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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE DO USO E ABUSO DO PODER NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Por: Raphael Oliveira da Silva Orientador Prof. William Rocha Rio de Janeiro 2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

DO USO E ABUSO DO PODER NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Por: Raphael Oliveira da Silva

Orientador

Prof. William Rocha

Rio de Janeiro

2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

DO USO E ABUSO DO PODER NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Monografia apresentada à Universidade Candido

Mendes como requisito para obtenção do título de

Pós-Graduado em Direito Publico e Tributário.

Por: Raphael Oliveira da Silva

3

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pela existência e pela oportunidade de seguir em frente com os estudos e pela ajuda para suportar as dificuldades de minha vida.

Agradeço o incentivo e o amor incondicional de meus pais, Waldir Ubiraci Candido da Silva e Maria Célia Oliveira da Silva e de minha Tia Maria Elisa da Silva Oliveira.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha incansável esposa Vânia Moreira da Silva e a minha filha Maria Eduarda Oliveira da Silva.

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RESUMO

A Administração Pública é o aparelhamento das entidades e órgãos que

desempenham determinadas funções através dos agentes públicos, se

caracterizando pela gestão de bens e interesses da coletividade no âmbito

federal, estadual ou municipal com o escopo de promover o bem comum do

Estado e do interesse público em consonância com os limites previstos em lei.

O princípio da legalidade constitui-se no mais importante dos princípios

administrativos, onde toda e qualquer atividade da Administração Pública deve

ser autorizada por lei, que também determina a limitação das funções e das

condutas dos agentes públicos, visando garantir a supremacia dos interesses

individuais e coletivos juridicamente protegidos. Os poderes administrativos

representam o conjunto de prerrogativas de Direito Público, que são

outorgados aos agentes públicos para utilização e execução das atividades

administrativas. Eles se originam com a Administração Pública, se

apresentando de diversos tipos e segundo as exigências dos serviços públicos

a serem prestados, dos interesses da coletividade e dos objetivos a que se

direcionam. Os agentes do Poder Público usam normalmente os poderes

administrativos quando exercem sua função pública em benefício do interesse

público, dentro dos limites legais. O abuso do poder ocorre quando a

autoridade pública por meio dos seus agentes públicos, utiliza o poder

administrativo agindo com excesso, desvio ou omissão na consecução dos fins

públicos, se constituindo numa afronta à lei e as exigências do interesse

público, sendo passível de punição dos mesmos pela via administrativa ou

judicial.

6

METODOLOGIA

Como metodologia de trabalho, realizou-se pesquisa bibliográfica

envolvendo análise de leis, normas e vários textos de doutrinadores

renomados cujas obras foram publicadas após a promulgação da Constituição

Federal de 1988 a respeito do uso e abuso do poder na administração pública.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 12

CAPÍTULO II – PODERES ADMINISTRATIVOS 24

CAPÍTULO III – PODERES E DEVERES DA AUTORIDADE PÚBLICA 35

CAPÍTULO IV – USO E ABUSO DO PODER 39

CONCLUSÂO 53

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 56

ÍNDICE 58

FOLHA DE AVALIAÇÃO 60

8

INTRODUÇÃO

A presente monografia visa demonstrar a questão do uso e abuso do

poder no âmbito das atividades desenvolvidas pela Administração Pública.

O abuso do poder surgiu à época da ascensão do governo absolutista

monárquico, no qual os reis detinham o poder absoluto do Estado. Neste

período, o controle do poder estatal era exercido precipuamente pelos reis

soberanos através de seus súditos, onde não havia nenhuma preocupação em

satisfazer os interesses exigidos pelo povo, que na maioria das vezes passava

por grandes dificuldades e necessidades de sobrevivência devido à fome, ao

desemprego, à violência e todos os tipos de ilegalidade.

Desse modo, havia a ocorrência do abuso do poder estatal, onde o

Estado representado pela Monarquia estava acima e no controle da lei,

objetivando somente preservar e satisfazer os próprios interesses, e

prejudicando todo o seu povo.

Atualmente, o abuso do poder ocorre em qualquer forma de governo,

porém, é certo que suas origens remontam à época do absolutismo

monárquico.

A Administração Pública representa o aparelhamento do Estado

preordenado à preservação e realização das atividades e serviços públicos,

através da produção de bens e serviços para a coletividade administrada,

exercidos e executados pelos agentes públicos investidos em determinados

cargos e desempenhando funções dentro de suas atribuições legais.

A estrutura da Administração Pública compreende os agentes públicos e

os órgãos públicos. Os agentes públicos são todas as pessoas físicas

investidas em cargo ou função pública que prestam serviços públicos para

satisfazer às exigências da coletividade administrada. Os órgãos públicos são

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repartições instituídas para o desempenho da função pública estatal e onde

trabalham os agentes públicos.

A Administração direta ou centralizada é formada pelo conjunto de

órgãos integrantes das pessoas federativas com competência para o

desempenho das atividades administrativas, sendo exercidas pela Presidência

da República, Ministérios, Governadoria Estadual, Secretarias Estaduais,

Governadoria Distrital, Secretarias Distritais, Prefeituras Municipais e

Secretarias Municipais.

A Administração indireta ou descentralizada é formada pelo conjunto de

pessoas administrativas vinculadas à Administração direta, para o

desempenho das atividades administrativas indiretamente, compostas pelas

autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e as fundações

públicas.

Os poderes administrativos são concedidos aos agentes públicos para

utilização nas atividades administrativas desempenhadas na Administração

Pública para promover a satisfação do interesse público. Entre os principais

poderes administrativos que serão tratados neste trabalho, estão: o poder

vinculado, o poder discricionário, o poder hierárquico, o poder disciplinar, o

poder regulamentar e o poder de polícia, cada qual com suas particularidades

próprias.

Os poderes e deveres do administrador público são os expressos em lei,

os impostos pela moralidade administrativa e os exigidos pelo interesse

público. Entre os poderes e deveres principais tratados, serão abordados o

poder-dever de agir, o dever de eficiência, o dever de probidade e o dever de

prestar contas.

O uso do poder se revela quando o agente público utiliza-o

normalmente, ou seja, emprega o poder segundo as disposições expressas

nas normas legais, a moral da instituição e a finalidade do ato administrativo e

as exigências do interesse público.

10

O abuso do poder ocorre quando o agente público ou o administrador

público utiliza o poder desproporcionalmente, agindo com ilegalidade,

desrespeitando os limites de suas atribuições e se desviando dos objetivos

impostos na lei. O gênero abuso do poder reparte-se em três espécies: o

excesso de poder, o desvio de poder ou de finalidade e a omissão da

Administração Pública.

O mandado de segurança é um remédio constitucional que visa coibir a

prática do abuso do poder e qualquer tipo de ilegalidade. Este instituto está

previsto no art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal e é regulado pela Lei

1.533/1951.

Esta monografia tem por objetivo geral demonstrar a questão do uso e

do abuso do poder na Administração Pública, enfocando a estrutura e

composição desta, a tipologia dos poderes e deveres administrativos, o uso e o

abuso do poder juntamente com suas espécies e por fim uma breve exposição

sobre o mandado de segurança que constitui num meio de defesa contra o

abuso do poder.

O objetivo específico é conscientizar a sociedade e os agentes públicos

que o abuso do poder constitui-se num mal que reflete em enormes e sérios

problemas de cunho ético e moral. A sociedade deve buscar preservar a

moralização da Administração Pública, cobrando das autoridades públicas

competentes o efetivo e regular cumprimento da lei para que os agentes

públicos que detém o poder, ajam com legalidade e em benefício do interesse

público e do bem-estar social.

Nesta monografia serão utilizadas basicamente pesquisas bibliográficas

referentes ao tema que possuem consonância com a doutrina, a legislação e a

jurisprudência.

O método aplicado será o método dedutivo, o qual é um método

empregado pela ciência jurídica para conhecer normas, criando um sistema

normativo de tipo estático, fundamentado numa norma básica, por ela

11

planejada, que constitui seu pressuposto. Este método é o que se procede por

dedução, enumerando minuciosamente fatos e argumentos. As pesquisas

bibliográficas serão baseadas em obras de cunho essencialmente ligado ao

Direito Administrativo, no qual serão feitas referências aos autores de grande e

renomado conhecimento no direito público pátrio.

O tema será desenvolvido numa exposição bem prática e simplória,

limitando-o no âmbito da Administração Pública, tendo em vista que o abuso

do poder numa acepção geral possui grande conteúdo e extensão nos

diversos campos em que poderá ser tratado, tal como num contexto

sociológico, econômico e jurídico.

12

CAPÍTULO I

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

O estudo da Administração Pública em geral, compreendendo a

sua estrutura e as suas atividades, deve iniciar-se pelo conceito de Estado,

sobre o qual funda-se toda a concepção de organização e funcionamento dos

serviços públicos a serem prestados pela Administração Pública aos seus

administrados.

A matéria tem seu estudo e desenvolvimento na Teoria Geral do Estado,

onde busca-se expor sobre os conceitos, elementos, poderes e organização do

Estado.

O Estado se constitui numa ordem jurídica soberana, que tem como

finalidade o bem comum de um povo situado num determinado território.

Dependendo do ponto de vista em que é considerado, o conceito de Estado se

apresenta variado. Sob o enfoque sociológico, é corporação territorial dotada

de um poder de mando originário; sob o aspecto político, é comunidade de

homens fixada sobre um território, com potestade superior de ação, de mando

e de coerção; sob o prisma constitucional, é pessoa jurídica territorial

soberana.

Existem três elementos constitutivos do Estado, quais sejam, o povo, o

território e o governo soberano. O povo representa a composição humana do

Estado. O território é a base física delimitada onde se situa o Estado. O

governo soberano é o elemento que detém e exerce o poder e a autoridade

absoluta ou suprema de determinação e organização do Estado. Os poderes

do Estado compreendem a apresentação e a manifestação volitiva do mesmo.

