universidade de sÃo paulo each · constituições de cada estado da federação brasileira e nas...
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO – EACH
ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
A TRANSPARÊNCIA COMO FORMA DE APROXIMAÇÃO DA SOCIEDADE
E O TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO
FERNANDO RODRIGUES CAMACHO
São Paulo - SP
2012
FERNANDO RODRIGUES CAMACHO
A TRANSPARÊNCIA COMO FORMA DE APROXIMAÇÃO DA SOCIEDADE
E O TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO
Monografia apresentada ao Curso de Pós-Graduação
lato sensu em Gestão de Políticas Públicas.
Universidade de São Paulo – USP/EACH
Escola de Contas Públicas do TCESP - ECP
Orientador: Prof. José Carlos Vaz
São Paulo - SP
2012
3
DEDICATÓRIA
À minha esposa Maria Paula, pelo apoio, paciência, dedicação e, o que considero mais importante, pelo amor imenso.
4
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, João Roberto (in memorian) e Mafalda, que venceram todos os obstáculos que a vida traz para mostrar a mim e aos meus irmãos, Roberta e Ricardo, a importância de saber e, principalmente, fazer aquilo que é certo.
5
RESUMO
O cidadão comum praticamente desconhece os Tribunais
de Contas como Instituição e seu trabalho, fato que revelam as
necessidades da divulgação do seu trabalho e do resultado de
sua atividade fim. A transparência é o melhor caminho para que
haja uma aproximação do Tribunal de Contas com a sociedade e
para que esta compreenda as informações divulgadas. Não é um
trabalho fácil e algumas barreiras devem ser superadas: a área
de atuação do Tribunal de Contas é muito específica, o que faz
com que a maioria das pessoas desconheça sua atividade e o
resultado do seu trabalho; linguagem muito técnica; o
brasileiro cordial. Vários instrumentos podem ser utilizados:
palestras em escolas, principalmente voltadas às crianças;
internet; redes sociais; aparelhos celulares; rádios e TVs. A
aproximação do Tribunal de Contas e a sociedade por meio da
transparência reforça conceitos democráticos. O TCESP está
ciente desse desafio e o objetivo deste trabalho é propor
ações que podem ser desenvolvidas.
Palavras-chave: transparência, Tribunal de Contas do Estado de
São Paulo, TCESP, sociedade.
6
ABSTRACT
The citizens unknow the institution of Courts of
Accounts and its works. This fact shows the necessity to
spread its works and the results of its final activity. The
transparency is the best for the approximation of Courts of
Accounts and the society. This is important to the community
understand all the informations that be spread. It’s not a
easy thing to do and many obstacles will must be overcome: the
work’s area of Court of Account is very specific; technical
language; the complainsance of the brazilian people. Many
instruments can be used: talks in schools, specialy with
childrens; internet; social nets; cellphones; radios and TVs.
The approximation of Courts of Accounts and the society
strengthen the democracy. The Court of Account of Sao Paulo
State knows the challenge and the purpose of that monography
its propose actions that can be done.
Key words: transparency, Court of Account of Sao Paulo State,
society
7
OBJETIVOS E METODOLOGIA
A finalidade precípua dos Tribunais de Contas é
fiscalizar a utilização do dinheiro público e, para tanto,
prestar contas à sociedade.
Esses dois aspectos revelam uma necessidade
importantíssima: a divulgação do seu trabalho e do resultado
de sua atividade fim à sociedade de forma que esta conheça e
entenda sua função e a informação que foi fornecida.
Entretanto, até que ponto a sociedade, de fato,
recebe e entende essas informações?
Grande parte da sociedade brasileira não tem
consciência sobre o que é transparência e sua importância. Uma
das explicações é a não compreensão do que é divulgado.
Para que isso seja possível deve ser traçada uma
estratégia, enfoque deste trabalho, que pretende propor e
analisar possíveis soluções para a ampliação da comunicação
entre o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP) e a
sociedade, identificar as barreiras que possam existir para
que isso seja alcançado, os instrumentos que podem ser
utilizados, bem como o público alvo para cada um deles.
A base do texto é o resultado da minha experiência
acumulada no exercício do trabalho como servidor do Tribunal
de Contas do Estado de São Paulo desde 15 de dezembro de 1995,
tendo atuado em vários setores da Casa, como a Unidade
Regional de Bauru, Secretaria-Diretoria Geral e Gabinete do
Exmo. Conselheiro Robson Marinho.
8
Como fontes complementares foram utilizadas: pesquisa
bibliográfica, principalmente com o subsídio do acervo de
livros e periódicos da biblioteca do Tribunal de Contas do
Estado de São Paulo; o material ofertado nas aulas ministradas
no curso de Pós-Graduação Lato Senso em Gestão de Políticas
Públicas, organizado pela USP/EACH e ECP/TCESP; internet,
principalmente no que se refere a soluções desenvolvidas por
outros Tribunais de Contas e demais Órgãos Governamentais para
a ampliação da comunicação com a sociedade.
9
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 10
1 A TRANSPARÊNCIA
1.1 A Transparência como princípio
1.2 Os Tribunais de Contas
1.3 A Transparência e os demais Órgãos Públicos
14
14
23
28
2 ELEMENTOS PARA O ATENDIMENTO DA TRANSPÂRÊNCIA
2.1 Instrumentos que podem ser utilizados
2.2 Público alvo para as ações de transparência pelo Tribunal de Contas
2.3 Barreiras que existem para que a transparência promova resultados
33
33
38
41
3 ESTRATÉGIA DE ATUAÇÃO DO TCESP
3.1 Situação atual
3.2 Ações voltadas à sociedade que podem ser desenvolvidas
46
46
52
CONCLUSÃO 58
REFERÊNCIAS 60
10
INTRODUÇÃO
Os Tribunais de Contas possuem, constitucionalmente,
um fim nobre: fiscalizar a utilização do dinheiro público. E o
destinatário final de suas ações é a sociedade.
É o que se extrai do disposto nos artigos 70, caput,
e 71 da Constituição Federal:
Art. 70. A fiscalização contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial da União e das
entidades da administração direta e indireta, quanto à
legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das
subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo
Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo
sistema de controle interno de cada Poder.
(...)
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso
Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de
Contas da União(...)
Esses mandamentos foram reproduzidos nas
Constituições de cada Estado da federação brasileira e nas
Leis Orgânicas dos Municípios de São Paulo e Rio de Janeiro,
os únicos que possuem Tribunais de Contas do Município, não
confundindo com alguns Estados que possuem duas Cortes de
Contas estaduais, sendo uma com atuação restrita aos
municípios e a outra responsável pela fiscalização dos atos do
Estado, a exemplo da Bahia.
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O texto constitucional é claro ao prever que, muito
embora o controle externo seja exercido pelo Poder
Legislativo, este o faz com o auxílio do Tribunal de Contas.
O cidadão comum, ao ler o parágrafo anterior,
possivelmente terá duas dúvidas imediatas: que órgão é esse e
o que ele faz? Pode parecer um contrassenso, uma vez que os
Tribunais de Contas estão presentes no nosso ordenamento
jurídico desde a primeira Constituição Federal, de 1824, mas
sua função e atuação são muito pouco conhecidas pela
comunidade.
Esses dois aspectos revelam necessidades
importantíssimas: a divulgação do trabalho do Tribunal de
Contas e do resultado de sua atividade fim à sociedade de
forma que esta conheça e entenda sua função.
Outra questão não menos relevante é que a informação
a ser passada, seja pelo cumprimento de uma obrigação legal ou
não, deve ser entendida pela comunidade.
Parece simples, mas não é bem assim. Até que ponto a
sociedade, de fato, recebe e entende essas informações? Como
elas são difundidas? Qual o grau de proximidade do Tribunal de
Contas do Estado de São Paulo e o cidadão, ou melhor, quais os
mecanismos usados para o estabelecimento dessa relação? São
utilizados instrumentos específicos para públicos alvo
diferentes?
O melhor caminho para responder essas questões é o da
transparência, não no sentido de que há algo sigiloso, mas no
de que a informação deve ser divulgada e devem ser
desenvolvidos meios para que essa informação seja recebida e
compreendida pelo cidadão.
12
Dar transparência significa tornar claro, visível,
perceptível o sentido e o motivo.
Tornar visível é fácil. Tornar claro, nem tanto. Essa
afirmação é verdadeira à medida que obrigações previstas na
legislação em vigor, no sentido de disponibilizar informações,
são muitas e na maioria das vezes respeitadas.
