprendizagem do referido campo conceitual. Análise priorizou as categorias dos pressupostos teóricos dos campos conceituais de multiplicação estabelecidas por Vergnaud: isomorfismo de medida, produto de medida e proporção múltipla. Como parâmetros dessas categorias foram adotadas as situações problemas, propostas pelos PCNs, que são contempladas em 4 grupos: multiplicação comparativa, proporcionalidade, configuração retangular e combinatória. A percepção elaborada é a de que há aproximações entre a proposta textual dos PCNs e as argumentações teóricas, no que diz respeito à forma de conceitualização do conteúdo. Existem em ambas as propostas uma preocupação com as significações e idéias que caracterizam os conceitos em detrimento de alguns aspectos considerados importantes, como por exemplo, os procedimentos algorítmicos da multiplicação e divisão. Palavras - chave: Campo Conceitual Multiplicativo; Matemática; Parâmetros

Curriculares Nacionais.

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ABSTRACT

This study sought to examine the National Curriculum Parameters (PCNs) for the teaching of mathematics in their grades. As delineation of the possibilities of study aimed to efforts to multiplicative conceptual field (multiplication and division) into a numeric field called the natives for 2nd cycle (3rd and 4th grade) elementary school. The method of research used was documentary analysis, which focused on the characteristics of the propositions of the PCNs to the process of teaching and learning of this conceptual field. Analysis prioritized the categories of the theoretical assumptions of the conceptual fields propagating established by Vergnaud: isomorphism of measure, product measure and multiple proportion. As parameters of these categories have been adopted situations problems, proposed by PCNs, which are covered in 4 groups: multiplication comparative proportionality, rectangular configuration and combinatorics. The perception is there drawn similarities between the proposed text of the PCNs and the theoretical arguments, regarding the form of conceptualization of the content. There are proposals on both a concern with meanings and ideas that characterize the concepts at the expense of some important aspects, such as the algorithmic procedures of multiplication and division. Word keys: Conceptual Multiplicative Field; Math; National Curriculum Standards.

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

UNESC – Universidade do Extremo Sul Catarinense PCNs – Parâmetros Curriculares Nacionais PPP – Projeto Político Pedagógico PIC170 – Projeto de Iniciação Científica 170 CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ANPEd – Associação Nacional de Pós – Graduação e Pesquisa em Educação EDUCERE – Congresso Nacional de Educação CIAEM – Conferencia Interamericana de Educación Matemática.

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO.....................................................................................................13

1. O CONTEXTO DA PESQUISA.............................................................................18

1.1. A problemática e suas delimitações..............................................................18

1.2. Procedimentos metodológicos.......................................................................24

2. FUNDAMENTOS DA PESQUISA.........................................................................28

2.1. A realidade matemática.................................................................................28

2.2. A noção de obstáculos epistemológicos em Bachelard................................31

2.3. A matemática e os obstáculos epistemológicos............................................35

2.4. A teoria dos campos conceituais...................................................................39

2.4.1. O campo conceitual multiplicativo.......................................................41

2.4.1.1. Isomorfismo de medida............................................................41

2.4.1.2. Produto de medida...................................................................43

2.4.1.3. Proporção múltipla....................................................................47

3. OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: PROPOSIÇÕES PARA O

ENSINO DE MATEMÁTICA.......................................................................................49

3.1. O que é o PCN e sua proposta para a matemática.......................................49

3.2. O PCN e a construção do saber matemático no ensino fundamental...........54

3.2.1. Abordagem do saber matemático nas séries iniciais do ensino

fundamental...................................................................................................58

4. AS OPERAÇÕES DE MULTIPLICAÇÃO E DIVISÃO COM NÚMEROS

NATURAIS: UMA ANÁLISE DOS PCNs..................................................................62

4.1. Análise das operações de multiplicação e divisão com números

naturais, segundo a teoria de Vergnaud..............................................................62

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CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................78

REFERÊNCIAS..........................................................................................................82

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APRESENTAÇÃO

A formação recente no curso de licenciatura plena em Matemática pela

Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC) e ainda sob a condição de

inexperiência na prática docente, não foi inibidora para proporcionar interesse e

expectativa pela pesquisa na área de educação. Com objetivos determinados, no

ingresso à vida docente, se faz necessário buscar cada vez mais, questionamentos

sobre formas e métodos de trabalho. Na luta colaborativa diária para a melhoria da

educação, é proposto como diversos educadores desse país, realizar uma pesquisa

em nível de mestrado, para contribuir com a reflexão sobre o processo de

apropriação do conhecimento matemático.

Como consequência de uma educação de nível médio técnico e com

primeiro contato no mundo do trabalho no setor industrial, houve um afastamento

das questões educacionais. Porém, o sentimento retraído de indignação com o atual

cenário da educação brasileira e a vontade de entender como se produz

conhecimento em um determinado assunto, trouxe a necessidade de ingressar na

universidade, onde foi concluído o curso de licenciatura supracitado.

Na academia, o primeiro contato com a pesquisa, ocorreu com a

participação no desenvolvimento de um projeto de pesquisa (PIC 170/UNESC) que

analisou estatisticamente o trabalho de puericultura realizado por religiosas, junto

aos filhos e filhas de operários mineiros. Essa inserção na produção de

conhecimento contribuiu para aumentar o interesse, de forma mais ampla pela área

da educação. Naquela oportunidade, a pesquisa não estava dentro do foco de

interesse, mas possibilitou a abertura de novos horizontes para a uma visão sobre a

investigação científica.

A partir de então, a preocupação passou a ser não somente com os

conceitos matemáticos abordados nas escolas brasileiras, mas também com a

educação como um todo. Questionamentos se apresentam: Que tipo de escola?

Quais conceitos? De que forma são desenvolvidas as investigações em educação?

Essas perguntas também permearam o início do presente estudo e

projetaram para abertura de novas interrogações. Os objetivos concretos não são de

buscar respostas definitivas, mas pelo menos produzir tentativas para novas

perguntas acerca da Educação Matemática.

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No contexto desses questionamentos construiu-se uma trajetória de

delimitação do problema do presente estudo, centrando a atenção sobre os

conceitos matemáticos, mais especificamente nas proposições dos documentos

oficiais. Diante dessa opção, três possibilidades se apresentaram para desencadear

um processo de análise: o Projeto Político de uma escola, a Proposta Curricular do

Estado de Santa Catarina e os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). A

decisão tomada foi pelos PCNs1 de 1997, documento oficial brasileiro, que

determina dentre inúmeras questões educacionais, o norteamento para o PPP das

escolas brasileiras.

Contudo, não foi deixado de fazer uma leitura do Projeto Político Pedagógico

de uma Escola da Rede Municipal de Ensino de Criciúma, em que se constatou a

completa ausência de indicação de conceitos ou conteúdos de ensino de

Matemática e mesmo de outra disciplina. O referido documento trata apenas de

questões administrativas e das concepções que o coletivo da escola explicita sobre

educação, aprendizagem, entre outras.

Da mesma forma, procurou-se conhecer a Proposta Curricular editada pela

Secretaria Municipal de Criciúma, que apresenta os conceitos matemáticos de forma

mais abrangentes que denomina campos conceituais numérico, algébrico e

geométrico.

Reafirma-se que a leitura desses documentos locais não tem interferência

na pesquisa, pois tratou apenas de um breve contato, de forma a ter-se uma visão

do seu conteúdo no que diz respeito às indicações para o ensino de Matemática.

Reafirma-se então, que o foco foi o estudo de quatro volumes dos PCNs,

quais sejam: os PCNs – Introdução 1º e 2º ciclos; PCNs – Introdução 3º e 4º ciclos;

PCNs – Matemática 1º e 2º ciclos; PCNs – Matemática 3º e 4º ciclos, que deram

uma percepção da proposta educacional. Porém, se quer mais, do que uma simples

leitura dos documentos. Por isso, escolheram-se os PCNs para Matemática dos 1º e

2º ciclos, como documento principal da análise. Para um melhor entendimento do

leitor, informa-se que o 1º ciclo corresponde à 1ª e 2ª séries juntas do Ensino

Fundamental e, por conseqüência, o 2º ciclo agrupa a 3ª e 4ª séries.

Na leitura mais detalhada desse documento, é possível observar que ele

aborda todos os conceitos matemáticos inerentes àqueles ciclos. Há um esforço no

1 A partir desse momento será feita referência aos Parâmetros Curriculares Nacionais, através da sigla PCNs.

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sentido de apresentar os conteúdos matemáticos de uma forma articulada, evitando

sua fragmentação. Em relação aos procedimentos pedagógicos, faz um tratamento,

detalhado e longo, que proporciona uma abertura de visão, para o docente em seu

trabalho diário.

Mesmo assim, observa-se que deixa margem para uma série de

interrogações que necessitaria de uma abordagem à luz de um referencial teórico

que explicitasse as implicações da estruturação adotada pelos PCNs. No entanto,

para realizar um estudo sobre inúmeros conceitos matemáticos do o 1º e 2º ciclo, o

tempo num período de curso de mestrado, inviabilizaria o processo. Dessa forma,

optou-se por elencar apenas um conceito matemático indicado nos PCNs.

A opção foi pelo 2º ciclo e nele, o conteúdo relacionado diretamente aos

números naturais, mais precisamente as suas operações. Vale lembrar que, os

meandros do currículo da Matemática das primeiras séries do Ensino Fundamental

dão ênfase para as quatro operações básicas: a adição, subtração, multiplicação e

divisão. O que, então, questionar agora? Que operações analisar? Como existem

inúmeros estudos e trabalhos sobre o campo aditivo, resolveu-se alçar no campo

multiplicativo, adotando a simultaneidade da multiplicação e divisão, como entende

Vergnaud.

Para chegar ao referencial de Vergnaud como base teórica para criar

critérios de análise dessas duas operações? Duas disciplinas do curso de Mestrado

foram decisivas. A primeira, Educação e Teoria do Conhecimento, que proporcionou

o debate sobre as obras de Gaston Bachelard, pensador francês, que em seus

estudos epistemológicos inaugurou o conceito de obstáculos epistemológicos.

Portanto, a base teórica que embasa as questões propostas para esse estudo.

Contudo, Bachelard não realiza um estudo específico para a matemática, o

que acabou por não remetê-lo como possibilidade de bibliografia exclusiva. Isso

ocorreu na disciplina optativa Perspectivas Atuais da Pesquisa em Educação

Matemática, mais especificamente no estudo de um de seus ementários, qual seja:

Didática da Matemática Francesa. Então foram vistos os desdobramentos dos

pressupostos bachelardianos sobre a teoria dos obstáculos epistemológicos

voltados à Matemática e ao seu ensino.

O primeiro texto encontrado foi de Glaeser (1981), que analisou os

obstáculos que historicamente foram produzidos/superados sobre as regras de

sinais da multiplicação dos números relativos. Ao indicar as dificuldades enfrentadas

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pelos matemáticos estabelece uma relação com aquelas que se apresentam aos

alunos no processo de aprendizagem da referida operação. Conclui que tais

dificuldades são constitutivas do próprio conhecimento, uma vez que a operação

com números positivos foi um obstáculo epistemológico para o aparecimento dos

números negativos.

No entanto, Brousseau (1983) é quem traduz as idéias de Bachelard para a

didática da matemática. Esta só tem razão de ser se suas questões forem

fundamentadas em uma boa teoria epistemológica, por dar condições do professor e

do pesquisador identificar os obstáculos, entre as dificuldades dos alunos no

processo de aprendizagem. Ao se referir à noção de obstáculos oriunda de

Bachelard, Brousseau (1983) atrela à resistência de um saber mal-adaptado. Porém,

considera de suma importância, pois é um meio de interpretar alguns erros

recorrentes e não aleatórios que os estudantes cometem em relação à Matemática.

Por exemplo, os conhecimentos referentes às relações entre os números naturais

constituem em obstáculos para o conhecimento dos números decimais.

Nessa inserção de estudo na Didática da Matemática, entre os franceses

com vinculação teórica bachelardiana, nossa filiação se concentra em Gerard

Vergnaud, não só pelo uso das categorias dos obstáculos epistemológicos, como

também por outras formulações teóricas. Ele vai além do estabelecimento de

relações dessas categorias com estudos de conceitos matemáticos.

Vergnaud propõe a teoria dos campos conceituais, entendida como uma

organização invariante da conduta para uma classe de situações dadas, subjacentes

as quais estão os conhecimentos que se pretende ensinar e aprender. Diz respeito,

pois, a um conjunto de problemas que explicita ou implicitamente estão conceitos,

procedimentos e representações distintas que requerem categorias analíticas

interconectadas.

Em Vergnaud (1994), encontra-se a referência básica na análise desse

objeto de pesquisa, pois trata especificamente do campo conceitual multiplicativo,

definido como ―uma variedade de situações que requerem operações de

multiplicação, divisão ou a combinação destas‖. No momento da análise do

tratamento dado pelos PCNs à multiplicação e à divisão, atem-se às categorias e

subcategorias da teoria de Vergnaud, especificadas e aprofundadas na seção 2.4.1

do capítulo 2.

Assim, o presente texto se estrutura, conforme especificação que segue.

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No primeiro capítulo, encontra-se o compromisso desse trabalho, sua

contextualização e relevância acadêmica. Também o leitor será avisado da forma

metodológica empregada e as etapas do trabalho.

O segundo capítulo, ressalta as noções de obstáculos epistemológicos,

com ênfase nos pressupostos de Gaston Bachelard, levando à mostra suas

características relevantes para o processo de entendimento do presente estudo. São

relatados também, os principais obstáculos ao pensamento científico na ordem de

interesse desse estudo.

Como proposta central, a contribuição da teoria dos campos conceituais, de

Vergnaud, aparece como uma ampliação da noção de conceito dos obstáculos

epistemológicos e considera as situações matemáticas como a referência dos seus

objetos. Vergnaud (1988) descreve a teoria dos campos conceituais como uma

teoria psicológica cognitivista, referente ao processo de conceitualização do real, na

possibilidade de localização e estudo das continuidades e rupturas entre

conhecimentos do ponto de vista de seu conteúdo conceitual.

Para o terceiro capítulo, reserva-se a contextualização dos Parâmetros

Curriculares Nacionais, que será o marco de partida para o entendimento atual

sobre a educação nacional. Afinal, ele caracteriza o ensino fundamental em suas

séries iniciais por meio da proposta político-pedagógica da escola e aproxima a

realidade escolar da função norteadora dos parâmetros. Também, e lembrando que

desse documento, o maior interesse está na disciplina de matemática.

Encontra-se no quarto capítulo, a análise realizada nos pontos que foram

elencados como objetos de estudo específicos nos PCNs, segundo as formulações

teóricas de Vergnaud e também apresenta as condições com que estas categorias

se estabelecem no documento.

Por último, nas considerações finais, espera-se realizar uma retrospectiva

dos dados alcançados, para um balanço desses resultados pesquisados, como

sobre as evidencias encontradas e, por conseqüência, propor continuidade desses

estudos.

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1. O CONTEXTO DA PESQUISA

1.1. A problemática e suas delimitações

O tema proposto para a discussão nesse estudo, tem como objetivo produzir

e ampliar as perspectivas para a formação de conceitos matemáticos referentes às

operações de multiplicação e divisão com números naturais. Para tal, recorreu-se a

novos formatos e/ou novas configurações de abordagens, no intuito de transformar o

conceito, que por hora, parece estabelecido como objeto sedimentado em um

processo dinâmico, integrando bases teóricas e documentos oficiais.

Para produzir esse estudo, o diálogo se fez com o esforço de evidenciar

aspectos da teoria dos campos conceituais, mais precisamente o campo conceitual

multiplicativo, produzido por Gerard Vergnaud, que possui relações com o estudo

dos obstáculos epistemológicos e didáticos em Bachelard.

Portanto, há uma inserção na formação de conceitos matemáticos, por parte

dos estudantes, não com o mesmo teor daquele produzido no contexto formal, isto

é, no transcorrer de sua evolução histórica. Sendo assim, trata-se de uma questão

pedagógica que se insere na Didática da Matemática, que tem como objetivo

estudar condições que possam favorecer a compreensão das características

essenciais dos conceitos pelo estudante.

Nesse sentido, apresentam-se alguns elementos da teoria dos campos

conceituais, proposta por Vergnaud (1996). Entende-se que sua proposta é repensar

as condições da aprendizagem conceitual, de forma que se torne mais acessível à

compreensão dos estudantes. Trata-se de estudar a questão do significado dos

conceitos no contexto escolar, sem perder de vistas suas raízes epistemológicas.

Essa teoria trata da complexidade do fenômeno da aprendizagem.

A teoria dos campos conceituais foi desenvolvida para estudar as condições

de compreensão do significado do saber escolar pelo estudante. Busca as

possibilidades de filiações e rupturas entre as idéias iniciais da matemática, com

consideração das ações realizadas e compreendidas pelo estudante. Mas vale o

esclarecimento de Vergnaud (1996), de que seus pressupostos não se limitam

apenas à educação matemática, mas diz respeito a uma estrutura progressiva de

elaboração de conceitos.

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Os conceitos matemáticos, para os quais a teoria foi testada, oferecem com

certa clareza os invariantes que integram a sua elaboração. As pesquisas que

deram suporte à teoria dos campos conceituais dizem respeito à compreensão de

situações de estudo das operações aritméticas elementares. Para exemplificar,

retomaram-se os termos utilizados por Vergnaud (1996, p.218)

[...] comprar bolos, frutas ou chocolates, colocar à mesa, contar pessoas, talheres, jogar bolinha de gude, são para uma criança de 6 anos, atividades que favorecem o desenvolvimento da formação de conceitos matemáticos referentes ao número, comparação, adição e subtração.

As situações pesquisadas por Vergnaud envolvem problemas em que os

estudantes são levados a realizar as quatro operações da matemática ou uma

combinação delas. Um dos aspectos relevantes no estudo dessa teoria é o destaque

dado ao tratamento do saber escolar, que se traduz em uma forma diferenciada de

entender os conceitos matemáticos estudados na educação escolar. Porém, vale

ressaltar, com o cuidado para não serem concebidos tal como suas formalizações

no território do saber cientifico.

Como o saber escolar está localizado entre o saber cotidiano e o saber

científico, a teoria dos campos conceituais permite atribuir aos conceitos um

significado de natureza educacional, servindo de parâmetro orientador para que a

educação escolar não permaneça na dimensão empírica do cotidiano nem se perca

no isolamento da ciência pura. Nesse sentido, é inadequado isolar o contexto de

elaboração de uma noção, cabendo à didática desenvolver situações em que

intervenha não apenas um único conceito, mas uma diversidade deles.

