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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE A CONTRIBUIÇÃO DOS CONTOS DE FADAS PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL Por: Vivian de Melo Hammes Orientador Prof. Dr. Carlos Alberto Cereja de Barros Rio de Janeiro 2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A CONTRIBUIÇÃO DOS CONTOS DE FADAS PARA O

DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Por: Vivian de Melo Hammes

Orientador

Prof. Dr. Carlos Alberto Cereja de Barros

Rio de Janeiro

2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A CONTRIBUIÇÃO DOS CONTOS DE FADAS PARA O

DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em

psicopedagogia.

Por: . Vivian de Melo Hammes

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AGRADECIMENTOS

À Deus pela minha vida, ao meu

esposo pelo incentivo de todos os dias,

aos meus pais por sempre

acreditarem, aos amigos pelas

alegrias.

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DEDICATÓRIA

A todos que acreditaram em minha

capacidade.

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RESUMO

A presente pesquisa tem por objetivo apresentar os benefícios dos

contos de fadas para o desenvolvimento infantil. O estudo se deu na área da

psicologia, pois investiga o processo de desenvolvimento psicológico através

do imaginário infantil, tendo como instrumento, os contos de fadas.

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METODOLOGIA

A presente pesquisa teve como base estudos bibliográficos.

Primeiramente foram selecionados livros de autores especialistas no tema e a

partir da leitura destes, houve uma seleção de subtemas relacionados ao tema

central da pesquisa.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I 10

CAPÍTULO II 16

CAPÍTULO III 31

CONCLUSÃO 44

BIBLIOGRAFIA CITADA 46

ÍNDICE 47

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INTRODUÇÃO

Quem nunca viajou na mágica de um conto de fada?

“Se quiser falar ao coração dos homens, há de se contar

uma história. Dessas onde não faltem animais, ou deuses

e muita fantasia. Porque é assim – suave e docemente que

se despertam consciências”. LA FONTAINE

Os contos de fadas perpassam a infância da criança envolvendo,

encantando e transformando a vida de cada uma delas. Histórias conhecidas

de todos são as preferidas dos pequenos, tais como: A Bela Adormecida, A

Branca de Neve, Os Três Porquinhos entre outras. Percebe-se que cada uma

delas apresenta estrutura semelhante. Um início bom, obstáculos no

desenrolar das estórias, bruxas, pessoas malvadas, lobos traiçoeiros,

desobediência com conseqüências graves e em seguida ações que levam as

soluções. O bem e o mal se confrontam todo o tempo, porém todas terminam

com um final feliz, é a fada que protege, a bruxa que leva a pior, o caçador que

mata o lobo, o príncipe encantado que chega a cavalo com todo o seu encanto

e amor, salva a princesa, casa com ela e vivem felizes para sempre em um

grande castelo.

De certo, tantas emoções e informações contribuem positivamente

para o desenvolvimento da personalidade das crianças. O mundo da fantasia, o

acreditar que existe o bem e que ele é mais forte e sempre vence o mal traz a

certeza de que tudo é possível. Essa crença adquirida quando criança

possivelmente contribuirá para que, quando adultos, encarem as dificuldades

da vida de forma mais otimista. A fantasia e o sonho são direitos de todas as

crianças.

No decorrer dos capítulos iremos perceber a grandiosidade dos

contos de fadas para o pensamento infantil uma vez que, na fase adulta

percebemos as dificuldades de um adulto em aceitar e enfrentar suas próprias

incertezas expressas nas aventuras dos contos, já com criança este

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9envolvimento se dá de forma imediata. A beleza e a linguagem dos contos são

captadas, pois se aproximam de seu próprio mundo inconsciente. Ao ouvir os

contos a criança desenvolve o psiquismo. Primeiramente, porque ela tem o

desafio intelectual de compreender uma narrativa tão rica, intrincada e bem

urdida, como a dessas histórias, pedindo para ouvi-la várias vezes, até

alcançar este objetivo. E também porque, dominando o conflito da história, ela

está dominando seus próprios conflitos internos, ou seja, para retornar à

afirmação de Tolstói, os contos, com toda a sua fantasia, não transmitem

falácias, e sim a mais profunda verdade.

Pelo encanto que produzem e pela importante função afetiva que

têm para crianças, jovens e adultos, os contos de fadas deveriam ser

retomados pela escola, não apenas em momentos esporádicos e

descomprometidos de leitura, mas como uma parte da herança cultural da

humanidade sobre a qual os alunos possam pensar e agir, das mais diferentes

formas – em atividades plásticas, simbólicas, cênicas, de leitura e escrita, e

tantas outras quanto a realidade de cada sala de aula, nas diversas faixas-

etárias, possa propor como desafio a pais e educadores.

Pela imensa riqueza e poder de suas palavras, os contos de fadas

merecem um espaço a eles reservado em qualquer projeto político-

pedagógico.

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CAPÍTULO I

A HISTÓRIA DA ESTÓRIA

1.1) Etimologia da expressão “contos de fadas”

A palavra portuguesa "fada" vem do latim fatum (destino, fatalidade, fado

etc). O termo se reflete nos idiomas das principais nações européias: fée em

francês, fairy em inglês, fata em italiano, feen em alemão e hada em espanhol.

Por analogia, os "contos de fadas" são denominados conte de fées na França,

fairy tale na Inglaterra, cuento de hadas na Espanha e racconto di fata na Itália.

Na Alemanha, até o século XVIII era utilizada a expressão feenmarchen, sendo

substituída por märchen ("fábula popular", "história fantasiosa") depois do

trabalho dos Irmãos Grimm. No Brasil e em Portugal, os contos de fadas, na

forma como são hoje conhecidos, surgiram em fins do século XIX sob o nome

de contos da carochinha. Esta denominação foi substituída por "contos de

fadas" no século XX.

1.2) A origem dos contos de fadas

Os contos de fada têm perpetuado há milênios, atravessando todas as

geografias, mostrando toda a força e a perenidade do folclore dos povos.

Antes de entendermos a influência e a importância dos contos na vida de uma

criança primeiro é certo compreendermos o que este significa, como se

compõe e suas personagens. Uma das persogem importante é a Fada, estas

são entidades fantásticas.Apresentam-se como mulheres de grande beleza,

imortais e dotadas de poderes sobrenaturais, capazes de interferir na vida dos

mortais em situações-limite. As fadas também podem ser seres ruins e

diabólicos, sendo chamadas "bruxas" em tal condição; embora as bruxas

"reais" sejam usualmente retratadas como megeras, nem sempre os contos

descrevem fadas "do mal" como desprovidas de sua estonteante beleza.

As primeiras referências às fadas surgem na literatura cortesã da Idade

Média e nas novelas de cavalaria do Ciclo Arturiano, tomando por base textos-

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11fontes de origem reconhecidamente céltico-bretã. Tal literatura destaca o amor

mágico e imortal vinculado às figuras de fadas como Morgana e Viviana, o que

evidencia o status social elevado das mulheres na cultura celta, na qual

possuíam uma ascendência e um poder muito maiores do que entre outros

povos contemporâneos (ou posteriores). Conforme destaca Coelho (1987, p.

34):

“Na maioria das tradições, as fadas aparecem ligadas ao

amor, ou sendo elas próprias as amadas, ou sendo

mediadoras entre os amantes. A partir da cristianização

do mundo, foi esse último sentido que predominou,

perdendo-se completamente aquela outra dimensão

"mágica", sobrenatural.“

Porém é importante ressaltar que um conto pode ou não ter a presença

de uma fada, mas sempre terá a presença de magia e encantamentos.

Em sua estrutura os contos de fada sempre apresentará no núcleo da

história um “problema” de ordem existencial, isto é o herói ou a heroína almeja

a realização e a superação pessoal. Os problemas anteriormente citados

constituem de verdadeiros rituais de iniciação para esses heróis, pois a partir

de sua vitória a sua vida terá uma mudança significativa.

Esopo, herói popular da Trácia, a quem se reputa o ofício de ter sido no

século VI a.C. um proeminente contador de fábulas.Segundo Philip (1998)

quem lê “Cinderela” não imagina que há registros de que essa história já era

contada na China, durante o século IX d.C e assim como tantas outras. Logo

percebemos a força que essas estórias detêm. A primeira coleção de contos,

porém, com motivos do folclore europeu, denominada Gesta Romanorum, só

surgiria no século XIV, escrita em latim. Precedeu em poucos anos As Mil e

uma Noites, famosos contos árabes de magia e aventura, de origem persa, que

datam dos séculos XIV a XVI. Tudo começa com a desilusão do califa Shahryar

ao descobrir que seu irmão Shazeman era traído pela esposa. Resolve então

que nunca deixaria que consigo acontecesse tamanha desonra, e decide

dormir com mulheres sempre virgens para no dia seguinte entregá-las a seus

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12soldados para a morte. Até que a corajosa Sherazade, filha de seu principal

vizir, contrariando os conselhos de seu pai, oferece-se para o califa. Propondo-

se a evitar maior matança, passa a contar-lhe todas as noites, após se

amarem, uma história que ela sempre interrompia em seu ponto culminante,

fazendo com que seu amo a poupasse até a noite seguinte, quando então,

continuava a narrativa.

