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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” O DIREITO DAS OBRIGAÇÕES Paulo Armando Nery Guimarães Rio de Janeiro 2007

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

O DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

Paulo Armando Nery Guimarães

Rio de Janeiro

2007

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

O DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

Objetivos: Esta publicação atende a complementação

didático-pedagógica de Metodologia da

Pesquisa e a produção e desenvolvimento de

monografia, para o curso de pós-graduação

em Psicologia Jurídica.

Paulo Armando Nery Guimarães

Rio de Janeiro

2007

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AGRADECIMENTOS

As Professoras Luciane, Erica, Diva e Nádia por todo

profissionalismo dispensado em nossas aulas e a

todas as colegas de turma que caminharam comigo

nessa brilhante jornada.

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DEDICATÓRIA

Dedico esse trabalho aos meus pais que

incansavelmente sempre estiveram ao meu lado

me apoiando e incentivando em todos os

momentos de minha vida.

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RESUMO

Nosso trabalho volta-se para a demonstração e análise do tema,

cujo objetivo é traçar os contornos básicos do Direito das Obrigações. Esse direito

é atualmente considerado o principal livro da parte especial do Código Civil, uma

vez que grande parte da Teoria Geral do Direito Civil tem aplicação direcionada

às obrigações em detrimento das demais especialidades.

Estudaremos os aspectos, conceitos, características, princípios e o

desenvolvimento das disposições legais buscando a coerência e um maior

entendimento a respeito da matéria.

Podemos considerar o Direito das Obrigações como sendo tema de

inegável importância, constituindo um conjunto de direitos que protegem valores

do homem e também da pessoa jurídica.

Ao analisarmos toda a construção dos fatos jurídicos iremos

constatar a razão pelas quais prestigiados doutrinadores propõem a elaboração

de um verdadeiro Código das Obrigações, idéia que esvaziaria a parte geral do

Código Civil.

Exploramos no Capítulo I as fontes das obrigações, no Capítulo II

tratamos do assunto analisando seus objetos, no Capítulo III estudamos as

modalidades de obrigações, no Capitulo IV abordamos os efeitos das obrigações,

no Capítulo V constatamos as conseqüências do não cumprimento das

obrigações e, por fim, no Capítulo VI enfatizamos as formas de extinção das

obrigações, tendo sido realizado valoroso estudo acerca da matéria.

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METODOLOGIA

Ao nos voltarmos para a demonstração e análise do tema, nos

utilizamos do raciocínio dedutivo e de livros e artigos relacionados ao assunto,

sem os quais não teríamos conseguido realizar uma valiosa pesquisa

bibliográfica, o que faz com que possamos afirmar que todo material utilizado foi

de suma importância para imprimir ao trabalho a seriedade que desejávamos.

Importante ressaltar que todo o estudo teve como base e fonte

permanente de consulta as principais legislações em vigor, como a Constituição

da Republica Federativa do Brasil, o Código Civil e o Código de Defesa do

Consumidor.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.........................................................................................................9

CAPÍTULO I. FONTES DAS OBRIGAÇÕES.

1.1) Negócios Jurídicos..........................................................................................13

1.2) Atos Jurídicos Não-Negociais.........................................................................14

CAPÍTULO II. OBJETO DA OBRIGAÇÃO 2.1) Obrigação de Dar........................................................................................16 2.2) Obrigação de Fazer.....................................................................................20 2.3) Obrigação de não fazer...............................................................................22 CAPÍTULO III. MODALIDADES DE OBRIGAÇÕES 3.1) Obrigações Fracionárias (conjuntas)...........................................................23 3.2) Obrigações Solidárias..................................................................................23 3.3) Obrigações Divisíveis e Indivisíveis.............................................................25 3.4) Obrigações Alternativas...............................................................................26 3.5) Obrigações Facultativas..............................................................................26 3.6) Obrigações Naturais....................................................................................27 CAPITULO IV. EFEITOS DAS OBRIGAÇÕES 4.1) Teoria do Pagamento...................................................................................28

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4.1.1) Condições Subjetivas do Pagamento..........................................................28

4.1.2) Condições Objetivas do Pagamento............................................................29

CAPITULO V. DA INEXECUÇÃO DAS OBRIGAÇÕES 5.1) Mora................................................................................................................33 5.2) Inadimplemento Absoluto...............................................................................34 5.3) Inadimplemento Mínimo..................................................................................35 5.4) Adimplemento Ruim........................................................................................36 5.5) Inadimplemento Antecipado...........................................................................37 CAPÍTULO VI. FORMAS DE EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES 6.1) Pagamento por Consignação........................................................................39 6.2) Pagamento Efetuado por Terceiro Com ou Sem Interesse Jurídico.............40 6.3) Imputação do Pagamento..............................................................................41 6.4) Dação em Pagamento...................................................................................42 6.5) Novação.........................................................................................................43 6.6) Compensação................................................................................................45 6.7) Transação......................................................................................................46 CONCLUSÃO.........................................................................................................48 BIBLIOGRAFIA......................................................................................................49

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INTRODUÇÃO

Nosso trabalho volta-se para a demonstração e análise do tema,

cujo objetivo é traçar os contornos básicos do Direito das Obrigações. Esse

direito é atualmente considerado o principal livro da parte especial do Código

Civil, uma vez que grande parte da Teoria Geral do Direito Civil tem aplicação

direcionada às obrigações em detrimento das demais especialidades. Ao

analisarmos toda a construção dos fatos jurídicos iremos constatar a razão

pelas quais prestigiados doutrinadores propõem a elaboração de um

verdadeiro Código das Obrigações, idéia que esvaziaria a parte geral do

Código Civil.

Antes de expor o nosso conceito a respeito do tema, selecionamos o

que pensam prestigiados juristas acerca da matéria. No entendimento do Prof.

Silvio Rodrigues, em seu livro Direito Civil, vol. II, p.4, obrigação “é o vinculo de

direito pelo qual alguém (sujeito passivo) se propõe a dar, fazer ou não fazer

qualquer coisa (objeto), em favor de outrem (sujeito ativo)”.

Para o doutrinador Arnold Wald, em seu livro Direito das Obrigações,

p.32, obrigação significa “o vínculo jurídico temporário pelo qual a parte credora

pode exigir da parte devedora uma prestação patrimonial e agir judicialmente

sobre o seu patrimônio, se não for satisfeito espontaneamente”.

Segundo o Prof. Washington de Barros em sua obra Curso de

Direito Civil, vol. IV, p.8, obrigação vem a ser “a relação jurídica de caráter

transitório estabelecido entre devedor e credor e cujo objeto consiste numa

prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao

segundo garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio”.

O saudoso e ilustre mestre Caio Mário, em sua obra Instituições de

Direito Civil, vol. II, p.5, define nosso tema como sendo “o vínculo jurídico em

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10virtude do qual uma pessoa pode exigir de outra prestação economicamente

apreciável”.

Assim, entendemos que a obrigação pode ser conceituada como o

vínculo jurídico especial em virtude do qual uma pessoa fica adstrita a

satisfazer uma prestação em proveito de outra. O termo obrigação é

utilizado muitas vezes para acentuar o pólo passivo dessas relações, já que

alguns autores preferem nomear a disciplina como Direito de Crédito em

atenção ao sujeito ativo do vínculo jurídico. A prestação é o objeto de uma

obrigação e consiste na coisa a ser entregue (obrigação de dar), ou no fato a

ser prestado (obrigação de fazer ou não fazer), importando invariavelmente em

uma ação ou omissão do devedor. Ao estudarmos uma obrigação,

encontramos dois elementos essenciais: o débito e a responsabilidade. No

direito comparado são definidos, respectivamente, como Schuld (débito) e

Haftung (responsabilidade).

O primeiro traduz a prestação a ser espontaneamente cumprida pelo

devedor em decorrência da relação de direito material, ao passo que o

segundo consiste na sujeição patrimonial coativamente imposta ao devedor

como garantia do direito do credor, derivada do inadimplemento da prestação.

Caberá ao devedor responder por suas obrigações com os bens que se

encontrarem em seu patrimônio ao tempo da execução, excetuando-se o caso

legal de impenhorabilidade e inalienabilidade, situações em que os bens do

devedor escapam à força coativa estatal.

Da relação existente entre as partes do vínculo obrigacional nasce o

débito, ou seja, o dever de prestar, ao passo que, da relação processual que se

estabelece entre o Estado e o sujeito sobre cujo patrimônio recai a sanção

jurídica, nasce a responsabilidade, que só recebe função com o

descumprimento espontâneo do preceito e a execução forçada da prestação.

Em síntese, a princípio a execução é real, incidindo sobre o patrimônio e não

sobre a pessoa do devedor, sendo a execução pessoal um resquício, visto que

a prisão civil remanesce unicamente nas exceções constitucionais da recusa

de alimentos e depósito infiel (art. 5°, LXVII, CF/88).

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11A responsabilidade não atua apenas na função de garantia, detendo

ainda um caráter coercitivo, uma vez que constrange o devedor a satisfazer

voluntariamente a prestação. Em face da elevada importância do Haftung,

(responsabilidade) alguns autores chegam a afirmar que atualmente a relação

obrigacional vincula dois patrimônios, e não duas pessoas. Em geral, os dois

elementos participam conjuntamente de todas as obrigações, recaindo

sucessivamente sobre a mesma pessoa: o débito, como finalidade imediata a

ser voluntariamente adimplida e a responsabilidade patrimonial, como

finalidade mediata. É o que chamamos de obrigação civil ou perfeita.

