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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” FACULDADE INTEGRADA AVM ADOÇÃO À BRASILEIRA Por: Aline Verissimo de Souza Tavares Orientador Prof. Francis Rajzman Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

ADOÇÃO À BRASILEIRA

Por: Aline Verissimo de Souza Tavares

Orientador

Prof. Francis Rajzman

Rio de Janeiro

2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

FACULDADE INTEGRADA AVM

ADOÇÃO À BRASILEIRA

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Direito

Privado (Civil).

Por: Aline Verissimo de Souza Tavares.

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AGRADECIMENTOS

A Deus pela oportunidade que me deu

de chegar até o final dessa estrada e ao

professor Francis Rajzman pela

atenção dispensada durante a

elaboração do trabalho.

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RESUMO

O presente estudo tem como tema a Adoção à Brasileira que é realizada em

nosso país por adotantes que desejam reconhecer um adotado como filho, mas

fogem da complexidade do processo de adoção legal. Seu principal objetivo é

apresentar uma análise da adoção no contexto histórico, tendo em vista

compreender a prática deste tipo de adoção. Ao longo da abordagem temática

foram desenvolvidas pesquisas bibliográficas, aproximando as colocações dos

autores que escrevem sobre a adoção articulando-as com o contexto histórico que

a adoção se desenvolveu no Brasil. Diante dos estudos realizados a partir dos

referencias teóricas foi possível perceber que os adotantes motivam-se em optar

pela adoção à brasileira devido à comodidade. E este é um dos principais motivos

para que ela aconteça com freqüência no Brasil, porém a falta de jurisprudência a

torna um ato ilícito passível de sanções.

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METODOLOGIA

O método utilizado no presente trabalho foi o de pesquisa bibliográfica e

internet.

SUMÁRIO

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1 - INTRODUÇÃO 07

2 - BREVE HISTÓRICO SOBRE A ADOÇÃO 09

2.1 - Da Antiguidade Clássica à Modernidade 09

2.2 - A História Da Adoção No Brasil 13

2.3 - Principais mudanças do Código Civil de 1916 para o Código Civil de 2002 16

3 - A MUDANÇA DE PARADIGMA A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO DE 1988

18 3.1 - Princípio da Igualdade e Direito à Filiação 18 3.2 - Posições doutrinárias acerca do art. 227 da CRFB/88 19 4 - A ADOÇÃO NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 21 4.1 - O Princípio da Proteção Integral 21 4.2 - Requisitos Gerais para a Adoção 22 4.3 - Aspectos Procedimentais do Estatuto da Criança e do Adolescente 26 4.4 - Efeitos da Adoção pelo Estatuto da Criança e do Adolescente 27 5 - ADOÇÃO À BRASILEIRA 30 5.1 - Conceito 30 5.2 - Características da Prática de Adoção à Brasileira 31 5.3 - A verdade biológica e a Socio Afetiva 34 5.4 - A paternidade e a sua Irrevogabilidade 34 5.5 - O Reconhecimento Voluntário e a Anulação 35 6 - CONCLUSÃO 36 7 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 38

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1 INTRODUÇÃO

Durante muito tempo a adoção à brasileira foi realizada como ato voluntário

de reconhecer a paternidade de crianças que não tem laços consangüíneos.

Esse ato constitui uma ação ilegal, pois não está prevista em Lei sendo até

mesmo considerado um ato criminoso. Porém existem considerações a serem

feitas em torno de toda a estrutura jurídica para que possamos compreender a

natureza do fato.

Diante dos ordenamentos jurídicos que regularizam os processo de

adoção no Brasil, e sabendo que existem maneiras legais e legitimamente

reconhecidas para realizar uma adoção, é importante ciência dos princípios

fundamentais para o bem estar da criança. Desse modo, a realização de uma

adoção deve constituir como um ato pensado e estabelecido dentro dos direitos

jurídicos. A adoção à brasileira, dependendo do ponto de vista dos juristas, pode

ser interpretada e como uma espécie de adoção simulada que foge às regras

legais e os princípios normativos das Leis.

Frente aos inúmeros casos já ocorridos de adoção à brasileira em nosso

país, é interessante que sejam analisadas as relações presentes neste ato

considerado irregular. É neste âmbito que o presente estudo tem como objetivo

geral conhecer a estruturação da adoção à brasileira através de uma construção

histórica, bem como sua origem. Especificamente, busca-se compreender quais

as diferenças que podem ser estabelecidas entre a adoção à brasileira e os

ordenamentos jurídicos; definir seu contexto histórico social, bem como as

relações sócio-afetivas presentes no ato de adoção; traçar um paralelo de

transformações ao longo do tempo sobre as Leis que envolvem as questões

legais sobre a adoção.

A adoção à brasileira é uma irregularidade cometida freqüentemente por

pessoas que assumem a paternidade de crianças de modo contrário ao

processo de adoção legal. Em geral, isto ocorre porque os processo de adoção

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são extensos e exigem intervenção jurídica, e vendo o adotante a facilidade em

simplesmente realizar o registro civil, transgridem normas que regem a adoção

em nosso país.

A metodologia utilizada está fundamentada na pesquisa qualitativa, que

tem como princípio a coleta de dados para análise das relações existentes na

temática abordada. Foram utilizados instrumentos relacionados à pesquisa

bibliográfica que facilitaram a articulação do tema com a realidade que temas

atualmente.

De acordo com estudos baseados em autores como Eunice Granato,

Antonio Chaves, Claudia Fonseca, entre outros, podemos analisar a adoção

sobre diferentes vértices, considerando seus diferentes aspectos. Segundo os

referenciais teóricos o Brasil passou por uma evolução histórica na construção

do conceito de adoção, que, por conseguinte deu origem à adoção à brasileira

muito praticada em nosso país. Alguns destes autores vêem a grave

problemática sobre a adoção à brasileira já que não existe jurisprudência que

regularize, e mesmo assim ainda há um numero significativo de adoções que

ocorrem desta maneira.

Este trabalho está organizado por capítulos, que inicialmente, descrevem

a evolução da adoção no Brasil, trazendo um breve histórico. Os capítulos

seguem com a apresentação das mudanças ocorrida frente às Leis brasileiras,

em especial a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do adolescente e o

Código Civil, e como cada uma deles expõe a questão sob a ótica do Direito.

Após essa apresentação é feita a análise da adoção à brasileira, completando o

contexto do estudo.

Em linhas gerais, a adoção á brasileira consiste no registro civil irregular

de uma criança que tem princípios contrários ao processo de adoção legal, por

não ser um ato reconhecido juridicamente. No entanto as facilidades e

comodidade da adoção à brasileira geram, diferentes de uma adoção legal,

motivam as ações ilegais dos adotantes.

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2 BREVE HISTÓRICO SOBRE A ADOÇÃO 2.1 Da Antiguidade Clássica à Modernidade

A adoção nos tempos antigos possuía um diferente significado do atual,

em que conforme estudos realizados por Fustel de Coulanges, sobre os povos

da Grécia e da Roma antiga, relatou-se que a adoção atendia aos anseios de

ordem religiosa, devido à crença das civilizações primitivas, de que os vivos

eram protegidos pelos mortos.

Havia também a crença de que os descendentes deveriam praticar ritos

fúnebres, para que os mortos pudessem obter tranqüilidade após a morte,

estabelecendo desta forma, um laço que unia todas as gerações de uma mesma

família.

Naqueles tempos, a religião era propagada pela geração, o pai transmitia

a vida ao filho assim como, a sua crença, o seu culto, o direito de manter o lar,

de oferecer um espaço fúnebre após a sua morte.

Sendo assim, o homem sem filhos, buscava a solução na adoção, para

que a família não se extinguisse como nos exorta Fustel de Coulanges:

A mesma religião obrigando o homem ao casamento, determinando o divórcio em casos de esterilidade, substituindo o marido por um parente em casos de impotência ou de morte prematura, oferece ainda à família derradeiro recurso como meio de escapar à desgraça tão temida da sua extinção: esse recurso encontramo-lo no direito de adotar.1

O ato de adotar tinha o escopo de garantir a perpetuidade da religião doméstica,

sendo permitida apenas a quem não tinha filhos, assegurar a salvação do lar pela

continuação das oferendas fúnebres pelo repouso dos antepassados.

Nesse contexto, a finalidade da adoção não era o bem estar do adotando, nem

mesmo a preocupação com laços afetivos entre ele e o adotante, mas sim, visava servir os

interesses do adotante, em não cair na desgraça de morrer sem ter quem praticasse os ritos

fúnebres e garantisse a continuidade da família.

1 COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga.Lisboa: Livraria Clássica Editora. 1950, p. 73.

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O Código de Hamurabi, considerado a primeira codificação jurídica que se tem

notícia, empresta relevante importância à história da humanidade. Hamurabi, Rei da

Babilônia, no código a que se deu seu nome, apresentava duzentos e oitenta e dois

dispositivos, sendo nove deles referentes à adoção. São eles2:

Art. 185. Se alguém dá seu nome a uma criança e a cria como filho, este adotado não poderá mais ser reclamado. Art. 186. Se alguém adota como filho um menino e depois que o adotou ele se volta contra seu pai adotivo e sua mãe, este adotado deverá voltar à casa paterna. Art. 187. O filho (adotado) de um camareiro a serviço da corte ou de uma sacerdotisa-meretriz não pode mais ser reclamado. Art. 188. Se o membro de uma corporação operária (operário) toma para criar um menino e lhe ensina o seu ofício, este não poderá mais ser reclamado. Art. 189. Se não ensinou a ele o seu ofício, o adotado poderá voltar á casa paterna. Art. 190. Se alguém não considera entre seus filhos um menino que tomou e criou como filho, o adotado pode voltar à casa paterna. Art. 191. Se alguém tomou e criou um menino como seu filho, põe em sua casa e depois quer renegar o adotado, o filho adotivo não deve retirar-se de mãos vazias.O pai adotivo deverá dar-lhe de seus bens, 1/3 da quota do filho e então deverá afastar-se. Do campo, do pomar e da casa ele não deverá dar-lhe nada. Art. 192. Se o filho de um camareiro ou de uma sacerdotisa-meretriz disser ao seu pai adotivo ou á sua mãe adotiva: “tu não és meu pai ou minha mãe”, dever-se-á corta-lhe a língua. Art. 193. Se o filho (adotivo) de um camareiro ou de uma sacerdotisa-meretriz aspira voltar à casa paterna e se afasta do pai adotivo e de sua mãe adotiva e volta á casa paterna, se deverão arrancar-lhe os olhos.

Ainda que este código não contenha nada sobre as finalidades da adoção, nele é

ressaltado com nitidez, um problema que ocorre até hoje, que é saber se o pai natural

pode reclamar de volta o seu filho que fora adotado e em quais situações.

Também se percebe, que os cuidados do pai adotivo para com o adotado, tornava

indissolúvel a adoção, criando-o e educando-o como se seu filho fosse. Furlani3 citado

por Chaves, descreve que:

2 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues.Op Cit., p 33. 3 CHAVES, Antônio. Adoção. Belo Horizonte: Editora Del Rey. 1995, p.48.