As Mil e uma Noites têm por pano de fundo o apogeu do mundo árabe

alcançado durante o reinado de Harum-el-Raschid, quinto califa da dinastia dos

Abácidas, século VIII d.C. Aladim e o gênio da lâmpada, Simbá, o marujo, e Ali

Babá são alguns dos personagens que por três anos mantiveram viva

Sherazade, até que, por fim, estando o califa completamente apaixonado por

ela e transformado interiormente pela beleza de suas histórias, liberta-se de

sua depressão, suspende a pena, e a pede em casamento. Os contos das

"Noites Árabes" haviam servido a el-Raschid como verdadeira terapia! A

propósito, este é o procedimento adotado desde a antigüidade pela medicina

hindu, chamada Ayurveda, na qual os pacientes são convidados a meditar

sobre contos de fadas para que suas mentes se purifiquem, condição prévia

para que qualquer cura seja alcançada.

O título dado às histórias de Sherazade, assim como o modelo adotado

por Bocaccio (1313-1375) no Decameron, bem serviram ao italiano Giovanni

Straparola (1480-1557) que imaginou uma reunião de jovens, isolados do

mundo, entretidos em suas narrativas de fadas. O conjunto, batizado por

Piacevoli Notti (Noites de Prazer), foi publicado de 1550 a 1553. Muitas de suas

idéias seriam depois adaptadas pelo francês Charles Perrault (1628-1703), até

nossos dias lembrado por seus Contos da Mamãe Gansa, que vieram a público

em 1697 trazendo uma versão de "Chapeuzinho Vermelho" em que o lobo sai

vitorioso da história, após haver jantado a vovó e comido em seguida a menina

de sobremesa.

O literato justificava-se dizendo que sua narrativa era de valor eminentemente

moral, e que as crianças bem deviam saber o preço da desobediência aos pais.

Foi seu contemporâneo Jean de La Fontaine (1621-1695), imortalizado

por suas Fábulas, publicadas entre 1668 e 1694, de cunho igualmente moral,

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13que passaram a ser contadas nas escolas da época e permanecem populares

até hoje. O alemão Gotthold Lessing, por considerar as sátiras de La Fontaine

muito leves, em 1759 edita seu Fabels (Fábulas), cujo teor trazia lições bem

mais severas que as da moral francesa.

Somente no século seguinte, porém, é que o jardim da infância

floresceria definitivamente com a paciente pesquisa feita pelos irmãos Grimm

na Alemanha. Os filólogos Jacob Grimm (1785-1863) e Wilhelm Grimm (1786-

1859), lingüistas e folcloristas, colecionaram contos de encantamento por toda

parte da Europa, e lançaram de 1812 a 1815, em dois tomos, Os Contos de

Fadas dos Irmãos Grimm, que, desde então, vêm sendo adaptados em quase

todos os idiomas, e transformados em elemento essencial da literatura infantil.

Jacob era o mais intelectualizado dos irmãos, mas Wilhelm era quem detinha a

verve da poesia; juntos chegaram a editar 210 histórias, a maior parte delas

encontrada nos dois volumes originais. Em 1983, descobriu-se um manuscrito

com conto inédito na coleção dos Grimm.

Outro autor de novelas, peças de teatro, roteiros de viagens, memórias

e poesias, consagrado por seus contos de fada, foi o dinamarquês Hans

Christian Andersen (1802-1875), filho de um humilde sapateiro e de uma

iletrada mãe, mulher supersticiosa que o influenciou bastante por passar-lhe a

tradição oral do campo. Em 1835 publicou Histórias Contadas às Crianças,

com seus quatro primeiros contos. Até 1872, produziu 168 histórias, logo

traduzidas em diversos países, comumente publicadas em séries de quatro

narrativas por livro. Combinando à fantasia infantil sua aguçada sabedoria,

encantou igualmente o público adulto, repetindo a mística do fenômeno

provocado pelos irmãos Grimm; hoje sua obra acha-se traduzida em mais de

100 línguas.

Ainda no século XIX, os românticos alemães Goethe e Ernst Hoffman , e

o inglês Oscar Wilde são exemplos dos que também se dedicaram à literatura

infantil. E citemos com orgulho Monteiro Lobato (1882-1948) que, preocupado

em edificar os jovens, produziu extensa literatura infanto-juvenil de cunho

pedagógico, adaptando para as crianças brasileiras as Fábulas de Esopo.

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14Já nos séculos XVI e XVII d.C, na França, explica Cadermatori (1986),

os de maior repressão religiosa, devido as contradições econômica e

repressões religiosas (a violência da Contra Reforma). Os legisladores e bispos

impunham a sua vontade as massas camponesas, porém seus objetivos não

eram de educar, mas sim o controle da fé e, por conseguinte a lealdade. Nesse

período o processo de cristianização se mistura com o paganismo residual e é

nesse contexto que se situa o folclore. Dentre as manifestações folclóricas do

povo há os contos, que refletiam as contradições e crises pelas quais o povo

passava e apresentavam uma solução possível, o da classe sofrida e

marginalizada que o gerou.

Segundo o autor, a literatura Infantil começa adaptada, primeiramente

pelo francês Charles Perrault, que escreveu os clássicos Chapeuzinho

Vermelho e Cinderela, que são contos e lendas da Idade Média adaptados, é

importante ressaltar que os contos de fadas foram os primeiros livros

destinados à criança. Já no século XIX os alemães irmãos Grimm coletam

outros contos populares, Rapunzel, João e Maria, alargando a antologia dos

contos de fadas. O dinamarquês Christian Andersen escreve O patinho Feio e

Os trajes do imperador, o italiano Collodi , Pinóquio, O inglês Lewis Carrol,

Alice no país das maravilhas, o americanos Frank Baum, O Mágico de Oz e o

escocês James Barrie, Peter Pan.

Mas por que nos impressionam tanto aos adultos quanto as crianças, os

contos de fada? Por certo, não apenas pelos homens que ao longo dos

séculos dedicaram-se à sua compilação, visto que tais contos sempre foram

populares como tradição oral, mas, antes, porque suas histórias são

instigantes. Não há como alcançar completamente seu sentido em termos

puramente intelectuais, fato que nos desperta a percepção intuitiva e não sabe-

se ainda em que e porque encanta a todos.

1.3) Os contos de fada e a psicanálise

Os contos de fada podem ser vistos como verdadeiras e pequenas obras

de arte; são capazes de tocar e envolver em seu enredo. Eles nos instigam a

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15mente e comovem com a história de seus personagens e toda a sua fantasia.

O impacto causado em nosso psiquismo vem devido às nossas experiências

vivenciadas. Os contos oportunizam que nos identifiquemos com as

dificuldades ou alegrias dos heróis, cujos feitos narrados expressam a condição

humana frente às dificuldades da vida.

De certo ficou mundialmente reconhecido que os contos de fada e a

psicanálise tem uma ligação, já que aqueles mexem e falam das emoções

humanas. Grandes autores falam dessa ligação. Franz (1990, p.25) cita Jung:

“...é nos contos de fada onde melhor se pode estudar a

anatomia comparada da psique. Nos mitos, lendas ou

qualquer outro material mitológico mais elaborado obtém-

se as estruturas básicas da psique humana através da

grande quantidade de material cultural. Mas nos contos

de fada, existe um material consciente culturalmente

muito menos específico e, conseqüentemente, eles

oferecem uma imagem mais clara das estruturas

psíquicas.” (FRANZ, 1990: 25).

O Dr. Bruno Bettelheim, em sua obra (1980, p. 13), traz a contribuição

de que a vida é desconsertante para a criança, e ela precisa aprender a

entendê-la, para saber lidar com ela. Para ser bem suscedida nesse aspecto

ela deve receber ajuda para que possa, assim, dar algum sentido à vida e aos

seus sentimentos. A criança encontra este tipo de significado nos contos de

fadas.

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CAPÍTULO II

OS CONTOS DE FADAS, UMA ABORDAGEM

PSICANALÍTICA

Para fazermos uma ligação entre os contos e a psicanálise

primeiramente, de forma reduzida é preciso colocar em pauta alguns conceitos

psicanalíticos. Nossa psique se constitui de três estruturas dinâmicas, o Id

(princípio do prazer), o Ego (princípio da realidade) e o Superego (princípio

moral). Dessas três estruturas, nascemos dotados apenas do Id, sendo que as

outras duas estruturas terão de ser construídas na relação do sujeito com o

mundo que o cerca.

O Id é a fonte de nossa energia original (libido), que nos sustenta e

motiva a mover-nos em direção ao mundo, buscando satisfazer nossos desejos

(pulsões). Mas o Id não se preocupa que esses desejos se realizem de forma

concreta. Ele se satisfaz com realizações alucinatórias, através de imagens

que condensam muitos desejos num só objeto criado pela imaginação.

Também não se preocupa com tempo e espaço. Para o Id, tudo o que

acontece é aqui e agora.

As crianças pequenas, que passarão ainda por longo processo de

sublimação dos desejos libidinais do Id, estão sob forte influência desse

aparelho de nossa mente, e a linguagem simbólica, não-verbal desses contos,

comunica-se diretamente com o imaginário da criança.

