trajetÓria formativa: entrelaÇando saberes... estudo do meio como lugar de aprendizagem...

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713 Avaliação, Campinas; Sorocaba, SP, v. 14, n. 3, p. 713-726, nov. 2009. TRAJETÓRIA FORMATIVA: ENTRELAÇANDO SABERES... ESTUDO DO MEIO COMO LUGAR DE APRENDIZAGEM DO/DISCENTE GIOVANNA MARGET MENEZES CARDOSO* Recebido em: 03 de maio de 2009 Aprovado em: 02 de junho de 2009 *Professora da Universidade do Estado da Bahia – UNEB. Aluna do Mestrado em Inovação Pedagógica pela Universidade de Madeira – Portugal. E-mail: [email protected] Resumo: As reflexões propostas neste artigo são em decorrência de uma prática educativa que visa fazer do processo de ensinagem na sala de aula, um espaço de pesquisa. Tal proposta de trabalho tem viés nos estudos do componente curricular Fundamentos da Educação Infantil, a qual é oferecida no quinto semestre do curso de Licenciatura em Pedagogia da Universidade do Estado da Bahia / UNEB – Campus XI, Serrinha/BA. Nesta perspectiva vivenciar uma prática educativa que reconheça a pesquisa como um princípio não só científico, mas, também educativo, podendo ser colocado como um paradigma da metodologia de ensino e aprendizagem. Para que este paradigma possa se desenvolver se faz mister considerar que a pesquisa alimenta-se de questionamentos elaborados, que devam ter como premissa a argumentação, fundamentação e manejo crítico do já conhecido. A abordagem metodológica se se fundamenta na perspectiva sócio-interacionista, com reflexões teóricas e trabalho de campo, tendo como instrumentos de coleta de dados a observação e entrevista. Os estudos teóricos e os dados coletados em campo permitiram comparar, elaborar hipóteses e organizar/sistematizar a realidade estudada/investigada. Os resultados evidenciam as contribuições da experiência em pesquisa no avanço/amadurecimento profissional dos educandos. Numa produção muito significativa, como resultado final os educandos apresentam o simpósio, fica explicito, nas comunicações, a percepção de que o objetivo maior da pesquisa no processo de ensino é fazer dos educandos um parceiro de trabalho ativo, participativo, produtivo e re-construtivo. Palavras-chave: Pesquisa. Prática pedagógica. Ensino e aprendizagem. THE TRAJECTORY OF EDUCATION: INTERTWINING KNOWLEDGES… STUDY OF THE ENVIRONMENT AS A PLACE OF LEARNING FOR THE STUDENTS AND TEACHERS Abstract: The proposed ideas in this article are due to an educational practice that aims to make the teaching process in the classroom an area of research. The proposed work takes its vantage point from studies of the curriculum component of the Child Education Foundations, which is offered in the fifth semester of the Pedagogy Bachelor program at the University of Bahia / UNEB - Campus XI, Serrinha / BA-Brazil. In this perspective a practical educational experience to recognize the research not only as a scientific principle but also an educational one can be placed as a paradigm of the methodology of teaching and learning. In order for this paradigm to be developed it is essential to consider that research needs prepared questions, which must be based on the argument, reasoning and critical management of the already known. The methodological approach is based on the socio-interactions perspective, with theoretical and fieldwork, using observations and interviews as tools for collecting. The theoretical studies and data collected in the field allowed us to compare, develop hypotheses and organize/systematize the reality studied/investigated. The results highlight the contributions of research experience in the professional growth of the students. As a final result the students present a symposium, and it becomes explicit in their communication the perception that the prime objective of research in the teaching process is to make the students hands-on, productive, constructive working partners. Key words: Research. Teaching. Teaching and learning. Contextualizando a discussão... Escrevo porque à medida que escrevo vou me entendendo e entendendo o que quero dizer, entendo o que posso fazer.

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As reflexões propostas neste artigo são em decorrência de uma prática educativa que visa fazerdo processo de ensinagem na sala de aula, um espaço de pesquisa. Tal proposta de trabalho temviés nos estudos do componente curricular Fundamentos da Educação Infantil, a qual é oferecidano quinto semestre do curso de Licenciatura em Pedagogia da Universidade do Estado da Bahia /UNEB – Campus XI, Serrinha/BA. Nesta perspectiva vivenciar uma prática educativa que reconheçaa pesquisa como um princípio não só científico, mas, também educativo, podendo ser colocadocomo um paradigma da metodologia de ensino e aprendizagem. Para que este paradigma possa sedesenvolver se faz mister considerar que a pesquisa alimenta-se de questionamentos elaborados,que devam ter como premissa a argumentação, fundamentação e manejo crítico do já conhecido.A abordagem metodológica se se fundamenta na perspectiva sócio-interacionista, com reflexõesteóricas e trabalho de campo, tendo como instrumentos de coleta de dados a observação e entrevista.Os estudos teóricos e os dados coletados em campo permitiram comparar, elaborar hipóteses eorganizar/sistematizar a realidade estudada/investigada. Os resultados evidenciam as contribuiçõesda experiência em pesquisa no avanço/amadurecimento profissional dos educandos. Numa produçãomuito significativa, como resultado final os educandos apresentam o simpósio, fica explicito, nascomunicações, a percepção de que o objetivo maior da pesquisa no processo de ensino é fazer doseducandos um parceiro de trabalho ativo, participativo, produtivo e re-construtivo.

