tortura no direito penal brasileiro lei nº...

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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA AMAZÔNIA REUNIDA CURSO BACHARELADO EM DIREITO RODRIGO DOS SANTOS OLIVEIRA TORTURA NO DIREITO PENAL BRASILEIRO Lei nº 9.455/1997 REDENÇÃO - PARÁ 2017

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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA AMAZÔNIA REUNIDA

CURSO BACHARELADO EM DIREITO

RODRIGO DOS SANTOS OLIVEIRA

TORTURA NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

Lei nº 9.455/1997

REDENÇÃO - PARÁ 2017

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RODRIGO DOS SANTOS OLIVEIRA

DIREITOS HUMANOS E A LEI 9.455/1997 COMO FORMA DE INIBIR OS CRIMES

DE TORTURA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Ensino Superior da Amazônia Reunida como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Penal

Orientador: Prof. Fernando Paiva Gomes do Amaral.

Redenção – PA

2017

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RODRIGO DOS SANTOS OLIVEIRA

DIREITOS HUMANOS E A LEI 9.455/1997 COMO FORMA DE INIBIR OS CRIMES

DE TORTURA

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do Grau de

Bacharel em Direito do curso de Direito na Faculdade de Ensino Superior da Amazônia

Reunida e aprovado em sua forma final em: ____/____/____.

Coordenador do Curso

Apresentado à banca examinadora composta pelos professores:

Orientador

Examinador

Examinador

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AGRADECIMENTOS

Agradeço este trabalho primeiramente а Deus, por ser essencial em minha

vida, autor de mеυ destino, mеυ guia, socorro presente na hora da angústia.

Agradeço а minha mãе , heroína qυе mе dеυ apoio, incentivo nаs horas difíceis,

de desânimo е cansaço, ao mеυ pai qυе apesar de todas as dificuldades mе fortaleceu

е qυе pаrа mіm foi muito importante.

Obrigada a meus irmãos, que sempre tiveram comigo nas horas boas e ruins,

sempre me deram força para seguir em frente.

Agradeço também a minha família e a minha vó Maria José por ser uma das

pessoas que mais me incentivou nessa conquista.

Agradeço à Karen, por ter sido mais do que uma namorada e ter me ajudado

durante todo esse tempo em que estive me formando enquanto profissional e pessoa,

sempre me motivando, me dando forças

Não poderia deixar de agradecer a Katia, pois sempre foi uma das pessoas de

grande importância nessa conquista.

Agradeço a todos os professores que acompanharam minha jornada enquanto

universitário e foram essenciais à minha formação como profissional e , além disso,

minha evolução como pessoa.

Por fim, agradeço todos os amigos e amigas que estiveram comigo nessa

jornada, vocês com certeza são parte dessa vitória.

Obrigada! Primos е tias pеlа contribuição valiosa.

Agradecer meu orientador Fernando Paiva Gomes do Amaral, que me acolheu

no momento mais difícil, não mediu esforços para contribuir na conclusão do trabalho.

A todos qυе direta оυ indiretamente fizeram parte dа minha formação, о mеυ

muito obrigado.

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RESUMO

Este estudo tem o objetivo de explanar de forma abrangente e bastante esclarecedora a respeito do delito de tortura, da referida lei 9455/1997, pois em seu contexto é de bastante valor, na busca de combater esse crime que vem desde a antiguidade no meio social, sendo dessa forma uma das mais horrendas barbaridades cometidas as vítimas. Assim sendo esclarece os pontos mais importantes e contraditórios do delito em si, tanto como as formas de cometer as inúmeras torturas, como as contradições no artigo da lei, buscando um grande enfoque nas novidades e casos que teve maior repercussão na mídia. Tendo ainda o esclarecimento dos momentos histórico da tortura, como suas problemáticas e o mais importante de todos em seu tema que é a proteção dos Direitos humanos, sempre protegendo a dignidade da pessoa humana, contra essas barbaridades e crueldades, para que seja respeitado o direito da integridade física dos cidadãos.

Palavras-chave: Tortura, vítimas, contradições, repercussão, Direitos Humanos e cidadãos.

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ABSTRACT

This study has the objective of explain in a comprehensive way and quite enlightening about the crime of torture, of that law 9455/1997, because in it’s context is enough value, in the search to fight this crime that comes since antiquity in social, in this way being one of the most horrendous atrocities committed victims. Therefore explains the most important points and the offense itself contradictory, as much as ways of committing the countless tortures, as the contradictions in the article of the law, seeking a strong focus on news and cases that had more media coverage. Having further clarification of the historical moments of torture, as their problems and the most important of all in its theme which is the protection of human rights, always protecting the dignity of the human person, against these cruelties and barbarities, to be respected the right of physical integrity of citizens.

Keywords: Torture, victimis, contradictions, rebound, human rights and citizens

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Sumário

1 INTRODUÇÃO ...............................................................................................8

2 TORTURA ...................................................................................................... 10

2.2 A TORTURA ATRAVÉS DOS TEMPOS ...................................................... 11

2.3 A ABOLIÇÃO DA TORTURA E O ILUMINISMO .......................................... 16

3 PREVISÕES LEGAIS .................................................................................... 18

3.1 TRATADOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS .................................... 18

3.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL ........................................................................ 19

3.3 NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ............................... 21

3.4 CÓDIGO PENAL ......................................................................................... 23

3.4.1 Da Reforma do Código Penal ................................................................... 28

3.5 LEI N. 9.455 “LEI DE TORTURA”, DE 7 DE ABRIL DE 1997....................... 30

4 FORMAS DE TORTURA ............................................................................... 44

5 TORTURA NO BRASIL E SEUS CASOS VERDADES ................................. 48

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 50

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 52

8 ANEXO – LEI Nº 9.455, DE 7 DE ABRIL DE 1997 ....................................... 54

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1 INTRODUÇÃO

Desde os primórdios da humanidade a tortura foi um dos maiores tormentos, e

sua forma cruel ocasionou muitos sofrimentos e dores, devido suas inúmeras

atrocidades, passando por vários períodos e formas repugnantes.

Sendo dessa forma ela acompanhou a evolução histórica, ficando cada período

marcado por inúmeras espécies de violência, tormentos e julgamentos na época que

ela era considera a “rainha das provas”, para que os condenados confessassem

crimes e delatassem terceiros, mesmo sem os mesmo ter cometido tais crimes.

Esteve presente desde há antiguidade, passando pela Grécia, Roma, China,

França, Itália, Espanha, Alemanha, Inglaterra, Áustria, Suécia, Portugal, nas inúmeras

guerras, sendo um dos principais ordenadores a Igreja Católica e os governantes,

devido o processo inquisitivo com o Direito Canônico e até mesmo pelo Brasil, onde

foi utilizada no golpe militar, ocasionando prisões ilegais, descumprimento do

processo legal, extermínio de pessoas, práticas degradantes e desumanas,

ocasionando assim uma supressão de valores.

Ficando evidenciadas suas diversas espécies, foi da antiguidade até os tempos

atuais, começando a ser repudiada no Iluminismo, pela escola clássica, e tendo como

um dos principais lutadores contra essas formas horrendas o filósofo “Beccaria” sendo

posteriormente abolida da sua forma legal para forma ilegal.

Interessante notar que com a Declaração Universal dos Direitos do Homem

teve bastante influência na luta contra a tortura, ficando declarado o repúdio e

prevenindo essas práticas por diversos países em suas constituições, na qual o Brasil

adotou em 1991 o Decreto 40 e se tornou signatário desse importante diploma

internacional.

Entretanto, o Brasil introduziu no seu ordenamento jurídico a lei 9.455/97 a

famosa “Lei da Tortura” suprindo desse modo a lacuna que tinha dentre nossas

previsões legais.

Desta forma é relevante estudar configuração do ordenamento jurídico do crime

de tortura para que se possa fazer sua devida divulgação colaborando no sentido de

coibir essa prática horrenda. Pois até nos dias atuais em pleno século XXI ela ainda

há de atormentar.

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A presente monografia diz respeito às diversas problemáticas e relatos de

Tortura no Brasil, pois nunca parou de existir desde os cárceres, delegacias, ditadura

militar, presídios, e a falha do sistema prisional e as questões de segurança pública,

pois o Estado tem o direito de proteger os cidadãos contra essas formas horrendas,

observando-se assim descumprimentos dos direitos do homem pelos seus servidores.

Sendo assim, demonstrará as formas de punição e meios utilizados através da tortura,

desde os primórdios até os dias atuais, e seus conceitos e legislações pertinentes aos

casos concretos, na forma da criminologia e ideias penais com maior enfoque no

Direito Penal brasileiro.

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2 DA TORTURA

2.1 CONCEITO

A tortura também denominada de “suplício” é um assunto dos mais polêmicos

dentro da sociedade, pois sua finalidade é obter confissão ou até mesmo para que

uma pessoa delate a outra, passando por períodos marcados na história, desde a

idade média chamada de época das trevas até os dias atuais.

Vários são os conceitos sobre a tortura, desde o principal que é o da Lei da

Tortura que está elencado no seu artigo 1º, como dentre muitos outros citados por

grandes doutrinadores, mas todos com o mesmo aspecto, física e psicológica, ou seja,

com seu sujeito ativo e o sujeito passivo.

Entretanto no Brasil, teve enfoque a contrariedade da tortura, na constituição

imperial de 1824, por meio do artigo 179, parágrafo 19 da mesma. Desta forma o crime

de tortura e os tormentos, foram abolidos mesmo antes da constituição de 1988 em

seu artigo 5º.

O conceito nas palavras do doutrinador Wolgran Ferreira (1991, p.

23)1:

A tortura compreende fatos essenciais, os quais obrigam a ampliar a definição tradicional: a) ocorre quando pelo menos duas pessoas se acham envolvidas no fato, o torturador e sua vítima; b) a vítima se encontra sob o controle físico do torturador; c) ainda que infligir a dor com o propósito básico, a definição deve incluir um aspecto essencial, o componente mental e psicológico; d) existe interesse implícito por parte do torturador de cercear a vontade da vítima e de destruir sua personalidade.

No entanto podemos ter uma definição mais precisa sobre a tortura que está

elencada na sua própria lei, em seu artigo 1º (lei 9455/97)2:

Art. 1º Constitui crime de tortura: I - Constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa;

1, Wolgran FERREIRA. A tortura: sua história e seus aspectos jurídicos na constituição. São Paulo: Julex Livros, 1991; 2 Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997.

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II - Submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Pena - reclusão, de dois a oito anos.

§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.

§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos. § 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.

Desta forma, a tortura, esta elencada na lista de violações aos direitos

humanos, e também é ela que viola a constituição, no que se refere ao princípio da

dignidade da pessoa humana, sendo ela que atinge diretamente a pessoa humana,

em sua integridade física e psicológica, e o pior, na maioria das vezes é praticada por

alguém constituído com as mesmas características biológicas, tanto racial, social e

religiosa.

Obviamente a tortura corporal, era um dos grandes exemplos de terror, tanto

sendo o físico, ou até mesmo o psicológico, com marcas nos corpos ou nas mentes

das pessoas, na forma de punir os condenados.

2.2 A TORTURA ATRAVÉS DOS TEMPOS

Ao longo da história, várias foram as formas de utilização de métodos horrendos

para prática da tortura, tendo cada um sua característica e certo estilo penal, tal

situação ocorreu ao longo dos séculos porque não havia legislação que protegesse os

acusados dos abusos cometidos por autoridades como forma de execução e punição,

para servir de exemplo para a sociedade.

Muitas foram às formas de inibir a tortura e os outros meios cruéis, com intuito

de prevenir e punir que estas práticas fossem cometidas, que muitas vezes o sujeito

ativo era a própria pessoa do ordenamento o de repressão penal, desta forma

ocorrendo uma contradição no sistema penitenciário e gerando grande revolta por

parte da população, que cada vez mais procura por segurança e um julgamento justo.

