trabalho de linguagem jurÍdica a linguagem jurÍdica no supremo tribunal federal

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CURSO DE DIREITO IGOR FERNANDES CAROL CARUSO RAFAELLA NAVAS LOUISE DE MELLO TRABALHO DE LINGUAGEM JURÍDICA A LINGUAGEM JURÍDICA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL São Paulo, Maio de 2015

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TRABALHO DE LINGUAGEM JURÍDICAA LINGUAGEM JURÍDICA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ESCLARECIMENTO DOS FATOSNo dia 19 de outubro de 2004, foi publicada a Portaria nº 540, que tinha como objetivo a criação do Cadastro de Empregadores que tivessem mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo para que determinados órgãos tivessem conhecimento e acesso a essa informação como forma de prevenir e evitar relações que possam ser mal interpretadas e mal vistas.Ayres Britto julgou a primeira portaria extinta por perda de objeto sendo essa revogada pela supracitada. Sete anos depois é criada a Portaria Interministerial N.º 2 revitalizando o Cadastro de Empregadores, conhecido como “Lista suja”.

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Page 1: TRABALHO DE LINGUAGEM JURÍDICA  A LINGUAGEM JURÍDICA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

CURSO DE DIREITO

IGOR FERNANDES

CAROL CARUSO

RAFAELLA NAVAS

LOUISE DE MELLO

TRABALHO DE LINGUAGEM JURÍDICA

A LINGUAGEM JURÍDICA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

São Paulo, Maio de 2015

Page 2: TRABALHO DE LINGUAGEM JURÍDICA  A LINGUAGEM JURÍDICA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

ESCLARECIMENTO DOS FATOS

No dia 19 de outubro de 2004, foi publicada a Portaria nº 540, que tinha como objetivo a criação do

Cadastro de Empregadores que tivessem mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo para que

determinados órgãos tivessem conhecimento e acesso a essa informação como forma de prevenir e evitar relações

que possam ser mal interpretadas e mal vistas.

Ayres Britto julgou a primeira portaria extinta por perda de objeto sendo essa revogada pela supracitada.

Sete anos depois é criada a Portaria Interministerial N.º 2 revitalizando o Cadastro de Empregadores, conhecido

como “Lista suja”.

PORTARIA INTERMINISTERIAL N.º 2, DE 12 DE MAIO DE 2011

(DOU de 13/05/2011 Seção I pág. 9)

Enuncia regras sobre o Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições

análogas à de escravo e revoga a Portaria MTE nº 540, de 19 de outubro de 2004.

O MINISTRO DE ESTADO DO TRABALHO E EMPREGO e a MINISTRA DE ESTADO CHEFE DA

SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS DA PRESIDÊNCIA REPÚBLICA, no uso da atribuição que

lhes confere o art. 87, parágrafo único, inciso II, e tendo em vista o disposto no art. 186, incisos III e

IV, ambos da Constituição Federal de 1988, resolvem:

Art. 1º Manter, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE, o Cadastro de Empregadores

que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo, originalmente instituído

pelas Portarias n.ºs 1.234/2003/MTE e 540/2004/MTE.

Art. 2º A inclusão do nome do infrator no Cadastro ocorrerá após decisão administrativa final relativa

ao auto de infração, lavrado em decorrência de ação fiscal, em que tenha havido a identificação de

trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo.

Art. 3º O MTE atualizará, semestralmente, o Cadastro a que se refere o art. 1º e dele dará

conhecimento aos seguintes órgãos:

I - Ministério do Meio Ambiente (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE);

II - Ministério do Desenvolvimento Agrário (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE);

III - Ministério da Integração Nacional (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE);

IV - Ministério da Fazenda (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE);

V - Ministério Público do Trabalho (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE);

VI - Ministério Público Federal (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE);

VII - Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE);

VIII - Banco Central do Brasil (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE);

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IX - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES (Acrescentada pela Portaria 496/2005/MTE);

X - Banco do Brasil S/A (Acrescentada pela Portaria 496/2005/MTE);

XI - Caixa Econômica Federal (Acrescentada pela Portaria 496/2005/MTE);

XII - Banco da Amazônia S/A (Acrescentada pela Portaria 496/2005/MTE); e

XIII - Banco do Nordeste do Brasil S/A (Acrescentada pela Portaria 496/2005/MTE).