Excepcionalmente, surgem casos de débito sem responsabilidade, ou seja,

hipóteses em que a dívida existe e é válida, mas não pode ser coativamente

obtida pelo Estado-Juiz, como as obrigações naturais, que se fundam em mero

dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível,

mas correspondem a um imperativo de justiça (exemplo: a dívida prescrita e a

dívida de jogo). Por não ser garantida com qualquer ação capaz de lhe exigir o

adimplemento, o único efeito jurídico das obrigações naturais é a

irrepetibilidade.

Realmente a nomenclatura repetição de indébito, já indica que a

ação só receberá juízo de procedência, caso o devedor tenha pago débito que

não existia ou que não era seu. Ao contrário, aqui há o débito e seu

cumprimento voluntário conduz extinção da obrigação e à retenção definitiva da

prestação pelo credor. Conceituando-se o direito subjetivo como a faculdade de

atuação legal na defesa de seus interesses, é fundamental compreendermos a

existência de dois grandes grupos de direitos subjetivos patrimoniais, isto é,

que possuem conteúdo econômico. De um lado, encontram-se os direitos

obrigacionais ou de crédito, e de outro os direitos reais. A diferença entre os

dois consiste no fato de nas obrigações, através de mera manifestação de

vontade consubstanciada em negócio jurídico, instalar-se vínculo jurídico entre

pessoas determinadas ou ao menos determináveis (exemplo: títulos ao

portador e promessa de recompensa) ao passo que nos direitos reais faz-se

necessário mais que a simples vontade. No nascimento do direito real não se

estabelece relação jurídica, e sim verdadeira situação jurídica de poder do

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12titular do direito real sobre o próprio objeto, impondo-se um dever jurídico erga

omnes, ou seja, a todo mundo, de abstenção a qualquer ato que possa vir a

lesar tal vínculo. Concluímos então, que só surgirá relação jurídica de direito

real contra aquele que eventualmente violar o dever genérico de abstenção.

Para finalizarmos, gostaríamos de frisar que para a realização de

nosso trabalho obedecemos a determinados critérios, analisando os aspectos,

conceitos, principais características, princípios e o desenvolvimento das

disposições legais acerca de nosso tema. Usando o raciocínio dedutivo e

utilizando livros e artigos relacionados ao assunto, para efetuar uma

empreendedora pesquisa bibliográfica, podemos dizer que todo material

utilizado foi de vital importância para a organização dos pensamentos, que

conferiram ao trabalho a seriedade que desejávamos.

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CAPÍTULO I

FONTES DAS OBRIGAÇÕES

Estudaremos neste capítulo a origem das obrigações. Como

sabemos, toda obrigação consiste em uma relação jurídica, tendo, por

conseqüência, a lei como fonte imediata. Nada obstante, ao indagarmos pela

fonte de determinada relação obrigacional, buscamos o fato constitutivo a que

a lei atribuiu o efeito de suscitá-lo, ou seja, o fato jurídico que fez brotar a

obrigação. Assim, como fontes mediatas das obrigações, destacam-se dois

grandes grupos de fatos humanos, conforme praticados em acordo ou

desacordo com o ordenamento jurídico: os negócios jurídicos e os atos

jurídicos não negociais. Analisaremos a seguir cada um deles.

1.1) Negócios Jurídicos

Os negócios jurídicos possuem caráter eminentemente voluntário,

correspondendo à vontade do devedor de se obrigar e podem ser classificados

em bilaterais e unilaterais. Os negócios bilaterais, onde podemos citar como

exemplo os contratos, são as fontes por excelência dos direitos obrigacionais,

refletindo a autonomia privada em se obrigar por intermédio do princípio da

pacta sunt servanda.(“vale o escrito”). Todavia, o Código Civil em vigor e o

Código de Defesa do Consumidor se referem à função social dos contratos,

com restrição da aludida autonomia contratual, por meio de normas de ordem

pública que eliminam qualquer lesão à boa-fé objetiva do contraente vulnerável,

dentre outras, por meio de anulação de cláusulas abusivas e impedimento de

dispositivos que possam lhe atenuar ou afastar os direitos. Já no que diz

respeito aos negócios jurídicos unilaterais, o devedor se obriga

independentemente do concurso de vontade de outrem. Também se inserem

como fonte de obrigações as declarações unilaterais de vontade, que se

formam quando o agente se manifesta com a intenção de se obrigar

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14independentemente da existência de uma relação creditória com outrem

(exemplos: títulos ao portador e promessa de recompensa).

1.2) Atos Jurídicos Não Negociais

Uma obrigação pode surgir de um ato ilícito, eis que o delito civil

gera a obrigação de reparação do dano. Todos nós temos um débito negativo

de não causar danos a terceiros e caso este dever de abstenção não seja

cumprido em razão da violação de um direito alheio, incidirá em

responsabilidade como dispõe o novo Código Civil em seus artigos 186 e 927.

Se a conduta voluntária for intencionalmente praticada ou o agente assumir o

risco de praticá-la (dolo ou dolo eventual), estaremos diante da figura do delito

e a outro turno, se a conduta voluntária derivar da inobservância culposa da

norma preexistente, cogita-se da figura do quase-delito. Em nosso

ordenamento vigente, dolo e culpa se confundem civilmente na figura da culpa

lato sensu, pois, para fins de ressarcimento, pouco importa o grau da culpa e

sim a extensão do dano.

Vale destacarmos também como fonte de obrigações a figura do

abuso de direito, que consiste no exercício anormal de um direito e vem a ser

um instituto que não se confunde com o ato ilícito, pois nele não incide violação

objetiva aos limites da lei, porém um desvio às suas finalidades sociais (art. 5°,

Lei de Introdução ao Código Civil). Sua noção pode ser alcançada pela

interpretação a contrario sensu do art. 188 do Código Civil. Nos direitos de

vizinhança, encontramos grande fonte de obrigações derivadas do abuso de

direito. Muitas vezes o mau uso da propriedade não decorre da prática de um

ato ilícito, e sim do exercício irregular de um direito do proprietário. Mesmo

assim, o art. 1277 do Código Civil considera que o intenso prejuízo à saúde, à

segurança e ao sossego do vizinho é suficiente para gerar responsabilidade

contra quem praticou o ato abusivo.

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15 Inserido na moderna fonte das obrigações, encontramos o risco

profissional. Atualmente, em diversas atividades reputadas como perigosas, a

responsabilidade civil não se baseia mais no pressuposto da culpa, e sim no

evento lesivo. O legislador procurou tutelar o interesse coletivo em face dessas

atividades potencialmente arriscadas, determinando objetivamente o dever de

indenizar, independentemente de qualquer cogitação sobre culpa. Para

finalizarmos, discorreremos brevemente sob a figura do defeito do produto ou

do serviço. O Código de Defesa do Consumidor reiterou a responsabilidade

objetiva, mas agora com enfoque no fato do produto e do serviço (art. 12/17,

Lei n. 8.078/90). Aqui não caberá a discussão a respeito do risco da atividade,

sendo suficiente a caracterização do dever de indenizar, o elemento objetivo do

defeito do produto ou serviço que acarrete um dano ao consumidor e/ou

terceiros.

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CAPÍTULO II

OBJETO DA OBRIGAÇÃO

Ao iniciarmos nossa análise acerca do objeto das obrigações,

afirmamos que a principal obrigação assumida pelo devedor sempre consistirá

em uma prestação de dar, fazer ou não fazer. O vínculo jurídico concerne

exatamente à possibilidade do credor de exigi-las, tendo no patrimônio do

devedor a garantia ante o eventual inadimplemento. Passaremos agora ao

estudo de cada um dos objetos da obrigação.

2.1) Obrigação de Dar

Tanto na obrigação de dar coisa certa como nas obrigações de dar

coisa incerta consistirá a prestação na entrega de um ou mais bens ao credor.

Obrigação de Dar consiste em prestação de coisa, pois cabe ao devedor

transferir a propriedade do objeto (compra e venda), ceder a sua posse ao

credor (comodato, locação) ou meramente restituir a coisa (depósito). Em

qualquer um dos exemplos assinalados, difere das Obrigações de Fazer já que

o credor está apenas interessado na tradição (entrega) do bem móvel ou

imóvel, sendo-lhe indiferente a atividade que será realizada pelo devedor no

momento anterior.

Antes da tradição (bens móveis) ou da transcrição (imóveis), todos

os riscos quanto à perda da coisa serão imputados ao alienante (vendedor),

conforme dispõe o Código em vigor. Devemos ressaltar que em nossa

legislação os contratos, isoladamente, não transferem a propriedade e assim

sendo, a transferência dos riscos da coisa ao adquirente (comprador) é

verificada somente no momento da entrega do bem, devidamente formalizada,

quando se tratar de bens imóveis. Se a obrigação consistir em dar coisa certa,

não poderá o credor ser constrangido a receber outra (art. 313, CC) por haver

sido originariamente pactuado que receberia bem individualizado e

perfeitamente determinado. Desta maneira, mesmo que o devedor, no instante

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18da entrega, culmine por oferecer bem ainda mais valioso que o combinado,

será lícito ao credor recusar a prestação substitutiva, justamente por possuir

direito subjetivo a uma prestação individualizada, não sendo obrigado a aceitar

uma coisa por outra. Porém, se vier a aceitar a troca, estará praticando dação

em pagamento.