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Uma dessas formas de inibir a tortura, que foi teve no mundo, foi à resolução

da ONU 39/46 de 10 de dezembro de 1984, sendo vigorada no Brasil a partir de 1991,

pelo decreto 40, de 15 de fevereiro do respectivo ano. Outro diploma principal foi a

Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de Dezembro de 1948, sendo

pelo qual o Brasil se responsabiliza em respeita-lo. Outro grande diploma de tratados

internacionais foi a proclamação da Convenção Interamericana a famosa OEA, que

serviu para prevenir e punir a tortura, sendo este decreto vigorado pelo Brasil em 09

de novembro de 1989, o decreto de número 98.386, e também a Convenção

Americana de Direitos Humanos, que é o famoso Pacto San José da Costa Rica de

11.1969. E sem esquecer a maior e principal, que foi a Declaração Francesa dos

Direitos do Homem e do Cidadão, de 1973, que veio com o maior intuito que foi o de

proteger a dignidade da pessoa humana, se tornando o principal objeto das

convenções internacionais.

No que tange a parte histórica, na antiguidade ela era utilizada de forma legitima

para obter provas, como meio de confissão, pois ao longo da história com suas

grandes transformações e evoluções da sociedade em si, foram sendo repudiadas

essas barbaridades, que serviam para se apurar a verdade do processo, tempos em

que era chamada de “rainha das provas”, mas também utilizada como pena para

certos crimes cruéis, tanto pelos antigos como pelos romanos.

A também em se falar que em parte da história, relata que as primeiras torturas

foram feitas pelos assaltantes das estradas, que utilizavam da mesma para ter

confissão das vítimas para lhes dizerem ondem guardavam seus pertences.

No entanto na Grécia, ela era utilizada como meio de torturar os escravos e os

estrangeiros, basicamente homens livres não eram torturados, só aqueles que

cometer-se crime contra o estado, no entanto era feita como forma de instrução

criminal, e pela participação direta dos cidadãos. Mas nessa mesma época poderia

ocorrer uma tensão de inseguridade, pois muitas pessoas poderiam imputar o crime

umas às outras, sendo tanto contra seus desafetos ou até mesmo por má índole,

ficando desta forma, que muitas pessoas foram torturadas mesmo sendo inocentes.

Diversas eram as formas de torturas e também legislações que autorizavam a

mesma, como por exemplo, o “olho por olho, dente por dente”, da Lei de Talião, os

princípios também do Código de Hamurabi, que eram a proporcionalidade entre o mal

causado e a reação, que para cada mal causado o ofendido tinha o direito de

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causar o mal ao outro, tanto pela forma de quebrar ossos, como até queimar na

fogueira. Outra legislação bastante importante foi da China, que o homicídio era

penalizado com a morte, e que para cada crime tinha um equiparado para contrapor

o cometido, sendo que a cada tempo evoluía, criando-se cada vez penas mais cruéis.

E no Egito por sua vez, tinha um órgão julgador, escolhido entre os mais privilegiados

homens, prudentes e distintos, das mais renomadas cidades, com direito a instrução

pública e escrita.

Em Roma, pertencia a jurisdição aos reis, Senado e ao povo, na época da

República, pois a religião influenciava, e protegia a dignidade das pessoas, sendo

muito influente no Direito, devido ao sistema acusatório, sendo torturados os escravos

e os estrangeiros, ficando os cidadãos imunes. Mas com a chegada do Império houve

uma grande transformação em respeito ao poder do imperador em governar, em se

tratando que o maior poder era do Imperador, modificando-se de sistema acusatório

para acusação ex ofício, sendo todo delito aplicado essa forma de tortura. Sendo que

a confissão para os romanos era prova suficiente para encerramento do processo,

mas sendo perfeitamente avaliada, se obtida por meio de tortura.

Posteriormente com a queda do Império Romano, e a invasão dos bárbaros, se

iniciou a Idade Média, que se destacava pelos juízos de Deus ou Ordálias, que se

referia em determinar a inocência ou culpabilidade dos acuados, que para o vencedor

desses duelos era proclamado pela divindade de Deus, pois se fosse derrotado,

estaria confirmada sua culpabilidade, sendo assim esses julgamentos foi a

substituição da tortura, sendo chamada essa primeira espécie do ordenamento

jurídico da Idade Média de direito germânico e os outros de direito canônico e o direito

comum.

Surgindo no século XIII, a Inquisição, conhecida pelos seus famosos tribunais

da inquisição, que a princípio julgavam os crimes cometidos contra a religião, como a

blasfêmia, a heresia e a apostasia, dentre outro.

Tendo destaque que o Cristianíssimo se tornou a religião dos romanos, em

virtude disso esses tribunais foram utilizados para julgar crimes desprezáveis pela

Igreja Católica, tendo grande influência nesse processo o Santo Agostinho, pois ele

repudiava a tortura, pois foi ele que participou das bases filosóficas da religião,

desaprovando esses métodos de tormento para que houvesse a pena de penitência

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teria que ocorrer a confissão e em seguida a condenação, dos crimes que era

comparado ao pecado.

Como relata Wolgran Ferreira (1991, p. 39):

A aplicação da tortura baseava-se no “louvável costume” porque se acreditava que ela é para o bem das almas e maior glória de Deus, permitindo-se, então, o castigo de quem o ofendia gravemente e colocavam, a outros, em perigo de condenação eterna.

No entanto o sistema inquisitivo passou a vigorar contra todos os crimes,

principalmente contra os vários tipos de hereges, que nada mais era aqueles que

professavam heresia contrária aos dogmas da Igreja Católica. E posteriormente

criaram-se verdadeiramente os Tribunais do Santo Ofício no século XV, que servia

para aplicação das penas, em Portugal e na Espanha.

Já na Idade Moderna, a tortura veio como instrumento de segurança do Estado,

assim diminuindo cada vez mais os direitos dos cidadãos, que em regra no século XIV

era a famosa “rainha das provas”, e nesse novo momento da Idade Moderna, em pleno

século XV ela restringiu mais ainda essas garantias dos indivíduos, no que se referia

à instrução do julgamento, que era agora sigiloso, ocasionando dessa forma o

desconhecimento total das provas, atos processuais, peças do processo e até mesmo

quem o denunciou.

Como ressalta Valéria Diez (2002, p. 29):

A confissão era a rainha das provas (confessio regina probationum), autorizava a condenação e dispensava outros elementos. Além disso, tinha dupla finalidade: fazia crer aos julgadores que a verdade fora desvendada e a condenação era merecida; justificava o emprego das graves penas corporais perante a população local.

Sendo assim, nesse período, ocorreu inúmeras torturas em vários países, como

na Itália, França, Espanha, Inglaterra, Áustria, Suécia, Alemanha e até mesmo

Portugal. Na Alemanha teve uma extraordinária aplicação, por meios rigorosos e

muitas atrocidades cometidas, pois o processo aconteceu juntamente com o tribunal

de inquisição, com o mesmo sistema de rigor e sempre secreto, tanto o local como o

3, Wolgran FERREIRA. A tortura: sua história e seus aspectos jurídicos na constituição. São Paulo: Julex Livros, 1991. 4 GOULART, Valéria Diez Scarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002;

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nome dos juízes, ficando dessa forma averiguada que cada país que cometia esses

tormentos, tinha sua própria particularidade processual.

Sendo muito comum na Itália, a forma de utilização da tortura da corda, e outra

forma bastante utilizada também foi a da vigília que se utilizava da coluna vertebral,

de forma que a mesma suportava todo o peso do corpo, ocasionando inúmeras dores

no torturado, desta forma os locais que se mais destacavam os relatos de tortura, era

na Espanha e na Itália.

No dizer de Michel Foucault (2007, p. 13)5:

A punição vai-se torando, pois, a parte mais velada do processo penal, provocando várias consequências: deixa o campo da percepção quase diária e entra no da consciência abstrata; sua eficácia é atribuída à sua fatalidade não sua intensidade visível; a certeza de ser punido é que deve desviar o homem do crime e não mais o abominável teatro; a mecânica exemplar da punição muda as engrenagens. Por essa razão, a justiça não mais assume publicamente a parte de violência que está ligada a seu exercício. [...] é a própria condenação que marcará o delinquente com sinal negativo e unívoco: publicidade, portanto, dos debates e da sentença; quanto à execução, ela é como uma vergonha suplementar que a justiça tem vergonha de impor ao condenado.

Corroborando tal entendimento, CABETTE (2008)6 afirma:

Apenas a título ilustrativo, é possível mencionar o fato recente de que a forçosa "necessidade da elucidação da autoria dos ilícitos penais" levou o Tribunal Superior do Estado de Israel a admitir "uma legítima pressão sobre os corpos dos suspeitos para compeli-los à admissão da culpa!”. Chegou ainda o mesmo Tribunal a reconhecer a "oportunidade" de castigar os "renitentes prisioneiros!". Com o golpe militar de 1964 no Brasil, houve o preterimento do direito à violência, com atos de guerrilha, práticas terroristas, prisões ilegais, condenações sem o devido processo legal, sem o direito a defesa, o aniquilamento de seres humanos, sem nenhuma motivação, situação que estava gerando o conformismo social. Houve uma supressão de valores, em que as práticas corriqueiras deturpavam a consciência, a ética e a moral. Contudo, estas práticas desumanas não foram exclusividade do Brasil, mas teve uma participação na história de toda a humanidade. Na China, a tortura na época da inquisição era a forma mais utilizada na obtenção da confissão, chegando a integrar a pena.

5 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 33 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.

Título original em francês: (Surveiller et Punir).

6 SILVA, Magna Meire de Oliveira. Tortura. Conteudo Juridico, Brasília-DF: 06 abr. 2017. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.36374&seo=1>. Acesso em: 09 out. 2017.

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2.3 A ABOLIÇÃO DA TORTURA E O ILUMINISMO

Iniciado o Iluminismo por volta do século XVII e XVIII, ocorreu a revolução

intelectual, tendo bastante influência os cientistas e grandes filósofos, que estavam

questionando a respeito dos processos inquisitivos e os conceitos tradicionais, tendo

um dos maiores representantes nessa luta contra a tortura, o famoso filósofo Beccaria

por ter escrito uma importante obra chamada “Dos delitos e das penas, de 1764” na

qual se relatava as formas de torturas utilizada no processo, com isso foi um dos

maiores defensores de que ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo, e com

isso defendendo princípios importantes como, da legalidade, da dignidade da pessoa

humana e o da inocência.

Com esse combate a tortura, com a Escola Clássica e desse surgimento do

Iluminismo, veio a ter um grande enfoque na Europa, influenciando o Direito Penal,

ocasionando essa revolução, transformando a legislação então vigente, com essas

novas ideias, ocorrendo assim abolição da tortura, em primeiro caso na Prússia, em

1740 e de forma geral em 1756, sendo retirada de grande parte dos sistemas legais.

Desta forma ocorreu o processo de legalidade para ilegalidade da referida tortura, mas

como visto ainda percorreu e percorre de forma ilegal.

Nesse período do Iluminismo, ocorreu também a famosa perseguição às

bruxas, que teve a caça e também eram torturadas e queimadas, pois a Igreja

Católica, queria eliminar todo o mal que lhe atingia, utilizando dessas práticas

desumanas, ocasionando dessa forma um momento em que essa revolução

protestante não teve no seu início grande eficácia.

Pode-se observar melhor nas palavras Wolgran Junqueira ferreira (1991, p.

46)7:

Mas sua abolição foi apenas nominal. Aquilo que era legal passou para o terreno do ilegal e desenvolveu-se pelo mundo, sendo que poucos países podem-se vangloriar de não ter um período onde o governo de forma ilegal tivesse usado a tortura.

Já nas palavras de Michel Foucault (2007, p. 63)8:

7 FERREIRA, Wolgran Junqueira. A tortura: sua história e seus aspectos jurídicos na constituição. São Paulo: Julex Livros, 1991;

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O protesto contra os suplícios é encontrado em toda parte na segunda metade do século XVIII: entre os filósofos e teóricos do direito; entre juristas, magistrados, parlamentares; nos cahiers de donénaces e entre os legisladores das assembleias. É preciso punir de outro modo: eliminar essa confrontação física entre soberano e condenado; esse conflito frontal entre a vingança do príncipe e a cólera contida do povo, por intermédio do supliciado e do carrasco. O suplício tornou-se rapidamente intolerável. Revoltante, visto da perspectiva do povo, onde ele revela a tirania, o excesso, a sede de vingança e o “cruel prazer de punir”. Vergonhoso, considerado da perspectiva da vítima, reduzida ao desespero e da qual ainda se espera que bendiga “o céu e seus juízes por quem parece abandonada”. Perigoso de qualquer modo, pelo apoio que nele encontram, uma contra a outra, a violência do rei e a do povo. [...]. Nessa mesma violência, ritual e dependente do caso, os reformadores do século XVIII denunciaram, ao contrário, o que excede, de um lado de outro, o exercício legítimo do poder: a tirania, segundo eles, se opõe à revolta; elas se reclamam reciprocamente. Duplo perigo. É preciso que a justiça criminal puna em vez de se vingar.