Não faltam exemplos de normas legais que trazem um
sem número de obrigações relativas à publicidade por parte dos
órgãos públicos, como a própria Constituição Federal.
A título ilustrativo, é possível mencionar o artigo
165, §3º, que determina ao Poder Executivo a publicação, até
trinta dias após o encerramento de cada bimestre, de um
relatório resumido da execução orçamentária.
No plano infraconstitucional, um bom exemplo é a Lei
Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a chamada Lei de
Responsabilidade Fiscal, que estabelece no artigo 55, §2º, a
obrigatoriedade de publicação pelos Poderes e órgãos
disciplinados por essa norma, inclusive o Tribunal de Contas,
de um relatório de gestão fiscal. Chama à atenção, nesse caso,
a determinação expressa da lei para que a divulgação dessas
informações também seja feita por meio eletrônico.
A Lei federal nº 4320, de 17 de março de 1964, por
sua vez, também traz no artigo 111, §1º, a necessidade de
publicação de quadros baseados nos orçamentos e nos balanços.
Para fechar o principal grupo de normas que sintetiza
a atuação dos Tribunais de Contas, as Leis federais nº 8666,
de 21 de junho de 1993, e nº 10520, de 17 de julho de 2002,
13
que regulam as licitações, inclusive por meio da modalidade
pregão, e os contratos públicos nas três esferas de governo,
impõem a publicidade de vários atos, como dos editais de
certames licitatórios.
Há ordenamentos que determinam a exteriorização de
informações não só por meio de publicações, mas por outras
formas de divulgação, como pela realização de audiências
públicas.
A própria Lei de Responsabilidade Fiscal traz esse
tipo de situação, como no inovador artigo 9º, §4º, que impôs a
realização de audiências públicas quadrimestrais para a
verificação do cumprimento de metas, alçando o criticado
planejamento público a algo mais concreto.
Merece destaque a edição da Lei federal nº 12527, de
18/11/11, chamada lei de acesso à informação, que regula o
inciso XXXIII do artigo 5º, o inciso II do §3º do artigo 37 e
o §2º do artigo 216, todos da Constituição Federal.
Grande parte da sociedade brasileira não tem
consciência nem interesse sobre o que é transparência e sua
importância. Chega a ser cultural. Uma das explicações é a não
compreensão do que é divulgado.
Para que isso seja possível deve ser traçada uma
estratégia, enfoque deste trabalho, que pretende propor e
analisar possíveis soluções para a ampliação da comunicação
entre o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP) e a
sociedade, identificar as barreiras que possam existir para
que isso seja alcançado, os instrumentos que podem ser
utilizados, bem como o público alvo para cada um deles.
14
1. A TRANSPARÊNCIA
1.1 A Transparência como princípio
A Constituição Federal de 1988, chamada “Cidadã”,
elevou a transparência ao posto de princípio constitucional. É
o que se extrai da leitura do artigo 37.
Art. 37. A administração pública direta e indireta
de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]
§ 1º - A publicidade dos atos, programas, obras,
serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter
caráter educativo, informativo ou de orientação social,
dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que
caracterizem promoção pessoal de autoridades ou
servidores públicos.
Não bastando isso, o texto constitucional ainda
disciplinou algumas regras, como a necessidade do caráter
educativo, informativo ou de orientação social da publicidade,
ou seja, admite apenas essas funções. Em nenhuma hipótese pode
haver publicidade de ato público de cunho pessoal, sendo
vedados nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção
pessoal de autoridades ou servidores públicos.
É possível notar que o legislador constituinte já
demonstrava preocupação não só com o exercício da publicidade,
mas também que o divulgado fosse compreendido pelo povo. Além
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de evitar a promoção pessoal do agente público, essa é a razão
da necessidade do caráter educativo, informativo ou de
orientação social da publicidade.
Esses aspectos permitem inferir que a transparência,
em todos os seus sentidos, está intrinsecamente relacionada à
idéia de Estado Democrático de Direito, uma vez que é
ferramenta essencial para o controle social.
Hélio Saul Mileski1, por exemplo, entende que “o
Estado Social e Democrático de Direito confirmou-se como um
Estado Plural que, formalmente, garante a liberdade, afirma e
protege os direitos fundamentais do cidadão, assegura a
realização de uma ordem econômica e social justa, tudo dentro
do princípio da igualdade perante a lei e a estrutura de
acordo com uma nova concepção política de poder, adotando o
princípio da transparência, com participação popular. Resta,
de outra parte, no decorrer do século XXI, haver a aplicação,
de forma real e concreta, desses novos desígnios do Estado
Democrático de Direito(...)”
É notória a preocupação do autor no sentido de elevar
a transparência como pilar do próprio Estado Social e
Democrático de Direito. E nem poderia ser de outra maneira,
uma vez que a legitimidade do Estado está intimamente ligada a
esse aspecto.
Fabrício Motta2, adotando a mesma linha de
raciocínio, defende que “o princípio da publicidade
1 MILESKI, Helio Saul. A transparência da Administração Pública pós-moderna e o novo regime de responsabilidade fiscal. Revista Técnica dos Tribunais
de Contas. Belo Horizonte, setembro de 2010. Ano 1, nº 0, pp. 115-149. 2 MOTTA, Fabrício. Publicidade e Transparência nos dez anos de Lei de
Responsabilidade Fiscal. Revista Técnica dos Tribunais de Contas. Belo
Horizonte, setembro de 2010. Ano 1, nº 0, p. 271-289.
16
administrativa caracteriza-se também como direito fundamental
do cidadão, indissociável do princípio democrático (...).
Protege o cidadão de intromissões indevidas da Administração
em sua esfera de liberdade constitucionalmente protegida.”
Bruno Wilhelm Speck e Marcelo Figueiredo3 ensinam
que, frequentemente, a transparência é uma arma simples e mais
eficiente para evitar arranjos antes tolerados sob o véu da
desinformação, sendo a publicidade requisito de eficácia e
moralidade do ato administrativo.
No Brasil, entretanto, nem sempre foi assim e a
explicação desse fato tem raiz na colonização do nosso país. O
colonizador português não tinha compromisso com a nova terra.
Sérgio Buarque de Holanda4, na obra “Raízes do
Brasil”, fez uma análise da colonização ocorrida aqui sob o
ponto de vista da aventura e do trabalho. Entendeu que na
América do Norte o colonizador foi lá para trabalhar e
construir uma nação. Já o português, ao contrário, tinha uma
visão de curto espaço de tempo, o que ele chamou de
“aventura”.
Segundo o renomado estudioso, havia no Brasil pouca
expectativa de algo sério e duradouro, estando o enfoque
voltado à riqueza da metrópole, e o colonizador português
tinha pouco compromisso com a nova terra, uma espécie de
mentalidade ibérica, até porque esses mesmos aspectos foram
verificados na colonização espanhola na América Latina.
3 SPECK, Bruno Wilhem e FIGUEIREDO, Marcelo. Caminhos da Transparência.
Campinas. Editora da UNICAMP. 2002. pp. 19 e 58. 4 BUARQUE DE HOLLANDA, Sérgio. Raízes do Brasil. Editora da Universidade.
1963.
17
A colonização ocorreu aqui num momento em que na
Europa acontecia uma profunda transformação provocada por
idéias liberais, com o surgimento da burguesia comercial.
Enquanto no norte da Europa surgia uma sociedade pré-
capitalista, liberal, na península ibérica ainda prevalecia
uma sociedade conservadora, caracterizada por grande
desigualdade entre os homens e hierarquizada, sustentada por
privilégios.
A mentalidade existente no colonizador português,
como a fidalguia portuguesa, influenciou diretamente a
formação da sociedade brasileira.
O pressuposto da concepção liberal de mundo é a
liberdade e igualdade entre os homens, a existência de um
espaço público para o debate livre, e esse movimento só chegou
à península ibérica, ainda que de forma parcial, no século
XIX.
Uma das marcas distintivas entre o plebeu e o nobre
era justamente o trabalho. Por isso é que Sérgio Buarque de
Holanda chamou o colonizador de aventureiro.
Um regime democrático pressupõe a participação de um
maior número de pessoas. O Brasil foi o único país do mundo
que após sua independência estabeleceu um regime monárquico,
da sociedade do privilégio, ainda dominada por oligarquias.