Havendo perda do objeto da prestação sem culpa do devedor,

resolve-se a obrigação para ambas as partes, sendo restituído ao adquirente a

importância eventualmente antecipada. De fato, se a inutilização da coisa se

deu por circunstâncias alheias à diligência do devedor, a obrigação fica

resolvida para ambas as partes. Porém, se a perda da coisa ocorreu devido à

conduta maliciosa ou negligente do devedor, este deverá ressarcir os valores

adiantados pelo adquirente, acrescidos de perdas e danos, na forma do artigo

234 do Código Civil. Cabe lembrar que se o interessado na restituição da coisa

estiver em mora (atraso) para recebê-la, mesmo nas hipóteses de perda

acidental pelo depositário, culminará por ser responsabilizado a ponto de

efetuar o pagamento, conforme se entende no artigo 492, § 2°, do Código Civil.

Podemos exemplificar, sugerindo a seguinte situação: imaginemos um veículo

sendo entregue para conserto em oficina, descurando o proprietário em seu

recebimento após o prazo marcado para devolução. Nesse período, o ônus

acidental da perda lhe será imposto sem que possa se furtar a pagar o valor

dos serviços ali executados.

Em sentido inverso, se o atraso for debitado àquele a quem

incumbia a entrega da coisa, mesmo que a sua perda resulte de caso fortuito

ou força maior (fenômenos da natureza), recairá contra o devedor a

condenação em perdas e danos. De fato, a mora (atraso) gera uma expansão

de responsabilidade do devedor, alcançando mesmo as situações de perda ou

deterioração da coisa alheia aos seus cuidados normais. Excepcionalmente,

isentará a sua responsabilidade se demonstrar que, mesmo se a entrega fosse

tempestiva, o evento ainda assim ocorreria. Por exemplo, a intempestiva

entrega da casa alienada (vendida) que culminou por ser atingida por um raio.

Para finalizarmos, se a perda ou destruição do bem ocorrer no

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19momento posterior à transferência, em princípio todos os riscos recairão na

conta do adquirente, que certamente não poderá responsabilizar o alienante

(vendedor) por fatos que agora lhe são alheios, isto é, a coisa perece para o

atual proprietário. Nada obstante, as teorias dos vícios redibitórios e a da

evicção asseguram ao adquirente propor ação de regresso em face do

alienante, mesmo nessa fase, respectivamente em virtude de defeitos ocultos

da coisa já existentes ao tempo da tradição (entrega) (art. 441, CC) e

resguardo dos vícios jurídicos do bem adquirido (art. 447, CC).

A outro turno, nas obrigações de dar coisa incerta, as partes não

convencionam a entrega de coisa individualizada. Aqui, em princípio, a dívida

não é determinada, mas será determinável, pois já identificada pela espécie

e quantidade. Daí também ser conhecida tal obrigação como dívida de gênero

(art. 243, CC). Assim, pactuando-se a futura alienação de cinco toneladas de

café, estaremos diante de objeto a ser especializado no momento da escolha.

Não se admite a indeterminação absoluta da coisa, como por exemplo, a

entrega de cinco toneladas (qual espécie?), ou a entrega de café (qual

quantidade?). Existe um grande equívoco em se denominar as coisas incertas

como obrigatoriamente bens fungíveis. Quanto a estes, além de caracterizados

pela espécie e quantidade, também o são pela qualidade, como por exemplo,

contrato em que se ajusta a entrega de cinco toneladas de café tipo Exportação

(qualidade). Já nas obrigações de gênero, variam intensamente os predicados

qualitativos dos bens, dos piores aos melhores. Todavia, na prática é muito

raro que alguém efetue um negócio sem qualquer estipulação referente à

qualidade do objeto, pois não é normal que uma pessoa contrate com a

possibilidade de receber mercadoria de padrão inferior.

É no momento da escolha que a obrigação de dar coisa incerta se

transforma em obrigação de dar coisa certa. A denominada concentração se

verifica no instante em que os bens, até então fungíveis, são separados e

individualizados. No silêncio contratual, caberá a escolha ao devedor,

restringindo o ordenamento jurídico a sua opção por bens que estejam no

meio-termo dos que lhe pertencem, isto é, não poderá selecionar os melhores

ou piores (art. 244, CC). Pode ocorrer que as partes determinem que a escolha

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20se faça pelo credor, ou mesmo por terceiro, a estes também se aplicando a

parte final do dispositivo acima citado.

Nas obrigações de gênero não se admite discussão acerca da perda

da coisa fungível, com ou sem culpa (caso fortuito ou força maior), pois o

gênero nunca perece, isto é, sempre poderá o credor exigir a perpetuação da

obrigação, determinando que o devedor encontre em outro local o objeto

acordado, da mesma espécie e quantidade (art. 246, CC), para que se opere a

concentração no momento próprio. Contudo, se a obrigação se referir a entrega

de coisas genéricas, porém previamente indicadas e localizadas, há de se falar

em prestação de dar coisa certa, aplicando-se as regras desta modalidade. Por

exemplo, contrato para entrega do arroz situado em um depósito ou dos

cavalos que se encontram em determinado estábulo.

2.2) Obrigação de Fazer

Aqui a finalidade não é a entrega de um bem, mediante transferência

de propriedade ou desapossamento do devedor e sim a pretensão do credor a

prestação de um fato, consistente na realização de uma atividade pessoal ou

serviço pelo devedor ou por um terceiro.

Em algumas situações intermediárias, ainda mais aquelas em que

da atividade resulte uma obra ou objeto, poderá existir alguma dificuldade em

determinar uma obrigação como de dar ou de fazer. Assim, se A promete

entregar um imóvel a B, a obrigação será de fazer caso a atividade seja a

própria construção da coisa. Consistirá, porém, em obrigação de dar coisa

certa se o imóvel já estivesse pronto e acabado ao tempo da contratação. Em

outra hipótese, se A se comprometeu a entregar uma composição musical a B,

este alternativamente poderá invocar uma obrigação de fazer caso A se recuse

a criar a obra, ou uma obrigação de dar, na hipótese de A elaborar a

composição, porém se furtar a entregá-la. Em suma, nas obrigações de dar, o

credor procura um objeto já existente ao tempo do nascimento da obrigação.

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21Se, porventura, houver incidência conjunta de prestações de coisas e

atividades pessoais, deve-se buscar a tipificação da obrigação pelo critério da

preponderância. Esse comportamento dirigido ao devedor nas obrigações de

fazer pode consistir em um serviço de natureza física (empreitada), intelectual

(composição de música ou confecção de um livro) ou mesmo na prática de um

ato jurídico (outorga de escritura definitiva pelo promitente vendedor). As

obrigações de fazer podem ser classificadas em duradouras ou instantâneas.

Nesta hipótese, aperfeiçoa-se em único momento (por exemplo: registrar

aquisição de um bem); nas instantâneas, a execução da obrigação se prolonga

no tempo de forma continuada (pintura em tela) ou de modo periódico,

mediante trato sucessivo (funcionário encarregado da abertura de salas de aula

todas as manhãs).

Tem-se como infungível a obrigação de fazer que obrigatoriamente

só possa ser prestada pelo devedor. Poderá a prestação de fazer ser

naturalmente infungível, com base nas qualidades pessoais do devedor - intuitu

personae (somente a pessoa)-, como por exemplo, na pintura de tela por

grande artista, cirurgia por médico habilidoso, ou ainda contratualmente

infungível caso o credor queira impor natureza personalíssima a uma obrigação

em tese fungível, como outorgar procuração a advogado, vedando

substabelecimento. A outro turno, será fungível a obrigação quando outra

pessoa puder dar cumprimento a mesma sem prejuízo ao credor. Como nas

obrigações de declaração de vontade o interesse do credor está voltado para o

resultado jurídico que dela decorre, a obrigação será considerada fungível, eis

que, na hipótese de negativa de atuação pelo devedor, sua vontade será

substituída por provimento jurisdicional, obtendo-se o mesmo resultado que

voluntariamente se pretendia extrair.

Na hipótese de não-cumprimento da obrigação infungível, sem culpa

do devedor, em casos como de doença ou falta do material adequado, resolve-

se (termina) simplesmente o contrato, porém, se a obrigação involuntariamente

inadimplida tiver caráter fungível, pode o credor optar ainda pela execução da

atividade por terceiro, à custa do devedor.

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2.3) Obrigação de Não Fazer

Também classificada como obrigação negativa, a obrigação de não

fazer consiste em uma abstenção, já que impede que o devedor pratique um

ato que normalmente não lhe seria vedado, como, por exemplo, não construir

mais andares acima de certo gabarito; tolere ato que normalmente não

admitiria, como permitir proprietário do prédio dominante passar pelo prédio

serviente ou, mesmo; se obrigue a não praticar um ato jurídico que em princípio

lhe seria lícito. Compreendemos que essa obrigação tem sempre natureza

infungível, uma vez que a omissão é uma atitude pessoal e intransferível do

devedor. O inadimplemento da obrigação negativa evidencia-se quando o

devedor pratica o ato proibido, sendo clara sua constituição em mora (art. 390,

CC). Como conseqüência, a reparação ocorre pelo desfazimento daquilo que

foi indevidamente realizado, ou pelo refazimento do que foi indevidamente

desfeito ou destruído. Caso a reposição ao estado anterior seja impraticável,

impõe-se a tutela ressarcitória (perdas e danos).