Quando se pensa em contos de fada, temos como questionamento

como estes influenciam as crianças, o que falam as pequenas cabecinhas e a

mensagem que toca nos seus corações. Os contos de fada falam diretamente

à criança e a atinge no mais íntimo de seus sentimentos. Aproximadamente

nos últimos 100 anos, os contos de fadas e seu significado oculto têm sido

objeto da análise dos seguidores de diversas correntes da Psicologia. Cashdan

(2000, p. 33), por exemplo, sugere que os contos seriam "psicodramas da

infância" espelhando "lutas reais". Na visão de Cashdan (2000, p. 25), "embora

o atrativo inicial de um conto de fada possa estar em sua capacidade de

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17encantar e entreter, seu valor duradouro reside no poder de ajudar as crianças

a lidar com os conflitos internos que elas enfrentam no processo de

crescimento". A luz da psicanálise, os contos de fadas revelam os conflitos de

cada um e a forma de superá-los e recuperar a harmonia existencial. Assim a

tão famosa dicotomia entre o bem e o mal, presta-se numa terapia, a uma

análise mais contundente da personalidade, na qual se permite trabalhar com

sentimentos inconscientes que revelam a verdadeira personalidade

(CEZARETTI, 1989: 26).

Diz Bettelheim (1980: 16):

“Para dominar os problemas psicológicos do crescimento -

separar decepções narcisistas, dilemas edípicos, rivalidades

fraternas, ser capaz de abandonar dependências infantis; obter

um sentimento de individualidade e de autovalorização, e um

sentido de obrigação moral - a criança necessita entender o que

se está passando dentro de seu eu inconsciente. Ela pode atingir

essa compreensão, e com isto a habilidade de lidar com as

coisas, não através da compreensão racional da natureza e

conteúdo de seu inconsciente, mas familiarizando-se com ele

através de devaneios prolongados - ruminando, reorganizando e

fantasiando sobre elementos adequados da estória em resposta a

pressões inconscientes. Com isto, a criança adequa o conteúdo

inconsciente às fantasias conscientes, o que a capacita a lidar

com este conteúdo. É aqui que os contos de fadas têm um valor

inigualável, conquanto oferecem novas dimensões à imaginação

da criança que ela não poderia descobrir verdadeiramente por si

só. Ajuda mais importante: a forma e estrutura dos contos de

fadas sugerem imagens à criança com as quais ela pode

estruturar seus devaneios e com eles dar melhor direção à sua

vida.“

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18Segundo Bettelheim (1980), a fantasia facilita a compreensão das

crianças, pois se aproxima mais da maneira como vêem o mundo, já que ainda

são incapazes de compreender respostas realistas. Não esqueçamos que as

crianças dão vida a tudo. Para elas, o sol é vivo, a lua é viva, assim como todas

os outros elementos do mundo, da natureza e da vida. "Os "Contos De Fadas"

são significativos para a criança que ainda não consegue compreender o

sentido dos conceitos éticos abstratos.Eles trazem mensagens á mente

consciente, á pré,consciente e á inconsciente,em qualquer nível que a mente

esteja funcionando no momento. Lidando com problemas humanos

universais,particularmente os que preocupam o pensamento da criança,estas

estórias falam ao ego em germinação e encorajam o seu

desenvolvimento,enquanto aliviam as pressões pré-conscientes e

inconscientes.À medida que as estórias se desenrolam, dão validade e corpo

ás pressões do id, mostrando caminhos para satisfaze-las e que estão de

acordo com as requisições do ego do super ego. E o Dr. Bettelheim prossegue:

" A mensagem dos "Contos De Fadas" transmitem o seguinte recado ás

crianças e de uma forma múltipla : que uma luta contra dificuldades graves na

vida é inevitável,é parte intrínseca da existência humana - mas que se a

pessoa não se intimida mas se defronta de modo firme com as opressões

inesperadas e muitas vezes injustas,ela dominará

todos os obstáculos e, ao fim emergirá vitoriosa”

Falar sobre histórias infantis é sem dúvida, falar sobre a imaginação.

Sosa,(1982), assinala essa importância quando menciona a etapa criadora

dentro do problema geral da imaginação, uma vez que não se sabe bem em

que idade, nem em que forma e circunstâncias ela aparece na criança.

Concluindo o capítulo sobre os “caracteres da imaginação infantil”, o mesmo

autor afirma que a imaginação é a “faculdade soberana” e a forma mais

elevada do desenvolvimento intelectual. Se em outros componentes

curriculares, dá-se atenção concentrada a conteúdos significativos para as

crianças,nos contos ou na literatura infantil encontramos o espaço privilegiado

para estimular o sujeito como elemento gerador das hipóteses mágicas.

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19Pela maneira que expõe o inusitado por toda a fantasia apresentada em

cada frase da história, os contos provocam uma reviravolta em nosso mundo

psíquico que, estimulado, aguça-se na tentativa de compreendê-las. E não há

como explicá-las pelos padrões da razão metódica. As histórias de fadas é por

si sua melhor explicação, do mesmo modo que as obras de arte encerram

aspectos que fogem do alcance do intelecto, já que suscitam emoções capazes

de comover os que diante delas se colocam. O significado desses contos está

guardado na totalidade de seu conjunto, perpassado pelos fios invisíveis de

sua trama narrativa. Claro que, diante desse mistério, muitas formas de

abordá-lo são possíveis e igualmente válidas, posto que acrescentam luz à sua

compreensão.

A origem dos contos de fadas, segundo Marie Louise Von Franz (apud

GIGLIO, 1991: 3), parece residir em uma potencialidade humana arquetípica

(aliás, não somente os contos de fada, como todas as fantasias). Antigamente

os pastores, lenhadores e caçadores, passavam bom tempo de suas vidas

sozinhos nas florestas, campos e montanhas. Acontecia que repentinamente

eram assaltados por uma visão interior muito forte, que os alvoroçava por

inteiro. Corriam então de volta a suas aldeias e relatavam o que lhes tinha

acontecido a todos que o quisessem ouvir. Daquela visão inicial, iam-se

formando lendas, e mais tarde “contos maravilhosos”. O pensamento mítico, no

caso dessas visões espontâneas, é compreendido como um pensamento

essencialmente pré-lógico, elementar e arquetípico. Os arquetípicos por

definição, são fatores e motivos que ordenam os elementos psíquicos em

imagens, de modo típico.

Como afirma Jung (apud GIGLIO, 1991: 15), os contos de fada

constituíram através dos séculos instrumentos para a expressão do

pensamento mítico, perpetuando-se no tempo por desempenharem uma

função psíquica importante relacionada ao processo da individuação: através

deles toma-se consciência e vivencia-se arquétipos do inconsciente coletivo.

Esses arquétipos, por sua vez, ao serem trazidos à consciência e

dramaticamente vivenciados permitem a Psique cumprir as etapas de

integração progressiva do desenvolvimento da persona, conscientização da

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20sombra, confrontação com a anima / animus e outros arquétipos, e finalmente

atingir um estado onde a comunicação Ego-Self seja fluente e criativa (apud

THOMPSON, 1969: 152). Ainda a partir de uma perspectiva junguiana, (apud

THOMPSON, 1969: 152) existe um lado masculino e um lado feminino em

cada um de nós. Se o masculino é dominante, o feminino é recalcado. O

indivíduo bem conformado necessita desenvolver ambos os aspectos. Também

existem quatro características principais em cada um de nós: pensamento,

sentimento, sensação e intuição. Constituem pares de oponentes. Nos homens

o pensamento e a sensação constituem, habitualmente, características

conscientes, ao passo que o sentimento e a intuição encontram-se recalcados.

Nas mulheres, sentimentos e intuição são predominantes. O lado feminino

recalcado do homem é denominado anima, o lado masculino da mulher é o seu

animus.

Em Franz (apud GIGLIO, 1991: 6), os contos de fada numa visão

junguiana são uma representação simbólica de problemas gerais humanos e

suas soluções possíveis, ou seja, as representações da fantasia são tão

primárias e originais como os próprios desejos e instintos. Nos conteúdos dos

contos de fada é possível ver uma projeção dos estágios originais e

arquetípicos do desenvolvimento da consciência humana. Nos símbolos do

inconsciente, nos sonhos e fantasias, encontram-se os mesmos princípios da

expressão dos mitos e contos de fada, o que, representa um recurso

fundamental no processo do desenvolvimento humano.

Conforme Araújo (1980: 39), para Jung certas lendas, mitos e símbolos

têm origem na infância da humanidade em que faltando recursos intelectuais, o

homem apresentava uma disposição natural para aceitar o sobrenatural. Seria

assim uma necessidade psicológica de buscar soluções mágicas e de criar

seres fantásticos para superar uma realidade que lhe impunha limitações. O

inconsciente coletivo, guardaria assim, uma necessidade de retorno as origens

do homem revivendo experiências anteriores da humanidade.

À luz da psicanálise, os contos de fadas revelam os conflitos de cada um

e a forma de superá-los e recuperar a harmonia existencial. Assim a tão

famosa dicotomia entre o bem e o mal, presta-se numa terapia, a uma análise

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21mais contundente da personalidade, na qual se permite trabalhar com

sentimentos inconscientes que revelam a verdadeira personalidade

(CEZARETTI, 1989: 26).