Aqui, no século XIX, já se notava a presença das
idéias liberais, mas o que se via era muito discurso e pouca
prática, fruto da sociedade patrimonialista da época, movida
basicamente por interesses particulares, e a
18
instrumentalização política brasileira residia numa camada
superficial da sociedade.
Hoje ainda há resquícios dessa sociedade, mas é certo
que evoluímos e o caminho ainda é longo.
Sem a transparência, a definição de democracia, no
qual é a forma de governo do povo, para o povo e pelo povo não
teria sentido. O governo “do povo” está relacionado à
soberania popular e o termo “pelo povo” encontra guarida no
sistema representativo.
O “para o povo” é que depende do respeito à
publicidade, pois representa o interesse popular e é nesse
ponto que está a importância dos Tribunais de Contas, uma vez
que fiscalizam a utilização do dinheiro público.
A prestação de contas e a tomada de contas são
processos burocráticos que demandam recursos, são caros, mas
essenciais à existência da democracia.
Para Wallace Paiva Martins Junior5, “o princípio da
transparência reúne funções materiais e instrumentais:
aperfeiçoamento do caráter democrático do Estado (pela
legitimidade do uso e do exercício do poder e da função
pública), concretização da dignidade da pessoa humana,
restauração da confiança na Administração Pública (pelas
possibilidades de acesso e participação), parâmetro de
controle da fidelidade aos princípios e às regras da
Administração Pública integrante do devido processo legal
administrativo, garantia dos direitos dos administrados,
recursos de obtenção e eficiência da ação administrativa mais
5 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Transparência Administrativa. São Paulo:
Saraiva, 2011. pp. 47/48.
19
próxima das demandas sociais e meio de maior adesão e consenso
dos administrados às decisões administrativas”.
Para o autor, “quanto maior o grau de transparência
administrativa maior também será o respeito devotado pelos
agentes públicos aos princípios jurídico-administrativos
(moralidade, legalidade, imparcialidade etc.). A visibilidade
proporcionada pelo fator psicológico de temor ao desvio de
poder, ao comprometimento irresponsável dos recursos públicos
etc. Em grande parte, os vícios da Administração Pública
devem-se à sigilosidade, cuja redução, além da efetividade do
controle, principia com maior visibilidade”.
Dessa forma, a transparência garante o respeito ao
direito dos administrados e é requisito do bom funcionamento
estatal e à medida que aumenta, também proporciona o
crescimento do controle e conhecimento do Estado pela
sociedade.
O principal reflexo do princípio da transparência é o
controle social, como bem definem Toledo Jr. e Rossi6: “o
controle social do erário é peça básica da Lei de
Responsabilidade Fiscal, que, para tanto, estabelece intensa
agenda de debate popular e de publicidade das contas”.
A transparência das informações governamentais
permite que a sociedade exerça o papel de controle daquilo que
é seu. O Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Ferreira
Mendes7 trabalha bem com esse conceito quando afirma que “a
idéia de transparência possui a importante função de fornecer
subsídios para o debate acerca das finanças públicas, o que
6 TOLEDO JR, Flávio C. de e ROSSI, Sérgio Ciquera. Lei de Responsabilidade
Fiscal Comentada Artigo por Artigo. 3ª Edição. São Paulo: NDJ, 2005. p.
288. 7 MENDES, Gilmar Ferreira e outros. Comentários à Lei de responsabilidade
Fiscal. 2ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2007. pp. 346 e 348.
20
permite uma maior fiscalização das contas públicas por parte
dos órgãos competentes e, mais amplamente, da própria
sociedade. A busca pela transparência é a busca pela
legitimidade”.
O jurista ainda menciona que “o acesso às informações
governamentais que proporciona o princípio da transparência
fortalece a democracia; do mesmo modo, o fortalecimento desta
estimula um maior acesso àquelas informações”.
Desde o ano 2000, com a edição da Lei de
Responsabilidade Fiscal, a transparência ganhou uma
importância singular no que diz respeito à gestão dos recursos
públicos.
O artigo 1º, §1º, estabeleceu a ação planejada e
transparente como pressuposto da responsabilidade na gestão
fiscal.
Art. 1º (...)
§ 1o A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe
a ação planejada e transparente, em que se previnem
riscos e corrigem desvios capazes de afetar o
equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento
de metas de resultados entre receitas e despesas e a
obediência a limites e condições no que tange a
renúncia de receita, geração de despesas com pessoal,
da seguridade social e outras, dívidas consolidada e
mobiliária, operações de crédito, inclusive por
antecipação de receita, concessão de garantia e
inscrição em Restos a Pagar.
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Na exposição de motivos do Projeto dessa lei ficou
evidenciado que a experiência internacional sobre códigos de
finanças públicas mostrava a transparência como um dos
instrumentos mais eficazes para a disciplina fiscal, tanto que
essa norma legal reservou capítulo específico sobre o tema,
entre os artigos 48 e 59, estabelecendo os instrumentos de
transparência na gestão fiscal, com exigência de ampla
divulgação.
Afinal, existe diferença entre divulgar e publicar?
Sobre essa questão é interessante mencionar o
posicionamento adotado pelo Exmo. Conselheiro do Tribunal de
Contas do Estado de São Paulo, Claudio Ferraz de Alvarenga,
quando da apreciação do Processo TC 1075/008/01: “na
sistemática da Lei de Responsabilidade Fiscal, há distinção.
Bem analisados, de um lado, os dispositivos que utilizam o
verbo publicar (ou derivações dele), e, de outro lado, os que
aludem a divulgar (ou variantes), percebe-se a diferença.
Divulgar significa dar amplo conhecimento por qualquer meio;
publicar significa dar amplo conhecimento pela imprensa”.
Assim, publicidade não significa, exclusivamente,
externar informações por meio da imprensa escrita, salvo
quando essa é a exigência legal. Sem tal especificação, as
informações podem ser divulgadas por meio eletrônico, como a
internet, e até pela afixação de documentos em locais
previamente estabelecidos na legislação.
A respeito disso, Martins Junior8, defende que “a
pluralidade de formas de publicidade administrativa é
8 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Transparência Administrativa. São Paulo:
Saraiva, 2011. p. 82.
22
imposição elementar da concepção de uma administração pública
aberta e fiel ao princípio da transparência”.
E não se pode negar que a história pode ser dividida
em antes e depois do advento da internet, uma vez que as
formas de agir do Estado e a de pensar do cidadão foram
sensivelmente modificadas.
A principal explicação para isso é que as distâncias
foram encurtadas. O Estado e a sociedade estão mais próximos.
Em alguns casos, apenas a um clique no mouse ou no celular.
Ano a ano aumentam as ferramentas que possibilitam à
comunidade o acesso a informações públicas. Foi-se o tempo em
que isso era sinônimo apenas da leitura do diário oficial.
Por fim, a doutrina enquadra a transparência no grupo
dos direitos de quarta geração, enfocando maior participação
do cidadão na gestão da coisa pública.
23
1.2 Os Tribunais de Contas
Talvez o maior fundamento para a existência dos
Tribunais de Contas esteja expresso na Declaração dos Direitos
do Homem e do Cidadão, de 1789, da qual constou no artigo 15
que “a sociedade tem o direito de pedir conta a todo o agente
público de sua administração”.
“Não basta julgar a administração, denunciar o
excesso cometido, colher a exorbitância, ou a
prevaricação, para as punir, circunscrita a estes
limites, essa função tutelar dos dinheiros públicos
será muitas vezes inútil, por omissa, tardia ou
impotente. Convém levantar, entre o Poder que
autorizará periodicamente a despesa e o Poder que
quotidianamente a executa, um mediador independente,
auxiliar de um e de outro, que, comunicando com o
Legislativo, e intervindo na Administração, seja não só
o vigia, como a mão forte da primeira sobre a segunda,
obstando a perpetração das infrações orçamentárias, por
um veto oportuno nos atos do Executivo, que direta ou
indireta, próxima ou remotamente, discrepem da linha
geral da lei de finanças”.
Os Tribunais de Contas estão presentes no nosso
ordenamento jurídico desde a Constituição Política do Império
do Brasil de 1824. Aqui ainda aparecia com o nome de Thesouro
Nacional, um tribunal que tinha a função de verificar a
administração, arrecadação e contabilidade da receita e
despesa da Fazenda Nacional.
