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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
AVM – FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
A AFETIVIDADE NA RELAÇÃO DE ENSINO/APRENDIZAGEM
E COMO A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA PODE
AUXILIAR NESSE PROCESSO
Paloma Mendes Flores
Prof. Msc. Cláudia Nunes
Rio de Janeiro 2016
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UTORAL
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
AVM – FACULDADE INTEGRADA
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicopedagogia Institucional. Por: Paloma Mendes Flores
A AFETIVIDADE NA RELAÇÃO DE ENSINO/APRENDIZAGEM
E COMO A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA PODE
AUXILIAR NESSE PROCESSO
Rio de Janeiro
2016
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus por permitir-me concluir
com êxito o curso; ao meu esposo Eric; aos
familiares e amigos que me permitiram acreditar e
em especial à professora Claudia Nunes, que com
toda paciência e dedicação me permitiu acertar e
acreditar que tudo daria certo.
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho primeiramente a Deus, pois sem ele nada se realizaria. Aos meus pais e irmãos, meus maiores incentivadores. Ao meu esposo Eric, a quem escolhi estar ao meu lado nesta vida, que me apoiou e me fez persistir até o fim, abdicando do seu próprio tempo para que fosse possível a concretização dos meus sonhos. Aos amigos, Adriana, Andreia, Ana, Jaqueline e Naira que inspiraram em mim a vontade de continuar e me permitiram os melhores sorrisos. Com toda certeza, vocês ficarão em meu coração para sempre.
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RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo colaborar efetivamente sobre a
importância que a afetividade possui para o ensino e aprendizagem, assim
como pontuar como o psicopedagogo poderá intervir no âmbito institucional de
forma a favorecer o trabalho docente, garantindo a efetivação do ensino e
aprendizagem. A proposta do presente trabalho não é de solucionar problemas
relacionados à afetividade x aprendizagem, mas analisá-los, tendo em vista
que cada ser é único, sendo assim, possui suas peculiaridades e se
desenvolvem no seu tempo. O objetivo do estudo é traçar novos caminhos em
prol do aprendizado e do desenvolvimento integral do objeto de estudo em
questão.
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METODOLOGIA
Este estudo envolve uma pesquisa bibliográfica acerca de ideias e
conceitos sobre afetividade e a importância do mesmo e dos vínculos para a
constituição e formação do ser, através de concepções psicogenéticas de
Piaget, Vygotsky e Wallon. Assim como, a partir de estudos neurocientíficos e
uma vivência pessoal, comprovando na prática tais afirmações.
Bossa, Mendes, Solé, entre outros, nos trazem o embasamento
teórico sobre o trabalho psicopedagógico como facilitador e interventor ao
processo institucional, garantindo assim, uma reflexão sobre as práxis
pedagógicas de maneira a permitir que todos os envolvidos sejam respeitados
e vistos pela sua individualidade , possibilitando a prevenção e diminuindo
problemas de aprendizagem, favorecendo um ensino de qualidade e igual para
todos.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
Importância do vínculo afetivo ao processo de ensino e aprendizagem 11
CAPÍTULO II
Lugar afetivo e respectivas contribuições ao ambiente escolar 23
CAPÍTULO III
Conflitos afetivos e a intervenção psicopedagógica na instituição de ensino 32
CONCLUSÃO 48
BIBLIOGRAFIA 49
ÍNDICE 51
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INTRODUÇÃO
Ultimamente, diferentes estudos e autores tem direcionado suas
visões ao ensino. O paradigma que se tinha em apenas orientar o professor em
como elaborar suas aulas, está sendo substituído na busca de respostas em
como a criança aprende. Desta forma, este trabalho se justifica tendo em vista
as teorias de Piaget, Vygotsky e Wallon para a constatação da importância que
a afetividade possui na evolução do processo da vida humana e a importância
do mesmo no âmbito escolar, fazendo um link entre teoria e prática.
Assim, nós nos deparamos com uma nova leitura onde o afetivo e o
cognitivo se interligam, não sendo possível sua separação e nem uma análise
isolada pois, para que a aprendizagem ocorra verdadeiramente, o afetivo deve
estar fundido ao processo cognitivo
A afetividade possui papel primordial e decisivo no processo
ensino/aprendizagem, sendo esta a alavanca de incentivo para que a
aprendizagem ocorra, visto que, uma criança motivada a aprender,
verdadeiramente vai além de suas potencialidades. O professor é quem faz
despertar esta alavanca, é ele quem media e permite que este incentivo
aconteça, sendo a peça fundamental para que uma turma inteira avance,
quando enxerga em cada aluno sua unicidade e individualidade. Mas é este
mesmo professor que pode garantir o retrocesso de seus alunos a partir do
momento em que vê a sua sala de aula apenas como transmissora de
conteúdos, cujo aluno e suas necessidades individuais não tem importância.
O termo afetividade vai além do sentimento e da emoção, sendo
esta a única forma de atingirmos ao outro e sermos atingidos, positivamente ou
de maneira negativa. É a expressão do que sentimos e nos emociona, sendo
capaz além de tocar ao outro, mudar pensamentos e atitudes.
A afetividade inicia-se assim que a criança nasce, é através dela e
dos vínculos afetivos que o indivíduo ingressa no mundo simbólico,
conquistando assim o seu avanço. Como afirma Wallon (2010): “é inevitável
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que as influências afetivas que rodeiam a criança desde o berço tenham sobre
sua evolução mental uma ação determinante” (p.122)
Todo sujeito necessita manter relações afetivas, logo, compreender
estas relações e o contexto destas para determinadas tomadas de decisões é
imprescindível, principalmente em relação aos nossos alunos de 1º ao 5º ano
com idades entre 6 à 12 anos, pois auxilia o sujeito a lidar com as situações de
maneira que favoreça o seu desenvolvimento.
A escola como espaço repleto de relações afetivas e o professor
como mediador destas experiências, possibilita a aquisição de respostas cada
vez mais significativas, permitindo experiências cada vez mais complexas com
respostas precisas. É através da afetividade que este processo acontece.
De acordo com esse entendimento, os objetivos deste trabalho são
de compreender a relação entre a afetividade e dos vínculos afetivos ao
processo de ensino e aprendizagem, analisar a importância do lugar afetivo e
respectivas contribuições destes vínculos para o ambiente escolar e por fim,
compreender a atuação do psicopedagogo nas instituições de ensino frete aos
conflitos afetivos.
O psicopedagogo, como interventor desta relação e com um olhar
individualizado e norteador ao trabalho pedagógico permitirá a compreensão e
a facilitação deste processo, possibilitando o êxito em relação a aprendizagem
pois intervirá com atividades norteadoras e relevantes, propiciando um melhor
aproveitamento entre a relação professor e aluno, atos estes essenciais para a
qualificação do processo de ensino e de aprendizagem.
Esta pesquisa será feita através de uma análise bibliográfica
paralelo às práticas educativas em sala de aula. Teóricos como Piaget,
Vygotsky e Wallon, nos permitirão compreender o que é a afetividade, qual a
importância dos vínculos e de lugares afetivos para aquisição de um ensino e
aprendizagem satisfatória em turmas do fundamental I.
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Autores como Augusto Cury, Fernández, entre outros, ressaltam a
importância do afeto paralelo ao ensino, estabelecendo assim que para se ter
aprendizagem, far-se-á necessário o desejo e o amor para que o indivíduo
verdadeiramente seja capaz de aprender.
Por fim, Isabel Solé, Nadia Bossa e Mendes, nos remeterá a uma
visão psicopedagógica como facilitadora e interventora deste processo, a forma
de se avaliar e de como intervir.
A fim de atingir a proposta do presente trabalho, o mesmo é
estruturado da seguinte forma: no capítulo I vai ser apresentada a
fundamentação teórica frete a realidade encontrada em sala de aula, onde são
apresentados o conceito do termo a partir de teorias baseadas no
desenvolvimento da afetividade para a formação pessoal e respectiva
influência na construção do sujeito e na aprendizagem.
No capítulo II, será relatado a importância dos lugares afetivos como
escola e família, assim como a importância da relação professor x aluno para
efetivação do processo ensino /aprendizagem.
No capítulo III, serão discutidos a atuação do psicopedagogo, como
é realizada uma avaliação psicopedagogica, a importância que a família possui
e os instrumentos de diagnóstico e intervenção.
Finalmente, são feitas as considerações finais sobre o presente
trabalho.
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CAPÍTULO I
IMPORTÂNCIA DO VÍNCULO AFETIVO AO PROCESSO
DE ENSINO E APRENDIZAGEM
A afetividade possui importância fundamental na formação e no
desenvolvimento pessoal e cognitivo do sujeito e na relação com o outro.
Quando pensamos no termo afetividade o relacionamos, de maneira
imediata, à palavra emoção e/ou sentimento como se fossem sinônimos.
Apesar de muitas das vezes os termos afetividade, emoção e sentimento
serem confundidos, ambos são diferenciados de acordo com a forma de
expressão, mas o termo vai além desta ideia, abrangendo a um campo mais
amplo.
A emoção se refere a expressão máxima do afeto, das quais
apresentam uma origem e causa, sendo elas positivas ou negativas, das quais
exprimem em reações corporais observáveis. Os sentimentos relacionam-se
com o interior do indivíduo, não são observáveis e surgem quando tomamos
consciência da nossa emoção, como afirma Damásio (apud RELVAS, 2014):
As emoções são complexos psicofisiológicos que se caracterizam por súbitas rupturas no equilíbrio afetivo de curta duração, com repercussões consecutivas sobre a integridade da consciência e sobre a atividade funcional de vários órgãos. Enquanto os sentimentos são estados afetivos mais estáveis e duráveis, provavelmente provindos de emoção correlatadas que lhe são cronologicamente anteriores. (p.140)
De acordo com Almeida (2004), a afetividade é a identificação de um
domínio funcional abrangente, com diferenciadas formas de manifestação,
sendo elas orgânicas ou diferenciadas como as emoções, sentimentos e
paixão, sendo estas, reguladoras e estimuladoras da atividade psíquica, cuja
origem se dá a partir de relações com o outro. Tais afirmações são observadas
na obra de Wallon (apud GALVÃO, 1999):
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As emoções, assim como os sentimentos e os desejos, são manifestações da vida afetiva. Na linguagem comum, costuma-se substituir emoção por afetividade, tratando os termos como sinônimos. Todavia não o são. A afetividade é um conceito mais abrangente no qual se inserem várias manifestações. (GALVÃO, 1991, p.61)
A afetividade possui papel primordial para a aprendizagem por ser o
estímulo necessário para que dentro da sala de aula ocorra verdadeiramente. É
através da afetividade que o pensamento, a vontade, a ação e a memória
ganham forças, estimulando com isso o aprimoramento das possibilidades de
cada um, como afirma Cunha (2008):
[...] o que vai dar qualidade ou modificar a qualidade do aprendizado é o afeto. São as nossas emoções que nos ajudam a interpretar os processos químicos, elétricos, biológicos e sociais que experienciamos, e a vivência das experiências que amamos é que determinará a nossa qualidade de vida. Por esta razão, todos estão aptos a aprenderem quando amarem, quando desejarem, quando forem felizes. (CUNHA, 2008, p.67)
Um professor com a consciência do valor que o afetivo e relações
afetivas possui com seu alunos , garantirá o sucesso, o respeito, admiração e
amizade dos mesmos, permitindo a estes, muito mais que a aquisição dos
conteúdos, mas uma aprendizagem verdadeira que perpetuará por toda a vida.
