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    Nova Economia_Belo Horizonte_23 (2)_329-366_maio-agosto de 2013

    A aprendizagem organizacional e

    suas bases econômicas

    Wilson Aparecido Costa de AmorimDepartamento de Administração da FEA USP

     André Luiz Fischer Departamento de Administração da FEA USP

    Resumo

    Este artigo objetiva apresentar os nexos teóricosque, a partir da Economia, justiquem a im-portância do estudo do fenômeno da aprendi-zagem organizacional, mais tipicamente abor-dado na Administração. Em primeiro lugar,são discutidas as características das economiasbaseadas em conhecimento e suas exigênciasem termos de aprendizado e desenvolvimentode competências organizacionais. Em segun-do lugar, a partir das limitações dos pressu-postos neoclássicos em relação à organização,é abordada a noção de estratégia. A seguir, sãoapresentadas origens do conceito de compe-tências na teoria da rma baseada em recursose seus desdobramentos para os estudos sobre

    estratégia e competências. No próximo passo,são destacados elementos conceituais do cam-po da aprendizagem organizacional. Por m,identicam-se ligações existentes entre a vidaorganizacional e a abordagem econômica, nosaspectos que relacionam o conhecimento e aaprendizagem organizacionais ao desenvolvi-mento econômico

    Palavras-chave

    aprendizagem organizacional,economia baseada emconhecimento e competênciasorganizacionais.

    Classificação JEL B5, O3, I25

    Abstract

    Tis paper intends to show the theoretical linksthat justify why it is important to study, froman Economics point of view, the phenomenonof organizational learning – which istraditionally studied in Business Management.Te rst step shows the characteristics ofKnowledge-Based Economies and their needsregarding organizational learning and thedevelopment of competencies. Te second stepcriticizes the neoclassical assumptions aboutorganizations and stresses the importance ofthe notion of strategy. Te third step discussesthe origins of the concept of competencies, inthe Resource-Based View of the Firm, andits inuence on organizational competenciesand strategy. Te fourth step points out theconcepts of the eld of organizational learning.Finally, the paper shows the links betweenorganizational life and the economicapproach, mainly as they relate the conceptsof knowledge, organizational learning andeconomic development.

    Keywords

    organizational learning,knowledge-based economy,organizational competencies.

    JEL Classification B5, O3, I25 

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    1_Introdução A luta das organizações pela liderança, ou

    simplesmente pela sobrevivência, em ummercado que se move com rapidez, liga-

    -se indissoluvelmente à sua capacidadede adaptação e inovação. A interpreta-ção correta dos sinais do mercado ou, demaneira mais ambiciosa, a criação de re-ferências inovadoras para o mercado sãoatividades dependentes da capacidade de

    compreensão e elaboração da organiza-ção e seus integrantes. Em um mundode informação cada vez mais abundante,conhecer e aprender são atividades ou ha-bilidades indispensáveis para toda e qual-quer organização, seja pública ou privada,seja empresarial ou sindical.

    Quando o conhecimento e a apren-

    dizagem tornam-se assuntos da Economiae Administração, novas polêmicas somam-

    -se às já existentes em outros camposcomo Filosoa, Psicologia, Pedagogia eecnologia. A Economia e a Adminis-tração têm grande exigência quanto àoperacionalização de seus conceitos. NaEconomia, as questões em torno do co-

    nhecimento e da aprendizagem deman-dam posicionamento do Estado e suaspolíticas públicas de educação, formaçãoprossional e também de apoio à ciência.Na Administração, o ato de conhecer eaprender nas organizações deve conectar-

    -se aos seus objetivos, ou seja, tornar-se

    parte da gestão. Por esse motivo, detectaros melhores caminhos para o desenvol-

    vimento de processos de disseminaçãoe criação de conhecimento e aprendiza-gem encontra-se entre as prioridades daspreocupações das organizações.