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“Naqueles tempos recuado o critério fundamental do legislador era considerar, antes de mais nada, se o adotado podia ou não ser reclamado pelos seus pais legítimos, critério que lhe serve para ordenar cada um dos dispositivos. Isto demonstra que o problema jurídico mais importante de flagrante atualidade, era saber se e quando o filho adotado podia voltar à casa paterna, isto é, quando os pais legítimos podiam reclamá-lo do pai adotivo. Compreende-se pelo cuidado do legislador em determinar quando isto pode ocorrer que a maior parte das controvérsias jurídicas decorrentes do instituto da adoção eram devidas as contestações surtas de fato que se encontravam em íntima conexão com esta circunstância. Conclui-se do artigo 185, ser a criação que faz surgir a indissolubilidade da relação de adoção. Enquanto o pai adotivo não criou o adotado, este pode retornar pá casa paterna; mas, uma vez educado, tendo o adotante despendido dinheiro e zelo, o filho adotivo, não pode, sem mais deixa-lo e voltar tranqüilamente à sua casa. Estaria lesado aquele princípio de justiça elementar que estabelece que as prestações recíprocas entre os contratantes devam ser iguais, correspondentes, princípios que constitui um dos fulcros babilonense e assírio.”

No decorrer da história, tanto a Bíblia, quanto às leis de Manu, ou a regulamentação em Atenas, no Egito, desenvolveram este instituto, porém foi em Roma que adoção mais se desenvolveu e onde foi mais utilizada. A adoção estava além da necessidade de se perpetuar o culto doméstico e dar continuidade à família, atingindo também finalidade política, permitindo que plebeus se transformassem em patrícios e vice-versa. Na Idade Média a adoção caiu em declínio durante longo tempo, quer por contrariar os interesses dos senhores feudais, que seguiam de forma completamente estrita os termos de consangüinidade, quer por influência do direito canônico, uma vez que a própria igreja manifestava uma série de cautelas. Os preceitos do cristianismo distanciaram o enorme temor que antes existia no homem de não ter descendentes masculinos que pudessem praticar os ritos fúnebres, sendo condenado ao sofrimento eterno conforme nos diz Roberto Christensen4 apud Chaves:

“O instituto nascido sobre um tipo de família patriarcal, com uma perfeita autonomia social, política, religiosa e econômica, segue a sorte e a evolução registrada pelo núcleo familiar no qual foi engendrado. Daí um longo período de obscuridade, uma vez que não se acomodava aos novos costumes e às instituições que foram surgindo. Foi considerado contrário ao direito dos agnados; além disso, o adotado não herdava o título nobiliárquico como em Roma, uma vez que os títulos se transmitiam jure sanguinis e em virtude de concessão real, sendo necessário o consentimento do príncipe para que o adotante pudesse transmitir o seu título. Se a adoção permanecia inadaptada, sendo escassamente praticada, não desaparecia, pois em alguns casos devia-se recorrer a ela pela

4 CHAVES, Antônio. Adoção. Ed. Del ReY.Belo Horizonte. 1995 p, 51.

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necessidade dos seus benefícios. Mas no século XVI já não se conferia, sequer, ao adotado o direito de suceder ao adotante. Do instituto sobreviveu apenas uma versão pr dizer assim popular da adoptio minus plena. Tratava-se, assinala Giulio Vismara, de um instituto lentamente amadurecido e que se afirmou solidamente num novo espírito como o instrumento mais idôneo para satisfazer em quem não tivesse filhos do próprio sangue, o sentimento cristão da paternidade e da proteção; um valor ético espirava e convalidava também o critério da imitatio naturae que lhe havia de dar os lineamentos.”

Alguns povos guerreiros, por exemplo, os germanos, também praticavam a adoção como meio de perpetuar o chefe de família, para que seus feitos bélicos tivessem continuidade. A adoção conferia ao adotado, as armas, o poder público e o nome do adotante, não podendo aquele herdar os bens do pai adotivo, sucedendo-lhe somente por ato de última vontade ou doação entre vivos. Entre os povos bárbaros, os francos, os longobardos e os visigodos5, foram os que maior interesse despertavam em relação ao instituto da adoção.

Na Idade Moderna por volta do ano de 1683, encontra-se na Dinamarca, referência ao Instituto da adoção, no Código promulgado por Christian V, e na Alemanha, no ano de 1756, o projeto do Código Prussiano, conhecido também como Código de Frederico e no Codex Maximilianus da Bavária. O contrato por escrito era indispensável por essas leis, sendo submetido à apreciação do tribunal. Estabelecia diferença de idade e a imposição de ter ao adotante cinqüenta anos, no mínimo e ainda deveria apresentar vantagem para o adotado, sendo incluído direitos sucessórios e o caráter de irrevogabilidade da adoção. Houve crédito desse conjunto de leis no Código Napoleônico, que estabelecia quatro espécies de adoção.

a)

5 Povos Germânicos, oriundos da Escandinávia que invadiram o território outrora pertencente ao Império Romano, em 500 a.c. – lttp: // pt.wikpedia.org/wiki/longobardos.

Adoção ordinária: permitiam que pudessem adotar pessoas com mais de cinqüenta anos, sem filhos e com a diferença de mais de quinze anos do adotado; previa a alteração do nome e a determinação de ser o filho adotivo herdeiro do adotante. Era contrato sujeito à homologação judicial.

b) Adoção remuneratória: prevista na hipótese dce ter sido o adotante salvo por alguém; poderia então, adotar essa pessoa. c) Adoção testamentária: permitida ao tutor, após cinco anos de tutela. d) Adoção oficiosa: era uma espécie de “adoção provisória” em favos dos menores.

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Portanto podemos dizer que com a ajuda do Código de Napoleão, a adoção começou a direcionar para um novo destino no atendimento dos interesses do adotado, ou seja, das crianças que não tinham família.O Decreto lei de 29 de julho de 1939 introduziu na legislação francesa, a figura da legitimação adotiva, dispondo que o adotante era desligado de sua família natural e integrada na família adotiva, sendo órfão ou abandonado pelos pais, desde que tivesse menos de cinco anos de idade. Segundo o Código de Napoleão podemos dizer que6:

“...a adoção começava a engatinhar para um novo rumo, no atendimento dos interesses do adotado, ou seja, das crianças que não tem uma família. Nas palavras de Bonaparte, a adoção é antes de tudo”, uma instituição de beneficência, e o efeito mais feliz será dar crianças àqueles que não as têm, de dar um pai a crianças órfãs,

6 WEBER, Lídia Natalia Dobrianskyj. Laços de Ternura. São Paulo: Editora Juruá. 2005, p.65.

de ligar, enfim, a infância à velhice e à idade viril”. Para Napoleão a adoção deveria imitar a natureza”.

No direito português, apesar de ter o direito romano presidido às ordenações

Afonsivas, Manuelinas e Filipinas, a adoção não teve desenvolvimento completo, pois

havia oposição a um dos principais efeitos da adoção, que era a aquisição do pátrio poder

pelo adotante, e ainda o direito à sucessão repelido no direito português.Deste modo, a

adoção, no direito português antigo, servia apenas para pedir alimentos e ter outras

distinções: só por graça do príncipe, por lei especial, poderiam ter todas as conseqüências

no direito romano.Não foi acolhida a adoção no Código Civil português de 1867, mas foi

restaurada pelo Código Civil de 1966, nas formas de adoção plena e de adoção restrita.

2.2 A História da Adoção no Brasil.

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Após a independência, as Ordenações do Reino continuaram a vigorar no Brasil, em matéria civil, até a

entrada em vigor do Código Civil, em 1917. Dessa maneira, a adoção com todas as

características que apresentava no direito português, que resistia do direito romano,

ingressou no nosso ordenamento jurídico.A lei de 22 de setembro de 1828 foi a primeira

referente à adoção, que deslocava da mesa do desembargo do paço para os juízes de

primeira instância, a competência para a expedição da carta de perfilhamento.De acordo

com o art. 217 da Consolidação, Teixeira de Freitas nos reflete sobre isto ao dizer que7,

“Aos juízes de primeira instância compete conceder cartas de legitimação aos filhos sacrilégios, adulterinos e incestuosos e confirmar as adoções procedendo às necessárias informações e audiências dos interessados, havendo-os.”

Carlos Carvalho em sua Nova Consolidação das Leis Civis referiu-se à adoção (arts.

1.631 a 1.640), se aprofundar reconhecendo poucos direitos aos filhos adotivos8.Felício

dos Santos não mencionou a adoção em seu projeto, mas Coelho da Rocha a ela dedicou

alguns artigos (arts. 2.167 a 2.183)9.Importante dizer que a sistematização do instituto da

adoção na sua Parte Especial Livro I (Direito de Família), capítulo V, título V, em dez

artigos (arts. 368 a 378), ocorreu no Código Civil Brasileiro, instituído pela lei 3.071 de

01 de janeiro de 1916, que entrou em vigor um ano depois.Estabelecia o art. 368 do

Código Civil:Só os maiores de cinqüenta anos, sem prole legítima ou legitimada, podem

adotar.Clóvis Bevilacqua10 nos diz ao comentar este artigo que: “A adoção não era um

modo normal de constituir a família, mas um meio supletivo de ter filhos.”Tanto a

exigência da não existência de prole quanto à idade de cinqüenta anos imposta ao

adotante pelo legislador, desestimulava a adoção. Ainda se verificava que deveria ter uma

diferença de idade entre o a adotante e adotivo de dezoito anos, segundo a regra do art.

369. Também se verificava, que o pátrio poder se transferia do pai naturalizado para o

adotante, mas os direitos e deveres da família natural e do adotado não se aboliam.Com

isso, o filho adotivo recebia a herança tanto do adotante, desde que este não tivesse filhos

consangüíneos, quanto de seu pai natural. Contudo, o pai adotivo só herdava no caso da

não-hipótese do pai natural.Por força do art. 375, a escritura pública era da substância do

ato. Porém, a adoção era revogável por vontade do adotando, no ano imediato em que

cessasse a menoridade, ou ainda podia ser dissolvida nos mesmos casos em que se

admitia a deserdação.Quarenta anos depois da entrada em vigor do Código Civil, houve a

7 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção Doutrina e Prática. Editora Juruá. 2006. p,43. 8 Idem p.43. 9 Idem p. 43. 10 Idem p.44.

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criação da Lei nº 3.133/57, trazendo seus dispositivos marcantes alterações às regras do

código vigente, demonstrando o legislador a intenção de incentivar a prática da

adoção.Dentre alguns de seus requisitos, a redução da idade mínima de cinqüenta, para

trinta anos de idade para adoção, propiciando que casais jovens pudessem então tornar

realidade o sonho de adotar um filho. Exigia-se apenas o prazo de cinco anos de casados,

a fim de evitar doações precipitadas.Outros abrandamentos também surgiram nessa lei

como:

a) eliminação da exigência de não ter o adotante prole legítima ou legitimada;

b) redução da diferença de idade entre adotante e adotando de dezoito para dezesseis anos.