Ocorre a divisão em obrigações de não fazer instantâneas, como

não divulgar segredo de empresa (segredo da fórmula da coca-cola, por

exemplo), visto ser impossível o desfazimento da nova situação e em

permanentes, onde mesmo após o descumprimento admite-se a

recomposição ao estado original, por exemplo, podemos citar a obrigação de

não poluir, sanada pela instalação de aparelhos poluentes.

Concluindo, recordamos que as obrigações de fazer e não fazer

derivam tanto de relações contratuais como de situações imediatamente

previstas em lei. Com efeito, enquanto os direitos relativos são acautelados

pelos negócios jurídicos, os direitos absolutos são preservados por preceitos

normativos (leis). Basta salientar os deveres jurídicos universais de não fazer

decorrentes da proibição à violação de direitos reais ou direitos de

personalidade.

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CAPÍTULO III

MODALIDADES DE OBRIGAÇÕES

Podemos qualificar as obrigações como simples e complexas. A

primeira acontece quando a relação for entre um credor e um devedor,

incidindo apenas sobre um objeto, como no caso em que A deve pagar R$

100,00 a B (obrigação de dar simples) e a segunda se dará quando houver

pluralidade de partes ou de objetos em uma relação jurídica obrigacional. Nos

deteremos no estudo das principais obrigações complexas.

3.1) Obrigações Fracionárias (conjuntas)

Havendo pluralidade de credores ou devedores em obrigação de

natureza divisível e não havendo solidariedade legal ou contratual, cada um

dos titulares se portará de forma autônoma com relação a seus direitos e

deveres, fracionando-se a obrigação em partes iguais (art. 257, CC). Em

síntese, cada credor só pede a sua parte, e cada devedor só se obriga por sua

parte, incidindo diversos vínculos jurídicos entre os sujeitos ativos e passivos

da relação jurídica. Dessa forma, se A, B e C se obrigam a pagar R$ 90,00 a

D, E e F, poderá A adimplir (cumprir) com o simples pagamento de R$ 30,00

em prol de qualquer um dos devedores. Em contrapartida, a D não será lícito

exigir mais do que R$ 30,00 de cada um dos devedores. Enfim, prevalece nas

obrigações conjuntas a idéia de que no concurso de credores ou devedores a

obrigação se fraciona, sendo esta regra apenas derrogada (abolida) quando as

obrigações complexas por multiplicidade de partes se revestirem de

solidariedade ou indivisibilidade.

3.2) Obrigações Solidárias

Consiste este tipo obrigacional em exceção à regra geral da

autonomia e fracionamento da obrigação entre os diversos credores ou

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24devedores. Obrigações solidárias são aquelas obrigações em que existe

concorrência de vários credores, cada um com direito à dívida toda ou

pluralidade de devedores, cada um obrigado a ela por inteiro, a teor do exposto

no parágrafo único do art. 265 do Código Civil. Em um primeiro momento, o

termo solidariedade pode dar a entender que os diversos credores ou

devedores se vinculam pela confiança mútua, mas na verdade a solidariedade

é proveniente da responsabilidade sobre o total de cada um dos personagens

que compõem a relação obrigacional. Segundo nossos estudos, cada credor ou

devedor atua como se fosse o único da classe, ocorrendo o fenômeno da

expansão da responsabilidade individual. Passaremos a analisar as principais

características dessa modalidade obrigacional.

Como sabemos, a solidariedade só se manifesta nas relações

externas, eis que qualquer credor poderá exigir o pagamento de qualquer

devedor no todo, como se fosse o único existente, diferente das relações

internas, onde prevalece o direito apenas fracionário de reembolso dos co-

credores que não receberam suas partes e o direito de regresso do devedor

que pagou o preço todo em face dos co-devedores. No que concerne ao

pagamento realizado por qualquer devedor, este extingue a obrigação (art. 257,

CC). Não obstante a pluralidade de sujeitos há apenas um vínculo obrigacional

conectando os pólos ativo e passivo da relação jurídica. A partir do momento

em que ocorre o adimplemento, é irrelevante aos devedores o fato do credor

que recebeu a prestação não reembolsar os seus co-credores, pois tal

discussão remanescerá apenas no âmbito interno dos sujeitos ativos. A

solidariedade não se presume (art. 265, CC), pois nasce em virtude de

convenção das partes ou imposição legal. Sem dúvida, se a presunção legal é

a da responsabilização de cada pessoa apenas por seus atos, ela acarreta

uma verdadeira expansão de encargos, que só mediante acordo ou norma se

impõe, assim sendo, existindo dúvida acerca da interpretação da vontade

contratual, prevalecerá o fracionamento da obrigação.

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3.3) Obrigações Divisíveis e Indivisíveis

O objeto da prestação consistirá em coisa divisível ou indivisível. O

conceito de indivisibilidade não é material, pelo contrário, é jurídico. Qualquer

bem na natureza é materialmente partível, mesmo um átomo, porém, pelo

disposto no art.87 do Código Civil, bens divisíveis são os que se podem

fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor,

ou prejuízo do uso a que se destinam. Assim, a indivisibilidade decorre

basicamente da impossibilidade de fracionamento de uma obrigação, sob pena

de perda de suas qualidades essenciais ou de seu valor, podendo ser física,

pela própria natureza da coisa (um automóvel), legal (indivisibilidade do lote

urbano com menos de 125 m2 - Lei n. 6.766/79) ou contratual (condôminos

que acordam em não dividir imóvel, mantendo-o em estado de indivisão).

Dessa maneira, a obrigação indivisível não comporta cumprimento parcial, eis

que haveria prejuízo à substância da coisa, com perda de sua utilidade e

função. Essa classificação só desperta interesse nas obrigações complexas

com pluralidade de sujeitos, já que, havendo apenas um credor e um devedor,

as obrigações são legalmente indivisíveis (art.314 CC). Nestes casos de

unicidade de sujeitos, o devedor só pagará parceladamente se existir ajuste

expresso neste sentido.

As obrigações indivisíveis e as solidárias se parecem em um

primeiro momento, pois ambas expõem a idéia de que o credor/devedor só

pede/deve a sua parte, porém, enquanto a solidariedade é subjetiva,

resultando de convenção (acordo) ou imposição normativa (lei), a

indivisibilidade é objetiva, visto ser resultante de impedimento ao

fracionamento da obrigação. Percebemos então, em dois momentos,

características que diferenciam essas duas obrigações. A primeira diz respeito

à perda do objeto, que gera a extinção da obrigação indivisível, em face da

conversão da prestação originária em perdas e danos, ocasionando

indenização em dinheiro e a segunda se refere à morte do devedor, que em

nada altera uma obrigação indivisível, pois os sucessores responderão pelo

objeto, que permanece íntegro.

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3.4) Obrigações Alternativas

Estas obrigações são caracterizadas pela multiplicidade de objetos e

encontram-se inseridas na categoria das obrigações complexas. Apesar da

pluralidade de prestações, estas se excluem no pressuposto de que apenas

uma delas deverá ser satisfeita, como por exemplo, na hipótese de pagamento

de uma dívida mediante a entrega de dinheiro ou de um apartamento no valor

correspondente.

Como as prestações têm objetos distintos, o cumprimento de uma já

extingue a obrigação. Importa frisar que tais obrigações possuem uma fase que

lhes é peculiar, que é a da concentração, que se caracteriza na conversão da

obrigação alternativa originária em obrigação simples, pela determinação do

objeto a ser prestado. Não havendo estipulação no contrato particular, caberá a

opção ao devedor (art. 252, CC). Feita a escolha, resta irrevogável ante a

individualização do objeto, salvo cláusula de arrependimento.

3.5) Obrigações Facultativas

Consiste a obrigação facultativa na possibilidade conferida ao

devedor de substituir o objeto inicialmente prestado por outro, isto é, a

prestação devida é uma só, incidindo unidade de objeto quando da celebração

do contrato. A doutrina aceita a terminologia facultativa, mas prefere identificá-

las como obrigações com faculdade alternativa, pois aquela designação induz a

erro, por supor um instituto no qual a existência do vínculo depende da vontade

do devedor, que poderia descumprí-la se assim entendesse.