1.1. Concepção de afetividade segundo Piaget, Vygotsky e
Wallon
Apesar das teorias de Piaget não associar com frequência o tema
afetividade e der ter feito poucas referências ao termo, de acordo com Souza
(2003), não deixou de considerar a influência do mesmo para o estudo da
inteligência e do desenvolvimento psicológico.
Para Piaget, a afetividade perpassa os sentimentos e emoções, pois
todo o comportamento visa uma assimilação e adaptação, do qual compete ao
indivíduo uma impressão afetiva particular a partir de uma necessidade, um
desequilíbrio, onde as vontades afetivas e morais da criança são colocadas
neste processo, como explica:
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A afetividade desempenharia então, o papel de uma fonte energética, da qual desempenharia o funcionamento da inteligência, mas não suas estruturas; assim como o funcionamento de um automóvel depende do combustível, que aciona o motor mas não modifica a estrutura da máquina. (PIAGET apud SALTINI e CAVENAGHI, 2014, p.42-43)
Apesar de considerar a afetividade e o cognitivo, baseando-se na
constituição da natureza, distintos em si, afirma que ambos são inseparáveis
de acordo com as ações humanas, sendo um dependente do outro para o
funcionamento da inteligência, como afirma Piaget (apud RELVAS, 2014):
Toda ação e pensamento compreendem um aspecto cognitivo, que são as estruturas mentais, e um aspecto afetivo, que serve como uma centelha energética. De forma geral, a afetividade seria funcional para a inteligência: ela é a fonte de energia pela qual a cognição funciona. (p.141)
Agregado a estes conceitos, Piaget (apud SALTINI e CAVENAGHI,
2014, p.56) ao descrever os estágios de desenvolvimento sensório-motor(0 a 2
anos) para o período pré-operatório(2 a 6 anos) há a discursão da existência
dos sentimentos e das relações interindividuais na formação dos esquemas
afetivos e simbolismos infantis, assim como a presença do cognitivo e afetivo
presentes no desenvolvimento psicológico da criança.
Para haver o desenvolvimento da inteligência humana, para Piaget,
só será possível se houver interação social. Tal interação, seja ela verbal ou
afetiva define e forma o ser, configurando sua real essência:
O homem é um ser essencialmente social, impossível, portanto, de ser pensado fora do contexto da sociedade em que nasce e vive. Em outras palavras, o homem não social, o homem considerado como uma molécula isolada do resto de seus semelhantes, o homem visto como independente das influências dos diversos grupos que frequenta, o homem visto como imune aos legados da história e da tradição, este homem simplesmente não existe. (PIAGET apud LA TAILLE,1992,p.11)
É a partir destas relações sociais que a criança perpassa fases
como do egocentrismo e desenvolve a construção do seu eu tendo como visão
a importância da relação e da interação com o outro, influenciando no
desenvolvimento de sua moral, suas tendências e vontades.
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Para Vygotsky (apud, OLIVEIRA e REGO, 2003) o aprendizado
sobre as emoções e afeto possui grande dimensão, visto prolongar por toda a
sua vida, desde o nascimento até a morte. Da mesma forma que o sujeito
aprende as condições necessárias para sua sobrevivência como falar, andar,
pensar e agir, ele é capaz de aprender a sentir, através de sua cultura,
provenientes da interação social .
Para Vygotsky (1993), a compreensão da base afetiva-volitativa do
ser é o que permite entender o pensamento humano de uma maneira plena,
quando afirma que:
Quem separa desde o começo o pensamento do afeto, fecha para sempre a possibilidade de explicar as causas do pensamento[...]. De igual modo, quem separa o pensamento do afeto nega de antemão a possibilidade de estudar a influência inversa do pensamento no plano afetivo, volitivo da vida psíquica, porque uma análise determinista desta última inclui tanto atribuir ao pensamento um poder mágico capaz de fazer depender o comportamento humano única e exclusivamente de um sistema interno do indivíduo, como transformar o pensamento em um apêndice inútil do comportamento, em sua sombra, sua desnecessária impotente. (VYGOTSKY,1993,p.25 apud REGO, OLIVEIRA,2003,p.18)
Segundo Vygotsky (apud, OLIVEIRA e REGO, 2003), tendo como
pressuposto a presença da linguagem e da interação social inerentes e
indispensáveis para o desenvolvimento integral do indivíduo, é através das
mesmas que o indivíduo apreende sua cultura, das quais os constitui como
espécie humana, permitindo assim que seus pensamentos sejam expressados
assim como suas emoções, tendo a afetividade relações históricas e culturais,
se diferenciando de outras espécies, como dos animais, cujas emoções
permanecem atreladas a origem instintiva e biológica.
Para Vygotsky, então, “a afetividade humana é construída
culturalmente” (apud, OLIVEIRA e REGO, 2003, p.28), ou seja, determinadas
emoções dependerá do pensamento cultural inerentes ao grupo pertencente.
Wallon (apud RELVAS, 2014, p.141-142), declara que a razão e a
emoção atreladas entre si, visto que:
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“O teórico tentou compreender as emoções por intermédio de suas funções, dando-lhes papel fundamental na evolução da consciência de si. Para ele, a evolução da afetividade depende das construções realizadas no plano da inteligência; a evolução intelectual depende das construções afetivas. Entretanto, para Wallon, existem fases em que predominam a razão e fases em que predominam a emoção.”
Dantas (1992) constata que
De acordo com a teoria de Wallon, o mesmo considera que na formação da vida psíquica, a emoção funciona como uma interligação constituída pelo social e orgânico. Nesta fase (nos primeiros anos de vida), a afetividade se baseia às manifestações fisiológicas, ou seja, é determinada apenas à satisfação dos interesses pessoais. A mãe, ou o sujeito que desempenha este papel, neste momento passa a ter importância social para a criança, fornecendo o vínculo e suprindo a insuficiência de articulação cognitiva. Mediante a esta questão, Wallon considera a afetividade fundamentalmente social, visto que ela fornece o primeiro e mais forte vínculo entre os indivíduos e supre a insuficiência da articulação cognitiva nos primórdios da história do ser e da espécie. (p.85)
A criança, inicialmente, apesar de não ter intencionalidade em
relação aos seus atos, é movida pelas suas necessidades e age mediante a
elas. O social tem influência fundamental, pois partindo das atitudes que tem,
mesmo que “inconscientemente” promoverá uma ação aos que estão em seu
entorno, essa ação promoverá atitudes favoráveis a própria criança. Sendo
assim, mediante a influência com o adulto (o social) que as atitudes da criança
ganham significado. Wallon (apud DANTAS ,1992, p.85)“admite que o
emocional caracteriza-se com o social e biológico”.
A afetividade manifesta-se através de impulsos emocionais no
período de desenvolvimento do indivíduo, apresentando papel fundamental
pois possibilita o contato da criança com o mundo e com a sua própria cultura,
favorecendo com isso a construção da sua própria identidade, como afirma
Wallon,( apud DANTAS,1992), quando afirma que é a atividade emocional que:
Realiza a transição entre o estado orgânico do ser e a sua etapa cognitiva, racional, que só pode ser atingida através da mediação cultural, isto é, social. A consciência afetiva é a forma pela qual o psiquismo emerge da vida orgânica: corresponde a sua primeira manifestação. Pelo vínculo imediato que se
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instaura com o ambiente social, ela garante o acesso ao universo simbólico da cultura, elaborado e acumulado pelos homens ao longo da sua história. Dessa forma é ela quem permitirá a tomada de posse dos instrumentos com os quais trabalha a atividade cognitiva. Neste sentido, ela lhe dá origem. (p.85-86)
Inicialmente, na infância, temos o afetivo como pura-emoção, a partir
do momento em que essa emoção se torna “racional” emitindo ações a partir
delas, onde a inteligência constrói uma função simbólica , o raio de ação afetivo
se amplia sendo incorporado o efeito da linguagem oral e escrita. As
possibilidades para que este lado afetivo se nutra são ampliados, neste
momento, a educação e a escola ganham força para que a aprendizagem
aconteça, através deste canal facilitador: a afetividade.
1.2. Influência da afetividade na aprendizagem
Damásio (apud RELVAS, 2014), cujas ideias se entrelaçam às
concepções de Piaget e Vygotsky , em seus estudos, comprovou que para
haver aprendizado, o afetivo deve estar inserido a este processo. Comprovou
que “pessoas que possuem alguma deficiência na região do cérebro
responsável pelas emoções apresentam dificuldades de aprendizado”
(DAMÁSIO, apud RELVAS, 2014, p.142), sendo assim, afirmamos que as
emoções possuem influência significativa e decisiva ao processo de
aprendizagem, por serem geradoras de sentimentos e atos racionais,
indispensáveis para efetivação da aprendizagem.
De acordo com Goleman (2012), a ligação das amigdalas do nosso
cérebro (e as estruturas límbicas relacionadas)e o neocórtex, são a base
central onde o pensamento e o sentimento, ou seja, razão e emoção se
entrelaçam, nos permitindo pensar e tomar decisões com clareza.
Piaget (apud SALTINI e CAVENAGHI, 2014) nos traz a constatação
que até na resolução de um problema matemático, além da atuação cognitiva,
é a afetividade quem motiva a aquisição da habilidade para resolver o mesmo.
Há um interesse intrínseco ou extrínseco. Ao longo da resolução do problema,
estados de prazer, decepção, ardor, fadiga, esforço ou desânimo acompanham
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o processo e ao final do mesmo, o sentimento de sucesso ou fracasso
correspondem ao resultado.
A aprendizagem está relacionada a “um clima emocional”, como
afirma Relvas (2014). A qualidade das relações estabelecidas na troca dos
saberes, seja ele entre professor/aluno, pai/filho, entre outros, favorecerá e
promoverá o desenvolvimento do individuo.