§ 1º Os órgãos de que tratam os incisos I a XIII deste artigo poderão solicitar informações

complementares ou cópias de documentos relacionados à ação fiscal que deu origem à inclusão do

infrator no Cadastro (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE).

§ 2º À Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República competirá acompanhar, por

intermédio da CONATRAE, os procedimentos para inclusão e exclusão de nomes do cadastro de

empregadores, bem como fornecer informações à Advocacia-Geral da União nas ações referentes ao

cadastro.

Art. 4º A Fiscalização do Trabalho realizará monitoramento pelo período de 2 (dois) anos da data da

inclusão do nome do infrator no Cadastro, a fim de verificar a regularidade das condições de trabalho.

§ 1º Uma vez expirado o lapso previsto no caput, e não ocorrendo reincidência, a Fiscalização do

Trabalho procederá à exclusão do nome do infrator do Cadastro.

§ 2º A exclusão ficará condicionada ao pagamento das multas resultantes da ação fiscal, bem como

da comprovação da quitação de eventuais débitos trabalhistas e previdenciários.

§ 3º A exclusão do nome do infrator do Cadastro previsto no art. 1º será comunicada aos órgãos

arrolados nos incisos do art. 3º (Redação dada pela Portaria 496/2005/MTE).

Art. 5º Revoga-se a Portaria MTE nº 540, de 19 de outubro de 2004.

Parágrafo único. A revogação prevista no caput não suspende, interrompe ou extingue os prazos já

em curso para exclusão dos nomes já regularmente incluídos no cadastro até a data de publicação

desta portaria.

Art. 6º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

CARLOS ROBERTO LUPI

Ministro de Estado do Trabalho e Emprego

MARIA DO ROSÁRIO NUNES

Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos

Dois processos administrativos (ainda em trâmite no STF) de AÇÃO DIRETA DE

INCONSTITUCIONALIDADE que visam impedir a publicação do Cadastro de Empregadores e denunciar erros

no fundamento jurídico utilizado como base para a publicação das Portarias.

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DAS ETAPAS JÁ PERCORRIDAS PELA AÇÃO JUDICIAL

ADI 5209

Petição inicial: apresentada junto à procuração e o substabelecimento: o processo tem como requerente a

Associação Brasileira de Incorporadora Imobiliária – ABRAINC e requeridos Ministro de Estado do Trabalho e

Emprego e a Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. O

Dispositivo legal impugnado é a portaria interministerial MTE-SDH Nº002 de 12 de maio de 2011, referente ao

cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo,

originalmente instituído pelas portarias 1.234/2003/MTE e 540/2004/MTE.A ação teve como pedidos, uma

medida liminar para suspender os efeitos da portaria, após a liminar, que seja declarada de forma definitiva a

inconstitucionalidade do dispositivo e que o Procurador-Geral da República, assim como, o Advogado-Geral da

União, se manifestem no prazo de quinze dias .

Documentos comprobatórios: a fiscalização das condições de trabalho: competência e devido processo legal; a

ABRRAINC fez uma consulta para elaborar um parecer jurídico sobre questões de Direito Administrativo e de

Direito Constitucional referentes à constitucionalidade e à legalidade de inclusão da empresa no Cadastro de

empregadores que teriam submetido trabalhadores a condições análogas à de escravos; fundamentos para

responder as perguntas do documento anexo “1. Como a Organização Internacional do Trabalho cuida das

situações de trabalho degradante, e emcondições análogas à escravidão? 2. Todo trabalho degradante equipara-

se a trabalho escravo? 3. Quais os limites de capitulação da fiscalização neste caso?” ; tela com o cadastro de

empregadores que empregaram pessoas em condições análogas à escravidão”.

Cópia do ato normativo ou lei impugnada: portaria nº2 de 12/05/2011, a qual se refere às regras para o

Cadastro de Empregadores.