Ainda com base neste diploma legal, várias outras modificações ocorreram, como a

exigência do consentimento do adotando, se maior, e da representante legal, em se

tratando de incapaz ou nascituro. A exclusão da regra da não produção de efeitos

sucessórios se o filho já estivesse concebido no momento da adoção, foi substituído pelo

princípio de que, quando o adotante tivesse filhos legítimos, a relação de adoção não

envolveria a de sucessão hereditária, além da possibilidade de poder o adotado

acrescentar ao nome dos pais de sangue do adotante.Conforme o passar dos anos e a

criação da Lei 4.655 de 02 de junho de 1965, de grande importância no instituto da

adoção, a legitimação adotiva só poderia ser deferida quando o menor até sete anos de

idade fosse abandonado ou órfão não reclamado por qualquer parente por mais de um

ano, ou cujos pais tivessem sido destituídos do pátrio poder, ou ainda na hipótese do filho

natural reconhecido apenas pela mãe, impossibilitada de prover a sua criação.Havia

também a possibilidade do menor com mais de sete anos, se já estivesse sob a guarda dos

legitimantes à esposa em que tivesse completado essa idade, ser legitimado a adoção em

seu favor.Era exigido por essa lei um período de três anos de guarda do menor pelos

requerentes, para ser deferida a legitimação.Manteve-se a idade de trinta anos e o período

de cinco anos de matrimônio, em relação aos legitimantes, previstos na Lei 3.133/57.

Autorizava-se também a legitimação excepcionalmente, ao viúvo ou a viúva, com mais de

trinta e cinco anos de idade, se ficasse provado que o menor tivesse integrado em seu lar,

onde vivesse por mais de cinco anos.Aos cônjuges desquitados, se estivessem começado a

guarda do menor no período de prova, na constância do matrimônio, era permitido

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requererem a legitimação, desde que ajustados sobre a guarda visitas e pensão.Era

estabelecido que mesmo que aos adotantes viessem a nascer filhos legítimos, a

legitimação permanecia irrevogável, sendo equiparados os legítimos aos adotivos em

direitos e deveres. Importante medida não prevista nas leis anteriores foi o rompimento da

relação de parentesco com a família de origem, sendo o vínculo estendido à família dos

legitimantes, desde que os seus ascendentes tivessem aderido ao ato da adoção.A

legitimação adotiva foi precursora da Adoção Plena, depois consagrada pelo Código de

Menores.11No Brasil, foi somente com a Instituição do Código de Menores Lei 6.697/79,

que houve maior progresso na questão da adoção. Com a instituição deste código, passou

a haver três procedimentos básicos para a adoção: a adoção simples, a adoção plena

regidas pelo código de menores e a adoção do código civil, feita através de escritura em

cartório, através de um contrato entre as partes, e denominada também de adoção

tradicional e adoção civil. Observa-se uma ambigüidade em relação ao tema, por força da

própria criação das leis, sempre tendo por base as leis anteriores, como nos explica

Costa12 apud Weber.

“Entre o dilema de se curvar às pressões da sociedade ou de conte-las e discipliná-las: ante a dificuldade de apreensão da multiplicidade de possibilidades e, até, de dar conta da heterogeneidade social, as leis são produzidas numa referência ao próprio texto das que as antecedem, e num espelhar-se do passado-no direito romano ou em outras formas “históricas”, mas não brasileiras, ou nos avanços que países mais “modernos” conquistaram neste campo.

Essa lei se destinava à proteção dos menores até dezoito anos de idade que se

encontrassem em situação irregular, descrita pelo legislador no art 2º a que

transcrevemos:

Art 2º - Para os efeitos deste código, considera-se em situação

irregular o menor:I – privado de condições essenciais á sua

subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que

eventualmente em razão de a) falta, ação ou omissão dos pais ou

responsável;b)manifesta impossibilidade dos pais ou responsáveis

para provê-las;II – vítima de maus tratos ou castigos imoderados

impostos pelos pais ou responsável;III – em perigo moral, devido

a:a)encontrar-se de modo habitual, em ambiente contrário aos bons

11 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção Doutrina e Prática. Editora Juruá. 2006. p, 47.

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costumes;b)exploração em atividade contrária aos bons

costumesIV – privado de representação ou assistência legal, pela

falta eventual dos pais ou responsável;V – com desvio de conduta,

em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária;VI – autor

de infração penal.

Como o Código de Menores só era aplicado aos menores em situação irregular, aqueles que estivessem em situação regular poderiam ser adotados nos termos do Código Civil, independentemente de autorização judicial. Também se aplicavam todas as disposições do Código Civil, para a chamada “adoção simples” aos menores de até dezoito anos em situação irregular, dependendo, porém, da autorização judicial, precedida de estágio de convivência com os adotantes. Quanto à adoção plena, cortava todos os laços com a família biológica do menor, que entrava para a família do adotante como se fosse filho consangüíneo, diferente do que acontece com a adoção simples. Sendo os adotantes casados entre si, o estágio de convivência diminuiu para um ano, e se tratando de viúvo ou viúva, para três anos, desde que iniciado esse estágio quando em vida do outro. Enfim, a adoção plena era irrevogável, ficando garantida o direito sucessório ao adotado, minimizando a discriminação antes existente. 2.3 Principais Mudanças do Código Civil de 1916 para o Código Civil de 2002 Dispõe o Código Civil de 2002, entre os artigos 1618 e 1629 com relação à Adoção no livro IV - Do Direito de Família, Título I – Do Direito Pessoal, II – Das Relações de Parentesco, Capítulo IV - Da adoção:O Instituto da adoção do Código de 1916 recebeu diversas alterações em relação ao Código em vigor. As mesmas disposições aplicáveis aos menores, preconizadas pela Constituição Federal e explicitadas no Estatuto da Criança e do Adolescente, passaram a abranger também os maiores no atual Código, com algumas ressalvas. Com o atual Código, a constituição da adoção por escritura pública e a possibilidade da sua dissolução, deixaram de existir. Com efeito, o art. 1.623 da nova lei que a adoção, tanto do maior, quanto do menor ocorrerá por sentença, em processo judicial. E ainda, sem reprisar os arts. 373 e 374 e o art. 1.626 prevê que a adoção atribui a situação de filho ao adotado, resultando claro que a adoção se tornará indissolúvel.Com a entrada em vigor do novo Código Civil, não resta dúvida que o Código de 1916 está totalmente revogado, tendo somente aplicação, quando já houver direito adquirido.Já a dissolução da adoção, por conveniência das partes (art. 374 I), só poderia se dar antes da entrada em vigor do novo Código. Mas, a dissolução nos casos em que cabe a deserdação (art. 374, II), poderá ocorrer, mesmo na vigência da nova lei, se o fato autorizador da deserdação tiver ocorrido antes e esteja sendo objetivo de processo judicial.Quanto à disputa travada em torno do art.377 do atual Código, à evidência, com o novo, deixava de existir. Os filhos adotivos, em quaisquer circunstâncias passam a ser tratados, na sucessão, com filhos naturais. Assim, o adotado deixa de ser herdeiro do pai natural e vice-versa, como prescreve o art. 378, a menos que o passamento de um ou de outro se dê antes da vigência da nova lei13.Mesmo o novo Código tratando por inteiro, a matéria da adoção, e o dispositivo 2º parágrafo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil, dispondo que a lei posterior revoga a anterior quando estiver regulando inteiramente a

12 WEBER, Lídia Natália Dobriansky. Laços de Ternura. Editora Juruá. 2006. p, 67. 13 GRANATO, Eunice Ferreira dos Santos. Adoção Doutrina e Prática. Ed. Juruá. Curitiba. p, 110.

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matéria que tratava a anterior, as primeiras reações colhidas nos meios especializados têm em sentido opostos.Assim diz o Promotor de Justiça de São Paulo Eduardo Dias Souza14 apud Granato, ao afirmar que:

Em face da premissa da proteção integral prevista no texto constitucional é possível a coexistência das regras e requisitos do Código Civil com os requisitos do ECA para a adoção de crianças e adolescentes. O ECA continua regulamentando a adoção de crianças e adolescentes.

O advogado mestrando em Direito Civil na PUCSP Alberto Gosson Jorge Jr. apud Granato também nos afirma que15:

Com a entrada em vigor do novo Código Civil, a adoção estabelecida no Código Civil, ficará inteiramente revogada, prevalecendo às disposições do Novo Código Civil. Já no que diz respeito a adoção regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, por se tratar de lei especial editada com a finalidade precípua de disciplinar a proteção integral da criança (até 12 anos) e do adolescente (de 12 a 18 anos), deverá ela subsistir em harmonia com os dispositivos do novo Código Civil, prevalecendo as normas do novo Código Civil naquilo que não houver compatibilidade com o Estatuto, nos termos do parágrafo 2º art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil.

Esta questão só poderá ser diluída com o passar do tempo, após pronunciamentos dos tribunais, com a estabilização da jurisprudência.Não podem subsistir as disposições que se chocam com a nova lei, como é o caso da maioridade, que com o Código Civil passou a ocorrer aos dezoito anos.Todavia, a doutrina majoritária aconselha que se mantenha o entendimento de que ambas as leis são aplicáveis à adoção de menores de dezoito anos, já que o Estatuto da Criança e do Adolescente contém diversas disposições de grande importância não repetidas na lei nova. 3 A MUDANÇA DE PARADIGMA A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. 3.1 Princípio da Igualdade e Direito à Filiação

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 afastou a discriminação

antes existente entre filhos. A partir disso, não só o filho adotivo teve seus direitos

igualados aos demais filhos, mas também foi proscrita de nosso direito, a pecha infamante

de filho ilegítimo.

Estabelece o parágrafo 6º, art. 227 da Constituição Federal:

Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

14 Idem p. 111. 15 Idem p. 111-112.

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Antes da Constituição Federal, a Lei do Divórcio (Lei 6.515/77), alterando a Lei

883/49, na parte referente à filiação, dispunha sobre a igualdade dos filhos ao estabelecer:

“qualquer que seja a natureza da filiação, o direito à herança será reconhecido em

igualdade de condições”.

Com a entrada em vigor da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do

Adolescente, houve um momento inicial de questionamento se os dispositivos do Código

Civil referentes à adoção, continuariam em vigor. Isso porque o Código Civil fazia

distinção entre o filho adotivo e o natural, tendo sido estes, igualados pela Constituição

Federal.

Theotônio Negrão16 apud Granato na 10º. ed. (1991. página 89) do seu Código

Civil e Legislação Civil em vigor, da Ed. Revista dos Tribunais, deixou consignado que a

Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente haviam revogado os artigos 368 a

378 do Código Civil. Em condições posteriores, porém, reconsiderou a sua posição.

Pedro Sampaio è enfático17: A adoção civil, assim chamada por estar prevista no Código

Civil, sofreu profundas mutações com o advento da vigente Constituição Federal. A bem dizer tal modalidade de adoção tornou-se inviável, face à nova sistemática constitucional, como chegamos a admitir nas edições anteriores deste trabalho. Presentemente, com a edição do Estatuto da Criança e do Adolescente, (lei 8.069 de 13 de julho de 1990 retificada no Diário Oficial de 27/09/1990), o instituto da adoção foi novamente regido, de tal maneira que, não somente o código de menores foi ab-rogado, como também as disposições positivas do Código Civil, atinentes ao direito de adotar e ser adotado (267).Por via de conseqüência temos como ab-rogadas as disposições pertinentes à adoção, existentes no Código Civil.

