uma analise acerca da legitimidade da defensoria publica para o ajuizamento da acao civil publica...
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Defensoria Pública e Ação Civil PúblicaTRANSCRIPT
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PS-GRADUAO LATO SENSU
EM DIREITO DO CONSUMIDOR
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A Defensoria Pblica e as Aes Coletivas de Consumo
Por: Fbio Machado da Silva
Orientador
Prof. William Rocha
Rio de Janeiro
Janeiro/2008
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PS-GRADUAO LATO SENSU
EM DIREITO DO CONSUMIDOR
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A Defensoria Pblica e as Aes Coletivas de Consumo
Apresentao de monografia Universidade
Candido Mendes como condio prvia para a concluso
do Curso de Ps-Graduao Lato Sensu em Direito do
Consumidor.
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AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, Prof. Willian Rocha, pelo incentivo e orientao ao longo
desse perodo. Desde o primeiro momento da acolhida deste projeto, sua sabedoria,
dedicao e interesse me permitiram uma aprendizagem constante e tornaram possvel a
realizao deste trabalho. Por to valiosa seriedade profissional e amizade, a minha
eterna gratido.
Ao pessoal da Biblioteca Nacional, pela presteza e dedicao, pela compreenso
naquelas horas que ficamos a mais do tempo. Dona Carminha pelas sugestes de
pesquisa da biblioteca
A todos os colegas do Curso de Ps Graduao Lato Sensu em Direito do
Consumidor da Universidade Candido Mendes-Centro pelo apoio e facilidades
oferecidas.
Ao pessoal da administrao do Projeto A vez do Mestre, da Candido Mendes
pelo constante bom atendimento, competencia e simpatia prestados durante o curso.
Aos que buscam no direito do consumidor o combate s desigualdade, o
fortalecimento do equilibrio contratual, e aos estudiosos preocupados com a justia e o
meio em que vivemos.
A todos que direta ou indiretamente colaboraram na realizao do presente
trabalho, o meu muito obrigado.
E claro, a Deus e minha famlia.
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DEDICATRIA
Deus, por tudo
minha me, Lcia Helena, por
cunhar minha moral.
A meus irmos por acreditarem.
minha mulher, Adriana pela
pacincia e por tantas razes.
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Uma cincia emprica privada de reflexo bem como uma filosofia puramente
especulativa so insuficientes; conscincia sem cincia e cincia sem conscincia so
radicalmente mutilados e mutilantes....
Edgar Morin
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RESUMO
O presente trabalho trata de relacionar as Aes Coletivas de consumo com a
legitimidade da Defensoria Pblica para tais aes. Como o assunto merece ser bem
entendido, introduzimos alguns capitulos conceituais para melhor entender alguns
fundamentos que servem de base para entender a relao de consumo e justificar a
atuao da instutuio da Defensoria como defensor coletivo do consumidor. Assim
fizemos pesquisa e inserimos no trabalho noes histricas, conceitos de justia e
noes de tica, em paralelo introduo e desenvolvimento com o tema proposto.
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METODOLOGIA
Procuramos nessa monografia, coletar o mximo de informaes em literaturas
ligadas ao tema, a pesquisa de jornais e peridicos tambm foi fundamental. Os casos
concretos trazidos durante o curso de especializao, a conversa com os professores e
profissionais da rea nos deu uma nova viso sobre o tema.
Poderamos simplesmente ter realizado o presente trabalho mediante o critrio
jurdico. Porm pela fascinao do tema, e a constante provocao a reflexo que o
curso proprocionou, nos conduzindo a bases metodolgicas slidas de raciocnio lgico
indutivo com base em premissas filosoficas e principiolgicas.
Procuramos dar breves bases historicas sobre o surgimento da Defensoria
Pblica, bem como ressaltar os diversos conceitos da tica e da justia, j que a todo o
tempo iremos registrar que a instituio concretiza a justia do consumidor.
O mtodo basicamente argumentativo, com farta pesquisa de textos e consultas
rede internacional. A biblioteca Nacional foi fundamental no trabalho, pois a mera
meno de artigos de Internet comprometeria a fidelidade da pesquisa.
A inicio deste deu-se em agosto de 2007, poca em que alcanvamos a
maturidade na ps-graduao Lato Sensu.
LISTAS
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Capa................................................................................................................1/2
Agradecimentos................................................................................................3
Dedicatria.......................................................................................................4
Resumo.............................................................................................................6
Metodologia......................................................................................................7
Listas.................................................................................................................8
Sumrio.............................................................................................................9
Introduo .......................................................................................................10
Capitulo 1.... ...................................................................................................13
Capitulo 2. .......................................................................................................23
Capitulo 3 ........................................................................................................47
Capitulo 4 ........................................................................................................74
Capitulo 5 ........................................................................................................89
Concluso..........................................................................................................93
Bibliografia.......................................................................................................94
Folha de Avaliao............................................................................................99
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SUMRIO
Introduo ...............................................................................................................10
Capitulo 1 Consumo, breve noo histrica: O Cdigo de Defesa do Consumidor e a
sociedade atual...........................................................................................................13
1.1 Quando e onde, pela vez primeira, apareceu o direito do consumidor?...................14
1.2. Fundamentos filosoficos: Kant e a Etica aplicados proteo do consumidor........16
Capitulo 2 Cdigo de Defesa do Consumidor e o ordenamento juridico
brasileiro....................................................................................................................23
2.1 Justia, a necessidade de entender as diversas concepes....................................23
2.2 Uma questo de principio:Os princpios judicos-consumeiristas...........................35
2.3 A Constituio da Repblica Brasileira e o consumidor........................................39
2.4 A L.8.078/90 e sua repercusso na sociedade.......................................................42
Capitulo 3. As Aes Coletivas de consumo........ ....................................................47
3.1. Origem e conceitos.............................................................................................47
3.2. O CDC e as Aes Coleivas de consumo..........................................................52
3.3. O Interesse nas Aes Coletivas de consumo.....................................................59
3.4. Os diversos legitimados nas Aes Coletivas.....................................................65
3.5. Breves consideraes sobre a coisa julgada nas Aes Coletivas.........................68
Capitulo 4 A Defensoria Pblica e o consumidor......................................................74
4.1. Breve historico do surgimento da Defensoria Pblica........................................... 74
4.2. Atuao coletiva da Defensoria Pblica na defesa do consumidor........................80
Capitulo 5 Casos Concretos................................................................................. ..89
Concluso.......................................... ......................................................................93
Bibliografia.......................................... ....................................................................94
Folha de Avaliao.............................. ....................................................................99
INTRODUO
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Homem e consumo sempre foram palavras que caminharam juntos.
Desde o mais primrdio momento da historia da humanidade, a questo do consumo
sempre se mostrou importante para o homem. Nas palavras do Ilustre professor William
Lima Rocha A matria vista sob o aspecto sociolgico, vez que desde que o homem
passou a viver em sociedade j eram praticadas as relaes de consumo1
As manifestaes se deram de diversas formas, desde a religio, no cristianismo
com o pecado capital da gula, mencionados por So Toms de Aquino at no campo
cientifico-sociolgico de Thomas Malthus, que analisou dados demogrficos e
econmicos para justificar sua previso de incompatibilidade entre o crescimento
demogrfico e disponibilidade de recursos.
A sociedade evoluiu, crescendo tambm seus interesses. Logo, o consumo e a
proliferao de empresas e atividades que nasceram para atender a demanda
consumerista, vieram tambm os problemas. As relaes contratuais de consumo
passaram a apresentar um lado muito forte e estruturado, em contrapartida outro lado
mais fraco. Surgiram ainda os diversos movimentos sobre a falta de recursos em razo
do consumo acelerado e desproporcional. Diante desse quadro, paises estruturados em
Estado de Direito, evoludos, atenderam aos reclames da sociedade e colocaram
disposio legislaes protetivas ao consumidor.
Com as demandas coletivas, a atuao da Defensoria Pblica ganhou contornos
de grande importncia face ao aumento das demandas coletivas. Nessa linha de ideia, a
L.8078/90 e a posterior Lei n 11.448/2007, que d legitimida Defensoria Pblica para
a propositura da Ao Civil Pblica, alterando o art. 5 da Lei n 7.347/1985, surgiu
como resposta ao anseio da sociedade que deixou registrar na Carta Cidad de 1988 no
art. 5 CF/88, a vontade e necessidade de se ter um diploma legal que regulasse as
relaes de consumo.
O que trataremos neste pequeno trabalho o aspecto da Defensoria ligado a
essas Aes Coletivas de consumo.
1 Disponivel em http://www.williamrocha.kit.net/dir_consumidor_/
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Capitulo 1 Consumo, breve noo histrica: O Cdigo de Defesa do
Consumidor e a sociedade atual
A doutrina aponta a 1 metade do sc. XIX, como um marco no que se refere as
relaes de consumo, quando comeou a mudar, a oxigenar os contratos. Ocorreu uma
mudana no individualismo: interesse individual; contrato relativo aos contratantes, e s
a eles interessava.
Nessa poca houve passagem do perodo do Estado Liberal Clssico, em que
preponderavam os princpios da liberdade de contratar e da autonomia da vontade e o
pacta sunt servanda. No Estado Liberal Clssico, a idia de contrato foi levada ao
extremo. Todas as relaes econmicas deveriam ser reduzidas forma de contrato.
Rosseau e sua Teoria do Contrato Social, j fazia a relao contratual at entre o homem
e o Estado.
A funo do Estado Liberal era a de garantir a liberdade das partes para que
pudessem ajustar o contrato que melhor atendesse aos seus interesses. Tudo o que era
contratual era justo, desde que as partes fossem livres para contratar. O Estado Liberal
somente assistia formao dos contratos.
Esses eram os dogmas que inspiraram o Estado Liberal Clssico (criado aps a
Revoluo Francesa), inclusive o nosso Cdigo Civil de 1916, que sofria as influncia
desse individualismo.