Prova de legitimidade ativa para a propositura da ação: estatuto social da brookfield incorporações e

ata de assembleia extraordinária; contrato social da Cury Empreendimentos Imobiliários, estatuto social Cyrela

Brasil Realty e estatuto da Encaamp Residencial.

Certidão – prevenção: a ADIN teve distribuição por prevenção à Exma Sra Ministra Carmén Lúcia,

pois está vinculada com a ADIN nº5115.

Decisão monocrática: a legitimidade da requerente foi considerada lícita devido ao nexo entre o objeto

da presente ação e seus objetivos institucionais, assim como, aptas a comprovar seu caráter nacional devido aos

seus associados estarem presentes em número suficiente de estados; em relação ao pedido da liminar, o juiz

reconheceu que devido à ofensa ao princípio da reserva legal e do devido processo legal, os efeitos da portaria

2/2011 e 540/2004 estão suspensos, sem prejuízo da continuidade das fiscalizações efetuadas pelo Ministério do

Trabalho e Emprego.

Comunicação assinada para o Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da

República sobre a decisão monocrática.

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Petição: agravo regimental feito pela Vice - Procuradora-Geral da República, com pedido de reconsideração

devido à falha na representação processual; ilegitimidade da ABRAINC para propor a ação, pois não

comprovou abrangência nacional e afirmação que o ato normativo não incidiu no princípio da legalidade, pois é

referente a regulamentos internos e a tratados que o Brasil é signatário.

Despacho: indeferimento do pedido de reconsideração.

Pedido de ingresso como amicus curiae pelo Repórter Brasil: Organização De Comunicação E Projetos Sociais.

Petição de apresentação de manifestação Do Advogado Geral da União: pela improcedência do pedido

vinculado pela autora.

Documentos comprobatórios: portaria em anexo.

ADI 5115

Petição inicial: apresentada junto à procuração e substabelecimento: tendo como autor a Confederação Da

Agricultura E Pecuária Do Brasil – CNA e parte ré o Ministro De Estado Do Trabalho E Emprego e a Ministra

De Estado Chefe Da Secretaria De Direitos Humanos, tem como objeto o Dispositivo legal impugnado, isto é, a

portaria interministerial MTE-SDH Nº002 de 12 de maio de 2011, referente ao cadastro de empregadores que

tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de escravos. A ação teve como pedidos, a concessão de

medida cautelar para suspensão do efeito do diploma impugnado e concedida esta, que seja julgada

integralmente procedente.

Cópia do ato normativo ou lei impugnada: PORTARIA INTERMINISTERIAL N.º 2, DE 12 DE MAIO DE

2011.

Prova de legitimidade ativa para propor a ação: em anexo estatuto da Confederação de agricultura e pecuária do

Brasil.

Decisão democrática: o juiz deferiu os pedidos e pediu a manifestação do Procurador-Geral da República e do

Advogado-Geral da União

Ofício: lista de postagem

Petição 23903/2014: encaminhamento a Vossa Excelência cópia da informação/nº173/2014/CONJUR-

TEM/CGU/AGU, da Consultoria Jurídica deste Ministério, juntamente com a documentação que acompanha.

Petição 24515/2014: Em reposta ao Ofício nº 15089/2014, de 12/05/2014, encaminho a Vossa Senhoria Nota

Técnica nº 002/2014, que tem por objetivo fornecer subsídios para atendimento relativo ao alegado na petição

inicial da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº5115.

Petição de apresentação de manifestação do Advogado-Geral da União: postulou pelo não conhecimento da

presente ação direta e, no mérito, pela improcedência do pedido veiculado pela autora, devendo ser declarada a

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constitucionalidade da Portaria Interministerial nº2, de 12/05/2011, do Ministro de Estado do Trabalho e

Emprego e da Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos.

Pedido de ingresso como amicus curiae pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT com

os devidos requisitos que a legitimam.

Despacho: juíza deferiu o pedido de desentranhamento.

A manifestação da PGR teve como parecer o não conhecimento da ação e, no mérito, pela improcedência do

pedido.