Aprendemos com a cognição, mas, sem dúvida alguma, aprendemos pela emoção, o desafio do professor é unir conteúdos coerentes, desejos, curiosidades e afeto para uma prazerosa aprendizagem. (RELVAS, 2014, p.41)
O afetivo é o que permite que o sujeito adquira conhecimento. Uma
criança desmotivada e sem interesse, não permite que as portas do
conhecimento cognitivo se abram para uma aprendizagem significativa com
aplicabilidade para a vida e duradouras, visto ser afirmado por Goleman (2012,
p.46) que o “cérebro tem dois sistemas de memória, um para fatos comuns e
outro para aqueles carregados de emoção”, emoção estas que perpetuarão e
darão sentido ao que é ensinado.
Os motivos para que a aprendizagem verdadeiramente ocorra são
puramente interiores. A criança deseja e se interessa pela aprendizagem
quando enxerga um motivo, sendo isto, uma motivação para o despertar do
funcionamento cognitivo, como afirma Rodrigues (1976):
A aprendizagem escolar depende, basicamente, dos motivos intrínsecos: uma criança aprende melhor e mais depressa quando sente-se querida, está segura de si e é tratada como um ser singular (...) Se a tarefa escolar atender aos seus impulsos para a exploração e a descoberta, se o tédio e a monotonia, forem banidos da escola, se o professor, além de falar, souber ouvir e se propiciar de experiências diversas, a aprendizagem será melhor, mais rápida e mais persistente. Os motivos da criança para aprender são os mesmos que ela tem para viver. Eles não se dissociam de suas características físicas, motoras, afetivas e psicológicas o desenvolvimento. (p.174)
Logo, toda e qualquer aprendizagem está coberta pela afetividade,
já que ocorrem mediante as intenções sociais, num processo vinculador, visto
que para se ter uma verdadeira aprendizagem, devemos ver o mesmo como
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um “compromisso essencialmente emocional. Cabe ao ensino o compromisso
com motivação, estimulação e orientação da aprendizagem” (RELVAS, 2015,
p.125) visto que, uma criança desmotivada e sem vontade de aprender, não é
acessível a aquisição dos conhecimentos necessários. “Ensinar consiste
fundamentalmente em aprender” (RELVAS 2015, p.125). Tal aprendizagem,
refere-se a aquisição própria de buscar soluções e estratégias eficazes para
que o aluno utilize sua razão em conjunto a emoção.
Atualmente, um dos grandes desafios é aguçar no discente a
vontade de aprender e a aquisição da aprendizagem real e duradoura, visto a
infinidade de informações aceleradas que chegam ao mesmo de forma
momentânea. A sala de aula perde por conta das inovações atuais. Compete
ao professor caminhar além destas inovações permitindo novas propostas e
criando um alicerce afetivo com o aluno, capaz de mostrar ao mesmo a
importância da sala de aula e dos conteúdos transmitidos, como importantes
para aplicabilidade na vida do mesmo, como afirma Relvas (2015):
Para enfrentarmos o mundo da informação, não basta, simplesmente, encará-lo com a razão. O melhor caminho para as convivências sociais do mundo atual é unir razão e emoção, para que se construa o alicerce necessário à construção do conhecimento e da aprendizagem significativa. (p.125)
Despertar o cognitivo vai além do apenas “transmitir” conteúdos,
despertar o afetivo é permitir que a aprendizagem verdadeiramente aconteça,
onde a criança perceba e usufrua o conhecimento adquirido para sua vida,
como afirma Relvas (2015):
Aprender a aprender é fundamental para uma sociedade justa e digna. Aprender significativo implica emocionar-se até certo ponto, sempre que nos relacionamos novamente com o conteúdo aprendido. Quem aprendeu com a cabeça e com o coração tem constantemente algo a falar sobre o aprendizado, compartilhando e partilhando com os demais. (p.126)
1.3. O vínculo afetivo na relação ensinar e aprender
O estabelecimento de vínculos afetivos no processo de ensino e
aprendizagem é primordial para que o ato de ensinar seja satisfatório e a
aprendizagem seja prazerosa e significativa. Wallon (2010) em sua teoria, nos
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traz a constatação que para haver desenvolvimento, o ponto de partida está na
afetividade, cuja mesma representa um domínio funcional dependente de dois
fatores: o orgânico e o social.
Segundo Almeida (2004) evolução do ser humano parte da
sociabilidade sincrética para uma individualização psicológica. As relações
familiares e o meio social da qual o sujeito convive, apresentam grande
importância para sua formação. Assim como Wallon(1959) nos afirma:
A importância das relações humanas para o crescimento do homem está escrita em sua própria história. O meio é uma circunstância necessária para a modelagem do indivíduo. Sem ele a civilização não existiria, pois foi graças à agregação dos grupos que a humanidade pôde construir os seu valores, os seus papeis, a própria sociedade. (WALLON apud ALMEIDA, 1999,p.45)
Quando Piaget ( apud SALTINI e CAVENAGHI, 2014), compara o afeto
ao combustível e o motor como a inteligência, fazemos uma ponte, visto ser o
aluno o motor, do qual necessita de combustível para que se mova, este
combustível refere-se ao professor, ou ao sujeito social deste processo, do qual
se torna necessário para o deslanchar desta criança. Para haver
aprendizagem, a criança deve ser motivada a isto, seja em qualquer situação
de sua vida.
De acordo com Relvas (2009) o processo de ensino e aprendizagem
está associado à construção de pontes entre a subjetividade, entre o ser que
aprende e o ser que ensina, ou seja, os vínculos entre professor e aluno são a
base para uma aprendizagem significativa pois a partir do momento que são
criados os vínculos, são estabelecidas confianças, confianças estas que
garantem que dificuldades, dúvidas e individualidade sejam revelados de
maneira que possibilite a intervenção para que seja mediada a aprendizagem.
Para Saltini (2008)
[...] a inter-relação da professora com o grupo de alunos e com cada um em particular é constante, se dá o tempo todo, seja na sala ou no pátio e é em função dessa proximidade afetiva que se dá a interação com objetos e a construção de um conhecimento altamente envolvente. Essa inter-relação é o fio condutor, o suporte afetivo do conhecimento. (p.100)
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A relação professor e aluno, permite que a aprendizagem seja
enriquecida. Quando é mencionada a palavra “aprendizagem” não é apenas a
aprendizagem dos conteúdos, mas a percepção de uma aprendizagem que
será contextualizada com a vida.
Para que tal aquisição de conhecimento aconteça, uma turma deve
ser desmembrada, tendo a visão de que cada aluno possui sua individualidade,
suas necessidades e aquisição de conhecimentos diferenciados. Compreender
isto, é criar e estabelecer vínculos, pois só a partir disto que a confiança surge,
possibilitando que o aluno e professor se conheçam e se respeitem.
Saltini (2008, p.92) nos diz que “a educação é uma arte. Não é uma
mera profissão ser educador. Manipulamos a educação com as duas mãos a
do afeto e a da lei das regras”. Esta afirmação, nos permite constatar que, ser
um professor, como muitos acreditam, não é deixar de impor regras e ditar leis
para ser seguida em sala de aula, mas é ter a sabedoria em dosar ambas de
maneira que não se confundam, pois é a partir delas que o alunos cria valores
dos quais se perpetuarão além dos muros da escola. Tais regras e valores
permitem o respeito mútuo, os limites e posição de cada um.
Apesar da sala de aula, ainda, permanecer direcionada apenas a
transmissão de conteúdos, de acordo com Fernández (1991) deve-se ter em
mente a influência que a mesma possui na formação e constituição do sujeito
pertencente, pois é ela quem direcionará o indivíduo de forma libertadora, onde
permitirá que o mesmo atue e aplique seus conhecimentos na vida, ou a
mesma o direcionará a ser um alienante cujas ideias jamais serão mostradas,
ficando aprisionadas apenas no seu interior, tornando-se a cada dia um
enfermidade crescente para aquele que o sente.
A função da educação pode ser alienante ou libertadora, dependendo de como for usada, quer dizer, a educação como tal não é culpada de uma coisa ou de outra, mas a forma como se instrumente esta educação pode ter um efeito alienante ou libertador. (FERNANDEZ, 1991, p.82)
A visão e o foco dos estudos no século atual está caminhando para
uma educação em que o afeto e os vínculos afetivos são a chave para uma
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aquisição de conhecimentos , visto a sua importância, funcionalidade e garantia
real para o processo de ensino, favorecendo a aquisição da aprendizagem.
Esta nova visão da educação, segundo Delors (2012) deve estar
contextualizada num pilar voltado para quatro aprendizagens fundamentais dos
quais serão as bases de conhecimento dos indivíduos que estão em nossa sala
de aula. Os quatro pilares são:
Aprender a conhecer - Combinando uma cultura geral, suficientemente ampla com a possibilidade de estudar em profundidade, um número reduzido de assuntos, ou seja: aprender a aprender, para beneficiar-se das oportunidades oferecidas pela educação ao longo da vida. Indicando o interesse, a vontade em aprender, em pesquisar, em descobrir. Valorizando a curiosidade pelo novo pois um aluno com interesse e a vontade aguçados, se permite à descoberta de novas aprendizagem.
Aprender a fazer - Referindo-se além de tudo ao desenvolvimento de técnicas, onde o sujeito aprenda a enfrentar situações novas, trabalhando em equipe e desenvolvendo o espírito cooperativo e de humildade. Valores estes necessários ao trabalho coletivo possibilitando o desenvolvimento além da sala de aula, mas se estendendo ao campo profissional.
Aprender a conviver - Onde o sujeito aprenda a valorizar o convívio com os outros, administrando conflitos, participando de projetos, tudo isso além da obrigação, mas pelo reconhecimento do valor que tais atos possuem principalmente nos dias atuais, valorizando com isso, o respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz.
Aprender a ser - A aprendizagem de cada sujeito e suas potencialidades individuais, desenvolvendo o melhor possível, a personalidade e estar em condições de agir com uma capacidade cada vez maior de autonomia, discernimento e responsabilidade pessoal. (DELORS, 2012, p.31)
Com base nisto, pensamos num ensino além dos conteúdos, onde
dá-se lugar a formação do sujeito em si, onde ele passa a se auto conhecer e
pensar numa realidade onde está inserido, dando lugar ao todo, formando
sujeitos atuantes para a vida.