A partir da 2 metade do sculo XIX, passou-se a temperar esses dogmas. O
excesso de Liberalismo foi fatal para a continuao dos dogmas do Estado Liberal
Clssico. Passou-se a entender que a igualdade das partes fundamental para o
equilbrio e a justia dos contratos, a despeito da liberdade. As partes podem ser livres,
mas suas condies econmicas, sociais, culturais, e etc., influenciavam negativamente
neste equilbrio.
Observou-se em um primeiro momento que os contratos de trabalho, a despeito
da liberdade das partes, impunham aos trabalhadores pssimas e desproporcionais
condies de trabalho, acarretando-lhes os mais diversos e intensos abusos: jornada de
trabalho excessiva, trabalho em condies insalubres, baixssimos salrios. No eram
trabalhadores; na verdade, eram semi-escravos.
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Desde ento, vislumbrou-se uma ausncia de igualdade entre as partes.
Percebeu-se que a igualdade condictio sine quae non para o contrato justo e
equilibrado.
Nesse contexto o Estado Moderno resolveu a questo atravs do Dirigismo
Contratual.O Estado passou a dirigir, interferir nos contratos para proteger a parte que,
naquele contrato, era a mais fraca. O Estado compensa a parte economicamente mais
fraca, tornando-a juridicamente mais forte. O Estado passa a atuar, protegendo o mais
fraco na relao contratual. Da o Estado Liberal Clssico enfraqueceu, sendo
substitudo pelo Estado Intervencionista.
As maneiras de agir do Estado Intervencionista so:1) O Estado impe aos
contratantes certas clusulas, ainda que as partes no as quisessem (Ex.: Contrato de
Trabalho). Ora ele impe, ora probe certas clusulas, fulminando-as de nulidade (Ex.:
art. 51 do CDC Art. 51. So nulas de pleno direito, entre outras, as clusulas
contratuais relativas ao fornecimento de produtos e servios que: ); 2) Vedao de
certas clusulas. Elas no existem pois nascem mortas. O Estado probe, sob pena de
nulidade, certas clusulas.
Esse Dirigismo s pode haver quando as partes estejam desniveladas, seja
economicamente, seja tecnicamente. H percepo de uma vulnerabilidade de uma das
partes. As legislaes trabalhistas foram as primeiras a sofrerem essa nova leitura.
O Direito passou do individualismo para a sua funo social. E na relao de
consumo, no foi diferente, pois nesta o consumidor triplamente vulnervel em
relao ao fornecedor:
1) Vulnerabilidade Econmica: Esta a regra, at porque h casos em
que o contrrio se verifica. Na maioria das vezes, o consumidor economicamente mais
fraco em relao ao fornecedor.
2) Vulnerabilidade Ftica: O consumidor precisa de um produto ou de
um servio, e o fornecedor lhe impe condies. Essa vulnerabilidade decorre do fato
da necessidade do consumidor precisar do produto ou do servio.
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3) Vulnerabilidade Tcnica: O consumidor no dispe de informaes
tcnicas sobre o produto ou servio que adquiriu. O consumidor adquiria um produto
que no atendia s suas finalidades, e etc., porque os fornecedores no davam
informaes a respeito do produto. Esta a regra que tambm comporta excees.
De outro lado, um dos princpios mais elementares do Direito do Consumidor,
sobre o qual toda a teoria encontra sustentculo o da proteo dignidade humana,
juntamente com a garantia sua sade e sua segurana, que so direitos fundamentais
do ser humano.
Assim, o respeito pessoa humana deve ser considerado como pedra
fundamental na construo dos pilares do Direito e, em especial, do Direito do
Consumidor.
A Constituio Federal consagrou, no inciso III do artigo 1, a dignidade da
pessoa humana como fundamento do Estado. Seguindo a mesma linha, a Lei 8078/90
reala o respeito dignidade do consumidor como seu objetivo principal. E sob esse
prisma que o Direito do Consumidor deve ser analisado.
Se a dignidade do consumidor estiver acima de qualquer interesse, os direitos do
homem sero preservados e nestes se incluem os direitos vida, sade, segurana e
tambm os econmicos.Com esses valores, a Constituio Federal de 1988 foi
elaborada, dando nfase perspectiva social do direito e determinando a
regulamentao das relaes de consumo, sob a perspectiva da vulnerabilidade do
consumidor.
Essa necessidade de adequao realidade social foi responsvel pela mudana
de paradigmas no direito privado. No diverso o mvel do artigo 170 da norma
constitucional, que regulamenta a atividade econmica, estabelecendo seus pilares na
preservao de uma existncia digna para o ser humano, conforme os ditames da justia
social e com a observncia, dentre outros princpios, da defesa do consumidor.
1.1 Quando e onde, pela vez primeira, apareceu o direito do consumidor?
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Essa pergunta respondida pelo autor Eduardo Gabriel Saad2 dizendo que No
dado a ningum responder, com segurana, a essa pergunta. Desde os tempos mais
recuados, sempre houve algum que vendesse algo (ou trocasse um por outro produto)
e algum que comprasse aquilo de que necessitava para alimentar-se ou para proteger-
se contra as intempries. Durante milnios, esse comrcio caracterizou-se por seu
individualismo, isto , o produto era predominantemente de carter artesanal e o
comprador limitava seu interesse a umas poucas unidades. O direito regulava essas
modestas relaes de consumo.
Por sua vez o ilustre professor Willian Rocha, da Universidade Candido Mendes,
revela3: O conceito vem ingls consumerism, definido tanto como polticas e
atividades traadas para proteger os interesses e direitos dos consumidores, em suas
relaes de troca com qualquer tipo de organizao tambm pode ser como uma
reao popular contra negligncia burocrtica e desrespeito corporativo em relao
aos cidados e consumidores no se confunde com consumismo, que a compulso
por consumir.
E continua o mestre: A matria vista sob o aspecto sociolgico, vez que desde
que o homem passou a viver em sociedade j eram praticadas as relaes de consumo.
O homem, desde a Antigidade, verificou a necessidade de utilizar unidades de medidas
para as mercadorias, pois as transaes eram feitas de diversas formas e maneiras,
tendo por base as regies, os povos e os valores. E esse hbito mereceu que padres
fossem adotados, surgindo assim, a unidade de medida nas relaes de consumo.
Com o passar dos tempos, o consumo aumentou e, continuando com a explicao do
professor, O consumerismo americano se expandiu em seus enfoques, conceitos e
2 Saad, Eduardo Gabriel, Comentrios ao Cdigo de Defesa do Consumidor lei n. 8.078, de 11.9.90. 4, ed., So Paulo - LTR, 1999.
3 http://www.williamrocha.kit.net/dir_consumidor_/
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forma de ao, alastrando-se pelo mundo no decorrer do Sculo XX, resumindo-se em
trs perodos marcantes, segundo Kotler.
O primeiro ocorreu no incio do sculo motivado por uma alta de preos, questes
como tica em produtos medicinais e denncias de condies de trabalho e higiene nas
indstrias de carne feitas por Upton Sinclair em seu livro The Jungle, que levou o
Congresso a aprovar em 1906 a regulamentao para inspeo de carne (Meat
Inspection Act), a lei de alimentos e medicamentos (Pure Food and Drug Act) e, em
1914, originou a Comisso Federal de Comrcio (Federal Trading Comission).
O segundo se localiza depois da Grande Depresso (dcada de 30), em razo do
fortalecimento da legislao sobre alimentao e medicamentos (FDA), que, em 1938,
passou a incluir cosmticos e ampliou as funes da Comisso Federal de Comrcio,
permitindo-lhe regular prticas e atos lesivos ou desleais.
O terceiro se deu nos anos 60, devido a um conjunto de fatores de insatisfao na
sociedade americana que incluiu o surgimento de produtos mais complexos e
perigosos, o escndalo da talidomida, a mensagem do presidente Kennedy
reconhecendo os direitos do consumidor, os livros crticos e, por ltimo, a atuao
firme de Ralph Nader, lutando por mais segurana nos automveis.
Termina o professor, explicando que o marco tambem pode ser visto quando
Kennedy fez referencia ao Congresso americano para que se festeje, no dia 15 de maro,
o Dia Mundial dos Direitos do Consumidor, dizendo o ento Presidente todos ns
somos consumidores, e se no o somos, passamos a ocupar a posio de fornecedores
ou de prestadores de servio.
1.2 Fundamentos filosoficos: Kant e a Etica aplicados proteo do consumidor
Percebemos neste ponto do trabalho que a questo de consumo mais complexa
do que se imagina, por envolver os vrios campos do saber. Percebemos que muita das
teorias que hoje aplicamos, e que numa primeira analise rotulamos de inovadoras,
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podem ter suas bases encontradas naqueles primeiros filsofos da humanidade, mesmo
no perodo pr-socrtico.
O consumo um fato social como bem lembra O Professor Everardo Rocha4,
professor da PUC-Rio e COPPEAD/UFRJ. um processo de troca simblica (...)
uma questo complexa que possui implicaes fundamentais para o entendimento da
cultura e do mercado contemporneos. (...)possui a sua vinculao com a cultura de
massa; as representaes sociais que aciona; seu poder classificatrio das identidades;
seus espaos e modos de realizao.
Com fato social deve ser analisado em sua perspectivas filosoficas, para melhor
compreeenso do tema. Para ilustrar e fundamentar de maneira mais slida a razo da
preocupao com a questo do consumo, relacionado ao o meio em que vivemos, numa
viso tico-principiolgica, vamos em poucas palavras ilustrar com o pesamento de
Kant e a noo de tica na aplicao da questo da relao de consumo.
O Imperativo Categrico.
Como ensina Dario e Reali, Giovanni ANTISERI,na obra "Histria da Filosofia"
(Paulinas 1990 So Paulo), em termos simples, eis o que o grande filsofo alemo
Immanuel Kant chamou de imperativo categrico: voc deve agir sempre baseado
naqueles princpios que desejaria ver aplicados universalmente.
Por que "imperativo categrico"?
4 http://joomla.coppead.ufrj.br/port/index.php?option=content&task=view&id=392&Itemid=160
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Imperativo, porque um dever moral.
Categrico, porque atinge a todos, sem exceo.