Pedido de ingresso como amicus curiae pelo Réporter Brasil: Organização de Comunicação e Projetos

Sociais.

DOS PROCESSOS

CNA (ADI 5115) & ABRAINC (ADI 5209)1

1. ACUSAÇÃO

A Requerente - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE INCORPORADORAS IMOBILIÁRIAS

(ABRAINC) - afirma que a Portaria 2/2011 foi editada sob os mesmos fundamentos e tratando de matéria

idêntica à Portaria 540/2004, sofrendo dos mesmos vícios de inconstitucionalidade que a Portaria revogada.

Lembram que o Ministro relator, Ayres Britto julgou a primeira portaria extinta por perda de objeto sendo essa

revogada pela supracitada, 2/2011.

Afirma, além disso, que “o pedido de declaração de inconstitucionalidade da Portaria não significa

menosprezo à legislação nacional e internacional de combate ao trabalho escravo, e muito menos uma defesa de

prática tão odiosa, mas sim prestígio aos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil mitigado

pelos Ministros de Estado que, por meio impróprio, legislaram e criaram restrições e punições inconstitucionais”.

Dos argumentos da Requerente, referentes às inconstitucionalidades perpetradas pela PI 2/2011 seguem-se:

A. OS LIMITES IMPOSTOS PELO INCISO II DO ARTIGO 87 DA CF/88

1 Devido a semelhança da argumentação em ambos processos, decidimos resumir os pontos chaves que eram apontados por ambos

Requerentes. Os Argumentos de ambas as partes são apresentados em ordem cronológica do processo (Petição inicial a Manifestação

do requerido).

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A ABRAINC afirma não haver fundamento legal para a portaria, que contraria o art. 87, parágrafo único,

inciso II, da Constituição da República, que prevê a competência dos ministros de Estado a “expedir instruções

para execução das leis, decretos e regulamentos”.

Eles dizem que “os Ministros de Estado extrapolaram o âmbito de incidência do inciso II, do artigo 87, da

Constituição, eis que inovaram no ordenamento jurídico brasileiro, usurpando a competência do Poder

Legislativo”.

B. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES

A portaria fere, segundo a Requerente, o princípio da divisão funcional do poder, uma vez que teria

inovado na ordem jurídica, invadindo a competência do Poder Legislativo para regular o Direito do Trabalho.

Alegam que a Constituição Federal, em seus artigos 22, inciso I e 84, inciso IV, respectivamente, trazem

a “competência privativa da União para legislar sobre Direito do Trabalho e do Presidente da República a

competência para sancionar, promulgar e fazer publicar as leis”. E, portanto, seria possível afirmar que os

Ministros de Estado, ao editarem tal Portaria, “legislaram, sancionaram e publicaram norma que, em verdade,

inovou no ordenamento jurídico brasileiro, criando nova competência para os Auditores-Fiscais do Trabalho”,

trazendo-lhes a “possibilidade de fiscalizar e condenar um empregador pelo cometimento de crime, já que apenas

o artigo 149 do Código Penal confere tratamento legal à figura do ‘trabalho escravo’”. Logo, tal iniciativa da

criação da nova competência apenas poderia ter surgido do Poder Legislativo.

C. O ALCANCE DO ART. 186 DA CF/88 – FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE RURAL

A Portaria Interministerial 2/2011 se embasa no art. 186 da Constituição Federal levando a crer que trata

da função social da propriedade rural.

Entretanto, “na última atualização feita no Cadastro de Empregadores, ocorrida em 1° de julho de 2014,

foram incluídas 24 (vinte e quatro) novas áreas urbanas, somando-se às outras 43 (quarenta e três) já inscritas

noutras atualizações, totalizando 67 (sessenta e sete) empregadores urbanos, de um total de 609 (seiscentos e

nove) inscritos”. Logo, haveria um “manifesto desvirtuamento da norma, erroneamente aplicada aos

empregadores das áreas urbanas, cujas condições de trabalho em nada se assemelham às impostas aos

trabalhadores da área rural. ”