São três os poderes, quais sejam, o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o

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Poder Judiciário, que comportam funções e atribuições precípuas dentro do

aparelhamento estatal.

A organização do Estado compreende a União, os Estados-membros, o

Distrito Federal e os Municípios.

A Administração Pública possui uma organização das entidades e

órgãos que irão desempenhar as funções, através de seus agentes públicos,

sendo que esta organização é prevista por lei.

1.1 - Conceito

O verbo administrar significa gerir, ativar, agir e atuar interesses.

A Administração, numa acepção geral, é uma atividade pela qual pessoas

geram recursos com o objetivo de satisfazer determinados interesses. A partir

deste conceito, podemos identificar os significados destas expressões. A

atividade compreende a noção de planejamento, ou seja, o acompanhamento

de atos racionalmente articulados. As pessoas são os indivíduos ou os entes

de qualquer natureza, que manifestam a vontade geradora destas atividades.

Os recursos constituem-se nos bens e serviços a serem empregados. O

objetivo é o fim ou a meta a satisfazer. Os interesses representam as

finalidades da ação administrativa.

A Administração Pública, num sentido geral, representa todo o

aparelhamento do Estado, preordenado à realização de serviços e atividades

que visam à plena satisfação das necessidades coletivas. Num sentido

específico, abrange cada ente da federação tomado isoladamente.

Representa um conjunto complexo de atividades pelas quais são

gerenciados os bens e os interesses públicos, visando sempre ao bem estar

social. Significa um conjunto de atividades estatais que realizam as finalidades

públicas pela produção de bens e serviços para os administrados, como por

exemplo, a coleta de lixo, o calçamento de ruas e o ensino público.

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A doutrinadora Odete Medauar ensina que:

Sempre houve dificuldade de fixar com precisão o conceito de Administração Pública. Diz-se mesmo que a Administração se deixa descrever, mas não se deixa definir, sobretudo ante sua complexidade e o caráter multiforme de suas atuações.1

A dificuldade de se estabelecer um conceito de Administração Pública

se dá pela diversidade de sentidos da própria expressão, pelo número de

órgãos e agentes incumbidos na execução da atividade administrativa e pelos

diferentes campos em que se desenvolve esta atividade em contextos de

grande complexidade de delimitação de funções e atuações.

Subjetivamente, a Administração Pública deve consistir na própria

atividade administrativa exercida pelo Estado por seus órgãos, agentes e

serviços. Objetivamente, trata-se da própria gestão dos interesses públicos

executados pelo Estado, seja através da prestação de serviços públicos, seja

por sua organização interna ou pela satisfação de seus fins de conservação,

de bem-estar individual dos cidadãos e do progresso social.

Na amplitude dada a estes conceitos, entram não só os órgãos

pertencentes ao Poder Público, como também as instituições e empresas

particulares que auxiliam o Estado na consecução de serviços de utilidade

pública ou de interesse coletivo, ou seja, a chamada Administração

centralizada que se compõe das entidades estatais e a Administração

descentralizada que se compõem das entidades autárquicas, fundacionais e

empresariais.

1.2 – Finalidade

1 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 3. ed. São Paulo: RT, 1999. p. 45.

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A finalidade da Administração Pública é promover o bem comum da

coletividade administrada, pois toda atividade do administrador público deve

ser orientada para esse objetivo específico.

No desempenho e consecução da atividade administrativa, o agente

público não possui a liberdade de procurar outro objetivo ou de satisfazer fim

diverso do que está previsto em lei.

Os deveres, poderes e prerrogativas são outorgados aos agentes

públicos para que os utilizem em benefício da coletividade, não podendo deles

renunciar, descumprir ou desconsiderar.

Os fins da Administração Pública consolidam-se na defesa do interesse

público, sempre almejando vantagens e aspirações de caráter lícito.

1. 3 – Princípio da Legalidade

Os princípios administrativos são os postulados fundamentais que

inspiram todo o modo de agir da Administração Pública, orientando o Estado

no exercício da atividade administrativa, visando satisfazer os interesses

coletivos em contraposição aos interesses individuais.

A Constituição Federal em seu art. 37 deixou expressos os princípios a

serem observados e seguidos pela Administração Pública em quaisquer dos

entes federativos, no desempenho das atividades administrativas. São eles:

princípio da legalidade, princípio da impessoalidade, princípio da moralidade,

princípio da publicidade e princípio da eficiência.

O principal e o mais importante é o princípio da legalidade, pois este

possui preceitos gerais que devem ser seguidos dentro da mais estrita lei.

1. 4 – Estrutura administrativa

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Pela variedade de funções e encargos que possui a Administração

Pública, é necessário que haja uma repartição de atribuições para a formação

de diferentes unidades representativas, cada qual com sua competência para

desempenhar a atividade administrativa de forma delimitada.

A Administração Pública manifesta sua vontade através de pessoas

físicas, ou seja, de seus agentes públicos e também por um grande

aparelhamento de repartições organizadas, formando assim, os órgãos

públicos.

Os agentes públicos são todas as pessoas físicas que executam uma

função pública, prestando serviços ao Estado, sendo, portanto, vinculados ao

Poder Público. Normalmente, eles desempenham funções do órgão público em

que integram distribuídas entre os cargos de que são titulares. Porém,

excepcionalmente podem exercer funções sem cargo.

A Lei 8.429/1992 que trata sobre sanções aplicáveis aos agentes

públicos nos casos de enriquecimento ilícito na Administração Pública,

conceituou agente público em seu art. 2º, como: reputa-se agente público, para

os efeitos desta Lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou

sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou

qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou

função nas atividades mencionadas no artigo anterior.

O conteúdo do artigo anterior desta lei faz referência a todos os agentes

da União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, bem como a

qualquer dos Poderes dessas pessoas federativas. Este conceito retrata o

sentido que os doutrinadores utilizam para esta expressão, mesmo constando

de uma lei que versa sobre sanções administrativas. A doutrina usa largamente

deste dispositivo de lei para conceituar genericamente o agente público, porém

é certo que este conceito não é totalmente taxativo.

Devido à amplitude deste significado, a noção do conceito abrange os

Chefes do Poder Executivo, em quaisquer das esferas federativas, os

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membros do Poder Legislativo, quais sejam, os senadores, os deputados e os

vereadores, os ocupantes de cargos ou empregos públicos da Administração

Direta dos três Poderes, os servidores das autarquias, das fundações públicas,

das empresas públicas, das sociedades de economia mista, enfim, todas as

pessoas que prestam serviços à Administração Pública direta, indireta e

fundacional.

Os agentes públicos agrupam-se em determinadas categorias dentro de

uma sistemática de classificação de natureza didática, sendo agregados de

forma diversificada entre os doutrinadores. A classificação mais comum dada

pelos mesmos se revela da seguinte forma: agentes políticos, agentes

administrativos, agentes honoríficos, agentes delegados e agentes

credenciados, podendo encontrar-se em determinadas obras de cunho

estritamente jurídicas a inclusão de outros tipos de classificação.

Os órgãos públicos são unidades de ação instituídas para o

desempenho das funções do Estado, sendo integrados por agentes públicos

que as executam, visando com isso, a manifestação da própria capacidade

volitiva do mesmo. Eles integram a estrutura do Estado e das demais pessoas

jurídicas, possuindo vontade e capacidade de exercerem direitos e contrair

obrigações para almejar seus fins instituídos em lei a favor do interesse

público, que constitui na primazia essencial do Estado.

Em sua obra, o doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello ensina

uma importante lição referente aos órgãos públicos e sua característica de

ente abstrato, vindo a desempenhar determinadas funções e atribuições

inerentes ao seu círculo de atuação perante o Estado e a Administração

Pública, como:

Órgãos são unidades abstratas que sintetizam os vários círculos de atribuições do Estado. Por se tratarem, tal como o próprio Estado, de entidades reais, porém abstratas (seres de razão), não têm nem vontade nem ação, no sentido de vida psíquica ou anímica próprias, que, estas, só os seres biológicos podem possuí-las. De

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fato, os órgãos não passam de simples repartições de atribuições, e nada mais.2

O autor esclarece que o caráter abstrato dos órgãos públicos se refere à

ausência de vida psíquica e de animosidade, que pertence somente aos seres

vivos. Os órgãos públicos constituem-se em repartições de atribuições estatais,

não possuindo vontade nem ação própria, tendo em vista que estas são

realizadas através dos agentes públicos que integram estes órgãos, daí a

referência do doutrinador ao caráter abstrato.

1. 5 – Administração Direta

A Administração direta ou centralizada é formada pelo conjunto de

órgãos que integram as pessoas federativas, aos quais foi atribuída

competência para o exercício das atividades administrativas estatais.

O Decreto-Lei 200/1967 em seu art. 4º, inciso I, dispõe que a

Administração direta se constitui dos serviços públicos integrados na estrutura

administrativa da Presidência da República e dos Ministérios.

O sistema federativo pátrio compreende a União, os Estados-membros,

o Distrito Federal e os Municípios.

Na esfera federal, a Administração direta da União, no Poder Executivo,

se compõe da Presidência da República e dos Ministérios, conforme

disposição expressa na Constituição Federal em seu art. 84, inciso II. O

Presidente da República é o chefe da Administração, tendo alguns órgãos

essenciais auxiliares, como a Casa Civil, a Advocacia Geral da União e os

Ministérios, tais como o da Saúde, o da Educação, o da Justiça, o do Desporto,

entre outros. A função básica dos Ministérios é auxiliar o Presidente da

República na atuação administrativa.

2 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 84.

19

No âmbito estadual, a Administração direta do Estado-membro, no

Poder Executivo, se compõe pelos Governadores dos Estados-membros, dos

órgãos de assessoria aos Governadores e das Secretarias Estaduais.

Já no campo municipal, a Administração direta do Município, no Poder

Executivo, se compõe da Prefeitura, dos órgãos de assessoria ao Prefeito e

das Secretarias Municipais.