O Imperativo Categrico uma das idias centrais para a adequada compreenso
da moralidade e da eticidade. Nesta proposta Kant sintetizou o seu pensamento sobre as
questes da moralidade. Kant valorizava esta idia de lei moral. Ele cunhou uma das
mais clebres frases a este respeito:
Duas coisas me enchem o nimo de admirao e respeito: o cu estrelado
acima de mim e a lei moral que est em mim.(Crtica da Razo Pura)
Ao introduzir a tica em sua obra filosfica, Kant fez surgir uma nova verso da
antiga Regra de Ouro, aquela regra ditada pelos grandes Mestres da humanidade: "Faa
para os outros o que voc gostaria que fizessem a voc."
Kant ampliou a regra para algo assim: "Faa para os outros o que gostaria que
todos fizessem para todos."
Com isso, Kant queria evitar o problema das diferentes idias que cada pessoa
tem sobre o que gostaria que se fizesse a elas. Queria enfrentar o "relativismo
moral", essa moralidade circunstancial to generalizada hoje em dia: a noo de que o
que certo depende da situao ou do contexto.
Ele no concordava com a doutrina do utilitarismo, ou seja, a de que "os fins
justificam os meios". Como podemos nortear nossas aes com base nos resultados, se
at mesmo os planos mais bem traados podem ser desvirtuados? O resultado do que
fazemos, muitas vezes, no absolutamente o que pretendamos, portanto um
desvirtuamento moral basear nossos julgamentos nos resultados.
Ento, como agir com segurana? Segundo Kant, se quisermos ser objetivos,
temos que agir, no segundo os fins, mas segundo princpios universais.
Princpios universais e no regras circunstanciais.
Para Kant o bem supremo a boa vontade, da qual a liberdade propriedade. O
pensador alemo define vontade (que no outra coisa seno a razo prtica)
como a faculdade de escolher s aquilo que a razo, independentemente da inclinao,
reconhece como praticamente necessrio, quer dizer, como bom (op.cit.: 123), ou ainda
a faculdade de se determinar a si mesmo a agir em conformidade com a representao
de certas leis (op.cit.: 134).
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Somente sob a idia de liberdade um ser racional pode ter vontade prpria. No que
respeita vontade humana, Kant diz haver um imperativo categrico cujo fundamento
est no princpio objetivo da vontade, segundo o qual a natureza racional existe como
fim..
Aplicaes do imperativo categrico
No campo da biotica comum decidir-se por meio do imperativo categrico. Em
contraposio corrente pela qual deve prevalecer a autonomia do indivduo, a quem
e somente a ele se d o direito de escolha (no caso de sujeitar-se a experimentaes ou
da deciso pelo aborto ou eutansia, por exemplo), existe a corrente que se norteia por
princpios definidos categoricamente. Pessini e Barchifontaine, ao apontar a necessidade
de uma mstica libertadora para a biotica, afirmam que esta mstica deve proclamar,
frente a todas as conquistas das cincias da vida e do cuidado sade, que o
imperativo tcnico-cientfico, posso fazer, passa obrigatoriamente pelo discernimento
de outro imperativo tico, logo devo fazer? (1998: 94). Enfim, no basta ater-se ao
primeiro imperativo, hipottico; preciso passar por um imperativo categrico.
No campo da preocupao com o consumidor, necessitamos a todo o tempo
entrar com discusses ticas e morais. Dai vem a importncia em conhecer Kant. Cada
individuo deve ter dentro de si um incontrolvel desejo de preservao, de cuidado, de
amor natureza e ao prximo, como um imperativo determinante. Devemos ter a
conscincia que esse imperativo fundamental para que no chegamos ao
holocausto de consumo provocado pela modernidade. A isto se liga a noo de
BOA-F OBJETIVA, hoje consagrada tambem no Novo Cdigo Civil.
Consideraes sobre TICA
mais fcil sentir a questo da tica aplicada no consumo que defini-la.
Discutir e conceituar tica e relacion-la com o consumo no tarefa to simples.
Encontramos diversos significados, diversos sentidos e interpretaes de sua
conceituao. Porm, temos uma certeza no uma discusso nova, mas a base para
formao de muitas outras. Encontramos esta discusso por exemplo em tica a
Nicmano, em que Aristteles discute conceitos ticos, nos primrdios da evoluo
humana. Scrates contraditou as duas teses bsicas dos sofistas, que foram duas:
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a) A tese de que os cdigos morais, ou convices ticas, e os conceitos
fundamentas da tica (como bom, justo, honesto etc) so frutos das convenes
sociais para ele estes encontram seu fundamento na prpria natureza humana;
b) A tese que afirma que as idias e os principio morais se apreendem
atravs de ensino defendeu, ele, que o ensino pressupe a posse desses
princpios e idias, contribuindo, no mximo, tomada de conscincia em
relao aos mesmos.
Com isto, acabou elegendo a liberdade com a primeira das concepes
transcendentais do agir moral, se o homem no livre no se pode absolutamente falar
de moralidade.
O objeto da tica, para alguns, a moral. A moral um dos aspectos do
comportamento humano. Derivando de costumes significa o conjunto de normas
adquiridas pelo hbito reiterado de sua prtica. Melhor explicando, o objeto da tica
a moralidade positiva, ou seja, o conjunto de regras de comportamento e formas de
vida atravs das quais tende o homem a realizar o valor do bem.
A tica tambm uma disciplina normativa pois procura descobrir as normas
e elucid-las.
Para Nicola Abbagnano, (HISTORIA DA FILOSOFIA. pg 380 a 387),
encontramos duas concepes para o conceito de tica:
!- Como cincia do fim e meios por atingir tal fim. Entendendo Fim como um ideal
para o qual o homem se dirige, por sua natureza e essncia.
2-Como cincia do mvel, da motivao. Entendendo como Mvel: motivos ou
causas da conduta e foras que o determinam.
Como ensina tambm a professora de filosofia Regina Queiroz, so pontos de vista
heterogneos, mas que permanentemente se confundem. Essa confuso advm do fato
de que ambas as concepes costumam se apresentar com definies aparentemente
idnticas do BEM. Analisando a noo do BEM, verifica-se a ambigidade: BEM pode
significar o que , pelo fato de que . Ainda BEM pode significar o que objeto do
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desejo. O primeiro significado aponta o BEM como realidade perfeita ou perfeio do
real., real como o eterno , o imutvel, a essncia.O segundo significado aponta o BEM
como objeto de apetio. Temos assim, BEM com significados e alcances muito
diferentes. Deve haver, portanto, a distino, entre:
*TICA DO FIM e
*TICA DO MVEL.
A atual convulso pelo consumo uma crise Moral, porque os descaminhos da
criatura humana, refletidos na violncia, no egosmo e na indiferena pela sorte do
semelhante, no sentimento de consumir e de ganhar com o aumento de consumo,
assentam-se na perda de valores morais. De nada vale reconhecer a dignidade da pessoa,
se a conduta pessoal no se pautar por ela. Pois, tica pode ser tida tambm como a
cincia do comportamento dos homens em sociedade. H quem faa ainda uma outra
classificao da tica:
a) tica emprica; aquela que pretende derivar seus princpios da
observao dos fatos.
b) tica Anarquista: O anarquismo repudia toda norma e todo valor. Para
esta corrente, direito, moral, convencionalismos sociais, religio, tudo
constitui exigncia arbitrria, nascida da ignorncia, da maldade e do
medo. Assim, as leis no so legtimas, sejam morais, sejam jurdicas.
uma doutrina egosta. Prepondera a vontade humana e esta varia de
indivduo para indivduo.Para estes, s tem valor o que no contraria as
tendncias e impulsos naturais. A ordem jurdica, como organizao
social de tipo coercvel, se ope liberdade e representa, por isso, um mal
que deve ser combatido.
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c) tica Utilitarista: O utilitarismo se caracteriza por considerar bom o que
til. Este tem sentido na vida moral, se entendido como prudente emprego
dos meios aptos consecuo de fins moralmente valiosos.
d) tica dos bens ou dos fins: Esta formulao defende, ao contrrio do
relativismo, a existncia de um valor fundamental denominado bem
supremo.A criatura humana capaz de se propor fins, eleger meios e
colocar em prtica os ltimos, para alcanar os primeiros.O supremo bem
da vida consistir na realizao do fim prprio da criatura humana. Esse,
na hierarquia dos bens, o bem supremo.
Para Scrates, o verdadeiro objeto do conhecimento a alma humana. A verdade
vive oculta no esprito humano.A bonde resultado do saber. Para algum ser feliz
necessrio ser bom e para ser bom preciso ser sbio. A maldade produto da
ignorncia.
Para os seguidores da tica Aristotlica, a finalidade da tica descobrir o bem
absoluto, a meta definitiva, que ponto de convergncia e chegada e no pode ser ponto
de partida de mais nada.Chamando-se o bem absoluto de felicidade, para Aristteles, ela
est no exerccio, firme e constante, da virtude. No basta um ato virtuoso de quando
em quando. A virtude a atualizao do que lhe prprio. O homem virtuoso aquele
que mergulha no desenvolvimento integral de suas faculdades.
Para quem ensinam a tica formal, dizem que o fundamento da lei moral no est
na experincia, mas se apia em princpios racionais apriorsticos. O critrio supremo da
moralidade : age sempre de tal modo que a mxima de tua ao possa ser elevada por
sua vontade, categoria de lei de universal observncia.
Os principais conceitos kantianos nessa linha so: a) O mais importante: a boa
vontade s se considera a atitude interior da pessoa. O centro de gravidade da vida
moral a pureza das intenes. b) O dos imperativos os fenmenos humanos derivam
de princpios.
Porm, as grandes discusses atuais j partem de um problema acontecendo,
uma degradao na personalidade, que tenta-se compensar pelo consumo forte, e uma
despreocupao na preservao das fontes esgotveis, que aumenta, seja por falta de
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educao, ou conscincia. Da a necessidade de chamar a teno para aqueles que no
perceberam que nossa terra me, a Gaia, est morrendo. O que nos move para este
despertar tico, so os acontecimentos catastrficos relacionados ao Homem e ao
planeta.