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  • A AVALIAO INSTITUCIONAL NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS E AS COMISSES PRPRIAS DE AVALIAO

    713Avaliao, Campinas; Sorocaba, SP, v. 14, n. 3, p. 713-726, nov. 2009.

    TRAJETRIA FORMATIVA: ENTRELAANDO SABERES... ESTUDO DO MEIO COMO LUGAR DE APRENDIZAGEM DO/DISCENTE

    TRAJETRIA FORMATIVA: ENTRELAANDO SABERES... ESTUDO DO MEIO COMO LUGAR

    DE APRENDIZAGEM DO/DISCENTEGiovanna MarGet Menezes Cardoso*

    Recebido em: 03 de maio de 2009 Aprovado em: 02 de junho de 2009

    *Professora da Universidade do Estado da Bahia UNEB. Aluna do Mestrado em Inovao Pedaggica pela Universidade de Madeira Portugal. E-mail: [email protected]

    Resumo: As reflexes propostas neste artigo so em decorrncia de uma prtica educativa que visa fazer do processo de ensinagem na sala de aula, um espao de pesquisa. Tal proposta de trabalho tem vis nos estudos do componente curricular Fundamentos da Educao Infantil, a qual oferecida no quinto semestre do curso de Licenciatura em Pedagogia da Universidade do Estado da Bahia / UNEB Campus XI, Serrinha/BA. Nesta perspectiva vivenciar uma prtica educativa que reconhea a pesquisa como um princpio no s cientfico, mas, tambm educativo, podendo ser colocado como um paradigma da metodologia de ensino e aprendizagem. Para que este paradigma possa se desenvolver se faz mister considerar que a pesquisa alimenta-se de questionamentos elaborados, que devam ter como premissa a argumentao, fundamentao e manejo crtico do j conhecido. A abordagem metodolgica se se fundamenta na perspectiva scio-interacionista, com reflexes tericas e trabalho de campo, tendo como instrumentos de coleta de dados a observao e entrevista. Os estudos tericos e os dados coletados em campo permitiram comparar, elaborar hipteses e organizar/sistematizar a realidade estudada/investigada. Os resultados evidenciam as contribuies da experincia em pesquisa no avano/amadurecimento profissional dos educandos. Numa produo muito significativa, como resultado final os educandos apresentam o simpsio, fica explicito, nas comunicaes, a percepo de que o objetivo maior da pesquisa no processo de ensino fazer dos educandos um parceiro de trabalho ativo, participativo, produtivo e re-construtivo.

    Palavras-chave: Pesquisa. Prtica pedaggica. Ensino e aprendizagem.

    THE TRAJECTORY OF EDUCATION: INTERTWINING KNOWLEDGES STUDY OF THE ENVIRONMENT AS A PLACE OF LEARNING FOR THE STUDENTS AND TEACHERS

    Abstract: The proposed ideas in this article are due to an educational practice that aims to make the teaching process in the classroom an area of research. The proposed work takes its vantage point from studies of the curriculum component of the Child Education Foundations, which is offered in the fifth semester of the Pedagogy Bachelor program at the University of Bahia / UNEB - Campus XI, Serrinha / BA-Brazil. In this perspective a practical educational experience to recognize the research not only as a scientific principle but also an educational one can be placed as a paradigm of the methodology of teaching and learning. In order for this paradigm to be developed it is essential to consider that research needs prepared questions, which must be based on the argument, reasoning and critical management of the already known. The methodological approach is based on the socio-interactions perspective, with theoretical and fieldwork, using observations and interviews as tools for collecting. The theoretical studies and data collected in the field allowed us to compare, develop hypotheses and organize/systematize the reality studied/investigated. The results highlight the contributions of research experience in the professional growth of the students. As a final result the students present a symposium, and it becomes explicit in their communication the perception that the prime objective of research in the teaching process is to make the students hands-on, productive, constructive working partners.

    Key words: Research. Teaching. Teaching and learning.

    Contextualizando a discusso...Escrevo porque medida que escrevo vou me entendendo

    e entendendo o que quero dizer, entendo o que posso fazer.

  • Maria do CarMo de LaCerda Peixoto

    714 Avaliao, Campinas; Sorocaba, SP, v. 14, n. 3, p. 713-726, nov. 2009.

    Giovanna MarGet Menezes Cardoso

    Escrevo porque sinto necessidade de aprofundar as coisas, de v-las como realmente so...

    Clarice Lispector

    Na busca de transformar a sala de aula num espao de pesquisa, no processo de ensinagem, mediante o argumento de que por ter como caracterstica eman-cipao a educao exige a pesquisa como seu mtodo formativo, por razo principal que somente um ambiente de sujeitos gesta sujeitos. partindo dessa premissa que o estudo do meio, utilizado como perspectiva metodolgica. Numa prtica pedaggica que permite ao educando sentir-se protagonista de suas construes e refletir sobre o papel da pesquisa como prtica no contexto da formao inicial. Portanto, o estudo do meio a metodologia escolhida para tratar do tema: As polticas pblicas para a Educao Infantil no Brasil: contexto de realidade, no componente curricular Fundamentos da Educao Infantil, do curso de Pedagogia da UNEB - Universidade do Estado da Bahia, Campus XI- Serrinha. Esta proposta metodolgica se prope a pensar no edu-cador que ensina e ao mesmo tempo faz pesquisa, como forma deste pro-fissional formar-se enquanto investigador da sua prpria prtica e reconstruir constantemente sua atividade e seus saberes docentes.