Todavia, ao devedor e somente a ele, é conferida a faculdade de, no

momento do pagamento, substituir a prestação por outra, previamente

consignada (acordada) no contrato. A obrigação substitutiva não poderá jamais

ser exigida ou reclamada pelo credor, pois ela não é objeto da obrigação. Em

suma, o devedor possui o direito de consagrar a faculdade alternativa,

unilateralmente determinando sua opção entre a prestação principal e a

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27supletiva, inserindo o credor em posição de submissão, por estar sujeito a

aceitar a escolha da outra parte. Exemplificando, A convenciona o pagamento

a B da quantia de R$ 3.000,00 em novembro, com a obrigação facultativa de

transferir uma motocicleta. Conseqüentemente, facilita-se o pagamento pelo

devedor, passando ele a contar com uma opção a mais para se exonerar da

obrigação, sem para tanto depender da concordância do credor. Diferem,

portanto, das obrigações alternativas, nas quais há uma obrigação complexa,

com pluralidade de objetos, cuja escolha caberá ao credor ou ao devedor

conforme o pactuado (art. 252, CC). Decorre da distinção uma repercussão

concreta: nas obrigações alternativas, a perda da coisa sempre concentrará o

débito na subsistente (art. 253, CC). Todavia, ocorrendo a perda da coisa sem

culpa do devedor, a obrigação facultativa se extingue, a despeito de subsistir o

objeto supletivo.

3.6) Obrigações Naturais

São aquelas que, em virtude de lei, não podem ser judicialmente

exigidas, porém, uma vez cumpridas, não admitem a possibilidade do devedor

reaver o que pagou em razão de se tratar de um dever por ele reconhecido.

São diferentes das obrigações civis, pois não são providas de ação hábil a

compelir o devedor ao adimplemento, sendo sua eficácia reduzida, eis que

apenas protege o credor com irrepetibilidade do que lhe foi voluntariamente

pago. Duas modalidades de obrigações naturais são reconhecidas pela

doutrina, sendo as primeiras as obrigações naturais stricto sensu, que

consistem em relação obrigacional desprovida de ação, caracterizada pela

impossibilidade de execução, mas cujo cumprimento voluntário é causa de

extinção do débito, não dando margem à pretensão de restituição, ao passo

que as segundas são os deveres morais ou sociais. Estes, apesar de

possuírem as mesmas conseqüências práticas da obrigação natural stricto

sensu, apresentam fundamento diverso, pois tais deveres surgem de relações

alicerçadas na convivência social, não tão fortes a ponto de gerar um vínculo

obrigacional, mas com um imperativo de solidariedade que não pode ser

completamente ignorado pelo ordenamento jurídico.

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CAPÍTULO IV

EFEITOS DAS OBRIGAÇÕES

Depois de termos analisado os momentos de constituição e

desenvolvimento das obrigações, passaremos a seguir ao estudo de seus

efeitos diretos e indiretos.

4.1) Teoria do Pagamento

O desfecho natural das obrigações é a sua solução. Neste sentido, o

adimplemento é o modo natural de extinção das obrigações, designando o

efetivo e direto cumprimento da prestação pelo devedor. O pagamento tem

como pressuposto um vínculo obrigacional que consiste no poder do credor de

exigi-lo, na correlata necessidade jurídica de prestá-lo pelo devedor e na exata

satisfação da prestação de dar, fazer ou não fazer, por inteiro, no tempo, lugar

e forma convencionados. Com relação ao pagamento, a doutrina enfatiza

modos indiretos de adimplemento, que se traduzem em formas alternativas de

liberação do débito, tais como sub-rogação, dação em pagamento,

consignação, novação, compensação, transação, remissão e prescrição. A

outro turno, os efeitos indiretos da relação obrigacional começam no instante

do inadimplemento culposo do débito originário. Acionado o mecanismo da

garantia - Haftung - é o devedor demandado com vista à reparação na mesma

espécie ou ao ressarcimento pecuniário - perdas e danos.

4.1.1) Condições Subjetivas do Pagamento

Acreditamos existir três condições subjetivas do pagamento. A

primeira refere-se a pessoa que deve efetuar o pagamento, que à princípio,

vem a ser o devedor, pessoalmente, ou o seu representante, bem como os

herdeiros até as forças da herança. A segunda diz respeito a pessoa que

pode pagar, onde encontramos a figura do terceiro interessado na dívida,

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30sendo este definido pelo Prof. Arnold Wald em seu livro Direito das Obrigações

p.67 como “a pessoa que integra o vínculo obrigacional, por estar indiretamente

responsável pela solução do débito e, portanto, juridicamente legitimada a

resgatá-lo, sob pena de sofrer os efeitos do inadimplemento”. A outro turno, o

terceiro não interessado é o estranho ao vínculo obrigacional, a princípio sem

interesse jurídico no débito, mas que em virtude de um interesse moral é

conduzido ao resgate da obrigação, como por exemplo, no caso de pai que

paga a dívida de filho. Duas são as formas de intervenção concedidas ao

terceiro não interessado: a primeira vem a ser aquela em que este poderá

pagar por conta e em nome do devedor, hipótese que em seus efeitos traduz

verdadeira doação incondicional, extinguindo-se a dívida, sem direito a

reembolso, e a segunda é aquela em que se o terceiro não interessado paga

em seu próprio nome, terá direito ao reembolso. Vale dizer, o terceiro pleiteará

apenas a quantia efetivamente despendida pela via da ação de cobrança, eis

que perde as garantias decorrentes do vínculo obrigacional originário. Para

finalizarmos, a terceira condição subjetiva é aquela referente à pessoa a quem

se deve pagar. Para evitar a incidência de duplo pagamento, a regra geral

preceitua que este deve ser feito ao credor ou a quem o represente legal,

judicial ou convencionalmente.

4.1.2) Condições Objetivas do Pagamento

No tocante às condições objetivas do pagamento, necessário se faz

que analisemos a que tempo este deve ser efetuado. Nos termos do art. 331

do Código Civil, a dívida é exigível quando de seu vencimento. Em princípio,

quando não há termo voluntária ou legalmente estipulado, aplica-se o princípio

da satisfação imediata, podendo o credor obter prontamente o pagamento.

Mesmo não determinado termo contratual, pode incidir um prazo

tácito suficiente ao cumprimento da obrigação, quando a execução vier a se

realizar em lugar diverso, como no caso de transporte de mercadorias ou

demandar tempo, como no caso de aquisição de safra. O lapso temporal

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31previsto no art. 134 do Código Civil condiz com situações em que é

impraticável a satisfação imediata do débito, fazendo-se necessária a aposição

de um termo moral ao adimplemento satisfatório da obrigação. Já em outras

situações de omissão de termo contratual, o próprio legislador tratou de

discorrer sobre prazos fatais. É o chamado termo legal. Assim, no contrato de

mútuo em dinheiro, no silêncio das partes prevalece o prazo de trinta dias para

solução do débito (art. 592, II). No comodato (empréstimo), a ausência de

prazo contratual presume o necessário para atender às finalidades do uso

concedido (art. 581). Mais recentemente, o art. 23 da Lei n.8.245/91 fixou o

sexto dia útil do mês seguinte como prazo supletivo à cobrança de locação

(exceto quando o contrato for despido de garantias locatícias - art. 42).

Havendo previsão de termo contratual, a pretensão ao recebimento

do crédito fica suspensa até o vencimento, respondendo o credor por má-fé

caso demande antes do prazo, sendo sujeito às sanções expressas no art. 939,

do Código Civil. Contudo, se o devedor frustrar a garantia por se colocar em

uma das situações de insolvência alvitradas nos artigos 333 ou 1425 do Código

Civil, incidirá o vencimento antecipado da dívida. Com efeito, se não fosse lícito

ao credor imediatamente invadir a órbita patrimonial do devedor, certamente

restaria frustrado o objetivo contratual ao adimplemento da prestação.

Prosseguindo em nosso estudo, passaremos agora a análise de

outra condição objetiva do pagamento: o local do pagamento. Aqui vigora o

princípio da liberdade de eleição, fixando-se domicílio contratual onde as

obrigações deverão ser cumpridas. No silêncio das partes, o pagamento se

fará no domicílio do devedor, cabendo ao credor procurar o devedor. Porém,

pode ser também estipulado contratualmente que o pagamento ocorra no

domicílio do credor. A estipulação do foro de eleição (local do pagamento) não

comporta cláusula para as ações dominiais que são as que se referem a

reivindicação de bens, usucapião e possessórias.

Enquanto no direito privado é livremente facultada a adoção do foro

de eleição (Súmula n. 335, STF), o mesmo não ocorre no regime do Código de

Defesa do Consumidor. Com efeito, é abusiva a eleição do foro da sede do

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32fornecedor nos contratos de adesão se a opção resultar em frustração ao

acesso do consumidor ao Judiciário, hipótese banalizada por fornecedores que

comerciam em locais distantes e impõem como foro de eleição a sua distante

sede de negócios para não terem que responder por seus atos abusivos. Trata-

se de cláusula abusiva (art. 51, IV), por imputar excessiva onerosidade à parte

mais frágil da relação (consumidor), desequilibrando a relação contratual e a

boa-fé do consumidor.

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CAPÍTULO V

DA INEXECUÇÃO DAS OBRIGAÇÕES

Neste capítulo trataremos da inexecução das obrigações.

Certamente, a solução ideal para a extinção do vínculo obrigacional reside no

adimplemento das obrigações de dar, fazer e não fazer, respeitando-se os

requisitos das partes - quem paga e quem recebe -, modo, lugar e tempo do

cumprimento do débito. Quando a prestação corresponde exatamente ao

acordado, a relação se exaure, desonerando o devedor e satisfazendo o

interesse do credor. Todavia, poderá incidir quebra de um dever contratual

capaz de gerar uma imperfeição no cumprimento da obrigação ou até mesmo o

desfazimento do vínculo contratual. Daí a importância do estudo deste tema

como um gênero que engloba como principais espécies tipificadas no Código

Civil a mora e o inadimplemento absoluto. Com efeito, no topo do capítulo

que disciplina as conseqüências da inexecução das obrigações, dispõe o art.