Liborni Siqueira18, então Juiz de Menores da Primeira Vara da Capital do Rio de Janeiro trazido à colação por Sálvio de Figueiredo Teixeira, assim se posicionou:

É sabido que, pela maioridade extingue-se o pátrio poder, art 395, inciso III do Código Civil, e com ele as obrigações dos incisos acima citados. Admitindo-se que o maior de vinte e um anos celebre a adoção por escritura pública, estaremos descumprindo a Constituição Federal e desnaturando repita-se, o instituto, que é de direito protetivo–parental para caracterizá-lo simplesmente como patrimonial, mascarando outros interesses que

16 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção doutrina e Prática. Ed. Juruá. Curitiba. p, 50. 17 SAMPAIO, Pedro. Alterações Constitucionais nos Direitos de Família e das Sucessões. Ed. Forense.São Paulo.p, 42-43. 18 TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Direitos de Família e do Menor. Ed. Del Rey. Belo Horizonte. p, 275-276.

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podem ser resolvidos por testamento.Assim, a ciência hermenêutica nos conduz a conclusão de que a Lei 8.069 de 13 de julho de 1990 revogou no Código de Menores e também os arts. 368 a 378 do Código Civil, não sendo admissível a adoção daquele que atingiu a maioridade a não ser nos precisos termos da exceção do art. 40 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

3.2 Posições Doutrinárias acerca do art. 227 da CF/88. A tendência da doutrina e da jurisprudência era no sentido de que a adoção do Código Civil de 1916 não fora revogada, mas que só se aplicaria aos maiores de dezoito anos e, segundo alguns também aos nascituros. É dessa posição o jurista Osmar Gama Kauss19;

Com a publicação da Lei 8.069 de 13 de julho de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente, impressões afoitas e largamente divulgadas, davam como existente no sistema brasileiro de adoção, a partir da lei, somente a plena. Entretanto, do exame atento da lei, verifica-se não ser verdadeira tal impressão.È que a nova lei, ao regular apenas a adoção da criança e do adolescente (arts.39 a 52) , fez aplicar o instituto só para menores ate dezoito anos e, além dessa idade, somente para única exceção do art.40.Ipsu facto, continua vigendo para o nascituro ou para quem tenha mis de dezoito anos a forma de adoção prevista no Capítulo V do Título V do Livro I da Parte Especial-Direito de Família e disciplinada pelos arts. 368 usque 378 do Código Civil.

Do mesmo sentir é Antônio Chaves20 cuja lição nos permitimos transcrever, por trazer argumentos bastante convincentes:

Admitiu acórdão do Conselho da Magistratura do TJRJ (Proc. 230- Rel Dês. Maria Estella, Adv. 49.107, reg, em 27/11/1989), com fundamento na exegese do art.227, parágrafo 6º da Constituição Federal, só exigir hoje, uma espécie de adoção; a plena.Os filhos adotivos, hoje, se igualam em tudo aos legítimos, inclusive quanto à qualificação, além dos direito, não mais subsistindo a adoção simples do Código Civil, que poderia romper-se, voltando as partes ao estado anterior. O raciocínio prevalece apenas com relação aos adotandos menores de dezoito anos. A razão está com o voto divergente do Desembargador Sérgio Mariano: ‘Ao proclamar que os filhos terão as mesmas qualificações evidentemente o legislador constituinte foi obscuro, não sendo razoável interpretar filologicamente o texto. O uso do plural “qualificações” já denota que admite ele mais de uma “qualificação”. Neste processo mesmo, se verifica não existir unidade de qualificação, porque se tem em mira filiação adotiva implicitamente há de se reconhecer a filiação consangüínea. O parentesco natural e o civil sobrevivem pois, à norma constitucional. A mens legis é a vedação de exprimir-se

19 KAUSS, Osmar Gama Bem. Adoção no Código Civil e no estatuto da Criança e do Adolescente. Ed Lúmen Júris. Rio de Janeiro. p, 25. 20 CHAVES, Antônio. Adoção, Adoção Simples e Adoção Plena. Ed. Revista dos Tribunais. São Paulo. p, 240

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qualificação que implique depreciar o filho. Tal, entretanto, já ocorria em nosso ordenamento jurídico desde o decreto Lei 3.200 de 1941, relativamente aos filhos legítimos. Agora também não se pode discriminar o adotivo. O dispositivo constitucional estabelece igualdade de direito entre os filhos em geral, o que significa que o adotado tem os mesmos direitos do filho legítimo, nivelando-se quanto aos efeitos jurídicos, adoção plena e a simples. Mas formalmente, subsiste a diferença, não sendo plausível a exegese que conduza à adoção plena de maiores, por exemplo, e por uma só pessoa.”

Ac. un. Da 6º Câm. Civ.do TJRS percebeu, com clareza: A inexistência de distinção entre adoção simples e plena, decorrente da Constituição Federal (art.227 parágrafos 5º e 6º), diz respeito às hipótese em que o adotando for criança ou adolescente. Na hipótese de adoção de maior, cuja possibilidade persiste, deverá ser feita através de escritura pública (CC, art. 375) (Ap. 590081733, 12.03.91, Revista Jurídica 167/75).

Ressalte-se a citar do fundamento do relator, Desembargador Luis Fernando Koch que

nega provimento ao apelo:

Tem sido entendido, diante dos temos da nova constituição, não haver mais distinção entre a adoção simples e plena, com o que estaria revogada a adoção por escritura pública. Esta Câmara já se manifestou nesse sentido. Com efeito na Ac. 590041109, da qual fui relator, decidiu-se: “Adoção-Com a nova Constituição, inexiste distinção entre adoção simples e plena. Deverá, outrossim, proceder-se sempre com a intervenção do Poder Público, vale dizer, o Judiciário, (CF, art. 227, parágrafos 5º e 6º), resultando revogada a adoção por escritura pública, prevista pelo Código Civil, art.375. Averbação de escritura de adoção indeferida. Apelo improvido”. (ementa em 14/08/1990.) Dito entendimento, porém, limita-se às hipóteses em que o adotando for menor, as quais, por óbvio, são as que comumente ocorrem. Não se estende, porém, aos casos em que o adotando for maior, civilmente capaz. Isso porque os parágrafos 6º e 7º, do art. 227 da CF, de cujos textos se retira a conclusão da inexistência da distinção entre adoção simples e plena, estão, por evidente questão de técnica legislativa, vinculados ao caput do art. E o caput do art. 227 diz com direitos (sic) fundamentais da criança e do adolescente. Assim, os regramentos dos citados parágrafos regulam situações de crianças e adolescentes, vale dizer, de menores. Por outro lado, a lei ordinária, ao regular a adoção, o faz por meio do Estatuto da Criança e do adolescente (lei 8.069/90) que claramente só trata da adoção de menores, como decorre expressamente do seu art.39. A adoção de maiores, por outra parte, não foi suprimida. Com isso e como se impõe modo para procedê-la (sic), a que se concluir que deverá ser feita como determina o Código civil em seu art.375, isto é, por escritura pública. Apenas a adoção de crianças e adolescentes, como já se assinalou, será procedida (sic) com a intervenção do

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Poder Público, segundo determinação do parágrafo 5º do art.227 da CF.No caso dos autos, pretende-se a adoção de pessoa maior e capaz. O pedido foi indeferido, eis que, tal como formulada (adoção plena), estava a envolver a adoção regulada pelo estatuto da Criança e do adolescente, inaplicável ao caso. O indeferimento, assim, resultou corretamente decidido. Persistindo a pretensão da adoção, há que ser procedida (sic) como ressalvado, através de escritura pública.

Com efeito o art.39 da Lei 8.069, de 13 de junho de 1990, só trata da adoção de criança e

de adolescente. Os parágrafos 5º e 6º da CF promulgada em 05/10/1988, levam à

conclusão da inexistência de distinção entre a adoção simples e plena e dizem respeito aos

direitos da criança e do adolescente.A adoção de maior de dezoito anos segue a forma e

os efeitos da lei civil (CC, art.375).

4 - A ADOÇÃO NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

4.1 O Princípio da Proteção Integral

No contexto das regras constitucionais, a lei 8069 de 13 de julho de 1990, introduziu

profundas modificações no instituto da adoção. O princípio da proteção integral da

criança e do adolescente, é o objetivo do Estatuto, tendo como marcante inovação o fato

de todo menor de dezoito anos e não apenas aqueles que estivessem em situação irregular,

serem colocados sob a égide dessa lei. Logo no art.2º da lei, norteou quem são

considerados crianças e adolescentes.

“Considera-se criança, para os efeitos desta lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”.O parágrafo único: “Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.”

O objetivo do legislador estatutário com base constitucionais do mencionado

art.227, foi igualar o filho adotivo ao filho natural, não mais se falando em adoção

simples e plena, mas sim, numa única adoção que visa a criação de laços de paternidade e

filiação entre adotante e adotado, desligando-o completamente de sua família biológica.

Não se concebe mais a situação de abandono ou de irregular, do menor a dispor o

art. 39 da Lei 8069/90 que “a adoção da criança e do adolescente reger-se á segundo o

disposto nesta lei”, reafirma o que já havia sido determinado no art.1º “a abrangência da

lei, colocando solo a sua égide à adoção de toda criança e de todo adolescente,

independentemente da sua situação jurídica”. Dessa forma, é indispensável a

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sentença judicial para que a adoção seja efetivada, ainda que o menor não esteja em

situação de abandono e que os pais expressem desejo de o entregar para adoção.

Anteriormente ao Estatuto, esses casos eram resolvidos através de escritura pública, uma

vez que regidos pelas normas do código civil. O legislador impediu com isso a

adoção por procuração interposta pessoa. Estando regulamentado no parágrafo único do

art.3921, conforme salienta Kauss:

“Ao vedar a adoção por procuração, a lei traz à frente do Juiz todos os interessados na adoção até mesmo para o julgador aferir com mais convicção as vantagens ou desvantagens de uma filiação irrevogável.”

4.2 Requisitos Gerais para a Adoção

Conforme o dispositivo 40 da Lei 8069/90, o adotando deve conter, no máximo, dezoito

anos, ao se requerer a adoção.Desse modo, não mais poderá seguir as regras do ECA, se o

pedido foi feito no dia imediato após o adotando completar dezoito anos, mas sim ao do

Código Civil.Se o adotando já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes é

excepcionado pela segunda ponte deste artigo, fazer o pedido depois dessa idade. Sendo

necessário que esse pedido deverá ser feito antes dele completar vinte e um anos.

Ademais, depois dos vinte e um anos ninguém mais poderia estar sob a guarda ou tutela

de outrem, conforme Kauss:

“Para atingir o fim colimado pela lei, parece-nos que a guarda ou tutela deve ter sido iniciada antes dos dezoito anos porque, se ao depois, não sendo a idade abrangida pelo novo sistema, valer-se do abrandamento seria um mero artifício para burlar a proibição legal ou o escopo da regra.22”

Com a redução da menoridade para dezoito anos, estabelecida pelo art.5º do novo Código

Civil, ficou derrogado o art. 40 do ECA, ou ficou como se tivesse sobrevivido com a

seguinte redação: O adotando deve contar com menos de dezoito anos, à data da

adoção”Já com relação à idade do adotante, o art. 42 do ECA permite aos maiores de

vinte e um anos requererem a adoção independente do seu estado civil, isto é, podem ser

solteiros, separados ou viúvos.Houve uma importante alteração no Estatuto da Criança e

do adolescente em relação ao Código de Menores, que exigia para a adoção plena, a idade

de trinta anos e, quando o pedido fosse feito por marido e mulher, ainda exigia cinco anos

21 KAUSS, Omar Gama Bem. A adoção no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Ed Lumen Jures. 1993, p 45. 22 Idem p. 45.