    Na busca de uma prtica que possibilite a pesquisa como metodologia de trabalho:

    [...] percorremos certos caminhos que nos do certa segurana, porque no h conhecimento absoluto e definitivo, Eles so sempre relati-vizados sintetizados sob certas condies, dependendo das teorias e mtodos que o pesquisador escolhe, devendo essas ter coerncia entre si. Fazer pesquisa fazer escolhas. No h um modelo de pesquisa cientfica, nem o mtodo cientfico, h sim caminhos j trilhados por pesquisadores experientes que nos ajudam a trilhar os nossos com maior segurana. Tendo em vista que o prprio pesquisador apresenta em seu trabalho comportamentos e vises peculiares. Assim, o conhe-cimento obtido pela pesquisa um conhecimento situado atravs de momentos histricos e das escolhas e olhares do pesquisador, qualquer que seja a natureza desses dados. (ILHA, 2008, p. 2)

    Desse modo o ensino por meio da metodologia da pesquisa, possibilita-se aos sujeitos imbricados a percorrer caminhos na busca de produo do conheci-mento. Que ao mesmo tempo em que desvelado, aparece como uma certeza, bem como aparece como um olhar que nosso, e que, portanto pode e deve ser relativizado, pois apenas outro modo de ler/interpretar/perceber a realidade.

    Paulo Freire (1996), em sua obra Pedagogia da Autonomia, preconiza: para que possamos verdadeiramente ser aprendiz, devemos exercer criticamente a

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    TRAJETRIA FORMATIVA: ENTRELAANDO SABERES... ESTUDO DO MEIO COMO LUGAR DE APRENDIZAGEM DO/DISCENTE

    capacidade de aprender. Ser aprendiz na concepo freiriana se construir e desenvolver a curiosidade epistemolgica, o papel do verdadeiro educador reforar a capacidade crtica do educando, para tanto, imprescindvel que o mesmo tenha a pesquisa como base metodolgica de desenvolvimento do seu trabalho.

    Desse modo preciso salientar que:

    [...] o profissional da educao, cada vez mais sente necessidade de ter contato maior com teorias, pensamentos e edificaes terico-metodolgicas que venham contribuir para a ressignificao da prtica pedaggica. Nesse contexto, os cursos de formao de educadores precisam estar atentos importncia da pesquisa para a produo intelectual, pois pesquisar um ato cognitivo que exige um pen-samento mais elaborado, sistematizado; que faz o sujeito transpor limites e adquirir sustentao para qualificar a ao. (PEREIRA; FONSECA, 2007 p. 3)

    Para que o profissional da educao possa ressignificar a prtica pedaggica, ele necessita refletir sobre a mesma, bem como trabalhar com uma metodologia que possibilite ao mesmo a qualificao da sua prtica, e a pesquisa uma pers-pectiva metodolgica que permite o dialogo entre teoria e prtica, qualificando a ao pedaggica. Ainda, conforme Demo (2005, p. 05), a proposta de educar pela pesquisa tem quatro pressupostos cruciais, a saber:

    1. A convico de que a educao pela pesquisa especificamente mais prpria da educao acadmica;

    2. O reconhecimento de que o questionamento re-construtivo com quali-dade formal e poltica o cerne do processo da pesquisa;

    3. A necessidade de fazer da pesquisa atitude cotidiana no educador e no educando;

    5. E a definio de educao como processo de formao da competncia histrica humana.

    Partindo dessa anlise, a prtica pedaggica desenvolvida no componente curricular Fundamentos da Educao Infantil busca articular o discurso da academia realidade scio-educacional, por meio da pesquisa.

    Desse modo, o estudo do meio organiza-se, a partir dos contedos abordados no componente curricular em questo, em que educador/mediador promove uma vasta e consistente discusso/reflexo luz dos tericos, junto com os educados/aprendizes, numa prtica dialgica de anlise e sistematizao; num processo dialtico de desconstruo e reconstruo de conceitos/concepes, como fruto das reflexes em sala de aula, buscando, deste modo, construir uma base terica que d sustentao as indagaes. Num segundo momento,

  • Maria do CarMo de LaCerda Peixoto

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    Giovanna MarGet Menezes Cardoso

    os contedos a se trabalhar so sistematizados, sem, contudo, procurar que se esgotem, nada pode ser totalmente entendido (DEMO, 2005, p. 31), na perspectiva de buscar compreender a realidade posta e numa expectativa que corresponda a uma inovao, no sentido de reconstruir o conhecimento e qui desconstruir o que existe para reconstruir em outro nvel.

    A partir das discusses, resultado do dilogo com os tericos que discutem sobre a temtica, do levantamento de hipteses e da sistematizao, os educan-dos/aprendizes, divididos/organizados em grupos para planejar toda a ao que norteia o estudo do meio. Cada grupo tem a sua temtica demarcada, a saber: Diretriz Curricular /PARECER CNE/CEB 22/1998; Diretrizes Operacionais para a Educao Infantil; RCNEI - Referencial Curricular para a Educao Infantil; Objetivos da Educao Infantil; RCNEI Estratgias e Orientaes para a educao de crianas com necessidades educacionais especiais; Orien-taes e aes para a educao das relaes tnico-racias Educao Infantil; O profissional da Educao Infantil, perspectivas e desafios e Instituies de Educao Infantil: Concepes.

    A partir dos temas produzem-se os instrumentos de coleta de dados indo ao lcus de pesquisa fazer a coleta, e de posse dos mesmos, em sala de aula, parti-se para a anlise e reflexo dos dados a luz do referencial terico, tece-se consideraes a partir de argumentaes, que revelam a habilidade estabelecer relaes e de tecer textos em profundidade, competncia metodolgica para ordenar o tema e oferecer-lhe um corpus elaborado.