Para que um aluno se permita desenvolver integralmente, os
vínculos afetivos devem fazer parte da rotina diária, pois sem isso, o aluno não
se permitirá a mudança e nem estará “aberto” para experimentar o novo, como
afirma Saltini (2008)
22
O educador não pode ser aquele que fala horas a fio a seus alunos, mas aquele que estabelece uma relação e um diálogo íntimo com ele, bem como uma afetividade que busca mobilizar sua energia interna. É aquela que acredita que o aluno tem essa capacidade de gerar ideias e coloca-las ao serviço de sua própria vida.(p.69)
Nisto, observa-se que a afetividade e os vínculos afetivos são
fundamentais, em sala de aula, visto ser, na mesma, que o sujeito se
desenvolve emocionalmente, estabelece as relações interpessoais e
intelectuais mais adequadas, cujo aprendizado e conceitos levarão por toda a
vida. Tais conceitos são capazes de mudar o indivíduo e ao final, toda a visão
de uma sociedade.
23
CAPÍTULO II
LUGAR AFETIVO E RESPECTIVAS CONTRIBUIÇÕES
AO AMBIENTE ESCOLAR
Quando a criança se torna pertencente ao ambiente escolar,
inicialmente não se chega ao mesmo “como uma folha em branco” capaz de
ser desenhada e formada da forma mais adequada aos padrões docentes,
como se acreditava, mas a mesma já possui uma vivência, experiência, uma
individualidade, enfim, uma história, história esta que a define e a constitui
como única. A família e o contexto familiar, já marcam esta criança em relação
a formação da sua identidade.
A escola é o local onde o contexto familiar adquire forma e força e se
faz presente no contexto educacional. Um professor atento é capaz de
compreender o seu aluno quando respeita exatamente isto, a sua história, pois
será ela o norte para a obtenção de uma aprendizagem efetiva e significativa,
que vai além dos livros e conteúdos, sendo um aprendizagem pessoal e
verdadeira.
2.1. Na relação professor e aluno
No ano de 2015, recebi uma turma de 3º ano do ensino fundamental,
composta por 30 alunos, todos ditos com “dificuldades de aprendizagem”. Uma
aluna em especial permitiu-me comprovar na prática a importância que o
vínculo afetivo apresenta para o sucesso ou regresso de um aluno.
Clarisse (nome fictício) era uma aluna arredia, não lia, não escrevia
e nem reconhecia o próprio nome. A figura do professor para ela possuía um
significado repulsivo, demonstrando verdadeiro desprezo ao se referir a um
professor. A aluna mostrava-se sempre rude e qualquer demonstração de
carinho não era aceita pela mesma, onde procurava agredir verbalmente e
deixava claro sempre o seu desprezo pela figura do mesmo.
Tal aluna me intrigava enquanto profissional, pois ao mesmo tempo
que ela representava repudio pelo professor, mantinha um aspecto de líder e
24
incentivava a turma a fazer o mesmo. Este aspecto, mostrava a necessidade
que a aluna em questão tinha em ser vista e de sentir-se importante para
alguém, de acordo com Cury (2003,p.97)“por trás de cada aluno arredio, de
cada jovem agressivo, há uma criança que precisa de afeto”
Desafiada por esta situação e necessitando adquirir controle para
obter sucesso, como afirma Relvas (2009, p.113) “o educador torna-se
responsável em apontar pistas, estimular e estabelecer pontes alicerçadas para
a construção efetiva do conhecimento do educando”.
A família foi solicitada, mas a mesma, não se mostrou com interesse
em ajudar se tornando inviável a presença dos mesmos para auxiliar no
sucesso da criança. Logo, optei em manter diálogo com os professores dos
anos anteriores, para buscar saber se a aluna sempre fora assim, ou se referia
a algum ocorrido, referente ao ano em questão, que a motivou a apresentar tal
comportamento. Neste momento, percebi que por anos ela fora agredida com
palavras rudes pelos mesmos, que afirmavam à ela por todos os anos que não
adiantaria que se mantivesse estudando pois jamais aprenderia. Tais palavras
foram absorvidas por esta aluna como algo destrutivo que afetou sua
aprendizagem por diversos anos.
Percebi neste momento que o problema de aprendizagem estava no
que fora implantado nela, cujos vínculos afetivos não haviam nunca sido
firmados, na escola por parte destes professores e em casa, cuja importância
desta criança não tinha significado. A aluna não tinha interesse no que era
proposto em sala de aula pois ela não se sentia incluída à escola, visto
ninguém ter mostrado, ensinado e proporcionado que ela sentisse a
importância e o valor que ela tinha para aquele ambiente. Relvas (2009),
explica a influência de tais fatores para o cognoscete:
As experiências vividas pelo educando em desenvolvimento são referidas e imprimem significação determinante em seu processo de construção pessoal. A aprendizagem coloca em foco as diferentes dimensões do educando sob uma ótica integradora do aspecto cognitivo, afetivo orgânico e social. O “olhar” sob esses aspectos, ao mesmo tempo em que relativiza a importância da escola na aprendizagem, coloca em foco a
25
importância de toda a reunião de fatores “extraclasses” que interferem no processo de construção do conhecimento e do papel de aprendente. (RELVAS, 2009, p.127)
Depois de muita persistência, fui mostrando à Clarisse o valor que
ela tinha, fui criando vínculos com ela e passei a mostrar que eu a enxergava e
via um potencial inimaginável nela. Passei a elogiá-la, mesmo recebendo
ofensas, mas tais grosserias foram sendo amenizadas a medida que ela não
recebia um grito de volta, mas uma palavra de amor, carinho e compreensão.
Clarisse aprendeu a ler em apenas dois meses. Incentivou a turma a
mudar e ensinou aos mesmos o valor que o professor tinha, a importância da
escola e principalmente o quão valioso era a aprendizagem, Relvas (2015), nos
explica o que proporcionou de forma positiva para que a aprendizagem da
aluna em questão se tornasse possível:.
O centro da inteligência emocional está no funcionamento da amígdala cortical e de sua interação com o neocórtex. Quanto mais intenso for o estímulo da amígdala, mais forte será o registro; as experiências que mais nos apavoram ou emocionam na vida estão entre nossas lembranças indeléveis. Isto significa que o cérebro tem dois sistemas de memória: um para fatos comuns e outro para fatos imbuídos de emoção. (RELVAS, 2015, p.124)
A turma ao final do ano deixou de ser considerada “incapaz de
aprender”, todos aprenderam a ler e a escrever e mais que isso, eles
aprenderam a amar e respeitar sua escola e a si mesmo, se tornando um
exemplo de persistência, dedicação e muito amor, sendo assim, de acordo com
Cury (2003, p148), “a tarefa mais importante da educação é transformar o ser
humano em líder de si mesmo, líder dos seus pensamentos e emoções.”
Diante deste pensamento, eu não desisti da Clarisse e como
recompensa, eu aprendi o meu verdadeiro papel enquanto professora, assim
como aprendi a ter uma postura diferenciada enquanto psicopedagoga. Como
afirma Relvas (2014):
Aprendemos com a cognição, mas, sem dúvida alguma, aprendemos pela emoção. O desafio é unir conteúdos coerentes, desejos, curiosidades e afetos para uma prazerosa aprendizagem. (p.129)
26
Quando a aprendizagem vai além do simples cognitivo em que a
emoção se faz presente, o aprendizado ganha sentido. O desejo em aprender
e buscar mais, inquieta e torna a persistência a chave mestra para tornar real o
que antes julgava-se impossível.
O papel do professor em sala de aula é de um valor imensurável,
pois a partir do momento em que se é configurado o seu real papel na
aprendizagem, em que a realidade e o aluno em si são vistos mediante sua
singularidade, a aprendizagem se torna real e significativa, não para o
conteúdo proposto, mas para a atuação da criança para a vida, visto que “o
melhor caminho para as convivências sociais do mundo atual é unir razão e
emoção, para que se construa o alicerce necessário à construção do
conhecimento e da aprendizagem significativa” (RELVAS, 2015, p.125)
Antunes, (apud RELVAS, 2009), compara o papel do professor a um
marinheiro dos novos tempos, visto que no momento em que o mesmo pensa
nas inteligências múltiplas, configura com isso um novo papel para a educação.
Uma educação em que o aluno é o centro do processo, com suas
singularidades, pronto a ser descoberto, cuja colaboração com esse
desenvolvimento está diretamente ligado a formar integralmente o indivíduo
para os novos tempos.
Segundo Relvas (2009, p.127), a aprendizagem deve estar
articulada ao “momento do aprendiz, a sua história e as suas possibilidades”
sendo visto e respeitado com isso, todos os aspectos vigentes que constituem
o sujeito em si, assim como as suas possibilidades individuais , indo além do
simples ensino e aprendizagem.
Hoje o processo de aprendizagem de cada pessoa está associado à construção de pontes entre a objetividade e a subjetividade, entre o ser que aprende e o ser que ensina, entre o saber e o não-saber, entre os seres que coexistem e, juntos, se humanizam. (RELVAS, 2009, p.127)
Nesta turma, tudo isso foi comprovado, muito mais que transmissão
de conteúdos, os vínculos afetivos são a chave para um verdadeiro sucesso no
âmbito educacional.
27
2.2. Na família
A família, como afirma Goleman (2012) e outros pesquisadores, é
onde se inicia a aprendizagem emocional, onde se aprende a conhecer a si
mesmo em paralelo às reações demonstradas pelo outro, a como avaliar e
reagir de acordo com o sentimento interior , a interpretar expectativas e
temores. Tais aprendizagens não estão fundamentadas apenas no que os pais
falam, mas em suas atitudes que são observadas pela criança. A forma como
os pais tratam os filhos na infância traz consequências profundas e
permanentes na vida da mesma.
De acordo com Goleman (2012) crianças que possuem a
oportunidade de serem criadas num seio familiar dotado de amor e
compreensão, adquirem vantagens em todo o espectro da inteligência
emocional e em tudo mais na vida, diferentes de uma criança que convivem
num seio familiar em que tais atos não acontecem à ela “é provável que essas
crianças passem a vida com uma perspectiva pessimista, não esperando
encorajamento nem interesse dos professores, não tendo prazer na escola.”
(GOLEMAN, 2012, p.211)
Um exemplo clássico do citado acima está na turma de 3º ano do
ano de 2015. Alguns alunos não viam expectativa na escola, não tinham
conhecimento do motivo de estarem ali e nem a importância da aprendizagem.
Os pais não eram presentes nesta classe, os alunos até então, não recebiam
importância dos familiares e nem dos professores que os acompanharam. O
resultado disto, foi o fracasso imposto pela falta de motivação.
Os pais possuem importância fundamental no que se antecede a
entrada da criança na escola e no decorrer de todo o processo, como afirma
Brazeton (apud GOLEMAN, 2012), a atuação dos mesmos pode gerar
confiança, prazer na aprendizagem e a definir limites. Posições estas
indispensáveis para uma aprendizagem qualitativa.