A Administração direta do Distrito Federal, no Poder Executivo, se

compõe da Governadoria, dos órgãos de assessoria direta e de Secretarias

Distritais.

1. 6 – Administração Indireta

A Administração indireta ou descentralizada é formada pelo conjunto de

pessoas administrativas vinculadas à Administração direta, tendo como

objetivo desempenhar as atividades administrativas indiretamente. A

composição deste instituto é formada por pessoas jurídicas, também

chamadas de entidades. O art. 4º, inciso II, do Decreto-Lei 200/1967, dispõe

que a Administração indireta compreende certas categorias de entidades que

possuem personalidade jurídica própria, quais sejam, as autarquias, as

empresas públicas, as sociedades de economia mista e as fundações públicas.

Representa um agrupamento de entes personalizados vinculados a um

Ministério, prestando serviços de interesse público. O Poder Público transfere a

sua titularidade e a execução destes serviços para outras entidades, havendo

portanto, a delegação de poderes para obter uma maior divisão de atribuições

e funções, buscando por conseguinte a celeridade e a eficiência no

desempenho das atividades administrativas.

Todas as entidades federativas podem ter a sua Administração indireta,

podendo haver portanto, a Administração indireta federal, estadual, do distrito

federal e municipal. Basicamente, o Poder Executivo é incumbido da

Administração indireta.

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As pessoas jurídicas que integram a Administração indireta federal,

quais sejam, as autarquias, as empresas públicas, as sociedades de economia

mista e as fundações públicas, possuem três pontos em comum: a criação por

lei específica, a personalidade jurídica própria e o patrimônio próprio.

As autarquias são pessoas jurídicas autônomas, criadas por lei

específica, possuindo personalidade jurídica de Direito Público, patrimônio e

receitas próprios, com o objetivo de realizar atividades típicas da Administração

Pública.

O Decreto-Lei 200/1967 em seu art. 5º, inciso II, conceituou autarquia

como: serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio

e receita próprios, para executar as atividades típicas da Administração

Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa

e financeira descentralizada.

Pelo conceito acima transcrito, é de se notar que a expressão atividades

típicas da Administração Pública, é variada devido as infinidades de atividades

que podem ser desempenhadas pela mesma. Porém, é certo que dentre estas

atividades estão a execução de serviços públicos de natureza social,

excluindo-se os serviços e atividades de cunho econômico e industrial, tais

como a prestação de serviços bancários e a fabricação de produtos industriais.

Entre os serviços mais comuns prestados pelas autarquias estão nas

áreas de saúde, ensino, cultura, meio-ambiente, pesquisas científicas e

tecnológicas.

Dentre algumas autarquias, podemos citar, o Instituto Nacional de

Seguro Social, INSS; o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária,

INCRA; o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais,

IBAMA; o Banco Central do Brasil, a Ordem dos Advogados do Brasil, OAB e o

Conselho Regional de Medicina, CRM.

As autarquias podem ser criadas por qualquer entidade estatal, ou seja,

a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios, desde que

21

preenchem os requisitos para instituição, organização e funcionamento para

melhor satisfazer os interesses públicos.

As empresas públicas são pessoas jurídicas de Direito Privado, criadas

por lei, com capital exclusivamente público, para a prestação de serviços

públicos ou a exploração de atividade econômica de relevante interesse

coletivo, podendo revestir qualquer forma e organização empresarial.

Elas são geralmente destinadas à prestação de serviços públicos

industriais ou atividades econômicas em que o Estado tenha interesse próprio

ou considere convenientes à coletividade administrada.

O Decreto-Lei 200/1967 em seu art. 5º, inciso II, dá o conceito de

empresa pública como: a entidade dotada de personalidade jurídica de direito

privado, com patrimônio próprio e capital exclusivo da União, criada por lei para

a exploração de atividade econômica que o Governo seja levado a exercer por

força de contingência ou de conveniência administrativa, podendo revestir-se

de qualquer das formas admitidas em direito.

Apesar de este conceito mencionar somente o capital exclusivo da

União, é certo porém que, os Estados-membros, o Distrito Federal e os

Municípios podem criar, organizar e operar suas empresas públicas

desvinculadas destas disposições federais, visto que, a sua instituição é ato

administrativo pertencente ao Direito Público e não ato de Direito Privado.

Dentre algumas empresas públicas, podemos citar, a Empresa Brasileira

de Correios e Telégrafos, EBCT; o Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social, BNDES; a Financiadora de Estudos e Projetos, FINEP; a

Casa da Moeda do Brasil e a Caixa Econômica Federal.

As sociedades de economia mista são pessoas jurídicas de Direito

Privado, criadas por lei, com participação do Poder Público e de particulares no

seu capital e administração para a exploração de atividades gerais de caráter

econômico ou a prestação de serviços públicos. Revestem a forma das

empresas particulares, admitem lucro e regem-se pelas normas das

22

sociedades empresariais e instituídas por leis que autorizem sua criação e

funcionamento.

O Decreto-Lei 200/1967 em seu art. 5º, inciso III, deu um conceito de

sociedade de economia mista como: a entidade dotada de personalidade

jurídica de direito privado, criada por lei para a exploração de atividade

econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto

pertençam, em sua maioria, à União ou a entidade da Administração Indireta.

Este conceito se apresenta muito restrito. A forma de sociedade

anônima não poderia revestir-se somente desta, mas de outros tipos de

sociedades. Deveria dispor sobre a realização de outros serviços de interesse

público e não somente no campo da atividade econômica.

Como pessoa jurídica privada, a sociedade de economia mista deve

realizar, em seu nome e por sua conta em risco, serviços públicos de natureza

industrial ou atividade econômica de produção ou comercialização de bens,

suscetíveis de produzir lucro para promover os interesses públicos.

O objeto deste instituto pode ser um serviço público ou uma atividade

econômica empresarial.

Dentre as sociedades de economia mista, podemos fazer referência ao

Banco do Brasil S.A e o Petróleo Brasileiro S.A, PETROBRAS.

As fundações públicas são pessoas jurídicas de Direito Privado, se

caracterizando pela circunstância de ser atribuída personalidade jurídica a um

patrimônio preordenado a um fim social. Por se tratar de pessoa jurídica de

Direito Privado, estão reguladas nos artigos 62 a 69 do Código Civil.

Elas prestam-se, principalmente, à realização de atividades não

lucrativas do Poder Público, mas de interesse coletivo, tais como a educação,

a cultura, a pesquisa. Sua instituição depende de autorização de lei específica,

conforme preceitua o art. 37, inciso XIX da Constituição Federal.

23

O Decreto-Lei 200/1967 em seu art. 5º, inciso IV, conceituou fundação

pública como: a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado,

sem fins lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa, para o

desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos ou

entidades de direito público, com autonomia administrativa, patrimônio próprio

gerido pelos respectivos órgãos de direção, e funcionamento custeado por

recursos da União e de outras fontes.

A partir deste conceito, percebemos que as fundações públicas

possuem personalidade jurídica de Direito Privado, sem fins lucrativos em suas

atividades prestadas e visando satisfazer ao interesse coletivo, tendo como

objetivo principal, atender aos fins sociais com determinadas atividades, tais

como promover a cultura, a educação, a pesquisa. Dentre as fundações,

destacamos a Fundação Nacional do Índio, FUNAI; a Fundação Instituto

Oswaldo Cruz, FIOCRUZ e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística,

IBGE.

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CAPÍTULO II

PODERES ADMINISTRATIVOS

O vocábulo poder significa ter a faculdade, a possibilidade ou a

autoridade de fazer alguma coisa.

O administrador público investido das atribuições conferidas ao seu

cargo, necessita exercer sua autoridade para promover o bem da coletividade.

Para o regular exercício desta autoridade, ele tem que estar munido de

poderes inerentes à Administração Pública.

Estes poderes conferidos pela lei à Administração Pública são

concedidos aos agentes públicos para utilização nas suas atividades

administrativas, sendo, portanto, instrumentos de seus trabalhos.

Para atender efetivamente ao interesse público, a Administração Pública

possui os chamados poderes administrativos. Eles se originam com a

Administração Pública e se apresentam de diversos tipos e formas, segundo

as exigências do serviço público, dos interesses da coletividade e dos objetivos

a que se direcionam.

Os poderes administrativos são inerentes à Administração Pública de

todas as entidades estatais, quais sejam, a União, os Estados-membros, o

Distrito Federal e os Municípios na proporção e limites de suas competências

institucionais, podendo ser usados isolados ou cumulativamente para a

consecução dos atos administrativos, visando sempre a satisfação do

interesse público, que representa a regra geral buscada pelo Estado.

2. 1 – Conceito

Os poderes administrativos são o conjunto de prerrogativas de Direito

Público que o ordenamento jurídico confere aos agentes públicos para

promover os fins do Estado e do interesse público.

25

Estes poderes são outorgados aos agentes públicos para utilização e

execução das atividades administrativas, encerrando prerrogativas de

autoridade e exercidos dentro dos limites da lei e sempre com objetivos

específicos devidamente positivados.

Depois destas considerações gerais, passamos a destacar a principal

classificação dos poderes administrativos.

2. 2 – Poder Vinculado

O poder vinculado ou regrado é aquele conferido à Administração

Pública pela lei para a prática de ato de sua competência funcional,

especificando os requisitos e elementos imprescindíveis à sua realização.

A atuação dos agentes públicos fica limitada ao contido na lei,

possuindo liberdade de atuar mínima, pois terá que restringir-se ao enunciado

minucioso legal. Não havendo atendimento às especificações da lei pelo

agente público, o ato administrativo será nulo pela simples razão de mostrar-se

desvinculado da norma positiva.

O princípio da legalidade impõe aos agentes públicos a observância

plena da lei. Havendo omissão ou diversificação para a consecução dos atos e

poderes administrativos, serão estes invalidados pela própria Administração

Pública e, inclusive pelo Poder Judiciário através do controle judicial.