    Os educandos fazem as articulaes/anlises entre os dados e o referencial terico e aps as reflexes, articulaes e refaces, a culminncia do estudo se d num simpsio com regras pr-estabelecidas dentro dos rigores acadmicos, aberto comunidade universitria e externa. As apresentaes dos resultados da ao so ricas e provocam um debate intenso e envolvente, em que os par-ticipantes, tanto os que apresentam como os que assistem, expressam a riqueza da experincia e evidenciam o amadurecimento a partir de tal intento.

    Nesta perspectiva metodolgica pode-se vislumbrar como fulcro, a impor-tncia das historicidades, dos nexos, da rede terica, da anlise e reflexo, dos elementos que possibilitam a sntese obtida. Como afirma Anastasiou (2003, p. 13), a ausncia desses aspectos cientficos, sociais e histricos deixa os contedos soltos, fragmentados, com fim e si mesmos.

    Conceituando: O Estudo do meio...A aventura de partir descoberta para conhecer o Meio

    no sentido de saber pensar e atuar sobre ele pressupe o desenvolvimento de competncias especficas em trs grandes

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    TRAJETRIA FORMATIVA: ENTRELAANDO SABERES... ESTUDO DO MEIO COMO LUGAR DE APRENDIZAGEM DO/DISCENTE

    domnios que se relacionam entre si: a localizao no espao e no tempo; o conhecimento do ambiente natural e social e odinamismo das inter-relaes entre o natural e o social.

    A localizao no espao e no tempoPriscila Maria Farah

    O estudo do meio, como perspectiva metodolgica, escolhida com o objetivo de desenvolver uma prtica pedaggica que supere a idia do simples dizer do contedo, num processo que possibilite destacar o aspecto do saber referente ao gosto ou sabor, do latim sapere ter gosto. Na ensinagem, o processo de ensinar e aprender exige um clima de trabalho tal que possa saborear o conhe-cimento em questo, (grifo nosso). (ANASTASIOU, 2003, p. 12)

    O estudo do meio por ter como operao de pensamento dominante a obten-o de dados/crtica comparao/elaborao de hipteses/ organizao de dados. Possibilita a superao das questes supracitadas, numa prtica pedaggica que vai alm de um ensino fragmentado e descontextualizado, provocando no educando o desejo de conhecer e desnudar a realidade, na nsia de melhor conhec-la, para nela atuar.

    O Meio, neste contexto compreendido como um conjunto de elementos, fenmenos, acontecimentos, fatores e / ou processos diversos, que ocorrem no meio vivido, onde a vida e a ao das pessoas tm lugar e adquirem significado. Portanto, podemos afirmar que o Meio desempenha um papel condicionante e determinante na vida, experincia e atividade humanas, ao mesmo tempo em que sofre transformaes contnuas como resultado dessa mesma atividade. Vale ressaltar, que o mesmo explicita as relaes dos sujeitos nos mais variados espaos, desse modo o conhecimento/ desvelamento do meio a partir da ob-servao, reflexo e anlise dos fenmenos, dos fatos e das situaes, permite uma melhor compreenso dos fotos sociais e polticos que permeiam o Meio, o que possibilita ao sujeito a conduo de interveno crtica no mesmo.

    Intervir criticamente significa ser capaz de analisar e conhecer as condies e as situaes em que somos afetados pelo que acontece no meio e significa tam-bm intervir no sentido de modificar, o que implica processos de participao, defesa e respeito. Estudar o meio pressupe, ento, a emergncia de compo-nentes emocionais, afetivos e prticas de relao com ele, proporcionadas pela vivncia de experincias de aprendizagem que promovam o desenvolvimento de competncias especficas no mbito da rea disciplinar.

    [...] o pesquisador estar sempre buscando novas respostas e novas indagaes para o desenvolvimento do seu trabalho; valorizando a interpretao do contexto; retratando a realidade de forma densa, refinada e profunda; estabelecendo planos de relaes com o objeto

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    pesquisado, revelando-se a a multiplicidade de mbitos e refern-cias presentes em determinadas situaes ou problema; usando uma variedade de informaes. (MACEDO, 2006, p. 89)

    A partir das suas percepes, vivncias e representaes, o educando le-vado compreenso, reelaborao, tomada de decises e adoo de uma linguagem progressivamente mais rigorosa e cientfica. Isto significa que os educandos trazem para o espao acadmico um conjunto de idias, preconceitos, representaes, disposies emocionais e afetivas e modos de ao prprios.

    Podemos inferir que esse corpo de conhecimento trazido pelos educandos ao ingressarem na academia, so esquemas de conhecimento subjetivos, incoe-rentes, pouco maduros e incapazes de captar a complexidade do meio tal como este se apresenta experincia humana. Estes esquemas, quando confrontados com outros mais objetivos, socialmente partilhados e decorrentes do processo de ensino vo sofrendo rupturas que abalam a viso sincrtica da realidade, a perspectiva egocntrica e as explicaes mgicas e finalsticas que so prprias do pensamento do senso comum, como afirmava Paulo Freire (1996), dando origem a um conhecimento cada vez mais rigoroso e cientfico, um conheci-mento epistemolgico.

    Questo fundamental para a docncia: Ensino e Pesquisa.

