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UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto 1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise da função social da escola sob a perspectiva da prática pedagógica como produto e produtora de uma ideologia. Assim, o mesmo objetivou traçar um perfil da escola pública com os alunos do Colégio Estadual Castro Alves – Ensino Médio da cidade de Rondon, Estado do Paraná. Para alcançar o objetivo proposto buscou- se, por meio de uma pesquisa de campo, de natureza descritiva e qualitativa, entender como alunos, pais de alunos, professores, pedagogos, direção e funcionários percebem a escola. Para tanto utilizou- se um questionário que investigava qual a função da escola em suas vidas, as dificuldades percebidas e as mudanças pretendidas, bem como, como percebem a prática pedagógica. Tais dados possibilitaram visualizar um perfil geral da escola, no qual teve destaque a relevância da ideologia presente na prática pedagógica como determinante da escola que se tem. A conclusão obtida foi a de que o professor é o principal articulador dos resultados alcançados no processo educativo, cabendo a ele apropriar-se das ferramentas que possibilitem a construção de uma prática pedagógica mediadora determinante da escola que se quer. Palavras-chave: Prática pedagógica. Perfil da escola. Função social da escola. ABSTRACT This work had as base the analysis of the social function of the school under the practical perspective of the pedagogical one as product and producer of an ideology. Thus, the same Average Education of the city of Rondon objectified to trace a profile of the public school with the pupils of the State College Castro Alves -, State of Paraná. To reach the considered objective one searched, through a research of field, descriptive nature and qualitative, to understand as pupils, parents of pupils, professors, pedagogos, direction and employees they perceive the school. For in such a way a questionnaire was used that investigated which the perceived function of the school in its lives, difficulties and the intended changes, as 1 Professora Pedagoga do Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná Universidade Estadual de Maringá – Paraná Colégio Estadual Castro Alves – EM Rondon – Paraná Especialista em Metodologia e Didática de Ensino e-mail: [email protected]

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Page 1: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA

Lucilene Poloto1

RESUMO

Este trabalho teve como base a análise da função social da escola sob a perspectiva da prática pedagógica como produto e produtora de uma ideologia. Assim, o mesmo objetivou traçar um perfil da escola pública com os alunos do Colégio Estadual Castro Alves – Ensino Médio da cidade de Rondon, Estado do Paraná. Para alcançar o objetivo proposto buscou-se, por meio de uma pesquisa de campo, de natureza descritiva e qualitativa, entender como alunos, pais de alunos, professores, pedagogos, direção e funcionários percebem a escola. Para tanto utilizou-se um questionário que investigava qual a função da escola em suas vidas, as dificuldades percebidas e as mudanças pretendidas, bem como, como percebem a prática pedagógica. Tais dados possibilitaram visualizar um perfil geral da escola, no qual teve destaque a relevância da ideologia presente na prática pedagógica como determinante da escola que se tem. A conclusão obtida foi a de que o professor é o principal articulador dos resultados alcançados no processo educativo, cabendo a ele apropriar-se das ferramentas que possibilitem a construção de uma prática pedagógica mediadora determinante da escola que se quer.

Palavras-chave: Prática pedagógica. Perfil da escola. Função social da escola.

ABSTRACT

This work had as base the analysis of the social function of the school under the practical perspective of the pedagogical one as product and producer of an ideology. Thus, the same Average Education of the city of Rondon objectified to trace a profile of the public school with the pupils of the State College Castro Alves -, State of Paraná. To reach the considered objective one searched, through a research of field, descriptive nature and qualitative, to understand as pupils, parents of pupils, professors, pedagogos, direction and employees they perceive the school. For in such a way a questionnaire was used that investigated which the perceived function of the school in its lives, difficulties and the intended changes, as

1 Professora Pedagoga do Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná Universidade Estadual de Maringá – Paraná Colégio Estadual Castro Alves – EM Rondon – Paraná Especialista em Metodologia e Didática de Ensino e-mail: [email protected]

Page 2: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

well as, as they perceive practical the pedagogical one. Such data make possible to visualize a profile general of the school, in which it had has detached the relevance of the pedagogical practical present ideology in as the determinative one of the school that if has. The gotten conclusion was of that the professor is the main articulador of the results reached in the educative process, fitting it to assume itself of the tools that make possible the practical construction of one pedagogical determinative mediating of the school that if wants.

Word-key: Practical pedagogical. Profile of the school. Social function of the school.

1 INTRODUÇÃO

Este artigo discute a função social da escola na vida dos alunos,

pais, professores e demais pessoas da escola, ao mesmo tempo que

desnuda o processo pedagógico à luz da ideologia que o rege.

Baseia-se nas teorias de estudiosos em educação que investigam e

discutem o assunto sob a ótica escolhida. FREIRE(2000) propõe que a

educação está presente em toda a sociedade e a serviço desta; SAVIANI

(2005), no bojo de sua teoria histórico-crítica, coloca como questão

central o saber; VASCONCELLOS (1994, p. 12) com sua metodologia

dialética, propõe “que nossa atenção deve estar em torno da sala de

aula”; GÓMEZ (1998), ao analisar o que acontece em sala de aula,

ressalta que o professor deve conhecer as múltiplas influências que

acontecem, pois o desafio da escola é formar o cidadão para atuar

eficazmente no cenário social; ESTEVE (1995) mostra o que tem

acontecido no interior da escola e o papel a que o professor foi reduzido,

apontando os fatores que influenciam na prática pedagógica; MOYSÉS

(1995) apresenta a competência profissional como fator de peso para a

melhoria da qualidade de ensino; FRANCIOLLI (2005) aponta os fatores

intervenientes na prática docente; ZAGURY (2006) propõe a necessidade

de estudos abrangentes sobre os problemas ligados à educação, segundo

ela é preciso mais pesquisa em educação; CAVACO (1995) destaca a

interferência do desenvolvimento biológico, dos processos estruturais

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Page 3: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

socialmente organizados, dinâmicas institucionais e aspectos específicos

de cada pessoa no processo ensino-aprendizagem.

Diante da atual situação de crise presenciada na educação

brasileira, é preciso entender o que está acontecendo, como e porque está

acontecendo, para tanto é necessário muitos estudos e pesquisa concreta

que permitam a análise de todas as variáveis que interferem no processo

ensino-aprendizagem. Isso requer muito esforço dos envolvidos, mas

principalmente cabe aos educadores a tarefa de desvendar, entender e

divulgar as reais causas e conseqüências, traçando linhas de ações.

Existem muitos estudos e estudiosos defendendo diversas teorias, mas é

evidente que grandes problemas educacionais existem. O caminho certo a

seguir é preciso descobrir.

Assim, a partir da realidade da nossa escola de atuação, é preciso

buscar ações efetivas, voltadas para a melhoria do quadro apresentado.

Não se pode ignorar os dados obtidos tampouco negligenciar as mudanças

necessárias.

Por meio de uma pesquisa de campo, de natureza descritiva e

qualitativa, buscou-se entender como alunos, pais de alunos e

professores percebem a escola e as práticas nela exercitadas. Essa

pesquisa é efetivada com a aplicação e a tabulação de dados de um

questionário que busca investigar questões tais como a função da escola

em suas vidas, as dificuldades percebidas e as mudanças pretendidas, e

ainda, a percepção sobre a prática pedagógica.

Os dados obtidos possibilitaram visualizar um perfil geral da escola,

no qual teve destaque a relevância da ideologia presente na prática

pedagógica como determinante da escola que se tem.

A conclusão obtida foi a de que o professor é o principal articulador

dos resultados alcançados pelo processo educativo, cabendo a ele

apropriar-se das ferramentas que possibilitem a construção de uma

prática pedagógica mediadora determinante da escola que se quer.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

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Page 4: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

Muitos estudos sobre a situação de nossas escolas têm mostrado

que são inúmeros os problemas que se apresentam no cotidiano escolar.

Muitas situações, tais como a indisciplina, a evasão, o desinteresse pelo

que é ensinado e pela escola, dificuldades de interação entre professor-

aluno, dificuldades de aprendizagem e outros tantos problemas devem ser

estudados e as possíveis soluções buscadas e/ou sugeridas.

