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ASSETS NA MIRA NO BRASIL E NO EXTERIOR, GESTÃO DE RECURSOS PASSA A SER MAIS REGULADA MAIS UM DRIBLE OS INDÍCIOS DE QUE EX-DONO DA TAURUS ESCAPOU DE OPA VIA AUMENTO DE CAPITAL AVANÇO DE INVESTIDORES QUE APOSTAM NA BAIXA DAS AÇÕES IMPÕE NOVOS DESAFIOS A PROFISSIONAIS DE RI E REGULADORES TORCEDOR DO CONTRA CAPITAL ABERTO • ANO 12 • NÚMERO 134 • OUTUBRO 2014

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Page 1: TORCEDOR DO CONTRA - Capital Aberto · Laurence Gomes 12 Seletas 36 Antítese Gestoras devem ter capital mínimo? ... Colunistas Alexandre Di Miceli da Silveira Marta Barcellos Ney

ASSETS NA MIRANO BRASIL E NO EXTERIOR, GESTÃO DE RECURSOS PASSA A SER MAIS REGULADA

MAIS UM DRIBLEOS INDÍCIOS DE QUEEX-DONO DA TAURUS ESCAPOU DE OPA VIA AUMENTO DE CAPITAL

AVANÇO DE INVESTIDORES QUE APOSTAM NA BAIXA DAS AÇÕES IMPÕE NOVOS DESAFIOS A PROFISSIONAIS DE RI E REGULADORES

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E d i t o r i a l

04 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

Marketing e Circulação Roberta PalmaEventosAnna Ortiz Publicidade Debora Manzano (11) 3775-1619International sales Sales Multimedia, Inc. (USA) +1-407-903-5000 – [email protected] Assinaturas (11) 3775-1603 [email protected]

Uma virtude inquestionável dos mercados de capitais é sua capacidade de criar. Imaginação e inteligência são frequentemente usados para desbravar rotas que termi-nam em cifrões reluzentes. O que fazer quando as bolsas não sobem? Encontrar um jeito de ganhar com a queda, é claro. Assim surgiram truques encantadores como os derivativos e as operações de aluguel de ações, que possibilitam fazer muito dinheiro com as inevitáveis possibilidades de insucesso. Uma simples e astuta constatação da vida como ela é: se nem sempre as coisas vão bem, por que não achar uma forma de ganhar na baixa?

Pois assim funcionam os chamados investidores de posição vendida, tema da repor-tagem de capa desta edição, produzida por Luciana Del Caro. Eles estão crescendo a galope no Brasil e têm exigido uma resposta rápida e atenta dos reguladores e profis-sionais de relações com investidores (RIs). Situações estranhas podem ocorrer na rotina desses investimentos; por exemplo, o uso do voto com a ação alugada, desprovido de interesse em ajudar a companhia ou, por que não, propositalmente intencionado em prejudicá-la. Não seria o caso de os RIs tentarem conhecer melhor esse investidor — em vez de odiá-lo por não enxergar o futuro radiante que eles prometem em suas apresentações? Mas como fazer isso se há tão pouca transparência sobre esse sócio?

Interessante que, nos Estados Unidos, os “short sellers” vêm trabalhando para mos-trar sua face do bem. Ao tentar achar as companhias cujas ações têm grandes chances de desabar, eles atuam como detetives do que está errado. Assim, enquanto uns correm para enxergar o que vai dar muito certo antes de todo mundo, outros escarafuncham a derrocada desde os seus primeiros sinais — e, assim, descobrem grandes trapalhadas ou até mesmo desavergonhadas falcatruas, como conta Bruna Maia Carrion.

E, por falar em coisas erradas, nesta edição a repórter Yuki Yokoi volta a relatar os criativos métodos do comandante da Forjas Taurus para livrar-se dos inconvenientes causados pela presença de minoritários na companhia. A última invenção do empre-sário teria sido uma venda de controle camuflada por um aumento de capital ensaiado com o comprador. A tática funcionou muito bem. E ainda adicionou um item novo à cartela de métodos criativos para escapar das famigeradas ofertas públicas de aquisição obrigatória — as OPAs.

Nenhuma surpresa numa conjuntura em que as soluções mirabolantes para subtrair direitos começam a ser gestadas já no âmbito do governo federal. A história recente da Eletrobras, também abordada nesta edição, sintetiza o descaso do setor público com as leis e as boas práticas. Sábios os investidores que aprenderam a apostar na baixa.

Simone Azevedo

Editora executiva Simone Azevedo [email protected] Tanoue [email protected] de texto e produçãoBruno [email protected]órteresBruna [email protected] Yokoi [email protected] ColaboradoresJiane CarvalhoJoão Carlos de OliveiraLuciana Del Caro Roberto RockmannColunistasAlexandre Di Miceli da SilveiraMarta Barcellos Ney CarvalhoPeter JancsoArticulistas desta edição Christian Sant’AnnaFelipe KimLuiz Antunes MüssnichProjeto e direção de arte Beto Nejme e Marco ManciniGrau 180DiagramaçãoGrau 180 Rodrigo Auada IlustraçõesBeto NejmeEric PeleiasMarco Mancini Rodrigo Auada Impressão Duograf Gráfica e EditoraCirculaçãoDPA Consultores Editoriais [email protected]: (11) 3935-5524Distribuição nacionalFernando Chinaglia Comercial e DistribuidoraTiragem desta edição 5.000 exemplares Data de fechamento28/9/2014

Nota aos leitores As opiniões expressas nos artigos e boletins customizados são as de seus autores e não necessariamente as da capital aberto. É proibida a reprodução ou transmissão de textos e imagens desta publicação sem autorização prévia. Para receber um exemplar como cortesia, acesse a seção Exemplar Cortesia, em www.capitalaberto.com.br.

ANO 12 - NÚMERO 134 — OUTUBRO DE 2014

A Capital Aberto é uma publicação mensal da Editora Capital Aberto Ltda. Endereço Rua Wisard, 305 – sala 54 – Vila Madalena – São Paulo, SP – CEP 05434-080 Contatos: (11) 3775-1600 – fax (11) 3775-1604 [email protected]

Sábios investidores

Circulação auditada:

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S u m á r i o

Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 05

4 Editorial

6 Mural do Leitor

8 capital aberto n@ Web

9 N@ Web

10 RelevoLaurence Gomes

12 Seletas

36 AntíteseGestoras devem ter capital mínimo?

50 Alta&Baixa Azul: CemigVermelho: Paranapanema

52 Notas Internacionais

54 ArtigoConselheiros: não se arrisquem!

55 Governança Conselhos mundo afora

56 HistóriasO colapso de 1929

58 RetratoMatias Spektor

61 Prateleira Business adventures

62 Saideira

SEÇÕES

16 Forjas TaurusInvestidores apontam uso de aumento de capital para disfarçar alienação de controle

22 CAPA Aposta na baixaAvanço no aluguel de ações impõe novos desafios a RIs e reguladores

28 Faro para encrencaNos EUA, ativistas de posição vendida desmascaram companhias fraudulentas

32 Para poucos e robustos Aqui e lá fora, atividade de gestão de recursos deve se tornar mais vigiada e cara

38 Antes tarde...Dez anos depois, parcerias público-privadas começam a usar o mercado de capitais

42 Sob as ordens do Planalto No governo Dilma, Eletrobras perdemetade de seu valor. E a situação pode piorar

46 Crédito de menosBancos médios fazem apostas distintas para reagir à queda dos financiamentos

Outubro 2014

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06 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

M u r a l d o L e i t o r

Marcio Verneque Soares, bancário

ESTAGFLAÇÃOO trabalho de vocês em muito tem me ajudado profissional e pessoalmente, sobretudo pela independência que de-monstram nos trabalhos, bem como por renovar alguns conceitos da economia acadêmica formal. No editorial da edição de aniversário (setembro), no entanto, gos-taria de divergir da afirmação: “O cenário de estagflação se instalou”. Tecnicamente não temos esse fenômeno, pois lhe falta o verdadeiro componente do caos, o desem-prego. No meu entendimento, precisamos interpretar o novo com a mente aberta e nos desprender de velhos conceitos que não explicam a atual dinâmica da economia e confundem os incautos.

Patrícia Freitas, conselheira da ABVCap

ESTÍMULO PARA PMESParabéns à BMF&Bovespa e à CVM pelo trabalho intenso em ampliar o acesso da população à economia real. A matéria de Bruna Maia Carrion em agosto (“Sem mi-lagre”, ed. 132) é perfeita ao mostrar que não existe milagre, mas um excelente começo. Apesar da performance em bolsa pouca atrativa das sete empresas apresentadas, não se trata de uma prerrogativa delas. O fato é que dependemos, sim, de um milagre para que nossa economia volte a crescer em bases sustentáveis. Quando isso acontecer, a mesa já estará posta. Boa sorte para todos nós e especialmente a todos os nossos pequenos grandes empresários.

NESTA DATA QUERIDA

A capital aberto recebeu felicitações por seu aniversário de 11 anos nas redes sociais. No LinkedIn, Denys Roman, da MZ, e Roberto Gonzalez, diretor do The Media Group, destacaram a importância da revista para o mercado de capitais brasileiro. José Roberto Pacheco, da Odon-toPrev, disse considerá-la leitura e referên-cia obrigatória no meio. Valter Faria, da Valor Partners, também deu os parabéns. Outras mensagens chegaram via Face-book. O veículo recebeu a qualificação de grande fonte de aprendizado por Julio Meneghini, da Deloitte, e de publicação diferenciada por Renato Chaves, da Mesa Corporate Governance.

ERRATAO cargo correto do empresário Luis Terepins, citado na seção Seletas de setembro (ed. 133), é membro do conselho de administração da Even.

SAÍDAS POSSÍVEIS

ISENTOS DE CULPADECISÃO DO TCU SOBRE PETROBRAS ENSEJA DISCUSSÃO SOBRE ATIVIDADE DO CONSELHO

AGRONEGÓCIOOFERTAS DE CRA EVOLUEM, MAS RATING E GARANTIAS AINDA SÃO ENTRAVES

ECONOMISTAS E GESTORES DE RECURSOS ANALISAM OS EFEITOS DA POLÍTICA ECONÔMICA SOBRE O MERCADO DE CAPITAISE SUGEREM CAMINHOS PARA A RETOMADA

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26 CAPITAL ABERTO Agosto 2014

E d i t o r i a l

04 CAPITAL ABERTO Setembro 2014

Marketing e circulação Roberta PalmaPublicidade Débora Manzano (11) 3775-1619  Eliani Prado (11) 3775-1623International sales Sales Multimedia, Inc. (USA) +1-407-903-5000 – [email protected] Assinaturas (11) 3775-1603 [email protected]

No ano passado, Delfim Netto cravou 2014 como o ano da tempestade perfeita para a economia brasileira. Os raios e trovoadas seriam desencadea- dos pela combinação das fragilidades já existentes com duas más notícias previstas: o rebaixamento do rating do País (que aconteceu em março, pela S&P) e a alta da taxa de juro americana, decorrente da desaceleração do programa de estímulos monetários (esta, ainda bem, foi adiada). A catás-trofe não aconteceu exatamente como imaginada, mas a economia vai mal mesmo assim: o cenário de estagflação se instalou.

Se não é perfeita para colapsar toda a conjuntura, a tempestade que cai é suficiente para, no mínimo, fazer murchar o mercado de capitais. Os ventos fortes o atingem de várias maneiras. O descontrole dos gastos públicos gera mais dependência do juro alto, que, por sua vez, ofusca os investimentos de maior risco e desencoraja a diversificação. Do lado da oferta, o risco do intervencionismo, o baixo crescimento e a falta de confiança minam o apetite do empresário para levantar recursos.

Quais as perspectivas, então, para o mercado de capitais retomar seu dinamismo? O incentivo fiscal para a listagem de pequenas e médias compa-nhias em bolsa terá algum efeito prático? Como ativar uma agenda positiva, em que empresas abram o capital e investidores busquem diversificar suas aplicações de forma responsável?

Para refletir sobre essas e outras questões, convidamos seis economistas e gestores de recursos a visualizar outros caminhos para o Brasil. As entre-vistas adornam esta edição de aniversário com pensamentos interessantes e deixam clara a angústia por mudança: se mantido o formato atual de condução da atividade econômica, afirmam, são grandes as chances de uma nuvem negra se instalar sobre o mercado de capitais.

Novo tempo — Neste setembro, ao completar seu 11o aniversário, a capital aberto estreia duas novidades em sua produção editorial. A primeira é a realização de reportagens com o apoio dos Grupos de Discus-são (fóruns em que reuniremos agentes do mercado para debater assuntos relevantes e apontar tendências). Além disso, faremos publicações diárias de conteúdo em nosso site, antecipando os temas que serão abordados na edição impressa. Confira!

Simone Azevedo

Editora executiva Simone Azevedo [email protected] Tanoue [email protected] de texto e produçãoBruno [email protected]órteresBruna Maia [email protected] Yokoi [email protected] ColaboradoresJoão Carlos de OliveiraLuciana Del CaroMariana SegalaMarianna AragãoColunistasAlexandre Di Miceli da SilveiraMarta Barcellos Ney CarvalhoPeter JancsoArticulistas desta edição Ana Paula MartinezOlavo Chinaglia Roberto Teixeira da CostaProjeto e direção de arte Beto Nejme e Marco ManciniGrau 180DiagramaçãoGrau 180 Rodrigo Auada IlustraçõesBeto NejmeEric PeleiasMarco Mancini Impressão Duograf Gráfica e EditoraCirculaçãoDPA Consultores Editoriais [email protected]: (11) 3935-5524Distribuição nacionalFernando Chinaglia Comercial e DistribuidoraTiragem desta edição 5.000 exemplares Data de fechamento26/8/2014

ANO 12 - NÚMERO 133 - SETEMBRO 2014

A Capital Aberto é uma publicação mensal da Editora Capital Aberto Ltda. Endereço Rua Wisard, 305 – sala 54 – Vila Madalena – São Paulo, SP – CEP 05434-080 Contatos: (11) 3775-1600 – fax (11) 3775-1604 [email protected]

Outros caminhos

Circulação auditada:

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Visite nosso site

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Uma das Big 5Líder no middle market20 escritórios no Brasil

Audit | Tax | Advisory

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C A P I TA L A B E R T O n @ W e b

08 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

Luiz Leonardo Cantidiano

http://bit.ly/1sWHFPySolidariedade zero A responsabilidade do admi-nistrador de companhia aberta é um dos assuntos em voga no mercado. Todos os conselhei-ros de uma empresa podem ser igualmente responsabilizados

em caso de problema? Segundo Cantidiano, a resposta é não. Ele explica que o Código Civil prevê que, em caso de atos ilícitos, a aplicação de pena

aos administradores leva em conta a conduta individual.

Por Yuki YokoiArtigos

http://bit.ly/1rs8IpEM&As: a dúvida é o Brasil Em artigo exclusivo para o site, Claudio Yamashi-ta, da Intralinks, prevê que o número de M&As no mundo crescerá até 10% em 2014. A pers-pectiva para o Brasil, no entanto, está nublada. Os investidores estão receosos com o nível de cres-cimento da economia local e a ingerência política.

http://bit.ly/1tVXyu1Imposto-surpresaO empenho da Fazenda Pública na cobrança de dívidas tributárias nunca foi tão alto. Se a intenção é louvável, nem sempre os meios utilizados para isso são ideais, principalmente quando o objetivo é preservar a segurança jurídica. Esse é o assunto do artigo es-crito pela advogada Daniella Zagari, do escritório Machado Meyer.

http://bit.ly/1ru2KEUAbaixo a censura

A charge de setembro, que teve como mote a censura do gover-no a análises elaboradas pelo Santander e pela Empiricus, fez sucesso nas redes sociais. No Linkedin da capital aberto, foram quase 1,5 mil visualizações.

http://ow.ly/BCliRBC versus CadeNa avaliação da maioria dos participantes da en-quete de setembro, é correto o Banco Central julgar fusões e aquisições entre instituições financeiras.

Roberto Teixeira da Costa

http://bit.ly/1xatP35Inspiração andina Enquanto a falta de crescimento da economia brasileira domina o noticiário, o sucesso do Peru chamou a atenção de Roberto Teixeira da Costa. O Banco Central de Reserva, autoridade monetária do país, anunciou no mês passado sua taxa de investimento em relação ao PIB: 29%, contra 16,5% no Brasil. “Políticas de estímulo à participação de capitais privados incentivaram o crescimento do país andino”, ressaltou o ex-presidente da CVM.

BlogsEliseu Martins

http://bit.ly/1vec4M1Quanto vale uma árvore? A partir de 2016, o Iasb flexibilizará a exigência de que todos os ativos biológicos sejam avaliados a valor justo. A mudança faz parte de uma longa evolução da contabilidade, como relata o professor no post “O ba- lanço das árvores”. Martins lembra que, inicialmente, todos os ativos biológicos eram registrados pelo preço de aquisição. Depois, passaram a ser contabilizados pelo valor justo, criando um problema: árvores cujos frutos são destinados à venda, como um pé de laranja, eram constan-temente reavaliadas. Agora, a partir de um movimento liderado pela Malásia, a regra vai mudar. Os ativos biológicos que produzam por mais de uma vez frutos, folhas, flores, cascas, caules e raízes — estes sim, os produtos objeto de venda — voltarão a ser contabilizados pelo custo. A valor justo, apenas os ativos efetivamente produzidos.

Raphael Martins

http://bitly/1C6l4HgNovidades no arNeste mês, o advogado Raphael Martins começa a assinar um blog no site da capital aberto sobre relações socie-tárias. O texto de estreia aborda a arbitragem no mercado de capitais.

61% 39%

Foto: divulgação

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N @ W e b

Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 09

Por Bruna Maia Carrion

http://bit.ly/1t3zbq9Informação tendenciosa?A Laep ganhou um verbete para lá de completo na Wikipédia. O tópico foi criado em 2 de setembro e, até o dia 22, registrava cerca de 500 atualizações — a maioria feita por um só usuário, não identificado. Quem produziu o conteúdo parece ter uma intenção clara: divulgar o andamento da ação civil pública que CVM e Ministério Público Federal (MPF) mo-vem contra os antigos administradores da empresa. As informações estavam tão atualizadas que infor-mavam sobre uma audiência de conciliação prevista para 2 de outubro. Chama a atenção, no entanto, o fato de o verbete exibir uma lista defasada dos administradores da companhia. Estão lá os nomes de Marcus Elias e Luiz Cesar Fernandes, dois ex-presidentes da Laep. Eles constam da lista de acusados pelo MPF, mas já deixaram o comando da empresa.

http://bit.ly/ZgXDNwQuem avisa amigo é Quando Nouriel Roubini faz uma pre-visão catastrófica, as pessoas param

para ouvir. Chegou a ser ridicularizado no começo dos anos 2000: enquanto todos esbanjavam otimismo, ele con-siderava os preços dos imóveis altos demais. Mas eis que veio 2008 e Rou-bini foi reconhecido como o homem que profetizou o inferno. Agora, ele

vem se empenhando em expor, via Twitter, os problemas da nova febre do ouro e do bitcoin. “Melhor esquema de pirâmide: compre bi-tcoin com ouro e ouro com bitcoin”, ironizou.

http://bit.ly/1vo3jjDRejeitadosO fundo de pensão dos funcionários públicos da Califórnia (CalPERS) é o maior investidor institucional do mundo. São US$ 300 bilhões em ativos sob gestão. Quando um colosso desses toma uma decisão, a reação nas redes sociais é grande, ainda que mercado de capitais e gestão de recursos não sejam assuntos exatamente populares internet. Pois o CalPERS anunciou em setembro, inclusive em sua conta do Twitter, que estava retirando US$ 4 bi-lhões aplicados em fundos de hedge. A notícia agradou al-guns: “Adeus, gestores medíocres”, comemo-rou um usuá-rio. Embora a fundação ame-ricana associe a decisão ao intui-to de diminuir a complexidade e os custos de seu portfólio, analistas acreditam que o motivo seja o baixo retorno desse tipo de veículo.

Silêncio quebradoEike Batista possuía R$ 30 bilhões há dois anos. Agora, ele contou à Folha de S. Paulo que, consideradas as dívidas, tem apenas R$ 1 bilhão — negativos. Disse também, em entrevista, que voltar à classe média “era um baque gigantesco”. Feito o desabafo, o em-presário e percebeu que sua frase havia pegado mal e resolveu, depois de quase 14 meses sem dar um pio no Twitter, se manifestar no microblog para esclarecer eventuais mal-entendidos. O resultado é que Eike, mesmo pobre, continua sendo o (ex-) CEO mais popular do Brasil. Foram 474 retuítes da primeira frase, 351 da segunda e 267 da terceira, além de centenas de respostas, a maioria delas bem-humorada. “Não fique tanto tempo sem tuitar. Aqui na classe média temos o costume de atualizar essa rede social algumas vezes por dia”, brincou uma usuária.

Apoio a SchwartsmanEconomistas não deixaram passar em branco o episódio entre o Banco Central (BC) e um ex-diretor seu, o economista Alexandre Schwartsman. Em setembro, o órgão registrou uma queixa-crime contra ele por difamação, devido a afirmações que considerou ofensivas. Schwartsman disse, no início do ano, que o BC tinha uma gestão “temerá-ria” e fazia “um trabalho porco” de controle à inflação. No Twitter, Elena Landau criticou a atitude do BC: “Esse processo é muito ridículo”, afirmou. Gustavo Franco, que já esteve à frente do órgão, também se manifestou. “Este não é o Banco Central que eu conheci”, ressaltou no Facebook. Pressionado, o BC recuou e desistiu do processo.