Diz Bettelheim (1980: 16):

“Para dominar os problemas psicológicos do crescimento

- separar decepções narcisistas, dilemas edípicos,

rivalidades fraternas, ser capaz de abandonar

dependências infantis; obter um sentimento de

individualidade e de autovalorização, e um sentido de

obrigação moral - a criança necessita entender o que se

está passando dentro de seu eu inconsciente. Ela pode

atingir essa compreensão, e com isto a habilidade de

lidar com as coisas, não através da compreensão

racional da natureza e conteúdo de seu inconsciente,

mas familiarizando-se com ele através de devaneios

prolongados - ruminando, reorganizando e fantasiando

sobre elementos adequados da estória em resposta a

pressões inconscientes. Com isto, a criança adequa o

conteúdo inconsciente às fantasias conscientes, o que a

capacita a lidar com este conteúdo. É aqui que os contos

de fadas têm um valor inigualável, conquanto oferecem

novas dimensões à imaginação da criança que ela não

poderia descobrir verdadeiramente por si só. Ajuda mais

importante: a forma e estrutura dos contos de fadas

sugerem imagens à criança com as quais ela pode

estruturar seus devaneios e com eles dar melhor direção

à sua vida.”

A psicóloga e psicoterapeuta Sophia Rozzana Caracushansky, doutora

em Psicologia pela USP (apud CEZARETTI, 1989: 26), afirma que os contos de

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22fadas, usados em terapia, fornecem o estilo e a personalidade. Sua utilidade

deu-se primeiramente, pelo criador da Psicanálise, Sigmund Freud, que, a título

de estudo, analisou a vida de personalidades como Leonardo da Vinci através

do confronto com mitos.

A psicanálise freudiana propõe que, numa análise, confronta-se o aqui e

agora do paciente com sua história passada à luz dos contos de fadas. Tal

sistemática permite que se reviva a primeira impressão, aquela que causou o

trauma, a base do conflito (edipiano) que assemelha-se sempre a um conflito

existente em um conto de fadas. A partir da localização do problema, o

paciente pode ser tratado adequadamente - explica Sophia Caracushansky

(apud CEZARETTI, 1989: 26).

Já dentro do enfoque oferecido pelo psicanalista Carl Gustav Jung (apud

CEZARETTI, 1989: 26), a análise terapêutica tem por base os sonhos que

fornecem uma indicação precisa da problemática. Analisando os sonhos o

terapeuta consegue precisar ou localizar o conflito do paciente, ou o “conto de

fadas” que está vivendo, orientando-o para enfrentar os obstáculos à sua

realização.

Os contos de fadas inseridos em seu universo maravilhoso impele a

criança em seu imaginário viver uma situação que pode acontecerr na

realidade, mas de forma mais branda em sua imaginação e emoção. Ao

mesmo tempo que a que elas vivem a estória essa tem a certeza de que ao se

passar num lugar que é apenas esboçado, fora dos limites do tempo e do

espaço, mas onde qualquer um pode caminhar não as deixam ansiosas,

porque todo esse processo é vivido através da fantasia, do imaginário, com

intervenção de entidades fantásticas , tais como, bruxas, fadas, duendes,

gigantes entre outros. (ABRAMOVICH, 1995, p.120).

Os personagens dos contos eternizados pela humanidade através dos

séculos, tem os seus perfis muito bem traçados, eles resumem sentimentos e

características em uma forma de representação não verbal da qual a criança se

apropria sendo utilizada como referência pelo seu Id. A respeito desses

personagens, diz-nos Abramovich:

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23“Daí que haver numa história fadinhas atrapalhadas,

bruxinhas que são boas ou gigantes comilões não

significa – nem remotamente – que ela seja um conto de

fadas... Muito pelo contrário. Tomar emprestado o nome

das personagens-chaves desses contos não faz com que

essas histórias adquiram sua dimensão simbólica... A

magia não está no fato de haver uma fada anunciada já

no título, mas na sua forma de ação, de aparição, de

comportamento, de abertura de portas...”

(ABRAMOVICH, 1995, p.121).

O motivo pelo qual as crianças se idetificam com os personagens é em

primeiro lugar é que, os personagens de contos de fadas não têm nome

próprio, mas sim nomes que são ligados às suas características físicas e

emocionais. “Branca de Neve” tem esse nome porque sua pele é branca como

a neve; “Bela Adormecida” assim se chama porque de fato adormece por 100

longos anos; e “Gata Borralheira” porque suas irmãs invejosas obrigam-na a

dormir no borralho (cinza), significado de onde também vem seu outro nome,

“Cinderela”.Com isso a identificação se torna mais fácil. Não tendo nome, ele

não tem uma identidade própria, e assim pode emprestar sua personalidade

aquele que ouve a estória e pode se imaginar como tal personagem. vale

ressaltar o detalhe que os personagens não têm idade cronológica definida;

podemos dizer que sua idade situa-se, aproximadamente, entre os 8 e os 80

anos.

As características presentes na infância (vergonha, medo, insegurança

etc.) tembém são caracteríticas se torna uma dos principais vínculos entre os

personagens e a criança, já que tais característica também fazem parte da

personalidade dos personagens.Seus familiares também não têm idade

definida; a mãe tem idade para ser qualquer mãe, e o pai idade para ser

qualquer pai. Nos contos, ou o personagem é o herói “completamente bom” ou

o vilão “completamente mau” dessa forma, os personagens funcionam da

mesma maneira que a mente infantil.

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24A criança tende a separar os objetos de sua afeição em bons ou maus,

pois é difícil para ela aceitar que alguém que ela ama possa negar-lhe, por

vezes, a realização de seus desejos, e desgostar-se com isso, sem, contudo,

deixar de amar a pessoa querida.Essa é uma característica de cunho

psicanalítico é presente no bebê, que ao ser amamentado, vê a mãe “boa” que

o alimenta, bem como a mãe “má” que o desmama. A fim de assim poder

manter o relacionamento amoroso com a mãe, projeta as características

negativas em algum outro objeto que ele possa rejeitar. Sendo assim,

pensamento mágico, que projeta no outro as suas próprias deficiências,

perdura durante toda a primeira infância e retorna na adolescência. Logo, é

muito fácil para as crianças e jovens identificarem-se com os personagens do

conto, pois possuem essa mesma estrutura. Porém essa projeção não acarreta

à criança a negaçaode sua própria parte má, pois ela não se identifica apenas

com a “Chapeuzinho Vermelho” boazinha, mas também com o “Lobo Mau” .

Sobre esse processo de identificação com os personagens do conto, diz-nos

Marly Amarilha:

“Através do processo de identificação com os

personagens, a criança passa a viver o jogo ficcional

projetando-se na trama da narrativa. Acrescenta-se à

experiência o momento catártico, em que a identificação

atinge o grau de elação emocional, concluindo de forma

liberadora todo o processo de envolvimento. Portanto, o

próprio jogo de ficção pode ser responsabilizado,

parcialmente, pelo fascínio que (o conto de fadas) exerce

sobre o receptor.”(AMARILHA, 1997, p. 18)

Dessa forma, os contos de fadas e os personagens ao servirem de

suporte referencial de identificações com o ouvinte desempenham um

importante papel para a saúde mental desse último, permitindo-lhe elaborar

seus sentimentos mais profundos e contraditórios. Esse tipo de identificação se

dá através do jogo simbólico, presente em muitas das brincadeiras

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25espontâneas infantis, como brincar de casinha, médico, escola e tantas outras

brincadeiras que qualquer criança faz, sem que seja necessária a intervenção

de um adulto. Mas, nos contos, essas fantasias adquirem uma dimensão mais

ampla e profunda:

“Na brincadeira normal, objetos tais como bonecas e

animais de brinquedo são usados para incorporar vários

aspectos da personalidade da criança que são muito

complexos, inaceitáveis e contraditórios para ela

enfrentar. Isso permite que o ego da criança consiga

algum domínio sobre estes elementos, o que ela não

pode fazer quando solicitada ou forçada pelas

circunstâncias a reconhecê-los como projeções de seus

processos internos.Algumas pressões inconscientes nas

crianças podem ser elaboradas na brincadeira. Mas

muitas não se prestam a isso porque são muito

complexas e contraditórias, ou muito perigosas e

socialmente desaprovadas.”(BETTELHEIM, 1980, p. 71)

As profundas pressões inconscientes profundas não podem ser

representadas por uma simples brincadeira de casinha, por exemplo, devido ao

seu conteúdo potencialmente violento e destrutivo, mas estão representadas

no universo simbólico dos contos de fadas, através das vitórias dos heróis e da

crueldade que os vilões dos contos de fadas podem desempenhar.

Ao pensarmos no Lobo engolindo a Vovozinha, na bruxa desejando

comer Joãozinho, não imaginamos como as crianças podem gostar de

histórias tão violentas?. Daí nasce a censura por parte dos adultos, dando-lhes

uma aspecto moralizante, como o fez Perrault na corte francesa, e Walt Disney

nos tempos atuais, esvaziando seu potencial conteúdo mágico.

Sob esse aspecto, vale lembrar duas características dos contos de

fadas, uma histórica, e outra, psicológica.Como já o havíamos demonstrado

antes, esses contos originam-se da tradição oral popular, portanto de classes

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26sociais cuja vida era triste e dura como as crueldades das histórias que

criaram.Diz-nos Lígia Cadermatori, sobre o aparente horror dos contos de

fadas:

“Esses aspectos estão no âmago dos contos de fada e,

malgrado a cristianização e os propósitos moralizantes,

eles permanecem perversos, amorais e angustiantes

como legítimo produto da classe sofrida e marginalizada

que os gerou.”(CADERMATORI, 1986, 38)

Já sob a faceta psicológica, podemos afirmar que são exatamente os

detalhes escabrosos dos contos os de maior significado na

história.Invariavelmente, qualquer conto de fada segue um enredo no qual o

herói abandona a casa de seus pais, passa por diversas privações (seja na

floresta escura, na casa de doces da bruxa, no castelo mal-assombrado) e

então, como Fênix, renasce das cinzas, glorioso e triunfante, e vive “feliz para

sempre”.