Essa observação se baseia num crescente conjunto de indícios que mostram como o sucesso escolar depende, em grande parte, de características emocionais que foram cultivadas nos
28
anos que antecedem a entrada da criança na escola. (GOLEMAN, 2012, p.211)
A participação da família no âmbito escolar possui importância
fundamental para a aquisição e efetivação do processo de ensino e
aprendizagem, visto serem ambos, os suportes necessários dos quais a
criança tem confiança .
A primeira oportunidade para moldar os ingredientes da inteligência emocional é nos primeiros anos, embora essas aptidões continuem a formar-se durante todo o período escolar. As aptidões emocionais que posteriormente, as crianças adquirem formam-se em cima daquelas aprendidas nos primeiros anos. E essas aptidões, são o alicerce essencial de todo o aprendizado. (GOLEMAN, 2012, p.211)
O vínculo familiar para o crescente da criança possui um valor
inigualável, sendo esta a primeira fonte de confiança e aprendizagem que a
criança adquire sobre si e sobre o mundo.
Aptidões como confiança, curiosidade, intencionalidade,
autocontrole, relacionamento, capacidade de comunicar-se e cooperatividade,
são adquiridas através dos vínculos familiares e levadas para a sala de aula,
como mecanismos de obtenção de sucesso da mesma.
Como afirma Goleman (2012, p.213), “os três ou quatro primeiros
anos são um período em que o cérebro da criança cresce até cerca de dois
terços do seu tamanho final, e evolui em capacidade num ritmo que jamais
voltará a ocorrer”. Sendo assim, neste período é onde os principais tipos de
aprendizagem ocorrem de maneira mais fácil, inclusive a aprendizagem
emocional que se refere a aprendizagem mais importante e crucial. O impacto
da maneira como esta aprendizagem acorre no indivíduo é profundo, cujas
consequências são duradouras e grandiosas.
Os vínculos afetivos impostos pela família, são os que garantirão tais
aprendizagens à criança. É primordial que os membros da mesma saibam a
importância que possuem e preparem de forma consciente seus filhos para a
educação formal escolar.
29
A inserção da família atrelada ao processo escolar possui extrema
importância, integrá-los ao ambiente escolar é garantir sucesso e
aprendizagem para a criança.
2.3. Lugar do desejo na aprendizagem
O processo de aprendizagem é acompanhado por sentimentos,
envolvendo o conhecimento na forma de fatos, figuras e linguagens. A emoção
apresenta um papel importantíssimo, pois, ativa a atenção, desencadeando
com isso a memória de curto prazo, tornando possível o ato de aprender.
Segundo Relvas (2014, p.38) a aprendizagem ocorre partindo do desejo, ou
seja, “para se ter aprendizagem, é preciso que ocorra excitação emocional.”
A interação com o outro e a experimentação e produção do
conhecimento proposto permitem a construção do conhecimento.
Uma aprendizagem sem a construção dos vínculos é o mesmo que
uma aprendizagem vazia, em que o aluno não tem forma e não tem
significado, apenas o conteúdo tem importância, mas sem contexto e eficácia
para a vida, como foi o exemplo da aluna Clarisse, que não era vista de acordo
com sua subjetividade, para a mesma não havia significado o conteúdo e a
escola, pois sua vida não estava ali contextualizada, com isso, a aprendizagem
e os conteúdos não tinham valor, sendo negligenciadas a sua função no
contexto social da mesma.
A partir dos vínculos, a criança se permite ir além das suas
capacidades adquirindo habilidades transcendentes aos conteúdos, tornando
desejante a obtenção do êxito em seu processo.
O professor, a família e a escola precisam buscar uma forma de harmonizar essa manifestação, é por meio dessas expressões afetivas que o educador comprometido e atento cria um olhar crítico e busca pistas para o entendimento das “incapacidades e limitações”, desde simples expressões faciais, agitações corporais, respiração aumentada até olhares para garantir a atenção e o cuidado no ato de aprender. (RELVAS, 2014, p.41)
30
Incentivar o aluno, segundo Relvas (2014) é fundamental em prol de
uma aprendizagem qualitativa, favorecendo no progresso do desempenho
pessoal do indivíduo. Garantir que o indivíduo conheça a si mesmo, garante
que o mesmo interprete os sinais sociais, promovendo com isso, a capacidade
da confiança ao outro, aceitando assim transitoriamente a dependência para o
seu desenvolvimento.
A neurociência apresenta grandes destaques e comprovações sobre
a importância que os estímulos afetivos desempenham sobre o cognoscente
uma das comprovações está na citação de Noronha (apud RELVAS, 2014):
[...]se os estados mentais são provenientes de padrões de atividades neural, então a aprendizagem é alcançada por meio da estimulação das conexões neurais, podendo ser fortalecida ou não, dependendo da qualidade da intervenção pedagógica. (p.147)
Uma pesquisa realizada pela revista Veja (ano 42, nº41/09) conta
que “[...] agrados e carinhos ajudam a fortalecer as conexões entre os
neurônios, sobretudo aqueles responsáveis pelo equilíbrio e pela locomoção.”
A aprendizagem perpassa a ideia conteudista, para que uma criança adquira
aprendizagem, sem o estímulo para que isso aconteça ela não alcançará. A
criança precisa ir além da sala de aula. Faz-se necessário mostrar a ela a
importância que a escola apresenta e a funcionalidade do que é aprendido para
transcrição na vida do mesmo.
Segundo Relvas (2015):
O dualismo razão e emoção se une por meio de um mecanismo dinâmico, uma impelindo a outra com grande velocidade na tomada de decisões. Na realidade, estas duas memórias são complementares para que ocorra a interação para o cérebro. [...] o elemento responsável pelo prazer e aprendizado situa-se nessa região. A ausência de libidação ocasiona problemas conflitantes, impedindo o processo de aprendizagem. (p.123)
Para existir aprendizagem, o desejo deve estar presente, motivando
e impulsionando a qualidade da mesma, pois é apenas mediante a isso que
uma criança se permite adquirir o conhecimento necessário. Como afirma
Relvas (2015):
31
A aprendizagem pode ser considerada como um compromisso essencialmente emocional. Cabe ao ensino o compromisso com motivação, estimulação e orientação da aprendizagem. Não se pode ensinar a quem não quer aprender, a quem não se encontra disponível para as incertezas e a busca de conhecimento. Ensinar consiste fundamentalmente em aprender. Aprender a enfrentar o desafio de elaborar estratégias, meios eficazes na mobilização do educando, de sua emoção em paralelo com a razão” ( p.125)
A turma do 3º ano em questão, teve o prazer de receber um
professor que mostrasse isso a eles, que os apoiou e incentivou-os e despertou
o desejo em aprender e a serem mais. Mostrou o motivo deles estarem na sala
de aula e incentivou a eles uma sede insaciável de conhecimento. O resultado
desta dedicação foi uma turma que inicialmente não lia e não escrevia nada,
até os desenhos eram feitos com dificuldade, por se acharem incapazes de
tudo, adquiriu acesso ao mundo letrado e hoje são capazes de compreender e
fazer parte de um mundo do qual eles achavam não ser acessível a eles.
A afetividade vai além do simples fato da turma ter aprendido a ler e
a escrever, mas está em permitir o encontro da real razão e função da escrita e
da leitura na sua vida.
Os vínculos afetivos são a base de uma educação qualitativa. A
neurociência hoje trás constatações da devida importância.
Um psicopedagogo preparado para exercer a sua função, tendo
como referência o aprendizado do aluno é aquele que com o olhar atento
percebe a importância do afeto para o progresso.
Não apenas na sala de aula, mas em qualquer situação da vida, sem
estímulo, sem desejo e sem conhecimento não há vitória.
Quando se aprende com a cabeça e com o coração, sempre se tem algo a dizer sobre o que parece ter aprendido. A aprendizagem torna-se mais impregnada, mais verdadeira. (RELVAS, 2009, p.114)
32
CAPÍTULO III
CONFLITOS AFETIVOS E A INTERVENÇÃO
PSICOPEDAGÓGICA NA INSTITUIÇÃO DE ENSINO
A psicopedagogia surgiu no século XIX na Europa, devido a
preocupação e necessidade de compreensão referentes as dificuldades
pertinentes ao processo de aprendizagem. Alguns acreditam que a
psicopedagogia surgiu tendo como paralelo a pedagogia e a psicologia como
norte de atuação. Mas a mesma deve ser pensada além destas teorias, das
quais são bem esclarecidas por Bossa (2011), quando nos diz que:
A psicopedagogia se ocupa da aprendizagem humana que adveio de uma demanda – o problema de aprendizagem, colocado em um território pouco explorado, situado além dos limites da psicologia e da própria pedagogia – e evolui devido a existência de recursos, ainda que embrionários, para entender a essa demanda, constituindo-se, assim, em uma prática. Como se preocupa com o problema de aprendizagem. Portanto, vemos que a Psicopedagogia estuda as características da aprendizagem humana. (p.33)
A psicopedagogia estuda as características da aprendizagem
humana referentes a como se aprende, os fatores envolvidos acerca da
dificuldade que tenha gerado o mesmo e por fim, aos meios que produzem tais
alterações, como reconhece-la e como preveni-las.
O trabalho psicopedagógico, segundo Bossa (2011) pode ter caráter
preventivo ou clínico, além de estar atrelado a teoria, visto a reflexão sobre as
práxis, tendo como paralelo o conhecimento sobre como a aprendizagem
acontece no indivíduo, assim como as influências afetivas e as representações
inconscientes que acontecem, permeando em características próprias que
possam comprometer o processo do indivíduo assim como favorecer todo o
processo. Cabe ao psicopedagogo, conhecimentos também do que vem a ser
ensino e aprendizagem para compreender como os sistemas e os métodos
educativos podem estar interferindo no processo de aprendizagem.
33
No âmbito institucional, sendo ele o espaço físico que permeia a
aprendizagem necessária, está o trabalho de caráter preventivo, onde são
avaliados os métodos de ensino e a dinâmica institucional circundantes ao
processo de aprendizagem do aluno, como afirma Bossa (2011, p.33) “são
avaliados os processos didático-metodológicos e a dinâmica institucional que
interferem no processo de aprendizagem”.