D. A OFENSA AO PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL

A Portaria Interministerial 2/2011 “trouxe inovação de caráter primário ao ordenamento jurídico,

estabelecendo novas atribuições e competências no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego e da Secretaria

de Direitos Humanos da Presidência da República” ao atribuir ao MTE o cargo de manter e atualizar o Cadastro

e designar aos auditores-fiscais o julgamento de empregadores pela prática de trabalho escravo, além de deixar

para a SDH a competência de acompanhar, por intermédio da CONATRAE, os “procedimentos para inclusão e

exclusão de nomes do cadastro, bem como fornecer informações à Advocacia-Geral da União nas ações

referentes ao cadastro”. Porém, a Requerente afirma não caber aos Ministros de Estado a ação de legislador

primário, “pois a administração é atividade subalterna à lei, ou seja, depende integralmente da lei para a sua

execução”. É necessária uma lei anterior que faculte ou imponha tal dever de atuação.

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A requerente ainda declara que “os atos normativos previstos no inciso II do artigo 87 do Texto

Constitucional são hierarquicamente inferiores à lei em sentido formal, cuja elaboração depende da legítima

atuação do Poder Legislativo” e lembra que “da supremacia do princípio da reserva legal decorre a segurança

jurídica do cidadão, que tem na lei os limites impostos ao poder normativo exercido pelo Ministro de Estado”.

Conclui dizendo que “a regência do tema objeto do ato normativo ora impugnado há de se fazer por meio

de lei em sentido formal e material, e não por portaria interministerial”.

E. A OFENSA AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

Ocorreria descumprimento do princípio da presunção da inocência e, por isso, agressão ao princípio da

dignidade do ser humano. “Assim como é inconcebível que empregadores submetam trabalhadores a condições

análogas às de escravo, também é inaceitável que pessoas sejam submetidas a situações vexatórias e restritivas

de direitos sem que exista uma previa norma legitima e constitucional que permita tal conduta da Administração

Pública”.

A Requerente aponta o art. 5°, LVII, da CF/88 que afirma que “ninguém será considerado culpado até o

trânsito em julgado de sentença penal condenatória” e também cita a Declaração Universal de Direitos Humanos,

proclamada em 1948 pela Organização das Nações Unidas (ONU), em seu artigo XI, item 1, afirmando que “todo

ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha

sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias

necessárias à sua defesa.”

Ainda afirma que os Ministros de Estado, por meio impróprio, legislaram e criaram restrições e punições

inconstitucionais, visto que “não existe na seara administrativa, e nem mesmo no âmbito da legislação trabalhista,

qualquer definição legal que tipifique referida conduta como infração administrativa, e muito menos como

infração trabalhista” somente na esfera penal, em seu artigo 149, ocorre a abordagem sobre o trabalho escravo.

Haveria, portanto, uma ofensa ao princípio da legalidade, visto que a inscrição do nome na “lista suja” ocorre

sem a existência de um processo legal, o que se mostra arbitrário, pois “o simples descumprimento de normas de

proteção ao trabalho não é conducente a se concluir pela configuração do trabalho escravo”. A “inclusão no nome

do suposto infrator ocorre após decisão administrativa final, em situações constatas em decorrência da ação fiscal

e que tenha havido identificação de trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo. Ou seja, essa

identificação é feita de forma unilateral sem que haja um processo administrativo em que seja assegurado

contraditório e a ampla defesa do sujeito fiscalizado”.

F. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

A CONFEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO BRASIL – CNA, traz uma fala do

Ministro Gilmar Mendes, no julgamento da medida cautelar na ADI 4.467, a respeito dos postulados da

proporcionalidade que diz: “Para a aferição da proporcionalidade da medida legislativa, deve-se averiguar se

tal medida é adequada e necessária para atingir os objetivos perseguidos pelo legislador, e se ela é proporcional

(em sentido estrito) ao grau de afetação do direito fundamental restringido”.