    Este trabalho objetiva estabeleceros nexos teóricos que, com base na Eco-nomia, justiquem a importância do es-tudo do fenômeno da aprendizagem or-

    ganizacional, mais tipicamente abordadono campo da Administração. Além destaintrodução, este artigo conta com as se-guintes partes: inicialmente são discuti-das as características das economias base-adas em conhecimento e suas exigênciasem termos de aprendizado e desenvolvi-mento de competências organizacionais.

     A seguir, tendo em vista as limitaçõesdos pressupostos neoclássicos em relaçãoà organização, é abordada a importânciada noção de estratégia. No tópico seguin-te, são apresentadas algumas das origensdo conceito de competências na teoriada rma baseada em recursos e seus des-dobramentos para os estudos sobre estra-

    tégia e competências. No próximo passo,são destacados os elementos conceituaisreferentes ao campo da aprendizagemorganizacional. Finalmente, em um ca-minho de volta, identicam-se ligaçõesexistentes entre a vida organizacional e aabordagem econômica, principalmente

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    nos aspectos que relacionam o conheci-mento e a aprendizagem organizacionais

    ao desenvolvimento econômico.

    2_A Economia Baseadaem Conhecimento

    Nesta parte são apresentados sinteticamen-te aspectos do conhecimento e aprendiza-gem relacionados à Economia. Para isso,

    são destacados os autores neoschumpe-terianos (que formulam o conceito deEconomia Baseada em Conhecimento) eautores dedicados à eoria da Firma Ba-seada em Recursos. A intenção é destacaros fundamentos econômicos da atual va-lorização do conhecimento e da aprendi-zagem nas organizações contemporâneas

    e, assim, demonstrar as ligações entre aEconomia e o conceito de competênciase suas implicações para as organizações.

    2.1_Schumpeter: inovação e

    desenvolvimento econômico

     As principais obras do economista aus-tríaco Joseph Alois Schumpeter (1883-

    1950) reetem sua preocupação com asgraves crises econômicas e políticas deseu tempo, como as duas grandes guerrase o advento da revolução comunista. Au-tor de difícil enquadramento nas escolaseconômicas, ele analisa crítica e criativa-mente ideias ideologicamente distantes

    entre si – como as de Marx e Marshall– nos principais assuntos da Economia,

    entre eles, o processo de desenvolvimen-to econômico.

    Para Schumpeter, o processo dedesenvolvimento econômico é compos-to de ciclos econômicos que, por sua vez,se relacionam às ondas de inovação. Se-gundo ele, o impulso fundamental para adinâmica econômica era dado pelo novo,

    que na sua chegada realizava a “destrui-ção criadora” – um dos seus mais impor-tantes conceitos – dos elementos base-ados nas velhas formas da produção. Osurgimento de outros bens de consumo,outros métodos de produção ou trans-porte, outros mercados e outras formasde organização industrial...

    “‘revoluciona’ a estrutura econômica

    a partir de dentro, incessantemente

    destruindo a velha, incessantemente

    criando a nova” (Schumpete r, 1984, p. 113).

    Desta forma, a presença bem-su-cedida do novo na economia destruiriaas oportunidades de sobrevivência das

    estruturas velhas através da concorrênciacapitalista. O autor assinala que a con-corrência capitalista não acontece confor-me a visão tradicional em que o preçotem função dominante, e os padrões deprodução não variam. Em sua opinião, aprincipal concorrência ocorre na forma

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    da venda de novas mercadorias, na utili-zação de novas tecnologias, novas fontes

    de oferta e mesmo de novas formas deorganização da produção. Essa concor-rência, baseada na inovação, visa ao lucroe, indo além, seria capaz de alterar os pró-prios fundamentos das empresas. Nela, oempresário, mesmo como monopolista,sente-se concorrendo pela simples ame-aça de que outros empresários venham

    disputar seu mercado. Por causa disso,busca a inovação (Schumpeter, 1984, p.114-115). No balanço entre custos e bene-fícios para a economia como um todo, asperdas provocadas nos setores perdedoresnessa disputa seriam mais que compensa-das pelos benefícios trazidos pelas inova-ções, ainda que sob a responsabilidade de

    empresas monopolistas. A gura do empresário inovador

    desempenha papel importante nos movi-mentos de inovação na economia. Schum-peter critica as denições mais tradicio-nais da gura do empresário ([uma delas]