Assim, ao definir nosso objeto de estudo que foi traçar um perfil da

escola, havia a pretensão de efetuar um levantamento de dados que

possibilitassem vislumbrar todas as escolas públicas do Estado. À medida

que se foi aplicando os questionários, procedendo a tabulação e a análise

dos dados, percebeu-se que os dados permitiam contextualizar apenas a

escola foco da aplicação da pesquisa, e somente por ela e pelos

envolvidos, dar as respostas aos questionamentos colocados.

2.1 ENTENDENDO A FUNÇÃO DA ESCOLA

Existem muitas teorias que discutem a função da educação, mais

especificamente da educação escolar. É preciso conhecê-las para elaborar

as idéias, estabelecendo conclusões que permitam direcionar a prática

pedagógica, cientes que toda prática traz no seu bojo uma ideologia. É

preciso que o entendimento do que acontece no contexto escolar

possibilite a compreensão da realidade da nossa escola, foco da pesquisa.

Primeiramente, buscando entender a função da escola e o que se

pode esperar dela, é preciso ter claro que a educação sempre esteve

presente nas sociedades, desde as mais primitivas até a atualidade, num

processo que foi assumindo diversas funções e formatos de acordo com a

realidade vivenciada em determinada época, sempre fazendo parte de um

contexto social e ainda é um continnum.

FREIRE (2000, p.67) propôs um modelo de educação considerando

que “Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela

tampouco a sociedade muda”. Portanto, é importante a aceitação de que

a educação está presente em toda sociedade a serviço desta para a sua

preservação.

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Page 5: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

Com a consciência de que se vive numa sociedade capitalista, que

se é fruto dessa sociedade, é preciso adquirir a clareza que ela tem

determinado a prática pedagógica, bem como, a vida dos professores, faz-

se necessário o entendimento de que toda a situação educacional

vivenciada em nossas escolas tem uma finalidade e atende a algum

interesse.

Essas colocações delineiam a realidade que se vive em educação,

uma vez que as mudanças impostas decorrem das necessidades sociais e

expressam a força do mercado econômico “mundializado”. O que se tem

é uma educação voltada para as necessidades de mercado econômico,

cujos direcionamentos visam construir indivíduos capazes de atuar e

satisfazer as necessidades desse mercado, induzidos pela crença de que

esse é o caminho para melhorar sua condição de vida e viver plenamente

a democracia, enfim há uma descaracterização do indivíduo, ele deve

pensar e fazer aquilo que interessa ao crescimento econômico.

Hoje a escola deixou de cumprir seu papel principal de educar e

formar o cidadão, está centrada no “assistencialismo”, na “maquiagem

estatística” e na “onda de privatizações”. Deve-se ter presente a

tendência de diferenciar as escolas das massas e das elites. O discurso

que justifica as mudanças induz à idéia de que as mudanças realmente se

fazem necessárias, sendo esse o único caminho viável para a democracia.

É preciso considerar os fatores alienantes presentes nos discursos e nas

políticas educacionais que vão se sucedendo na medida em que florescem

novos interesses econômicos. De acordo com SAVIANI (2002, p.2)

outro componente dessa visão ideológica é que os conhecimentos que a população precisa dominar são mais os do dia a dia. O importante não é estar empregado, mas ser empregável. Ser empregável significa ter flexibilidade e capacidade de adaptação. E você se adapta na medida em que você convive, se relaciona. Então os conhecimentos sistemáticos tendem a ser secundarizados. A questão que se põe que precisa ser pensada é se isto tenderia a alterar substantivamente o caráter da escola. Se isto é um indicador de que a sociedade está mudando e que, com a mudança da sociedade, a natureza da escola também está mudando.

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O entendimento do que acontece em nossas escolas, passa pelo

entendimento da ideologia presente nas idéias transmitidas e/ou

comunicadas.

SAVIANI (2005), no bojo de sua teoria Histórico-Crítica, coloca como

questão central o saber. O saber é o que deve direcionar todo o trabalho

educativo. Na escola devemos ter presente como fim a atingir a

tramsmissão-assimilação do saber sistematizado, elaborado, científico, a

cultura letrada.

Isto porque o homem não se faz homem naturalmente; ele não nasce sabendo ser homem, vale dizer, ele não nasce sabendo sentir, pensar, avaliar, agir. Para saber pensar e sentir; para saber querer, agir ou avaliar é preciso aprender, o que implica o trabalho educativo.Assim, o saber que diretamente interessa à educação é aquele que emerge como resultado do processo de aprendizagem, como resultado do trabalho educativo. Entretanto, para chegar a esse resultado a educação tem que partir, tem que tomar como referência, como matéria-prima de sua atividade, o saber objetivo produzido historicamente. (SAVIANI, 2005, p.7)

2.2 O PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM

A escola como espaço que prima pela aprendizagem tem toda uma

organização, que prioriza a construção gradual de conhecimentos, isto é,

conforme as etapas vão sendo vencidas, há a complementação desses

conhecimentos. Nesse espaço destaca-se a importância do educador ter

definido sua concepção teórica, porque isto significa ter claro que

indivíduo quer formar e que metodologia vai utilizar, possuindo a clareza

da forma como o aluno se apropria do conhecimento e das possibilidades

de efetivar sua prática educativa.

Para o entendimento de como se dá o processo ensino-

aprendizagem, é preciso que todo educador conheça as teorias que se

referem ao processo de aprendizagem, para poder definir que caminhos e

quais mecanismos serão mais efetivos para atender ao aluno, sendo

evidente a necessidade de buscar nos pensadores da educação o

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Page 7: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

embasamento teórico que o capacite a entender a problemática

educacional ora vivenciada.

Definir como se aprende é importante, porém mais importante ainda

é definir quem são nossos alunos, quais são suas condições e perspectivas

de vida e de futuro. Isso possibilita o entendimento, pelos professores, da

maioria das problemáticas presentes hoje em nossas salas de aula.

Que o ser humano é fruto da história isso é fato, mas é preciso

considerar que a história se constrói a cada dia, assim o que se vive hoje é

parte histórica da construção de vida de nossos alunos. Essa construção

não se dá ao acaso, ela é determinada pelas interações decorrentes do

sistema vigente. Por se viver numa sociedade capitalista é preciso o

entendimento de que, com a globalização mudaram-se as relações de

trabalho, ampliando-as para esferas que exigem um novo perfil de homem

e de trabalhador, sendo que a educação deve servir de instrumentalização

do homem para atender a essa demanda capitalista.

O educador, consciente dessa realidade, deve definir qual vai ser

sua prática pedagógica, quais caminhos seguir, que conhecimentos

considera importante trabalhar junto aos seus alunos. Enfim, que

diferença pretende fazer na vida deles.

VASCONCELLOS (1994, p.34, grifo do autor), com sua metodologia

dialética entende que em sala de aula “O conhecimento tem sentido

quando possibilita o compreender, o usufruir ou o transformar a

realidade”. A finalidade do conhecimento é que possa colaborar na

formação global do educando (consciência, caráter e cidadania), assim, o

educador deve ter clareza dos objetivos que pretende atingir, deve ter

convicção daquilo que pretende com o seu trabalho, deve saber o

conteúdo e saber muito bem para poder fazer as mediações que

desencadeiem em seus alunos as relações e as problematizações

necessárias à transformação da realidade social.

