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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM ENSINO DE CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
Um Estudo sobre a Trigonometria
no Triângulo Retângulo
PAULO ROBERTO DOS SANTOS
Orientadora: Profª. Dra. Cintia A. Bento dos Santos
Dissertação apresentada ao Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática, da Universidade Cruzeiro do Sul, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências e Matemática.
SÃO PAULO
2014
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA
UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL
UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
Um Estudo sobre a Trigonometria no Triângulo Retângulo
Paulo Roberto dos Santos
Dissertação de mestrado defendida e aprovada
pela Banca Examinadora em __/__/2014.
BANCA EXAMINADORA:
Profª. Dra. Cíntia A. Bento dos Santos
Universidade Cruzeiro do Sul
Presidente
Profª. Dra. Norma Suely Gomes Allevato
Universidade Cruzeiro do Sul
Prof. Dr. Marcio Eugen Klingenschmid Lopes dos Santos
Secretaria Estadual de Educação/SP
AGRADECIMENTOS
A Deus, por me dar força para enfrentar desafios.
À minha mãe, Maria, por sempre acreditar em mim.
À minha companheira, Ivonete, por me apoiar em horas difíceis.
Aos meus filhos, Natália e Paulo, por suportarem longos períodos de minha
ausência.
A professora Norma Suely Gomes Allevato, por ter aceitado o convite para fazer
parte de minha banca e ter contribuído para estruturar meu trabalho.
Ao professor Marcio E. K. Lopes dos Santos, por ter aceitado participar de minha
banca e suas contribuições.
Aos professores do Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e
Matemática, pelas contribuições que enriqueceram o curso e meu desenvolvimento.
Aos colegas de Mestrado, pelo companheirismo e contribuições que enriqueceram
minha jornada.
Aos meus alunos, pela participação e responsabilidade.
E em especial, à minha orientadora, professora Cíntia A. B. Santos, com quem
aprendi e contribuiu muito para realização deste trabalho.
“EDUCAÇÃO NÃO TRANSFORMA O MUNDO. EDUCAÇÃO MUDA PESSOAS. PESSOAS TRANSFORMAM O MUNDO”.
(PAULO FREIRE, educador)
SANTOS, Paulo Roberto dos. Um estudo sobre a trigonometria do triângulo retângulo. 2014. 92 f. Dissertação (Mestrado de Ensino de Ciências e Matemática)-Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2014.
RESUMO
Este estudo é uma pesquisa de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e de
Matemática, focando o estudo das relações entre as medidas dos lados de um
triângulo retângulo (seno, cosseno e tangente). O objetivo desta investigação é
verificar as revelações que alunos de um 2º ano de Ensino Médio de uma escola
pública estadual da cidade de São Paulo têm sobre o conhecimento trigonométrico;
como mobilizam tal conhecimento, introduzido no Ensino Fundamental, para
resolverem tarefas e como este pode ser útil para construção de novos
conhecimentos. Como aportes teóricos, será utilizada a Teoria das Situações
Didáticas, de Guy Brousseau, e a Teoria dos Campos Conceituais, de Gérard
Vergnaud, para estruturar a pesquisa. Para atender ao objetivo, foi utilizada uma
pesquisa de método qualitativo, com técnica de análise documental. Por meio de
três instrumentos de pesquisa desenvolvidos com os alunos, procurou-se levantar o
que os alunos revelam em relação aos conhecimentos matemáticos, referentes ao
estudo de trigonometria, verificar como eles demonstram mobilizar tais
conhecimentos aprendidos no Ensino Fundamental ao resolverem tarefas de
trigonometria no Ensino Médio e, também, como realizam a conexão entre
conhecimentos novos e antigos. Após a aplicação do instrumento I, constatou-se
que a maioria absoluta dos alunos não dispunha dos invariantes operatórios
necessários no que se refere ao triângulo retângulo e à semelhança de triângulo. A
análise do instrumento II permitiu inferir que a maior parte dos estudantes conseguiu
compreender o conceito de razões trigonométricas que se manteve estabilizado,
conforme se verificou após análise da resolução dos problemas do instrumento III.
Palavras-chave: Mobilização de conhecimentos matemáticos, Trigonometria no
triângulo retângulo, Razões trigonométricas, Situações didáticas, Campos
conceituais.
SANTOS, Paulo Roberto dos. A study about the Trigonometry of the triangle rectangle. 2014. 92 f. Dissertação (Mestrado de Ensino de Ciências e Matemática)-Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2014.
ABSTRACT
This study is a research of Professional Master in the tuition of Science and Math’s
field, focusing on the relation between the measures of the sides of a triangle
rectangle (sine, cosine and tangent). The objective of this research is to check the
revealing of the amount of Math’s knowledge students from the 2nd year of High
School from a public school in the city of São Paulo have about Trigonometry, how
they deal with such knowledge, introduced in the elementary school to solve
problems and how it can be useful in the construction of new knowledge. The Theory
of Didactic Situations from Guy Brousseau and the Theory of Conceptual Fields from
Gérard Verhnaud will be used to structure this research. To get into the objective, a
research about the qualitative method was used with technique of documentary
analysis. Through three research instruments developed with students, it tries to
raise what students reveal in relation to their Math’s knowledge, related to the study
of Trigonometry, and check how they can demonstrate such knowledge learned in
the elementary school when solving some trigonometry tasks in High School and
also how they make the connection between the new and the old knowledge. After
the use of Instrument I, it was discovered that the great majority of the students did
not have the invariant elements necessary in relation to the triangle rectangle and the
triangle’s similarity. The analysis of Instrument II allowed to infer that the majority of
the students could understand the concept of the Trigonometric ratios which is kept
stabilized, according to what was checked after the analysis of the resolution of the
problems of Instrument III.
Key-words: Mobilization of Math’s knowledge, Trigonometry in the triangle rectangle,
Trigonometric Ratios, Didactic Situations, Conceptual Fields.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Pesquisas por regiões do Brasil ............................................ 41
Figura 2 Triângulo didático.....................................................................51
Figura 3 Atividade 12 – instrumento I ................................................... 65
Figura 4 Atividade 14 – instrumento I ................................................... 66
Figura 5 Atividade 15 – instrumento I....................................................66
Figura 6 Atividade 17 – instrumento I....................................................67
Figura 7 Atividade 16 – instrumento I....................................................68
Figura 8 Atividade 9 – instrumento I......................................................69
Figura 9 Atividade 10 – instrumento I . .. ...............................................70
Figura 10 Estudo das noções referentes à trigonometria ..................... 70
Figura 11 Atividade 11 – instrumento I .................................................. 71
Figura 12 Atividade 11 – instrumento I .................................................. 72
Figura 13 Atividade 12 – instrumento I .................................................. 74
Figura 14 Atividade 12 – instrumento I .................................................. 75
Figura 15 Atividade 12 – instrumento I .................................................. 76
Figura 16 Atividade 12 – instrumento I .................................................. 77
Figura 17 Atividade 13 – instrumento I .................................................. 78
Figura 18 Atividade 13 – instrumento I .................................................. 78
Figura 19 Atividade 13 – instrumento I .................................................. 79
Figura 20 Atividade 14 – instrumento I .................................................. 80
Figura 21 Atividade 14 – instrumento I .................................................. 80
Figura 22 Atividade 15 – instrumento I .................................................. 81
Figura 23 Atividade 16 – instrumento I .................................................. 82
Figura 24 Atividade 17 – instrumento I .................................................. 83
Figura 25 Atividade 17 – instrumento I .................................................. 83
Figura 26 Percentual de acertos por questão ....................................... 85
Figura 27 Atividade 1 – instrumento II ................................................... 90
Figura 28 Atividade 2 – instrumento II – parte 1 .................................... 92
Figura 28 Atividade 2 – instrumento II – parte 2 .................................... 93
Figura 29 Atividade 3 – instrumento II ................................................... 95
Figura 30 Atividade 4 – instrumento II – parte 1 ................................... 97
Figura 30 Atividade 4 – instrumento II – parte 2 .................................... 98
Figura 31 Atividade 4 – instrumento II – aluna I .................................. 100
Figura 32 Atividade 4 – instrumento II – aluna K ................................ 101
Figura 33 Atividade 4 – instrumento II – aluna J ................................. 101
Figura 34 Atividade 4 – instrumento II – aluna F ................................. 102
Figura 35 Atividade 4 – instrumento II – aluna J ................................. 103
Figura 36 Atividade 4 – instrumento II – aluna E – parte 1 ................. 104
Figura 36 Atividade 4 – instrumento II – aluna E – parte 2 ................. 105
Figura 37 Atividade 4 – instrumento II – aluna F ................................. 106
Figura 38 Atividade 4 – instrumento II – aluno P ................................ 106
Figura 39 Atividade 4 – instrumento II – aluna P ................................ 107
Figura 40 Atividade 4 – instrumento II – aluna A ................................ 107
Figura 41 Atividade 4 – instrumento II – aluna F ................................. 108
Figura 42 Atividade 4 – instrumento II – aluna E ................................ 109
Figura 43 Atividade 4 – instrumento II – aluno B ................................ 106
Figura 44 Atividade 4 – instrumento II – aluno G ................................ 110
Figura 45 Atividade 4 – instrumento II – aluno P ................................ 112
Figura 46 Atividade 4 – instrumento II – aluna A ................................ 113
Figura 47 Atividade 4 – instrumento II – aluna K ................................ 113
Figura 48 Atividade 4 – instrumento II – aluna M ................................ 114
Figura 49 Atividade 4 – instrumento II – aluna T ................................. 114
Figura 50 Atividade 4 – instrumento II – aluno G ................................ 115
Figura 52 Atividade 4 – instrumento II – aluna E ................................ 111
Figura 52 Atividade 4 – instrumento II – aluno P ................................ 117
Figura 53 Problema 1 – instrumento III ................................................ 121
Figura 54 Problema 2 – instrumento III ................................................ 121
Figura 55 Problema 3 – instrumento III ................................................ 121
Figura 56 Problema 4 – instrumento III ................................................ 122
Figura 57 Problema 1 – instrumento III – aluno G ............................... 123
Figura 58 Problema 1 – instrumento III – aluna F ............................... 124
Figura 59 Problema 1 – instrumento III – aluna M ............................... 124
Figura 60 Problema 2 – instrumento III – aluna F ............................... 125
Figura 61 Problema 2 – instrumento III – aluna I ................................. 125
Figura 62 Problema 2 – instrumento III – aluna J ................................ 126
Figura 63 Problema 3 – instrumento III – aluno P ............................... 127
Figura 64 Problema 3 – instrumento III – aluno G ............................... 128
Figura 65 Problema 4 – instrumento III – aluno B ............................... 129
Figura 66 Problema 4 – instrumento III – aluna R ............................... 130
Figura 67 Problema 4 – instrumento III – aluna T ............................... 130
Quadro 1 Distribuição do conteúdo de trigonometria.........................29
Quadro 2 Pesquisas selecionadas de trigonometria.......................... 42
Quadro 3 Aplicação do instrumento II.................................................. 89
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 14
CAPÍTULO 1- A PESQUISA E OS PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS......... 178
1.1 Justificativa da Pesquisa ..................................................................................... 18
1.2 Problemática da Pesquisa ................................................................................... 20
1.3 Metodologia da Pesquisa .................................................................................... 20
CAPÍTULO 2 - O ENSINO DE TRIGONOMETRIA .................................................... 25
2.1 Inserção Curricular do Estudo de Trigonometria ................................................. 25
2.2 Pesquisas que discutem o Ensino de Trigonometria ........................................... 31
2.3 Sintetizando o Panorama das Pesquisas ............................................................ 40
CAPÍTULO 3 - QUADRO TEÓRICO ......................................................................... 45
3.1 A Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud ................................................. 45
3.2 A Teoria das Situações Didáticas de Brousseau ................................................. 50
3.3 Sobre as Teorias dos Campos Conceituais de Vergnaud e das Situações
Didáticas de Brousseau ............................................................................................ 61
CAPÍTULO 4 - PESQUISA DE CAMPO .................................................................... 63
4.1 Sobre os Instrumentos ........................................................................................ 63
4.2 Aplicação do Instrumento I .................................................................................. 63
4.3 Análise e Interpretação dos Dados do Instrumento I ........................................... 64
4.4 Análise a Priori e Aplicação do Instrumento II ..................................................... 89
4.5 Análise e Interpretação dos Dados do Instrumento II ........................................ 100
4.6 Síntese da Análise a Posteriori do Instrumento II .............................................. 117
4.7 Aplicação e Análise dos Dados do Instrumento III ............................................ 120
CAPÍTULO 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................... 1323
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 139
APÊNDICE A – Instrumento de pesquisa I ............................................................. 143
APÊNDICE B – Instrumento de pesquisa II........................................................... 1477
APÊNDICE C – Instrumento de pesquisa III ......................................................... 1544
14
INTRODUÇÃO
Iniciei minha carreira como professor substituto, passando por várias escolas
e turnos variados, por um curto período de tempo, na rede estadual na cidade de
São Paulo. Como professor efetivo de Matemática, minha carreira teve início há
cerca de dez anos, sempre lecionando no Ensino Médio de uma escola pública da
cidade de São Paulo, no período da manhã, tarde ou noite. Atualmente, leciono no
período noturno.
A escola em que leciono é antiga, dispondo de apenas oito salas e com
pouca infraestrutura, mas é organizada e a maioria dos alunos é participativa.
Nesse ambiente, percebi que, ano após ano, uma parcela significativa
desses alunos apresentava dificuldades no aprendizado de trigonometria no
triângulo retângulo. Passei, então, a dar mais atenção a esse conteúdo, planejando
melhor as aulas, procurando explicar na lousa, de forma mais clara possível, e
exigindo a realização de exercícios pelos alunos. As possíveis dúvidas ainda
existentes eram esclarecidas com uma revisão da teoria e mais exercícios. Ao final,
verificava o aprendizado dos alunos por meio de uma prova mensal ou bimestral.
Acreditava, naquele momento, que, dessa forma, conseguiria que os alunos
aprendessem melhor as razões trigonométricas no triângulo retângulo.
Mesmo empenhando-me, percebia que os resultados ainda eram frustrantes,
pois a maioria dos alunos apresentava rendimento insatisfatório nas provas. Havia
algo que prejudicava seu aprendizado e que precisava ser descoberto, mas eu não
sabia do que se tratava.
Essas inquietações fizeram-me ir à busca de aperfeiçoamento, o que
resultou no ingresso em um curso de Pós-Graduação de Especialização em
Matemática para Professores do Ensino Fundamental II e do Ensino Médio, no qual
aprendi mais Matemática, mas não obtive as respostas que procurava.
Percebendo, naquele momento, por meio de pesquisas e de leituras, que as
respostas almejadas poderiam estar na Educação Matemática, resolvi matricular-me
no Programa de Pós Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da
Universidade Cruzeiro do Sul, para realizar o mestrado profissional.
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Já no início do mestrado, após um período de reflexão, minha orientadora
sugeriu como título de pesquisa “Um Estudo sobre a trigonometria no triângulo
retângulo”. Chegamos à conclusão de que a pesquisa seria realizada com dezesseis
alunos de duas turmas do segundo ano do Ensino Médio, período noturno, da escola
pública da cidade de São Paulo.
Os conteúdos discutidos nas disciplinas do curso de mestrado juntamente
com as orientações encaminharam-nos ao quadro teórico desta pesquisa, pautado
na Didática Francesa, em que tomamos como referência a Teoria das Situações
Didáticas, de Guy Brousseau (BROUSSEAU, 1986, 1996, 2008), pois ela permite-
nos explicar as relações entre saber, professor e aluno.
Cabe salientar que Brousseau utiliza a palavra “saber” em sua teoria. Assim,
é conveniente fazermos a diferenciação entre saber e conhecimento.
Segundo Pais (1999), enquanto o saber caracteriza-se quase sempre por
ser descontextualizado, despersonalizado e mais associado a um contexto científico,
histórico e cultural, o conhecimento refere-se a um contexto mais individual e
subjetivo, associado ao caráter experimental.
Brousseau (1988) faz uma distinção entre conhecimento e saber,
evidenciando o aspecto da utilidade e remetendo a questão para análise das
situações didáticas. Em sua análise, o saber aparece associado ao problema da
validação do conhecimento, relacionada à questão do raciocínio lógico-dedutivo. Por
outro lado, o conhecimento é vinculado mais ao aspecto experimental, envolvendo
algum tipo de ação de contato mais pessoal.
Também adotamos a Teoria dos Campos Conceituais, de Gérard Vergnaud
(VERGNAUD, 1996, 1998, 2012), a fim de evidenciar as questões relativas à
construção de conceitos por parte dos alunos e as relações que alunos estabelecem
entre conhecimentos novos e antigos.
Em nossa pesquisa, tem-se por objetivo geral verificar as revelações que
alunos de um segundo ano de Ensino Médio de uma escola pública estadual da
cidade de São Paulo têm sobre o conhecimento trigonométrico e como mobilizam tal
conhecimento, introduzido normalmente no 9º ano do Ensino Fundamental, para
16
resolverem tarefas e como este pode ser útil para construção de novos
conhecimentos.
Para auxiliar o presente trabalho, foi realizado um levantamento sobre
pesquisas publicadas a partir de 2006, relacionadas ao foco desta pesquisa. Essa
etapa tem por objetivo apresentar o que se tem discutido em relação a esta temática
no cenário acadêmico. Considerou-se importante essa etapa do trabalho, pois o
mapeamento das pesquisas ajudará a ter clareza sobre o que tem sido discutido em
se tratando do estudo de trigonometria.
Por último, cabe ressaltar que o pesquisador é professor regente da turma
que foi pesquisada e que este estudo também teve como finalidade fazer com que o
professor-pesquisador compreendesse melhor as dificuldades de seus alunos,
podendo contribuir para o processo de ensino-aprendizagem dos educandos, assim
como para o aprimoramento de sua prática profissional.
Para responder ao objetivo da pesquisa, estruturou-se o trabalho conforme
esta sequência:
No primeiro capítulo, apresenta-se a justificativa desta pesquisa, ou seja, a
motivação para a escolha da temática abordada. Nesse capítulo, também é
apresentada a problemática de pesquisa e a metodologia a ser utilizada
(mencionada anteriormente) para desenvolvimento desta investigação.
No segundo capítulo, discorre-se sobre o ensino de trigonometria. Nessa
etapa, são apresentados alguns aspectos curriculares que corroboram para a
importância do tema e são analisadas dissertações relacionadas ao assunto e a
livros que tratam diretamente do ensino-aprendizagem de trigonometria no triângulo
retângulo a partir de 2006.
No terceiro capítulo, discutem-se os aportes teóricos desta pesquisa, a
Teoria dos Campos Conceituais, de Vergnaud e a Teoria das Situações Didáticas,
de Brousseau. Esses referenciais foram utilizados, a fim de entender como os
alunos constroem conceitos e também como fazem as conexões entre
conhecimentos novos e antigos, bem como as relações entre saber, professor e
aluno.
17
O quarto capítulo é destinado a tratar da pesquisa de campo. Nele,
apresenta-se uma análise a priori da sequência didática e a posteriori da realização
da sequência pelos alunos.
No quinto capítulo, retoma-se a questão de pesquisa, a fim de respondê-la.
Além disso, traçam-se alguns indicativos para o ensino de trigonometria no triângulo
retângulo com base nos resultados encontrados.
18
CAPÍTULO 1- A PESQUISA E OS PROCEDIMENTOS
METODOLÓGICOS
Neste capítulo, será apresentada a pesquisa, descrevendo os principais
aspectos que a justificam, bem como sua problemática. Será apresentada, ainda, a
metodologia de pesquisa adotada para esta investigação.
1.1 Justificativa da Pesquisa
A presente pesquisa, desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-
Graduação em Ensino de Ciências e de Matemática da Universidade Cruzeiro do
Sul, tem como foco o estudo das relações entre as medidas dos lados de um
triângulo retângulo (seno, cosseno e tangente) na fase de escolarização do 2º ano
do Ensino Médio.
Por ser evidente que a trigonometria tem grande participação na sociedade
moderna, a apropriação e o domínio desse conhecimento matemático constituem
instrumentos básicos para a leitura e compreensão do mundo em que se vive.
A importância da trigonometria é comprovada na aprendizagem de alguns
conceitos da Física Clássica, bem como no estudo da eletricidade, da mecânica, da
música, da medicina, da topografia, da engenharia, de náutica, de
telecomunicações, ou ainda em aplicações que envolvem principalmente fenômenos
periódicos. A trigonometria é muito utilizada na determinação de distâncias
inacessíveis como medições de astros, de distâncias, entre outras coisas.
Vários aspectos históricos evidenciam a importância da presença dessa
noção matemática no desenvolvimento das civilizações antigas como a egípcia,
babilônica, chinesa, grega, estendendo-se até os dias atuais.