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de matrimônio, salvo provado esterilidade dos cônjuges, para diminuir este prazo

matrimonial.Referente à idade, em relação ao Código Civil de 1916, antes de sofrer

modificação era a exigência de cinqüenta anos para o adotante, desestimulando os

interessados em adotar.Com a vigência do novo Código Civil, estabelecendo que a

maioridade se dá aos dezoito anos e como o art.42 do ECA determinava-se a idade

mínima de vinte e um anos para adotar, isto porque, pelo Código anterior a maioridade

ocorria aos vinte e um anos, diante disso observa-se derrogação do art.42 que então

haveria de se ler: “Podem adotar os maiores de dezoito anos, independentemente do

estado civil.23”A diferença de idade entre adotante e adotado, é um requisito de

importante valor para adoção, pois, tanto o art.42 parágrafo 3º do ECA, quanto o art.1619

do Código Civil, estabelecem que o adotante deve ser dezesseis anos mais velho que o

adotado conforme Granato24.

Numa outra abordagem, Clóvis Beviláqua afirma tratar-se de uma diferença de idade suficiente para dar ao pai ou a mãe adotiva uma distância que infunde respeito e pressupõe maior experiência, e põe cada um em seu lugar próprio: o pai para velar e dirigir, o filho para venerar e confiar.

Na lei 8069/90 não se estabelece diferença máxima de idade entre adotante e adotado e

nem idade mínima para o adotando o que é censurado por parte da doutrina. Mônaco25,

ao falar sobre a questão diz:

“Lamenta-se apenas que o legislador não tenha estabelecido, em contra partida, limite máximo de idade entre adotante e adotado. Em outros países a adoção somente poderá se concretizar se não houver diferença muito grande de idade entre adotante e adotado. No Brasil, infelizmente, isso não ocorre, o que implica dizer que, em tese, um casal octogenário pode adotar uma criança recém nascida sem que haja restrição legal. Ora, se adoção tem em mira imitar a natureza como repetidas vezes dissemos neste estudo, causa estranheza o fato de a lei não obstá-la, antes permitindo-a a pessoas que, em razão da idade, mais estariam para avós do que propriamente para pais dos adotados.

Conforme disposto no art. 45 parágrafo 2º do ECA, é necessário o consentimento do

adotando com mais de doze anos para que a adoção se concretize.No entanto, alguns

23 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção Doutrina e Prática. Editora Juruá. 2006, p. 79. 24 Idem p.80 25 SILVA, José Luiz Mônaco da. Estatuto da Criança e do Adolescente. Ed. Revista dos Tribunais. 1994, p.68.

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comentadores do ECA, tem chamado a atenção , para o fato de o consentimento não ser

condição absolutamente necessária com nos relata Gama26:

“Entretanto, esse consentimento deve ter um valor relativo na apreciação a ser feita pelo juiz na sentença. A sua concordância ou discordância, por si só, não deve representar o deferimento ou indeferimento da adoção. O art. 45 parágrafo 2º pode ter uma interpretação divorciada daquela que se deve dar ao art. 43 que representa o ideal do sistema. Portanto, a concordância ou discordância do menor deve ser confrontada com as vantagens ou desvantagens para si, da adoção. Pode concordar e a adoção ser indeferida e, ao contrário, pode discordar, e ela ser deferida. Não se pode esquecer a cautela com que sempre se houve a justiça, nas causas de família, com relação a depoimentos de menores, não se deve considerá-los isoladamente, mas em conjunto com as outras provas ou elementos formadores de convicção. A Adoção moderna é sempre conferida de acordo com os altos interesses dos menores, que eles nem sempre sabem aquilatar.”

Como a adoção corta-se quaisquer laços do adotando com a família consangüínea, salvo

os impedimentos matrimoniais, os pais ou o representante legal da criança ou do

adolescente devem manifestar o consentimento para tão importante ato, nos termos do

art.45 do ECA27.Quando os pais forem desconhecidos ou destituídos do pátrio poder,

essa anuência poderá ser dispensada conforme o art. 1º desse artigo.Não é essencial para a

adoção, o consentimento que se exige dos pais ou representante legal do adotando, assim

como o consentimento do adotado.O Procurador de Justiça, Olímpio de Sá Sotto Maior

Netto28 apud Liberatti em palestra proferida no I Encontro Nacional de Promotores de

Justiça Curadores de Menores, realizado em agosto de 1989, na cidade de São Paulo,

falando sobre as origens do pátrio poder, afirmou:

“A sua mais marcante característica era o fato de que o chefe da família (pater) exercitava sobre as pessoas e sobre as coisas que a compunham a autoridade mais absoluta e sem qualquer freio jurídico. Face ao caráter dominial sobre o filho que o instituto emprestava, o pai tinha todos os poderes sobre o mesmo, por todo o tempo de sua vida e podia encarcerá-lo, espancá-lo, acorrentá-lo, para que trabalhasse no campo, aliená-lo ou matá-lo, sem incorrer em sanção alguma. Calcado nas regras do direito privado, em razão do pátrio poder, o pai era livre para dispor dos filhos como se fossem simples coisas”.

26 KAUSS, Omar Gama Ben. A adoção no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Ed Lumen Jures. 1993, p.54. 27 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção Doutrina e Prática. Editora Juruá. 2006, p.75. 28 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adoção Internacional. Ed.Malheiros. 1995, p.70.

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Quando não estiverem presentes as condições para a destituição do poder familiar, e

havendo o consentimento de um dos pais e negativa do outro, a divergência a de ser

previamente decidida judicialmente.Ao contrário de leis anteriores que estabeleciam um

prazo fixo de convivência, o ECA em seu art 46 e parágrafos, determina a realização do

estágio de convivência, deixando a critério do juiz a sua fixação, atendendo as

peculiaridades de cada caso, e até mesmo podendo ser dispensado tal estágio se a criança

tiver menos de um ano de idade ou se o adotando já está em companhia dos

adotantes.Esse tempo de experiência, têm grande importância pelo fato de se avaliar a

adaptação do adotando com sua família substituta, bem como a compatibilidade desta

com a adoção, afastando adoções precipitadas que geram situações irreversíveis de

sofrimento para todos os envolvidos.Também é importante dizer que alguns parentes não

têm legitimidade para requerer a adoção de outros parentes: os ascendentes não podem

adotar os seus descendentes, nem o irmão pode adotar outros irmãos (art.42, parágrafo 1º,

ECA).29Apesar do silêncio da lei, parece ser também parte ilegítima, para requerer

adoção, o marido em relação a sua esposa e vice-versa, como lembra Antônio Chaves

apud Oliveira comentando o art.42 do ECA30.O legislador pátrio agiu de forma coerente

com o texto constitucional de 1988 e documentos internacionais aprovados com amplo

consenso da comunidade das nações ao romper ao romper definitivamente com a doutrina

da situação irregular, até então admitida pelo Código de Menores, e estabelecer como

diretriz básica e única no atendimento de crianças e adolescentes a doutrina de proteção

integral.É nesse sentido que a Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na história

brasileira, aborda a questão da criança como prioridade absoluta, e a sua proteção é dever

de família, da sociedade e do Estado.Devido a essas conquistas da Carta Magna,

revogando implicitamente a legislação em vigor, pela proteção integral proclamada por

ela, houve a necessidade da Nação, de um texto infraconstitucional que regulasse essa

questão da criança. O disposto ora em exame (art. 1º do Estatuto da Criança e do

Adolescente) é a síntese do pensamento do legislador constituinte, expresso na

consagração do preceito de que “os direitos de que todas as crianças e adolescentes

devem ser universalmente reconhecidos”. Sendo assim, deverá leis internas e o direito de

cada sistema nacional garantir a satisfação de todas as necessidades das pessoas de até 18

anos, não incluindo apenas o aspecto penal do ato praticado pela ou contra a criança, mas

29 OLIVEIRA, J.M.Leoni Lopes de. Guarda, Tutela e Adoção.Ed.Lumen Júris.São Paulo.p, 183. 30 OLIVEIRA, J.M.Leoni Lopes de. Guarda, Tutela e Adoção.Ed.Lumen Júris.São Paulo.p, 183.

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o seu direito à vida, saúde, educação, convivência, lazer, profissionalização, liberdade e

outros.

4.3 Aspectos Procedimentais do Estatuto da Criança e do Adolescente

Pela inovação introduzida pelo ECA no seu art.41 parágrafo 1º o cônjuge ou

concubino ficam autorizados a adotar o filho de sua esposa ou concubina e vice-versa

configurando-se a adoção unilateral.Nesse caso será necessário a concordância do pai do

menor, a não ser que o menor esteja registrado tão somente em nome do cônjuge ou

concubino do adotante quando então bastará o seu assentimento. Realmente, o art 45 do

ECA exige o consentimento dos pais do adotando31.O ECA, ao admitir que pleiteiem, em

litisconsórcio unitário os concubinos, nada mais fez que dar vigência ao disposto no art

226, parágrafo 3º da CF,que, para efeito de proteção do Estado, reconhece a união estável

entre um homem e uma mulher como entidade familiar32. Antes do ECA, o art 370 do

Código Civil não admitia que alguém pudesse ser adotado por duas pessoas salvo se fosse

marido e mulher.Com a modificação da realidade social e aceitação dos casais que vivem

em estado de concubinato, igualmente com referência à adoção houve mudança de

posição do legislador, admitindo que casais concubinados pudessem adotar crianças ou

adolescentes33.Com a promulgação da lei 9.278 de 10 de maio de 1996, o assim chamado

“Estatuto dos Concubinos”, reforçou ainda mais a permissão de concubinos poderem

adotar. Finalmente, o Código Civil atual é expresso ao permitir nos artigos 1.618

parágrafo único e 1.622, a adoção por companheiros. O Estatuto da criança e do

adolescente, no parágrafo 4º do art.42, estabelece:

“Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar conjuntamente contando que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estagio de convivência tenha sido iniciado na constância da sociedade conjugal.”

Segundo Oliveira, é permitido aos divorciados e aos judicialmente

separados adotarem em conjunto. A permissão de adotar separadamente é assegurada pelo principio geral, que afirma que pode adotar os maiores de vinte e um anos independente do estado civil. Mas a lei permite que os divorciados e separados judicialmente adotem em conjunto, isto é, formulem o pedido em litisconsórcio unitário, como podem fazer os casados e os concubinos, desde que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e que já tenha sido iniciado o estágio de convivência durante a existência da constância da 31 Idem p, 182. 32 OLIVEIRA, J.M.Leoni Lopes de. Guarda, Tutela e Adoção.Ed.Lumen Júris.São Paulo.p, 182. 33 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção Doutrina e Prática.Ed.Juruá. Curitiba.p, 86.