SAVIANI (2005, p.15), trata da apropriação do saber

elaborado/sistematizado, “a escola existe, pois, para propiciar a aquisição

dos instrumentos que possibilitam o acesso ao saber elaborado (ciência),

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bem como o próprio acesso aos rudimentos do saber”, fazendo distinção

entre pedagogia geral (noção de cultura como tudo que o homem produz)

e pedagogia escolar (ligada ao saber sistematizado), clareando as idéias

quanto ao papel da escola e em conseqüência o caminho que o educador

deve seguir:

Ora, clássico na escola é a transmissão-assimilação do saber sistematizado. Este é o fim a atingir. É aí que cabe encontrar a fonte natural para elaborar os métodos e as formas de organização do conjunto das atividades da escola, isto é, do currículo. E aqui nós podemos recuperar o conceito abrangente de currículo: organização do conjunto das atividades nucleares distribuídas no espaço e tempo escolares. Um currículo é, pois, uma escola funcionando, quer dizer, uma escola desempenhando a função que lhe é própria. (SAVIANI, 2005, p. 18)

2.3 A REALIDADE EDUCACIONAL

É necessário considerar a inserção de todos num contexto mundial e

por esse fato não se pode ficar à margem dos acontecimentos e das

conseqüências, nem sempre positivas. A educação deveria ser beneficiada

e privilegiada com os avanços tecnológicos, porém, infelizmente não é

devidamente contemplada como deveria, afinal, mesmo considerada

prioridade pelos órgãos governamentais, continua de modo geral, obsoleta

em tecnologia e elitista, na qual os menos favorecidos lutam por uma

escola pública de maior qualidade e por um acesso à universidade mais

democrático e menos excludente.

Por estar inserido nesse contexto, os alunos observam uma situação

crítica, o que lhes provoca desestímulo e falta de perspectiva em relação

às suas vidas e ao futuro. Isso tudo, acaba por desencadear elevados

índices de repetência e evasão escolar, ou seja, o insucesso do processo

ensino-aprendizagem. Somam-se a isso outros problemas de ordem

pessoal, social e familiar que comprometem o processo ensino-

aprendizagem, uma vez que afloram na escola e no meio próximo a esta.

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Essa realidade induz e faz acreditar que em educação tudo vai mal,

que nada mais tem jeito e que não há nada para se fazer. Instala-se um

conformismo generalizado, em que o professor faz de conta que ensina e

o aluno faz de conta que aprende.

Ora, o que se pode fazer diante de tal situação? É preciso não só

teorização, pois esta desvinculada de qualquer prática não tem nem ao

menos, razão de ser. É preciso reflexão sobre o que realmente tem

acontecido em nossas escolas, nossas salas de aula, com nossos alunos e

com os professores que ali atuam. É preciso nesse momento, concordar

com FREIRE (1996, p. 22), quando diz que “ A reflexão crítica sobre a

prática se torna uma exigência da relação Teoria/Prática sem a qual a

teoria pode ir virando blábláblá e a prática, ativismo”.

É necessário ter clareza que a escola como um todo, no nosso caso

as escolas públicas, não atuam a esmo, antes são direcionadas por leis

federais e estaduais, sendo que toda a sua ação é regida pelos órgãos

competentes (Ministério da Educação e Cultura e Secretaria Estadual de

Educação). Porém, ainda o que se vê atualmente é uma escola que não

ensina, que não consegue satisfazer as orientações e exigências das

instâncias superiores, uma escola que vive atolada em tantos afazeres,

em cumprir tantos projetos, que os conteúdos acadêmicos mínimos ficam

impossibilitados de serem desenvolvidos plenamente e como seria de

direito dos alunos e de obrigação da escola enquanto instituição

educativa. MOYSÉS (1995, p. 10) evidencia isso ao afirmar que “um dos

problemas mais graves da nossa escola em todos os níveis é o baixo nível

de aproveitamento dos alunos; a aprendizagem dos conteúdos escolares é

algo que envolve os processos mentais superiores e se dá no interior de

um ser social e historicamente contextualizado”. E o sistema gestor não se

apercebe dessa realidade e continua a inundar a escola com novos

afazeres, novas teorias e exigências, destituindo-se de qualquer culpa.

Ao considerar o que já foi exposto aqui, é preciso ter como ponto de

partida a análise do que acontece em nossas salas de aula, sendo de

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suma importância as intervenções do professor. GÓMEZ (1998, p.70) nos

mostra isso:

O ensino nas sociedades contemporâneas se desenvolve em instituições sociais especializadas para cumprir essa função. A aprendizagem do alunos/as ocorre em grupos sociais nos quais as relações e as trocas físicas, afetivas e intelectuais constituem a vida do grupo e condicionam os processos de aprendizagem. Assim para que o professor/a possa intervir e facilitar os processos de reconstrução e transformação do pensamento e da ação dos alunos/as deve conhecer as múltiplas influências que, previstas ou não, acontecem na complexa vida da aula e intervêm decisivamente no que os estudantes aprendem e nos modos de aprender.

O que tem acontecido com nosso(s) aluno(s)? Por que tanto

desinteresse? Por que não aprendem? De quem será a culpa? São

justamente essas a grandes questões da problemática educacional, pois

as respostas a estas perguntas parecem não interessar a quem de direito

tem a responsabilidade.

Observa-se que nesse contexto tem sido mais fácil jogar a culpa no

aluno ou no professor. A escola e o professor não podem se isentar

totalmente de culpa, mas é preciso antes, entender a problemática ou

parte desta, envolvida no cotidiano escolar. Assim, é importante entender

o que acontece no interior da sala de aula.

Busca-se em VASCONCELLOS (1994, p.12) o entendimento de “que

nossa atenção deve estar em torno da sala de aula, onde todo dia o

professor tem sua prática, seleciona os conteúdos, passa posições

políticas, ideológicas, transmite e recebe afetos e valores”. A posição do

professor em sala de aula, diante do processo ensino-aprendizagem que

se instaura a todo momento, nas dinâmicas educativas estabelecidas, é

fator de análise. Pois, parodiando SACRISTÁN (1995, p.68), os professores

não produzem o conhecimento que são chamados a reproduzir, nem

determinam as estratégias práticas de sua ação.

ESTEVE (1995, p. 100) mostra o que tem acontecido no interior da

escola e a que o professor foi reduzido.

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Há um autêntico aumento das exigências que se fazem ao professor, pedindo-lhe que assuma um número cada vez maior de responsabilidades. No momento atual, o professor não pode afirmar que a sua tarefa se reduz apenas ao domínio cognitivo. Para além de saber a matéria que leciona, pede-se ao professor que seja facilitador da aprendizagem, pedagogo eficaz, organizador do trabalho de grupo, e que, para além do ensino, cuide do equilíbrio psicológico e afectivo dos alunos, da integração social e da educação sexual, etc.; a tudo isto pode somar-se a atenção aos alunos especiais integrado na turma.

Dito de outra forma, a prática social inevitavelmente está atrelada à

cultura e aos contextos sociais de seus personagens, como mostra

SACRISTÁN (1995, p. 66) ao afirmar que “o ensino é uma prática social

[...] reflectem a cultura e contextos sociais a que pertencem”.

ESTEVE (1995), aponta ainda outros fatores que influenciam na

prática educativa do professor e nos resultados de sua ação: aumento das

exigências em relação ao professor; inibição da responsabilidade da

família como agente de socialização; aumento das fontes de informações

alternativas; presença multicultural e multilíngüe no seio da escola;

aumento das contradições no exercício da docência; a configuração do

sistema educativo passou de um ensino para as elites para um ensino

para as massas; o apoio da sociedade mudou pais incertos quanto ao

futuro dos filhos e a extensão e massificação do ensino também não

produziu a igualdade e a promoção social esperada; caiu o status social do

professor; o avanço das ciências e a transformação das exigências sociais

requerem uma mudança profunda dos conteúdos curriculares; a

massificação do ensino e o aumento das responsabilidades dos

professores não se fizeram acompanhar de uma melhoria efetiva dos

recursos materiais e das condições de trabalho em que se exerce a

docência. Hoje em dia, o ensino de qualidade é mais fruto do voluntarismo

dos professores do que conseqüência natural de condições de trabalho

adequadas às dificuldades reais e às múltiplas tarefas educativas; as

relações entre professores e alunos tornaram-se conflituosas;

fragmentação do trabalho do professor . Os mesmos “para além das

aulas, devem desempenhar tarefas de administração, reservar tempo para

programar, avaliar, reciclar-se, orientar os alunos e atender os pais,

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organizar atividades várias, assistir a seminários e reuniões de

coordenação, de disciplina ou de ano, porventura mesmo vigiar edifícios e

materiais, recreios e cantinas.” (ESTEVE, 1995, p. 108)

É fácil chegar à definição de que a posição do professor é muito

delicada. Se por um lado lhe é imposta uma culpa pelo fracasso, pelo

insucesso do processo ensino-aprendizagem no formato que acontece em

nossas escolas, concordando com MOYSÉS (1995, p. 11), que o “professor

a quem falta quase tudo: das condições materiais de trabalho ao apoio

pedagógico; da boa formação ao reconhecimento do seu valor

profissional”.