    Pensar certo e saber que ensinar no transferir conhecimento fundamentalmente pensar certo uma postura exigente, difcil, s vezes penosa, que temos de assumir diante dos outros e com os

    outros, em face do mundo e dos fatos, ante ns mesmos.Paulo Freire

    Falar em produo do conhecimento estar nos referindo pesquisa como seu sinnimo. Assim, coadunando com as idias de Demo (2005, p. 14), a premissa de que no se pode conceber educador que apenas exera o ensino; do mesmo modo, que dificilmente se pense num pesquisador que apenas pesquise sem socializar os resultados de sua busca. Nessa perspectiva, acreditamos ser fulcral que haja uma articulao/imbricao entre as duas esferas (ensino e pesquisa), e nesta articulao que reside produtividade docente.

    Paulo Freire (1996, p. 29), ao escrever a Pedagogia da Autonomia aborda a questo supracitada de um modo bem simples e objetivo:

    Fala-se hoje, com insistncia, no professor pesquisador. No meu en-tender o que h de pesquisador no professor no uma qualidade ou uma forma de ser ou de atuar que se acrescente a ensinar. Faz parte da natureza da prtica docente a indagao, a busca, a pesquisa. O

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    que se precisa que, em sua formao permanente, o professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador.

    Ao colocar a pesquisa como condio e responsabilidade indispensveis da ao docente, apontamos como conseqncia que a mesma, tanto para o edu-cador quanto para o educando, torna-se um princpio educativo, uma vez que o professor no educa apenas atravs de palavras, mas, tambm, pela postura revelada em suas atitudes. Como bem afirma Freire (1996, p. 34), ensinar exige a corporeificao das palavras pelo exemplo, (grifo nosso).

    Assim estabelecer a pesquisa como princpio educativo tambm significa incentivar a capacidade de questionamento crtico do educando; fazer com que ele consiga identificar as fontes de informao e conhecimento que podem ser utilizadas para levar o processo de pesquisa a bom termo (bibliotecas, acervos culturais, museus, internet, in lcus); aguar a capacidade de selecionar e ma-nusear informaes; incentivar o uso da tecnologia disponvel; possibilitar uma postura cientifica para o tratamento metodolgico das questes. Nessa medida, o verdadeiro educador no pensa a construo do conhecimento fora da relao com a vida social, haja vista que a prtica pedaggica, para ser eficaz, pede esta articulao com a concretude do sujeito e do real.

    [...] construir conhecimento principalmente ter idias prprias, sn-teses pessoais, modo particular de ver, ateno observadora, anlise crtica do que acontece e assim por diante. No professor no basta isso. mister que ele elabore teoricamente e que teorize as prticas. (DEMO, 1992, p. 8)

    Nesse vis, preconiza-se uma educao que promova uma tentativa constan-te de mudana de atitude no sujeito, substituindo a passividade pelo hbito da participao e ingerncia. Contudo no modelo educacional contemporneo, nas prticas pedaggicas adotadas de modo geral, nada faz para alcance de tal objetivo.

    [...] No seria, porm, quase nada existe em nossa educao, que desenvolva no nosso estudante o gosto da pesquisa, da constatao, da reviso dos achados o que implicaria no desenvolvimento da conscincia transitivo-crtica. Pelo contrrio, a sua conscincia ingnua [...][...] Cada vez mais nos convencemos, aliais, de se encontrarem na nossa inexperincia democrtica, as razes deste nosso gosto da pa-lavra oca. Do verbo. Da nfase nos discursos. Do torneio da frase. que toda esta manifestao oratria, quase sempre tambm sem profundidade, revela, antes de tudo, uma atitude mental. Revela ausncia de permeabilidade caracterstica da conscincia crtica. E precisamente a criticidade a nota fundamental da mentalidade democrtica.

  • Maria do CarMo de LaCerda Peixoto

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    Giovanna MarGet Menezes Cardoso

    Esta nos parecia uma das grandes caractersticas de nossa educao. A de vir enfatizando cada vez mais em ns posies ingnuas, que nos deixam sempre na periferia de tudo o que tratamos. Pouco ou quase nada, que nos leve a posies mais indagadoras, mais inquietas, mais criadoras. Tudo ou quase tudo nos levando, desgraadamente, pelo contrrio, passividade, ao conhecimento, memorizado apenas, que, no exigindo de ns elaborao ou reelaborao, nos deixa em posio de inautntica sabedoria. (FREIRE, 1996, p. 102-104 )

    A prxis: prtica pensada e refletida, transformada em ao. [...] No possvel tambm formao docente indiferente

    boniteza e decncia que estar no mundo, com o mundo e com os outros, substantivamente, exige de ns. No h prtica docente

    verdadeira que no seja ela mesma um ensaio esttico e tico. Paulo Freire

    Mediar as descobertas dos educandos no que se refere metodologia de trabalho com o estudo do meio, sem dvidas, uma experincia rica e interes-sante que proporciona a construo do conhecimento, o qual permeado pela pesquisa e reflexo, atribuio de sentido s informaes construdas em sala de aula, aos textos lidos e debatidos, aos saberes analisados. A aprendizagem se concretiza quando transformamos as informaes em conhecimento, transfor-mando curiosidade ingnua em curiosidade epistemolgica. (FREIRE, 1997, p. 13, grifo nosso)

    Os aprendizes / educandos produziram vdeos, textos, painis eletrnicos, estabeleceram relaes (interdisciplinaridade), principalmente no tocante ao estudo do componente curricular Fundamento da Educao Infantil. O estudo est contribuindo para a compreenso de que a construo de Polticas Pblicas para Educao Infantil deva ser consubstanciada nos princpios de cidadania, esta compreendida aqui, no apenas enquanto direitos e deveres da criana, mas que perpassa a dimenso tica e poltica.