Entretanto, a tortura na atualidade, foi sendo proibida, por meio das

constituições de vários países, ficando dessa forma vedados constitucionalmente

esses horrores, que foram praticados aos longos dos anos desde as práticas nas

guerras até mesmo como meio de instrução processual, que daqueles países há

utilizavam a procura da confissão. Deste modo ficou de maneira reproduzida através

do artigo V da DUDH “Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948”.

8 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 33 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.

Título original em francês: (Surveiller et. Punir).

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3 PREVISÕES LEGAIS

3.1 TRATADOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS

Partindo da premissa que as primeiras previsões legais contra a prática da

tortura foram às declarações e tratados internacionais “documentos internacionais”,

que buscou a proteção e prevenindo-se contra essas práticas abusivas horrendas e

desumanas que a tortura atormentava toda a sociedade e atormenta até hoje em dia.

Procurando defender a dignidade humana e a integridade física dos cidadãos, através

dos diplomas internacionais como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, em

conformidade ao seu artigo V, que versa sobre a premissa que o cidadão não pode

ser submetido a tais atos e práticas de tortura, outra é a resolução da ONU 39/46,

Convenção Interamericana conhecida como OEA, Pacto Internacional dos Direitos

Civis e Políticos que relata em seu VII artigo que também ninguém pode ser submetido

a tais atos desumanos, degradantes e cruéis, em seguida o Pacto San José da Costa

Rica, e sem deixar de citar a primeira Declaração Francesa dos Direitos do Homem e

do Cidadão, que teve uma grande importância para que os outros diplomas fossem

espalhados pelo mundo.

No que tange a legislação do Brasil, temos como primeiro meio de

contrariedade da tortura a constituição imperial de 1824, posteriormente colocada pela

constituição de 1988, seguindo o estatuto da criança e da Adolescência e a lei nº

9.455, de 7 de abril de 1997, famosa “Lei de Tortura”, que foi um grande marco depois

de nove anos da constituição de 1988, está lei veio para suprir a necessidade, os

reclames antigos dos juristas e da sociedade em si, com isso atendendo essa

reivindicação dos cidadãos e coibindo tal prática pelo nosso ordenamento jurídico,

tornando assim mais eficaz a luta contra esses tormentos que assombra a todos e

proclamando a luta contra esses atos desumanos sendo seriamente reprimido.

Pode-se observar melhor nas palavras do doutrinador Fernando Capez (2010,

p. 721)9:

9 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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No entanto, até a edição desse diploma legal, a tortura era objeto

apenas do art. 233 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.

8.069/90), bem como do art. 121, § 2º, III, do Código Penal (homicídio

qualificado pela tortura). Para os demais delitos, como o de lesão

corporal ou abuso de autoridade, em que poderia haver o emprego de

tortura, esta constituía mera circunstância agravante genérica,

prevista no art. 61, II, d, do mesmo diploma legal. Neste contexto, a

Lei n. 9455/97 representou significativa evolução no combate à tortura,

coibindo essa prática execrável.

Os direitos fundamentais são os direitos dos homens e de todas as pessoas

desde os presos, refugiados, dentre outros, tendo todos de serem respeitados e suas

integridades físicas protegidas e asseguradas. Em regra, direitos humanos devem ser

promovidos, resguardados quando adquiridos, pois vem sendo buscados ao longo da

história, passando pelo marco da escravização.

3.2 CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Ficando evidenciado que perdurou por muitos anos no Brasil uma grande

lacuna a respeito da previsão legalista do ordenamento jurídico, sendo que a Carta

Magna de 1988 em seu artigo 5º, XLIII, demonstrava a contrariedade e repúdio a

esses atos de tortura cometidos nacionalmente, por seguinte ficando demonstrada em

seu texto constitucional, a não previsão de anistia, graça e até mesmo a fiança, nesses

determinados crimes de tortura.

Dessa forma aqueles atos praticados na tortura como tratamentos desumanos,

penas cruéis e degradantes, serão repelidos pela legislação pertinente, ficando assim

a aplicação até mesmo na tentativa de tortura, pois aquele que participa ou é cumplice

nesses atos responderá também pelo devido crime cometido, sendo dessa forma o

Estado terá que cumprir com seu papel para que seja considerado crime os atos de

tortura, e que sejam os devidos responsáveis julgados pelos seus atos praticados.

A Constituição Federal de 1988, em sua redação pelo artigo 5º, nos incisos III

e XLIII dispôs10:

Art. 5º. “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”: --------------------------------------------------------------------------------------------

10 Respectivamente, art. 5º, III e XLIII, da Constituição Federal de 05 de outubro de 198

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III – “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”; XLIII – “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”;

Desta forma o inciso XLIII, preceitua em primeira vista, o conceito inicial do que

seja tortura, pois, devido as grandes torturas cometidas pelo mundo e inclusive no

Brasil pela ditadura, ficou a necessidade de introduzir dispositivos para assegurar os

direitos dos cidadãos, para proteger um dos seus maiores direitos que é o da

dignidade do ser humano, trazendo assim uma garantia fundamental. Sendo assim a

Constituição Federal teve um importante papel no combate a tortura.

No que tange a respeito do inciso XLIII, ficou analisado que o legislador

constitucional, equiparou o crime de tortura ao crime hediondo, regido pela lei 8.072,

de 25 de julho de 1990, famosa “Lei dos Crimes Hediondos”, estando assim a tortura

passível das formas e disciplinas dos delitos hediondos, como meios mais gravosos

penalmente, sendo negado a quem prática esses crimes, o direito de responder em

liberdade provisória, graça, anistia, indulto, fiança, apelação em liberdade da sentença

sendo bastante severa.

Tendo no crime de tortura a negação da anistia e da graça. Que a anistia vem

a ser extinção da punibilidade de determinados delitos, sendo principalmente aplicada

aos crimes políticos, por meio da lei instituída e concedida pelo Congresso nacional,

como forma de perdão, trazendo a paz social. E sendo a graça nada mais que uma

forma de extinção da punibilidade, mas agora concedida pelo Presidente da

República, tendo que ser solicitada, mas é negada pelo próprio ordenamento jurídico,

já que a tortura é uma forma desumana e degradante de tratar o ser humano.

Outro Inciso importante em destacar é o inciso LVI do artigo 5º da CF: “são

inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;” desta forma são

inaceitáveis todas as provas obtidas por meio de tortura sob o aspecto probatório,

devido a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada "The fruit of the poisonous tree",

pois deve ser desentranhada e excluída do feito essa prova, não se admitindo essa

forma ilícita.

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Outros incisos importantes do artigo 5º da constituição, são o inciso XLVII e o

XLIX11:

XLVII – “não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis”; -------------------------------------------------------------------------------------------- ----------

XLIX – “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”;

Sendo o primeiro garantido a inviolabilidade a vida do ser humano, pois ela

deve ser protegida, visto que é um dos maiores bem que o ser humano tem,

protegendo também as diversas formas de penas cruéis e tratamentos deploráveis

para com os presos desde o serviço forçados, até mesmo da pena perpétua e da pena

de morte, sendo que só é admitida pena de morte no caso de guerra declarada,

ficando dessa forma o segundo inciso o XLIX relacionado à integridade física e moral

do preso, pois o Estado é responsável pela segurança dos detentos.

Nesses moldes a Constituição de 1988, insere no combate à tortura, através

tanto do Brasil ser signatário dos diplomas do sistema internacional de proteção aos

Direitos Humanos, que proíbe as práticas de tortura, e recomenda-se a os países que

deles fazem parte, em procurar estabelecer normas vigentes no combate a tais atos

horrendos, ficando dessa forma a Constituição Federal como um dos maiores protetor

dos Direitos Humanos, protegendo os direitos fundamentais dos respectivos cidadãos.

3.3 NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Em seguida a tortura foi primeiramente tipificada no Estatuto da Criança e do

Adolescente lei 8.069/90, no ordenamento brasileiro, pelo respectivo artigo 233 do

ECA, que posteriormente foi revogado pela Lei de Tortura.

Como ressalta Valéria Diez (2002, p. 50)12:

Com o Advento do Estatuto da Criança e do Adolescente, que continha a previsão de crime consistente em “submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a tortura”, punido com reclusão de um a cinco anos, dividiram-se os estudiosos e juristas a respeito da existência do tipo penal de tortura.

11 Respectivamente, art. 5º, XLVII, XLIX e LVI da Constituição Federal de 05 de outubro de 1988

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Surgiu um primeiro entendimento pelo qual o tipo, embora genérico, seria perfeitamente válido, dando-se a complementação assim como nos tipos abertos. Havia outro posicionamento no sentido de que não estava definida a tortura, pois devi o legislador especificar quais eram as condutas que a caracterizavam, sob pena de se ofender o princípio da reserva legal. A questão ficou superada diante da expressa revogação do dispositivo pela Lei de Tortura, de modo que os tormentos contra crianças e adolescentes deverão ser enquadrados na nova lei. A lei nº 9.455 foi então editada, em 7 de abril de 1997, e criou de forma definitiva o crime de tortura no ordenamento nacional.

Ficando esclarecido dessa forma que esse artigo deixava bastante confusão,

pois não trazia consigo a definição expressa, conclusiva, específica à conduta de

quem a praticava, pois para que seja tipificado legalmente tem que trazer no seu

ordenamento a forma expressa e uma interpretação precisa do fato criminoso, devido

a sua ilicitude, tendo que haver uma interpretação lógica entre o fato e o delito.

Pode-se observar melhor nas palavras do doutrinador Fernando Capez (2010,

p. 722)13:

Tal dispositivo recebeu inúmeras críticas, por se tratar de norma por demais ampla, ferindo, por essa razão, o princípio da reserva legal. É que o tipo do art. 233 limitava-se a dizer “submeter a tortura”, sem definir em que consistia tal prática, ou seja, se fornecer os elementos necessários para que se extraísse o exato significado da expressão tortura. A lei penal deve ser precisa, uma vez que um fato só será considerado criminoso se houver perfeita correspondência entre ele e a norma que o descreve. A lei penal delimita uma conduta lesiva, apta a pôr em perigo um bem jurídico relevante, e lhe prescreve uma consequência punitiva. Ao fazê-lo, não permite que o tratamento punitivo cominado possa ser estendido a uma conduta que se mostre aproximada ou assemelhada. É o que o princípio da legalidade, ao estatuir que não há crime sem lei que o defina, exigiu que a lei definisse (descrevesse) a conduta delituosa em todos os seu elementos e circunstâncias, a fim de que somente no caso de integral correspondência pudesse o agente ser punido.

12 Valéria Diez. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002.

13 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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Visto assim ficavam demonstradas as inúmeras interpretações para o mesmo

caso, pois em se tratando dessa forma genérica do devido artigo 233 do ECA “lei nº

8.069 de 1990”, gerava uma grande confusão na forma de os juízes interpretar tal

norma, ao ponto de gerar grandes diferenças entre as decisões nas referidas

sentenças, ocasionando uma terrível confusão tanto para o ordenamento jurídico

como para o meio social, devido a sociedade em si, por meio do sujeito em distinguir

se estava cometendo ou não o crime.

Convenientemente ficou esclarecido pela Lei de Tortura em e seu artigo 4º, a

definição e conceito, do ato de tortura, revogando o respectivo artigo 233 do Estatuto

da Criança e do Adolescente, visto que respeitado o princípio da reserva legal,

completando todas as lacunas que tinha nesse antigo artigo, ficando dessa forma

superada tal discussão, pois o Supremo Tribunal Federal declarou a contrariedade do

artigo 233 com o que queria se definir na legislação, pois se tratava de descrição

genérica da tortura, tipificando agora de forma específica, precisa e detalhada na lei

9.455/97, famosa Lei de Tortura.