Tudo o que acontece no contexto escolar, bem como no meio social

ao qual se insere, marca a vida de todos os indivíduos envolvidos, em

relação à prática pedagógica do professor, salientando que

o professor trabalha de forma fragmentada, perdendo a autonomia, o conhecimento do todo e fica incapaz de trabalhar independentemente do capital; a atomização do trabalho pedagógico inibe as forças intelectuais do professor, já que a produção intelectual, o conhecimento, concentra-se a serviço do capital e confronta-se com o trabalhador como força estranha e dominadora; a mecanização do trabalho docente expropria o saber do professor sobre suas ações pedagógicas, tornando-o incapaz de pensá-lo e concebê-lo na sua totalidade; a desqualificação docente priva-o do debate das grandes questões sociais: salários, desemprego, guerras; transformando o espaço escolar em espaço do silêncio, da aceitação e do conformismo; a forma como o sistema educacional atende às necessidades do capital, obriga o professor a um trabalho cansativo, apático, indiferente, condicionando-o a produzir algo que lhe permita ganhar a vida. Quando o sistema exige mudanças de concepções, de metodologias – e isto ocorre, quase sempre, a cada mudança de governo – do educador exige-se a mudança de sua prática pedagógica e o cumprimento da nova ordem estabelecida. (FRANCIOLI, 2005, p. 47-48)

1.4A PRÁTICA PEDAGÓGICA POSSÍVEL

Mudanças são necessárias, mas o que de fato pode ser modificado

que leve a uma ação pedagógica de sucesso? São muitas as

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variáveis envolvidas no processo educativo, no entanto a ação docente é

considerada fator determinante do que acontece dentro da sala de aula.

É preciso considerar a idéia de VASCONCELLOS (1994, p. 11) sobre a

importância do professor estar “antenado” com todas a variáveis

envolvidas no processo educativo: “conhecer como se dá o conhecimento

no processo pedagógico é ajudar a eliminar a determinação social dos

destinos dos alunos. Para o professor, é importante esse conhecimento a

fim de melhor saber como interagir com a criança, no sentido de favorecer

seu desenvolvimento e sua emancipação.”

O professor deve assumir-se enquanto educador, acreditando como

FREIRE (1996), que o ato de ensinar cria as possibilidades para a

produção ou construção de conhecimentos, sendo que na relação

docente / discente “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende

ensina ao aprender” (FREIRE, 1996, p.23). Assim,

Sou tão melhor professor, então, quanto mais eficazmente consiga provocar o educando no sentido de que prepare ou refine sua curiosidade, que deve trabalhar com minha ajuda, com vistas a que produza sua inteligência do objeto ou do conteúdo de que falo. Na verdade, meu papel como professor, ao ensinar o conteúdo a ou b, não é apenas o de me esforçar para, com clareza máxima, descrever a substantividade do conteúdo para que o aluno o fixe. Meu papel fundamental, ao falar com clareza sobre o objeto, é incitar o aluno a fim de que ele, com os materiais que ofereço, produza a compreensão do objeto em lugar de recebe-la, na íntegra, de mim [...] (FREIRE, 1996, p. 118)”

Portanto é de suma importância a percepção de que a prática não

pode ser neutra, exige sim, uma definição, uma tomada de posição, pois

tão importante quanto ensinar os conteúdos é o testemunho ético, a

coerência com os alunos.

É preciso lembrar MOYSÉS (1995, capa/verso e p.14) que busca

entender “Qual a razão de bons resultados que alguns professores obtêm

com seus alunos? O que os distingue de seus pares? Como é a sua

prática?”. A autora considera ainda que saber ensinar é “ tarefa complexa,

requer preparo e compromisso; envolvimento e responsabilidade. É algo

que se define pelo engajamento do educador com a causa democrática e

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Page 14: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

se expressa pelo seu desejo de instrumentalizar política e tecnicamente o

seu aluno, ajudando-o a construir-se como sujeito social.” .

MOYSÉS (1995, p.14) ressalta também a competência profissional

como fator de peso para a melhoria da qualidade de ensino, sem deixar de

considerar que “é óbvio que ele, o professor, por si só, não é capaz de

transformar a realidade que extrapola a própria escola e tem suas raízes

no econômico e no sóciopolítico”.

Preocupada também com os percalços enfrentados pela educação

hoje, ZAGURY (2006, p.12-13) propõe a necessidade de estudos

abrangentes sobre os problemas ligados a educação, é preciso mais

pesquisa.

Quem não tem por hábito questionar ou investigar as informações que recebe (origens e autores) começa a repetir o que ouviu. Muitos dos que falam sobre Educação ( e que por vezes nunca deram aulas, por exemplo, no Ensino Básico) o fazem com tal segurança e até certo ar de superioridade, que inibem os que os escutam. Em geral, começam assim: “todos sabem que...”; “como é de conhecimento geral”... Quem os ouve, e não está embasado, acaba achando que é um pressuposto incontestável. E assim se criam mitos, modas e manias em educação [...].

Propõe como pontos fundamentais para a educação a

“Continuidade nas experiências e projetos pedagógicos iniciados; [...]

Acompanhamento e avaliação sistemáticos e abrangentes de processo e

de produto [...] e Análise final dos resultados” (ZAGURY, 2006, p.13-14),

sendo que sem eles dificilmente corrigiremos os desvios, insucessos,

influências e contaminações não desejadas na escola, como seu uso

político, por exemplo.

Ainda, ZAGURY (2006, p.18 e 19) evidencia, ao questionar se a

educação brasileira não está tomando rumos equivocados, escolhendo

“estratégias ou reformas educacionais sem embasar essas escolhas na

realidade das salas de aula” que a culpa do fracasso não pode estar no

professor, deve situar-se no sistema. Vai além quando apresenta como

uma medida para evitar fracassos, “ouvir o docente”, considerando suas

colocações, fazendo-o “como rotina, com respeito profissional e levando

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Page 15: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

em conta, de fato, o que foi dito”. É o docente que pode realmente

expressar o que acontece no interior da sala de aula e que apesar de toda

gama de dificuldades, “continuam dispostos em busca de ensinar

qualitativamente bem”.

2.5 PESQUISAS EM EDUCAÇÃO

Essa pesquisa iniciou-se com a proposição de traçar um perfil da

escola pública, investigando, junto aos vários atores da realidade da

escola, a opinião que têm desta, as mudanças pretendidas, a forma como

percebem a prática pedagógica e a função da escola em suas vidas.

Porém, obteve-se um perfil referente apenas à população envolvida na

pesquisa, já que os dados obtidos não permitem generalizações.

Considerando os resultados obtidos pelo levantamento de dados,

seguidos de uma análise embasada em estudiosos da educação deu-se o

direcionamento da intervenção na realidade da escola junto ao corpo

docente, pois o professor é que produz a prática pedagógica, cabendo-lhe

a responsabilidade pela condução de sua aula, o sucesso ou insucesso

desta depende de inúmeras variáveis, que nem sempre ele está apto para

dominar e superar, afinal é preciso que ele seja visto como um ser

humano.

Muitas pesquisas vêm acontecendo no interior das escolas tendo em

vista investigar suas rotinas e conseqüentemente estimular novas

práticas, que vão de encontro ou complementam esta.

A fim de entender o percurso profissional de cada professor numa

trajetória seqüenciada, CAVACO (1995, p. 160) desenvolveu um estudo

que destaca a interferência “tanto do desenvolvimento biológico, como

processos estruturais socialmente organizados e dinâmicas institucionais e

ainda aspectos específicos de cada pessoa.” Os resultados dos estudos

mostraram-se afirmativos, portanto o presente trabalho se entrelaça as

proposições de Cavaco.