Vergnaud (1996) destaca ainda a existência dos chamados espaços de

situações problemas, cuja utilização adequada facilita ao aluno a percepção das

conexões existentes entre os vários conceitos, pois destaca a dimensão da

operacionalidade entre eles. Na diversidade desse espaço de problemas, são

estruturadas as condições ideais para que ocorra uma aprendizagem mais

significativa. Portanto, mostra que essa noção é de fundamental importância para a

didática da matemática. Ao enfatizar a função pedagógica dos problemas, o

conhecimento passa a ser concebido como uma sucessão de adaptações que o

estudante realiza sob a influência de situações que ele vivencia na escola e na vida

cotidiana. Em cada momento, entra em cena não só conhecimentos anteriores,

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como também a capacidade de coordenar e adaptar essas informações em face de

uma nova situação.

No caso ideal, em que a aprendizagem acontece com sucesso, os

conhecimentos anteriores são adicionados uns aos outros e incorporados à nova

situação. Assim, ocorre uma parte do processo cognitivo, que consiste no conjunto

de procedimentos de raciocínio desenvolvidos pelo sujeito, para coordenar as

adaptações necessárias, para que informações precedentes sejam incorporadas em

uma situação de aprendizagem, sintetizando o novo conhecimento.

A estrutura multiplicativa é um campo conceitual que está relativamente

explorado. Constitui-se de situações e procedimentos que implicam em uma ou

várias multiplicações e divisões e em um conjunto de conceitos e teoremas que

permitem que essas situações sejam representadas.

Será com as categorias expressadas no campo conceitual multiplicativo de

Vergnaud, que se fará análise do conceito de multiplicação, divisão e operação com

números naturais, propostos pelos PCNs de matemática do 1º e 2º ciclo.

O esforço se dá no sentido de apropriar-se desses documentos como

objetos de estudo, para verificar se contemplam, e de que modo o fazem, essa

forma de pensar o processo de produção do conhecimento matemático, nesse

estágio da formação escolar. A escolha recai sobre o campo dos números naturais,

situando-se apenas nas suas operações, mais especificamente, aquelas referidas: a

multiplicação e a divisão.

Salienta-se que a escolha dos Parâmetros Curriculares Nacionais, como o

documento analisado, se dá pelo motivo de que eles têm o intuito de nortear as

questões educacionais em nosso país. Eles têm uma função bem definida: orientar

os projetos políticos pedagógicos e demais processos que envolvem o cotidiano

escolar. Ao tratarem das disciplinas individualmente, significa dizer que a

matemática também foi contemplada com um referencial nacional.

Observa-se nos PCNs de introdução 1º e 2º ciclos, em suas primeiras linhas,

os seus objetivos:

Sua função é orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional, socializando discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores brasileiros, principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com a produção pedagógica atual. (BRASIL, 1997, p.13).

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Essa auto-afirmação e convencimento instigaram ainda mais para tomar os

PCNs o objeto de análise. A concepção de seus pressupostos é decisiva para o

avanço educacional brasileiro, diante da ofensiva mundial de um sistema econômico

global, que tem se tornando mais competitivo. Atento para esse panorama, o

Ministério da Educação entende que aliou forças e investiu em um documento

referencial para se estender aos quatros cantos do país, com o que concebe de

mais atual e inovador para a educação. Cumpre, pois, o papel que lhe compete de

propor um formato de ensino para o Brasil.

O documento traz a preocupação de expor as razões que determinaram a sua

elaboração e, ao mesmo tempo, mostrar-se como algo novo para o processo

educativo nacional. Por isso, inicialmente, faz-se um relato da sua trajetória e as

motivações de sua proposição. O argumento é de que seus aspectos pedagógicos

diferem daqueles tradicionalmente abordados. Aponta como exemplos, a inserção

de novidades como os temas transversais e outros assuntos até aquele momento

tratados como tabus pela sociedade.

A comparação entre suas concepções são aquelas que ainda se manifestam

na prática escolar, que também são parâmetros no início do texto sobre a

matemática:

O ensino de Matemática costuma provocar duas sensações contraditórias, tanto por parte de quem ensina como por parte de quem aprende: de um lado, a constatação de que se trata de uma área de conhecimento importante; de outro, a insatisfação diante dos resultados negativos obtidos com muita freqüência em relação à sua aprendizagem. (BRASIL, 1997, p.15).

O pressuposto é de que essa contradição pode gerar certo desconforto para

o docente, visto que a matemática não é uma disciplina com aceitação satisfatória

pelo corpo discente, alegadamente em função de seu grau de abstração, ou com a

justificativa de que muitas vezes, por certo deslocamento de seus conteúdos em

relação à realidade cotidiana.

Por isso, a proposta dos PCNs para matemática dos 1º e 2º ciclos pode ser

entendida como uma tentativa de aproximar o conhecimento cotidiano do

conhecimento científico, elaborado e sistematizado historicamente pela humanidade.

Para tal apresenta-se com questões pedagógicas sobre diversos conteúdos

matemáticos.

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Há uma caracterização do que é a matemática no ensino fundamental, seus

objetivos e intenções, em harmonia com o papel que atribuiu à escola: construção

do cidadão que a sociedade atual necessita.

No que diz respeito aos aspectos pedagógicos, observa-se que a

distribuição dos conteúdos de ensino para as séries iniciais, segundo o

entendimento dos PCNs para matemática, se dá numa divisão em quatro blocos:

números e operações, espaço e forma, grandezas e medidas e tratamento de

informações.

O bloco dos números e operações tornou-se o foco principal do presente

estudo, pois é nele que se encontram os números naturais e suas operações. Vale

lembrar que é nas operações que se concentra o interesse dessa pesquisa.

Contudo, analisar todas as operações básicas, produziria um trabalho extenso, o

que direcionou a análise para o estudo da multiplicação e da divisão, que teriam

maiores possibilidades para contemplar as categorias de análise teóricas do campo

conceitual multiplicativo de Vergnaud.

Se os PCNs deram margens para adotá-los como referência das análises,

porém não se tinha a garantia da sobreposição desse estudo com outros realizados

por pesquisadores, anteriormente. Por isso, localizou-se a problemática dessa

pesquisa no cenário dos debates atinentes ao tema proposto. Para tal, foi feito um

mapeamento das produções bibliográficas em: periódicos, sítios especializados em

assuntos educacionais como CAPES e ANPEd, banco de teses das universidades

do Brasil e do exterior, dentre outros. Dois critérios subsidiaram essa busca na

produção científica, para relevância das discussões: que adotassem o referencial

bachelardiano sobre obstáculos na área do ensino de Ciências e Matemática e

tratassem do campo conceitual de multiplicação de números naturais fundamentado

na Didática da Matemática Francesa.

No acervo da Universidade Federal de Santa Catarina, foi encontrada a

dissertação de mestrado (MELO, 2005) que pesquisou as contribuições da

epistemologia histórica de Bachelard no estudo da evolução dos conceitos da óptica,

com foco para a articulação entre as contribuições filosóficas e históricas na

disciplina de Física.

No mesmo banco encontrou-se a dissertação de Farago (2003) que tratou

do ensino da história da matemática como forma de contextualização para uma

aprendizagem significativa, com ênfase na idéia de superação dos obstáculos.

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Nos sítios da internet, a revista online Ensaio, volume 08, número 01, traz

um artigo com o título ―Educação científica na perspectiva bachelardiana: Ensino

Enquanto Formação‖, (CARVALHO FILHO, 2006), o referido artigo analisa a

problemática do ensino-aprendizagem que aparece na epistemologia bachelardiana,

ao defender que aprender é uma mudança na constituição psíquica do sujeito. Dito

de outra forma, aprender é superar os obstáculos que se interpõem no processo de

aquisição do conhecimento. O referido autor usa o argumento de Bachelard de que

a aprendizagem ocorre quando o estudante rompe com os obstáculos que impedem

a compreensão dos conceitos científicos. Consequentemente, o objetivo central do

ensino de ciências não deve ser a exposição de aulas para a aquisição de uma

grande quantidade de conteúdos, mas a superação dos obstáculos que impedem a

compreensão do pensar e fazer ciência, na atualidade.

A Revista Química Nova, número 15, Lopes (1992) faz uma análise

histórico-epistemológica, mais especificamente dos obstáculos da aprendizagem da

Química, tendo como referência 107 livros didáticos, usados no ensino fundamental

no período 1931 até 1990.

A revista eletrônica Investigações em Ensino de Ciências – V7(1), pp. 7-29,

Moreira (2002) estuda a teoria dos campos conceituais de Vergnaud, no ensino de

ciências e na pesquisa nessa área. Adota como referencial a teoria dos campos

conceituais de Vergnaud por acreditar em sua adequabilidade para o ensino de

ciências e para a pesquisa nessa área. Além disso, estabelece algumas relações

entre essa teoria e outros referenciais como, por exemplo, aprendizagem

significativa, resolução de problemas e representações mentais.

Em Educação Matemática, no sítio do Encontro Nacional de Educação

Matemática, o leque de trabalhos com a temática se expande. Destaca-se o texto de

Santos (2004) por adotar o conceito de campo conceitual multiplicativo de Vergnaud

para analisar a utilização de jogos, para fixação do conteúdo matemático.

No sítio da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, os anais do VIII

EDUCERE, Silva e Bezerra (2008) adotam a teoria dos campos conceituais na

investigação com situações-problema sobre aprendizagem de equações da reta. O

problema de pesquisa trata da investigação sobre as invariantes adotadas pelos

alunos nas discussões sobre situações-problemas apresentadas em uma ficha de

atividade, dividida em cinco momentos.

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Rasi (2009) em sua dissertação de mestrado (PUC/SP) estudou o

tratamento dado, pelos alunos do sétimo ano, as relações multiplicativas que

envolvem noções de transformações multiplicativas e decomposição binária e as

propriedades.

Nehring (2001) adota o referencial de Vergnaud para estudar a resolução de

problemas multiplicativos elementares de combinatória. Identificou as diferentes

situações multiplicativas sustentadas pelo sentido operatório enfatizados no ensino

fundamental. A autora levou em consideração as variáveis redacionais do enunciado

dos problemas que os tornam congruentes ou não-congruentes e a utilização de

uma representação intermediária para auxiliar no processo de resolução.

Dentre as demais pesquisas realizadas em diversos meios eletrônicos,

pode-se constatar um vasto número de artigos relacionados ao assunto, que se

apresenta como inovador, associando o conceito de campo conceitual, nas mais

diversas áreas e para inúmeras análises de documentos e referenciais bibliográficos.

Do exposto, pode-se dizer que o presente estudo teve sua justificativa de

realização, pois não teve antecedente que abordassem o conceito de multiplicação,

à luz da teoria dos campos conceituais, no documento que norteia a educação

fundamental brasileira: Parâmetros Curriculares Nacionais.

1.2. Procedimentos metodológicos

O planejamento metodológico desse estudo foi entendido como o conjunto

sequencial de procedimentos e técnicas que direcionaram a execução das ações

pertinentes à pesquisa. Desse modo, foi possível perseguir os objetivos inicialmente

propostos e, ao mesmo tempo, atender as condições objetivas para que o estudo se

concretizasse no tempo estipulado (2 anos), sem perder a qualidade científica.

No entanto, a precaução fundamental foi a consciência de que necessário se

fazia o conhecimento de fatores que caracterizassem uma pesquisa em si e sua

metodologia, tais como: a natureza do objeto, o problema e a corrente de

pensamento. São eles que determinam a direção a tomar, o processo de análise e a

elaboração das sínteses. Como diz Goldenberg (2002, p.14), ―o que determina como

trabalhar é o problema que se quer trabalhar: o caminho quando se sabe aonde se

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quer chegar‖. Enfim, o planejamento consistente é que determina os resultados de

qualquer pesquisa.

No entanto, o planejamento requer opção por uma modalidade de pesquisa,

o que não é uma tarefa muito simples, pois, segundo Ventura (2002, p.76-77): ―são

incontáveis e absolutamente diversas as classificações da metodologia que se pode

encontrar na literatura especializada‖. Nesse sentido, entre outras, a escolha foi

direcionada para aquela que remetesse ao estudo teórico e que contribuísse para

análise conceitual dos conteúdos escolares de matemática. Ou seja, a investigação

com foco para um documento articulado com uma bibliografia convergente ao

assunto.

Assim, a escolha recaiu na pesquisa documental, com o cuidado ao alerta

de Ludke e André (1986, p.38) de que a referida modalidade propõe trazer para

discussão uma metodologia que é pouco explorada, tanto na área de educação,

quanto em outras áreas das ciências sociais.

A pesquisa documental vale-se de materiais que não receberam ainda um

tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os

objetos da pesquisa. Segundo Lakatos e Marconi (2001), caracteriza-se pela ―fonte

de coleta de dados restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se

denomina de fontes primárias‖.

De acordo com Lopes e Galvão (2001), a pesquisa documental tem como

referência inicial as formulações de questões, em vez de ir diretamente à análise dos

documentos. As fontes não falam por si sós, elas são testemunhas de um momento

que tenta elaborar respostas às perguntas, por isso, problematizá-las é fundamental:

―o que determina o que são as fontes é exatamente o problema problematizado.‖

(LOPES e GALVÃO, 2001, p.79). Desse modo, o documento e as perguntas

formuladas sobre ele, pelo pesquisador, assumem o mesmo nível de importância.

Dessa forma, Foucault (apud LE GOFF, 1984), diz que os problemas históricos

podem ser resumidos nas palavras: o questionar dos documentos.

No presente estudo, os documentos questionados foram: Parâmetros

Curriculares Nacionais: Ensino de primeira à quarta série, Parâmetros Curriculares

Nacionais de Matemática: Ensino de primeira à quarta série, Parâmetros

Curriculares Nacionais: Ensino de quinta a oitava séries, Parâmetros Curriculares

Nacionais de Matemática: Ensino de quinta a oitava séries.

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As perguntas dirigidas aos documentos que subsidiaram a análise foram: os

documentos tratam do conceito de multiplicação? Qual a orientação metodológica de

ensino para o desenvolvimento do referido conceito? Qual abordagem teórica é

adotada? Quais as implicações das proposições no processo de ensino e

aprendizagem do conceito de multiplicação? Qual o tempo e o espaço ocupados

pela multiplicação nas proposições dos PCNs.

Realizado o processo de escolha desses documentos, a trajetória percorrida

foi marcada pela sua exploração com intuito de entender: a lógica de sua

estruturação, a identificação da inserção do conceito de multiplicação, o tratamento

didático do referido conceito, prenúncios de ideias do campo conceitual multiplicativo

de Vergnaud.

Dessa forma, inicia-se o estudo analítico propriamente dito, pois são

adotados os PCNs, como documento de referência para o estudo do conceito de

matemática e, ao mesmo tempo, remete-se ao referencial teórico adotado. Também,

não menos importante, foi à delimitação de um conceito matemático proposto:

campo conceitual multiplicativo, com a concepção teórica de Vergnaud, que envolve

a multiplicação e divisão de números naturais. Ainda, foi necessário estabelecer

outro recorte referente à série escolar a ser focada. Para tal, a opção foi pelas séries

iniciais do ensino fundamental, mais especificamente o que os PCNs estabelecem

como 1º e 2º ciclos.

Essa leitura inicial possibilitou duas determinações para o processo de

análise do objeto propriamente dito da pesquisa. A primeira foi voltar-se

exclusivamente para o documento intitulado ―Parâmetros Curriculares Nacionais de

Matemática: Ensino de primeira a quarta série‖, consequentemente deixou-se a

margem os demais, quais sejam: Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino de

primeira à quarta série, Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino de quinta a

oitava séries, Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática: Ensino de quinta a

oitava séries.

A segunda determinação diz respeito à definição das categorias de análise,

cuja opção foi buscá-las no próprio referencial teórico e de ordem conceitual

referente ao campo multiplicativo. São elas: isomorfismo de medida, produto de

medida e proporções múltiplas.

Como na leitura preliminar foi observado que os PCNs apresentam as

operações de multiplicação e divisão de números naturais com ênfase em quatro

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ideias conceituais (multiplicação comparativa, ideia de proporcionalidade,

configuração retangular e ideia de combinatória), a análise privilegiou as possíveis

inter-relações com as categorias de Vergnaud, anteriormente citadas.

Como forma de argumentos procurou-se trazer evidências do objeto de

estudo com recortes de trechos dos PCNs. Também, se estabeleceu um diálogo de

teor comparativo com a base teórica. Ou seja, entre as quatro ideias que o

documento considera como características principais do conceito e as categorias do

campo conceitual multiplicativo, no entendimento teórico de Vergnaud. Além disso,

foi observado outro princípio da teoria ao propor que a abordagem conceitual, em

situação de ensino e aprendizagem, ocorre por meio de situações problemas com

apelo cotidiano. Atentou-se, ainda, para outro pressuposto teórico que estabelece

um modelo de aprendizagem que procura aproximar o conhecimento científico ao

conhecimento escolar, como forma do aluno aprender os conteúdos matemáticos

em questão.

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2. FUNDAMENTOS DA PESQUISA

2.1. A realidade matemática.

É sobressalente, na literatura referente à Educação Matemática, afirmações

de que o conhecimento matemático é visto, na atualidade, como um saber estático e

inquestionável. Mas essas denúncias não são algo recente, pois Caraça (1984)

manifestava-as ao dizer que uma concepção corrente nos ambientes científicos e

educacionais era de que a matemática não possui dinamicidade de contexto, tendo

um caráter finalista, ou seja, sem ligações com a realidade social humana.

Essa ideia se traduz no ato de ensinar e aprender e, segundo Fiorentini

(1995), atribui ao professor o papel de mero transmissor de conhecimentos.

Consequentemente, cabe a ele a tarefa simplista de buscar os conteúdos de ensino

nos livros didáticos que, por sua vez, são organizados conforme preconizações de

programas de ensino oficiais. Ao aluno, cumpre o papel de receptor passivo do que

é exposto, em sala de aula, e sua aprendizagem assume um caráter dogmático.

Por extensão, com diz Machado (1987, p.9), difunde-se entre os ―leigos e

especialistas de que o conhecimento matemático possui características gerais de

objetividade, de precisão, de rigor, de neutralidade do ponto de vista ideológico.‖ O

referido autor também considera equivocado o tratamento dado a matemática, na

atualidade, em duas dimensões. A primeira, a técnica, destinada aos especialistas; a

segunda, a lúdica, dirigida ao cidadão comum.

