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Sem dar trégua ao fumo de mascar, Henrique descre-ve como é o manejo dos animais. No final do dia, já juntoàs mães, conta ele, os cordeiros meio-sangue da raçadorper podem mamar à vontade, até a manhã seguinte,quando as ovelhas voltam ao pasto. "Corn essa estratégia,eles vão aos poucos se acostumando ao novo alimentoe a ficar sem as mães, o que provoca menos stress nodesmame", afirma. Henrique explica que, uma vez des-mamados, os machos seguirão para um confinamentoa uns poucos quilômetros de distância, juntando-se aoscordeiros de outros produtores da região. Já as fêmeaspermanecem ali mesmo; mais tarde, irão receber sêmendorper, integrando assim o programa de produção dereprodutores e matrizes da raça desenvolvida na Áfricado Sul, a mais recente fonte de renda da propriedade.

A rotina de criação na Cabanha Hapar resume, emboa medida, as estratégias que têm sido adotadas pelaovinocultura em São Paulo - e que também já rendemfrutos para a atividade em todo o país. Investimentosem genética e em cruzamentos industriais, assim comoa adoção de procedimentos diferenciados de manejo ede comercialização, estão entre os fatores que têm dadomaior vigor aos balidos nos campos paulistas. A voz decarneiros, ovelhas, borregos e cordeiros - ou seja, de

toda a família dos ovinos - vem se popularizando pelointerior do estado e já soa mais forte no panorama agro-pecuário nacional.

Há quem sustente que o rebanho de São Paulo jábeire um milhão de cabeças. Não é o que diz o IBGE -Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística: os dadosapurados pelo Censo Agropecuário 2006 indicam umvolume que mal chegaà metade disso. Pelas informaçõesoficiais, a quantidade de animais em todo o territóriopaulista é menor do que a soma das populações de ovinos

em Santana do Livramento e Rosário do Sul, na Campa-nha gaúcha, ou igual à da região baiana de Euclides daCunha (que inclui Uauá, a "capital do bode", mas quetambém poderia ser a capital do ovino deslanado), sópara citar dois exemplos nos estados onde estão os maisvolumosos e tradicionais rebanhos brasileiros.

iVías não é a quantidade que tem feito a ovinoculturapaulista tomar corpo. "O rebanho em São Paulo cresceu75% nos últimos dez anos, já é o sétimo em tamanho nopaís, mas o mais importante é que este é ura dos locaisonde a cadeia de produção está mais estruturada", afirmaArnaldo dos Santos Vieira Filho, o Dindo. Dividindo-seentre uma meia dúzia de cargos e atividades ligados ao

segmento - entre eles, o de presidenteda Associação Paulista de Criadores, aAspaco, e o da câmara setorial do esta-do, além de produtor e dono de loja deartigos para ovinos -, o que lhe obriga apassar quase o tempo todo com o celu-lar em punho, Vieira Filho é, realmen-te, uma espécie de padrinho do setor.Criador desde 1999, é um entusiasta daovinocultura no estado. "Nessa últimadécada, muita gente percebeu que osovinos são uma boa alternativa paraas propriedades paulistas, pois ofere-cem boa rentabilidade por área, ciclocurto, giro rápido e aproveitamento deterrenos marginais", enumera Dindo.

Vieira Filho ainda afirma que, ocu-pando áreas caras e pequenas, a ativida-de em São Paulo tende a se concentrarna produção de genética e de carne dealtíssima qualidade, em sistemas inten-sivos de criação.

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O presidente da As-paco sustenta que o ovi-no foi o primeiro animala ser domesticado pelohomem. "Só que sua car-ne sempre foi deixada emsegundo plano em rela-ção à pele e à lã", afirma.O produto, entretanto,estaria atravessando ummomento de grande va-lorização, sobretudo acarne jovem e macia decordeiro.

"No Brasil, há quem estime o consumo por habitan-te em 700 gramas por ano, enquanto outros já falamem 1,5 quilo; de qualquer modo, os números refletemum grande consumo reprimido, pois não há carne su-ficiente para atender à demanda", diz. Arnaldo VieiraFilho, lembrando que, somente em São Paulo, 60%do mercado é suprido por produto importado. "Partedisso vem da Argentina, mas a maioria tem origem noUruguai e nem sempre é de qualidade: muitas vezes éproveniente de animais refugados da produção de lã",afirma o representante da Aspaco.

Ele admite, entretanto, que do país vizinho tambémchegam bons cordeiros, criados em excelentes pastagense com custo baixo de produção. "A carne uruguaia évilã da brasileira nos preços, mas faz um ótimo papelao suprir o mercado e dar visibilidade ao produto, in-centivando a compra. Se ela não chegasse ao país, oabastecimento poderia ser feito por carne de ovelha, porexemplo, mais dura e gordurosa, o que faria o consumoper capita andar para trás", afirma. "Ruim com a carneuruguaia, pior sem ela."