O ponto crucial dos contos de fadas está justamente na superação do

herói, pois se ele não fosse capaz de superar as privações que passa, oriundas

das atrocidades dos vilões, ele não conseguira triunfar no final da história – é

exatamente aí que reside a mensagem positiva que as crianças guardam dos

contos e seus horrores.

Isso acontece porque a narrativa dos contos reproduz a história de vida

de qualquer criança. Ela nasce protegida pela família (equivalente à casa

paterna dos contos), e vive lá até alcançar a maturidade. Quando madura, é

obrigada a deixar a segurança da casa paterna para conquistar outros

mundos viver outras situações: começa a freqüentar a escola, a fazer amigos

fora de casa e a ter de resolver seus conflitos com eles. É justamente essas

relaçòes que a fará uma adulto independente e autônomo nas relações adultas.

Os contos permitem as crianças, por mais que tenham problemas, poder

enfretar e superar os obstáculos impostos. Diz-nos Amarilha:

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27“Pelo processo de ‘viver’ temporariamente as conflitos,

angústias e alegrias dos personagens da história, o

receptor multiplica as suas próprias alternativas de

experiências do mundo, sem que com isso corra risco

algum.” (AMARILHA, 1997, p. 19)

Por esse motimo se tornam tão significativas as estróias com cunho

moralizante contadas às crianças, juma vez que enfatizadas e internalizada

essa mensagens, as que deveriam ser válidas acabam passando

despercebidas pelas crianças.

“Se o adulto não tiver condições emocionais para contar

a história inteira, com todos os seus elementos, suas

facetas de crueldade, de angústia (que fazem parte da

vida, senão não fariam parte do repertório popular...),

então é melhor dar outro livro para a criança ler... Ou

esperar o momento em que ela queira ou necessite dele

e que o adulto esteja preparado para contá-lo... De

qualquer maneira, ou se respeita a integridade, a

inteireza, a totalidade da narrativa, ou se muda a

história... (e isso vale, aliás, como conduta para qualquer

obra literária, produzida em qualquer época, por qualquer

autor... Mutilar a obra alheia, acho que é um dos poucos

pecados indesculpáveis...).” (ABRAMOVICH, 1995,

p.121)

Cabe aos pais e professores oportunizar o pensamento e a fantasia da

criança sobre o conto, sugerindo-lhe que desenhe livremente sobre a história,

reconte-na a seu próprio modo, deixando-a brincar de faz de conta com

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28fantasia. Isso porque, ao ouvir de novo o conto, a criança está empenhada em

uma das mais importantes tarefas, segundo a psicanálise, para a construção

de sua personalidade. Tarefa essa que somente ela mesma, e nenhum agente

externo, pode fazer, e que o conto permite-lhe compreender e elaborar a nível

simbólico: a sublimação e resolução do Complexo de Édipo.

O complexo edípico é um dos mais controversos postulados defendidos

por Freud; porém, nenhum psicanalista, nem mesmo os que mais discordaram

das idéias freudianas, como Jung, pôde negá-lo ou fugir integralmente à sua

idéia original. É necessário, por tanto, esclarecer esse conceito, antes de

analisá-lo dentro do contexto dos contos de fadas.

Segundo o conceito psicanalítico, por volta dos 4 aos 7 anos de idade, a

criança desenvolve um desejo pelo seu progenitor do sexo oposto (o menino,

pela mãe; a menina, pelo pai). Essa é a primeira tentativa da criança em

compreender, a nível simbólico, a sexualidade adulta. A tentativa de conquista

do progenitor que é objeto de seu desejo, a criança passa a identificar-se e a

imitar o progenitor do seu sexo – a menina começa a imitar sua mãe, como

cuidar da casa, dos filhos, trabalhar, enfeitar-se com jóias, etc.; e o menino,

passa a imitar seu pai, brincando de dirigir, lutar, trabalhar ,cuidar dos filhos,

etc.

Porém, logo a criança percebe que para a sociedade em que ela vive,

esse dejeso de casamento não é viável. Com isso ela sublima seus interesses

sexuais, voltando-se para atividades aceitas e valorizadas pela sociedade –

como para a escola, a prática de esportes, as brincadeiras, etc. Esses desejos,

ao serem sublimados, de certa maneira, “adormecem” até o início da

adolescência, quando retornam, porém agora voltados para a busca de

parceiros sexuais fora da família. Por tanto, a vivência e a resolução do conflito

edipiano, fazem com que a criança defina as bases de sua futura sexualidade

adulta, ao identificar-se com o pai e a mãe, e também faz com que ela introjete

os valores morais e sociais, dando início à formação do Superego, bem como

promove o interesse da criança pela aprendizagem de atividades socialmente

valorizadas, seja esta aprendizagem dentro ou fora da escola.

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29Podemos ffirmar que os contos de fadas expressam simbolicamente a

resolução do Complexo de Édipo, e ajudam as crianças a superarem tais

conflitos. Já esses apresentam uma narrativa muito parecida, reproduzindo os

estágios da vida humana. Recontam, de várias maneiras, o complexo de Édipo.

As histórias de fadas se iniciam com o herói deixando sua casa, esse fato

simboliza tanto a criança pequena, que parte para a conquista de suas

identificações sexuais precoces, quanto o adolescente, que deixa o ambiente

familiar para buscar parceiros sexuais fora de casa’.

Em muitos casos os heróis saem de casa por ordem dos pais, tais como

nas narrativas de: Chapeuzinho Vermelho, que é enviada por sua mãe para

levar doces à avó; Branca de Neve, que é expulsa pela madrasta invejosa,

entre outras.

A sublimação do complexo de Édipo também acontece devido à

intervenção da sociedade, de maneira geral, e dos pais, de maneira mais

direta. A criança abandona o desejo de casar-se com o pai ou a mãe devido a

rejeição por parte da sociedade, mas principalmente, porque percebe que, por

mais que ela imite o progenitor do mesmo sexo, sempre haverá

relacionamentos que seu parente desejado manterá apenas com outros

adultos, e não com a criança.

O enfretamento de assombrações, Lobo, Bruxa e as dificuldades

enfrentadas faz com que o herói vivencie papel de adulto: tornando-se capaz

de assegurar sua própria existência, de superar a dificuldade sozinho, em

suma, vem a ser autônomo e independente. Como João e Maria, que não

apenas foram capazes de escapar da Bruxa, mas também encontram um rico

tesouro escondido na casa de doces, que os tornou capazes de sustentar a si e

à sua família, superando o estado de pobreza do início da história.

Estando agora preparado, herói é capaz de encontrar o seu próprio

parceiro, formar família, casar-se, ter filhos, assim como uma vez,

remotamente, em sua infância, desejara casar e ter filhos com seu pai ou sua

mãe: No conto, o sapo transforma-se em príncipe para casar-se com a

princesa; o cavaleiro desperta Bela Adormecida de seu profundo sono; o

Patinho Feio torna-se um lindo e esplendoroso cisne.Ouvir essas histórias

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30assegura à criança que ela também será capaz de superar as dificuldades, os

sentimentos profundos e contraditórios, despertados por seu delicado e

complexo conflito emocional, e virá a encontrar a felicidade.

Por isso, cabe a ela mesma vivenciar o conto e tirar dele a mensagem

que lhe é útil – e não ao adulto. Quando o adulto se apressa em fazê-lo, como

disse Bettelheim, ele não apenas acaba com a magia do conto, mas também

priva a criança da satisfação em conseguir chegar à mensagem positiva que o

conto carrega sozinha. A mensagem embutida no simbolismo do conto é a que

a criança busca dominar quando nos pede que recontemos uma mesma

história infinitas vezes, sabendo que, ao ouvi-las, está de certo modo ouvindo a

sua própria história, e dessa forma tornando-se mais capaz de superar seus

próprios conflitos.

Este é o poder mágico dos contos de fadas – o poder de fazer-nos

conhecer e compreender melhor a nós mesmos – e esta a razão de sua

permanência entre nós através dos séculos, bem como a razão do fascínio que

o simples ato de sentar-se junto a um adulto para ouvir uma história ainda

consegue despertar, mesmo frente a um mundo cheio de brinquedos e

maravilhas tecnológicas.

A mensagem de sucesso e segurança que os contos carregam os fazem

não apenas sempre presentes e fascinantes, mas sobretudo únicos e

insubstituíveis em sua importância para o imaginário infantil.

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31

CAPÍTULO III

A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS DE FADAS PARA O

DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Antes de destacarmos a importância dos contos também para a educação

é preciso esclarecer que por muito tempo esses estavam vinculados a literatura

infantil, por isso muitas das citações feitas ao londo desse capítulo, mencionará

os contos como literatura infantil.

Para a criança é essencial que seja oferecida oportunidades de leitura de

forma convidativa e prazerosa. E é nesse sentido que os contos desempenha

um importante papel, o de conduzir as crianças não só à aprendizagem,

contribuindo para uma sistematizada escrita, mas que permita que se realize

na leitura, que sinta prazer ao estar lendo. E isso é ótimo, pois é fundamental

que as crianças sintam o gosto pela leitura. A literatura possibilita então, que

essas consigam redigir melhor desenvolvendo sua criatividade, pois o ato de

ler e o ato de escrever estão intimamente ligados.