    “[...] bem conhecida, que remonta a J. B.Say 1: a função do empresário é combi-

    nar os fatores produtivos, reuni-los”, [ouconforme] “[...] a versão marshalliana deempresário, que trata a função empresa-rial simplesmente como ‘administração’”)e entende que ele deve ser um líder queassume os riscos inerentes da inovação,conduz os meios de produção em direção

    aos novos canais e, ao m, lidera a pró-pria concorrência que seguirá seus passos

    pelo caminho aberto (Schumpeter, 1982,p. 54, 55, 63).

    É curioso que, a despeito de per-ceber a importância dos processos deinovação no âmbito econômico, Schum-peter fosse bastante pessimista quanto aofuturo do capitalismo. Para ele, o declí-nio do capitalismo ocorreria em função

    de pelo menos três fatores: a substituiçãogradual do empreendedor pela burocra-cia gerencial das grandes empresas, a re-sistência dos intelectuais relativamenteao sistema capitalista e também o cres-cimento da intervenção estatal na eco-nomia. A combinação desses elementosresultaria na perda do ímpeto pela acu-

    mulação causada pela saída de cena, oumesmo pela redução do espaço de atua-ção do empreendedor inovador, elemen-to-chave no capitalismo. Sua previsão eraque desse declínio adviria o socialismo(Fusfeld, 2001, p. 224-225).

    O tempo mostrou que Schumpeterequivocou-se em sua previsão. As déca-

    das seguintes ao lançamento de seu últi-mo livro foram marcadas por expressivocrescimento econômico mundial, e, jáno nal da década de 80, aconteceria aprópria derrocada dos regimes socialistaspelo mundo. De qualquer modo, a suaabordagem para a relação entre inovação

    1 Jean Baptiste Say (1767-1832), economista francêsque, com base na leitura de

     Adam Smith e David Ricardo,

    formulou uma lei econômicasegundo a qual toda ofertagera a própria demanda(decorrendo daí uma situaçãode pleno emprego para aeconomia). Essa lei econômicaé um dos fundamentosprimeiros da teoria econômicaneoclássica (Miglioli, 1985).

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    e desenvolvimento mostrou-se bastantepertinente para a compreensão dos fenô-

    menos econômicos nas últimas décadas.

    2.2_Economia Baseada em Conhecimento:

    um onceito neoschumpeteriano

     A importância dada por Schumpeter àinovação dentro do processo de desen-volvimento econômico abriu caminhopara interessantes abordagens relativa-

    mente à aprendizagem e ao conhecimen-to na Economia. Isso porque a noção deinovação na economia traz implícitas acriação e a aquisição de conhecimentopor meio das pesquisas necessárias para aprodução de novos produtos e processos,e – inseparável desses dois fenômenos – anecessidade de aprendizagem. Em outras

    palavras, conhecer e aprender situam-seno centro do processo produtivo.

     A expressão “Economia Baseadaem Conhecimento” (EBC) tem comoprecursor um economista heterodoxoentre os autores neoclássicos: Machlup(1962). Esse autor desenvolveu trabalhosteóricos e de pesquisa sobre a economia

    do conhecimento e informação já noinício da década de 60  e concluiu pelaexistência de grandes transformações naseconomias industrializadas, entre elaso aumento da participação dos setoresintensivos em conhecimento (Lenhari;Quadros, 2002).

    Posteriormente, Foray e Lundvallestudam a Economia Baseada em Conhe-

    cimento e assinalam pelo menos dois fatosimportantes que dicultam teoricamentea aplicação dos princípios econômicosfundamentais tradicionais à generaliza-ção e à produção de conhecimento:

    a_ existem grandes mudançasno modo de produção edistribuição de conhecimento

    (nova dinâmica entreconhecimento tácito ecodicado, aumento deimportância das redes detrabalho, aceleração do processode aprendizado) que precisamser repensados em termos dosprincípios econômicos;

    b_ há importantes assuntospolíticos – globalização,subdesenvolvimento,crescimento econômicosustentável, questões ambientais

    – que precisam ser interpretadassob a luz da Economia (comfoco no conhecimento e

    aprendizado) (Foray; Lundvall,1996, p. 12).

    Desde sempre, a capacidade dohomem para aprender novas habilidadese transmiti-las às demais gerações ocupafunção relevante na atividade humana. En-tretanto, relativamente às etapas históricas

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    anteriores, a atual é caracterizada por mu-danças importantes na relação entre co-

    nhecimento e desenvolvimento (Foray;Lundvall, 1996, p. 13). A corrente neoschumpeteriana tra-

    ta das grandes mudanças do capitalismoe estuda a divisão do trabalho que existee é organizada nos chamados sistemasnacionais de inovação (Paula et al., 2000,p. 421). ais autores (como Foray e Lund-

    vall) estão envolvidos com a formulaçãode uma nova teoria do crescimento eco-nômico que compreende os papéis doconhecimento e da tecnologia enquantogeradores de produtividade e desenvolvi-mento. Elementos como investimentosem pesquisa e desenvolvimento, educa-ção e treinamento, e novas formas de ge-

    renciamento tornam-se importantes doponto de vista dessa análise.

    Institucionalmente, os estudos e aspesquisas desenvolvidos pelos neoschum-peterianos inuenciam as discussões dospaíses da Organização para a Cooperaçãoe Desenvolvimento Econômico – OCDE (OECD, 1996). Os estudos dos autores

    neoschumpeterianos oferecem insumospara a elaboração de instrumentos e po-líticas adequadas à situação dos paísesda OCDE, cujos setores intensivos emconhecimento e tecnologia tendem a seros mais dinâmicos em termos de cresci-mento. As principais conclusões destes

    estudos se encontram em documento de1996 (OECD, 1996).

     A seguir, são sumarizados: carac-terísticas, tendências e implicações daEBC, seus principais indicadores e tam-bém o papel desempenhado pelo sistemacientíco.

     A EBC  poderia ser descrita base-ando-se pelo menos em três fenômenos.

     Analisaremos a seguir cada um deles.

    a_Nova dinâmica na formação deconhecimento tácito e codificado

    Esta nova dinâmica seria dada pelaintensicação do processo de codicaçãodo conhecimento, ou seja, a sua transfor-mação de conhecimento tácito – fundadona experiência e não sistematizado – em

    explícito. O documento da OCDE apon-ta quatro tipos de conhecimento envol-vidos nessa dinâmica:

     A codicação do conhecimentoocorreria principalmente por meio datransformação do know-how   e do know-

    -who em registros sistematizados e de fácilacesso e manuseio, ou seja, em um estágio

    no qual esses conhecimentos possam cons-tituir informação. As tecnologias de infor-mação permitem crescente codicação doconhecimento e a sua disponibilidade nosbancos de dados. ais eventos conferemao conhecimento, uma vez sistematizadoe disponível, a característica de commodity ,

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    ou seja, uma matéria-prima padronizada ede baixo custo.

     A continuidade do processo de co-dicação por meio da tecnologia move

    os limites entre os conhecimentos tácitoe explícito, extraindo as experiências depessoas e organizações e colocando-as àdisposição de outras. A codicação cres-cente do conhecimento permite ainda acriação de pontes entre campos e áreas deconhecimento diminuindo sua dispersão.

    b_Importância crescente das redes de conhecimento

    Segundo a EBC, e de acordo com a lógicaschumpeteriana, a Economia tem na ino-vação uma de suas principais forças, o que

    evidentemente pressupõe conhecimento.O uso e a difusão da informação tornam--se tão importantes quanto a criação doconhecimento.2  Dada a crescente possi-bilidade de acesso à informação, o surgi-mento da inovação pode ocorrer tendopor base várias fontes, inclusive de novascapacidades de manufatura e de reconhe-

    cimento de necessidades do mercado.Para Knight, as inovações podem

    ser classicadas em quatro tipos3: inova-ções no produto ou no processo (novosprodutos ou serviços oferecidos pelaorganização), inovações no processo deprodução (novos elementos nas tarefas

    Quadro 1_Conhecimentos: tipos e fontes

    Tipo de conhecimento Fonte

    Conhecimento e informação

    • Know-wha t: o conhecimento sobre fatos(que seria muito próximo da informação)

    • Know-why : refere-se ao conhecimento cientícosobre as leis da natureza 

    • livros, aulas ou do acesso a bancos de dados 

    Conhecimento tácito

    • Know-how : habilidade ou capacidade de fazer algo• Know-who: o conhecimento sobre “quem sabe o quê”

    ou “quem sabe fazer o quê”

    • tipicamente apreendido nas situações em que o aprendizacompanha seu mestre e o reconhece como autoridade

    • é apreendido na prática social e às vezes em ambientes

    educacionais especícos

    Fonte: OECD (1996).

    2 Neste parágrafo, osconceitos de conhecimento einformação são usados, comona fonte, indistintamentecomo sinônimos.3 Moreira e Queiroz (2007, p.9) apontam que existem cercade 20 diferentes classicações

    para os tipos de inovação. Nãoé nosso objetivo aprofundara discussão em torno dessasclassicações, e, por isso, nossareferência será a taxonomia deKnight (1967) que, conformeos autores, é uma dasutilizadas há mais tempo.

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    da organização, seu sistema de informa-ção ou na produção física ou operações

    de serviços), inovações na estrutura or-ganizacional (mudanças nas relações deautoridade, alocações de trabalho, nasformas de remuneração, nas formas decomunicação, etc.) e inovação nas pes-soas (mudanças de comportamento oucrenças por meio de educação e treina-mento) (Moreira; Queiroz, 2007, p. 9-10).

    Em busca da inovação, as em-presas que atuam na EBC  procurarãoconectar-se com outras para promoverum aprendizado interativo, e assim, me-diante a constituição de verdadeiras redes,deverão encontrar parceiros com os quaispossam obter bens complementares à suaprodução. Ao estabelecer essas relações,

    as empresas poderão dividir os custos eos riscos associados às inovações entre asdiversas organizações, acessar os resulta-dos das pesquisas, adquirir componentestecnológicos importantes de produtos eprocessos e dividir ativos na manufatura,no marketing e na distribuição.

    Na EBC, o novo não é necessa-

    riamente uma sequência xa e linear deacontecimentos, como determina a visãoeconômica tradicional do processo deinovação (no qual as descobertas acon-tecem em fases de desenvolvimento doproduto, produção, marketing e nal-mente ocorre a venda dos novos produ-

    tos e serviços). Para inovar, a economiase articula em redes, e estas, conforme

    suas necessidades, estabelecem uma hie-rarquia voltada para a aceleração da taxade mudança e da taxa de aprendizagem.

     As instituições de pesquisa, as universi-dades e o próprio governo podem tomarparte dessas redes. Da interação entre es-ses atores, pode-se constituir um sistemavoltado para a inovação.

    c_Aceleração dos processos de aprendizado interativo

     A competição impele à inovação. A ino-vação, dependente do conhecimento, dámargem ao movimento de codicaçãoda informação e do desenvolvimento dascompetências para uso dessa informação.Dessa forma, a EBC é caracterizada pela

    necessidade de aprendizado contínuo emque a educação ocupa papel central parao avanço dos indivíduos, das organiza-ções e das sociedades.4

     

    odo esse processo conuiria pa-ra a montagem de um Sistema Nacionalde Inovação ( SNI  ). O SNI seria compostodos uxos e das relações existentes entre

    empresas, indústria, governo e academiano desenvolvimento da ciência e tecno-logia e que inuenciam empresas e eco-nomias. A ilustração 1 traz uma forma derepresentação de um SNI.

    Uma vez percebida sua lógica defuncionamento, a EBC pode ser denida

    4 rabalhos interessantes deMeister (1999) e Eboli (2004)(esta autora, especialmentepara o caso brasileiro)estabelecem a ligação entre asiniciativas das empresas (quenecessitam de aprendizadocontínuo) e as universidadescorporativas comoforma de proporcionareducação continuadaaos seus funcionários e,eventualmente, parceiros.

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    como uma economia baseada diretamente

    na produção, na distribuição e no uso do

    conhecimento e da informação. Entre assuas características, estão a preexistên-cia de um sistema nacional de inovaçãomaduro; papel da infraestrutura de co-

    nhecimento é importante no sistema deinovação; construção de infraestruturainformacional (como consequência das–ecnologias de Informação e Comuni-cação – ICs); sosticação da divisão do

    trabalho (com participação expressiva daforça de trabalho na produção, na difu-são e na transmissão de conhecimentos).

    Os trabalhos desenvolvidos no âm-bito da OCDE  preocupam-se em instru-mentalizar as políticas públicas quanto à

    relação entre conhecimento e desenvolvi-mento. Com isso, da análise dessa econo-mia chega-se à sua denição, caracteriza-ção, avaliação-mensuração e, nalmente, àelaboração de uma abordagem prescritiva.

    odavia, as diculdades de men-suração econômica dos chamados ativosintangíveis são inúmeras, tanto nas em-

    presas quanto no nível das economiasnacionais. Nas economias nacionais, otradicional sistema de contas nacionaislida prioritariamente com um mundoeconômico de bens tangíveis e não per-mite a compreensão dos fenômenos daeconomia do conhecimento.6

    5 O modelo recebe este nomeporque cada hélice (empresas,

    governo e universidade) é“[...] uma esfera institucionalindependente, mastrabalha em cooperação einterdependência com asdemais esferas, por meio douxo de conhecimento entreelas (SAL et al , 2006, p. 20).

    Ilustração 1_Sistema Nacional de Inovação – hélice tripla5

    6 Citando duas dasdiculdades, o relatório aponta

    a inexistência de um sistema depreços de conhecimento queservisse de base para agregaçõesnacionais e, mensuraçãoda adição líquida deconhecimento (conhecimentonovo menos conhecimentoobsoleto) na economia (OECD,1996, p. 30-31).

    Fonte: Stal et al . (2006, p. 21).

    Governo

    Empresas Universidade

    Pessoas

    e Ideias

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    Para isso, o relatório da OCDE apre-senta uma série de indicadores voltados

    para a mensuração econômica de insu-mos, estoques e uxos de conhecimento,bem como do desempenho de redes e deaprendizado.7 Com indicadores disponí-veis a respeito do conhecimento, seriapossível estabelecer parâmetros de eciên-cia em termos da capacidade ou poder deuma economia em distribuir conhecimen-

    to. A avaliação dos uxos de conhecimen-to entre os participantes do sistema nacio-nal de inovação (universidades, centros depesquisa, empresas, etc.) ou da distribui-ção de conhecimento no mercado entreofertantes e usuários torna-se, então, umareferência para a avaliação do desenvolvi-mento de um país (OECD, 1996, p. 40).

     A abordagem desenvolvida pelosneoschumpeterianos traz um conjuntode conceitos novos (EBC, Economia do

     Aprendizado e Sistema Nacional de Ino-vação) são incorporados às discussões daOCDE. Com base nesses conceitos, a OC-DE chega às proposições práticas de ins-trumentos à disposição das políticas pú-

    blicas. A seguir são abordados os desaosconceituais e práticos da EBC.

    Paula  et al . (2000) analisam o con-ceito de SNI e destacam que, no polo dotrabalho intelectual da economia, existeuma sosticação da divisão do trabalhopor meio da interação que passa a gurar

    nas redes que compõem o SNI  (centrosde pesquisa, universidades e áreas de P&D 

    das grandes empresas). Os autores assina-lam ainda que a sosticação da divisão dotrabalho é institucionalmente organizadae busca meios para viabilizar a aplicaçãosistemática da ciência à produção.

    Para os neoschumpeterianos, ainovação é a mola propulsora da concor-rência. As necessidades de conhecimento

    e aprendizado daí decorrentes tornam-sedependentes do desenvolvimento da ca-pacidade dos indivíduos, que, por suavez, têm como seu ponto de partida aeducação. Estabelece-se aqui um pontode contato com o conceito de capital hu-mano desenvolvido por Marshall.8 A di-nâmica da EBC, porém, não se relaciona

    apenas à educação formal, mas tambémà necessidade de aprendizado contínuo,dado que a inovação resulta das novas lei-

    7 O Banco Mundialdispõe de um interessanteinstrumental voltado para amensuração do conhecimentonos países que permitemestudos comparativos. Vide

    “Knowledge AssessmentMethodology – KA M” inwww1.worldbank.org/gdln/kam.htm.8 Segundo Marshall, o capitalhumano seria denido comoo grau de capacitação da

    comunidade para o trabalhoqualicado, a inovaçãocientíca e tecnológica, aliderança, a iniciativa ea organização em nívelempresarial privado e na vidapública (Fonseca, 1992, p. 79).Para Marshall, caberia aoEstado, mediante o provimentoda educação universal, garantircondições para a ofertaadequada do capital humano(Marshall, 1985, p. 91).

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    turas da realidade permitidas pela ciênciae pela tecnologia em geral, em especial

    aquelas relacionadas à informação.O lado prescritivo das ideias neos-chumpeterianas, por sua vez, indica quea esfera pública também tem por tarefa aelaboração de políticas públicas voltadaspara o estímulo às inovações. As priorida-des dessas políticas seriam o incentivo àdifusão tecnológica, o incremento do ca-

    pital humano e a promoção da mudançaorganizacional (OECD, 1996, p. 19). Nes-ta linha, Lundvall arma que uma políti-ca voltada à inovação deveria contribuirpara a capacidade de aprendizagem dasempresas, das instituições voltadas para oconhecimento e das pessoas. Em poucaspalavras, a aprendizagem deve ser o ob-

     jetivo em todos os lugares, inclusive nasorganizações. Desta forma, alguns doselementos centrais para a aprendizagemseriam o desenvolvimento de recursoshumanos, as novas formas de organiza-ção empresarial, a formação de redes, adenição de uma nova função dos servi-ços intensivos em conhecimentos e das

    universidades (Lundvall, 2003, p. 117).Segundo Lundvall, mudança e

    aprendizado são faces de uma mesma moe-da. Competir, aprender, inovar e novamen-te competir são ações que compõem umprocesso circular e cumulativo (Lundvall,2003, p. 117). Nesse processo, a capacidade

    de sobrevivência de uma organização pas-sa a depender de sua capacidade de adqui-

    rir e desenvolver competências – vale dizer,aprender – que, por sua vez, é altamen-te dependente do desenvolvimento e daapropriação de conhecimento. A organi-zação é levada a uma contínua preparaçãopor melhor gestão, habilidades ou mesmoestruturas organizacionais, que se confor-mam em novos conhecimentos.

    3_Economia, organizaçãoe estratégia

    Do ponto de vista teórico, ao lidar comdesenvolvimento econômico, inovação ecompetição, Schumpeter apresentou visãobastante diversa da economia neoclássica.

    De modo geral, sua visão situou a ino-vação no centro da questão econômicae traz a necessidade de melhor entendi-mento das mudanças que acontecem nasorganizações quando essas promovem ouincorporam inovações.

    Os autores neoschumpeterianos –preocupados com o ambiente institucio-

    nal no qual convivem empresas, governos,universidades e centros de pesquisa – tam-bém desenvolveram um conjunto concei-tual bastante distante da teoria neoclássica.