Arnaldo Vieira Filho acredita que o Brasil possavir a se tornar um dos grandes produtores mundiais decarne de ovinos, como já é de bovinos e aves. Mas eleafirma que, como toda atividade nova, a ovinoculturaainda enfrenta entraves e carece de ajustes. "A cadeiaainda está em organização, e necessitamos de maior pro-dução. Mas há interesse de todos os elos em melhoraressa situação, dos produtores aos institutos de pesquisa,dos fabricantes de ração aos frigoríficos. E é em SãoPaulo onde essas ações são mais visíveis."

Uni dos obstáculos ao desenvolvimento do setor,segundo ele, é a comercialização. Geralmente sem terquantidade e regularidade para ofertar aos frigoríficos,os criadores padecem com a baixa lucratividade na

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venda de cordeiros ou até com a impossibilidade decolocação da produção. Esse impasse começou a sersuperado com uma ação da Aspaco, que incentivouseus associados a vender cordeiros conjuntamente aosabatedouros. Com maior volume de animais, o poderde negociação melhorou, o frete diminuiu e os preçosforam mais justos do que quando cada ovinocultoroferecia separadamente suas crias. "Há algum tempotenho feito palestras pelo pais relatando as experiênciasda associação, e agora vejo outros criadores seguindoesse exemplo, como grupos de Mato Grosso do Sul",diz Vieira Filho.

Um passo mais largo em prol da comercializaçãocomeçou a ser dado há pouco mais de um ano, com oinício das operações dos confinamentos coletivos. Seisdos 16 núcleos de produtores da Aspaco já mantêmáreas onde se terceiriza a engorda de cordeiros dos asso-ciados. A maior delas está em Araçatuba. No municípiopaulista que já foi chamado de terra do boi gordo - e quehoje está mais para terra da cana-de-açúcar -, centenasde borregos multicores ocupam as diversas divisões deurna antiga instalação, erguida há 60 anos para receberboiadas vindas de Mato Grosso. Quando os bichos sealinham nos comedouros, assim que a ração é renovada,é possível perceber que, se lhes falta uniformidade nacor da peiagem, em razão da variada composição racial,eles estão parelhos em tamanho e peso.

Ao serem trazidos por seus proprietários, os cor-deiros passam por uma seleção, durante a qual sãovistoriados, pesados e identificados. Em seguida, sãodistribuídos em baias de acordo com suas características- os maiores de um lado, os mais leves de outro, fêmeasmais adiante, os mais novinhos em outra divisão, etc.Passam então a conviver apenas com animais muito si-milares, recebendo ração balanceada (do tipo total,-quejá contém volumoso) até atingir o peso de abate, acimados 30 quilos. "Na propriedade do criador, um bichopequenininho vai sempre continuar assim, pois teráque disputar o cocho com animais maiores", comentaGuilherme Cazerta Lemos, diretor do confinamentodo núcleo de Araçatuba.

Seja qual for o tamanho do lote do ovinocultor - de100, dez ou dois animais -, todos são bem-vindos. "Masos cordeiros precisam ser dente-de-leite, desmamados,vermifugados e vacinados contra clostridiose", ressalvao diretor. Ele afirma que os animais passam em média60 dias no confinamento coletivo, mas não há peso

mínimo para sua aceitação. Feitaa entrega para o frigorífico, o valorda venda é repassado aos produtores,descontando-se o preço da "estadia". Para cadacordeiro, é cobrada uma taxa de 75 centavos dereal por dia de permanência no confinamento."Não é barato, mas é muito interessante para ocriador, que assim não precisa comprar ração e tem co-locação garantida do produto, no momento em que eleestá pronto para o abate", diz Vieira Filho. "A principal

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SILVIO OLIVEIRA,do Cordeiro Brasileiro:busca por animaispadronizados econstrução deindústria para produzirlingüiça, almôndega e"kit buchada"

vantagem é que isso permite que eu tire logo os animaisda propriedade, liberando áreas para outras atividades ediminuindo a necessidade de mão-de-obra", diz Henri-que Ribeiro, da Cabanha Hapar.

O diretor do confinamento lembra que dar finalidadecomercial a um rebanho de ovinos ainda é relativamenterecente. "Ainda é muito comum um vizinho pedir aoutro um cordeirinho, dar o bicho de presente etc."Lemos conta que recentemente manteve um grupo dedez animais no sítio do sogro, mas só pôde levar seis aoconfinamento. "Quatro viraram churrasco. E, se demo-rasse mais tempo para trazer os demais para cá, outrosteriam o mesmo destino", brinca.