“(...) a literatura infantil é, antes de tudo, literatura; ou

melhor, é arte: fenômeno de criatividade que representa

o mundo, o homem a vida, através da palavra. Funde os

sonhos e a vida prática, o imaginário e o real, os ideais e

sua possível/impossível realização.” (COELHO, 2000,

p.27).

A literatura infantil desenvolve não só a imaginação das crianças, como

também permite que elas se coloquem como personagens das histórias, das

fábulas e dos contos de fada, além de facilitar a expressão de idéias. Sendo

assim, o objetivo da literatura infantil é o de formar leitores, pois por uma série

de características e fatores ela desempenha esse papel melhor do que a

literatura adulta, uma vez que é mais convidativa. O que se procura hoje é

assegurar ao maior número de pessoas possíveis o direito de ler. “A literatura

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32infantil contribui para que não se deixe esta tarefa por acaso...”

(CAGNETI:1986, p.21).

O leitor precisa estabelecer um envolvimento integral com aquilo que lê.

De maneira que a cada leitura, possa adquirir mais profundidade e intimidade

com o texto, que se consiga estabelecer um diálogo, fazendo perguntas e

buscando respostas, seja o texto uma história, uma fábula, um conto de fadas

ou qualquer outro. Nesse sentido, pode-se mencionar ainda que a leitura, além

de produzir um contínuo aprendizado, desenvolve a reflexão e o espírito crítico.

“é fonte inesgotável de assuntos para melhor compreender a si e ao mundo.”

(CAGNETI, 1986, p.23).

A ludicidade, presente na literatura infantil é importante, pois como ponto

de ancoragem, apresenta a possibilidade da criança desencadear

aprendizagem, sem mesmo ter vivenciado no real a situação descrita pelo livro.

O lúdico motiva a criança a expor-se a estímulos através do prazer e do desejo

de experienciar novas descobertas e aventuras. Aliviada a resistência, o leitor

tende a explorar melhor o texto e utilizar toda a capacidade investigativa

possível. Bettelheim (1989, p.69) nos diz que “estórias extremamente realistas

correm contra as experiências internas da criança; ela escutará e talvez tirará

alguma coisa delas, mas não pode extrair muito significado pessoal que

transcenda o conteúdo óbvio”.

A linguagem simbólica trabalha com os estados emocionais da criança e

a auxilia a lidar com sua insegurança e auto-estima. Os símbolos, presentes

nas estórias infantis, penetram profundamente na consciência infantil. O

maravilhoso, o imaginário e o fantástico deixaram de ser considerados como

pura fantasia para serem vistos e tratados como portas que se abrem para as

verdades humanas. Assim, a visão mágica do mundo passa a ser assumida

pelas crianças. O que segundo Bettelheim (1989, p.60) acontece porque “para

uma criança não existe uma linha clara separando os objetos das coisas vivas ;

e o que quer que tenha vida tem vida muito parecida com a nossa”.

A linguagem verbal, o ato de contar estórias, pode ser considerada como

meio formador do pensamento abstrato. É um sistema de códigos capaz de

transmitir qualquer informação mesmo fora do contexto de uma ação prática

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33imediata. Observa-se perfeitamente esta diferença ao analisarmos que o

homem é capaz de comunicar pensamentos, opiniões e desejos através de um

aparelho como o telefone, ou seja, pode comunicar-se usando apenas um

elemento abstrato: a palavra.

Ao contar uma história para a criança, utilizamos uma estrutura própria

da linguagem oral que pode apresentar junto com os componentes verbais,

outros elementos: os gestos, a entonação, a pausa. Quando lemos a estória do

livro, utilizamos estruturas gramaticalmente organizadas próprias da linguagem

escrita (pontuação). Embora nos dois momentos seja possível perceber as

reações da criança e, portanto, corrigir, modificar, reler, explicar e

complementar a leitura, cada uma delas possui estruturas próprias e ambas

vão ser importantes para o desenvolvimento da linguagem: oral e escrita.

Quanto maior for o contato com literatura, melhor preparada estará a

criança para ser clara ao exprimir seus pensamentos. Ao ouvir uma estória,

aprende a colocar-se no lugar do outro e assim perceber diferentes pontos de

vista. Aprende a conhecer o poder da palavra para provocar atos e despertar

sentimentos. Percebe que através da linguagem pode exercer ação sobre o

pensamento do outro. Com a intenção de fazer valer seu ponto de vista,

desenvolve uma linguagem interior que lhe permite levantar hipóteses e se

preparar para argumentar e contra-argumentar. Na tentativa de evitar

incompreensões e contradições, aos poucos estabelece uma coerência entre

suas argumentações, clareando a sua maneira de se expressar.

É importante ressaltar que a compreensão de um texto pode depender

do conhecimento de textos anteriores, ou seja, as relações de associação com

leituras anteriores podem servir para estimular a percepção dos significados no

texto atual. Somente quando a criança exercita várias leituras (de formigas, de

fadas e bruxas, de lobo mau, de um mesmo autor, de um mesmo gênero

literário, com um mesmo tema gerador) pode compreender as relações entre

diversos textos e abrir-se verdadeiramente à reflexão, logo é valoroso para a

criança o contato com estórias desde cedo, para que assim esta possa

estabelecer vários referenciais literários.

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34Os contos de fadas com o seu grande poder de encantar fascinam as

crianças com sua magia que despertando-a para a fantasia. Essas estórias

carregam uma força profunda capaz de nao somente distrair e embalar o sono,

mas também educar.

A criança ao ter contato com o livro adquirem ganhos significativos junto

com a leitura e a escrita, nela é despertada principalmente a imaginação,

porém acontece algo maravilhoso, a construção de uma aprendizagem

significativa e prazerosa. A criança elabora novas hipóteses, experimenta e

interpreta os contos. O desdobramento dos contos para as crianças é infinito, já

que, no último momento do “viveram felizes para sempre” não determina o fim

para criança, que pode contar e recontar as estórias.

Mundança significativa para o máximo aproveitamento dos contos e sua

magia deverá ser por parte da escola superando o conceito de transmissão de

conhecimento. Os contos podem contribuir para a formação pessoal de cada

indivíduo. Pois através dos contos a criança, como antes mencionado, aliviam

suas pressões incoscientes e ajudam o desenvolvimento do simbólico,

podendo assim serem considerados intrumentos pedagógico.

Infelizmente, muitos pais desejam ver seus filhos com as cabeças

funcionando racionalmente como as suas, e acreditam que a maturidade deles

dependa exclusivamente do ensinamento lógico oferecido pela maioria das

escolas que, via de regra, em nossa sociedade moderna, nada mais fazem que

repassar um conteúdo pedagógico desprovido de maiores significados para a

vida. Esquecem-se de explorar os sentimentos como fundamental ingrediente

para a formação do caráter e, ainda que bem alfabetizem, desconsideram os

contos de fadas como se estes só gerassem confusões quanto aos conceitos

sólidos de realidade que devem ser ensinados às crianças. Pecam gravemente

por isso.

A arma mais poderosa para uma sociedade é a educação de qualidade

para crianças, jovens e adultos, essa norteando o desenvolvimento à liberdade

e a uma leitura de mundo diferenciada. Infelizmente, a realidade que se abate

sobre a educação brasileira não é a idealizada, o que nos faz apontar como

importante passo a ser dado na direção da qualidade seja a conscientização

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35dos instrumentos de ensino. A literatura infantil para uma educação visando o

desenvolvimento e a autonomia é um valoroso recurso para proporcionar o

ensino de qualidade dentro e fora do espaço escolar.

A escola como principal interlocutora no processo educacional tem

um papel fundamental de construção e desenvolvimento do conhecimento.

Calcada na realidade de seu alunado, respeitando diferentes ritmos de

aprendizagem e conhecimentos pré adquiridos. Masetto (1997,p.23) faz

referências a escola de acordo com a realidade sociocultural brasileira:

“A escola é uma instituição social e, como tal, está

inserida na história. Ela é uma instituição que sofre

influência e influencia aquilo que acontece ao seu redor.

Em outras palavras a escola está inserida em uma

realidade da qual ela sofre e exerce influência.”

Algumas indagações surgem referente a literatura infantil e o seu uso em

sala de aula como por exemplo: qual a função da literatura infantil na Escola?

Em que essa literatura desenvolve o sujeito? Questionamentos esses que nem

sempre os educadores fazem, apenas exigem o ato da leitura esquecendo-se

do valor que essa pode representar para um aluno. “Ao reconhecermos a

atividade de leitura como instrumento, estamos nos posicionando criticamente

frente ao mundo” (BELMIRO,1999,p.117).

Os professores, ao entenderem que, para haver desenvolvimento na

literatura seus alunos não podem ser obrigados, cobrados e ameaçados. O

texto literário está diretamente ligado à imaginação e a sensibilidade, logo deve

ser utilizado de forma criativa, lúdica e diversificada, assim fomentando

interesse dos alunos. Deve-se incentivar também o uso da literatura fora da

escola, pois não é somente no ambiente escolar e os livros propostos pela

escola que o aluno deverá ler, mas também todo o tipo de literatura que o

interessar deverá ser incentivada e que ele o faça em outros locais.