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Page 16: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

FRANCIOLI (2005, p. 70) buscou obter uma descrição densa sobre a

prática pedagógica de um grupo de professores, com o “objetivo de

analisar o trabalho docente, vivido no cotidiano da escola, e os fatores que

afetam, transformando esse trabalho em trabalho alienado”, revelando a

alienação vivida pelos professores em que ele, o professor, sente-se um

estranho na sua ação durante a prática vivenciada em sala de aula e

aponta ainda os maiores problemas levantados durante a sua pesquisa em

relação a uma prática pedagógica mais efetiva, tais como: a falta de

interesse dos alunos, a rotina do trabalho docente, a sobrecarga de horas-

aula, a falta de qualificação profissional, a falta de conhecimento dos

professores sobre as outras disciplinas, a que classe trabalhadora

pertence com oprofessor. Dados parecidos aparecem no presente

trabalho, obtidos da intervenção junto aos professores.

Na tentativa de mostrar que existem possibilidades de mudanças e

melhoras, MOYSÉS (1995, p. 11) realizou uma pesquisa com o objetivo de

“ verificar porque certos professores conseguem fazer com que seus

alunos compreendam aquilo que lhes está sendo transmitido. Por que

conseguem ensinar bem? Qual a razão dos bons resultados que obtém

com os alunos, a despeito do enorme fracasso que ronda a escola? O que

os distingue de seus pares? Como é a sua prática? E o seu discurso? Quais

são as representações sociais que tem sobre a educação, aprendizagem e

seus alunos?” Para entender as respostas a estas questões, faz uma

análise do desafio de saber ensinar, a ênfase na aprendizagem por

compreensão, disciplina e motivação: conquistas necessárias e o

Professor e sua representações. Sob essa perspectiva, o presente

trabalho dá continuidade ao trabalho de MOYSÉS (1995), uma vez que

propõe direcionamentos à prática pedagógica de professores.

Numa mesma linha de pensamento ZAGURY (2006, p. 19)

desenvolveu uma pesquisa buscando colher dados concretos sobre o

pensamento do professor brasileiro e propõe “ouvir o docente” sobre

todas as variáveis que interferem no ensino, educação brasileira, pois é

ele que está na sala de aula e está apto a indicar o que precisa ser

mudado e como deve ser a mudança. Buscando as causas do fracasso,

16

Page 17: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

coloca a disciplina como uma das problemáticas. No entanto, o trabalho

ora apresentado permite observar que nada tem acontecido, nesse

sentido, no sistema educacional vigente.

Tanto os estudos já efetuados pelos estudiosos em educação,

quanto o presente trabalho levantam dados e situações que expressam a

realidade educacional brasileira, seus problemas e agravantes. Assim, é

preciso que intervenções sejam feitas e responsabilidades assumidas e

cobradas.

3 METODOLOGIA DA PESQUISA

Dentro de uma proposta de trabalho iniciada com o Programa de

Desenvolvimento Educacional (PDE), num trabalho conjunto com outras

três orientandas, pedagogas, atuantes em diferente Núcleos Regionais de

Educação do Estado do Paraná, sob a orientação da Professora

Orientadora da IES, em conjunto com duas co-orientadoras, da mesma

linha de ação, havia a pretensão/proposição de traçar um perfil das

escolas públicas do Estado do Paraná (Região Noroeste) sob a perspectiva

de alunos, pais e professores, tendo como campo de pesquisa as nossas

escolas de atuação.

A pesquisa foi realizada junto aos alunos, professores e famílias dos

alunos da minha escola de atuação, investigando qual a visão que

possuíam da escola e as perspectivas de mudanças e sobretudo buscando

identificar quais os maiores anseios da comunidade escolar em relação à

escola, ao que está sendo ofertado por ela, o que ela representa em suas

vidas, na perspectiva presente e futura qual a função que creditam à

escola. Os dados levantados permitem definir o perfil desse grupo

pesquisado e, somente em relação a ele proceder a análise e

direcionamento de ação.

As ações dizem respeito à proposta de intervenção na realidade da

escola pesquisada, em função dessa pesquisa realizada e em

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Page 18: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

concordância com as diretrizes do PDE. A intervenção ocorreu junto aos

professores e possibilitou um levantamento de dados que permitiu uma

análise da prática pedagógica enquanto produtora e ou reprodutora de

uma ideologia e da função social desta escola para os seus atores.

Foi realizada uma pesquisa de campo, com a aplicação de

questionários específicos. Com o objetivo de levantar dados e

informações concretas, busquei um levantamento qualitativo, utilizando

questionários de questões abertas, tais como: Qual a sua opinião sobre a

escola? O que mudaria na escola? Como é a prática pedagógica? Qual a

função da escola sem sua vida? Essas questões foram aplicadas para

cada segmento da comunidade escolar: alunos, professores e pais dos

alunos. Resultando em dados que, após tabulação e análise, permitiram

delinear um perfil da escola, apontando aspectos positivos e negativos.

O trabalho teve início com a aplicação dos questionários na primeira

semana do mês de agosto de 2007, a 03 (três) turmas do período noturno,

uma de cada série do Colégio Estadual Castro Alves – Ensino Médio,

cidade de Rondon, Estado do Paraná. O estabelecimento atende 450

alunos de 1ª a 3ª séries do Ensino Médio e tem no seu quadro funcional 21

professores, 02 pedagogas, 03 funcionários administrativos e 05

funcionários de serviços gerais.

O levantamento de dados pela aplicação dos questionários e

tabulação dos dados se deu por amostragem. Os questionários foram

aplicados aos alunos e professores no horário normal de aula e o dos pais

foi levados para casa pelos filhos.

A tabulação dos dados, aconteceu considerando todas as respostas

dadas. Sendo que o questionário era com questões abertas, foi necessário

proceder o levantamento de todas as respostas dadas para cada questão

proposta, a seguir agrupar essas respostas em categorias que

apresentavam características próximas e/ou redundantes de expressão de

idéias, o que permitiu analisar os dados quantitativamente.

A partir desses dados iniciou-se o trabalho de intervenção na escola,

numa proposta de implementação do projeto de pesquisa junto aos

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Page 19: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

professores, abordando o tema “A função social da escola e o processo

ensino-aprendizagem”, apresentado para fins de estudos, num caderno

pedagógico de nossa autoria, dentro do qual destacou-se a função da

escola, o processo ensino-aprendizagem, a prática pedagógica, a

realidade educacional e as possibilidades de mudanças.

Esse estudo possibilitou também aos professores a discussão acerca

de novos encaminhamentos metodológicos e pedagógicos. Procedendo

paralelamente um levantamento das possíveis dificuldades encontradas

em relação aos alunos, aos conteúdos a serem trabalhados, ao tempo de

aula, e ainda dificuldades para perceber, resgatar e implementar a função

da escola, bem como sugerir alternativas nesse sentido.

Possibilitou ainda, aos educadores, a busca de subsídios para uma

ação mais efetiva, voltada para os interesses dos alunos e suas famílias,

adotando estratégias e mecanismos de ação, com a finalidade de

melhorar a escola como um todo.

4 RESULTADOS, ANÁLISE E DISCUSSÃO DA PESQUISA

Através da aplicação de questionários de questões abertas foi

possível levantar diversas informações acerca da escola, do trabalho dos

professores, da postura dos alunos frente aos estudos e da função que

acreditam ter a escola.

Foram obtidos os seguintes dados referentes à aplicação dos

questionários e devolução dos mesmos respondidos: dos 76

questionários dos alunos, 76 foram devolvidos, dos 76 questionários dos

pais enviados apenas 24 foram devolvidos, dos 21 questionários dos

professores, 16 responderam, dos 03 questionários da equipe pedagógica

foram respondidos os 03 e dos 08 questionários dos funcionários, os 08

foram respondidos. Os questionários dos pais foram levados para casa

pelos filhos.

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Page 20: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

Não havia a obrigatoriedade de responder aos questionários e a

participação era voluntária. Vale salientar que nem todos os questionários

foram devolvidos como mostram os dados acima, sendo o questionário

dos pais o de menor retorno, o que reforça a idéia de que os pais dos

alunos do ensino médio se isentam da responsabilidade com os filhos.