    Nas falas dos educandos, podemos perceber a riqueza da experincia com estudo do meio, culminando no simpsio:

    O que eu mais gostei na atividade do estudo do meio foi a articulao entre teoria e prtica, a produo do conhecimento, ao educador interagindo com o educando, provocando , instigando ao educando a produo do conhecimento (aluna 5 semestre do curso de Pe-dagogia -2008)

    O fato de termos ido a campo com o objetivo de analisar a realidade e confronta-la com o proposto na Lei com relao aos espaos de Educao Infantil, pois saber que existe uma diretriz operacional

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    de construo desses espaos e que os mesmos devem ser pensa-dor a partir da colaborao de uma equipe multidisciplinar foi uma descoberta importante. O estudo do meio foi uma prtica que alargou os nossos conhecimentos em relao E.I. pois atravs dele, das aulas e das pesquisas realizadas nas escolas, e nas secretarias municipais de educao, numa relao entre teoria e prtica foi possvel percebermos os pontos avanos e retrocessos que permeia a E.I., as possibilidades que existem [...] as possibilidades para uma efetivao de uma educao de qualidade para esse pblico [...] (aluna 5 semestre do curso de Pedagogia 2008)

    [...] Sem dvida o processo de pesquisa, analise e estudo do meio e a elaborao e concretizao do Simpsio, proporcionou a todos, a oportunidade de ampliar a viso de modo critico, sobre as polticas educacionais para a Educao Infantil, foi de grande valia para nossa formao, como futuros Pedagogos e como pessoa. (aluna 5 semestre do curso de Pedagogia 2008)

    Diante das falas dos educandos, extradas do relatrio final sobre o estudo do meio, evidencia-se o quanto esta metodologia possibilita uma prtica pedag-gica critica, reflexiva e criativa e que, como diria Freire, envolve o movimento dialtico entre o fazer e o pensar sobre o pensar e o fazer.

    Ponderaes conclusivas...

    medida que a leitura interpretativa dos dados se d s vezes por vrias oportunidades aparecem significados

    e acontecimentos, recorrncias, ndices representativos de fatos observados, contradies profundas,

    relaes estruturadas, ambigidades marcantes.Roberto Sidnei

    Caminhante, o teu rasto o caminho, e nada mais; caminhante, no h caminho, o caminho faz-se ao caminhar.

    Antonio Machado

    importante dar-se conta de que, na contemporaneidade, a pedagogia das certezas est sendo substituda por uma pedagogia do problema, onde o saber pr-fixado cede lugar busca da informao para a construo contnua do conhecimento. Portanto, a perspectiva metodolgica do estudo do meio possibilita que o educador em vez de dar respostas prontas, problematize os contedos previstos no componente curricular Fundamentos da Educao Infantil, numa prtica pedaggica que media s descobertas dos educandos na construo do conhecimento, permeada pela pesquisa e reflexo.

  • Maria do CarMo de LaCerda Peixoto

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    Giovanna MarGet Menezes Cardoso

    A prtica resulta numa produo muito significativa, a apresentao do simpsio, em que os educandos explicitam, nas comunicaes, a percepo de que o objetivo maior da pesquisa no processo de ensino fazer dos mesmos um parceiro de trabalho ativo, participativo, produtivo e re-construtivo. Nesse sentido Freire (1979, p. 28), salienta que:

    [...] no processo de aprendizagem, s aprende verdadeiramente aquele que se apropria do aprendido, transformando-o em apreendido, [...] Aquele que enchido por outro de contedo cuja inteligncia no percebe; de contedos que contradizem a forma prpria de estar em seu mundo, sem que seja desafiado, no aprende.

    Nesses termos, preciso explicitar as habilidades e competncias demons-tradas pelos educandos visualizadas ao longo da experincia e que merecem destaque:Um envolvimento mais intenso dos educandos no componente curricular;A percepo da importncia da localizao no espao e no tempo do

    conhecimento do ambiente natural e social e o dinamismo das inter-relaes entre o natural e o social;

    Efetiva participao dos educandos nas atividades de grupo, adotando um comportamento construtivo, responsvel e solidrio, valoriza as contribuies de cada um em funo de objetivos comuns e o respeito aos princpios bsicos do funcionamento democrtico;

    No decorrer da apresentao do trabalho a capacidade de exprimir, funda-mentar e discutir as idias pessoais sobre fenmenos e problemas do meio fsico e social com vista a uma aprendizagem cooperativa e solidria;

    A habilidade de utiliza formas variadas de comunicao escrita, oral e grfica e aplicar tcnicas elementares de pesquisa, organizao e trata-mento de dados;

    A capacidade de investigar e descobrir e utilizar processos cientficos na realizao de atividades experimentais;

    A capacidade de identificar os principais elementos do meio fsico e natural, analisar e compreender as suas caractersticas mais relevantes e o modo como se organizam e interagem, tendo em vista a evoluo das idias pessoais na compreenso do meio envolvente;

    Maior estmulo nas leituras dos textos do componente curricular; Uma postura mais amadurecida dos educandos quanto vida acadmica;A vinculao dos educandos a realidade concreta, e uma discusso sobre

    a mesma a luz dos elementos tericos que as compem;A percepo da necessria reviso sobre os dados da teoria que funda-

    mentam o objeto de estudo;

  • A AVALIAO INSTITUCIONAL NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS E AS COMISSES PRPRIAS DE AVALIAO

    723Avaliao, Campinas; Sorocaba, SP, v. 14, n. 3, p. 713-726, nov. 2009.