De uma maneira ou de outra, ter a tica do fim ou do mvel, uma necessidade
continua para preservamos a terra para as futuras geraes, difundir a noo do bem,
da tica, do cuidar, do preservar, e viver de modo sustentvel, realizar produo
razovel da mesa forma que o consumo.
Capitulo 2 O Cdigo de Defesa do Consumidor e o ordenamento
juridico brasileiro
Nesse capitulo estudaremos as relaes de consumo numa perspectiva juridica.
Para entendermos com profundidade o tema, achamos de bom alvitre fazer alguns
breves esclarecimentos sobre a noo de justia, para depois ingressarmos nos
principios norteadores da relao consumeirista e analise constitucional e legal dos
negocios envolvendo o consumidor. A razo simples: O sistema juridico deve existir
para compor conflitos e manter a ordem e equilibrio social, mas o sistema atual permite
de forma ampla o acesso do consumidor, parte mais fraca na relao contratual, de
forma material ou simplesmente formal? Meras previses legais s suficientes para
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afirmamos que existe justia plena a acessivel ao consumidor? O que chamaremos de
justia? Eis o porqu de ser exigida a noo de justia para compreendermos o tema.
2.1 Justia, a necessidade de entender as diversas concepes
"A justia a primeira virtude das instituies sociais, como a
verdade o dos sistemas de pensamento". John Rawls Uma
teoria da justia.
O acesso a justia e as concepes de justia
Falar em justia no simplesmente caracterizar o poder judicirio, seus rgos e
instrumentos de acesso. Compreendemos que vivemos num sistema autopoitico, que
necessitamos despertar a conscincia de todos em prol da preservao da vida, nosso
habitat e percebemos que o direito visa, entre outros termos, buscar o justo, por meio da
justia.
Ter instrumentos eficazes para o homem busque a proteo do estado e do
consumo sustentavel para cessar uma agresso ao meio ambiente, poder cobrar dos
rgos pblicos a efetivao de polticas pblicas, de conscientizao dos direitos do
consumidor, mas tambem conscientizao da educao no consumo, para o consumidor
e para o fornecedor, uma das facetas do que o verdadeiro acesso a justia.
O livre acesso a justia tambm ponto central da moderna processualstica. Seu
estudo pressupe um alargamento e aprofundamento dos objetivos e mtodos da
moderna cincia jurdica.
O livre acesso implica tanto que o sistema judicirio seja igualmente acessvel a
todos quanto que produza resultados, individual ou coletivamente, justos. Assim, a
preocupao central dever ser, no tanto com as garantias processuais clssicas, que
assegurem a possibilidade formal de acesso ao Judicirio, mas sim a criao de
instrumentos que permitam que as partes estejam, mais do que em igualdade jurdica,
mas tambm em igualdade tcnica e econmica.
Seguindo o pensamento de CAPPELLETTI, ensinado por JOS MRIO
WANDERLEY GOMES NETO- ACESSO JUSTIA EM MAURO
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CAPELLETTI editora Sergio Fabris, o acesso Justia constitui, hoje, um movimento
mundial, que pode, graficamente, se resumir em trs fases (ou ondas) distintas:
- a primeira onda, preocupada pela assistncia judiciria para os pobres.
- a segunda onda representou a mudana das regras tradicionais do processo
civil para a tutela dos interesses coletivos e difusos.
- a terceira onda seria a etapa das reformas dos cdigos existentes em funo da
necessidade de um enfoque de justia mais efetiva.
Por sua vez, BOAVENTURA SOUZA SANTOS, na obra Para uma Revoluo
Democrtica da Justia- Cortez editora, aponta trs tipos de obstculos Justia:
econmicos, sociais e culturais.
Relativamente aos obstculos sociais e culturais, releva destacar que,
modernamente, tem se entendido da insuficincia da tradicional assistncia judiciria,
que se limita ao apoio judicirio , assim entendido o patrocnio gratuito e a dispensa das
despesas processuais, mas abrange hoje toda a assistncia jurdica pr-processual, a
comear pela informao, com a correlata tomada de conscincia, passando pela
orientao jurdica (complementada, quando necessrio, por outros tipos de
orientao), pelo encaminhamento aos rgos competentes e culminando finalmente,
na assistncia judiciria propriamente dita.
Quanto aos obstculos econmicos, conforme BOAVENTURA SOUZA
SANTOS, estes atingem aos desfavorecidos de forma tripla:
a) nas sociedades capitalistas em geral os custos da litigao so muito elevados;
b) a relao entre o valor da causa e o custo da litigao aumenta medida que baixa o
valor da causa;
c) a lentido dos processos facilmente se converte em um custo econmico adicional e
este proporcionalmente mais gravoso para os cidados de menos recursos.
Constata-se, como ensina Cappelletti, que, em face das diferenas
fundamentais entre os homens, a que se rene o custo da demanda, nem sempre o
exerccio do direito de ao se oferece acessvel ao alcance do corpo social, mxime
dos despossudos de recursos financeiros, seno atravs de rgos institudos e
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mantidos pelo Estado, no desempenho do dever-funo de atribuir a cada qual o que
lhe pertence.
importante termos tais noes iniciais ao tratarmos do tema relacionado s
questes de consumo, especificamente porque o consumidor, parte mais fraca na relao
contratual deve ter o amplo e irrestrito acesso justia em suas vrias concepes.
AS MODERNAS TEORIAS SOBRE JUSTIA
Amandino Teixeira Nunes Junior5, examina as teorias sobre a justia
formuladas no sculo XX, tanto no meio jurdico, como no meio filosfico, e o faz com
relao s obras de Hans Kelsen, Jrgen Habermas, Cham Perelman e John Rawls.
Convm salientar, ainda, que no constitui propsito do presente estudo submeter
a um aprofundado exame crtico das complexas teorias desses renomados pensadores. O
que se objetiva aqui uma exposio das linhas fundamentais dessas concepes sobre
a justia que contriburiam sobremodo para a doutrina jusfilosfica recente. O que ser
importante para compreendemos o Sistema de Aes coletivas nas relao de consumo
pela defensoria Pblica.
5 retirado do sitio As modernas teorias da justia: a teoria discursiva de Jrgen Habermas. Disponvel em:
. Acesso em: 05 agosto. 2007
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A TEORIA POSITIVISTA DE HANS KELSEN
Ao elaborar sua teoria da justia, Kelsen (KELSEN Hans. O que justia?: a
justia, o direito e a poltica no espelho da cincia. So Paulo: Martins Fontes, 2001)
realiza um exame crtico e profundo das teorias que se produziram desde a Antiguidade
clssica at a primeira metade do sculo XX sobre o tema.
Avaliando a justia em Plato, Kelsen sustenta que a quase totalidade de seus
dilogos busca precisamente a pergunta: "O que o Bem?" (na qual se insere, tambm,
a pergunta: "O que a justia?"). Afirma que o mtodo dialtico ensinado e praticado
nos dilogos platnicos no chegou a elaborar um contedo definvel de justia.
A concluso de Kelsen de que "a idia do Bem inclui a de justia, aquela justia a
cujo conhecimento aludem todos os dilogos de Plato. A questo "O que justia?"
coincide, portanto, com a questo o que bom ou que o Bem? Vrias tentativas so
feitas por Plato, em seus dilogos, para responder a essa questo de modo racional,
mas nenhuma delas leva a um resultado definitivo".
Um outro exemplo, para Kelsen, da tentativa infrutfera de elaborar um contedo
definvel de justia, atravs de um mtodo racional ou cientfico, a tica de
Aristteles. "Trata-se de uma tica da virtude, ou seja, ele visa a um sistema de virtudes,
entre as quais a justia a virtude mxima, a virtude plena."
Com relao ao Direito natural, Kelsen sustenta que essa doutrina "afirma existir
uma regulamentao absolutamente justa das relaes humanas que parte da natureza
em geral ou da natureza do homem como ser dotado de razo"
Como se v, o talento de Kelsen funciona como verdadeiro destruidor das
convices jusnaturalistas elaboradas ao longo dos sculos, pois "encontrar normas para
o comportamento humano na razo to ilusrio quanto extrair tais normas da
natureza."
Com Immanuel Kant, a crtica kelseniana no se passa de modo diverso. O
imperativo categrico kantiano determina que o sujeito moral, para ser justo, deve agir
sempre de tal modo que a mxima de seu agir possa ser querida como uma lei geral.
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Noutras palavras, o comportamento humano justo se for determinado por normas que
o homem, ao agir, pode ou deve esperar que sejam obrigatrias para todos.
Veja-se o seguinte excerto no qual Kelsen expe sua crtica a Kant:
Mas quais so essas normas que podemos ou devemos esperar que sejam
genericamente obrigatrias? E essa a questo decisiva da justia; e a ela, o imperativo
categrico da mesma forma a regra de ouro, seu modelo no d resposta."
Kelsen, na sua obra "O que justia?", considera a justia "uma caracterstica
possvel, porm no necessria, de uma ordem social". E indaga: "mas o que significa
ser uma ordem justa? Significa essa ordem regular o comportamento dos homens de
modo a contentar a todos, e todos encontrarem sob ela felicidade. O anseio por justia
o eterno anseio do homem por felicidade. No podendo encontr-la como indivduo
isolado, procura essa felicidade dentro da sociedade. Justia felicidade social, a
felicidade garantida por uma ordem social" .
Observa Kelsen que o conceito de justia passa por uma transformao radical: do
sentido original da palavra (que implica o sentimento subjetivo que cada pessoa
compreende para si mesma, de modo que a felicidade de um pode ser a infelicidade de
outro) para uma categoria social: a felicidade da justia. que a felicidade individual (e
subjetiva) deve transfigurar-se em satisfao das necessidades sociais. Como ocorre no
conceito de democracia, que deve significar o governo pela maioria e, se necessrio,
contra a minoria dos sujeitos governados.
A TEORIA DISCURSIVA DE JRGEN HABERMAS
Habermas elabora sua teoria do agir comunicativo, contida na obra "Direito e
democracia: entre facticidade e validade", para analisar as instituies jurdicas e propor
um modelo onde se interpenetram justia, razo comunicativa e modernidade.