Não restando mais dúvidas a respeito da conduta do agente que em si no artigo

233 do ECA era bastante infraconstitucional, pois a descrição do tipo penal passou a

ser com o advento dessa nova lei, uma das grandes formas de definição do delito de

tortura.

3.4 CÓDIGO PENAL

Primeiramente no que diz respeito ao código penal, previsto no seu artigo 61,

II, d, que trata das agravantes genéricas, aplicando-se assim os procedimentos

previstos dos respectivos crimes hediondos, devido ser a tortura equiparada ao

mesmo, pois essa agravante resultava dos crimes como o abuso de autoridade e até

mesmo de lesão corporal, que por seguinte nesses delitos poderiam ser utilizados os

meios cruéis e degradantes do ser humano, através da tortura. E nesse mesmo

entendimento antes da Lei de Tortura, o artigo 121, em seu parágrafo 2º, III do CP, de

que se trata homicídio qualificado pela tortura também era objeto de interpretação do

delito tortura.

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Como ressalta Valéria Diez (2002, p. 48)14:

Ante a ausência de um tipo penal específico, que somente passou a existir com a Lei nº 9.455/97, a punição da tortura dava-se pela adequação do fato a outros tipos penais do ordenamento jurídico, normalmente de pouca gravidade. Dessa forma, era muito comum o enquadramento da tortura nos crimes de lesão corporal dolosa e abuso de autoridade, salvo quando praticado como meio de execução de outro delito, hipótese em que caracterizava agravante ou qualificadora de homicídio (artigos 61, II, d e 121, § 2º, III, do Código Penal). Nesse caso, justificava-se a elevação da pena em razão do grande sofrimento causado à vítima durante a prática do crime. [...]. Na maioria das vezes, o fato não era punido com rigor. Embora a tortura tivesse sido equiparada aos crimes hediondos pela Constituição, seu enquadramento em outros tipos, não considerados/equiparados aos hediondos, livrava o agente dos rigores da Lei nº 8.072/90. Assim, se o agente tivesse torturado a vítima, resultando apenas lesão leves, não seria acusado de crime hediondo e teria direito até a transação penal (Lei nº 9.099/95).

Temos outro artigo que aborda a respeito da tortura, só que com enfoque ao

tratamento dos presos, o artigo 38 do Código Penal, “O preso conserva todos os

direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o

respeito à sua integridade física e moral.”

Desta forma, vê-se total desrespeito a esse artigo, pois nos presídios o que

mais acontece é inúmeras rebeliões, devido ao excesso de presos, ultrapassando

assim a quantidade mínima de presos por celas, ficando dessa forma o Direito do

preso não sendo respeitado, chegando a ser humilhante, e não sendo observada a

integridade moral do respectivo condenado, se tratando dessa forma o condenado por

meio cruel e degradante, tendo em vista que as prisões nem mesmo se quer tem

assistência médica adequada, falta melhores condições, até mesmo o serviço básico

e sem falar nos maus-tratos e discriminação.

Ficando assim, os grandes relatos como a superlotação, pois fica difícil até de

lidar com bastantes presos, sendo amontoados sem circulação de ar, na

escuridão, sem tratamentos médicos, correndo o perigo de pegarem AIDS e

demais doenças, por estarem expostos uns aos outros sem a devida separação

até mesmo dos crimes cometidos.

14 GOULART, Valéria Diez Scarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002.

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Nesse sentido observa-se o entendimento do doutrinador Júlio Fabbrini

Mirabete (2000; p. 272):

A prisão não deve impor restrições que não sejam inerentes à própria natureza da pena privativa de liberdade e, por essa razão, impõe-se a todas as autoridade o respeito à integridade física e moral do detento ou presidiário (art. 5º, XLIX da CF e art. 40 da LEP). A Resolução nº 7, de 11/07/94, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, reitera o ‘princípio fundamental de que qualquer pessoa presa ou sujeita à medida de segurança tem direito à preservação de sua integridade física e moral, não devendo ser submetida a tortura, a tratamento desumano ou degradante, nem ficar exposta à execração pública’(art.6º).

Vejamos as jurisprudências do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul neste sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. MORTE DE DETENTO EM PRESÍDIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. DEVER DE ZELO PELA INTEGRIDADE FÍSICA DO APENADO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM REDUZIDO. Responsabilidade Extracontratual do Estado A Administração Pública responde objetivamente pelos danos advindos dos atos comissivos realizados pelos agentes públicos, nesta condição, nos termos do artigo 37, § 6º da CF. Caso em que o detento foi morto no interior do estabelecimento prisional. Comprovado nos autos a responsabilidade do Estado pelos prejuízos...37§ 6ºCF. (70047451026 RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Data de Julgamento: 25/04/2012, Nona Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 21/05/2012)

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. MORTE DE DETENTO EM ESTABELECIMENTO PRISIONAL. FALHA DO ESTADO. OMISSÃO ESPECÍFICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL IN RE IPSA CONFIGURADO. A responsabilidade civil do Estado em caso de omissão é subjetiva, fugindo à previsão do art. 37, § 6º, da CF. Contudo, deve ser analisado se a omissão foi específica ou genérica. Em caso de omissão específica, ou seja, quando há o dever de agir, vale a regra constitucional. Hipótese dos autos em que o Estado falhou com o dever de garantir a vida e integridade física de seus detentos na medida em que deixou de prestar um serviço de proteção e vigilância constante e eficiente a garantir a integridade daqueles recolhidos sob sua custódia, culminando com a morte do familiar dos autores recolhido ao estabelecimento prisional.

15 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código Penal Interpretado. São Paulo: Jurídica Atlas, 2000. TJ-RS, 70047451026, Rel. Leonel Pires Ohlweiler TJ-RS, 70047934237, Rel. Tasso Caubi Soares Delabary STF, AI 782903 AgR-segundo, Rel. Min. LUIZ FUX STF, RE 495740 AgR, Rel. Min. CELSO DE MELLO STJ, REsp 936.342/ES, Rel. Ministro LUIZ FUX

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Dano moral in ré ipsa. Valor da condenação fixado de acordo com as peculiaridades do caso concreto, bem como observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, além da natureza jurídica da indenização. Dano material. Pensão mensal aos filhos menores. Fixada a condenação ao pagamento de pensão mensal aos filhos menores, sendo presumida sua dependência econômica em relação ao pai falecido. Precedentes jurisprudenciais. À UNANIMIDADE. DERAM PROVIMENTO AOS APELOS DOS AUTORES ANDERSON, ADRIANO E JOSÉ, E PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DA AUTORA GARIBALDINA. (70047934237 RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Data de Julgamento: 30/05/2012, Nona Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 05/06/2012)

Tem sido este também o entendimento STJ e STF:

SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE MENOR SOB GUARDA. FALTA DO NECESSÁRIO PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282 DO STF. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA. 1. O requisito do prequestionamento é indispensável, por isso que inviável a apreciação, em sede de recurso extraordinário, de matéria sobre a qual não se pronunciou o Tribunal de origem, incidindo o óbice da súmula 282 do Supremo Tribunal Federal, verbis: é inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada na decisão recorrida, a questão federal suscitada. 2. A simples oposição dos embargos de declaração, sem o efetivo debate acerca da matéria versada pelo dispositivo constitucional apontado como malferido, não supre a falta do requisito do prequestionamento, viabilizador da abertura da instância extraordinária. 3. O estado responde objetivamente por danos sofridos por detentos, no caso, menores sob sua guarda. Teoria do risco administrativo. Configuração do nexo de causalidade em função do dever constitucional de guarda (art. 5º, XLX). (RE n. 481.110-AgR). 4. In casu, o acórdão recorrido assentou: RESPONSABILIDADE CIVIL - danos morais e materiais- Dano causado a menor detido em instituição Estadual - Responsabilidade do Poder Público -Estando o autor interno em reformatório para menores infratores, com óbvia custódia e proteção direta do Poder Público, este é responsável por sua integridade física - Artigo 5º, XLIX da CF -Redução dos danos morais-13º salário- Exclusão - Recursos parcialmente providos. 5. Agravo regimental desprovido. (AI 782903 AgR-segundo, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 13/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-066 DIVULG 30-03-2012 PUBLIC 02-04-2012)

RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - ELEMENTOS ESTRUTURAIS - PRESSUPOSTOS

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LEGITIMADORES DA INCIDÊNCIA DO ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO - INFECÇÃO POR CITOMEGALOVÍRUS - FATO DANOSO PARA O OFENDIDO (MENOR IMPÚBERE) RESULTANTE DA EXPOSIÇÃO DE SUA MÃE, QUANDO GESTANTE, A AGENTES INFECCIOSOS, POR EFEITO DO DESEMPENHO, POR ELA, DE ATIVIDADES DESENVOLVIDAS EM HOSPITAL PÚBLICO, A SERVIÇO DA ADMINISTRAÇÃO ESTATAL - PRESTAÇÃO DEFICIENTE, PELO DISTRITO FEDERAL, DE ACOMPANHAMENTO PRÉ-NATAL - PARTO TARDIO - SÍNDROME DE WEST - DANOS MORAIS E MATERIAIS - RESSARCIBILIDADE - DOUTRINA - JURISPRUDÊNCIA - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o "eventus damni" e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva imputável a agente do Poder Público que tenha, nessa específica condição, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. Precedentes. A omissão do Poder Público, quando lesiva aos direitos de qualquer pessoa, induz à responsabilidade civil objetiva do Estado, desde que presentes os pressupostos primários que lhe determinam a obrigação de indenizar os prejuízos que os seus agentes, nessa condição, hajam causado a terceiros. Doutrina. Precedentes. - A jurisprudência dos Tribunais em geral tem reconhecido a responsabilidade civil objetiva do Poder Público nas hipóteses em que o "eventus damni" ocorra em hospitais públicos (ou mantidos pelo Estado), ou derive de tratamento médico inadequado, ministrado por funcionário público, ou, então, resulte de conduta positiva (ação) ou negativa (omissão) imputável a servidor público com atuação na área médica. - Servidora pública gestante, que, no desempenho de suas atividades laborais, foi exposta à contaminação pelo citomegalovírus, em decorrência de suas funções, que consistiam, essencialmente, no transporte de material potencialmente infectocontagioso (sangue e urina de recém-nascidos). - Filho recém-nascido acometido da "Síndrome de West", apresentando um quadro de paralisia cerebral, cegueira, tetraplegia, epilepsia e malformação encefálica, decorrente de infecção por citomegalovírus contraída por sua mãe, durante o período de gestação, no exercício de suas atribuições no berçário de hospital público. - Configuração de todos os pressupostos primários determinadores do reconhecimento da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, o que faz emergir o dever de indenização pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido. (RE 495740 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 15/04/2008, DJe-152 DIVULG 13-08-2009 PUBLIC 14-08-2009 EMENT VOL- 02369-07 PP-01432 RTJ VOL-00214- PP-00516)

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR MORTE DE PRESO EM CADEIA PÚBLICA.DEVER DE VIGILÂNCIA DO ESTADO (ART. 5º, XLIX, CF/88). INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ART. 37, § 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CULPA E NEXO DE

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CAUSALIDADE COMPROVADOS. SÚMULA 07/STJ. 1. O dever de

ressarcir danos, inclusive morais, efetivamente causados por ato dos agentes estatais ou pela inadequação dos serviços públicos decorre diretamente do art. 37 § 6º da Constituição, dispositivo auto- aplicável, não sujeito a intermediação legislativa ou administrativa para assegurar o correspondente direito subjetivo à indenização. Não cabe invocar, para afastar tal responsabilidade, o princípio da reserva do possível ou a insuficiência de recursos. Ocorrendo o dano e estabelecido o seu nexo causal com a atuação da Administração ou dos seus agentes, nasce a responsabilidade civil do Estado, caso em que os recursos financeiros para a satisfação do dever de indenizar, objeto da condenação, serão providos na forma do art. 100 da Constituição. 2. A aferição acerca da ocorrência do nexo causal entre o dano e a conduta do agente público demanda a análise do conjunto fático-probatório carreado aos autos, interditada em sede de recurso especial por força da Súmula 07/STJ. Precedentes desta Corte: RESP 756437/AP, desta relatoria, DJ de 19.09.2006; RESP 439506/RS, Relatora Ministra Denise Arruda, DJ de 01.06.2006 e RESP 278324/SC, Relator Ministro João Otávio de Noronha, DJ de 13.03.2006. 3. In casu, o Juiz Singular e Tribunal local, com ampla cognição fático-probatória, concluíram pela obrigação de indenizar do Estado, ao argumento de que o ordenamento constitucional vigente assegura ao preso a integridade física (CF, art. 5º, XLIX) sendo dever do Estado garantir a vida de seus detentos, mantendo, para isso, vigilância constante e eficiente. 4. Recurso especial desprovido. (REsp 936.342/ES, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/11/2008, DJe 20/05/2009)

Ficando comprovado dessa forma que incube ao Estado, o dever de proteger

a integridade física e moral do condenado, conforme dispõe artigo 37, § 6º, da

Constituição Federal, sendo dessa forma tem que se comprovar o nexo de

causalidade e a ocorrência do dano, ocasionando assim indenização em face do

Estado, pois o que se vê nos presídios é a total contrariedade ao princípio da

preservação da integridade moral e física do condenado, dessa forma desrespeitando

a resolução 7º “Conselho Nacional de Política Criminal Penitenciária.”