Acompanhe a seção Na Web no site www.capitalaberto.com.br

http://bit.ly/1pi5Re8

http://bit.ly/1Cupjwy

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R e l e v o

10 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

L a u r e n c e G o m e s

Entre as companhias abertas do setor de vestuário, a Lojas Renner está em situação privilegiada. Enquanto a maioria freia os in-vestimentos diante do ambiente econômico pouco amigável ao aumento do consumo, a varejista gaúcha acelera. Investe não só na abertura de lojas, mas em ações que farão sua competitividade crescer. “Em 2021, quando a Lojas Renner tiver o dobro de tamanho, estará muito mais ágil e eficiente”, garante Laurence Gomes, diretor financeiro e de relações com investidores da companhia, nesta entrevista à Relevo. O mercado, ao que tudo indica, confia em suas palavras. No ano até 25 de setembro, os papéis da Lojas Renner valorizavam 16,31%, enquanto os da Hering caíam 13,03%, os da Marisa, 12,24%, e os da Guararapes, 1,37%.

e governança elevada — coisas que, acredito, temos conseguido entregar nos últimos anos. Também é preciso levar em conta que a primeira onda de consumo, de imóveis, carros e outros bens duráveis, já passou. Com isso, so-bra espaço no bolso do brasileiro para gastos com a moda, que envolve itens de preço menor.”

Concorrência“O Brasil não é fácil para iniciantes. Os gargalos logísticos e burocráticos são relevantes. Além disso, os concor-rentes estrangeiros precisam arcar com os custos de importação elevados. Há, portanto, algumas barreiras de entrada relevantes no mercado de vestuário nacional. Estamos, obviamente, acom-panhando os movimentos da concor-rência, mas é bom ressaltar que atuamos num mercado grande, em que ainda há bastante espaço para consolidação. Hoje, aproximadamente 40% do setor de vestuário trabalha na informalidade. Atuar nessa condição está mais difícil, devido a controles e cruzamentos de dados de informações financeiras pela Receita Federal.”

Crescimento“Nossa estratégia é crescer organica-mente, não por aquisições. Até 2021, planejamos ter 408 Lojas Renner aber-tas e 105 da Camicado [no fim de 2013, eram 217 e 43, respectivamente]. Também nos preparamos para abrir, no mesmo período, 300 lojas da Youcom, startup voltada à moda jovem [hoje, são 20 uni-dades]. Essa operação ainda está em seus momentos iniciais. Os grandes grupos internacionais que são referência para a Youcom levaram de três a cinco anos para estabilizar sua marca.”

“O mantra é simplificar”

Por Luciana Tanoue

Eliminando excessos“O apelo das coleções, aliado à eficiên-

cia na operação das lojas, garantiu bons resultados para a Renner no primeiro semestre [a receita com vendas e o lucro líquido subiram, respectivamente, 15% e 41,6% em relação ao mesmo período do ano passado]. Nossa cultura de austeri-dade também tem nos favorecido. Valo-rizamos a disciplina e seguimos à risca o orçamento. Em 2013, prevendo um ritmo mais moderado de vendas, im-plementamos uma série de iniciativas, com o intuito de revisar as atividades da companhia e identificar processos que poderiam ser melhorados ou elimina-dos. O mantra é simplificar.”

Pioneirismo“Além de investir no aumento do número de lojas, estamos aportando recursos expressivos em infraestrutura logística. A Lojas Renner foi pioneira na implementação de um sistema cha-mado ‘push and pull’, que possibilita a alocação mais precisa de produtos nas lojas. O objetivo é ter o produto certo na loja certa e na hora certa. Essa tecnologia já está funcionando no centro de distribuição do Rio de Ja-neiro e será estendida para dois outros em construção.”

Seletividade“Mesmo num cenário de taxa de cres-cimento menor no varejo, temos boas perspectivas. O problema principal pelo qual o Brasil passa hoje é a redução da confiança. Num momento como esse, há uma preferência dos consumidores e fornecedores por marcas sólidas. O investidor também fica mais seleti-vo e busca players com boa execução do negócio, resultados consistentes

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S e l e t a s

12 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

Por Yuki Yokoi

O banco Brasil Plural assumiu as carteiras de gestão de recursos de ter-ceiros do Espírito Santo Investment Bank Brasil (Besi Brasil) no fim do mês passado. Com a cessão dos portfólios, de R$ 1,5 bilhão, os portugueses receberão uma parcela dos resultados gerados. O percentual e o prazo de validade do acordo não foram divulgados.

A delicada situação financeira da instituição portuguesa veio à tona durante o processo de fusão entre Oi e Portugal Telecom. Em julho, a tele europeia admitiu que levaria calote no empréstimo de quase € 900 milhões concedido à RioForte, controlada pelo grupo Espírito Santo.

O Brasil Plural espera o aval do Cade para finalizar o negócio. Em março, após a compra da Geração Futuro, o patrimônio sob gestão do banco já havia alcançado R$ 18 bilhões.

Brasil Plural assume carteiras do BES no Brasil

A BM&FBovespa anunciou, no mês passado, sua política de preços para 2015. A partir de janeiro, companhias dispostas a fazer ofertas, sejam elas para colocar novos papéis no mercado, sejam para retirá-los da bolsa, gastarão mais.

Uma oferta pública de distribuição de ações começará com uma despe-sa de R$ 50 mil, a título de análise da operação. O serviço inclui a verificação de documentos e orientações sobre o negócio. A partir daí, os gastos depen-derão do conjunto de taxas em que a oferta se inserir. São três as possibili-dades, de acordo com a sofisticação. O pacote mais barato é o simplificado, que vai abrigar emissões destinadas ao Bovespa Mais e as realizadas por meio da Instrução 476. Neste caso, o custo mínimo será de R$ 95 mil. Já as ofertas do pacote padrão custarão a partir de

BM&FBovespa passa a cobrar taxas em ofertas de ações

R$ 208 mil; e as do customizado, R$ 550 mil. Se o sistema de cobrança já estives-se em vigor, operações como a da Bio-sev e da Oi entrariam no último grupo. A primeira, porque consistia na venda de ações combinada com opções de venda; a segunda, pelo elevado número de intermediários envolvidos.

Sair da BM&FBovespa também fica-rá mais caro. A Bolsa passará a deman-dar uma taxa de R$ 200 mil pela análise de ofertas públicas de aquisição de ações (OPAs), além do 0,1% sobre o va-lor final liquidado que já cobra. A rea- lização de OPA é prevista pela regu-lamentação em diversas hipóteses — como fechamento de capital e aliena-ção de controle —, mas também pela própria Bolsa, em especial quando as companhias deixam os segmentos de listagem com governança diferenciada.

Ilustração: Rodrigo Auada

Ilustração: Eric Peleias

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Ofertas de ações e debêntures conversíveis agora podem ocorrer sem registro prévio na CVM, desde que destinadas a um público restrito. A novidade é resultado da edição, em setembro, da Instrução 551 do regulador, que alterou a 476, de 2009. Por viabilizar uma oferta pública de ações mais ágil e menos burocrática, a expectativa é que o normativo ajude a retomada das emissões. Este ano, nenhuma companhia se aventurou a fazer IPO.

A versão final da regra traz poucas mudanças em relação àquela levada a consulta pública. Preservou princípios já aplicados à emissão de títulos de dívida: continua proibida a participação de investidores que não sejam qualificados e a divulgação ampla da oferta. É possível procurar, ao todo, 75 investidores, mas somente 50 podem aderir ao negócio — estrangeiros ficam de fora desse limite, uma vez que a CVM não pode restringir a adesão a ofertas feitas fora de sua jurisdição.

Todas as companhias registradas na categoria A estarão aptas a se beneficiar da norma. Aquelas que realizarem um IPO com esforços restritos terão suas ações limitadas à negociação entre investidores qualificados nos primeiros 18 meses, contados a partir da data de entrada no pregão. Caso a oferta seja feita por uma pré-operacional, os papéis só estarão livres para ser negociados quando, além de decor-rido o ano e meio de carência, a companhia tiver iniciado as operações. De acordo com Flavia Mouta, superintendente de desenvolvimento de mercado da CVM, só “será considerada operacional a companhia que apresentar uma demonstração financeira anual com receita resultante de suas atividades”.

Empresas com ações já listadas em bolsa também poderão fazer ofertas subsequentes (os chamados follow-ons) pela nova 476. Como contam com papéis no mercado secundá-rio, não terão limite de negociação. A oferta poderá ocorrer com a exclusão do direito de preferência ou com um prazo

para exercê-lo em até cin-co dias. De todo modo, deverá ser garantido o direito de prioridade a todos os acionistas pré-existentes. Os an-tigos acionistas não se-rão incluídos no grupo de até 50 investidores que podem com-prar ações, desde que adquiram apenas o sufi-ciente para não sofrerem diluição.

Com o intuito de aumentar a fiscalização sobre as ofertas com esforços restritos, a CVM também passou a exigir dos emissores (sejam de ações, sejam de títulos de dívida) que avisem a autarquia quando iniciarem uma distribuição — originalmente, a norma demandava apenas a comunicação do encerramento da oferta. O documento deverá conter dados básicos, como os nomes do emissor e do intermediário e as principais características do valor mobiliário ofertado. A mudança ajudará o regulador a rastrear quem não cumprir as exigências.

Outra novidade foi a entrada do certificado de operações estruturadas (COE) na norma. Paralelamente, a CVM con-tinua trabalhando numa instrução que regulamentará os certificados e abrirá as portas desse mercado para os inter-mediários. Até agora, devido à ausência de regras que estipu-lem, por exemplo, quais informações devem ser fornecidas ao investidor, os COEs são emitidos apenas em transações bilaterais — aquelas em que o banco emissor tem acesso direto ao comprador.

A Inepar ga-nhou um novo acionista rele-vante no mês passado. Em 9 de setembro, a corretora Con-córdia anun-

ciou que seus fundos passaram a deter 5,11% das ações preferenciais e 3,61% das ordinárias da companhia.

A notícia chegou poucas semanas depois de a Inepar entrar com um pe-

de negociação com seus credores”, justifica. O baixo valor de mercado da Inepar — atualmente, em torno de R$ 45 milhões — é outro atrativo; qual-quer melhoria da condição atual pode render uma vultosa valorização.

O mesmo raciocínio explica por que os fundos da Concórdia mantêm em carteira ações das cambaleantes empre-sas do grupo EBX. Uma delas é a OSX, projeto de construção naval que entrou com pedido de recuperação judicial em novembro passado.

dido de recuperação judicial. Embora esse tipo de situação explicite fragili-dades na situação financeira de uma empresa, ela também pode aguçar o apetite de investidores dispostos a correr riscos.

Marcelo dos Anjos, operador da Concórdia, relata que os fundos da corretora já tinham ações da Inepar em carteira, mas as compras foram acentuadas após a notícia da recupe-ração judicial. “Agora, a companhia ganhará tempo e melhores condições

CVM inclui ações no rol de ofertas com esforços restritos

Concórdia vira acionista relevante da Inepar

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S e l e t a s

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Eike Batista pode ter se acostumado a re-ceber notícias ruins desde que suas principais empresas começaram a enfrentar problemas, mas o mês passado foi particularmente con-turbado para ele. No dia 13 de setembro, o Ministério Público Federal (MPF) do Rio de Janeiro denunciou o empresário pelos crimes de manipulação de mer-cado e insider trading na OGX — atualmente em recuperação judicial e rebatizada de OGPar.

Para garantir que o investidor seja indenizado, o MPF decretou o bloqueio dos bens de Eike até o valor de R$ 1,5 bilhão. “Tal quantia equivale ao prejuízo suportado pelo mercado de ações em consequência da conduta criminosa do denunciado”, destacou o procurador Orlando Monteiro Espíndola da Cunha.

Dois dias depois, em 15 de setembro, foi a vez do MPF de São Paulo denunciar Eike. Desta vez, pelo uso de informações privilegiadas na OSX. Ele arrecadou R$ 33,7 milhões com a venda de ações da companhia, dias antes de anunciar ao mercado que a situação financeira do estaleiro exigiria uma revisão de seu plano de negócios, sobretudo pela venda de ativos e pela redução dos investimentos.

Justiças do Rio e de São Paulo estão atrás de Eike Batista

O clima na Usiminas anda tenso. Em 26 de setembro, a siderúrgica comunicou a demissão de três de seus principais executivos: Julián Eguren, diretor-presidente; Paolo Bassetti, diretor vice--presidente de subsidiárias; e Marcelo Chara, diretor vice-presidente industrial. A decisão foi tomada na reunião do conselho de administração realizada no dia anterior e mostrou animosidade entre os dois principais grupos que formam o bloco de controle da siderúrgica: o NSSMC, co-mandado pelos japoneses da Nippon Steel; e os argentinos da Ternium e da Tenaris, pertencentes ao grupo Techint.

O racha ficou evidente após um conselheiro da Usiminas, indicado pela Nippon, denunciar os três executivos por irregularidades na remu-neração. Investigações internas apontam que eles teriam recebido benefícios não previstos no pacote de remuneração aprovado anualmente pelo conselho. Os diretores haviam sido indica-dos pelos argentinos.

A questão foi levada à reunião do board, composto de dez membros. Votaram a favor da destituição três conselheiros indicados pela Nippon e dois representantes dos minoritários. Os cinco conselheiros da cota da Ternium foram contrários à proposta. O voto de minerva coube ao chairman Paulo Penido Marques: alinhado aos japoneses que o recomendaram para o cargo, ele votou a favor do desligamento dos executivos.

A demissão gerou um burburinho — a Nippon estaria querendo minar a influência da Ternium na companhia. O duelo, agora, será para fazer valer o acordo de acionistas. O documento prevê que os integrantes do bloco de controle votem em consenso, a partir de uma reunião previamente realizada. Como na demissão dos executivos não houve esse acerto, a Ternium quer provar que a Nippon violou o trato. Temporariamente, a Usiminas será comandada pelo diretor Rômel Erwin de Souza.

Demissões na Usiminas revelam racha no bloco de controle

BC ouvirá auditores de bancos em regime especial

No dia 9 de setembro, o Banco Central (BC) publicou a Portaria 82.265, que regula o funcionamento das comissões de inquérito vol-tadas a problemas em instituições financeiras que foram à bancarrota. A mudança tende a reduzir a insegurança jurídica das firmas de auditoria.

A investigação é disparada quando se decretam os regimes de intervenção, liquidação extrajudicial ou admi-nistração especial temporária. Auditor, controladores e administradores de bancos sempre foram o foco da aná-lise. A gora, o BC passará a ouvir o que os auditores das instituições investigadas têm a dizer antes de concluir o inquérito, caso haja indício de negligência e imperícia na elaboração das demonstrações financeiras.

Até então, o BC não era obrigado a seguir esse protocolo, o que aumentava o risco de as auditorias serem listadas no relatório final que a autoridade monetária entrega ao Ministério Público em casos problemáticos. Uma vez citadas, elas ficam sujeitas, inclusive, a ações de bloqueio de bens. A medida visa resguardar recursos que sirvam para ressarcir os credores dos bancos.

Em julho, a KPMG teve seus bens brasileiros bloqueados devido a problemas detectados no BVA. A firma realizava a auditoria do banco até junho de 2013, quando a instituição foi liquidada.

Acompanhe a seção Seletas no site www.capitalaberto.com.br

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R e l a ç õ e s s o c i e t á r i a s

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Venda disfarçada

Controlador da Forjas Taurus é suspeito de mais uma artimanha: usar um aumento de capital para escapar de OPA

No dia 20 de agosto, foi homologado o mais recente aumento de capital da Forjas Taurus. A fabricante de armas e equipa-mentos de segurança vendeu novas ações e conseguiu levantar R$ 67 milhões. Dinheiro à vista, injetado diretamente no cai-xa. Nada mal para uma companhia que concentra resultados ruins. Seu prejuízo somou R$ 80 milhões no ano passado e já acumulou R$ 57 milhões nos seis primeiros meses de 2014. Ao fim de 2013, o endividamento alcançou R$ 819 milhões, dos

quais 40% vencem no curto prazo. A bolada obtida na capitalização, no entanto, pode render à empresa uma série de problemas. Há diversos indícios de que Luis Fernando Estima, dono da Taurus desde a década de 1970, usou a capitalização como disfarce para alienar o controle da companhia.

A investidora do aumento de capital foi a Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC), que com a operação alcançou 52,5% do capital votante e o posto de acionista controladora. Do ponto de vista econômico, a união fez sentido: a maior fabricante de munições do País tornou-se sócia da líder em produção de armas. Na forma, o aumento de capital também foi perfeito. Mas sua essência duvidosa levou a operação ao escrutínio da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e do Conselho Administrativo da Defesa Econômica (Cade).

Por Yuki Yokoi

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Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 17

Ilustração: Marco Mancini/Grau180.com

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R e l a ç õ e s s o c i e t á r i a s

18 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

Alvo certoA CBC é uma sociedade anônima de capital fechado cujo maior acionista, com 89,2% do capital votante, é a CBC Ammo LLC. Está sediada no estado americano de Delaware e, embora não haja informações públicas a confirmar a identidade de seu dono, o mercado dá como certo que o empreendimento é comandado por Daniel Birmann — seu filho Bernardo aparece como proprietá-rio direto, com 9,2% da CBC. Birmann ficou conhecido por seu arrojo na aquisição de empresas problemáticas. Acumula condenações na CVM que vão de irregularidades em transações com partes relacionadas a falta de dever de lealdade. Foi inabilitado para o cargo de administrador de companhia aberta duas vezes pelo regulador: uma pelo período de dois anos, em 2005, e outra por cinco anos, em 2009. Nos últimos tempos, foi visto na Taurus com alguma frequência, o que rendeu boatos de que as duas empresas se juntariam.

Em 14 de abril deste ano, Estima propôs o aumento de capital aos con-selheiros. O board não referendou a ideia. Os representantes indicados pelos minoritários, detentores de quatro dos sete assentos do board, rejeitaram a pro-posta. Na época, o então controlador, com 16% do capital social (44% das ações ordinárias), enfrentava a pior fase de um entrave truculento com seus investido-res — mais precisamente a Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, a gestora carioca Argucia e Joaquim Baião, ex-dono da corretora Geração Futuro. Eles haviam colocado em curso uma devassa nas contas da companhia e afirmavam estar prestes a demonstrar que o empresário a usava em benefício próprio.

Detentor da maior fatia individual de ações, Estima decidiu ignorar a opi-nião do conselho. Chamou sozinho a assembleia (o benefício é assegurado a qualquer acionista com pelo menos 5% do capital social), argumentando que a

operação capitalizaria a companhia e re-duziria suas dívidas. Já detentor de 2,5% das ações ordinárias e 0,2% das prefe-renciais na época, Birmann compareceu pessoalmente ao encontro realizado no dia 29 de abril. Votou a favor.

No dia 11 de maio, a CBC divulgou fato relevante e notificou o Cade. Afirmou que pretendia adquirir, na bolsa de valores, 18% do capital social da Taurus e também subscrever ações no aumento de capital recém-aprovado. Dada a baixa liquidez dos papéis da Taurus, a compra em pregão de fatia tão relevante não seria simples. Em 2013, as ações preferenciais, as mais líquidas, movimentaram em média R$ 539 mil por pregão, segundo a Economática; as ordinárias, concentradas na mão do controlador, apenas R$ 32 mil ao dia. A despeito dessa dificuldade, para sur-presa geral Birmann acumulou 16,8% do capital social da Taurus (15,6% em ações ordinárias) até a data da subscri-ção. As ações, ao que tudo indica, foram adquiridas de Estima. Entre os dias 23 e 27 de maio, o empresário se desfez de mais de 5 milhões de ações ordinárias em bolsa, que representavam 10,7% do capital votante à época.

De posse dessa fatia do capital, Birmann decidiu subscrever as ações proporcionalmente. O direito de pre-ferência é garantido a todos os acio-nistas, mas a data de corte do bene-fício é determinada pela companhia. O mercado tradicionalmente adota como referência o dia em que a opera-ção foi aprovada (na assembleia geral ou na reunião do conselho de adminis-tração), para evitar que atos posteriores à deliberação alterem a subscrição. Na Taurus, porém, o objetivo era justa-mente esse. Prevaleceu a data de 27 de maio, véspera da subscrição.

Insatisfeitos com os rumos da Tau-rus, os minoritários ficaram de fora e se deixaram diluir. A Previ, especifica-mente, estava impedida de adquirir os papéis: dona de 26,8% do capital antes

da operação, a fundação de previdência opera acima do limite de alocação em ativos de renda variável e não pode com-prar mais ações. Ao fim da capitalização, ficou com 19,4% do capital da Taurus (e apenas 7,3% em ONs). Estima, por sua vez, apesar de possuir 12,8% do capital (37,2% das ordinárias) às vésperas da subscrição e de ter, ele próprio, sugerido a operação, não comprou todas as ações a que tinha direito — sua participação passou a 12,1% do capital (23,2% em ONs). A combinação do apetite voraz de Birmann com a baixa adesão dos minoritários e o empurrão de Estima fez com que a CBC abocanhasse mais da metade do capital votante da fabricante de armas.

Outra ajuda dada pelo empresário foi o preço de subscrição das ações, de R$ 1,38. O valor foi calculado com base na cotação das PNs no pregão de 9 de abril, apesar de o aumento de capital ter sido feito, quase que integralmente, por meio de ações ordinárias. Levando--se em conta a média das cotações nos 30 pregões anteriores, o valor se mostra ainda mais benevolente: embute um deságio de 31,78%.

Caminho livreA denúncia dos minoritários é que toda essa articulação tinha um objetivo claro: transferir o controle da Taurus sem disparar uma oferta pública de aquisição de ações (OPA). Se optasse por uma venda tradicional de controle, Estima e Birmann correriam o risco de ter de computar na transação os gastos com uma OPA sob os moldes previs-tos no artigo 254-A da Lei das S.As. O dispositivo assegura aos minoritários o direito de vender suas ações por, no mínimo, 80% do valor pago pelos papéis do controlador — o chamado tag along. Embora não possuísse a maioria do ca-pital votante, Estima sempre exerceu o comando através da soma de duas fatias de ações: uma em seu nome e outra sob o chapéu da Estimapar, veículo de

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investimento do qual detém 99% do capital. Prova disso é que, em conjunto, o empresário e a Estimapar se autode-nominavam “veículo de controle” no estatuto social.