Entretanto, há exceções, pois no processo de aprendizagem escolar, se

apresentam proposições para a superação dessas concepções predominantes,

referidas anteriormente. As novas propostas que passam a ocupar alguns espaços

nas práticas do ensino aderem à concepção empírica do processo de obtenção do

conhecimento matemático e ao pragmatismo pedagógico que caracterizam o

movimento da Escola Nova. Além disso, se baseiam muito mais nos resultados das

pesquisas dos campos científicos e tecnológicos, do que nas metodologias que os

conduziram a tais resultados. Essa nova proposta também passa a ser alvo de

questionamentos, o que gera a busca de alternativas metodológicas que propiciem

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uma aprendizagem inovadora ao conceito empirista de ensino. Becker (1993, p.61)

faz crítica ao empirismo no ensino de matemática com o seguinte argumento:

[...] é sempre incapaz de dar uma explicação satisfatória para o conhecimento matemático. Incapaz, porque o empirismo parte do pressuposto de que a verdade matemática – como, aliás, qualquer verdade – está inscrita nos objetos, e é retirada destes por uma abstração simples ou empírica.

A proposta de Becker (1993) tem seus fundamentos na epistemologia

genética que, por sua vez, se constitui na base teórica da proposta pedagógica

construtivista. Nesse sentido, afirma:

A explicação piagetiana, ao contrário, entende que o conhecimento matemático é eminentemente uma construção efetuada na interação sujeito-objeto, e originária de um processo de abstração reflexionante, abstração que implica tomada de consciência ou apropriação pelo sujeito dos mecanismos da própria ação humana e de suas coordenações, assim que se tornam conscientes. (BECKER, 1993, p.61).

Contudo, segundo Fiorentini (1995), o construtivismo teve algumas

adesões na educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental. A parcialidade

com que novas tendências atingem os ambientes escolares abre duas

possibilidades: a conservação do modelo estático e a apresentação de outras

propostas pedagógicas. Estas últimas trazem o slogan de que um conhecimento

estático deve e tem que ser superado. Cita-se entre outras tendências:

etnomatemática, modelagem matemática, tecnologia e educação matemática, uso

da história da matemática no ensino, resolução de problemas e a didática da

matemática francesa. Entretanto, elas têm recebido adesões tênues por parte de

quem ensina a matemática nos diversos níveis de escolaridade do sistema

educacional brasileiro. Isso ocorre pela concepção dominante de uma educação

baseada nos resultados, que exclui do processo de aprendizagem a compreensão

do conhecimento em favor da ênfase à memorização mecânica. Tal posicionamento

constitui - adotando um dos pensamentos da didática da matemática francesa – em

obstáculos epistemológicos e didáticos para os professores e, por extensão, pois

impedem que o estudante, não desenvolva uma concepção científica de

matemática.

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Como consequência, conforme Ruiz (2001), o analfabetismo matemático de

nossa sociedade é denunciado por diversas maneiras e por diferentes linguagens. O

analfabetismo matemático é estudado por Paulos (1994) que entende como sendo a

baixa desenvoltura das pessoas com os números e probabilidades a eles

associadas. Por isso, provocam decisões confusas, respostas equivocadas e uma

perspectiva em absorver conhecimentos embasados no senso comum, sem o

devido crivo científico.

Paulos (1994) diz que não são claras as evidências das consequências do

analfabetismo matemático. Contudo, alerta que as sociedades atuais são

dependentes do conhecimento matemático e das ciências. Mas, contraditoriamente,

se mantêm indiferentes aos cidadãos que acabam por se tornarem analfabetos

matemáticos e científicos, por consequência da falta de estudo nessas áreas.

As preocupações de Paulos (1994) não se referem ao uso de algoritmos,

memorização de tabelas, habilidade em recitar regras, destreza de escrever

números e competência de "fazer como o modelo‖. Em vez disso, sua inquietação é

pela falta de senso matemático das pessoas, perante os problemas que enfrentam

com esse campo do saber.

Nesse sentido, Stewart (1996, p.114) propõe a descaracterização de um

analfabetismo matemático, ao dizer que as ferramentas para o uso da matemática

são as idéias e não os símbolos ou contas. Esses últimos, segundo o autor, apenas

servem como exercícios braçais. A matemática é um sistema de pensamento com

diferentes idéias e as relações estabelecidas entre elas.

O contexto de preocupações com as deficiências educativas matemáticas

dos estudantes e da população em geral tem levado a distinção entre o que Papert

(1986, p.73) considera a matemática - como um vasto domínio de investigações,

cuja beleza raramente é avaliada pela maioria dos não-matemáticos - e a

matemática escolar. Ruiz (2001), ao fazer distinção entre matemática e matemática

escolar, diz que elas são absolutamente diferentes no que diz respeito ao objeto e a

epistemologia de ambas. Acrescenta: a primeira, prima pela exaltação da liberdade

do espírito em relação à realidade; a segunda, enfatiza a ordem, a sequência, a

obediência e a repetição. Para Gomes (2006), a simplificação da matemática escolar

tomou o rumo dos anseios didáticos, da forma rigorosa e sequencial dos fragmentos

a serem transmitidos. Dessa forma, ela perdeu o contato com o espírito matemático

e isso tem implicações decisivas nas aulas de matemática.

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O panorama pouco alentador da realidade matemática, como até agora

desenhado, tem propiciado o surgimento de perspectivas críticas de Educação

Matemática. Entre elas, cita-se a defendida pela Proposta Curricular do Estado de

Santa Catarina (1998), cuja base teórica é o materialismo histórico e dialético.

Sendo assim, concebe a matemática e o seu ensino como produção humana

histórica. O saber matemático passou por diversas reelaborações e apresenta-se,

atualmente, em um nível altíssimo de abstração e isso se deve, em grande parte,

pelas possibilidades da dinâmica que os conceitos inerentes a esta disciplina

possuem.

Contudo, o caminho ainda está aberto para novas possibilidades, pois os

anos se passaram e as propostas se mantém vivas entre os seus adeptos

pesquisadores, mas não conseguem se solidificar na prática escolar.

2.2. A noção de obstáculos epistemológicos em Bachelard.

A noção de obstáculo epistemológico foi desenvolvida pelo filósofo francês

Gaston Bachelard, que viveu em uma época de construções revolucionárias na

ciência contemporânea, a luz especialmente da Física Relativística, das Geometrias

Não-Euclidianas e da Mecânica Quântica. Os pressupostos de Bachelard são

decorrentes da crítica ao realismo ingênuo, ao empirismo e ao racionalismo

cartesiano que norteiam os discursos e as práticas científicas. Seu discurso não

trata de um diálogo com os cientistas, mas uma reflexão filosófica. Ou seja, sua

preocupação não tem intuito de elaborar normas para a realização da ciência. Em

vez disso, faz interpretação do que é realizado pelo cientista e estabelece um

diálogo com os filósofos sobre a ciência de ponta.

O seu conceito de epistemologia apresenta-se como um referencial

questionador aos pressupostos empírico-positivistas. Desenvolve o sentido do

fenômeno científico como construção instrumental e teórica; defende a noção de real

científico como construção humana e a perspectiva de relação sujeito-objeto com

mediação pela técnica.

Bachelard entende que o progresso científico não se dá de forma linear, mas

sim descontinuísta, dialético e inacabado. A ciência projeta ao individuo a presença

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de revoluções e não de evoluções. Nesse sentido, o progresso científico acontece

pelas descontinuidades ou rupturas, estas últimas entendidas como negação a uma

trajetória de erros. Referenciam uma descontinuidade entre o senso comum e o

conhecimento científico e, também, denotam a caracterização das dificuldades na

elaboração dos conhecimentos.

O modo de ocorrência das rupturas no campo científico é uma das

inquietações epistemológicas de Bachelard (1996). Suas interrogações se voltam

para o pesquisador das ciências por colocar muito de si próprio na atitude de

conhecer. Dessa forma, contamina o conhecimento com sua subjetividade, seus

imaginários pueris, dentre outros sentimentos. O autor em referência diz que o não

controle dessas variáveis é determinante para que o ato de conhecer permaneça

contaminado de impurezas, que escapa do controle dos cientistas. Nesse contexto,

que é fundamental o conceito de obstáculos epistemológicos.

O caráter inconsciente do espírito científico gera o mau pensamento,

característico dos dados adquiridos pelos sentidos, que reforçam a dificuldade da

ascensão de valores racionais. Assim, o obstáculo epistemológico, conforme

Bachelard (1996) traduz o embate do pensamento contra pensamento. Parte do

pressuposto que a subjetividade do conhecimento, principalmente aquele de cunho

afetivo, torna-se um empecilho ao conhecimento objetivo. O bloqueio pode estar

ligado: à intuição e aos aspectos imediatos e sensíveis; às experiências primeiras;

às relações imaginárias; aos conhecimentos gerais, unitários e pragmáticos; às

analogias; às perspectivas filosóficas empiristas, realistas, substancialistas e

animistas; aos interesses, hábitos e opiniões de base afetiva, entre outros.

Bachelard (1996) entende que a compreensão do progresso da ciência de

forma clara, requer a discussão do problema dos obstáculos epistemológicos. Isso

requer a utilização de conteúdo histórico produzido nos meios científicos, a fim de

perceber a revolução que acontece na trajetória de produção dos conceitos.

Entretanto, alerta de que a opinião posiciona-se como o primeiro ―obstáculo

epistemológico‖, pois ela "pensa mal" e, dessa forma, "se incrusta no conhecimento

não questionado". (BACHELARD, 1983, p.148).

Ao estudar o conceito de obstáculo epistemológico no desenrolar histórico da

ciência, Bachelard (1983) conclui que alguns conhecimentos travam seus próprios

desenvolvimentos, pela interpretação deturpada que passa a ser um obstáculo, ou

um contra-pensamento.

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Mas as obras de Bachelard, não ficam restritas às questões

epistemológicas, pois têm um apelo pedagógico. Não deixavam à margem as

condições necessárias para resolução dos problemas característicos do ensino e da

aprendizagem. Ele mesmo explicita o seu interesse por questões pedagógicas:

Léon Brunschvicg, com aquele matiz de crítica sempre benevolente que dava tanta força a suas observações, surpreendeu-se, certo dia, de me ver atribuir tanta importância ao aspecto pedagógico das noções cientificas. Respondi-lhe que eu era, sem dúvida, mais professor que filósofo e que, além do mais, a melhor maneira de avaliar a solidez das ideias era ensiná-las, seguindo nisso o paradoxo que se ouve com tanta frequência nos meios universitário: ensinar é a melhor maneira de aprender. (BACHELARD, 1977, p.19).

Esse cunho pedagógico da epistemologia bachelardiana requer a atenção do

professor de que o conhecimento científico implica em uma ruptura com a

experiência primeira e o senso comum. Há, pois, um teor de superação subjacente à

ideia de obstáculo epistemológico. Assim sendo, a atividade de ensino e de

aprendizagem é imprescindível que o professor busque no desenvolvimento

histórico do conhecimento a ser ensinado as ideias que os caracteriza, seus

momentos de estagnação, e seus períodos de superação.

Desse modo, os obstáculos epistemológicos passam a ter o entendimento

de obstáculos pedagógicos, na esfera educacional. Bachelard faz a crítica ao não

reconhecimento, por parte dos docentes, da existência dos obstáculos na formação

do pensamento científico. Não admite que os mesmos se ausente no processo

educativo.

Acho surpreendente que os professores de ciências, mais ainda que os outros se possível fosse, não compreendam que alguém não compreenda. Poucos são os que se detiveram na psicologia do erro, da ignorância e da irreflexão. (BACHELARD, 1996 p. 23).

Para Bachelard (1996), o estudante adentra ao espaço escolar com suas

apropriações que ocorreram no cotidiano de sua trajetória de vida. Por outra parte,

muitos professores acreditam que a escola é o lugar apenas de transmissão e

assimilação do conhecimento científico. O autor extrapola essas duas posições e

propõe que, no âmbito da escola, deve acontecer a superação do conhecimento

cotidiano, por meio da derrubada dos obstáculos acumulados na vida desse

estudante. Para tal, pressupõe uma psicanálise dos erros iniciais - erros

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epistemológicos – que se tornam compreensões dos estudantes sobre algumas

ideias, de algumas informações ou do objeto de estudo. Esclarece:

Desse modo, toda cultura científica deve começar, como a explicamos extensamente, por uma catarse intelectual e afetiva. Resta depois a tarefa mais difícil: pôr a cultura científica em estado de mobilização permanente, substituir o saber firmado e estático por um conhecimento aberto e dinâmico, dialetizar todas as variáveis experimentais, dar, enfim, à razão, razões de evoluir. (BACHELARD, 1983, p. 151).

O erro é outro conceito observado por Bachelard, que não pode ser

compreendido como na pedagogia tradicional, como sendo algo prejudicial e

limitador para o saber. Tanto no desenvolvimento da ciência como no processo

educativo, o erro tem sua função específica na gênese do conhecimento, de forma

que não pode ser tratado como uma simples privação ou carência. Tem sua

formação e características próprias e é necessário à ciência, que é construída com

base na retificação dos erros. Para Bachelard (1983) o conhecimento contra um

conhecimento anterior, destrói o conhecimento mal feito, superando-o no próprio

espírito e criando um obstáculo à espiritualização.

A noção de obstáculo, atualmente, é foco de pesquisas e também de um

novo horizonte de interesses pedagógicos. Nesse contexto, o erro é reconhecido

como algo intrínseco ao conhecimento, bem como conectado às relações entre o

conhecimento científico e às concepções trazidas pelos estudantes de seus

cotidianos.

Diversas pesquisas em didática da matemática, que têm se fundamentado

nessa perspectiva teórica, realizam interpretações e aproximações diferenciadas da

idéia de obstáculo. Contudo, apresentam duas conclusões em comum: a análise das

condições e meios favorece uma evolução das concepções dos estudantes; e o

consenso de que o obstáculo é uma passagem obrigatória. Na subseção a seguir,

tratar-se-á dessas questões especificamente em educação matemática.

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2.3. A matemática e os obstáculos epistemológicos

Bachelard (1996) trata de obstáculos nas diversas ciências. Porém, percebe-

se uma ausência no que diz respeito à matemática. Isso pode ser explicado pela sua

compreensão de que a matemática passou por períodos de pausa na produção de

seus conhecimentos sem, contudo, atingir um nível de estagnação ou conviver com

erro que impedisse seu avanço. Se comparada com o processo de desenvolvimento

de outras ciências, a história da matemática é marcadamente regular. Contudo,

entende-a como uma atividade que também desenvolve teorias e contribui para a

produção do conhecimento de outras ciências.

No entanto, suas formulações e pressupostos, principalmente sobre

obstáculos epistemológicos foram e continuam sendo referencial para a Didática da

Matemática. Os franceses George Glaeser e Guy Brousseau foram os primeiros a se

dedicarem aos estudos com a intenção de articular os conceitos bachelardiano ao

ensino de Matemática. Importante para tal, foi a ideia de Bachelard de que a noção

de obstáculos epistemológicos pode ser estudada no desenvolvimento histórico do

pensamento científico e tem contribuições para o ensino. A precaução é de que eles

são resistentes e persistentes, com a probabilidade que tenham manifestações

equivalentes no pensamento do aluno.

Glaeser (1981 e 1985) apresenta um estudo detalhado sobre os obstáculos

epistemológicos dos números relativos, mais especificamente da construção da

regra de sinais da multiplicação e suas implicações para o processo de

aprendizagem dos alunos do referido conceito. Para tanto, busca na história as

dificuldades, suas superações e permanências personalizando-as aos diversos

estudiosos. A pesquisa de Glaeser (1985) evidencia a lentidão da construção dos

números negativos (1500 anos) e toma com referência as primeiras e frágeis

elaborações de Diofante, passa pelas contribuições/dificuldades/superações de

Stevin, Descartes, Maclaurin, Euler, D’alembert, Carnot, Laplace, Cauchy até

Hankel. Sua surpresa é de que parece ter escapado da análise de muitos

historiadores da Matemática esse fenômeno dos obstáculos na construção da regra

de sinais da multiplicação de números relativos (o produto de dois números de sinais

iguais é positivo e o produto de dois números de sinais diferentes é negativo).

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Brousseau é quem inicia e aprofunda a teorização das formulações de

Bachelard para o ensino da Matemática. Nesse sentido, em 1976, profere uma

palestra sobre “Os obstáculos epistemológicos e os problemas em Matemática”, no

XXVIII Encontro do CIAEM, que marca a inserção da noção de obstáculo no

contexto didático.

Brousseau (1983), ao tratar da noção de obstáculos cognitivos, refere-se

àqueles que aparecem no sistema educativo, que são inevitáveis. Classifica-os,

quanto à sua origem, em: ontogenéticos, didáticos, epistemológicos e culturais. Os

obstáculos de origem ontogenética resultam de limitações que surgem em

determinado momento do processo de desenvolvimento de um indivíduo. Por

exemplo, uma criança que distingue, por um determinado procedimento, a

quantidade quatro e não consegue adotá-lo para outro número. Os obstáculos de

origem didática se referem aos equívocos cometidos no sistema de ensino.

Dependem ―de uma escolha ou de um projeto do sistema educativo‖ (BROUSSEAU,

1983, p. 177), que levam a conhecimento errôneo e a consequente compreensão

dos conceitos a serem aprendidos.

Dessa forma, uma concepção metodológica, que prioriza a mecanização do

de procedimentos algoritmos das operações em detrimento da compreensão

conceitual, gera um obstáculo para um verdadeiro processo de construção de

conhecimento. Os obstáculos cognitivos de origem epistemológica dizem respeito às

dificuldades surgidas e inevitáveis no processo de produção do conhecimento. Por

fim, os obstáculos culturais que, normalmente, se apresentam no estudo de um

conhecimento que tem sentido distinto daquele da cultura do aluno. De acordo com

Grando (1995, p. 111), eles têm relação com conhecimento que os estudantes

necessitam ou desejariam desenvolver, que não existem na cultura científica.

Para Brousseau (1983), o conceito de obstáculos no ensino de

matemática é uma oportunidade do professor criar situações problemáticas e

interações dialéticas, de forma que o aluno se envolva na seguinte dinâmica: utiliza

conhecimentos anteriores para submetê-los à revisão e proponha modificações; em

seguida, completa-os ou os rejeita, o que caracteriza a possibilidade para a

aprendizagem de novos conceitos.