24
Na forma como se vê hoje, somente após a proclamação
da República, no Decreto nº 966-A, de 7 de novembro de 1890,
com a criação do Tribunal de Contas da União, depois previsto
na Constituição de 1891. O texto acima é de autoria de Rui
Barbosa, então Ministro da Fazenda, e faz parte da exposição
de motivos desse decreto.
Por vezes com mais atribuições, outras com menos, o
Tribunal de Contas sempre esteve presente nas Constituições
que se seguiram, de 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988. Todavia, em
1939, com a implantação do Estado Novo e um regime de exceção,
todos os Tribunais de Contas foram extintos. A Constituição de
1934 restabeleceu o Tribunal de Contas da União e a de 1946 os
estaduais.
Da Constituição de 1891 constou autorização para que
cada Estado promovesse experiências próprias, o que
possibilitou a criação dos Tribunais de Contas Estaduais,
sendo o primeiro deles o do Estado do Piauí, em 1899, seguido
pelo da Bahia, em 19159.
O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo10 foi o
terceiro do país, instituído por meio de emenda constitucional
em 1921 e estruturado pela Lei nº 1961, de 29 de dezembro de
1923.
Hoje, é responsável pela fiscalização do Governo do
Estado e de seiscentos e quarenta e quatro municípios
paulistas, ou seja, todos menos da cidade de São Paulo, que
possui um Tribunal de Contas próprio.
9 CASTARDO, Hamilton Fernando. O Tribunal de Contas no Ordenamento Jurídico
Brasiliero. Campinas: Millennium Editora Ltda., 2007. p. 61. 10 Revista do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo nº 60 -
agosto/setembro de 1989, pp. 27 a 36.
25
A Constituição de 1988 vedou a criação de tribunais,
conselhos ou órgãos de contas municipais, preservando os
existentes até então. Dessa foram, somente os municípios de
São Paulo e Rio de Janeiro possuem Tribunais de Contas
Municipais, desde 1968 e 1980, respectivamente11.
No ordenamento jurídico atual, o Tribunal de Contas
da União foi instituído como paradigma para os estaduais e os
municipais.
O Tribunal de Contas é independente, não integrando a
estrutura de nenhum dos Poderes, assim também entendido pelo
Supremo Tribunal Federal, para quem o Tribunal de Contas da
União recebe suas funções diretamente da Constituição Federal.
Como explica Castardo12, tem “autonomia financeira,
quando elabora seu próprio orçamento; funcional, pois seus
membros gozam de vitaliciedade; administrativa, com
competência de encaminhar projetos de lei de seu interesse
para a criação e extinção de seus cargos”.
Possui competência fiscalizadora, judicante,
sancionadora, consultiva, informativa, corretiva, normativa e
de ouvidoria, atuando a priori, a posteriori e
concomitantemente.
Assim como qualquer outro órgão público, tem que se
preocupar com o atendimento pleno ao princípio da
transparência, seja no que diz respeito à divulgação de
informações ou no contato com a sociedade.
11 CASTARDO, Hamilton Fernando. O Tribunal de Contas no Ordenamento Jurídico
Brasiliero. Campinas: Millennium Editora Ltda., 2007. p. 106/107. 12 Ibidem, p. 66.
26
Como visto, de um modo geral, as dificuldades para
cumprir essa necessidade têm fundamento na própria formação do
estado democrático brasileiro.
Pode-se dizer que a gestão pública moderna possui
três dimensões.
A primeira, econômico-financeira, tem foco na
eficiência, nos recursos e processos, que considera o cidadão
como contribuinte e foi responsável pelas reformas de primeira
geração, que visaram o ajuste estrutural do Estado,
privatização, reengenharia, introdução da contabilidade
gerencial e da auditoria operacional e equilíbrio fiscal.
A segunda, administrativa, tem foco na eficácia, no
produto, sendo o cidadão um usuário, tendo provocado as
reformas de segunda geração, com preocupação na qualidade do
serviço público, desburocratização, governo eletrônico,
processos de treinamento e desenvolvimento, investimento e
controle social, bem como transparência administrativa.
A terceira, sócio-política, tem foco na efetividade,
no resultado, com o cidadão participando de um processo
político, detentor de direitos e deveres. Não foi responsável
propriamente por reformas, mas por uma inovação, surgida pela
necessidade da sociedade, provocando o desenvolvimento
integrado por meio da democracia participativa.
Hoje, presenciamos os efeitos da dimensão
administrativa, com a econômica ainda perdurando em alguns
aspectos. A sócio-política, no entanto, ainda não é muito
presente, uma vez que não o Estado não está acostumado a
direcionar a atenção para o resultado e não para a forma e o
27
cidadão ainda não tem a real dimensão dos seus direitos e
deveres.
É possível inferir que as questões relacionadas à
transparência passam pelas reformas de segunda geração, a
caminho das inovações da terceira geração.
Como o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo está
enquadrado nesse processo, o que faz e quais as medidas que
pode tomar são temas que serão estudados no capítulo 3 deste
trabalho.
28
1.3 A Transparência e os demais Órgãos Públicos.
Como visto, existem inúmeros exemplos de normas
legais que trazem obrigações relativas à publicidade e essas
exigências não se limitam às esferas da federação e seus
Poderes. Muito do que deve ser divulgado deve ser por órgão
público, por unidade da administração.
A análise do cumprimento dessas obrigações pode ser
feita sob óticas diferentes.
Apenas a título ilustrativo e com limitação ao
universo da internet, dificilmente será encontrado um sítio
eletrônico de um órgão público que não dê algum destaque à
questão da transparência.
Esse aspecto basta para que seja possível a conclusão
de que o tema é tratado com a devida atenção que reclama?
Certamente, não.
Há a necessidade de uma verificação mais detalhada.
De que adianta o sítio eletrônico de uma Prefeitura divulgar
que existe um edital de licitações aberto se não tornar
possível o download do respectivo arquivo?
Isso mostra que além de divulgar, tem que haver
qualidade do que é divulgado. As informações devem ser
completas e os acessos a elas estimulados e facilitados.
Talvez um dos problemas que os órgãos enfrentem,
principalmente os municipais, seja a necessidade de um
aparelhamento para o desenvolvimento de ações voltadas à
29
publicidade, uma vez que mais de 90% dos municípios
brasileiros são de pequeno porte e ressentem de estruturação
técnica adequada.
O legislador não se furtou a essa questão, tanto que
o artigo 64, caput, da Lei de Responsabilidade Fiscal previu
por parte da União a prestação de assistência técnica e
cooperação financeira aos municípios.
Art. 64. A União prestará assistência técnica e
cooperação financeira aos Municípios para a
modernização das respectivas administrações tributária,
financeira, patrimonial e previdenciária, com vistas ao
cumprimento das normas desta Lei Complementar.
§ 1o A assistência técnica consistirá no
treinamento e desenvolvimento de recursos humanos e na
transferência de tecnologia, bem como no apoio à
divulgação dos instrumentos de que trata o art. 48 em
meio eletrônico de amplo acesso público.
§ 2o A cooperação financeira compreenderá a doação
de bens e valores, o financiamento por intermédio das
instituições financeiras federais e o repasse de
recursos oriundos de operações externas.
O mencionado artigo 48 estabeleceu expressamente
instrumentos da transparência da gestão fiscal e outras formas
de assegurá-la.
Art. 48. São instrumentos de transparência da
gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação,
inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os
planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias;
as prestações de contas e o respectivo parecer prévio;
o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o
Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas
desses documentos.
30
Parágrafo único. A transparência será assegurada
também mediante:
I – incentivo à participação popular e realização
de audiências públicas, durante os processos de
elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes
orçamentárias e orçamentos;
II – liberação ao pleno conhecimento e
acompanhamento da sociedade, em tempo real, de
informações pormenorizadas sobre a execução
orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de
acesso público;
III – adoção de sistema integrado de administração
financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de
qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e
ao disposto no art. 48-A.
Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso
II do parágrafo único do art. 48, os entes da Federação
disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o
acesso a informações referentes a:
I – quanto à despesa: todos os atos praticados
pelas unidades gestoras no decorrer da execução da
despesa, no momento de sua realização, com a
disponibilização mínima dos dados referentes ao número
do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao
serviço prestado, à pessoa física ou jurídica
beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao
procedimento licitatório realizado;
II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento
de toda a receita das unidades gestoras, inclusive
referente a recursos extraordinários.