Raramente encontraremos atos administrativos exclusivamente

vinculados, porque sempre terá diversas opções de realização destes sobre os

quais possui a Administração Pública. A caracterização do ato vinculado está

na prevalência dos conteúdos expressos na lei, havendo também certa

liberdade de agir dentro da limitação legal.

Os elementos vinculados principais do ato administrativo são a

competência, a finalidade, a forma, o motivo e o objeto, havendo outros que a

lei poderá dispor para a consecução do ato.

26

A competência refere-se à atribuição legal do agente ou do órgão

público para a prática do ato. A finalidade é o objetivo do ato para proporcionar

o fim público indicado pela lei. A forma é o modo pelo qual o ato deve ser feito

para a sua validação legal. O motivo é a situação de direito ou de fato que

determina ou autoriza a realização do ato, podendo vir expresso em lei ou

deixado ao critério do administrador. O objeto é o assunto ou o conteúdo de

que trata o ato.

2.3 – Poder Discricionário

O poder discricionário é o que o Direito concede à Administração

Pública, de forma explícita ou implícita, para a prática de atos administrativos

com alternativas e liberdades na escolha de sua conveniência, oportunidade e

conteúdo para satisfazer o interesse público.

A lei não é capaz de traçar rigidamente todas as condutas de um agente

público. Mesmo que procure definir alguns elementos que limitam a atuação do

agente, ainda assim haverá na própria lei opções e possibilidades de

adequação e valoração de sua conduta, devendo ele avaliar sempre a

conveniência e a oportunidade dos atos praticados em prol da satisfação

pública.

A faculdade discricionária distingue-se da vinculada pela maior liberdade

de ação que é conferida ao agente público, sendo certo que tal liberdade deve

se adequar aos limites impostos e expressos pela lei.

O professor Dwight Cerqueira Ronzani aponta em sua obra uma

importante distinção referente ao poder arbitrário e o poder discricionário:

Não se pode estabelecer confusão entre discrição e arbítrio, entre poder discricionário e poder arbitrário. Este é resquício do absolutismo monárquico, quando o poder enfeixava-se nas mãos do Rei, sendo sua característica principal a ausência de qualquer tipo de limitação normativa; aquele tem berço na legalidade, por isso

27

mesmo ostenta os acentuados contornos da legitimidade. 3

A distinção feita pelo professor Dwight Cerqueira Ronzani demonstra

que o poder arbitrário tem sua origem no absolutismo monárquico, no qual os

reis soberanos estavam acima das leis, predominando o caráter da

irresponsabilidade pelos atos praticados pelo mesmo e por seus regentes,

prevalecendo somente os interesses da monarquia. Já no que tange ao poder

discricionário, está amparado na legalidade e na legitimidade.

O poder discricionário não se confunde com poder arbitrário. A

discricionariedade representa a liberdade de atuação do agente público, dentro

dos limites permitidos em lei, sendo sua conduta inteiramente legítima. Já o

arbítrio, representa uma ação contrária ou excludente da lei, sendo sempre

ilegítimo e inválido por afrontar as disposições legais.

Convêm esclarecer que a discricionariedade também deve subordinar-

se aos elementos da competência, da forma e da finalidade do ato, tal como

qualquer ato vinculado. O ato discricionário praticado por autoridade

incompetente ou realizado por forma diversa da prescrita em lei, ou ainda com

finalidade estranha ao interesse público, se constitui em ato ilegítimo, nulo e

arbitrário.

2.4 – Poder Hierárquico

Poder hierárquico é o que dispõe o Executivo quanto à distribuição e ao

escalonamento das funções de seus órgãos, ordenando a atuação de seus

agentes, estabelecendo a necessária relação de subordinação entre os

servidores integrantes de seu quadro funcional.

Hierarquia é a relação de subordinação existente entre os vários órgãos

e agentes do Executivo, com a distribuição de funções e o escalonamento da

3 RONZANI, Dwight Cerqueira. Direito Administrativo Concreto.2. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2003 p.114.

28

autoridade. Numa acepção mais simples, representa uma ordem e

subordinação dos poderes dispostos em grau ou escalões.

O objetivo do poder hierárquico é ordenar, coordenar, controlar,

fiscalizar, rever e corrigir as atividades administrativas no âmbito interno da

Administração Pública. A hierarquia atuará como instrumento de organização

dos serviços públicos, impondo responsabilidades aos agentes públicos em

graus de cargos ou funções com o estrito dever de obediência legal.

Do poder hierárquico decorrem faculdades implícitas para o superior

hierárquico, tais como a de dar ordens e fiscalizar o seu efetivo cumprimento, a

de delegar e avocar atribuições e a de rever os atos dos seus subordinados

inferiores na hierarquia.

A hierarquia é cabível somente no âmbito da função administrativa

estatal. Ela não se restringe somente ao Poder Executivo porque a função

administrativa se difunde entre todos os órgãos que a exercem, seja qual for o

Poder do Estado que integrem. Entretanto, inexiste qualquer tipo de hierarquia

entre os agentes públicos que exercem função jurisdicional ou legislativa.

2.5 – Poder Disciplinar

O poder disciplinar é a faculdade de punir as infrações funcionais dos

agentes públicos e demais pessoas sujeitas à disciplina dos órgãos e serviços

da Administração Pública, tais como os estudantes de uma escola pública.

A Administração Pública tem a prerrogativa de apurar as infrações e

aplicar as penalidades aos agentes públicos.

O poder disciplinar possui uma relação mútua com o poder hierárquico.

No uso do poder hierárquico, a Administração Pública distribui e escalona as

suas funções executivas numa relação de subordinação. Já no uso do poder

disciplinar, a Administração Pública controla o desempenho e desenvolvimento

dessas funções e a conduta de seus agentes, responsabilizando-os acaso

houver faltas ou infrações cometidas.

29

A punição disciplinar da Administração Pública não se confunde com o

poder punitivo estatal, realizado pela Justiça Penal, devido a independência

das instâncias administrativa e criminal. O poder disciplinar é exercido para

punir os agentes da Administração Pública quando estes praticam faltas ou

infrações funcionais na execução dos serviços públicos. Já o poder punitivo do

Estado é aplicado visando à repreensão de crimes e contravenções definidas

nas leis penais, sendo realizado pelo Poder Judiciário.

O poder disciplinar tem em si conteúdo de discricionariedade para a

aplicação da sanção administrativa. Há uma margem para ação da autoridade

pública, segundo seu prudente critério, aplicando a sanção que considerar

cabível, valendo-se sempre da oportunidade, do interesse e da conveniência

necessárias.

Os doutrinadores Maximilianus Cláudio Américo Fuhrer e Maximiliano

Roberto Ernesto Fuhrer ensinam uma importante característica do poder

disciplinar:

É uma outra face do poder hierárquico e tem por fim a punição do servidor infrator. Embora haja certa discricionariedade na aplicação das sanções, o poder disciplinar é obrigatório, sendo que a inércia da autoridade administrativa superior pode constituir crime (condescendência criminosa, art. 320 do CP).4

Neste sentido, expõe os autores sobre a natureza e a finalidade do

poder disciplinar, ou seja, a semelhança com o poder hierárquico e a finalidade

de punir o servidor público infrator. A discricionariedade está presente no

momento de aplicação da sanção administrativa, onde a autoridade pública

possui certa margem de ação para aplicar esta sanção com base na

oportunidade, interesse e conveniência desta medida. A inércia da autoridade

administrativa pode vir a constituir o crime de condescendência criminosa.

4 FUHRER, Maximilianus Cláudio Américo e FUHRER, Maximiliano Roberto Ernesto. Resumo de Direito Administrativo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2005 .p. 33.

30

No Código Penal Brasileiro, estão previstos no Título XI, os crimes

contra a Administração Pública. O art. 320 deste dispositivo legal prevê o crime

de condescendência criminosa, praticados por funcionário público na seguinte

redação: deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado

que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência,

não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente: Pena – detenção,

de 15 ( quinze) dias a 1 ( um) mês, ou multa.

Assim, o funcionário público que é benevolente com seu subordinado

que cometeu infração funcional, e não comunica o fato ao seu superior

hierárquico ou à autoridade competente, pratica esse crime de

condescendência criminosa, que apena o infrator com detenção de 15 (quinze)

dias a 1 ( um) mês ou multa.

As penas disciplinares geralmente são: a advertência, a suspensão, a

demissão, a cassação da aposentadoria ou disponibilidade, a destituição de

cargo em comissão e a destituição de função comissionada.

Conforme a gravidade do fato a ser punido, a autoridade pública

escolherá, entre as penas legais, a que melhor reprima a falta ou infração

cometida, entrando aí, o discricionarismo disciplinar.

A apuração da falta ou infração funcional caberá à autoridade pública,

valendo-se dos meios legais compatíveis com a gravidade da pena a ser

imposta, dando-se oportunidade de defesa ao servidor acusado. Se não

houver o atendimento destes requisitos, a punição será arbitrária, devendo ser

invalidada pelo Poder Judiciário através principalmente, do remédio

constitucional do mandado de segurança.

2.6 – Poder Regulamentar

O poder regulamentar consiste na faculdade desfrutada pelos Chefes do

Poder Executivo, em seus três graus, de explicar o conteúdo da lei para sua

correta execução, ou de expedir decretos autônomos sobre matéria de sua

competência ainda não disciplinada em lei. Sendo um poder inerente e

31

privativo dos Chefes do Executivo, é indelegável a qualquer subordinado.

Representa uma prerrogativa conferida à Administração Pública de editar atos

gerais para complementar as leis e permitir sua efetiva aplicação.

Os Chefes do Executivo tem o poder regulamentar para editar e

complementar as leis que porventura estejam com lacunas ou quando são

detectadas situações não previstas pelo Poder Legislativo. O instrumento do

poder regulamentar é feito através de decreto.

O regulamento constitui-se em ato administrativo geral e normativo

expedido privativamente pelos Chefes do Executivo nas três esferas de

atuação, através de decreto, visando explicar o modo e a forma de execução

da lei ou prover situações não previstas na mesma.