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sociedade conjugal.34Já com relação a adoção póstuma, admite-se a possibilidade de efetuar a adoção, mesmo depois de ter falecido o adotante, desde que anteriormente ao seu falecimento tenha ele manifestado, perante o juiz, a sua vontade de adotar. Dispõe o parágrafo 5º do art.42 do ECA que a “adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.”35Os efeitos da adoção, neste caso, retroage a data do óbito coincidindo com a abertura da sucessão, nos termos do art.47, parágrafo 6º do Estatuto:

“A adoção produz seus efeitos a partir do trânsito em julgado da sentença, exceto na hipótese prevista no art.42 parágrafo 5º caso em que terá força retroativa à data do óbito.”

É permitido aos tutores e curadores adotar o pupilo ou curatelado, desde que prestem conta da sua administração e salde o seu alcance. A lei pretende que aquele que já cuida da pessoa e bens do adotado (portanto, com vínculo de afetividade) possa adotar o seu pupilo ou curatelado36. É evidente que o juiz deverá verificar se a adoção apresenta reais vantagens para o adotando e se o pedido formulado pelo tutor ou curador funda-se em motivos legítimos (art.44, ECA)

4.4 Efeitos da Adoção pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. São de duas naturezas os efeitos da adoção: efeitos pessoais e efeitos patrimoniais.Como efeitos pessoais sobrelevam a constituição do vínculo de filiação, estabelecimento de parentesco com a família do adotante e o direito ao uso do patronímico deste. E dentre os efeitos patrimoniais se destacam o direito sucessório, a obrigação alimentar e uso fruto e administração dos bens do adotado, pelo adotante.O desligamento do vínculo de parentesco do adotado com a sua família biológica e, conseqüentemente, a constituição de novo vínculo de filiação com os pais adotivos e de parentesco com a sua família, é o principal efeito conferido pela sentença de adoção.É o que estabelece o art.41 do Estatuto:

“A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais”.

Por ser a adoção irrevogável, nem mesmo a morte dos adotantes permite o

restabelecimento do poder familiar dos pais biológicos, nem retorna o vínculo do

parentesco anterior.Em relação aos impedimentos matrimoniais, são aqueles chamados

absolutamente dirimentes, que tornam o casamento nulo. Portanto, não pode se casar, o

filho adotivo com os seus ascendentes de sangue nem com os afins em linha reta, seja o

vínculo legítimo ou ilegítimo, germano ou não, e os colaterais, legítimos ou ilegítimos até

o terceiro grau.Quando se trata de adoção unilateral, há uma exceção ao rompimento

definitivo dos laços de sangue do adotado com sua família de origem, pois quando um

dos cônjuges ou concubinos adota o filho do outro, são mantidos os vínculos de filiação

entre o adotado e o cônjuge ou concubino do adotante, e os laços de parentesco com os

parentes biológicos (ECA art.41 parágrafo 1º). Ocorre então dupla relação de parentesco:

34 OLIVEIRA, J.M.Leoni Lopes de. Guarda, Tutela e Adoção.Ed.Lumen Júris.São Paulo.p, 183. 35 OLIVEIRA, J.M.Leoni Lopes de. Guarda, Tutela e Adoção.Ed.Lumen Júris.São Paulo.p, 186.

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a anterior, através da mãe ou pai natural, e a nova através, do adotante.Na Constituição

Federal de 1988 o parentesco do adotado com a família do adotante, têm a mesma

abrangência, como se fosse gerado biologicamente pelos pais adotivos. Por esse motivo

também, os nomes dos avós maternos e paternos são inscritos no assento de nascimento

do adotivo37, conforme Granato.Com a decretação da adoção, ocorre a transmissão do

nome do adotante, bem como, dos seus ascendentes, podendo, inclusive, haver a mudança

do seu prenome, a requerimento do adotante (art.47, parágrafos 1º e 5º do ECA).É de se

observar que a lei dos Registros Públicos (Lei 6.015/73) estabelece, no art.58, que o

prenome é imutável. Essa regra, porém, não é absoluta, já que sua modificação está

prevista no parágrafo único deste artigo, nas hipótese de erro gráfico ou no caso de

prenome que exponha ao ridículo o seu portador, dependendo, sempre, de sentença

judicial.38Para a troca do prenome, basta que se consigne essa intenção com o pedido

inicial, não sendo necessária qualquer justificativa. Porém, deve ser respeitada a opinião

do adotando, se este já possui idade suficiente para compreender a importância de sua

identificação.Conforme o mandamento constitucional do parágrafo 6º do art. 227 e mais o

art. 20 do Estatuto, é completo a integração do filho adotivo na família, com todos os

direitos e deveres, não existindo duvida alguma sobre a aquisição do direto do adotado

em suceder ao adotante.É o que se lê no art. 41 parágrafo 12º do Estatuto:

“É recíproco o direito sucessório entre o adotado, seus descendentes, o adotante, seus ascendentes, descendentes e colaterais até o quarto grau, observada a ordem de vocação hereditária”.

Ocorrendo a hipótese prevista no parágrafo 1コ do art.41 do Estatuto, a chamada “adoção

unilateral”, onde um dos cônjuges ou concubino adota o filho do outro, permanecendo os

vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou concubino do adotante e seus

parentes, o adotado será chamado à vocação hereditária de ambas a s partes, quando um

ou outro falecer. É a hipótese, por exemplo, de uma mulher que teve um filho, é mãe

solteira e se casa ou vive em concubinato com um homem, que resolve adotar esta

criança. O adotado mantém os vínculos de filiação com a sua mãe biológica e o

parentesco com a família de sua genitora; está vinculado ao adotante e seus parentes, pela

adoção39.A obrigação de alimentar é gerada pela sentença de adoção, como conseqüência

36 Idem p, 183. 37 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção Doutrina e Prática. Ed Juruá. Curitiba. p, 90. 38 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção Doutrina e Prática. Ed Juruá. Curitiba. p, 91. 39 Idem p, 92.

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da constituição do vínculo paterno-filial, podendo o adotado pleitear alimentos do pai

adotivo e se necessitar, também pode exigi-los dos membros de sua família adotiva, assim

como, o pai adotivo pode pedir alimentos do adotado se os necessitar.Não se deve

entender, por alimento, apenas a comida, mas o que é indispensável ao sustento

habitação, atendimento médico, vestuário, e no caso do menor, instrução e educação.Essa

é a lição de Cahali40 :

O ser humano, por natureza, é carente desde a sua concepção: como tal, segue o seu fadário até o momento que lhe foi reservado como derradeiro: nessa dilação temporal – mais ou menos prorrogada – a sua dependência dos alimentos é uma constante, posta como condição de vida. Daí a expressividade da palavra “alimentos” no seu significado vulgar, ou, no dizer de Pontes de Miranda, “o que serve à subsistência animal” . Em linguagem técnica, bastaria acrescentar a esse conceito a idéia de obrigação que é imposta a alguém, em função de uma causa jurídica prevista em lei, de prestá-los a quem deles necessite. Adotado no direito para designar o conteúdo de uma pretensão ou de uma obrigação, a palavra “ alimento” vem a significar tudo aquilo que é necessário para satisfazer os reclamos da vida, são as prestações com a s quais podem ser satisfeitas as necessidades vitais de quem não pode provê-las por si; mas amplamente, é a contribuição periódica assegurada a alguém, por um título de direito, para exigi-la de outrem, como necessário à sua manutenção.

Entretanto, mais valioso que o apoio material é o respaldo verdadeiro amor paterno filial

que deve caracterizar as relações pais e filhos como nos diz Liberati:41

Apesar de o termo “alimentos” referir-se à manutenção biológica,

vestuário, atendimento médico, segurança, transporte, lazer etc., do

adotado, outro sentido de maior profundidade, pode circundar e

completar o seu significado: de nada adianta o adotante oferecer

toda essa satisfação biológica ao seu filho adotivo se não lhe

proporciona o alimento do respeito, da solidariedade, da

compreensão, da presença, do afago, do carinho, da honestidade, da

retidão, do companheirismo, do amor. Esses são os alimentos que

realmente, sustentam e dão vida às pessoas.

Incube aos adotantes, como conseqüência lógica de o adotado se tornar seu filho legítimo,

administrar e usufruir dos bens dele, estando regulamentado no art. 1.689 I e II do atual

código Civil. Almada manifesta-se sobre a matéria42 dizendo que:

40 CAHALI, Yuseef Said. Dos Alimentos. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais.p, 177.

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A percepção do usufruto legal dos bens dos filhos é inerente ao exercício dom pátrio poder, declara o Código Civil, art. 389. Lendo tal dispositivo, o tribunal de justiça do Rio de Janeiro sustento ou que usufruto é em prol do pai que exerça a guarda do filho. É plausível assim seja, pois a fundamentação que justifica o embolsamento do usufruto descansa no ônus do sustento do menor. Em tal hipótese o cônjuge não guardião ficará eximido de prestar alimentos ao filho, salvo se o produto do usufruto não bastar a sua subsistência, quando, então, responderá pelo déficit alimentar. A Branco Rocha ficou bem clara a diferenciação entre o usufruto inerente ao pátrio poder e usufruto comum, com o instituto de direito real, nos seguintes termos: “São características do usufruto paterno: a) resulta sempre de dispositivo de lei: b) é universal: c) abrange todos os frutos e utilidades da coisa: d) independe de transcrição no registro: e) está fora do comércio; f) é irrenunciável; g) o pai usufrutuário não está obrigado a prestar caução; h) é condicionado ao pátrio poder.”Aduza-se a essa conotação que é também temporário, extinguindo-se quando termine o pátrio poder, ao qual é correlato.Dispensado está o pai de prestar contas ao filho no tocante ao usufruto, pois, como já acentuado, trata-se, em verdade, de “uma compensação dos encargos, que se originam do exercício do pátrio poder com a pessoa e os bens dos filhos.”

O pai deve alimentos e educação aos filhos em qualquer hipótese, possuindo bens o filho ou nada tendo. Mas nem por isso deixa de ser o uso fruto em uma compensação desses encargos.

41 LIBERATI, Wilson Donizeti. Adoção Internacional. Ed. Malheiros. p, 181. 42 ALMADA, Ney de Mello. Direito de Família. Ed Tribuna da Justiça. São Paulo. p, 274-275.