Quando da edição da Lei de Responsabilidade Fiscal
muito se discutiu se essa norma iria “pegar”, pela falta de
tradição dos governantes brasileiros em realizar um
planejamento criterioso.
O tempo mostrou que as mudanças de comportamento
provocadas por essa norma foram positivas, tanto que seu
texto, mesmo representando um entrave ao mau administrador
público, foi alterado uma única vez, em 2009.
31
Apesar da grande pressão para a eliminação de
exigências, principalmente as relacionadas aos limites de
gastos com pessoal e endividamento, a alteração promovida pela
Lei Complementar nº 131, de 27 de maio de 2009, foi justamente
relativa a mais obrigações atinentes à transparência. O
parágrafo único do artigo 48 e seus incisos, bem como o artigo
48-A são os frutos dessa modificação.
A Lei Complementar nº 131/09 foi chamada de Lei Geral
da Transparência.
Com o advento dessa alteração na Lei de
Responsabilidade Fiscal multiplicaram os sítios eletrônicos
governamentais destinados a tornar públicas principalmente
informações relativas ao gerenciamento fiscal.
A União criou o www.portaltransparência.gov.br. O
Governo de São Paulo o www.fazenda.sp.gov.br/conta1, e a
Prefeitura de São Paulo o
www.deolhonascontas.prefeitura.sp.gov.br .
Todos esses sítios são meios hábeis para a consulta
de informações referentes à movimentação orçamentária e
financeira desses órgãos, com relatórios gerenciais e
contábeis.
A União também disponibilizou uma série de portais
demonstrando o quanto repassou para cada Estado da Federação.
O www.sp.transparência.gov.br mostra os recursos federais
recebidos pelo Estado de São Paulo.
Esse tipo de informação permite o cruzamento de
dados, uma vez que o que o órgão repassador divulgou deve ser
32
igual ao número que o órgão recebedor registrou, o que aumenta
bastante o índice de transparência dessa informação e facilita
a atuação dos órgãos de controle, tanto externo, como os
Tribunais de Contas, quanto o interno.
Todavia, aqui vale a mesma questão: apesar dos dados
divulgados, houve preocupação em relação à assimilação dessas
informações pela comunidade?
Uma simples observação do material divulgado na
maioria desses sítios eletrônicos mostra que a sociedade, de
uma forma geral, continua com as mesmas dificuldades em
entender essas informações. Um bom exemplo que ilustra esse
problema são os relatórios resumidos da execução orçamentária
e relatórios de gestão fiscal, documentos publicados pelos
órgãos da Administração Pública por força da Constituição
Federal e da Lei de Responsabilidade Fiscal.
E é gasto muito dinheiro, uma vez que a
operacionalização dos atos de publicidade tem um custo.
33
2. ELEMENTOS PARA O ATENDIMENTO DA TRANSPARÊNCIA
2.1 Instrumentos que podem ser utilizados
Houve a época em que publicação de informações do
governo era sinônimo de “diário oficial”. Hoje, além dos
tradicionais diários oficiais da União, DOU, e do Estado, DOE,
há os municipais.
Não que esse meio de comunicação não seja importante,
mas quem o lê? Se o cidadão comum se interessar, onde é que
encontra um exemplar?
Os plantonistas logo se insurgirão e dirão que em
qualquer repartição pública há exemplares de diários oficiais,
o que é verdade. Também podem ser consultados pela internet.
Mas não é essa a questão.
O fato é que a abrangência desse instrumento, por
mais importante que seja, é restrita demais e não é suficiente
para o atendimento do exigido para o cumprimento do princípio
da transparência.
Essa questão está hoje relativizada, eis que cada vez
mais é desenvolvida a tecnologia da informação, importante
aliada no diz respeito à transparência.
Durante o dia, seja no trabalho ou em outras
atividades, a pessoas são constantemente bombardeadas por
informações. Até mesmo dentro de um transporte coletivo é
possível ter acesso a meios de informação.
34
O Brasil vive um momento de maturação que traz
algumas consequências: nunca se buscou tanto as facilidades
eletrônicas e tampouco tivemos tantos estudantes de nível
superior.
Esses aspectos abrem diversos caminhos para que
informações sejam passadas.
O primeiro exemplo, por óbvio, é a internet,
ferramenta que encurta as distâncias de um país de dimensões
continentais como o nosso.
Estudos13 realizados mostram que em 2011 o Brasil era
o 5º do mundo em número de conexões à internet, representando
48% da população. E esse percentual só aumenta, e rápido,
tanto que em 2007 esse índice era de apenas 27%.
A mesma pesquisa mostra que são 78 milhões de
brasileiros conectados acima de dezesseis anos. Se levados em
conta os acima de doze anos, esse número passa para 81,3
milhões.
Alguns fatores de ordem econômica explicam esses
números, como a venda crescente e facilitada de computadores e
o aumento de conexões de banda larga. A estimativa é que em
2012 seja atingida a marca de 100 milhões de equipamentos em
uso14.
Nessa esteira, outro relevante instrumento de difusão
de informação são as redes sociais, fenômeno neste país. Por
várias razões, uma parcela grande da população brasileira se
interessa por essa forma de relacionamento.
13 Pelas empresas F/Nazca, Ibope/Nielsen, Fecomércio/RJ, Ipsos e FGV, no
sítio http://tobeguarany.com/internet_no_brasil.php, acessado em 22/1/2012. 14 Ibidem.
35
As mais acessadas, não necessariamente nessa ordem,
são: Twitter, Facebook, Myspace, Orkut. Mas há diversas
outras.
Sua utilização não se limita ao lazer, sendo
importante ferramenta de contato entre amigos e familiares e
até mesmo de trabalho.
Algumas características importantes devem ser
evidenciadas sobre as redes sociais: baixo custo; alta
velocidade de difusão da informação; milhões de acessos
diários; excelente meio de alcance da população mais jovem;
compartilhamento de informações com várias pessoas ao mesmo
tempo.
Estima-se que dois terços da população mundial
acessem alguma rede social. No Brasil, 80% dos que usam a
internet acessam as redes15.
Um estudo feito em setembro de 2008 pela americana
Cone INC.16 constatou que 93% dos usuários de mídias sociais
acreditam que as empresas deveriam estar nessas redes e que
85% deles acreditam que a interação das empresas com seu
público pelas redes é importante. O que muitos ainda não
enxergaram é que isso vale também para os órgãos públicos, o
que inclui o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.
O caminho para a divulgação de informações de órgãos
públicos passa pela utilização das redes sociais.
15 http://www.escritoriodigital.net/blog. Acessado em 22/1/2012. 16 Ibidem.
36
Outro importante mecanismo são os aparelhos
celulares, que ainda servem para fazer ligações telefônicas,
mas que se transformaram em verdadeiros minicomputadores.
A evolução tecnológica proporcionou a esses aparelhos
acesso rápido e de qualidade à internet.
O Brasil, com mais de 200 milhões de celulares, marca
atingida em 2010, é o sexto maior mercado no mundo e São Paulo
é um dos Estados em que o número de aparelhos é maior que de
sua população17.
Uma forma de comunicação mais específica e custosa,
mas que não pode ser desconsiderada também em razão da
capacidade de difusão de informação são as rádios e TVs.
É cada vez mais comum a existência de canais
exclusivamente administrados por órgãos públicos, sendo toda a
sua programação baseada nas atividades que esses órgãos
desenvolvem.
Como exemplo é possível citar a TV Justiça, gerida
pelo Supremo Tribunal Federal, a TV Senado, a TV Câmara e, em
São Paulo, a TV ALESP, todos esses últimos administrados por
órgãos do Poder Legislativo.
A grande relevância está no fato de que o brasileiro
tem o costume de ouvir rádio e assistir televisão. Uma
pesquisa18 encomendada pela Secretaria de Comunicação da
Presidência da República (SECOM) revelou que a televisão é o
meio de comunicação mais utilizado no Brasil, por 97% da
população, seguido pelo rádio, com 80%.
17 http://epocanegocios.globo.com e http://www.celulares.etc.br/celular-no-
brasil. Acessados em 22/1/2012. 18 http://contasabertas.uol.com.br/WebSite/Noticias. Acessado em 22/1/2012.
37
Os meios impressos não podem ser descartados,
todavia, não podem ser exclusivos, como outrora. Na realidade,
são importantes veículos para divulgação de informações de
forma didática, como manuais e cartilhas.