Ao se referir facticidade e validade, Habermas intenta compreender a
dualidade do Direito moderno.
Assim, de um lado, o Direito facticidade quando se realiza aos desgnios de um
legislador poltico e cumprido e executado socialmente sob a ameaa de sanes
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fundadas no monoplio estatal da fora. De outro lado, o Direito validade quando suas
normas se fundam em argumentos racionais ou aceitveis por seus destinatrios.
A relao entre facticidade e validade, "assume uma forma de tenso pelo fato de
o Direito reunir em si elementos sancionadores e elementos provenientes de uma
autolegislao. Dito em outros termos, a tenso entra facticidade e validade, no Direito
moderno, retorna pela circunstncia de que com a sano se restringe o nvel de
dissenso, mas esse dissenso superado no momento em que se introduz em seu bojo a
idia de que as normas jurdicas so emanaes do povo".
Essa tenso, nas palavras de Habermas, reside: (...) mais precisamente entre a
coero do Direito, que garante um nvel mdio de aceitao da regra, e a idia de
autolegislao ou da suposio da autonomia poltica dos cidados associados que
resgata a pretenso da legitimidade das prprias regras, ou seja, aquilo que as torna
racionalmente aceitveis".
No seio de uma tenso permanente entre facticidade e validade, a constituio de
uma comunidade jurdica autnoma requer o abandono, em termos ps-metafsicos, de
uma razo prtica e a assuno de uma razo comunicativa.
Como afirma Habermas "Eu resolvi encertar um caminho diferente, lanando
mo da teoria do agir comunicativo: substituo a razo prtica pela comunicativa. E tal
mudana vai muito alm de uma simples troca de etiqueta. " HABERMAS, Jrgen, pg.
19. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1997, t. I e II6
Mas qual o sentido dessa mudana? Por no ser prtica, vale dizer, por no
oferecer nenhum tipo de "indicao concreta para o desempenho de tarefas prticas,
pois no informativa", a razo comunicativa afasta-se da tradio prescritiva da razo
prtica.
A proposta da Habermas pretende, pois, situar a legitimidade do Direito no no
plano metafsico, mas no plano discursivo e procedimental, lanando mo da sua teoria
do agir comunicativo, na qual a linguagem supera a dimenso sinttica e semntica,
6 Retirado de NUNES JUNIOR, Amandino Teixeira. As modernas teorias da justia . Jus Navigandi, Disponvel em:
. Acesso em: 19 ago. 2008.
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constituindo o medium de integrao social, isto , o mecanismo pelo qual os agentes
sociais se interagem e fundamentam racionalmente pretenses de validade discursivas
aceitas por todos.
Para Habermas, o Direito legtimo, nas sociedades atuais ps-metafsicas, depende
do exerccio constante do poder comunicativo. Para que no se esgote a fonte da justia,
mister que um poder comunicativo jurgeno esteja na base do poder administrativo do
Estado.
Mesmo assumindo a perspectiva de que o ordenamento jurdico emana das
diretrizes dos discursos pblicos e da vontade democrtica dos cidados,
institucionalizadas juridicamente, observando a correio parcial, h sempre a
possibilidade de que a normatividade seja injusta, abrindo-se assim para dois caminhos:
o primeiro, a permanecer injusta, passa a constituir-se arbtrio; o segundo, a tornar-se
arbtrio, surge a falibilidade e, com isso, a presuno de que seja revogada ou revista.
Ainda, para Habermas, a resoluo dos conflitos ser tanto mais facilmente
alcanada quanto maior for a capacidade dos membros da comunidade em restringir os
esforos comunicativos e pretenses de validade discursivas consideradas
problemticas, deixando como pano de fundo o conjunto de verdades compartilhadas e
estabilizadoras do conjunto da sociedade, possibilitando que grandes reas da interao
social desfrutem de consensos no problemticos.
O genial da teoria de Habermas reside, portanto, na substituio de uma razo
prtica, baseada num individuo que, atravs de sua conscincia, chega norma, pela
razo comunicativa, baseada numa pluralidade de indivduos que, orientando sua ao
por procedimentos discursivos, chegam norma. Assim, a fundamentao do Direito,
sua medida de legitimidade, definida pela razo do melhor argumento. Como
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emanao da vontade discursiva dos cidados livres e iguais, o Direito pode realizar a
grande aspirao da humanidade: a efetivao da justia.
A TEORIA FORMAL DE CHAM PERELMAN7
Na sua obra "tica e Direito", Perelman no pretende formular uma teoria da
justia que seja a mais apropriada e consentnea com a idia de racionalidade,
comparativamente s teorias de outros autores. Pretende, na verdade, a partir de um
ponto de vista lgico, examinar os diferentes sentidos da noo de justia, para deles
extrair um substrato comum a igualdade - que o conduzir ao conceito de justia
formal ou abstrata.
As seis concepes mais correntes da justia concreta que se afirmaram na
civilizao ocidental, desde a Antiguidade at nossos dias, segundo Perelman, so:
a)a cada qual a mesma coisa;
b)a cada qual segundo seus mritos;
c)a cada qual segundo suas obras;
d)a cada qual segundo suas necessidades;
e)a cada qual segundo sua posio;
f)a cada qual segundo o que a lei lhe atribui.
Segundo a primeira concepo da justia concreta, ser justo tratar todos da
mesma forma, sem considerar nenhuma das particularidades que distinguem os
indivduos. Perelman observa que, no imaginrio humano, o ser perfeitamente justo a
morte que vem atingir todos os homens independentemente de seus privilgios.
A segunda concepo da justia concreta no exige a igualdade de todos, mas um
tratamento proporcional a uma qualidade intrnseca, ao mrito do indivduo. A questo
saber o que deve ser levado em conta como mrito ou demrito de uma pessoa, quais
7 NUNES JUNIOR, Amandino Teixeira. As modernas teorias da justia . Jus Navigandi,Disponvel
em: .
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os critrios que devem presidir tal determinao, se deve ser considerado o resultado da
ao, a inteno do agente ou o sacrifcio utilizado.
Perelman observa que, partindo-se dessa concepo, pode-se chegar a resultados
absolutamente distintos, bastando que no se conceda o mesmo grau de mrito aos
mesmos atos dos indivduos.
A terceira concepo da justia concreta, cujo nico critrio do tratamento justo
o resultado da ao dos indivduos, de aplicao infinitamente mais fcil do que a
anterior, pois, ao invs de constituir um ideal quase irrealizvel, permite s levar em
considerao elementos sujeitos ao clculo, ao peso ou medida. Da por que sua
aplicao preside tanto o pagamento dos salrios dos empregados quanto a definio do
resultado de concursos e exames para provimento de cargos pblicos.
A quarta concepo da justia concreta, em vez de levar em considerao
mritos dos indivduos ou de sua produo, tenta reduzir os sofrimentos de que resultam
da impossibilidade em que o homem se encontra de satisfazer suas necessidades
essenciais. Assim, aqueles que se encontram em situao precria, carecendo de
condies consideradas como um mnimo vital, devem ter um tratamento diferenciado.
Perelman afirma que a legislao dos pases ocidentais que criou, no sculo XX,
os direitos sociais, como o salrio-mnimo e o seguro-desemprego, inspirou-se nessa
frmula de justia.
A quinta concepo da justia concreta baseia-se na superioridade de indivduos
em decorrncia da hereditariedade (ou do nascimento), sendo muito usada na
hierarquizao social das sociedades aristocrticas e escravocratas, onde as diferenas
de tratamento levam em considerao critrios como a raa, a religio e a fortuna.
A sexta (e ltima) concepo da justia concreta a parfrase do princpio de "dar
a cada um o que lhe devido" ("cuique suum", dos romanos) e se prope a aplicar aos
fatos um sistema preestabelecido de regras de direito razo pela qual levar a
resultados diferentes conforme o ordenamento jurdico a ser aplicado.
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Perelman apresenta a noo de justia formal (vinculada igualdade) como o
substrato comum s seis concepes da justia concreta examinadas anteriormente. Esse
substrato comum a igualdade fundamenta-se em valores escolhidos de forma
aleatria igualdade segundo, por exemplo, a riqueza e a beleza. Em decorrncia,
Perelman acaba por estabelecer, como regra de justia, a igualdade formal, porquanto
"ser justo tratar da mesma forma os seres que so iguais em certo ponto de vista, que
possuem uma mesma caracterstica, a nica que se deve levar em conta na
administrao da justia. Qualifiquemos essa caracterstica de essencial."
A justia formal ou abstrata, para Perelman, , pois, "um princpio de ao
segundo o qual os seres de uma mesma categoria essencial devem ser tratados da
mesma forma", sendo que esse princpio subjaz latente em cada uma das seis noes da
justia concreta.
A partir desse conceito de justia formal ou abstrata, observa-se que as
concepes concretas de justia se distinguem medida que cada uma delas erige um
valor diverso para definir a pertinncia dos indivduos s categorias essenciais dentro
das quais aplicar-se- um tratamento igual.
Em suma, a justia possvel em Perelman a justia formal ou abstrata segundo o
parmetro da igualdade, fundado sobre uma pauta valorativa. Logo, a justia deve
contentar-se com um desenvolvimento formalmente correto de um ou mais valores. E
assim Perelman levado a distinguir trs elementos na justia de determinado sistema
normativo: o valor que a fundamenta, a regra que a enuncia e o ato que a realiza.
A TEORIA SOCIAL DE JOHN RAWLS
A teoria da justia de John Ralws, contida na obra "Uma teoria da justia", uma
das mais importantes desenvolvidas no sculo XX. Pretende Rawls "elaborar uma teoria
da justia que seja uma alternativa para essas doutrinas que h muito tempo dominam a
nossa tradio filosfica a utilitria e a intuicionista".
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A sociedade vista por Rawls, como uma associao mais ou menos auto-
suficiente de pessoas que, em suas relaes, reconhecem a existncia de regras de
condutas como obrigatrias, as quais, na maioria das vezes, so cumpridas e obedecidas,
especificando um sistema de cooperao social para realizar o bem comum.