    TRAJETRIA FORMATIVA: ENTRELAANDO SABERES... ESTUDO DO MEIO COMO LUGAR DE APRENDIZAGEM DO/DISCENTE

    A percepo da importncia dos estudos tericos para maior compreenso da realidade em permanente dilogo com a realidade concreta;

    A possibilidade de produo de conhecimento por parte dos educandos por meio da articulao teoria e prtica;

    A aplicao de fatos a novas situaes, com reviso de hipteses, orga-nizao e reorganizao de dados;

    A preparao dos educando para se flexibilizar lidando com abertura diante do inesperado e de novos elementos apresentados pela realidade dinmica;

    A assuno por parte dos educandos da pesquisa como uma prtica necessria do educador;

    A percepo da Educao Infantil como um direito e que o educador da E.I. necessita fundamentar sua prtica.

    Podemos confirmar os aspectos supra citados, no registro das falas dos educandos, o quanto a perspectiva metodolgica do estudo do meio promove a construo do conhecimento por parte dos educandos e o alcance dos objetivos traados pela educadora ao planejar a atividade:

    A atividade do estudo do meio foi uma experincia vlida, mais interessante ainda foi realizao do simpsio, que nos mostrou que ns somos capazes de ousar e vencer desafios. Trouxe tambm um vasto conhecimento quando confrontou teoria e prtica, quando fomos a campo conhecer os programas e ver como a sua realidade, os seus pontos de convergncias e congruncias. (aluna 5 semestre do curso de Pedagogia 2008)O que mais gostei de fazer nesse trabalho do estudo do meio, foi a possibilidade de poder ter conhecimento de coisas que eu no sabia, como por exemplo, que existe um documento que orienta a construo e organizao das instituies de Educao Infantil, e o mais surpre-endente que as Secretarias Municipais no tomam conhecimento do documento, sou professora da E.I. e no sabia desse documento, esse fato me levou a querer pesquisar sobre o tema, estava sem saber o que pesquisar , minha produo monogrfica ser sobre os espaos da E.I. as instituies , como so planejadas e quem participa , pois atravs do estudo do documento soube que se faz necessrio uma equipe multidisciplinar na elaborao do projeto arquitetnico de construo das instituies de E.I. Para mim foi muito gratificante (aluna do 5 semestre do curso de Pedagogia - 2008)

    Diante do exposto, podemos refletir que a construo da saber numa pers-pectiva dialgica, de criao do concreto pensado, transformado em sntese elaborada, a busca dos percursos dos contedos curriculares, como temas e veredas, em relaes rizomticas de seus elementos, possam efetivar-se, em ao/reflexo/ao continuas do fazer-se educador.

  • Maria do CarMo de LaCerda Peixoto

    724 Avaliao, Campinas; Sorocaba, SP, v. 14, n. 3, p. 713-726, nov. 2009.

    Giovanna MarGet Menezes Cardoso

    Fica aqui o desejo de que, ns educadores, compreendamos a to repetida mensagem de Paulo Freire (1996), de que ensinar no transmitir conhecimento e que ns educadores devemos ser mestres/aprendizes, que alm de intermediar a ao pedaggica, de provocar reflexes intensas, tambm no ato de ensinar, constri conhecimentos.

    Para Freire (1996) o professor enquanto pesquisador mestre/aprendiz, aquele que aprende enquanto ensina e que ensina enquanto aprende. Como afirmava Gonzaguinha, [...] viver e no ter a vergonha de ser feliz, cantar, e cantar, a beleza de ser um eterno aprendiz [...]. (GONZAGA JNIOR, 1982) O verdadeiro educador, na perspectiva Freiriana, deve ser epistemologi-camente curioso, o que implica na capacidade de aprender, de que decorre a de ensinar, sugere ou, mais do que isso implica a nossa habilidade de aprender a substantividade do objeto apreendido. Aprender construir, reconstruir, constatar para mudar, o que no se faz sem abertura ao risco e aventura do esprito. (FREIRE, 1997, p. 74)

    A experincia do estudo do meio nos possibilitou a percepo de que im-prescindvel que o educador assuma suas convices, instigado pelos desafios da prtica em sala de aula, assumindo suas limitaes, num esforo continuo de super-las, como dizia Paulo Freire (1997, p. 14), limitaes que no procuro esconder em nome mesmo do respeito que me tenho e aos educandos. Desse modo fica o amadurecimento de que cabe ao mesmo, uma atuao flexvel e contextualizada, um permanente dilogo com a realidade, na perpectiva de provocar uma mobilizao e reconstruo de saberes e numa aprendizagem continuada, permedada pela constante reflexo na e sobre a ao.

    Como afirmava Paulo Freire (1991, p. 32):

    Ningum comea a ser educador numa certa tera-feira s quatro horas da tarde. Ningum nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanen-temente, na prtica e na reflexo sobre a prtica.

    imprescindivel a ns educadores uma prtica pedaggica que num pro-cesso cclico de ao-reflexo-ao (aproximando-se da investigao sobre a prtica), possibilite a tomada de decises e resoluo de problemas durante o ato de ensino.