5 ADOÇÃO À BRASILEIRA

5.1 Conceito A denominada adoção à brasileira consiste no registro de filho alheio

como próprio, realizada no Cartório de Registro Cível das Pessoas Naturais, bastando

que o suposto pai ou mãe ali compareçam e declarem o nascimento obedecendo ao

disposto no art. 54 da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015 de 31 de dezembro de

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1973) e somente havendo dúvidas do oficial em relação à declaração, poderá este, se

dirigir a casa do recém nascido para verificar a sua existência ou exigir a sua atestação

do médico ou parteira que tiver assistido o parto ou testemunho de duas pessoas que não

forem os pais e tiverem visto o recém nascido. Ainda que se possa pensar que esse

tipo de adoção é uma exceção, a ela se arriscando apenas pessoas de menor

esclarecimento, ela é extremamente comum em nossa sociedade. Em 1990, a revista

Isto É publicou a saga de um agricultor do interior gaúcho, acusado de ter declarado a

filha de sua companheira, mãe solteira, como sendo dele. Ameaçado de multas e até

pena de prisão, ele foi socorrido por uma legião de juristas, declarando que, no Brasil, a

prática (de falsificação ideológica) é, no mínimo, dez vezes mais comum do que a

adoção.43 O caso demonstrado bem o descompasso entre a lei e as práticas de uma

boa parte da população brasileira, causando grandes divergências entre doutrinadores e

legisladores, pois ao mesmo tempo em que alguns legisladores liberais tendem

tacitamente a endossar esta apropriação popular da lei, outros mais conservados,

chamam a atenção para o perigo desta tolerância tornar a adoção legal letra morta, já

que a adoção á brasileira continuará a imperar em detrimento da adoção legal. São

variados os motivos que levam alguém a registrar o filho alheio como próprio, mas fácil

é deduzir que, dentre eles, estão a esquiva a um processo judicial de adoção demorado e

dispendioso, mormente quando se tem que contratar advogado; pela intenção de se

ocultar à criança a sua verdadeira origem; ou ainda, o medo de não lhe ser concedida à

adoção pelos meios regulares e, pior ainda, de lhe ser tomada a criança, sob pretexto de

se atender a outros pretendentes há mais tempo “na fila” ou melhor qualificados.

Geralmente impossibilitada de criar o recém nascido, a mãe de sangue, não se

importa em entregar a criança a quem tiver a melhor condição para sustentá-lo. A

prática tem mostrado que a esmagadora maioria dos praticantes da adoção à brasileira

que pertencem à classe média, com idade entre os 40 e 50 anos, residentes em locais não

pertencentes à circunscrição do Cartório de Registro Cível onde o assento de

nascimento da criança é indevidamente lavrado.

5.2 Características da Prática de Adoção à Brasileira

43 FONSECA, Cláudia. Caminhos da Adoção. Ed. Cortez. São Paulo, p 129.

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A declaração de nascido vivo é um dos sinais que possibilitam a suspeita de uma adoção

à brasileira, pois esse documento que à vezes acompanha a cópia do assento de

nascimento da criança (indicação de socorro hospitalar logo após o parto fora do

nosocômio), pode conter os seguintes pontos discordantes:

a) preenchimento por pessoa diversa da funcionária da maternidade ou

hospital.b) ausência da impressão palmar do recém nascido ou da impressão

digital da parturiente.

Em todos os casos, as partes devem comunicar seu endereço residencial, até mesmo para fim das declarações de praxe diante do Cartório de registro Cível. Todavia, não raro, casais adeptos dessa prática, declaram endereços residenciais falsos, dificultando a localização do grupo familiar para que haja a prestação de esclarecimento perante o qual de direito.Um outro fator que deixa vestígios para a presença deste tipo de adoção ocorre fazendo uma pesquisa junto ao distribuidor do juízo para verificação de existência de requerimento para habilitação em cadastro de pessoas interessadas em adoção, sendo posteriormente retirado este cadastro pela desistência (como argumento de tentativa de fertilização artificial, por exemplo).Não se descarte a possibilidade de investigação de caso suspeito de adoção à brasileira com a visualização de apenas um fator ou outro de maneira isolada. Repetidamente estes elementos vêm concatenados, fazendo com que um se evidencie com a exposição de seu correspondente. A paternidade que legalmente recai sobre o pai não biológico é o crime de registro de filho alheio como próprio. Pode-se dizer em relação a essa prática de adoção que se sujeitava é verdade, aquele que registrava falsamente o filho como seu, às penas do art. 299 do Código Penal, que vão de um a cinco anos de reclusão e multa, por fazer inserir declaração falsa em documento público com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Todavia, a severidade da norma penal choca-se tão frontalmente com os relevantes motivos sociais que acompanham imemorialmente atos dessa natureza, que os sentimentos do homem médio comum - dos quais não se pode excepcionar o juiz – que, com raras exceções são unânimes a doutrina e a jurisprudência em diligenciar meios e pretextos para contornar o texto álgido da lei a fim de não cominar pena alguma, quando alguns, entre esses milhares de casos que anualmente ocorrem, chegam, por qualquer circunstância às barras dos tribunais. Não é comum observar a resistência à coação de moral decorrente do alto valor espiritual e humano que inspiram tais gestos. Em contraste, com os inúmeros casos que são sabidos e ocorrerem anualmente, sem que as autoridades deles tomem oficialmente conhecimento, uma pesquisa revelara serem raros os pronunciamentos condenatórios44, todos eles reveladores, no entanto, de particularidades de natureza verdadeiramente excepcional. Muito mais abundantes são os acórdãos absolutórios45Também diz que nos casos oriundos de causa nobre, sentem os juízes o descobrimento da aplicação de pena grave com a reclusão. E, à falta de pena de rigor intermédio e conveniente, preferem concluir pela absolvição do agente, ainda que para isso se valendo de soluções que o texto legal e

44 RT 149/706; 231/61; 251/127; 334/90; 439/338; e RF 163/345. 45 RT 149/706; 155/305; 167/541, 564; 185/122; 190/655; 195/97; 206/83; 218/111; 228/110; 231/663; 235/93; 277/157; 284/448; 288/118; 291/121; 292/115; 303/82, 95; 307/110; 312/136; 322/124; 329/137; 379/115; 384/271; 447/767; 464/336; 479/310; RF 98/199; 140/428; 182/334; 199/275; 203/305; 207/327).

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a doutrina desautorizam, tais como a de atribuir à nobreza de propósitos a força de circunstância excludente da criminalidade46. Exatamente por isso, encontra-se, por proposta da Associação Brasileira de Juízes e Promotores da Infância e da Juventude, uma solução legislativa que, embora não descriminalizasse o fato, penalizava-o de forma mais branda, permitindo até o perdão judicial. Com efeito, a Lei 6.898 de 30 de março de 1981, passou a tipificar o “registrar como seu o filho de outrem” como crime do art. 242 do Código penal, com pena de dois a seis anos de reclusão, mas excepcionado, no parágrafo único: “se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza: pena de detenção de um a dois anos, podendo o juiz deixar de aplicar a pena”. Essa questão criminal, gera por sua vez, grandes divergências doutrinárias em relação a possibilidade de condenação criminal ou até mesmo o risco daquele registro sem declarado nulo. Estão em conformidade com este entendimento, dentre outros, Eunice Granato, Arnaldo Marmitt47, chegando este último a se posicionar, diz que:

Hoje, através da adoção simplificada e plena, tem-se meio mais eficaz e mais apropriado para adotar uma criança, sem os riscos, traumas e percalços de alguém erradamente registrado como filho sangüíneo, que na mente dos agentes nunca o será verdadeiramente, fato que poderá causar prejuízos futuros ao adotado.

Entretanto, atualmente os entendimentos jurisprudenciais e de grande parte da doutrina, são a favor do notório conflito que se estabelece entre o art. 339 e incisos, do Código Civil e o art. 242, do Código Penal. O art. 339 inciso I do Código Civil dispõe que a paternidade de um filho nascido com menos de 180 dias da primeira relação sexual entre a mulher e o seu marido, não pode ser contestada, se, ao tempo do casamento, tinha ele ciência da gravidez. Dessa forma, o marido não será o pai biológico, se a primeira relação sexual da esposa acontecer, por exemplo, 100 dias antes do nascimento da criança, e ainda assim a lei impede de contestar a paternidade. Com isso o conflito é evidente, pois o art. 339 do código Civil, obriga o marido a reconhecer como seu o filho de outrem, no instante em que o proíbe de contestar tal paternidade, enquanto o art, 242, do Código Penal, diz que tal fato é criminoso. Em face a essa questão o jurista Franceschinelli48, se posiciona da seguinte forma:

Entendemos que no presente caso inocorre a antijuridicidade, que é transcendente ao Direito Penal, pois existe uma norma no Direito Civil que exclui a ilicitude do fato típico. È o exercício regular do direito, pois a lei civil, no inciso I do art. 339, presume de forma juris et de jure a paternidade do marido, e em seu nome deve ser registrada a criança, mesmo que outro seja o pai natural.O tribunal de justiça de são Paulo decidiu um fato semelhante da seguinte forma: delito não configurado – Acusada que registra como sendo do marido, de quem estava separada havia mais de um ano, filha que concebera – Casamento, porém, não desfeito até então – Filiação legítima – Absolvição mantida – Inteligência dos arts. 299 do Código Penal e art. 337 do Código Civil. Segundo esta decisão, não pratica o delito do art. 299 do Código Penal quem registra como sendo do marido, de quem se

46 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção Doutrina e Prática. Ed Juruá. Curitiba, p, 132-133. 47 MARMITT, Arnaldo. Adoção. Ed. Aide. Rio de Janeiro, p, 200. 48 FRANCESCHINELLI, Edmilson Villaron. Direito de Paternidade. Ed. LTr. São Paulo, p 56.

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acha separada a amis de ano, filha que concebera em face do princípio segundo o qual pater is est quem justae nuptiae demonstrant, firmado pelo legislador civil (RT 493/294). Tal decisão reconheceu que o art. 337 do Código Civil afasta o dolo específico do art. 299.Data vênia discordamos desta posição jurídica, pois a mulher, ao registrar filho de outrem em nome de seu marido, praticou uma conduta dolosa, alterando a verdade sobre fato juridicamente relevante, uma vez que a criança será herdeira, além de possuir inúmeros outros direitos decorrentes da filiação. Aqui não há exclusão do dolo pois não houve erro de tipo, mas sim, como já dissemos anteriormente, exclusão da antijuridicidade pelo exercício regular do direito, pois o art. 337, combinado com o art. 338 inciso II, do Código Civil, atribui a mulher legitimidade para a prática de tal ato, razão pela qual o instituto da antijuridicidade é transcendente ao Direito Penal.