Nesse contexto, surgem tanto identidade de interesses como conflito de interesses
entre as pessoas, pois estas podem acordar ou discordar pelos mais variados motivos,
quanto s formas de repartio dos benefcios e dos nus gerados no convvio social.
Para Rawls, so dois os princpios da justia social:
"Primeiro: cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema de
liberdades bsicas iguais que seja compatvel com um sistema semelhante de liberdades
para as outras.
Segundo: as desigualdades sociais e econmicas devem ser ordenadas de tal
modo que sejam ao mesmo tempo (a) consideradas como vantajosas para todos dentro
dos limites do razovel, e (b) vinculadas a posies e cargos acessveis a todos."
Tais princpios, segundo Rawls, aplicam-se estrutura bsica da sociedade,
presidem a atribuio de direitos e deveres e regem as vantagens sociais e econmicas
advindas da cooperao social.
Rawls observa ainda que os dois princpios so um caso especial de uma
concepo mais geral da justia assim expressa:
"Todos os valores sociais liberdade e oportunidade, renda e riqueza, e as bases
sociais da auto-estima - devem ser distribudos igualitariamente, a no ser que uma
distribuio desigual de um ou de todos esses valores traga vantagens para todos.
V-se, pois, que os princpios de justia social tm um ntido carter "substancial",
e no meramente "formal", na teoria de Rawls. Logo no incio de sua obra, ele bem
claro quando sustenta que o que o preocupa a justia verificada na atribuio de
direitos e liberdades fundamentais s pessoas, assim como a existncia real da igualdade
de oportunidades econmicas e de condies sociais nos diversos segmentos da
sociedade.
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Assim, o objeto primrio da justia, para Rawls, " a estrutura bsica da
sociedade, ou mais exatamente, a maneira pela qual as instituies sociais mais
importantes distribuem direitos e deveres fundamentais e determinam a diviso de
vantagens provenientes da cooperao social."
Segundo Rawls, os princpios de justia social, que regulam a escolha de uma
constituio poltica, devem ser aplicados em primeiro lugar s profundas e difusas
desigualdades sociais, supostamente inevitveis na estrutura bsica de qualquer
sociedade.
Em suma, para Rawls, a concepo de justia apresentada na sua obra consiste na
"justia como eqidade" ("justice as fairness"), significando que uma justia
estabelecida numa posio inicial de perfeita eqidade entre as pessoas, e cujas idias e
objetivos centrais constituem uma concepo para uma democracia constitucional.
2.2 Uma questo de principio:Os princpios judicos-consumeiristas
Podemos aduzir alguns princpios8 trazidos pela L.8078/90 tanto no art.4 do
CDC e em outros, que na verdade no so somente princpios fundamentais, so
clusulas gerais abertas, que uma tcnica legislativa moderna alem, tcnica das
clusulas gerais. Eles tem muita importncia porque como so princpios fundamentais,
que na verdade funcionam como clusulas gerais, eles se consideram como inseridos em
todos os contratos de consumo. Isso mitiga a inrcia do judicirio, pois como elas se
consideram inseridas nos contratos, o juiz pode agora verificando a ausncia de uma
dessas clusulas modificar o contrato.:
8 Retirado das anotaes em aula proferidas no Curso de Especializao em Direito Consumidor
2007, pela UCAM-Projeto A Vez do Mestre.
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1) Reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor: est bem claro no art.
4 CDC, quando fala da poltica nacional de consumo Ou seja, o governo declarou e
reconhece que o consumidor vulnervel diante do fornecedor. Se ele vulnervel, os
riscos do consumo no podem cair sobre os ombros dele, ao contrrio, o risco do
consumo teve que se inverter e recair sobre os ombros do fornecedor, pois j que o
fornecedor triplamente mais forte, ele tem mais condies de suportar esse risco. Por
isso que o ttulo da lei afirma que ela dispe sobre a proteo do consumidor.(4,I CDC)
2) Princpio da Transparncia: nas relaes de consumo, o que se quer uma
conduta transparente de ambas as partes. As partes no podem contratar de maneira
ambgua, com reserva mental, elas devem expor uma outra as suas pretenses, as suas
expectativas.
3) Princpio da Informao: visa suprir a deficincia tcnica, a vulnerabilidade
tcnica. O fornecedor hoje tem que informar ao consumidor tudo que ele precisa saber
sobre o desempenho daquele produto/servio, os riscos e danos que ele pode causar,
como usar o produto, como proteger-se dos seus riscos inerentes. (6, III CDC)
4) Princpio da Segurana: o consumidor tem o direito de se sentir seguro ao
adquirir o produto, de saber que aquele produto no lhe causar dano. Quem tem que
responder por isso o fornecedor, o risco do fornecedor se esse produto causar dano.
(ART.8 CDC_
5) Princpio da solidariedade: Tal principio retira-se do art. 7 , p. nico CDC.
Isso mudou as relaes de consumo, pois agora o consumidor lesado que sofreu um
dano, pode eleger sua vontade qualquer desses elos da cadeia da produo para entrar
com pretenso indenizatria. Essa a regra de ouro da solidariedade, pois eu posso
acionar todos, do fabricante ao importador, como posso acionar um s deles, ou alguns
deles.(
6) Princpio do acesso justia: diferente de acesso ao judicirio. Acesso ao
judicirio o direito de propor a ao, e isso todos tem hoje com a Justia Gratuita, nem
os carentes tem esse problema. Acesso justia o direito que tem o consumidor de
obter do Estado uma resposta rpida e efetiva ao seu conflito de interesses; direito de
efetividade e da utilidade da prestao jurisdicional. O CDC criou regras que tornam o
acesso a justia eficiente. este princpio est em vrios lugares do CDC, espalhado, entre
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eles onde est garantida a defesa do consumidor com a inverso do nus da prova, que
uma revoluo no processo civil clssico.. Outro exemplo deste princpio quando o
CDC probe a denunciao da lide nas aes referentes relao de consumo, porque
ela tumultua e retarda o processo.(6,VII CDC)
7) Princpio Geral da Boa-f: tambm chamado de clusula geral da boa-f..
Ele se encontra no art. 4 III CDC, ele permite que o juiz modifique o contrato se
perceber que abusivo. Est claramente tambm no art. 51 CDC, que elenca as
clusulas abusivas. A boa-f precisa ser dupla, tanto do consumidor quanto do
fornecedor.(ART.51 CDC)
Existem ainda importantes principios emanados do Codigo Civil de 2002, e para
alguns, j consagrado no Cdigo Consumeirista como ensina Flavio Tartuce9 que
passamos a expor a seguir a reproduo do texto elaborado pelo renomado autor,
valendo ressaltar a aplicao plena face ao artigo 7 da L.8.078/90:
1) PRINCPIO DA ETICIDADE O Novo Cdigo Civil se distancia do
tecnicismo institucional advindo da experincia do Direito Romano, procurando, ao
invs de valorizar formalidades, reconhecer a participao dos valores ticos em todo
o Direito Privado.
Por isso muitas vezes se percebe a previso de preceitos genricos e clusulas
gerais, sem a preocupao do encaixe perfeito entre normas e fatos. Tambm, o Novo
Cdigo abandona o excessivo rigor conceitual, possibilitando a criao de novos
modelos jurdicos, a partir da interpretao da norma diante de fatos e valores
melhor concepo da Teoria Tridimensional do Direito.
O Princpio da Eticidade pode ser percebido pela leitura de vrios dispositivos do
Novo Codigo, sendo vrios exemplos citados pelo prprio Miguel Reale.
9 retirado do sitio http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigos.asp em 03/01/2008),
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Inicialmente, nota-se a valorizao de condutas ticas, da boa-f objetiva, pelo
contedo da norma do art. 113, segundo o qual "os negcios jurdicos devem ser
interpretados conforme a boa-f e os usos do lugar de sua celebrao."
O art. 187 prev justamente qual a sano para a pessoa que contraria a boa-f,
a funo social ou econmica de um instituto ou os bons costumes: cometer abuso de
direito, assemelhado a ilcito: comete ato ilcito o titular de um direito que, ao exerc-
lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econmico ou social, pela
boa-f ou pelos bons costumes."
O art. 422 tambm valoriza a eticidade, prevendo que a boa-f deve integrar a
concluso e a execuo do contrato. As conseqncias dessa previso sero enormes,
conforme veremos oportunamente, mantendo ntima relao com o princpio da funo
social do contrato.
Como bem enfoca Miguel Reale freqente no Projeto a referncia probidade
e a boa-f, assim como correo (corretezza) ao contrrio do que ocorre no Cdigo
vigente, demasiado parcimonioso nessa matria, como se tudo pudesse ser regido por
determinaes de carter estritamente jurdicas (Viso geral do novo Cdigo Civil .
Jus Navigandi, Teresina, a 6, nmero 54, fevereiro de 2002:
. Acesso em: 30 dez. 2003).
2) PRINCPIO DA SOCIALIDADE O Novo Cdigo Civil procura superar o
carter individualista que imperava na codificao anterior, valorizando a palavra
ns, em detrimento da palavra eu.
Isso diante das inmeras modificaes pelas quais passou a sociedade: houve o
incremento dos meios de comunicao, a standardizao dos negcios e o
surgimento da sociedade de consumo em massa, trazendo uma nova realidade que
atingiu os alicerces de praticamente todos os institutos privados. Desse modo, dever
prevalecer o social sobre o individual, o coletivo sobre o particular.
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A funo social do contrato est agora tipificada em lei, prevendo o art. 421 do
Novo Cdigo, que a liberdade de contratar ser exercida em razo e nos limites da
funo social do contrato.
3) PRINCPIO DA OPERABILIDADE O Novo Cdigo Civil segue tendncia
de facilitar a interpretao e aplicao dos institutos nele previstos. Procurou-se assim
eliminar as dvidas que imperavam na codificao anterior, fundada no tecnicismo
jurdico.
Com exemplo disso podemos citar a distino que agora consta em relao aos
institutos da prescrio extintiva e da decadncia, tpico que trazia grandes dvidas
pela lei anterior. Agora, mais facilitadas as previses legais desses institutos, poder
o estudioso do direito entender muito bem as distines existentes e identificar com
facilidade se determinado prazo de prescrio ou de decadncia.