    O oficio de ser educador em si complexo, principalmente quando se tem por objetivo a mudana de paradigma do processo de ensinagem, numa prtica peda-ggica que se pretende mudana de conceitos, onde a pesquisa torna-se o fulcro do processo educativo, buscano transformar o conhecimento do senso comum em conhecimento cientfico, entrelaando o saber acadmico com a realidade.

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    725Avaliao, Campinas; Sorocaba, SP, v. 14, n. 3, p. 713-726, nov. 2009.

    TRAJETRIA FORMATIVA: ENTRELAANDO SABERES... ESTUDO DO MEIO COMO LUGAR DE APRENDIZAGEM DO/DISCENTE

    Como afirmou Albert Einstein, mais fcil desintegrar um tomo do que um preconceito, contudo no pretende-se afirmar que as mudanas no so possveis.

    A educao obra transformadora, criadora. Ora, para criar neces-srio mudar, perturbar, modificar a ordem existente Fazer algum progredir significa modific-lo. Por isso, a educao um ato de desobedincia e de desordem. Desordem em relao a uma ordem dada, uma pr-ordem. Uma educao autntica reordena. por essa razo que ela perturba, incomoda. nessa dialtica ordem-desordem que se opera o ato educativo. (GADOTTI, 1980, p. 89)

    Para que a educao possa fazer-se obra transformadora, criadora, se faz mister que ns educadores estejamos abertos a refletir nossa prtica, repensar o nosso modelo de prtica pedaggica.

    O processo de ensinagem, tendo a pesquisa como principio, deve centra-se em transformar o paradigma tradicional de ensino e aprendizagem, num paradigma que nos possibilite voar, experimentar, criando condies de dilogo com os educandos. Numa prtica que possibilite ao educador presen-ciar as aprendizagens significativas dos educandos, a partir do exerccio das habilidades mentais na objetivao da proposta, assumindo e sistematizando os conceitos construdos e reelaborados nas discusses e apresentao dos estudos realizados.

    Neste contexto a interao planejada e intencional, entre educador, aducando e objeto do conhecimento, configura-se segundo Anastasiou (2003, p. 34) a essncia da relao pedaggica.

    Desse modo, so grandes os desafios e imensas as possibilidades. Urge avanar na direo de uma prtica pedaggica que promova o dilogo dos educandos com o conhecimento, como base para enfrentar os dilemas e com-promissos do cotidiano e das incertezas da vida. Pois conforme Demo (1985, p. 67, apud MACEDO, 2006, p. 39) [...] o intensivo tem mil faces. Aparece e desaparece. Reflui e se esgueira. Toda felicidade tem uma pitada de amar-gura, como toda amargura pode ser prenncio de alegria. H o que bom e di, como h o que di e bom. Possui estruturas ticas, mas capaz de imoralidades (grifo nosso), explicitando deste modo, o quanto devemos ter claro que o objetivo da pesquisa no a busca de qualificao da realida-de pesquisada, mas antes uma possvel compreenso da mesma. Pois como afirma Demo (2006, p. 29), Antes de mais nada, cientista quem duvida do que v, diz-se, aparece, e, ao mesmo tempo, no acredita poder afirmar algo com certeza absoluta.

  • Maria do CarMo de LaCerda Peixoto

    726 Avaliao, Campinas; Sorocaba, SP, v. 14, n. 3, p. 713-726, nov. 2009.

    Giovanna MarGet Menezes Cardoso

    Referncias

    ANASTASIOU, Lea das Graas Camargo; ALVES, Leonir Pessate. Proces-sos de ensinagem na universidade. Pressupostos para uma estratgia de trabalho em sala. Joinville, SC: UNIVILLE, 2003.

    DEMO, Pedro. Educar pela pesquisa. Campinas: Autores Associados, 1997.

    ______. Pesquisa como metodologia de trabalho. Revista de Educao AEC, Braslia, v. 21, n. 83, p. 7-11, abr./jun. 1992.

    ______. Metodologia da investigao em educao. Curitiba: Ibpex, 2006.

    ______. Cincia e qualidade. So Paulo: Artmed,1985.

    FREIRE, Paulo. A educao na cidade. So Paulo: Primavera, 1991.

    ______. Educao e mudana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

    ______. Educao como prtica da liberdade. 22. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.

    ______. Pedagogia da autonomia: saberes necessrios prtica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.

    GADOTTI, Moacir. Educao e poder: introduo pedagogia do conflito. So Paulo: Cortez, 1980.

    GONZAGA JNIOR, Luiz - Gonzaguinha. O que , o que . In: Caminhos do corao, faixa 3. LP/CD [S.l.]: EMI-Odeon, 1982.

    ILHA, Franciele Roos da Silva. A prtica da pesquisa em educao: histria, desafios e possibilidades. Revista Partes, So Paulo, 01 set. 2008. Dispon-vel em: . Acesso em: 07 set. 2008.

    MACEDO, Roberto Sidnei. Etnopesquisa crtica, etnopesquisa-formao. Braslia: Liber Livro, 2006.

    BRASIL.MEC. Ministrio da Educao. Currculo Nacional do Ensino Bsico. Competncias Essenciais. Braslia. 2000. Disponvel em:< http://www.dgidc.mi-nu.pt/public/cnebindex.asp>. Acesso em: 18 ago. 2008

    PEREIRA, Ana Cristina Silva de Oliveira; FONSECA, Zenilda de Jesus. Pesquisa e formao do educador: desafios e possibilidades de articulao. In: ENCONTRO DE PESQUISA EDUCACIONAL DO NORTE E NOR-DESTE, 18. 2007, Macei, AL, 2007.