5.3 A Verdade Biológica e a Sócio Afetiva No Direito de Família o avanço da técnica médica, possibilitada através do exame de DNA, em que através deste é possível atestar a verdade biológica em percentuais elevados de confirmação da paternidade, traduz consigo mesmo um paradoxo: a verdade biológica pode não expressar a verdadeira paternidade. Ao longo da história do Direito de Família Brasileiro, o conflito que ocorria entre a filiação biológica e a socioafetiva sempre se resolveu em benefício da primeira. A questão é que antigamente a paternidade era definida apenas pelos laços sangüíneos, sendo deixados de lado os vínculos sociais envolvidos na questão. Em verdade, apenas recentemente alguns juristas, passaram a cogitar seriamente como categoria própria, a filiação socioafetiva. A sociedade, por estar sempre em processos de modificações, cabe ao Direito, e conseqüentemente ao Direito de Família, se adequar à medida que possa acompanhar estas mudanças sociais. Suas decisões são relativizadas, uma vez que se mexe com a família e os direitos da filiação, que merecem sempre ampla proteção do Estado, como é o caso do bem estar dos filhos envolvidos e o que é melhor para eles. Sendo assim, o Direito de Família é caracterizado pelo princípio da prioridade e prevalência dos interesses dos filhos. De acordo com todas as mudanças ocorridas, podemos reconhecer que a família hoje não é marcada pelo domínio da posse, mas por sentimentos de carinho, de amor, ideal de felicidade e de comunhão. Pai não é somente o genitor, estando este legalmente vinculado devido aos laços genéticos, mas sim, o protetor, amigo e companheiro. 5.4 A Paternidade e a sua Irrevogabilidade. Sobre a paternidade, podemos destacar três tipos, que podem ser verificados separadamente, combinados dois a dois, ou coexistirem quando o genitor registra a criança e ainda mantém com ela uma paternidade sócio-afetiva. É necessário para que seja caracterizada essa última, que exista uma relação de afeto com o filho de criação, comprovada pela posse de estado de filho, levando em conta três elementos. Primeiro o uso do nome do pai, segundo o tratamento como se filho fosse e por último o reconhecimento de filho perante toda a sociedade. Como já mencionado, é tão real a verdade sócio-afetiva quanto à biológica, sendo os seus efeitos tão concretos quanto os

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oriundos de laços sangüíneos, ou até mais verdadeiros. Afinal não podemos aceitar a classificação como pai, de uma pessoa que nunca teve contato com a criança e ao mesmo tempo negar que um homem que por mais de dez anos educou e deu amor ao filho. Ainda existe por parte de alguns juristas, a resistência em igualar as filiações. Contudo, há um movimento para que ocorra uma alteração do predomínio material para o afetivo, pois as mudanças na sociedade exigem dos operadores de direito reposicionamento e redefinição do conceito. No Brasil, existe uma regulamentação, presente no art. 1.609 do Código Civil de 2002 que dispõe sobre o reconhecimento voluntário de filiação sendo irrevogável a mesma, pois a livre manifestação de vontade tendente a tal reconhecimento uma vez aperfeiçoada torna-se irretratável. 5.5 O Reconhecimento Voluntário e a Anulação. O reconhecimento voluntário é aquele decorrente do ato jurídico praticado de forma

voluntária pelo pai, pela mãe, ou ambos conjuntamente, buscando admitir o vínculo

jurídico da filiação49. O reconhecimento tem por fim imediato a aquisição do estado de

filiação e, conseqüentemente, todos os direitos dele decorrentes. Este reconhecimento,

também denominado perfilhação, se caracteriza juridicamente como um ato jurídico

personalíssimo, bilateral, voluntário ou compulsório, declarativo, irrevogável,

indisponível de efeito ex tunc, não sujeito a termo ou condição e que compreende a

existência da filiação natural50. A irrevogabilidade do reconhecimento voluntário

decorre, portanto, da indisponibilidade de seu objeto que é a filiação. Inoperante

também será qualquer transação que vise à renúncia do estado de filho51. Uma vez

aperfeiçoada, torna-se irretratável a declaração de vontade tendente ao reconhecimento

voluntário de filiação. A invalidação ocorre apenas em razão de dolo, erro, coação,

simulação ou fraude. Se foi o próprio recorrido à pessoa que compareceu ao cartório e

fez as declarações de registro, não pode ele agora procurar anulá-la para beneficiar-se

dessa anulação, principalmente em prejuízo de quem não participou do ato e nem

poderia participar, por ser menor de idade.

A espontânea atribuição de paternidade a quem não é filho equipara-se à adoção

pelo que não pode ser revogada ao sabor das emoções. Pleitear a nulidade do registro

por tal fundamento importa em invocar a própria torpeza, vedado pelo nosso direito52.

49 FRANCESCHINELLI, Edmilson Villaron. Direito de Paternidade. Ed. LTr. São Paulo, p 91. 50 Idem, p 92. 51 Idem, p 98. 52 28026456 – Registro Civil- Paternidade- Adoção à Brasileira – Nulidade – Inocorrência (TJPE – AC 122266-4 – Rel. Des. José Fernandes – DJPE 20/12/2005).

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Seria perturbador se tivesse à possibilidade do reconhecimento voluntário feito

durante uma boa relação com a mãe, por exemplo, pudesse ser desfeita ao talante do

companheiro, que anteriormente por vontade própria decidiu dar nome à criança, como

se fosse um presente de namoro e que depois pedia de volta.

Há de se dizer que a criança não deu causa ao reconhecimento, ela partiu da

própria vontade de quem o registrou, devendo então, atender a dignidade da criança. A

dignidade é que confere à pessoa humana a sua autoridade moral, o sentimento de

honra, a respeitabilidade. O prejuízo da dignidade, em fase de desenvolvimento, pode

acarretar conseqüências graves para a criança, com reflexos em seu amadurecimento,

em sua conduta social e até mesmo ao seu respeito.

Hoje os interesses do bem estar da criança, prevalecem sobre os da família e

sobre os interesses particulares dos pais, visto que a boa criação e estrutura da criança

são a única esperança de que o homem amanhã será melhor, conforme preconiza o

princípio da proteção integral de acordo com a Lei 8.069/90, já mencionado

anteriormente.

Segundo Caio Mário da Silva53, em relação à declaração da vontade de

reconhecimento da paternidade, uma vez pronunciada, ela se desprende do foro interior

do agente, para adquirir consistência jurídica de um ato perfeito.

Assim como o ato jurídico perfeito o reconhecimento somente pode ser desfeito

se presente os vícios que o inquinem de nulo.

Os defeitos ou vícios são causas que tornam não só o reconhecimento voluntário,

mas qualquer outro ato jurídico, inexistente, nulo ou anulável. As causas que retiram ou

podem retirar a eficácia dos atos jurídicos são: a) a falta do consentimento, objeto e

causa. Estas tornam o ato inexistente; b) agente absolutamente incapaz, objeto ilícito ou

impossível, não revestir a forma prevista em lei ou preterir alguma solenidade imposta

para a sua validade, quando a lei expressamente o declarar nulo ou lhe negar efeito. A

falta que qualquer destas torna o ato nulo (art. 145 do Código Civil); c) os vícios da

vontade tais como o erro, dolo, coação, simulação. Estes defeitos tornam o ato somente

anulável.54

6 - CONCLUSÃO

53 SILVA, Caio Mário. Reconhecimento de Paternidade e seus Efeitos. São Paulo: Ed. Forense. 1997, p 74. 54 FRANCESCHINELLI, Edmilson Villaron. Direito de Paternidade. São Paulo: Ed. LTr. 1997, p 159.

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Nos tempos antigos a adoção era considerada um ato de perpetuidade dos ritos

religiosos que as famílias realização e somente era direito daquele que não tinha filhos

legítimos. A referência histórica revela o real sentido da adoção nesta época, garantir

continuidade na familiar por acreditar na salvação apenas através do culto aos mortos.

Ao contrário do que existe atualmente, esse modelo de adoção não tem como objetivo o

bem estar do adotando, mas sim a preservação dos deveres religiosos sustentados pelos

dogmas no intuito de não permitir que essa tradição seja quebrada.

Diante dos registros históricos destacamos o relevante papel da Roma antiga,

onde foi desenvolvido como o início de uma visão mais ampla sobre a adoção, pois

havia outras finalidades ligadas a intenções políticos. A partir, ao longo da história a

adoção sofreu modificações que caracterizavam a sua função.

Foi na Idade Moderna que se encontrou a primeira referência legal sobre a

adoção, gerando a ampliação de seu sentido no âmbito jurídico. Durante sua evolução

podemos destacar a participação portuguesa na construção histórica de seu real

significado perante os mecanismos legais, que exerceu influência nas ordenações

jurídicas do Brasil.

Percebe-se que as referências dedicadas ao processo de adoção passaram por

momentos de altos e baixos em que era possível questionar a adoção ou até mesmo

revogá-la. Com a criação da Lei nº 3.133/57 que rezava sobre a adoção no Brasil esse

processo tomou novo rumo, pois alterou questões obrigatórias para que houvesse

adoção, modificando o que era estabelecido no Código Civil. Mais tarde a Lei 4.655/65

firmou a legitimidade da adoção. Que por sua vez a legitimidade adotiva foi a

precursora da adoção plena. Porém foi somente com a partir da Instituição do Código de

Menores, que houve considerável progresso, pois os procedimentos que relacionados à

adoção foram definidos.

Muitos anos se passaram desde a criação do Código Civil de 1916 até que fosse

alterado em 2002. As alterações que ocorreram em relação à adoção revogou toda

estrutura anterior, cabendo recorrer à ela somente em caso de direito adquirido. No que

concerne a relação do Novo Código Civil com o Estatuto da criança e do Adolescente, é

preciso que as divergências exigentes sejam redefinidas com o passar dos anos, para que

entre eles haja consonância. A Constituição Federal de 1988 que não prevê distinção

entre adoção simples e adoção plena estabeleceu direitos iguais aos filhos legítimos e

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adotados. E o Estatuto da Criança e do Adolescente firmou princípios de proteção

integral à criança no que se refere à adoção. Daí a adoção passa a ser legitima não só

para os que necessitam de amparo por se encontrarem em situação irregular, mas

também para aquelas que forem postas ao processo de adoção com consentimento dos

pais legítimos. Tanto a CF quanto o ECA estabelecem em seus artigos princípios

que prevêem o bem estar do adotando, definindo normas que auxiliam nas disposições

jurídicas legais necessárias ao processo de adoção. Atualmente a amplitude neste

processo torna mais acessível a efetivação de uma adoção. Isso se deve exatamente pela

presença das relações diferenciadas que foram definidas, tanto para o adotante quanto

para o adotado, e viabilizou novas formas de adoção, antes omitida na jurisprudência

que a legalizava, redefinindo os direitos e deveres atribuídos a eles. Com todo o aparato

legal sob a forma da Lei que o Brasil possui em relação ao processo legal, podemos

dizer que a adoção à brasileira consiste em uma forma de adoção contrária à adoção

legal. Isso porque derivam de uma adoção informal e que não está prevista em nenhuma

Lei.À luz do Direito Penal a adoção à brasileira é considerada um crime previsto no

Código Penal, especificamente no artigo 242, pois consiste em registrar uma criança em

nome de seus adotantes sem que tenha sido feito um processo legal. Apesar de durante

um longo tempo ter ocorrido com freqüência e ser passível de perdão judicial este ato

não deve ser estimulado.Por outro lado, existem situações como o que reza o artigo 339

do Código Civil, que nos leva a questionar a regularidade ou não da adoção à brasileira,

visto que o reconhecimento da paternidade se dá por esferas biológicas e sócio-afetivas.

E é nesse sentido que se faz necessário estudar a adoção à brasileira levando em conta o

laço que a criança estabelece com aquele que o reconheceu como seu filho.Ora realizada

a adoção à brasileira consistiu em reconhecer o adotado como seu filho. Desse modo, ao

tornar-se ciente da ilegalidade os ato não é correto que quem o cometeu queira eximisse

das sanções apenas desfazendo o reconhecimento da paternidade nesta modalidade de

adoção, pois quando o adotante o fez, foi por vontade própria. É preciso que

consideremos os princípios de proteção integral a criança e tenhamos sensatez ao

analisar a adoção à brasileira.

7 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMADA, Ney de Mello. Direito de Família. São Paulo: Tribuna da Justiça, 1990. CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. São Paulo: Revista dos Tribunais,

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