Assim, na pretensão de uma análise dos vários pontos de vista dos

diversos segmentos escolares: alunos, pais e professores, foi dada

atenção as questões básicas e comuns a todos os questionários, para o

estabelecimento de parâmetros que permitiram uma intervenção mais

efetiva no processo ensino-aprendizagem e conseqüente melhoria da

escola, finalidade esta do PDE. Desta forma, foi investigada a opinião de

todos sobre a escola, as mudanças pretendidas, a forma como percebem

que se dá a prática pedagógica e qual a função da escola.

Considerando o foco dessa pesquisa e pela grande quantidade de

dados obtidos, foi dada prioridade à análise das questões referentes a

função da escola, a prática pedagógica e ainda, aos depoimentos dos

professores resultantes dos estudos propostos na implementação,

efetuada na escola junto aos mesmos.

Os dados colhidos nos questionários foram submetidos a uma

avaliação, selecionando os que interessavam mais de perto ao objeto de

estudo.

Em primeiro lugar fez-se uma listagem de todos os dados, que

foram agrupados por categorias de expressão de idéias. Em seguida

procedeu-se uma análise crítico-comparativo, buscando nas respostas

registradas, os elementos que se direcionavam ao objeto principal da

pesquisa, ou seja a função social da escola na perspectiva da prática

pedagógica.

Nesse contexto o objetivo do estudo foi analisar a visão de todos os

personagens da escola sobre a função da escola, definida pela ideologia

presente na prática pedagógica.

Consideram-se pertinentes as colocações de FREIRE (2000, p.67)

que “ Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela

tampouco a sociedade muda” e de SAVIANI (2002, p.2)

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Page 21: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

outro componente dessa visão ideológica é que os conhecimentos que a população precisa dominar são mais os do dia a dia. O importante não é estar empregado, mas ser empregável. Ser empregável significa ter flexibilidade e capacidade de adaptação. E você se adapta na medida em que você convive, se relaciona. Então os conhecimentos sistemáticos tendem a ser secundarizados. A questão que se põe que precisa ser pensada é se isto tenderia a alterar substantivamente o caráter da escola. Se isto é um indicador de que a sociedade está mudando e que, com a mudança da sociedade, a natureza da escola também está mudando.

É preciso o entendimento de que a questão da mudança da

sociedade diz respeito diretamente a nossa realidade, pois em todas e por

todas instâncias há relação direta com o que acontece na nossa escola,

com os nossos professores, com nossos alunos e com suas famílias.

Ao se tentar estabelecer qual a função que atribuem à escola, foi

preciso considerar os posicionamentos observados no questionamento

sobre qual a função da escola.

Os alunos, a partir de indicações, colocam que a função da escola é

preparar para o futuro, para um futuro melhor, é ensinar, preparar para a

vida, prepará-los para ser alguém na vida, para vencer na vida, para

conseguir um bom trabalho, educar, aprimorar e enriquecer

conhecimentos. Nesse sentido pode-se elencar expressões como: “tenho

um grande sonho, me formar e ter um bom emprego, acho que está aí a

função da escola”, “fazer de nós cidadãos, homens de bem”, e finalizando

“preparar para os obstáculos futuros em nossa vida”.

Assim, ficou claro que colocam na escola suas esperanças de vida,

onde se espera a aquisição de conhecimentos que vão possibilitar a

transformação de suas vidas. SAVIANI expõe muito bem essa função

através da sua pedagogia histórico-crítica.

Isto porque o homem não se faz homem naturalmente; ele não nasce sabendo ser homem, vale dizer, ele não nasce sabendo sentir, pensar, avaliar, agir. Para saber pensar e sentir; para saber querer, agir ou avaliar é preciso aprender, o que implica o trabalho educativo. (SAVIANI, 2005, p.7)

Os pais têm pontos de vistas diversificados, mas colocam como

função da escola: ensinar, ajudar seus filhos, preparando-os para um

futuro melhor, para ter um bom emprego, alguns abordam os professores

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Page 22: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

e a prática pedagógica tal como, “minha filha vai as aulas mas tem notas

baixas”, “tem que ter bons professores, competentes e responsáveis, e

nessa escola é exemplo”, outros a escola “ a escola tem muitas regras,

mas tudo o quem acontece a gente sabe”, a escola tem que formar e

informar e ela tem cumprido essa função”, “ a escola tem cumprido sua

função, meu filho sabe muito mais coisas que eu”.

Todas essas colocações evidenciam a satisfação dos pais com a

escola, mesmo com algumas dificuldades, ainda acreditam na escola

como uma instituição onde o saber elaborado, sistematizado, adquire

forma e tem vez.

Assim, o saber que diretamente interessa à educação é aquele que emerge como resultado do processo de aprendizagem, como resultado do trabalho educativo. Entretanto, para chegar a esse resultado a educação tem que partir, tem que tomar como referência, como matéria-prima de sua atividade, o saber objetivo produzido historicamente. (SAVIANI, 2005, p.7)

Os professores, por sua vez, colocam que a função maior da escola é

ensinar, preparar para a vida, para enfrentar o mundo, para ser um

cidadão responsável. Também apontam problemas tais como, evasão,

repetência, dualidade entre ensinar para a vida e preparar para o

vestibular, alunos e professores desmotivados por longas jornadas de

trabalho, falta da presença da família no contexto escolar, desinteresse

pelos estudos e falta de perspectiva no futuro, assistencialismo imposto as

escola em detrimento do pedagógico, no entanto ressaltam os sucessos

observados: esforço em “organizar o trabalho pedagógico centrado no

aluno” e muitos ex-alunos formados e trabalhando com sucesso.

VASCONCELLOS (1994) dá suporte teórico a essas idéias, com sua

metodologia dialética entende que em sala de aula “O conhecimento tem

sentido quando possibilita o compreender, o usufruir ou o transformar

a realidade” (grifo do autor) e GÓMEZ (1998, p.70) nos mostra também

que

A aprendizagem do alunos/as ocorre em grupos sociais nos quais as relações e as trocas físicas, afetivas e intelectuais

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Page 23: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

constituem a vida do grupo e condicionam os processos de aprendizagem. Assim para que o professor/a possa intervir e facilitar os processos de reconstrução e transformação do pensamento e da ação dos alunos/as deve conhecer as múltiplas influências que, previstas ou não, acontecem na complexa vida da aula e intervêm decisivamente no que os estudantes aprendem e nos modos de aprender.

Tais posicionamentos permitiram visualizar uma imagem da escola,

que, via de regra, parece não se diferenciar das demais. Possibilitou

ainda, perceber que os estudos realizados sobre a função da escola

situam a realidade desta escola num contexto globalizado.

No questionamento sobre a forma como percebem que se dá a

prática pedagógica, foi necessário considerar a prática pedagógica

como determinante da aprendizagem que se tem, nas quais os pontos

apontados permitiram definir o que vem ocorrendo e ainda as mudanças

necessárias.

Os alunos apontam a prática pedagógica que acontece em sala de

aula como boas, os professores “explicam bem”, “alguns professores além

de darem aula, também dão conselhos, idéias sobre as nossas

dificuldades do dia-a-dia” e “ aprende quem presta atenção”, porém

alegam que “algumas aulas poderiam ser mais dinâmicas” e “alguns nos

escutam, outros nos ignoram, tenho medo de perguntar”. Essas

considerações conduzem ao entendimento do que aponta VASCONCELLOS

(1994, p.12), “que nossa atenção deve estar em torno da sala de aula,

onde todo dia o professor tem sua prática, seleciona os conteúdos, passa

posições políticas, ideológicas, transmite e recebe afetos e valores”.

Nas colocações dos alunos ficou evidente como percebem as formas

dos professores ensinar, agir e de conduzir a aulas.

Os pais demonstram claramente que esperam da escola a

responsabilidade quanto à competência pedagógica, com depoimentos

tais como, “confio na escola, sei que utiliza somente o certo”, “ a gente

procura saber um pouco sobre o ensino, confiamos nos professores que

estão dando o melhor, um ensino de qualidade”, porém quando avaliaram

a escola apresentaram sugestões de melhorar o nível de ensino de alguns

professores. Também apresentam visão sobre a participação dos alunos “

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Page 24: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

pelo meu filho digo que os alunos não levam os estudos a sério”. Isso

evidenciou um descompromisso com a aprendizagem de seus filhos, que

fica a cargo da escola e dos professores toda a responsabilidade pelo que

seus filhos aprendem, transferem toda a responsabilidade da família para

a escola. ESTEVE (1995) mostrou muito bem o que vem acontecendo no

interior da escola e a que o professor vem sendo reduzido.