3.4.1 Da Reforma do Código Penal

Outro ponto importante em destacar é a reforma do Código Penal que está

trazendo em seu novo texto a incorporação do crime de tortura, como preceitua o

STJ16:

16 STJ. Proposta do novo Código Penal incorpora tratados e criminaliza atos contra direitos humanos. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=105801>. Acesso em: 18 out. 2017.

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Proposta do novo Código Penal incorpora tratados e criminaliza atos contra direitos humanos. A comissão de reforma do Código Penal decidiu trazer ao texto do anteprojeto que será entregue ao Senado diversas condutas previstas em tratados internacionais sobre os direitos humanos. Genocídio, tortura, extermínio e escravidão foram alguns dos pontos abordados pelos juristas na reunião que ocorreu nesta segunda-feira (21). [...] O título do novo CP sobre os crimes contra os direitos humanos trará um capítulo sobre os crimes contra a humanidade. Atualmente, a maioria dessas condutas está prevista no Estatuto de Roma, tratado do qual o Brasil é signatário e que instituiu o Tribunal Penal Internacional. Conforme o relator da comissão, procurador regional da República Luiz Carlos Gonçalves, o objetivo é recepcionar essas condutas na legislação brasileira. Caso contrário, ocorrendo qualquer uma delas, o Brasil ficaria sujeito a julgamento em um tribunal internacional. [...] A comissão também definiu o crime de tortura como crime contra a humanidade. O relator do anteprojeto explicou que a inclusão desse tipo penal não exclui o tipo penal que descreve a tortura praticada fora desse cenário – isto é, como ato contra um único indivíduo. A pena prevista é de dez a 15 anos de prisão. Também fica prevista a tortura qualificada: se resulta em lesão corporal grave ou gravíssima, pena de prisão de 12 a 18 anos; se resulta em morte, de 20 a 30 anos.

Ficando esclarecido esse contexto nos moldes do projeto como sendo o crime

de Tortura uma afronta aos direitos humanos “crime contra a humanidade”, tendo

esses crimes um próprio capítulo, pois têm que ser respeitado os princípios, como o

da dignidade humana, integridade física e moral do preso, e dentre outros, sendo

também analisado e respeitado os tratados internacionais.

Desse modo Ana Cláudia Lucas em seu blog faz comentário a atual reforma17:

Reforma do Código Penal: tortura passa a ser imprescritível, inafiançável e insuscetível de graça ou anistia. Em outro ponto analisado na reunião, a comissão classificou o crime de tortura como imprescritível, inafiançável e insuscetível de graça ou anistia. As penas foram aumentadas: para quem constrange alguém ou o submete a intenso sofrimento físico e mental, a pena foi elevada de dois a oito anos (legislação vigente hoje) para quatro a dez anos de prisão. Se da tortura resultar lesão corporal grave, a pena será de prisão de seis a 12 anos (atualmente é de quatro a dez anos); se resultar morte não intencional e as circunstâncias do fato demonstrarem que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo, a pena pode ir de a oito a 20 anos (hoje, não passa de 16 anos). Caso a morte seja intencional, os juristas esclareceram que o réu responderá pelo homicídio e pela tortura. Outra hipótese prevista para o novo Código Penal é a ocorrência de suicídio da vítima, em razão do sofrimento físico ou mental advindo dos atos de tortura.

17 LUCAS, Ana Cláudia. Reforma do Código Penal. Disponível em: <http://profeanaclaudialucas.blogspot.com.br/2012/05/reforma-do-codigo-penal-tortura-passa.html.> Acesso em: 18 out. 2017.

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Nesse caso, a pena poderá ser idêntica à hipótese de morte culposa após a tortura – de oito a 20 anos. Se alguma autoridade tomar conhecimento do crime de tortura e não determinar as providências cabíveis, incidirá nas penas de um a quatro anos. Ainda quanto ao crime de tortura, a comissão inseriu motivações por discriminação ou preconceito de identidade ou orientação sexual, cor, gênero e procedência regional ou nacional entre aquelas previstas na descrição do tipo penal – raça e religião já estavam previstas na Lei 9.455/97. A tortura estará inserida no capítulo dos crimes contra os direitos humanos.

3.5 LEI N. 9.455 “LEI DE TORTURA”, DE 7 DE ABRIL DE 1997

Surgindo a Lei de Tortura, que em seu texto mediante o artigo 4º, revogou o

referido artigo 233 do Estatuto da Criança e do adolescente, pois se tratava de uma

conduta ainda sem descrição.

Com essa nova lei veio também o conceito mais apropriado para a definição do

que venha a ser o delito em si, explanado em seu artigo 1º, I, “constitui crime de tortura:

constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe

sofrimento físico ou mental.” Tipificando também as condutas de tortura nos demais

artigos 2º e 3º da referida lei, incorporando as penas imposta no devido ordenamento

jurídico do Brasil, as causas de aumento, elementos subjetivos, o não cabimento de

fiança, graça, anistia nesses determinados crimes, as consequências para aqueles

que são agentes públicos na prática desses atos horrendos, a forma de regime a

serem cumpridas essas penas, iniciando o seu cumprimento no regime fechado

“reclusão de 2 a 8 anos”, as particularidades das práticas desumanas, como também

cruéis e degradantes de punição e tratamento para com os condenados, pois quem

pratica tal ato, infligem não só a integridade física, mais também a integridade moral

e mental da vítima, desrespeitando dessa forma os tratados internacionais, que busca

o respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Dessa forma como preceitua a Anistia Internacional (2001, p. 42)18:

A Lei da Tortura, embora seja o instrumento mais importante para acabar com a impunidade disseminada de que desfrutam aqueles que a praticam, não chega a definir plenamente o ato de tortura conforme descrito no Artigo Primeiro da Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e Outras Formas Cruéis, Desumanas de Tratamento e Punição (Convenção contra a Tortura).

18 ANISTIA INTERNACIONAL. Tortura e maus-tratos no Brasil: desumanização e impunidade no sistema de justiça criminal. Reino Unido, 2001.

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Efetivamente, cumpre salientar que no seu próprio artigo 1º regulamenta o que

a Lei de Tortura caracteriza como elementos, ou seja, as três formas de crimes

previstas, sendo esses elementos tanto subjetivos, como objetivos, como dispões o

inciso I, da lei 9.455/9719:

I - Constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa;

Não restando dúvidas a respeito dos elementos que se tratam esse inciso, que

são o motivo ou dolo específico, as formas de consequência que a vítima sofreu pelo

delito praticado e o meio empregado, sendo ele de violência ou grave ameaça.

Seguindo o raciocínio que os crimes das respectivas alíneas são tanto crimes

de tortura para obtenção de provas e até mesmo confissão, como também para que

a pessoa torturada ou mediante grave ameaça cometa crime, e pôr fim a tortura em

forma de racismo, devido às discriminações. Dessa forma exemplifica um melhor

esclarecimento e interpretação do inciso, tendo mais lógica na maneira de se vê e de

entender a lei em si.

No que dispõe sobre o inciso I, alínea “c” que retrata de crime de discriminação,

a Lei de Tortura em si não fica restrita a somente a discriminação racial ou religiosa,

podendo dessa forma abranger inúmeras outras formas de discriminação, sendo ela

sexual, por classe ou até mesmo por meio das diferenças culturais, pois o Brasil

abrange em seu território a vasta miscigenação.

Por diante, se denomina “vis absoluta” a forma em que é utilizada a violência física

em si, e em se tratando de grave ameaça temos a terminologia usada para tal

definição a “vis compulsiva”, dessa forma exterioriza o inciso I da referida lei, ficando

esclarecida que a primeira é a forma de violência mais abrangente, mas grave, sendo

a utilização de força, e para o segundo que se trata a grave ameaça, é uma mera

promessa de ocasionar uma mal à integridade da pessoa, tanto físico como

mental, dessa forma gerando um constrangimento a vítima, por se tratar de um

sofrimento.

19 Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997.

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Dessa forma explana melhor a objetividade jurídica e o tipo objetivo desse

delito, o doutrinar Fernando Capez (2010, p. 725)20:

Objetivada jurídica. O bem jurídico protegido por este crime é a integridade corporal e a saúde física e psicológica das pessoas. No caso de o crime ser praticado por agente público, tutela-se também, secundariamente, a Administração Pública, traída em seus objetivos de legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência. Tipo objetivo. Tal como o crime de constrangimento ilegal (CP, art. 146), a ação nuclear típica consubstancia-se no verbo “constranger”, isto é, forçar, coagir ou compelir. A diferença entre ambos os delitos reside no fato de que o tipo penal da tortura explicita os atos a que a vítima está obrigada a realizar. Há, assim, primeiro a ação de constranger realizada pelo coator, a qual é seguida pela realização de um ato por parte do coagido, qual seja, o fornecimento de informações, a realização de declaração ou confissão, a prática de ação de natureza criminal. Somente com relação ao crime de tortura-racismo, previsto no inciso III, o legislador empregou o verbo constranger, sem que nessa hipótese, aparentemente, fosse exigida qualquer ação da vítima, contentando-se com a motivação por preconceito de raça ou religião.

Ficando a conclusão que tem que haver as formas especiais, das alíneas “a, b

e c” do referido artigo 1º, I da Lei de Tortura, para que haja a configuração do crime

tortura, não bastando à mera configuração de constrangimento através da violência

ou grave ameaça.

Tal crime tem como sujeito ativo qualquer pessoa, por se tratar de crime

comum, e se tratando de agente público ou particular na função estatal, a lei prevê

aumento na pena, ficando dessa forma o tratamento mais grave para esses sujeitos,

pois deveriam estar zelando com mais eficácia pelo princípio da dignidade da pessoa

humana.

Já em relação ao sujeito passivo, temos a figura da pessoa que sofre o

constrangimento através dos meios utilizados como a violência ou grave ameaça,

sendo eles direto ou indireto, pois podem ocorrer de sofrer violência os terceiros como

o cônjuge do coagido.

20 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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No que diz respeito à tentativa, como nós casos é muito difícil de se provar

essa modalidade, tendo em vista que o crime não há de acontecer por força de

circunstância alheias à sua vontade, pois em virtude de um terceiro ou até mesmo no

momento da ação o crime não venha a ocorrer, mesmo utilizando de violência tanto

física ou grave ameaça, não atingindo o sujeito passivo dessa forma, como almeja o

agente do delito.

Já em relação à Desistência voluntária, o doutrinador Fernando Capez

conceitua melhor em suas palavras (2010, p. 728):

Se o agente, antes de completar o constrangimento, interrompe voluntariamente a sua ação, antes que a vítima venha a ter, comprovadamente, algum sofrimento físico ou psíquico não responderá pelo crime de tortura, mas pelos atos até então praticados (constrangimento ilegal, por exemplo). É que na desistência voluntária, o sujeito responde apenas pelos atos até então praticados, ficando afastada a tentativa.

Adiante, o crime de tortura não aceita a modalidade de arrependimento eficaz,

pois em se tratando de o tormento ser praticado em virtude da vítima, ele se torna ou

tentando ou consumado, uma vez que se for impedido, mas que já tenha sido

praticado os meios descritos como violência, físicos e mentais, mas teve

interropimento da mesma, o agente estará assim descrito na modalidade tentada, e

em se tratando de ter obtido a confissão ou declaração, o mesmo já consumou o delito

de Tortura. Dessa forma não há que se falar em arrependimento, tendo em vista que

já ocasionou lesão à vítima ou pela sua tentativa ou pela sua consumação em espécie,

ocasionando assim, sofrimento em desfavor da vítima.

Entretanto, o elemento subjetivo do crime de tortura é o dolo, pois o agente

procura aferir a sua vontade, para que dela lhe proporcione benefício, através da

confissão da vítima, declaração, produzir provas ilícitas como é de regra na maioria

das vezes, e até mesmo de provocar contra a vontade da vítima, para que ela cometa

crime, por tanto esses meios utilizados, como a violência ou a grave ameaça, resulta

essa finalidade, que é o dolo específico, ocasionando e provocando tormentos físicos

e até mesmo psíquicos na vítima.

21 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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Nesse entendimento temos o doutrinador Fernando Capez, a respeito da

tortura como obtenção de provas, confissão e declaração da vítima (2010, p. 729)22:

Veda-se com essa expressa disposição legal o emprego de tortura, geralmente praticada por agentes públicos em interrogatórios, com o fim de obter confissão da prática de crime, a delação do comparsa, a localização da vítima de um sequestro, a localização da arma do crime etc., ou a obtenção de qualquer outra informação ou declaração da vítima ou terceira pessoa. É por tanto, a tortura, via de regra, praticada com o nítido propósito de obter prova em investigação policial. Trata-se da tortura institucional.

Nesse mesmo entendimento temos o conceito da doutrinadora Valéria Diez

(2002, p. 51)23:

O único meio eficaz de combate ao emprego da tortura, na conjuntura atual, é a punição severa dos torturadores associada à retirada e desconsideração da prova ilícita extorquida, um desestímulo aos adeptos desse método. Para alcançar esses objetivos – de punição e reconhecimento judicial da ilicitude -, a tortura deve ser sobejamente demonstrada. Com efeito, a comprovação dos tormentos é a principal arma contra os torturadores, a única garantia de que a brutalidade será punida e a prova assume especial relevância na repressão a essa ilicitude.

Ficando claro desse modo que a lei tem sua plena eficácia, faltando em si a sua

aplicabilidade para que haja mais rigor na efetivação ao combate dessas formas

horrendas para com as vítimas, pois a tortura atormenta não só a vítima em si mais toda

a população, pois as famílias das vítimas passam por grandes problemas, vindo a sofrer

de forma desesperada, por tanto é muito complicado provar esses delitos, tendo em

vista que ocorre nos bastidores carcerários, em meios presídios, delegacias e mais

locais do sistema prisional do Brasil, devido ao mau comportamento de alguns agentes

públicos em sua função, que ao invés de proporcionar segurança ao cidadão, provoca

dor e sofrimento, em virtude disso ocasionando muitos e sérios desequilíbrios

emocionais e psicológicos para com as vítimas.

22 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

23 GOULART, Valéria Diez Scarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002.

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Ainda por demais, temos inúmeros casos que ficam sem esclarecimentos,

tendo em vista em conformidade com os delitos, pois a vítima que sofre tais tormentos

fica amedrontada com medo de denunciar, devido não serem informadas que o crime

cometido tem que ser punido, pensando em ser uma mera agressão. Dessa forma fica

difícil de provar esse crime, que acontece até hoje em dia, sendo via de regra na fase

inquisitiva, para obter assim a finalidade que é de acusar demais comparsas “delação”,

no ato de algum ilícito, por meio de sua confissão, e declaração.

Como ressalta Valéria Diez (2002, p. 53)24:

No âmbito jurídico, a maioria dos casos de tortura de que se tem notícia refere-se a sua utilização como meio de obtenção de prova, principalmente confissões e declarações. Nesses casos, a comprovação há de ser tal a convencer o julgador quanto à ocorrência de tortura e, consequentemente, ilicitude da prova extorquida.

Ficando muito complicado para o Juiz decidir no caso concreto quando houve

ou não o delito consumado “crime de tortura”, pois na maioria das vezes os acusados

ao denunciar a prática do crime, que sofreu dentro do sistema prisional para confessar

o crime dando detalhes específicos, solucionando o crime, usa desse artifício para se

beneficiar da confissão em juízo, ficando claro dessa forma que no cotidiano jurídico,

essa forma de denunciar o crime de tortura por parte dos acusados de crimes, é

bastante utilizada, pois eles mentem muitas das vezes dizendo que sofreram diversos

suplícios em seus interrogatórios dentro das delegacias.

Nessa linha de raciocínio fica o convencimento do juiz em decidir de maneira

mais eficaz possível, buscando solucionar os casos, dessa forma procura-se a

verdade real do fato ocorrido, tendo que decidir a respeito do caso em tela, pois se

torna um elemento muito subjetivo, pois em algum momento pode se deixar ser

influenciado devido a sua formação como pessoa no contexto dos seus princípios e

valores humanos, mas que em verdade deve julgar de forma eficiente, procurando

sempre a melhor solução, conforme dispõe a lei. Ficando dessa forma muito

complicado e esclarecer esses delitos se foram praticados ou não pelos agentes

públicos, devidos essas alegações se de cunho corriqueiro por parte das vítimas.

24 GOULART, Valéria Diez Scarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002.

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Dessa forma o juiz tem que ser imparcial, mas podendo ter seu livre

convencimento, para que haja uma decisão justa, buscando dessa forma a certeza de

que com o cometimento do delito, ocasionou uma prova ilícita, pois foi forjada por

meios de violência ou grave ameaça, dessa forma ocasionando sofrimento à vítima,

para produção dessa prova ilícita, que seja por meio de confissão ou declaração de

algum ilícito.

Ficando claro que o juiz deve procurar pela prova eficiente, que busque

adequação ao fato, e esclarecendo se foi ou não produzida à prova da confissão por

meio de tortura para com a vítima, sendo que essa aceitação ou rejeição da prova tem

que ser de forma motivada, pois a decisão do magistrado ficará assim fundada em

legitimidade.

No que diz respeito ao artigo 1º, II, da Lei de Tortura: II – “submeter alguém,

sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a

intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar o castigo pessoal ou

medida de caráter preventivo”. Trata-se de um crime apenado com reclusão de 2 a 8

anos, sendo que a objetividade jurídica nada mais é que a violência utilizada tanta

como meio a ferir a integridade ou a grave ameaça, ficando dessa forma o sujeito

passivo sob a guarda do agente, ou seja, poder da autoridade que tem sob a influência

da pessoa, gerando dessa forma um castigo intenso, não sendo qualquer castigo, pois

para que seja de caráter do tipo objetivo tem que haver a configuração da violência ou

grave ameaça, dessa forma o sofrimento constante por meio de lesão a vítima tanto

física como mental. Sendo assim é uma prática de crime próprio, pois tem quer ter as

características específicas de agente, guarda, nas atribuições de suas funções, no

entanto o sujeito passivo, aquele que sofre tratamentos desse delito, que está em

poder, ou seja, submetido a tal práticas horrendas, sendo assim o sujeito passivo em

si também é específico.

Outro fator importante é que se trata de dolo nessa modalidade de elemento

subjetivo, tendo em vista que se caracteriza de forma a castigo pessoal, para de

maneira preventiva aplicar-lhe tais castigos ou medidas. Em diante admite-se

tentativa de forma em tese, pois se consuma com a aplicação dos meios de

sofrimento cometidos em face da vítima, com intuito de ocasionar assim tais

tormentos, devido estar o agente passivo sobre a influência ou seja sob o poder de

guarda do agente, ficando assim que a tentativa ocorrerá quando tentando esses

meios e não venha a ocorrer por motivos alheios a vontade do sujeito ativo do delito.

Outro ponto específico em explanar sobre esse inciso é em relação à semelhança

desse delito com o crime de maus-tratos disposto no artigo 136 do

Código Penal25:

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Art. 136 - expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua

autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino,

tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados

indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado,

quer abusando de meios de correção ou disciplina: Pena - detenção,

de 2 (dois) meses a 1 (um) ano, ou multa.

No entanto, o que se distingue de um delito para com o outro, é que o delito de

tortura é mais abrangente, nas formas de seu sujeito ativo, entretanto o tipo objetivo

do crime de tortura é mais específico em relação ao de maus-tratos, pois no delito de

tortura busca o intenso sofrimento da vítima, enquanto nos maus-tratos é uma forma

de abuso dos meios utilizados para castigar ou corrigir, dessa forma a tortura passar

ser uma forma mais grave e com a pena mais alta, devido ser um delito de maior

relevância para o ordenamento jurídico, sendo punido com mais rigor.

No que diz respeito ao artigo 1º, § 1º, da Lei de Tortura: “na mesma pena incorre

quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou

mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de

medida legal”. Trata-se de um crime que se utiliza de dolo, pois consuma-se a partir

do momento que o agente submete o preso as humilhações, sofrimento físico e

mental, desrespeitando dessa forma, a integridade física e moral do condenado, que

está resguardada pela Constituição Federal em seu artigo 5º, III, XLIX, e dessa

maneira provocando tortura, por meio de dores e sofrimento, dentro do sistema

prisional, pois esse crime tem sua característica específica, em virtude de ser seu

sujeito ativo o agente público, como por exemplo os carcereiros, policiais e demais

autoridades.

No entanto se diferencia do Abuso de Autoridade, tendo em vista que no abuso

de autoridade, o agente passa vexame para com a vítima, enquanto que nesse delito

trata-se de provocar sofrimento através dos meios de tormentos da tortura, ficando

dessa forma a inflição à integridade física, moral, a saúde do preso, pois o sujeito

passivo desse delito é a pessoa que está legalmente cumprindo a medida de

segurança ou presa, e se torna submetido a essa práticas horrendas, consumando-

se assim o delito através dessa submissão a vítima, sendo admitida sua tentativa

também.

25 Respectivamente, art. 136, do Código Penal, Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

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No que diz respeito ao artigo 1º, § 2º, da Lei de Tortura: “aquele que se omite

em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na

pena de detenção de um a quatro anos”. Trata-se na verdade de crime comissivo

próprio, pois seu sujeito ativo é na verdade aquelas pessoas que tem o dever de

resguardar a integridade física dos presos, mas que age de forma omissiva na questão

de demonstrar prática do delito de tortura, podendo ser o legista, carcerário, até

mesmo o delegado nessa omissão do crime ter sido praticado, pois poderia estar

evitando e apurando esses atos de sofrimento. No entanto pode até ser

responsabilizado aquele que estiver elencado nas formas do artigo a 13, parágrafo 2º,

do Código Penal: "o dever de agir incube a quem: a) tenha por lei obrigação de

cuidado, proteção e vigilância; b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de

impedir o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência

do resultado".

No que tange a respeito da pena, o doutrinador Fernando Capez explica melhor

(2010, p. 739):

A pena é de detenção de um a 4 anos. Em face da pena mínima cominada, é cabível a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95). De acordo com o art. 1º, § 7º, da Lei, “o condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado”. Assim, de acordo com esse dispositivo legal, aquele que, tendo o dever de agir, deixar de apurar a prática do crime de tortura não estará obrigado a iniciar o cumprimento da pena no regime fechado. A Lei, portanto, foi mais benéfica para aquele que não praticou atos de tortura.

Adiante temos o § 3º do artigo 1º da Lei de Tortura como forma de qualificadora:

“se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena de reclusão de quatro

a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos”. Trata-se das formas

de qualificadora da tortura, pois o agente age com dolo auferindo a tortura, mas de forma

culposa com os resultados, sendo de lesão corporal ou de morte, com isso levando a

consequência do resultado pretedoloso, uma das características dessas qualificadoras,

pois o sujeito ativo não deseja o resultado dos atos culposo, mas se excede ao praticar

a tortura, vindo a ocasionar tanto a lesão como até mesmo a morte. No entanto se o

agente pretende atingir de forma dolosa o resultado da morte ou assume o risco,

responderá pelo delito de homicídio qualificado pela tortura disposto no artigo 121, § 2º

do Código Penal, ou de algumas das lesões

26 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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pois acontecem inúmeras maneiras de tortura com os mais diversos resultados. Vale

ressaltar ainda que em se tratando das diversas formas de lesões na tortura, o agente

se praticando de forma culposa, poderá responder por essa forma de tortura

qualificada do § 3º do artigo 1º da Lei de Tortura, em cometimento pela lesão de perigo

de vida do artigo 129, § 1º, II do Código Penal e também se provocar aborto na

gestante, disposto esse resultado das lesões com perigo de vida, no artigo 129, § 2º,

V do Código Penal, no entanto se praticar tais delitos de forma dolosa, responderá

pelos atos, sendo computado o concurso dos crimes cometidos.

Já o § 4º do artigo 1º da Lei de Tortura trata das formas de aumento de pena:”

Aumenta-se a pena de um sexto até um terço: I - se o crime é cometido por agente

público; II - se o crime é cometido contra criança, gestante, deficiente e adolescente;

III - se o crime é cometido mediante sequestro”. Dessa forma devem ser observadas

as características específicas de cada crime, como no caso de ser observada a

situação de efetivo agente público elencada no artigo 5º da lei 4.898 de 1965, que

trata o conceito específico do que venha a ser agente público, como no caso de tortura

cometida contra criança, que para ser criança e adolescente, deve ser observado o

conceito dos sujeitos passivos, no Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu

artigo 2º, caput, que demonstra que para ser criança deve auferir menos de 12 anos,

e que para ser adolescente deve ter a idade de 12 e menor de 18, dessa forma se

trata de modalidades específicas, devendo ser observado dos os elementos de cada

caso concreto. No entanto se da tortura cometida contra esses sujeitos passivo

resultar morte dolosa, o crime será o de homicídio qualificado pelo emprego de tortura

elencado no artigo 121, § 2º, III do Código Penal com o devido aumento da pena, em

se tratando de crime praticado contra menor de 14 anos, disposto no artigo 121, § 4º

do Código Penal.

Conforme dispõe a Lei de Tortura, esse crime é ação penal pública

incondicionada, tendo em vista a propositura de imediato pelo Ministério Público, pois

esse crime é uma das formas mais atormentante, degradantes, desumana da forma

de tratar o cidadão, auferindo dor e sofrimento, tanto físico como mental, ficando assim

se o Ministério Público deixar de propor a devida ação, o interessado poderá propor

ação penal privada subsidiária, conforme disposto no artigo 5º, LIX, da Constituição

Federal e no artigo 29 do Código Penal.

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Em continuidade a Lei de Tortura, traz no seu art. 1º, § 5º: “A condenação

acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu

exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada”. Trata-se das aplicações das sanções

aos agentes públicos, sendo que esses são penalizados de forma mais severa, pois

estes que devem respeitar os direitos dos cidadãos, em conformidade com o fato de

a administração pública buscar pelo bem maior que é o da coletividade. Tendo em

vista que esses são os efeitos da condenação dos agentes públicos, formando assim

uma condenação extrapenal, pois em si é uma forma dos seus efeitos baseada na

própria lei 9.455/97, ficando assim esses agentes inabilitados de exercer suas funções

públicas enquanto perdurar a condenação, se estendendo essa condenação até

cumprir a respeitosa pena aplicada, aplicada a todos os agentes públicos que praticar

esses tormentos de tortura.

No que tange a respeito da condenação, o doutrinador Fernando Capez

explica melhor (2010, p. 744)27:

Haverá, assim, automaticamente, a perda do cargo, função ou emprego público + a interdição para o seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada. Vejam que a lei n. 9.455/97 não impôs para a perda do cargo, função ou emprego público qualquer limite de pena, diferentemente do art. 92 do CP.

Dessa forma, diferentemente dos efeitos da condenação do disposto artigo 92

do Código Penal, a Lei de Tortura traz uma forma específica de tratar o agente público

que pratica o crime de tortura, pois no crime de tortura a condenação não precisa ser

motiva, e nem ao menos tem limite na pena.

Ademais o § 6º, do artigo 1º da lei 9.455 “Lei de Tortura”: “o crime de tortura é

inafiançável e insuscetível de graça ou anistia”. Trata-se de não cabimento desses

dispositivos nos crimes de tortura, tendo em vista que houve uma grande repercussão

enquanto a concessão do indulto, mas ficou superado, tendo em vista que está

constituído na Constituição Federal o não cabimento de induto para os crimes

hediondos, ficando a tortura equiparada a eles, também ficará sem cabimento para

esses delitos, pois a concessão de graça e anistia no texto da Carta Magna é muito

ampla compreendendo o indulto nas suas modalidades.

27 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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No que tange a concessão da liberdade provisória nesses crimes de tortura, o

doutrinador Fernando Capez explícita melhor (2010, p. 745)28:

Muito embora o crime inafiançável, o condenado por crime hediondo e equiparado, que for preso provisoriamente, poderá obter o benefício da liberdade provisória, caso não estejam presentes os pressupostos para a manutenção de sua segregação cautelar. Assim, somente se admitirá que o acusado permaneça preso cautelarmente quando estiverem presentes os motivos que autorizam a prisão preventiva (CPP, arts. 310, parágrafo único, e 312), ou seja, somente se admitirá a prisão antes da condenação quando for imprescindível para evitar que o acusado continue praticando crimes durante o processo, frustrante a produção da prova ou fuja sem paradeiro conhecido, tornando impossível a futura execução da pena. Quando não ocorrer nenhuma dessas hipóteses, não se vislumbra a existência de periculum in mora e não se poderá impor a prisão processual.

Ficando assim esclarecido nesse dispositivo o não cabimento da graça, anistia

e a fiança no delito de tortura, pois poderá responder ao processo em liberdade se

preencher os pressupostos para a liberdade ou se o flagrante for considerado ilegal.

Já o que se dispõe no § 7º, do art. 1º da Lei de Tortura: “o condenado por crime

previsto nesta Lei, salvo hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime

fechado”. Trata-se de características específicas da Lei de Tortura, uma vez que para

esses delitos, iniciará o cumprimento em regime fechado da respectiva pena, tendo

em contrapartida que o entendimento anterior aos crimes hediondos era que não se

admitia a progressão de regime, sendo assim era cumprindo a pena integralmente em

regime fechado dos crimes hediondos e seus equiparados, tendo em vista que tinha

essa contradição entre a lei 9.455/97 que deixa bastante esclarecida que iniciará,

sendo esse termo cabível a modificação de regime, a famosa progressão de um

regime para o outro, pois no seu texto a essa possibilidade. No que diz respeito a essa

contradição, foi formulada a lei 11.464/2007, que trouxe em seu bojo a possibilidade

de progressão de regime para os crimes hediondos e seus equiparados, ficando no

desuso a Súmula 698 do STF, que tratava da impossibilidade de progressão de regime

nos crimes hediondos e equiparados, tendo agora depois da edição dessa nova lei a

possiblidade de admissão da progressão de regime nos crimes hediondos e seus

equiparados como na própria Lei de Tortura, se seu o agente cumprir os requisitos

para o benefício.

28 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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Como conceitua melhor o doutrinador Fernando Capez (2010, p. 743)29:

A Lei trouxe, no entanto, requisito temporal distinto. Desse modo, se o apenado for primário, a progressão se dará após o cumprimento de 2/5 da pena, isto é, 40% da pena e, se reincidente, 3/5 da pena, isto é, 60% da pena. Com o delito de tortura é crime equiparado a hediondo, deverá sujeitar-se ao novo requisito temporal da Lei n. 11.464/2007 para obtenção do benefício da progressão de regime.

Por diante temos o art. 2º da Lei de Tortura: “o disposto nesta Lei aplica-se

ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima

brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira”. Trata-se da

extraterritorialidade, um dos princípios a ser observado nos crimes de tortura,

aplicando esse princípio aos delitos cometidos fora do Brasil, devendo-se se observar

os tratados internacionais.

Como relata melhor esse princípio o doutrinador Fernando Capez (2010, p.

746)30: Assim, temos duas hipóteses em que a lei nacional aplicar-se-á ao cidadão que comete crime de tortura no estrangeiro: (a) quando a vítima for brasileira: trata-se aqui da extraterritorialidade incondicionada, pois não se exige qualquer condição para que a lei atinja um crime cometido fora do território nacional, ainda que o agente se encontre em território estrangeiro. Basta somente que a vítima seja brasileira; (b) quando o agente se encontrar em território brasileiro: trata-se da extraterritorialidade condicionada, pois, nesse caso, a lei nacional só se aplica ao crime de tortura cometido no estrangeiro se o torturador adentrar o território nacional. Convém notar que esta última hipótese é conhecida como princípio da jurisdição universal, da justiça cosmopolita, da jurisdição mundial etc., pelo qual todo Estado tem o direito de punir qualquer crime, seja qual for a nacionalidade do delinquente e da vítima ou o local de sua prática, desde que o criminoso esteja dentro de seu território. Finalmente, não se exige qualquer outra condição prevista no art. 7º do Código Penal para incidência da lei brasileira sobre o crime de tortura praticado no estrangeiro, pois prevalece o disciplinado específico da Lei n. 9.455/97.

A Lei de Tortura no seu bojo final traz consigo os artigos 3º e 4º, sendo o art.

3º: “Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação”. Trata-se desse artigo

da data vigorante do dispositivo, dessa forma sendo de grande importância para

o combate desses tormentos horrendos da tortura, e no seu artigo 4º: “Revoga-

se o art. 233 da Lei nº 8.089, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do

Adolescente”, deixando dessa forma clara a total revogação do artigo 233 do ECA.

29 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010;

30 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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4 FORMAS DE TORTURA

Diversas são as formas, métodos e técnicas de tortura, no qual se utilizam de

meios horrendos, para proporcionar dores, sofrimentos, lesões irreversíveis,

praticadas muitas das vezes no regime da ditadura, impondo humilhação, torturas

psicológicas, e entre os demais tormentos. Desse modo, ela evoluiu ao longo dos anos

de forma centrada, buscando perfeição em torturar os presos, de forma lenta e brutal,

sendo dessa forma praticada com grande enfoque pela ajuda da medicina e da

ciência, portanto utilizada para a ditadura se manter no poder ou obter confissões de

acusados de crimes, ou para delatar suspeitos de delitos.

Desse modo como relata GOULART (2002, p. 72 e 73):

A tortura é um crime peculiar, principalmente porque praticada em locais ocultos e, muitas vezes, por autoridades públicas. Assim, sua comprovação exige técnica e conhecimentos específicos por parte dos juristas, entre os quais se destaca o estudo dos métodos de tortura e dos vestígios resultantes de sua prática. Conhecer os métodos de tortura é ter em mãos uma poderosa arma contra os torturadores. Em geral, os agentes amparam-se em técnicas avançadas que lhes permitem infligir dores horrendas sem que resultem evidências físicas, o que quase sempre importa em impunidade. Contudo, ao estudar determinadas técnicas e verificar que elas não deixam marcas, ou que os vestígios são insignificantes, é possível punir os torturadores, mesmo nesses casos. Além disso, pode-se verificar se o relato do ofendido é compatível com os métodos de tortura alegados e com os vestígios encontrados. Há vários casos no quotidiano forense de réus que alegam ter sido vítimas de tortura, mas os ferimentos não correspondem ao conteúdo de seus interrogatórios, como, por exemplo, os réus que dizem ter sofrido agressões na face e apresentem hematomas nas pernas. Dessa forma, o confronto do relato do ofendido com os métodos de tortura e vestígios encontrados serve para conferir maior ou menor credibilidade ao relato.

Deve as torturas, desse modo ter um nexo entre os vestígios e os meios de

relato das vítimas que veio a sofrer tal tormento, ficando assim que existem as

modalidades e o resultado final, assim proporcionando, lesões tanto grave como

gravíssimas e levar até mesmo a morte ou o resulto menos gravoso como a lesão

corporal leve.

31 GOULART, Scarance Fernandes. Tortura e prova no processo penal. São Paulo: Atlas, 2002.

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Sendo umas mais graves que as outras, podendo nunca mais ser reparadas

como no caso dos sofrimentos psicológicos ou aquelas que deixam sequelas

irreparáveis que ficará gravada tanto fisicamente como mentalmente na vítima que a

sofreu. Desse modo passando pelas fases aos longos dos anos, cada uma com os

seus métodos e formas, como no caso da antiguidade e tempos medievais e até

mesmo na atualidade, tendo um grande enfoque no uso do capuz tanto pelo carrasco

como pela vítima.

Ressalta melhor Wolgran Junqueira Ferreira (1991, p. 50):

A mente humana é fértil para criação de instrumentos destinados ao progresso científico, ao bem do ser humano, mas também é usado para criação de instrumentos de suplícios. A evolução neste sentido também não deixa nada a desejar. Os tipos são mais requintados, hoje, do que aqueles aplicados na antiguidade e na Idade Média, e mesmo no século atual sua evolução foi grande. Há também que se considerar que na antiguidade e na Idade Média a tortura era aplicada publicamente para servir de exemplo. Hoje não mais. É aplicada de forma disfarçada, a solapa, para que o povo não tenha conhecimento. Torna-se claro que hoje a dosagem de covardia do torturador é muito grande. Ele sabe que está fazendo o que é proibido e então o faz de forma solerte. O torturador da antiguidade e o medievo não eram covardes perante a sociedade, perante o torturado sim; hoje não, ele é covarde tanto perante o torturado como perante a sociedade.

No entanto são modalidades dessas práticas horrendas, como ressalta Magna

Meire de Oliveira:

a) Arrastamento em viatura: causava esfolamento e escoriações generalizadas no corpo da vítima. Também forçavam a vítima a respirar o gás que saía pelo escapamento do veículo; b) Escalpo: consiste na retirada da pele da vítima;

c) Churrasquinho: introdução de material inflamável no ânus e na vagina; d) Cama cirúrgica: a vítima é amarrada e esticada em uma cama. Causava o rompimento de nervos e, sobre a cama, também praticavam torturas como o arranchamento das unhas; e) Maçarico: espécie de “churrasquinho” que causa queimaduras de primeiro grau; f) Coroa-de-cristo ou capacete: consistia no esmagamento do crânio por meio de um anel metálico e um mecanismo que o estreitava;

32 FERREIRA, Wolgran Junqueira. A tortura: sua história e seus aspectos jurídicos na constituição. São Paulo: Julex Livros, 1991 33 SILVA, Magna Meire de Oliveira. Tortura. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 06 abr. 2017. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.36374&seo=1>. Acesso em: 31 out. 2017.

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g) Tortura aos familiares e a amigos: consistia em torturar amigos e parentes em frente ao perseguido político; h) Cadeira-do-dragão: espécie de cadeira elétrica; i) Tamponamento por éter: aplicação nas partes sensíveis e feridas do corpo, provocando queimaduras e dores; j) Tortura sexual: prática de estupros, introdução de cassetete no ânus, compressão e choques nos testículos; k) Palmatória: espécie de raquete de madeira que é aplicada às mãos, pés, nádegas e costas da vítima; l) Capuz: causa tortura física inesperada e tortura psicológica (o torturado fica incapacitado de ver de onde vêm os golpes); m) Formas de imobilização: utilizada nos intervalos de outras formas de tortura com o objetivo de causar esgotamento físico (segurar pesos nos braços, equilibrar a sola dos pés em latas cortantes); n) Espancamento: murros e pontapés aplicados em regiões como rins, estômago e diafragma; o) Corredor polonês: filas paralelas de torturadores formando um caminho obrigatório para a vítima passar; p) Telefone: aplicação de tapas com ambas as mãos nos ouvidos da vítima (provoca rompimento dos tímpanos e labirintite);

Entretanto ainda tem outras formas que foram bastante utilizadas, como

Empalação (introdução de diversos objetos no ânus tanto do homem como da mulher),

Queimaduras, Choque elétrico, Afogamento e similares e o famoso Pau de Arara

“Cambão”, que é uma das formas mais utilizadas entre tantas espécies do delito

tortura, sendo que nesse método é utilizada uma barra de ferro que passa pela dobra

do joelho e os punhos que foram amarrados no cano, ficando por muitas das vezes

de cabeça para baixo, passando esse ferro pelo vão do joelho, ainda nessa mesma

situação a vítima ainda sofre outras torturas, como choque, afogamento, empalação,

que proporciona ainda mais tormentos, sofrimentos, podendo ocasionar até mesmo a

morte se vier a ser duradoura a sessão de tortura.

Restando por fim que nesse contexto, muito importante a realização de laudo

da perícia, que demonstrará se houve ou não a tortura, através dos vestígios físicos

dos maus tratos que a vítima sofreu, sendo assim muito importante como prova do

processo para apuração do delito, pois na maioria das vezes fica difícil de se provar

pois os vestígios desaparecem, devido ao não acesso dos detentos com os médicos

para realizar tais perícias, desse modo o exame de corpo de delito é essencial para

apurar o crime de tortura se foi cometido ou não, conforme dispõe o artigo 158 do

CPP: “Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de

delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.”

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5 CASOS VERÍDICOS DE TORTURA NO BRASIL

A tortura por sua vez teve seu marco na história do Brasil, pelo período de

colônia e escravidão, sendo que na colônia teve três períodos importantes, como as

Ordenações Afonsinas de 1446, em 1521 as Ordenações Manuelinas e por fim em

meados a 1603 tivemos as Ordenações Filipinas, sendo que nesses tempos eram

legais tais tratamentos, para buscar a confissão através de indagações, que por sua

vez foram cometidas inúmeras vezes aos escravos, que sofriam tormentos,

sofrimentos físicos durante muito tempo, sendo que cada uma teve seu marco na

história vindo a ser ilegal através da Constituição Política do Império, em 25 de Março

de 1824, e sendo de bastante importância um dos marcos mais terríveis as

Ordenações Filipinas, que admitia um enorme desigualdade, ou seja arbítrio judicial

proporcionando assim os inúmeros crimes de tortura nesse período, que adiante teve

outro importante fator no combate a tais penas o Código Criminal de 1830.

Adiante tivemos a ditadura que teve um grande marco no processo de tortura,

pois foi criada nesse período a Lei de Segurança Nacional, na qual ocorreu inúmeros

tormentos, com muitas repressões a políticos, críticos, intelectuais, cantores e demais

opositores desse novo modelo de imposto pelos militares, devido ao golpe sofrido pelo

Brasil em 1964. Sendo assim mesmo com a proibição da tortura, devido ser abolida

no império, voltou à tona os tormentos, sendo utilizado meios cruéis, ficando dessa

forma a sociedade insegura, pois o principal objetivo da ditadura era combater esse

opositores através de inúmeras formas de tormentos.

Assim muitos políticos tiveram que procurar exílios, pois corriam até risco de

vida se continuasse no território nacional, pois várias também foram as formas de

censuras a artistas, cantores e demais celebridades, pois aquele que ia contra o

regime vigente, sofria penas, tanto corporais como as demais práticas de tormentos.

Outro fator importante foi que nesse período houveram inúmeros presidentes

no total de cinco, pois passavam por inúmeras transformações, sendo uns mais

repressivos que outros, sendo desse modo uma época de grandes transformações e

inúmeros de diversas repressões do regime para como os meios de comunicação e

para com a sociedade em si.

Em suma importância tivemos diversos casos rebelados pela mídia como O

Caso da Favela Naval em Diadema São Paulo, foi o primeiro caso que mais

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repercutiu para a criação da Lei de Tortura, no mesmo ano da criação da lei em 1997,

O Massacre do Carandiru, que gerou até filme, mostrando a realidade dos tormentos

ocorrido dentro do sistema prisional, com a morte de muitos prisioneiros, fato ocorrido

em outubro de 1992, A Chacina da Candelária no Rio de Janeiro em julho de 1993, A

Morte dos Sem Terras em Eldorado dos Carajás no Pará, que foi um dos casos que

também mais teve repercussão na mídia, ocorrido em abril de 1996, O Índio Pataxó

em Brasília em abril de 1997, O Sequestro de Wellington de Camargo em Goiânia em

março de 1999, o caso dos Irmãos Naves que foi um dos maiores erros judiciais do

Brasil em Araguari interior de Minas Gerais no ano de 1937, e entre demais casos que

ocorrem nos bastidores sem que a mídia venha a revelar.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa trouxe de forma esclarecedora, a grande evolução do delito de

tortura, desde antiguidade até os tempos modernos, mostrando um grande enfoque

nos seus modos praticados, de forma desumana para com o ser humano.

Há de se notar que antes não tinha previsão específica para o delito de tortura,

pois veio a suprir essa lacuna com a criação da lei 9.455/1997, tendo seu primeiro ato

instituído em nosso ordenamento jurídico, no Estatuto da Criança e do Adolescente,

ficando dessa forma explanado na pesquisa, sua evolução no Direito Brasileiro, desde

o artigo 233 do ECA como da criação e instituição da Lei da Tortura, como dos

primeiros ordenamentos que foram as convenções internacionais. Dessa forma a

tortura está sendo cada vez mais reprimida pelo, buscando proteger esses Direito tão

grande que é o da dignidade da pessoa humana no nosso Código Penal.

Entretanto, até hoje em dia tem acontecido inúmeros relatos de crimes de

tortura, mas poucos são evidenciados pela mídia, pois a maioria são difíceis de prova

sua autoria , ficando dessa forma difícil a desse delito de quem o pratica, pois, a prova

desse crime se deteriora rápido, devido ao preso não ter acesso imediato com o

médico legista, para comprovar de forma precisa as lesões e tormentos cometidos.

Pois em inúmeras às vezes o delito de tortura é confundido com lesão corporal e maus

tratos, tendo penas mais leve do que o crime de tortura, pois tem que ser observado

com mais rigor cada caso concreto.

A lei em si tem eficiência, mas falta mais aplicabilidade, devido ao sistema prisional ser

falho, pois no Brasil sofremos com a superlotação dos presídios e cadeias, devem ser

observados e propostos melhores políticas de segurança pública para que tais

tormentos não venham acontecer e ficarem impunes aqueles que praticam com

crueldade o delito de tortura.

Dessa forma é de bastante importância que seja protegido essas garantias dos

cidadãos e que as vítimas não fiquem inertes, que não tenham medo de denunciar

esses tormentos sofridos, não ficando caladas as tantas crueldade, e buscando dessa

forma integração dos órgãos competentes para punir esses infratores que os

cometem, com a interligação dos membros do poder judiciário, que são os

Magistrados, as Corregedorias, o Ministério Público a Defensória Pública e a OAB.

Sendo assim, deve se analisar de forma bastante precisa a aplicabilidade da lei

no caso concreto, procurando dessa forma punir com mais rigor e efetividade todos

os casos que foram cometidos, pois na maioria dos casos o que se procura por parte

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do sujeito ativo é a confissão através desses tormentos ou delação, sendo essa prova

contaminada, pois foi obtida por tormentos que poderão ser irreversíveis para vítima,

ou até mesmo ocasionar sua morte, pois não podemos nos dias atuais suportar essas

barbaridades com o ser humano.

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2012. Disponível em:

<http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.36374&seo=1>. Acesso em: 09

out. 2017.

STJ. Proposta do novo Código Penal incorpora tratados e criminaliza atos contra direitos humanos. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=105 801>. Acesso em: 18 out. 2017.

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Presidência da República Casa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos

ANEXO – LEI Nº 9.455, DE 7 DE ABRIL DE 1997.

LEI Nº 9.455, DE 7 DE ABRIL DE 1997.

Define os crimes de tortura e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Constitui crime de tortura:

I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe

sofrimento físico ou mental:

a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;

b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;

c) em razão de discriminação racial ou religiosa;

II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência

ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de

segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.

§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las

ou apurá- las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos.

§ 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.

§ 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um

terço: I - se o crime é cometido por agente

público;

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II - se o crime é cometido contra criança, gestante, deficiente e adolescente;

II – se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência, adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

III - se o crime é cometido mediante seqüestro.

§ 5º A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.

§ 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.

§ 7º O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o

cumprimento da pena em regime fechado.

Art. 2º O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 4º Revoga-se o art. 233 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente.

Brasília, 7 de abril de 1997; 176º da Independência e 109º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Nelson A. Jobim

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 8.4.1997