Em matria de Direito Contratual, o princpio da operabilidade pode ser
percebido pela previso taxativa e conceitual dos contratos em espcie, cujas previses
constam agora. O Novo Cdigo conceitua a compra e venda, a locao, a empreitada, a
prestao de servios, o transporte, o seguro, e assim sucessivamente.
Enfim, tal o sistema de proteo ao consumidor ganhar reforo ao ingressar no
sistema juridico patrio a noo, previso e aplicao de tais principos juridicos.
2.3 A Constituio da Repblica Brasileira e o consumidor
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A questo dos Direitos do Consumidor to importante que em trs
oportunidades distintas tratada na Constituio Federal vigente, conforme relata a
doutrina10.
A primeira vez, j em seu Captulo I do Ttulo II, no artigo 5, XXXII CF/88
que "o Estado promover, na forma da lei, a defesa do consumidor" . significando o
dever do Estado defender o consumidor, de acordo com o que estiver estabelecido nas
leis.
A segunda vez que a Constituio menciona a defesa do consumidor quando
trata dos princpios gerais da atividade econmica no Brasil, citando em seu artigo 170,
V,CF/88 que a defesa do consumidor um dos princpios que devem ser observados no
exerccio de qualquer atividade econmica.
Finalmente, o artigo 48 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias
(ADCT), determina que o Congresso Nacional elabore o Cdigo de Defesa do
Consumidor.
Jos Geraldo Brito Filomeno11 lembra que a sensibilizao "constituintes de
1887/88, foi obtida por unanimidade na oportunidade do encerramento do VII
Encontro Nacional das (...) Entidades de Defesa Do Consumidor, desta feita realizado
em Braslia, por razes bvias, no calor das discusses da Assemblia Nacional
Constituinte, e que acabou sendo devidamente protocolada e registrada sob n. 2.875,
em 8-5-87, trazendo sugestes de redao, inclusive aos ento artigos 36 e 74 da
Comisso "Afonso Arinos", com especial destaque para a contemplao dos direitos
fundamentais do consumidor (ao prprio consumo, segurana, escolha,
informao, a ser ouvido, indenizao, educao para o consumo e a um meio
ambiental saudvel)." (Ob.cit. p. 21-22).
Nosso Cdigo do Consumidor como assinalamos acima rene disposies
extradas de vrios ramos do direito, o que vai dificultar sobremaneira sua interpretao
e sua aplicao, porque, a todo instante, existe a possibilidade de conflito com a variada
legislao anterior.
10 PEDRON, Flvio Barbosa Quinaud; CAFFARATE, Viviane Machado. Evoluo histrica do Direito do
Consumidor. Jus Navigandi, Disponvel em: . Acesso em: 20 ago.
2007.
11 FILOMENO, Jos Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor. So Paulo: Atlas, 1991
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Rezava o 42 do art. 153 da Constituio Federal anterior, verbis: A lei no
poder excluir da apreciao do Poder Judicirio qualquer leso de direito
individual. bem verdade que as Constituies anteriores a exemplo da de 1967,
Emenda n. 1/69 s faziam meno a direito subjetivo individual.
Emanados da legislao, como j relatado, o surgimento de princpios prprios de
proteo ao consumidor sem duvida a maior importncia trazida pela L.8.078/90.
Para o professor Celso Antonio Bandeira de Mello12 principio o mandamento
nuclear do sistema, verdadeiro alicerce dele que se irradia sobre diferentes normas
compondo-lhes o esprito e servindo de critrio para sua exata compreenso e
inteligncia exatamente por definir a lgica e a racionalidade do sistema normativo,
no que lhe confere a tnica e lhe d sentido harmnico.
Podemos aduzir alguns princpios13 trazidos pela L.8078/90 tanto no art.4 do
CDC e em outros, que na verdade no so somente princpios fundamentais, so
clusulas gerais abertas, que uma tcnica legislativa moderna alem, tcnica das
clusulas gerais. Eles tem muita importncia porque como so princpios fundamentais,
que na verdade funcionam como clusulas gerais, eles se consideram como inseridos em
todos os contratos de consumo. Isso mitiga a inrcia do judicirio, pois como elas se
consideram inseridas nos contratos, o juiz pode agora verificando a ausncia de uma
dessas clusulas modificar o contrato.:
De conseqncia, ficava em aberto a defesa dos interesses coletivos ou difusos, no
plano constitucional.
Mais uma prova de que a Carta Magna em vigor (pelo menos,no ponto aqui
ventilado) quer acertar o passo com o Pais que, hoje, a oitava potncia econmica do
mundo vamos encontrar no inciso XXXVI do art. 5: As entidades associativas,
quando expressamente autorizadas, tm legitimidade para representar seus filiados
judicial ou extrajudicialmente Dilata a legitimao para agir em juzo. A pessoa
jurdica autorizada por seus estatutos ou por seus associados reunidos em assemblia
pode ingressar em juzo para defender interesse coletivo de seus filiados.
12 Celso Antonio Bandeira de Melo, curso de Direito Administrativo, 9ed. Malheiros, 1997. pp573-574 13 Retirado das anotaes em aula proferidas no Curso de Especializao em Direito Consumidor
2007, pela UCAM-Projeto A Vez do Mestre.
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2.4 A L.8.078/90 e sua repercusso na sociedade
Um dos mandamentos da L.8078/90, art.4 e no art.6, II, a educao e
informao de fornecedores e consumidores para garantir melhoria da qualidade de
vida, mediante o consumo adequado. E prev como um dos rgos de execuo da
Poltica Nacional das Relaes de Consumo, as Associaes de Defesa do Consumidor,
ampliando o debate para toda sociedade e outras reas do conhecimento. 14
Por exemplo, se discute muito atualmente, mesmo com metade da humanidade
situada abaixo da linha de pobreza, que j se consome 20% a mais do que a Terra
consegue renovar. Se a populao do mundo passasse a consumir como os americanos,
seriam necessrios mais trs planetas iguais a este para garantir produtos e servios
bsicos como gua, energia e alimentos para todo mundo. A busca por adotar padres
de produo e de consumo sustentveis um desses efeitos, que no so unicamente da
L.8078/90, mas certamente potencializados por ela. Para os pases ricos, isso significa,
por exemplo, procurar fontes de energia menos poluidoras, diminuir a produo de lixo
e reciclar o mximo possvel, alm de repensar sobre quais produtos e bens so
realmente necessrios para alcanar o bem-estar. Aos pases em desenvolvimento, que
tm todo o direito a crescer economicamente, cabe o desafio de no repetir o modelo
predatrio e buscar alternativas para gerar riquezas sem destruir florestas ou contaminar
fontes de gua.
Nesse processo, o consumidor consciente tem um papel fundamental. Nas suas
escolhas cotidianas, seja na forma como consome recursos naturais, produtos e servios,
seja pela escolha das empresas das quais vai comprar em funo de sua
responsabilidade social, pode ajudar a construir uma sociedade mais sustentvel e justa.
14 Retirado do site: http://www.akatu.net/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=9, em 20/09/2007
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Podemos citar alguns exemplos muito divulgados na mdia15:
Fast-food e aquecimento global
11 de Julho de 2006 Fonte: Instituto Akatu
Se "somos o que comemos", como diz o ditado, um estudo acadmico feito nos Estados
Unidos comprovou que nossos hbitos alimentares tm relao direta tambm com a
"sade" do planeta. De acordo com a pesquisa, adotar uma dieta vegetariana uma
forma simples de consumir sem agredir o meio ambiente, enquanto que hbitos
alimentares com predominncia de comida industrializada e rica em protena animal
contribuem diretamente para um dos problemas ambientais que mais ameaam o
mundo: o aquecimento global.
A pesquisa mostra que a produo, a estocagem e a conservao de alimentos
enlatados, embutidos e fast-food - todos com processamento industrial - responsvel
por cerca de 20% da queima de combustveis fsseis (derivados do petrleo) nos EUA.
Assim, a dieta tpica dos norte-americanos emite gases de efeito estufa em quantidade
equivalente a um tero da emisso de todos os carros, motos e caminhes do pas. Os
transportes so apontados como os principais causadores do superaquecimento do
planeta.
Mas ressaltam que pequenas mudanas nos hbitos alimentares das pessoas
podem ter um impacto positivo muito grande. "Se cada um que come dois
hambrgueres por semana cortasse essa quantidade pela metade, a diferena j seria
substancial", disse Eshel, professor-assistente em cincias geofsicas, ao jornal da
universidade.
Dessa forma, o consumidor consciente pode, por meio de sua escolha alimentar,
contribuir para no aprofundar o problema de aquecimento da Terra e mudanas
climticas decorrentes.Com informaes de A Tribuna Digital
15 Retirado do site: http://www.akatu.net/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=9, em 20/09/2007
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Consumo consciente a nica salvao da Amaznia
30 de Maro de 2006 Fonte: Instituto Akatu
Um estudo realizado pelos cientistas brasileiros Britaldo Soares-Filho e Daniel
Nepstad, e publicado no ltimo dia 23 pela revista inglesa Nature, indica que, mantido
o atual ritmo de devastao da floresta amaznica, 40% da maior cobertura vegetal do
planeta pode desaparecer at 2050. As consequncias disso podem facilmente ser
classificadas como catastrficas: alm da ameaa biodiversidade do habitat mais rico
da Terra, bilhes de toneladas a mais de dixido de carbono seriam lanadas na
atmosfera, contribuindo ainda mais para o aquecimento global.
So trs os maiores responsveis pela derrubada de rvores na Amaznia: a
pecuria extensiva, a monocultura de soja e o extrativismo ilegal de madeira. Essas
trs atividades econmicas tm como objetivo abastecer os mercados interno e externo
com carne vermelha, rao para aves e porcos, leo de cozinha e matria-prima para
fabricao de uma extensa gama de produtos que usam a madeira.
Na ponta dessa cadeia produtiva est o consumidor, o nico que tem poder para
mudar o panorama.