A psicopedagogia com o objetivo de atuação com maior precisão
sobre o objeto de estudo, o sujeito e suas dificuldades de aprendizagem,
utiliza-se como norte para suas práticas, o apoio e conhecimentos específicos
de outras áreas como a Filosofia, psicanálise, linguística, neurologia,
sociologia, com o objetivo de compreender e atuar de maneira qualitativa para
a efetivação do processo. Segundo Bossa (2011):
Atualmente, a Psicopedagogia refere-se a um saber e a um saber-fazer, às condições subjetivas e relacionais – em especial familiares e escolares-, a inibições, atrasos e desvios do sujeito ou grupo a ser diagnosticado. O conhecimento psicopedagógico não se cristaliza em uma delimitação fixa nem nos déficits e nas alterações subjetivas do aprender, mas avalia a possibilidade do sujeito, a disponibilidade afetiva de saber e de fazer, reconhecendo que o saber é próprio do sujeito. ( p.46)
No campo institucional, que é o campo de estudo do presente
trabalho em questão, a atuação do psicopedagogo se constitui na construção
do conhecimento, de acordo com a instituição de ensino vigente, seja ele a
família, a escola, uma empresa industrial, um hospital, uma creche uma
organização assistencial, “podemos dizer que nosso sujeito é a instituição, com
suas complexas rede de relações” ( BOSSA, 2011, p.139)
A atuação do psicopedagogo está voltado para as dificuldades de
aprendizagem, mas estas atreladas aos valores e ideologias da instituição
vigente, que paralelo ao tema do trabalho em questão, se baseia na instituição
escolar, onde existe a função atrelada de favorecer a socialização dos
conhecimentos, desenvolvimento cognitivo e a construção de regras e
condutas, baseando-se em um projeto social de amplitudes.
34
3.1. Atuação psicopedagogia institucional
A aprendizagem acontece em todos os momentos da vida, do
nascimento até a morte e em diferentes lugares, mas é na escola que tal
aprendizagem se formaliza, seja ela na relação com o professor, com o grupo
social envolvido na instituição como um todo, ou seja ele pertencente aos
conteúdos pedagógicos. A instituição de ensino apresenta grande valia na vida
do ser humano, mas a mesma pode acarretar em grandes prejuízos . Como
afirma Bossa (2011):
O trabalho psicopedagógico , portanto, pelo visto, pode e deve ser pensado a partir da instituição escolar, a qual cumpre uma importante função social: a de socializar os conhecimentos disponíveis, promover o desenvolvimento cognitivo e a construção de regras de conduta, dentro de um projeto social mais amplo. A escola, afinal, é responsável por grande parte da aprendizagem do ser humano. (p.141)
Cada indivíduo já carrega consigo a sua própria história e é esta que
se faz presente no contexto educacional quando a criança ingressa na
instituição, um exemplo bem clássico sobre isso está na história do nome de
cada um, como explicita Ciampa (apud Mendes 2006).
O nome delimita cada pessoa como diferente no contexto social,
mas o sobrenome o delimita como pertencente a uma determinada família,
incluindo cada ser ao conceito familiar constituinte, incluindo seus valores,
crenças, etc. Tais conceitos, devem ser considerados no decorrer do processo.
Diante do âmbito institucional, o psicopedagogo apresenta um
trabalho de caráter preventivo e interventivo diante das dificuldades de
aprendizagem, sendo este papel amplo e carregado de constantes mudanças
diante das modernidades que ocorrem a cada dia, levando em conta também
que a escola é um espaço que além de tudo é um sistema inserido em um
macrossistema, como descreve Mendes (2006), do qual está inserido em seu
contexto valores, crenças, regras próprias, o contexto sociocultural e políticas
públicas educacionais que devem ser considerados diante da perspectiva, dos
quais também devem ser levados em conta.
35
Coll (1996, apud SOLÉ, 2001), faz uma definição sobre o campo de
atuação da psicopedagogia:
“Numa primeira abordagem (...), podemos caracterizar o campo profissional da psicopedagogia como aquele para o qual conflui um conjunto de profissionais – basicamente psicólogos, pedagogos e psicopedagogos – cuja atividade fundamental tem a ver com a maneira que como as pessoas aprendem e se desenvolvem, com as dificuldades e os problemas que encontram quando levam a cabo novas aprendizagens, com as intervenções dirigidas a ajuda-las a superar estas dificuldades e, em geral, com as atividades especialmente pensadas, planejadas e executadas para que elas aprendam mais e melhor. De um ponto de vista genérico, podemos dizer que o trabalho psicopedagógico está intimamente vinculado à análise, ao planejamento, ao desenvolvimento e à modificação de processos educacionais.” (p.27)
Diferenciando-se da atuação psicopedagógica clínica, que cujo
enfoque primordial é o sujeito com seus problemas de aprendizagem, sendo a
escola considerada o lugar físico, onde o trabalho é realizado com as
dificuldades da criança e do adolescente e não com o aluno. Sua atuação não
se expande aos profissionais da instituição. “O papel do mesmo é de
“solucionador de problemas específicos” dos quais apesar de serem
detectados e tratados dentro da instituição, são abordados à margem da
mesma”. (SOLÉ, 2001, p.45)
A intervenção tendo um enfoque institucional, como afirma Solé
(2001):
[...]define como seu objeto os processos de ensino e aprendizagem que a escola estabelece e implementa, assim como a instituição em seu conjunto; esta não é somente o lugar físico no qual se realiza tal intervenção: transforma-se no seu objeto. (p.45)
Logo, os processos de intervenção do psicopedagogo a partir da
dificuldade ou de um comportamento disruptivo, não centra-se apenas no
“portador” do problema para proceder a sua avaliação, mas no entorno do
sujeito também, seja ele família, agentes educacionais, colegas de turma,
legislação da instituição vigente, ou seja, o contexto que envolve o aluno,
adquirem participação imprescindíveis e consideráveis para uma avaliação
36
precisa, possibilitando assim uma intervenção corretiva e consequentemente
preventiva, como afirma Solé (2001):
Quando se trabalha a partir de um enfoque educacional embora o desencadeante seja a situação de um aluno, amplia-se o foco e incorpora-se o contexto ou contextos nos quais a disfunção se apresenta e se mantém. Daí a tendência a fazer intervenção com os agentes educacionais, a incluir os diversos contextos e, assim uma intervenção que começa sendo corretiva adota dimensões também preventivas e enriquecedoras. (p. 47)
Solé (2001, p.28) nos afirma que “ o psicopedagogo é um
profissional estratégico, e reflexivo que analisa, avalia, e interpreta os
fenômenos que precisa enfrentar, que contribui com sua visão para que outros
tomem decisões que permitam otimizá-los, que colabora, discute e chega a
acordos”, permitindo uma visão acima do visto pelo profissional atuante na
escola, favorecendo o desenvolvimento da criança com recursos específicos,
capazes de favorecer de maneira mais precisa o seu desenvolvimento.
Solé (2001, p.37) explicita a atuação psicopedagógica, sendo eles
“os profissionais que prestam assessoramento às escolas.” Tal atuação está
voltado para quatro eixos, a saber:
O primeiro eixo refere-se a natureza dos objetos da intervenção, que está centralizada em torno do sujeito em si, assim como nas circunstâncias do seu entorno, referentes ao contexto educacional, estando incluído no mesmo, tarefas realizadas de atendimento ao aluno em questão, assim como às questões vinculadas aos aspectos curriculares e organizacionais do ambiente de ensino.
O segundo eixo, afeta as modalidades de intervenção, das quais podem ser consideradas como corretivas ou preventivas, as quais são complementares em si, visto que, dependendo do enfoque, uma tarefa que tem início como corretiva, pode ter efeito preventivo, enriquecendo o processo educacional.
O terceiro eixo refere-se ao caráter relativamente direto sobre o aluno, do qual independente da diferenciação dos modelos de intervenção que seguem de acordo com a especificidade de cada psicopedagogo em questão, a proposta final permanece sendo objetivada no aluno, de forma a qualificar e garantir o progresso do mesmo.
37
O quarto eixo, refere-se ao lugar preferencial de intervenção, cujas tarefas localizadas no nível de sala de aula, em algum subsistema dentro da instituição de ensino, em torno de uma questão geral, assim como ano, série, ao sistema familiar, a zona de influência, etc. (p.37-38)
Visto o trabalho psicopedagógico estar voltado entorno de quatro
eixos pertinentes, cada psicopedagogo escolhe a melhor maneira de execução,
visto ter de ser levado em consideração, principalmente a legislação vigente do
ensino no qual o aluno está inserido. Tal legislação sofrerá uma variável de
uma instituição para a outra, e isso deve ser respeitado pelo mesmo e levado
em conta.
De acordo com a formação de cada psicopedagogo, o mesmo se
sentirá mais preparado para atuar de acordo com a sua formação inicial, onde
priorizará enfaticamente sua tarefa cotidiana voltada para aquelas a que tem
maior domínio e atuação constante, constatando que “existe uma enorme
diversidade de hipóteses a partir das quais se pode definir o objeto ou objetos
de intervenção psicopedagógica e escolher os meios mais adequados para
abordá-los” (SOLÉ, 2001, p.40)
Sendo o psicopedagogo um expert em sua matéria, atua de forma a
complementar outros profissionais da escola, colaborando a partir de sua
perspectiva específica, para alcançar os objetivos que são próprios às suas
finalidades.
Esta definição conduz a um envolvimento progressivo nas estruturas estabelecidas para alcançá-las, ou o que é a mesma coisa, conduz a uma integração progressiva no núcleo da instituição. (SOLÉ, 2001, p.46)
Diante do trabalho preventivo, Bossa (2011, p.35-36), traz a
constatação de diferentes níveis de prevenção no âmbito institucional, a saber:
O primeiro nível, onde o psicopedagogo atua nos processos educativos com o objetivo de diminuir a “frequência dos problemas de aprendizagem”. Seu trabalho incide sobre as questões didático-metodológicas, assim como na formação e orientação dos professores, além de fazer aconselhamento aos pais.
38
No segundo nível, o objetivo é diminuir e tratar os problemas de aprendizagem já instalados. Para tanto, cria-se um plano diagnóstico da realidade institucional e elaboram-se planos de intervenção baseados nesse diagnóstico, a partir do qual se procura avaliar os currículos com os professores, para que não se repitam tais transtornos.
O terceiro nível, o objetivo é eliminar os transtornos já instalados, em um procedimento clínico com todas as suas implicações. O caráter preventivo permanece aí, uma vez que, ao eliminarmos um transtorno, estamos prevenindo o aparecimento de outros.
Segundo Mendes (2006) na escola, o psicopedagogo atua em
questões pertinentes a todas as questões referentes o contexto do processo de
ensino e aprendizagem, sejam eles professores, família, comunidade, relações
vinculares entre os que compõem a sala de aula, situações e métodos e
recursos de ensino, etc. permitindo assim a compreensão do que está
acarretando no sucesso ou fracasso em relação a aprendizagem.