No entanto, com base na prática docente, pode-se observar que uma
parcela significativa de alunos chega ao Ensino Médio sem a devida clareza desse
conteúdo; também se observa que a forma como a trigonometria é aprendida nas
19
aulas de Matemática não proporciona uma visão ampla ao aluno acerca de sua
inserção nas situações cotidianas.
Outro ponto que se verificou na prática docente é o fato de alunos
aprenderem durante o Ensino Fundamental conteúdos como, por exemplo, razões,
semelhança de triângulos, teorema de Pitágoras, e, quando chegam ao Ensino
Médio, não possuírem esses conhecimentos disponíveis, nem os reconhecerem no
momento de fazer as devidas conexões no estudo de trigonometria. Sendo assim,
apesar de esses conteúdos já terem sido institucionalizados em anos anteriores, os
alunos sinalizam não ter desenvolvido autonomia suficiente para lançar mão dos
conhecimentos disponíveis quando se fazem necessárias as devidas articulações e
conexões entre os conhecimentos já aprendidos e os novos que estão sendo
propostos.
Essas constatações, observadas, num primeiro momento, na prática
docente, motivaram o levantamento de hipóteses sobre a problemática que envolve
o conteúdo matemático relacionado à trigonometria.
Esta pesquisa permite abrir uma reflexão quanto à necessidade de se
dialogar com as dificuldades que os educandos enfrentam em relação ao domínio e
à interpretação de conhecimentos sobre a trigonometria no triângulo retângulo.
A trigonometria esteve presente na escola secundária ao longo de todo o
século XX. Sua inclusão no currículo do Ensino Médio enquanto saber matemático é
atualmente um conteúdo obrigatório, destacado nos Parâmetros Curriculares
Nacionais do Ensino Médio – PCNEM+ (BRASIL, 2006) e, também, presente no
currículo da Rede Estadual de Ensino de São Paulo (SÃO PAULO, 2012).
No presente estudo, considerou-se relevante averiguar o que alunos de um
2º ano do Ensino Médio de uma escola pública estadual da cidade de São Paulo
revelam em relação ao conhecimento matemático de trigonometria e como
mobilizam esse conhecimento, iniciado no Ensino Fundamental, para resolverem
tarefas, e como este pode ser proveitoso para construção de novos conhecimentos.
20
1.2 Problemática da Pesquisa
Com base na justificativa deste estudo e buscando delimitar a investigação,
elaborou-se a seguinte questão de pesquisa para nortear o presente trabalho:
Como alunos demonstram mobilizar ou ter disponíveis conhecimentos
matemáticos aprendidos no Ensino Fundamental ao resolverem tarefas de
trigonometria, no que se refere ao triângulo retângulo, no Ensino Médio?
1.3 Metodologia da Pesquisa
Nesta investigação, a organização do trabalho está pautada na abordagem
qualitativa, com técnica de análise documental.
De acordo com Goldenberg (2007), os dados da pesquisa qualitativa têm
por objetivo uma compreensão profunda de certos fenômenos sociais apoiados no
pressuposto da maior relevância do aspecto subjetivo da ação social. Ainda segundo
a autora, os métodos qualitativos enfatizam as particularidades de um fenômeno em
termos de seu significado para o grupo pesquisado, sendo esse tipo de pesquisa
capaz de possibilitar a compreensão do significado e a descrição dos fenômenos
estudados em seus contextos e não à sua expressividade numérica.
Para Creswell (2010), a investigação qualitativa emprega diferentes
concepções filosóficas, estratégias de investigação e métodos de coleta, análise e
interpretação de dados. Para o autor, a investigação qualitativa utiliza diferentes
estratégias, as quais têm grande influência sobre os procedimentos qualitativos.
Creswell (2010) destaca, também, que a amostragem intencional, a coleta
de dados abertos, a análise de textos ou de imagens, a representação de
informações em figuras e em quadros e a interpretação pessoal dos achados
sugerem procedimentos qualitativos, ou seja, são procedimentos que podem auxiliar
na caracterização de uma pesquisa qualitativa, dentre eles, encontram-se os
procedimentos a serem utilizados neste estudo. O autor ainda define a pesquisa
qualitativa como:
21
[...] um meio para explorar e para entender o significado que os indivíduos ou os grupos atribuem a um problema social ou humano. O processo de pesquisa envolve as questões e os procedimentos que emergem, os dados tipicamente coletados no ambiente do participante, a análise dos dados indutivamente construída a partir das particularidades para os temas gerais e as interpretações feitas pelo pesquisador acerca do significado dos dados. (CRESWELL, 2010, p.26)
Para Lüdke e André (2012), a pesquisa qualitativa envolve a obtenção de
dados descritivos, por meio do contato direto do pesquisador com a situação
pesquisada, enfatiza mais o processo do que o produto e preocupa-se em retratar a
perspectiva dos participantes. De acordo com as autoras, a pesquisa qualitativa
supõe o contato direto e prolongado do pesquisador com ambiente e a situação que
está sendo investigada, em geral, por meio do trabalho intensivo de campo.
Lüdke e André (2012) ressaltam, ainda, que, no estudo qualitativo, os
problemas são estudados no ambiente em que eles ocorrem naturalmente, sem
qualquer manipulação intencional do pesquisador.
A pesquisa de campo foi desenvolvida inicialmente com dezesseis alunos de
duas turmas do 2º ano do Ensino Médio de uma escola pública da cidade de São
Paulo. Durante um período de tempo, o pesquisador verificou os conhecimentos
anteriores relacionados à trigonometria no triângulo retângulo. Na sequência,
acompanhou a mobilização desses conhecimentos para a construção de conceitos
de razões trigonométricas no triângulo retângulo e como essa construção de
conceitos se deu em relação à tríade professor, aluno e saber. Por último, verificou
como o aluno aplicou o que construiu de conhecimentos na etapa anterior. Para
tanto, elaboraram-se três instrumentos de pesquisa (Apêndice A, B e C), que foram
desenvolvidos em um total de oito encontros (cada encontro, com duração de duas
horas-aula).
As características apontadas anteriormente ajudam a reforçar a escolha pela
abordagem qualitativa, em que se utiliza a técnica de análise documental. A análise
documental será realizada com base em três instrumentos de pesquisa a serem
desenvolvidos pelos alunos elaborados à luz do referencial teórico, apoiando-se em
Phillips (1974), que considera como documentos “quaisquer materiais escritos que
possam ser usados como fonte de informação sobre o comportamento humano”
(PHILLIPS, 1974, p. 187).
22
Em Appolinário (2009), encontra-se uma definição mais ampla de
documento que vai além do conceito de materiais escritos:
Qualquer suporte que contenha informação registrada, formando uma unidade, que possa servir para consulta, estudo ou prova. Incluem-se, nesse universo, os impressos, os manuscritos, os registros audiovisuais e sonoros, as imagens, entre outros. (APPOLINÁRIO, 2009, p. 67)
Inicialmente foi desenvolvido com os alunos um instrumento do tipo
questionário (Apêndice A), que visa coletar seus conhecimentos prévios em relação
às noções matemáticas a serem utilizadas no estudo das razões trigonométricas no
triângulo retângulo, a fim de verificar quais intervenções serão necessárias para que
esses alunos possam construir conhecimentos de forma a desenvolver autonomia
quanto à utilização das ferramentas matemáticas.
Em um segundo momento, foi trabalhado o instrumento II (Apêndice B),
elaborado à luz da referida fundamentação teórica. Trata-se de uma sequência
didática, composta por situações-problema, referentes ao conteúdo de trigonometria
no triângulo retângulo, em que se fará a análise dos conhecimentos mobilizados ou
disponíveis em decorrência da implementação da proposta didática e que tem por
objetivo fazer evoluir os conhecimentos dos alunos em relação ao estudo dessa
noção matemática.
Posteriormente, foi aplicado o terceiro instrumento (Apêndice C), composto
por quatro problemas referentes à trigonometria no triângulo retângulo. O objetivo
desse instrumento é verificar como o aluno aplica o que construiu com o segundo
instrumento.
Além dos instrumentos de pesquisa, foram utilizadas as anotações escritas
do pesquisador e o material transcrito de gravações de áudio como apoio na análise
documental, fazendo uma análise quanto aos procedimentos e resultados
desenvolvidos pelos alunos.
Por fim, foram dadas sugestões, apontando caminhos e alternativas que
conduzam à superação das dificuldades das relações trigonométricas no triângulo
retângulo.
23
Lüdke e André (2012) consideram que uma análise documental busca
identificar informações factuais nos documentos a partir de questões ou hipóteses
de interesse. De acordo com as autoras, o uso de documentos na pesquisa
apresenta uma série de vantagens que se consideram importantes neste estudo, tais
como: os documentos podem ser consultados muitas vezes e inclusive servir de
referência a outros estudos; são considerados uma fonte de informação
contextualizada, fornecendo informações sobre esse mesmo contexto; têm baixo
custo; permitem a obtenção de dados quando o acesso ao sujeito é impraticável ou
quando a interação com os sujeitos pode alterar seu comportamento ou seus pontos
de vista.
Além disso, Lüdke e André (2012) atentam que o uso da análise documental
é apropriado quando o acesso aos dados é problemático, quando se pretende
ratificar e validar informações por outras técnicas de coleta, ou quando o interesse
do pesquisador é estudar o problema a partir da própria expressão dos indivíduos. A
última situação faz referência a este trabalho, pois os protocolos serão analisados a
partir dos registros desenvolvidos pelos próprios alunos.
Diante das considerações expostas, destaca-se que a técnica de análise
documental tem um papel essencial na presente investigação, subsidiando-a com
uma variedade de informações a partir da expressão do aluno.
Para Lüdke e André (2012), a tarefa de análise implica organizar todo o
material, dividindo-o em partes, relacionando essas partes e procurando identificar
nele tendências e padrões relevantes, seguida de uma reavaliação dessas
tendências e padrões, buscando-se relações e inferências num nível de abstração
mais elevado.
Com o desenvolvimento dos instrumentos, foi obtido um total de 208
problemas a serem analisados.
Após a organização, a categorização dos dados acontecerá de acordo com
os procedimentos de resolução apresentados nos protocolos pelos alunos, seguida
de uma análise qualitativa, em que se procurou aprofundar, dentro de cada
categoria, a observação quanto às particularidades em relação à resolução dos
problemas que compõe os instrumentos de pesquisa apresentados. Sendo assim,
24
procurou-se compreender com profundidade as especificidades em relação à
construção de conceitos trigonométricos no triângulo retângulo, com uma
interpretação pessoal dos dados pelo pesquisador.
A escolha pelo método de pesquisa de abordagem qualitativa justifica-se
pelo fato de que os procedimentos desenvolvidos neste trabalho encontram
subsídios nos procedimentos de pesquisa qualitativa, ou seja, os dados coletados
por meio dos instrumentos de pesquisa serão organizados de modo a buscar
sintetizar ideias dentro do cenário da pesquisa. Com os dados categorizados,
pretende-se fazer uma análise qualitativa, procurando aprofundar, dentro de cada
categoria, à luz da fundamentação teórica utilizada, a observação sobre as
especificidades presentes nos protocolos, referentes aos problemas desenvolvidos
pelos alunos que compõem os instrumentos de pesquisa.
25
CAPÍTULO 2 - O ENSINO DE TRIGONOMETRIA
Conforme já mencionado, o foco desta pesquisa é, sobretudo, o estudo das
relações entre as medidas dos lados de um triângulo retângulo e tem-se por objetivo
verificar as revelações relativas aos conhecimentos matemáticos que alunos
possuem sobre o conteúdo trigonométrico, como mobilizam esse conhecimento para
resolverem tarefas e como tais conhecimentos podem servir para construção de
novos conhecimentos.
Nesse sentido, foram considerados relevantes os seguintes aspectos: o
estudo das razões dos lados do triângulo retângulo apresenta-se como proposta
inicial desde o 9º ano do Ensino Fundamental e o domínio desse conteúdo facilita a
transição para o estudo do ciclo trigonométrico de caráter mais algébrico, ou seja,
acredita-se que a institucionalização desse conhecimento minimiza as dificuldades
que eventualmente surjam no processo de transição de relações trigonométricas
para função trigonométrica.
Diante do exposto, serão apresentados, neste capítulo, alguns aspectos
curriculares e trabalhos de pesquisas recentes, selecionados por julgar-se que
tratam de situações relevantes dentro do presente foco de estudo, as quais
corroboram para melhor compreensão de tal importância.
2.1 Inserção Curricular do Estudo de Trigonometria
Analisou-se o Currículo do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2012), pois
se trata de uma parte relevante deste trabalho, isto é, refere-se a um documento
vigente que dá orientações ao trabalho docente e também norteia a aprendizagem
dos alunos que serão nossos sujeitos de pesquisa.
Esse documento visa propor um currículo para os níveis de Ensino
Fundamental e Médio e, também, garantir a todos uma base comum de
conhecimentos e competências para que as escolas funcionem como uma rede.
Nele, encontramos alguns princípios orientadores, a fim de promover as
competências exigidas no mundo contemporâneo.
26
Nesse sentido, o documento prioriza a competência de leitura e escrita,
definindo a escola como espaço de cultura e de articulação de competências e
conteúdos disciplinares.
Complementando o Currículo, foram elaborados os cadernos do professor,
dirigidos especialmente aos docentes, e os cadernos do aluno, organizados por
disciplina, ano e bimestre. Neles, encontram-se situações de aprendizagem para
orientar o trabalho do professor quanto ao ensino dos conteúdos e à aprendizagem
do aluno, com propostas de abordagens e sugestões de materiais disponíveis como
textos, softwares, sites, vídeos, os quais o docente pode utilizar para o
enriquecimento das aulas.
O texto desse documento traz várias informações que se relacionam direta
ou indiretamente à importância do objeto deste estudo. Dentre elas, afirma que, há
um certo tempo, o foco da educação escolar era o ensino; entretanto, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN (BRASIL, 1996) mudou-o para a
aprendizagem (SÃO PAULO, 2012).
O mesmo texto ressalta, ainda, que a Matemática é apresentada como uma
área específica, distinta das Linguagens e Códigos e das Ciências da Natureza, e,
conforme esse documento, “a ninguém é permitido dispensar o conhecimento de
Matemática sem abdicar de seu bem mais precioso: a consciência nas ações”. (SÃO
PAULO, 2012, p. 29).
Nesse currículo, as disciplinas são fundamentais, mas o foco educacional
deve estar nas competências a serem desenvolvidas pelos alunos, ou seja, as
disciplinas são um meio para a sistematização dos conhecimentos e formação de
alunos cidadãos. De acordo com o Currículo:
[...] os conteúdos da disciplina Matemática são considerados um meio para o desenvolvimento de competências tais como: capacidade de expressão pessoal, de compreensão de fenômenos, de argumentação consistente, de tomada de decisões conscientes e refletidas, de problematização e enraizamento dos conteúdos estudados em diferentes contextos e de imaginação de situações novas. (SÃO PAULO, 2012, p. 35)
O Currículo (SÃO PAULO, 2012) busca a transformação da informação em
conhecimento. Mas, para que a construção do conhecimento aconteça, as
informações precisam estar articuladas, produzindo visões organizadas da
27
realidade. Nesse sentido, algumas ideias fundamentais são apresentadas, como a
ideia de proporcionalidade, de equivalência, de ordem e de aproximação que
nortearão o estudo de grande quantidade de conteúdos escolares.
Decorrente dos pressupostos, os conteúdos disciplinares de Matemática
foram agrupados em três blocos temáticos: Números, Geometria e Relações. De
acordo com o Currículo (SÃO PAULO, 2012):
• Os Números envolvem as noções de contagem, medida e
representação simbólica, sendo constituídos pelas ideias
fundamentais de equivalência e de ordem. Esse bloco visa à
ampliação da ideia do campo numérico por meio de situações
significativas. Espera-se, ao final do Ensino Fundamental, que o aluno
reconheça e opere no campo dos números reais, ampliando novas
relações no Ensino Médio.
• A Geometria refere-se à percepção de formas e de relações entre
elementos de figuras planas e espaciais; à construção e à
representação de formas geométricas e à elaboração de concepções
de espaço. Deve ser tratada ao longo de todos os anos, em
abordagem espiralada, com diferentes escalas de tratamento.
• Quanto às Relações, seu estudo parece favorecer a
interdisciplinaridade, pois suas conexões com os eixos de números e
geometria acontecem quase que naturalmente. No Ensino
Fundamental, a ideia de proporcionalidade pode ser explorada nas
relações entre as grandezas direta e inversamente proporcionais. A
ligação das relações métricas com a geometria dá-se pelos cálculos
de áreas e volumes. No Ensino Médio, a ampliação de ideias no que
se refere a esse bloco acontece de forma significativa, incluindo a
investigação da relação entre grandezas que dependem umas das
outras, o que propicia um estudo mais sistematizado das funções.
Sobre a trigonometria, o Currículo destaca:
28
Também se enquadra nas relações de interdependência todo o estudo da trigonometria, desde as relações métricas no triângulo retângulo até a caracterização das funções trigonométricas, com sua notável potencialidade para representar fenômenos periódicos. As chamadas funções trigonométricas nada mais são do que relações de interdependência que generalizam a ideia de proporcionalidade, fundadora das noções de seno, cosseno e tangente, entre outras. (SÃO PAULO, 2012, p. 44)
Em consonância às ideias da citação anterior, a orientação geral do caderno
1 do professor da 2ª série do Ensino Médio ressalta que:
A ideia de proporcionalidade está presente no estudo das relações métricas entre lados do triângulo retângulo e a noção de semelhança, base para a aplicação das razões trigonométricas seno, cosseno e tangente. (SÃO PAULO, 2013)
A mesma orientação destaca, ainda, que o professor deve avaliar os
conhecimentos que os alunos desenvolveram anteriormente sobre tais conceitos.
Caso as razões trigonométricas não tenham sido apresentadas aos alunos no 9º ano
do Ensino Fundamental e no 1º ano do Ensino Médio, é necessário que esse
trabalho inicial não se limite apenas à retomada de conceitos, exigindo, desse modo,
maior atenção do professor, pois é fundamental que a base conceitual da
proporcionalidade esteja consolidada antes do início do estudo das funções
trigonométricas.
Ao final do Currículo (SÃO PAULO, 2012), também é apresentado um
quadro de conteúdos por ano e por bimestre para os quatro anos finais do Ensino
Fundamental e para os três anos do Ensino Médio. O Quadro 1 foi elaborado com
base nesse Currículo para o conteúdo de trigonometria, pois esse é o foco desta
pesquisa.
29
Quadro 1 - Distribuição do conteúdo de trigonometria
Ano Bimestre Conteúdo
9º ano EFII 3º Bimestre Proporcionalidade na geometria
• Razões trigonométricas
1º ano EM 4º Bimestre Geometria-Trigonometria
• Razões trigonométricas nos triângulos retângulos
2º ano EM 1º Bimestre Trigonometria
• Fenômenos periódicos • Funções trigonométricas • Equações e inequações • Adições de arcos
3º ano EM 3º Bimestre Estudo das funções
• Gráficos: funções trigonométricas, exponenciais, logarítmicas e polinomiais
Fonte: Currículo do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2012, p. 57-70)
A leitura dos cadernos evidencia uma proposta de trabalhar conteúdos de
forma contextualizada, buscando fundamentalmente as competências individuais.
Pela grade curricular, percebe-se que a trigonometria aparece a partir do último ano
do Ensino Fundamental. É possível perceber que, durante as fases de
escolarização, a trigonometria é tratada em diferentes etapas e por meio de temas
distintos. No último ano do Ensino Fundamental, trabalha-se a fundamentação da
trigonometria, abordada principalmente por meio da exploração das regularidades
encontradas em triângulos semelhantes. No 1º ano do Ensino Médio, estuda-se a
relação entre a geometria e a trigonometria, isto é, consolidam-se ideias já vistas no
9º ano do Ensino Fundamental, com contextualização em diferentes situações
práticas e a extensão de seu significado para ângulos superiores a 90º.
No 2º ano do Ensino Médio, a proposta é a trigonometria estabelecer uma
conexão entre geometria e funções. As ideias fundamentais que estão por trás
30
desses elementos são, respectivamente, a proporcionalidade e a periodicidade. A
ideia de proporcionalidade deveria ser apresentada aos alunos no 9º ano do Ensino
Fundamental e no 1º ano do Ensino Médio. Cabe ao professor avaliar se tais
conhecimentos foram sistematizados pelos alunos, devendo retomá-los, se houver
necessidade, já que se trata da base conceitual da trigonometria.