Um dos principais clientes do confinamento coleti-vo de Araçatuba é o frigorífico Cordeiro Brasileiro, dePresidente Prudente, SP. "Essa ação é muito importanteporque precisamos de carcaças padronizadas", afir-ma Silvio César Oliveira, administrador da empresa,"Nosso produto segue para restaurantes e redes de

supermercados, que exigem peças de mesmo ta-manho". O frigorífico, que opera há três anos

e abate uma média de 700 animais por mês,é uma das primeiras plantas paulistas cons-truídas especialmente para ovinos. Alémde comercializar peças tradicionais como

pernil e paleta, o Cordeiro Brasileiro também trabalhacom produtos diferenciados, corno picanha e "frenchrack", um corte especial da costelinha. A empresa tam-bém está se verticalizando: ao lado do abatedouro, já estáem fase final de construção urna agroindústria, que nosegundo semestre deverá produzir lingüiça, almôndega,espetinho, kafta e até um "kit buchada", vísceras já tem-peradas para preparar o famoso prato nordestino.

"Optei por começar a operar o frigorífico já como SIF, para abrir mais portas no mercado e vender aqualquer parte do país", afirma Oswaldo Athia, donoda empresa. O médico aposentado conta que passou acriar algumas cabeças de ovinos em sua chácara de lazerapenas para "manter a grama baixa". Só que não houvegrama nem espaço suficientes para o plantei, que acaboupor se multiplicar em mil fêmeas confinadas, levando-o amontar o frigorífico para abater os cordeiros produzidos.A criação foi deixada de lado, porém, elaborando-se umprojeto para a produção integrada de ovinos com cria-dores do Pontal do Paranapanema, no extremo oestepaulista, mas que também não foi adiante.

Hoje, o frigorífico é abastecido por propriedadesque estão num raio de 300 quilômetros de PresidentePrudente, o que engloba áreas dos estados do Paraná e

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Mato Grosso do Sul. "A falta de cultura comercial paraatividade faz com que a qualidade geral do rebanhoainda seja baixa", diz Athia. De acordo com o admi-nistrador Oliveira, o frigorífico só adquire animais quesejam pelo menos serniconfinados, com peso entre 28e 40 quilos, idade de até oito meses e provenientes deraças lanadas destinadas à produção de carne ou decruza com deslanadas.

Todos esses quesitos são obedecidos pelo núcleode criadores de Araçatuba, que recebe um preçodiferenciado no mercado, de 102 reais por arroba."Essa ação do confmamento coletivo é muito in-teligente, pois, de um lado, resolve o problema decriadores que não têm volume, e, de outro, fornecematéria-prima de melhor qualidade aos frigoríficos",diz Valdomiro Poliselli Júnior, uma voz forte da ovi-nocultura empresarial em São Paulo. Sua empresa,a VPJ Pecuária, atua, por exemplo, na produção dealta genética da raça dorper, trazendo para as insta-lações no município paulista de Jaguariúna sêmenimportado da África do Sul e embriões coletadosnuma criação própria na Austrália. A VPJ tambémtem um frigorífico que abate mil cordeiros por mês,restringindo-se a animais que tenham ao menos 50%de sangue dorper e no máximo 150 dias de vida.

"Iniciativas como as dos núcleos de produtores sãoimportantes e demonstram bons resultados; já compreimuito animal produzido por eles", diz Poliselli. O em-presário afirma que a ovinocultura é uma opção valiosapara pequenas propriedades e para áreas quebradas,onde não é possível trabalhar com a cana, por exemplo."A demanda de mercado é muito interessante para umestado onde as atividades dificilmente remuneram ovalor das terras", acredita.

"Mas a verdade é que ainda é grande a falta de pa-dronização dos cordeiros nos criatórios". Poliselli ex-plica que para obter os produtos que levam a marcaCordeiro Prime VPJ, presente em restaurantes e redesde supermercado como Muffato e Wal-Mart, necessitade "picanhas todas iguais, carrés todos com a mesmabitola". "Para chegar ao cordeiro padronizado, é precisopensar antes na padronização das mães",' afirma.

Em busca dessas características, a VPJ vem montandoum projeto de integração com criadores gaúchos desde2005. Poliselli espera fechar este ano com a contrataçãode 15 mil ovelhas de cerca de 30 integrados para produzircordeiros dorper cruzados. "O diferencial no Rio Grandedo Sul é a tradição dos produtores, que têm fazendasequipadas e rebanhos padronizados, de onde sairão cor-deiros mais homogêneos", diz o empresário.

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Fonte: Globo Rural, a. 23, n. 269, p. 42-49, mar. 2008.