O poder de consumidor est na escolha. Mudar hbitos de consumo um desafio
grande, mas que pode ser vencido se houver a sensibilizao sobre a urgncia da
questo. Ao comer menos carne vermelha, alm de fazer bem sade, estaremos
diminuindo a demanda por pastagens. Optar por alimentos orgnicos (inclusive carne
de vaca e de frango), que so produzidos sob normas que preservam o meio ambiente, e
comprar apenas produtos feitos de madeira certificada so duas atitudes que
certamente contribuem muito para a preservao da Amaznia e outras florestas.
Como no h ainda no Brasil uma regulamentao sobre os alimentos orgnicos,
diversas certificadoras usam seus prprios critrios para dar o seu selo.
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As regras mais comuns para obter o selo de certificao incluem: a
desintoxicao do solo (fase de converso, que dura, aproximadamente, dois anos), a
no-utilizao de adubos qumicos e agrotxicos, a recomposio de matas ciliares, a
preservao de espcies nativas e mananciais, o respeito s normas sociais baseadas
nos acordos internacionais do trabalho e a no utilizao de sementes geneticamente
modificadas. Saiba mais sobre os orgnicos clicando aqui.
A certificao florestal, por sua vez, deixou de ser uma realidade distante para se
tornar uma realidade para o consumidor brasileiro..So produtos como material de
construo, mveis, objetos de decorao, utenslios domsticos, brindes, cosmticos,
material escolar e de escritrio, alm de livros e at alimentos, com a garantia de
origem ambientalmente correta, socialmente justa e economicamente vivel. Se o
consumidor final pode exercer sua responsabilidade ao adquirir produtos e servios, o
mesmo vale para os governos e as empresas. Um bom exemplo disso foi a medida do
governo estadual de So Paulo de pr em prtica um programa de compras
responsveis para a madeira nativa utilizada em obras e servios pblicos. O termo
estabelece que apenas madeira com origem em planos de manejo florestal ser aceita
dos fornecedores do governo, excluindo-se madeira de extrao predatria e
desmatamentos. So Paulo o primeiro estado da federao a participar do programa
"Cidade Amiga da Amaznia", do Greenpeace, que j est em andamento em 28
municpios brasileiros.
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Consumidor consciente exige nota fiscal
05 de Abril de 2006 Fonte: Instituto Akatu
Muitos brasileiros no pedem nota fiscal ao efetuar compras ou contratar
servios. Esse "descompromisso", porm, pode ter consequncias srias para a
economia e a sociedade. Sonegao de impostos e explorao de mo-de-obra so
alguns dos perigos inibidos pelo documento.
A nota fiscal comprova a existncia de um ato comercial (compra e venda de
mercadorias ou prestao de servios). Qualquer transao sem a devida
documentao, portanto, uma porta aberta para o famoso "caixa 2" - um dinheiro que
inexiste oficialmente, mas que pode ser usado, por exemplo, para a contratao de
pessoal sem o pagamento dos respectivos direitos trabalhistas.
Esse dinheiro "invisvel", que no consta do balano da empresa, tambm no
sofre a incidncia de impostos. Isto , a arrecadao do governo diminui, limitando
tambm sua capacidade de investimentos em servios populao.
A informalidade um mal para o Pas. De acordo com pesquisa da consultoria
McKinsey, 40% da renda brasileira gerada em atividades ilegais como contrabando,
pirataria e sonegao de impostos. O estudo conclui, ainda, que uma reduo de
apenas 20% na informalidade elevaria a taxa de crescimento do Brasil em 1,5 ponto
percentual ao ano, fazendo com que o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto)
chegasse a 5% ao ano.
Pelo respeito s leis e para o bem do Pas, o consumidor consciente exige nota
fiscal.
Alm disso, por trs do mercado informal esto organizaes criminosas que
roubam mercadorias, falsificam produtos e praticam o contrabando.
Com informaes da Folha de S.Paulo e Receita Federal
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Capitulo 3. As Aes Coletivas de consumo
Feitas as explicao necessrias iniciais passamos ao ponto central do tema.
3.1. Origem e conceitos
A Professora Ada Pelegrine Grinover16 ensina que, seja nos casos de controle
jurisdicional indispensvel, seja quando simplesmente uma pretenso deixou de ser
satisfeita por quem podia satisfaz-la, a pretenso trazida pela parte ao processo clama
por uma soluo que faa justia a ambos os participantes do conflito e do processo. Por
isso que se diz que o processo deve ser manipulado de modo a propiciar s partes o
acesso justia, o qual se resolve, na expresso muito feliz da doutrina brasileira
recente, em acesso ordem jurdica justa.
Acesso justia no se identifica, pois, com a mera admisso ao processo, ou
possibilidade de ingresso em juzo. Para que haja o efetivo acesso justia
indispensvel que o maior nmero possvel de pessoas seja admitido a demandar e a
defender-se adequadamente (inclusive em processo criminal), sendo tambm
condenveis as restries quanto a determinadas causas (pequeno valor, interesses
difusos), mas para a integralidade do acesso justia, preciso isso e muito mais
Para a efetividade do processo, ou seja, para a plena consecuo de sua misso
social de eliminar conflitos e fazer justia, preciso, de um lado, tomar conscincia dos
escopos motivadores de todo o sistema (sociais, polticos, jurdicos); e, de outro, superar
os bices que a experincia mostra estarem constantemente a ameaar a boa qualidade
do seu produto final. A histria do direito processual inclui trs fases metodolgicas
fundamentais.
16 Retirado de textos e anotaes das aulas de Ps-Graduao as grandes transformaes do
Processo, realizada no ano de 2006, pela Universidade do Mazonas em convnio com a rede de ensino
Luis Flavio Gomes.
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At meados do sculo passado, processo era considerado simples meio de
exerccio dos direitos (da, direito adjetivo, expresso incompatvel com a hoje
reconhecida independncia do direito processual). A ao era entendida como sendo o
prprio direito subjetivo material que, uma vez lesado, adquiria foras para obter em
juzo a reparao da leso sofrida. No se tinha conscincia da autonomia da relao
jurdica processual em face da relao jurdica de natureza substancial eventualmente
ligando os sujeitos do processo.
Nem se tinha noo do prprio direito processual como ramo autnomo do
direito e, muito menos, elementos para a sua autonomia cientfica.
Foi o longo perodo de sincretismo, que prevaleceu das origens at quando os
alemes comearam a especular a natureza jurdica da ao no tempo moderno e acerca
da prpria natureza jurdica do processo.A segunda fase foi autonomista, ou conceitual,
marcada pelas grandes construes cientficas do direito processual. Foi durante esse
perodo de praticamente um sculo que tiveram lugar as grandes teorias processuais,
especialmente sobre a natureza jurdica da ao e do processo, as condies daquela e
os pressupostos processuais, erigindo-se definitivamente uma cincia processual. A
afirmao da autonomia cientfica do direito processual foi uma grande preocupao
desse perodo, em que as grandes estruturas do sistema foram traadas e os conceitos
largamente discutidos e amadurecidos. Faltou, na segunda fase, uma postura crtica. O
sistema processual era estudado mediante uma viso puramente introspectiva, no exame
de seus institutos, de suas categorias e conceitos fundamentais; e visto o processo
costumeiramente como mero instrumento tcnico predisposto realizao da ordem
judicial material, sem o reconhecimento de suas conotaes deontolgicas e sem a
anlise dos seus resultados na vida das pessoas ou preocupao pela justia que ele
fosse capaz de fazer.
A fase instrumentalista, ora em curso, eminentemente crtica. O
processualista moderno sabe que, pelo aspecto tcnico-dogmtico, a sua cincia j
atingiu nveis muito expressivos de desenvolvimento, mas o sistema continua falho na
sua misso de produzir justia entre os membros da sociedade. preciso agora deslocar
o ponto-de-vista e passar a ver o processo a partir de um ngulo externo, isto ,
examin-los nos seus resultados prticos.
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Como tem sido dito, j no basta encarar o sistema do ponto-de-vista dos
produtores do servio processual (juzes, advogados, promotores de justia); preciso
levar em conta o modo como os seus resultados chegam aos consumidores desse
servio, ou seja, populao destinatria Para o desencadeamento desse novo mtodo,
crtico por excelncia, foi de muita relevncia o florescer do interesse pelo estudo das
grandes matrizes constitucionais do sistema processual.
Diz-se que, no decorrer dessa fase ainda em andamento, tiveram lugar trs
ondas renovatrias, a saber:
a) uma consistente nos estudos para a melhoria da assistncia judiciria aos
necessitados;
b) a segunda voltada tutela dos interesses supra-individuais, especialmente no
tocante aos consumidores e rigidez ambiental (interesses coletivos e interesses
difusos);
c) a terceira traduzida em mltiplas tentativas com vistas obteno de fins
diversos, ligados ao modo-de-ser do processo (simplificao e racionalizao de
procedimentos, conciliao, eqidade social distributiva, justia mais acessvel e
participativa, etc.).
A terceira fase est longe de exaurir o seu potencial reformista.J se obteve
tambm algum progresso no plano prtico, especialmente mediante a legislao
brasileira sobre pequenas causas (ampla assistncia jurdico-judiciria, simplificao
das formas, maior acessibilidade popular) e ao civil pblica (tutela jurisdicional a
interesses supra-individuais), alm das garantias constitucionais do mandado de
segurana coletivo (proteo a interesses homogneos de pessoas integrantes de
determinada categoria), da assistncia jurdica aos necessitados, da ao direta de
inconstitucionalidade aberta a diversas entidades representativas, da excluso das provas
obtidas por meios ilcitos etc, (cfr. respectivamente, lei n. 7.244, de 7.11.84, lei n. 7.347,
de 24.7.85, e Const., art. 5, incs. LXX, LXXIV, LVI, e art. 103). O Cdigo do
Consumidor constitui outra conquista dessa fase, especialmente no que toca ao
tratamento processual especfico ali estabelecido (v. lei n. 8.078, de 11.9.90).
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Como resultado de todo esse esforo da doutrina, hoje se podem destacar as
linhas evolutivas do direito processual, no exterior e especialmente no Brasil. O
processo tradicional vem sendo marcado por profundas alteraes me