Com o aumento de capital, Birmann e Estima livraram-se ainda de outros dois ônus. O primeiro escapou de uma poison pill estabelecida pelo estatuto da fabricante de armas. Ela exige a efe-tivação de uma oferta caso um acionista adquira pelo menos 20% de qualquer uma das classes de ações — exceto nos casos em que essa proporção seja alcançada por meio de um aumento de capital. “Não faria sentido penalizar o investidor que se propõe a colocar mais recursos na companhia com a realiza-ção de uma oferta”, explica a advogada Eliana Chimenti, sócia do escritório Machado Meyer.

Estima, por sua vez, se desvencilhou de cumprir o artigo 52 do estatuto social

da Taurus, que prevê a conversão de to-das as ações preferenciais em ordinárias caso a participação do empresário caia abaixo de 35% das ONs. O dispositivo foi incluído em 2011, quando a companhia migrou do ambiente tradicional para o Nível 2 da BM&FBovespa. Na época, minoritários liderados pela Previ acei-taram incorporar R$ 165 milhões em dívidas da Polimetal, holding que con-trolava a Taurus, em troca de melhores regras de governança e de uma diluição do controlador — a participação de Es-tima caiu de 94,1% das ordinárias para 44%. A fim de evitar que o empresário transferisse as dívidas da Polimetal e depois vendesse sua participação, os minoritários criaram a regra da conver-são. Só que esse dispositivo, assim como a pílula de veneno fixada em 20%, não é disparado se a alteração da participa-ção acionária for consequência de um aumento de capital.

Apesar dos indícios de venda disfar-çada do controle, não será fácil para os minoritários da Taurus provarem que ela aconteceu. A jurisprudência da CVM consagrou o entendimento de que uma alienação só se caracteriza quando é dispendiosa. E não existe nenhuma evidência concreta de que Estima te-nha, por exemplo, transferido onero-samente seus direitos de subscrição — o artigo 171 da Lei das S.As. concede a qualquer acionista a possibilidade de ceder o benefício, mas não há regras que o obriguem a dar transparência desse tipo de negociação. Os R$ 7,5 milhões arrecadados por Estima com a venda de suas ações, pouco antes do aumento de capital, tampouco serviriam como prova. Ainda que a CBC tenha sido a compradora de quase toda a monta, a negociação se deu na bolsa de valo-res. A rigor, qualquer acionista poderia ter interferido e arrematado os papéis à venda.

Na jurisprudência, há um episódio antigo em que um aumento de capi-tal pode ter sido usado para disfarçar

Estima livrou-se de

cumprir um artigo do

estatuto social que

prevê a conversão de

todas as preferenciais

em ordinárias caso

sua participação seja

reduzida a menos de

35% das ONs

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alienação de controle. Em setembro de 1985, o dono da madeireira Manasa cedeu gratuitamente seus direitos de preferência num aumento de capital e permitiu, dessa forma, a ascensão de um novo bloco de controle. Os inves-tidores teriam ficado sem a OPA não fosse por um detalhe: após a subscrição, o antigo dono, que remanesceu como minoritário, vendeu sua fatia aos novos proprietários abocanhando um prêmio de controle. O caso foi parar na CVM. Quase três anos depois da transação, a Manasa foi obrigada a concretizar uma OPA.

ImpedidoPara frear as artimanhas que assolam a Taurus, a CVM fragmentou seus esforços de investigação em três pro-cessos. No SP 2014-280, iniciado após reclamação da Previ, apura se o voto de Estima na assembleia de 27 de junho foi abusivo. Na ocasião, os acionistas da Taurus foram convocados para avaliar as recomendações de um comitê espe-cial. Criado em abril, o grupo tinha o objetivo de estudar possíveis medidas diante dos sucessivos desmandos de Estima. Entre as propostas colocadas em votação pelo comitê estava a aber-tura de uma ação de responsabilidade civil contra o empresário e os demais conselheiros, além da aprovação de contas dos administradores.

De acordo com o artigo 115 da Lei das S.As., Estima não poderia votar por dois motivos: primeiro, porque era o alvo da ação civil; depois, por estar aprovando as próprias contas. Mas a CBC, que a essa altura já detinha mais da metade do capital votante, poderia, num acordo de cavalheiros, livrá-lo do processo. Poucos dias antes da assembleia, entretanto, o Cade suspendeu os direitos políticos da CBC. A lei de concorrência em vigor prevê que atos de concentração entre empresas verticalmente relacionadas, como é o caso, sejam previamente aprovados pelo órgão antitruste — o que não tinha ocorrido, uma vez que a ascensão da CBC foi gerada por meio de sucessivas operações na bolsa.

Restou a Estima, no posto de presi-dente da assembleia, ignorar qualquer hipótese de impedimento de voto e participar da deliberação. Ele ainda detinha, na época, 14% das ações ordi-nárias e a Estimapar, outros 21,2%— o suficiente para vencer os minoritários, cuja participação se concentrava em ações preferenciais. Em setembro, a CVM informou a Taurus de que o voto de Estima havia sido irregular. Não cabe ao regulador, porém, anular a assem-bleia. Essa tarefa é do Judiciário, caso seja constatado prejuízo dos acionistas.

Paralelamente, a CVM conduz o pro-cesso RJ 2013-11746, que apura indícios de fraude contábil. De todas as investi-gações em curso, esta é a mais próxima de um termo de acusação. Em 2012, a Taurus vendeu a subsidiária Taurus Máquinas por R$ 115,3 milhões, numa transação que envolvia o perdão das dí-vidas da Wotan, arrendatária das insta-lações da empresa controlada. Embora a venda tenha sido registrada no balanço, um ano depois o valor foi reduzido à metade, sob a justificativa de que a com-pradora, a SüdMetal, não tinha condi-ções financeiras para honrar o trato. O desarranjo reverteu o resultado anual da companhia, transformando o lucro de R$ 41 milhões em 2012 num prejuí- zo de R$ 117 milhões. As outras duas envolvidas saíram bem do negócio: a SüdMetal ganhou um desconto de 50%; a Wotan permaneceu com suas dívidas quitadas. Os minoritários, no entanto, acreditaram em um ganho com a venda que nunca se concretizou. Não se sabe quem é o dono da Wotan, mas a suspeita é de que seja o próprio Estima.

O desenrolar dessas duas investiga-ções pode subsidiar a CVM no processo 2014-4772, o mais incipiente de todos. Nele, o regulador pretende analisar o uso do aumento de capital para venda do controle. O mercado aguarda tam-bém o parecer do Cade nesse caso — o órgão antitruste precisa dar seu aval para que a CBC assuma o controle majoritário. Procurados, Forjas Taurus, Luis Estima, CBC e Daniel Birmann não concederam entrevista.

Apesar dos indícios

de venda disfarçada

do controle, não

será fácil para os

minoritários da

Taurus provarem

que ela aconteceu.

De acordo com

a jurisprudência

da CVM, uma

alienação só se

caracteriza quando é

dispendiosa. E não

há nenhuma

evidência concreta

de que Estima

tenha transferido

onerosamente

seus direitos

de subscrição

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Em meio a um cenário econômico repleto de incerte-zas — o que se acentua em momento pré-eleitoral —, a Co-missão de Valores Mobiliários (CVM) tem lançado mão de diversas medidas com o objetivo de tornar o merca-do de capitais um meio de fomento às pequenas e médias empresas (PMEs) e um ambiente seguro de negociações.

Com o propósito de atender a esses objetivos, a au-tarquia editou, no dia 25 de setembro, a Instrução 551. Como mais um passo na importante estruturação de um mercado de acesso, a norma incluiu no rol de valores mo-biliários passíveis de ofertas públicas com esforços res-tritos, entre outros: 1. ações; 2. debêntures conversíveis em ações; 3. bônus de subscrição, mesmo que atribuídos como vantagem adicional aos subscritores de debêntu-res; e 4. debêntures permutáveis por ações emitidas por emissor registrado na categoria A.

Ao prever a emissão de títulos de propriedade e de tí-tulos conversíveis ou permutáveis em títulos dessa natu-reza, mediante ofertas públicas com esforços restritos, a CVM viabiliza um mecanismo de captação de recursos menos custoso e torna o mercado de capitais uma fonte de financiamento mais atrativa às PMEs.

As regras previstas pela Instrução 551 estão em li-nha com medidas adotadas recentemente pela autarquia com o propósito de estimular a participação das PMEs no mercado de capitais brasileiro e a realização de inves-timentos por agentes de mercado em empresas com es-sas características, por meio de veículos como o fundo de ações – mercado de acesso. Os efeitos dessas medi-das, contudo, ainda não puderam ser sentidos na prática.

Além das medidas de fomento ao mercado de acesso, outro aspecto relevante da 551 é o estabelecimento de no-vas regras de proteção ao investidor de valores mobiliá-rios emitidos por empresas pré-operacionais. Ainda sob a ressaca do maremoto provocado no mercado de capi-tais brasileiro pelas empresas do grupo EBX, a CVM tem direcionado seus esforços para evitar a reedição de epi-sódios marcados pela perda repentina do valor de ações.

Como ponto de partida das medidas para evitar ou-tras crises como essa, a nova instrução define empresa pré-operacional como aquela que não tenha apresenta-do receita proveniente de suas operações, em demons-tração financeira anual ou em demonstração financeira anual consolidada, elaborada de acordo com as normas da CVM e auditada por auditor independente registra-do na autarquia.

A Instrução 551 determina que ações, bônus de subs-crição, debêntures conversíveis ou permutáveis por ações e certificados de depósito desses valores mobiliários emi-tidos por companhia em fase pré-operacional: 1. tenham sua primeira oferta pública distribuída exclusivamente para investidores qualificados; e 2. sejam, no período de 18 meses contados do encerramen-to da oferta pública inicial, negocia-dos exclusivamente entre investido-res qualificados.

Também, as ofertas públicas com esforços restritos que tiverem por objeto ações de emissores em fase pré-operacional terão sua ne-gociação restrita a investidores qua-lificados até que, cumulativamente: 1. a companhia se torne operacio-nal; 2. tenham transcorrido 18 me-ses do encerramento da oferta; e 3. tenham passado 18 meses da admissão à negociação das ações em bolsa.

A Instrução 551 tratou de temas extremamente relevantes para o de-senvolvimento do mercado de capi-tais brasileiro. De todo modo, não se pode afirmar com certeza que as alterações introduzidas surtirão os efeitos desejados. Isso somente o tempo e o mercado dirão.

Lucas Akel Filgueiras ([email protected]) e Pedro Henrique

Benradt ([email protected]) são associados do Lehmann, Warde &

Monteiro de Castro Advogados

O boletim REGULAÇÃO é um informativo bimestral produzido por Lehmann, Warde & Monteiro de Castro Advogados (www.lwmc.com.br) e veiculado com exclusividade pela CAPITAL ABERTO. As opiniões aqui expressas são as do escritório e não, necessariamente, as da revista.

O que a nova instrução

nos diz sobre os rumos

pretendidos pela CVM para o mercado de

capitais?

O que muda com a 551

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Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 23

Avanço de acionistas com posições vendidas impõe mudanças a profissionais de RI e reguladores. Falta de dados é motivo de alerta

Poucas situações incomodam tanto os dirigentes de uma companhia aberta quanto a constatação de que certos investidores esperam a queda das ações. Se essa expectativa vier acompanhada de um aumento do aluguel dos papéis, o desconforto torna-se ainda maior. Porém, diante do desen-volvimento do mercado brasileiro de empréstimo de ações, as empresas e, mais especificamente, os

profissionais de relações com investidores (RI) terão que aprender a lidar com os short sellers — termo usado, em inglês, para designar o investidor de posição vendida. Nessas operações, o aplicador aluga uma ação e a vende em bolsa, apostando que irá recomprar o papel posteriormente por um valor mais baixo para devolvê-lo a quem o alugou, lucrando com a diferença de preços.

Os aluguéis de ações vêm crescendo paulatinamente: a média anual dos contratos em aberto no Banco de Títulos CBLC (BTC), que era de R$ 12,7 bilhões em 2009, cresceu 61% em 2010, 47% em 2011 e 5,9% em 2012. No ano passado, eles ganharam novo impulso com as expectativas de queda da bolsa e as distorções causadas pelo peso das empre-

Por Luciana Del Caro

sas X, de Eike Batista, no Ibovespa. Atingiram recorde de R$ 40,8 bilhões, incremento de 27,5% sobre 2012.

Devido a sua relevância, e a pedido da BM&FBovespa, as informações sobre aluguel foram incorporadas ao volumoso banco de dados da Economatica sobre bolsas de valores. O resultado foi um novo módulo dedicado aos aluguel de ativos, lançado em setembro. A partir do sistema, a provedora de dados elaborou um estudo sobre empréstimos de ações com exclusividade para a capital aberto (veja tabelas e gráfico na p. 25).

Coletados no dia 23 de setembro, os dados mostram que a grande maioria das companhias ainda tem uma base pequena de ações alugadas em relação ao capital em circulação. Em apenas duas — OGX Petróleo ON e AES Tietê PN —, as operações de empréstimo representavam mais que 10% do free-float (12,4% e 10,1%, respectivamente), ainda bem menos que o percentual máximo permitido para a maioria das ações.

A BM&FBovespa limita esse percentual a 20%, mas tem a prerrogativa de mudá-lo, de acordo com sua análise. Isso já aconteceu em fevereiro de 2013 com o aluguel de ações da Eletropaulo. Na época, a Bolsa subiu o teto para 50% após os

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empréstimos crescerem ao ponto de faltar ações para aluguel — uma circunstância conhecida como “short squeeze”.

Episódios como esse reforçam a importância de os depar-tamentos de RI não estarem alheios ao tema. Afinal, trata-se de um indicador do que o mercado está pensando sobre a empresa: “O aluguel de ações é um termômetro”, comenta Fernando Caio Galdi, professor da Fipecafi. Em caso de cres-cimento dessas operações, o que pode estar se cristalizando é uma visão negativa sobre o desempenho da companhia.

A solução é entrar em campoO monitoramento das operações de aluguel pelas áreas de RI, contudo, não seria nada simples até pouco tempo atrás. Foi só em fevereiro deste ano que a Bolsa passou a publicar dia-riamente as taxas de cada operação, especificando os valores cobrados pelo doador (que entrega a ação para aluguel) e pagos pelo tomador (que aluga o papel) — a diferença fica para as corretoras, que intermedeiam os empréstimos. Antes, as tarifas de aluguel, disponíveis no site da BM&FBovespa, se referiam à média dos últimos quinze dias. Com dados sobre as taxas e ferramentas para cruzá-los com informações do mercado à vista, a Economatica espera oferecer aos RIs uma ferramenta de acompanhamento dessas informações de forma sistemática.

Ainda assim, para que essa informação seja usada a favor da companhia, outra barreira precisará ser vencida: os RIs deverão se aproximar dos short sellers, em vez de repudiá--los, como muitas vezes acontece. Bernardo Gomes, gestor dos fundos long-short da BBM Investimentos, observa que nem sempre o investidor de posição vendida espera piora no desempenho da companhia. “Muitas vezes, a venda a desco-berto, feita por meio do aluguel, ocorre porque os múltiplos de uma empresa estão muito elevados e há pouco potencial de alta”, lembra Gomes. Esse tipo de venda é bastante usado pelos fundos long-short, que realizam operações combinadas de compra de algumas ações (long) e venda de outras (short). Dessa forma, eles têm a possibilidade de lucrar com apostas em diferentes direções — a baixa de uma ação e a valorização de outra — ou de fazer uma arbitragem entre Ibovespa à vista e Ibovespa futuro, vendendo um e comprando outro.

Porém, para detectar se a expansão do aluguel indica ape-nas movimentos táticos para ganhar nas duas pontas, como os citados acima, ou uma visão de fato negativa sobre os rumos do negócio, é preciso entrar em campo, como tem feito a CPFL. Segundo Eduardo Takeiti, diretor de RI, a companhia de distribuição de energia monitora diariamente o merca- do de empréstimo de ações. “Quando percebemos que há um aumento das operações envolvendo nossas ações, buscamos entender o motivo.” Nesses momentos, a área de RI marca reuniões com analistas de investimento para diagnosticar os fatores que podem estar influenciando negativamente o horizonte de preço dos papéis, além de informá-los sobre as perspectivas para a companhia.

Varejo e energia são os mais requisitadosEm 2013, o movimento com aluguel foi exageradamente alto. Isso se deve, principalmente, às expectativas negativas no mercado acionário e à volatilidade causada pela erosão das empresas do grupo X, que tinham peso importante no Ibovespa. O índice futuro foi negociado com deságio em relação ao índice à vista durante boa parte do ano, o que propiciou operações de arbitragem — como o índice futuro estava mais barato, os investi-dores compravam-no e vendiam seu análogo à vista. Para efetuar a venda, precisavam alugar as ações que compunham o índice.

A distorção foi eliminada neste ano, quando o humor dos investidores melhorou um pouco e a bolsa mudou a metodologia do Ibovespa, passando a dar menos peso à liquidez das ações. Os papéis do grupo X saíram do índice, a demanda por aluguel voltou a um patamar mais baixo e a taxa média caiu. O número de contratos abertos no Banco de Títulos CBLC (BTC) foi de R$ 34 milhões para R$ 30 milhões entre 15 de maio e 29 de agos-to. A tarifa média do tomador das ações do Ibovespa encolheu de 1,27% para 0,79% no mesmo período, conforme a Economatica. A expectativa, no entanto, é o aluguel continuar em ascensão: “Há sempre novos investidores nesse mercado”, diz Michael Viriato, coordenador do Laboratório de Finanças do Insper.

Em termos relativos, as empresas do setor de varejo e energia elétrica possuíam a maior proporção de ações emprestadas no dia 23 de setembro, desconsiderando a OGX: após esta, vieram as ações de AES Tietê PN, Magazine Luiza ON , Lojas Marisa ON e Cia. Hering ON. Quanto maior o percentual, maior o risco e a volatilidade dos papéis. Se há mais ações em circulação alu-gadas, é mais provável que os preços sejam pressionados para baixo (pela intensificação da pressão vendedora) ou para cima (caso os investidores tenham que correr para comprar os papéis no mercado à vista, na hipótese de elas eventualmente subirem).

O risco do aluguel pode ser analisado ao lado de outro indica-dor: o número de dias necessários para as vendas a descoberto serem zeradas. Quanto maior o volume negociado e a liquidez da ação, mais rápido o investidor consegue zerar suas posições. Numa conjuntura em que as ações sobem, contrariando a aposta de queda, o risco do tomador aumenta: afinal, ele se comprometeu a devolver as ações em determinada data e terá que comprá-las na bolsa.

Para não correr o risco de ter prejuízos elevados, ele pode se ver obrigado a zerar sua posição, o que é feito pela compra das ações no mercado à vista para devolvê-las ao doador. Depen-dendo do tamanho da posição alugada e do histórico de liquidez, é possível prever que o investidor levará um determinado nú-mero de dias para concluir a compra de todas as ações. Nesse quesito, a liderança estava com Telefônica Brasil ON, Embratel Participações ON, AES Tietê PN, Cemig ON, Copasa ON e Lojas Marisa ON. Confira os dados ao lado. (L. D. C.)

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As cinco ações mais alugadasNúmeros absolutos (valor dos contratos em aberto, em R$ bilhões)

Em relação ao free-float (em %)*

Itaú Unibanco PN 2,10 OGX Petróleo ON 12,39

Petrobras PN 2,05 AES Tietê PN 10,14

Bradesco PN 2,02 Magazine Luiza ON 9,91

Vale ON 1,36 Lojas Marisa ON 9,75

Ambev ON 1,16 Cia. Hering ON 9,37Dados extraídos pela Economatica em 23/9/2014. * O cálculo considera os contratos em aberto da ação no BTC sobre o valor de mercado da ação no free-float.

As dez maiores taxas de aluguel (em % ao ano)*1 dia 30 dias

Lupatech ON 59,74 54,32

MMX Miner ON 14,09 13,55

Le Lis Blanc ON 13,87 14,50

Lojas Marisa ON 13,27 13,65

CCX Carvão ON 12,99 8,39Dados extraídos pela Economatica em 23/9/2014. * Taxa média do contrato do doador. O percentual é relativo ao valor do contrato.

As cinco ações com maior prazo para o investidor zerar a posição de aluguel*Telefônica Brasil ON 34,6 dias

Embratel Participações ON 27,7 dias

AES Tietê PN 22,2 dias

Cemig ON 20,5 dias

Copasa ON 20,1 diasDados extraídos pela Economatica em 23/9/2014. * O resultado é a relação entre os contratos em aberto da ação no BTC e o volume médio diário em 4 meses da ação no mercado à vista.

Em altaConfira abaixo um retrato do mercado de empréstimo de ações

12,7

20,5

30,2

32,0

40,8

2009

2010

2011

2012

2013

Em R$ bilhõesAnos

Média anual dos contratos em aberto no BTC

Fonte: BM&FBovespa.

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Hora de informarCom o avanço do mercado de aluguel, muitos consideram que está na hora de discutir o assunto mais a fundo. A transpa-rência desejável, afinal, está longe de se encerrar com a clara visualização das taxas de empréstimo por ação. Entidades como o Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri) e a Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec) têm se debruçado sobre o tema. “O aluguel é exce-lente para a liquidez das ações, mas precisamos evoluir em dois pontos: os limites do aluguel [em relação ao free-float] e a identificação dos investidores”, resume Geraldo Soares, presidente do conselho de administração do Ibri. Para ele, é importante as companhias conhecerem aqueles que vendem suas ações a descoberto. Afinal, uma possível concentração dos empréstimos pode implicar riscos de grandes oscilações e volatilidade nos preços. Por diligência, caberia aos diretores de RI, inclusive, divulgar ao mercado eventuais concentrações das posições vendidas, se dispusessem dessa informação.