Por fim, cabe citar o corpo a corpo. O contato direto
coma pessoa pode permitir, além da efetiva aproximação do
cidadão com o órgão público, uma interação mais dinâmica por
meio de cursos e palestras.
38
2.2 Público alvo para as ações de transparência pelo Tribunal de Contas
São três os grupos a quem devem ser destinados os
esforços de divulgação de informação pelo TCESP, no intuito de
atender ao princípio da transparência em todos os seus
enfoques.
O primeiro está relacionado àqueles que se submetem a
suas atividades de fiscalização.
O parágrafo único do artigo 70 da Constituição
Federal estabelece de forma clara quem está sob a jurisdição
do Tribunal de Contas, texto esse reproduzido no artigo 32,
parágrafo único, da Constituição do Estado de São Paulo no
caso do TCESP.
Art. 70.(...)
Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa
física ou jurídica, pública ou privada, que utilize,
arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros,
bens e valores públicos ou pelos quais a União
responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de
natureza pecuniária.
Sob a ótica da atividade fim do Tribunal de Contas,
suas ações estão direcionadas àqueles que utilizam, arrecadam,
guardam, gerenciam ou administram dinheiros, bens e valores
públicos.
Ocorre que a sociedade é a dona desses dinheiros,
bens e valores. Portanto, as ações também devem ser voltadas a
ela, que é o segundo grupo.
39
O terceiro grupo são os que formam seu corpo de
servidores.
A grande vantagem de passar informações por
instrumentos diversos de comunicação, como os mencionados no
item 2.1, é que podem ser desenvolvidas atividades para
públicos alvos diferentes.
O enfoque da informação que vai ser divulgada também
deve ser específico para cada um desses instrumentos.
A utilização das redes sociais facilitará muito o
acesso à população mais jovem, dotada, inclusive, de linguagem
própria.
Se a preocupação for fazer chegar uma informação a
essa parcela da população de forma que isso seja assimilado, o
cuidado com os termos a serem utilizados é condição
prioritária.
Os efeitos de um relatório das atividades
desenvolvidas pelo Tribunal de Contas no exercício, por
exemplo, será um se destinado à seus servidores, outro se aos
jurisdicionados e um diferente se voltado para a sociedade.
O mesmo vale para a confecção de uma cartilha com
orientações sobre as ações de fiscalização do Tribunal de
Contas. Dados contábeis podem interessar aos jurisdicionados e
aos servidores, mas não ao cidadão comum, que estará mais
preocupado em saber quais foram os resultados efetivos dos
trabalhos realizados.
40
Dessa forma, as ações devem ser planejadas e
desenvolvidas de acordo com cada um desses grupos.
41
2.3 Barreiras que existem para que a transparência promova resultados
Tornar visível uma informação é fácil. Tornar claro,
nem tanto. Essa frase, que constou da introdução deste
trabalho, exprime a maior dificuldade em atender de forma
satisfatória ao princípio da transparência.
No caso do Tribunal de Contas, o primeiro grande
problema é ele mesmo, como instituição, uma vez que sua área
de atuação é extremamente específica, muito técnica, e não faz
parte do cotidiano da maioria das pessoas, seja física ou
jurídica.
Não são raros os casos em que pessoas apareceram nos
balcões de atendimento do TCESP para tentar discutir alguma
pendência relativa à sua conta de consumo de energia elétrica
e ficam espantados ao serem informados que ali não é o órgão
próprio para tratar dessas contas.
À exceção de um aluno de bacharelado em Direito,
Ciências Contábeis, Economia ou Administração, é bem possível
que os demais sequer tenham ouvido falar do Tribunal de Contas
e se ouviram, não sabem ou não entendem o trabalho desse
órgão.
E esse fato não é difícil de ser constatado. Assim,
raramente um leigo acessará a página na internet do Tribunal
de Contas, ou seja, as informações que foram divulgadas
somente lá contarão com o acesso pelos seus servidores, dos
jurisdicionados e por um número ínfimo de cidadãos.
42
A linguagem técnica também é grande fator de
impedimento, uma vez que o que não é entendido deixa de ser
atraente e interessante.
Toledo e Rossi19 ilustram bem esse problema quando
explicam que “a população, e mesmo os que titularizam o
controle externo, os vereadores, pouco entendem desses
documentos, tornando-os peças inúteis e, no mais das vezes,
dispendiosas ao Tesouro. É a dificuldade do leigo de
interpretar uma peça financeira, porquanto não pode ele
compará-la com padrões reconhecidos ou com o desempenho havido
em municípios semelhantes”.
Eles estão cobertos de razão. Como é possível exigir
do munícipe que entenda que a dívida ativa inscrita, constante
do balanço patrimonial de uma determinada Prefeitura,
represente uma expectativa de receita, um direito, e não uma
obrigação de pagar? O que são resultados nominal e primário?
São pequenos exemplos dos entraves encontrados por quem se
interessa em ver o que foi divulgado.
Os autores concluem dizendo que “bem melhor que
enunciar, na imprensa ou na internet, os números frios de
receita e despesa, é transparecer se houve, de fato,
eficiência na aplicação do dinheiro recolhido compulsoriamente
da população; é divulgar dados que permitam análise fácil e
rápida por parte do cidadão (...)”.
É fato que em muitos casos não há como fugir da
tecnicidade, pois existem relatórios que devem ser publicados
em formato pré-estabelecido, mas paralelamente podem ser
19 TOLEDO JR, Flávio C. de e ROSSI, Sérgio Ciquera. Lei de Responsabilidade
Fiscal Comentada Artigo por Artigo. 3ª Edição. São Paulo: NDJ, 2005. p.
290.
43
desenvolvidos meios para uma melhor compreensão do que foi
divulgado.
O terceiro problema é o chamado “brasileiro cordial”,
termo cunhado por Sérgio Buarque de Holanda20, que explica de
forma robusta a falta de interesse na fiscalização da
utilização do dinheiro público pela sociedade e a praticamente
nula cobrança dos governantes.
A herança histórica da colonização do Brasil,
caracterizada pelo perfil do colonizador português, marcou
profundamente o desenvolvimento da sociedade brasileira.
O português trouxe para o Brasil uma tradição
política calcada numa sociedade de privilégios, conservadora,
hierarquizada, patrimonialista, com desvalorização do trabalho
e valorização do status de nobreza.
Esse cenário durou até medos do século XIX, época que
em vários lugares do mundo, por influência das idéias
liberais, esses valores já tinham se invertido.
Essa característica traz reflexos até hoje no
comportamento da sociedade brasileira, na qual se vê baixo
interesse em fiscalizar as atividades dos governantes e a
utilização do dinheiro público e, por consequência, as
atuações dos Tribunais de Contas.
É claro que a sociedade brasileira evoluiu e que há
focos de preocupação com a coisa pública, tanto que pululam
iniciativas voltadas à transparência, mas tudo ainda muito
incipiente.
20 BUARQUE DE HOLLANDA, Sérgio. Raízes do Brasil. Editora da Universidade.
1963.
44
Outro problema é o fato do gestor público, por vezes,
não dimensionar a importância do desenvolvimento de ações de
transparência.
Isso tem muito a ver com a qualidade do serviço
público, especificamente em relação à diferença existente
entre a desejada pelo dirigente e a esperada pelo usuário.
O equilíbrio entre elas passa por planos que
considerem tanto a necessidade dos órgãos públicos como a
demanda efetiva do cidadão.
É claro que melhorias implicam custos. Assim, o
planejamento deve prever medidas que devem ser distribuídas em
planos de curto, médio e longo prazo.
Alguns aspectos servem de referência para esse
planejamento: perfil do usuário; experiências anteriores;
imagem pré-existente; expectativa das necessidades.
Quando o assunto é medição de qualidade, a discussão
se volta para o campo da subjetividade, uma vez que é questão
de avaliação.
Neste ponto, pesa novamente o pouco conhecimento que
o cidadão comum tem do Tribunal de Contas e de suas
atividades.
Quanto mais informações a esse respeito forem
passadas à sociedade, mais condições ela terá de saber como
funciona e qual a importância do serviço realizado pelo
Tribunal de Contas, possibilitando o aprimoramento e
modificação dos seus parâmetros de qualidade.
45
A mensuração e avaliação dessa qualidade, no entanto,
devem refletir a estratégia do Tribunal de Contas do Estado de
São Paulo.