Para os pesquisadores que adotam a noção de obstáculo didático, não só

muda o foco do processo ensino-aprendizagem, como também a concepção de

erros e os obstáculos, que deixam de ser algo inerente apenas à subjetividade dos

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alunos. Nesse sentido, Brousseau chama atenção para que a noção de obstáculo

epistemológico seja entendida como um conhecimento e não como a falta dele ou

uma dificuldade imposta pelo próprio conteúdo. Também, alerta que um

conhecimento somente poderá ser declarado como um obstáculo, desde que se faça

uma leitura que não contemple o conceito de dificuldade. Nesse sentido, Duroux

(1982 apud Brousseau 1983, p.190) diz que, pelo fato do obstáculo ser considerado

um conhecimento, basta reformular a ―dificuldade‖ estudada, não na ótica da falta de

conhecimento, mas da falseabilidade e incompletude do verdadeiro conhecimento

que precisa ser superado. Só assim, a dificuldade mostra-se menos resistente.

Vale reafirmar que Brousseau (1983), assim como Bachelard, diz que a

utilização dos obstáculos no ensino, requer triplo procedimento: identificar as suas

manifestações na história da matemática, encontrar os seus traços nos modelos

espontâneos dos estudantes e apresentar situações pedagógicas para o seu

enfrentamento. Como exemplo da relação ―obstáculo-história‖ e ―obstáculo-

desenvolvimento do indivíduo‖, cita-se Cornu (1983 apud Brousseau 1997), ao

relatar que o aparecimento de obstáculos no ensino-aprendizagem referente à

noção de limite, tem ligações que corroboram na afirmação de que as dificuldades

dos estudantes se aproximam dos obstáculos atestados pela história.

Schubring (1998) também concorda com o paralelismo entre o

desenvolvimento de conceitos matemáticos como caminho do empírico ao abstrato e

o progresso intelectual dos estudantes. Entretanto, Bittencourt (1998) diz que

Brousseau propõe um método para a identificação dos obstáculos na didática da

matemática, que consiste de três fases: encontrar erros sistemáticos e concepções

em torno das quais eles se agrupam (obstáculos de origem didática); identificar

obstáculos na história da matemática (obstáculos de origem epistemológica);

encontrar as limitações originadas neurofisiologicamente, entre outras, do estudante

num determinado momento de seu desenvolvimento (obstáculos de origem

ontogênica).

Conforme Brousseau (1983, p. 171), os obstáculos se revelam nos erros,

entendidos como sendo ―o efeito de um conhecimento anterior, que teve seu

interesse, seu sucesso, mas que, agora, se revela falso, ou simplesmente

inadaptado‖. O erro é recorrente e não aleatório cometido pelos estudantes no

processo de construção do novo conhecimento. Está, pois, atrelado ao um modo de

pensar que não é verdadeiro e se explicita de forma inconstante.

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Estes erros estão ligados entre si por uma fonte comum: uma maneira de conhecer, uma concepção característica, coerente, se não correto, um conhecimento antigo e que obteve êxito em todo domínio de ação. Erros que não são facilmente explícitos e não podem desaparecer radicalmente, de uma forma instantânea. Persistem num momento, ressurgem em outros, se manifestam muito tempo depois do sujeito ter rejeitado o modelo defeituoso de seu sistema cognitivo. (BROUSSEAU, 1983, p.173).

Dessa forma, os erros se constituem de importância no processo ensino-

aprendizagem. Sendo assim, não podem ser descartados como querem algumas

teorias, por acreditarem que o aparecimento desses erros em situações didáticas

deve ser evitado e, se percebidos antecipadamente, devem ser eliminados.

Nesse sentido, Brousseau (1983) também alerta de que a precocidade de

aprendizagem, mesmo que efetiva, pode contribuir para a transformação de um

conhecimento em um obstáculo intransponível. Para tal, chama a atenção para que,

no intuito de superação de um obstáculo, não basta que se proceda à comunicação

das informações a serem ensinadas, ―mas de encontrar uma situação na qual elas

são as únicas a serem satisfatórias ou ótimas – entre aquelas às quais se opõem –

para obter um resultado no qual o aluno se dedicou.‖ (BROUSSEAU, 1983, p.179).

Ou seja: ―consistirá em propor uma situação suscetível de evoluir e de fazer evoluir o

aluno segundo uma dialética conveniente‖.

A noção de obstáculo, como tratada por Brousseau, tem assumido

dimensões de importância, tanto no processo educativo como na pesquisa em

Educação Matemática. De acordo com Igliori (1999), essa temática abre as

possibilidades de percepção da interdependência entre a epistemologia e a didática

da matemática. No Brasil, desde a década de 90, cresce os estudos e publicações

sobre essa perspectiva teórica, entre outras cita-se: Grando (1995), Andrade (1996),

Bittencourt (1998), Igliori (1999), Paes (2001), Gomes (2006) e Miranda (2007).

Vergnaud (1988) também trata da noção de obstáculos na didática da

matemática. No entanto, questiona o uso do termo obstáculo em determinadas

situações pelos pesquisadores. Adverte que há necessidade de se estabelecer a

distinção entre: "dificuldades conceituais, erros didáticos e verdadeiros obstáculos

epistemológicos". Assim, existem dificuldades próprias dos conceitos e das operações

que, de modo algum, podem ser considerados obstáculos.

Uma dificuldade só se constitui em obstáculo se traz consigo uma contradição

entre uma concepção a superar e aquela a ser assimilada. De acordo com Grando

(1995, p.111), Vergnaud distingue dois tipos de dificuldades. Uma delas se

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caracteriza pela existência de ―saltos do pensamento‖ sem que entrem em

―contradição com as concepções e competências anteriormente formadas. Um

segundo tipo – que formam obstáculos epistemológicos propriamente ditos – requer

uma análise para que ocorra a mudança de concepção, bem como para a

compreensão da relação entre a concepção a formar e a existente.

Decorre, então, a necessidade da referida distinção como base do trabalho

docente, uma vez que as proposições didáticas se diferenciam quando trata dos

verdadeiros obstáculos e das dificuldades conceituais.

Por sua vez, os obstáculos epistemológicos, segundo Vergnaud, não se

pode ignorá-lo ou ―saltá-lo‖, em vez disso, superá-lo. Por isso, a exigência de uma

análise da contradição entre as concepções anteriores – que precisam ser rejeitadas

- e as novas concepções em processo de assimilação.

2.4. A teoria dos campos conceituais

O trabalho de Vergnaud (1996) tem foco na construção de representações

simbólicas pelos estudantes, no processo de generalização e abstração dos

conhecimentos. Nesse sentido, o pressuposto de Vergnaud (1996) é de que um

determinado conceito não está atrelado somente a uma situação que, por sua vez,

não pode ser analisada à luz de um único conceito. No processo de construção do

conhecimento em situação de ensino e aprendizagem, existe uma inter-relação entre

conceitos que requer uma diversidade de situações didáticas e problemas.

Vergnaud (1991) afirma que, para acontecer conceitualização, se faz

necessária uma representação com significado e sua proposta é a ideia de campos

conceituais. Assim, por exemplo, explica que a estrutura multiplicativa envolve

inúmeros conceitos, que não podem ser abordados - em situação de ensino e

aprendizagem - de forma independente, mas sim com conceitos interconectados,

que abrange: a estrutura aditiva, a operação de multiplicação e divisão, frações, raiz,

números racionais, função linear e não-linear, análise dimensional e espaço vetorial.

Vergnaud (1983), com base no estudo do comportamento de uma criança

frente a problemas aritméticos elementares, estabelece a distinção de dois tipos de

cálculo: o "cálculo numérico", referente às operações ordinárias de adição,

subtração, multiplicado e divisão; e o ―cálculo relacional‖ que diz respeito às

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operações de pensamento, no reconhecimento das relações presentes numa

situação. Este cálculo é expresso por teoremas ou falsas inferências, que não são

necessariamente explicados pela criança: eles podem se tornar hipóteses apenas

pela observação das ações das crianças. Vergnaud (1991, 1996) chama-os de

teoremas-em-ato e define-os como relações matemáticas que os alunos levam em

consideração ao escolher uma operação ou uma seqüência delas para resolução de

um dado questionamento. Raramente são expressos de forma verbal e pode até

ocorrer que estejam errados. Eles surgem, espontaneamente, em contextos simples;

por isso, não se caracterizam com universais.

É muito comum, entre os estudantes, o uso de teoremas-em-ato em

contextos fáceis e valores numéricos simples. Trata-se, pois, de uma base intuitiva

que não pode ser desconsiderada pelos professores no processo de ampliação e

formalização dos conceitos, pelos alunos, em situação de ensino e aprendizagem.

Cumpre aos professores, expressá-los e objetivá-los como forma de ajudar os

estudantes a usá-los em situações complexas.

Vergnaud (1994) é considerado o principal estudioso da teoria dos campos

conceituais, que a considera subsidiadora no processo de construção do de forma

que os alunos estabeleçam as conexões entre os diversos conceitos de um

determinado campo. Para ele, uma proposta de ensino que apresenta isoladamente

os conceitos, gera dificuldade no estabelecimento dessas vinculações que, por

extensão, requer o desprendimento de um tempo maior para o processo de

assimilação da totalidade dos conceitos.

Para argumentar contra as reações por parte dos defensores do ensino de

conceitos isolados, Vergnaud (1994) diz que as escolas, por suas convicções,

desconsideram a capacidade do ser humano articular diversos conceitos. Por isso,

rejeita a ideia de ensino que obedece ao critério de partir de conceito mais simples

para o mais complexo. Para tal, exemplifica que os alunos dificilmente entenderão a

lógica de que calcular o preço de 5 miniaturas de carro a quatro dólares cada, o seu

valor é expresso em dólar em vez de carro. (VERGNAUD, 1994, p.47).

Para o autor, as crianças apresentam diferentes possibilidades intelectuais.

Para tanto, elucida que, por volta dos 7 - 8 anos, as crianças não conseguem atentar

para mais de uma variável de uma determinada situação, o que as levam a fixar em

somente uma delas. Assim, elas podem apresentar dificuldades no processo de

entendimento de que 4 dólares vezes 5 carros (4 5) como significando o

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envolvimento de 4 dólares, repetitivamente em 5 vezes. Da mesma forma, não

conseguem estabelecer a relação de comutatividade, por exemplo, 4 5 e 5 4

como similares. Por isso, Vergnaud (1994, p.58), considera sua ―teoria mais

consistente por ter uma base na epistemologia da matemática e na psicologia da

aprendizagem matemática.‖

2.4.1. O campo conceitual multiplicativo

Em vários trabalhos de Vergnaud, é dado um tratamento com ênfase na

estrutura multiplicativa, com apresentação de categorias, especificadas em três

grupos: isomorfismo de medida, produto de medida e proporções múltiplas. Estas

constituirão as subseções a seguir, em que são apresentadas as principais ideias e

características de cada grupo anteriormente especificado. Para tanto, far-se-á uma

síntese tanto do exposto por Vergnaud, como também de autores que dele fizeram

leituras para fundamentar seus estudos.

2.4.1.1. Isomorfismo de Medida

Refere-se à idéia de proporção direta entre duas grandezas. Por exemplo, a

relação entre o custo de uma unidade a ser adquirida e aquisição de várias

unidades. Assim, um lápis custa R$ 2,00, dois lápis custam R$ 4,00, e assim por

diante.

Genericamente, dir-se-ia que trata de proporção direta, pois duas grandezas,

Y1 e Y2, têm dependência linear entre si. Vale dizer que essas grandezas, por se

tratarem de uma dada situação da realidade, elas podem ser:

a) Discretas: que tem relação direta com a contagem;

b) Contínuas: que tem relação direta com as medidas.

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O isomorfismo de medida, segundo Vergnaud, se divide em três subclasses,

no que diz respeito às operações que as constitui: multiplicação, divisão, problema

da regra de três.

Na multiplicação, ocorrem quatro termos relacionados entre si, em que o

terceiro deve ser extraído pelo estudante. Nesse sentido, Vergnaud, conforme

Nehring (2001) estabelece dois métodos de pensamento: lei binária de composição

e operação unívoca. A Lei binária de composição considera os fatores da

multiplicação a b, não como grandezas, mas como dois números. Como Operação

Unívoca, o processo multiplicativo pode ocorrer por dois caminhos distintos: um

deles o fator ―b‖ é um operador escalar, ou seja, ―b‖ não é representativo de uma

dimensão. Existe, pois, uma razão que envolve duas grandezas de mesma espécie.

O outro caminho reconhece um operador de junção - em que o fator ―a‖ representa o

coeficiente da função linear - sua dimensão e o quociente de duas outras

dimensões. De acordo com Nehring (2001, p.77):

Os operadores escalares ou procedimentos escalares usam uma relação entre quantidades ou magnitudes de mesmo tipo, n vezes, n vezes menos, ou seja, não levam em consideração, as magnitudes das grandezas envolvidas, não possui dimensão. Já os operadores funcionais ou procedimentos funcionais, levam em consideração, as dimensões envolvidas.

No que diz respeito à subclasse da divisão, Vergnaud subdivide-a em duas

categorias, assim definidas. A primeira delas requer que se encontre o valor

unitário, com a aplicação de um operador escalar ― b‖ na grandeza ―c‖. De acordo

com Nehring (2001), com base em Vergnaud, como consequência de suas

dificuldades de transformar ― b‖ em ― b‖ recorrem a procedimentos de tentativa e

erro, X b = c. Em outras palavras buscam resposta a pergunta: qual o número que

multiplicado por ―b‖ e igual a ―c‖? Para a autora em referência, trata-se de um

―procedimento faltoso/factual‖, que pode desviar a dificuldade conceitual, porém, tem

suas vantagens somente para números naturais pequenos.

A segunda subclasse da divisão diz respeito à determinação de “x”

conhecendo f(x) e f(1), que requer a inversão do operador da função, bem como a

aplicação de a em b. Essa situação pode acarretar em dificuldade para as crianças,

pois, nesse caso, a inversão do operador apresenta uma dimensão inversa da

operação direta.

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Nesse sentido, Vergnaud indica três estratégias:

Inversão do operador, entretanto alerta que pode ser difícil para os

estudantes tanto pela inversão propriamente dita, como também pelo fato dela ter

uma dimensão.

Determinação de o operador escalar, precedida de sua transposição

para Y1.

Recorrência a procedimentos aditivos do tipo a + a + ..., até atingir a

soma ―b‖, posteriormente, contar a quantidade de ―a‖.

A subclasse ―problema de regra de três: caso geral‖ envolve distintos

procedimentos de solução, bem como diferentes propriedades ao se relacionar os

três dados (valores numéricos) explicitados no problema e a incógnita, relacionadas

com duas ou mais grandezas. Nesse caso, pode ocorrer a presença da multiplicação

e a divisão e quatro valores (regra de três simples) ou seis valores (regra de três

composta).

O isomorfismo de medidas tem como peculiaridade o envolvimento de uma

relação quartenária, isto é, de quatro quantidades, como por exemplo, os problemas

de regra de três simples.

2.4.1.2. Produto de medida

Trata da composição cartesiana de duas grandezas, cujo produto tem uma

terceira significação. Cita-se, por exemplo, V = área da superfície da base vezes a

altura da sua aresta, na determinação do volume de um prisma de base retangular.

Portanto, envolve uma estrutura com três variáveis (X1, X2, X3) que, por

extensão, pode ser representada em tabelas de dupla correspondência. De acordo

com Nehring (2001, p.79), neste caso, ―existe um caminho canônico de escolha de

unidades f(1,1) = 1 (unidade de comprimento) (unidade de largura) = (unidade de

área). As unidades do produto são expressas como produtos de unidades

elementares (cm cm = cm2, cm cm cm = cm3...)‖.

Da mesma forma que no isomorfismo de medida, a categoria produto de

medida, também se manifesta em três operações: multiplicação, divisão e produto

cartesiano.

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A multiplicação a b = c inclui o valor da grandeza elementar para

determinar o produto de medida. Nehring (2001) e Gomes (2006) fazem a

interpretação de que essa multiplicação não é tão simples de ser analisada em

termos de operadores escalares e funcionais. Trata-se de um produto no verdadeiro

sentido da palavra, pois ocorre também para as próprias grandezas (aspecto

dimensional), além do valor numérico. Para ilustrar, recorre-se a Gomes (2006 p.92),

ao apresentar problemas que envolvem a determinação da área de um retângulo em

que é conhecida a medida da base e da altura. Ou o cálculo do volume de um

recipiente dado a medida da sua altura e a medida da área da seção transversal.

As autoras supracitadas estabelecem a diferença primordial entre a

multiplicação no isomorfismo de medida e o produto de medida, como sendo que, no

primeiro caso, não ocorre à multiplicação das grandezas, mas somente dos seus

valores. Ou seja, não é possível multiplicar caixas com ovos, na seguinte situação:

Compram-se 4 caixas de uma dúzia de ovos cada. Quantos ovos foram comprados?

Observa-se que em: 4 caixas 12 ovos = 48 ovos.

Por sua vez, o produto de medida, determina uma terceira grandeza que é

uma relação: ―multiplica-se metro por metro produzindo-se metros quadrados;

multiplicando-se meninos que dançam por meninas que dançam, produzimos pares

de dançarinos.‖ Nehring (2001, p.79).

Vale expressar nossa discordância com entendimento de que, por exemplo,

―multiplica-se metro por metro, produzindo-se metro quadrado‖ como exposto na

citação anterior. A explicação para tal divergência é que, assim como no

isomorfismo de medida, ocorre apenas a multiplicação de números em vez de

grandeza, mesmo quando ela trata de unidade de medida. Assim, o cálculo da área

de um retângulo de 4 metros de base e 3 metros de altura, o produto 4 3 = 12, pela

nossa compreensão, quer dizer que temos uma superfície com quatro colunas, em

que cada uma delas possui 3 unidades de áreas. Enfim, se tem 4 3u² = 12u², como

se vê na figura a seguir.

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Na subclasse da divisão, para definir uma grandeza qualquer, onde seu

procedimento não é descrito por operador escalar ou funcional, deve-se operar o

valor do produto das grandezas pelo valor elementar de outra grandeza, assim,

pode-se encontrar a quantidade da dimensão, ou seja, o quociente da operação.

Dessa, forma podemos dizer que tendo o volume de um cubo, em metros

cúbicos, divido pela área de sua face, em metros quadrados, pode-se encontrar a

medida da sua aresta em metros.

Segundo Nehring (2001, p.80), a categoria do produto de medida, difere do

isomorfismo de medida, pois pode ser determinado como um duplo isomorfismo. Da

mesma forma, o isomorfismo de medida, é visto como um produto, como exemplo do

tempo vezes a velocidade igual à distância ou o volume vezes densidade sendo

igual à massa.