389 do novo Código Civil que, “não cumprida a obrigação, responde o devedor

por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices

oficiais regulamente estabelecidos, e honorários de advogado”. A primeira

parte do dispositivo cuida da extinção do vínculo pelo inadimplemento absoluto

enquanto que a segunda refere-se ao cumprimento defeituoso, característico

da mora.

5.1) Mora

Entendemos que mora é o cumprimento imperfeito de uma

obrigação, tanto pelo devedor (mora debendi) como pelo credor (mora

accipiendi). Ao contrário da crença comum, ela não se caracteriza apenas pelo

pagamento fora do prazo pelo devedor ou pela recusa injustificada de receber

no prazo devido pelo credor. Nos termos do art. 394 do Código Civil, o

pagamento que contenha uma falha no tocante ao lugar e à forma previamente

estabelecidos também induz à mora. Em suma, o pressuposto básico da mora

é a viabilidade do cumprimento da obrigação, não obstante os transtornos no

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34adimplemento. Verifica-se apenas a impossibilidade transitória de satisfazer a

obrigação. Em qualquer caso, da imperfeição culposa no pagamento decorre o

inadimplemento relativo em solver (cumprir) a obrigação, já que a prestação

principal ainda é útil à outra parte, apesar dos contratempos. Por isso, a

situação originária será restaurada se o pagamento resultar em cumulação

entre a obrigação originária e as perdas e danos advindos da mora (danos

emergentes e/ou lucros cessantes), além da incidência cumulativa dos juros de

mora (legais ou convencionais), custas e honorários de advogado, a teor do art.

404 do Código Civil, acrescido da correção monetária segundo índices oficiais

desde o curso da data do efetivo prejuízo (Súmula n. 43, STJ). Não se duvide

ainda da possibilidade das partes se socorrerem da prefixação de cláusula

penal moratória, evitando, assim, a penosa liquidação das perdas e danos.

5.2) Inadimplemento Absoluto

Apesar da mora e de o inadimplemento absoluto serem espécies do

gênero da inexecução das obrigações, mostram-se institutos distintos. O

inadimplemento absoluto resulta da completa impossibilidade de cumprimento

da obrigação, com conseqüente indenização pelos prejuízos sofridos ao credor

(art. 395, parágrafo único, CC). São três as situações motivadoras do

desfazimento do vínculo:

a) omissão do devedor em atender a prestação - aqui o devedor se recusa pura

e simplesmente a cumprir voluntariamente o débito, cabendo a resolução do

acordo;

b) destruição ou perda do objeto - com o perecimento do objeto, perece o

direito. Sendo impossível manter o vínculo obrigacional, as partes devem ser

restituídas à situação de origem. Mesmo que a perda ou a destruição se dê por

evento inimputável (sem culpa) ao devedor, o que sobreleva é o elemento da

impossibilidade da prestação;

c) inutilidade da prestação ao credor - das três hipóteses, seguramente é a

mais interessante. Se em princípio o atraso no adimplemento gera uma

situação de mora, em diversas oportunidades não mais será interessante ao

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35credor receber uma prestação atrasada, por dela não mais extrair efeitos

relevantes. É o que se concebe como caráter transformista da mora em

inadimplemento absoluto. O atraso do devedor pode equiparar-se ao

descumprimento definitivo.

De forma ilustrativa, o pagamento fora do tempo da prestação

locatícia não gera desinteresse ao locador sobre o aluguel, por ainda existir

viabilidade de cumprimento tardio da obrigação. Todavia, constatada a mora,

ao débito serão acrescidos valores acessórios concernentes ao atraso

injustificado. Enfim, a irreversibilidade do descumprimento no inadimplemento

absoluto faculta ao credor a pretensão de resolver judicialmente o negócio

jurídico (contrato). Fundamental neste instante é compreendermos o alcance

do termo resolução que vem a ser a desconstituição da obrigação em virtude

de fatos posteriores à contratação, ou seja, é motivada pela inexecução do

acordado ou de uma das cláusulas contratuais por uma das partes, sendo

normalmente derivada do inadimplemento. O contrato atende aos planos de

existência, validade e eficácia, porém vem a ser sepultado por episódio

superveniente, fundado no fato do não cumprimento da prestação, de modo

lesivo a uma das partes.

5.3) Inadimplemento Mínimo

Atualmente é questionada a possibilidade da resolução contratual

em situações caracterizadas pelo cumprimento de substancial parcela do

contrato em que o devedor não suportou adimplir uma pequena parte da

obrigação. Se possuirmos uma percepção nítida da função social do contrato,

entenderemos que se inclui entre as atribuições do magistrado a análise da

gravidade da infração contratual, não sendo crível o desfazimento de uma

significativa relação jurídico-econômica pelo fato do insignificante

descumprimento do acordo. Em outras palavras, o desfazimento do contrato

pode impor um sacrifício desproporcional, comparativamente à opção de

manutenção do contrato, sendo coerente que o credor procure a tutela

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36adequada à percepção da prestação faltante (execução, monitória), e não a

resolução contratual (extinção do contrato).

Enfim, podemos conceber uma alteração de paradigma, vazado na

impossibilidade de se dar eficácia a uma cláusula resolutória expressa, sem

que o Poder Judiciário possa avaliar o grau de sacrifício de uma das partes em

razão ao que já foi objeto de cumprimento e à parcela restante, devendo-se

levar em conta, portanto, o que já foi pago.

5.4) Adimplemento Ruim

Trata-se de outra espécie do gênero da inexecução das obrigações.

Apesar de há muito ser objeto de estudo pela doutrina, o adimplemento ruim

alcançou amplo perfil após a edição do Código de Defesa do Consumidor,

sendo também conhecido como quebra positiva do contrato. Observamos no

início do nosso estudo que a obrigação principal é a resultante do contrato,

sendo composta por uma prestação primária de dar, fazer ou não fazer - débito

(Schuld) - e uma prestação secundária –responsabilidade (Haftung). A outro

turno, foram introduzidos em nosso ordenamento jurídico deveres acessórios

de conduta, acauteladores da prestação principal, que não se inserem na teoria

clássica do negócio jurídico, porém vinculam objetivamente as partes. Diante

da constitucionalização do direito privado, ganhou vulto a idéia da função social

dos contratos, perdendo eles aquela relatividade ínsita, passando a interessar

à sociedade. Basta analisar o art. 1º da Lei n. º 8078/90 (CDC): “O presente

código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem

pública e interesse social”. Deste modo, devemos sempre partir para a

observância do princípio da boa-fé objetiva do consumidor como cláusula geral

e regra de conduta que estabelece parâmetros de confiança recíproca entre os

contratantes.

Isso significa que, a par das obrigações contratuais, todo fornecedor

assume obrigações legais, de integração contratual compulsória. Insere-se na

noção da boa-fé objetiva os chamados deveres anexos, acessórios ou laterais,

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37que consistem basicamente nos deveres de informação, lealdade, segurança e

cooperação. Ocorrendo falhas no adimplemento de tais deveres secundários,

caberá ao consumidor, alternativamente, a ação de cumprimento (obtenção da

tutela específica na Justiça) ou mesmo a resolução contratual, pois se houve

adimplemento ele foi insatisfatório ou ruim (art. 35, CDC). O direito à

informação se insere entre os direitos fundamentais (art. 5°, XIV, CF/88),

devendo preencher os requisitos de adequação, suficiência e veracidade. A

adequação diz respeito aos meios de informação utilizados, referindo-se à

composição, riscos e periculosidade dos produtos. A suficiência se relaciona

com a integralidade da informação e a veracidade vem a ser a informação

correspondente às reais características do produto e do serviço. O

adimplemento será caracterizado como ruim, porém, se houver falha no dever

de informação e fornecimento, de esclarecimento e aconselhamento ao

consumidor no tocante aos riscos, modo de utilização e qualidade dos produtos

e serviços, em outras palavras, o objetivo é a transparência nas relações de

consumo.

5.5) Inadimplemento Antecipado

Esta situação pode ser encontrada em determinados contratos

bilaterais. As partes combinaram o momento para o adimplemento de suas

respectivas obrigações, porém, em instante anterior ao termo pactuado, um

dos contratantes já demonstra inequívoca intenção de não cumprir a sua

prestação. De acordo com o Prof. Rosenvald Nelson em seu livro Direito das

Obrigações e Responsabilidade Civil p. 84, “o instituto da ruptura antecipada

permite ao contratante que previamente saiba da intenção de inadimplemento

do outro, ajuizar ação de resolução contratual já a partir do momento em que

se caracterizou a negativa ao cumprimento”. Daí entendermos viável a

resolução quando, pelas circunstâncias do negócio jurídico, uma das partes

constata sem sombra de dúvida, pelo comportamento da outra, que esta não

cumprirá sua prestação. Seria uma espécie de antecipação de inadimplemento,

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38em face da verificação de que um dos contratantes adota atitudes que

futuramente inviabilizarão a satisfação de sua obrigação.