A ideia fundamental, nessa etapa, é a do estudo da periodicidade a partir da
observação de determinados fenômenos naturais e a possibilidade de modelá-los
por equações. Em seguida, tem-se o estudo das funções trigonométricas, o estudo
de gráficos de senos e cossenos e, por fim, o estudo de equações, em que são
propostas atividades contextualizadas como o movimento aparente do Sol e o
comprimento das sombras, do período de claridade ou temperatura de uma
localidade, da periodicidade da pressão sanguínea e do fenômeno das marés.
No 3º ano do Ensino Médio, a ideia de função, que já foi apresentada em
anos anteriores, é retomada. No ano anterior, revelou-se que, nas funções
trigonométricas senx e cosx, enquanto os valores de x podem variar livremente ao
longo de toda a reta real, os valores correspondentes de f(x) repetem-se
periodicamente, compreendidos entre 1 e -1. No 3º ano, as características dessas
funções são exploradas de modo mais sistematizado, ampliando-se as
possibilidades de construção de gráficos e da compreensão das formas de
crescimento ou decrescimento.
Pôde-se observar, assim, que o documento pretende que sejam
estabelecidas conexões entre os conteúdos de trigonometria nas fases de
escolarização dos alunos, porém verifica-se, na prática, que essas conexões não
têm sido uma realidade.
As considerações de trigonometria encontradas no Currículo (SÃO PAULO,
2012) mostram a importância da sistematização da ideia fundamental de
proporcionalidade, sustentando o trabalho com as razões trigonométricas, antes do
estudo da periodicidade e das funções trigonométricas abordadas no 2º ano do
Ensino Médio, justificando, portanto, o presente estudo nessa etapa de
escolarização.
31
2.2 Pesquisas que Discutem o Ensino de Trigonometria
Neste tópico, apresentam-se algumas pesquisas que discutem o ensino de
trigonometria. Para isso, realizou-se um levantamento de 23 dissertações (16 de
mestrado profissional e 7 de mestrado acadêmico), as quais foram publicadas, a
partir de 2006, neste país. Essas pesquisas foram levantadas no banco de
dissertações e teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES).
Optou-se, ainda, por buscar na literatura autores que discutam os processos
de ensino e aprendizagem de trigonometria no triângulo retângulo. Até início de
2013, foi encontrado apenas o livro de Fonseca (2010), publicado pela editora
Universidade Federal de Sergipe, o qual será abordado após a análise das
dissertações.
Para seleção das pesquisas levantadas, foram seguidos os seguintes
critérios:
• Pesquisas que abordam aspectos conceituais de seno, cosseno e
tangente no triângulo retângulo ou que contenham partes
relacionadas a esse assunto.
• Pesquisas que utilizam a informática como uma ferramenta de apoio,
sem ser o objeto de estudo em si.
• Foram descartadas desta seleção as pesquisas que tratam das
funções trigonométricas; trabalhos que visam puramente à pesquisa
informática; ou de abordagem totalmente histórica ou filosófica.
Considerou-se que esses estudos não são adequados ao foco desta
pesquisa.
Com relação aos critérios estabelecidos anteriormente, foram filtradas 8
pesquisas das 23 levantadas a princípio. Esse número chamou a atenção, pois, em
um período de sete anos, parece ainda pequeno o número de pesquisas de
mestrados acerca dessa temática. Com base nesses dados iniciais, tem-se como
hipótese que poucas pesquisas têm sido desenvolvidas visando atender a fase de
escolarização do Ensino Médio.
32
Para a análise das pesquisas selecionadas, foram adotadas as seguintes
categorias:
• Contribuições para os processos de ensino e aprendizagem das
noções propostas;
• Fundamentação teórica utilizada;
• Metodologia adotada;
• Desenvolvimento da pesquisa de campo.
Dentre os trabalhos pesquisados, o de Oliveira (2006) parece bem
direcionado e traz contribuições relevantes. Com enfoque no construtivismo e
fundamentado na metodologia de Engenharia Didática (ARTIGUE, 1996; PAIS,
2001), analisa as dificuldades de ensino de trigonometria apresentadas pelos
professores de Ensino Médio por meio de atividades. A pesquisa de campo se deu
em uma escola de Natal, capital do Rio Grande do Norte. Sua pesquisa destaca-se,
por exemplo, quando comenta os trabalhos de outros estudiosos. Nessa seção, o
autor aponta as dificuldades de domínio de conceitos trigonométricos apresentadas,
também, por professores em um curso de formação, algumas relacionadas a lado e
ângulos do triângulo retângulo e até relacionadas à medição pelo uso de
instrumentos.
Oliveira (2006) argumenta que, dentro da sala de aula, a abordagem
construtivista é um pouco “barulhenta”, isto é, os alunos buscam inquietamente
solucionar problemas e fazer descobertas, mas defende que a verdadeira
matemática é aprendida. Dentre as dificuldades exibidas pelos alunos, o autor
descreve as de caráter atitudinal, comportamental e de habilidade; destaca, ainda, o
obstáculo didático observado durante a aplicação da primeira atividade “medindo
sombras”, provavelmente devido à incompreensão do conceito de proporcionalidade
que deveria ter sido aprendido nos anos anteriores.
Segundo o autor, apesar de seu trabalho não ter como objeto de discussão
as vantagens do uso de atividades, suas ações estavam no caminho certo, pois,
comparada a outra turma cujas aulas foram somente expositivas, alguns alunos
mostraram rendimento e motivação maiores. Ao final, o pesquisador deixa algumas
33
recomendações organizacionais no âmbito da escola, resultantes das dificuldades
que parecem ter surgido durante o desenvolvimento das atividades.
A pesquisa de Huanca (2006) teve como objetivo verificar a Metodologia de
Ensino-Aprendizagem-Avaliação de Matemática por meio da Resolução de
Problemas, apresentando um caminho alternativo para a construção de conceitos e
conteúdos trigonométricos pelos alunos do Ensino Médio.
Os temas trabalhados foram conceitos básicos e trigonometria no triângulo
retângulo, a circunferência e arcos trigonométricos, funções trigonométricas e
resolução de triângulos. A pesquisa ocorreu em 2005, numa escola pública com 37
alunos de Ensino Médio, na cidade de Rio Claro/SP. Huanca (2006) adotou em seu
trabalho a orientação metodológica de Romberg (1992) e, para a coleta de dados,
recorreu a várias técnicas da pesquisa qualitativa, tais como: observações diretas,
diário de campo do pesquisador, material escrito de trabalhos de alunos, entrevistas
semiestruturadas e conversas informais.
O pesquisador constatou que houve um aumento tanto da motivação dos
alunos em aprender quanto da professora em ensinar. Esse trabalho mostra-se
interessante, visto que a pesquisa trabalha o ensino e a aprendizagem de
Matemática por meio de resolução de problemas, mas também oferece uma ideia da
Educação Matemática vista de acordo com o National Council of Theachers of
Mathematics – NCTM, dos Estados Unidos.
O trabalho de Barbosa (2009) também contribui dentro de uma perspectiva
construtivista, mas fundamentado na teoria de Simon (1995). Toma como base a
noção de Trajetórias Hipotéticas de Aprendizagem – THA. Foi desenvolvida com
alunos do 2º ano do Ensino Médio da rede pública do Estado de São Paulo.
Focando as razões e as funções trigonométricas, sua pesquisa tem por
objetivo analisar a possibilidade de conciliar perspectivas de aprendizagem junto ao
plano de ensino, bem como verificar o comportamento do professor diante de uma
proposta construtivista. Como metodologia, optou-se pela pesquisa qualitativa com
dados coletados com base nas observações em sala de aula por meio de relatórios.
O autor afirma que é possível conciliar a perspectiva de aprendizagem e a
34
planificação de ensino1, mas destaca que, para ocorrer aprendizagem nesse
modelo, a participação do professor da disciplina é importante. Por fim, conclui que a
THA não basta por si; no modelo construtivista, tem que haver interação entre os
envolvidos, professores e alunos, para que haja uma aprendizagem com significado.
A pesquisa de Klein (2009) tem por objetivo propor uma metodologia de
ensino que possibilite contribuir para construção dos conceitos envolvidos em
trigonometria com significado. Seu referencial teórico é apoiado na Teoria da
Aprendizagem Significativa de Ausubel (1980) e na Teoria dos Campos Conceituais
de Vergnaud (1993), as quais a autora considera complementares entre si.
Segundo a autora, a teoria de Ausubel (1980) considera importante a
questão dos conhecimentos prévios dos alunos para sua aprendizagem, sendo que
o professor deve subsidiá-los com materiais potencialmente significativos; enquanto,
para Vergnaud (1993), o que dá sentido aos conceitos é a situação e, por meio dela,
o aluno pode explicitar seus conhecimentos-em-ação e transformá-los em
conhecimentos científicos.
O trabalho foi realizado com uma turma do 2º ano do Ensino Médio, de 28
alunos, em uma escola particular de Novo Hamburgo/RS, em que a pesquisadora
era professora. Assim, as atividades para levantar os conhecimentos prévios foram
desenvolvidas por meio de um questionário, servindo de base para a elaboração da
proposta de situações.
A proposta é composta de sete situações de aprendizagem, iniciando-se
com a definição de razões trigonométricas até chegar à última visualização gráfica
das mudanças causadas na imagem da função seno e cosseno, utilizando o
software Graphmática. Na última parte, as habilidades e competências alcançadas
foram verificadas por meio de avaliações formais. Optou-se pela metodologia
qualitativa, utilizando-se diferentes instrumentos de coleta de dados como o registro
oral e escrito dos conhecimentos prévios, o registro das observações em sala de
aula, o registro escrito de várias situações-problema e avaliações formais.
1 Construção do planejamento, desenvolvimento das atividades e avaliação dos objetivos.
(BARBOSA, 2009)
35
Relatou que um fator limitante é o tempo, pois algumas das atividades
programadas necessitaram de tempo maior. Pelos resultados obtidos, ressaltou que
é possível compatibilizar perspectiva de aprendizagem e planificação de ensino. Ao
final, a pesquisadora concluiu que, para haver uma aprendizagem significativa
construtivista, é necessária uma interação ativa entre os envolvidos, alunos e
professores, e não apenas uma boa sequência de ensino.
A pesquisa de Trindade (2009) objetivou verificar se uma proposta de
material didático tratando do teorema de Pitágoras e das relações trigonométricas do
triângulo retângulo é significativa para satisfazer às necessidades de aprendizagem
da matriz de referência para o Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM (BRASIL,
2002). A proposta foi realizada em uma escola particular de Soledade/RS, com 14
alunos de segundo ano de Ensino Médio e utilizados como aportes teóricos a Teoria
Significativa de Ausubel (2000) e também as propostas dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (BRASIL, 1999) e a Matriz de Referência para o Exame Nacional do
Ensino Médio (BRASIL, 2002).
O material da pesquisa é composto por um pré-teste, registros escritos
produzidos pelos alunos e pelo professor durante as aulas e um pós-teste. Em suas
considerações, o autor destaca que a apropriação da teoria de Ausubel (2000) foi
importante, pois subsidiou sua prática pedagógica, produzindo reflexos a cada novo
conteúdo. Com a análise do material, percebeu-se que houve progresso em relação
ao estado inicial em que os alunos se encontravam. Foi possível perceber a
transformação dos alunos, passando a ver a Matemática com outros olhos.
Já o pós-teste evidenciou uma melhora na organização do pensamento na
resolução das questões, com respostas mais coerentes, que levaram os alunos a
aumentarem o número de acertos. Apesar do trabalho também ter como foco o
teorema de Pitágoras e a elaboração de material pedagógico significativo com base
no ENEM (BRASIL, 2002), ainda assim, poderá auxiliar esta pesquisa, ao fornecer
evidências de como se dá a construção do conhecimento de trigonometria pelos
alunos, pois se trata de estudar um conhecimento prévio necessário à formação de
tal conceito.
36
Oliveira (2010), em sua pesquisa, teve por objetivo investigar uma
abordagem de ensino da trigonometria desde o triângulo retângulo até o Ciclo
Trigonométrico. Para atingir os objetivos, foram elaboradas quatro atividades com
dinâmicas diversas (experimentos concretos, História da Matemática e material
manipulativo), que exploram a trigonometria e uma sequência com seis aplicativos,
utilizando o software de geometria dinâmica Geogebra, que aborda o ciclo e as
funções trigonométricas.
As atividades e a sequência de aplicativos foram aplicadas em turmas do
Ensino Médio de duas escolas particulares dos municípios de Mogi Guaçu e Mogi
Mirim, nas quais a professora era docente. Como fundamentação teórica, a autora
parte dos pressupostos descritos nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Médio – PCNEM (BRASIL, 2003) e se apoia no pensamento de Shulman (1986).
De todo o trabalho, a parte que se refere a esta pesquisa é a primeira
atividade experimental sobre as regularidades dos triângulos retângulos
semelhantes e a construção das razões e tábuas trigonométricas, manipulando
triângulos, transferidor, régua e calculadora; e a segunda, em que se procura
determinar distâncias inacessíveis com auxílio de um inclinômetro. No entanto, todo
o trabalho é enriquecedor, pois procura oferecer um conjunto de atividades com
dinâmicas diferenciadas a partir de outros conhecimentos, visando superar a
dificuldade na relação ensino-aprendizagem de trigonometria, percebida pela autora
docente. Ao final, a pesquisadora concluiu que, com base em seus referenciais
teóricos, foi possível alcançar satisfação por meio de uma atividade que motivasse
mais os alunos ao estudo da Matemática.
Santos (2011) investigou o uso de materiais manipuláveis como ferramenta
para exploração de conteúdos matemáticos na resolução de problemas
trigonométricos. Por meio de maquetes, verificou que alunos podem despertar as
habilidades de questionar, elaborar hipóteses e resolver com autonomia problemas
de trigonometria. O grupo era composto por 25 alunos de reforço do 2º ano do
Ensino Médio de uma escola estadual de Uruguaiana/RS. O pesquisador adotou
uma abordagem qualitativa utilizando questionários e observações. Dentre as quatro
atividades propostas, as três primeiras envolviam problemas de triângulos
retângulos e a última tratava da determinação do valor de pi.
37
Como metodologia, adaptou a resolução de problemas com base nas ideias
de Polya (1977, 1997), Onuchic (1999) e Allevato e Onuchic (2006). Santos (2011)
concluiu que os materiais manipuláveis permitem explorar conteúdos matemáticos,
de uma maneira que motiva os alunos e ainda permite que esses estudantes
desenvolvam soluções autônomas dos problemas, com a mediação do professor e a
discussão com seus pares.
Silva (2011) investigou as contribuições de uma abordagem envolvendo
modelagem e diferentes tecnologias no ensino de trigonometria. Buscou utilizar
atividades de modelagem, associando modelos matemáticos trigonométricos no
triângulo retângulo e no círculo trigonométrico a situações práticas, utilizando
tecnologias variadas.
A pesquisadora adotou como metodologia a Engenharia Didática,
compreendendo as etapas de análises prévias, concepção e análise a priori,
implementação, análise a posteriori e validação de sequência didática de 23
atividades, que foi proposta com o objetivo de motivar os alunos, a descobrirem
propriedades trigonométricas. O estudo ocorreu em uma escola pública do estado
de Minas Gerais, envolvendo 70 alunos de duas turmas da 2ª ano do Ensino Médio.
Com base nos resultados, a proposta contribuiu para que os alunos
atribuíssem significado aos conteúdos trigonométricos, incentivando seu
envolvimento e empenho na aprendizagem desse assunto. Essa pesquisa é
interessante, porque mostra o tema do triângulo retângulo sendo utilizado como
modelo matemático para abordar situações reais, por meio de uma sequência
didática, ou seja, o uso da modelagem é colocado em ação para descobrir suas
propriedades, fato não visto em outras pesquisas.
O livro de Fonseca (2010) resulta de sua dissertação de Mestrado em
Educação pela Universidade Federal de Sergipe, realizada com alunos da 1º ano do
Ensino Médio, no ano de 2001, na antiga Escola Técnica Federal de Sergipe. O
universo de pesquisa foi composto de 18 alunos e 8 alunas, com faixa etária entre
15 e 27 anos. O autor partiu da hipótese de que a não ocorrência de conexões “bem
feitas” entre as várias partes do conteúdo pesquisado, geraria o que chamou de
“desconexão de aprendizagem”. Para tanto, Fonseca (2010) apoiou seu trabalho na
38
história da trigonometria e na aprendizagem em trigonometria como elementos
norteadores, buscando caminhos para superar as dificuldades que o aluno tem
nessa aprendizagem, considerando o fato de a aprendizagem em trigonometria
encontrar-se desconectada em currículos do Ensino Fundamental e Médio, da
História da Matemática e até do mundo cotidiano. Fonseca (2010) estruturou seu
livro em três capítulos. A seguir, foram destacadas as ideias mais importantes de
cada um deles.
No capítulo 1, Fonseca (2010) faz recortes do desenvolvimento da
trigonometria ao longo da História das Civilizações. O autor apoia-se, sobretudo, nas
obras de Boyer (1974), Kennedy (1992), Struik (1989) e procura compreender a
exploração da trigonometria, seu desenvolvimento, os fatos que a promoveram e os
estudiosos envolvidos; além do momento em que houve a ruptura da geometria,
ocorrendo a sistematização de seu estudo. Para o autor, talvez em função da
sistematização do conhecimento matemático grego inspirado em Euclides, a
trigonometria tenha perdido, em parte, as conexões entre teoria e prática.
No capítulo 2, o autor faz reflexões sobre a aprendizagem da trigonometria,
discutindo sobre os problemas de ensino-aprendizagem da trigonometria, o currículo
de Matemática, o livro didático e a distribuição do espaço físico nas aulas de
Matemática.
Sobre os problemas de ensino-aprendizagem da trigonometria, Fonseca
(2010) acredita que os docentes poderiam usar o conhecimento como meio para
ensinamentos socioculturais. Pensa que o vestibular tem servido para treinar
conteúdos. Comenta que boa parte do ensino trigonométrico é apresentada de
forma congelada, morta, privilegiando apenas a exposição de conteúdos
trigonométricos cristalizados. Em seu ponto de vista, não se pode falar em ensino-
aprendizagem da trigonometria desconsiderando a história e os experimentos, sem
incentivar a criatividade a partir de jogos, sem fazer relações com o cotidiano, sem
manipular instrumentos para medir ângulos, sem incentivar os alunos à resolução de
situações-problema ou levá-los a visualizarem os movimentos ondulatórios das
funções seno e cosseno.
39
No entanto, Fonseca (2010) argumenta que o processo de aprendizagem
não pode ser estruturado focalizando apenas a metodologia, pois outros fatores
podem implicar em sua aprendizagem. A história da trigonometria é, portanto,
imprescindível para poder compreender os avanços tecnológicos e poder acessá-los
quando disponíveis. Propõe, ainda, um enfoque ligado a situações mais imediatas,
pois o que interessa ao aprendiz em geral é aquilo que tem apelo às suas
percepções materiais e intelectuais mais imediatas. O autor também mostra que a
individualização da instrução também deveria ser considerada e cita como sugestão
o docente preparar uma justificativa para cada um dos tópicos do programa, mas
justificativas contextualizadas no mundo do presente e do futuro.
Acerca do currículo, Fonseca (2010) acredita que o ensino de trigonometria
consta apenas como parte do currículo de Matemática, principalmente para dar
suporte às disciplinas como Física e Química, e também como item para seleção de
futuros universitários, ou seja, o ensino está “abandonado”. A reorganização desse
currículo seria uma das alternativas encontradas pelos pesquisadores da área. Outro
ponto destacado é a avaliação que, em sua visão, deveria ser ampla, composta
pelos depoimentos dos alunos, seus registros, sua produção literária, seus modos
de representação e outras formas de expressão.
A respeito do livro didático, publicado por editoras de maior circulação em
Sergipe, no período de 1988 a 1992, conclui que, na maior parte dos livros, a
trigonometria é apresentada de forma “desarticulada” de qualquer aspecto “prático”.
Refletindo sobre a distribuição do espaço físico nas aulas de Matemática,
propõe seis layouts de sala de aula que acredita serem planejados para possibilitar
uma participação efetiva de todos os membros da turma.
No capítulo 3, Fonseca (2010) apresenta o que considera uma proposta
metodológica na perspectiva da Educação Matemática composta por um conjunto de
10 experimentos, com o objetivo de mostrar aos alunos o desenvolvimento histórico
da trigonometria, a partir de dúvidas ou problemas do cotidiano. O autor elaborou
uma prova, denominada de pré-teste, a fim de analisar a quantidade de erros de
aprendizagem e os conhecimentos prévios que os alunos traziam, desde o 9º ano,
sobre os conceitos importantes para a compreensão da trigonometria, razões
40
trigonométricas, relações e identidades fundamentais. O conjunto das 10 atividades
funcionaria como indicador de alguma desconexão de aprendizagem trigonométrica,
sendo essas atividades desenvolvidas a partir da história da trigonometria até o uso
de software. Para desenvolvimento das atividades, o autor optou por trabalhar com
grupos, formados por 5 alunos e distribuídos em 7 grupos de cores, acreditando
numa produção maior. Ao final, foi aplicado o pós-teste (similar ao pré-teste), a fim
de verificar o nível de assimilação e acomodação dos conceitos de trigonometria
estudados pelos alunos.