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Acerca de tal embasamento afirma que a caracterização de “trabalho escravo” é feita no direito brasileiro

somente como crime, através do art. 149 do Código Penal e que a Portaria Interministerial nº 2/2011 não seria

adequada a punir um crime com imposições administrativas de restrições de direitos, visto que as punições

deveriam vir de transito em julgado de sentença penal condenatória.

Ainda quanto à proporcionalidade, seria esta desnecessária visto que ao passar pelo processo penal e

receber a condenação, o autor já teria incluso o seu nome no rol dos culpados, com sua submissão à Pena prevista

no Código Penal.

E por último, ainda quanto à proporcionalidade, na exequibilidade dos dispositivos atacados, argumentam

que não seria razoável impor administrativamente uma pena que não possui fundamento constitucional,

desrespeitando a Constituição quanto à reserva da lei, a legalidade, a presunção da inocência e o devido processo

legal.

OS PEDIDOS

a) o recebimento da presente Ação Direta de Inconstitucionalidade na forma da Lei n° 9.868/99;

b) seja concedida a medida liminar, nos termos dos artigos 10 e seguintes da Lei n° 9.868/99, suspendendo-se

imediatamente os efeitos da Portaria Interministerial MTE/SDH n° 2, de 12 de maio de 2011 e,

consequentemente, da Portaria MTE n° 540, de 19 de outubro de 2004 em razão da eficácia repristinatória, até o

julgamento final da ação direta;

c) sejam solicitadas informações ao Ministério do Trabalho e Emprego e à Secretaria de Direitos Humanos da

Presidência da República;

d) sejam o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União oficiados para se manifestarem, cada qual,

no prazo de 15 (quinze), conforme artigo 8° da Lei n° 9.868/1999;

e) seja declarada, em caráter definitivo, confirmando-se a liminar, a inconstitucionalidade da Portaria

Interministerial MTE/SDH n° 2, de 12 de maio de 2011 e, consequentemente, da Portaria MTE n° 540, de 19 de

outubro de 2004, revogada pela primeira, eis que eivada das mesmas inconstitucionalidades, já suscitadas nos autos

da ADI n° 3347, da relatoria do então Ministro AYRES BRITTO, julgada extinta por perda de objeto em razão da

revogação pela Portaria Interministerial n° 2/2011.

2. QUESTÃO PRELIMINAR

PROCURADORIA-GERAL DA UNIÃO

Em sua primeira manifestação ao processo iniciado pela ABRAINC, a Procuradoria-Geral da União

evidência uma falha na legitimidade da associação para instaurar um controle concentrado de constitucionalidade,

especificamente a ad causam.

A Legitimidade Ativa ad causam de entidade de classe de âmbito nacional para provocar controle

concentrado de constitucionalidade dependente de: (ɪ) homogeneidade da categoria que represente; (ɪɪ)

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representatividade na totalidade da categoria afetada pela norma; (ɪɪɪ) comprovação de caráter nacional pela

presença de associados em pelo menos nove Estados da Federação; e (ɪv) vinculação temática entre objetivos

institucionais da postulante e norma impugnada.

A ABRAINC não comprovou abrangência nacional, apenas alegou que as empresas associadas atuam em

todos país nos seus documentos comprovatórios. Simples possibilidade de instituição de filiais em todo território

nacional não é suficiente para atender ao requisito de representatividade nacional.

Também se menciona o Voto do Ministro Celso de Mello no julgamento de ordem na ADI 108/DF:

Premissa de que uma pretensão de representação nacional no estatuto da pessoa jurídica não confere para a

aquisição de um âmbito nacional. ABTI não possui associados em mais de 5 Estados Federais.

Outra menção é para a ADI 368/SP que, no mesmo sentido, baseia-se no Art. 103, IX para declarar

ilegitimidade ad causam.

3. DA DEFESA

MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO

A. DA CONTITUCIONALIDADE DO CADASTRO DE EMPREGADORES QUE TENHAM MANTIDO

TRABALHADORES EM CONDIÇÕES ANÁLOGAS À DE ESCRAVO.

a. FUNDAMENTOS CONTITUCIONAIS

Defende que a criação de mecanismos de combate ao trabalho escravo é uma conduta que não pode ser

compreendida senão sob a ótica da realização dos Direitos Humanos Fundamentais consagrados na Constituição

Federal. De fato, em seu artigo 1º há destaque para a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho

como fundamentos do Estado brasileiro.