Trata-se de situação que vem se tornando corriqueira na construção

civil, por exemplo, quando o comprador da unidade percebe que o prazo de

entrega do imóvel se aproxima. Apesar de beneficiado pelo prazo, o

incorporador demonstra desinteresse, seja pela construção não ser iniciada ou

culminar por paralisar em virtude de situação (pré) falimentar da empresa. A

resolução antecipada não existe em nossa legislação e não pode ser

confundida com o vencimento antecipado do débito. Este é restrito a situações

que induzem o devedor à insolvência (não pagamento), conforme se extrai dos

artigos 1425 e 333 do Código Civil. Já o inadimplemento antecipado se verifica

quando o devedor ainda é solvente (está em dia), mas exterioriza a sua

vontade de não vir a cumprir a obrigação.

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CAPÍTULO VI

FORMAS DE EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES

As obrigações podem ser extintas de duas formas: com ou sem

pagamento. Iniciaremos este capítulo estudando as formas de se extinguir uma

obrigação com pagamento e suas modalidades. Além do pagamento ordinário

(stricto sensu), satisfaz-se às obrigações por modos análogos. Existem

importantes modalidades especiais de pagamento que acarretam a morte natural

da obrigação, merecendo estudo individualizado. Em cada uma delas observa-se

com facilidade alguma variação no tocante ao modo de pagamento ou às pessoas

que ocupam originariamente a posição de credor e a de devedor. Analisaremos

cada uma delas.

6.1) Pagamento por Consignação

É o meio judicial ou extrajudicial adotado pelo terceiro, para se liberar

da obrigação, depositando a coisa devida nos casos e formas legais. Em outras

palavras, é o meio técnico posto à disposição do devedor para efetuar o

pagamento na Justiça ante o receio de pagar mal. O objeto da consignação será

a coisa (bem móvel ou imóvel) ou a importância devidamente corrigida. A doutrina

dominante repele o requisito da liquidez do débito, restando suficiente que o autor

consigne (deposite, entregue) sua existência e montante total, sendo os outros

requisitos apontados no curso da demanda. Obviamente, só não cabe a

consignação nas obrigações de fazer ou não fazer. A consignação poderá ser

levada a efeito nas hipóteses elencadas taxativamente no art. 335 do Código

Civil, derivadas da mora do credor ou de razões objetivas que impeçam a

realização do pagamento ou a regularidade da quitação. É imprescindível que o

terceiro respeite os requisitos objetivos e subjetivos do pagamento, não sendo

bastante o depósito para elidir (extinguir) a sua mora, já que o autor deve provar

que tem razão na sua atitude (art. 336, CC).

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6.2) Pagamento Efetuado por Terceiro Com ou Sem Interesse

Jurídico

Conforme nossos estudos, o solvens é aquele que cumpre a obrigação,

sendo ordinariamente o próprio devedor. No pagamento efetuado por terceiros

devemos destacar que o mesmo pode ou não possuir interesse jurídico, pois não

é raro que terceiros que possuam vínculo jurídico com credor e devedor (terceiro

interessado), ou, mesmo, sem qualquer relação contratual com eles (terceiro

desinteressado), culminem por efetuar o pagamento. Devemos destacar que o

pagamento efetuado por terceiro sem interesse jurídico pode ser feito de duas

formas:

a) em nome próprio, onde existe direito ao reembolso pelo valor

despendido, por exemplo: A deve determinada quantia para B e C procura B e diz

que quer pagar a dívida de A;

b) em nome do devedor, obrigação natural onde não há que se falar

em reembolso por parte do devedor, por exemplo: A possui uma determinada

dívida e B sabendo do que se trata, quita o débito de A. Devemos lembrar

também que existe o pagamento efetuado por terceiro com sub-rogação.

Sub-rogação pessoal é a transferência da qualidade creditória para

aquele que solveu (cumpriu) obrigação de outrem ou emprestou o necessário

para isso. A terceira pessoa toma o lugar do credor originário, sendo este

satisfeito. Contudo, subsiste o mesmo vínculo obrigacional, agora entre o sub-

rogado e o devedor. Portanto, é modo de pagamento indireto, por apenas

promover a satisfação do sub-rogante, com alteração subjetiva no pólo ativo da

relação jurídica. O solvens assume o crédito com os mesmos privilégios, ações e

garantias que o antigo credor, sendo certo que o pagamento não gera a extinção

do débito. Destarte, a sub-rogação produz dois efeitos: liberatório, ante a

exoneração do credor primitivo, e translativo, pois o novo credor ingressa na

exata posição do primitivo em relação à dívida, haja vista que apenas se verifica

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uma mutação subjetiva na obrigação. Assim, não apenas privilégios, como

também os inconvenientes do crédito, sobrevivem. Como exemplo, o sub-rogado

poderá se servir das mesmas garantias acessórias (cláusula penal), pessoais

(fiança) e reais (hipoteca) do sub-rogante, porém, havendo sub-rogação sobre

dívida prescrita, não será lícito ao solvens buscar o regresso em face do devedor.

Tendo nos remetido ao estudo das formas de extinção das obrigações

pela via do pagamento e suas modalidades, nos deteremos agora nas formas de

extinção das mesmas sem pagamento, que ocorrem através dos institutos da

imputação do pagamento, da dação em pagamento, da novação, da

compensação e da transação. Vejamos:

6.3) Imputação do Pagamento

Imputação do pagamento é a forma de determinação de um

pagamento quando o devedor possui duas ou mais obrigações para com um

mesmo credor. O devedor contrai vários débitos em relação a um só credor e

paga a quantia insuficiente para a liquidação de todas, todavia se esquece de

especificar a qual delas se destina o valor. Neste instante, surge o problema

referente a quais débitos devem ser considerados pagos, ou, em outras palavras,

com relação a que débitos o pagamento deve ser imputado, consistindo, portanto,

a imputação do pagamento justamente no fato de se determinar qual é a dívida

que se está querendo quitar.

O instituto assume importância à medida que a opção pela imputação

do pagamento de uma dívida em detrimento de outra gera conseqüências mais ou

menos onerosas ao devedor. Basta imaginar dois contratos de mútuo

(empréstimo) contraídos com a mesma instituição financeira, em tempos distintos.

Se o intuito do devedor é adimplir o débito mais antigo, poderá o credor utilizar o

montante para apenas amortizar os encargos da obrigação mais recente. Da

mesma forma, se um dos empréstimos é garantido por uma hipoteca e o outro é

apenas crédito quirografário (divida comum), será certamente mais proveitosa a

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imputação do pagamento no primeiro débito, evitando-se a excussão judicial do

bem dado em garantia. Para que a imputação de pagamento possa se afirmar,

além de haver dois ou mais débitos, exige-se que haja uma identidade de credor

e devedor quanto às dividas, bem como é essencial que estas sejam todas da

mesma natureza - relativas a coisas fungíveis entre si, como por exemplo, várias

dívidas em dinheiro ou de sacas de café, todas líquidas e vencidas. Releva

perceber que os valores pagos serão suficientes à extinção de um dos débitos.

Podemos demarcar três modalidades de imputação do pagamento: a imputação

pelo devedor, designando o débito que deseja saldar; a imputação praticada

pelo credor, quando o devedor se omite; e a imputação oriunda da lei, nas

hipóteses em que ambas as partes descuidam-se de indicar a prestação a ser

adimplida. Outrossim, conquanto exija o artigo em tela a pluralidade de dívidas,

há que se observar que uma única dívida pode vencer juros, quando então se

abrirá ensejo, à imputação do pagamento. Em principio, o autor da imputação do

pagamento é o devedor, vez que, pela leitura do art. 352 do Novo Código Civil, a

este foi conferido o direito em apreço. Isto é, como tem a faculdade de adimplir ou

não, também lhe será lícito, ao pagar, determinar sobre qual das prestações será

imputado o pagamento.

6.4) Dação em Pagamento

A dação em pagamento constitui modalidade de pagamento em que o

credor consente em receber objeto diverso ao da prestação originariamente

pactuada, com efeito liberatório, extinguindo-se a obrigação anterior, ou seja, A

deveria pagar R$ 5.000,00 a B e, na data do pagamento as partes ajustam em

substituir a prestação originária por um carro.

Nas obrigações de dar coisa certa o credor visa a um bem específico,

sendo certo que não se pode lhe impor o pagamento uma coisa por outra, mesmo

que o objeto substitutivo seja de valor superior ao originário (art. 313, CC). Três

requisitos simultâneos se impõem ao aperfeiçoamento da dação:

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a) Pré-existência de um vínculo obrigacional entre as partes, caso não exista

débito anterior, o devedor estará realizando uma doação, operando mera

liberalidade em prol do credor;

b) Anuência (concordância) do credor, pois a dação em pagamento não poderá

ser imposta ao recebedor, não sendo ele obrigado a suportar unilateral alteração

do plano obrigacional convencionado, prevalecendo o princípio de que o

contrato é lei entre as partes, não existindo norma capaz de sacrificar a vontade

do credor, constrangendo-o ao acordo;

c) Diversidade entre a prestação devida e a oferecida em substituição, neste caso

a coisa nova pode ser bem móvel, imóvel ou mesmo um direito (usufruto de

imóvel), sendo importante que guarde correlação de valor à prestação

anteriormente pactuada. No entanto, com certa freqüência a dação de uma coisa

por outra de valor excessivamente superior culmina por envolver fraude contra

credores. A dação em pagamento é contrato real, demandando a tradição

(entrega) ou a transcrição do objeto para o seu aperfeiçoamento.