A literatura infantil, seja na escola ou em qualquer outro ambiente, tem o

papel de alargamento do horizonte, permitindo ao indivíduo a descoberta de

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36novas formas de viver e sentir, sejam essas internas ou externas. O diferencial

do ler na escola se dá devido as pessoas que aproximam a criança à essa

leitura, tais como professores, supervisores orientadores, enfim, todo o

pessoal que tem um convívio aberto para além das paredes da sala de aula e

que por conseguinte estimula na criança essa vivência intensa do mundo e o

reconhecimento do seu lugar nesse. A criança levará consigo a consciência da

prática da leitura e da importância dessa para a sua vida, pois quanto mais

cedo essa for estimulada mais rápido perceberá essa importância.

E para uma clara compreensão da importância da Literatura Infantil na

sala de aula é preciso o conhecimento da sua história ao longo do tempo, do

seu desenvolvimento, e dos seus benefícios.

Ao perpassarmos pela história da Literatura Infantil compreenderemos

que esta surgiu como uma necessidade nos séculos XVII e XVIII com a

decadência do feudalismo e a ascensão da burguesia. Necessidade essa que

desenvolveu-se à medida que as concepções de criança e de família mudaram

e evoluíram. A primeira mudança foi a composição da família como núcleo

unicelular, originando também a valorização da infância, antes inexistente, não

reconhecida. Até então, os adultos e as crianças compartilhavam as mesmas

exigências, eventos, direitos e experiências. A criança era vista como um

adulto em miniatura.

A escola e sua organização aos poucos ampliou seus espaços, bem

como o gênero literário dirigido ao jovem, a literatura infantil. Também a

valorização da criança, enquanto faixa etária, mudou a concepção de infância e

tratados de Pedagogia foram escritos para assegurar sua singularidade. Porém

concomitantemente a essa valorização da criança, surgiram também os meios

de controle e desenvolvimento intelectual desta e a manipulação de suas

emoções. A escola e a Literatura foram convocadas para cumprir tal função.

Segundo Zilberman (2003, p.16) os primeiros textos foram escritos por

professores e eram de cunho pedagógico, ou seja, moralizantes, fechados,

ditavam ensinamentos morais. Dessa maneira, podemos dizer que a literatura

infantil foi uma extensão da Pedagogia; não sendo aceita como arte, tinha

como intuito dominar a criança e colocá-la como ser inferior, sob o controle do

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37adulto. Mas, a infância expandia, também o sonho dos adultos: já que a criança

era boa, era preciso conservar sua naturalidade. “A criança é o bom selvagem,

cuja naturalidade é preciso conservar enquanto o ser humano atravessa o

período infantil. (ZILBERMAN : 2003, p.18)

Assim, ela era isolada da sociedade para preservar sua pureza infantil.

Os adultos, com isso, asseguravam seu prestígio e dominação: a criança era o

reflexo do que o adulto e a sociedade queriam e planejavam que ela se

tornasse.

Na escola se refletia essa imagem: uma divisão entre indivíduo e

sociedade, reunia-se um grupo homogeneizado perante a autoridade do

mestre, a escola fechava suas portas para o mundo exterior, e no interior, o

professor era detentor do poder. Era negado a livre expressão e impostas as

regras da época.

“A criança verdadeira era ilhada, porque tornada alheia

aos meios de produção, e comprimida pelos mais velhos,

que assim asseguravam seu prestígio e dominação , foi

elaborado uma série de atributos (...) a menoridade, a

fragilidade física e moral, a imaturidade intelectual e

afetiva.” (ZILBERMAN: 2003,p.20)

A escola controlava ideologicamente a criança e a Literatura Infantil

serviu para multiplicar e garantir essas normas que vigoravam, transmitindo um

ensinamento de acordo com a visão dos adultos. O texto passou a ser um

apoio para educação das crianças da época, um manual de instruções.

E hoje, como a escola trabalha com a Literatura Infantil?

A escola e a literatura são de natureza formativa, estão voltadas à

formação do indivíduo. A literatura resume uma realidade servindo de auxílio

para conhecê-la melhor. Esta função também é desempenhada pela escola.

Mas através da máxima exploração das potencialidades sociais e cognitivas

da literatura é que se garante a transformação da sociedade e ampliam-se as

visões de mundo.

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“(...) por mais exacerbada que seja a fantasia do escritor

ou mais distanciadas e diferentes circunstâncias de

espaço e tempo dentro das quais a obra foi concebida

(...) ela continua a se comunicar com o destinatário atual,

porque ainda fala de seu mundo, com suas dificuldades e

soluções, ajudando-os a conhecê-lo melhor.” (

ZILBERMAN: 2003, p.25)

A escolha dos textos literários feita pelo professor deve responder a

alguns critérios, tais como: qualidade estética e aspecto inovador. A escolha e

a atitude do professor frente ao livro é importante. O professor não pode ser um

redutor, transformando o sentido do texto em um número limitado de

observações tidas como corretas. É preciso fazer com que o leitor se situe e

tenha relações com sua realidade, através do livro. Segundo Zilberman (2000,

p.28) “ao professor cabe o detonar as múltiplas visões que cada criação

literária sugere”, possibilitar o espaço para as interpretações pessoais e

individuais da compreensão do livro.

O professor necessita estar sempre sintonizado e atento as

transformações do momento presente, e reorganizando o seu próprio

conhecimento. E, segundo Coelho (2000:p.18) “orientado em três direções

principais: da literatura (como leitor atento), da realidade social que o cerca

(como cidadão consciente da “idéia geral” dominante e de suas possíveis

causas) da docência (como profissional competente)”

Coelho (idem, p.19-24), aponta para os valores que a Literatura Infantil

pode veicular. A Literatura infantil oferece novos valores, estes favorecendo a

formação de uma nova mentalidade da sociedade, por isso requerem uma

melhor atenção. Um confronto nos é apresentado por ela entre os valores

tradicionais e os valores novos. O professor precisa estar alerta ao trabalhar

com Literatura Infantil, atentando-se para não incentivar os valores tradicionais

como o individualismo e a competitividade, pois estes baseiam-se em verdades

únicas, contribuindo para o fortalecimento do poder de uma minoria da

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39população. Padrões ideais que são seguidos por grandes heróis das histórias

infantis, aventureiros que tudo podem, mas só eles. É necessário trabalhar a

idéia de que o indivíduo é a parte essencial do todo, porém sozinho ele pouco

fará. Logo deverá ser sinalizado para a criança o senso de comunidade e

buscar livros que substituam o herói individual pelo grupal.

A atenção também é necessária quando trabalha-se a moral rígida das

fábulas. Um bom e claro exemplo de fábula é “A cigarra e a formiga”. A cigarra,

que estava com muita fome, pede comida à formiga, que tinha acumulado

durante o verão. A formiga, sabendo que a cigarra cantava e não trabalhava

neste período, negou ajuda. Segundo Bettelheim (1980, p.54) , a fábula “com a

finalidade de dar instrução moral, (...) sempre afirma explicitamente uma

verdade moral; não há significado oculto, nada é deixado à nossa imaginação”.

Qual seria a conclusão, a mensagem que a criança internalizaria dessa

fábula? “Tenho que trabalhar sempre, e não brincar, caso contrário não terei

nada no futuro...”. Logo ressalta-se a importância de um trabalho consciente

que deve ser realizado pelo professor em sala. É necessário que se adote uma

postura crítica-reflexiva das fábulas sem que essa perca seu encanto aos olhos

da criança. Tal postura deve ser iniciada pelo professor, para que seus alunos

também adquiram tais atitudes.

A história “Os três porquinhos”, apesar da moral ser um pouco mais

velada do que das fábulas, também leva a criança pequenina a saber, da

forma mais deliciosa e dramática, que não devemos ser preguiçosos e levar

tudo que é feito a sério, porque caso o contrário poder-se-á sofrer

conseqüências. Encontra-se nos contos de fadas, a conduta certa ou errada,

que se firma nos castigos quando os personagens são ruins ou prêmios

quando eles são bons. “Os três porquinhos é um conto de fadas devido ao seu

final feliz, e porque o lobo recebe o que merece (BETTELHEIN:1980, p.56)

É preciso interpretar, questionar com o aluno estas estórias, para que

ele tenha consciência que sempre há mais de um ponto de vista e que as

diferenças existem. Em sala de aula isso é fundamental. Valorizar as diferentes

etnias, culturas, religião, classes sociais, costumes, são objetivos da literatura

infantil a serem conquistados. Esses são alguns pontos fundamentais para que

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40aconteçam justiça e igualdade entre todos partindo de uma socialização da

leitura. Segundo Coelho (2000, p.24) tais dados são básicos para o exercício

de uma leitura crítica avaliadora dessa literatura nova, que, sem deixar de ser

um instrumento de emoção, diversão ou prazer, poderá auxiliar, e muito, a

tarefa da Educação, no abrir caminho aos que estão chegando, em direção à

nova mentalidade a ser conquistada por todos, em breve tempo.

Todos têm direito à leitura, e o acesso a ela também precisa ser um

direito comum a todas as pessoas. Somente quando a leitura for

democratizada, poderá se dizer que todos, realmente, são iguais. Contudo a

literatura exige muito mais que uma simples decodificação de letras: envolve

reflexão e criticidade melhor e mais nítida, compreensão de mundo, da

realidade, dos conhecimentos e novas idéias. Porém ela não precisa deixar de

ser prazer, emoção, aventura, realização, para que se possa ter um bom

desenvolvimento, refletindo sobre seu conteúdo sem perder a imaginação.

Basta que seja trabalhada de forma criativa e autêntica.

O prazer da leitura, se não conquistado em casa, na família, a escola

tem por obrigação esse despertar e de maneira única e particular para que este

valor se torne, posteriormente, esse prazer perdure por toda vida do aluno

leitor para adulto leitor.

“A justificativa que legitima o uso do livro na escola

nasce, pois, de um lado, da relação que estabelece com

o seu leitor; convertendo-o num ser crítico perante as

circunstância; e, de outro o papel transformador que

pode exercer dentro do ensino, trazendo-o para a

realidade do estudante e não submetendo-o a esse

ambiente rarefeito do qual foi suprida toda a referência

concreta.” (ZILBERMAN: 2003, p.30)

A escola, oferecendo esta oportunidade, está ajudando seus

professores, alunos e a si própria como propulsora do idealizar e do fazer para

uma prática educativa consciente voltada para a autonomia dos seus alunos ,

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41pois se a literatura infantil é ao mesmo tempo prazer, realização, ludicidade, e

fonte de conhecimentos, e criticidade, para os alunos traduz-se como:

“aprender com prazer”.

“A literatura infantil (...) propicia os elementos para uma

emancipação pessoal, o que é finalidade implícita ao

próprio saber . Integrando-se a esse projeto libertador, a

escola rompe suas limitações inerentes à situação com

a qual comprometeu a sua gênese.” (ZILBERMAN:

2003, p.29)

Mas não resume em colocar diante da criança um monte de livros e

dizer: agora leiam, ou resumir o papel dos livros de literatura infantil em

trabalhinhos em sala, quando alguns dos alunos terminam mais rápidos as

atividades. Então, para que incomodem os colegas de classe, coloca como

ocupação o livrinho de literatura infantil. Nada discutido, interpretado,

comentado ou mesmo mostrado. Apenas ocupação. E quando todos os alunos

terminam as atividades, mesmo que não tenham terminado de ler um livro

começado, devem guardá-lo, pois é hora de fazer outras atividades mais

importantes.

“A literatura infantil (...) aproveitada na sala de aula em

sua natureza ficcional, que aponta a um conhecimento de

mundo, e não como súdita do ensino bem comportado,

ela se apresenta como elemento propulsor que levará a

escola à ruptura com a educação contraditória e

tradicional.” (ZILBERMAN: 2003, p.30)

É importante que a literatura infantil seja trabalhada. O professor precisa

estar oportunizando uma relação entre a literatura infantil e a realidade do

aluno. Caso contrário, a história não terá significado e, certamente, será

esquecida. Conhecendo a importância da Literatura Infantil em sala de aula e

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42estando consciente dos valores que ela oferece, é que o professor se mantém

num processo de construção de alunos leitores, e mais que isso, alunos

leitores críticos, que saibam interpretar as várias visões de mundo, usufruindo

delas para a compreensão do seu próprio mundo interior.

O professor tem em suas mãos a tarefa de propor ao aluno situações de

aprendizagens para (re) construção do conhecimento. A literatura infantil é um

instrumento que contribui para elaboração destas situações. Sendo assim, é

importante que ele tenha conhecimentos sobre este elemento tão importante e

também saiba como utilizá-lo de forma que se preserve a função real da

literatura.

Um projeto que privilegie a literatura infantil, segundo Coelho (2002),

deve ter claro a concepção de infância, enxergar a literatura como um

fenômeno da linguagem, estabelecer relações entre literatura, história e cultura,

entender a leitura como um diálogo entre o leitor e o texto tendo consciência

que a escrita é fruto dessa leitura e olhar a escola como um espaço

privilegiado.

O trabalho com a literatura infantil, segundo Zilberman(2001):

“(...)desemboca num exercício de hermenêutica, uma vez

que é mister da relevância ao processo de compreensão,

pois é esta que complementa a recepção, na medida em

que não apenas evidencia a captação de um sentido,

mas as relações que existem entre a significação e a

situação atual e histórica do leitor.”

Assim convém ao professor estabelecer critérios para a seleção do livro

a ser trabalhado em sala de aula. Ele deve estar atento à escolha do texto e

sua adequação ao leitor considerando sua qualidade estética e não veiculando

ela apenas ao ensino de regras gramaticais ou normas de obediência. As

crianças necessitam ler bons textos para compreenderem a literatura como um

meio de pensar a realidade e não de apenas vê-la como algo imutável, com

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43regras a serem obedecidas. E, além disso, enxergar estes textos com um

elemento que não traz o ensino da língua como um único fim.

Sendo assim, além da qualidade estética, deve-se considerar o aspecto

inovador da obra, assinalando aquilo que vivemos, mas desconhecemos. É

relevante analisarmos o enredo, os personagens, os valores impressos, porém

é importante notar que é esta coincidência entre o mundo representado no

texto e o contexto do qual participa seu destinatário que emerge a relação entre

a obra e o leitor. E este é o principal critério a ser considerado: escolher um

livro que faça nascer uma relação entre ele e a criança, que dificilmente será

rompida com o passar do tempo.

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CONCLUSÃO

A proposta desta monogafia foi a possibilidade de um mergulho na

magia e na fantasia presente nos contos de fadas e o leque de

possibilidades oferecidas nas estórias.

Os contos de fadas não descrevem o mundo de acordo com a

simples realidade objetiva. Mas sim, através de sua riqueza simbólica,

descrevem a realidade subjetiva da mente humana. Isso os torna mais

verdadeiros, pois nos faz refletir sobre os aspectos mais obscuros da

nossa psique, que não podem serem alcançados diretamente através do

pensamento consciente.

Esse poder de atuação dos contos de fadas é maior ainda para o

pensamento infantil pois, se o adulto tem dificuldade em aceitar e

enfrentar suas próprias incertezas expressas nas aventuras dos contos,

a criança é imediatamente captada pela beleza e a linguagem destes,

que muito se aproxima de seu próprio mundo inconsciente.

Por isso, ao ouvir contos, o psiquismo da criança se desenvolve.

Primeiramente, porque ela tem o desafio intelectual de compreender

uma narrativa tão rica, intrincada e bem urdida, como a dessas histórias,

pedindo para ouvi-la várias vezes, até alcançar este objetivo. E também

porque, dominando o conflito da história, ela está dominando seus

próprios conflitos internos. Ou seja, para retornar à afirmação de Tolstói,

os contos, com toda a sua fantasia, não transmitem falácias, e sim a

mais profunda verdade.

Pelo encanto que produzem e pela importante função afetiva que

têm para crianças, jovens e adultos, os contos de fadas deveriam ser

retomados pela escola, não apenas em momentos esporádicos e

descomprometidos de leitura, mas como uma parte da herança cultural

da humanidade sobre a qual os alunos possam pensar e agir, das mais

diferentes formas – em atividades plásticas, simbólicas, cênicas, de

leitura e escrita, e tantas outras quanto a realidade de cada sala de aula,

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45nas diversas faixas-etárias, possa propor como desafio a pais e

educadores.

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BIBLIOGRAFIA

ABRAMOVICH, Fanny. Literatura Infantil – gostosuras e bobices. São Paulo.

Scipione, 1986.

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. 8ª ed. Rio de Janeiro:

Paz e Terra, 1980.

CADERMATORI, Lígia. O que é Literatura Infantil. São Paulo: Brasiliense,1986.

CAGNETTI, Sueli de Souza. Livros que te quero livre. Rio de Janeiro: Ática,

1980.

CASHDAN, Sheldon. Os 7 pecados capitais nos contos de fadas: como os

contos de fadas influenciam nossas vidas. Rio de Janeiro:Campus, 2000.

CEZARETTI, Maria Elisa. Nem só de fantasias vivem os contos de fadas.

Família Cristã. São Paulo, p. 24-26, maio 1989.

COELHO, Nelly Novaes. Literatura infantil: teoria, análise, didática. São Paulo:

Moderna, 2000.

COELHO, Nelly Novaes. O Conto de Fadas. São Paulo:Ática, 1987.

GERALDI, João Wanderley. O Texto na Sala de Aula. São Paulo:Ática, 1999.

MASSETTO, Marcos. Didática – aula como centro. 4ª edição. São Paulo: FTD,

1997

ZILBERMAN, Regina. A literatura infantil na escola.11ª edição São Paulo:

Global, 2003.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

A HISTÓRIA DA ESTÓRIA 10

1.1 – A etimologia da expressão “contos de fadas” 10

1.2 – A origem dos contos de fadas 10

1.3 – Os contos de fadas e a psicanálise 14

CAPÍTULO II

OS CONTOS DE FADAS

UMA ABORDAGEM PSICANÁLITICA 16

CAPÍTULO III

A IMPORTÂNCIA DOS CONTOS DE FADAS

PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL 31

CONCLUSÃO 44

BIBLIOGRAFIA CITADA 46

ÍNDICE 47

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes – Projeto A Vez

do Mestre

Título da Monografia: A contribuição dos contos de fadas para o

desenvolvimento infantil

Autora: Vivian de Melo Hammes

Data da entrega: 27/01/2007

Avaliado por: Conceito: