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  • 1. Francisco Plato Savioli e Jos Luiz Fiorin Verso impressa Editor-chefe Carlos S. Mendes Rosa Editores assistentes Frank de Oliveira e Tatiana Corra Pimenta Coordenadora de reviso Ivany Picasso Batista Revisor Maurcio Katayama Estagiria Monise Martinez Editor de arte Vinicius Rossignol Felipe Diagramadora Leslie Morais Editorao eletrnica Vinicius Rossignol Felipe Verso ePUB 2.0.1 Tecnologia de Educao e Formao de Educadores Ana Teresa Ralston Gerncia de Pesquisa e Desenvolvimento

2. Roberta Campanini Coordenao geral Antonia Brandao Teixeira e Rachel Zaroni Coordenao do projeto Eduardo Araujo Ribeiro Estagiria Olivia Do Rego Monteiro Ferragutti Reviso Marina Lazaretti Ao comprar um livro, voc remunera e reconhece o trabalho do autor e de muitos outros profissionais envolvidos na produo e comercializao das obras: editores, revisores, diagramadores, ilustradores, grficos, divulgadores, distribuidores, livreiros, entre outros. Ajude-nos a combater a cpia ilegal! Ela gera desemprego, prejudica a difuso da cultura e encarece os livros que voc compra. CIP - BRASIL. CATALOGAO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ. F553L | 1.ed. Savioli, Francisco Plato & Fiorin, Jos Luiz Lies de texto : leitura e redao / Francisco Plato Savioli, Jos Luiz Fiorin. - 1.ed. - So Paulo : tica, 2011. 3. Inclui bibliografia: 1. Lngua portuguesa (Ensino mdio). 2. Lngua portuguesa - Composio e exerccios. 3. Lngua portuguesa - Explicao textual. I. Savioli, Francisco Plato, 1944-. II. Ttulo. 06-2424. | CDD 469.8 | CDU 811.134.3'27| 015217 1 Edio - Arquivo criado em 10/08/2011 e-ISBN 9788508149353 4. Plato & Fiorin LIES DE TEXTO leitura e redaoJos Luiz Fiorin Doutor em Letras e Professor Livre-Docente do Depto. de Lingustica da USPFrancisco Plato Savioli Professor-Assistente Doutor do Depto. de Comunicaes e Artes da ECA USP 5. Professor e Coordenador do Curso de Gramtica e Interpretao de Texto do Anglo Vestibulares So Paulo 6. Fontes das imagens p. 15 WESCHER, H. La historia del collage. Barcelona, Gustavo Gili, 1977. p. 17 Uffizi Florena. So Paulo, Melhoramentos, s.d. (col. Enciclopdia dos Museus). p. 18 McSHINE, K. Andy Warhol A Retrospective . Nova York, The Museum of Modern Art, 1989. p. 19 16 Anurio de criao. So Paulo, Clube de Criao de So Paulo, 1991. p. 21 BOSI, Alfredo e outros. Machado de Assis. So Paulo, tica, 1982 (col. Escritores Brasileiros). p. 26 BECKETT, S. W. The Story of Painting. Londres, Dorling Kindersley, 1994. p. 27 4 Centenrio da 1 edio de Os lusadas. Lisboa, Secretaria de Estado da Informao e Turismo, 1972. p. 28 Lisboa e a expanso martima Sculos XV e XVI. Lisboa, Ministrio da Educao, 1990. p. 30 19 Anurio de criao. So Paulo, Clube de Criao de So Paulo, 1994. p. 31 DEBRET, J. B. Viagem pitoresca e histrica ao Brasil . Belo Horizonte/So Paulo, Itatiaia/Edusp, 1989 (col. 7. Reconquista do Brasil). p. 40 Revista Striptiras. So Paulo, Circo, s.d., n. 9. p. 41 HECK, J. G. The Complete Encyclopedia of Illustration. Nova York, Crown, 1979. p. 43 Coleo Pirelli de Fotografias de 1995. So Paulo, Museu de Arte de So Paulo, 1995 (v. 5). p. 51 O Museu de Valores do Banco Central do Brasil. So Paulo, Banco Safra, 1988. p. 53 a) Noel Rosa. So Paulo, Abril, 1970 (col. Msica Popular Brasileira); b) ANDREATO, Elifas. Impresses. Curitiba, Bamerindus, 1993. p. 58 HENDRICKSON, J. Roy Lichtenstein. Colnia, Taschen, 1988. p. 59 RAMOS, Graciliano. Vidas secas. Rio de Janeiro, Jos Olympio, 1947. p. 62 a) Dictionnaire Encyclopdique de la Peinture. Paris, Bookking International, 1994; b) CLAY, J. De LImpressionisme a LArt Moderne . Paris, Hachette, 1975. p. 68 JAGUAR. tila, voc brbaro. Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 1968. p. 69 Pssaros. Rio de Janeiro, JB, 1986. p. 71 Brasilien Entdeckung und Selbstentdeckung. Zurique, 8. Benteli, 1992. p. 74 Klee. Tquio, Shueisha, 1971 (col. LArt Moderne du Monde). p. 75 TITS. Jesus no tem dentes no pas dos banguelas. So Paulo, BMG Ariola, s.d. p. 78 Renoir Joie de Vivre 1996 Calendar . Paris, Graphique de France, 1995. p. 79 idem p. 62a. p. 83 FINKELSTEIN, Lucien. Nafs brasileiros de hoje. So Paulo, Cmara Brasileira do Livro, 1994 (col. Brasiliana de Frankfurt). p. 86 Ernst/Mir. Tquio, Shueisha, 1972 (col. LArt Moderne du Monde). p. 87 idem p. 41. p. 89 TERRY, W. & RENNERT, J. 100 Years of Dance Posters. Nova York, Darien House, 1975. p. 90 DEICHER, S. Piet Mondrian. Colnia, Taschen, 1975. p. 96 WREDE, S. The Modern Poster. Nova York, The Museum of Modern Art, 1988. p. 97 a) DRUET, R. & GRGOIRE, H. La Civilization de Lcriture . Paris, Fayard et Dessain et Tolra, 1976; b) SCHWANDNER, J. G. Calligraphy. Nova York, Dover, 1958. p. 99 Bienal Brasil sculo XX. So Paulo, Fundao Bienal de So Paulo, 1994. p. 103 V AN DE 9. BEUQUE, Jacques. Arte popular brasileira. So Paulo, Cmara Brasileira do Livro, 1994 (col. Brasiliana de Frankfurt). p. 108 Reclames da Bayer 1911-1942. So Paulo, Bayer do Brasil, 1 9 8 6 . p. 109 ALCNTARA MACHADO, Antnio. Novelas paulistanas. Rio de Janeiro, Jos Olympio, 1971. p. 110 QUINO. Hombres de bol-sillo. Barcelona, Lumen, 1977. p. 112 LOPES NETO, Simes. Contos gauchescos.Porto Alegre, Globo, 1983. p. 113 ANGELI. FHC Biografia no autorizada . So Paulo, Ensaio/Circo, 1995. p. 117 PONTUAL, Roberto. Entre dois sculos Arte brasileira do sculo XX na coleo Gilberto Chateaubriand. Rio de Janeiro, JB, 1987. p. 124 18 Anurio de criao. So Paulo, Clube de Criao de So Paulo, 1993. p. 125 Fbulas de La Fontaine. So Paulo, Edigraf, s.d. p. 127 DUNCAN, D. D . O mundo privado de Pablo Picasso. Nova York, The Ridge Press, 1958. p. 129 a) GEANDR. A ovelha negra de Geandr. So Paulo, Global, 1975; b) idem p. 124. p.130 O 10. Museu de Arte Contempornea da Universidade de So Paulo. So Paulo, Banco Safra, 1990. p. 132 Gustave Dor: La Bible. Liubliana, Prosveta-Beograd, 1989. p. 139 idem p. 51. p. 141 Revista Photo-Italia. Milo, Publimedia, 1989 (ano XIV n. 169). p. 143 Illustrators 31. , Nova York, The Society of Illustrators, 1990. p. 144 a) SCHULZ, C. M. Segurana um polegar e um cobertor. So Paulo, Hemus, s.d.; b) DAVIS, J. The Garfield Gallery 3. Londres, Hodder and Stoughton, 1987. p. 146 a) Coleo Pirelli de Fotografias de 1993. So Paulo, Museu de Arte de So Paulo, 1993 (v. 3); b) Zlio Alves Pinto. So Paulo, Museu de Arte de So Paulo, 1977. p. 147 17 Anurio de criao. So Paulo, Clube de Criao de So Paulo, 1992. p. 148 idem p. 71. p. 154 Bienal fotojornalismo brasileiro 1990-1995. So Paulo, Fundao Bienal de So Paulo, 1995. p. 155 Revista Popular Photography. Nova York, Ziff-Davis, 1980. v. 87, n. 5. p. 158 Gilberto Gil. So Paulo, Abril, 1977 (col. Msica Popular 11. Brasileira). p. 160 a) YASABURO, K. Trademarks & Symbols of the World Pictogram & Sign Design. Tquio, Kashiwashobo, 1989 (pictogramas de esportes); b) STIEBNER, E. D. & URBAN, D. Signs + Emblems. Munique, Bruckmann, 1987 (pictogramas de terminais de transporte). p. 172 idem p. 26. p. 173 HARTER, J. Transportation A Pictorial Archive from Nineteenth-Century Sources. Nova York, Dover, 1984. p. 174 Revista Action Comics n. 1 (fac-smile). So Paulo, Abril Jovem, s.d. p. 182 idem p. 30. p. 185 Fbulas de Esopo. So Paulo, Companhia das Letrinhas, 1994. p. 190 idem p. 154. p. 191 ALENCAR, Jos de. Iracema. So Paulo, Martins, 1941. p. 193 J. Carlos 100 Anos. Rio de Janeiro, Funarte, 1984. p. 197 BANDEIRA, Manuel. Pasrgada. Rio de Janeiro, Sociedade dos Cem Biblifilos do Brasil, 1960. p. 198 a) Coleo Pirelli de Fotografias de 1992. So Paulo, Museu de Arte de So Paulo, 1992 (v. 2); b) idem p. 146a. p. 199 e 202 idem 12. p. 71. p. 203 DANON, D. D. & TOLEDO, B. L. So Paulo: Belle poque. So Paulo, Nacional/Edusp, 1974. p. 206 Belo Horizonte, a cidade revelada. Belo Horizonte, Fundao Emlio Odebrecht, 1989. p. 208 Foto de Homem de Melo & Troia Design. p. 209 PESSOA, Fernando. Obra potica. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1986. p. 210 idem p. 147. p. 218 Arte moderna brasileira Uma seleo da coleo Roberto Marinho. So Paulo, Museu de Arte de So Paulo, 1994. p. 224 KOIKE, K. & KOJIMA, G. Lobo Solitrio. So Paulo, Nova Sampa, 1991 (n. 4). p. 225 idem p. 41. p. 231 BLACHON. Sport. Paris, Seghers, 1988. p. 234 idem p. 83. p. 239 QUINN, G. The Clip Art Book. Nova York, Crescent Books, 1990. p. 241 Jornal Folha de S. Paulo. So Paulo, Folha da Manh, 1973. p. 243 idem p. 4 1 . p. 248 a) Arte arteira: brinquedos, brinquedeiros, brincadeiras. So Paulo, MD Comunicaes, 1992; b) Revista Radio Race Car International. Worcestershire (Inglaterra), 13. Traplet, 1996 (n. 148). p. 251 idem p. 160a. p. 254 e 255 JARRASS, D. Rodin A Passion for Movement. Paris, Terrail, 1992. p. 257 Museus Castro Maya. Rio de Janeiro, Agir, 1994. p. 266 WATTERSON, B. O progresso cientfico deu tilt. So Paulo, Best, 1991 (v. 1). p. 267 Cerrado Vastos espaos . Rio de Janeiro, Alumbramento, 1992/3. p. 271 RENNER, R. G. Edward Hopper. Colnia, Taschen, 1992. p. 276 idem p. 109. p. 280 Revista Life. Nova York, Time, 1988 (n. especial: 150 Years of Photography). p. 287 Revista Fotoptica. So Paulo, Bela Vista, 1985 (n. 124). p. 292 idem p. 30. p. 304 Imagem e violncia. So Paulo, Senac, 1994. p. 305 idem p. 113. p. 306 20.. Anurio de criao. So Paulo, Clube de Criao de So Paulo, 1995. p. 310 QUINO. Gente. Lisboa, Dom Quixote, 1985. p. 311 FERNANDES, Millr. Desenhos. So Paulo, Razes, 1981. p. 312/3 idem p. 19 (anncio cria-do pela agncia W/Brasil). p. 320 GLAUCO. Abobrinhas da Brasilnia. So Paulo, 14. Circo, 1985. p. 326 idem p. 124. p. 327 Claes Oldenburg: An Anthology. Nova York, Guggenhein Museum, 1995. p. 328 CARV ALHO, Jos Cndido de. O coronel e o lobisomem. Rio de Janeiro, Jos Olympio, 1985. p. 336 idem p. 224 (n. 3). p. 337 Folheto Trem de Prata. So Paulo, Trem de Prata, 1996. p. 340 A Pinacoteca do Estado. So Paulo, Banco Safra, 1994. p. 342 SPARKE, P. Design in Context. Secaucus (EUA), Chartwell Books, 1987. p. 343 idem p. 99. p. 347 Joo Cmara 27 Fotografer. Copenhagem, Charlottenborg, 1994. p. 350 LIVINGSTONE, M. Pop Art. Londres, Royal Academy of Arts, 1991. p. 356 Artistas da escultura brasileira. So Paulo, V olkswagen do Brasil, 1986. p. 357 JOHNSON, J. French Fashion Plates of the Romantic Era. Nova York, Dover, 1991. p. 359 a) Animais e filhotes. Tquio, Aplauso, 1981; b) KLINTOWITZ, Jacob. Aldemir Martins Natureza a traos e cores . So Paulo, Valoart, 1989. p. 368 Catlogo The Worldwide Exhibit 15. System Design. Stuttgart, Burkhardt Leitner, s.d. p. 375 Grfico de Homem de Melo & Troia Design. p. 377 a) Folheto Belo Horizonte. Belo Horizonte, BeloTur, 1996; b) idem p. 41. p. 380 Revista Elle. So Paulo, Abril, 1992 (ano 5, n. 8). p. 394 ZERBST, R. Antoni Gaud. Colnia, Taschen, 1993. p. 395 ANDRADE, Oswald de. Cadernos de poesia do aluno Oswald (Poesia reunida). So Paulo, Crculo do Livro, s.d. p. 399 a, b, c, d) O Metr de So Paulo 19871991. So Paulo, Companhia do Metropolitano de So Paulo, 1991; e) idem p. 208 (totem de identificao da estao). 16. PREFCIO consensual o reconhecimento de que a escola brasileira no tem cumprido satisfatoriamente o compromisso de ensinar o aluno a compreender e produzir textos com proficincia. Ao final do ensino fundamental e do ensino mdio, o estudante no tem se mostrado capaz de extrair do texto os sentidos que ele transporta nem de redigir textos que produzam o resultado planejado. Submetidos a provas de avaliao junto com alunos de outros pases, os nossos tm sido classificados nos ltimos lugares. Esse resultado no seria to preocupante se afetasse apenas o orgulho nacional e no comprometesse os trs objetivos centrais perseguidos pelo ensino escolar em qualquer pas: a preparao para o mundo do trabalho, para o exerccio da cidadania e para a autonomia do aprendizado. Essa ltima meta da educao formal, da qual dependem em grande parte as duas primeiras, tem estreita relao com o 17. aprendizado da compreenso e da produo de textos. A capacidade de compreender textos com autonomia indispensvel para acompanhar os constantes e rpidos avanos do conhecimento, sem o que no h possibilidade de exerccio competente da profisso; a de produzir textos condio necessria para quem deseja ter participao ativa nas diversas esferas de atividade da vida em sociedade. A fora de tais evidncias nos obriga a aceitar que compete escola, em qualquer estgio do percurso do aprendizado, empenhar-se para melhorar cada vez mais o desempenho do aluno na compreenso e na produo de textos. A respeito desse objetivo existe unanimidade. As divergncias surgem principalmente quando se discutem as competncias consideradas necessrias para atingi-lo. H quem julgue vo o esforo de oferecer resposta para isso, pois as competncias exigidas 18. so tantas que a tentativa de enumer-las no escaparia ao reducionismo que fatalmente obrigaria o texto a comprimir-se para caber em moldes. Por outro lado, h aqueles que rejeitam a hiptese de uma leitura nica, definitiva ou correta, mas no descartam a possibilidade de leituras cada vez mais ricas e abrangentes; que no acreditam na redao do texto perfeito, mas incentivam o esforo de aperfeio-lo indefinidamente. entre estes que se colocam os autores deste livro, que foi escrito para confirmar e no para negar a crena de que a compreenso do texto um processo gradual e ininterrupto e de que a sua redao sempre passvel de melhora. preciso ressalvar, no entanto, que o reconhecimento dessa evoluo gradual e contnua no implica a aceitao de que essa competncia seja mero resultado da ao espontnea do tempo e da conjugao de motivaes aleatrias, 19. refratrias a qualquer esforo de sistematizao. Modernos estudos de anlise do discurso e do texto descreveram inmeros procedimentos de construo textual que se repetem com regularidade em qualquer texto. Conhec-los pode aumentar consideravelmente a possibilidade de explor-los com mais versatilidade, de aumentar o grau de controle sobre eles. Isso tanto para a compreenso quanto para a produo do texto. Desse modo, se no possvel definir um conjunto limitado de frmulas que, aplicadas, produzem automaticamente uma leitura definitiva, ao menos possvel sugerir procedimentos gerais, capazes de evitar desvios ou distores no trabalho com o texto. Sabe-se que nunca possvel atingir a leitura ou a construo perfeita de um texto, mas sempre possvel controlar interpretaes que no encontram sustentao no texto ou redirecionar redaes que se desviam do resultado desejado pelo enunciador. esse o propsito destas Lies 20. de texto. Os autores 21. SUMRIO LIO 1CONSIDERAES SOBRE A NOO DE TEXTO Tira As cobras, Lus Fernando Verssimo TEXTO COMENTADO: Anncio publicitrio EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 2VOZES PRESENTES NO TEXTO Os lusadas, Cames 22. TEXTO COMENTADO: Sermes, Pe. Antnio Vieira EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 3VOZES MOSTRADAS E DEMARCADAS NO TEXTO Satlite, Manuel Bandeira TEXTO COMENTADO: Quincas Borba, Machado de Assis EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 4 23. VOZES MOSTRADAS E NO DEMARCADAS NO TEXTO Vidas secas, Graciliano Ramos TEXTO COMENTADO: Macunama: o heri sem nenhum carter, Mrio de Andrade EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 5ORGANIZAO FUNDAMENTAL Comida, Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer, Srgio Brito TEXTO COMENTADO: A cidade e as serras, Ea de Queirs EXERCCIOS 24. PROPOSTA DE REDAO LIO 6TEXTOS TEMTICOS E TEXTOS FIGURATIVOS O escorpio e o sapo , fbula/ Texto dos autores TEXTO COMENTADO: Odes de Ricardo Reis, Fernando Pessoa EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 7O ENCADEAMENTO DE FIGURAS OU DE TEMAS 25. Profisso de f, Olavo Bilac TEXTO COMENTADO: Triste fim de Policarpo Quaresma, Lima Barreto EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 8FIGURATIVIDADE E VARIAO LINGUSTICA Novelas paulistanas , Antnio de Alcntara Machado TEXTO COMENTADO: Grande serto: veredas, Guimares Rosa EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO 26. LIO 9AS VRIAS POSSIBILIDADES DE LEITURA DE UM TEXTO O lobo e o cordeiro, La Fontaine TEXTO COMENTADO: A noite dissolve os homens, Carlos Drummond de Andrade EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 10MODOS DE COMBINAR FIGURAS E TEMAS Memrias pstumas de Brs Cubas, Machado de Assis 27. TEXTO COMENTADO: Sermes, Pe. Antnio Vieira EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 11ALTERAO DO SENTIDO DAS PALAVRAS a vaidade, Fbio..., Gregrio de Matos TEXTOS COMENTADOS: Lngua portuguesa, Olavo Bilac Lngua, Caetano Veloso EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 12 28. PRESENA DO NARRADOR NO TEXTO Dom Casmurro, Machado de Assis TEXTO COMENTADO: Memrias pstumas de Brs Cubas, Machado de Assis EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 13PERSONAGENS E ESPAO Iracema, Jos de Alencar TEXTO COMENTADO: O guarani, Jos de Alencar 29. EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 14TEMPO Pobre velha msica!, Fernando Pessoa TEXTO COMENTADO: Profundamente, Manuel Bandeira EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 15NARRAO 30. O senhor embaixador, rico Verssimo TEXTO COMENTADO: Memrias de um sargento de milcias, Manoel Antnio de Almeida EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 16DESCRIO A escrava Isaura, Bernardo Guimares TEXTO COMENTADO: O cortio, Alusio Azevedo EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO 31. LIO 17DISSERTAO Viagens de Gulliver, Jonathan Swift TEXTO COMENTADO: Razes do Brasil, Srgio Buarque de Holanda EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 18OS ESTADOS DE ALMA DAS PERSONAGENS Leito de folhas verdes, Gonalves Dias TEXTO COMENTADO: 32. Noite de almirante, Machado de Assis EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 19ARGUMENTAO Texto de vdeo educativo TEXTO COMENTADO: Sermes, Pe. Antnio Vieira EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 20 33. INFORMAES IMPLCITAS Reportagem de Liliana Pinheiro TEXTO COMENTADO: Anncio publicitrio EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 21DIZER UMA COISA PARA SIGNIFICAR OUTRA Anncios classificados TEXTO COMENTADO: O coronel e o lobisomem, Jos Cndido de Carvalho 34. EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 22O PLANO SONORO E A DISPOSIO DAS PALAVRAS NO TEXTO Trilha nostlgica, reportagem Cana caiana, Ascenso Ferreira TEXTO COMENTADO: Debussy, Manuel Bandeira EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 23 35. TEXTO LITERRIO E TEXTO NO LITERRIO Efeito Cinderela, matria jornalstica A valsa, Casimiro de Abreu TEXTO COMENTADO: Poema tirado de uma notcia de jornal, Manuel Bandeira EXERCCIOS PROPOSTA DE REDAO LIO 24COESO TEXTUAL Bolo de arroz, receita culinria TEXTO COMENTADO: 36. Texto de Ea de Queirs EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO LIO 25COERNCIA E PROGRESSO TEXTUAL Trechos escolhidos, Oswald de Andrade TEXTOS COMENTADOS: Poemas de Jos Paulo Paes EXERCCIOS PROPOSTAS DE REDAO BIBLIOGRAFIA RESPOSTAS DOS EXERCCIOS 37. LIO 1o amontoando os ingredientes que se assim tambm no superpondo frases que se constri um texto.Nprepara uma receita; 38. O significado de uma imagem isolada pode ser completamente diverso daquele que ela assume encaixada num contexto. Esta foto documenta um ato pblico em favor da anistia realizado em 1979. Combinada com a multido ao fundo, a imagem da pomba deixa de ser a simples foto de uma ave, como na pgina anterior, e passa a ser interpretada como um smbolo da paz; a imagem da manifestao, associada pomba em primeiro plano, deixa de ser um mero registro do fato, e passa a ser interpretada como um clamor coletivo pelo perdo e pela concrdia.Ato pblico pela anistia, foto de Maurcio Simonetti(Agncia F4), 15 de agosto de 1979(fragmento). 39. LIO 1 CONSIDERAES SOBRE A NOO DE TEXTOLeia o texto abaixo, uma tira de As cobras, de Lus Fernando Verssimo:Zero Hora. Segundo Caderno, 13 fev. 1995. 40. primeiro Aleitura do deixaria o quadrinho, isolado do segundo, presidente Fernando Henrique e sua equipe muito gratificados, j que sua administrao recebe nota mxima (dez) na avaliao de um dos interlocutores do dilogo a transcrito. Confrontado com o segundo, no entanto, o significado do quadrinho um se altera consideravelmente e provoca decepo. Dez passa a ser lido como um indicador de velocidade e no como a nota mxima de uma escala convencional. Com a quebra de expectativa criada pelo quadrinho um, produz-se um efeito de humor, e o texto, no seu todo, passa a ser uma stira lentido com que se tomam as decises do governo. Essa tirinha exemplar para demonstrar dois dados importantssimos na leitura de um texto: a) num texto, o significado de uma parte no autnomo, mas depende das outras com que se relaciona. Tanto verdade que, no caso da tirinha acima, fomos obrigados a reinterpretar o sentido 41. do quadrinho um, quando o confrontamos com o dois. b) o significado global de um texto no o resultado de mera soma de suas partes, mas de uma certa combinao geradora de sentidos. No fosse esse dado, o pequeno texto humorstico admitiria a seguinte leitura: que o governo de FHC merece nota dez e que anda a dez quilmetros por hora. Qualquer leitor mdio de texto diria que interpret-lo dessa forma significa no t-lo entendido. Em sntese, num texto o sentido de cada parte definido pela relao que mantm com as demais constituintes do todo; o sentido do todo no mera soma das partes, mas dado pelas mltiplas relaes que se estabelecem entre elas. Ao explicar o sentido da tira aqui reproduzida, usamos diversas vezes a palavra texto. Mas o que um texto? Essa palavra bastante usada na escola e mesmo fora dela. muito frequente ouvirmos frases como seu texto ficou muito bom; 42. o texto sobre o qual versaram as questes da prova de Portugus era muito longo e complexo; os atores de novela devem decorar textos enormes todos os dias; o texto constitucional desceu a detalhes que deveriam estar em leis ordinrias. Apesar do uso corrente da palavra, o conceito de texto no to simples: mesmo para aquelas pessoas habituadas a empregar esse termo com frequncia. Comecemos por definir propriedades de um texto:quaissoas1 A primeira que ele tem coerncia de sentido. Isso quer dizer que ele no um amontoado de frases, ou seja, nele, as frases no esto pura e simplesmente dispostas umas aps as outras, mas esto relacionadas entre si. por isso que, nele, o sentido de uma frase depende do sentido das demais com que se relaciona. O exemplo do texto 43. com que iniciamos esta lio mostra de maneira simples e clara que o sentido de qualquer passagem de um texto dado pelo todo. Se no levarmos em conta as relaes de uma frase com as outras que compem o texto, corremos o risco de atribuir a ela um sentido oposto quele que ela efetivamente tem. Uma mesma frase pode ter sentidos distintos dependendo do contexto dentro do qual est inserida. Precisemos um pouco melhor o conceito de contexto. a unidade maior em que uma unidade menor est inserida. Assim, a frase (unidade maior) serve de contexto para a palavra; o texto, para a frase, etc. O contexto pode ser explcito, quando expresso com palavras, ou implcito, quando est embutido na situao em que o texto produzido. Quando Lula disse a Collor no primeiro debate do segundo turno das eleies presidenciais de 1989 Eu sabia que voc era collorido por fora, mas caiado por dentro, todos os brasileiros entenderam que essa frase no queria dizer Voc tem cores por fora, mas 44. revestido de cal por dentro, mas Voc apresenta um discurso moderno, de centro-esquerda, mas reacionrio. Como foi possvel entender a frase dessa maneira? Porque ela foi colocada dentro do contexto dos discursos da campanha presidencial. Nele, o adjetivo collorido significava rela-tivo a Collor, adepto de Collor; Collor apresentavase como um renovador, como algum que pretendia modernizar o pas, melhorar a distribuio de renda, combater os privilgios dos mais favorecidos; Ronaldo Caiado era o candidato mais direita, defendia a manuteno do statu quo, etc. As frases ganham sentido, porque esto correlacionadas umas s outras. 45. ABCD, colagem de Raoul Hausmann, de 1923. O princpio da coerncia de sentido pode ser observado mesmo em quadros construdos a partir de fragmentos aparentemente desconexos. Nesta colagem do incio do sculo, a profuso de elementos traduz o atordoamento do homem da poca diante do massacre, por vezes indiscriminado, de informaes.Um texto , pois, um todo organizado de sentido. Dizer que ele um todo organizado de sentido implica afirmar que o texto um conjunto formado de partes solidrias, ou seja, que o sentido de uma depende das outras. Que que faz que um conjunto de frases forme um texto e no um amontoado desorganizado? So vrios os fatores. Citemos por enquanto dois. O primeiro a coerncia, isto , a harmonia de sentido de modo que no haja nada ilgico, nada contraditrio, nada desconexo, que nenhuma parte no se solidarize com as demais. A base da coerncia a continuidade de sentido, ou seja, a ausncia de discrepncias. Em princpio, seria incoerente um texto que dissesse Pedro est muito 46. doente. O quadrado da hipotenusa igual soma do quadrado dos catetos. Essa incoerncia seria dada pelo fato de que no se percebe a relao de sentido entre as duas frases que compem o texto. Um outro fator a ligao das frases por certos elementos que recuperam passagens j ditas ou garantem a concatenao entre as partes. Assim, e m No chove h vrios meses. Os pastos no poderiam, portanto, estar verdes, o termo portanto estabelece uma relao de decorrncia lgica entre uma e outra frase. Esse segundo fator menos importante que o primeiro, pois, mesmo sem esses elementos de conexo, um conjunto de frases pode ser coerente e, por conseguinte, um todo organizado de sentido. Observe o texto abaixo, de Carlos Drummond de Andrade: O QUE SE DIZ Que frio! Que vento! Que calor! Que caro! Que absurdo! Que bacana! Que tristeza! Que tarde! Que amor! Que besteira! Que esperana! Que modos! Que noite! Que graa! Que horror! Que doura! 47. Que novidade! Que susto! Que po! Que vexame! Que mentira! Que confuso! Que vida! Que talento! Que alvio! Que nada... Assim, em plena floresta de exclamaes, vaise tocando pra frente. Carlos Drummond de Andrade. Poesia e prosa. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1983. p. 1 379.Faltam elementos de ligao entre as partes no primeiro pargrafo, mas a ltima frase, Assim, em plena floresta de exclamaes, vai-se tocando pra frente, produz a unidade de sentido. O texto deixa de ser um amontoado aleatrio de exclamaes, adquirindo coerncia e, dessa forma, mostrando o carter estereotipado de nossa linguagem cotidiana.2 A segunda caracterstica de um texto que ele delimitado por dois brancos. Se o texto um todo organizado de sentido, ele pode ser verbal (um 48. conto, por exemplo), visual (um quadro), verbal e visual (um filme) etc. Mas, em todos esses casos, ser delimitado por dois espaos de no sentido, dois brancos, um antes de comear o texto e outro depois. o espao em branco no papel antes do incio e depois do fim do texto; o tempo de espera para que o filme comece e o que est depois da palavra Fim; o momento antes que o maestro levante a batuta e o momento depois que ele a abaixa, etc.Sagrada Famlia, pintura de Michelangelo, de 1504. 49. Durante sculos, a moldura dos quadros cumpriu a funo de isol-los do entorno, visando a estabelecer com nitidez um campo para o olhar, ou seja, um espao de significao, da mesma forma que os brancos antes e depois de um texto verbal.3 O texto produzido por um sujeito num dado tempo e num determinado espao. Esse sujeito, por pertencer a um grupo social num tempo e num espao, expe em seus textos as ideias, os anseios, os temores, as expectativas de seu tempo e de seu grupo social. Todo texto tem um carter histrico, no no sentido de que narra fatos histricos, mas no de que revela os ideais e as concepes de um grupo social numa determinada poca. Cada perodo histrico coloca para os homens certos problemas e os textos pronunciam-se sobre eles. Por exemplo, em nossa poca, em que os recursos naturais do planeta correm o risco de esgotar-se, aparece o discurso ecologista que mostra a necessidade de preservar a natureza com vistas 50. manuteno da espcie humana.Cem latas, pintura de Andy Warhol, de 1962. 51. O prprio fato de escolher um produto de consumo dirio no caso, uma lata de sopa para com ele construir uma pintura uma forma de representar certo estgio de desenvolvimento atingido por uma sociedade.No h texto que no mostre o seu tempo. Cabe lembrar, no entanto, que uma sociedade no produz uma nica forma de ver a realidade, um nico modo de analisar os problemas colocados num dado momento. Como ela dividida em grupos sociais, que tm interesses muitas vezes antagnicos, produz ideias divergentes entre si. A mesma sociedade que gera a ideia de que preciso pr abaixo a floresta amaznica para explorar suas riquezas, produz a ideia de que preservar a floresta mais rentvel. Cabe lembrar, no entanto, que algumas ideias, em certas pocas, exercem domnio sobre outras, ganhando o estatuto de concepo quase geral na sociedade. necessrio entender as concepes existentes na poca e na sociedade em que o texto foi produzido para no correr o risco de compreendlo de maneira distorcida. 52. Como as ideias s podem ser expressas por meio de textos, analisar a relao do texto com sua poca estudar as relaes de um texto com outros. Poderamos dizer que um texto , pois, um todo organizado de sentido, delimitado por dois brancos e produzido por um sujeito num dado espao e num dado tempo. Duas concluses podemos tirar dessa noo: a) uma leitura no pode basear-se em fragmentos isolados do texto, j que o significado das partes determinado pelo todo em que esto encaixadas; b) uma leitura, de um lado, no pode levar em conta o que no est no interior do texto e, de outro, deve levar em considerao a relao, assinalada, de uma forma ou de outra, por marcas textuais, que um texto estabelece com outros. TEXTO COMENTADO 53. Anncio criado pela agncia Young & Rubican, de 1990.O texto que segue um anncio publicitrio publicado pela revista Veja. O produto anunciado so os carros russos Lada, que acabavam de entrar no mercado brasileiro. APROVEITE QUE OS RUSSOS NO ENTENDEM NADA SOBRE LUCRO. ELES AINDA FAZEM CARROS QUE DURAM PELO MENOS 20 ANOS. Se existe alguma coisa que os russos no sabem 54. fazer direito ganhar dinheiro. Eles ainda pensam que um bom negcio fazer um carro moderno, confortvel, resistente, com chapa de ao belga, um motor simples, em que qualquer mecnico mexe e que ainda por cima no d manuteno. que os russos que fabricam os Lada esto acostumados a consumidores que ficam de 10 a 15 anos com o mesmo carro, que vendem para outros consumidores que tambm ficam um tempo com o mesmo carro, que vendem para outros. Na Rssia, o carro que no resistir a tantos consumidores no bom. E olhe que no deve ser fcil fazer um carro que funcione perfeitamente por tantos anos em um pas onde s 15% das estradas so pavimentadas. Mas voc no mora na Rssia e, com certeza, no tem um carro russo. Ento, voc deve estar pensando em trocar de carro daqui a pouco. Espere s at novembro e compre os primeiros Lada que vo chegar ao Brasil. Porque, do jeito que os russos aprendem rpido, logo, logo eles podem aprender a ganhar dinheiro. Veja, 7 nov. 1990. 55. Para demonstrar que, num texto, o significado de uma parte depende de suas relaes com as outras, vamos interpretar, isoladamente, o significado das duas primeiras linhas do texto acima. Quando se diz Aproveite que os russos no entendem nada sobre lucro, a frase remete para o fato de que a Rssia era o pas lder do bloco socialista e de que l, portanto, no havia necessidade de buscar o lucro, como nos pases capitalistas. Como esse texto de 1990, quando eram notrias as dificuldades econmicas por que passava a ento Unio Sovitica, pode-se pensar que a concepo sobre a qual o texto vai trabalhar a da superioridade da economia capitalista sobre a socialista, ou seja, pode-se imaginar que o texto considerar negativo o fato de os russos no entenderem nada sobre lucro. As duas linhas seguintes comeam a mostrar que essa hiptese interpretativa no verdadeira. Seus carros no esto submetidos obsolescncia crescente planejada pela indstria capitalista para que o consumo seja sempre maior: eles duram pelo 56. menos vinte anos. O texto em letras menores confirma essa ltima hiptese de leitura: os russos no sabem ganhar dinheiro, porque pensam que bom negcio fabricar um carro moderno, confortvel, resistente (com chapa de ao belga, que dura muito tempo e passa de um dono a outro, que suporta estradas no pavimentadas), com motor simples (em que qualquer mecnico mexe), que no d manuteno. Agora o sentido se apresenta em toda a plenitude e contrrio ao que as duas primeiras linhas, isoladas do contexto, davam a entender. Bom negcio, para o industrial capitalista, fabricar um carro que no dure muito tempo e, por conseguinte, precise ser trocado. Da decorre que o lucro, segundo o texto, algo que se obtm custa do consumidor, fruto da ganncia. O lucro a mola do capitalismo. J os russos, por no serem capitalistas, no visam ao lucro e fabricam, por isso, produtos de grande durabilidade. O lucro e, por extenso, o sistema que o produz so 57. negativos para o consumidor, enquanto no entender de lucro positivo para ele, pois no o submete obsolescncia planejada. O texto uma publicidade dos carros russos Lada, veiculada na poca em que comearam a ser vendidos no Brasil. A estratgia de persuaso do texto transformar o que sempre se considerou um ponto negativo da economia socialista em ponto positivo para o consumidor. A ltima frase conclama o comprador potencial a efetuar o negcio rapidamente, acenando com o perigo das transformaes por que passa a Rssia. Transformando-se em economia submetida s chamadas leis do mercado, os russos aprendero a ganhar dinheiro e, por conseguinte, o consumidor estar submetido obsolescncia planejada, no tendo mais bens bastante durveis. LIO 1 EXERCCIOS O texto que segue o captulo LXVIII do livro Memrias pstumas de Brs Cubas, de Machado 58. de Assis. O VERGALHO Tais eram as reflexes que eu vinha fazendo, por aquele Valongo fora, logo depois de ver e ajustar a casa. Interrompeu-mas um ajuntamento; era um preto que vergalhava outro na praa. O outro no se atrevia a fugir; gemia somente estas nicas palavras: No, perdo, meu senhor; meu senhor, perdo! Mas o primeiro no fazia caso, e, a cada splica, respondia com uma vergalhada nova. Toma, diabo! dizia ele; toma mais perdo, bbado! Meu senhor! gemia o outro. Cala a boca, besta! replicava o vergalho. Parei, olhei... Justos cus! Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque Prudncio, o que meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me; ele deteve-se logo e pediu-me 59. a bno; perguntei-lhe se aquele preto era escravo dele. , sim, nhonh. Fez-te alguma coisa? um vadio e um bbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, enquanto eu ia l embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber. Est bom, perdoa-lhe, disse eu. Pois no, nhonh. Nhonh manda, no pede. Entra para casa, bbado! Sa do grupo, que me olhava espantado e cochichava as suas conjeturas. Segui caminho, a desfiar uma infinidade de reflexes, que sinto haver inteiramente perdido; alis, seria matria para um bom captulo, e talvez alegre. Eu gosto dos captulos alegres; o meu fraco. Exteriormente, era torvo o episdio do Valongo; mas s exteriormente. Logo que meti mais dentro a faca do raciocnio achei-lhe um miolo gaiato, fino, 60. e at profundo. Era um modo que o Prudncio tinha de se desfazer das pancadas recebidas, transmitindo-as a outro. Eu, em criana, montavao, punha-lhe um freio na boca, e desancava-o sem compaixo; ele gemia e sofria. Agora, porm, que era livre, dispunha de si mesmo, dos braos, das pernas, podia trabalhar, folgar, dormir, desagrilhoado da antiga condio, agora que ele se desbancava: comprou um escravo, e ia-lhe pagando, com alto juro, as quantias que de mim recebera. Vejam as sutilezas do maroto! Machado de Assis. Memrias pstumas de Brs Cubas. So Paulo, tica, 1995. p. 100-1.Ilustrao de Portinari para o conto O vergalho. 61. QUESTO 1 Os dois personagens centrais dessa narrativa vm indicados por duas designaes iniciais: um preto ... outro (era um preto que vergalhava outro na praa ). Como no interior de um texto, uma passagem explica outra, cada um desses personagens vem designado por outras palavras assim distribudas ao longo do texto: UM PRETO meu senhor; meu senhor (linha 7) o primeiro (linha 8) ele (linha 11) meu senhor (linha 13) o vergalho (linhas 14-5)OUTRO o outro (linha 5)diabo (linha 11) bbado (linha 12) o outro (linha 13) besta (linha 14) aquele preto, o do vergalho (linha 17) escravo (linha 21) o meu moleque Prudncio vadio, bbado (linha (linhas 17-8) 24) 62. o que meu pai libertara (linhas 18-9) ele (linha 19) lhe (linha 21) dele (linha 21) te (linha 23) o Prudncio (linhas 41-2) o, lhe (linha 44) o, ele (linha 45) de si mesmo (linha 47) ele, se (linha 50) do maroto (linhas 52-3)ele (linha 25) ele (linha 26) lhe (linha 28) bbado (linha 30) a outro (linha 43) um escravo (linha 50) lhe (linha 51)Como se pode notar, esses dois grupos de palavras servem para costurar entre si vrias passagens do texto e tambm para o narrador ir construindo o perfil de cada uma das personagens. Na coluna 1, alm dos pronomes (ele, lhe, dele, te etc.), que servem para evitar repeties enfadonhas e para indicar correlaes entre passagens do texto, ocorrem palavras e expresses 63. com que o narrador d informaes sobre Prudncio e traduz o modo como este trata o outro preto. a) Que informaes importantes o narrador nos d sobre Prudncio? b) Como define o modo de Prudncio tratar o escravo que adquirira depois de libertado? QUESTO 2 Na coluna 2, ao lado dos pronomes que se referem ao escravo que era aoitado, existem palavras que, de um lado, servem para confirmar o autoritarismo e a crueldade de Prudncio, de outro, servem para indicar a imagem que Prudncio fazia de seu escravo. a) Cite algumas dessas palavras. b) Qual a imagem que criam do escravo segundo Prudncio? QUESTO 3 64. As palavras ou frases exclamativas servem para exprimir sentimentos de variados tipos: horror, espanto, desespero, raiva, medo etc. No interior do texto (linha 16) ocorre a seguinte exclamao: Justos cus! a) De que personagem procede esse grito? b) Que tipo de sentimento exprime? c) Que tipo de ocorrncia provocou tal sentimento no narrador? QUESTO 4 a) Quais so as palavras que o homem chicoteado usa para tratar o seu atual senhor? b) Quais as que Prudncio usa para se dirigir ao narrador? Qual o seu significado? c) Considerando o grau de formalidade prprio de cada uma dessas expresses, quem que demonstra menos intimidade no trato com o seu superior hierrquico? 65. QUESTO 5 Na sua opinio, o captulo em questo mostra um narrador preocupado com a instituio escravagista ou apenas preocupado em revelar formas do comportamento humano? QUESTO 6 O narrador diz que gosta dos captulos alegres. a) O captulo em questo alegre? b) Fundamente sua resposta. QUESTO 7 No dilogo entre Nhonh e Prudncio, a linguagem do ex-escravo marcada por desvios da norma culta da lngua, em contraste com a do seu ex-senhor, absolutamente ajustada s prescries gramaticais: a colocao pronominal e a coerncia no uso das pessoas do pronome e do verbo so ndices disso (Fez-te; perdoa-lhe). 66. a) Cite, na fala de Prudncio, alguns desvios da lngua culta escrita. b) Considerando que, num texto, todas as ocorrncias contribuem com o sentido global, tente interpretar a funo desses desvios da lngua culta para a caracterizao da personagem Prudncio. QUESTO 8 Levando em conta o texto na sua totalidade, podemos dizer que nele: a) o narrador ironiza, com certo amargor, o procedimento do seu ex-escravo. b) Prudncio, a julgar por esse espetculo, to severo com o seu escravo quanto com o seu exsenhor. c) o narrador apresenta plenas justificativas para o mau comportamento do seu ex-escravo. d) o narrador tenta explicar os motivos que levam um homem a odiar outro. e) o narrador se mostra surpreso com a reao do 67. homem chicoteado perante as vergalhadas de seu senhor. QUESTO 9 (VUNESP) A maior injustia que eu ainda vi desenfreada e s soltas na face da terra foi a que prendeu os senhores Almeida e Manuel Caetano, a propsito de uma tentativa de roubo ao senhor Lobo da Reboleira. Vinham aqueles inofensivos cidados pelo seu caminho, mansos e quietos, e desprendidos de cobia. Passaram porta do capitalista no momento em que o senhor Lobo escorregava nas escadas ngremes e oleosas de sua casa, gritando que andavam ratoneiros l dentro. O senhor Almeida, quando tal ouviu, receou que o tomassem por um dos salteadores, e estugou o passo. O senhor Manuel Caetano, menos amedrontado das suspeitas, mas temeroso de ser chamado como testemunha, fugiu tambm. Os vizinhos do senhor Lobo, vendo fugirem dois homens, e ouvindo os 68. gritos da criada do milionrio, correram atrs deles, e, auxiliados pela guarda do Banco, apanharam-nos. So o queixoso e sua criada, convidados a reconhecer os ladres, e no os conhecem. So chamados os vizinhos, que os perseguiram, e asseveram a identidade das pessoas. Aqui est a histria contada pelos presos, nicos, a meu ver, que a podem contar como ela foi. Mas haver de oito meses que esto esperando que os julguem. Tomou cargo de defesa Marcelino de Matos. Se o jri provar a inocncia destes dois homens, qual o artigo da lei que impe no ministrio pblico o sacratssimo dever de os indenizar? Camilo Castelo Branco. Memrias do crcere. Lisboa, A. M. Pereira, 1966. v. 2, p. 120-1.No excerto que lhe apresentamos, h pelo menos duas palavras que no so comuns no portugus coloquial brasileiro: ratoneiro e estugar. O contexto, no entanto, permite entender o que 69. significam. Releia o texto de Camilo, e a seguir indique: a) o sentido das duas palavras; b) os elementos contextuais que permitem entender tal sentido. QUESTO 10 (FUVEST) Aquela senhora tem um piano Que agradvel mas no o correr dos rios Nem o murmrio que as rvores fazem... Por que preciso ter um piano? O melhor ter ouvidos E amar a natureza. Alberto Caeiro (heternimo de Fernando Pessoa).Que simboliza o piano no poema? 70. PROPOSTAS DE REDAO 1) No captulo XI de Memrias pstumas de Brs Cubas, o narrador, falando de sua infncia, confessa-se um menino diabo, teimoso e birrento. Entre algumas de suas crueldades faz aluso a esta, que diz respeito ao modo como tratava o seu ento escravo Prudncio: (...) Prudncio, um moleque de casa, era o meu cavalo de todos os dias; punha as mos no cho, recebia um cordel nos queixos, guisa de freio, eu trepava-lhe ao dorso, com uma varinha na mo, fustigava-o, dava mil voltas a um e outro lado, e ele obedecia, algumas vezes gemendo mas obedecia sem dizer palavra, ou, quando muito, um ai, nhonh! ao que eu retorquia: Cala a boca, besta! Machado de Assis, op. cit., p. 32-3.No captulo LXVIII, o mesmo narrador observa que, ao deixar o grupo, este o olhava espantado e 71. cochichava as suas conjeturas, isto , fazia suposies sobre a cena que acabava de presenciar. Suponha que, entre as pessoas que cochichavam, havia uma que soubesse do passado de Prudncio. Ela ouviu calada as suposies e comentrios do grupo e, depois de um certo tempo, resolveu contar o que sabia. Conforme se viu, num texto, o significado de uma passagem depende de informaes contidas em passagens anteriores. Redija um texto, expondo os comentrios que os integrantes do grupo faziam: a) antes de terem informaes sobre o passado de Prudncio; b) depois de saberem que ele repetia ali, com seu atual escravo, as mesmas crueldades que seu exsenhor fazia com ele. 2) 72. EXCELLENTE ESCRAVOVende-se um creoulo de 22 annos, sem vicio e muita fiel: bom e aceado cozinheiro, copeiro, bolieiro. Faz todo o servio de arranjo de casa com presteza, e o melhor trabalhador de raa que se pde desejar; humilde, obediente e bonita figura. Para tratar na ladeira de S. Francisco n. 4. 54 100 anos de Propaganda. So Paulo, Abril Cultural, 1980. p. 5.Este anncio verdico e foi transcrito do jornal A Provncia de So Paulo antigo nome 73. do atual O Estado de S. Paulo do dia 21 de dezembro de 1878. Memrias pstumas de Brs Cubas veio luz no ano de 1881, data bem prxima da publicao do anncio. Essa coincidncia serve para revelar que todo texto, mesmo o de fico, reflete temas do contexto histrico em que produzido. Imagine-se no tempo em que o texto de Machado de Assis e o anncio do jornal foram escritos. Levando em conta os dados sugeridos por eles, escreva uma narrao supondo a seguinte situao: O Excellente escravo do anncio foi comprado por uma viva com cinco herdeiros ambiciosos, dona de muitos bens e cheia de particularidades a esconder. 74. LIO 2odo texto produto de uma criao coletiva:Ta voz do seu produtor se manifesta ao lado de um coro de outras vozes que j trataram do mesmo tema e com as quais se pe em acordo ou desacordo. 75. Neste, que considerado o quadro mais representativo da pintura moderna, pode ser observada a convivncia de diversas vozes. Nas duas moas esquerda, quem fala ainda a pintura de herana renascentista, na qual se observa uma certa harmonia de traos. J nas duas moas direita, est evidente a influncia das mscaras africanas, que Picasso havia conhecido pouco tempo antes, e que viriam a influenciar decisivamente sua maneira de pintar.Les Demoiselles dAvignon, pintura de Pablo Picasso, de 1907(fragmento). 76. LIO 2 VOZES PRESENTES NO TEXTO Leia o texto abaixo, a estrofe 94 do canto IV de Os lusadas, de Cames: Oh glria de mandar! Oh v cobia Desta vaidade, a quem chamamos fama! Oh fraudulento gosto, que se atia Com uma aura popular, que honra se chama! Que castigo tamanho, e que justia Fazes no peito vo que muito te ama! Que mortes, que perigos, que tormentas, Que crueldades neles experimentas! Cames. Os lusadas. Lisboa, Imprensa Nacional, 1931. IV, 94. 77. Cames retratado por Gustave Dor, em gravura do sculo XVIII. 78. ao canto Aestrofe acima pertence do clebre IV de Os lusadas e faz parte episdio intitulado O velho do Restelo. Nele, narra-se que, estando a armada portuguesa para partir em busca do caminho das ndias, num clima de festa, com os soldados vestidos de vrias cores, com os estandartes tremulando ao vento, toma a palavra um velho de aspecto venerando, que estava na praia, entre as pessoas que assistiam partida. Esse velho, descontente com o empreendimento portugus de buscar do mundo novas partes, pese contra ele, destruindo ponto por ponto os ideais que levaram epopeia das grandes navegaes. Comea por desmistificar o ideal da fama, dizendo que ela nada mais que vontade de poder, que uma fraude com que os poderosos atiam as massas para faz-las apoiar sua poltica expansionista. Chamam-te Fama e Glria soberana, / Nomes com que se o povo nscio engana (id., ibid., IV 96). Esse desejo de mandar , s produz danos. O velho vai, ento, mostrar que o 79. projeto ultramarino ser um desastre para a sociedade portuguesa, ocasionando o despovoamento e o enfraquecimento do pas, j que os homens vlidos estaro mortos ou em outras terras e, em Portugal, estaro os velhos, as mulheres, os rfos. Para ele, a empresa navegadora produzir somente pobreza, adultrio, desamparo. Execra ainda os chamados heris civilizadores, aqueles que fizeram progredir a sociedade humana: por exemplo, Prometeu, que roubou o fogo do cu e o deu aos homens, Ddalo, grande arquiteto que fabricou para seu filho caro umas asas, presas com cera aos ombros, com cujo auxlio pretendeu voar. Considera todo progresso material e todo avano tcnico intrinsecamente maus, porque ocasionam a runa de seus empreendedores. O discurso do velho do Restelo est em oposio a certas concepes dominantes na sociedade portuguesa da poca dos grandes descobrimentos, expressas pelo discurso de exaltao da empresa navegadora posta em marcha 80. pela Coroa lusitana. Neste, celebra-se a glria da epopeia portuguesa das grandes navegaes, o esplendor de Portugal, a fama dos heris lusitanos. Nele, justifica-se esse empreendimento como um meio de propagar a f crist entre os infiis e de aumentar o Imprio, isto , o territrio portugus. esse o discurso que aparece nas trs primeiras estrofes do canto I de Os lusadas:Vista do porto de Lisboa em pintura do sculo XVIII.As armas e os bares assinalados, Que da ocidental praia Lusitana, 81. Por mares nunca dantes navegados, Passaram ainda alm da Taprobana: Em perigos e guerras esforados, Mais do que prometia a fora humana; Entre gente remota edificaram Novo reino, que tanto sublimaram: E tambm as memrias gloriosas Daqueles Reis, que foram dilatando A F, o Imprio; e as terras viciosas De frica, e de sia andaram devastando; E aqueles que por obras valerosas Se vo da lei da morte libertando; Cantando espalharei por toda parte, Se a tanto me ajudar o engenho e a arte. Cessem do sbio Grego, e do Troiano As navegaes grandes que fizeram, Cale-se de Alexandre e de Trajano A fama das vitrias que tiveram: Que eu canto o peito ilustre Lusitano, 82. A quem Netuno e Marte obedeceram: Cesse tudo o que a Musa antiga canta, Que outro valor mais alto se alevanta. Cames, op. cit., I, 1-3.O discurso do velho do Restelo constitui-se em oposio a esse ponto de vista que exalta a expanso colonial portuguesa. Procura desmascarar esse discurso que fala de altos ideais, mostrando que tudo no passa de desejo de mando, que trar consequncias funestas e no coisas boas para Portugal. Ao ler o que diz o velho, v-se que havia diferentes perspectivas na sociedade sobre a aventura ultramarina portuguesa e que elas estavam em relao polmica umas com as outras. Esse exemplo mostra uma propriedade fundamental da linguagem: a heterogeneidade constitutiva. Os textos tm a propriedade intrnseca de se constituir a partir de outros textos. Por isso, todos eles so atravessados, ocupados, 83. habitados pelo discurso do outro. Por conseguinte, a linguagem fundamentalmente, constitutivamente heterognea. Um texto remete a duas concepes diferentes: aquela que ele defende e aquela em oposio qual ele se constri. Nele, ressoam duas vozes, dois pontos de vista. Sob as palavras de um discurso, h outras palavras, outro discurso, outro ponto de vista social. Para constituir sua concepo sobre um dado tema, o falante leva sempre em conta a de outro, que, de certa forma, est, pois, tambm presente no discurso construdo. Essa heterogeneidade, isto , esses dois pontos de vista, no est marcada no fio do discurso, as duas perspectivas em oposio no esto mostradas no interior do texto. Na passagem que contm o ponto de vista do velho do Restelo sobre a expanso colonial portuguesa, por exemplo, ele no diz que est em desacordo com o discurso de sua exaltao. No entanto, nossa memria discursiva leva-nos a perceber que ele se constri nessa relao polmica. Lemos, no incio de Os 84. lusadas, o discurso de glorificao dos grandes descobrimentos e, quando chegamos ao trecho que considera as descobertas um empreendimento funesto, verificamos que um se ope ao outro. Quando lemos um texto a favor da abolio da escravatura, percebemos que ele s pode ter surgido numa formao social em que h discursos a favor da escravatura; um discurso antirracista s pode constituir-se numa sociedade em que existe um discurso racista; um discurso feminista s pode ser gerado num tempo em que existe um discurso machista. Esses pontos de vista so sociais, so as posies divergentes que se es-tabelecem numa dada sociedade sobre uma determinada questo. Como uma sociedade sempre dividida em grupos sociais com interesses divergentes, no h uma perspectiva nica sobre uma dada questo. Os indivduos, em seus textos, defendem uma ou outra posio gerada no interior da sociedade em que vivem. O discurso sempre a arena em que lutam esses pontos de vista em oposio. Um deles pode 85. ser dominante, isto , pode contar com a adeso de um nmero maior de pessoas. Isso, no entanto, no elimina o fato de que concepes contrrias se articulam sobre o mesmo assunto. Um discurso sempre, pois, a materializao de uma maneira social de considerar uma questo. Ao longo da histria de uma sociedade, estabelecem-se esses pontos de vista contraditrios. Por isso, os discursos esto em relao polmica uns com os outros. Nesse sentido, todo discurso histrico. Num texto, est o outro em oposio ao qual, num dado momento, ele se constituiu. A historicidade de um texto estudada analisando-se essa relao polmica em que ele se construiu.Anncio criado pela agncia DM9, em 1993. 86. Este anncio de um fabricante de doces s pode ser compreendido a partir de sua oposio ao discurso da preservao da boa forma fsica por meio de exerccios constantes e hbitos alimentares saudveis. Satirizando esse tipo de concepo, o anncio convida o pblico a entregar-se ao prazer de uma guloseima.TEXTO COMENTADOAquarela de Debret, do sculo XIX, representandoo interior de uma casa abastada brasileira. Acervo dos Museus Castro Maya, Rio de Janeiro.O texto que segue um fragmento do sermo do 87. quinto domingo da Quaresma, de Vieira. Como estamos na corte, onde das casas dos pequenos no se faz caso, nem tm nome de casas, busquemos esta f em alguma casa grande e dos grandes. Deus me guie. O escudo desta portada em um quartel tem as quinas, em outro as lises, em outro as guias, lees e castelos; sem dvida este deve ser o palcio em que mora a f crist, catlica e cristianssima. Entremos e vamos examinando o que virmos, parte por parte. Primeiro que tudo vejo cavalos, liteiras e coches; vejo criados de diversos calibres, uns com libr, outros sem ela; vejo galas, vejo joias, vejo baixelas; as paredes vejo-as cobertas de ricos tapizes; das janelas vejo ao perto jardins, e ao longe quintas; enfim, vejo todo o palcio e tambm o oratrio; mas no vejo a f. E por que no aparece a f nesta casa? Eu o direi ao dono dela. Se os vossos cavalos comem custa do lavrador, e os freios que mastigam, as ferraduras 88. que pisam e as rodas e o coche que arrastam so dos pobres oficiais, que andam arrastados sem poder cobrar um real, como se h de ver a f na vossa cavalaria? Se o que vestem os lacaios e os pajens, e os socorros do outro exrcito domstico masculino e feminino depende do mercador que vos assiste, e no princpio do ano lhe pagais com esperanas e no fim com desesperaes, a risco de quebrar, como se h de ver a f na vossa famlia? Se as galas, as joias e as baixelas, ou no Reino, ou fora dele, foram adquiridas com tanta injustia ou crueldade, que o ouro e a prata derretidos, e as sedas se se espremeram, haviam de verter sangue, como se h de ver a f nessa falsa riqueza? Se as vossas paredes esto vestidas de preciosas tapearias, e os miserveis a quem despistes para as vestir a elas, esto nus ou morrendo de frio, como se h de ver a f, nem pintada nas vossas paredes? Se a Primavera est rindo nos jardins e nas quintas, e as fontes esto nos olhos da triste viva e rfos, a quem nem por obrigao, nem por esmola satisfazeis, ou agradeceis o que seus 89. pais vos serviram, como se h de ver a f nessas flores e alamedas? Se as pedras da mesma casa em que viveis, desde os telhados at os alicerces esto chovendo os suores dos jornaleiros, a quem no fazeis a fria, e, se queriam ir buscar a vida a outra parte, os prendeis e obrigveis por fora, como se h de ver a f, nem sombra dela na vossa casa? Antnio Vieira. Sermes. Porto, Lello, 1959. v. 2, t. 4, p. 203-4.Antes de comear o comentrio, vejamos algumas informaes sobre certos termos de herldica1 que aparecem no texto: quartel: cada uma das quatro partes em que se divide um escudo; escudo: braso de nobreza; guia: figura estilizada dessa ave presente num braso; castelo: figura, em escudo, que representa uma fortaleza; 90. lis/lises: figura, em escudo, do lrio. quina: cada um dos cinco pequenos escudos que figuram nas armas de Portugal e cuja origem est na primeira bandeira portuguesa, a das quinas, adotada por Dom Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal; essa bandeira era branca com cinco escudetos, que, segundo a lenda, simbolizavam os cinco reis mouros destroados por Dom Afonso Henriques na batalha de Ourique, em 1139, que marca, de acordo com a tradio, a fundao do reino de Portugal, pois Dom Afonso Henriques teria sido aclamado rei no prprio campo de batalha; pode-se dizer que, posteriormente, as quinas presentes nas armas portuguesas passaram a representar a fundao de Portugal. Nesse texto, Vieira est falando do que a f e resolve mostr-la no palcio (alguma casa grande) de um nobre (dos grandes). Simula ele estar entrando, juntamente com os ouvintes por ele convidados, em um palcio de fidalgos muito ricos cujo escudo no alto da grande porta de entrada 91. (portada) mostra os signos herldicos (quinas, lises, guias, lees e castelos) da f crist, catlica e cristianssima da famlia. Vai, ento, mostrando, de um lado, as riquezas da casa, os objetos de luxo, os cavalos e coches, a multido de criados, as belezas dos jardins e das quintas etc.; de outro, os seres humanos explorados para que essa riqueza possa existir: os pequenos proprietrios de terra, a quem no se paga o que os cavalos comem; os artesos, a quem no se pagam os objetos (freios, ferraduras, rodas e coches) que fizeram; os mercadores, a quem no se pagam as mercadorias que forneceram; os criados, a quem no se pagam os salrios; os diaristas ( jornaleiros), a quem no se paga a fria (a diria); as vivas e os rfos de criados, a quem se deixa no abandono. Vieira mostra, ento, que no pode haver f sem que se leve uma vida em conformidade com ela, ou seja, deixa claro que no h f sem as obras correspondentes. Ora, a f crist, segundo o pregador, implica a justia com os que trabalham, 92. implica que o trabalho seja remunerado, que a riqueza no se construa sobre a explorao do outro. O sermo de Vieira constitui-se em oposio ao discurso feudal, que defendia os privilgios da nobreza e as relaes servis de trabalho, em que os servos tinham obrigao de prestar servios ao senhor e no podiam mudar de trabalho, mas estavam presos a uma propriedade (... se queriam ir buscar a vida a outra parte, os prendeis e obrigveis por fora). Em oposio ao discurso que defendia os privilgios da nobreza, dados por seu nascimento, Vieira tem o ponto de vista da sociedade mercantil, que valoriza o trabalho dos operrios e dos burgueses (mercadores etc.), que condena as relaes servis de trabalho e defende o assalariamento, em que o operrio tem a liberdade de fazer contrato de trabalho com quem quiser, que preconiza que o valor de cada homem no dado por seu nascimento, mas por sua ao no mundo. Condena vivamente os que dizem ter f mas no praticam as obras correspondentes. Para ele, a f sem as obras 93. no existe. O sermo de Vieira faz parte do discurso jesutico, que pregava que o ser humano se define por sua ao no mundo. Ope-se ao discurso jansenista, segundo o qual a f basta para salvar o homem, mesmo que desacompanhada das obras. O discurso religioso de Vieira manifesta uma voz ativista e pragmtica, que se constitui numa relao polmica com o que foi chamado quietismo, que sustenta que a perfeio consiste na anulao da vontade, na indiferena total em relao aos acontecimentos e na unio contemplativa com Deus. Num outro sermo, o do terceiro domingo do Advento, Vieira explicita ainda mais esse ponto de vista pragmtico: Cada um suas aes, e no outra cousa. Oh que grande doutrina esta para o lugar em que estamos! Quando vos perguntarem quem sois, no vades revolver o nobilirio de vossos avs, ide ver a matrcula de vossas aes. O que fazeis, isso sois, nada mais. Quando ao Batista lhe perguntaram quem era no disse que se chamava Joo, nem que era filho de Zacarias; no se definiu 94. pelos pais, nem pelo apelido. S de suas aes formou a sua definio: Ego vox clamantis (Eu sou a voz que clama). A. Vieira, op. cit., v. 1, t. 1, p. 212.LIO 2 EXERCCIOS O texto que vem a seguir uma montagem feita pelos autores, a partir de fragmentos de uma reportagem de Wagner Carelli, publicada pela revista Carta Capital (15 :12-25, out. 1995). Sob o ttulo Pequeno Tratado do Malcriado Brasileiro, o jornalista expe e comenta o comportamento social de um tipo de brasileiro pertencente elite econmica do pas. Foi sobre essa forma de comportamento que o pesquisador americano Michel Lind elaborou uma tese acadmica, editada em livro sob o ttulo de The Next American Nation (traduzindo literalmente, A prxima nao americana). Nessa obra, o autor cria o neologismo brasilianizao para designar um fenmeno social que se originou e se 95. implantou no Brasil, e que constitui, segundo ele, a maior ameaa para a sociedade norte-americana do sculo XXI. Para destacar com nitidez os diferentes fragmentos extrados da reportagem, cada um deles vem precedido de um nmero romano que no consta no texto original. I. Marcos G., publicitrio bem-sucedido, rico, 38 anos, deu uma mountain bike importada preo por volta de seus R$500,00 para o filho Bruno G., 9 anos. Era um presente de aniversrio. Marcos e famlia moram em Alphaville, um condomnio da alta classe mdia da regio perifrica de So Paulo, concebido dentro dos padres dos melhores subrbios americanos; a, as bicicletas das crianas costumam corresponder em estilo, origem e preo aos carros dos pais. Passada uma semana do aniversrio, Marcos notou que o filho brincava a p. Perguntou pelo presente, e o menino desconversou. Confessou depois muito 96. embaraado que a bicicleta fora, ahn, expropriada por Pedro A. C., 10 anos, filho do bem-sucedido empresrio da construo civil Carlos Alberto C., rico, por volta dos 40, 42 anos, morador daquela casa enorme na quadra de cima. Marcos bateu casa de Carlos Alberto. O prprio Carlos Alberto atendeu. Vim buscar a bicicleta do Bruno, que o Pedro tomou emprestada, disse Marcos. Carlos Alberto no gostou: Me diz o preo dessa m... a que eu pago. Marcos disse que a bicicleta no estava venda, entrou para peg-la, e voltou para casa. 97. II. Alphaville apenas um dos enclaves sociais de elite que se disseminam pelas grandes cidades brasileiras, espcies de guetos s avessas, que variam nas caractersticas e concordam no propsito. No gueto chique do Morumbi, na Zona Sul de So Paulo, por exemplo, o afastamento determinado por lombadas e cancelas uma das formaes defensivas mais comuns aos bairros nobres das capitais do pas. Com um acintoso agravante: a o espao de defesa tomado 98. cidade. Em dezenas de ruas pblicas e centrais do bairro, lombadas a cada cem metros e cancelas s extremidades, operadas por guardas armados, lembram ao caminhante eventual caso lhe deem passagem que trafega em propriedade alheia. As ruas foram expropriadas comunidade, como a bicicleta do menino em Alphaville, para o erguimento da paliada. O chamado fosso social nunca foi to explcito. III. O fenmeno chegou a ser observado almfronteiras e nos Estados Unidos mereceu a tese de u m scholar, Michael Lind, editor de influente publicao americana, o The New Republic. A ganhou carter de perigosa tendncia social e um nome: em seu livro The Next American Nation, ainda sem edio brasileira, Lind chama o processo de entrincheiramento das elites de brasilianizao. Ele cunhou o termo para explicar a crescente retirada das classes superiores para trs das barricadas de uma prpria nao dentro da nao, um mundo de bairros privados, escolas privadas, polcia privada, sade privada e at 99. mesmo ruas privadas, muradas contra a misria ao redor. Lind refere-se s evidncias ainda escassas que considera ameaadoras da tendncia nos Estados Unidos, mas reconhece no Brasil sua origem e sua forma instituda. IV. Sob a rubrica desse egosmo terminal que no apenas usa o outro, mas o elimina possvel sistematizar e catalogar um rol de atitudes tpicas, at ento aparentemente desconectadas. O caso do lixo, por exemplo: na cabine do sempre limpssimo carro importado, nacional, velho ou novo, o carro alma da clula brasilianizada o lixo no fica; fora, pode ficar, j que o lado de fora, viu-se, um lugar que no existe. Abre-se a porta do elevador e o malcriado, nico desenvolvido no pas, no espera que as pessoas saiam l de dentro: ele caminha diretamente rumo ao fundo do elevador, como se entre almas. O sinal fecha, o motorista mais malcriado em todo o mundo interrompe o cruzamento do trfego 100. transversal; fora da sua prpria cabine movimento no h trfego: esse indivduo que acredita em vida alm da sua produz 50 mortes, anualmente, quase a metade atropelamentos.em no mil emQUESTO 1 No trecho I, h uma passagem que ilustra exemplarmente a expresso Malcriado Brasileiro, que consta do ttulo da reportagem. a) Transcreva essa passagem. b) Que indicadores de m-criao esto presentes nessa passagem? c) Opondo-se a esse discurso do brasileiro malcriado, circula, dentro da nossa cultura, um outro discurso que serve para demonstrar que, por trs do ponto de vista defendido por um, existe um ponto de vista contrrio, mesmo que no venha explcito. Qual o discurso que afirma um ponto de vista 101. oposto ao que vem explcito no trecho I? QUESTO 2 H uma concepo segundo a qual a riqueza fruto da injustia e, por isso, no deve ser motivo de exibicionismo mas de culpa por parte de quem a possui. o que diz este pensamento de Montesquieu: As riquezas so uma injustia que se deve reparar, e poder-se -ia dizer: Desculpem-me, se sou rico. Meus pensamentos. Apud RNAI, Paulo. Dicionrio universal Nova Fronteira de citaes. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1985. p. 852.a) Ainda no trecho I, h uma passagem que se ope frontalmente a esse ponto de vista. Transcreva-a. b) Explique a sua resposta. QUESTO 3 O trecho que vem a seguir, retirado da revista Veja, exemplar para demonstrar a heterogeneidade de vozes (pontos de vista) 102. presentes no discurso: Patres de um lado, empregados de outro. Os primeiros sobem e descem pelo elevador social. No de servio, com sacos de lixo e carrinhos de compras, vo as empregadas domsticas, os motoristas e os entregadores de pizza. Essa diviso j considerada contraveno em So Paulo. o que garante o projeto de lei elaborado pela vereadora Aldaza Sposati (PT) e sancionado pelo prefeito Paulo Maluf. A partir de agora, quem impedir a empregada de usar o elevador social ou obrigar a manicure a subir pelo de servio poder pagar uma multa de 1185 reais. Revista Veja, :39, 24 jan. 1996.Como se v, numa sociedade complexa, uma questo posta em debate gera opinies divergentes, variando de grupo para grupo. No texto de Veja, esto explcitos dois pontos de vista opostos sobre uma nica questo: a) Quais so esses pontos de vista? 103. b) Qual desses pontos de vista corresponde ao do brasileiro malcriado? Explique por qu. c) No trecho II, o autor da reportagem da revista Carta faz um relato sobre O gueto chique do Morumbi. O que vem relatado a ope-se a qual dos pontos de vista explcitos no trecho da revista Veja? Explique sua resposta e transcreva uma passagem que sirva para ilustr-la. QUESTO 4 Observe a citao que segue, um fragmento do livro Razes do Brasil, de Srgio Buarque de Holanda: [...] daremos ao mundo o homem cordial. A lhaneza no trato, a hospitalidade, a generosidade [...] representam, com efeito, um trao definido do carter brasileiro... Srgio Buarque de Holanda. Razes do Brasil. 5. ed., rev. Rio de Janeiro, Jos Olympio,1969. p. 106.No trecho III, o termo brasilianizao confirma ou nega o contedo da citao acima? Por qu? 104. QUESTO 5 No discurso do homem que se chama de civilizado, a palavra urbanidade designa a qualidade prpria da pessoa bem-educada, polida, que age com decncia. O termo rstico, por oposio, indica qualidade de quem grosseiro, rude, malcriado. Trata-se de palavras carregadas de preconceito social, j que, segundo a origem latina, urbanidade a qualidade de quem vive na cidade (urbs em latim = cidade); rstico prprio de quem vive no campo (rus em latim = campo, regio agrria, espao rural). a) Levando em conta esses dados, os relatos contidos no trecho IV se opem ou se ajustam ao conceito de urbanidade do discurso do homem que se diz civilizado? b) Dentro do discurso do homem urbanizado, a boa educao se caracteriza por certas atitudes como: polidez (= delicadeza, cortesia); altrusmo (o oposto do egosmo, considerao e respeito pelo 105. outro); a compaixo (= sentimento humanitrio, preocupao com o bem-estar do prximo, aflio com a dor alheia). Transcreva, do trecho IV atitudes que , contrariam: a polidez; o altrusmo; a compaixo. QUESTO 6 Da leitura dos quatro trechos, pode-se concluir que: a) o autor da reportagem d mostras claras de que se ope ao ponto de vista daqueles que defendem o discurso favorvel ao fenmeno da brasilianizao. b) o autor da reportagem se ope ao ponto de vista de Michael Lind sobre o discurso da brasilianizao, considerando que no se trata de um fenmeno exclusivo do Brasil e, por isso, o autor americano injusto para com os brasileiros. c) entre o ponto de vista do autor da reporta-gem e o do intelectual americano Michael Lind no h 106. nenhuma oposio j que ambos consideram a brasilianizao como uma ameaa futura para o Brasil e para os Estados Unidos. d) o autor da reportagem faz questo de repetir muitas vezes o fato de que, ao lado do brasileiro malcriado, existe um outro tipo de brasileiro cordial, afvel e generoso. e) o texto todo da reportagem adverte que nos Estados Unidos o fenmeno da brasilianizao mais disseminado do que no Brasil e, por isso, no h razo para designar tal conduta social com um nome que ofende o nosso sentimento de nacionalidade.PROPOSTAS DE REDAO 1) O discurso publicitrio procura adaptar-se integralmente ao ponto de vista ( viso de mundo) do consumidor que ele pretende seduzir para comprar determinado produto. Na propaganda abaixo, por exemplo, o texto diz 107. que o carro Peugeot 106 perfeitamente ajustado a um tipo de consumidor cujo ideal de felicidade vem expresso num discurso em que a sensao de prazer produzida por satisfaes de natureza exclusivamente individual.Revista Veja, 34 :24-5, 23 ago. 1995.No h, nesse discurso, nenhuma preocupao com os problemas do homem, da sociedade e do mundo. Para usar uma expresso da gria popular, o Peugeot 106 para um consumidor cuca 108. fresca. Como todo tipo de discurso, esse tambm se ope a um outro tipo que defende pontos de vista diferentes. o caso do que diz o filsofo Bertrand Russell no Prlogo de sua autobiografia: Trs paixes, simples, mas irresistivelmente fortes, governaram-me a vida: o anseio do amor, a busca do conhecimento e a dolorosa piedade pelo sofrimento da humanidade. Autobiografia de Bertrand Russell, 1872-1914. Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 1967. v. 1, p. 1.Procure redigir um pequeno texto semelhante ao da publicidade acima, revelando outro tipo de discurso, que seja, como o de Bertrand Russell, oposto ao que vem nela exposto. 2) Os exames vestibulares, nas provas de redao, tm explorado largamente a caracterstica da diversidade de vozes presentes no discurso, sugerindo para discusso textos que se opem entre si. o caso da proposta de redao que vem a seguir, extrada de um vestibular da Fuvest. 109. Leia atentamente os textos dados, procurando identificar a questo neles tratada. ESCREV UMA DISSERTAO EM A PROSA, relacionando os dois textos e expondo argumentos que sustentam seu prprio ponto de vista. TEXTO 1 Entre os Maoris, um povo polinsio, existe uma dana destinada a proteger as sementeiras de batatas, que quando novas so muito vulnerveis aos ventos do leste: as mulheres executam a dana, entre os batatais, simulando com o movimento dos corpos o vento, a chuva, o desenvolvimento e o florescimento do batatal, sendo esta dana acompanhada de uma cano que um apelo para que o batatal siga o exemplo do bailado. As mulheres interpretam em fantasia a realizao prtica de um desejo. nisto que consiste a magia: uma tcnica ilusria destinada a suplementar a tcnica real. Mas essa tcnica ilusria no v. A dana no pode exercer qualquer efeito direto 110. sobre as batatas, mas pode ter (como de fato tem) um efeito aprecivel sobre as mulheres. Inspiradas pela convico de que a dana protege a colheita, entregam-se ao trabalho com mais confiana e mais energia. E, deste modo, a dana acaba, afinal, por ter um efeito sobre a colheita. George Thomson TEXTO 2 A cincia livra-nos do medo, combatendo com respostas objetivas esse veneno subjetivo. Com um bom para-raios, quem em casa teme as tempestades? Todo ritual mtico est condenado a desaparecer; a funo dos mitos se estreita a cada inveno, e todo vazio em que o pensamento mgico imperava est sendo preenchido pelo efeito de uma operao racional. Quanto arte, continuar a fazer o que pode: entreter o homem nas pausas do seu trabalho, desembaraada agora de qualquer outra misso, que no mais preciso lhes atribuir. Hercule Granville 111. 1 herldica: estudo dos brases de nobreza ou escudos. 112. LIO 3 diferentes formas de mostrar a presena das mltiplas vozes num texto: deix-las implcitas, por conta da memria do leitor, ou traz-las para a cena, demarcando explicitamente seu lugar e seu limite.H 113. As histrias em quadrinhos usam com frequncia o discurso direto. Nessa linguagem, a fala de cada personagem associada diretamente sua imagem. Isso permite ao leitor apreender com facilidade as vozes mostradas no texto.Os vizinhos, quadrinho de Laerte (fragmento). 114. LIO 3 VOZES MOSTRADAS E DEMARCADAS NO TEXTOLeia este poema de Manuel Bandeira: SATLITE 115. Fim de tarde. No cu plmbeo A Lua baa Paira Muito cosmograficamente Satlite. Desmetaforizada, Desmitificada, Despojada do velho segredo de melancolia, No agora o golfo de cismas, O astro dos loucos e enamorados, Mas to somente Satlite. Ah Lua deste fim de tarde, Demissionria de atribuies romnticas, Sem show para as disponibilidades sentimentais! 116. Fatigado de mais-valia, Gosto de ti assim: Coisa em si, Satlite. Manuel Bandeira. Estrela da vida inteira. 4. ed. Rio de Janeiro, Jos Olympio, 1973. p. 232.Nos versos de 1 a 6, o poeta constri uma figura da lua, situando-a num fim de tarde, num cu plmbeo (cor de chumbo), atribuindo-lhe a qualidade de baa, isto , fosca, embaada, e dizendo que ela paira muito cosmograficamente. Como cosmografia a astronomia descritiva, principalmente referente ao sistema solar, o que o poeta quer dizer com paira muito cosmograficamente que a lua est no alto pura e simplesmente como um astro. O poeta sintetiza essa imagem numa palavra: Satlite. Com essa figura, o poeta pretende enfatizar o conceito puro de lua, despojado de qualquer tipo de associao paralela, sem as impresses 117. sentimentais que evoca. O uso reiterado do prefixo des, que indica ao contrria (desmetaforizada, desmitificada, despojada), e a afirmao de que a lua no agora o astro dos loucos e dos enamorados pressupem que, no passado, ela foi metaforizada, mitificada, considerada como o depsito do velho segredo de melancolia, como um golfo de cismas, como o astro dos loucos e enamorados. A negao, tanto a indicada pelo prefixo des, quanto a feita pelo advrbio no, implica a presena de duas vozes, dois pontos de vista a respeito da lua: um que a v como uma fonte e um repositrio de sentimentos, de mitos e de metforas; outro que a v em sua realidade nua indicada pela palavra satlite. Uma negao implica duas perspectivas distintas sobre uma dada questo, pois ela se ope a uma afirmao anterior, refuta a posio afirmativa correspondente. Em nosso texto, quando se diz, por exemplo, que a lua agora no o golfo 118. de cismas, o astro dos loucos e enamorados, o poeta nega um ponto de vista anterior, de que a lua o golfo de cismas, o astro dos loucos e enamorados. Diferentemente do caso estudado na lio anterior em que no havia marcas lingusticas a delimitar as duas concepes implicadas no texto, mas elas eram percebidas apenas pelo nosso conhecimento a respeito das diferentes opinies que circulavam numa determinada sociedade sobre uma dada questo, nesse texto de Manuel Bandeira, os operadores lingusticos da negao (o prefixo des e o advrbio no) demarcam os dois pontos de vista, as duas vozes mostradas no texto. Apesar de essas duas perspectivas estarem delimitadas pela negao, precisamos ainda nos valer de nossa memria discursiva, de nosso conhecimento dos textos literrios, para entender bem o que o poeta est refutando. As expresses golfo de cismas e astros dos loucos e enamorados remetem-nos a uma estrofe do poema Plenilnio, de Raimundo Correia: 119. H tantos anos olhos nela arroubados, No magnetismo do seu fulgor! Lua dos tristes e enamorados, Golfo de cismas fascinador. Raimundo Correia. Poesia. 4. ed. Rio de Janeiro, Agir, 1976. p. 65.Ao opor-se a uma concepo a respeito da lua, atribuda a um literato do passado, podemos concluir no que o poeta esteja lamentando o fim dos bons tempos romnticos e criticando a frieza do mundo moderno, mas que avesso aos exageros sentimentais de uma certa literatura em torno da lua. Quando ele diz sem show para as disponibilidades sentimentais, quer dizer que a lua qual dirige seus versos no est mais a exibir-se para pessoas predispostas a v-la de maneira sentimental. Se levarmos em conta que a mais-valia se define como a diferena entre o custo da fora de trabalho e o valor do produto produzido pelo trabalhador, ao dizer fatigado de mais-valia, o poeta manifesta sua averso aos exageros prprios de literatos de pocas passadas, 120. que consistem em explorar a lua, roubando dela significados que ela no comporta. O poeta manifesta sua predileo pela concepo moderna (Gosto de ti assim: / Coisa em si, / Satlite). Por meio das negaes, e da negao de um texto potico, o poeta circunscreve no texto dois pontos de vista a respeito da poesia. Contesta uma poesia que idealiza a realidade, assume como sua uma concepo de potica como busca da essncia da realidade.H diversos mecanismos lingusticos que servem para mostrar diferentes vozes no interior de um texto, demarcando nitidamente esses distintos pontos de vista. Estudemos alguns deles. O primeiro desses mecanismos a negao, pois, como se disse, nela esto implicadas duas vozes: uma que afirma e outra que refuta a afirmao anterior. Assim, quando Brs Cubas diz, no final de suas Memrias pstumas, No tive 121. filhos, no transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa misria, temos dois tipos de negao: a primeira (No tive filhos), chamada negao descritiva, aquela que aparentemente nega um dado da realidade, mas na verdade rejeita o que poderia ser a viso de algum sobre ela (no c a s o , teve filhos); a segunda denominada negao polmica, pois expressa claramente uma oposio a um dado ponto de vista presente na sociedade (no caso, ter filhos transmitir a uma criatura tudo o que existe de bom), afirmando uma concepo contrria (no texto, a de que ter filhos transmitir a alguma criatura o legado da misria da humanidade). 122. Acervo da Coleo MASP/Pirelli de Fotografia, So Paulo.Rio de Janeiro, 1985, fotografia de Walter Firmo. Na linguagem fotogrfica tambm podem ser demarcados diferentes discursos no interior da imagem. Nesta foto, o contraste explicitado visualmente: de um lado, a afirmao de luxo e ostentao na fantasia carnavalesca; de outro, o discurso de pobreza e precariedade da moradia que abriga a personagem.Outro expediente lingustico para mostrar diferentes vozes bem demarcadas no texto so o 123. discurso direto e o indireto. Num texto, as personagens falam, conversam entre si, expem suas ideias. Quando o narrador conta o que elas disseram, insere na narrativa uma fala que no de sua autoria, cita o discurso alheio. O discurso direto e o indireto so procedimentos de reproduo do discurso das personagens. Observe o texto que segue, extrado do romance Ana em Veneza, de Joo Silvrio Trevisan: Estavam agora diante de uma bandeja de queijos variados. Ah, o Brasil, essa imensa ilha... dizia o conde Basuccello, entretido em cortar um pedao de sbrinz dos Alpes. De fato aparteou Nepomuceno estamos muito isolados na Amrica. A lngua mas tambm... Oh, no. No me refiro a isso, que no deixa de ser verdadeiro retrucou o conde, acabando de mastigar. Falo de uma dessas ilhas utpicas 124. cuja lenda se perde na noite dos tempos. Os senhores talvez no saibam, mas o nome Brasil em geografia j existe desde o perodo medieval. Mas o Brasil s foi descoberto bem depois... No mesmo, Herr Nepo? admirou-se Jlia, entretida com um delicioso queijo stracchino lombardo. Sim, mas antes do atual Brasil j existia na Idade Mdia uma ilha chamada Brasil asseverou Basuccello. Bem existiam muitas ilhas mticas imaginadas pelos povos de ento. Todas representavam o paraso terrestre, onde no haveria discrdia nem velhice nem doenas ou morte. Eram to perfeitas que seus habitantes no precisavam sequer trabalhar para comer. Numa dessas ilhas, imaginem, as frutas caam do p pontualmente s nove horas, para poupar os homens do trabalho de colh-las. Joo Silvrio Trevisan. Ana em Veneza . 2. ed. So Paulo, Best Seller, (1994). p. 465-6.Nesse texto, o narrador indica a fala das 125. personagens, dizendo dizia o conde Basuccello, entretido em cortar um pedao de sbrinz dos Alpes; aparteou Nepomuceno; retrucou o conde, acabando de mastigar; admirou-se Jlia, entretida com um delicioso queijo stracchino lombardo; asseverou Basuccello, e como que passa a palavra a elas, o conde Basuccello, Nepomuceno e Jlia, e deixa-as falar. O discurso direto o modo de citao do discurso alheio em que o narrador indica o discurso do outro e, depois, reproduz literalmente a fala dele. As marcas do discurso direto so: a) a fala das personagens anunciada por um verbo (no nosso exemplo, dizia, aparteou, retrucou, admirou-se, asseverou ) denominado verbo de dizer (outros exemplos so responder, retorquir, replicar, acrescentar, obtemperar etc.), que pode vir antes, no meio ou depois da fala da personagem (no nosso caso, veio depois ou no meio) ou ainda estar subentendido (depois da fala de uma personagem, o simples fato de aparecer 126. outro travesso indica que outra personagem tomou a palavra); b) a fala das personagens aparece nitidamente separada da fala do narrador por aspas ou por dois-pontos e travesso; c) os pronomes pessoais e possessivos, os tempos verbais e as palavras que indicam tempo e espao, como, por exemplo, pronomes demonstrativos e advrbios de lugar e de tempo, so usados tendo como referncia tanto o narrador como as personagens: assim tanto o narrador como as personagens dizem eu, denominam a pessoa com quem falam tu, chamam o espao em que cada um est aqui e em funo dele organizam os demais espaos (a, l), marcam o tempo em que cada um fala como agora e a partir dele ordenam os outros tempos. Observe agora o fragmento do conto O inimigo, de Rubem Fonseca, que aparece abaixo: 127. segunda-feira; estou triste pois no domingo cheguei para Aspsia e recitei para ela em espanhol, La casada infiel; depois de ouvir sorridente o que deveria (achava eu) comov-la at as lgrimas, ela encerrou o assunto dizendo que o meu espanhol era nojento. Rubem Fonseca. Contos reunidos. So Paulo, Companhia das Letras, 1994. p. 58.Nesse caso, o narrador, para citar o que Aspsia lhe disse, usa outro procedimento: no d a palavra personagem, mas comunica, com suas palavras, o que ela disse. A fala de Aspsia no chega diretamente ao leitor, mas por via indireta, isto , por meio das palavras do narrador. Por essa razo, esse expediente chama-se discurso indireto. As principais marcas do discurso indireto so: a) o que a personagem disse vem tambm introduzido por um verbo de dizer; 128. b) o que a personagem disse constitui uma orao subordinada substantiva objetiva direta do verbo de dizer e, portanto, separada da fala do narrador por uma partcula introdutria, que pode ser uma conjuno como o que ou o se (Ele disse que no sabe), um advrbio (No disse onde estar) ou um pronome interrogativo (Pergunto por que ele no veio); c) como apenas o narrador toma a palavra, apenas ele diz eu; somente a pessoa com quem ele fala designada por tu; s o lugar onde ele est chamado aqui e, a partir dele, os demais espaos so organizados; apenas o tempo em que ele fala marcado como agora e em funo dele so ordenados os outros tempos. Faamos um confronto entre a citao da mesma fala alheia em discurso direto e em discurso indireto: Pedro disse: 129. Eu estarei aqui amanh. No discurso direto, a personagem Pedro toma a palavra, depois da introduo feita pelo narrador, dizendo eu; aqui o lugar em que ela est; amanh o dia seguinte ao dia em que ela fala. Se passarmos essa frase para o discurso indireto ficar assim: Pedro disse que estaria l no dia seguinte. No discurso indireto, eu passa a ele, porque indica no mais quem fala, mas algum a respeito de quem o narrador diz alguma coisa; estaria futuro do pretrito, que um tempo que indica posterioridade em relao a um momento pretrito, indicado por disse, e no posterioridade ao momento presente em que a personagem est falando, como o faz estarei; l o espao em que est a personagem distinto do aqui em que se acha o narrador; no dia seguinte o dia posterior ao momento pretrito em que se deu a fala da 130. personagem. Na passagem do discurso direto para o indireto, deve-se observar o seguinte: a) as frases que, no discurso direto, tm a forma interrogativa, exclamativa ou imperativa convertem-se, no discurso indireto, em oraes declarativas: Ela me perguntou: Quem est a? Ela me perguntou quem estava l. b) as interjeies e os vocativos do discurso direto desaparecem no discurso indireto ou seu valor semntico explicitado, isto , traduz-se o significado que eles expressam: O papagaio disse: Oh! L vem a raposa. O papagaio disse admirado [explicitao do 131. valor semntico da interjeio oh] que ao longe vinha a raposa. c) se o discurso citado (fala da personagem) comporta um eu ou um tu que no se encontram entre as pessoas do discurso citante (fala do narrador), eles so convertidos num ele; se os pronomes demonstrativos (este, esse, aquele) e os advrbios de espao (aqui, a, l) do discurso citado no corresponderem aos do discurso citante devem ajustar-se a estes: Pedro me disse l em Paris: Aqui eu estou sentindo-me bem, pois nesta cidade tudo bonito. Pedro me disse em Paris que l ele estava se sentindo bem, pois naquela cidade tudo era bonito. Eu converte-se em ele, porque Pedro, a personagem que disse eu em discurso direto, no a pessoa que fala no discurso citante, mas a 132. pessoa de quem se fala. Aqui e nesta transformamse, respectivamente, em l e naquela, porque no discurso citado indicam o lugar em que estava Pedro, quando falou, mas, como agora o narrador est falando de outro lugar, Paris indicado por l, e o advrbio de espao e o pronome demonstrativo tm de se ajustar a esse lugar. d) se as pessoas do discurso citado, isto , da fala da personagem, tm um correspondente no discurso citante, seu estatuto o mesmo neste ltimo: Maria declarou-me: Eu te amo. Maria declarou-me que me amava. O te do discurso citado corresponde ao me do citante. Por isso, o te converte-se em me. 133. e) no que se refere aos tempos, s h alterao quando o tempo do discurso citante estiver no pretrito e os tempos do discurso citado forem o presente, o pretrito perfeito e o futuro do pretrito; em outros casos, no h qual-quer mudana. Se o verbo de dizer estiver no pretrito perfeito, as converses so as seguintes: discurso direto presente pretrito perfeito futuro do presentediscurso indireto pretrito imperfeito pretrito mais-queperfeito futuro do pretritoExemplos: 1) Joaquim disse: Compro tudo isso. Joaquim disse que comprava tudo aquilo. 2) Joaquim disse: 134. Comprei tudo isso. Joaquim disse que comprara tudo aquilo. 3) Joaquim disse: Comprarei tudo isso. Joaquim disse que compraria tudo aquilo. O discurso direto uma espcie de teatralizao da fala dos outros. Por isso, produz um efeito de sentido de verdade. O leitor ou o ouvinte tem a impresso de que quem cita preservou a integridade do discurso citado e de que, portanto, autntico o que ele reproduziu. como se ouvisse a pessoa citada falar com suas prprias palavras e com a mesma carga de subjetividade. Como h dois tipos de discurso indireto (o que analisa o contedo e o que analisa a expresso), esse procedimento de citao do discurso alheio pode criar diferentes espcies de efeitos de 135. sentido. Dado que o primeiro tipo elimina os elementos emocionais ou afetivos presentes no discurso direto (por exemplo, as interrogaes, as exclamaes, as formas imperativas, as interjeies), produz um efeito de sentido de objetividade analtica. Nele o narrador revela somente o contedo do discurso da personagem e no o modo como ela o disse. Com isso, o narrador estabelece uma distncia entre sua posio e a da personagem, abrindo caminho para a rplica e o comentrio. Esse tipo de discurso indireto despersonaliza o discurso citado em nome da objetividade. Cria, assim, a impresso de que o narrador analisa o discurso citado de maneira racional e isenta de envolvimento emocional. O discurso indireto, nesse caso, no se interessa pela individualidade do falante revelada no modo como ele diz as coisas. Por isso, a forma preferida nos textos de natureza filosfica, cientfica e poltica com a finalidade de criticar, rejeitar ou acolher as posies expressas pelos outros. O segundo tipo de discurso indireto serve para 136. analisar as palavras, o modo de dizer dos outros e no o contedo do que dizem. Nesse caso, as palavras ou expresses ressaltadas aparecem entre aspas. Veja-se este exemplo, extrado de Ea de Queirs: ... descobrira de repente, uma manh, que no devia trair Amaro, porque era pap do seu Carlinhos. E disse-o ao abade; fez corar os sessenta e quatro anos do bom velho... Ea de Queirs. O crime do padre Amaro. So Paulo, tica, 1993. p. 326.Nesse caso, Amlia disse que no devia trair Amaro, porque era pap do seu Carlinhos. O que est entre aspas a expresso usada pela personagem. Ao usar o discurso indireto para analisar o modo de falar de uma personagem, o narrador o faz para dar relevo a uma tpica expresso dela e, assim, manifestar uma particularidade dela. Nesse 137. caso, o discurso indireto revela peculiaridades por meio de formas de falar. Alm disso, mostra a posio do narrador em relao a elas (ironia, condescendncia, desagrado, desdm etc.). Outro recurso lingustico para demarcar a voz alheia no texto o uso das aspas. Nesse caso, o produtor do