A Instrução 358, de 2002, e o Ofício Circular 1 de 2014, da Superintendência de Relações com Empresas (SEP) da CVM, obrigam os investidores a informar o mercado sempre que atingirem posição de 5% do capital de determinada compa-nhia, seja no mercado à vista, seja por meio do aluguel de ações. Da mesma forma, é compulsório que a venda de fatias superiores a essa seja revelada. Não há exigência, entretanto, de divulgação da posição líquida vendida (quanto o investi-dor está mais vendido do que comprado). Essa informação é fundamental para entender a expectativa preponderante do investidor para os papéis — de alta ou de baixa.

Na União Europeia, a crise de 2008 levantou a discussão sobre o short selling, visto como benéfico em períodos de normalidade mas pernicioso em momentos de estresse. O re-sultado foi uma regulamentação comum aos países-membro, em vigor desde novembro de 2012, que impôs, entre outros pontos, a comunicação da posição líquida vendida. Os in-vestidores devem reportar esse dado às comissões de valores locais sempre que atingirem 0,2% do capital de uma empresa. Quando elas chegarem a 0,5%, é necessário informar também o mercado. Além de ampliar a transparência, a norma visa ajudar os reguladores a monitorar se as posições criam riscos sistêmicos ou se estão sendo usadas com propósitos abusivos. E faculta aos reguladores do mercado de capitais a iniciativa de suspender temporariamente as vendas a descoberto sem-pre que for preciso.

Voto vazioOutra distorção criada pelo aluguel de ações é o chamado “empty voting”, situação em que um investidor usa ações alu-

gadas para votar numa assembleia e influenciar os resultados. Na operação de aluguel, o doador transfere temporariamente a propriedade do papel ao tomador e, com ela, direitos como o de voto. O problema aí é a possibilidade de um investidor estar simultaneamente comprado e vendido na mesma ação. Ele pode votar em assembleia com os papéis que têm em carteira (sua parte comprada), mesmo que elas sejam menos relevantes que a posição vendida. Isso não significa necessa-riamente que ele votará contra os interesses da companhia mas, no mínimo, que o fará sob claro conflito de interesses.

Por isso, assim como Soares, Mauro Cunha, presidente da Amec, é favorável à identificação dos tomadores de ações e à divulgação da posição líquida de cada investidor. Segundo ele, são medidas que facilitariam o questionamento jurídico do voto de um investidor contrário ao interesse da companhia por ter alugado ações. Cunha acredita ainda numa postura mais consciente dos investidores como outra forma de ajudar a combater o empty voting. Acionistas de longo prazo que emprestam suas ações para obter um rendimento adicional, como os fundos de pensão, poderiam adotar políticas que determinassem a interrupção do contrato de aluguel na iminência de uma assembleia, por exemplo.

Espaço demais?Outra discussão relevante, defende Soares, seria a dos li-mites para empréstimo de papéis. Embora a BM&FBovespa estabeleça que as companhias não podem ter mais de 20% de suas ações em circulação alugadas, ele acredita que esse teto precisa ser discutido com o mercado. Para Takeiti, da CPFL, o percentual é muito elevado, pois é amplo o suficiente para gerar intensa volatilidade para as ações.

Procurada pela capital aberto para falar sobre o alu-guel de ações, a BM&FBovespa não concedeu entrevista. Na época em que expandiu o limite de empréstimo dos papéis da Eletropaulo para 50%, sua atitude foi criticada — há uma corrente que defende que a pressão vendedora dos tomadores potencializa a queda das ações. Outros dizem que a desvalo-rização ocorreria de qualquer jeito, independentemente do aluguel, pois o que a motiva são as perspectivas ruins para a companhia. Independentemente de quem esteja certo, o fato é que os aluguéis de ações vêm fazendo a cabeça de muitos investidores. E o fenômeno é mundial. Nos Estados Unidos, já existem até ativistas de posição vendida; eles não só tor-cem pela baixa das ações como encampam essa estratégia por uma causa nobre (leia reportagem na p. 28). Os aluguéis, portanto, deixaram de ser apenas uma modalidade alternativa de obter ganhos. É bom RIs e reguladores aprenderem logo a lidar com eles.

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Nos Estados Unidos, investidores que apostam na queda das ações desmascaram companhias e se transformam em justiceiros

Por Bruna Maia Carrion

O autodeclarado Batman do mercado de ações conseguiu, nos Estados Unidos, derrubar uma empresa espanhola. Daniel Yu, por meio de sua firma Gotham City Research — batizada em homenagem à cidade fictícia do soturno super-herói —, pôs abaixo a provedora de acesso gra-tuito à internet Gowex, listada no Mer-

cado Alternativo Bursátil. Em julho, Yu afirmou em seu site que 90% dos rendimentos alegados pela empresa nos últimos anos eram falsos e que a ação deveria valer zero, em vez dos quase € 20 pelos quais eram vendidas em 30 de junho. Uma semana depois, a companhia admitiu ser a fraude que Yu revelara. Entrou com pedido de falência e suas ações deixaram de ser negociadas. A trapaça tinha passado despercebida pela Comisión Nacional del Mercado de Valores (CNMV), regula-dora do mercado espanhol, e também pela bolsa local. Foi preciso que Yu, um ativista de posição vendida (“short seller activist”, no jargão em inglês) que nunca mostrou seu rosto, revelasse o engodo.

O número de investidores que se proclamam short seller activists vem crescendo nos Estados Unidos. Alguns fazem parte de gestoras conhecidas que também possuem posições compradas. David Einhorn, da Greenlight Capital, é um deles. Ficou famoso por ter identificado problemas no banco Lehman Brothers em 2007, quase um ano antes de a instituição falir e deflagrar a crise de 2008. Outros são obscuros como Yu. Montam pequenas firmas das quais são os únicos sócios e dedicam-se exclusivamente a derrubar empresas suspeitas.

Criado em junho deste ano, o site Activist Shorts Research monitora os ativistas de posição vendida. Cobre 50 gestoras e investidores individuais famo-sos pela estratégia. Ao todo, eles já realizaram mais de 400 campanhas pela queda de ações. O portal divulga, inclusive, um ranking com o número de campanhas e os resultados de 28 gestores. A lista mede a desvalorização média dos papéis após a intervenção dos ativistas: quanto menor o valor,

mais bem-sucedida a empreitada. No topo está a Alfred Little, cujo dono, Jon Carnes, encabeçou 15 campanhas e conseguiu uma desvalorização média de -62,8%.

Segundo Carnes, sua primeira tacada veio em 2010, depois de ele ter passado cinco anos estu-dando empresas chinesas (os principais alvos dos short sellers) que desconfiava estarem falsificando seus resultados. “Só vale a pena apostar na queda e publicar meus achados depois de muito trabalho. Preciso ter certeza de que a empresa é uma fraude”, diz. O cuidado é não apenas para evitar acusações falsas, mas também para não desperdiçar dinheiro.

O empréstimo de ações e as opções de venda são as formas mais comuns de um investidor apostar na baixa de uma companhia. A primeira estratégia consiste em vender os papéis alugados na alta e recomprá-los, no término do empréstimo, a um preço inferior, embolsando a diferença. O segundo expediente, para ser bem-sucedido, depende de o valor de venda escolhido ser superior à cotação do papel em bolsa, na data de vencimento da opção. As taxas de aluguel e o preço das opções variam conforme o emissor. Segundo Carnes, seu valor anual pode chegar a 100% do valor da ação — o que adiciona custos e risco à estratégia. Eventos como o “short squeeze” também atrapalham: quando muitos investidores ficam vendidos, a demanda por aluguel aumenta. Com mais gente interessada, a taxa de empréstimo e a cotação do papel sobem, justamente o que os short sellers não querem ver.

Os ativistas de posição vendida ainda correm um perigo extra: sofrer processo por difamação. Carnes conta que isso já lhe aconteceu quatro ve-zes, mas em todas ele saiu ileso, pois ninguém con-seguiu provar que estava mentindo: as empresas eram, de fato, fraudadoras de balanços. “Os short sellers são espertos e ficam em Nova York, estado com um forte precedente a favor da liberdade de expressão, o que nos protege”, explica. Um proces-so veio da Deer Consumer Products, companhia chinesa que anunciava generosa margem de lucros

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Jon Carnes: Gestora: Alfred Little

Desvalorização média: - 62,8%Número de campanhas: 15

É um dos mais bem-sucedidos short sellers. Mira principalmente empresas chinesas

listadas nos Estados Unidos. No momento, seu alvo é a FAB Universal,

distribuidora de mídia digital

David Yu: Gestora: Gotham City

Desvalorização média: - 48,5%Número de campanhas: 5

Yu conseguiu ver o que os reguladores espanhóis não enxergaram. Empresa muito

bem posicionada no segmento de acesso local, a provedora de acesso à internet Gowex fraudava 90% de suas receitas.

Admitiu ser uma fraude uma semana depois de as denúncias de Yu serem

publicadas na internet.

Majed Souiedan: Gestora: Geoinvesting

Desvalorização média: - 48,5%Número de campanhas: 38

Souiedan tem hoje cinco sócios que fazem uma das mais intensas coberturas de fusão

reversa, processo em que uma empresa (geralmente chinesa) passa a operar no mercado

americano após fundir-se com uma companhia já listada nas bolsas locais (conhecida como

empresa-casca). Normalmente é nessas operações que se encontram fraudes

e riscos de diluição.

Conheça os short sellers mais famosos dos Estados Unidos

Supercontroversos casso da companhia não é modesta: a posição vendida dele soma US$ 1 bilhão.

Icahn e outros nomes de peso, como George Soros, se manifestaram veemen-temente a favor da empresa, na qual estão comprados. Tão veementemente que Icahn xingou Ackman no programa da CNBC. Disse que ele não passava de um menino que sofreu bullying na esco-la e que suas acusações eram absurdas.

A briga deu mais evidência ao ativis-ta. Em 23 de julho deste ano, ele voltou à CNBC, para uma apresentação em que prometeu revelações bombásticas. Disse que havia gastado US$ 50 milhões em pesquisa para revelar a fraude da Herbalife. O investimento, no entanto, parece ter sido em vão. Ackman repetiu seu discurso de sempre e, mais uma vez, falhou na demonstração. Tanto que os papéis da empresa, cujos preços haviam despencado 15% quando ele anunciou que faria a mais importante declaração de sua vida, subiram 25% naquele dia.

É por situações assim que muita gente critica os ativistas de posição vendida. Considera-se que eles agem não em prol do mercado, mas para man-char reputações e destruir companhias. Seriam vilões, ao invés de super-heróis. “Do jeito que é feito, está bem próximo de uma manipulação do mercado”, observa James Allen, diretor de políti-cas para o mercado de capitais do CFA Institute, associação internacional que representa analistas de investimentos.

O problema, segundo ele, é a distân-cia entre o momento da apostas e o de seu anúncio. Para Allen, o ético seria, após longa e exaustiva pesquisa sobre o assunto, os ativistas da baixa publica-rem seus achados e, depois do anúncio, adquirirem suas posições vendidas. O CFA não possui nenhuma recomen-dação específica sobre o comportamen-to ideal de ativistas (sejam eles vendidos, sejam comprados), mas vem pensando a respeito. Jon Stokes, diretor de padrões profissionais do instituto, chegou a defender em seu blog que decisões de investidores influentes sejam tratadas com o mesmo cuidado e sigilo que os fatos relevantes. “Se Warren Buffett

na produção e na venda de utensílios de cozinha (mais especificamente, de abri-dores de lata elétricos). Carnes alvejou a empresa em março de 2011; a Nasdaq a deslistou dois anos depois, após su-cessivas interrupções das negociações.

Atualmente, ele conduz uma campa-nha contra a FAB Universal, companhia chinesa de mídia e entretenimento digital listada na Nyse por meio de uma “empresa casca” com sede no Colorado. Em relatório lançado em novembro de 2013, Carnes denunciou que a FAB possuía menos centros de distribuição do que dizia ter e distribuía filmes ame-ricanos pirateados na China. Poucos dias depois, em 22 de novembro, a nego-ciação das ações foi suspensa pela Bolsa de Nova York. Embora a princípio a companhia tenha negado as acusações, já em dezembro admitiu falhas inter-nas e disse ter iniciado uma apuração. A FAB está sendo deslistada pela Nyse e é alvo de vários acionistas enganados na Justiça. Se há investigações contra a empresa na SEC, elas não são públicas.

Sob os holofotesDaniel Yu, da Gotham City, tomou para si o título de Batman e, como o super--herói, vive recluso. Jon Carnes, da Al-fred Little, é menos misterioso: fala com a imprensa, embora não faça muitas aparições públicas. Os dois são o oposto de Carson Block, da Muddy Waters, outra gestora focada em desmascarar companhias chinesas (leia mais na p. seguinte). Block dá as caras em palestras para universidades e programas de TV.

Nenhum deles, porém, busca tanto os holofotes como Bill Ackman. O dono da gestora Pershing Square protagoni-zou um infame episódio em janeiro de 2013, quando discutiu ao vivo na rede de televisão CNBC com o ativista à moda antiga Carl Icahn. O motivo foi Ackman declarar que, desde maio de 2012, estava vendido em papéis da fabricante de pro-dutos para emagrecimento Herbalife. Para ele, a empresa é um gigantesco esquema de pirâmide, cuja renda vem do recrutamento de pessoas e não da venda de produtos. Sua aposta no fra-

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estivesse prestes a comprar ou vender suas ações, um investidor razoável não iria querer saber disso?”, questiona.

Na Securities and Exchange Com-mission (SEC) não há nenhum litígio público contra short sellers. A regra proíbe que analistas e gestores, indepen-dentemente da estratégia, divulguem informações falsas ou enganosas para desestabilizar o mercado. Entretanto, ao contrário do investidor de posição comprada, que deve avisar o mercado quando sua participação supera 5% do capital, o de posição vendida não precisa informá-la (ainda que muitos o façam). O Congresso americano discute a pos-sibilidade de ampliar os requisitos de transparência para short sellers.

Apesar das ressalvas, esses ativistas têm seus defensores. No estudo How constraining are limits to arbitrage? Evi-dence from a recent financial innovation, os acadêmicos Alexander Ljungqvist e Wenlan Qian analisaram campanhas de short sellers e seus impactos no mer-cado. A conclusão: justamente por ter um incentivo financeiro para encontrar problemas — que seria drasticamente menor caso seus achados viessem à tona antes da compra das posições vendidas —, esses investidores conseguem iden-tificar distorções não percebidas por reguladores. “A evidência mostra que o mercado financeiro precisa de short sellers para funcionar bem. Alguns deles podem ser especuladores que não fazem nada além de desestabilizar preços, mas os de nossa amostra são geradores de in-formação que ajudam a corrigir preços”, avaliam Ljungqvist e Qian, deixando claro que credibilidade é fundamental para influenciar o mercado.

Eu, vendido?No Brasil, não se fala de ativistas de posição vendida. E um dos motivos é o baixo número de companhias que teriam para alvejar. De acordo com o Banco Mundial, enquanto nos Estados Unidos as listadas somam mais de 4.100, por aqui elas são 366. Dessas, apenas cerca de 150 têm opção de compra ou venda disponível para suas ações,

Bill Ackman: Gestora: Pershing Square

Desvalorização média: - 42,8%Número de campanhas: 8

É o mais famoso e polêmico short seller. Desde o fim de 2012, se dedica a provar que a Herbalife é um enorme

esquema de pirâmide. Ackman, porém, ainda não conseguiu derrubar

significativamente as ações da companhia.

Jim Chanos: Gestora: Kynikos Associates

Desvalorização média: - 1,5%Número de campanhas: 25

É um dos mais antigos short sellers: atua no setor desde os anos 1980. Alguns o

consideram a “versão vendida” de Warren Buffett. Uma de suas melhores tacadas foi

apostar na queda da Enron antes do colapso.

David Einhorn: Gestora: Greenlight Capital

Desvalorização média : + 23,2%Número de campanhas: 12

É um dos mais famosos. Disse, um ano antes da crise de 2008, que o Lehman Brothers tinha excesso de créditos podres em seu

balanço. Apesar de ter acertado nessa, ele fez algumas apostas malsucedidas.

A Moody’s valorizou quase 200% depois que ele anunciou a posição vendida na

agência de rating, prejudicando seu currículo (e seu bolso).

Carson Block: Gestora: Muddy Waters

Desvalorização média: - 21,8%Número de campanhas: 13Adora aparecer na televisão e dar

palestras. Seu foco são as empresas chinesas com resultados bons demais

para ser verdade. Um dos mais recentes ataques de Block atingiu a NQ Mobile, companhia de software

para smartphones.

sendo que Petrobras e Vale são as únicas líquidas o suficiente para comportar apostas vultosas.

A alternativa, portanto, para em- preender uma posição vendida é o alu-guel de ações, que requer dos locatários um risco considerável. No Brasil, há três tipos de contrato para essa operação: um com prazo fixo para a devolução das ações; outro em que o tomador pode devolver os papéis ao locador quando desejar; e um terceiro em que qualquer uma das partes pode devolver ou exigir de volta as ações quando bem entender. A última forma é a mais comum no Brasil: 70% dos contratos de aluguel de 2013 a utilizavam. “É complicado man-ter posições vendidas. Salvo eventos atípicos como bolhas ou falências, não é fácil ganhar dinheiro com isso”, comen-ta Marcos Peixoto, gestor de carteiras long-short (que podem ter posições compradas ou vendidas em companhias) da XP Investimentos. O risco de short squeeze também incentiva os gestores a não dar publicidade a suas apostas.

Hoje, há no Brasil 163 fundos long--short, conforme a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). A capital aber-to procurou alguns, mas quase todos declinaram o pedido de entrevista. “Não pega bem admitir que você aposta na queda da companhia. O diretor de re-lações com investidores não é receptivo com quem está vendido; você é visto como um mero especulador”, conta um gestor que preferiu não se identificar.

Quanto aos custos, os short sellers brasileiros e americanos estão expostos a despesas semelhantes. Ao contrário dos Estados Unidos, todavia, o Brasil não tem uma esfera jurídica preparada para julgar processos contra investido-res vendidos, o que aumenta o risco de eles serem condenados por difamação. Diante desses fatores, fica fácil entender por que esse movimento não pegou por aqui. Nossos investidores ainda treinam para ser combativos como o tradicional ativista de posições compradas Carl Icahn. Yus e Bill Ackmans são apenas uma curiosa realidade distante.

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De olho no gestor

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Por Bruna Maia Carrion

Um roteiro é cada vez mais comum no ambiente de investimentos brasi-leiro: funcionários de grandes bancos decidem que chegou a hora de empre-ender, deixam seus empregos, pegam seus milhões e abrem uma gestora para administrar o patrimônio próprio e de terceiros. O movimento está refletido no aumento consistente do número de assets. Se, em janeiro de 2012, 551 gestoras eram signatárias do código de fundos da Associação Brasileira das Entidades do Mercado Financeiro e de Capitais (Anbima), em setembro este número já alcançava 647. Isso significa um crescimento de 17% em dois anos e meio. “No sentido da realização pessoal e também no financeiro, abrir uma ges-tora pareceu uma alternativa melhor do que continuar no banco”, conta Carlos Calabresi, que saiu do BNP Paribas para montar a Garde Asset Management. Lançada em dezembro de 2013 com R$ 50 milhões em recursos de Calabresi e de outros seis sócios, a gestora mais do que triplicou esse montante em apenas dez meses de operação — nada mal para um ano em que o mercado espera crescimento de meros 0,3% para a economia.

O negócio de gestão de recursos é, de fato, muito convidativo. Embora estejamos bem atrás dos americanos, por exemplo — eles possuem US$ 17,05 trilhões (cerca de R$ 40,8 trilhões) aos cuidados de terceiros; o Brasil, R$ 2,47 trilhões —, a poupança disponível para

De olho no gestorinvestimentos cresce a um ritmo ani-mador: entre 2010 e 2013, o volume de recursos geridos em fundos no País au-mentou 54,3%. Além disso, as margens são bastante elevadas. De acordo com dados da Anbima de julho deste ano, a taxa de administração média dos fundos multimercado é 1,21% do patrimônio líquido ao ano, enquanto a de fundos de ação é 1,85%. Além dessa remuneração, os gestores bem-sucedidos ganham taxa de performance (aplicada sobre o ganho de capital). Tudo isso acompanhado de um investimento relativamente baixo: os principais custos das gestoras são seus funcionários — que, em muitos casos, são sócios — e a tecnologia para investimento, como a dos softwares de negociação e cálculo de risco.

Não à toa as gestoras estrangeiras também estão atrás desse filão. A esco-cesa Aberdeen é um exemplo. Inaugu-rou sua sede brasileira em 2009, mas até o ano passado se dedicava apenas a gerir ativos locais para seus veículos de inves-timento sediados no exterior. Este ano, a despeito do cenário econômico pouco estimulante, decidiu lançar dois fundos para captar recursos em solo nacional. Já a gestora americana NCH Capital, fundada em 1993, abriu um escritório no Rio de Janeiro em 2012 e, em maio deste ano, começou a operar um fundo de ações brasileiro. Em breve, também pretende lançar um veículo para gerir recebíveis imobiliários. “Nossa aposta é que o País vai desenvolver uma cultura

Altamente rentáveis, firmas de gestão de recursos se proliferam com rapidez no Brasil. Mas a tendência, aqui e lá fora, é a atividade se tornar mais cara e vigiada

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de investimento em ações bem mais forte que a atual. Há espaço para no-vas gestoras”, diz James Gulbrandsen, gerente de portfólio da NCH no Brasil.