A psicopedagogia institucional pode ser compreendida como um modelo teórico-prático de intervenção que proporciona um questionamento aprofundado da situação escolar a ponto de gerar a construção de processos de avaliação da aprendizagem e seus impedimentos, com vistas à elaboração de recursos de intervenção para a solução de problemas em questão. (MENDES, 2006, p.24)
No âmbito institucional, de acordo com Mendes (2006), o
psicopedagogo prioriza como foco central a análise das diferentes questões e
implicações referentes ao aluno em questão e o seu contexto, permitindo
assim, a compreensão dos motivos de sucesso ou fracasso favorecendo para
que o mesmo possa intervir de maneira consciente promovendo a continuação
ou a mudança de práxis, possibilitando a aquisição do ensino para todos os
envolvidos de maneira que atinja de forma igualitária todos os envolvidos,
sendo respeitado também suas individualidades e peculiaridades pessoais.
“[...] visa não apenas sanar problemas de aprendizagem e deficiência do aparelho escolar, mas, principalmente, considerar as características multidisciplinares do sujeito que aprende, buscando melhorar seu desempenho e aumentar suas potencialidades.”(BOSSA, 2011, p.102)
Segundo Bossa (2011, p.105) “ o psicopedagogo também utiliza
instrumental especializado, do qual pode avaliar e estabelecer estratégias
39
capazes de atender aos alunos de maneira individualizada”, auxiliando que o
aluno produza e pratique o que aprendeu não apenas no contexto escolar mas
de maneira atrelada com a sua vivência fora da mesma, resgatando de
maneira positiva o ato de aprender e qualificando o que a criança trás consigo
de conhecimentos. Compete também a este profissional,
assessorar a escola, reestruturando a atuação da própria instituição junto aos alunos e professores, seja redimensionando o processo de aquisição e incorporação do conhecimento dentro do espaço escolar, ou seja encaminhando os alunos para ouros profissionais. (BOSSA, 2011, P.105)
Diante do exposto por Bossa (2011), os profissionais dos quais são
encaminhados pelo psicopedagogo competem em atender com maior precisão
dificuldades especificas de aprendizagem, das quais vão além do trabalho do
mesmo na instituição.
Vale ressaltar a necessidade do psicopedagogo em fundamentar
sua intervenção visando a contextualização com a realidade da instituição
vigente, adotando decisões diferenciáveis visto a diversidade de instituições e
de sistemas nos quais se realizam a intervenção.
3.2. Avaliação psicopedagógica
A avaliação psicopedagógica é de suma importância para o contexto
de fracasso escolar e dificuldades de aprendizagem já existentes, no que se
refere a compreensão do que levou a criança a apresentar tais rejeições ao
ensino vigente. A avaliação consiste em investigar a realidade escolar,
objetivamente e subjetivamente, procurando encontrar evidências que
justifiquem o fracasso.
A avaliação psicopedagógica é definida por diversos autores... como um processo de coleta e análise de informações relevantes sobre os diferentes elementos que intervêm no processo de ensino-aprendizagem – não somente das competências do aluno, mas também do ambiente educacional – com a finalidade de fundamentar as decisões sobre a resposta educacional mais adequada as necessidades do aluno. (SOLÉ, 2001, p.186)
40
A avaliação psicopedagógica não tem o papel de apenas questionar
as dificuldades atuais da criança, mas principalmente valorizar as
possibilidades, ressaltando o potencial do avaliado e não apenas verificando os
seus déficits. O mesmo preocupa-se em compreender o que motivou a
dificuldade em questão para poder intervir através de diferentes instrumentos e
estratégias.
A avaliação psicopedagógica exige a intervenção de especialistas-com certa frequência, mais de um, além do regente. Isso exige a coordenação de tarefas e de pontos de vista. Implica, também, o uso de certas estratégias e instrumentos específicos, que tornam possível a obtenção de informações nem sempre diretamente acessíveis e proporcionam um olhar diferente e mais distanciado sobre o sistema no qual se manifesta o problema ou dificuldade. (SOLÉ, 2001, p.189)
Deve ser levado em conta causas intrínsecas(intelectuais,
emocionais e físicas) e extrínsecas (sociais, familiares e ambientais).
Segundo Fernández (1991) sobre o processo complementar ao da
avaliação educacional, há a necessidade de se avaliar não apenas o aluno,
mas também o sistema mais amplo através de meios específicos, visto que
alguns recursos utilizados para avaliar, ensinar e ajudar o progresso, mostram-
se insuficientes para o avanço da criança, sendo necessário o uso de medidas
específicas que favoreçam a real aprendizagem.
Deve-se ter em questão inicial que:
O objeto primário de avaliação psicopedagógica é o aluno no sistema de ensino e aprendizagem, ou seja, na interação que estabelece com seu professor e com seus colegas em torno dos conteúdos do currículo. (SOLÉ, 2001,p.190)
A avaliação psicopedagógica demanda de estratégias bem
elaboradas e devidamente bem pensadas, capazes de se alcançar uma meta
pré estabelecida.
A meta, segundo Solé (2001), se refere ao melhor conhecimento do
aluno e do contexto educacional, cuja finalidade é de fortalecer o que há de
positivo na instituição de ensino ou de neutralizar as disfuncionalidades. No
41
que se refere ao procedimento, são as técnicas e instrumento dos quais serão
utilizados para obter as informações devidas e analisá-las.
As estratégias advindas para resolução dos problemas em questão,
só serão possíveis após uma avaliação inicial minuciosa e precisa. De acordo
com Pozo (apud SOLÉ, 2001):
[...] sua aplicação (a estratégia) não seria automática, mas controlada. As estratégias exigem planejamento e controle da execução. (...) Além disso, implicariam um uso seletivo dos próprios recursos e capacidades disponíveis. (...) Sem uma variedade de recursos, não é possível atuar de modo estratégico. Finalmente, as estratégias seriam compostas de técnicas ou destrezas (...). (p.192)
Quando o psicopedagogo avalia , o regente educacional se envolve
também na compreensão do que ocorre, assim como na geração de propostas
capazes de modificar em sentido positivo, a situação do aluno.
Para elaborar uma avaliação muitos são os instrumentos de
pesquisa, mas cada um deve estar voltada de acordo com a necessidade do
sujeito que apresenta tal dificuldade, levando em consideração as causas
intrínsecas e extrínsecas, levando em consideração também a realidade da
instituição vigente.
A maneira como o psicopedagogo concebe sua prática, será
baseada de acordo com suas construções teóricas, isto refletirá na escolha dos
instrumentos e na sequência de utilização, assim como as características e
poderá adaptar os instrumentos que considere mais próximos de suas
propostas.
3.3. Instrumentos de avaliação
Os instrumentos avaliativos são inúmeros, mas existem limitações a
serem consideradas para sua aplicação e análise.
Dentro do contexto institucional, deve-se ter em mente que tais
técnicas devem ser lançadas para que sejam tiradas dúvidas sobre a
necessidade ou não de encaminhar o aluno para um atendimento específico,
42
ou para auxiliar o docente a qualificar o seu trabalho voltado para atender as
diferentes demandas em sala de aula.
Segundo Mendes (2006, p. 38) “toda avaliação psicopedagógica,
surge de uma demanda, ou seja, há um encaminhamento em geral por parte
do professor, de um aluno que apresenta dificuldades de aprendizagem para
que providências sejam tomadas”, a fim de qualificar o andamento educacional
do aluno.
Tal reflexão permite ao solicitante observar sua real importância para
o desenvolvimento da criança e permite ao psicopedagogo descobrir
inicialmente competências imprescindíveis, além das dificuldades iniciais,
através do relator.
Após este processo, o profissional, diante das respostas dadas, se
posicionará utilizando pensamento estratégico e estabelecendo metas e
objetivos que irão direcionar a condução do processo.
A avaliação psicopedagógica dá-se prioritariamente em relação a
escola para por seguinte chegar ao aluno, na busca de não rotular a criança e
permitir que mediante a isto, o profissional se aproprie das normas de
funcionamento do sistema educacional em que o mesmo está inserido, como
afirma Mendes (2006):
[...] em primeiro lugar, investigar a escola, suas instâncias, as relações estabelecidas em seu espaço interno, suas crenças e valores, suas opções espitemológicas, suas práticas pedagógicas, seu sistema de avaliação, as orientações dadas aos professores, as relações professor-aluno, enfim, toda sorte de informações pertencentes à instituição de ensino e que podem ser úteis para compreender o sistema escolar em que o aluno com dificuldades está inserido. (p.39)
Após isto, é feita uma entrevista inicial, para compreender os
julgamentos estabelecido, capaz de ser observada como se dá a relação entre
os membros que compõem o entorno da criança, onde é realizada a entrevista
com a criança em si e por seguinte com os familiares.
43
De acordo com Solé (2001), a entrevista com a criança inicialmente
permite que o psicopedagogo perceba a concepção da própria a cerca das
suas dificuldades, limitações e capacidades de superação, assim como suas
referências pessoais sobre a escola, sua relação com o contexto escolar,
expectativas, experiências familiares e relações sociais.
A entrevista inicial, à qual fizemos alusão, proporciona informações imprescindíveis se considerarmos que o aluno é o protagonista do processo de avaliação psicopedagógica e não um mero objeto da mesma. (SOLÉ, 2001,p.210)
A entrevista com o aluno poderá ser realizada em um momento ou
em vários momentos. O profissional deve ter cautela na realização, realizando
a mesma de maneira informal, visto a necessidade de se estabelecer uma
relação afetiva com o envolvido, o que garantirá mais validade às informações
prestadas.
O contato com os pais é imprescindível na avaliação, mas cabe ao
psicopedagogo a escolha do melhor momento para convoca-los, visto que nem
sempre, ocorrerá uma intervenção direta do psicopedagogo, cuja autonomia e
responsabilidade estão estabelecidas com os tutores e/ou professores, como
afirma Huguet (1996):
[...] a intervenção direta do psicopedagogo deve realizar-se quando as soluções tentadas pelo professor sozinho ou com sua colaboração não tiverem surtido efeito, quando se vê que esta colaboração é difícil ou quando é preciso abordar conflitos no nível familiar, diante dos quais se aconselha a intervenção de um profissional não envolvido diretamente na educação dos filhos e com formação neste tipo de trabalho. (p.142)
De certa forma, segundo Solé (2001), pode-se afirmar que:
[...] o papel de protagonista do psicopedagogo se diversifica: às vezes, sua intervenção será realizada direta e pessoalmente com a família, enquanto que, em outros casos, terá lugar uma entrevista conjunta da qual participa também o regente. Às vezes, atuará num discreto segundo plano, ajudando a otimizar a relação pais/docentes a partir da sua perspectiva. (p.218)
44
As entrevistas se concretizam de forma diferenciada, como afirma
Solé (2001), pois as mesmas estão dependentes da proposta estabelecida,
mas alguns parâmetros são norteadores para que aconteçam. Em primeiro
lugar, a entrevista deve ser realizada através do regente, mediante uma nota
escrita, convocando o comparecimento dos pais à escola. Em segundo lugar,
disponibilização de tempo suficiente para que a entrevista se desenvolva sem
pressa. Em terceiro lugar, tudo na entrevista deve contribuir para garantir a
confidencialidade das informações e em quarto lugar, deve ser estabelecido o
respeito mútuo entre os envolvidos e por último, a coleta de informações de
acordo com os aspectos gerais é imprescindível.