Esse descompromisso do pais em relação a aprendizagem de seus

filhos, como fruto de um momento atual da realidade em sociedade,

remete a SACRISTAN (1995, p.66) que afirma que “o ensino é uma prática

social [...] reflectem a cultura e contextos sociais a que pertencem”.

Os professores descrevem sua prática pedagógica, na maioria como

tradicional, porém procurando relacionar a teoria à prática, verificando as

possibilidades de aprendizagem para o planejamento de atividades. Fica

evidente por suas respostas que têm consciência do trabalho que

desenvolvem demonstrando a necessidade de mudar, Afirmativas como

“Acho que preciso melhorar muito, mas procuro fazer o melhor no sentido

de estabelecer uma prática que leve meu aluno a se sentir motivado em

aprender o que quero transmitir. Percebo que o mais importante é que

tenho consciência de que erro e quero melhorar” foram percebidas.

Destacam também que necessitam de metodologias que possam

favorecer a aprendizagem dos alunos.

As respostas dadas pelos professores permitiram vislumbrar um

quadro angustiante vivenciado, pois a eles é incutida toda a

responsabilidade pela aprendizagem dos alunos, do sucesso que obterão

na vida, cabendo ainda sanar-lhes as necessidades mais imediatistas que,

em muitos casos, assumem cunho assistencialista. Sabem que precisam

ensinar, que tem erros e que precisam melhorar, mas não conseguem,

com seus conhecimentos, achar os caminhos para mudar essa situação

vivenciada.

Muitos estudos e pesquisas acontecem, procurando evidenciar a

realidade vivenciada pelos professores que refletem diretamente na sua

prática pedagógica e nos resultados desta. ESTEVE (1995, p. 108)

apresenta que o professor

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Page 25: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

Para além das aulas, devem desempenhar tarefas de administração, reservar tempo para programar, avaliar, reciclar-se, orientar os alunos e atender os pais, organizar atividades várias, assistir a seminários e reuniões de coordenação, de disciplina ou de ano, porventura mesmo vigiar edifícios e materiais, recreios e cantinas.

MOYSÉS (1995, p. 11) ressalta ainda, o “professor a quem falta

quase tudo: das condições materiais de trabalho ao apoio pedagógico; da

boa formação ao reconhecimento do seu valor profissional”

Assim, tudo o que acontece no contexto escolar, bem como no seu

meio social ao qual se insere, marca a vida desses indivíduos, em relação

à prática pedagógica do professor e vale a pena salientar que

o professor trabalha de forma fragmentada, perdendo a autonomia, o conhecimento do todo e fica incapaz de trabalhar independentemente do capital; a atomização do trabalho pedagógico inibe as forças intelectuais do professor, já que a produção intelectual, o conhecimento, concentra-se a serviço do capital e confronta-se com o trabalhador como força estranha e dominadora; a mecanização do trabalho docente expropria o saber do professor sobre suas ações pedagógicas, tornando-o incapaz de pensá-lo e concebê-lo na sua totalidade; a desqualificação docente priva-o do debate das grandes questões sociais: salários, desemprego, guerras; transformando o espaço escolar em espaço do silêncio, da aceitação e do conformismo; a forma como o sistema educacional atende às necessidades do capital, obriga o professor a um trabalho cansativo, apático, indiferente, condicionando-o a produzir algo que lhe permita ganhar a vida. Quando o sistema exige mudanças de concepções, de metodologias – e isto ocorre, quase sempre, a cada mudança de governo – do educador exige-se a mudança de sua prática pedagógica e o cumprimento da nova ordem estabelecida. (FRANCIOLI, 2005, p. 47-48)

Mais uma vez, os resultados que foram colhidos junto aos atores da

escola indicam que o que acontece no interior desta escola é reflexo do

vem acontecendo na maioria das escolas, onde a função que assume a

escola está em relação direta ao que se espera dela, refletida na ideologia

presente no fazer pedagógico ali existente.

O resultado dessa pesquisa permitiu a análise e o confronto entre o

prescrito e o realizado e, desta forma, desvelou-se o que realmente vem

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acontecendo em nossa escola, assim, foi proposto um aprofundamento de

estudos junto aos professores, numa proposta de implementação desse

projeto de pesquisa.

FREIRE (1996, p.22) destaca a necessidade desses estudos ao

afirmar que “a reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da

relação Teoria/Prática sem a qual a teoria pode ir virando blábláblá e a

prática, ativismo”.

Assim, foi discutido com os professores temas diretamente

relacionados a sua prática pedagógica, a sua atuação em sala de aula,

buscando efetivamente uma melhoria do quadro educacional

apresentado. Essa é a idéia, melhorar nosso meio próximo, a nossa escola.

O que embasou esses estudos foi a idéia de que o professor como

principal articulador do processo ensino-aprendizagem, precisa, conforme

VASCONCELLOS (1994, p. 11) estar “antenado” com todas a variáveis

envolvidas no processo educativo: “conhecer como se dá o conhecimento

no processo pedagógico é ajudar a eliminar a determinação social dos

destinos dos alunos. Para o professor, é importante este conhecimento a

fim de melhor saber como interagir com a criança, no sentido de favorecer

seu desenvolvimento e sua emancipação.”

Conforme FREIRE (1996), o ato de ensinar cria as possibilidades para

a produção ou construção de conhecimentos e, de acordo com ZAGURY

(2006, p.12-13) existe a necessidade de estudos abrangentes sobre os

problemas ligados a educação, é preciso mais pesquisas e também sugere

como medida para evitar fracassos, “ouvir o docente”, considerando suas

colocações, fazendo-o “como rotina, com respeito profissional e levando

em conta, de fato, o que foi dito”. É o docente que pode realmente

expressar o que acontece no interior da sala de aula e que apesar de toda

gama de dificuldades, “continuam dispostos em busca de ensinar

qualitativamente bem”.

Assim, foi aprofundado o estudo com os professores sobre a função

social da escola e o processo ensino-aprendizagem, momento no qual

também foi apresentado os dados levantados com a pesquisa.

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Page 27: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

Os resultados dessa pesquisa causaram certa inquietude entre os

professores, pois apontaram, os problemas que requeriam soluções

urgentes, destacando a prática pedagógica de alguns professores.

Seguindo um cronograma de estudos estabelecido com os

professores, efetivou-se a implementação na escola, o que possibilitou um

levantamento de dados sobre a prática pedagógica por eles realizada,

bem como dos problemas e soluções apontados.

a) As dificuldades em relação aos alunos, aos conteúdos a serem

trabalhados, ao tempo de aula e a outras variáveis observadas:

desinteresse generalizado, sem objetivo de vida, sem empenho nas

atividades escolares, comodismo; a preocupação maior dos alunos é

passar de ano; falta de apoio e estrutura familiar; sem limites, desconhece

seus deveres e obrigações; violência contra o professor; muita burocracia

legal, com a preocupação constante de documentar o que acontece em

relação aos alunos, considerando os fatores citados; dinamicidade

histórica que traz angústia aos alunos e ao professor que não sabe o quê,

como e porque ensinar; falta de maturidade e pré-requisitos necessários

ao desenvolvimento dos conteúdos; o número de aulas é insuficiente para

trabalhar os conteúdos mínimos necessários das disciplinas; os conteúdos

previstos são ditados pelo sistema que atende aos interesses dos que

mandam, cabendo ao professor através da sua prática pedagógica,

socializá-lo aos alunos;

b) As dificuldades para perceber, resgatar e implementar a função da

escola: a função da escola não está clara nem aos professores, nem

aos pais; escola presa a burocracia como mecanismo de defesa dos

problemas sociais que estouram no interior da escola; falta de

discernimento da sociedade, principalmente dos dirigentes, sobre a

função da escola; a imposição da função do assistencialismo à escola

quando as demais instituições sociais falham; descaracterização da sua

função, quando lhe é imposta assumir a função da família; grande

burocracia que a escola tem enfrentado, se trabalha muito com

levantamento de dados, índices e apontamentos de situações, projetos

impostos pela SEED, ficando os conteúdos e os projetos reais da escola

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relegados a segundo plano, nunca atingindo os objetivos previstos;

dificuldade de transpor teoria para a prática sem os recursos e tempo

necessários;

c) Possíveis soluções e alternativas propostas a partir dos estudos:

produzir aulas dinâmicas e criativas, tendo o professor como produtor

dessas aulas, a sala de aula como um laboratório de conhecimento, e o

aluno criando suas próprias idéias; maior envolvimento escola-família e

comunidade; “Procurar novos meios de avaliar o aluno, sem esta

preocupação com “nota”, isto me parece muito capitalista, quanto vale

o conhecimento de um aluno? 0 ou 10?”; valorização dos profissionais

da educação, principalmente dos professores; ampliação do tempo

escolar dos alunos, com ampliação de estudos efetivos, alimentação e

orientações práticas para a vida; diálogo permanente, atrelado ao

compromisso ético do profissionais da educação; trabalho conjunto de

professores e equipe pedagógica; mais espaço para estudo

direcionados ao tema; “ a reflexão sobre a ideologia que dá suporte à

minha prática docente, possibilitou que eu fizesse uma reavaliação da

metodologia, que buscasse novas estratégias motivadoras voltadas à

aprendizagem significativa”; maior disponibilidade de tempo para o

professor e maior salário possibilitando ao professor estudar, planejar,

aplicar e avaliar os resultados de sua prática pedagógica; os conteúdos

e a escola devem buscar a reflexão, deixar de ser meros reprodutores;

seleção crítica dos conteúdos; seleção e autonomia de escolha na

participação naqueles projetos que dizem respeito a realidade dos

alunos e represente ganhos significativos para estes; maior

investimento em material didático; dar oportunidades iguais de

capacitação aos professores; escola em tempo integral; enfim, buscar o

conhecimento do aluno através da troca de experiências, o bom

relacionamento com o grupo através do diálogo, as normas para a

convivência em grupo com a formulação de regras com o próprio

grupo; o trabalho com a afetividade por meio de dinâmicas, o

embasamento teórico através de pesquisas; o domínio de conteúdos

através da formação continuada; a reflexão das ações através de

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Page 29: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

avaliações diagnósticas, o respeito a diversidade com a aceitação do

diferente e a compreensão da singularidade dentro dessa diversidade;

Todos esses dados vem subsidiar a busca constante pelos

professores e equipe pedagógica do entendimento do que realmente vem

acontecendo com a realidade escolar. Achar culpados não é suficiente, é

necessário empenhar esforços de todos os envolvidos para melhorar o que

está aí posto.

É preciso entender como se dá a prática pedagógica e buscar nas

pesquisas realizadas, subsídios e dados complementares. Vale citar as

pesquisas de CAVACO (2005), FRANCIOLLI (2005), MOYSÉS (1995) e

ZAGURY (2006), anteriormente expressas nesse trabalho.

5 CONCLUSÃO

Esse estudo não esgota todas as possibilidades de compreensão do

objeto de pesquisa proposto. A idéia de analisar a função social da escola

sob a perspectiva da prática pedagógica como produto e produtora de

uma ideologia, foi impulsionada a princípio pela necessidade de realização

de um trabalho de pesquisa dentro do PDE, porém muito mais pela

necessidade de entender e modificar o cotidiano escolar vivenciado.

Problemas para os quais, na maioria das vezes, não temos respostas e que

tem levado educadores e alunos ao desestímulo, ao desânimo, e ao final

de um ano letivo, a um sentimento de impotência e de fracasso.

Por isto, fez-se necessário entender o que realmente acontece na

sala de aula, os pontos de vista de alunos, professores e pais. Enfim,

como tem se efetivado o processo ensino-aprendizagem.

Dessa forma, ao discutir a função social da escola na vida dos

alunos, pais, professores e demais pessoas da escola, desnuda-se o

processo pedagógico à luz da ideologia que o rege, ficam transparentes os

sucessos e os fracassos obtidos em educação junto a clientela pesquisada.

Assim, aparece o perfil dessa escola pública na qual teve destaque a

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Page 30: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

relevância da ideologia presente na prática pedagógica, pois vivemos em

uma sociedade capitalista, voltada para o mercado de consumo, num

mundo globalizado, onde todas as diretrizes que regem a educação estão

voltadas para o atendimento dessa ideologia.

Mudanças são necessárias, mas o que de fato pode ser modificado

que nos leve a uma ação pedagógica de sucesso? São muitas as variáveis

envolvidas no processo educativo, mas o professor e a sua ação docente

são fatores determinante do que acontece dentro da sala de aula.

Portanto, o professor é figura de destaque e determinante da ação

pedagógica efetivada em sala de aula, perpassada por uma ideologia

capitalista. Todas as variáveis apontadas indicam o professor como a mola

mestra do ensino, nesse enfoque cabe a ele tomar as rédeas do que

realmente está acontecendo no seio da escola, como determinante da

escola que se tem.

Tendo presente todas essas considerações, é preciso reflexão sobre

a ação educativa procurando delinear possíveis caminhos. Não é tarefa

fácil ser educador, mas é preciso assumir a função com responsabilidade

e respeito.

Enfim, a conclusão é que o professor é o principal articulador dos

resultados obtidos através do processo educativo, cabendo a ele

apropriar-se das ferramentas que possibilitem a construção de uma

prática pedagógica mediadora determinante da escola que se quer.

6 REFERÊNCIAS

CAVACO, M. H. Ofício do professor: o tempo e as mudanças. In: NÓVOA, Antonio (org.). Profissão Professor. 2ª ed.. Cidade do Porto: Porto Editora, 1995, p. 63-92 (Coleção Ciências e Educação)..........

ESTEVE, J. M. Mudanças sociais e função docente. In: NÓVOA, A. (org.). Profissão Professor. 2ª ed. Cidade do Porto: Porto Editora, 1995, p. 93-124 (Coleção Ciências e Educação).

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Page 31: UM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA - Gestão · PDF fileUM PERFIL DA ESCOLA PÚBLICA: A IDEOLOGIA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Lucilene Poloto1 RESUMO Este trabalho teve como base a análise

FRANCIOLI, F. A. S. Profissão docente: uma análise dos fatores intervenientes na prática educativa. Ponta Grossa: Universidade Estadual de Ponta Grossa, 2005 (Dissertação de Mestrado).

FREIRE, P. Pedagogia da auntonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996 (Coleção Leitura)

FREIRE, P. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos.. São Paulo: Editora UNESP. 2000.

GÓMEZ, A. I. P. Compreender e transformar o ensino. In SANCRISTÁN, J. G. & GÓMEZ, A. I. P. Compreender e transformar o ensino. 4ª Ed.. Porto Alegre: Artmed, 1998, p. 13-25 e 67-91 (Coleção Ciências e Educação).

MOYSÉS, L. M. O desafio de saber ensinar. 2ª ed., Campina: Papirus; Rio de Janeiro: Editora da Universidade Federal Fluminense, 1995.

SAVIANI, D. Pedagogia histórico crítica: primeiras aproximações. 9ª ed.. Campinas: Autores Associados, 2005. Col. Educação Contemporânea.

SAVIANI, D. Domínios, dominadore e dominados. Jornal da UNICAMP. Universidade Estadual de Campinas – SP. 14 a 24 de outubro de 2002. nº 194, ano XVII.

SACRISTÁN, J.G. Consciência e acção sobre a prática como libertação profissional dos professores. In: NÓVOA, A. (org.). Profissão Professor. 2ª ed.. Cidade do Porto: Porto Editora, 1995, p. 63-92 (Coleção Ciências e Educação).

VASCONCELLOS, C. dos S. Construção do conhecimento em sala de aula. 2ª ed.. São Paulo: Libertad, 1994. [Cadernos Pedagógicos do Libertad; 2]

ZAGURY, T. O professor refém: para pais e professores entenderem por que fracassa a educação no Brasil. 4ª ed.. Rio de Janeiro: Record. 2006. -

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