Hierarquicamente, o regulamento é inferior à lei, por isso não pode

contrariá-la, competindo ao Congresso Nacional sustar a eficácia de atos

normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar,

conforme prevê o art. 49, inciso V, da Constituição Federal.

2.7 – Poder de Polícia

O poder de polícia é a faculdade de que dispõe a Administração Pública

para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos

individuais em benefício da coletividade e do Estado.

O Estado busca deter a atividade dos particulares quando há uma

conduta contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social, ao

desenvolvimento e à segurança nacional.

A polícia administrativa se difunde por toda a Administração Pública, se

distinguindo da polícia judiciária, que possui uma atuação predominantemente

voltada às pessoas com um caráter repressivo e depois de cometida a

infração, difundindo-se nas corporações especiais, ou seja, na polícia civil e na

polícia militar.

32

O Código Tributário Nacional em seu art. 78 conceitua o poder de polícia

como: a atividade da Administração Pública que, limitando ou disciplinando

direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato,

em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem,

aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de

atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder

Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos

individuais ou coletivos.

Este conceito deu uma correta noção do poder de polícia, destacando o

aspecto ligado às limitações que a Administração Pública pode instituir sobre

os direitos.

O poder de polícia é inerente a toda a Administração Pública,

repartindo-se entre todas as esferas administrativas da União, dos Estados-

membros, do Distrito Federal e dos Municípios.

O professor Diogo de Figueiredo Moreira Neto dá um conceito didático

do poder de polícia, como:

Denomina-se polícia à função administrativa que tem por objeto aplicar concreta, direta e imediatamente as limitações e os condicionamentos legais ao exercício de direitos fundamentais, compatibilizando-os com interesses públicos, também legalmente definidos, com a finalidade de possibilitar uma convivência ordeira e valiosa. 5

A partir deste conceito, presenciamos o caráter de limitações e condições

ao exercício dos direitos fundamentais dos cidadãos. As ações ou omissões

individuais podem prejudicar o interesse público, razão pela qual, tem o poder

de polícia a função precípua de limitar e prevenir estes tipos de condutas,

visando estabelecer uma convivência harmoniosa e da mais perfeita ordem.

5 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002 .p. 386.

33

A razão do poder de polícia é o interesse social e o seu fundamento está

na soberania que o Estado exerce em seu território sobre todas as pessoas,

bens e atividades.

O regime de liberdades públicas em que todos nós vivemos, assegura o

uso normal dos direitos individuais, porém, não autoriza o abuso destes

direitos.

O objeto do poder de polícia administrativa é todo bem, direito ou

atividade individual que venha a prejudicar a coletividade ou pôr em risco a

segurança nacional. A Administração Pública pode condicionar o exercício de

direitos individuais e o uso de bens que afetem a coletividade em geral. A

finalidade do poder de polícia é a proteção ao interesse público que tenha

relevância, visando combater as atividades particulares contrárias à ordem

social e moral.

A extensão do poder de polícia abrange a proteção à moral e aos bons

costumes, a preservação da saúde pública, a segurança dos transportes e das

construções, possuindo cada área uma polícia específica para atuar e

preservar o interesse público. Os limites do poder de polícia são demarcados

pelo interesse social, em consonância com os direitos fundamentais do

indivíduo assegurados pela Constituição Federal em seu art. 5º.

O ato de polícia, como todo ato administrativo, fica sempre sujeito a

invalidação pelo Poder Judiciário quando for praticado com abuso, excesso ou

desvio de poder.

As sanções do poder de polícia geralmente se perfazem com a multa, a

interdição da atividade, o fechamento de estabelecimento, a demolição de

construção, o embargo administrativo de obra, e tudo o mais que houver de ser

impedido em defesa da moral, da saúde, da segurança pública e da segurança

nacional.

Estas sanções são impostas e executadas pela própria Administração

Pública em procedimentos administrativos compatíveis com as exigências do

34

interesse público. As sanções do poder de polícia são aplicáveis aos atos ou

condutas individuais que sejam inconvenientes e prejudiquem à coletividade,

mesmo que não venha a constituir crimes.

Para finalizarmos, citamos os principais exemplos de polícias

administrativas, tais como: polícia sanitária, polícia das construções, polícia de

trânsito, polícia ambiental, polícia de costumes, polícia da comunicação, polícia

do comércio e da indústria, polícia das profissões, polícia de estrangeiros.

35

CAPÍTULO III

PODERES E DEVERES DA AUTORIDADE PÚBLICA

Os poderes e deveres da autoridade pública se traduzem nos encargos

e obrigações que possuem a mesma quando exerce plenamente suas funções

e atribuições, gerando bens e interesses para a coletividade. As autoridades

públicas são os gestores da coisa pública, possuindo poderes e deveres

específicos exercidos por seus agentes públicos, sendo que estes possuem

responsabilidades próprias que devem ser obrigatoriamente seguidas.

Estes poderes e deveres são os expressos em lei, os impostos pela

moral administrativa e os exigidos pelo interesse da coletividade.

Cada agente público é investido num cargo ou função onde exerce

determinada parcela de poder público para o desempenho de suas atribuições.

Este poder é o que confia autoridade ao agente público para impor suas

decisões aos administrados. Se este tiver fora da sua função ou do seu cargo,

não poderá usar de sua autoridade pública, visto que, essa conduta

caracterizaria abuso do poder ou também abuso de autoridade, dependendo

do caso concreto descrito.

O poder é atribuído à autoridade para tirar os interesses particulares que

se contraponham aos interesses públicos. No Direito Público, o poder de agir é

uma obrigação advinda da lei e um dever para o agente que o detém,

diferentemente do Direito Privado em que o poder de agir representa uma

faculdade de atuar.

3.1 – Poder-Dever de agir

O poder tem para o agente público o significado de dever para com a

coletividade e para com os indivíduos, devido à obrigação do mesmo para

exercê-lo e executá-lo. Este poder pertencente à autoridade pública e seu

36

respectivo dever para com a coletividade administrada é irrenunciável e com

exercício obrigatório pelos agentes públicos.

A omissão do agente público no que tange à sua conduta, configura-se

como ilegal. Assim, o administrado poderá exigir da autoridade pública omissa

a conduta que ele deveria agir imposta na lei, o que poderá fazer pelo exercício

do direito de petição previsto no art. 5º, XXXIV, a, da Constituição Federal, que

diz: são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: o

direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra

ilegalidade ou abuso de poder.

Pelo dispositivo citado, podemos concluir que o direito de petição tem

por objetivo salvaguardar os direitos dos administrados quando há um abuso

de poder ou uma ilegalidade praticados por agentes do Poder Público na

esfera administrativa.

No entanto, é certo que nem toda omissão administrativa se caracteriza

como ilegal. As omissões genéricas são aquelas em que cabe ao

administrador público avaliar a conveniência e a oportunidade adequada para

concretizar as providências exigidas pelo interesse público, sendo este tipo de

omissão de caráter legal, como no exemplo dos projetos de obras públicas de

hidrelétricas, estradas, hospitais, escolas públicas, os quais não costumam ter

prazo certo para implementação. Já as omissões específicas são aquelas em

que a Administração Pública fica omissa em relação à determinação imposta

na lei, sendo este tipo de omissão revestido de ilegalidade, como no exemplo

de pedido formulado pelo administrado que possui previsão legal de prazo

certo para ser devidamente respondido, no entanto, a autoridade pública

permanece inerte e omissa.

O agente público que concorre com a omissão, poderá ser

responsabilizado civil, penal e administrativamente, conforme sua conduta de

inércia e omissão praticada.

3.2 – Dever de eficiência

37

O dever de eficiência corresponde a um dever de boa administração,

onde a Administração Pública deve comprometer-se a prestar os serviços

públicos com a maior eficiência possível, adequando estes serviços com o

interesse público e procurando uma avaliação e otimização das funções

públicas numa eficaz prestação de serviços aos administrados.

A eficiência funcional do agente público abrange sua produtividade no

desempenho de seu cargo ou função, sua perfeição no trabalho e sua

adequação técnica aos fins objetivados pela Administração Pública, para que

posteriormente avaliem-se os resultados alcançados e aperfeiçoem-se as

funções dos agentes públicos através de seleção e treinamento. A verificação

da eficiência visa aprimorar os aspectos quantitativo e qualitativo do serviço

público prestado para satisfazer os administrados e a própria conservação e

manutenção da Administração Pública.

A eficiência veio a tornar-se um princípio administrativo através da

emenda constitucional nº. 19 de 04/06/1998, que introduziu no art. 37, caput,

da Constituição Federal a eficiência dentre os princípios ali especificados.

3.3 – Dever de probidade

O dever de probidade está integrado na conduta do agente público

como elemento indispensável à legitimidade e legalidade de seus atos.

Probidade significa ter o agente honestidade, integridade, honra, seriedade,

atitude correta. Os atos de improbidade administrativa punem o administrador

público com sanções políticas, administrativas e penais. O art. 37, § 4º, da

Constituição Federal dispõe que: os atos de improbidade administrativa

importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a

indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação

previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

A Lei 8.429/1992 dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes

públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo,

emprego ou função na Administração Pública direta, indireta e fundacional.

38

Dentre os ilícitos cometidos previstos estão o enriquecimento ilícito, o prejuízo

ao erário público e as afrontas aos princípios da Administração Pública,

estabelecidos no art. 37 da Constituição Federal.

O ato administrativo praticado com lesão aos bens e interesses públicos

também fica sujeito a invalidação pela Administração Pública ou pelo Poder

Judiciário, por vícios de improbidade, que constitui-se numa conduta grave,

prejudicial e ilegítima.

3.4 – Dever de prestar contas

O dever de prestar contas decorre de toda administração, como uma

espécie de encargo de gestão de bens e interesses alheios. O administrador

público gere os bens e interesses da coletividade, possuindo um múnus

público com a mesma e tendo o dever de prestar contas de sua gestão.