Fonseca (2010) afirmou que, apesar do cansaço físico e mental apresentado
pelos alunos no último dia de aula e de alguns dos conceitos não terem sido
assimilados por uma parte dos alunos, minimizaram-se as “desconexões de
aprendizagem” quando foi possível perceber os alunos “desejando aprender”.
Ressaltou, também, que nenhum dos 26 alunos obteve média inferior a 6 no
conjunto de atividades. Concluiu que as principais causas das possíveis
“desconexões” foram o modelo sistemático dado à trigonometria, práticas de aulas
idênticas às de anos anteriores para alunos “diferentes”, um ensino de trigonometria
pautado em conjecturas e abstrações num ritmo acelerado, um currículo sem
priorização do conhecimento trigonométrico, livros que não atendem ao
desenvolvimento da trigonometria e instituições de ensino sem estrutura adequada
para que a aprendizagem seja atingida.
2.3 Sintetizando o Panorama das Pesquisas
Para ter-se um panorama geral da produção de pesquisas que foram
filtradas no que se refere à trigonometria no triângulo retângulo, é apresentado, a
seguir, um gráfico que sintetiza a quantidade porcentual de dissertações produzidas
por regiões do Brasil. Nesta pesquisa, constatou-se que, das 8 dissertações de
mestrado, uma foi realizada no estado do Rio Grande do Norte, três no Rio Grande
do Sul, três em São Paulo e uma em Minas Gerais.
Figura
Analisando os trabalhos
metodologias e resultados
Oliveira (2006) e Trindade (2009)
trigonométricas no triângulo retângulo
pesquisa à produção de material especifico
maior parte das pesquisa
busca investigar alunos com dific
atividades apoiadas em maquetes
Oliveira (2010) e
círculo trigonométrico, e
atividades diferenciadas
e software Geogegra), usando
calculadora) e inclinômetro
entretanto, buscou focar
Por fim, Huanca (2006), Barbosa (2009),
chegando ao estudo das funções trigonométricas. Huanca verific
Resolução de Problemas
Barbosa (2009) fez uso de Trajetórias Hipotéticas de Apr
estudo enquanto Klein
situações propostas por Klein
qual aborda as razões trigonométricas que utiliza
com E.V.A, e a segunda,
0,0%
Norte
Figura 1 – Pesquisas por regiões do Brasil
Fonte: Elaborado pelo pesquisador
Analisando os trabalhos pesquisados em relação a conteúdos,
metodologias e resultados, percebe-se que, em relação a conteúdos e estratégias
Trindade (2009) concentram seus estudos somente
triângulo retângulo; entretanto Trindade (2009)
pesquisa à produção de material especifico. Santos (2011) também
pesquisas nas relações trigonométricas no triângulo retângulo
busca investigar alunos com dificuldades em Matemática, propondo todas as
maquetes.
e Silva (2011) abordaram desde o triângulo retângulo até o
, enquanto Oliveira (2010) fez uso, em sua investigação
(experimento, História da Matemática, material manipulativo
usando material manipulativo (triângulo, transfer
inclinômetro no estudo das razões trigonométricas
sua investigação na modelagem.
Huanca (2006), Barbosa (2009), Klein (2009) foram
chegando ao estudo das funções trigonométricas. Huanca verific
Resolução de Problemas, é possível a construção de conceitos trigonom
fez uso de Trajetórias Hipotéticas de Aprendizagem
Klein (2009) utilizou 7 situações de aprendizagem
propostas por Klein, interessa mais a esta pesquisa a primeira
es trigonométricas que utiliza trinta triângulos retângulos feitos
, na qual utiliza-se o astrolábio em uma atividade prática.
12,5%
0,0%
50,0%
37,5%
Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul
41
Pesquisas por regiões do Brasil
em relação a conteúdos, estratégias,
m relação a conteúdos e estratégias,
somente nas razões
(2009) direciona sua
também centraliza a
o triângulo retângulo, mas
, propondo todas as
abordaram desde o triângulo retângulo até o
em sua investigação, de
, material manipulativo
material manipulativo (triângulo, transferidor, régua e
estudo das razões trigonométricas; Silva (2011),
foram mais adiante,
chegando ao estudo das funções trigonométricas. Huanca verificou se, por meio da
ão de conceitos trigonométricos.
endizagem (THA) em seu
7 situações de aprendizagem. Dessas
a primeira situação, a
trinta triângulos retângulos feitos
se o astrolábio em uma atividade prática.
37,5%
Sul
42
No quadro a seguir, apresentam-se as pesquisas levantadas, indicando as
principais referências utilizadas.
Quadro 2 – Pesquisas selecionadas de trigonometria
Autor Referência utilizada Estratégias de ensino Pesquisa com
Oliveira (2006) Engenharia didática – Artigue (1996); Pais (2001)
Sequência didática Professores
Huanca (2006) Metodologia de Romberg (1992)
Resolução de problemas Alunos
Barbosa (2009) Teoria de Simon (1995) Uso de THA Alunos
Klein (2009) Teoria da Aprendizagem Significativa de Ausubel (1880) / Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud (1993)
Situações de aprendizagem
Alunos
Trindade (2009) Teoria Significativa de Ausubel (2000), PCN (BRASIL,1999), ENEM (BRASIL, 2002)
Pré e pós-testes, situações-problema
Alunos
Oliveira (2010) Pensamento de Shulman (1986), PCNEM (BRASIL, 2003)
Conjunto de atividades (experimentos concretos, História da Matemática, material manipulativo) e sequência de aplicativos
Alunos
Santos (2011) Resolução de problemas - Polya (1977), Onuchic (1999), Allevato e Onuchic (2006)
Resolução de problemas por meio de maquetes
Alunos
Silva (2011) Engenharia didática - Artigue (1988, 1996)
Sequência didática Alunos
Fonseca (2010) (livro)
História da Matemática - Boyer (1974), Kennedy (1992), Struik (1989)
Conjunto de Experimentos (atividades), pré e pós-testes
Alunos
Fonte: Dados da pesquisa
43
Sendo assim, a análise das dissertações pesquisadas evidencia que
somente o trabalho de Oliveira (2006) concentra toda a pesquisa nas razões
trigonométricas no triângulo retângulo e que outros trabalhos perpassam pelo tema,
no entanto buscam investigar metodologias diferenciadas para a relação ensino-
aprendizagem da trigonometria, valorizando a participação ativa do aluno no
processo de aprendizagem e o trabalho coletivo. Percebe-se que as estratégias
escolhidas pelos pesquisadores foram estas: sequência de atividades, resolução de
problemas, THA, situações-problema, experimentos, materiais manipulativos
(transferidor, régua, material de E.V.A., maquetes), instrumentos (inclinômetro /
astrolábio), modelagem e, como apoios, História da Matemática e software
(Graphmática, Geogegra).
Nas pesquisas analisadas, tivemos a utilização da Engenharia Didática (dois
casos), a metodologia de Romberg, a teoria de Simon, a teoria da Aprendizagem
Significativa de Ausubel (dois casos), a teoria dos Campos Conceituais de
Vergnaud, o pensamento de Shulman e propostas de Resoluções de Problemas.
Com isso, é possível perceber que houve somente três trabalhos dentro da
abordagem da Didática da Matemática Francesa e que apenas um recorreu à teoria
dos Campos Conceituais de Vergnaud.
Pela leitura das dissertações, podem-se notar evidências de que um número
pequeno de trabalhos apresenta (ou aborda) problemas de ordem organizacional ou
dificuldades de aprendizagem pelos alunos. Alguns pesquisadores destacam a
importância da interação entre alunos e professores no processo de ensino-
aprendizagem; em seus trabalhos, deixam transparecer, em suas considerações
finais, que, em geral, o nível de aprendizado dos alunos cresceu, aumentando a
motivação e o rendimento de forma autônoma e coletiva.
Reafirma-se que a análise dos trabalhos sobre trigonometria permite inferir
algumas conclusões que se consideraram significativas para esta pesquisa. Após a
discussão, percebeu-se que, das 8 pesquisas, apenas Oliveira (2006) tratou
exclusivamente da trigonometria no triângulo retângulo, recorrendo como ferramenta
metodológica ao estudo da Engenharia Didática (ARTIQUE, 1996; PAIS, 2001).
Nesse aspecto, as outras pesquisas perpassaram pelo tema, mas a maioria focou
seus estudos em metodologias diferenciadas.
44
O livro de Fonseca (2010) também contempla o triângulo retângulo e as
relações trigonométricas, tendo como norte a história da trigonometria e a
Aprendizagem em trigonometria. Contribui essencialmente com as “desconexões de
aprendizagem”, tentando superar suas causas por meio de recursos inseridos nas
linhas de pesquisa da Educação Matemática (História, Laboratório, Informática,
Vídeos, Jogos, Resolução de Problemas, Etnomatemática e Modelagem).
Baseado nas considerações anteriores, percebeu-se que o tema deste
estudo ainda precisa ser mais explorado. Diante desse cenário, considera-se o
presente estudo importante, pois pode contribuir para ampliar os conhecimentos de
razões trigonométricas nos triângulos retângulos, considerando a relação professor,
aluno e saber, e também como se dá a aquisição desse conhecimento
trigonométrico, à luz da teoria dos Campos Conceituais.
45
CAPÍTULO 3 - QUADRO TEÓRICO
Neste capítulo, apresentam-se as teorias que norteiam este trabalho de
pesquisa: a teoria dos Campos Conceituais, de Gerard Vergnaud, e a Teoria das
Situações Didáticas, de Guy Brousseau. A finalidade principal deste capítulo é
descrever alguns elementos fundamentais de cada referencial teórico da didática
francesa e abrir uma reflexão sobre como cada teoria pode auxiliar na busca de
solução para a problemática desta pesquisa. Serão estudadas as noções de
Situações Didáticas e Contrato Didático, que estruturam a teoria de Brousseau e a
formação de conceitos que compõe a teoria de Vergnaud, elementos fundamentais
na condução desta pesquisa.
3.1 A Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud
Um dos quadros teóricos em que se apoia a presente investigação é a teoria
de Vergnaud (1996, 1998, 2012) sobre os Campos Conceituais. A escolha dessa
vertente teórica para fundamentar a elaboração desta pesquisa se deu porque, para
Vergnaud (2012), parte de nosso conhecimento é resultante de habilidades e a
utilização da linguagem é especialmente importante para realizar a simbolização e a
conceitualização. Outro ponto que se destaca na Teoria dos Campos Conceituais é
que, para Vergnaud (2012), o desenvolvimento do conhecimento de Matemática não
pode se reduzir ao desenvolvimento das operações lógicas. Pretende-se, com essa
teoria, entender como alunos constroem conceitos e como fazem as conexões entre
conhecimentos novos e antigos.
Segundo Vergnaud (1996), a principal finalidade da Teoria dos Campos
Conceituais é fornecer um quadro que permita a compreensão das filiações e
rupturas entre conhecimentos novos e antigos, nas crianças e nos adolescentes,
entendendo por “conhecimento” tanto o saber fazer, quanto os saberes expressos.
Com base na consideração anterior e pensando no campo desta pesquisa,
imagina-se que, na aprendizagem de trigonometria, alunos tenham dificuldades em
relacionar os conhecimentos já aprendidos aos novos e, por consequência, não
conseguem desenvolver autonomia no momento de realizar tarefas distintas
46
daquelas aprendidas na sala de aula, sob o auxílio do professor. Acredita-se que as
filiações e rupturas são processos inerentes à atividade matemática.
O autor considera que essa teoria não é específica da Matemática, mas foi
inicialmente elaborada com o intuito de desvendar o processo de conceitualização
progressiva das estruturas aditivas e multiplicativas, além das relações número-
espaço, pertencentes à álgebra.
Em sua teoria, Vergnaud (1996) refere-se a campos conceituais porque,
para ele, um conceito depende de várias situações e uma situação depende de um
conjunto de conceitos, pois uma situação não se forma a partir de um único
conceito.
Na referência anterior a campos conceituais, Vergnaud (1996) utiliza os
termos conceito e situação.
Segundo Vergnaud (1996), um conceito é a reunião de três conjuntos:
• conjunto das situações que dão sentido ao conceito;
• conjunto de invariantes operatórios (objetos, propriedades e relações)
de que o indivíduo fará uso para compreender as situações (o
significado);
• conjunto das representações simbólicas (linguagem natural, símbolos,
gráficos, diagramas) que o indivíduo utilizará para representar o
conceito, as suas propriedades e as situações (o significante).
Para estudar o desenvolvimento e o funcionamento de um conceito, é
necessário considerar simultaneamente os três conjuntos.
O conceito de situação, conforme Vergnaud (1996), está associado ao
sentido de tarefa, isto é, uma situação complexa pode ser analisada como uma
combinação de tarefas, sendo importante conhecer a sua natureza e as dificuldades
próprias. O desempenho em cada subtarefa é importante para o desempenho final,
ou seja, o fracasso em uma subtarefa implica o fracasso global, mas a dificuldade de
uma tarefa não é constituída pela soma ou multiplicação das dificuldades de cada
subtarefa. Portanto, são as situações que dão sentido aos conceitos.
47
De acordo com Vergnaud (1996), o sentido é uma relação do sujeito com as
situações e os significantes, ou seja, são os esquemas evocados. Como exemplo, o
autor cita que o sentido da adição para um sujeito é o conjunto dos esquemas de
que ele pode se utilizar diante das situações a serem confrontadas e implicam a
ideia de adição, assim como o conjunto de esquemas que ele pode pôr em prática
para operar sobre os símbolos numéricos, algébricos, gráficos e de linguagem, que
representam a adição.
Tem-se por hipótese que o estudo de trigonometria, como tantos outros
conteúdos matemáticos, relaciona-se à construção de conceitos que dependem de
várias situações. No presente caso, as noções de triângulo retângulo são
apresentadas em uma situação ao aluno, mas há a necessidade de gerar um
conjunto de conceitos que, futuramente, os alunos devem ter disponíveis para fazer
conexões entre conhecimentos aprendidos e novos conhecimentos. Além disso,
devem utilizá-los em outras disciplinas como, por exemplo, a Física ou ainda fazer
relações com situações de seu próprio cotidiano.
Para Vergnaud (2009), pode-se aprender e se desenvolver em qualquer
idade, pois um indivíduo é capaz de adaptar-se às situações por meio de uma
evolução da organização de sua atividade. Sobre a atividade em situação, realizada
pelo indivíduo, Vergnaud defende que:
[...] a análise da atividade em situação é um meio essencial para compreender os processos de aprendizagem, por mais delicada e difícil que ela seja. Ela passa notadamente pela análise dos erros, das hesitações e dos desfuncionamentos, assim como pela identificação das diferentes etapas pelas quais se constrói uma forma nova de organização da atividade. (VERGNAUD, 2009, p. 14)
Com base na referida citação e aproximando-a do contexto desta pesquisa,
pode-se compreender que, quando se analisa a atividade em situação, ou seja, os
procedimentos, as ações e as representações realizadas pelo aluno, consegue-se
verificar em que etapa se dá sua aprendizagem, e deve-se observar e analisar os
erros, os acertos e também as dificuldades demonstradas. Vergnaud (2009) defende
que o aluno organiza sua atividade por meio de esquemas e um esquema está
sempre associado a uma situação.
Referindo-se ao esquema, Pais (2005) destaca que:
48
“[...] é uma forma estruturada e invariante de organizar as atividades relacionadas à aprendizagem de conceitos, diante de uma classe de situações vivenciadas pelo aluno. O reconhecimento dos invariantes é uma passagem crucial para que a formação do conceito evolua.” (PAIS, 2005, p. 55)
Franchi (1999) ressalta que é importante observar que o caráter da
invariância não se refere aos elementos formais ou até mesmo às ações do sujeito,
mas sim, à forma como as ações são organizadas diante da classe de situações,
visando a uma estratégia de aprendizagem do conceito.
Vergnaud (2012) afirma que é nos esquemas que se devem procurar os
elementos cognitivos os quais permitem a ação do sujeito ser operatória, ou seja,
cada esquema tem a ver com uma variedade de situações. O desenvolvimento
cognitivo do sujeito está relacionado à quantidade e à diversidade de esquemas que
o mesmo possui. Isso só é possível, porque o esquema comporta:
• invariantes operatórios (teoremas-em-ação e conceitos-em-ação) que
pilotam o reconhecimento pelo sujeito dos elementos pertinentes à
situação e à recolha de informação sobre a situação a tratar;
• antecipações do objetivo a atingir, dos efeitos a considerar e das
eventuais etapas intermediárias;
• regras de ação do tipo “se...então...”, que permitem gerar a
sequência de ação do sujeito;
• Inferências (ou raciocínios), que permitem calcular as regras e as
antecipações a partir das informações e do sistema de invariantes
operatórios de que o sujeito dispõe.
Vergnaud (1996) considera, também, que um conceito não pode ser
reduzido à sua definição, pois é por meio das situações e dos problemas a resolver
que um conceito ganha sentido diante dos alunos, ou seja, o conceito está
fortemente ligado à resolução de problemas. Esse processo de elaboração
pragmática é essencial, caso se queira avaliar a medida da função adaptativa do
conhecimento.
Pode-se distinguir duas classes de situações, conforme Vergnaud (1996):
49
• classes de situações para as quais o sujeito dispõe das competências
necessárias ao tratamento de determinada situação;
• classes de situações para as quais o sujeito não dispõe de todas as
competências, o que o levará a um tempo de reflexão e de
exploração, a hesitações, conduzindo-o ao sucesso ou ao fracasso.
O conceito de esquema é interessante para as duas classes, mas não
funciona da mesma forma. No primeiro caso, tem-se condutas automatizadas,
organizadas em um único esquema; no segundo caso, são observados diversos
esquemas sendo utilizados e os mesmos devem ser acomodados, descombinados e
recombinados para que possam, até mesmo, competir entre eles.
De acordo com Vergnaud (1996), as competências matemáticas também
são sustentadas por esquemas organizadores da conduta. Todas as condutas
contêm uma parte automatizada e uma parte de decisão consciente. Como exemplo,
o autor cita que os algoritmos são formas de esquemas. Nesse sentido, Vergnaud
destaca que “como Piaget, podemos dizer que os esquemas se encontram no centro
do processo de adaptação das estruturas cognitivas: assimilação e acomodação”
(VERGNAUD, 1996).
Ainda segundo Vergnaud (1996), o funcionamento cognitivo de um sujeito ou
de um grupo de sujeitos em situação apoia-se em um conjunto de esquemas
disponíveis, formados anteriormente por cada um dos sujeitos. O esquema é,
portanto, um conceito fundamental, pois é uma função temporalizada com
argumentos, que permitem gerar várias sequências de ações e de tomadas de
informação, em função dos valores das variáveis da situação.
O esquema é composto, essencialmente, pelos conhecimentos de conceito-
em-ação e teorema-em-ação, denominados de invariantes operatórios, e por
inferências (indispensáveis à prática do esquema). O conceito-em-ação não é um
conceito, nem um teorema-em-ação é um teorema, pois conceito e teorema devem
ser necessariamente explícitos. Um conceito-em-ação é um conceito implícito válido
como pertinente, e um teorema-em-ação é uma proposição válida como verdadeira.
Ambos constroem-se em estreita interação. Portanto, o reconhecimento de
invariantes é a chave da generalização de um esquema.
50
Para Vergnaud (1996), a tese subjacente à Teoria dos Campos Conceituais
é a de que uma boa representação didática, necessariamente, sustenta-se no
conhecimento da dificuldade das tarefas cognitivas, nos obstáculos com que se
depara, do repertório dos procedimentos, e das possíveis representações.
3.2 A Teoria das Situações Didáticas de Brousseau
O outro quadro teórico em que esta investigação tem referência é a Teoria
das Situações Didáticas de Brousseau (1986, 1996, 2008). De acordo com Pommer
(2008), a teoria de Brousseau (1996) permite compreender as interações sociais que
ocorrem dentro da sala de aula entre alunos e professores, as condições e a forma
como o conhecimento matemático pode ser aprendido; o controle dessas condições
permitiria reproduzir e otimizar os processos de aquisição de conhecimento
matemático escolar.
Para Brousseau (2008), o modelo de interação de um sujeito e um meio
específico que determina esses conhecimentos é denominado de situação. O autor
considera que a situação didática é todo o contexto que cerca o aluno, nele incluídos
o professor e o sistema educacional. Segundo definição dada por Brousseau (1986):
Uma situação didática é um conjunto de relações estabelecidas explícita e ou implicitamente entre um aluno ou um grupo de alunos, num certo meio, compreendendo eventualmente instrumentos e objetos, e um sistema educativo (o professor) com a finalidade de possibilitar a esses alunos um saber constituído ou em vias de constituição. (BROUSSEAU, 1986).
Pommer (2008) ressalta que o objeto central de estudo nessa teoria é a
situação didática, na qual são identificadas as interações entre professor, aluno e
saber. Ainda segundo o autor, é por meio de uma série de situações didáticas que
se estabelecem os fatores determinantes para a evolução do comportamento dos
alunos.
Nesse sentido, Brousseau (2008) representa a situação de ensino conforme
o “triângulo” a seguir:
51
Figura 2 – Triângulo didático
Fonte: Brousseau (BROUSSEAU, 2008, p. 54)
Nesse esquema, a situação de ensino é constituída por três elementos – o
aluno, o professor e o saber – estabelecendo uma relação complexa, resultante das
interações entre professor e aluno, mediadas pelo saber.
Referindo-se a esse triângulo didático, Pommer (2008) cita que o professor e
o aluno possuem um relacionamento assimétrico quanto ao saber; o que se espera
da relação didática é mudar esse quadro inicial face ao saber.
Sendo assim, faz-se necessário discutir inicialmente os papéis do professor,
do aluno e do saber na relação didática. Para Brousseau (2008), a teoria de Piaget,
baseada nos esquemas de assimilação e acomodação, em que o aluno aprende
adaptando-se a um meio que é fator de desequilíbrio, corre o risco de tirar do
professor a responsabilidade didática, pois um meio sem intenções didáticas é
incapaz de induzir o aluno a adquirir todos os conhecimentos culturais que se espera
que obtenha.
Sobre a aprendizagem por adaptação, Pais (2005) comenta que o aluno é
desafiado a adaptar seus conhecimentos anteriores às condições de solução de um
novo problema, sendo necessário o aluno ultrapassar o seu próprio nível de
conhecimento, revelando a operacionalidade dos conteúdos dominados até então.
De acordo com Brousseau (2008), as concepções atuais do ensino exigirão
que o professor provoque o aluno, por meio da seleção adequada dos problemas
que propõe para que se atinjam as adaptações desejadas. Esses problemas,
escolhidos de modo que o estudante possa aceitá-los, devem fazer, pela própria
dinâmica, com que o aluno atue, fale, reflita e evolua. É a partir da devolução ou do
aceite do problema pelo aluno que se inicia o processo de aprendizagem. Segundo
o mesmo autor, o professor não deve fornecer conhecimentos desde a devolução
52
até o momento em que se produz a resposta, o aluno deve saber que esse
conhecimento é justificado pela lógica interna da situação e que pode prescindir de
razões didáticas para construí-lo.
Nessa relação didática, o meio é capaz de provocar no aluno
comportamentos que motivem a manifestação de seu conhecimento,
correspondendo às necessidades desse elemento. Brousseau (2008) considera o
meio como subsistema autônomo, antagônico ao sujeito, sendo constituído pelas
peças de um jogo, um desafio, um problema, inclusive um exercício, fichas, etc.
Em síntese, cabe ao professor regular a relação aluno e meio, organizando-
a e estabelecendo as condições que levem o sujeito a “construir” a Matemática, por
meio de problemas, sem a influência das condições didáticas direcionadas pelo
professor. Esse saber que o aluno consegue usar fora do contexto de ensino e sem
nenhuma indicação intencional, Brousseau (2008) denominou situação adidática.
Nessa situação, o aluno atua de forma autônoma. Na definição dada por
Brousseau (1986):
Quando o aluno se torna capaz de pôr em funcionamento e utilizar por si mesmo o saber que está construindo, em situação não prevista em qualquer contexto de ensino e também na ausência de qualquer professor, está ocorrendo, então, o que pode ser chamado de situação adidática. (BROSSEAU, 1986).
Freitas (1999) considera que as situações adidáticas representam os
momentos mais importantes da aprendizagem, pois o sucesso alcançado pelo aluno
significa que ele conseguiu sintetizar um conhecimento por seu próprio mérito. Não
se deve confundi-las, portanto, com as situações não didáticas, aquelas que não
foram planejadas visando a uma aprendizagem. Assim, toda atividade pedagógica
deve ser planejada pelo professor no sentido de direcionar o aluno para o principal
que é a situação adidática. No processo de ensino-aprendizagem, o professor deve
fornecer as condições para que o aluno mobilize seus conhecimentos e explicite
raciocínio e procedimentos.
Pela prática em sala de aula, sabe-se das dificuldades que os alunos
apresentam em relação ao estudo de trigonometria referente a conceitos e a suas
mobilizações. Pensando nessas dificuldades, adotou-se essa teoria como uma
53
forma de auxiliar a elaboração dos instrumentos desta pesquisa, com a finalidade de
propor uma sequência didática, constituída por problemas de trigonometria; tudo
isso para resultar na apreensão de conceitos por parte dos alunos. Para isso, deve-
se levar em consideração que a interação do aluno com o meio proposto deve ser
um elemento facilitador na construção do conhecimento de trigonometria, sem
depender apenas da influência direta do professor. Normalmente, o professor seria
visto como um transmissor de informações na relação didática, mas, nessa nova
postura, ele teria o papel fundamental de iniciar um conhecimento científico no
aluno.
Segundo Brousseau (1996), o professor deve “propor ao aluno uma situação
de aprendizagem para que (esse) elabore seus conhecimentos como resposta
pessoal a uma pergunta e os faça funcionar ou os modifique como resposta às
exigências do meio e não a um desejo do professor” (BROUSSEAU, 1996, p. 49).
A devolução é a etapa inicial pela qual o professor transfere
responsabilidades ao aluno. Para Brousseau (2008), a devolução é o ato pelo qual o
professor faz com que o aluno aceite a responsabilidade de uma situação de
aprendizagem ou de um problema, assumindo ele mesmo as consequências dessa
transferência.
Dessa forma, há uma mudança de procedimento por parte do professor e do
aluno: o professor deixa de ter o controle pedagógico sobre o aluno, que passa a
trabalhar de forma efetiva e autônoma na construção de seu próprio conhecimento,
mobilizando as informações, fazendo inferências e apropriando-se de seu
conhecimento. Nessa nova postura metodológica, o professor não fica alheio à
situação, mas deve incentivar o aluno em direção à sua aprendizagem, por seu
próprio esforço e meios, proporcionando, nessa fase, situações enriquecedoras.
A partir da devolução, têm-se as situações de ação, formulação, validação e
institucionalização. Essa sucessão de situações unidas pode acelerar as
aprendizagens e levar à construção do saber. As intervenções do professor nas
situações de ação, formulação e validação são praticamente nulas, entretanto, a
institucionalização fica sob sua responsabilidade.
54
A situação de ação caracteriza-se pelo predomínio do aspecto experimental
e pela produção de um conhecimento de natureza operacional; os alunos
apresentam uma solução sem a preocupação de justificá-la ou explicitar como
chegaram a tal solução.
Na situação de formulação, o aluno troca informações com o meio,
empregando uma linguagem adequada, ou seja, procura explicar sua resposta na
forma escrita ou oral.
A situação de validação caracteriza-se pela veracidade das afirmações por
meio de provas e demonstrações, por meio de linguagem matemática apropriada.
A situação de institucionalização tem por objetivo estabelecer um caráter de
objetividade e universalidade ao conhecimento, conduzida pelo professor, por meio
da formalização e generalização.
Em seu estudo da teoria das situações didáticas, Brousseau (2008) também
discute que toda relação didática é regida por um determinado tipo de contrato
didático, ou seja, conjunto de regras implícitas e explícitas que permeiam as
relações entre o professor, os alunos e um saber entreposto. Conforme Brousseau
(1986):
Chama-se contrato didático o conjunto de comportamentos do professor que são esperados pelos alunos e o conjunto de comportamentos do aluno que são esperados pelo professor. Esse contrato é o conjunto de regras que determinam, uma pequena parte explicitamente, mas, sobretudo implicitamente, o que cada parceiro da relação didática deverá gerir e aquilo que, de uma maneira ou de outra, ele terá de prestar conta perante o outro. (BROSSEAU, 1986).
Para Brousseau (2008), não há possibilidade de pactuar um contrato
didático entre o professor e o aluno ou tampouco existirem cláusulas de quebra, ou
seja, é uma ilusão tentar estabelecer contratos reais. Segundo o autor, o contrato
didático impõe-se a professores e alunos e não pode ser explicado pelo mau
desempenho dos mesmos. Mas o contrato didático revela-se principalmente quando
se dá a transgressão de suas regras e, na situação didática, influencia as situações
de ação, de formulação, de validação e de institucionalização. Dessa forma, torna-se
essencial analisar a influência do contrato didático dentro de uma relação didática.
55
Silva (1999) afirma que o contrato didático depende da estratégia de ensino
adotada, adaptando-se a diversos contextos, tais como: as escolhas pedagógicas, o
tipo de trabalho solicitado aos alunos, os objetivos do curso, as condições de
avaliação, etc. O autor também observa que o contrato didático em que um
professor dá aula expositiva, com definições e listas de exercícios é muito diferente
daquele em que os alunos realizam atividades propostas e, ao final, o professor
procura institucionalizar coletivamente o conceito trabalhado. Nessa estratégia de
ensino, o aluno trabalha individualmente ou em duplas, seguindo orientações
contidas em sequências didáticas organizadas pelo professor, e a institucionalização
do saber se dá por meio de sessões coletivas.
Cabe, então, analisar alguns modelos de contratos didáticos. Brousseau
(1986) apresenta três exemplos de contratos.
O primeiro tipo de contrato enfatiza o conteúdo por meio da relação
professor e aluno. Tem como características o fato do professor considerar deter o
monopólio do conhecimento; escolher os conteúdos, sem a participação do aluno;
impor um único método de organização e apresentação do conteúdo, por meio de
definições, demonstrações e exercícios. O professor tem a convicção de que o aluno
não tem nenhum conhecimento a respeito do que será ensinado e de que quanto
mais clara for sua exposição, melhor será para a aprendizagem, desprezando
totalmente a metodologia de ensino.
No segundo tipo de contrato didático, enfatiza-se o relacionamento entre o
aluno e o saber, isto é, o aluno deve assumir uma postura ativa no aprendizado,
enquanto o professor apenas o acompanha, deixando de ser o transmissor dos
conhecimentos. A maior parte das atividades é realizada em grupos com poucas
intervenções pelo professor. Nesse tipo de contrato, não existe um controle
pedagógico efetivo sobre o funcionamento dos processos de ensino e
aprendizagem, ocorrendo uma confusão entre saber cotidiano e saber escolar.
No terceiro tipo de contrato didático, continua-se a ênfase do relacionamento
entre o aluno e o saber, mas há um comprometimento maior no nível de intervenção
do professor. Nesse caso, cabe ao professor planejar as situações didáticas,
escolhendo situações desafiadoras, compostas por problemas, jogos, atividades,
56
trabalhos de pesquisa, adequados à realidade e ao nível intelectual dos alunos.
Esse tipo de contrato proporciona a participação ativa do aluno na elaboração dos
conceitos matemáticos por meio de uma valorização da resolução de problemas.
De acordo com Pais (2005), deve-se considerar que certas características
do saber matemático, tais como formalismo, abstração e rigor, condicionam algumas
regras implícitas do contrato didático, expressas pelas diferenças habituais de
concepções dos professores de matemática.
Conforme Silva (1999), resultados de investigações demonstram que, diante
de certos problemas, os alunos internalizam regras que conduzem a uma grande
quantidade de erros dos alunos e a incoerências no tratamento desses erros pelos
professores, ou seja, grande parte das dificuldades dos alunos tem como causa os
efeitos do contrato didático mal colocado.
Nessa perspectiva, é fundamental que sejam conhecidos alguns dos efeitos
do contrato didático provocados nos sujeitos envolvidos no processo de ensino-
aprendizagem, pois, conhecendo melhor tais efeitos didáticos, tem-se condições de
propor um outro tipo de contrato didático o qual será implementado por meio da
sequência didática proposta nesta pesquisa, a fim de tentar superar ou, no pior dos
casos, amenizar seus efeitos didáticos negativos. A seguir, serão sintetizados alguns
dos principais efeitos do contrato didático.
Um desses comportamentos que Brousseau (2008) destaca é denominado
de efeito Topaze. É um tipo de situação que se manifesta quando o professor facilita
uma situação de aprendizagem até chegar ao momento em que fornece a resposta
do problema pelo aluno. Nesse caso, o professor facilita as perguntas para tentar
obter o máximo de aprendizado da maior quantidade de alunos, perdendo por
completo os conhecimentos em questão. É considerada uma postura inadequada do
professor, pois impede a participação ativa do aluno na elaboração de seu próprio
conhecimento.
O efeito Jourdain se dá quando o professor reconhece um saber culto na
manifestação de uma resposta banal do aluno. É uma degeneração de efeito
Topaze, pois, além do professor fornecer a resposta antecipadamente, ainda
reconhece um conhecimento escolar válido uma resposta ingênua do aluno.
57
O efeito da Analogia pode ser causado pelo uso inadequado de uma
analogia. Ela pode ser utilizada como um recurso didático eficiente nos processos de
ensino e aprendizagem, mas a Teoria das Situações Didáticas mostra que seu uso
impróprio pode levar a um efeito Topaze e, consequentemente, a um efeito Jourdain.
O efeito do Deslize Metacognitivo surge quando o aluno não compreende
um determinado problema e o professor já esgotou quase todas as possibilidades
pedagógicas. Diante disso, por meio de seus próprios argumentos, o professor
assume suas próprias concepções como saber científico válido. É um tipo de efeito
que se torna ameaçador, porque decorre da falta de domínio.
O efeito Dienes decorre da forma como o professor concebe a disciplina de
matemática, associando-a à sua epistemologia espontânea, ou seja, suas ações
passam a ser associadas a uma estrutura matemática de base tecnicista. Nessa
visão, o docente não está envolvido no sucesso ou no fracasso da aprendizagem,
que é justificado pela estrutura epistemológica do saber ensinado.
Brousseau (2008) também ressalta o envelhecimento das situações de
ensino, em que o professor encontra dificuldade para reproduzir a mesma aula,
mesmo para novas turmas de alunos. Sintetiza que situações de aprendizagens que
não exigem intervenções do professor envelhecem mais lentamente.
Em relação ao contrato didático, Brousseau (1986) observa que o mais
importante é delinear alguns de seus possíveis pontos de ruptura, pois determinar
todas as regras do contrato didático é uma tarefa impossível pelo fato de que a
natureza do contrato envolve condições explícitas e interpretações subjetivas pelos
envolvidos. Apesar dessa dificuldade, convém avaliar algumas situações que
comprometem os processos de ensino e aprendizagem no que se refere à quebra
do contrato didático.
Pais (2005) descreve alguns casos em que há a ruptura do contrato
didático: um primeiro exemplo pode ser dado quando o aluno mostra desinteresse
pela resolução dos problemas propostos ou falta de envolvimento pelas atividades
propostas. Essa situação exige a verificação das razões do desinteresse. Um
segundo exemplo ocorre quando o professor propõe a resolução de um problema
para o qual a estratégia de resolução é incompatível com o nível intelectual e
58
cognitivo do aluno; nesse caso, uma grande parte dos alunos, sem perceber,
apresenta uma solução para o problema utilizando dados incoerentes, geralmente,
uma regra implícita no contrato didático. Um terceiro exemplo é quando o professor
apresenta postura pedagógica incompatível com a sua função, como aplicar
retaliações ao aluno que se comportou inadequadamente.
As considerações anteriores sobre o contrato didático levam a entender que,
sendo um elemento fundamental na Teoria das Situações Didáticas e conhecendo o
tipo de relação didática entre o professor e seus alunos, com base nesse estudo
teórico, será proposta, nesta investigação, um outro tipo de contrato didático
baseado nas situações didáticas, a fim de superar as dificuldades de
comportamentos enraizados por contratos vigentes.
Dessa forma, serão objetos de intenso trabalho nesta investigação a
identificação e a análise de alguns dos possíveis pontos de ruptura do contrato
didático que porventura surjam, caso sejam identificados após análise dos
instrumentos de pesquisa. O conhecimento do contrato didático não explica todos os
problemas da relação didática, mas pode esclarecer alguns, auxiliando a
compreender as noções trigonométricas no triângulo retângulo.
Desse modo, no planejamento deste trabalho, buscou-se levar em
consideração todos esses aspectos no desenvolvimento das atividades de
trigonometria e na organização dos trabalhos em sala de aula. A busca por
compreender as dificuldades dos alunos em relação às noções de trigonometria no
triângulo retângulo e tentar ajudá-los a superá-las direcionou o olhar para a relação
professor, aluno e saber. Diante de todas as considerações anteriores, pode-se
perceber que a Teoria das Situações Didáticas pode ajudar a problemática
abordada, pois explica as interações da relação didática que ocorrem na sala de
aula, caracterizando alguns dos elementos que podem contribuir para promover ou
prejudicar a relação de ensino-aprendizagem.
A análise das situações didáticas auxiliará a investigar a problemática da
aprendizagem matemática, quanto ao conteúdo de trigonometria no triângulo
retângulo. Sobre as situações didáticas, concorda-se com as palavras de Freitas
(1999), salientando que:
59
[...] Através da análise das situações didáticas, é possível investigar toda a problemática da aprendizagem matemática e desvelar aspectos que ocorrem durante a resolução de problemas e a elaboração de conceitos pelos alunos. (FREITAS, 1999, p. 67)
Nessa teoria, as situações didáticas ainda podem ser trabalhadas por meio
da abordagem socrática que valoriza os conhecimentos prévios dos alunos, os quais
deverão surgir por meio de perguntas apropriadas. Esse método pode ser
aperfeiçoado, permitindo uma evolução de seus conhecimentos.
Como toda relação didática é regida por um contrato didático, essa noção
desempenha um papel central nesta teoria, pois o conhecimento e o domínio desse
elemento auxiliam a análise e a construção de situações para o ensino e a
aprendizagem de Matemática, em particular, para o ensino dos conteúdos de
trigonometria no triângulo retângulo.
A Teoria das Situações Didáticas mostra que o contrato didático pode ser
uma porta de entrada para outros efeitos didáticos e, segundo Pais (2005), “trata-se
de situações que podem acontecer em uma sala de aula e que se caracterizam
como momentos cruciais para a continuidade do processo de aprendizagem”. (PAIS,
2005, p. 89). Logo, o conhecimento de tais efeitos ajudará dentro da dinâmica que
se estabelecerá dentro da sala de aula o desenvolvimento da proposta desta
pesquisa, evitando fundamentalmente os efeitos Topaze e o Deslize Metacognitivo,
pois estes são, quase sempre, decorrentes da falta de competência do professor.
Procurou-se elaborar a sequência didática de trigonometria, pensando na
conexão entre a abordagem pedagógica deste trabalho e a Teoria das Situações
Didáticas, buscando, nos pressupostos dessa teoria, os elementos para análise e
fundamentação da produção dos alunos.
O planejamento de situações didáticas ricas no aspecto adidático pode levar
à construção de uma matemática mais significativa pelos alunos; pode revelar,
também, que o sucesso do aprendizado do aluno foi obtido por seu próprio mérito.
Isso motivou a elaboração de uma sequência didática própria, referente às noções
de trigonometria no triângulo retângulo.
A situação adidática contribui para despertar atitudes no aluno que o levem a
reconhecer a presença dos elementos trigonométricos ao seu redor. Pode ajudá-lo a
60
perceber a importância da aplicação desse conhecimento em seu entorno e ainda
contribuir para a fase de devolução. Nessa situação, os alunos serão incentivados a
comentarem suas percepções, o que auxiliará as conexões entre as situações de
formulação, validação e institucionalização. Dessa forma, espera-se que, nessa
fase, os alunos percebam os elementos que estruturam a trigonometria no triângulo
retângulo, dando-lhes autonomia para aplicá-la em situações-problema.
A fase de ação é composta por uma atividade a qual se acredita que
conduza o aluno ao reconhecimento do triângulo retângulo, que é elemento base da
trigonometria. Reconhece-se que uma identificação correta desse triângulo e de
suas partes, bem como a determinação de suas medidas, são fundamentais para o
uso das razões trigonométricas. Conforme já mencionado, nessa etapa, os alunos
apresentam suas soluções sem justificá-las. A conexão com a fase posterior se dá
com a explicitação da estratégia, passando ao estudo das medidas do triângulo
retângulo.
A fase de formulação é composta por uma situação que leve o aluno a
perceber que a semelhança de triângulos é o conceito fundamental que está “por
trás” das razões trigonométricas no triângulo retângulo. Nesse momento, os alunos
são instigados a comunicar suas estratégias em linguagem simples, sem se prender
à linguagem formal da Matemática. Acredita-se, nesse ponto, que o aluno tenha
construído o conceito de seno, cosseno e tangente de um ângulo agudo e ter
condições de aplicar esse conhecimento na fase seguinte em algumas atividades de
cálculo ou em situações-problema.
A validação é constituída por uma atividade de cálculo que envolve seno,
cosseno e tangente de um ângulo agudo. Essa fase objetiva estabelecer a conexão
entre o conhecimento construído de razões trigonométricas (seno, cosseno e
tangente) e sua aplicabilidade em diversas situações-problema. A afirmação do
aluno agora tem de ser demonstrada por uma linguagem matemática formal.
Por último, a fase de institucionalização requer uma situação que conduza a
fase anterior a um caráter generalista, sendo o professor o instrumento facilitador no
processo de socialização desse conhecimento. Pensou-se em uma atividade
experimental que se acredita resumir todas as fases anteriores e ter a significação
61
que a fase de institucionalização requer. Pode-se considerar essa etapa alcançada
ou não após análise do material produzido pelos alunos.
3.3 Sobre as Teorias dos Campos Conceituais de Vergnaud e das Situações
Didáticas de Brousseau
Conforme já mencionado, esta pesquisa fundamenta-se na Teoria das
Situações Didáticas de Brousseau (1986, 1996, 2008) e na Teoria dos Campos
Conceituais de Vergnaud (1996, 1998, 2012). Por um lado, Brousseau permite
entender as interações entre os envolvidos no processo de aprendizagem, podendo,
a partir disso, contribuir para a criação de propostas metodológicas em sala e aula;
por outro lado, as ideias de Vergnaud dão subsídios à compreensão da construção
do conhecimento matemático, ou seja, buscam-se respostas para a problemática
desta pesquisa à luz dessas teorias, pois, a princípio, julgou-se apresentarem
caráter complementar para os propósitos deste trabalho. Dessa forma, serão
destacados os aspectos principais de cada teoria dentro do contexto desta pesquisa.
A Teoria das Situações Didáticas subsidiará fundamentalmente a elaboração
de situações, por meio da sequência didática trigonométrica proposta nesta
pesquisa. Ela permite estudar a dinâmica entre os envolvidos nos processos de
ensino e aprendizagem, fornecendo elementos que possibilitam romper contratos
anteriormente estabelecidos e evitar efeitos didáticos.
A ideia é que tais atividades contemplem as situações de ação, formulação,
validação e institucionalização, permitindo preparar o aluno essencialmente para as
situações adidáticas. É na fase de institucionalização que, efetivamente, as razões
trigonométricas no triângulo retângulo serão aprendidas pelo aluno, pois o saber
será identificado, sistematizado e reconhecido pelo professor, isto é, ter-se-á o saber
como um conhecimento institucionalizado.
A Teoria dos Campos Conceituais auxiliará a compreensão da formação
conceitual da trigonometria no triângulo retângulo. Será analisada a atividade em
situação, por meio das soluções apresentadas pelos alunos em seus protocolos de
respostas, verificando a etapa de aprendizagem, pois, segundo Vergnaud (1996), é
nos esquemas que se devem encontrar os elementos cognitivos.
62
Diante de todas as considerações, pensou-se que as duas teorias se
complementam neste estudo, justificando, portanto, a opção pelas mesmas.
63
CAPÍTULO 4 - PESQUISA DE CAMPO
Neste capítulo, será apresentada a pesquisa de campo, que foi desenvolvida
inicialmente, com 16 alunos de duas turmas do 2º ano, período noturno, de uma
escola pública estadual da cidade de São Paulo.
4.1 Sobre os Instrumentos
A pesquisa foi separada em três etapas, sendo cada etapa composta por um
instrumento de pesquisa. Por meio de cada instrumento, teve-se a pretensão de
atingir os seguintes objetivos:
• Instrumento I (Apêndice A) – Levantar perfil e conhecimentos
trigonométricos prévios dos alunos.
• Instrumento II (Apêndice B) – Construir conceitos de trigonometria no
triângulo retângulo.
• Instrumento III (Apêndice C) – Verificar como o aluno aplica o que
construiu de conhecimentos na etapa 2.
Um ponto a ser destacado na elaboração dos instrumentos de pesquisa
seria a necessidade de articulação entre tais instrumentos, ou seja, seria levada em
consideração a análise do Instrumento I para elaboração do instrumento II, assim
como seria feita a construção do instrumento III, considerando a análise dos
instrumentos anteriores.
Após a explicação deste trabalho de pesquisa na sala de aula, foram
convidados todos os discentes de duas turmas, com aproximadamente 40 alunos
por sala, a participarem deste estudo. Dezesseis alunos se prontificaram a participar,
compondo o universo de pesquisa do instrumento I.
4.2 Aplicação do Instrumento I
O desenvolvimento do instrumento I ocorreu em um horário diferente das
aulas, durante duas horas-aula, no período noturno.
64
Após a organização do grupo, o instrumento I foi distribuído para que os
alunos começassem a respondê-lo. Os alunos foram instruídos de que as atividades
deveriam ser resolvidas individualmente, sem consulta a outros participantes ou a
outros materiais, visto que se almejava saber essencialmente o que cada aluno
trazia de conhecimento anterior referente às noções de trigonometria no triângulo
retângulo. Eles deveriam utilizar somente os materiais fornecidos pelo professor, no
caso: a régua, o esquadro e o transferidor.
Desde o momento em que o grupo começou a responder o instrumento I,
procurou-se acompanhar atentamente o desenvolvimento das atividades dos alunos.
Esse acompanhamento foi registrado em um diário de bordo, em que o professor
pesquisador tomou nota das dúvidas, questionamentos e/ou comentários que
surgiram durante o processo de resolução.
Apesar de, nesse primeiro momento, focar-se nos conhecimentos prévios
dos alunos, esses registros foram fundamentais, pois, na Teoria das Situações
Didáticas, o controle das condições em que o conhecimento pode ser aprendido
permite melhorar e reproduzir os processos de aquisição de conhecimento
matemático. Trazendo essa ideia para o presente contexto, os resultados da análise
dos registros do diário de bordo e dos protocolos dos conhecimentos prévios dos
alunos norteariam a pesquisa no processo de melhoria na aquisição do
conhecimento das noções de trigonometria no triângulo retângulo, que seria
implementado por meio do instrumento de pesquisa II.
4.3 Análise e Interpretação dos Dados do Instrumento I
De acordo com Lüdke e André (2012), “analisar os dados qualitativos
significa ‘trabalhar’ todo o material obtido durante a pesquisa, ou seja, os relatos de
observação, as transcrições de entrevistas, as análises de documentos e as demais
informações disponíveis”. (LÜDKE; ANDRÉ, 2012, p. 45).
Visando a uma melhor compreensão, a análise dos registros do diário de
bordo foi dividida em duas partes: a análise dos questionamentos, referentes a como
responder o instrumento de pesquisa, e à análise dos questionamentos sobre os
conteúdos.
65
As perguntas sobre como responder o instrumento I (Apêndice A) foram
pontuais como, por exemplo: como fazer para indicar um determinado elemento da
resposta, se era necessário justificar determinada escolha ou sobre a dificuldade
para responder à questão 12, pois seu enunciado encontrava-se no final da página
do instrumento I, e alguns alunos não perceberam que as figuras encontravam-se na
página seguinte.
Vale ressaltar que a solicitação de justificativa, como nas questões 11 e 12,
foi particularmente interessante, pois se pôde notar que a maior parte dos alunos
apontou suas escolhas, no entanto demonstrou muita dificuldade para justificá-las,
ou seja, parece haver indícios de que os conceitos de reconhecimento de triângulo
retângulo e de semelhança de triângulos não foram completamente apreendidos.
A seguir, são apresentados os principais questionamentos dos alunos,
referentes aos conteúdos. Foram utilizadas as letras A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L,
M, P, R, T, em substituição aos seus nomes verdadeiros, de modo a garantir o
anonimato dos estudantes envolvidos.
• O aluno B questionou a falta de indicação da medida de um dos ângulos em
alguns dos triângulos do problema 12, de enunciado:
Figura 3 – Atividade 12 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
66
Observou-se que o aluno não percebeu ou desconhecia ser possível
determinar a medida de um ângulo desconhecido em um triângulo qualquer, dadas
as medidas dos outros dois.
• A aluna R perguntou sobre os lados do triângulo isósceles, sem associar a
pergunta a qualquer problema. Nesse caso, a aluna pode ter esclarecido uma
dúvida que tinha sobre as propriedades dos triângulos.
• O aluno P perguntou se os valores ao lado do desenho do triângulo do
problema 14, presente na figura a seguir, referiam-se às medidas dos lados
do triângulo.
Figura 4 – Atividade 14 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Esse questionamento levou a crer que o aluno não tinha certeza se o valor se referia
à medida parcial ou total do lado do triângulo, mostrando que talvez faltasse
familiaridade com esse tipo de representação do triângulo.
• A aluna I indagou sobre o que são ângulos agudo, reto e obtuso, referindo-se
ao problema a seguir:
Figura 5 – Atividade 15 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
67
Esclareceu-se que ângulos agudos são aqueles cuja medida está
compreendida entre 0º e 90º; ângulos retos são aqueles cuja medida é 90º e ângulos
obtusos são aqueles de medida entre 90º e 180º. Essa informação mostrou-se
irrelevante, pois se verificou que nenhum dos alunos acertou totalmente a questão
15, o que pode corroborar com a ideia a respeito da dificuldade dos alunos em
perceber que não há ângulos internos obtusos nos triângulos retângulos ou em
reconhecer visualmente ângulos de 0º a 90º e de 90° a 180°. Observou-se, também,
que nenhum dos alunos utilizou o transferidor para fazer as medições dos ângulos
internos dos triângulos.
• A aluna F comentou que não lembrava de maneira alguma as fórmulas para o
cálculo do valor do seno, cosseno e tangente, referindo-se ao problema 17,
que consta na figura 6 a seguir.
Figura 6 – Atividade 17 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Esse comentário deixou transparecer que, em algum momento, a aluna
estudou as razões trigonométricas no triângulo retângulo, mas o conteúdo não foi
institucionalizado.
Observou-se que o desenvolvimento da atividade ocorreu em um clima
tranquilo, mas foi possível perceber que a maior parte dos alunos teve grande
dificuldade na resolução do problema 17, de enunciado já descrito, e do 16,
apresentado a seguir.
68
Figura 7 – Atividade 16 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Essas dificuldades tornaram-se evidentes, ao fazerem perguntas do tipo
“como se determina” ou “como se faz”; ou por meio de seus comportamentos,
quando pronunciavam palavras como “eu não sei” ou “eu não lembro”. O tempo foi
outro indicador de tais dificuldades, pois a maioria utilizou apenas uma hora-aula
para responder o questionário; apenas 3 alunos continuaram na aula posterior. Ao
entregar os questionários, a maioria dos alunos afirmava que já tinha respondido o
que sabiam.
Foram analisados, a seguir, os protocolos dos alunos, dividindo as análises
em duas partes: o perfil dos alunos e os conhecimentos prévios de trigonometria.
O levantamento do perfil dos alunos permitiu verificar alguns aspectos:
dentro do universo de pesquisa composto por 16 alunos de 2 salas, 7 alunos
pertencentes à sala H e 9 alunos pertencentes à sala I, ou seja, houve praticamente
equilíbrio na quantidade de alunos por sala. Desse universo, observou-se que 6
eram do sexo masculino e 10 eram do sexo feminino, ou seja, a participação das
meninas foi quase o dobro da participação dos meninos.
Quanto ao ano de nascimento, pôde-se verificar que 5 alunos estavam no
ano adequado de estudo, 7 alunos estavam atrasados um ano, 2 alunos estavam
dois anos atrasados, e 2 alunos estavam três anos defasados.
Sobre os motivos que levaram os alunos à escola, verificou-se que a quase
totalidade dos alunos descreveu o que se julga ser próximo à “busca de
conhecimento” e à “necessidade futura ou profissional”.
69
Em relação ao local de estudo do Ensino Fundamental, constatou-se que 6
alunos cursaram escola municipal, 3 alunos frequentaram escola particular e 2
alunos estudaram em escola estadual, ou seja, a maioria cursou o Ensino
Fundamental em escola pública.
Sobre o gostar da disciplina de Matemática, obteve-se o resultado: 12 alunos
que gostam de Matemática, 3 alunos que não gostam da disciplina e 1 aluno ora
gosta, ora não. Quanto às justificativas dos alunos que disseram gostar de
Matemática, foram sintetizadas em: “serve para descobrir áreas/encarar desafios”,
“utilidade (profissional)”, “facilidade com Matemática”, “presença da Matemática no
dia a dia”. Verificou-se, ainda, que quase metade dos alunos respondeu gostar por
“utilidade (profissional)”, ou seja, para eles, a Matemática tem alguma utilidade ou a
usarão futuramente em suas formações e atuações profissionais. As justificativas
dos alunos por não gostar de Matemática foram principalmente devido à dificuldade
de aprendizado.
Iniciou-se o levantamento de conhecimentos prévios de trigonometria com a
questão 8, perguntando se o aluno já havia ouvido falar de trigonometria.
Constatou-se que 15 alunos disseram “sim” e apenas 1 aluno disse “não”,
indicando que a quase totalidade dos alunos já tinha ouvido falar do assunto.
A questão seguinte perguntava em qual série o aluno estudou trigonometria,
conforme a figura a seguir.
Figura 8 – Atividade 9 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Nessa questão, foram obtidas 7 respostas para o “9º ano do Ensino
Fundamental”, 7 respostas para o “1º ano do Ensino Médio” e 6 respostas para
“nunca estudou”. Percebeu-se haver um equilíbrio entre as três escolhas
A atividade 10 apresentou o seguinte enunciado:
70
Figura 9 – Atividade 10 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Para formulá-la, foi feito um levantamento no Currículo do Estado de São
Paulo (SÃO PAULO, 2012) dos conteúdos que se relacionavam à noção de razões
trigonométricas no triângulo retângulo. Os alunos, então, deveriam confirmar se
haviam estudado, não haviam estudado ou não se lembravam. O gráfico, a seguir,
mostra os resultados obtidos:
Figura 10 – Estudo das noções referentes à trigonometria
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Pelo gráfico, verificou-se que os dados sobre o conceito de semelhança
eram preocupantes, pois mostravam que a maioria absoluta dos alunos não
lembrava que estudou esse conceito, considerando que é um pré-conhecimento
básico para o estudo da semelhança de triângulos. Por outro lado, o número de
estudantes que afirmaram ter estudado o teorema de Pitágoras e razões
trigonométricas foi significativo.
A seguir, fez-se a análise do problema 11, ilustrado a seguir:
0
5
1412
23
0
3
14
8
21
Co
nce
ito
de
sem
elh
an
ça
Se
me
lha
nça
de
triâ
ng
ulo
s
Te
ore
ma
de
Pit
ág
ora
s
Ra
zõe
s
trig
on
om
étr
ica
s
Estudou
Não estudou
Não lembra
71
Figura 11 – Atividade 11 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Esse problema permitiu verificar o conhecimento acerca da identificação dos
triângulos retângulos com suas devidas justificativas. Dados 6 triângulos diferentes
sem os valores dos ângulos internos, os alunos deveriam localizar 2 Triângulos
Retângulos.
Verificou-se que 11 alunos erraram, 1 aluno não respondeu e 4 alunos
acertaram parcialmente o problema, ou seja, localizaram o triângulo retângulo
visualmente mais fácil; mas o segundo triângulo retângulo, cuja base era a
hipotenusa, não foi reconhecido por nenhum estudante. Nesse caso, teve-se por
hipótese que o aluno não está acostumado com esse tipo de disposição do triângulo
retângulo ou não tem o hábito de confirmar a medida de um ângulo reto, indicando
como reto um ângulo próximo de 90º.
Dentre os alunos que acertaram parcialmente, três apresentaram
justificativas corretas, indicando saberem o que é um triângulo retângulo, e apenas
um não justificou. É mostrado, a seguir, um protocolo de um aluno que acertou
parcialmente, evocando corretamente o teorema-em-ação:
72
Figura 12 – Atividade 11 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Dentre os estudantes que responderam incorretamente, 3 apresentaram as
seguintes justificativas:
• “Se você completar o triângulo retângulo com outro igual a ele
mesmo, ele se torna um retângulo”;
• “Acho que são esses três, pois começo a seguir a linha do retângulo”;
• “Pela semelhança ao retângulo, e ser a mais aproximada.”.
Nesses casos, os alunos associaram o triângulo retângulo à figura
geométrica de um retângulo. Isso fez refletir que a palavra “retângulo”, usada para
qualificar um tipo de triângulo, poderia ser vista por alguns alunos como nome, o que
caracterizaria um conceito-em-ação em situações em que o conceito de triângulo
retângulo fosse evocado.
Também se observaram, nas respostas incorretas, as seguintes
justificativas:
73
• “Todos são triângulos, todos, além de triângulos, têm suas três
pontas”;
• “Triângulo retângulo é que todos os lados têm a mesma medida”;
• “Por ter lados iguais, o nº 1, 2 e 3”.
No primeiro caso, é possível que o aluno não tenha percebido que se
tratava de um triângulo específico, e, nos demais, os alunos podem ter tomado o
triângulo retângulo pelo equilátero. As outras respostas foram:
• “Os dois (triângulos escolhidos pela aluna) são parecidos”;
• “Os três últimos são, eles não deixam de ser um triângulo, mas eles
são compridos e, por isso, são triângulos retângulos”;
• “São triângulos retângulos porque não são equiláteros e isósceles”.
Considerando que, para Vergnaud, “os conceitos-em-ação permitem
identificar os objetos, as propriedades e as relações” (VERGNAUD, 2009, p. 22),
observou-se que os alunos mobilizaram os seguintes conceitos-em-ação quanto ao
conhecimento do triângulo retângulo:
• Ângulo de 90º;
• Triângulo;
• Retângulo.
Pôde-se, também, reconhecer alguns teoremas-em-ação que foram
evocados:
• “Triângulo retângulo possui um ângulo de 90º”;
• “Se completar um triângulo retângulo com outro igual, ele se torna um
retângulo”;
• “São triângulos retângulos, pois seguem a linha do retângulo”;
• “São triângulos retângulos, pela semelhança ao retângulo”.
Sendo assim, pôde-se considerar que apenas uma pequena parte do grupo
sabia corretamente o que é um triângulo retângulo, entretanto, a disposição da figura
ou a necessidade de confirmação do ângulo reto poderia ser um elemento a
dificultar o reconhecimento.
74
A seguir, analisou-se a questão 12.
Figura 13 – Atividade 12 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Esse problema solicitava localizar 3 triângulos semelhantes dentre 6
triângulos dados. Nesse caso, observou-se que o número de alunos que deixou a
questão em branco aumentou para 3. Dez alunos indicaram incorretamente: 5
justificaram que eram semelhantes por serem triângulos retângulos, e 5
responderam que eram semelhantes devido a ângulos semelhantes, ou seja, mais
da metade dos alunos não escolheu e também não apresentou justificativas
adequadas. Houve 3 escolhas corretas, no entanto justificaram que os triângulos
eram semelhantes por possuírem ângulos semelhantes, ou seja, os estudantes
podem ter associado ângulo semelhante a ângulo congruente.
A seguir, apresenta-se um protocolo de uma aluna que indicou corretamente
os 3 triângulos semelhantes:
75
Figura 14 – Atividade 12 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Observou-se que os alunos mobilizaram os seguintes conceitos-em-ação
nesse problema de semelhança:
• Ângulos;
• Triângulos;
• Triângulos retângulos;
• Soma das medidas dos ângulos internos de triângulos.
Nos 3 problemas indicados corretamente, pôde-se reconhecer os seguintes
teoremas-em-ação evocados pelos alunos:
• “Os triângulos [...] são semelhantes, pois todos os resultados da soma
de seus ângulos equivalem a 180º, e possuem 50º, 38º, e 92º graus”,
ou seja, a soma das medidas dos ângulos internos é 180º e possuem
ângulos internos correspondentes congruentes;
• “Porque a soma dá 180°”, isto é, porque a soma das medidas dos
ângulos internos é 180º;
• “[...] Por ter ângulos semelhantes”, isto é, por ter as medidas dos
ângulos internos correspondentes congruentes.