46
3. ESTRATÉGIA DE ATUAÇÃO DO TCESP
3.1 Situação atual
Quando se trata da necessidade do desenvolvimento de
ações do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo para a
exteriorização de informações aos seus públicos alvos não
significa que as medidas começarão do zero.
No caso dos servidores, há quinze anos são realizados
ciclos anuais de aperfeiçoamento do pessoal que atua na área
fim do Tribunal, o que representa movimentação de cerca de
seiscentos servidores.
A constante modificação da legislação também exige a
confecção periódica de manuais de orientação sobre todos os
assuntos abordados pela atividade da fiscalização e órgãos
jurisdicionados.
Há, ainda, parcerias estabelecidas com empresas
especializadas na realização de cursos em que são oferecidas
vagas a servidores do Tribunal.
Todo esse trabalho é realizado, e bem, pela Escola de
Contas Públicas – ECP, unidade vinculada à Presidência do
Tribunal, responsável pela organização de programação de
cursos e palestras durante todo o ano.
Os jurisdicionados também contam com o apoio
orientador e pedagógico do TCESP.
47
Da mesma forma que os encontros de aperfeiçoamento de
servidores do TCESP, há quinze anos são realizados ciclos de
debates destinados à capacitação de servidores municipais.
Esses encontros são realizados nos próprios
municípios, ou seja, o Tribunal leva seu corpo funcional até
eles. Isso é um diferencial.
Em 2011 foram realizadas reuniões em trinta e quatro
municípios do Estado, atendendo cerca de cinco mil servidores
e agentes políticos no ano.
A idéia por traz desse trabalho é a melhoria tanto na
prestação de contas pelos jurisdicionados como da aplicação
dos recursos públicos.
Assim como para os servidores do Tribunal, os dos
órgãos jurisdicionados também são agraciados com manuais e
cartilhas de orientação segmentadas por assunto, como ensino,
saúde e repasses ao terceiro setor, cabendo destaque ao
relacionado à Lei de Responsabilidade Fiscal, divulgado antes
mesmo da edição dessa norma, tendo sido o primeiro do Brasil.
Em 2009, o Tribunal de Contas organizou e executou o
Programa de Gestão Governamental – PGG, cuja finalidade foi
capacitar, por videoconferência, aproximadamente mil e
quinhentos servidores e agentes políticos municipais. A aula
inaugural foi transmitida simultaneamente para oitenta e duas
salas distribuídas pelo Estado utilizando a Rede do Saber21.
É possível notar que a atuação pedagógica do Tribunal
prioriza os servidores municipais, uma vez que a grande
maioria dos municípios carece de estrutura técnica.
21 http://www.rededosaber.sp.gov.br/portais/. Acessado em 25/1/12.
48
Todavia, os servidores estaduais, apesar de
normalmente contar com corpo técnico de assessorias, também
contam com cursos, palestras e manuais voltados à sua esfera
de atuação. Mesmo assim, há a necessidade de um maior
equilíbrio nesse atendimento.
Em relação à sociedade comum, muito embora existam
exemplos de canais de aproximação com o TCESP, é o setor que
clama por maiores iniciativas, principalmente pelo fato de
desconhecer sua função e muitas vezes sua própria existência.
Em 2011 foi lançado o “Portal do Cidadão”22,
instrumento de divulgação eletrônica contendo informações
sobre receita e despesa dos municípios jurisdicionados,
atualizados mensalmente por meio dos dados coletados pelo
Sistema AUDESP.
Foi desenvolvido para que o cidadão dispusesse de uma
ferramenta na qual pudesse ver dados do seu município, com a
possibilidade de comparação com os demais do Estado.
Ciente da necessidade de uma maior compreensão das
informações ali contidas, a ferramenta conta com um glossário
explicando os termos técnicos afetos à área de atuação do
TCESP e que aparecem recorrentemente nas informações
disponíveis no portal.
Há, nesse mesmo sentido, uma seção intitulada
“aprenda a fiscalizar”, com links direcionando a navegação
para outros portais de transparência e manuais de orientação
do próprio TCESP.
22 http://www.portaldocidadao.tce.sp.gov.br. Acessado em 25/1/12.
49
A “Consulta Cidadã”23 também é um canal de suma
importância, tendo por escopo oferecer à sociedade maior
transparência na fiscalização dos atos da Administração
Pública pelo TCESP, permitindo a qualquer cidadão inteirar-se
dessa atuação. O serviço é gratuito e possibilita o
acompanhamento das publicações dos despachos e das decisões
proferidos nos processos que tramitam no Tribunal de Contas do
Estado de São Paulo, relativos aos seus jurisdicionados.
Conforme consta do próprio sítio eletrônico do
TCESP24, o mencionado projeto AUDESP - Auditoria Eletrônica de
Órgãos Públicos “é uma iniciativa do Tribunal de Contas do
Estado de São Paulo no aperfeiçoamento do controle de gestão
governamental que objetiva, através do concurso da tecnologia
da informação, aprimorar os procedimentos de coleta de dados e
informações dos órgãos fiscalizados, buscando maior agilidade
nos trabalhos, aumento da qualidade dos dados e como
consequência natural, o cumprimento da missão constitucional
de fiscalizar e controlar as contas públicas paulistas com o
máximo grau de eficiência e eficácia, em benefício da
sociedade. É uma das prioridades que o Comitê de Tecnologia da
Informação escolheu para ser desenvolvido pelo corpo técnico
da Casa, iniciou-se em meados de 2003, passando por várias
fases, desde o levantamento de problemas, coletas de
sugestões, reuniões periódicas, pesquisa do nível de
informatização dos órgãos jurisdicionados, dentre outras.”.
Tem por objetivo “disponibilizar, para os envolvidos
com o processo de fiscalização, um banco de dados contendo
informações de cada órgão, em especial a sua contabilidade,
com conteúdo padronizado e atualizado diretamente pelos
próprios órgãos objeto de fiscalização. As informações
23 http://www4.tce.sp.gov.br/content/consulta-cidada. Acessado em 25/1/12. 24 http://www4.tce.sp.gov.br/content/audesp. Acessado em 25/1/12.
50
constantes do banco de dados resultante desse processo serão
também disponibilizadas, via Internet, ao público em geral”.
Em razão do seu sucesso, em 2011 o Projeto AUDESP foi
vencedor, juntamente com outros quatro trabalhos de órgãos
públicos diversos, da 7ª edição do Prêmio Governador Mário
Covas na categoria “Excelência na Gestão Pública”, que busca
consolidar a cultura da inovação e primazia na administração
pública paulista. O Programa de Gestão Governamental – PGG, já
mencionado, também foi um dos finalistas nessa categoria.
Outro banco de dados disponível à consulta é o
SIAPNET25, desenvolvido pelo TCESP, que congrega informações de
interesse na área municipal, referentes aos aspectos
orçamentário, financeiro e operacional, componentes dos
processos de prestação de contas de Prefeituras, Câmaras
Municipais e demais Órgãos integrantes da Administração.
Em atendimento ao disposto na Lei Complementar nº
131/09, há no sítio do TCESP a seção “Prestando Contas”26, com
informações sobre receita, despesa, relatório de gestão
fiscal, composição do quadro de pessoal e vencimentos.
Algumas ações realizadas pelo Tribunal atendem aos
três grupos alvo, como é o caso da Semana Jurídica, que em
2011 teve sua nona edição. É um evento realizado anualmente,
que conta com a participação de juristas renomados para a
discussão de temas atuais e é aberto tanto aos servidores do
TCESP, como dos órgãos jurisdicionados e à comunidade.
É possível observar que o TCESP não é omisso nas suas
relações com os públicos alvo.
25 http://siapnet.tce.sp.gov.br/. Acessado em 25/1/12. 26 http://www4.tce.sp.gov.br/cidadao. Acessado em 25/1/12.
51
Todavia, as ações voltadas à comunidade, da forma
como estão estruturadas, tem como pressuposto a iniciativa
desta em procurar a informação.
Esse fator que esbarra na recorrente questão de que o
trabalho do TCESP nem sua função são conhecidos. Para que isso
funcione e produza resultados o Tribunal tem que ir até a
comunidade. Esse é o objeto de análise do próximo item.
52
3.2 Ações voltadas à sociedade que podem ser desenvolvidas
Em 2010 o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo
lançou o programa “Gestão Estratégica do TCESP” – GET, um
processo de articulação dos seus ativos para definir e
alcançar uma visão de futuro, bem como cumprir sua missão
constitucional.
Sua implantação está prevista em três etapas:
formulação da estratégia; tradução da estratégia em objetivos,
indicadores e metas, que constituirão o mapa estratégico;
execução da estratégia e monitoramento contínuo.
Os trabalhos realizados até a primeira fase
estabeleceram como proposta de missão “fiscalizar e orientar
para o bom e transparente uso dos recursos públicos em
benefício da sociedade”.
A proposta de declaração de visão de futuro é
“fiscalizar, orientar e divulgar, em tempo real, o uso dos
recursos públicos, priorizando a auditoria de resultados e a
aferição da satisfação social, consolidando uma imagem
positiva perante a sociedade”.
Como pontos fortes da atuação do TCESP foram
destacados, entre outros, o Projeto AUDESP, a ECP e a Consulta
Cidadã.
Todavia, dentre os pontos fracos levantados, reputo
como fundamental o relativo à comunicação e imagem do TCESP.
Do relatório final referente ao primeiro seminário do GET
constou que há falta de divulgação da instituição, linguagem
53
técnica inacessível ao cidadão comum e desconhecimento pela
sociedade das funções e ações do TCESP.
A partir disso serão tomadas medidas de caráter
contínuo para que essa distância seja cada vez mais curta.
Como visto, faz parte das fases de implantação do GET o estudo
dessas ações e a idéia deste trabalho é propô-las, utilizando
para tanto os instrumentos destacados no item 2.1.
De alguns anos para cá houve o que pode ser chamada
de uma revolução na educação ambiental. Se alguém tem próximo
de si uma criança de sete anos sabe bem o que isso quer dizer.
Experimente abrir uma torneira na frente de uma delas
e deixar a água correr. É quase certo que será severamente
repreendido e escutará algo como “você está acabando com a
água do planeta”.
O significado disso é imensurável. Estamos
conseguindo preparar uma geração para questões relevantes
relacionadas ao meio ambiente e isso só foi possível a partir
do momento em que nas escolas esse assunto passou a ser
tratado com seriedade e continuidade.
Essa mesma experiência deve ser realizada com os
gastos do dinheiro público. As crianças devem entender desde
cedo como sua cidade funciona, de onde vem o dinheiro público,
quem trabalha para isso, quem fiscaliza, qual o papel da
sociedade e o do Tribunal de Contas.
Obviamente, é um trabalho a ser executado de forma
planejada, com linguagem apropriada e até mesmo lúdica.
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A iniciativa, no entanto, pode partir do próprio
TCESP. Além de firmar parceria com as Secretarias Estaduais e
Municipais para a implementação de um projeto nesse sentido.
Esse tipo de ação promoverá, ao mesmo tempo,
divulgação da instituição e do que faz, passagem de
conhecimento por parte de quem tem como atuação precípua a
fiscalização do uso do dinheiro público e o fomento nas
crianças da importância disso tudo.
Faz muita diferença na formação da personalidade do
ser humano ele crescer ouvindo o que pode e o que não pode ser
feito com o dinheiro público.
Com o meio ambiente está dando certo. Com o dinheiro
público também certamente dará, principalmente por ser ação
preventiva.
É claro que toda e qualquer ação envolve um custo,
mas nesse caso não é uma despesa, é um investimento e com
retorno garantido.
A parcela jovem da população também merece atenção
nesse sentido, mas aqui há uma diferença: quando crianças não
tiveram a oportunidade de ouvir esses temas, o que faz com que
esse assunto não faça parte de seus conhecimentos nem de sua
rotina. É visível até mesmo a falta de interesse, o que pode
ser explicado pelo fato da matéria ser estranha à maioria
deles.
Nesse caso, a ida do TCESP até essa parcela da
população é igualmente necessária e essencial.
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Há a necessidade de que essa aproximação ocorra em
outro terreno: as redes sociais. O TCESP deve manter contas
ativas nas principais delas, como Twitter, Facebook, Myspace e
Orkut e a razão disso é muito simples: os jovens estão lá,
diariamente.
Claro que esse espaço tem suas limitações e
finalidades, mas são hábeis à divulgação de informações
importantes, como cursos, concursos, eventos, julgados
relevantes, relatórios com informações consolidadas de
julgamentos e atuação do TCESP, bem como vários outros
assuntos.
A utilização desse mecanismo praticamente garante que
a comunicação vai acontecer, desde que respeitada,
logicamente, a necessidade da utilização de linguagem e visual
acessíveis e próximos a esse público.
Cada uma dessas redes tem características e
funcionalidades diferentes, que devem ser exploradas para
melhor atingir a finalidade desse tipo de ação.
A importância da adesão às redes sociais aumenta pelo
fato de que não é somente a população jovem que utiliza esse
serviço, o que amplia e muito o alcance do que lá for
divulgado.
A utilização da internet não se reduz às redes
sociais. O TCESP conta com um sítio eletrônico estruturado e
com páginas especificamente criadas para a transparência e
relação com o cidadão. Esse espaço de ser constante e
continuamente monitorado para que sejam verificadas as
necessidades de aprimoramento e melhoria nos resultados.
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A questão da TV é mais complexa, pois exige estrutura
e investimentos bem maiores, mas não é menos importante.
Uma possível solução seria a utilização, em parceria,
de estrutura já existente, como a “TV ALESP”, meio de
comunicação administrado pela Assembléia Legislativa do Estado
de São Paulo.
A edição de um programa semanal, por exemplo, já
seria um canal de comunicação extraordinário com a sociedade,
podendo ser explorados assuntos da área de atuação do TCESP,
de forma didática, como gastos com educação e saúde, a
importância da administração da dívida com precatórios,
respeito aos limites estabelecidos pela Lei de
Responsabilidade Fiscal, o significados dos números do
resultado da execução orçamentária e tantos outros.
O mesmo vale para a forma de divulgação de
informações proporcionada pela “Rádio ALESP”.
Os celulares, com sua utilização pelas pessoas cada
vez mais crescente e consolidada, devem receber atenção por
meio de mensagens a usuários pré-cadastrados no sítio do
TCESP, facilitando a divulgação da realização de cursos, por
exemplo.
As publicações impressas também são ferramentas
essenciais em razão de sua facilidade de consulta. A edição
dos manuais e cartilhas, já tradicionais no âmbito de atuação
do TCESP, e sua divulgação na internet devem ser mantidas.
Ocorre que outras frentes podem ser exploradas, como
publicações específicas a determinada parcela da população.
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Qual seriam o impacto e o resultado da elaboração e
distribuição de um impresso no formato de gibi destinado às
crianças para a explicação de determinados assuntos?
Certamente, bem positivos.
Iniciativa como a do gibi não é inédita no âmbito dos
Tribunais de Contas, já realizados, por exemplo, pelos de
Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso.
Todas essas formas de comunicação com a sociedade são
hábeis a permitir a salutar aproximação da sociedade e o
TCESP, permitindo o conhecimento da instituição e a relevância
de sua atuação.
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CONCLUSÃO
Os Tribunais de Contas tem papel fundamental no
desenvolvimento e consolidação dos conceitos democráticos, uma
vez que cobra a prestação de contas a pune sua ausência.
O caminho para o sucesso de sua atuação passa pelo
estreitamento da relação com a sociedade e isso somente é
possível por meio de atos de transparência.
O serviço prestado somente poderá ser classificado
como de qualidade se houver maior equilíbrio entre o planejado
pelo dirigente e o desejado pela comunidade.
Como o conceito de qualidade tem como forte
característica a subjetividade de quem avalia, para que haja
menos lacunas nesse processo é preciso a implantação de ações
de melhoria contínua e de avaliação permanente.
A sociedade não está acostumada a cobrar seus
dirigentes nem a usar as informações divulgadas pelos órgãos
públicos, mas o implemento de novas ações pode fazer com que
as próximas gerações trabalhem essa questão de forma
diferente.
O exposto mostra que o TCESP está ciente do tema
proposto neste trabalho, seu distanciamento em relação à
sociedade, o que é louvável em termos administrativos e de
planejamento.
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Ninguém toma remédio se não admite que tem a doença.
Ninguém busca solução se não entender que existe um problema a
ser resolvido.
Entender a situação e visualizá-la como um problema a
ser trabalhado e solucionado é o primeiro e mais importante
passo. Isso o TCESP já fez.
A implementação de medidas da natureza das aqui
propostas é o próximo passo.
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