A prestação de contas não se refere somente aos dinheiros públicos e à

gestão financeira, mas também a todos os atos de governo e de

administração. A Constituição Federal em seus artigos 70 a 75, prevê o dever

de prestar contas aos administradores e aos demais responsáveis por bens e

valores públicos. O dever de prestar contas alcança não só administradores de

entidades e órgãos públicos, como também os entes paraestatais e os

particulares que recebam auxílios pecuniários concedidos pelos Poderes

Públicos, conforme os termos expressos no art. 70, caput e parágrafo único, da

Constituição Federal.

Assim, quem gera dinheiro público ou administra bens ou interesses da

coletividade, deve prestar contas ao órgão fiscalizador competente. Essa

prestação de contas é feita ao órgão legislativo de cada entidade estatal

através do Tribunal de Contas, que auxilia o controle externo da administração

financeira, orçamentária e de gestão fiscal.

39

CAPÍTULO IV

USO E ABUSO DO PODER

As origens do abuso do poder residem nos primórdios de ascensão do

absolutismo monárquico. Os reis soberanos detinham o poder absoluto estatal,

estando no controle de todas as leis e exercendo este poder sem qualquer tipo

de limitação normativa, valendo-se somente de seus interesses e os da

monarquia.

O absolutismo monárquico não se preocupava com as aspirações e

necessidades de seu povo, deixando-os a mercê dos atos praticados pelo rei,

que na maioria das vezes prejudicava-os. Deste modo, o povo passou a sofrer

fome, desemprego, elevação de impostos, violência constante, prisões ilegais

e todo e qualquer tipo de arbitrariedade e ilegalidade.

Neste sentido, as determinações dos reis soberanos tinham que ser

cumpridas obrigatoriamente por seus súditos regentes, sob pena destes serem

presos ou executados e, por conseguinte, mostrava-se ao povo sobre as

conseqüências advindas pela desobediência à monarquia que poderiam ser

aplicadas também a eles.

Assim, a monarquia absolutista estava acima das leis, possuindo total

ilegalidade e irresponsabilidade pelos atos praticados, almejando uma maior

supremacia do poder, com a finalidade de satisfazer somente seus interesses.

Atualmente, o abuso do poder está presente em qualquer forma de

governo, seja nos governos republicanos, seja nos governos monárquicos.

4. 1 – Conceito

A palavra uso, significa ato ou efeito de usar, empregar, executar,

aplicar, utilizar, praticar, exercer algo.

Sendo o uso do poder prerrogativa da autoridade pública, ele deve ser

praticado normalmente, ou seja, há de ser empregado segundo as normas

40

legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as principais exigências do

interesse público.

O poder é confiado ao administrador público para ser usado em

benefício da coletividade administrada, sendo utilizado nos limites que o bem-

estar social exigir.

Os agentes públicos têm a seu cargo a execução de certas funções

exigidas pela lei e pelo interesse público, que devem ser exercidas para

beneficiar toda a coletividade em consonância com os limites expressa ou

implicitamente expressos nas normas e na lei.

Portanto, o uso do poder se traduz na utilização normal pelos agentes

públicos das prerrogativas que a lei lhes confere.

A utilização desproporcional do poder pelos agentes públicos, o

emprego arbitrário da força, a violência contra o administrado, constituem

formas abusivas do uso do poder. Quando a Administração Pública, por meios

de seus agentes, assim age, fica caracterizado o abuso do poder público.

O vocábulo abuso, significa mau uso, uso errado, excessivo ou injusto.

Os agentes públicos quando exercem suas funções públicas cometendo

qualquer tipo de ilegalidade, estarão perpetrando condutas que violam os

preceitos legais através do abuso do poder administrativo, o qual é conferido

aos mesmos.

O abuso do poder é gênero sobre que a doutrina tem procurado reunir

algumas formas ou modalidades de comportamento ilegal e reprovável

cometidos por agentes públicos no exercício da atividade administrativa

estatal.

José dos Santos Carvalho Filho em sua obra, expõe sobre o abuso do

poder nos seguintes termos:

Nem sempre o poder é utilizado de forma adequada pelos administradores. Como a atuação deve sujeitar-se aos

41

parâmetros legais, a conduta abusiva não pode merecer aceitação no mundo jurídico, devendo ser corrigida na via administrativa ou judicial. A utilização do poder, portanto, deve guardar conformidade com o que a lei dispuser.6

Assim, esclarece o autor que o abuso do poder deve ser rejeitado pelo

ordenamento jurídico, por constituir-se em desrespeito à lei, sendo sanado

pela Administração Pública ou pelo Poder Judiciário, em acordo com as

disposições legais.

O abuso do poder se constitui numa conduta ilegítima do administrador

público quando atua fora dos objetivos expressa ou implicitamente traçados na

lei. A autoridade pública, embora tendo competência para praticar ato

administrativo, ultrapassa os limites de suas atribuições ou se desvia dos

objetivos da Administração Pública.

Este instituto se apresenta de diversas formas, tais como a prática de

violência, as arbitrariedades, as perseguições, as dissimulações, as

chantagens, as omissões, sendo isto, obviamente, contrário aos preceitos de

moral e de ética contidos na lei.

O abuso do poder pode assumir tanto a forma comissiva quanto a

omissiva. A forma comissiva resulta de uma conduta positiva do agente público

que contraria a lei. A forma omissiva resulta da inércia da autoridade pública

quando deixa de executar os serviços públicos obrigatórios expressos em lei,

lesando assim, os administrados.

4. 2 – Excesso de poder

6 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 11. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 33.

42

O excesso de poder ocorre quando o agente público atua fora dos

limites de sua competência, invadindo atribuições cometidas a outro agente ou

praticando atividades que a lei não lhes conferiu.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro conceitua e dá alguns exemplos de

excesso de poder:

O excesso de poder ocorre quando o agente público excede os limites de sua competência; por exemplo, quando a autoridade, competente para aplicar a pena de suspensão, impõe penalidade mais grave, que não é de sua atribuição; ou quando a autoridade policial se excede no uso da força para praticar ato de sua competência. 7

Assim, o excesso de poder se caracteriza pela exorbitância no uso do

poder pelos agentes públicos, os quais ultrapassam os limites de seus cargos

funcionais, adentrando na competência de outra autoridade pública ou

excedendo no uso do seu poder quando pratica ato de sua atribuição.

O excesso de poder torna o ato arbitrário, ilícito e nulo, retirando a

legitimidade da conduta do agente público, colocando-o na ilegalidade. A

espécie excesso de poder decorre de vício no requisito da competência,

quando esta é exercida além daquilo que a lei permite.

4. 3 – Desvio de poder

O desvio de poder ou de finalidade ocorre quando a autoridade pública,

embora atuando nos limites de sua competência, pratica o ato buscando

alcançar fins diversos daqueles determinados em lei ou exigidos pelo interesse

público.

Se o agente público atua em descompasso com a lei e o interesse

público, desvia-se de seu poder, praticando assim, conduta ilegítima. Por isso

é que tal vício também é chamado de desvio de finalidade, sendo esta

7 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1995. p. 198.

43

denominação adotada no art. 2º, parágrafo único, alínea e, da Lei 4.717/1965,

que regula a ação popular, nos termos seguintes: o desvio de finalidade se

verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto,

explícita ou implicitamente, na regra de competência.

Pela análise deste dispositivo, entende-se que o desvio de finalidade

acontece quando o agente público dá outro fim ao ato, que não é o que está

previsto em lei.

Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo fazem um comentário sobre o

requisito finalidade, assim:

A finalidade é requisito sempre vinculado e é idêntico para todo e qualquer ato administrativo, vale dizer, o fim almejado por qualquer ato administrativo é o interesse público. O objetivo mediato de toda atuação da Administração é a tutela do interesse público. Esta finalidade, elemento vinculado de qualquer ato administrativo, pode estar expressa ou, o que é mais comum, implícita na lei. 8

A finalidade é elemento vinculado de todo ato administrativo, porque o

ordenamento jurídico não admite ato administrativo sem finalidade pública ou

desviado de sua finalidade específica. O objetivo de qualquer ato

administrativo é a satisfação do interesse público, sendo que pode estar

expresso ou implícito na lei.

O ato administrativo praticado com desvio de finalidade pode ser

consumado às escondidas ou se apresenta disfarçado sob a legalidade e o

interesse público.

Em sua obra, Antônio Queiroz Telles define o desvio de poder focando

alguns possíveis fins objetivados pelos agentes públicos:

8 ALEXANDRINO, Marcelo e PAULO, Vicente. Direito Administrativo. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2003. p. 168.

44

O desvio de poder (ou de finalidade) significa atuação do administrador competente de maneira inteiramente contrária à lei e, assim, em desatendimento ao interesse público, movido tão-só pela obtenção de vantagem, privilégio para si, ou para outrem, ou pelo desejo de vingança. 9

O agente público desvia das finalidades que deve buscar e executar de

acordo com as disposições legais para obter proveitos e vantagens para si ou

para outrem, com interesses próprios e em desacordo com os interesses

públicos, que é a finalidade efetiva da Administração Pública.

Estes desvios de finalidade ocorrem por exemplo, quando a autoridade

pública decreta uma desapropriação alegando utilidade pública, mas visando a

satisfazer interesse pessoal de algum particular com a subseqüente

transferência do bem expropriado; ou quando outorga uma permissão sem

interesse coletivo ou quando classifica um concorrente por favoritismo, sem

atender aos fins objetivados pela licitação.

O desvio de poder ou de finalidade se difere do excesso de poder. Este

último ocorre quando a autoridade pública, embora competente para praticar o

ato, atua exorbitando no uso desta competência, ultrapassando os limites

impostos pela lei e em desacordo com as exigências do interesse público. Já o

desvio de poder ou de finalidade ocorre quando a autoridade pública, embora

atue nos limites de sua competência, pratica o ato por motivos ou com fins

diversos dos objetivados pela lei ou exigidos pelo interesse público.

A prova do desvio de poder é difícil de fazer-se. A autoridade pública

age, quase sempre, com extrema cautela, acobertando-se sob a máscara da

legalidade, ou seja, pratica um ato ilegal procurando revesti-lo de legalidade,

que no caso é aparente.

9 TELLES, Antônio Queiroz. Introdução ao Direito Administrativo. São Paulo: RT, 1995. p. 72.

45

A prova deve encontrar-se na documentação que figura no expediente

administrativo. Também é admitida a prova testemunhal e as provas por

indícios.

No exame da prova, é necessário ter certas precauções, pois a

Administração Pública não examina somente a intenção subjetiva do agente

público, mas valora-se mais o próprio ato e os documentos administrativos que

o acompanham, tais como arquivos, cartas, bilhetes, declarações à imprensa,

confissões.

O professor José Cretella Júnior demonstra a relevância do desvio de

poder nos dias atuais, desse modo:

Tema de grande atualidade, relevante, não descurado na literatura especializada dos vários países, o desvio do poder merece especial desenvolvimento e rigoroso tratamento sistemático, pela freqüência cada vez maior com que ocorre na prática e é considerado pelos tribunais, posto que antes nem sempre tenha sido designado com a precisa individuação terminológica, o que o deixava como que entrelaçado com outras figuras do mundo jurídico. 10

Atualmente, a abrangência do desvio de poder é cada vez maior devido

à freqüência e o desenvolvimento constante da prática de abuso do poder.

Antes, não havia uma sistemática terminológica sobre este instituto, ficando

sua caracterização difícil de ser detectada, posto que se misturava com outras

figuras jurídicas abusivas e ilegais.

4. 4 – Omissão da Administração Pública

A omissão da Administração Pública pode representar aprovação ou

rejeição da pretensão do administrado, tudo dependendo do que dispuser a

norma legal. Quando a lei limita-se a fixar prazo para a prática do ato, sem

indicar as conseqüências da omissão administrativa, há que se investigar

10 CRETELLA JR, José. Curso de Direito Administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 290.

46

minuciosamente em cada caso, os efeitos advindos do silêncio. É certo,

porém, que o administrado jamais perderá seu direito subjetivo enquanto

perdurar a omissão da Administração Pública na manifestação que lhe

compete.

Quando não houver prazo legal, regulamentar ou regimental para a

decisão, deve-se aguardar por um tempo razoável a manifestação da

autoridade ou do órgão competente e se ultrapassado este prazo, o silêncio e

a inércia da Administração Pública converte-se em uma espécie de abuso do

poder, sendo corrigida pela via administrativa ou judicial, tal como ação

ordinária, medida cautelar, mandado de injunção ou mandado de segurança.

Ao Poder Judiciário caberá impor a prática do ato omitido ou suprir seus efeitos

nocivos, visando restaurar ou amparar o direito violado do administrado.

Assim, o silêncio constitui-se em conduta omissiva da Administração

Pública que, quando ofende direito individual ou coletivo dos administrados, é

ilegal e sujeita-se a correção e reparação desta inércia na via administrativa ou

judicial, indenizando o administrado prejudicado.

4. 5 – Improbidade administrativa

A Constituição Federal em seu art. 37 ordena os princípios básicos da

Administração Pública e expressamente determina no parágrafo 4º deste

mesmo dispositivo, a imposição de sanções para os atos de improbidade

administrativa.

A improbidade administrativa é entendida pelo ato que afronta os

princípios orientadores da atuação administrativa praticados por agentes

públicos, constituindo-se num ilícito político-administrativo que induz à

aplicação de sanções de natureza administrativa em processo judicial.

A Lei 8.429/1992 classifica e define os atos de improbidade

administrativa em três espécies: atos de improbidade que importam

enriquecimento ilícito (art. 9º), atos de improbidade que causam prejuízo ao

erário (art. 10) e os atos de improbidade que atentam contra os princípios da

47

Administração Pública (art. 11). Para cada espécie há uma previsão de

punições expressas no art. 12 e incisos da referida lei. Conforme o caso, as

cominações podem ser: perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente,

ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos

direitos políticos, multa civil, proibição de contratar com o Poder Público ou

receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Ao Poder Judiciário cabe

aplicar estas sanções, levando-se em conta a extensão do dano causado e o

proveito patrimonial obtido pelo agente público, conforme prevê o parágrafo

único do art. 12 desta lei.

O sujeito ativo da improbidade administrativa é o agente público e o

particular que concorre ou se beneficia pelo ato. O sujeito passivo da

improbidade administrativa é a União, os Estados-membros, o Distrito Federal,

os Municípios, as Autarquias, as Empresas Públicas, as Sociedades de

Economia Mista, as empresas incorporadas ao patrimônio público ou de

entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com

mais de 50 % ( cinqüenta por cento) do patrimônio ou da receita anual, as

entidades que recebam subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício,

de órgãos ou empresas públicas, consoante os termos expressos no art. 1º,

caput e parágrafo único da presente lei.

A responsabilização e a punição dos agentes públicos fazem-se por

meios internos e externos. Os meios internos abrangem o processo

administrativo disciplinar e os meios sumários, com a garantia do contraditório

e da ampla defesa. Os meios externos compreendem os processos judiciais,

civis e criminais. Ao Direito Administrativo só interessam os meios internos

como formas específicas de proteção ao serviço público e de repressão às

infrações funcionais dos agentes públicos.

Conforme a gravidade da infração a ser apurada e aplicada, a

Administração Pública disporá do meio de responsabilização adequado, que

vai desde o processo administrativo disciplinar até a apuração sumária da falta,

através de sindicância administrativa, possibilitando ao agente público infrator

48

a ampla defesa e o contraditório, previstos no art. 5º, inciso LV, da Constituição

Federal, assim: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos

acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os

meios e recursos a ela inerentes.

O seqüestro e o perdimento de bens são cabíveis contra os agentes

públicos que enriqueceram ilicitamente com o produto do crime cometido em

desfavor da Administração Pública ou por influência ou com abuso de cargo,

função ou emprego público. O seqüestro é medida cautelar e o perdimento de

bens é medida definitiva amparada na Constituição Federal em seu artigo 5º,

inciso XLV.

O enriquecimento ilícito decorre da prática de crimes contra a

Administração Pública, regulados no Código Penal Brasileiro nos artigos 312 a

327. Neste caso, os agentes públicos podem ser processados tanto na via

administrativa como na via judicial, separadamente ou concomitantemente,

dependendo do caso concreto.

4. 6 – Abuso de autoridade

O abuso de autoridade é disciplinado pela Lei 4.898/1965, que regula o

direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa, civil

e penal, nos casos de abuso de autoridade, sujeitando-se os agentes públicos

federais, estaduais ou municipais a estas três esferas de responsabilidades

citadas.

A apuração da responsabilidade civil faz-se por ação ordinária, perante

a Justiça Comum federal ou estadual. A responsabilidade administrativa e a

responsabilidade penal são apuradas através de processos especiais

estabelecidos em lei, mediante representação da vítima à autoridade superior

ou ao Ministério Público competente para a ação penal.

Os abusos de autoridade puníveis nesta lei são os indicados nos artigos

3º e 4º, relativos à liberdade individual, à inviolabilidade do domicílio a da

correspondência e aos direitos de locomoção, de culto, de crença, de

49

consciência, de voto e de reunião, os concernentes à incolumidade física do

indivíduo.

Para os efeitos dessa lei, considera-se autoridade todo aquele que

exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza civil ou militar, ainda

que transitoriamente ou sem remuneração.

As penas por abuso de autoridade no âmbito administrativo se

apresentam de diversas sanções, tais como a advertência administrativa, a

repreensão, a destituição de função, a demissão. Já no âmbito criminal, as

penas são as multas, a detenção, a perda do cargo, a inabilitação para exercer

função pública.

4. 7 – Abuso do poder e ilegalidade

Pela própria natureza do fato em si, todo abuso do poder se configura

como ilegalidade. Não se pode idealizar que a conduta de um agente público,

fora dos limites de sua competência de atribuição ou despida da finalidade da

lei, possa compatibilizar-se com a legalidade. É certo que nem toda ilegalidade

decorre de conduta abusiva, mas todo abuso se reveste de ilegalidade, sendo

passível de revisão administrativa ou judicial.

O poder administrativo é conferido ao agente público para ser

devidamente utilizado e só dessa forma é que se pode afirmar a presença da

legalidade. Sem a utilização conforme a lei, o abuso do poder estará presente

pelo caráter da ilegalidade.

4.8 – Mandado de segurança

A Constituição Federal contempla duas formas de mandado de

segurança: o mandado de segurança individual (art. 5º, LXIX), com a finalidade

de proteger direito subjetivo individual líquido e certo, e o mandado de

segurança coletivo (art. 5º, LXX), com a finalidade de proteger direitos e

interesses coletivos de certas entidades ali delimitadas.

50

O mandado de segurança é um remédio constitucional, com natureza de

ação civil de rito sumário especial, pela qual qualquer pessoa, física ou jurídica,

pode provocar o controle jurisdicional estatal, quando sofrer lesão ou ameaça

de lesão a direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus, em

decorrência de ato ou omissão de autoridade praticado com ilegalidade ou

abuso de poder. Pode também ser praticado por omissão da autoridade

pública ou por agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder

Público.

Este instituto está regulado pela Lei 1.533/1951 e também está previsto

na Constituição Federal em seu art. 5º, LXIX, desse modo: conceder-se-á

mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por

habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou

abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no

exercício de atribuições do Poder Público. Trata-se aqui do mandado de

segurança individual.

O ato de autoridade é todo aquele praticado por pessoa investida de

certa parcela de poder público, sendo emanado do Estado, por meio de seus

agentes e órgãos, ou de pessoas jurídicas que exerçam funções delegadas,

abrangendo portanto, os atos praticados pelos órgãos e agentes da

Administração direta e da Administração indireta, incluindo também, os atos

emanados de particulares que ajam por delegação do Poder Público. A

ilegalidade ou abuso de poder decorre de vícios dos atos administrativos, que

podem ser quanto ao sujeito, ao objeto, ao motivo, à finalidade e à forma. A

lesão ou ameaça de lesão refere-se ao direito de pessoa física ou jurídica que

deve estar sendo lesado ou ameaçado de lesão por atos que produzem efeitos

prejudiciais e nocivos. O direito líquido e certo é o que necessita ser invocado

quando está expresso em norma legal, e que traz em si todos os requisitos e

condições de sua aplicação ao impetrante.

O administrativista Hely Lopes Meirelles aponta em sua doutrina sobre o

direito líquido e certo:

51

Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. O prazo para impetração é de cento e vinte dias do conhecimento oficial do ato a ser impugnado.11

A partir deste conceito, é correto afirmar e constatar que se existência

do direito for duvidosa, ou se a sua extensão ainda não estiver devidamente

delimitada e se o seu exercício depender de situações e fatos ainda

indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser definido por

outros meios judiciais cabíveis. Mas o próprio autor veio após questionar este

conceito, achando-o insatisfatório, observando que o direito, quando existente,

é sempre líquido e certo, porém, os fatos é que podem ser imprecisos e

incertos, exigindo comprovação e esclarecimento para favorecer a devida

aplicação do direito invocado pelo postulante. Quanto ao prazo citado, este

está expresso no art. 18 da Lei 1.533/1951, sendo de 120 (cento e vinte) dias

contados da ciência, para impetrar mandado de segurança e a partir do

conhecimento oficial do fato.

Somente o próprio titular do direito tem legitimidade para impetrar o

mandado de segurança individual, que é oponível contra qualquer autoridade

pública ou contra agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições

públicas, com o objetivo de corrigir ato ou omissão ilegal ou decorrente de

abuso de poder.

O mandado de segurança coletivo se constitui em remédio

constitucional que pode ser impetrado e colocado à disposição de partido

político com representação no Congresso Nacional, ou de organização

sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída, e em

funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, em defesa dos interesses de seus

membros ou associados, conforme é previsto nos termos do art. 5º, LXX da

Constituição Federal. Seus pressupostos são os mesmos do mandado de

11 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 689.

52

segurança individual, inclusive quanto ao direito líquido e certo, só que, a tutela

jurisdicional não é individual, e sim coletiva.

Logo abaixo, uma jurisprudência referente ao tema abordado, nestes

temos:

Mandado de Segurança contra Ato Judicial. Cabimento. Concessão da

segurança em virtude de julgamento de 1º grau deferir liminar “inaudita altera

parte”, em ação de cautela, sem atender às exigências do art. 804 do CPC, a

agir conseqüentemente com abuso de poder (art. 5º, LXIX, da Constituição

Federal ). MS nº 304/89 – Rel. Des. Jorge Loretti – 5ª Câmara Cível do

Tribunal de Justiça – RJ – Ementário: 37/92 – nº 92 – 1989.

Sobre o objeto do mandado de segurança coletivo, explica Márcio

Fernando Elias Rosa, assim:

O objeto é a defesa de direito líquido e certo que não seja meramente individual, mas coletivo, difuso ou individual homogêneo, lesionado ou sob ameaça de lesão por ação ou omissão de agente público ou de particular que atue por delegação, concessão ou mera autorização do Poder Público. 12

Assim, o objeto do mandado de segurança coletivo se difere do

mandado de segurança individual. O primeiro visa defender o direito líquido e

certo dos interesses coletivos dos entes referidos no art. 5º, LXX, da

Constituição Federal, enquanto o segundo visa defender direito líquido e certo

de pessoa física ou jurídica, tomada em sua individualidade.

Em suma, a pessoa física ou jurídica que for lesada ou sofrer ameaça

de lesão, pode impetrar mandado de segurança para proteger direito líquido e

certo, contra atos de ilegalidade ou abuso de poder. Visa precipuamente a

coibir atos ilegais de autoridade que lesam direito subjetivo, líquido e certo do

impetrante.

12 ROSA, Márcio Fernandes Elias. Direito Administrativo. Vol. 19. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p.

53

CONCLUSÃO

O uso e o abuso do poder na Administração Pública foi o tema

abordado neste trabalho monográfico.

A Administração Pública é uma organização estatal de entidades e

órgãos que desempenham as funções públicas, através dos agentes públicos.

Os agentes públicos são pessoas físicas investidas num cargo ou

função pública prevista por lei, que executam determinados serviços públicos

com a finalidade de satisfazer as exigências do interesse público.

Para executar tais atribuições, é necessário que os agentes públicos

estejam munidos de poderes, os quais são delimitados pela lei para

desenvolvimento das atividades administrativas. Portanto, os agentes públicos

possuem os poderes administrativos, que representam o conjunto de

prerrogativas legais que são conferidas aos mesmos para promover a

preservação e desenvolvimento do Estado e a satisfação dos interesses

públicos exigidos pelos administrados. Quando o agente público usa esse

poder normalmente, ele age dentro da legalidade e promove os interesses da

coletividade administrada, caracterizando assim, o uso do poder que lhe é

outorgado pela lei.

Porém, quando o agente público usa esse poder com abuso, ele age

dentro da ilegalidade, caracterizando o abuso do poder, no qual pode

revestir-se de diversas espécies e formas, tais como o desvio de poder ou de

finalidade, o excesso de poder e a omissão da Administração Pública. O

desvio de poder ou de finalidade ocorre quando o agente público dá fins

diversos aos atos administrativos do que está determinado na lei, desviando-se

de suas atribuições legais e geralmente buscando promover interesses

particulares e não os interesses públicos. O excesso de poder ocorre quando o

agente público pratica atos que não são de sua competência legal, invadindo

54

atribuições funcionais de outros agentes públicos, excedendo, portanto, os

limites de sua competência. A omissão da Administração Pública se

caracteriza pela inércia da mesma, quando deveria se pronunciar sobre a

prática de ato administrativo. Quando ofende direito individual ou coletivo dos

administrados, a omissão converte-se em abuso do poder. Constantemente,

presenciamos casos de abuso do poder denunciados pelos veículos de

imprensa nacional em todos os seus segmentos, tais como nas rádios, jornais

e internet.

O caso mais absurdo de abuso do poder ocorreu no mês de março de

1997, quando um cinegrafista amador gravou imagens de uma blitz efetuada

por nove policiais militares na Favela Naval em Diadema, município da região

metropolitana de São Paulo, onde houve agressões a treze pessoas que

transitavam durante a noite nesta favela.

Em certo momento, três pessoas passavam nesta região de carro,

quando foram obrigadas a parar o veículo para a vistoria. Efetuada a revista no

carro, os passageiros perguntaram aos policiais se estavam dispensados,

quando bruscamente estes últimos começaram a espancá-los com bofetões na

cara, chutes e pontapés. Após estes reprováveis atos dos policiais, os

passageiros foram liberados e iam partindo para suas casas, quando um dos

policiais conhecido pelo apelido de Rambo, disparou duas vezes na direção do

vidro traseiro do carro, atingindo fatalmente o passageiro Mário Josino.

Com as imagens aparecendo nos diversos veículos de comunicação

nacional e inclusive internacional, houve a prisão destes noves policiais

militares, sendo que seis deles foram condenados pelo crime de abuso de

autoridade, instituto abordado nesta monografia, e o policial Rambo foi

condenado pela Justiça Comum a 47 anos de prisão por homicídio doloso.

Analisando este caso, presenciamos um abuso do poder praticados por

agentes públicos no exercício das funções públicas, sendo que no nosso país

teve muitos casos de abuso do poder, tal como na época da ditadura militar.

55

Para conter o abuso do poder, o prejudicado deve procurar os órgãos de

controle interno da Administração Pública através de instrumentos próprios,

tais como a representação, a reclamação, pedido de reconsideração, dentre

outros, ou buscar a tutela jurisdicional através do Poder Judiciário, valendo-se

principalmente do mandado de segurança contra atos de ilegalidade ou abuso

de poder.

O abuso do poder sempre irá existir, porém devemos procurar agir

acreditando na moralização da Administração Pública e na conscientização

dos detentores do poder na busca pelos interesses públicos dos

administrados, para ao final chegarmos numa sociedade mais justa e

objetivando preservar os preceitos éticos e morais de um verdadeiro estado

democrático de direito.

É com essa visão de pensamento que devemos nos posicionar de

acordo com a moralidade e legalidade administrativa.

56

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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TELLES, Antônio Queiroz. Introdução ao Direito Administrativo. São Paulo: RT,

1995.

58

ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 12

1.1 – Conceito 13

1.2 – Finalidade 14

1.3 – Princípio da legalidade 15

1.4 – Estrutura administrativa 15

1.5 – Administração direta 18

1.6 – Administração indireta 19

CAPÍTULO II

PODERES ADMINISTRATIVOS 24

2.1 – Conceito 24

2.2 – Poder vinculado 25

2.3 – Poder discricionário 26

2.4 – Poder hierárquico 27

2.5 – Poder disciplinar 28

2.6 – Poder regulamentar 30

2.7 – Poder de polícia 31

CAPÍTULO III

PODERES E DEVERES DA AUTORIDADE PÚBLICA 35

59

3.1 – Poder-Dever de agir 35

3.2 – Dever de eficiência 36

3.3 – Dever de probidade 37

3.4 – Dever de prestar contas 38

CAPÍTULO IV

USO E ABUSO DO PODER 39

4.1 – Conceito 39

4.2 – Excesso de poder 41

4.3 – Desvio de poder 42

4.4 – Omissão da Administração Pública 45

4.5 – Improbidade administrativa 46

4.6 – Abuso de autoridade 48

4.7 – Abuso do poder e ilegalidade 49

4.8 – Mandado de segurança 49

CONCLUSÃO 53

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 56

ÍNDICE 58

60

FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição:

Título da Monografia:

Autor:

Data da entrega:

Avaliado por: Conceito: