acao civil publica - sbt - cumprimento da classificacao etar

43
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DE SÃO PAULO EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA VARA CÍVEL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL , pelos Procuradores Regionais dos Direitos do Cidadão infra-assinados, no uso de suas atribuições legais e constitucionais, vem, com fundamento no artigo 129, II, da Constituição brasileira e na Lei n.º 7.347/85, ajuizar a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA em face de TVSBT CANAL 04 DE SÃO PAULO S.A. , empresa concessionária do serviço público federal de radiodifusão, inscrita no CNPJ/MF sob o número 45.039.237/0001-14, sediada nesta subseção judiciária, na cidade de Osasco, na Avenida das Comunicações, 04, Bairro Vila Jaraguá, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas: 1

Upload: wadson-xavier

Post on 02-Oct-2015

229 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

sbt

TRANSCRIPT

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    EXCELENTSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA VARA CVEL DA SUBSEO JUDICIRIA DE SO PAULO.

    O MINISTRIO PBLICO FEDERAL, pelos Procuradores Regionais dos Direitos do Cidado infra-assinados, no uso de suas atribuies legais e constitucionais, vem, com fundamento no artigo 129, II, da Constituio

    brasileira e na Lei n. 7.347/85, ajuizar a presente

    AO CIVIL PBLICACOM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA

    em face de TVSBT CANAL 04 DE SO PAULO S.A., empresa concessionria do servio pblico federal de radiodifuso, inscrita no CNPJ/MF sob o nmero

    45.039.237/0001-14, sediada nesta subseo judiciria, na cidade de Osasco,

    na Avenida das Comunicaes, 04, Bairro Vila Jaragu, pelas razes de fato e

    de direito a seguir expostas:

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    I - INTRODUO

    A presente ao civil pblica busca conformar a programao

    televisiva da concessionria-r aos dispositivos constitucionais e legais que

    regulam a comunicao social no Brasil.

    Confome se apurou nas representaes instauradas no mbito

    deste rgo ministerial, de nmeros 1.34.001.002404/2004-26,

    1.34.001.002018/2005-15 e 1.34.001.001648/2004-91, a emissora-r vem

    perfunctoriamente apresentando inadequaes em sua grade de programao,

    desrespeitando por completo a classificao indicativa exarada pelo

    Departamento de Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao do Ministrio da

    Justia.

    No total foram exibidos mais de 120 programas contendo inadequaes, dentre eles o filme South Park: Maior, Melhor e Sem Cortes; os seriados Mulher Gato, Smallville, O Vidente, As Espis, Witchblade, Fastlane, Alis e The OC; a novela Madrasta e o programa comandado pelo apresentador Ratinho.

    Depois de apresentada a causa de pedir, sero pleiteadas

    obrigaes de no fazer em face da TVSBT, bem como a condenao da r ao

    pagamento de indenizao por danos morais coletivos causados imensa

    massa de telespectadores que teve contato com a programao irregularmente

    exibida. Tal indenizao dever ser revertida ao Fundo Nacional para a Criana

    e o Adolescente, previsto no art. 6 da Lei n. 8242/91.

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    II DOS FATOS

    1 DAS REPRESENTAES INSTAURADAS NO MPF

    A presente exordial tem como suporte as representaes de

    nmeros 1.34.001.002404/2004-26, 1.34.001.002018/2005-15 e 1.34.001.001648/

    2004-91, instauradas nesta Procuradoria da Repblica e que versam sobre a

    exibio de programas de televiso em horrio inadequado pela emissora SBT.

    1.1 DA REPRESENTAO N. 1.34.001.002404/2004-26

    O procedimento administrativo n. 1.34.001.002404/2004-26 foi

    instaurado a partir do ofcio PR/ES n. 01036/2004, oriundo da Procuradoria da

    Repblica no Estado do Esprito Santo, encaminhando representao feita por

    Glauder dos Santos Neumeg acerca da exibio, em horrio no apropriado,

    do filme SOUTH PARK: MAIOR, MELHOR E SEM CORTES pela emissora

    SBT (doc. 01).

    Autuados os referidos documentos na Procuradoria da

    Repblica no Estado de So Paulo, expediu-se o ofcio n. 9.316/2004 MPF-

    PR/SP requisitando emissora-r cpia do filme exibido com o respectivo

    aviso de classificao etria. Aps reiterao, o SBT encaminhou fita de vdeo

    contendo a gravao do filme SOUTH PARK: MAIOR, MELHOR E SEM

    CORTES (doc. 02), informando que o mesmo havia sido exibido em

    29/01/2004, por volta das 22h15. Na oportunidade, encaminhou tambm cpia da Portaria n. 109, de 24 de novembro de 2003, do Departamento de Justia,

    Classificao, Ttulos e Qualificao, segundo a qual referido filme, na

    modalidade programa (veculo televiso/distribuio TVSBT Canal 04 de So

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Paulo S/A), no era recomendado para menores de 18 (dezoito) anos, sendo, portanto, inadequado para antes das 23h00, nos termos do art. 2, inciso V, da Portaria MJ n. 796, de 08 de setembro de 2000 (doc. 02).

    Foi juntado aos autos relatrio descritivo do contedo do filme

    SOUTH PARK, em que se verifica a constante utilizao de palavres e

    palavras pornogrficas pelos personagens infantis e adultos (doc. 03).

    Este rgo ministerial oficiou novamente o SBT (ofcio n.

    17.014/2004 MPF-PR/SP), solicitando que informasse se o filme South Park

    fora colocado ao ar em rede nacional e o dia e horrio em que havia sido

    exibido pela emissora (se em 29/01/2004 ou 30/01/2004, como havia declarado

    o representante). Em resposta, informaram que o filme fora exibido dia

    30/01/2004 (retificando informao anterior de que havia sido exibido dia

    29/01/2004), em rede nacional, iniciando sua exibio s 22h15 (doc. 04).

    O Departamento de Justia, Classificao, Ttulos e

    Qualificao da Secretaria Nacional de Justia Ministrio da Justia, foi

    questionado, por meio do ofcio n. 17.015/2004 MPF-PR/SP, sobre o motivo

    pelo qual o filme em comento recebera a classificao indicativa no recomendado para menores de 18 anos, enquanto que nas modalidades cinema e DVD/vdeo, a classificao atribuda foi inadequado para menores de 14 anos. Em resposta, aquele departamento informou que a possibilidade de uma mesma obra receber diferentes classificaes de acordo com o meio

    de veiculao sempre esteve ligada percepo de que o acesso de crianas

    e adolescentes ao cinema e ao vdeo domstico (VHS ou DVD) seria mais

    difcil do que televiso, em especial aos canais abertos de radiodifuso

    televisiva. Encaminhou cpia das publicaes no Dirio Oficial da Unio

    4

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    referentes classificao indicativa do filme ora colocado em discusso (doc.

    05).

    Tendo em vista, portanto, que o filme fora exibido em horrio

    no apropriado, expediu-se ofcio ao Sistema Brasileiro de Televiso

    requisitando esclarecimentos acerca de sua transmisso antes do horrio

    permitido, bem como se naquela ocasio houvera advertncia ao pblico

    quanto classificao indicativa atribuda: programa no recomendado para

    menores de 18 anos, nos termos do art. 10, pargrafo nico, da Portaria MJ

    n. 796, de 08/09/2000 (doc. 06).

    Em resposta, aquela concessionria informou que praxe na

    grade de programao da TVSBT a advertncia dirigida ao telespectador no

    que tange ao tipo de atrao transmitida. Tal advertncia feita por meio de

    diversas cores empregadas na marca dgua da emissora, logotipo situado no

    canto inferior direito do monitor. Assim, afirma a r que durante a transmisso

    do filme em questo, a marca dgua fixada na tela tinha a cor vermelha,

    indicando que a atrao era desaconselhvel para menores. Contudo, o horrio de transmisso era inadequado (doc. 06).

    Em 02 de fevereiro de 2006, este rgo ministerial expediu

    ofcio ao Departamento de Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao

    Ministrio da Justia, solicitando informaes sobre todos os casos pretritos

    em que houve o descumprimento da classificao indicativa pela emissora SBT

    (doc. 07). Em resposta (doc. 07), informaram que h diversos procedimentos administrativos abertos naquele rgo, registrando (at aquela data) um TOTAL DE 119 PROGRAMAS EXIBIDOS EM HORRIO INADEQUADO.

    5

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    O Ministrio Pblico Federal encaminhou cpia das principais

    peas do procedimento administrativo em epgrafe Presidncia do Conselho

    de Comunicao Social do Congresso Nacional (ofcio n. 514/2005 MPF-

    PR/SP) e Promotoria de Justia de Defesa dos Interesses Difusos e Coletivos

    da Infncia e Juventude da Capital (ofcio n. 516/2005 MPF-PR/SP), a fim de

    que tomassem as providncias pertinentes.

    1.1.1 DO CONTEDO DO FILME SOUTH PARK: MAIOR, MELHOR E SEM CORTES

    Da anlise da fita VHS encaminhada pela concessionria-r

    (doc. 02), correspondente ao filme South Park: Maior, Melhor e sem Cortes,

    verificou-se a existncia de inmeras imagens contendo violncia, bem como

    de palavras obscenas e chulas, com as quais o pblico infanto-juvenil jamais

    poderia ter contato. Dentre elas, podemos citar:

    aps ouvir os palavres na sala de aula, um professor indaga

    o aluno: O que voc acha de ir falar com o diretor?. A criana devolve ao professor a seguinte pergunta: O que voc acha de chupar meu saco?;

    os personagens (crianas) apostam que um deles no

    conseguiria acender a prpria flatulncia. Ao tentar, o garoto se incendeia e levado ao hospital, onde submetido a uma violenta cirurgia e no resiste;

    seu esprito vai para o inferno, onde Sat o apresenta a seu

    parceiro do mal: Saddam Husseim, que fala palavres e palavras pornogrficas

    enquanto tortura Kenny. Sat e Sadam Husseim tm um caso amoroso;

    6

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    aparecem cenas em que Saddam e Sat, conversando a

    respeito da relao amorosa, utilizam muitos vocbulos pornogrficos como

    trepar, comer o rabo etc. Eles brincam com alguns pnis de brinquedo;

    enquanto um dos personagens est na cadeira eltrica, exala

    o seguinte comentrio: Isso pior do que aquele dia que voc colocou seu pau na minha boca e tirou uma foto;

    constatou-se, tambm, o uso das seguintes expresses, alm

    de vrias outras: FODE-PORCO, FODE-CAVALO, VIADINHO DE

    MERDA, COMEDOR DE JUMENTO, COME MEU CU E ME CHAMA DE

    VACA, VOC COMERIA SEU TIO?, CHUPE MEU SACO, CARA DE CU,

    FILHO DA PUTA, MAS QUE PORRA ESSA, BABACA CHUPA-PAU,

    CASSETE, CARALHO, VAI SE FODER, ONDE FICA O CLITRIS? etc;

    os personagens Sat e Saddam, principalmente este ltimo,

    usam muitas palavras pornogrficas em suas falas, tais como: TREPAR,

    MASSAGEAR OS MAMILOS, COMER O RABO, ESTOU MALVADINHA,

    SUA PUTA, VAMOS DAR UMAZINHA etc.

    Percebe-se, assim, que a utilizao de palavres e palavras

    pornogrficas pelas crianas e adolescentes atores muito freqente. Esses

    ltimos, alm dos palavres, soltam gases na cara das pessoas.

    de fundamental importncia ressaltar aqui que no houve

    qualquer impugnao administrativa do SBT classificao feita pelo Ministrio

    da Justia em relao ao filme em questo, o que demosntra, por si s, que a

    emissora concordou com ela, no que diz respeito inadequao das cenas e

    contedo do mesmo. Sendo assim, estava ciente de que ao exibir o fime

    7

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    estava lesando diretamente o pblico infanto-juvenil, pois reconheceu, ainda

    que indiretamente, que seu contedo era inapropriado.

    1.2 DA REPRESENTAO N. 1.34.001.001648/2004-91

    Por meio de notcia encaminhada pela Comisso de Direitos

    Humanos da Cmara dos Deputados, foi instaurada, no mbito desta

    Procuradoria da Repblica em So Paulo, a representao de n

    1.34.001.001648/2004-91, com o objetivo de apurar a exibio de cenas

    imprprias pelo Programa do Ratinho, em desacordo com a classificao

    indicativa estabelecida pelo Ministrio da Justia na Portaria de n 11, de

    09/11/1998 (doc. 08).

    O Ministrio da Justia realizou o monitoramento do programa

    no perodo de 3 (trs) a 13 (treze) de setembro de 2004, com o fim de verificar

    indequaes em seu contedo com a classificao exarada pelo MJ como

    inapropriado para antes das 21h00. Dentre as irregularidades verificadas

    durante o monitoramento, podemos citar abordagens homofbicas; vdeos pornogrficos com genitais mostra; consumo de substncias ilcitas; explorao sexual de mulheres; vdeo com cenas de uma tailandesa que usava uma zarabatana na vagina; vdeo com cenas de um homem que enrolava seu pnis em uma bengala (doc.08); cenas de uma cmera de segurana que mostra a retirada de um caixa eletrnico de uma pequena loja, com o comentrio subseqente do apresentador nestes casos o crime compensa; mulher escrevendo com uma caneta colocada na vagina etc (doc.09).

    8

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Salienta-se que, de acordo com a Portaria n. 796/2000 MJ (art. 2, pargrafo nico), a exibio de cenas pornogrficas com genitais mostra s permitida depois da meia-noite, fato este ignorado pela Requerida. Houve, portanto, total inadequao do contedo dos programas exibidos ao seu horrio de classificao, qual seja, 21h00.

    No decorrer da referida representao, foi constatado ainda

    que, no obstante o Programa do Ratinho tenha sido catalogado pelo Ministrio da Justia como programa no recomendado para menores de 14 anos, inadequado para antes das 21 horas, vinha sendo veiculado em horrio LIVRE, consoante atestam os ofcios expedidos pelo Diretor do Departamento de Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao do Ministrio da Justia (doc. 10).

    Infelizmente, o desrespeito s normas legais, mormente s

    prescries da Lei n 8.069/90, bem assim aos atos emanados dos rgos do

    Poder Executivo, uma conduta constante da emissora r, haja vista que tal

    fato ensejou tambm a instaurao de outro procedimento administrativo no

    mbito deste Ministrio Pblico Federal, o de n 1.34.001.002018/2005-15.

    1.3 DA REPRESENTAO N. 1.34.001.002018/2005-15

    Esta representao, encetada em virtude de ofcios remetidos

    pelo Diretor do Departamento de Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao

    do Ministrio da Justia, tem por objetivo apurar a exibio de seriados, por parte da concessionria-r, em horrio incompatvel com o que lhe fora determinado pelo Ministrio da Justia. Vejamos:

    9

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    seriado Mulher Gato: classificado como inadequado para

    menores de 12 anos e para exibio antes das 20h00. A

    emissora admite, entretanto, ter optado por exibi-lo em horrio

    livre (doc. 11).

    seriado The OC Um estranho no paraso: classificado

    como inadequado para menores de 14 anos e para exibio

    antes das 21h00. A emissora admite ter optado por exibi-lo em

    horrio livre (doc. 12).

    seriado Witchblade: classificado como inadequado para

    menores de 14 anos e para exibio antes das 21h00. A

    emissora admite ter optado por exibi-lo em horrio livre (doc.

    13).

    seriado Fastlane: classificado como inadequado para

    menores de 16 anos e para exibio antes das 22h00, contudo

    exibido aos domingos, s 9h00 (horrio livre). A emissora no

    quis se manifestar respeito (doc. 14).

    seriado Alias: classificado como inadequado para menores

    de 12 anos e para exibio antes das 20h00. A emissora

    admite, entretanto, ter optado por exibi-lo em horrio livre (doc.

    15).

    Cumpre sublinhar que, atualmente, a emissora r vem exibindo

    em sua grade de programao apenas os seriados O Vidente, The OC e

    Smallville, embora ainda persista em contrariar o horrio estabelecido

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    pelo Ministrio da Justia, consoante evidenciam os documentos acostados a esta exordial (doc. 16).

    2 DO CABIMENTO DA PRESENTE AO CIVIL PBLICA

    Percebe-se, assim, da simples leitura que se faa dos

    expedientes acima transcritos, que a emissora exibiu o filme, as sries e o

    programa em comento em total desconformidade com a classificao

    formulada pelo Departamento de Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao,

    rgo do Ministrio da Justia com atribuio para informar sobre a natureza

    das diverses e espetculos pblicos, as faixas etrias a que no se

    recomendem, bem como locais e horrios em que sua apresentao se mostre

    inadequada para crianas e adolescentes.

    Resta claro e notrio, desta feita, que a concessionria r

    desrespeitou no s as normas preventivas da Lei 8.069/90, como tambm os

    atos emanados do Ministrio da Justia, o que implica em agresso ao

    telespectador, em especial, crianas e adolescentes que assistiram ao

    programa, dando ensejo, por conseguinte, propositura da presente Ao Civil

    Pblica.

    3 DA CLASSIFICAO INDICATIVA DOS PROGRAMAS - INADEQUAO NO HORRIO DE TRANSMISSO

    Como podemos extrair do artigo 21, inciso XVI, da CF, o

    constituinte atribuiu Unio a competncia para exercer a classificao

    indicativa da programao de rdio e televiso:

    Art. 21.Compete Unio:

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    (...)

    XVI exercer a classificao, para efeito indicativo, de diverses

    pblicas e de programao de rdio e televiso;

    O Ministrio da Justia, rgo da Administrao Pblica Direta,

    por meio do Decreto 4.720/2003 (doc.17), recebeu a delegao de exercer a

    classificao sobre a qual dispe o artigo constitucional, fazendo-o por meio do

    Departamento de Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao, que, para dar

    cumprimento a esta tarefa, emite Portarias.

    Tendo isso em vista, quando da entrada em vigor do Estatuto

    da Criana e do Adolescente, aquele rgo editou a Portaria n. 796/00 (doc. 17), na qual traou os critrios para classificar por horrio e idade a

    programao de rdio e televiso:

    Art. 2. Os programas para emisso de televiso, inclusive

    traillers, tm a seguinte classificao, sendo-lhes terminantemente vedada a exibio em horrio diverso do

    permitido:I veiculao em qualquer horrio: livre;

    II programa no recomendado para menores de doze anos: inadequado para antes das vinte horas;

    III programa no recomendado para menores de quatorze anos: inadequado para antes das vintes e duas horas;

    V programa no recomendado para menores de dezoito anos: inadequado para antes das vintes e trs horas.

    Pargrafo nico. Os programas de induo de sexo, tais como tele-

    sexo e outros afins, somente podero ser veiculados entre zero

    hora e cinco horas.

    (grifamos)

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Com vistas a dar cumprimento ao dispositivo legal supra-

    citado, aos artigos 21, XVI e 220, 3, I, ambos da Constituio Federal, e ao

    artigo 74 da n. Lei 8.069/90 (ECA), o Departamento de Justia, Classificao,

    Ttulos e Qualificao do Ministrio da Justia classificou o filme South Park,

    os seriados Mulher Gato, The OC, Witchblade, Fastlane e Alias, bem

    como o progrma Ratinho da seguinte forma:

    SOUTH PARK

    Portaria n. 109 de 24/11/2003 (doc.17)

    Filme: SOUTH PARK: MAIOR, MELHOR E SEM CORTES (SOUTH

    PARK: BIGGER, LONGER AND UNCUT, Estados Unidos da

    Amrica 1995).

    Distribuidor (es): TVSBT Canal 04 de So Paulo S/A

    Gnero: Desenho Animado

    Veculo: Televiso

    Tipo de Anlise: Fita VHS

    Classificao: Programa no recomendado para menores de 18

    anos: Inadequado para antes das vinte e trs horas

    Impropriedade (s): Temtica Adulta, Conflitos Psicolgicos e

    Desvirtuamento de Valores.

    Contudo, no dia 30 de janeiro de 2003, a emissora - r, a

    despeito do que determina a Portaria n. 109/03, exibiu o filme

    em questo s 22h15.

    PROGRAMA RATINHO

    Portaria n. 11, de 09 de novembro de 1998, de publicada no Dirio

    Oficial da Unio no dia 12 de novembro de 1998: classificado como

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    programa no recomendado para menores de 14 anos - inadequado

    para exibio antes das 21h00 (doc.17).

    Contudo, o programa foi exibido por diversas vezes em horrio

    desapropriado, como por exemplo, s 16h30, 17h00, 17h30 e

    18h50 (livre).

    SERIADO MULHER GATO

    Classificao Publicada no Dirio Oficial da Unio no dia 06 de

    janeiro de 2004 Portaria n. 05/01/2004: programa no

    recomendado para menores de 12 anos inadequado para exibio

    antes das 20h00 (doc.17).

    A emissora admite, entretanto, ter exibido a srie em horrio

    livre.

    SERIADO THE OC UM ESTRANHO NO PARASO

    Portaria n. 154 de 16/08/2004, publicada no Dirio Oficial da Unio

    no dia 17 de agosto de 2004: classificado como inadequado para

    menores de 14 anos e para exibio antes das 21h00 (doc.17).

    A emissora admite ter exibido a srie em horrio livre.

    SERIADO WITCHBLADE

    Classificao Publicada no Dirio Oficial da Unio no dia 30 de

    outubro de 2003 Portaria n. 93 de 29/10/2003: programa no

    recomendado para menores de 14 anos - inadequado para exibio

    antes das 21h00 (Portaria n. 93 de 29/10/2003 doc.17).

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    A emissora admite ter exibido a srie em horrio livre.

    SERIADO FASTLANE

    Classificao Publicada no Dirio Oficial da Unio no dia 01 de

    agosto de 2003 Portaria n. 54 de 31/07/2003: programa no

    recomendado para menores de 16 anos inadequado para exibio

    antes das 22h00 (doc.17).

    Contudo, a srie era exibida aos domingos, s 9h00 (horrio

    livre). A emissora no quis se manifestar a respeito.

    SERIADO ALIAS

    Classificao Publicada no Dirio Oficial da Unio no dia 06 de

    janeiro de 2004: programa no recomendado para menores de 12

    anos - inadequado para exibio antes das 20h00 (Portaria n. 04 de

    05/01/2004 doc. 17).

    A emissora admite ter exibido a srie em horrio livre.

    Diante disso, de fcil e notria concluso que a Requerida desrespeitou a classificao exarada pelo Ministrio da Justia, infringindo, destarte, dispositivos insertos na Magna Carta, no Estatuto da Criana e do Adolescente e na Portaria n. 796 do prprio Ministrio da Justia, o que implica em agresso ao telespectador, em especial, crianas e adolescentes que assistiram e continuam a assitir a programas completamente imprprios e inadequados para suas faixas etrias.

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Impende ressaltar que a vedao da exibio de determinados contedos em horrios de televiso normalmente assistidos por crianas e adolescentes no configura nenhuma forma de censura, j que a emissora no est impedida de veicul-los em horrio apropriado, segundo os critrios objetivos fixados pelo rgo federal competente.

    III DO DIREITO

    1 DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTRIO PBLICO

    O Ministrio Pblico o rgo ao qual a Constituio Federal

    incumbiu a guarda dos interesses individuais e coletivos que sejam

    indisponveis. Assim, suas funes institucionais esto determinadas naquela

    Carta Fundamental:

    "Art. 129. So funes institucionais do Ministrio Pblico:

    (...)

    II-zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Pblicos e dos servios de

    relevncia pblica aos direitos assegurados nesta Constituio,

    promovendo as medidas necessrias a sua garantia;

    III-promover o inqurito civil e a ao civil pblica, para a proteo do

    patrimnio pblico e social, do meio ambiente e de outros interesses

    difusos e coletivos;

    No mesmo sentido dispem os artigos 1 e 2 da Lei

    Complementar n. 75 de 1993:

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    "Art. 1 O Ministrio Pblico da Unio, organizado por esta Lei

    Complementar, instituio permanente, essencial funo

    jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurdica,

    do regime democrtico, dos interesses sociais e dos interesses

    individuais indisponveis.

    Art. 2 Incumbem ao Ministrio Pblico as medidas necessrias

    para garantir o respeito dos Poderes Pblicos e dos servios de

    relevncia pblica aos direitos assegurados pela Constituio

    Federal.

    Tais normas j demonstram de forma inabalvel a legitimao

    do Parquet para atuar no feito em causa. No entanto, vale acostar ainda

    dispositivos outros consignados na referida Lei Complementar, in verbis:

    "Art. 5 So funes institucionais do Ministrio Pblico da Unio:

    ...

    III - a defesa dos seguintes bens e interesses:

    ...

    e)os direitos e interesses coletivos, especialmente das comunidades

    indgenas, da famlia, da criana, do adolescente e do idoso;

    ...

    V - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Pblicos da Unio e dos

    servios de relevncia pblica quanto:

    a)aos direitos assegurados na Constituio Federal relativos s

    aes e aos servios de sade e educao;

    "Art. 6 Compete ao Ministrio Pblico da Unio:

    ...

    VII - promover o inqurito civil e a ao civil pblica para:

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    a) a proteo dos direitos constitucionais;

    ...

    c) a proteo dos interesses individuais indisponveis, difusos e

    coletivos, relativos s comunidades indgenas, famlia, criana,

    ao adolescente, ao idoso, s minorias tnicas e ao consumidor;"

    Saliente-se, outrossim, que a prpria Lei de Ao Civil Pblica

    (n 7.347/95), em seu artigo 5, tambm proclama a legitimidade do Ministrio

    Pblico para a proteo dos direitos difusos relativos aos cidados em geral, a

    saber:

    "Art. 5. A ao principal e a cautelar podero ser propostas pelo

    Ministrio Pblico, pela Unio, pelos Estados e Municpios. Podero

    tambm ser propostas por autarquia, empresa pblica, fundao,

    sociedade de economia mista ou associao".

    Sem excluir a possibilidade de outros legitimados promoverem

    a defesa das crianas e adolescentes, estabelece o ECA meios de defesa em

    complementaridade ao disposto no artigo 220, 3 da CF/88, assim dispondo

    em seu artigo 201:

    Art. 201. Compete ao Ministrio Pblico:

    (...)

    V - Promover o inqurito civil e a ao civil pblica para a proteo

    dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos infncia e

    adolescncia, inclusive os definidos no artigo 220, 3, inciso II, da

    Constituio Federal;

    De fato, estamos diante de legtimo INTERESSE DIFUSO, como j apontou Barbosa Moreira, em artigo sobre o tema:

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    O INTERESSE EM DEFENDER-SE DE PROGRAMAS OU PROGRAMAES DE RDIO E TELEVISO QUE CONTRARIEM

    O DISPOSTO NO ART. 221 ENQUADRA-SE COM JUSTEZA NO CONCEITO DE INTERESSE DIFUSO. (...) Com efeito: em

    primeiro lugar, ele se caracteriza, evidncia, como TRANSINDIVIDUAL, j que no pertence de modo

    singularizado, a qualquer dos membros da comunidade, seno a um conjunto indeterminado e, ao menos para fins prticos,

    indeterminvel de seres humanos. Tais seres ligam-se uns aos outros pela mera circunstncia de fato de possurem

    aparelhos de televiso ou, na respectiva falta, costumarem valer-se do aparelho do amigo, do vizinho, do namorado, do

    clube, do bar da esquina ou do salo de barbeiro. E ningum hesitar em qualificar de INDIVISVEL o objeto de semelhante

    interesse, no sentido de que cada canal, num dado momento, transmite a todos a mesma e nica imagem, nem se concebe

    modificao que se dirija s ao leitor destas linhas ou ao rabiscador delas1.

    Isto posto, resta patente a legitimatio ad causam do rgo

    Ministerial para a propositura desta ao.

    2 DA COMPETNCIA DA JUSTIA FEDERAL

    Pensamos que j est esclarecido o motivo da demanda ter

    sido proposta perante a Justia Federal: a empresa r CONCESSIONRIA DE UM SERVIO PBLICO FEDERAL, nos termos do art. 21, inciso XII, a, c.c. o art. 223 da Constituio.

    1 Ao Civil Pblica e Programao de TV, op. cit., pp. 243-244. No mesmo sentido, cf. o artigo de Rodolfo de Camargo Mancuso, Controle jurisdicional do contedo da programao televisiva in Boletim dos Procuradores da Repblica n. 40, agosto de 2001, pp. 20-29.

    1

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    A propsito, o art. 5, inciso IV, da Lei Orgnica do Ministrio

    Pblico da Unio (Lei Complementar Federal n. 75/93), confere ao Ministrio

    Pblico Federal atribuio expressa para zelar pelo efetivo respeito dos meios

    de comunicao social aos princpios, garantias, condies, direitos, deveres e

    vedaes previstos na Constituio Federal e na lei, relativos comunicao

    social.

    Como o Ministrio Pblico Federal rgo integrante da Unio,

    a ao que prope em defesa dos usurios do servio federal concedido deve,

    necessariamente, ser endereada Justia Federal, consoante dispe o art.

    109, inciso I, da Constituio.

    Citamos, em corroborao, os seguintes julgados:

    CONFLITO DE COMPETNCIA. MANDADO DE SEGURANA.

    DIRIGENTE DE CONCESSIONRIA DE SERVIO PBLICO

    FEDERAL. PRECEDENTES. 1.Consoante assentado pela eg. 1.

    Seo deste Tribunal, a Justia Federal competente para

    processar e julgar mandado de segurana contra ato de dirigente de

    concessionria de servio pblico federal. 2. Conflito conhecido para

    declarar competente o juzo federal da 2a. Vara de Niteri-RJ,

    suscitante.2

    "CONFLITO DE COMPETNCIA. MANDADO DE SEGURANA.

    ATO DE DIRIGENTE DE CONCESSIONRIA DE ENERGIA

    ELTRICA. SUSPENSO DO FORNECIMENTO. FUNO

    FEDERAL DELEGADA. CONFLITO CONHECIDO PARA

    DECLARAR COMPETENTE O JUZO FEDERAL DA 2 VARA DE

    NOVO HAMBURGO-SJ/RS, O SUSCITADO."3

    2 STJ - CC n. 14.804/RJ - Rel. Min. Francisco Peanha Martins - DJ de 19.08.1996.3 STJ - CC n. 33.837/RS - Rel. Min. Luiz Fux - DJ de 08.04.2002.

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    PROCESSUAL MINISTRIO PBLICO FEDERAL PARTE

    COMPETNCIA JUSTIA FEDERAL.

    Se o Ministrio Pblico Federal parte, a Justia Federal

    competente para conhecer do processo.4

    "EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL.

    MINISTRIO PBLICO. AO CIVIL PUBLICA. 1. O Ministrio

    Pblico instituio nacional, subordinada aos princpios de

    unidade, indivisibilidade e independncia funcional (CF. art. 127), e

    compreende o Ministrio Pblico da Unio e o dos Estados (CF, art.

    128). 2. A atuao dos agentes do Ministrio Pblico se d em forma

    estruturalmente organizada e mediante repartio de atribuies. 3.

    incompatvel com os princpios de regncia da instituio e do

    sistema de repartio de atribuies a atuao do Ministrio Pblico

    Estadual, fora do seu Estado ou fora da jurisdio estadual. 4.

    Compete ao Ministrio Pblico da Unio, e no ao do Estado,

    exercer as funes institucionais do rgo relativas a promoo de

    aes civis pblicas de competncia da Justia Federal."5

    Em virtude dos fundamentos ora assinalados, no pairam

    dvidas que a lide em testilha deve ser processada e julgada pela Justia

    Federal.

    3 DO MRITO PROPRIAMENTE DITO

    4 STJ - CC n 4.927-0-DF - DJU de 4/10/93 - Rel. Min. Humberto Gomes Barros.5 TRF 4 Regio - AC 91.04.13275-0 2 Turma - Relator Des. Teori Albino Zavascki j. 17/10/91 - DJU 06/11/91, p. 27.825.

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    A Constituio da Repblica, ao mesmo tempo em que

    garantiu a liberdade de expresso da atividade intelectual, artstica, cientfica e

    de comunicao, independentemente de censura ou licena (art. 5, IX),

    estabeleceu limites ao exerccio dessa liberdade, sobretudo quando a

    expresso veiculada por intermdio dos meios de comunicao de massa.

    Tais limites esto indicados nos arts. 220 e 221 da Carta de 1988.

    Alm disso, o art. 227 da Lei Maior determina ser dever do

    Estado colocar crianas e adolescentes a salvo de toda forma de violncia,

    sendo certo que a mera exposio de jovens e crianas a cenas de violncia

    excessiva j , por si s, um ato de violncia.

    No mbito infraconstitucional, o Estatuto da Criana e

    Adolescente (Lei Federal n. 8.069/90) determina, em seu art. 71, que a criana

    e o adolescente tm direito a diverses e espetculos que respeitem sua

    condio peculiar de pessoa em desenvolvimento.

    Mais especificamente, no tocante ao objeto desta ao, o

    mesmo diploma legal estabelece, em seu art. 75, que toda criana ou

    adolescente ter acesso s diverses classificadas como adequadas sua

    faixa etria, bem como, em seu art. 76, que as emissoras de televiso somente

    exibiro, no horrio recomendado para o pblico infanto-juvenil, programas

    com finalidades educativas, artsticas, culturais e informativas.

    No mesmo sentido, o art. 74 do Estatuto da Criana e do

    Adolescente atribui ao Poder Pblico regular as diverses e espetculos

    pblicos, informando a natureza deles, as faixas etrias a que no se

    recomendem, locais e horrios em que sua apresentao se mostre

    inadequada. Tal regulamentao, por fora da Portaria n 796/2000, editada

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    pelo Ministro da Justia, compete, consoante j assinalado, ao Departamento

    de Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao.

    Vejamos:

    Art. 74. O poder pblico, atravs do rgo competente, regular as

    diverses e espetculos pblicos, informando sobre a natureza

    deles, as faixas etrias a que no se recomendem, locais e horrios

    em que sua apresentao se mostra inadequada.

    Pargrafo nico. Os responsveis pelas diverses e espetculos

    pblicos devero afixar, em lugar visvel e de fcil acesso, entrada

    do local de exibio, informao destacada sobre a natureza do

    espetculo e a faixa etria especificada no certificado de

    classificao.

    Art. 75. Toda criana ou adolescente ter acesso s diverses e

    espetculos pblicos classificados como adequados sua faixa

    etria.

    Pargrafo nico. As crianas menores de dez anos somente podero

    ingressar e permanecer nos locais de apresentao ou exibio

    quando acompanhadas dos pais ou responsvel.

    Art. 76. As emissoras de rdio e televiso somente exibiro , no

    horrio recomendado para o pblico infanto-juvenil, programas com

    finalidades educativas, artsticas, culturais e informativas.

    Pargrafo nico. Nenhum espetculo ser apresentado ou

    anunciado sem aviso de sua classificao, antes de sua

    transmisso, apresentao ou exibio.

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Como se sabe, as emissoras de rdio e televiso recebem,

    obrigatoriamente, certificado de classificao de seus programas, definindo

    horrios de apresentao. Essa informao deve ser repassada ao ouvinte ou

    telespectador antes da apresentao do programa, j que esses veculos de

    comunicao entram na casa das pessoas, sem que aos pais seja muitas

    vezes possvel triar aquilo que pode ser assistido ou ouvido por seus filhos.

    Se os horrios de classificao fossem respeitados, poderiam

    os responsveis pelas crianas e adolescentes selecionar a programao,

    evitando que assistam espetculos absolutamente desaconselhveis para suas

    idades.

    Cumpre aqui ressaltar que o Estatuto da Criana e do

    Adolescente, em seu artigo 254, penaliza a conduta adotada pela

    concessionria que no respeitar a classificao indicativa imposta pelo

    Ministrio da Justia:

    Art.254. Transmitir, atravs de rdio ou televiso, espetculo em

    horrio diverso do autorizado ou sem aviso de sua classificao:

    Pena multa de vinte a cem salrios de referncia; duplicada em

    caso de reincidncia a autoridade judiciria poder determinar a

    suspenso da programao da emissora por at dois dias.

    Ao comentar mencionado artigo, Jos Luiz Mnaco da Silva

    assim disserta:

    Segue-se, pois, que a ilicitude da conduta repousa na

    transmisso, atravs do rdio ou televiso, de espetculo: a) em horrio diverso do autorizado no certificado de

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    classificao; b) sem aviso de sua classificao. Na primeira hiptese, a emissora transmite espetculo em desacordo

    com o certificado de classificao emitido; tal programao, veiculada naquele horrio, completamente inadequada ao

    pblico infantil ou juvenil. J na segunda hiptese, o espetculo, ainda que adequado a esse pblico, ressente-se de

    prvio anncio atinente sua classificao.6

    De acordo com o dispositivo legal acima citado, criado com o

    objetivo de evitar a exibio dos programas no recomendveis ao pblico

    infanto-juvenil em horrios acessveis a estes, PROIBIDA a transmisso, por intermdio de televiso, de espetculos em horrios diversos do autorizado e

    sem aviso de sua classificao.

    A dico do artigo 76 do ECA clara: as emissoras de rdio e

    televiso somente exibiro, no horrio recomendado para o pblico

    infanto-juvenil, programas com finalidades educativas, artsticas, culturais e

    informativas

    , portanto, terminantemente vedada a exibio em horrio diverso do permitido, fato este no observado pela Requerida quando da exibio dos programas em comento.

    Ademais, todo o arcabouo legal em defesa do consumidor, em

    particular o Cdigo de Defesa do Consumidor, subsume-se inteiramente ao

    presente caso, visto que os telespectadores caracterizam-se, indubitavelmente,

    como consumidores dos servios prestados pelas emissoras de televiso.

    6 Jos Luiz Mnaco da Silva, Estatuto da Criana e do Adolescente So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1994, p. 427.

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Saliente-se, assim, que o diploma legal acima citado

    estabelece, em seu art. 6, inciso I, que so direitos do consumidor a proteo

    da vida, sade e segurana contra os riscos provocados por prticas no

    fornecimento de produtos e servios considerados perigosos ou nocivos.

    Feitas estas ponderaes, resta claro que, ao transmitir programas em horrio diverso do estabelecido pela autoridade administrativa, a empresa-r descumpriu com as obrigaes que lhe haviam sido outorgadas pelos diversos dispositivos legais outrora anotados, colocando em risco o desenvolvimento de seus telespectadores infanto-juvenil, pelo que urge a interveno do Judicirio para fins de coibir tal prtica abusiva.

    Em relao influncia exercida no desenvolvimento infanto-

    juvenil por meio da televiso, a prpria Conveno Sobre os Direitos da

    Criana, cujo objeto a proteo moral da infncia e da adolescncia, prev

    expressamente a importncia dos meio de comunicao de massa para a

    formao da personalidade da criana. Ademais, uma pesquisa realizada na

    Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, diz que a exposio

    das crianas ao sexo e violncia nos meios de comunicao aumenta a

    prosmicuidade, bem como intensifica o comportamento agressivo das crianas

    (doc. 18).

    Os experts na rea de psicologia infantil, em tom unssono,

    apontam para o fato de que o excesso de cenas de violncia e de sexo na

    televiso atuam como fator decisivo nos desvios e abusos sexuais praticados

    pelos adultos. 7

    7Nas origens da psicanlise, Sigmund Freud atribuiu as neuroses dos adultos a traumas infantis, estabelecendo uma conformidade entre a extenso dos danos decorrentes do trauma e a vulnerabilidade do indivduo.

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Esse pblico no poderia, portanto, ficar sujeito a

    programaes que no se identificassem com os princpios constitucionais e

    legais vigentes, quando sabido que crianas e adolescentes so pessoas em

    estgio de desenvolvimento sensorial, mental e fsico, plenamente capazes de

    sofrer influncias de toda a ordem.

    Doutra banda, h que se ter em mente que o cumprimento das

    obrigaes consignadas nos dispositivos ora colacionados no representam

    qualquer embarao liberdade da empresa-r, visto que a medida reclamada no importa em excluso dos programas retromencionados da grade de programao da mesma, os quais podero continuar a ser veiculados, mas no horrio adequado.

    Nesse sentido, colacionamos o entendimento de Anderson de

    Oliveira Alarcon e Humberto Quirino:

    Druzio Varella afirma que nos Estados Unidos, pas com o maior nmero de aparelhos por habitante, a autoridade mxima de sade pblica "Surgeon General", j afirmava em comunicado nao, em 1972: "A violncia na televiso realmente tem efeitos adversos em certos membros da nossa sociedade". Segundo Varella, desde ento, a literatura mdica j publicou sobre o tema 160 estudos de campo (que envolveram 44.292 participantes) e 124 estudos laboratoriais com 7.305 participantes. E acrescenta: "Absolutamente todos demonstraram a existncia de relaes claras entre a exposio de crianas violncia exibida pela mdia e o desenvolvimento de comportamento agressivo". (Violncia na TV in Observatrio da Imprensa. So Paulo, edio de maio de 2002).

    Sobre a programao infantil, a UNESCO apresentou em 1998 um relatrio de estudo global sobre violncia na mdia, nos anos de 1996/97. A amostra foi formada por um ncleo original de 23 pases, entre eles o Brasil, num universo de 5.000 crianas de 12 anos. 93% das crianas tinham acesso TV e passavam pelo menos 50% mais tempo assistindo a esse meio do que qualquer outra atividade extra-aula. Os meninos so mais fascinados pelos heris agressivos. Os heris da mdia so utilizados pelas crianas como escapismo e compensao por seus problemas. As vises de mundo das crianas so obviamente influenciadas pelas experincias reais tanto quanto pelos meios de comunicao.

    A forma como exibida uma situao determina sua implicao no comportamento da criana. Campanhas de dio, ou a glorificao da violncia acentuam as caractersticas de "recompensa" da agresso extrema. As crianas, em geral, no tm capacidade para distinguir entre realidade e fico. Se as crianas ficam permanentemente expostas a mensagens que promovem a violncia como um divertimento ou uma atitude adequada para resolver problemas ou adquirir status, torna-se muito alto o risco de que elas venham a aprender sobre essas atitudes e padres de comportamento (CECCARELLI, P.R. Violncia e TV. Belo Horizonte, mar. 2002.)

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    No seria nem razovel nem inteligente pregar a censura ou

    qualquer medida que tenha essa conotao. As famlias e a

    sociedade tm, no entanto, o direito de exigir sistemas de controle que evitem distores de contedo e inadequaes

    nos horrios de transmisso. Tm tambm o direito de esperar que as fantsticas potencialidades da televiso no se

    convertam em elementos de desintegrao social. Instalada nos recessos das casas, mostrando instintivamente heris e viles

    muitas vezes sem promover a diferena entre ambos exibindo sexo e violncia com intensidade e freqncia, a televiso de

    transformou em algo que j no pode ser ignorado. um veculo muito importante para que seu contedo fique apenas

    sob a responsabilidade das empresas que a exploram, seja do poder que a coordena, seja do arbtrio dos milhes de crianas,

    que so suas usurias. 8 (grifamos)

    Abrindo um parnteses, impende, a essa altura, transcrever

    valiosos trechos do artigo "Ao Civil Pblica e Programao da TV", do

    brilhante Professor JOS CARLOS BARBOSA MOREIRA, o qual serve de

    fundamento presente causa, no que diz respeito extenso do pedido em

    questo e impossibilidade de se argumentar no sentido de que eventual

    atuao jurisdicional aqui caracterizaria censura aos meios de comunicao:

    "Se certo, como se mostrou acima, que encontra lugar entre os

    interesses difusos o dirigido observncia, pelas emissoras de

    televiso, dos preceitos constantes do art. 221 da Lei Maior,

    segue-se, em lgica elementar, que a ao civil pblica,

    disciplinada na Lei 7.347, instrumento adequado vindicao

    8 Anderson de Oliveira Alarcon; Humberto Quirino. Programao Televisiva para Crianas e Adolescentes: limites e possibilidades de controle Maring, PR : [s.n.], 2003, p. 74.

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    de semelhante interesse em juzo. Ela constitui, sem discusso

    possvel, um dos "meios legais que, de acordo com o art. 220,

    3o, n. III, devem garantir " pessoa e famlia que contrariem o

    disposto no art. 221"; isto : que no dem a indispensvel

    preeminncia a "finalidades educativas, artsticas, culturais e

    informativas", ou que no respeitem os "valores ticos e sociais

    da pessoa e da famlia" para s nos referirmos aos princpios

    (que aqui mais nos instruem) dos incs. I e IV.

    (...)

    A Lei 7.347, em seu art. 3o, aduz que: "A ao civil poder ter

    por objeto a condenao em dinheiro ou o cumprimento de

    obrigao de fazer ou no fazer". Significa isso que, procedente

    o pedido, tem o rgo judicial a possibilidade de proibir a

    exibio do programa incompatvel com a Constituio, e bem

    assim, em termos gerais, a de impor emissora que adapte sua

    programao s diretrizes do art. 221. Atente-se, ao propsito,

    no art. 11 da Lei 7.347: "Na ao que tenha por objeto o

    cumprimento da prestao da atividade devida ou a cessao da

    atividade nociva, sob pena de execuo especfica, ou de

    cominao de multa diria, se esta for suficiente ou compatvel,

    independentemente de requerimento do autor" (cf. o art. 213 e

    seu 2 o do Estatuto da Criana e do Adolescente).

    (...)

    Ademais, por fora da remisso do art. 21 do Titulo III do Cdigo

    de Defesa do Consumidor, incidem as disposies do respectivo

    art. 84, de resto incorporadas recentemente ao Cdigo de

    Processo Civil: pode o juiz, por exemplo, aplicar multa

    emissora, ou determinar medidas como busca e apreenso ou

    impedimento da atividade nociva, inclusive mediante requisio

    de fora policial (Lei 8.078, art. 84, 4o e 5o).

    (...)

    2

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    No assunto de que se trata, porm, a questo est resolvida a

    priori pela Constituio mesma, que, bem ou mal, optou, e cuja

    opo vinculativa para a comunidade nacional. vista do art.

    221, h um tipo de interesse difuso julgado merecedor de tutela

    jurdica, qual no pode aspirar, de seu lado, o interesse que se

    lhe contrape. Quem quiser dar pasto ao sadismo, ao

    voyeurismo ou pura e simples "grossura" dispe naturalmente

    da possibilidade de recorrer, dentro de certos limites,.a outros

    meios, que no este o lugar prprio para relacionar; no tem

    como exigir, todavia, que o satisfaam por intermdio da telinha.

    Seria absurdo que o ordenamento jurdico viesse a proteger, de

    alguma forma, pretenso avessa aos seus prprios ditames.

    (...)

    A outra objeo previsvel usar como ponto de apoio a

    disposio constitucional que veda "toda e qualquer censura de

    natureza poltica, ideolgica e artstica" (art. 220, 2o). Da

    certamente querer algum tirar que no lcito autoridade

    alguma interferir na programao da TV, seja para proibir tal ou

    qual exibio, seja de maneira mais geral para for-la a

    obedecer a tais ou quais parmetros, como os fixados no art.

    221. Demonstra-se com facilidade a incorreo desse

    entendimento.

    Conforme oportunamente ressaltado (supra n. 2), o 2o do art.

    220 integra amplo conjunto de disposies atinentes, de modo

    direto ou indireto, atividade dos meios de comunicao social.

    Para bem avaliar-lhe o significado e o alcance, mister levar em

    conta todos os outros textos correlatos. H sculos se sabe que

    "incivile est, nisi tota lege perspecta uma particula eius posita,

    iudicare vel respondere". No por acaso que o art. 220, caput,

    contm a expressa ressalva "observado o disposto nesta

    Constituio". J se indicaram acima ilaes bvias dessa

    clusula final. A liberdade de criao artstica e de difuso de

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    idias e conhecimentos no absoluta; obrigatoriamente h de

    respeitar outras liberdades e direitos tambm consagrados na

    Lei Maior. Alis, nenhuma liberdade , nem pode ser, absoluta:

    o ordenamento jurdico constitui, tem de constituir sempre, a

    expresso de um compromisso entre solicitaes divergentes de

    proteo a valores suscetveis de contrapor-se uns aos outros. A

    interpretao de qualquer lei, e com relevo particular a da

    Constituio, h de atender a essa contingncia bsica.

    Ora, uma vez que outras liberdades e direitos devem ser

    preservados, foroso admitir alguma sorte de controle sobre as

    transmisses eventualmente capazes de les-los. Se os rgos

    administrativos tm limitado seu mbito de ao, no particular,

    pela proibio da censura, cumpre assegurar aos titulares

    daquelas liberdades e direitos (e a outros legitimados por fora

    de norma constitucional ou legal) a utilizao de meios aptos

    respectiva (e eficaz) defesa, toda vez que alguma liberdade ou

    direito protegido seja objeto de violao, atual ou iminente,

    imputvel a qualquer transmisso pela TV. Semelhante

    possibilidade tem de conviver e na verdade convive -, no

    sistema constitucional brasileiro, com a vedao da censura,

    sem que a ningum aproveite invocar esta vedao para

    contestar aquela possibilidade. Acrescente-se que isso se aplica

    indiferente aos direitos individuais e aos direitos coletivos, a que

    a Carta de 1988 deu, em boa hora, to grande realce." 9

    Lamentvel, portanto, que a concessionria de servio pblico

    SBT no esteja cumprindo suas funes sociais. Como est sujeita s normas

    estipuladas pelo artigo 221 da Carta Magna, deveria dar preferncia a

    programaes que promovam a educao e a cultura, alm de respeitar e

    9 AO CIVIL PBLICA Coordenador DIS MILAR, Ed. Revista dos Tribunais p. 277.

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    primar pelos valores ticos e sociais da pessoa e da famlia, a serem

    observados por meio dos direitos fundamentais.

    4 - DO DANO MORAL COLETIVO CAUSADO AOS TELESPECTADORES

    Observadas as irregularidades praticadas pela

    concessionria-r, resta clara sua responsabilizao por danos morais

    causados sociedade, em especial s crianas e adolescentes que tiveram

    contato com os programas exibidos em horrios no recomendados pelo

    Ministrio da Justia.

    Ora, com efeito os fatos objeto desta ao revestem-se de

    gravidade, coonestando com as mais abjetas condutas de que pode ser vtima

    uma sociedade. Como j exaustivamente demonstrado, a exibio de filmes

    ou programas em horrio diverso daquele estabelecido pelo Departamento de

    Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao pode causar imensos prejuzos

    sade mental e psquica do pblico infanto-juvenil, refletindo em suas

    condutas futuras, de modo a atingir a sociedade como um todo. Tal violao

    corresponde a dano moral coletivo que exige reparao.

    de se notar que a exibio de programao indevida por

    canal de televiso atinge indiscutivelmente o interesse difuso. Barbosa

    Moreira, com sua peculiar clareza, lembra que

    ao interesse em que se observem os mandamentos do art. 221 da Lei Maior ajusta-se como luva a qualificao de difuso. Com

    efeito: em primeiro lugar, ele se caracteriza, evidncia, como transindividual, j que no pertence, de modo singularizado, a

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    qualquer dos membros da comunidade, seno a um conjunto indeterminado e, ao menos para fins prticos, indeterminvel

    de seres humanos. Tais seres ligam-se uns aos outros pela mera circunstncia de fato de possurem aparelhos de televiso

    ou, na respectiva falta, costumarem valer-se do aparelho do amigo, do vizinho, do namorado, do clube, do bar da esquina

    ou do salo do barbeiro. E ningum exitara em qualificar de indivisvel o objeto de semelhante interesse, no sentido de que

    cada canal, num dado momento, transmite a todos a mesma e nica imagem.10

    E, em sentido difuso, o dano causado pela exibio de

    programao em horrio indevido por emissora de televiso sujeita-se

    reparao por meio da Ao Civil Pblica (Lei n. 7.347/95, art. 1, IV).

    Estando, pois, caracterizada na espcie o contedo irregular

    (ou melhor, inconstitucional) da programao exibida pela emissora r, no

    h como deixar de reconhecer que os telespectadores foram lesionados,

    havendo, sem dvida, um dano moral consumado a ser reparado.

    Ressalte-se que, para efeitos de indenizao por danos

    morais, basta a demonstrao do fato que deu origem ao dano, o que a

    presente ao j lograr, por si prpria, realizar.

    Nesse diapaso, colacionamos as seguintes jurisprudncias:

    EMENTA: Indenizao de direito comum. Dano moral. Prova.

    Juros moratrios. Smula n. 54 desta Corte.

    10 In RDA 201:45-56

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    1 No h que falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos

    ntimos que o ensejam. Provado assim o fato, impe-se a condenao, sob pena de violao ao art. 334 do Cdigo de

    Processo Civil.2 Na forma da Smula n. 54 da Corte, os juros moratrios nestes

    casos contam-se da data do evento.

    3 - Recurso especial conhecido e provido, em parte. (STJ, RESP n.

    86.271 - SP, Terceira Turma, Rel. em. Min. Carlos Alberto Menezes

    Direito, DJ 09/12/97)

    A doutrina tambm respalda a tese aqui defendida. Serve

    como exemplo o entendimento do estudioso Carlos Alberto Bittar Filho:

    (...) chega-se a concluso de que o dano moral coletivo a injusta leso da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja,

    a violao antijurdica de um determinado crculo de valores

    coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, est-se fazendo

    meno ao fato de que o patrimnio valorativo de uma certa

    comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido

    de maneira absolutamente injustificvel do ponto de vista jurdico:

    quer isso dizer, em ltima instncia , que se feriu a prpria cultura,

    em seu aspecto imaterial. 11

    Vale destacar, ainda, o ensinamento do Procurador da

    Repblica Andr de Carvalho Ramos, que, em anlise ao dano moral coletivo,

    disserta:

    11 ver in Do dano moral coletivo no atual contexto jurdico brasileiro, Revista de Direito do Consumidor, vol. 12- Ed. RT

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Assim, preciso sempre enfatizar o imenso dano moral coletivo

    causado pelas agresses aos interesses transindividuais. Afeta-se a

    boa-imagem da proteo legal a estes direitos e afeta-se a

    tranqilidade do cidado, que se v em verdadeira selva, onde a lei

    do mais forte impera. 12

    Continua o citado autor, dizendo:

    Tal intranqilidade e sentimento de desapreo gerado pelos danos

    coletivos, justamente por serem indivisveis, acarretam leso moral

    que tambm deve ser reparada coletivamente. Ou ser que algum

    duvida que o cidado brasileiro, a cada notcia de leso a seus direitos no se v desprestigiado e ofendido no seu sentimento

    de pertencer a uma comunidade sria, onde as leis so cumpridas? A expresso popular o Brasil assim mesmo deveria

    sensibilizar todos os operadores do Direito sobre a urgncia na

    reparao do dano moral coletivo. 13

    No h que se afastar a responsabilidade da R face ao

    suficientemente demonstrado menosprezo com que tratam o cidado, visto

    que, em lugar de preservarem direitos e garantias fundamentais conferidos

    pela Constituio, findam por cooperar, ainda que involuntariamente, com o

    aumento da criminalidade em nosso pas.

    Urge por todo o aduzido, assim, a responsabilizao da R por

    atentar contra a moral coletiva, sendo arbitrada indenizao como medida

    reparatria pela ilicitude atacada por esta ao.

    12 A ao civil pblica e o dano moral coletivo, Revista de Direito do Consumidor, vol. 25- Ed. RT, p. 83

    13 Ibid

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    Essa prtica se caracteriza como dano moral difuso, expressamente defeso pela Lei 7.347/85, como bem se l em seu art. 1:

    "Art. 1 - Regem-se pelas disposies desta lei, sem prejuzo da

    ao popular, as aes de responsabilidade por danos morais e

    patrimoniais causados:

    I ao meio ambiente;

    II ao consumidor;

    III aos bens e direitos de valor artstico, esttico, histrico, turstico

    e paisagstico;

    IV a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;(...) (grifamos)

    O instrumento adequado para a proteo desses direitos

    metaindividuais , portanto, sem nenhuma dvida, a ao civil pblica, regulada pelas Leis n. 7.347/85, 8.069/90 e 8.078/90.

    Por essas razes, entende o Ministrio Pblico Federal que

    mais do que razovel a FIXAO DE INDENIZAO POR DANOS MORAIS

    COLETIVOS NO VALOR DE 8.000.000,00 (oito milhes de reais), O

    EQUIVALENTE A 1% DO FATURAMENTO BRUTO DA EMPRESA PARA O

    ANO DE 2006.14

    5. DA NECESSRIA EXTENSO DO PEDIDO A TODO TERRITRIO NACIONAL

    A presente causa tem por alicerce todo um arcabouo

    legal, como salientado, que pressupe atuao administrativa por parte do

    Ministrio da Justia, o que vem sendo realizado de forma exemplar. Ocorre

    14 Jornal folha de so Paulo, edio de 04 de junho de 2006.

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    que, o rgo administrativo referido exara a classificao mencionada com

    validade em todo o territrio nacional.

    Por isso que, os efeitos da deciso de concesso do presente

    pedido devem alcanar todos os Estados em que ocorra a veiculao dos

    programas em comento, sob pena de se criar uma situao insustentvel, qual

    seja, a declarao de que tal transmisso inadequada para o Estado de So

    Paulo, e, ao mesmo tempo, adequada para os demais entes federados.

    Alm do que, em situaes anlogas, mais especificamente em

    casos de produtos que se revelem nocivos, nosso ordenamento jurdico (art.

    102 do Cdigo de Defesa do Consumidor), prev a possibilidade de

    ajuizamento de aes que visem compelir o Poder Pblico competente a

    proibir, em todo o territrio nacional, a produo, divulgao, a distribuio ou

    venda deste produto, razo mais que suficiente para, por analogia, aplicar a

    extenso pretendida. In litteris:

    "Art. 102. Os legitimados a agir na forma deste Cdigo podero

    propor ao visando compelir o Poder Pblico competente a proibir,

    em todo o territrio nacional, a produo, divulgao, distribuio ou venda, ou a determinar alterao na composio, estrutura,

    frmula ou acondicionamento de produto, cujo uso ou consumo se

    revele nocivo ou perigoso sade pblica e incolumidade

    pessoal.

    Poder-se-ia argumentar no sentido de que o art. 16, da Lei

    7.347/85 (LACP), com a redao que lhe foi dada pela Lei 9494, no permitiria

    tal entendimento.

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    No intuito de demonstrar a fragilidade de tal argumentao,

    transcrevemos trechos de excelente artigo, no qual a Professora Ada Pellegrini

    Grinover, comentando a alterao em tela na LACP, demonstra a

    inaplicabilidade da mesma ao caso:

    "Limitar a abrangncia da coisa nas aes civis pblicas significa

    multiplicar demandas, o que, de um lado contraria toda a filosofia

    dos processos coletivos, destinados justamente a resolver

    molecularmente os conflitos de interesses, ao invs de atomiz-los e

    pulveriz-los; e de outro lado, contribui para a multiplicao de

    processos , a sobrecarregarem os tribunais, exigindo mltiplas

    respostas jurisdicionais quando uma s poderia ser suficiente. No

    momento em que o sistema brasileiro busca sadas at nos

    precedentes vinculantes, o menos que se pode dizer do esforo

    redutivo do Executivo que vai na contramo da histria.

    Em segundo lugar, pecou pela incompetncia. Desconhecendo a

    interao entre a Lei da Ao Civil Pblica e o Cdigo de Defesa do

    Consumidor, assim como muitos dos dispositivos deste, acreditou

    que seria suficiente modificar o art. 16 da Lei n 7.347/85 para

    resolver o problema. No que se enganou redondamente. Na verdade, o acrscimo introduzido ao art. 16 da LACP ineficaz.15

    DA TUTELA ANTECIPADA

    A tutela antecipada, necessidade do pleno exerccio do direito

    de ao, em prol da defesa de toda e qualquer ameaa ou leso a direito, est

    15 in Cdigo Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos autores do anteprojeto

    Ada Pellegrini Grinover e outros, 5a ed., Forense universitria, p.724

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    estatuda no artigo 273 do Cdigo de Processo Civil e no artigo 84, 3, do

    Cdigo de Proteo e Defesa do Consumidor.

    Seus requisitos so a verossimilhana das alegaes

    constantes na inicial, a partir de prova inequvoca, e o fundado receio de dano

    irreparvel ou de difcil reparao. Visa a tutela antecipada a garantir o

    resultado efetivo do provimento jurisdicional.

    A antecipao dos efeitos da tutela de particular necessidade

    nas aes relativas defesa do cidado, as quais exigem celeridade e

    efetividade processuais como condies para o resguardo de seus direitos.

    A presente ao possui como objeto obrigaes de no fazer,

    sendo de tal forma aplicvel, por analogia, o artigo 84 do Cdigo de Proteo e

    Defesa do Consumidor, assim como seus respectivos pargrafos:

    "Art. 84. Na ao que tenha por objeto o cumprimento de obrigao

    de fazer ou no fazer, o juiz conceder a tutela especfica da

    obrigao ou determinar providncias que assegurem o resultado

    prtico equivalente ao adimplemento.

    (...)

    3- Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo

    justificado receio de ineficcia do provimento final, lcito ao juiz

    conceder a tutela liminarmente ou aps justificao prvia, citado o

    ru."

    evidncia, esto plenamente configuradas na ao em cotejo

    os requisitos para a concesso da tutela antecipada. De fato, questiona a

    mesma trs pontos essenciais: a) a veiculao de filme, programas e seriados

    pela emissora de televiso SBT em horrios totalmente inadequados; b) a

    3

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    exposio dos telespectadores, em sua maioria, crianas e adolescentes, ao

    nefasto material exibido; c) a classificao exarada pelo rgo governamental

    encarregado de promover a fiscalizao dos mencionados produtos no tem

    sido obedecida.

    Resta inexorvel, desta feita, que a ausncia da tutela

    antecipada seria causa da realizao de danos em uma amplitude

    indeterminada, lesando toda uma massa de cidados telespectadores. A fim de

    resguardar a proteo destes, constitucionalmente determinada, h que se

    obstar, desde j, a produo de tais danos, compelindo-se a empresa-r a

    transmitir toda a sua grade de programao apenas no horrio de classificao

    determinado pelo Ministrio da Justia.

    Em face da fundamentao acima expendida, diante da

    relevncia do fundamento da demanda e considerando os srios prejuzos

    impostos s crianas e adolescentes em decorrncia da exibio irregular de

    alguns programas como os ora citados nesta exordial, sendo totalmente

    temerrio o aguardo de deciso final para o cumprimento da obrigao que

    resulta cristalina das normas j explicitadas, requer o Ministrio Pblico Federal seja concedida, inaudita altera pars, a antecipao dos efeitos da tutela, compelindo-se a concessionria-r obrigao de no-fazer, consistente na obrigao de no mais transmitir (imediatamente aps a notificao do teor da deciso antecipatria) os programas, seriados e filmes de sua programao em desacordo com a classificao exarada pelo Ministrio da Justia, sob pena de ser imposta multa cominatria, no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), para cada exibio contrria ao horrio estabelecido por aquele rgo, a qual se reverter ao Fundo de que trata a Lei n. 8.242, de 12 de outubro de 1991, em seu art. 6 - Fundo Nacional

    para a Criana e o Adolescente.

    4

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    DO PEDIDO

    Em face de todo o exposto, o Ministrio Pblico Federal requer:

    a) seja deferida tutela antecipada inaudita altera pars, para

    fins de coibir a R de veicular qualquer programa

    constante de sua grade em desacordo com o horrio

    estabelecido pelo Departamento de Justia,

    Classificao, Ttulos e Qualificao do Ministrio da

    Justia, sob pena de multa cominatria no valor de R$

    100.000,00 (cem mil reais) por cada veiculao

    irregular, a ser revertida ao Fundo de que trata a Lei n.

    8.242, de 12 de outubro de 1991, em seu art. 6 -

    Fundo Nacional para a Criana e o Adolescente;

    b) a citao pessoal da Requerida para responder aos

    termos da presente ao, assim como para, querendo,

    contest-la, no prazo legal, sob pena de revelia (artigos

    285, 297 e 319 do Cdigo de Processo Civil).

    c) a intimao da Unio, para querendo, habilitar-se como

    litisconsorte ativo. Em caso de recusa, fica requerida,

    desde j, sua citao para compor o plo passivo desta

    demanda;

    4

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    d) no caso de descumprimento da deciso, seja

    determinada a suspenso, por dois dias, da

    programao da emissora-r que der causa

    infringncia, nos termos estatudos no art. 254 da Lei

    8.069/90, uma vez que sobejamente comprovada a

    reincidncia referida naquele artigo;

    e) seja condenada a R TVSBT a indenizar os danos

    morais causados ao interesse difuso, decorrentes da

    exibio inadequada da programao, em desacordo com o horrio estabelecido pelo Departamento de Justia, Classificao, Ttulos e Qualificao do Ministrio da Justia, mediante recolhimento, ao fundo previsto no art. 6 da lei n. 8242/91, da importncia

    equivalente ao valor de R$ 8.000.000,00 (oito milhes de reais).

    Requer, tambm, seja o Ministrio Pblico Federal intimado

    pessoalmente dos atos processuais no seguinte endereo: rua Peixoto Gomide

    n 768, Cerqueira Csar, Capital. Protesta, ainda, se assim for necessrio,

    provar o alegado pela produo de todas provas admitidas em Direito, sem

    exceo.

    Atribui-se presente Ao Civil Pblica o valor de R$

    8.000.000,00 (oito milhes de reais).

    Termos em que,

    Pede deferimento

    4

  • MINISTRIO PBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPBLICA NO ESTADO DE SO PAULO

    ADRIANA DA SILVA FERNANDES

    Procuradora da Repblica

    SERGIO GARDENGHI SUIAMA

    Procurador da Repblica

    4

    SOUTH PARKPortaria n. 109 de 24/11/2003 (doc.17)Gnero: Desenho Animado

    SERIADO MULHER GATO

    5. DA NECESSRIA EXTENSO DO PEDIDO A TODO TERRITRIO NACIONAL