Capital na mão?Algumas novidades, no entanto, podem atrapalhar o ímpeto dos profissio-nais em abrir suas próprias gestoras. Uma delas surgiu em decisão do colegia-do da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de 6 de agosto, que solicitou à Superintendência de Desenvolvimento de Mercado (SDM) um estudo sobre “eventual obrigatoriedade de se impor regras de capital mínimo a gestores de recursos de terceiros”.

Não ficou claro se, com o termo “capital mínimo”, a CVM se refere à exi-gência de um investimento dos sócios nos fundos — prática já usual entre as gestoras — ou, o que é mais provável, a um colchão de recursos aplicado em ativos líquidos e pouco arriscados para cobrir contingências operacionais como processos movidos por cotistas, multas dos reguladores ou resgates em massa. A SDM foi procurada pela reportagem para esclarecer o assunto, mas afirmou que o estudo ainda é incipiente e nada foi definido.

Os profissionais do mercado já dis-cutem o tema. “Dependendo do valor, a exigência de capital mínimo pode ser boa para dar segurança ao mercado. Porém, a quantia não pode ser alta a ponto de impedir a entrada de novos participantes”, pondera Gulbrandsen. Valério Marega Júnior, presidente da ASK Brasil, asset com R$ 40 milhões em recursos sob gestão e focada em investimentos de alto risco, é contra a obrigatoriedade de capital mínimo. “Discutir isso é focar uma questão não essencial para o mercado brasileiro”, critica (leia mais argumentos favoráveis e contrários ao requisito na coluna An-títese, à p. 36).

A decisão da CVM de pôr o assunto em pauta segue uma tendência mun-dial. O tema começou a ser discutido no âmbito da International Organiza-tion of Securities Commissions (Iosco),

a um banco; resgates fortes poderiam demandar a atuação do governo para garantir liquidez”, explica Marcelo Giufrida, da Garde Investimento. Por meio da obrigação de capital mínimo para esses fundos, os reguladores visam minimizar os efeitos de resgates em massa, como ocorreu em 2008 nos Es-tados Unidos e na Europa. Na ocasião, alguns MMFs americanos chegaram a receber aportes do governo federal para garantir a liquidez das cotas.

Para o Investment Company Insti-tute (ICI), associação de companhias de investimento americana, o colchão de recursos é uma péssima ideia, espe-cialmente por ser voltado a um tipo de fundo que oferece pouco risco e baixo retorno. Para formar a reserva de capi-tal, constata a associação, os gestores de MMF teriam que levantar capital no mercado ou retirá-lo de outras áreas do negócio e deixá-lo praticamente parado numa conta, sem gerar rentabilidade. “Se os gestores não puderem obter o retorno desejado com esses fundos, vão buscar alternativas, como transferir seus clientes para fundos menos regulados. Os investidores, portanto, continua-riam carregando os riscos de investir”, alerta o ICI.

No Brasil não há nenhum veículo nos moldes do MMF — um fundo de investimento cuja importância no co-tidiano da população levaria o Tesouro nacional a cobrir resgates. Quando os fundos de investimento passam por retiradas massivas no Brasil, as gestoras seguem o que está previsto na maioria dos regulamentos: a instituição ad-ministradora da carteira determina a suspensão de pagamentos aos cotistas e convoca assembleia para deliberar o encerramento do fundo ou a proibição de resgates por tempo determinado. Quanto à preocupação de fortalecer as gestoras para o caso de cotistas move-rem processos contra elas, já existem seguros para isso. “Em nossa realidade, o capital mínimo serviria como uma barreira de entrada a novas assets, mas não seria eficiente para garantir o patri-mônio de investidores. De que adianta

instituição que congrega reguladores do mercado de capitais de vários países do mundo, logo depois de 2008, mas ganhou destaque nos últimos dois anos. Nos Estados Unidos, o debate tornou--se polêmico em 2012. Foi quando o Financial Stability Oversight Council (FSOC), órgão ligado ao Tesouro americano e à Securities and Exchange Commission (SEC), declarou estar con-siderando a hipótese de requerer um col-chão de capital para compensar eventu-ais perdas do chamados money-market funds (MMFs).

O MMF é o tipo mais simples e acessível de investimento disponível para investidores americanos e euro-peus: consiste na aplicação de recursos em dívida líquida de alta qualidade e de curto prazo — nesse sentido, semelhante ao fundo DI brasileiro. A diferença é que ele funciona quase como uma conta corrente em que o cidadão comum deixa o dinheiro para as despesas do dia a dia, mantendo uma remuneração mínima. “Em situações de crise, os MMFs se assemelhariam

Instrução 306 deve

exigir um documento

público anual com

dados sobre as

atividades da asset,

os tipos de ativo,

a remuneração dos

gestores e o perfil

dos clientes

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fundos de hedge, até então dispensados de registro em muitos países. Na União Europeia, esse endurecimento já entrou em vigor, em julho de 2013. A Diretiva dos Gestores de Fundos de Investimen-to Alternativos (AIFMD, na sigla em inglês) limitou a alavancagem dos hedge funds e os obrigou a realizar testes de estresse. Além disso, passou a demandar que divulguem anualmente um rela-tório com informações ao investidor, como, por exemplo, a remuneração dos principais gestores. Seus parentes brasileiros, os fundos long-short, nunca foram dispensados de registro por aqui e estão sujeitos às mesmas regras dos demais veículos de investimento. Por isso, ainda não houve necessidade de se voltar para eles.

A reforma da Instrução 306 da CVM, posta em audiência pública em 2012, deve trazer exigências semelhantes para as gestoras — como a divulgação anual de um documento nos moldes do for-mulário de referência costumeiramente publicado pelas companhias abertas. Atualmente, as assets enviam um re-latório anual à autarquia, mas ele não fica disponível ao público. A intenção é que isso mude e todos possam acessá--lo por meio da internet. Além disso, devem passar a ser exigidas informações mais detalhadas sobre as atividades da asset, os tipos de ativo, a remuneração dos gestores e o perfil dos clientes. A nova 306 deve requisitar ainda que os gestores de recursos passem por exames de certificação para poder atuar no ramo e que as instituições divulguem suas práticas de controle de risco. “Isso significará um custo a mais, mas que será compensado com um mercado mais transparente”, opina Gulbrandsen, da NCH.

O texto final da norma foi aprovado em agosto pela CVM, mas ainda não veio a público. Como cravou a PwC, um mundo novo se avizinha para as gestoras, e esse movimento contempla o Brasil. Se bem dimensionado, o funil regulatório poderá garantir mais qua-lidade e segurança ao investidor, sem desencorajar talentos.

um colchão de alguns milhões se o valor gerido é muito maior?”, observa Otavio Yazbek, advogado e ex-diretor da CVM.

Por que, então, o regulador estuda implantar o capital mínimo por aqui? De acordo com os gestores e especialis-tas ouvidos pela reportagem, o objetivo da CVM seria alinhar-se às regras inter-nacionais, de modo a evitar a arbitragem regulatória — migração de agentes do mercado para países com normas mais flexíveis. “Os membros da Iosco cos-tumam trabalhar para harmonizar as regras, evitando a arbitragem. É natural que a CVM discuta os tópicos debatidos lá fora, mas isso não quer dizer que eles devam ser aplicados no mercado brasi-leiro”, considera Giufrida.

Corrida pela transparênciaCom ou sem capital mínimo, há uma tendência internacional de que as ges-toras de recursos passem a lidar com regras mais duras. No estudo Asset management 2020: a brave new world, a consultoria PwC observa que, nos últimos anos, reguladores e legisladores se concentraram em colocar nos eixos o setor bancário, cujos excessos foram expostos após a crise financeira de 2008. Agora, seria a vez de as assets enfrenta-rem as consequências de uma escalada regulatória, que tende a ganhar inten-sidade até 2020. “Os reguladores estão voltando sua atenção para os gestores de recursos, ao escrutinar suas cultu-ras, as interações com consumidores e a efetividade na aplicação de regras”, destaca o relatório da PwC, publicado em fevereiro nos Estados Unidos.

Boa parte das mudanças deve ca-minhar no sentido de requerer mais transparência dos gestores. Diante do temor de uma nova crise e da preocupa-ção mundial em criar leis anticorrupção, evitar sonegação fiscal e prevenir desvio de dinheiro para regiões sob sanção (como países do Oriente Médio e, mais recentemente, a Rússia), espera-se que as assets tenham que divulgar com mais frequência o destino de seus recursos.

Existe também a tendência, nos Es-tados Unidos e na Europa, de regular os

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É válida a exigência de capital mínimo para gestoras?O texto da Instrução 306 da Co-

missão de Valores Mobiliários (CVM), publicado em 1999 e submetido a altera-ções posteriores, teve uma proposta de atualização levada a audiência pública em 2011. Dada a distância entre a data de encerramento da audiência e os dias atuais, alguns aspectos sobre a adminis-tração de carteira de valores mobiliários surgiram, tornando forçoso que a CVM proponha uma nova audiência pública. Um desses aspectos é a necessidade de as administradoras que concentram sua atividade na gestão de recursos — as chamadas gestoras — apresentarem capital mínimo para funcionar.

Sobre esse tema muito se tem discu-tido. Posições contra e a favor levam aos mais diferentes raciocínios e justificati-vas. Um dos argumentos a favor do capi-tal mínimo passa pelo entendimento do papel do gestor de recursos na engrena-gem do mercado de capitais, trazendo à tona a questão da estrutura necessária para se desempenhar a atividade.

Para qualquer tipo de público que o gestor distribua seu veículo de inves-timento, qualificado ou não, uma in-fraestrutura adequada é indispensável, pois oferece segurança ao investidor. O texto proposto pela audiência pú-blica indica requisitos mínimos para o gestor, tais como: a realização de con-

troles internos, de gestão de risco (pró-pria ou, se for terceirizada, monitorada permanentemente) e compliance; a existência de departamento técnico de análise; o fornecimento de informações por meio de relatórios na periodi-cidade que a atividade de-mandar; e a disposição de profissionais suficientes para colocar a estrutura em condições de funcio-nar, além de recursos de tecnologia da informação (TI) necessários para fazer frente a toda a demanda operacional.

Conclui-se que, para o exercício sério da atividade, um gestor necessita muito mais do que a correta capacitação téc-nica e o indispensável faro de mercado. Para tanto, o capital mínimo cumpre perfeitamente esse papel. Demanda que o gestor invista recursos em sua infraestrutura e, assim, reúna um con-junto de requisitos que dê ao investidor a segurança de que sua gestão possui critérios e condições profissionais para ser um “player” no mercado. Essa re-gra, se aprovada, levantará a régua das exigências ao criar um padrão para os novos empreendedores do mercado e

corrigir as distorções porventura exis-tentes nos gestores em atividade. Além disso, o capital mínimo em alguma medida dificultará a entrada daqueles

que pretendem utilizar a gestão em proveito próprio, arriscando, sem estrutu-ra, recursos de poupança privada.

Alguns poderiam argu-mentar que a imposição seria um limitador para profissionais competentes mostrarem suas habilida-des e que o capital mínimo não impede incompetên-cia, fracasso e insucessos. O raciocínio é correto, mas a discussão não se refere a competência nem a exper-

tise — e, sim, ao comprometimento de que os recursos serão gastos para criar melhores condições de gerir o patrimônio de terceiros. Atribuir ao capital mínimo o papel de colchão para ressarcimento de eventuais prejuízos a investidores ou para eventuais deman-das de solidariedade de administradores e custodiantes também é equivocado. Qualquer valor estabelecido seria des-proporcional aos volumes sob gestão e, portanto, aos prejuízos que poderiam vir a ocorrer.

É preciso mais que capacidade e faro para o exercício sério da atividade

Luiz Antunes Müssnich ([email protected]) é advogado e conselheiro da Holding Petra S.A.

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É válida a exigência de capital mínimo para gestoras?Nos Estados Unidos, o gestor profis-

sional é considerado um prestador de serviço, como o médico, o contador ou o advogado. Seu registro e sua possibili-dade de atuação têm como foco a com-provação de organização e capacidade técnica. Exames, treinamento contínuo, procedimentos estritos e padronizados, além de transparência, caracterizam a atuação dos gestores (pessoas físicas e jurídicas), conforme as exigências da Securities and Exchange Commission (SEC) e dos órgãos autorreguladores. No Brasil não é diferente: a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) realiza auditoria e questionamentos e demanda comprovação de currículo e experiência. A Associação Brasileira das Entidades do Mercado Financeiro e de Capitais (Anbima) requisita a formalização de manuais e procedimentos internos, além de aprovação em exame.

A exigência de capital mínimo nos Estados Unidos, país em que litígios por danos têm consequências seve-ras, é limitada a valores módicos, que variam de US$ 10 mil a US$ 35 mil do patrimônio líquido da gestora. Faz sentido que o montante seja pequeno. Os pontos essenciais para se evitar problemas são supervisão e controle. Cabe lembrar que a crise de 2008 foi gerada pela proliferação de instrumentos

com alavancagem por entidades como bancos e fundos de hedge. Todas as instituições eram de grande porte. Situ-ações como o golpe de Bernard Madoff e casos de investidores com informação privilegiada acontecem com ou sem capital mínimo. Elas decor-rem de má-fé ou de falhas em auditorias.

Erros operacionais, que poderiam levar a processo, justificam um capital mí-nimo? Todas as categorias profissionais são sujeitas a erros. Médicos, controla-dores de vôo e farmacêuti-cos lidam com vidas. O que seus respectivos órgãos de regulação requisitam é a excelência no trato da profissão. Esses prestadores de serviço precisam apre-sentar capital mínimo? Não.

É preciso fomentar o mercado das gestoras, e não o contrário. A diversi-dade de gestoras significa criatividade na indústria, novos produtos e me-lhores serviços. Nos Estados Unidos, as pequenas geram empregos e esti-mulam a descentralização geográfica. É importante que nosso mercado de valores mobiliários tenha vida própria, separada do setor bancário.

Christian Sant’Anna ([email protected]),

CFA, é gestor de recursos na Titan Capital

Há realmente um problema a ser so-lucionado? O número de casos, proces-sos e reclamações contra as pequenas é relevante? Não. Ao contrário. O controle,

já estabelecido por entidades como CVM e Anbima, bem como por administradores de fundos e auditores, é eficiente. Gestoras menores tendem a ter investidores qualificados como clien-tes, cuja relação é próxima. A bem da verdade, é bom lembrar, as gestoras auxiliam o regulador no processo de supervisão, por serem veículos aglutinadores e organizadores.

Os Estados Unidos têm em torno de 10.500 gestores.

Enquanto isso, o Brasil conta com cerca de 600. A dinâmica de nosso jovem mercado determinará a quantidade de participantes. A consolidação é um processo natural, em que a resposta virá do cliente, o investidor.

A CVM deve zelar pelo funciona-mento do mercado e pela proteção do investidor. O número de participantes e a lucratividade da indústria não fa-zem parte de seu escopo. A fiscalização terá de crescer com o maior número de investidores.

Não há um problema a ser solucionado. O controle estabelecido é suficiente

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Uma década de PPPsAinda bastante dependentes do financiamento estatal, parcerias público-privadas começam a usar o mercado de capitais

Por Roberto RockmannEm dezembro, a Lei 11.079, que ins-

tituiu a parceria público-privada (PPP), completa dez anos. Criada para tirar do papel as obras de infraestrutura brasilei-ras, ela inaugurou uma nova forma de se desenvolver projetos. Nesse modelo, o ente privado se encarrega de planejar, financiar, executar e operar determina-da obra ou serviço para a administração pública, em troca de receber dela um pagamento periódico, vinculado a seu desempenho. Até o início de setembro, segundo levantamento do portal PPP Brasil, 65 parcerias foram assinadas: 37 pelos estados, 27 pelos municípios e 1 pela União. Mais da metade (55%) foi celebrada nos últimos três anos. Cerca de um quarto de todas as PPPs realiza-das refere-se a projetos de saneamento.

Quando o modelo foi lançado, cogitou-se o mercado de capitais como possível fonte de financiamento dos projetos a serem erguidos. A prática, porém, não corroborou a expectativa. “A presença do mercado de capitais é praticamente inexistente. O financia-mento está sendo feito pelos bancos públicos, como BNDES [Banco Nacio-nal de Desenvolvimento Econômico e Social], Banco do Nordeste ou Caixa”, afirma Fernando Albino, sócio do Al-bino Advogados, que contribuiu para a elaboração do projeto de lei sobre as PPPs, aprovado em 2004.

O motivo é simples: com a oferta de crédito a taxas extremamente atrativas, os bancos públicos minam o espaço do

financiamento privado. Esse cálculo matemático levou a CAB Ambiental a descartar o mercado de capitais na captação de recursos para as PPPs de que participa. A companhia de sane-amento, que já cogitou abrir o capital em 2011 no Bovespa Mais, presta dois serviços ao poder público. Uma parceria foi acordada com a Sabesp, em 2009, e a outra com a concessionária alagoana de água, a Casal, em 2012. “Poderíamos ter buscado recursos no mercado de capitais para executar as obras, mas seria mais caro”, confessa Galvão. Na associação estabelecida com a Sa-besp, o financiador foi o BNDES; na da Casal, a Caixa Econômica Federal.

A concessionária alagoana precisava de dinheiro para engendrar um sistema de abastecimento de água na região de Arapiraca, a 140 km de Maceió. Sua situação financeira, contudo — passivo superior a R$ 500 milhões, além de pa-trimônio líquido negativo —, a impedia de contratar empréstimo num banco estatal. A alternativa foi firmar uma PPP de 30 anos com a CAB, que prevê R$ 143 milhões em investimentos.

O sistema de água, entregue em ju-lho, permitirá à concessionária atender novos clientes comerciais. Entre eles, uma mineradora, disposta a investir R$ 1 bilhão na exploração de cobre, e um shopping center. “O dinheiro que receberemos da mineradora pelo forne-cimento de água representa um quarto do que devemos pagar de contrapres-

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tação para o contrato de PPP. Teremos lucro e ainda recursos para financiar a parceria, com um sistema que forne-cerá 1.500 metros cúbicos por hora de água”, comemora o presidente da Casal, Álvaro Menezes.

Primeiros passosEmbora o financiamento particular ain-da seja escasso nas PPPs, algumas devem começar a usar títulos do mercado de capitais — por incentivo das próprias instituições do governo. A Caixa Eco-nômica Federal está oferecendo uma linha de crédito especial, no valor de R$ 600 milhões, para projetos urbanísti-cos e de saneamento que emitam certi-ficados de recebíveis imobiliários (CRIs). “Essas alternativas são importantes, porque em algum momento o BNDES, principal financiador da infraestrutura nacional, não terá recursos para todos os investimentos”, projeta Byung Soo Hong, sócio do MHM Advogados. Se-gundo ele, algumas prefeituras estariam estudando opções de custeio fora do sistema bancário.

Uma delas é a de Belo Horizonte. A prefeitura local cogitou usar fluxo de recebíveis imobiliários, como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), para financiar obras em PPP no município. Mas, para não ficar com a receita atrelada a um projeto por todo o prazo da parceria, acabou optando por usar recursos vinculados ao orçamento geral do município. “Algumas cidades já começam a estudar a possibilidade de securitizar o fluxo de IPTU [em imó-veis] de PPPs de saúde, com a emissão

de títulos com prazo de dez anos, para financiar a contraprestação ao ente privado”, conta Rosane Meira, sócia do MHM Advogados.

A securitização de recebíveis também tem sido adotada para financiar PPPs no Peru. A diferença é que a emissão parte do setor privado. Conforme a execução do projeto caminha, o empreendedor recebe um certificado de cumprimento das etapas do cronograma; o Estado não faz um desembolso, porém reconhece possuir uma dívida a pagar. Com base nesse direito creditório, a companhia pode emitir um papel lastreado no re-conhecimento da dívida para financiar as outras etapas do projeto, explica Tatiana Cymbalista, sócia do Manes-co, Ramires, Perez, Azevedo Marques, escritório especializado no setor de infraestrutura. “No Brasil, a debênture incentivada de infraestrutura também poderia ser uma opção de financiamen-to das PPPs”, comenta. Até agora, no entanto, nenhuma parceria público--privada foi custeada por esse título, que oferece isenção de Imposto de Renda (IR) para os investidores estrangeiro e pessoa física nacional.

Quando se firma uma PPP, a conces-sionária do serviço cria uma sociedade de propósito específico (SPE), que pode ser sociedade anônima ou empresa limi-tada. Mesmo a segunda tende a adotar regras da Comissão de Valores Mobiliá- rios (CVM) de garantia de direitos aos minoritários e transparência dos resul-tados. Um exemplo é a PPP da rodovia BR-093, instituída entre o governo da Bahia e as empreiteiras Invepar e

Odebrecht Transporte. De acordo com Tatiana, o contrato da obra exige, numa cláusula, que as informações prestadas pela concessionária sigam as normas da CVM para empresas de capital aberto. Alguns convênios vão além: já requerem da SPE ser uma companhia aberta e, em alguns casos, ter valores mobiliários negociados no mercado. Esse tipo de cláusula existe, por exem-plo, no documento que norteia a PPP da Rodovias Tamoios.

Avanço moderadoAinda que a legislação tenha sido esta-belecida em 2004, apenas nos últimos cinco anos os contratos ganharam velocidade, tanto nos Estados como nos municípios. Para se ter uma ideia, no último ano, o número de PPPs na área da saúde aumentou quase 150%. As parcerias público-privadas também evoluíram no setor de saneamento, que registra mais de R$ 10 bilhões em negó-cios fechados recentemente ou em vias de serem selados.