O Objeto de debate pretende, por meio da criação de um instrumento administrativo, implementar uma

política de efetivação do programa constitucional posto. O ato normativo está dirigido à consecução do texto

constitucional, constituindo-se, de fato, em um instrumento de sua efetivação.

O Texto Magno pugna que a ordem econômica se funda na valorização do trabalho tendo como princípios,

dentre outros, a função social da propriedade e a busca do pleno emprego (CF, art. 170, caput, incisos III e VIII).

Ademais, a constituição também estipula que ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante em

seu artigo 5, inciso III.

Se não fosse suficiente as normas que concedem fundamento de validade aos atos impugnados, eles ainda

contam com um recurso infraconstitucional de legitimação que justifica a competência normativa do TEM para

editá-los com amparo no artigo 87, Inciso II.

b. SUPORTE INFRACONTITUCIONAL– Ausência de Ofensa aos Princípios da Reserva Legal

e da Separação dos Poderes

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O Ministério do Trabalho e Emprego afirma que, embora a conduta que o cadastro pretende coibir implica

ofensa a dispositivos da CLT, especialmente às relativas à segurança e medicina do trabalho (Capítulo IV do

Título II), a obrigação legal de combate ao trabalho escravo não se prende a esta obrigação indireta de proteção

das normas da CLT. O Brasil é signatário de diversos atos normativos internacionais, em destaque os referentes

a Convenção nº105 da OIT, já incorporados no direito interno e que possuem status de lei ordinária. A norma

(Artigo 1 e 2 da Convenção nº105 da OIT) explícita ao instituir o dever administrativo de combater o trabalho

forçado, justificando plenamente os atos administrativos exarados. Inexiste, portanto, qualquer ofensa aos

princípios da reserva legal ou da separação dos poderes.

c. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCIPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

Defende-se, por parte da PGR, de que as portarias não ofendem quando determinam a Inclusão de nomes

no respectivo cadastro, tal inclusão decorre da decisão administrativa final sobre as infrações administrativas

envolvidas, nos termos VII da CLT, proferida no âmbito dos respectivos processos administrativos. Portanto,

antes da decisão administrativa final e do decorrente ato de inclusão, são oferecidos ao empregador todos os meios

para insurgir-se contra as infrações que lhe são imputadas, em respeito aos princípios do contraditório e da ampla

defesa.

d. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCIPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

Conforme a defesa, a alegação de ofensa do princípio constitucional da presunção de inocência não se

justifica, visto que não se trata de atribuir aos incluídos a condição de infratores da lei penal e condicionados a

uma pena, mas a condição de infratores da lei no que é referente somente ao âmbito administrativo. “Não se está

a atribuir a condição de culpado em termos penais, mas tão somente em termos administrativos, e, ainda assim,

apenas para o efeito de inclusão na respectiva lista. ” Os tribunais nacionais são citados referindo-se à

independência entre as instâncias penais e administrativas decorrente da harmonia entre os Poderes da República.

Inexiste, portanto, por estes fundamentos, qualquer presunção de culpabilidade penal inerente à inclusão no

cadastro.

4. DECISÃO DOS MEMBROS

Reconhecemos refutados os argumentos do Autor referentes a violação do princípio da presunção de inocência

e da inconstitucionalidade referente ao art. 87 II.

Respectivamente, visto que a finalidade do cadastro era administrativa-informativa, e em nenhum

momento de intensão de punição das empresas cadastradas baseadas no código penal, não se está penalizando de

forma arbitrária as pessoas jurídicas envolvidas.

Referente a capacidade do poder executivo, essa se limitando a fiscalizar e executar as leis conforme o art.

87 II da CF explicita, os requeridos não ultrapassaram seus limites visto que o cadastro é um ato normativo com

finalidade de se aplicar os tratados internacionais, existindo assim uma Lei prévia que legitima os atos, a lista tem

finalidade informativa para a proteção de terceiros que não querem sua reputação prejudicada por relações com

empresas escravagistas.