6.5) Novação

A novação consiste na extinção de uma obrigação em virtude da

constituição de uma obrigação nova que vem ocupar o lugar da primitiva,

envolvendo, portanto, a idéia de substituição de uma obrigação, cessando o

vínculo anterior com a aquisição de novo direito de crédito pelo credor.

Entendemos que a novação, ao contrário do pagamento e da compensação, vem

a ser modo extintivo não satisfatório, pois não produz satisfação imediata do

crédito em prol do credor, como por exemplo, A promete entregar um carro a B,

porém, vendo ser difícil o adimplemento, propõe a substituição da obrigação pela

futura entrega de 15 bicicletas.

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Diferentemente da sub-rogação pessoal, em que o pagamento se

efetua com a subsistência do mesmo débito, que passa para o novo credor, a

novação produz um novo débito com força extintiva do anterior. Ao inverso da

dação em pagamento, em que o objeto da prestação é substituído por um

elemento diverso, para fins de imediata satisfação das partes, a novação, ao

extinguir o débito anterior, transfere ao devedor a responsabilidade pela solução

do novo vínculo. A novação se aperfeiçoa com a conjunção de três requisitos.

Primeiro com a existência de obrigação anterior, pois se a nova obrigação se

extingue e substitui a anterior, é fundamental a preexistência de relação

obrigacional válida. Assim, inviável a novação de obrigação nula (art. 367, CC),

pois o interesse público afasta a ratificação (conserto) de um ato que nem chegou

a se formar. Segundo com a constituição de nova dívida, uma vez que

necessariamente a relação obrigacional que vem a ser criada para extinguir a

pregressa será válida e eficaz. Sendo nula, restabelece-se a obrigação anterior,

com todos os seus acessórios. Caso o vício decorra de anulabilidade, se

declarado mediante sentença judicial, retoma a vigorar a obrigação primitiva; e

terceiro com o animus novandi, (vontade de novar), pois a novação apenas se

opera quando se verifica substancial diversidade entre a obrigação primitiva e a

substituta, isto é, simples alterações de natureza acessória não geram novação. É

importante ressaltarmos que alteração de prazo ou condições acessórias não

importam em novação. É freqüente a alegação de novação por devedores em

embargos à execução de título extrajudicial. Dificilmente, porém, ela é provada,

pois o fato do credor, por exemplo, receber parcelas com atraso não implica

novação, isso pode tão-só modificar a obrigação, mas não nová-la. Da mesma

forma não implicam novação: a mudança de lugar do cumprimento; a modificação

pura e simples do valor da dívida; o aumento ou a diminuição de garantias; a

substituição de um título representativo da dívida (o que vulgarmente ocorre com

a substituição de cheques que mascaram empréstimos), mesmo que o novo título

passe a ter força executiva, quando antes não tinha, e vice-versa. Ademais,

nunca se pode esquecer de que, embora não se exijam palavras sacramentais, a

vontade de novar das partes deve ser expressa.

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6.6) Compensação

A compensação vem a ser o modo de extinção de obrigações que se

verifica quando duas pessoas forem, reciprocamente, credor e devedor uma da

outra, sendo técnica de simplificação de quitação, pois evita a duplicidade de

pagamentos e o risco do inadimplemento. Ao contrário da novação, é modo

extintivo satisfatório de pagamento. Com efeito, mesmo não recebendo os seus

créditos em pecúnia (dinheiro), as partes extinguem as obrigações até onde

possam se compensar. Para que a compensação possa se operar por completo,

automaticamente, três requisitos merecem observância. São eles:

a) Reciprocidade das obrigações, pois existe um encontro de direitos opostos,

caracterizados por dois vínculos jurídicos entre as mesmas partes. Assume

grande relevo, via de conseqüência, a personalidade dos sujeitos. Disciplina o art.

371 do Código Civil que o devedor só pode compensar com o credor o que este

lhe dever. Portanto, não se pode compensar em prol de pessoa que se obriga por

terceiro. Exemplificando, um amigo não poderá compensar a dívida de outro com

o crédito que tem com o credor.

b) Fungibilidade das prestações, pois não basta que as obrigações tenham por

objeto coisas fungíveis em si mesmas, devendo as coisas ser fungíveis entre si,

como por exemplo, dívida de dinheiro só se compensa com dívida de dinheiro. O

legislador foi além no art. 370 do Código Civil, ao prever a possibilidade de as

partes exigirem contratualmente a homogeneidade quanto à qualidade das

prestações, como por exemplo, se estabelece que só se pode compensar a

entrega de um cavalo árabe com a prestação de outro cavalo árabe. Alerte-se,

por necessário, que as obrigações de fazer são insuscetíveis de compensação,

de acordo com o artigo citado que alude às coisas fungíveis.

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c) Liquidez e exigibilidade das dívidas, uma vez que as dívidas líquidas são

aquelas certas quanto à existência e determinadas quanto ao objeto. Já a

exigibilidade diz respeito ao vencimento das dívidas, sendo incompensáveis,

portanto, aquelas sujeitas ao advento de termo ou implemento de condição

suspensiva. Como a faculdade de compensação não é norma de ordem pública,

poderá ser derrogada convencionalmente pelas partes ou renunciada

previamente por uma delas, nos termos do art.375 do Código Civil.

6.7) Transação

Transação é acordo liberatório cuja finalidade é prevenir ou extinguir

relações jurídicas controvertidas, por via de concessões recíprocas das partes

(art. 840, CC). Desse modo, objetivam os transigentes evitar riscos de uma futura

demanda ou cessar litígios já instaurados, pela abdicação de parcela dos seus

direitos. Existem quatro requisitos que devemos analisar: o acordo, a prevenção

ou extinção de litígio, a reciprocidade das concessões e a incerteza. Vejamos:

a) acordo - Em razão das concessões mútuas, a transação, invariavelmente,

coloca-se como negócio jurídico bilateral, inexistindo hipóteses de transação legal

ou atuação judicial espontânea. A capacidade das partes e a legitimação para

alienar devem ser acrescidas à outorga de poderes especiais quando efetivada

por mandatário (art. 661 § 2°, CC). Operado o acordo, não se admite retratação

unilateral (desistência), operando a transação com efeitos análogos à coisa

julgada, inclusive acarretando a extinção do processo sem análise meritória em

caso de rediscussão judicial (art. 267, V; CPC). Eventualmente, poderá a

transação ser objeto de ação anulatória, uma vez presentes alguns dos vícios de

consentimento (art. 486, CPC). Tendo a transação natureza contratual, comporta

faculdade de resolução por inadimplemento de uma das partes. Para garantir o

cumprimento do acordo, permite-se às partes a adição de cláusula penal de

natureza acessória, conforme o exposto no art. 847 do Código Civil.

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b) prevenção ou extinção de litígio - Quando as partes buscam evitar a

instauração do litígio em sede extrajudicial, devem observar o requisito formal da

escritura pública - tratando- se de bens imóveis ou instrumento particular para

móveis, dispensando-se intervenção de advogado ou homologação para a sua

eficácia.

c) reciprocidade das concessões - Se apenas uma das partes cede, não haverá

transação, no máximo uma doação, renúncia ou remissão;

d) incerteza - O estado de dúvida dos interessados também é pressuposto da

transação. Se ausente a controvérsia diante da anterior solução da lide por

sentença transitada em julgado, proíbe-se a transação. Aliás, se uma das partes

transacionou sem ter ciência da decisão que antes eliminara o litígio, de acordo

com o art. 850 do Código Civil, incidirá a nulidade absoluta da transação.

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CONCLUSÃO

Acreditamos ter alcançado o objetivo a que nos propusemos de

demonstrar e analisar o Direito das Obrigações, traçando seus contornos básicos

e realçando a importância do instituto dentro do campo do Direito.

Ao nos voltarmos para a demonstração e análise do tema, nosso

objetivo foi o de estudar os aspectos, conceitos, principais características, origem,

forma, conteúdo, classificação e aplicações da referida matéria, assim como o

desenvolvimento das disposições legais e esperamos ter sido coerentes e

proporcionado um maior entendimento a respeito da matéria.

Exploramos no Capítulo I as Fontes das Obrigações, destacando o

estudo dos Negócios Jurídicos e dos Atos Jurídicos Não Negociais, no Capítulo II

tratamos do assunto pelo foco do Objeto da Obrigação, onde vimos as obrigações

de dar, fazer e não fazer, no Capítulo III a análise foi sobre as várias Modalidades

de Obrigações, no Capítulo IV enfatizamos os Efeitos das mesmas, detendo-nos

na teoria e nas condições subjetivas e objetivas do pagamento, no Capítulo V

abordamos a Inexecução das Obrigações e por fim no Capítulo VI, analisamos as

Formas de Extinção das Obrigações e seus mais variados aspectos.

Lembramos que nos utilizamos do raciocínio dedutivo e de livros e

artigos relacionados ao assunto, sem os quais não teríamos conseguido realizar

uma valiosa pesquisa bibliográfica, o que faz com que possamos afirmar que todo

material utilizado foi de suma importância para imprimir ao trabalho a seriedade

que desejávamos.

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