Nos 5 problemas com indicações parcialmente corretas, observou-se que,
em um dos casos, o aluno justificou “pois parecem ter a mesma forma, porém
invertidos de maneiras diferentes”, e, nos demais, os alunos apresentaram as
justificativas seguintes:
• “Pelas dimensões, ângulos são semelhantes”;
• “[...] Eles se assemelham em graus”;
• “São semelhantes por causa dos ângulos”;
76
• “Porque cada um tem a mesma medida e somando-as dá 180º”
Nesses casos, pôde-se considerar que os alunos evocaram o teorema-em-
ação “os triângulos são semelhantes, então as medidas dos ângulos internos
correspondentes são iguais”, embora também se tenham observado referências às
dimensões dos triângulos e à soma das medidas dos ângulos internos.
Verificou-se que, em quatro das indicações, um dos três triângulos
escolhidos não indicava a medida dos ângulos internos e, em uma das indicações, o
triângulo escolhido apresentava as medidas de dois ângulos internos de 45º, ou
seja, mesmo evocando corretamente o teorema-em-ação, os alunos indicaram
incorretamente um dos triângulos. Esse erro poderia estar relacionado à
determinação da medida de um dos ângulos internos de qualquer triângulo, dados
os outros dois, sabendo que a soma de suas medidas é 180º. Como exemplo,
apresenta-se um dos protocolos parcialmente correto a seguir:
Figura 15 – Atividade 12 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Nos 3 problemas com indicações incorretas, obtiveram-se as seguintes
justificativas:
77
• “[...] pois contém os mesmos ângulos (90º) e é um ângulo reto”;
• “Todos são triângulos retângulos.”;
• “Porque triângulos retângulos são sempre iguais”
Pode-se dizer que, nesses casos, os alunos evocaram o teorema-em-ação
“os triângulos são semelhantes, porque são triângulos retângulos (ou possuem um
ângulo reto)”. A seguir, ilustrou-se um protocolo incorreto:
Figura 16 – Atividade 12 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Descartaram-se 5 problemas, pois, em 2 deles, os alunos não indicaram os
3 triângulos semelhantes e, nos outros, escreveram que não sabiam resolver ou não
lembravam.
Apesar do fato do problema dar destaque aos ângulos e não aos lados,
verificou-se que nenhum aluno mencionou a propriedade da proporcionalidade. Tal
fato poderia estar relacionado ao seu desconhecimento ou esquecimento; o gráfico
da Figura 10 já havia mostrado que o número de alunos que afirmou estudar o
conceito de semelhança foi nulo.
78
No problema 13, os alunos deveriam determinar a medida da hipotenusa de
um triângulo retângulo, aplicando o teorema de Pitágoras, dadas as medidas dos
catetos na malha quadriculada.
Figura 17 – Atividade 13 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Nesse problema, 4 alunos não responderam, 11 alunos responderam
incorretamente e apenas 1 aluno pôde-se considerar que acertou a questão, pois
evocou o teorema corretamente, errando apenas no final para determinar o valor da
raiz quadrada. A seguir, apresenta-se o protocolo do aluno cuja resposta foi
considerada correta:
Figura 18 – Atividade 13 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Dentre os alunos que apresentaram respostas incorretas, duas alunas
tentaram resolver: a primeira aluna não conseguiu explicitar corretamente o teorema
de Pitágoras; e a segunda resolveu o problema fazendo uso da razão entre os lados
79
do triângulo retângulo, ou seja, não conseguiu fazer a conexão entre a solução do
problema e o teorema de Pitágoras. O restante dos alunos apresentou as soluções
incorretas, sem explicitar os cálculos, o que impossibilitou qualquer análise dos
esquemas desenvolvidos por eles.
Esses índices alarmantes parecem remeter fundamentalmente à Educação
Matemática, pois os dados do gráfico da Figura 10 indicam que 14 alunos estudaram
esse conceito, entretanto, o que se pôde ver é que somente um aluno conseguiu
realizar a tarefa pedida — os demais nem mesmo chegaram a enunciar o teorema
de Pitágoras, ou seja, o conteúdo pode ter sido estudado, mas não foi assimilado.
Apresenta-se, a seguir, o protocolo de resolução da aluna que resolveu o
exercício por meio de razão.
Figura 19 – Atividade 13 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Observou-se a mobilização dos seguintes conceitos-em-ação nesse tipo de
problema:
• Teorema de Pitágoras;
• Medidas em malhas quadriculadas.
O problema 14 permitiu determinar a medida de um dos lados de um
triângulo menor sobreposto a outro maior, utilizando os conhecimentos de razão e
proporção. A questão é mostrada a seguir:
80
Figura 20 – Atividade 14 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Entende-se que, para o grupo ter êxito nesse tipo de problema, era essencial
dominar os conhecimentos do teorema de Tales ou de semelhança de triângulos.
Verificou-se que 10 alunos deixaram a questão sem resposta, 4 alunos responderam
incorretamente (3 deles apresentaram somente o resultado final, sem cálculos e 1
utilizou o que parecia ser o teorema de Pitágoras) e 2 alunos apresentaram a
resposta final correta, mas um deles chegou ao resultado por procedimento incorreto
(adicionou 1,6 a 1,6). Observou-se, portanto, que esse é outro problema que
apresentou índice de acerto baixo, já que apenas uma aluna montou as razões
corretamente e chegou ao resultado final. O protocolo da aluna é mostrado a seguir:
Figura 21 – Atividade 14 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Foi observada a necessidade da mobilização dos seguintes conceitos-em-
ação pelos alunos para resolução de problema de semelhança de triângulos:
• Razão;
• Proporcionalidade.
81
Esse problema é uma aplicação direta dos conceitos de semelhança de
figuras planas; o aluno tende a se sair melhor nesse tipo de situação quando os
conceitos de semelhança já foram bem formalizados, mas, como se pôde notar, não
foi o caso dos participantes deste estudo.
O problema 15 permitiu verificar se os alunos sabiam classificar os ângulos
em agudos, obtusos ou retos em dois triângulos retângulos em posições diferentes.
Figura 22 – Atividade 15 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Verificou-se que 3 alunos não responderam a esse problema e 13 alunos
responderam incorretamente. Dentre os treze, 7 estudantes localizaram o ângulo
reto, mas não os 2 ângulos agudos.
Nesse problema, foi observada a mobilização do conceitos-em-ação
seguinte:
• Ângulos (classificação).
Como já mencionado, mesmo diante da informação do significado de
ângulos agudo, reto e obtuso dada pelo professor, os alunos indicaram ao menos
um ângulo como obtuso.
Diante das informações registradas no diário de bordo em conjunto com
esses dados, pôde-se afirmar que os participantes não conseguiram reconhecer
visualmente medidas de ângulos maiores ou menores que 90º e não se sentiram
estimulados em medi-los com os instrumentos fornecidos.
82
O problema 16 solicitava a identificação dos lados (hipotenusa, cateto
oposto e cateto adjacente) de um triângulo retângulo em relação aos dois ângulos
agudos.
Figura 23 – Atividade 16 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Foram obtidas 3 respostas corretas, 3 respostas em branco e 11 respostas
incorretas, sendo 5 delas parcialmente corretas.
Constatou-se que, nas respostas parcialmente corretas, a posição do ângulo
agudo influenciou, de alguma forma, as respostas dos alunos, pois todos já tinham
apontado corretamente os lados do triângulo em relação ao primeiro ângulo.
Observou-se que, nessa questão, os alunos mobilizaram os seguintes
conceitos-em-ação:
• Ângulos;
• Triângulo retângulo (nomes dos lados).
O problema 17 pedia para que fossem calculadas as razões trigonométricas
seno, cosseno e tangente em relação a um dos ângulos agudos em 2 triângulos
retângulos em posições diferentes.
83
Figura 24 – Atividade 17 – instrumento I
Fonte: Dados da pesquisa
Nesse caso, foi obtida apenas uma resposta considerada correta, 2
respostas parcialmente corretas, 5 respostas incorretas e 8 atividades ficaram sem
respostas. Segue o protocolo da resposta considerada correta:
Figura 25 – Atividade 17 – instrumento I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Observou-se que os 2 casos parcialmente corretos ocasionaram-se do fato
de que os alunos não haviam respondido a todos os itens, no entanto, os itens já
respondidos estavam corretos. Dentre os 5 casos de respostas incorretas, em 4
deles, os alunos apresentaram as medidas dos lados dos triângulos retângulos
como se fossem os valores do seno, cosseno e tangente, ou seja, mobilizaram os
conceitos-em-ação de seno, cosseno e tangente como sendo as medidas dos lados
do triângulo retângulo.
84
Para resolver esse problema, os alunos necessitavam dos conceitos-em-
ação mobilizados no problema anterior. A falta de tais conceitos pode ter dificultado
a resolução desse problema, piorando ainda mais o índice de acerto.
O estudo das situações didáticas mostrou que alguns efeitos do contrato
didático podem prejudicar o aprendizado dos alunos. Dessa forma, nesta pesquisa,
houve a intenção de localizá-los e evitá-los durante todo o processo de
desenvolvimento dos instrumentos de pesquisa de trigonometria no triângulo
retângulo utilizados neste estudo.
Nesse problema, em particular, percebe-se haver indícios de manifestação
de alguns comportamentos enraizados por contratos vigentes. Alguns dos alunos
insistiam em perguntar ao professor como “resolver a questão”, ou diziam “não se
lembrar”, como se esperassem, em algum momento, a resposta ou a facilitação do
professor. Nesse caso, percebe-se o indício do que Brousseau (BROUSSEAU,
2008) denominou de efeito Topaze.
Nesse contexto, o aluno, diante de uma situação que não consegue resolver,
geralmente, apela para o professor, esperando que este lhe forneça alguma dica ou
facilite a resposta. O efeito Topaze concretiza-se quando o professor minimiza os
conhecimentos do aluno, facilitando a situação de aprendizagem até fornece-lhe a
resposta por completo.
Outro comportamento que se observou em alguns problemas, quando foram
analisados os protocolos, foi o fato de que uma parte dos alunos apresentou a
solução do problema, mesmo sem apresentar algum cálculo ou sem saber resolvê-lo
corretamente. Nesse caso, a teoria explica que os estudantes sentem-se compelidos
a apresentar uma resposta esperada pelo professor, efeito do contrato didático.
No final da primeira hora-aula, percebeu-se o que é possível chamar de
início de ruptura do contrato didático, pois a maior parte dos participantes começou a
desistir e a entregar seus questionários. As razões que os levaram a essa situação
foram perceptíveis na sala de aula e confirmadas na análise dos protocolos de
resolução: tratava-se da dificuldade enfrentada para a resolução dos problemas.
Essa situação foi ruim para os alunos, entretanto, para Brousseau (2008), a ruptura
85
de contrato didático é considerada boa, pois é o momento de renegociar e
estabelecer um novo contrato didático.
Sintetizando as considerações desta investigação, tem-se o seguinte: o
grupo de pesquisa do qual foram levantados os conhecimentos prévios sobre
trigonometria tem como característica de 75% possuírem entre 16 e 17 anos de
idade, sendo 62,5% composto por alunas. Nesse universo de 16 estudantes, 81,25%
estudaram a maior parte do Ensino Fundamental em escola pública (estadual ou
municipal), 75% gostam de Matemática e vão à escola, principalmente, em busca de
conhecimento e por necessidade.
O gráfico a seguir mostra os percentuais de acertos dos conhecimentos
prévios dos alunos. A partir disso, fez-se uma síntese desses conhecimentos e
foram traçadas as diretrizes para construção do instrumento II.
Figura 26 – Percentual de acertos por questão
Fonte: Dados da pesquisa
Os dados do gráfico sobre acertos por problema oferecem uma visão
bastante preocupante acerca dos conhecimentos prévios que os alunos deveriam
saber, visto que o gráfico mostra o repertório de conhecimentos anteriores que os
participantes detinham. Assuntos como o reconhecimento de triângulo retângulo, o
reconhecimento dos lados do triângulo retângulo e classificação de ângulos tiveram
percentuais de acertos nulos. Entretanto não se pode deixar de considerar que os
dados não mostram se os estudantes acertaram totalmente o problema ou não, ou
0,0%
25,0%
6,3%
12,5%
0,0%
18,8%
6,3%
86
seja, aqueles que acertaram uma parte da questão não estão incluídos nesse
universo. Pensando dessa forma, observa-se que os alunos não estão “vazios” de
tudo, mas trazem consigo algum conhecimento sobre esses assuntos.
Verificou-se, também, que conteúdos como, reconhecimento de semelhança
de triângulos tiveram índice de acerto de 25%, mas as justificativas não foram
satisfatórias; e temas como o teorema de Pitágoras, que aproximadamente 90% dos
alunos afirmaram terem estudado, tiveram índice de acerto de apenas 6,3%,
demonstrando que o mesmo não havia sido assimilado pela maior parte dos alunos.
Diante do exposto, os dados mostraram que os conteúdos mínimos
referentes às noções do triângulo, dos quais os alunos já deveriam ter-se apropriado
em anos anteriores, foram insuficientemente assimilados.
Com base nos estudos teóricos desta pesquisa, reconhece-se que esses
conhecimentos precedentes são considerados na teoria de Brousseau (1986), pois a
aprendizagem por adaptação é uma das noções utilizadas para estruturar a Teoria
das Situações Didáticas. Segundo Pais (2005), “[...] em tal aprendizagem, o aluno é
desafiado a adaptar seus conhecimentos anteriores às condições de solução de um
novo problema” (PAIS, 2005, p. 69), ou seja, admite-se a possibilidade de expansão
do domínio cognitivo.
Algumas noções que estruturam a teoria de Brousseau (1986, 1996, 2008)
e permeiam a relação didática, como o contrato didático, emergiram durante esta
investigação. Segundo Brousseau (2008), “[...] o contrato didático se impõe a todos
e não pode ser explicado pelo mau desempenho de professores ou alunos”.
(BROUSSEAU, 2008, p. 79).
Nesta investigação de campo, foram identificados alguns dos efeitos
negativos provocados por contratos didáticos em vigor, como a apresentação de
soluções com dados inadequados e o início de um efeito Topaze.
O efeito Topaze é um dos mais interessantes, pois quase sempre está
associado à competência do professor e, de acordo com Pais (2005), “[...] a
ocorrência de um efeito Topaze sinaliza para a direção oposta à postura didática
87
defendida pelo pressuposto de que é necessário o aluno participar ativamente na
elaboração de seu próprio conhecimento”. (PAIS, 2005, p. 91).
Neste trabalho, o início do efeito Topaze foi controlado pelo professor,
evitando tomar para si a responsabilidade de fazer a tarefa e realizando as devidas
orientações aos alunos.
Nesse sentido, teve-se por objetivo superar esses e outros comportamentos
que porventura surgiram nesta pesquisa, propondo um novo tipo de contrato a ser
implementado na próxima fase de pesquisa.
Os conhecimentos prévios também são fundamentais na Teoria dos Campos
Conceituais de Vergnaud (1996), pois, segundo Pais (2005), “a formação de um
conceito é realizada a partir de componentes anteriores, por meio de uma síntese
coordenada pelo sujeito. Esses componentes podem ser noções fundamentais ou
ainda outros conceitos elaborados anteriormente [...]”, (PAIS, 2005, p. 61), ou seja,
para a construção do conceito de razões trigonométricas no triângulo retângulo,
podem-se destacar os conteúdos precedentes de ângulos, razões, proporções,
semelhança e o teorema de Pitágoras que, normalmente, deveriam ter sido
aprendidos até o 9º ano do Ensino Fundamental.
Neste instrumento, a Teoria dos Campos Conceituais pôde ajudar na análise
das dificuldades, evidenciando alguns dos invariantes operatórios mobilizados pelos
alunos. Quando foi possível, foram evidenciados os teoremas-em-ação verdadeiros
em que se deseja a construção pelos estudantes e, também, os teoremas-em-ação
falsos, passíveis de serem construídos. A seguir, apresenta-se uma síntese dessa
análise:
• Relativamente à identificação dos Triângulos Retângulos, constatou-
se que três alunos mobilizaram o teorema-em-ação verdadeiro:
“triângulo retângulo possui um ângulo de 90º”; percebeu-se que
alguns dos teoremas surgidos tinham alguma relação com a palavra
retângulo.
• Quanto à localização dos triângulos semelhantes, verificou-se que,
dos três estudantes que escolheram corretamente, apenas dois
fizeram referência “a ângulos internos correspondentes congruentes”.
88
Em 5 casos de indicações parcialmente corretas, o teorema-em-ação
evocado relacionava-se ao que se denomina como “ângulos
semelhantes”; em 3 casos de indicações incorretas, justificaram “por
serem triângulos retângulos”; 5 casos ficaram sem análise por falta de
indicação ou resposta.
• Sobre o problema que pedia a medida da hipotenusa na malha
quadriculada, concluiu-se que apenas um estudante mobilizou o
teorema de Pitágoras corretamente e fez inferências. Dois alunos não
conseguiram explicitar corretamente o teorema, nove alunos
apresentaram soluções erradas sem realização de cálculos e quatro
alunos não responderam.
• Em relação ao problema que solicitava a medida de um dos lados de
um triângulo menor sobreposto a outro maior, apenas um estudante
chegou à solução corretamente, mobilizando o teorema de Tales.
• Na situação que permitiu verificar a classificação dos ângulos em
agudos, obtusos ou retos, observou-se que nenhum aluno acertou
completamente o problema. No entanto, sete alunos localizaram o
ângulo reto.
• Sobre a identificação dos lados de um triângulo retângulo, tendo
como referência seus ângulos agudos, obtiveram-se três respostas
satisfatórias, entretanto, notou-se que, nos casos parcialmente
corretos, a posição do ângulo influenciou as respostas dos alunos.
• Houve somente uma resposta considerada correta no problema que
pedia as razões seno, cosseno e tangente. Em quatro casos, os
alunos mobilizaram os conceitos-em-ação de seno, cosseno e
tangente como sendo os lados do triângulo retângulo.
Diante das considerações anteriores, teve-se convicção de que tais
conteúdos precisariam ser priorizados na elaboração do instrumento de pesquisa II,
para que esses alunos pudessem evoluir em seus conhecimentos.
89
4.4 Análise a Priori e Aplicação do Instrumento II
No instrumento II, houve a participação de 12 alunos (A, B, E, F, G, I, J, K,
M, P, R, T), pois 4 alunos (C, D, H, L) desistiram em razão de indisponibilidade de
tempo ou de motivos particulares.
A aplicação desse instrumento ocorreu conforme ilustrado no quadro 2, a
seguir:
Quadro 3 – Aplicação do instrumento II
Dia Situação de Sequência de atividades Horas-aula
10/10/2013 Ação Atividade 1 3
11/10/2013 Formulação Atividade 2 3
16-19/10/2013 Validação Atividade 3 4
20/10/2013 Institucionalização Atividade 4 2
Fonte: Dados da pesquisa
Assim, foram programadas 12 horas-aula para desenvolvimento de todo
instrumento de pesquisa II.
A sequência de atividades desse instrumento, elaborada com base na Teoria
das Situações Didáticas de Brousseau (1986, 1996, 2008), teve por objetivo
construir conceitos trigonométricos no triângulo retângulo. As atividades que
compuseram esse instrumento foram constituídas em quatro partes (atividades 1, 2,
3 e 4), pensando numa articulação com as situações de ação, formulação, validação
e institucionalização que, segundo Brousseu (2008), “[...] podem conjugar-se para
acelerar as aprendizagens (sejam elas espontâneas ou provocadas)”.
(BROUSSEAU, 2008, p. 32).
Na primeira parte, foi ilustrada a figura de uma rampa com o desenho de um
triângulo retângulo sobreposto, mostrando que, a partir de um percurso, podem-se
associar uma altura e um afastamento. Em seguida, foi definido índice de subida e
pediu-se para os alunos desenharem a representação de uma rampa e calcularem
suas razões, utilizando a nomenclatura proposta. Em um segundo momento,
90
perguntou-se o tipo de triângulo desenhado em relação ao ângulo e solicitou-se,
também, a verificação da validade da relação de Pitágoras em relação aos lados
medidos. A seguir, é mostrada a atividade proposta:
Figura 27 – Atividade 1 – instrumento II
Fonte: Dados da pesquisa
Nessa fase da sequência, pensou-se na ideia de trazer o elemento básico da
trigonometria para o contexto do aluno, ou seja, possibilitar o reconhecimento da
figura do triângulo retângulo, associando-o a elementos próximos de seu cotidiano,
nesse caso, as rampas de acesso. Nessa situação de ação, o aluno trabalharia o
aspecto experimental, desenhando a representação de uma rampa e medindo seus
lados com instrumentos adequados e, também, produziria conhecimento de
natureza operacional, realizando alguns cálculos de razões de lados do triângulo
retângulo e de verificação do teorema de Pitágoras, sem necessitar explicá-los.
91
Esperava-se que o aluno, nessa fase, conseguisse associar a representação
do triângulo retângulo a elementos que estão ao seu redor e também que retomasse
conteúdos já estudados em anos anteriores, como razões e o teorema de Pitágoras,
conseguindo realizar cálculos de natureza operacional, ou seja, esperava-se que o
aluno mobilizasse conceitos-em-ação fundamentais, como o de triângulo retângulo,
de razões e do teorema de Pitágoras, para a construção dos conceitos de razões
trigonométricas no triângulo retângulo.
Na segunda parte, dado um triângulo retângulo maior ABC, dividido em
outros dois triângulos retângulo menores, de vértice B comum a todos os triângulos
retângulos, solicitou-se aos alunos medirem os lados e calcularem todas as razões
entre os lados. Em seguida, pediu-se para que os alunos calculassem todas as
razões dos possíveis triângulos retângulos que conseguissem perceber. A atividade
proposta foi a seguinte:
93
Figura 28 – Atividade 2 – instrumento II – parte 2
Fonte: Dados da pesquisa
O objetivo dessa atividade era fazer o aluno perceber que, nos triângulos
retângulos semelhantes, a razão entre dois lados correspondentes quaisquer de um
dos triângulos é igual e as medidas de seus ângulos internos correspondentes são
congruentes. Nessa fase de formulação, o aluno interagiria com o meio, trocando
informações quanto a razões e a ângulos internos dos triângulos retângulos
observados, sendo estimulado a explicar, de forma escrita, sua conclusão a respeito
da semelhança dos triângulos estudados. Como o conceito de proporcionalidade é
essencial para a constituição dos conceitos de razões trigonométricas no triângulo
retângulo, foi reforçada, ao final, a formação desse conceito, solicitando aos
estudantes a construção de um par de triângulos retângulos semelhantes com as
devidas justificativas. Dessa forma, procurou-se sanar quaisquer dúvidas ainda
existentes sobre a semelhança dos triângulos retângulos estudados.
94
Esperava-se, nessa fase, ampliar a visão do aluno para a representação
geométrica de um triângulo retângulo, a fim de que percebesse que, nos triângulos
semelhantes, as razões entre dois lados correspondentes quaisquer seria a mesma,
registrando todos os argumentos na forma escrita e, por fim, desenvolvendo
autonomia para percepção de semelhança em triângulos retângulos quaisquer.
Dessa forma, acreditava-se, sobretudo, que o aluno conseguiria por si mesmo
construir o teorema-em-ação “se dois triângulos são semelhantes, então, as
medidas dos ângulos correspondentes são congruentes e as razões entre os lados
correspondentes são iguais”.
Na terceira parte, foi pedida, inicialmente, a construção de um triângulo
retângulo ABC com os ângulos agudos A , B (com a horizontal) e reto em C ,
indicando o cateto oposto, adjacente e a hipotenusa a partir do ângulo B . Após, foi
proposta uma mudança de nomenclatura, ou seja, solicitou-se que os alunos
trabalhassem com a nomenclatura matemática da trigonometria. A partir disso,
estabeleceram-se os conceitos de seno, cosseno e tangente dos ângulos agudos A
e B . A seguir, apresenta-se a atividade proposta:
96
Essa parte da sequência didática teve por objetivo elaborar o conceito das
razões trigonométricas (seno, cosseno e tangente). Tinha-se a convicção de que a
incorporação da nomenclatura trigonométrica é importante para sistematização das
fórmulas das razões trigonométricas no triângulo retângulo. Além disso, na fase de
validação, o aluno poderia utilizar a linguagem matemática para as devidas
comprovações, isto é, por meio do seno, cosseno e tangente de um ângulo agudo, o
aluno oportunamente faria as demonstrações e as provas que permitiriam ampliar
seus conhecimentos sobre trigonometria no triângulo retângulo.
A validação desses conhecimentos foi proposta ao aluno por meio de três
situações: Na primeira, percebendo que a soma das medidas dos ângulos A e B era
90º, o aluno deveria provar que a relação é válida para qualquer triângulo retângulo,
usando a soma das medidas dos ângulos internos; a segunda pedia para o aluno
justificar o que aconteceria com o ângulo agudo B , seno, cosseno e tangente de B
quando aumentasse o lado AC; e a terceira situação pedia para escrever as
relações de tg B e tg A , a partir das razões sen B /cos B e sen A /cos A .
Nessa fase da sequência, espera-se que o aluno fizesse uma prova simples
da soma (igual a 90º) dos ângulos agudos de um triângulo retângulo, ou seja,
espera-se que o mesmo fizesse a demonstração, manipulando algebricamente os
termos da equação da soma das medidas dos ângulos de um triângulo qualquer, e
percebesse o teorema-em-ação envolvido na situação: “se dois ângulos agudos são
complementares, então, o seno de um ângulo agudo é igual ao cosseno de seu
complemento”, generalizando, dessa forma, a noção de complementaridade para
qualquer triângulo retângulo.
Quanto ao estado do seno, cosseno e tangente de B e ao próprio ângulo
agudo, aumentando o lado AC, deseja-se que o aluno, no desenvolvimento de seu
raciocínio, mobilizasse os invariantes operatórios, demonstrando as mudanças
aritmeticamente a partir das razões ou, o mais esperado, utilizando algum esquema
geométrico. E, por último, almeja-se que o aluno demonstrasse que as razões sen B
/cos B e sen A /cos A são iguais a tg B e tg A por meio de manipulação algébrica.
Pensava-se, entretanto tratar-se de uma questão que talvez poucos alunos
conseguissem realizar, não por ser uma questão considerada difícil, mas por
97
envolver uma divisão de frações algébricas, operação que os alunos geralmente
evitam.
Na quarta parte da sequência, pediu-se a construção de vários triângulos
retângulos, dado um como modelo, com o ângulo B aumentando de 10º em 10º.
Feitas as medidas dos lados dos triângulos, solicitou-se ao aluno preencher uma
tabela determinando os valores do sen B , cos B e tg B . A seguir, apresenta-se a
atividade desenvolvida:
Figura 30 – Atividade 4 – instrumento II – parte 1
Fonte: Dados da pesquisa
99
Essa atividade teve por objetivo determinar os valores das razões
trigonométricas (seno, cosseno e tangente), variando de 10º em 10º, e analisar o
comportamento dessas razões para B , variando de 0º a 90º. Essa fase de
institucionalização seria ministrada fundamentalmente pelo professor para formalizar
coletivamente as noções de um triângulo retângulo, de sen, cos e tg de um ângulo
agudo, generalizando essas razões para futuras aplicações desses conhecimentos
matemáticos.
A atividade ainda ofereceu oportunidades para o aluno construir triângulos
retângulos, inscritos em ¼ de circunferência de raio 1 dm (10 cm), medindo seus
lados, comparando as medidas, e analisar, também, os valores do sen B , cos B e tg
B da tabela a ser preenchida, possibilitando-o refletir sobre o comportamento das
razões trigonométricas quando B aumenta de 0º a 90º. Esse modelo de construção
de triângulos retângulos ainda permitiria ao aluno fazer analogias com os modelos já
estudados e também possibilitaria os primeiros contatos do aluno com os
comportamentos dos triângulos retângulos no ciclo trigonométrico.
Conduzida pelo professor, essa atividade possibilitaria ao aluno perceber
que o cálculo das razões (seno e cosseno) tornar-se-ia mais simples se a medida da
hipotenusa fosse igual a um e ainda era possível relacionar o seno e o cosseno de
um ângulo agudo do triângulo retângulo por meio do teorema de Pitágoras, noção da
qual o aluno, naquele momento, já dispunha.
Ao final dessa atividade, esperava-se que o aluno percebesse que,
aumentando B , o valor do sen B tenderia a aumentar e cos B tenderia a diminuir.
Quando B atingisse 90º, o valor do sen B seria máximo e valeria um, enquanto cos
B teria valor mínimo igual a zero. Mas, nessa situação, a figura do triângulo
retângulo deixaria de existir. O professor também poderia explorar a mesma ideia
para o caso de B igual a 0º. Era esperado, ainda, que o aluno compreendesse que,
na Matemática, as representações e fórmulas não surgem ao acaso, o uso da
hipotenusa unitária facilitaria o estudo das razões seno e cosseno e a relação do
seno e cosseno poderia ser explicada a partir do teorema de Pitágoras.
100
4.5 Análise e Interpretação dos Dados do Instrumento II
Para o desenvolvimento deste instrumento de pesquisa, foi permitido o uso
de calculadora com orientação para o uso de duas casas decimais na resolução de
todos problemas.
Na situação de ação (atividade 1) que consistia em trabalhar com o triângulo
retângulo, explorando o aspecto experimental, considerou-se que o problema foi
resolvido satisfatoriamente por 8 alunos (B, E, F, G, M, P, R, T). O aluno G escreveu
como resposta 4,6 (ao invés de 0,46) à razão entre a altura e o percurso, mas pode-
se atribuir esse erro à falta de atenção.
Dentre quatro casos insatisfatórios observados, constatou-se que as alunas I
e L não conseguiram verificar o teorema de Pitágoras. Apresenta-se o protocolo da
aluna I, a seguir:
Figura 31 – Atividade 4 – instrumento II – aluna I
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Analisando seu esquema, notou-se que a aluna não conseguiu verificar a
validade do teorema, embora tenha afirmado que a relação era válida. Verificou-se
que ela calculou as potências, multiplicando-se a base pelo expoente, obtendo
valores finais distintos. Nesse caso, percebeu-se que faltou o conceito-em-ação de
potenciação para o desenvolvimento da relação de Pitágoras.
A seguir, apresenta-se o protocolo da aluna K.
101
Figura 32 – Atividade 4 – instrumento II – aluna K
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Pôde-se verificar que a aluna não usou corretamente a medida da
hipotenusa do triângulo retângulo na relação de Pitágoras, indicando que a aluna
não dispunha completamente do conceito-em-ação de triângulo retângulo.
Os outros casos insatisfatórios apresentaram erros de medidas na
construção do triângulo retângulo, mas as alunas calcularam as razões
corretamente. A seguir, está o protocolo da aluna J.
Figura 33 – Atividade 4 – instrumento II – aluna J
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Nesse caso, percebeu-se que ocorreu um erro de medida, pois a aluna
indicou 9 cm para um dos catetos e também para a hipotenusa. Verificou-se, ainda,
pelo esquema da relação de Pitágoras, que a aluna trocou a medida da hipotenusa
pela medida de um dos catetos, ou seja, o conceito-em-ação de triângulo retângulo
que a aluna deveria dispor para resolução do problema estava incompleto.
102
No último caso insatisfatório, a aluna A incorreu em erros de medida,
indicando 1 cm e 5,2 cm para as medidas dos catetos, quando deveriam ser 2 cm e
4,6 cm, respectivamente, resultando valores incorretos na relação de Pitágoras.
Na situação de formulação (atividade 2), trabalhou-se, essencialmente, o
conceito de semelhança de triângulos retângulos. Também foi pedida a soma das
medidas dos ângulos internos dos triângulos retângulos, a fim de que os alunos
percebessem que tal soma era 180º.
Considerou-se, de modo geral, que 8 alunos (B, E, F, G, M, P, R, T)
conseguiram responder corretamente o problema. Perceberam mais dois triângulos
retângulos, além do ABC, e que o teorema-em-ação “se dois triângulos são
semelhantes, então, as medidas de seus ângulos correspondentes são congruentes
e as razões entre os lados correspondentes são iguais” é válido. Todos os alunos
também responderam que a soma das medidas dos ângulos internos dos triângulos
retângulos é 180º.
A seguir, mostra-se, como exemplo, o protocolo da aluna F:
Figura 34 – Atividade 4 – instrumento II – aluna F
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Duas alunas (E e M) cometeram erros de medição dos lados do triângulo
ABC, comprometendo parcialmente o cálculo das razões. A aluna E mediu 4,4 cm
no lado AC (o correto seria 4,9 cm) e a aluna M mediu 7,8 cm (o correto seria 8,9
cm) no lado AB. A aluna E respondeu que os triângulos observados eram
103
“semelhantes, pois seus agudos (ângulos) são iguais, e suas razões são diferentes”,
mas esse erro pode ser resultante das razões calculadas serem bem próximas, que
ela entendeu como sendo razões diferentes. Ao final, as duas alunas conseguiram
desenhar os dois triângulos semelhantes.
As alunas A, I, J, e K mostraram dificuldades parecidas. Perceberam mais
um triângulo retângulo, além do ABC, e o teorema-em-ação envolvido, mas não
conseguiram construir dois triângulos semelhantes. Como exemplo, ilustra-se o
protocolo da aluna J:
Figura 35 – Atividade 4 – instrumento II – aluna J
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Analisando o esquema, percebeu-se que, embora a aluna tenha indicado
30º e 50º para os ângulos agudos nos dois triângulos retângulos, verificou-se que as
medidas eram 25º e 65º.
Constatou-se que, na construção dos triângulos semelhantes pedidos, as 4
alunas (A, I, J, K) erraram as medidas dos ângulos agudos, evidenciando uma
dificuldade de obter ângulos utilizando o transferidor. A aluna A também deixou em
branco a pergunta que pedia a soma das medidas dos ângulos internos do triângulo
ABC e que solicitava, também, a soma das medidas ângulos internos dos outros
triângulos observados. No entanto, mesmo diante da falta do conceito-em-ação de
medidas por alguns alunos, pôde-se considerar a percepção do teorema-em-ação
de semelhança de triângulos retângulos por todos os estudantes.
A partir de agora se faz a análise da situação de validação (atividade 3) que
teve por objetivo elaborar os conceitos de seno, cosseno e tangente e ainda fazer
104
algumas provas que pudessem ampliar os conhecimentos de trigonometria no
triângulo retângulo, conforme já mencionado.
Verificou-se que somente as alunas E e I responderam corretamente a essa
parte da atividade, conforme é mostrado, como exemplo, no protocolo da aluna E:
Figura 36 – Atividade 4 – instrumento II – aluna E – parte 1
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
105
Figura 36 – Atividade 4 – instrumento II – aluna E – parte 2
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
106
As atividades de razões trigonométricas foram desenvolvidas
satisfatoriamente por todos os alunos, permitindo elaborar os conceitos de seno,
cosseno e tangente, levando-os a perceber a igualdade entre o seno de um dos
ângulos agudos e o cosseno do outro, ou vice-versa.
Com relação às atividades de validação (atividade 3), constatou-se, na
primeira situação, que os alunos B, E, F, G, I, J, K, M, P, R, T perceberam que a
relação entre as medidas dos ângulos internos é de 90º, mas apenas 5 alunos (E, J,
M, P, R) mostraram que essa relação é válida para qualquer triângulo retângulo; 6
alunos (E, F, I, J, K, R) apoiaram-se nos ângulos medidos nos triângulos que foram
construídos no início da etapa de validação como forma de demonstração; os alunos
E e P demonstraram escrevendo na língua natural, ou seja, nenhum aluno utilizou
escritas algébricas como meio de generalização da relação. A seguir, como
exemplos, tem-se os protocolos dos alunos F e P:
Figura 37 – Atividade 4 – instrumento II – aluna F
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Figura 38 – Atividade 4 – instrumento II – aluno P
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Por último, notou-se que a aluna A não conseguiu perceber a
complementaridade entre as medidas dos ângulos agudos, afirmando que “eles são
praticamente próximos e os ângulos dão 180 graus”.
Sobre a relação entre o seno e o cosseno, analisando o item h, verificou-se
que os alunos E, I, P e R responderam corretamente, percebendo o teorema-em-
107
ação envolvido na situação que se pode inferir como “se dois ângulos agudos são
complementares, então, o seno de um ângulo é igual ao cosseno de seu
complemento”. Será mostrado, a seguir, como exemplo, o protocolo do aluno P:
Figura 39 – Atividade 4 – instrumento II – aluno P
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Pôde-se inferir, também, que a maioria dos alunos evocou o teorema-em-
ação “o seno e o cosseno são iguais”, ou seja, para alguns alunos, a atividade não
conseguiu conduzi-los à percepção da complementaridade entre o seno e o
cosseno. Ilustra-se a seguir, como exemplo, o protocolo da aluna A.
Figura 40 – Atividade 4 – instrumento II – aluna A
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Na segunda situação de validação, solicitou-se que o aluno justificasse o
que aconteceria com o ângulo agudo B , seno, cosseno e tangente de B quando
aumentasse o lado AC do triângulo retângulo ABC. Verificou-se que os alunos E e F
responderam corretamente à atividade. A seguir, apresenta-se o protocolo da aluna
F, que foi considerado correto:
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Figura 41 – Atividade 4 – instrumento II – aluna F
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Dentre os acertos parcialmente corretos, os alunos G e I responderam que a
tangente de B)
diminuiu, mas, verificando os cálculos realizados e comparando à
situação anterior, notou-se que, na verdade, a tangente aumentou.
Analisando os esquemas dos alunos E, F, G e I, percebeu-se que os
estudantes iniciaram a resolução fazendo um esboço da situação proposta e, na
sequência, passaram à realização dos cálculos, ou seja, mobilizaram corretamente
os conceitos de seno, cosseno, tangente e os conceitos-em-ação de ângulo,
triângulo retângulo, razão, envolvidos na situação, obtendo inferências. No entanto,
os alunos G e I, por motivo desconhecido, justificaram a tangente incorretamente.
Segundo Vergnaud, “a automatização é evidentemente uma das manifestações mais
visíveis do caráter invariante da organização da ação. [...] De fato, todas as nossas
109
condutas comportam uma parte de automaticidade e uma parte de decisão
consciente”. (VERGNAUD, 1996, p. 158)
Observou-se, também, que dois alunos não indicaram o aumento ou
diminuição do seno, cosseno e tangente: a aluna R respondeu que o ângulo B)
e as
razões aumentaram, e o aluno P explicou que o ângulo B)
aumentou, alterando o
seno, cosseno e tangente. Foram obtidas, também, duas respostas incompletas: a
aluna M escreveu que o ângulo B)
aumentou, e a aluna A respondeu que todos os
ângulos aumentaram. Apesar desses alunos não explicitarem seus esquemas, deve-
se ressaltar que todos perceberam um aumento no ângulo B)
, entretanto, esses
alunos não conseguiram explicitar todos os conhecimentos que contribuíram com a
organização racional de suas atividades.
Por último, deixou-se de analisar as respostas dos alunos B, J, K e T, pois
algumas delas continham partes corretas, mas sem justificativas coerentes.
A última situação de validação consistia em escrever as relações de tg B e
tg A , a partir das razões sen B /cos B e sen A /cos A . Considerou-se que os alunos
A, E, F, I, J, K, M, e P responderam corretamente. Os alunos A e M escreveram que
os valores das razões e a tangente eram aproximados; o aluno K respondeu que,
em relação ao ângulo A , era igual; mas, em relação ao B , era diferente. No entanto,
tais situações foram consideradas corretas e devidamente esclarecidas pelo
professor, pois eles mobilizaram os invariantes operatórios corretamente, porém
deixando de perceber que tais diferenças apresentadas eram constituídas por erros
de medida e de aproximação. Como exemplo, apresenta-se o protocolo da aluna E.
Figura 42 – Atividade 4 – instrumento II – aluna E
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
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Em seu esquema, pôde-se notar a presença de invariantes operatórios
(teoremas-em-ação e conceitos-em-ação) e de inferências. Ao final, o aluno concluiu
que a tangente (de um ângulo agudo) era o valor da divisão do seno pelo cosseno.
Percebeu-se, também, que a aluna R não conseguiu inferir corretamente as
relações entre as razões obtidas e os valores das tangentes, respondendo que “a
razão sen B /cos B era congruente com o valor da tg B e a razão sen A /cos A era
aproximadamente o valor da tg A ”. O fato que levou ao erro encontrava-se no
cálculo do cos A , pois a aluna utilizou equivocadamente o valor da hipotenusa igual
a 5,8, quando o correto seria 6,3.
Por último, foram constatadas três respostas sem as relações pedidas entre
as razões e os valores das tangentes:
• A aluna T não fez o cálculo das razões. Obter inferências a partir das
razões era uma parte essencial para chegar-se às relações
solicitadas.
• O aluno G inferiu corretamente, mas não apresentou a relação.
Percebeu-se que esse aluno obteve inferências, mas não soube por
qual caminho seguir, indicando, dessa forma, a ausência de regras de
ação;
• O aluno B fez somente o cálculo da razão entre o seno e o cosseno
do ângulo A . A seguir, apresenta-se o protocolo desse aluno:
Figura 43 – Atividade 4 – instrumento II – aluno B
Fonte: Dados coletados pelo pesquisador
Esse aluno pode ter inferido que o quociente de 0,8 por 0,6 é igual ao de 0,6
por 0,8, ou ter se esquecido de dividir 0,6 por 0,8. Mesmo com esse caminho
equivocado, foi possível perceber a ausência das regras de ação.