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A lista também é um método reconhecido e elogiado por instituições internacionais, o interesse dela é

mutuo para inúmeras pessoas (físicas e jurídicas).

Entretanto não foi refutada a crítica ao fundamento jurídico inconsistente do edital do Cadastro que se diz

legitimada pelos art. 87º II, 186º III & IV da CF. Embora esteja de acordo com o art. 87º II que retrata a capacidade

do poder executivo, o art. 186º retrata das leis aplicadas a propriedade RURAL, muitas empresas na lista possuem

exclusivamente propriedades urbanas, pois o fundamento está no mínimo enganado. É levantado a possibilidade

de fundamento nos Tratado Internacionais no Combate a Escravidão dos quais o Brasil é signatário, todavia,

consideramos essencial a indicação desses tratados no Edital.

Outro conflito é a desconsideração de um critério preciso para a escravidão por parte do Poder Executivo,

concordamos com o autor de que o simples não cumprimento de Leis Trabalhistas não pode caracterizar

escravagismo. Julgamos necessário que tenha um fundamento jurídico no edital para definir os critérios (a

única norma que define é o Art. 149 do Código Penal), caso contrário o método torna-se demasiado subjetivo

para a importância que tem para todas as partes.

Em suma, pedimos que seja suspendida as atividades do Cadastro de Empregadores que tivessem mantido

trabalhadores em condições análogas temporariamente, até que seja redigido um novo edital com o fundamento

jurídico necessário e coerente que: defina um critério para relação de trabalho análogo a escravidão; efetivamente

mostre um direito do Estado para a execução deste ATO NORMATIVO.

5. GLOSSÁRIO

Repristinatório - trata de suposições previstas no controle de inconstitucionalidade, em que o STF por concessão

de uma liminar suspende os efeitos de uma determinada lei, ou seja, a sua eficácia.

Ad referendum - Trata-se de termo jurídico em latim que significa "para apreciação", "para aprovação", "para

ser referendado". É utilizado para atos que dependem de aprovação ou ratificação de uma autoridade ou de um

poder competente para serem válidos.

Decisão cautelar – decisões urgentes

Impugnar - ato ou efeito de impugnar, ou seja, de contestar, de refutar, de contrariar, de resistir, de opor-se a.

Contraditório - o princípio do contraditório é um corolário do princípio do devido processo legal, e significa que

todo acusado terá o direito de resposta contra a acusação que lhe foi feita, utilizando, para tanto, todos os meios

de defesa admitidos em direito.

Decisão monocrática - Decisão monocrática consiste em decisão proferida por um único magistrado, de qualquer

instância ou tribunal. Contrapõe-se às decisões colegiadas, típicas de casos em que o pedido jurisdicional esteja

em fase de recurso.

Assente - Disposto ou posicionado sobre (alguma coisa); assentado ou apoiado

Deferido – 1. Autorizado; 2. Despachado favoravelmente; 3. Conceder (o pedido).

Exequibilidade - Possibilidade de algo ser executado.

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Medida cautelar - É um procedimento intentado para prevenir, conservar ou defender direitos. Trata-se de ato

de prevenção promovido no Judiciário, quando da gravidade do fato, do comprovado risco de lesão de qualquer

natureza ou da existência de motivo justo, desde que amparado por lei. Deve-se examinar se há verossimilhança

nas alegações (fumus boni iuris); e se a demora da decisão no processo principal pode causar prejuízos à parte

(periculum in mora). A medida cautelar será preventiva, quando pedida e autorizada antes da propositura do

processo principal. Quando requerida durante o curso da ação principal, a medida cautelar será incidental. É de

competência originária do Supremo Tribunal Federal julgar o pedido de medida cautelar das ações diretas de

inconstitucionalidade (CF, art. 102, I, p).

Revogar -1. Tornar nulo; 2. Tirar o efeito a, fazer com que deixe de vigorar.

Mitigar: 1. Amansar, tornar brando.