Dessa forma, algumas grandezas, como a velocidade e densidade, possuem

a características de constantes e não podem ser consideradas como variáveis.

Contudo, se observa no produto de medida, tomando como exemplo o volume,

pode-se constatar que as duas grandezas elementares são variáveis. Ou seja, área

da base vezes altura igual ao volume.

Na determinação das estruturas isomórficas, o quociente das dimensões,

pode ser considerado como uma grandeza derivada e nunca como uma grandeza de

característica elementar. Ainda segundo Nehring (2001, p.80), o tempo velocidade

= distância, pelo motivo que velocidade = distância tempo. Assim entendendo que,

as grandezas elementares possuem função apenas elementar na estrutura do

produto de medida e não compreendem nenhuma característica de grandeza

quociente, no entendimento das crianças, quando as operam.

Na última subclasse apresentada, o produto cartesiano, caracteriza-se por

pares que são gerados em uma tabela de dupla entrada. Vergnaud (1983) ilustra

essa ideia multiplicativa com uma situação de formação de pares de dançarinos,

constituído de quatro meninas e três meninos.

As possibilidades podem ser obtidas por diferentes representações:

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a) Diagrama

b) Conjunto de pares ordenados entre chaves

{(A,1); (A,2); (A,3); (B,1); (B,2); (B,3); (C,1); (C,2); (C,3); (D,1); (D,2); (D,3)}

c) Tabela de dupla entrada

Meninos

Meninas 1 2 3

A A1 A2 A3

B B1 B2 B3

C C1 C2 C3

D D1 D2 D3

Os problemas da categoria de produto de medidas envolvem uma relação

ternária estabelecida entre três quantidades, em que uma delas se constitui do

produto de outras duas.

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2.4.1.3. Proporção Múltipla

Segundo Nehring (2001, p.76-77) se assemelha ao produto de medida em

relação ao tratamento aritmético. Entretanto, apresenta diferença por ter uma

grandeza proporcional a duas diferentes grandezas independentes. A autora citada

apresenta como exemplo a produção de leite de uma fazenda, sob certas condições,

como sendo proporcional ao número de vacas e ao número de dias do período

considerado.

Nesse caso, todas as grandezas possuem um significado particular e não se

reduzem ao um produto de outras. Dito de uma maneira contextualizada, não se

pode interpretar a dupla proporcionalidade como operador dimensional, em

situações como, consumo de um determinado alimento, número de pessoas e o

número de dias.

Na proporção múltipla, Vergnaud estabelece apenas duas subclasses:

multiplicação e divisão. A multiplicação é indicadora de procedimentos

multiplicativos. Entretanto, o autor estabelece dois tipos de divisão. O primeiro

requer a busca do valor unitário f(1,1), isto é, a divisão nem sempre é caracterizada

como um produto de medida. É típico dessa divisão situações problemas como:

Numa indústria se faz necessário determinar a produção média de peças nos 3

meses em que ocorreram os picos da produção. Dispondo de 20 máquinas a

produção foi de 62.400 peças. Determinar a produção diária.

O Segundo tipo de divisão requer encontrar o ―x‖ conhecendo f(x, a) = b e

f(1,1). Por exemplo: A capacidade de produção de uma fábrica é 800 peças

semanais. A distribuição padrão entre seus clientes é de 6 por semana. Quanto

tempo levará para serem abastecidos os 250 clientes.

Nehring (2001) diz que as estruturas de produto de medida e a proporção

múltipla apresentam três ou mais variáveis. Diferentemente, o isomorfismo de

medida exige apenas duas variáveis e é definido por um modelo funcional linear.

De modo geral, observa-se que Vergnaud (1996) denomina de campo

conceitual das estruturas multiplicativas o conjunto de situações que expressão a

necessidade da operação multiplicação, ou a divisão, como também a combinação

entre elas. Além disso, requer um conjunto de conceitos, suas propriedades e os

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teoremas que podem ser explicitados por diferentes representações na análise das

referidas situações.

Para Vergnaud (1991), a solução de uma situação problema requer um

conjunto de tarefas que são analisadas num determinado campo conceitual,

obedecendo ao nível de complexidade das possibilidades cognitivas a serem

desenvolvidas pelos alunos. Entra em cena, a observação do contexto da situação,

no que se refere aos seguintes aspectos: a familiaridade da situação, o campo

numérico e o domínio de validade de suas propriedades, as relações que se

estabelecem entre seus elementos e, finalmente as formas de representações.

Subjacente a cada situação, existe um conjunto de invariantes, que

Vergnaud (1996) denomina de ―teoremas-em-ato‖ e ―conceitos-em-ato‖, que permite

a ação operatória nos esquemas do estudante. As invariantes são classificadas em

três tipos lógicos. O primeiro tipo ―proposições‖ em que se incluem os teoremas-em-

ato, que são suscetíveis de serem falsos ou verdadeiros. Vergnaud (1996, p.163) diz

que, este conhecimento pode ser expresso por f(nx) = nf(x). Por exemplo, ―alunos

compreendem que, se a quantidade de objetos vendáveis for multiplicada por 2, por

3, por 4, por 5, por 10, por 100 ou por um número simples, o seu preço será 2, 3, 4,

5, 10 ou 100 vezes superior‖.

O segundo tipo ―função proposicional‖, os conceitos-em-ato, são

indispensáveis à construção das proposições e da conceituação. Por não serem do

tipo proposições essas invariantes não podem ser expressas em termo de falso e

verdadeiro. As funções proposicionais podem apresentar: um argumento referente a

uma propriedade, por exemplo, ―é vermelho‖; dois argumentos, isto é uma relação

binária, como ―estar acima de‖; três argumentos, relações ternárias, como ―a

diferença entre 8 e 6 é 2‖; quatro argumentos, proporcionalidade e mais de quatro

argumentos.

O terceiro tipo ―argumento‖ que requer determinadas afirmações. Assim para

Vergnaud (1996, p.174), ―quem diz função proposicional e proposição, diz

argumento‖. Um argumento pode se referir a objetos materiais como em ―o barco

que está à direita do farol‖; números, 6 – 4 = 2; relações, ―é menor que‖ e

proposições, ―10 é múltiplo de 5 e 5 é divisor de 10‖.

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3. PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: PROPOSIÇÕES PARA O

ENSINO DE MATEMÁTICA.

3.1. O que são os PCNs e suas propostas para a matemática

Os Parâmetros Curriculares Nacionais surgiram como uma proposta

curricular para orientar as ações docentes, consequentemente, os processos de

aprendizagem discente. Entretanto, não se constitui numa diretriz obrigatória, uma

vez que há estados e municípios brasileiros que elaboram suas próprias propostas

com base em pressupostos teóricos diferentes e, muitas vezes, coincidentes com o

referido documento oriundo do Ministério da Educação e Cultura. Os próprios PCNs

explicitam essa abertura ao alertar sobre a necessidade da escola atender a

diversidade cultural, étnico, político e territorial do Brasil. Contudo, se autoavalia

como ―um referencial de qualidade para a educação no Ensino Fundamental em

todo o país‖ (BRASIL, 1997, p.13). Tem como função principal orientar e garantir a

coerência dos investimentos feitos no sistema educacional em todo território

nacional. Portanto, trata-se de uma proposta aberta e flexível que respeita as

diferenças regionais e não se constituem em um documento impositivo, mas cumpre

um papel de orientar as questões educacionais. A escrita dos PCNs é coerente com

os pressupostos que adota e, ao mesmo tempo atende os princípios do contexto

político e histórico do momento em que foi elaborado.

Portanto, os Parâmetros Curriculares Nacionais trazem o slogan de uma

proposta que contribui para a melhoria da qualidade do ensino brasileiro e atrelada à

seriedade na aplicação do dinheiro público. Para Berticelli (1998), a elaboração de

um currículo acontece em um determinado tempo e espaço. Além disso, em sua

subjacência estão posturas assumidas que obedecem a discursos diferentes

galgados em filosofias que, por sua vez, tem intencionalidades distintas.

Para cumprir as suas finalidades, os PCNs chegam até os professores de

todo o Brasil, por distribuição da Secretaria de Educação Fundamental. A

elaboração de uma proposta em nível de um Ministério requer que se torne

conhecida nos meios escolares e entre os professores. Por isso, os PCNs passam a

ser referência para as secretarias municipais e estaduais de educação, rediscutirem

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suas ações educativas. Para tanto, iniciaram-se cursos de formação continuada para

professores e organizaram-se semanas pedagógicas como forma de promover o

debate sobre o conteúdo do referido documento. A temática era as concepções e

orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais com vistas a sua implementação

nas escolas. Cumpria-se, pois, o objetivo do envio para os professores: ―instrumento

útil no apoio às discussões pedagógicas em sua escola, na elaboração de projetos

educativos, no planejamento das aulas, na reflexão sobre a prática educativa e na

análise do material didático‖ (BRASIL, 1997, p.5). Ou seja, instrumento norteador de

todo o trabalho escolar.

A disciplina de Matemática foi tratada em dois volumes: Parâmetros

Curriculares Nacionais - Matemática (1997), com orientações para o ensino Básico

(1º e 2º Ciclos); Parâmetros Curriculares Nacionais - Matemática (1998), com

orientações para o ensino Básico (3º e 4º Ciclos), destinado ao ensino de 5º a 8º

séries.

Na apresentação desses documentos é explicitada a concepção do

conhecimento matemático que se pretende difundir na escola. Indica que o papel da

matemática é de instrumentar o aluno no exercício da sua cidadania. Para isso,

procedimento metodológico ideal é aquele que adota a Resolução de Problemas

―como ponto de partida da atividade Matemática‖ (BRASIL, 1998, p. 16).

Essa indicação é justificada, na historicidade, sobre as reformulações

curriculares da matemática, que assinalam as preocupações em buscar recursos

diferenciados e inéditos. Segundo pressupostos apontados por Brasil (1998),

existem dificuldades para o ensino brasileiro na especificidade da matemática, pois o

tratamento de seus conteúdos matemáticos é realizado de forma fragmentada,

desconexo e extenuante. Eles são percebidos somente como instrumentos para o

entendimento de conteúdos posteriores e como objeto matemático em si e não como

representação do outros objetos. Genericamente falando, observa-se a não

relevância em tentar uma consolidação e ampliação do conteúdo matemático por

meio de originais extensões, representações ou conexões com outros conceitos

Subjacente à crítica manifestada anteriormente, há proposição de que no

tratamento didático de um conceito matemático se explicite sua vinculação com

outros conceitos e situações de contextos. Essa preocupação coincide com a

afirmação de Vergnaud de que conceitualização requer a compreensão do conceito

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estudado, de forma que exista o traspasse e a coordenação entre as diversas

formas do objeto matemático em estudo.

As aproximações com Vergnaud também podem ser induzidas em duas

explicitações dos PCNs. Uma delas na concepção de saber matemático como sendo

―algo flexível e maleável às inter-relações, entre os seus vários conceitos e entre os

seus vários modos de representação e, também, permeáveis aos problemas nos

vários outros campos científicos.‖ (BRASIL, 1998, p. 26). A outra na apresentação

dos objetivos gerais para o ensino da matemática no Ensino Fundamental:

―estabelecer conexões entre temas matemáticos de diferentes campos e entre esses

temas e conhecimentos de outras áreas curriculares‖ (BRASIL, 1998, p. 48).

Observa-se, tanto na concepção quanto no objetivo, uma tendência ao

pressuposto das noções dos campos conceituais dos objetos matemáticos. Isso vai

se manifestar também no tratamento didático de cada conteúdo ao discutir as

diferentes significações ou ideias dos conceitos.

Também há indicativos implícitos dessas ideias nas orientações sobre a

seleção e estruturação dos conteúdos para o Ensino Fundamental. A proposição

ideal seria a de um trabalho com as diferentes representações do mesmo objeto

matemático, no sentido de aprimorar o desenvolvimento do conceito. Contudo

aborda, sim, a questão de procedimentos de seleção de conteúdos:

Há um razoável consenso no sentido de que os currículos de Matemática para o ensino fundamental devam contemplar o estudo dos números e das operações (no campo da Aritmética e da Álgebra), o estudo do espaço e das formas (no campo da Geometria) e o estudo das grandezas e das medidas (que permite interligações entre os campos da Aritmética, da Álgebra e da Geometria). O desafio que se apresenta é o de identificar, dentro de cada um desses vastos campos, de um lado, quais conhecimentos, competências, hábitos e valores são socialmente relevantes; de outro, em que medida contribuem para o desenvolvimento intelectual do aluno, ou seja, na construção e coordenação do pensamento lógico-matemático, da criatividade, de intuição, da capacidade de análise e de crítica, que constituem esquemas lógicos de referência para interpretar fatos e fenômenos. Um olhar mais atento para nossa sociedade mostra a necessidade de acrescentar a esses conteúdos aqueles que permitam ao cidadão ―tratar‖ as informações que recebe cotidianamente, aprendendo a lidar com dados estatísticos, tabelas e gráficos, a raciocinar utilizando idéias relativas à probabilidade e à combinatória. Embora nestes Parâmetros a Lógica não se constitua como bloco de conteúdo a ser abordado de forma sistemática no ensino fundamental, alguns de seus princípios podem ser tratados de forma integrada aos demais conteúdos, desde as séries iniciais. Tais elementos, construídos por meio de exemplos relativos a situações-problema, ao serem explicitados, podem ajudar a compreender melhor as próprias situações.

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Também algumas idéias ou procedimentos matemáticos, como proporcionalidade, composição e estimativa, são fontes naturais e potentes de inter-relação e, desse modo, prestam-se a uma abordagem dos conteúdos em que diversas relações podem ser estabelecidas. [...] a seleção de conteúdos a serem trabalhados pode se dar numa perspectiva mais ampla, ao procurar identificar não só os conceitos mas também os procedimentos e as atitudes a serem trabalhados em classe, o que trará certamente um enriquecimento ao processo de ensino e aprendizagem. (BRASIL, 1997, p. 38-39).

Basicamente os PCNs para Matemática sugerem uma nova proposta para o

ensino dos conteúdos e em sua subjacência, uma nova alternativa filosófica no

processo de assimilação e compreensão. Ao destacar o papel da matemática no

Ensino Fundamental reafirma a interface entre o desenvolvimento do pensamento

do aluno e sua contribuição para a formação de sua cidadania, que significa

inserção social, cultural e trabalho.

Para tanto, é importante que a Matemática desempenhe, equilibrada e indissociavelmente, seu papel na formação de capacidades intelectuais, na estruturação do pensamento, na agilização do raciocínio dedutivo do aluno, na sua aplicação a problemas, situações da vida cotidiana e atividades do mundo do trabalho e no apoio à construção de conhecimentos em outras áreas curriculares. [...] Falar em formação básica para a cidadania significa falar em inserção das pessoas no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura, no âmbito da sociedade brasileira. (BRASIL, 1997, p.25).

A mesma intenção aparece na formulação dos objetivos para o Ensino

Fundamental, que propõe ao estudante a compreensão do seu cotidiano, a fim de

transformá-lo; estabelecer relações qualitativas e quantitativas sobre os conteúdos;

resolver situações-problemas pertinentes à matemática; expressar-se

matematicamente; verificar a interdisciplinaridade entre a matemática e as outras

áreas do saber humano e desenvolver habilidades nos procedimentos matemáticos.

Sendo assim, a organização dos conteúdos difere da estruturação

convencionalmente adotada nos antigos programas de ensino e livros didáticos. Os

conteúdos aparecem organizados em quatro blocos: números e operações, espaço

e formas, grandezas e medidas, tratamento da informação.

Entretanto, ressalva que a organização dos conteúdos adotada só terá

sentido de inovadora se atrelada à metodologia compatível, isto é, que prime pela

participação ativa dos alunos para que possa expressar suas compreensões.

Para tanto, o ensino de Matemática prestará sua contribuição à medida que forem exploradas metodologias que priorizem a criação de estratégias, a

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comprovação, a justificativa, a argumentação, o espírito crítico, e favoreçam a criatividade, o trabalho coletivo, a iniciativa pessoal e a autonomia advinda do desenvolvimento da confiança na própria capacidade de conhecer e enfrentar desafios. (BRASIL, 1997, p.26).

Observa-se o incentivo para que o professor promova a cultura ao apreço

pelos estudos matemáticos, adotando meios didáticos exploratórios e investigativos,

na resolução de situações-problema.

Em sua proposta referencial metodológica para o ensino, a organização de

situações de ensino e aprendizagem, enfatizam as inter-relações das diferentes

áreas da Matemática e, estas, com as demais áreas do conhecimento, de forma a

apontar para diversos assuntos emergentes ao contexto social e que se tornaram

relevantes nas últimas 2 décadas. São eles: Ética, Saúde, Meio Ambiente,

Pluralidade Cultural e Orientação Sexual. Dessa forma, se faz necessário um

diálogo entre os professores das diversas áreas do conhecimento, inclusive os

matemáticos, para a tentativa elaboração de currículo que contemple essa proposta

sugerida pelos PCNs.

A proposta está na elaboração de projetos que explorem situações

problemas de situações matemáticas, de forma que sua compreensão possa

possibilitar um melhor entendimento dos assuntos tratados como emergentes,

citados pelo PCNs e elencados acima, nesse texto. Também se espera dessa forma,

construir um novo saber através da modificação na forma didática de ensino.

A confiança na auto-capacidade de construção de conhecimento relativo à

matemática e a observação ao contexto de pensamento emergido dos estudantes,

são características primordiais ao professor. Para tanto, a Matemática pode

colaborar na aquisição de novos conhecimentos e também para o desenvolvimento

de diferentes tecnologias e linguagens.

Nos PCNs, os conteúdos sobre os saberes, abandonam a forma retilínea e

sequencial de abordagem, dando lugar a uma metodologia que preconiza pela

interação de um ensino feito em três dimensões: conceitos, procedimentos e

atitudes. Valoriza-se, portanto, a compreensão das idéias matemáticas, o modo

como são produzidas e sua aplicação nas diversas áreas do conhecimento. Os

conteúdos transformam-se em contornos para o desenvolvimento de maneiras

estimuladoras, na superação e assimilação dos mais diversos saberes, incluindo a

matemática.

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Observa-se que as proposições dos PCNs não possuem caráter de

ineditismo, devido à apregoação de muitas de suas características balizadoras, já

serem oferecidas pelas tendências em Educação Matemática, no contexto mundial.

Mesmo assim, há avanços importantes comparando-as com práticas educativas que

ainda perduram nas escolas brasileiras.

Ainda devem-se esgotar todas as possibilidades de estudo e compreensão

sobre os PCNs, para que seja emitido um julgamento de qualidade ou não, por parte

dos professores e pesquisadores, a fim de uma tomada de posição em relação à sua

adoção efetiva na prática docente.

A tomada de decisão consciente, sobre as opção pedagógicas à seguir, é

valorizada, pois só assim é verificada as reais intenções da suas aplicações para a

melhoria no ensino dos diversos campos do conhecimento; e não simplesmente por

tendências que se pautam em influências carregadas de intenções adversas àquelas

que sobrepujam os princípios ideais para a educação.

Dessa forma, faz-se aos educadores matemáticos, envolvidos na formação e

na educação continuada do professor, o papel de colaborador, na intenção da

melhoria ao entendimento da proposta trazida pelos PCNs e, por extensão, o uso

adequado de suas orientações. Assim, minimizam-se os equívocos conceituais,

desse documento propositivo de caráter inovador, proporcionando-o uma sobrevida

e posterior efetivação, real e cotidiana, em sala de aula.

3.2. Os PCNs e a construção do saber matemático no ensino fundamental

Analisando, com mais rigorosidade os aspectos que foram instaurados nos

PCNs, pode-se observar uma tendência a formulações abrangentes e inter-

relacionadas, para a integração dos conteúdos e seus conceitos, em especial, a

inter-relação entre a matemática e os temas transversais.

É perceptível, no decorrer do documento proposto para a matemática das

séries iniciais, uma ênfase em correlacionar o conhecimento matemático, não

apenas como disciplina na aquisição de conhecimento formal nas escolas, mas

também como forma de pensamento, no auxílio para formação da sociedade e sua

perpetuação e construção da cidadania.

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O papel que a Matemática desempenha na formação básica do cidadão brasileiro norteia estes Parâmetros. Falar em formação básica para a cidadania significa falar da inserção das pessoas no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura, no âmbito da sociedade brasileira. (BRASIL, 1997, p.25).

Com esta pretensão, pretende-se formular um currículo para a matemática,

a partir das séries iniciais com o intuito de colaborar no aspecto da construção das

características de pensamento que se espera dos futuros cidadãos do Brasil, se

utilizando de conteúdos disciplinares como forma para esta elaboração, que

segundo o documento norteador,

[...] um currículo de Matemática deve procurar contribuir, de um lado, para a valorização da pluralidade sociocultural, impedindo o processo de submissão no confronto com outras culturas; de outro, criar condições para que o aluno transcenda um modo de vida restrito a um determinado espaço social e se torne ativo na transformação de seu ambiente. (BRASIL, 1997, p.25).

Dessa forma o documento para as séries iniciais, acaba por fazer referência

aos temas transversais, inaugurando uma questão inovadora e apontando em seu

corpo, alguns desses temas. Aqui serão apenas citados por hora, não fazem jus a

nossa análise, mas seguem sendo estes: Ética, Orientação Sexual, Meio Ambiente,

Saúde, Pluralidade Cultural. Ainda propõem discussão, se necessário de outros

temas.

No propósito de auxílio referencial, os PCNs, se organizam de uma forma

sequencial e por tópicos, a fim de tornar a leitura retilínea e de certa forma

pragmática. Continuando os relatos sobre as séries iniciais nos PCNs, os mesmos

tentam justificar algumas posições para o ensino e aprendizagem dos estudantes,

em um formato de correlação e cooperação entre os três sujeitos envolvidos nessa

dialética sobre o ensino.

Pode-se apurar, fazendo-se ênfase aos documentos, que os relatados em

questão são: o aluno, o professor e o saber, nesse caso específico, o matemático.

Fazendo um cruzamento entre eles, os PCNs apontam relações entre: ―o aluno e o

saber matemático‖, ―o professor e o saber matemático‖ e por fim ―as relações

professor-aluno e aluno-aluno‖.

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Existem, nestes pontos dos PCNs, argumentos de críticas e reflexões, na

tentativa de uma postura equilibrada e comprometida entre os sujeitos

caracterizados ou como os PCNs os tratam, sob a condição de ―variáveis envolvidas

no processo‖, que para os alunos, seriam primordiais dentro de seu contexto, aulas

com significação cotidiana, relação entre conteúdos e até certo anseio ao

utilitarismo. Para a conduta do professor, pode-se verificar que os parâmetros,

sugerem a utilização da história da matemática como forma demonstrativa da

dinamicidade dos conceitos matemáticos, como a possibilidade de uma ligação

efetiva entre o conhecimento científico com vistas ao saber escolar.

Os PCNs em seu texto fazem referências aos conceitos de obstáculos,

remetendo-se a eles como, ―um conhecer dos obstáculos envolvidos no processo de

construção de conceitos é de grande utilidade para que o professor compreenda

melhor alguns aspectos da aprendizagem dos alunos. (BRASIL, 1997, p.30)‖. Porém

em sua bibliografia não cita Gaston Bachelard. Contudo alguns pensadores mais

diretamente ligados à matemática que se apropriaram ou alicerçaram-se

teoricamente, a partir de Bachelard. Encontram-se nomes como Duval e Vergnaud,

este último, que é elemento teórico deste estudo.

No decorrer da análise da proposta, observa-se um texto influenciador e

direcionador, com características para certas tendências, que emergem no contexto

da educação matemática, indicando a resolução de situações problemas como

ponto de partida de atividades matemáticas. Discute caminhos para fazer

matemática na sala de aula, destacando a importância da História da Matemática e

da Tecnologia de Comunicação e dos Jogos.

Os PCNs, por sua vez, delineiam condições para estruturação dos objetivos

gerais, na constituição do ensino fundamental de matemática de uma forma geral.

Aqui, compreendido ainda como as séries entre o 1º e 9º anos, para servir de aporte,

talvez, para preparação e formulação de um projeto político pedagógico, com

elementos perpetuantes, que estarão vislumbrados no corpo do seu texto, pois

segundo Brasil (1997), os objetivos gerais para a matemática no ensino fundamental

são:

identificar os conhecimentos matemáticos como meios para compreender e transformar o mundo à sua volta e perceber o caráter de jogo intelectual, característico da Matemática, como aspecto que estimula o interesse, a curiosidade, o espírito de investigação e o desenvolvimento da capacidade para resolver problemas;

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fazer observações sistemáticas de aspectos quantitativos e qualitativos do ponto de vista do conhecimento e estabelecer o maior número possível de relações entre eles, utilizando para isso o conhecimento matemático (aritmético, geométrico, métrico, algébrico, estatístico, combinatório, probabilístico); selecionar, organizar e produzir informações relevantes, para interpretá-las e avaliá-las criticamente;

resolver situações-problema, sabendo validar estratégias e resultados, desenvolvendo formas de raciocínio e processos, como dedução, indução, intuição, analogia, estimativa, e utilizando conceitos e procedimentos matemáticos, bem como instrumentos tecnológicos disponíveis;

comunicar-se matematicamente, ou seja, descrever, representar e apresentar resultados com precisão e argumentar sobre suas conjecturas, fazendo uso da linguagem oral e estabelecendo relações entre ela e diferentes representações matemáticas;

estabelecer conexões entre temas matemáticos de diferentes campos e entre esses temas e conhecimentos de outras áreas curriculares;

sentir-se seguro da própria capacidade de construir conhecimentos matemáticos, desenvolvendo a auto-estima e a perseverança na busca de soluções;

interagir com seus pares de forma cooperativa, trabalhando coletivamente na busca de soluções para problemas propostos, identificando aspectos consensuais ou não na discussão de um assunto, respeitando o modo de pensar dos colegas e aprendendo com eles. (BRASIL, 1997, p.37).

Logo, sobre a questão dos conteúdos matemáticos para as séries iniciais,

nos PCNs, como foram citados no início deste capítulo, esta orientada em forma de

blocos, onde se contempla a seleção através de campos de conhecimentos

matemáticos a saber: números e operações, espaço e forma,grandezas e medidas,

tratamento da informação.

Pode-se observar que a justificativa dessa forma de organização em blocos

dos campos matemáticos, tem o intuito de manter o argumento inicial dos PCNs,

que é a de sempre manter a integração de conteúdos, entre disciplinas e entre

conteúdos dentro de uma disciplina. Parece então, na visão dos idealizadores dos

PCNs, que esta integração entre os blocos dos campos matemáticos poderá

sustentar essa proposta.

Os PCNs também propõem uma organização entre estes campos de

conhecimentos matemáticos para as séries do ensino fundamental, conforme três

aspectos, que segundo Brasil (1997), poderiam ser descritos através da ―variedade

de conexões que podem ser estabelecidas entre os diferentes blocos‖, da ―ênfase

maior ou menor que deve ser dada a cada item‖ e por fim aos ―níveis de

aprofundamento dos conteúdos em função das possibilidades de compreensão dos

alunos‖, de forma a auxiliar na construção da proposta político pedagógica para a

matemática das séries inicias das escolas municipais, segundo BRASIL:

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É fundamental ressaltar que, ao serem reinterpretados regionalmente (nos Estados e Municípios) e localmente (nas unidades escolares), os conteúdos, além de incorporarem elementos específicos de cada realidade, serão organizados de forma articulada e integrada ao projeto educacional de cada escola. (BRASIL, 1997, p.41).

Como forma geral, tentou-se explicitar em uma breve síntese, aspectos

determinantes para elaboração de estratégias de ensino, baseadas nos PCNs, para

o ensino fundamental. Contudo, o foco da pesquisa está voltado para o que os

PCNs, podem ajudar na elaboração de uma proposta político pedagógica de uma

escola pública municipal, a cerca da disciplina de matemática, em suas séries

iniciais, mais especificamente nas séries compreendidas pelo 2º ciclo, na tentativa

da superação de obstáculos ao saber matemático no seu campo multiplicativo.

3.2.1. Abordagem do saber matemático nas séries iniciais do ensino

fundamental

As contribuições advindas dos PCNs, para o 2º ciclo, possuem certa

relevância, pois estão pautadas em experiências empíricas do cotidiano, onde são

ressaltados aspectos comparativos como as primeiras séries do ensino fundamental.

No texto dos PCNs, podem-se observar citações do tipo ―conhecimento anterior‖,

―relações de causalidade‖, ―reversibilidade do pensamento‖, ―regularidades e

propriedades numéricas, geométricas e métricas‖.

Esses são pontos, que podem levar os estudantes a compreenderem com

maior significação, aspectos determinados na disciplina de matemática, remetendo-

os finalmente aos objetivos propostos para esta disciplina, nessa época escolar. A

seguir, objetivos extraídos dos PCNs.

Ampliar o significado do número natural pelo seu uso em situações problema e pelo reconhecimento de relações e regularidades.

Construir o significado do número racional e de suas representações (fracionária e decimal), a partir de seus diferentes usos no contexto social.

Interpretar e produzir escritas numéricas, considerando as regras do sistema de numeração decimal e estendendo-as para a representação dos números racionais na forma decimal.

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Resolver problemas, consolidando alguns significados das operações fundamentais e construindo novos, em situações que envolvam números naturais e, em alguns casos, racionais.

Ampliar os procedimentos de cálculo — mental, escrito, exato, aproximado — pelo conhecimento de regularidades dos fatos fundamentais de propriedades das operações e pela antecipação e verificação de resultados.

Refletir sobre procedimentos de cálculo que levem à ampliação do significado do número e das operações, utilizando a calculadora como estratégia de verificação de resultados.

Estabelecer pontos de referência para interpretar e representar a localização e movimentação de pessoas ou objetos, utilizando terminologia adequada para descrever posições.

Identificar características das figuras geométricas, percebendo semelhanças e diferenças entre elas, por meio de composição e decomposição, simetrias, ampliações e reduções.

Recolher dados e informações, elaborar formas para organizá-los e expressá-los, interpretar dados apresentados sob forma de tabelas e gráficos e valorizar essa linguagem como forma de comunicação.

Utilizar diferentes registros gráficos — desenhos, esquemas, escritas numéricas — como recurso para expressar idéias, ajudar a descobrir formas de resolução e comunicar estratégias e resultados.

Identificar características de acontecimentos previsíveis ou aleatórios a partir de situações-problema, utilizando recursos estatísticos e probabilísticos.

Construir o significado das medidas, a partir de situações-problema que expressem seu uso no contexto social e em outras áreas do conhecimento e possibilitem a comparação de grandezas de mesma natureza.

Utilizar procedimentos e instrumentos de medida usuais ou não, selecionando o mais adequado em função da situação-problema e do grau de precisão do resultado.

Representar resultados de medições, utilizando a terminologia convencional para as unidades mais usuais dos sistemas de medida, comparar com estimativas prévias e estabelecer relações entre diferentes unidades de medida.

Demonstrar interesse para investigar, explorar e interpretar, em diferentes contextos do cotidiano e de outras áreas do conhecimento, os conceitos e procedimentos matemáticos abordados neste ciclo.

Vivenciar processos de resolução de problemas, percebendo que para resolvê-los é preciso compreender, propor e executar um plano de solução, verificar e comunicar a resposta. (BRASIL, 1997, p.55-57).

Sobre os aspectos de conteúdos matemáticos, para o 2º ciclo do ensino

fundamental, os PCNs fazem relação com conteúdos anteriormente abordados nas

séries anteriores, com uma expectativa de ampliação dos conhecimentos, através de

novas estratégias de ensino, a partir de situações problemas que possam dar mais

significados aos campos numéricos já estudados.

Os anos que compreendem o período final das séries iniciais têm como

característica, geralmente o trabalho que permita, através de atividades, fazer com

que o estudante avance na construção de conceitos e procedimentos matemáticos.

Porém esse período não se constitui um ponto final de aprendizagem dos

conteúdos, significando que o trabalho com números naturais e racionais,

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operações, medidas, espaço e forma e o tratamento da informação, deve ter sua

continuação, de forma que o estudante vislumbre novos alicerces para o

conhecimento matemático.

Os critérios de avaliação em matemática, também são contemplados no

PCN, onde foram formulados segundo uma ótica, da constatação de competências e

reafirmação daquilo que se espera dos estudantes nesse período. Como pontos

essenciais numa avaliação, pode-se destacar,

Ler, escrever números naturais e racionais, ordenar números naturais e racionais na forma decimal, pela interpretação do valor posicional de cada uma das ordens;

Realizar cálculos, mentalmente e por escrito, envolvendo números naturais e racionais (apenas na representação decimal) e comprovar os resultados, por meio de estratégias de verificação;

Medir e fazer estimativas sobre medidas, utilizando unidades e instrumentos de medida mais usuais que melhor se ajustem à natureza da medição realizada;

Interpretar e construir representações espaciais (croquis, itinerários, maquetes), utilizando-se de elementos de referência e estabelecendo relações entre eles;

Reconhecer e descrever formas geométricas tridimensionais e bidimensionais;

Recolher dados sobre fatos e fenômenos do cotidiano, utilizando procedimentos de organização, e expressar o resultado utilizando tabelas e gráficos. (BRASIL, 1997, p.63).

Como documento norteador para formulação de PPP, os PCNs abordam os

aspectos didáticos e fazem referências aos conteúdos sugeridos no decorrer dos

seus textos, tentando se aprofundarem nas expectativas dos conceitos, que

reafirmam como essenciais, para o bom entendimento da matemática para o 2º ciclo

do ensino fundamental.

Logo, os conteúdos citados para este entendimento são segundo sua

concepção: números naturais e sistema de numeração decimal; números racionais;

operações com números naturais (adição e subtração: significados, multiplicação e

divisão: significados); repertório básico para o desenvolvimento do cálculo e

ampliação dos procedimentos de cálculo (cálculo mental, aproximações e

estimativas, cálculo escrito); operações com números racionais (os significados, o

cálculo com números racionais); espaço e forma; grandezas e medidas; tratamento

da informação.

Mesmo limitando-se apenas aos estudos específicos dos PCNs para o 2º

ciclo do ensino fundamental relacionados à matemática, a quantidade de conteúdos

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seria extensa para realizar uma análise mais aprofundada de como todos esses

saberes podem se objetivar em obstáculos ao pensamento matemático para as

séries subseqüentes.

Então, como os fundamentos teóricos desse estudo voltam-se para os

campos conceituais de Vergnaud, mais especificamente, o campo multiplicativo, faz-

se saber que dentro do item ―operações com números naturais‖, será analisado o

subitem ―multiplicação e divisão: significados‖.

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4. AS OPERAÇÕES DE MULTIPLICAÇÃO E DIVISÃO COM NÚMEROS

NATURAIS: UMA ANÁLISE DOS PCNs.

O presente capítulo trata da análise do campo conceitual multiplicativo, nos

PCNs de matemática. Vale reafirmar que a referência é o documento do segundo

ciclo, uma vez que é nele que aparece pela primeira vez o tema em foco.

4.1. Análise das operações de multiplicação e divisão com números naturais,

segundo a teoria de Vergnaud

Os PCNs apresentam algumas proposições de ordem conceitual para a

forma de abordagem do campo multiplicativo. Para esse conceito que se volta a

análise, na presente subseção, com base nas categorias estabelecidas com a

fundamentação teórica, quais sejam: isomorfismo de medida, proporção múltipla e

produto de medida. Salienta-se que o campo multiplicativo é entendido como

constituído das operações de multiplicação e divisão, de formas inter-relacionadas.

Vale antecipar que os PCNs não adotam a linguagem de Vergnaud, sobre

―campo conceitual multiplicativo‖ e suas categorias. Em vez dessa denominação

usam apenas multiplicação, separadamente do conceito de divisão, cada qual com

suas ideias ou significações. Dessa forma, a análise feita centrou no conjunto de

ideias, que segundo o documento caracterizam o conceito de multiplicação.

Em vez de ―isomorfismo de medida‖ (Vergnaud), os PCNs apresentam,

inicialmente a multiplicação com a ideia ou significação de ―adição‖ de várias

parcelas que é exemplificada com uma situação problema.

Uma abordagem freqüente no trabalho com a multiplicação é o estabelecimento de uma relação entre ela e a adição. Nesse caso, a multiplicação é apresentada como um caso particular da adição porque as parcelas envolvidas são todas iguais. Por exemplo: Tenho que tomar 4 comprimidos por dia, durante 5 dias. Quantos comprimidos preciso comprar? (BRASIL, 1997, p.71).

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Observa-se que os PCNs, adotam como primeira significação aquilo que,

convencionalmente, é entendido como sendo a multiplicação propriamente dita, isto

é, simplificação da adição. Contudo, preocupam-se com o sentido e o significado

para cada um dos fatores, valendo-se da denominação ―papéis diferentes‖, como

segue a explicação:

A essa situação associa-se a escrita 5 4, na qual o 4 é interpretado como o número que se repete e o 5 como o número que indica a quantidade de repetições. Ou seja, tal escrita apresenta-se como uma forma abreviada da escrita 4 + 4 + 4 + 4 + 4. A partir dessa interpretação, definem-se papéis diferentes para o multiplicando (o número que se repete) e para o multiplicador (o número de repetições), não sendo possível tomar um pelo outro. No exemplo dado, não se pode tomar o número de comprimidos pelo número de dias. Saber distinguir o valor que se repete do número de repetições é um aspecto importante para a resolução de situações como esta. (BRASIL, 1997, p.71).

Podem-se destacar dois aspectos a serem considerados na citação anterior.

O primeiro é a aproximação de preocupações de caráter epistemológico e didático

entre os PCNs e a teoria de Vergnaud. Ou seja, ambos se preocupam com o

entendimento do conceito, isto é, o conhecimento denominado multiplicação,

abordado no contexto de uma situação didática de análise. Fogem, portanto, do

tradicional entendimento de multiplicação que é rapidamente apresentado como

simplificação aditiva e, imediatamente, assume o significado de multiplicação em si,

como operação de ―vezes‖, fundamentalmente, entendida como ―tabuada‖. Esta se

transforma em conceito propriamente dito, pois é determinante para ―resolver a

conta de multiplicação‖.

Dito em outras palavras, no ensino tradicional a multiplicação se restringia

numa espécie de cumplicidade entre tabuada e algoritmo, sendo a preocupação do

primeiro, o real sentido da aprendizagem do referido conceito. A sequência de

ensino obedecia ao padrão de linearidade: primeiro, decorar a tabuada;

posteriormente, aquisição de bom desempenho no algoritmo (fazer a conta);

finalmente, a resolução de problemas.

O estudo de Nürnberg (2008) mostra que, entre os professores de 1º ao 5º

ano do ensino fundamental, há aqueles que a tabuada é uma base necessária e

indispensável para a aprendizagem do conceito de multiplicação. Ela é concebida

como uma síntese a priori, ou seja, um produto generalizado a mercê de um

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processo de elaborações. A referida operação tem um processo pedagógico que

confirma o que foi afirmado no parágrafo anterior, isto é, o ponto de partida é a

tabuada, segue o algoritmo e, finalmente as situações problemas.

O segundo aspecto a considerar é a centralidade das explicações dos PCNs

nos dois fatores, 4 e 5, com a preocupação de que cada um deles representem

grandezas discretas e distintas. Entretanto, eximem-se de fazer referência ao

significado do produto. Ou seja, faltou chamar a atenção do leitor que em situações

multiplicativas com a ideia aditiva, não é possível estabelecer um produto unificador

entre as duas grandezas envolvidas. Assim em 4 comprimidos 5 dias, o resultado

20 significa a quantidade de grandeza comprimido, sem uma relação explicita com a

grandeza dias. Em síntese, é impossível multiplicar grandeza entre si.

Como o documento dos PCNs não se restringe apenas a uma abordagem,

ou ideia de multiplicação, ressalta o seu compromisso explicitado em sua

apresentação nos dois documentos destinados à matemática, qual seja:

proporcionar ao estudante oportunidade de construir um determinado conceito de

forma que inter-relacionasse as diversas significações, os diversos conceitos, como

também as demais disciplinas curriculares.

Coerentemente, passam a apresentar uma segunda ideia ou significação de

multiplicação, porém não as fazem diretamente. Antes, discorrem sobre as

insuficiências e limitações de situações puramente aditivas (parcelas iguais), bem

como sobre a ambigüidade em relação à propriedade comutativa da operação.

No entanto, essa abordagem não é suficiente para que os alunos compreendam e resolvam outras situações relacionadas à multiplicação, mas apenas aquelas que são essencialmente situações aditivas. Além disso, ela provoca uma ambigüidade em relação à comutatividade da multiplicação. Embora, matematicamente, a b = b a, no contexto de situações como a que foi analisada (dos comprimidos) isso não ocorre. Assim como no caso da adição e da subtração, destaca-se a importância de um trabalho conjunto de problemas que explorem a multiplicação e a divisão, uma vez que há estreitas conexões entre as situações que os envolvem e a necessidade de trabalhar essas operações com base em um campo mais amplo de significados do que tem sido usualmente realizado. (BRASIL, 1997, p.71-72).

Reafirma-se que o exposto na citação tem a conotação de argumento para

indicar a necessidade de apresentar outras significações ou ideias conceituais da

multiplicação. Para tal, recorre estrutura matemática, isto é, a ambigüidade na

propriedade comutativa quando o foco é a ideia aditiva. A partir dessa justificativa os

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PCNs destacam situações-problemas relacionadas aos campos da multiplicação e

divisão, com outras quatro significações: ideia comparativa, proporcionalidade,

configuração retangular e combinatória. Porém chamam a atenção de que não

existe qualquer hierarquização para a ordem de aparecimento dessas operações.

Esse alerta de não predominância de um conceito em relação ao outro

traduz, de acordo com nossa interpretação, a noção do que Vergnaud denomina de

campo conceitual multiplicativo, com a abrangência multiplicação/divisão.

A ampliação das significações, de acordo com os PCNs só faz sentido se for

num contexto de situações problemas:

Num primeiro grupo, estão as situações associadas ao que se poderia denominar multiplicação comparativa; Num segundo grupo, estão as situações associadas à comparação entre razões, que, portanto, envolvem a idéia de proporcionalidade; Num terceiro grupo, estão as situações associadas à configuração retangular; Num quarto grupo, estão as situações associadas à idéia de combinatória. (BRASIL, 1997, p.72-73).

Portanto, as argumentações colocam em evidência, o destaque que os

PCNs propõem para situações-problemas, com um formato que integra a

multiplicação e divisão. Também, é respaldo para confirmar a coerência de suas

proposições iniciais no que diz respeito tanto as questões conceituais quanto

metodológicas.

Essa preocupação tem fortes indícios da teoria de Vergnaud (1990) de

formular a unificação do componente construtivo no próprio conceito. Nesse sentido,

o autor se preocupou com a própria definição de ―conceitualização‖, como sendo

constituída do terno (S, I, S) em que S é o referente, I o significado e S o significante.

Portanto, a conceitualização requer a passagem dos ―conceitos-como-instrumento

aos conceitos-como-objeto e uma operação lingüística essencial nessa

transformação é a nominalização‖ (D´AMORE, 2005, p.47).

É com esse teor que os PCNs – 2º ciclo - passam a exemplificar as

articulações de ideias conceituais com as situações problemas, nos quatro grupos.

Num primeiro grupo, estão as situações associadas ao que se poderia denominar multiplicação comparativa. Exemplos: 1- Pedro tem R$ 5,00 e Lia tem o dobro dessa quantia. Quanto tem Lia?

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2- Marta tem 4 selos e João tem 5 vezes mais selos que ela. Quantos selos

têm João?

A partir dessas situações de multiplicação comparativa é possível formular

situações que envolvem a divisão. Exemplo:

3- Lia tem R$ 10,00. Sabendo que ela tem o dobro da quantia de Pedro,

quanto tem Pedro? (BRASIL, 1997, p.72).

Os três problemas com ideia de multiplicação comparativa correspondem à

categoria conceitual que Vergnaud denomina o isomorfismo de medida, pois envolve

uma proporção simples entre objetos e pessoas. Os dois primeiros exemplos

direcionam a classe de multiplicação e remetem-se a subclasse da operação

unívoca, por envolver um operador escalar (5 no primeiro problema e 4 na segunda

situação).

Contudo, pode ocorrer que essa significação assuma o sentido operatório de

adição de parcelas iguais, largamente adotada em sala de aula. No primeiro

problema, como aparece somente um valor numérico 5 (quantidade de reais de

Pedro), então há possibilidade de o aluno operar 5 + 5 para determinar a solução do

problema que corresponde à quantidade de Lia. Sendo assim, limita-se ao aspecto

unitário de grandeza. A hipótese de reduzir a ideia comparativa da multiplicação em

adição pode ser explicada pela tendência que temos de levar a um novo

conhecimento os saberes adquiridos anteriormente.

Desse modo, abre possibilidades para que os professores proponham para

os alunos a síntese: ―para achar o dobro, basta somar o número por ele mesmo‖.

Isso significa dizer que há um predomínio de sua percepção primeira que, segundo

Bachelard (1996) caracteriza um obstáculo epistemológico. Além disso, por se tratar

de uma atitude pedagógica em sala de aula, também se constitui um obstáculo

didático (BROUSSEAU, 1983). Consequentemente reduz o efeito no processo de

compreensão de outras significações por parte dos estudantes.

Para os PCNs o exemplo da divisão tem como ponto de partida a

multiplicação. Consequentemente está na categoria conceitual de Vergnaud de

isomorfismo de medida, subclasse de divisão, com aproximações a ―primeira

categoria da divisão‖.

Nessa categoria, conforme Vergnaud deve-se encontrar o valor unitário, pela

aplicação de um operador de divisão escalar na grandeza, com o propósito de

encontrar a resposta do enunciado. Nessa circunstância, segundo Nehring (2001),

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podem ocorrer dificuldades de transformação ― b‖ em ― b‖, o que pode levar o

aluno a recorrer a procedimentos de tentativa e erro, X b = c. Para tanto, lançam a

pergunta: Que número é multiplicado por ―b‖ para se obter ―c‖?

Outro aspecto merece evidência com relação aos PCNs: mesmo com toda

preocupação em apresentar as diversas significações multiplicativas ao enfatizar as

limitações de uma exclusividade de tratamento didático de adição de mesma

parcela, pode-se chamar atenção para a possibilidade de ocorrência de um

obstáculo quando o professor insiste em uma só significação conceitual. Mesmo

assim, a evidência de tal insistência não é a garantia de que o obstáculo seja

evitado, pois de acordo com Bachelard (1996) e Brousseau (1983) ele é inevitável.

Contudo, parece plausível a consciência de sua existência e a necessidade de sua

superação, em vez de um total desconhecimento, que faz com que uma percepção

fixa galgada em certeza seja perpetuada.

Na continuidade, os PCNs passam a exemplificar o segundo grupo de

situações para a multiplicação e divisão, ou seja, com a ideia de proporcionalidade:

Num segundo grupo, estão as situações associadas à comparação entre razões, que, portanto, envolvem a idéia de proporcionalidade. Os problemas que envolvem essa idéia são muito freqüentes nas situações cotidianas e, por isso, são mais bem compreendidos pelos alunos. Exemplos: 1- Marta vai comprar três pacotes de chocolate. Cada pacote custa R$

8,00. Quanto ela vai pagar pelos três pacotes? (A idéia de

proporcionalidade está presente: 1 está para 8, assim como 3 está para 24.)

2- Dois abacaxis custam R$ 2,50. Quanto pagarei por 4 desses abacaxis?

(Situação em que o aluno deve perceber que comprará o dobro de abacaxis

e deverá pagar — se não houver desconto — o dobro, R$ 5,00, não sendo

necessário achar o preço de um abacaxi para depois calcular o de 4).

A partir dessas situações de proporcionalidade, é possível formular outras

que vão conferir significados à divisão, associadas às ações ―repartir

(igualmente)‖ e ―determinar quanto cabe‖.

Exemplos associados ao primeiro problema:

3- Marta pagou R$ 24,00 por 3 pacotes de chocolate. Quanto custou cada

pacote? (A quantia em dinheiro será repartida igualmente em 3 partes e o

que se procura é o valor de uma parte.)

4- Marta gastou R$ 24,00 na compra de pacotes de chocolate que

custavam R$ 3,00 cada um. Quantos pacotes de chocolate ela comprou?

(Procura-se verificar quantas vezes 3 cabe em 24, ou seja, identifica-se a

quantidade de partes.) (BRASIL, 1997, p.72).

Pode-se verificar nos primeiros exemplos desse grupo, a ideia de proporção,

como o próprio o documento explicita em ―1 está para 8 assim como 3 está para 24‖.

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Se incluído números num conceito mais geral, constituir-se-á na subclasse da ―regra

de três‖ da categoria que Vergnaud, denomina de ―isomorfismo de medida‖. A sua

compreensão, pode minimizar problemas considerados triviais, relacionados com a

proporcionalidade.

Observa-se que, tanto no primeiro exemplo como no segundo, em

correspondência com a ideia de Vergnaud da classe de multiplicação e subclasse de

regras de três, que ocorre em situação nas quais quatro termos estão relacionados,

sendo necessária a extração de um, que nesse caso, será a incógnita.

De acordo com Vergnaud (1991, p.199), a análise do problema 1 da citação

anterior pode ser representada conforme o esquema a seguir, quando se tratar da

subclasse regra de três:

Pacotes de Chocolate Reais

1

3

8

....x

Da mesma forma, pode estender para outro tipo de representação

apresentada por Vergnaud (1991, p.199), em que o termo desconhecido é

determinado por meio de dupla sequência: a primeira determinada pelos números

naturais e a segunda constituída pelos produtos da multiplicação dos termos

anteriores por 8.

Pacotes de Chocolate Reais

1

2

3

4

....

8

16

.... 24

32

....

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Nessa forma de representação está a ideia de função linear, que no

momento posterior da trajetória educativa dos alunos, poderia atingir um nível

algébrico pela representação genérica: valor em reais = 8 vezes a quantidade a ser

comprada, ou seja, generalizada por y = 8x (y: o valor a pagar e x: a quantidade de

caixas a comprar).

Sobre o terceiro e quarto exemplo, pode-se observar que também se

enquadra na categoria ―isomorfismo de medida‖ (VERGNAUD, 1996), porém, na

―subclasse da divisão‖. O terceiro problema se refere ao que Vergnaud denomina de

primeira categoria da referida subclasse, qual seja: determinar o valor unitário.

Nesse caso, faz-se necessário um escalar ou um operador divisor para determinar

uma terceira grandeza.

Pacotes de Chocolate Reais

1

3

x

...24

Nesse caso, Vergnaud (1991) diz que o operador ( indica a passagem

de 3 para 1 pacote de chocolate. Por sua vez, o operador inverso (x 3) significa a

passagem de 1 para 3 pacotes de chocolate.

É observável que nesse tipo de situação, o dividendo e o quociente são de

mesma grandeza e diferem da grandeza do divisor, como pode ser visto no seguinte

algoritmo:

24 3 = 8.

24 (reais) 3 (pacotes) = 8 (reais).

No problema 4 da citação anterior, ocorre que o dividendo e o divisor

representam a mesma grandeza (reais) e o quociente representa outra grandeza

que é pacote de chocolate:

24 3 = 8

24 (reais) 3 (reais) = 8 (pacotes de chocolate).

x 3 3

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Os PCNs apresentam um terceiro grupo de situações problemas para

estudo da multiplicação e da divisão no segundo ciclo, que traduzem a ideia de

configuração retangular:

Num terceiro grupo, estão as situações associadas à configuração retangular. Exemplos: 1- Num pequeno auditório, as cadeiras estão dispostas em 7 fileiras e 8

colunas. Quantas cadeiras há no auditório?

2- Qual é a área de um retângulo cujos lados medem 6 cm por 9 cm?

Nesse caso, a associação entre a multiplicação e a divisão é estabelecida

por meio de situações tais como:

3- As 56 cadeiras de um auditório estão dispostas em fileiras e colunas. Se

são 7 as fileiras, quantas são as colunas?

4- A área de uma figura retangular é de 54 cm2. Se um dos lados mede 6

cm, quanto mede o outro lado? (BRASIL, 1997, p.73).

As quatro situações apresentadas pelos PCNs são similares aos exemplos

que Vergnaud indica como pertencente à categoria ―produto de medida‖. Seus

enunciados envolvem três variáveis: fileiras, colunas e cadeiras na primeira e na

terceira situações problemas; base, altura e área na segunda e quarta situações

problemas. Todos os enunciados desse terceiro grupo remetem ao entendimento da

noção geométrica de área de superfície retangular, que costumeiramente é

associada ao produto obtido pela multiplicação da medida da base pela medida da

altura.

Olhando atento às proposições dos PCNs, observa-se a preocupação com

detalhes conceituais (ideias ou significações) na apresentação do campo

multiplicativo (multiplicação e divisão), porém são omitidas projeções indicadoras de

um processo prospectivo de elaboração conceitual e da inter-relação entre os

campos matemáticos: aritmética, álgebra e geometria. Assim, as situações

problemas poderiam se transformar em conceitos algébricos e funcionais. Por

exemplo, na situação dois, poderia ser proposto que os alunos estudassem a

variação da área do retângulo em que sua base fosse 6 cm e sua altura variasse

aleatoriamente. Nesse caso, com mediações necessárias se atingiria o nível de

generalização da forma A=6 h, em que A é a medida da área e h é a medida da

altura.

Nessa visão prospectiva, se transcende a idéia de área por confluir entre si

os conceitos: relação, função, coeficiente angular, proporção, contagem, entre

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outros. Desse modo, o campo multiplicativo vai deixando sua especificidade e pode

ocorrer que em uma dada situação problema, aparentemente, enquadrada em uma

categoria vergnauniana se expandir para todas elas: isomorfismo de medida,

produto de medida e proporção múltipla. Assim também, as representações

matemáticas se diversificam: algorítmicas, modelos funcionais, tabelas, diagramas,

gráficos, entre outros.

Os problemas 3 e 4 podem ser caracterizados como pertencente à

subclasse que Vergnaud denomina de divisão e à categoria produto de medida. É

possível observar que, em termos de significados, todos os termos (dividendo,

divisor e quociente) são diferentes.

56 7 = 8.

56 (cadeiras) 7 (fileiras) = 8 (colunas). (problema 3).

54 6 = 9

54 (medida de área) 6 (medida da base) = 9 (medida da altura). (problema

4).

Portanto, são diferentes as ideias subjacentes ao conceito de divisão em

situações problemas de isomorfismo de medida e produto de medida. A esse

respeito, a síntese que pode ser feita é: no isomorfismo de medida (Vergnaud) ou

ideia comparativa (PCNs), ocorre que dois dos termos tem o mesmo significado e

um deles diferente; no produto de medida (Vergnaud) ou ideia de razão e

proporcionalidade (PCNs) os três termos representam significações distintas.

Deixar despercebido esta especificidade ou diferença da divisão, pode se

traduzir em um obstáculo para identificar a operação a adotar na resolução de um

problema ou na análise de uma situação cotidiana. Isso quer dizer que uma proposta

para o ensino das operações deve contemplar as múltiplas ideias (PCNs) ou

categorias (Vergnaud). Portanto, deve-se evitar o enfoque somente em uma ideia,

como ocorre no ensino tradicional, e propor situações problemas com outras ideias

de significações, pois levam a manifestações de dificuldades por parte dos alunos

que, segundo Brousseau (1983), são indícios da existência de obstáculos didáticos e

epistemológicos.

O último grupo (4) de análise elencado pelos PCNs de matemática para o

segundo ciclo, apresenta a ideia de combinatória, para qual é que dedica maior

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espaço para discussão, em relação aos demais. É a única situação que apresenta

uma representação pictórica e da teoria de conjuntos, produto cartesiano.

Segue o exemplo conforme PCNs, onde:

Num quarto grupo, estão as situações associadas à idéia de combinatória. Exemplo: 1- Tendo duas saias — uma preta (P) e uma branca (B) — e três blusas —

uma rosa (R), uma azul (A) e uma cinza (C) —, de quantas maneiras

diferentes posso me vestir?

Analisando-se esses problemas, vê-se que a resposta à questão formulada

depende das combinações possíveis; no segundo, por exemplo, os alunos

podem obter a resposta, num primeiro momento, fazendo desenhos,

diagramas de árvore, até esgotar as possibilidades:

Esse resultado que se traduz pelo número de combinações possíveis entre os termos iniciais evidencia um conceito matemático importante, que é o de produto cartesiano. Note-se que por essa interpretação não se diferenciam os termos iniciais, sendo compatível a interpretação da operação com sua representação escrita. Combinar saias com blusas é o mesmo que combinar blusas com saias e isso pode ser expresso por 2 3 = 3 2. (BRASIL, 1997, p.73).

Essa situação problema, proposta para exemplificar estratégias de ensino para as

operações de multiplicação de números naturais, mostra uma aproximação entre a

ideia de combinação (PCNs) com a categoria de ―produto de medida‖ do campo

conceitual multiplicativo (Vergnaud). Observa-se que o exemplo, dos pares de

moças e rapazes, possui as mesmas características construtivas empregadas por

Vergnaud (1983), no exemplo dos meninos e meninas dançarinos.

Ainda sobre a ideia de combinação, o PCN traz:

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A idéia de combinação também está presente em situações relacionadas com a divisão: 2- Numa festa, foi possível formar 12 casais diferentes para dançar. Se

havia 3 moças e todos os presentes dançaram, quantos eram os rapazes?

Os alunos costumam solucionar esse tipo de problema por meio de

tentativas apoiadas em procedimentos multiplicativos, muitas vezes

representando graficamente o seguinte raciocínio:

Um rapaz e 3 moças formam 3 pares.

Dois rapazes e 3 moças formam 6 pares.

Três rapazes e 3 moças formam 9 pares.

Quatro rapazes e 3 moças formam 12 pares. Levando-se em conta tais considerações, pode-se concluir que os problemas cumprem um importante papel no sentido de propiciar as oportunidades para as crianças, do primeiro e segundo ciclos, interagirem com os diferentes significados das operações, levando-as a reconhecer que um mesmo problema pode ser resolvido por diferentes operações, assim como uma mesma operação pode estar associada a diferentes problemas. (BRASIL, 1997, p.73-74).

A situação problema da citação, é típica da categoria ―produto de medida‖ e

as subclasses ―produto cartesiano e divisão‖ de Vergnaud. Nesse caso, no

procedimento de cálculo, cada um dos termos da operação divisão também

apresenta significações distintas:

12 3 = 4;

12 (casais) 3 (moças) = 4 (rapazes)

Das análises relativas aos quatro grupos de significações ou idéias relativas

ao que Vergnaud denomina de campo conceitual multiplicativo, algumas

considerações ainda podem ser feitas. Dado o exposto em toda essa seção do

presente capítulo, pode-se dizer que a proposta dos PCNs, embora não se

identifiquem como tal, têm grandes similaridades com a teoria de Vergnaud. As

aproximações se explicitam no documento do Ministério da Educação analisado,

desde a sua estruturação. Isso porque nas ―Orientações Didáticas‖ em que são

tratadas as abordagens dos significados das operações, a multiplicação e a divisão

aparecem em um único título, ou seja, ambas constituem um único campo

conceitual.

Da mesma forma, ao discorrer sobre os grupos de situações problemas em

conformidade com as significações conceituais, observa-se que os enfoques dos

PCNs remetem ao campo conceitual multiplicativo de Vergnaud. Ao comparar seus

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enunciados com a análise do referencial teórico, obteve-se subsídio para o

entendimento de que a construção do texto dos PCNs para matemática, emprega

muitos conceitos elaborados por Vergnaud, mesmo esse sendo referenciado apenas

uma vez na bibliografia do documento.

Para não repetir todas as coincidências apontadas anteriormente, ressalta-

se que o exemplo dado por Vergnaud (1996) para a categoria de ―produto de

medida‖ na subclasse do ―produto cartesiano‖ também aparecem nos PCNs, no

grupo das situações com a idéia de ―combinação‖. Tal coincidência se avulta na

forma de representação tanto por ―diagrama‖ (formação de trajes diferentes com

saias e blusas), como por ―conjuntos de pares ordenados‖ e pela ―tabela de dupla

entrada‖.

Contudo, esta análise não se limita apenas em verificar coincidências. Vale

ressaltar também que os PCNs, como um documento propositivo, não poderiam

pormenorizar e esgotar o tratamento didático do referido campo conceitual. Por isso,

de forma implícita, propõem que se busquem estratégias semelhantes para

elaboração do referido campo conceitual. Para tanto, dependendo da categoria ou

significação apresenta diferentes representações (pictórica, gráfico, diagramas e

notacional de conjuntos) que levem aos procedimentos de cálculo da multiplicação e

divisão. As estratégias revelam níveis de compreensão diferentes, conforme os

problemas enunciados, desde a contagem elemento por elemento, que seria a forma

mais elementar, passando pela relação de operação de multiplicação (linha x coluna

ou coluna x linha) e chega à idéia de proporção, bem como de relação e função. Por

exemplo, o aluno poderá calcular uma quantidade especifica de uma pequena área

para, posteriormente, com o uso de estratégias de cálculo, encontrar uma área

superior a primeira. Nesse processo, poderão ocorrer manifestações de dificuldade,

pois o estudante precisa entender relações elementares de proporção.

Para o cálculo escrito da multiplicação, o documento mostra que a sua base

é a decomposição dos termos de acordo com os princípios do sistema de

numeração decimal e, também, a propriedade distributiva da multiplicação em

relação à adição. Por exemplo:

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Esse nível, considerado como ―uma boa habilidade em cálculo‖ (BRASIL,

1997, p. 74), é atingível desde que antecedido pelo desenvolvimento do que

denomina de ―pontos de apoio‖ como: o domínio da contagem e combinações

aritméticas (tabuada). Porém, não significa que eles são obtidos por simples

memorização, mas resultado de um processo de construção e organização de

pensamento, com consequência na memorização compreensiva dos fatos

multiplicativos. Para tanto, a proposição é a resolução de problemas, o uso de

propriedades operatórias (comutativa, associativa e distributiva) e a observação de

regularidades.

Para a resolução da operação de divisão a sugestão é de que ocorra por

meio de estratégias pessoais. Recomenda, ainda, que a organização do estudo do

cálculo deva contemplar ―concomitantemente procedimentos de cálculo mental e

cálculo escrito, exato e aproximado, de tal forma que o aluno possa perceber

gradativamente as relações existentes entre eles‖(BRASIL, 1997, p.76). Isso, para o

referido documento, aperfeiçoa os procedimentos pessoais dos alunos e, aos

poucos, tornam-se mais práticos e se aproximam das técnicas usuais.

Mesmo assim, no que se refere aos procedimentos de cálculo para divisão, a

sugestão é adotar a ideia de medida, com base na pergunta orientadora: quantas

vezes o número x cabe em y? Ou mais especificamente: quantas vezes o divisor

cabe no dividendo? Concomitantemente, adota estimativa, tendo como referência as

potências de 10. O quociente é obtido pelas somas das estimativas, conforme

tabela abaixo, extraída de Brasil (1997, p.79):

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Entre tantos encaminhamentos didáticos indicados pelos PCNs de

Matemática, percebe-se ausência de uma relação entre a divisão e a subtração.

Trouxe-se à tona a referida lacuna, pois o documento estabelece a vinculação

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multiplicação-divisão. Além disso, ao abordar a multiplicação fez menção à

significação de adição de mesma parcela, em uma situação problema que fora

resolvida por 5 4 ou 4 + 4 + 4+ 4+ 4. Porém, o mesmo procedimento não foi

adotado com a idéia de subtração sucessiva para a divisão. Por exemplo, 20 4

como sendo:

20 – 4 = 16

16 – 4 = 12

12 – 4 = 8

8 – 4 = 4

4 – 4 = 0

Também, vale ressaltar que as proposições dos PCNs dão entendimento, ao

leitor e aos professores, que a observância do conjunto de idéias e significações

conceituais garante uma ―boa habilidade de cálculo‖, que se pressupõe como sendo

uma boa aprendizagem. Em momento algum, faz referência às possíveis

dificuldades que poderão ser manifestadas pelos alunos, como também dos

obstáculos de diversos tipos (BROUSSEAU, 1983).

É muito provável que os obstáculos de origem epistemológica, didática,

ontogenética e cultural se manifestem ao passar de uma situação problema com teor

de uma significação (PCN) ou categoria (Vergnaud) para outra. Na certa, erros serão

cometidos pelos alunos na organização do pensamento, por exemplo, ao sair de

uma situação problema com a idéia de proporcionalidade para a questão da

combinação. Os elementos envolvidos podem gerar um conhecimento difuso e

apressado, sobre a elaboração de um método seguro para responder o que é pedido

nos enunciados. Da mesma forma, no processo de cálculo, a contagem manual de

pequenas quantidades pode se transformar em obstáculo ao envolver combinações

numéricas representativas de grandes quantidades.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na trajetória de estudos do presente trabalho, foram delineados caminhos a

fim de proporcionar possibilidades de compreensão dos problemas levantados

durante o período do curso de mestrado.

Preocupou-se sempre com a utilização dos conceitos matemáticos

vinculados a um processo de abordagem contextualizada, que se entende permitir

as melhorias contínuas na aprendizagem discente.

A escolha do documento, Parâmetros Curriculares Nacionais, como objeto

de estudo se justifica, devido ao fato do mesmo, ser oficialmente o norteador das

questões educacionais brasileiras. O surgimento dos PCNs, traz a possibilidade de

abertura para questionamentos de métodos pedagógicos arcaicos e a busca para

inovação do processo escolar em sua totalidade, tornando-se como o próprio relata,

um ―referencial de qualidade‖.

Essa qualidade entusiasticamente pregada pelos próprios PCNs foi

propulsora para a decisão de estudá-los, mais especificamente o documento

referente à matemática do 1º e 2º ciclo do ensino fundamental, para verificar que

novas possibilidades para o ensino são propostas. Devido à limitação por tempo em

um curso de mestrado, optou-se pelo estudo das operações de multiplicação e

divisão dos números naturais no 2º ciclo (3ª e 4ª séries).

A intencionalidade para esse conteúdo ocorreu, por se tratar de um conceito

fundamental para a matemática, mas devido a sua sistematização (processo

histórico de organização de um determinado conhecimento) e outros fatores

inerentes ao processo escolar, tornou-se num aprendizado mecanizado,

descontextualizado e aparentemente sedimentado, sem possibilidade para

alternativas de ensino.

Procurando maior dinamicidade para o ensino do conteúdo especificado

anteriormente, fez-se o estudo dos PCNs para matemática do 2º ciclo, à luz de uma

teoria que proporcionasse categorias de análise. Dessa forma, dentre os autores

pesquisados, optou-se por trabalhar em um diálogo com Gerard Vergnaud. Contudo,

para apropriar-se dos devidos conceitos estabelecidos pelo referido autor, realizou-

se uma contextualização, a fim de determinar os seus pressupostos e fundamentos.

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Nessa trajetória para a fundamentação teórica se estabeleceu, primeiramente, no

autor francês, Gaston Bachelard, que propôs um importante conceito por ele

inaugurado, denominado de obstáculos epistemológicos. Para Bachelard (1996)

sinteticamente, pode-se dizer que é o embate entre conhecimentos a fim de propor

melhorias a eles próprios.

Seguindo por este caminho, já que especificamente Bachelard não trata de

conteúdos matemáticos propriamente ditos, procurou-se conhecer obras e autores

que à luz das formulações bachelardianas, propuseram seus estudos. Dos

pesquisados cita-se: Artigue, Brousseau, Cornu, Duroux, Glaeser, Sierpinska,

Vergnaud (principal referência), entre outros.

Cada um desses autores procurou respostas às questões postas para o

conteúdo matemático, fazendo relações aos obstáculos epistemológicos de

Bachelard. Porém, transferem para o âmbito escolar com a denominação de

obstáculos didáticos. Estes trazem os mesmos pressupostos dos obstáculos em

Bachelard, como sendo a luta de pensamento contra pensamento, contudo, com

eles existe uma maior aproximação das questões educacionais.

A escolha por Vergnaud deu-se pelo seu trabalho em pesquisas no campo

da multiplicação e divisão, que se entendeu como conteúdos que geram desconforto

e insegurança no processo de ensino e aprendizagem. Como na presente pesquisa,

a ênfase foi para as operações com números naturais (multiplicação e divisão),

Vergnaud foi a opção, pois ele inaugura uma teoria chamada de campos

conceituais. Seu foco se volta para a perspectiva da construção de representações

simbólicas pelos estudantes, que se generalizam e se abstraem conforme a

interiorização dos conhecimentos construídos. Portanto, há uma aproximação do

conhecimento erudito, cientificamente elaborado, com o espaço escolar.

Dentre os estudos dos diversos campos conceituais, concentrou-se no

campo conceitual multiplicativo, assim denominado por Vergnaud (1996), pois

determina um conjunto de situações tarefas, cujo tratamento exige a multiplicação

ou divisão, ou uma combinação entre as duas. Além disso, requerem ideia,

propriedades, teoremas e diferentes representações.

Estabelecido o documento dos PCNs para matemática como objeto de

estudo e o campo conceitual multiplicativo, como orientador dos questionamentos,

adotou-se como forma de análise os trechos destacados dos documentos que

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traduziam aproximações com as categorias de Vergnaud e também do próprio

estudo.

Esses recortes dos documentos, na verdade são as situações problemas

propostas para o ensino das operações de multiplicação e divisão, no 2º ciclo para

matemática. Nelas é que se deram os questionamentos e observações recorrentes

da análise e pode-se verificar que a proposta dos PCNs, possui certa identificação

com os pressupostos de Vergnaud, no que diz respeito aproximação do

conhecimento científico e conhecimento escolar. Tanto um como outro, propõe que

o ensino do referido campo conceitual tenha com referência situação problema com

características do cotidiano.

Além disso, existe uma forte aproximação entre as categorias de Vergnaud e

ao que os PCNs denominam de ideias e significações da operação. A maior ênfase

foi para categoria isomorfismo de medida, porque contemplam todas as suas

subclasses, umas com maior e outras com menor intensidade.

O produto de medida, também aparece dentre os grupos de conceitos

matemáticos elencados pelos PCNs, com maior detalhamento para a subclasse do

produto cartesiano que, por sua vez, tem íntima relação com conceito de

combinatória. Dependendo da abordagem pode ter relação com isomorfismo de

medida, mas em um grau de complexidade mais elementar.

Não houve, por parte do documento, qualquer menção à classe da

proporção múltipla. Essa ausência pode ser justificada, uma vez que o próprio

Vergnaud, em seus trabalhos mais recentes, unifica o conceito de produto de

medida com proporção múltipla. Dessa forma, supera o modo de conceber esta

última categoria.

Também é observável, nos PCNs, a não existência das questões que

envolvem as aplicações de teoremas e propriedades do campo multiplicativo, tão

veementemente ressaltado nos pressupostos teóricos de Vergnaud. Apesar de o

documento expressar características das formulações de Vergnaud, ainda sim, deve

caminhar na inter-relação dos conceitos, uma vez que suas orientações e

posicionamentos se autoidentificam como proposta educacional unificadora por não

admitir rupturas entre os conteúdos matemáticos.

Os PCNs ao enfocarem a operação de multiplicação, a partir de tratamentos

diferentes da adição sucessiva, fazem com certa ressalva com o tom de

tradicionalismo. Sua proposição reforça a importância de ampliação desse enfoque

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na construção do conceito da multiplicação e defende a exploração de diversos

enunciados de problemas, tornando possível pensar-se em um campo de

proporcionalidade, combinação, composição retangular e comparativa. Além disso,

os PCNs partem do pressuposto de que os conhecimentos são formas de conduzir a

outros conhecimentos e assim, produzir no estudante, a virtude investigativa diante

de situações desafiadoras inerentes aos conteúdos estudados em sala de aula.

Como os próprios PCNs se autodenominam como inovadores, uma questão,

entre tantas, vale ser explicitada com base no referencial bachelardiano e do próprio

Vergnaud. O caráter inovador dos PCNs se caracteriza com obstáculo

epistemológico e didático, para os professores, na sua implementação?

Isso contribui para adotar-se como justificativa para a inexistência de

qualquer menção aos conteúdos de ensino em Projeto Político Pedagógico de

Escolas. Afinal os PCNs trazem duas compreensões distintas daquelas

tradicionalmente adotadas na escola: 1) epistemológica, ao passar da idéia de soma

de parcela iguais da multiplicação para as significações de comparação,

combinação, proporcionalidade e retangular; 2) didáticos, por passar de uma

experiência pedagógica de memorização de tabuada, para buscar situações

problemas que traduzam as diversas significações conceituais. Essas questões

ficam abertas e se tornam intenção futura de estudar os pressupostos didáticos e

pedagógicos introduzidos pelos PCNs nos documento escolares, como o PPP.

Produziu-se, com essa pesquisa, um sentimento de valorização da causa

educacional e ânimo na busca de por uma mudança nos processos didáticos.

Construiu-se o interesse em estabelecer novos rumos, a fim de manter vivo o

espírito questionador entre as teorias relacionadas à aprendizagem e as propostas

em documentos oficiais para o ensino da Matemática.

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en Sciendes Sociales. Centre d'Etude des Processus Cognitifs et du Langage. Laboratoire associé au C.N.R.S. décembre, 1978.

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