Segundo Bassedas, (apud MENDES, 2001), algumas considerações
são imprescindíveis no momento da entrevista:
É se suma importância a clareza quanto aos objetivos da avaliação psicopedagógica. Os mesmos necessitam saber o que será feito, o que se pretende e se concorda com os procedimentos de uma avaliação psicopedagógica.
Informar de maneira objetiva sobre como tal intervenção poderá auxiliar a criança.
Obter o máximo de informações possíveis sobre a família, característica socioeconômica, estrutura, relações interpessoais, componentes, grau de escolaridade, crenças e valores do contexto familiar, dentre outros aspectos.
Investigar o papel da criança no contexto familiar, assim como procedeu-se a gestação da mesma e respectivo desenvolvimento. Informar sobre a situação da criança na escola assim como o histórico da queixa de aprendizagem.
Investigar a flexibilidade e disposição da família em participar na busca de soluções.
Ouvir os pais, escutar suas queixas, angústias, explicitações e ansiedades.
Solicitar a colaboração da família para compreender melhor o problema em questão e inseri-la nas estratégias de soluções e queixas de aprendizagem.
É imprescindível que após a entrevista, os familiares sintam-se
parte desta equipe na busca e na solução das estratégias adequadas capazes
de garantir o progresso da criança. A entrevista também pode ser um momento
45
de orientação e encaminhamento, caso o profissional tenha verificado tal
necessidade.
Em seguida, faz-se necessário a observação da aula, tal observação
permite que o psicopedagogo tenha acesso ao aluno “em seu contexto habitual
na escola” (SOLÉ, 2001, p.199), onde é possível a observação das
dificuldades. Permitindo assim, o acesso a variadas informações, dentre elas,
como citadas por Solé (2001), oferece elementos para contextualizar o
problema, pois possibilita acesso direto aos processos de ensino e
aprendizagem nas suas diversas dimensões, assim como as devidas
interações dos envolvidos na sala de aula. Permite ainda, comparar a
realização do aluno em torno da qual se estrutura o processo de avaliação
psicopedagógica.
Segundo Mendes (2006):
É importante, ao planejar a observação, que o psicopedagogo tenha clareza do que quer observar, em quais períodos vai ingressar na sala de aula para realizar este trabalho, como vai preparar professores e alunos para esta intervenção e como vai minimizar os efeitos de sua presença em sala de aula nas ações do professor e alunos. A observação exige planejamento, realização e análise de seus resultados, com clareza e precisão, para melhor aproveitamento dos resultados. (p.56)
3.4. Intervenção psicopedagógica
Uma forma mais abrangente de tratar o problema de aprendizagem, ancorada, entre outros conhecimentos, na palestra Psicanálise, significa levar em conta o caráter desejante do sujeito, isto é, admitir a interferência do desejo (o qual é inconsciente) nos processos mentais e, consequentemente, na aprendizagem. (BOSSA, 2011, p.166)
Destaca-se diante da concepção de Bossa, inicialmente, de uma
forma antecedente a intervenção, buscar “o caráter desejante do sujeito”
(BOSSA, 2011, p.166) pela aprendizagem. Utilizar recursos coerentes tendo
base principal tal ideia, visto ser incoerente iniciar qualquer tentativa cujo
sujeito em questão não se sinta atraído, se permitindo a novas tentativas.
46
Além disto, de acordo com Bossa (2011), cabe ao psicopedagogo,
mediando o trabalho com o professor, além de atrair o desejo, se aprofundar
teoricamente e utilizar de recursos plausíveis e pessoais, para que possa ver
além do que a criança aparenta, sem tentar adivinhar ou se equivocar diante
das apresentações.
Quando a criança demonstra carência afetiva, emocional ou
dependência do professor ou do profissional para realizar suas tarefas:
É importante que o profissional possa apontar, ou seja, assinalar à criança o seu desejo de ser acompanhada na tarefa e que possa oferecer condições para que descubra o prazer em trabalhar sozinha, inaugurando uma nova modalidade de relação. (BOSSA, 2011, p.170)
O psicopedagogo, cujo papel é mediar a atuação entre o professor e
o aluno, Lajonquière (apud BOSSA, 2011), nos aponta que:
A existência do que ele chama de “intermediação caprichosa” entre o estímulo pedagógico e a resposta do sujeito. Afirma que o discurso cotidiano, tanto dos pais quanto dos professores, ao aludirem o “desconhecido”, que na situação pedagógica se interpõe entre o que é ensinado e o que é aprendido, se refere (ainda que sem saber)a algo que é de ordem do desejo. (p.172)
Segundo Bossa (2011, p.174), o jogo diante do processo de
intervenção “se constitui em um excelente catalisador da aprendizagem”,
permitindo que com isto, defesas sejam rompidas, permitindo a criança projetar
seus conflitos e revivê-los , manejando-os de acordo com seus desejos.
Fernández (1991) afirma que apenas através do prazer em aprender
que será liberta a inteligência aprisionada. Tal busca está voltada ao prazer
que o professor deve demonstrar ao ensinar, que permeada por uma relação
afetiva o aprender se estabelece.
Mediante as informações obtidas a partir das avaliações realizadas,
das quais são compartilhadas com os regentes desde o início, permite que o
mesmo repense em suas práticas e crie novas propostas para que todos os
alunos sejam alcançados de forma igualitária e satisfatória.
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O psicopedagogo deve colaborar no sentido de permitir que o
regente atenda a diversidade, sendo respeitado a singularidade de cada um,
portanto, cabe ao psicopedagogo institucional, junto com a equipe escolar,
analisar os fatos favoráveis ou prejudiciais a aprendizagem e colaborar no
desenvolvimento de projetos que não estão dando certo.
Na intervenção, no atendimento a diversidade, o psicopedagogo
poderá atuar indiretamente nos projetos educacionais ou currículos ou de
forma direta com os alunos. Pozzo (1996, apud SOLÉ, 2001), no contexto da
motivação para uma aprendizagem efetiva:
[...]embora os motivos para buscar uma aprendizagem possam ser inicialmente extrínsecos ou intrínsecos, o mais frequente é que se produza uma mistura de combinação de ambos[...] na verdade, a polaridade extrínseco-intrínseco deve ser entendida como um contínuo, de maneira que gerar um desejo de aprender é , de alguma forma, fazer com que o aprendiz vá interiorizando (ou atribuindo a si próprio) motivos que inicialmente percebia como estando fora dele. (p.124)
Uma das tarefas do psicopedagogo consiste em fazer emergir as
diferentes compreensões que os participantes, sejam eles professores ou
familiares, em sua tarefa tem acerca do sentido de mudança. Na medida em
que os motivos para mudar são vistos como próximos dos interesses, do
profissionalismo e das preocupações dos professores, pode-se falar de uma
motivação mais intrínseca e pode-se esperar um maior grau de envolvimento
nos meios de que se dispõem para alcançar os propósitos de mudança.
O psicopedagogo, bem mais que um simples profissional, permite
juntamente com o professor e com o âmbito institucional de forma a favorecer e
qualificar o processo educacional, permitindo que as dificuldades sejam
sanadas de maneira que o ensino atinja a todos, independente das limitações
existentes, visto ser respeitado prioritariamente por este profissional a
individualidade de cada um para atingir o êxito quanto ao processo.
48
CONCLUSÃO
Apesar da afetividade ser um tema muito abordado, visto a
importância que apresenta para a aquisição do ensino e aprendizagem, muitos
profissionais ainda insistem em não anexá-la, visando um ensino apenas
voltado para os conteúdos, fazendo do aluno que está na sala de aula, um
mero número.
É impossível a existência de um indivíduo sem afetividade, pois ela é
algo natural e faz parte para a constituição do “Eu”. A cada etapa da vida a
afetividade sempre estará presente, ajudando no seu desenvolver, seja ela em
qual aspecto for.
Os conteúdos só ganharão sentido se os mesmos estiverem
atrelados a vida e a realidade da criança, visto ser o ensino de sala de aula um
preparo do qual permitirá a utilização fora dos muros da escola.
O psicopedagogo, como mediador ao trabalho institucional, permite
que a escola volte a repensar no seu papel, possibilitando uma reflexão sobre
novas práticas, cujo ensino seja capaz de atingir a todos os alunos, sendo
respeitadas as singularidades dos cognoscentes, assim como a vivência e
realidade pessoal de cada um, permitindo assim, pessoas melhores para a
vida.
O amor ao seu “Eu”, determina o seu sucesso, seja ele profissional
ou pessoal. A afetividade é o coração que pulsa dentro de cada um, inclusive
dentro de uma sala de aula, ou seja, sem ele não há vida e sem ele não há
progresso.
49
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51
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02 AGRADECIMENTOS 03 DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05 METODOLOGIA 06 SUMÁRIO 07 INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
IMPORTÂNCIA DO VÍNCULO AFETIVO AO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM 11
1.1. Concepções de afetividade segundo Piaget, Vygotsky e Wallon 12
1.2. Influência da afetividade na aprendizagem 16
1.3. O vínculo afetivo na relação ensinar e aprender 18
CAPÍTULO II
LUGAR AFETIVO E RESPECTIVAS CONTRIBUIÇÕES AO AMBIENTE ESCOLAR 23
2.1. Na relação professor e aluno 23
2.2. Na família 27
2.3. Lugar do desejo na aprendizagem 29
CAPÍTULO III
CONFLITOS AFETIVOS E A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA NA INSTITUIÇÃO DE ENSINO 32
3.1. Atuação psicopedagógica institucional 34
3.2. Avaliação psicopedagógica 39
3.3. Instrumentos de avaliação 41
3.4. Intervenção psicopedagógica 45
CONCLUSÃO 48 BIBLIOGRAFIA 49 ÍNDICE 52