Em fevereiro, a cidade de Paraty, no litoral fluminense, pactuou um con-vênio com a concessionária Água do Brasil, que deve gastar R$ 85 milhões nos primeiros quatro anos e R$ 145 milhões em três décadas. No triênio inicial da parceria, 100% da população que está na área da concessão receberá água tratada (inclusive em alta temporada) e, em cin-co anos, 82% do município terá esgoto coletado e tratado. A modelagem é iné-dita no Brasil. Além da contrapartida da prefeitura, a PPP conta com recursos do governo estadual, por meio do Fundo

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Estadual de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano, e do governo federal, via Eletronuclear, subsidiária da Eletrobras voltada à operação e à construção de usinas termonucleares. “No início, havia descrença e descon-fiança em relação às parcerias. Essas percepções foram sendo vencidas, ao mesmo tempo em que estados e municí-pios aprenderam mais com a legislação”, observa Albino.

A expansão dos procedimentos de manifestação de interesse (PMIs) tam-bém ajudou a fomentar o progresso das PPPs. Por meio desse instrumento, o setor público obtém estudos técnicos e de viabilidade econômica sobre pro-jetos de infraestrutura em sua agenda. A realização da pesquisa fica a cargo das empresas interessadas em disputar con-tratos de concessão. Devido à falta de corpo técnico em municípios e Estados para realizar esse tipo de análise, o PMI se tornou uma importante ferramenta para fazer as parcerias público-privadas saírem do papel. Desde 2011, quando os estados começaram a regular a legisla-ção do PMI, mais de cem procedimentos de manifestação de interesse foram feitos, segundo o coordenador do portal PPP Brasil, Bruno Ramos Pereira. Entre 2004 e 2010 ocorreram menos de 20. “O apetite por risco do agente privado cresceu a partir de 2011, com as indica-ções de mais projetos de infraestrutura no Brasil. Além disso, o investidor viu que integrar uma PPP significa estar presente num empreendimento de maior valor agregado, em que se parti-cipa de todo o ciclo de vida dele.”

Na visão de Rosane, do MHM, a regulamentação dos ramos de ativi-dade ligados à infraestrutura pode ser benéfica ao desenvolvimento das PPPs. O setor de saneamento, que concentra um quarto das parcerias público-priva-das, não tem uma agência reguladora federal, e alguns Estados também não contam com entidades para normatizar a atividade. “A presença de uma agência reguladora dá mais independência às decisões e confere maior segurança regulatória. No setor de saneamento, porém, não há indicação de que possa haver avanços em breve”, constata.

Albino, por sua vez, defende mudan-ças na tributação dos projetos erguidos pelas PPPs. Hoje, numa parceria que contemple a construção e a gestão de um hospital, por exemplo, a concessionária deve pagar PIS, Cofins e IR na etapa de construção. Um projeto de lei em tramitação no Congresso há três anos pretende isentar as PPPs de áreas sociais, como saúde e educação, dessas tarifas. “O Estado, que paga a contraprestação do serviço, acaba sendo onerado por essa estrutura, já que o agente privado repassa o custo”, diz o advogado.

Considerando que as intenções de investimentos em infraestrutura supe-ram R$ 1 trilhão até 2018 (de acordo com dados da Associação Brasileira de Tec-nologia para Construção e Mineração), muitas parcerias público-privadas ainda devem ser celebradas. Com o desejo do BNDES de aplicar menos dinheiro de seus cofres nessas obras, o mercado de capitais ganha uma chance de entrar em cena.

Quando se firma uma

PPP, a concessionária

do serviço cria

uma sociedade de

propósito específico

(SPE), que pode ser

sociedade anônima

ou empresa limitada.

Mesmo a segunda

tende a adotar

regras da CVM de

garantia de direitos

aos minoritários e

transparência

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Por Yuki Yokoi

“Quem opta por ser acio-nista de uma sociedade de economia mista tem plena noção de que o objetivo do controlador poderá não ser apenas o lucro, mas também a prestação de serviço

público e a satisfação do interesse comum da sociedade.” O trecho faz parte do processo administrativo que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) move contra a Eletrobras e que aguarda julgamento. Assinado pelo procurador da Fazenda Nacional Luiz Frederico de Bessa Fleury, em maio passado, faz parte da argumentação do governo fe-deral para justificar sua intromissão na companhia elétrica durante o polêmico episódio da renovação de concessões. A frase evidencia também o maior problema da companhia atualmente: o turvo limite entre os interesses da sociedade, do governo e dos acionistas privados da Eletrobras.

Maior empresa do setor elétrico em toda a América Latina, a Eletrobras

afunda. Desde o início do governo da presidente Dilma Rousseff, seu valor de mercado despencou 56%, de R$ 25,9 bilhões para R$ 11,4 bilhões. A ação ordi-nária caiu 54%, e a PNB, a mais líquida, 32%. O desempenho em nada lembra o registrado nos oito anos do governo Lula. De 2003 até 2010, ON e PNB avançaram 203% e 303%, respectiva-mente. Nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, o desempenho foi mais modesto, porém positivo: alta de 7% para as ordinárias e de 37% para as preferenciais. O mergulho da Eletrobras no pregão já supera o da Petrobras. Do início de 2011 até o dia 18 de setem-bro, as preferenciais da petrolífera esta-tal assolada por denúncias de corrupção desvalorizaram 8%. Procurada pela reportagem, a Eletrobras não concedeu entrevista.

A propensão do governo Dilma ao intervencionismo é a principal razão para o estrago. A mão pesada do Esta-do ficou clara com a edição da Medida Provisória (MP) 579, convertida na Lei 12.783. Editada em janeiro do ano passa-do, propôs a renovação antecipada das concessões que venceriam entre 2013 e 2017 e determinou o estabelecimento de novos preços. As tarifas, por megawatt--hora, caíram de cerca de R$ 90 para R$ 30. Com isso, a União queria reduzir o custo da energia também para os con-sumidores finais.

As companhias se viram obrigadas a tomar uma decisão: garantiam suas concessões e arcavam com os custos do desconto imediato nos preços ou mantinham as tarifas até o fim dos contratos, quando deveriam enfrentar uma licitação nova e correr o risco de não vencê-la. Apesar da dúvida, algu-mas rejeitaram a proposta — entre elas Cesp, Cemig, Copel e Celesc, empresas de estados comandos pela oposição ao governo federal.

Eletrobras perde metade do valor de mercado no governo Dilma, mergulha em prejuízos após mudança de tarifas e ainda torra reservas para pagar dividendos

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E s t a t a i s

44 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

Ao optar pelo acatamento das novas regras, a Eletrobras comprou uma briga das boas com o mercado. Os fundos geridos pela norueguesa Skagen, que tinham 10,35% das ações preferenciais antes da MP 579, deixaram a compa-nhia. Não, contudo, sem antes colocar a boca no trombone. Um de seus execu-tivos deu entrevistas à imprensa com-parando o Brasil à Venezuela. A asset também foi à CVM reivindicar que a companhia fosse punida por infringir o artigo 115 da Lei das S.As., que trata do abuso do direito de voto e de conflito de interesses.

A Skagen se refere à assembleia que aprovou a continuidade precoce das concessões e a redução de tarifas. No entendimento da gestora, a deci-são deveria ter ficado nas mãos dos minoritários, uma vez que o novo marco regulatório foi desenhado pelo governo federal e ele detém a maior parte das ações votantes da Eletrobras. A União, no entanto, simplesmente ig-norou o conflito e votou na assembleia de dezembro de 2012, desobedecendo o artigo 115 da lei. Segundo o dispo-sitivo, o acionista não deve votar nas deliberações de assembleia que possam beneficiá-lo de modo particular ou em que ele tiver interesse conflitante com o da companhia. A CVM decidiu proces-sar administrativamente a Eletrobras pelo voto abusivo — a data do julga-mento ainda não foi marcada. Outros minoritários prosseguem no confronto e estudam a hipótese de recorrer ao Judiciário.

Sem bateriaA adesão da Eletrobras à renovação antecipada também criou uma celeuma econômica. Na visão dos investidores, ao acatar as novas regras a companhia aceitou abrir mão de sua lucratividade. A Eletrobras é proprietária do maior sis-tema de geração e transmissão de ener-gia do País: entre seus ativos estão 50% do capital de Itaipu, subsidiárias como Chesf, Furnas, Eletrosul, Eletronorte e

Eletronuclear, diversas distribuidoras e metade das linhas de transmissão do Brasil.

Em 2012 e 2013, já sob o impacto do novo marco regulatório, acumulou pre-juízos de R$ 6,6 bilhões e R$ 6,2 bilhões, respectivamente. Em 2011, antes das mudanças, exibia lucro de R$ 3,7 bilhões. Entre os investidores, a expectativa é que, ao fim deste ano, o resultado seja novamente negativo.

Curioso que, a despeito dos prejuí-zos, a companhia se mantém uma boa pagadora de dividendos. Seu estatuto social é bastante generoso com os acionistas. Além de estabelecer um dividendo mínimo de 25% do lucro líquido, confere aos donos de ações pre-ferenciais A e B proventos prioritários de, respectivamente, 6% e 8% ao ano, calculados sobre o capital de cada classe. A benevolência serviu para atrair acio-nistas privados, mas hoje os dividendos prioritários consomem a reserva de lucro que a companhia armazenou. Em 2011, o estoque somava R$ 19,2 bilhões; no fim do ano passado, encolheu para R$ 11,7 bilhões.

Se a reserva acabar e puser fim aos proventos, os investidores que ainda veem algum atrativo na companhia podem seguir os passos da Skagen e ir embora. Um dos acionistas ouvidos pela reportagem acredita que os lucros economizados não sobreviverão ao exercício de 2015.

Para piorar, a Eletrobras ainda gasta dinheiro para consumar aquisições. No mês passado, foi fechada a compra de 51% da Celg, distribuidora perten-cente ao governo estadual de Goiás, por R$ 59 milhões. O negócio é, na verdade, uma operação de salvamento (e federalização) da empresa, atolada em dívidas. Enquanto a Eletrobras assumia o controle da companhia goiana, um despacho do Ministério da Fazenda permitia à União ser garantidora de um empréstimo de R$ 1,9 bilhão que a Caixa Econômica Federal concederá à antiga controladora CelgPar.

A Eletrobras possui

o maior sistema

de geração e

transmissão de

energia do País: entre

seus ativos estão

50% do capital de

Itaipu, subsidiárias

como Chesf e Furnas,

além de diversas

distribuidoras e

metade das linhas

de transmissão

do Brasil. Na visão

dos investidores,

ao acatar as novas

regras a gigante

aceitou abrir mão de

sua lucratividade

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Setembro 2014 CAPITAL ABERTO 45

À luz do interesse públicoAo mudar as regras do setor elétrico, o governo buscava baratear os preços cobrados pelas concessionárias e, por consequência, as tarifas pagas pelos consumidores. Só que deu tudo erra-do. Em abril, o Executivo autorizou as elétricas a aumentar as contas de luz de 24 milhões de brasileiros. A alta variou entre 11,6% a 29%, sob a justificativa de que, com a estiagem, as usinas térmicas foram mais demandadas — e a energia produzida por elas é cerca de oito vezes mais cara do que a das hidrelétricas.

Outros reajustes de preço são aguar-dados. No fim de setembro, o Ministério do Planejamento reduziu o repasse de R$ 4 bilhões para a Conta de Desen-volvimento Energético (CDE), fundo que vem ajudando a custear as dis-tribuidoras. Com o cobertor curto, a União fez isso para reforçar as próprias contas e manter o superávit primário. Sem a ajuda, a saída das elétricas será rever o preço cobrado do consumidor novamente.

A trapalhada do governo à frente da Eletrobras realçou um antigo problema das estatais que recorrem à bolsa de valores para captar recursos: a ampla interpretação do artigo 238 da Lei das S.As. O dispositivo iguala os deveres e as responsabilidades do controlador da sociedade de economia mista aos de qualquer outro, mas dá ao governo a possibilidade de “orientar as ativida-

des da companhia de modo a atender o interesse público que justificou sua criação”.

A expressão “interesse público”, apesar de citada à exaustão em leis e regras, não tem definição. No ramo bancário, criou-se um rito. Ao limitar a presença do capital estrangeiro nas instituições financeiras, a Constituição estabelece exceções, condicionadas ao alinhamento com o interesse público. Para comprovar esse requisito, é preci-so uma autorização expressa por meio de decreto presidencial. Foi assim que o Banco do Brasil teve sua fatia máxi-ma de estrangeiros ampliada de 20% para 30% e pôde migrar para o Novo Mercado da BM&FBovespa. No setor elétrico, não há como caracterizar o interesse público.

“A exceção aberta pelo artigo 238 não se sobrepõe ao entendimento de que a companhia de economia mista deve seguir todas as regras aplicáveis pela Lei das S.As. às demais empresas”, afirma Joaquim Simões Barbosa, sócio do escritório Lobo & Ibeas. Na avaliação do advogado, quando o diploma aborda o interesse público, refere-se à presta-ção de serviços necessários à sociedade que, do ponto de vista empresarial, não seriam a primeira escolha de uma com-panhia. “Um exemplo é a eletrificação de áreas rurais, que pode ser desenvol-vida em conjunto com outros nichos, de maior retorno”, aponta.

Outros circuitos Para prevenir a confusão entre os interesses econômicos e sociais — ou mesmo os do governo —, a Austrália adota um modelo rígido e simples: empresas estatais não podem ter ações negociadas em bolsa de valo-res. O objetivo é justamente prevenir conflitos entre os sócios. Já o modelo britânico é mais flexível. Concede a abertura de capital das companhias do Estado, porém delega às agências reguladoras a responsabilidade de definir preços e estipular a margem de lucratividade delas. Assim, embora as estatais não tenham a prerrogati-va de aumentar as tarifas para gerar mais lucro aos acionistas quando quiserem, tampouco podem abrir mão da produtividade.

Na visão de Emilio Carazzai, conse-lheiro de administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o Brasil deveria caminhar no sentido do modelo britânico, com agências reguladoras dotadas de mais autonomia e regras claras. “Hoje, o investidor está sujeito a uma gover-nança opaca nas companhias de capi-tal misto”, considera o executivo, que teve passagens por diversas empresas controladas pelo governo. Mas en-quanto as mudanças não acontecem, os fatos deixam a incômoda percepção de que o pior ainda está por vir para a Eletrobras.

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A n á l i s e s e t o r i a l

46 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

A fragilidade da economia brasileira brecou o crescimento das concessões de crédito. Ao redor de 20% em 2010, a expansão dos empréstimos deve cair à metade este ano. A desaceleração é especialmente temerosa para os bancos médios, focados na venda de financia-mentos. Os efeitos dela, contudo, não os prejudicam em igual medida, como mostram as cotações em bolsa. Enquan-to as ações de ABC Brasil, Banrisul, Sofisa e Daycoval exibiam valorização (do início do ano até 16 de setembro) de, respectivamente, 21,3%, 24,3%, 28,8% e 12,2%, os papéis de Indusval e Pan amargavam queda de 31,7% e 29,3%. A diferença pode ser explicada pelo mo-delo de negócio adotado por cada insti-tuição. Saem na frente aquelas voltadas à oferta de crédito para o segmento cor-porate — formado por companhias de faturamento maior — ou com atuação diversificada. Por Jiane Carvalho

Como a queda da cessão de empréstimos afeta as perspectivas dos bancos médios

É preciso diversificar

Tanto Pan como Indusval buscam o caminho da diversificação para voltar a operar no azul. Nenhum dos dois obteve êxito até agora. Com o pior desempenho em bolsa entre nove bancos médios ana-lisados (veja gráfico), o Indusval passa por uma reestruturação desde 2011. Um dos passos da iniciativa foi justamente a mu-dança no perfil de cliente atendido: a mi-gração do chamado “low middle market” para o segmento corporate, composto de empresas com faturamento superior a R$ 400 milhões. A reformulação do modelo de negócio também compre-endeu o incremento da distribuição de produtos e a definição de um setor como especialidade do banco: o agronegócio. Apesar dos esforços para se reinventar, o Indusval ainda não conseguiu se tornar lucrativo: teve prejuízo de R$ 9 milhões no primeiro semestre deste ano.

Em 8 de setembro, a Moody’s rebai-xou algumas notas do Indusval. Segun-

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Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 47

Somente ações conjuntas nas diversas áreas poderão melhorar a operação, mas isso ainda vai levar tempo”, acredita Alcir Freitas, vice-presidente e analista senior da Moody’s.

Quem também aparece com um desempenho pífio em bolsa é o Pan. Controlado atualmente pelo BTG Pactual, o banco visa se tornar menos dependente do crédito automotivo, até agora sem sucesso. Na visão de João Augusto Sales, analista da Lopes Filho & Associados, a conjuntura econômica atrasou os planos de diversificação do Pan, que busca ganhar espaço na oferta de crédito imobiliário e de recursos para companhias pequenas e médias. “Com a desaceleração da economia, a carteira de veículos não vai bem, e as outras cres-cem lentamente”, explica. No segundo trimestre, as concessões de emprés-timos para automóveis e imóveis no Pan recuaram, respectivamente, 11,1%

do a agência de classificação de risco, nos últimos seis trimestres consecutivos o banco reportou perdas ou pequenos ganhos, o que enfraqueceu sua capaci-dade de recompor capital por meio de geração interna de resultado. “O cenário econômico atual torna mais difícil para o banco gerar ativos saudáveis, assim como ganhar escala no médio prazo”, observa Alexandre Albuquerque, ana-lista da Moody’s. A agência pondera que, embora a instituição tenha gerido bem os custos operacionais das com-pras e parcerias realizadas, elas ainda precisam atingir o ponto de equilíbrio. Outra inquietude mora no arranjo da carteira de crédito do Indusval: 21% são direcionados ao setor do agronegócio e a indústrias relacionadas. A concen-tração elevaria o risco de qualidade dos ativos e de volatilidade de capital. “In-vestir num segmento específico, como o agronegócio, não vai ajudar muito.

e 28,1%, na comparação com o mesmo período do ano passado. Já a oferta de crédito para empresas subiu 11,9%.

Lugar protegidoEnquanto Pan e Indusval se esmeram para melhorar a última linha do balan-ço, ABC Brasil, Sofisa, Daycoval estão em situação mais confortável. O moti-vo é, principalmente, o tipo de cliente que atendem. No ABC Brasil, as linhas de empréstimo são destinadas prio-ritariamente a pessoas jurídicas com faturamento acima de R$ 500 milhões. “É um banco de nicho, com foco claro num público de risco menor”, define Sales, da Lopes Filho & Associados. En-quanto no acumulado de janeiro a agos-to, a busca por crédito entre as micro e pequenas empresas subiu 2,8% e nas médias recuou esse mesmo percentual, nas grandes ela evoluiu 8,2%, conforme dados da Serasa Experian.

Ilustração: Beto Nejme/Grau180.com

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A n á l i s e s e t o r i a l

48 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

No segundo trimestre, o lucro lí-quido do ABC atingiu 79,8 milhões (aumento de 12,8% em relação ao tri-mestre anterior e de 25,7% em relação ao mesmo período de 2013). A variação reflete não só o aumento das carteiras de crédito do banco, mas também a menor despesa com provisão para de-vedores duvidosos. Cerca de 97% das operações de empréstimo do ABC estão classificadas entre AA e C, numa escala em que AA representa créditos de maior qualidade e H indica os piores.

Assim como o ABC, o Sofisa foi bem--sucedido em ampliar a oferta de crédi-to. O banco atende a pessoas jurídicas e físicas, mas tem diminuído drastica-mente a concessão de crédito para este último público. “O Sofisa se deu muito mal no varejo no passado e foi obrigado a fazer um processo de limpeza dessa carteira. Hoje, ela corresponde a R$ 25 milhões, de um total de R$ 1,8 bilhão”, diz Freitas, da Moody’s. Enquanto a car-teira de financiamento para o segmento Empresas no Sofisa avançou 10,2% no segundo trimestre de 2014 em relação a um ano antes, aquela voltada para a pessoa física recuou 81,8%.

No Daycoval, a carteira de crédito corporativo também se expandiu: teve alta de 16,4% nos últimos 12 meses. O banco atende principalmente pessoas jurídicas com receita anual entre R$ 10 milhões e R$ 300 milhões. O grande des-taque, no entanto, tem sido a oferta de empréstimo consignado, que aumentou 47,2% de um ano para cá.

Horizonte nebulosoManter as carteiras de crédito rechon-chudas, no entanto, será um desafio. As instituições financeiras estão cientes de que as taxas de crescimento tendem a ser mais modestas daqui para a frente. O ABC Brasil, que esperava um avanço anual de 11% a 16% em sua carteira de financiamentos, recentemente reduziu essa projeção para o intervalo entre 10% e 15%. O Pine fez o mesmo: diminuiu a expansão prevista de 8% a 12% ao ano para 0% a 5%. “Diante das fracas condi-ções macroeconômicas do País, a cau-

tela das instituições de médio porte em relação ao crédito vai prosseguir”, res-salta Claudio Gallina, diretor da Fitch, lembrando que essa postura é comum a todos os bancos, independentemente do tamanho.

As recentes medidas anunciadas pelo Banco Central (BC) para estimular o crédito tampouco devem desanuviar o horizonte. Pelas novas regras, o BC deixou de remunenar 60% dos com-pulsórios sobre os depósitos a prazo (CDBs, por exemplo); ou seja, se o banco não emprestar esse dinheiro, ele ficará parado nos cofres da autoridade mo-netária sem rendimento. Para escapar dessa situação, os bancos têm algumas opções, entre as quais direcionar o

montante para o financiamento de ve-ículos e motocicletas ou para a compra de carteiras de crédito de instituições menores. É aí que os bancos médios poderiam se dar bem. Na opinião de Sales, da Lopes & Filho, porém, a me-dida deve surtir pouco efeito. “Se essas aquisições ocorrerem, serão pontuais, talvez voltadas para a compra de car-teiras de consignado ou imobiliário”, avalia. Um dos motivos é que, diante do risco crescente de inadimplência, o apetite dos grandes bancos por adquirir carteiras de crédito é reduzido. Do lado dos bancos médios, a necessidade de vendê-las também é pequena. “Não tem sentido captar mais com uma demanda tão fraca por crédito”, explica Alexandre Albuquerque, analista da Moody’s.

Diante da incerteza a respeito da retomada da demanda por crédito, é pouco provável que as ações das ins-tituições médias agucem o apetite dos investidores, ao menos no curto prazo. Para quem gosta de bancos, é mais van-tajoso, no momento, comprar papéis de instituições maiores, a exemplo de Bradesco e Itaú. De janeiro a 16 de se-tembro, suas ações valorizaram, respec-tivamente, 37,6% e 40,9%.

Como os grandes bancos têm atuação mais diversificada, seu resultado depen-de menos do humor de empresários e pessoas físicas em obterem crédito. Uma grande parte do que ganham vem das re-ceitas de serviços financeiros — linha do balanço que as instituições financeiras menores buscam incrementar. Do ponto de vista da obtenção de capital, também têm posição privilegiada, ao contar com o dinheiro barato proveniente da pou-pança de milhões de correntistas. Entre as médias, essa vantagem é usufruída pelo Banrisul, controlado pelo estado do Rio Grande do Sul. “Os bancos mé-dios são mais interessantes para quem tem um horizonte de investimento longo e, principalmente, para quem gosta de dividendos”, comenta Daniel Utich, da Fator Corretora. O Pine, por exemplo, oferece um retorno de 12,6% com dividendos, bem superior ao do Bradesco (2,9%). Fonte: Economatica.

Sob controleMaioria dos bancos médios mostra valorização, apesar do enfraquecimento da economia

Retorno entre 1/1 e 16/9/2014 (em %)

- 35 - 15 0 15 30

ABC Brasil — PN

Banrisul — PNB

Daycoval — PN

Bicbanco — PN

Indusval — PN

Pan — PN

Paraná — PN

Pine — PN

Sofisa — PN

21,3

24,3

2,8

12,2

- 31,72

- 29,29

- 4,7

- 11,47

28,78

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Venture Capital & Empreendedorismo é um informativo bimestral produzido por Derraik & Menezes Advogados e veiculado com exclusividade pela CAPITAL ABERTO.

A arbitragem, embora seja um método tradicionalmente mais caro do que um pro-cesso judicial, apresenta vantagens que ge-ralmente justificam sua escolha em opera-ções de venture capital.

Em primeiro lugar, destaca-se a possibi-lidade de as partes escolherem especialistas para atuar como árbitros no procedimento. Isso significa que o litígio poderá ser deci-dido por profissionais (advogados, acadêmi-cos, doutrinadores etc.) dotados de reconhe-cida intimidade com os conceitos, as regras e as terminologias próprias de uma opera-ção de venture capital. Por consequência, ha-verá decisões mais coerentes sem surpresas derivadas da inexperiência do julgador com a matéria.

A confidencialidade do processo tam-bém merece destaque. Enquanto na justiça comum ele pode ser consultado por qualquer interessado (salvo raras exceções) e a senten-ça é publicada em diário oficial, na arbitra-gem a regra é restringir o acesso aos autos e à decisão somente para as partes, seus pro-curadores e os árbitros e funcionários da câ-mara arbitral. Preservam-se, assim, aquelas informações que tanto investidor quanto in-vestido desejariam manter afastadas do co-nhecimento público.

Outra conveniência é a possibilidade de ditar as regras e os cronogramas que gover-narão a arbitragem, inclusive a data em que a sentença deverá ser proferida. Essa flexibi-lidade permite que as partes pré-estabeleçam prazos e mecanismos de acordo com a com-plexidade do litígio, otimizando os trabalhos.

Mas a qualidade mais marcante da arbi-tragem é, sem dúvida, a agilidade com que a

sentença é obtida, se comparada à realidade do poder judiciário, na qual juízes se veem cercados por milhares de processos que pro-vavelmente aguardarão outros tantos anos (ou décadas!) para serem finalmente julgados pelas instâncias superiores, após a interposi-ção de todos os recursos permitidos pela lei. Na arbitragem não há recursos e, como dito anteriormente, as partes podem escolher os árbitros e flexibilizar o procedimento, o que na prática resulta em sentenças promulgadas em meses ou, no máximo, um ano.

Se ainda assim o custo do expediente é fator de preocupação para as partes, há al-gumas formas de atenuá-lo: hoje o País con-ta com diversas câmaras de arbitragem, com custos igualmente variados, sendo prudente fazer uma pesquisa nesse sentido antes de es-tabelecer qual será a escolhida para dirimir as questões oriundas do contrato. Há ainda a possibilidade de definir qual parte será res-ponsável por custear um eventual processo arbitral — por exemplo, a parte reclaman-te, a parte vencida ou mesmo ambas as par-tes em igual proporção.

Embora ninguém em sã consciência cele-bre um negócio almejando um litígio, o fa-to é que as partes precisam estar preparadas para equacionar qualquer eventual desaven-ça no curso do contrato. A solução amigá-vel é sempre a melhor alternativa. Quando ela não se mostrar factível, entretanto, a ar-bitragem então se revela como procedimen-to muito mais adequado ao dinamismo e às particularidades de uma operação de ventu-re capital, ao oferecer a possibilidade de um resultado rápido e consistente com as práti-cas habituais do mercado.

As vantagens da arbitragem em operações de venture capital

Rodrigo Menezes ([email protected]) e Júlio Alexandrino ([email protected]) são, respectivamente, sócio-fundador e advogado de Derraik & Menezes Advogados

A qualidade mais marcante desse método é a agilidade da sentença

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A l t a & B a i x a

50 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

Os últimos resultados da Cemig fo-ram expressivos: lucros de R$ 1,2 bilhão no primeiro trimestre e de R$ 750 mi-lhões entre abril e junho. Mesmo com a queda, o número do segundo trimes-tre significa crescimento de 20% sobre o mesmo período de 2013. Esse avanço garantiu à ação da empresa de energia elétrica uma ascensão de 53,8% no acu-mulado de 2014, até 5 de setembro.

A alta seguiu a alteração das regras do setor pelo governo federal, com a Medi-da Provisória 579, em 2012. O objetivo era baixar a tarifa de energia para o con-sumidor final em 20%. O meio: anteci-par a renovação das concessões de usi-nas em troca de redução do preço médio pago pelo megawatt-hora (MWh) para R$ 30. Tendo em vista a perda financei-ra, Cemig, Cesp e Copel não aceitaram a proposta. Os contratos em vigor fo-ram mantidos — no caso da Cemig, por R$ 140 o MWh. A escassez de chuvas, no entanto, levou a um desequilíbrio entre oferta e demanda gerado pela queda da produção das hidrelétricas. Como re-sultado, as distribuidoras tiveram de recorrer ao mercado de curto prazo, no qual o preço atingiu estratosfériocos R$ 822,83 em setembro, beneficiando comercializadoras desse segmento — entre elas a Cemig.

Elétrica se beneficia de preços no curto prazo, mas enfrenta riscos judiciaisNo mesmo mês, contudo, diversos

bancos mudaram sua perspectiva para o papel da empresa. O BTG Pactual trans-formou a recomendação de compra em neutra. O J.P. Morgan baixou de neutra para abaixo do índice de mercado. E o Itaú BBA, embora preveja desempenho em linha com o do mercado, recomen-

dou postura mais cautelosa. Essas mu-danças ocorreram não apenas porque as ações já teriam subido muito, mas sobretudo por causa de um horizonte judicial nebuloso.

Na corte, a Cemig trava uma bata-lha decisiva com o governo federal pela usina de Jaraguá. A empresa reivindica prorrogar por mais 20 anos a concessão, vencida em 2013, enquanto a União quer a hidrelétrica de volta. Por enquanto, uma liminar permite à companhia man-ter a posse e comercializar sua energia no mercado de curto prazo. A decisão final sobre Jaraguá, provavelmente no Supremo Tribunal Federal, define o ce-nário para outras disputas que podem acontecer entre a companhia mineira e o governo federal. Na mira, as usinas de São Simão e de Miranda.

Não é pouca coisa: juntas, as três hidrelétricas respondem por 36,5% da capacidade total de geração da empresa. “Prevemos um cenário em que a Cemig será obrigada a depositar os lucros no tribunal”, dizem os analistas Paula Kovarsky, Giuliano Ajeje e Arthur Pe-reira, do Itaú BBA. Para não ficar refém dessa perspectiva desfavorável, a empre-sa adotou a estratégia de participar de todos os leilões de geração de energia que puder, inclusive de outras fontes, como a solar.

Por João Carlos de Oliveira

Brecha lucrativa Cemig

Cotações no fechamento (em R$)

GestoraValor investido28/2/2014 31/5/2014

Opus Gestão de Recursos

11 1.069

Quest Investimentos 30 2.816

Petra Asset Gestão de Investimentos

228 2.119

Morgan Stanley Administradora de Carteiras

0 40.101

SPX Gestão de Recursos 0 1.738

Angá Asset Management 0 1.345

Investidores que mais aumentaram a participação em ações ON da Cemig

Quem

mai

s com

prou

Quem

ent

rou

Fonte: Economatica. Foram consideradas as posições finais superiores a R$ 1 milhão. Valores em R$ milhares. Obs.: Os dados de 31/5/2014 eram os últimos disponíveis até o fechamento desta edição.

19,5522/8/2014

20

15

10

19,8124/7/2014

17,0017/9/2014

11,6217/3/2014

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Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 51

Elétrica se beneficia de preços no curto prazo, mas enfrenta riscos judiciais

Paranapanema

Poderia ser pior? Esta pergunta é o título do relatório do Banco Fator sobre a Paranapanema. As ações acu-mulavam queda de 53,7% no ano, até o dia 5 de setembro. E, de fato, 2014 não tem sido bom: a fabricante de catodos (cobre primário) e produtos de cobre fechou o segundo trimestre com um prejuízo quase seis vezes maior do que o registrado no mesmo período do ano anterior. Pior: teve queda de receita num momento em que os custos da matéria-prima estão em baixa. Segundo os analistas do Fator, este foi o quarto trimestre consecutivo de queda na ven-da de produtos semiacabados, o carro--chefe do futuro da empresa.

A frustração das expectativas é maior quando se leva em conta que a Paranapanema vinha se reestruturando e se preparou para um aumento das vendas. De olho no mercado de tubos de cobre para ar-condicionado, investiu em 2013 R$ 150 milhões na planta de um complexo em Santo André, o que ampliou a capacidade produtiva para 30 mil toneladas por ano. Devido à queda nas vendas, contudo, ela produz meras 1.400 toneladas mensais (em doze me-ses, 16.800). Outro investimento ocor-reu em Dias D’Ávila, na Bahia: R$ 330 milhões empregados para incrementar

o poder de produção anual — de 215 mil toneladas de catodos de cobre, em 2012, para 280 mil. No segundo trimestre, contudo, a empresa produziu 56 mil toneladas, o que dá um ritmo de 224 mil toneladas anuais.

Os dois investimentos faziam parte de um plano de voo orçado em R$ 1 bi-

Produtora de cobre tem resultados frustrantes depois de expansão operacionalCotações no fechamento (em R$)

Faltaram as vendas

lhão, que teve início em 2010. No meio desse ciclo, a companhia voltou ao radar dos analistas e do mercado. Seu papel registrou crescimento de 136% entre agosto de 2012 e janeiro de 2013. Por isso, apareceu no lado azul desta seção em março do ano passado.

Mesmo na época, porém, a situação não era confortável. Analistas da cor-retora Coinvalores criticavam o endivi-damento, considerado muito alto. Mas o mercado comprou a aposta de que a empresa seria favorecida pela chamada Resolução 13, que encerrou a guerra dos portos (disputa entre estados via redução de ICMS de importação). Com o fim do benefício aos estrangeiros, ela ganharia espaço da concorrência. Só que as vendas decepcionaram.

Agora, com um novo conselho eleito em abril e depois de três presidentes nos últimos três anos, a Paranapane-ma investe em mais um plano para se recuperar. A iniciativa visa reduzir custos, aprimorar a operação e elevar a receita. E, com resultados melhores, reconquistar a confiança do investidor.

A escolha das companhias para esta seção é feita a partir de um levantamento da Economática com a oscilação e o volume negociado mensalmente por ações que possuem giro mínimo de R$ 1 milhão por dia. A partir daí, são escolhidas aquelas que se destacam pelas variações positivas e negativas nos últimos seis meses.

GestoraValor investido28/2/2014 31/5/2014

BB DTVM 3.199 2.445

Fator Administração de Recursos

25.359 21.121

SulAmérica Investimentos

50.196 41.976

Nenhuma gestora com mais de R$ 1 milhão se desfez de sua posição no período.

Investidores que mais reduziram a participação em ações ON da Paranapanema

Quem

mai

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Fonte: Economatica. Foram consideradas as posições iniciais superiores a R$ 1 milhão. Valores em R$ milhares. Obs.: Os dados de 31/5/2014 eram os últimos disponíveis até o fechamento desta edição.

2,89 17/3/2014

4

3

22,84

4/6/2014

2,0421/8/2014

2,2117/9/2014

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N o t a s I n t e r n a c i o n a i s

52 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

Números grandiosos, à altura das ci-fras comuns na China — país de origem do site de comércio Alibaba. Essa foi a marca da abertura de capital da compa-nhia na Nyse, em 19 de setembro. A maior listagem já realizada no mundo levan-tou US$ 25 bilhões, ao preço de US$ 68 por ação. Não apenas o valor é alto; a desconfiança também.

De acordo com o estatuto, o conselho do Alibaba, com nove cadeiras, terá 44% de seus membros indicados por um gru-po de 27 sócios, composto pelo fundador

Quem colocou dinheiro na carteira MSCI EAFE, que contém 900 ações de países desenvolvidos (menos Estados Unidos e Canadá), perdeu 2,50% em 2014, até 23 de setembro, e ganhou 2,38% nos 12 meses encerrados no mesmo dia. Já quem apostou na MSCI BRIC, com 304 companhias de Brasil, Rússia, Índia e China, viu seu investimento subir, respectiva-mente, 2,13% e 0,65%. Satisfeitos estão aqueles que investiram no MSCI FM. O índice, que contempla 127 companhias de 24 mercados de fronteira, valorizou 18,14% neste ano e 25,36% de setembro a setembro. Trata-se de países sem estrutura para serem considerados emergentes ou desenvolvidos, mas com um ambiente vibrante o suficiente para atrair quem está disposto a correr um pouco mais de risco.

Os índices da consultoria MSCI são a base de muitos exchange traded funds (ETFs), os fundos de índice. Suas de-finições de países emergentes, desenvolvidos e de fronteira servem de referência para muitos gestores. A MSCI considera

Profissionais de compliance vivem momento crucial

Os profissionais das áreas de gestão de risco e compliance vivem um ano crucial: precisam elevar a carga de trabalho e ser mais diligentes. Uma pesquisa da Thomson Reuters ouviu 600 profissionais da área em 41 países entre novembro de 2013 e janeiro de 2014. Mais da metade tinha a expecta-tiva de ver sua responsabilidade pessoal crescer ao longo do ano; 17% supunham um aumento significativo.

As equipes de compliance também têm levado mais tempo para acompa-nhar mudanças regulatórias — um terço delas passa ao menos um dia inteiro por semana na tarefa. O estudo, divulgado em setembro, revelou ainda que as companhias estão buscando profissio-nais com mais experiência nessas áreas. Eles devem assumir a incumbência de implementar mudanças duradouras nos procedimentos de controle de riscos e fiscalização de conduta. Não à toa, dois terços dos entrevistados esperam um aumento da verba para o setor este ano.

Por Bruna Maia Carrion

Após maior IPO do mundo, Alibaba oferece riscos

Mercados de fronteira valorizam mais que emergentes e desenvolvidos

Jack Ma e por outros executivos. Essa fa-tia pode atingir 55% no futuro, indepen-dentemente da participação econômica dos 27. O desalinhamento, segundo a consultoria MSCI, não é o único risco a que a empresa e, consequentemente, seus investidores estão expostos. Ainda não sabe, por exemplo, como o Alibaba se sairá na integração das inúmeras empresas que adquiriu nos últimos 18 meses, nem como melhorará seu fraco controle de privacidade. Hoje, detém dados de 279 milhões de compradores.

32 países como fronteiriços. A lista é um balaio de gatos: países da União Europeia com bons índices de desenvolvi-mento humano e renda per capita considerável, a exemplo de Eslovênia e Bulgária, dividem espaço com repúblicas — e ditaduras — problemáticas em termos sociais, como Nigéria, Arábia Saudita, Palestina, Bangladesh e Zimbábue. Até mes-mo a vizinha Argentina integra o grupo.

Um relatório publicado em junho pela gestora escocesa Aberdeen explica o interesse por esses locais. “Políticas macroeconômicas melhores, decisões bem pensadas, esta-bilidade política e instituições independentes e bem geridas impulsionaram o crescimento de muitos países pobres”, afirma o documento. Outro motivo para o aumento do interesse por essas nações é justamente a existência de índi-ces específicos para elas, como o MSCI FM. Os indicadores fornecem um histórico de desempenho e facilitam a análise das gestoras de recursos.

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Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 53

A Rússia não comprou uma briga apenas com a Ucrânia ao anexar territórios do país, que pretende sair de sua esfera de influência e ingressar na União Europeia (UE). O entrevero é com o Ocidente como um todo. As potências europeias e os Estados Unidos não gostaram do avanço de Vladimir Putin na região e impuseram sanções econômicas a companhias russas. Uma das alvejadas foi a produtora de gás Gazprom.

Em uma nova rodada de sanções anunciada em 12 de setembro, a companhia entrou na lista das que não podem captar recursos em várias nações ocidentais — mais notada-mente, os 28 países da UE e os Estados Unidos. Antevendo esse tipo de movimento, em junho, a empresa começou a negociar recibos de ações (DRs, na sigla em inglês) na Bolsa de Valores de Cingapura. E, uma semana após o anúncio das restrições, em 19 de setembro, anunciou em sua conta oficial no Twitter que está conversando com a Bolsa de Valores de Hong Kong sobre uma possível listagem.

Produtoras de energia oriunda de fontes alternativas, como sol e vento, estão entre as empresas favoritas dos investido-res socialmente responsáveis (SRI). Em 2013, elas captaram US$ 250 bilhões em todo o mundo; neste ano, o montante deve se repetir. A partir de 2015, contudo, deve cair e se estabilizar em cerca de US$ 230 bilhões. Os dados são da International Energy Agency, organização formada por 29 países, entre eles Estados Unidos, Reino Unido e Japão.

A previsão acontece a despeito dos preços cada vez mais competitivos da energia renovável e do aumento de sua parcela na quantidade total de energia produzida no mundo. Em 2007, ela representava 18%; hoje, atinge 22%. Entre os motivos do prognóstico está a incerteza quanto ao sucesso dos negócios a longo prazo. É difícil estimar ganhos de escala e presumir em quanto tempo ocorrerão. O risco mais considerável, entretan-to, é político. O investidor prefere esperar para ver que rumos as nações vão tomar em termos regulatórios.

Na Itália, o gatilho para que um inves-tidor precise lançar uma oferta pública de aquisição de ações (OPA) por compra de fatia relevante na companhia agora varia conforme o tamanho da empresa. De acordo com um decreto publicado no fim de agosto, sócios de empresas grandes (com receita anual maior que € 50 milhões) que ultrapassarem 25% do poder de voto terão que fazer uma OPA. Antes, o gatilho era de 30% — proporção mantida caso a companhia tenha um controlador com mais de 50% do capital .

As empresas de pequeno e médio porte terão mais flexibilidade: poderão estabelecer o gatilho em qualquer pa-tamar entre 25% e 40%. Para as que não citarem o assunto no estatuto social, valerá o percentual de 30%. Como a le-gislação do país permite a existência de papéis com poder político diferenciado — existem ações com direito a dois ou três votos —, essa peculiaridade será levada em conta na hora de calcular se o limite foi ultrapassado.

Companhias pagam caro para brigar com ativistas

Incertezas mantêm investidor reticente com energia renovável

Itália reduz gatilho para ocorrência de OPA

As batalhas com investidores ativistas em 2014 custaram, em média, US$ 4,9 milhões para as empresas americanas. É o que revela um estudo publicado em setembro pela consultoria Activist Insight. Quanto maior a companhia, maior o gasto. As que possuem valor de mercado entre US$ 250 milhões e US$ 2 bilhões consumiram de US$ 1,5 milhão a US$ 2 milhões; as que têm capitalização até US$ 10 bilhões desembolsaram US$ 10 milhões. O dinheiro banca a defesa contra propostas que a administração julga ruins, o marketing jurídico para conquistar votos contrários a essas propostas e o reembolso do minoritário, caso ele vença.

O valor médio foi puxado por dispu-tas custosas, como a de Dan Loeb contra a empresa de leilões Sotheby’s. Loeb, da gestora Third Point, publicou uma carta em outubro de 2013 declarando possuir 9,3% dos papéis da empresa e estar preocupado com sua governança e seus resultados operacionais. Em maio deste ano, ele conseguiu uma cadeira no conselho, junto com dois aliados.

A empresa diz ter gastado US$ 5,7 milhões para se defender de Loeb e mais US$ 10 milhões de reembolso à Third Point por seus custos em sete meses de batalha. Somando a oscilação no preço das ações causada pela batalha, o valor total pode ter chegado a US$ 24 milhões.

Sob sanções do Ocidente, Gazprom foge para Hong Kong

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A r t i g o

54 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

A reunião é trimestral e os membros do conselho de administração chegam para aprovar as demonstrações finan-ceiras do exercício. Para a surpresa de alguns, não há parecer dos auditores independentes assegurando a quali-dade dos documentos em análise. Um silêncio paira no ar, até que um dos conselheiros exige o diagnóstico exter-no. O diretor-financeiro explica que ele será dado após a aprovação. Em suas palavras, essa prática, “de mercado”, tem sido adotada pela companhia já há algum tempo. A situação é incômo-da, porém os conselheiros validam os relatórios contábeis na expectativa de receber o posicionamento favorável do auditor independente na sequência.

Noutra companhia, os membros do board recebem previamente o parecer positivo dos auditores independentes e opinam a favor das demonstrações financeiras.

O contraste entre essas circunstân-cias se explica pelo exame do estatu-to social de cada empresa. A prática “de mercado” não garante conforto ao conselheiro. Afinal, a história está cheia de casos de companhias saudá-veis que anunciam esqueletos no ba-lanço de uma hora para a outra. E os conselheiros que o respaldaram podem ser responsabilizados.

Embora a situação não seja nova, ela é pouco discutida e merece análise detida da lei e do estatuto, para identi-ficar sua causa e as eventuais soluções. De acordo com o caput do artigo 176 da Lei 6.404, de 1976 (a Lei das S.As.), a

Por Felipe Kim*

Risco “de mercado”Conselho não deve validar os relatórios contábeis na expectativa de receber, na sequência, análise favorável do auditor

diretoria zelará pela elaboração dos relatórios con-tábeis da companhia ao fim do exercício. Os de- monstrativos, junto com o parecer dos auditores independentes, devem ser submetidos à confirma-ção da assembleia geral ordinária da companhia, conforme o artigo 133 da mesma legislação. A au- ditoria é obrigatória para companhias abertas e opcional para companhias fechadas (o mesmo vale para a existência de conselho de administração).

Entre o preparo das demonstrações financeiras pela diretoria e a aprovação pela assembleia geral, o estatuto social de cada empresa pode atribuir diferentes competências ao conselho. Em geral, o órgão ratifica os relatórios contábeis ou opina a respeito. Se ele tiver a autoridade, prevista no estatuto, de aprovar os documentos, também poderá deliberar mudanças neles. No caso de rea-lizar alterações, um novo parecer da auditoria será necessário, para contemplar os demonstrativos modificados. Assim, cumpre-se a exigência legal de submissão, à assembleia geral, dos documen-tos contábeis junto com o exame da auditoria independente.

Existe uma alternativa que torna o processo de aprovação mais eficiente e, também, evita que os membros do conselho de administração fiquem expostos ao risco de o auditor mudar de ideia. O es- tatuto pode atribuir à diretoria o poder de refe-rendar e ao conselho, a competência de opinar ou se manifestar. Com isso, o board não teria a autoridade de alterar as demonstrações, mas tão somente ponderar a favor ou contra elas. Essa se-quência de eventos levará a que o auditor emita o parecer antes da reunião do conselho, conferindo maior proteção a seus membros. Qualquer que seja o caso, o emprego da estrutura escolhida pode ser feito mediante alteração no estatuto social. O mais importante é contar previamente com a opinião da auditoria independente.

* Felipe Kim ([email protected]) é sócio do Tauil & Chequer Advogados

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Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 55

G o v e r n a n ç a

Um ou dois conselhos?

* Alexandre Di Miceli da Silveira é sócio- -fundador da Direzione Consultoria e autor de Governança corporativa: o essencial para líderes. O articulista agradece a Angela Donaggio pelos comentários e sugestões

Países se diferenciam em relação à estrutura de governança de suas companhias

Por Alexandre Di Miceli da Silveira*

Sistema monístico(conselho de administração)

Sistema dual(conselho de supervisão e conselho de gestão)

Opcional: monístico ou dual

Sistema híbrido

Austrália, Bélgica, Brasil, Canadá, Chile, Coreia do Sul, Espanha, Estados Unidos, Hong Kong, Israel, México, Reino Unido, Suécia e Turquia

Alemanha, Argentina, Áustria, Estônia, Indonésia, Polônia e República Tcheca

Dinamarca, Eslováquia, Finlândia, França, Hungria, Noruega e Países Baixos

Itália, Japão e Portugal

Na edição passada, apresentamos os dois sistemas de governança do mundo, categorizados em função da concentra-ção acionária típica das companhias. As nações também se diferenciam quanto à estrutura de governança exigida das companhias abertas. Há dois modelos predominantes: o monístico (“one-tier board”), em que há um conselho de admi-nistração, e o dual (“two-tier board”), com a presença de dois conselhos distintos.

A maioria dos países, inclusive o Bra-sil e os anglo-saxões, adota o sistema monístico. Nele, o board é responsá-vel por supervisionar a administração diária, fixar as diretrizes estratégicas e tomar outras decisões relevantes. Há flexibilidade na distribuição dos poderes da alta gestão: alguns conselhos tomam as resoluções de negócio de maneira centralizada, enquanto outros delegam (desde que a lei nacional permita) certas incumbências para comitês ou para a diretoria. No Reino Unido, por exemplo, apesar de o conselho ser responsável pelos temas mais importantes, ele tem a opção de transferir parte de seus poderes para comitês.

Um debate importante no sistema monístico diz respeito à presença ou não de executivos da companhia no co-legiado. Enquanto alguns países, como os Estados Unidos, advogam pela maior separação possível entre executivos e conselheiros, outros, a exemplo do Rei-no Unido, acreditam que a participação de executivos no conselho pode levar o órgão a tomar resoluções melhores.

O sistema dual foi criado pela Ale-manha e é adotado por alguns outros países. Aparece, ainda, como modelo optativo de governança na França e nos Países Baixos, entre outros lugares. Nele, há uma divisão bem definida de poderes entre o conselho de supervisão e o conselho de gestão. Essa segregação é reforçada pelo princípio da incompa-tibilidade, que impede qualquer pessoa de atuar simultaneamente nos dois órgãos, tendo em vista que um possui a função de supervisionar as atividades do outro. Como resultado, o conselho de supervisão é composto apenas de pessoas externas às operações diárias, enquanto o de gestão — responsável por determinar a estratégia da companhia — é formado pelo corpo executivo. No modelo dual, a flexibilidade para distri-buição de poderes é reduzida, já que a maioria das atribuições de cada um dos conselhos é indelegável.

O quadro acima, derivado de um estu-do recente da Organização para Coope- ração e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mostra como diversas nações

estruturam seu modelo de governança. Além da estrutura monística e da dual, existe a híbrida, adotada por Itália, Japão e Portugal. Nela, há um órgão estatuário adicional destinado a realizar atividades de auditoria.

Independentemente do sistema em-pregado, a maioria dos países exige, ou ao menos recomenda, maioria de con-selheiros independentes. Quatro deles (Chile, França, Israel e Estados Unidos) exigem um percentual mínimo desses membros que varia conforme a estru-tura societária. Na França e em Israel, por exemplo, as companhias sem acio-nista controlador devem ter maioria de independentes. Para aquelas com controlador definido, a exigência é de ao menos um terço.

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H i s t ó r i a s

56 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

O colapso de 1929

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A multidão concentrada

em Wall Street restou inerte,

assistindo à extinção

do sonho de constante

prosperidade

Outubro de 1929 marca o apogeu de um longo ciclo de desenvolvimento, seguido pelo maior crack já ocorrido nos mercados de ações internacionais. Corriam os últimos dias daquele mês quando a bolsa de valores de Nova York iniciou uma debacle que deixaria sinais indeléveis no século 20.

A década de 1920 se caracterizou como um período de grande opulência no mundo ocidental. Novas tecno-logias impulsionavam a evolução da humanidade: o rádio, o cinema e a aviação comercial representavam um crescimento que parecia não ter fim. O mercado de ações americano acom-panhou o fenômeno de modo frenético. Os papéis subiam constantemente. Era apenas, no entanto, o fim da alta de um largo ciclo econômico, como descreveu o russo Nicolau Kondratieff. O período de expansão é longo e suave, mas sempre se encerra com uma bolha espetacular. A contração seguinte é curta, dolorosa e deixa sequelas graves na sociedade — sobretudo desemprego e desalento.

Ao contrário do que rezam as teorias socialistas, não se tratou de uma crise do capitalismo, porém de um espasmo natural no caminho da própria huma-nidade. O progresso vem em ondas sucessivas de expansão e encolhimento, tal e qual o bater do coração humano. * Ney Carvalho é historiador e

ex-corretor de valores

O pânico começou na quinta-feira, 24 de outubro, conforme o mercado entrava na fase de queda vertiginosa. A multidão concentrada em Wall Street restou inerte, assistindo à extin-ção do sonho de prosperidade constante. No início da semana seguinte, o proces-so atingiu o paroxismo (o dia 29 ficou conhecido como Terça-Feira Negra). Não havia compradores para quaisquer títulos. A derrocada foi alucinante.

O problema maior estava em que toda a alta anterior do mercado se fundamentara num sistema de crédito denominado “call loans”, que os bancos punham à disposição dos investidores. Esses empréstimos, caucionados por ações, poderiam requerer novas garan-tias a qualquer momento, na medida em que o preço dos papéis se desvalorizasse em bolsa. Tais solicitações, apelidadas de margem, ocorreram em cascata, determinando mais e mais vendas de títulos, para poder suportar as exigên-cias solicitadas.

O sistema de crédito de chamada instantânea arrastou com seu método as economias, as esperanças e os sonhos de milhares de americanos que haviam enriquecido no mercado. De uma hora para a outra, eles foram conduzidos à bancarrota.

Por Ney Carvalho*

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58 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

R e t r a t o

Política na vida

Por Marta Barcellos Foto Aline Massuca

Domingo, 27 de outubro de 2002. Sem acesso à televisão, proibida no prédio da Universidade de Oxford, Matias Spektor toma conhecimento da vi-tória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais pelo rádio. Há dois meses cursando o doutorado em política e relações internacionais,

ele está tão adaptado aos rituais centenários da instituição — como jantares de toga à luz de velas — que acaba de pedir demissão do sólido emprego no escritório das Nações Unidas (ONU) no Brasil, para arrepio dos pais. Ficará mais cinco anos estudando na Inglaterra.

“Eu não queria ser um burocrata”, conta hoje o professor de relações internacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro e colunista de política externa da Folha de S. Paulo. “Já estava com 24 anos, e vendo o bonde passar.” O bonde, no caso, era seu fascínio pelo sistema educacional britânico, “um mundo de Harry Potter” onde estudantes tinham seus trabalhos acadêmicos destruídos por tutores, depois de passarem a se-mana lendo na biblioteca. “Ali, a educação é um processo de aprender a se defender”, explica, com entusiasmo. Foi nesse ambiente de forte estímulo intelectual que um dos colegas de doutorado o questionou, durante o almoço de 28 de outubro: por que não estava ouvindo pelo rádio os anún-cios do novo governo? Ora, a posse no Brasil só acontece em 1o de janeiro, ele respondeu, para

M a t i a s S p e k t o rdepois refletir e tomar notas sobre a complexi-dade daquela situação.

Passados 12 anos daquele momento, o assunto de Spektor voltou a ser eleições e transição. Isso porque o novo livro deste “intelectual público” — o que ele preferiu ser, em vez de burocrata da ONU — partiu justamente da reflexão feita naqueles primeiros dias de rádio e luz de velas. E está sendo lançado em meio a uma eleição tão disputada quanto a de 2002. Em 18 dias: quando Lula e FHC se uniram para conquistar o apoio de Bush, o professor relata como os dois ex-presidentes brasileiros trabalharam juntos para debelar uma grave crise de imagem do País, que levava o mercado financeiro internacional a apostar contra o real.

Os bastidores do poder, levantados em dezenas de entrevistas e documentos secretos, mostram hoje como a polarização típica das campanhas eleitorais não impede entendimentos políticos posteriores. A leitura suscita especulações sobre o período de passagem que começará neste mês. “As pessoas não percebem a complexidade de uma transição no Brasil”, observa Spektor. “Mesmo em caso de reeleição da presidente Dilma Rousseff, a coalizão governista precisará ser costurada no-vamente e a composição do poder, redesenhada, com mudanças nos comandos da Câmara dos Deputados, do Senado e de cada ministério. Quem ganhar terá que se mover muito rápido para mandar sinais claros ao mercado de uma retomada da economia em 2015. A tensão sempre existe, porque é necessário trocar a roda com o carro em movimento.”

A linguagem clara e precisa de Spektor, mais jornalística que acadêmica, segue o atual objetivo de “alcançar um público leigo de forma sofistica-da” com os livros e pesquisas. Da mesma forma, sua mistura de sotaques revela uma vivência in-ternacional preciosa nas análises. Carregando o sobrenome ucraniano do pai urbanista e a cultura ítalo-espanhola da mãe psicanalista lacaniana, Matias Spektor nasceu em Rosário, no interior da Argentina, passou a infância em Buenos Aires e mudou-se com a família para Salvador aos 10 anos. “Sou baiano”, ele brinca, ao justificar a preferência por praia de água morna. Diferente do mar gelado do Rio, onde voltou a morar depois de nova tem-porada no Reino Unido — desta vez, ocupou a Cátedra Rio Branco no King’s College de Londres, para escrever o livro que está lançando.

Entusiasmado tanto por praia quanto por rituais britânicos centenários, ele só não parece

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Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 59

Matias Spektor, professor de relações

internacionais da Fundação Getulio Vargas:

“As pessoas não percebem a complexidade

de uma transição no Brasil. É necessário

trocar a roda com o carro em movimento”.

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R e t r a t o

60 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

ter saudades de Brasília, onde morou sete anos para fazer a faculdade e o mestrado em relações internacionais na UnB, depois de descartar o curso de filosofia por duvidar da viabilidade de uma carreira de filósofo. “Sempre pre-cisei trabalhar. No colégio, dava aulas de espanhol. Na faculdade, traduzia documentos jurídicos para empresas estrangeiras interessadas na privati-zação do sistema Telebras, para poder passar as férias na Inglaterra.”

Após o doutorado em Oxford, cuja tese resultou no livro Kissinger e o Bra-sil, ele não hesitou em relação ao país onde buscaria o novo emprego. “Vi pelo lado de fora a transformação brutal que se iniciava aqui. E percebi que a opi-nião pública brasileira, mesmo aquela educada e de classe média, não tinha ideia de como a política externa e as relações internacionais afetam sua vida cotidiana. Quis voltar para assumir esse papel”, diz Spektor. Na FGV, ele não só se dedicou a levar esse conhe-cimento aos alunos como também agiu na mão inversa. Em viagens ao exterior para divulgar a criação do Centro de Relações Internacionais da fundação, que coordenou, e levantar fundos, era chamado para dar palestras e participar de debates sobre o Brasil, visto à época como país em franca ascensão. “Isso foi entre 2009 e 2010. Eu não dava conta da demanda”, lembra.

Ainda hoje, por causa da repercus-são da coluna na Folha, recebe muitos e-mails de estrangeiros — de acadê-micos a operadores de mercado — in-teressados em suas análises. É nessa troca permanente de pontos de vista que Spektor se abastece diariamente: “O fascínio das relações internacionais é que os mesmos acontecimentos são interpretados de maneiras radicalmen-te distintas, dependendo de onde você está no mundo. Não é verdade que a internet derrubou as fronteiras. Elas existem e são muito reais”. Com tantas experiências e referências internacio-nais aos 37 anos, Spektor sabe, como poucos, a importância da geopolítica na vida das pessoas.

Rotina – Saiu de uma rotina “de monge” no King’s College de Londres, onde passou um ano redigindo seu último livro, para voltar a escrever artigos e dar aulas no Rio de Janeiro. “Estou aproveitando a calmaria para começar o projeto do próximo livro.”

Atividade física – Por ser “horrível” em esportes com bola, passou a adolescência imerso em livros. Hoje encontrou atividades de que gosta: em Londres remava às 6h com os amigos da faculdade; no Rio, pratica corrida, “olhando aquela pedra maravilhosa [da Urca]”.

Férias – São raras. O máximo que consegue é passar uma semana na Bahia, na praia de Imbassaí, durante o inverno (“Adoro praia com chuva”). No entanto, sempre se hospeda na casa de amigos em países como Índia, Estados Unidos, África do Sul, Egito e Irã. “Não viajo para passear, mas para conversar com as pessoas e visitar os estabelecimentos políticos das nações.”

Livro na cabeceira – Ficou encantado com o romance Nação Crioula, do angolano José Eduardo Agualusa, e agora está imerso no “melhor livro de história de todos os tempos”: O império de Hitler, de Mark Mazower. “Um livraço. Leio muita história internacional.”

Fim de semana – Vai à praia e gosta de caminhar e almoçar no bairro de Santa Teresa, em geral com os amigos estrangeiros hospedados em sua casa. “Sempre tenho um ou dois.”

Rede social – É atuante no Twitter e no Facebook, onde tem 1.467 amigos. “Fico sabendo o que está sendo publicado e descubro o que os meus alunos assistem. Foi assim que encontrei o Porta dos Fundos [canal de humor no Youtube].”

Série na TV – Gosta de House of cards e recomenda seu equivalente dinamarquês, o se-riado Borgen, sobre as disputas políticas em torno da ascensão de uma primeira-ministra. “Também adorei Breaking bad.”

Melhor momento – As entrevistas que fez para a pesquisa do livro 18 dias, que incluíram conversas com os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Lula e com a ex-secretária de estado americana Condoleezza Rice. “Ao entrevistar operadores políticos de primeiro nível, com anos de experiência nas costas, aprendi o que não está nos livros.”

Momento mais difícil – A escrita do livro. “Foi um processo sofrido. Eu nunca estava satisfeito com o resultado. Era a primeira vez que escrevia para um leitor leigo.”

Próximo livro – Contará a história de como o Brasil se tornou o único país dos Brics que nunca fez um explosivo nuclear. “Havia gente que queria ter feito.”

Uma inspiração – Seu orientador de doutorado, Andrew Hurrel (“Converso com ele 20 minutos e saio cheio de ideias”), e o professor de literatura David Jordan, uma espécie de padrinho que o abrigou em seu primeiro curso de inglês em Londres.

Conselho para quem está começando – “Siga a sua curiosidade até o limite.”

3 x 4

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P r a t e l e i r a

Outubro 2014 CAPITAL ABERTO 61

P r a t e l e i r a

Não é todo dia que encontramos um livro elogiado por Bill Gates e Warren Buffett. Ao ler o comentário de Gates em seu blog sobre a reimpressão de Busi-ness adventures, fiquei bastante curioso, ávido por consumir esse clássico do iní-cio dos anos 1970. A obra do jornalista John Brooks é uma coletânea de artigos escritos na década anterior, sobre fatos bastante diversos da vida corporativa e financeira dos Estados Unidos. Eles analisam desde o espantoso fracasso do automóvel Edsel, da Ford, até a vertigi-nosa ascensão da Xerox Corporation.

A prosa é ágil e elegante. O leitor mal se dá conta das mais de 450 páginas, ain-da que a nova era dos livros eletrônicos

mitigue o peso psicológico de se enfren-tar uma “bíblia”. Embora a obra já passe dos 40 anos, os assuntos abordados são extremamente atuais, reforçando a noção de que a história se repete. Há relatos sobre insider trading, formação de cartéis e ataques especulativos contra a libra esterlina — assuntos frequente-mente estampados na primeira página dos jornais contemporâneos.

Em particular, dois capítulos me atra-íram mais, apesar do desfecho diametral-mente oposto: o sucesso da Xerox e o fracasso do Edsel. Enquanto o primeiro conta a saga do desenvolvimento das copiadoras e o aparente caos inerente às inovações disruptivas, o segundo narra o processo planejado e organizado para torrar mais de US$ 350 milhões no lan-çamento de um carro que sofreu rejeição absoluta do consumidor americano.

A despeito da paleta multicolorida dos tópicos apresentados pelos 12 ca-pítulos, é possível identificar um traço comum às histórias. Todas elas tratam de situações empresariais em que a li-derança organizacional é determinante para seu desfecho. O êxito e o fiasco têm como origem o papel desempenhado pelos responsáveis pela tomada de de-cisões em cada companhia. No caso do Edsel, fica clara a desconexão entre o

O tempo melhora os clássicos

Por Peter Jancso*

* Peter Jancso é professor de finanças corporativas da Business School São Paulo e sócio da Jardim Botânico Investimentos

Business adventures: twelve classic tales from the world of Wall Street

John BrooksEditora: Open Road Media476 páginas1a edição, 2014 (reimpressão)

discurso da direção da Ford e a prática na linha de frente junto aos consumido-res. Ao descrever a saga que foi a defesa da libra esterlina ante sua desvaloriza-ção, o autor reconta o enorme esforço dos banqueiros centrais sob o comando dos Estados Unidos para atuar de for-ma coordenada no controle da crise financeira. Ela ameaçava as principais economias do mundo na época.

Nas palavras de Bill Gates, um cético poderia muito bem se perguntar o que uma coleção de artigos da década de 1960 tem a ensinar sobre o mundo dos negócios hoje em dia. Naquele momen-to, uma copiadora Xerox custava o pre-ço de uma casa e vinha com um extintor de incêndio, devido a seu péssimo hábi-to de superaquecer. Certamente, muita coisa mudou desde então. Os fun- damentos econômicos e de negócios, no entanto, permanecem os mesmos, assegurando a longevidade e a relevân-cia da obra de Brooks. Assim como os bons vinhos, os verdadeiros clássicos parecem melhorar com o tempo.

A fina arte do jornalismo de negócios em doze capítulos escritos na década de 1960

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S a i d e i r a

62 CAPITAL ABERTO Outubro 2014

resultadosuuuuuuuuuuuuuu

fora!o que aconteceu? nossos números estão ótimos...

chefe, acho que você esqueceu... esta é a reunião

com os investidores que alugam ações.

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