     A teoria neoclássica compreende arma ou a empresa como um espaço emque as mudanças ou o aperfeiçoamento

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    acontecem de forma incremental, ou seja,ela não se altera radicalmente no tempo.

    De maneira geral, na teoria neoclássica,a tecnologia e as preferências são dadas. Além disso, por conta do conhecimentoperfeito, as escolhas possíveis ao produtortambém são dadas, e a melhor escolha é,pela obviedade, fácil de ser identicada(Nelson, 2006). Para Nelson (2006), a eco-nomia neoclássica tende a tomar as orga-

    nizações como semelhantes, quando naverdade há diferenças entre elas, e taisdiferenças são importantes do ponto devista econômico.

     A admissão de que as organizaçõesinovam, promovem rupturas tecnológicas,mudam e evoluem demanda novos pres-supostos para o seu funcionamento. Nel-

    son sintetiza em duas obras de Alfred D.Chandler (Strategy and Structure, 1962, eScope and Scale, 1992) contribuições im-portantes nessa busca (Nelson, 2006).

    Na primeira obra, Chandler assi-nala que as organizações adotam uma es-tratégia e que esta, por sua vez, dene aslinhas gerais de sua estrutura. Estratégia

    e estrutura – características mais abran-gentes e duradouras de uma organização

    – orientam sua evolução interna e suas ap-tidões essenciais. A estratégia seria

    “[...] conjunto de compromissos assumi-

    dos por uma empresa para denir e

    racionalizar seus objetivos e os modos

    como pretende consegui-los”.

     A estrutura envolveria

    “[...] a forma de organização e de gover-

    no da empresa, e de como as decisões

    são efetivamente tomadas e levadas

    adiante, determinando assim o que

    ela faz de fato, a partir de sua ampla

    estratégia” (Nelson, 2006).

    Na segunda obra, ainda segundoNelson, Chandler destaca a importânciada relação entre a organização e seu am-biente, e sua inuência nos seus moldesestratégico e estrutural e no desempenho.Com base em Chandler, Nelson armaque a estratégia empurra a organização

    para, quando necessário, mudar sua es-trutura e buscar ou reforçar aptidões es-senciais à sua performance – entre elas ade inovação (Nelson, 2006).

    Outro autor que questiona a va-lidade dos pressupostos da teoria neo-clássica da rma foi Herbert A. Simon.

     A obra de Simon alcançou de modo in-

    uente campos diversos como Economia, Administração, Psicologia e a Computa-ção. A sua teoria comportamental desdo-bra-se em dois temas – a racionalidadee a organização –, que, no entanto, nãodevem ser observados separadamente(Barros, 2004).

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    Para Simon, o pressuposto de ra-cionalidade adotado pela economia ne-

    oclássica é irreal e diculta a compreen-são dos fenômenos econômicos. Em suacrítica, o autor dirige-se ao pressupostoneoclássico de onisciência dos indivíduosquando diante da necessidade de tomardecisões econômicas (Simon, 1979). Naopinião de Simon, o conhecimento per-feito não é possível, e, portanto, também

    não é possível conhecer todas as alter-nativas. Desta maneira, também não épossível decidir pela alternativa ótima. Apartir daí, ele propõe, então, o conceitode racionalidade restrita ou limitada, deforma que, na tomada de decisões eco-nômicas, o comportamento possível dosadministradores seja o de buscar padrões

    apenas satisfatórios (e não ótimos, comono pressuposto neoclássico). Na buscadesses padrões, os gestores são levados aprojetar suas organizações em relação aofuturo (Simon, 1978).

     Ao analisar as ideias de Simon, Bar-ros assinala que a racionalidade restrita oulimitada faz com que o comportamento

    humano seja dependente do contexto,posto que é nesse que as escolhas são feitas.Nessa linha de raciocínio, a organizaçãoseria o contexto predominante do com-portamento econômico. Barros apontatambém que, para Simon, as organizaçõessão vinculadas a sistemas abertos nos quais

    as inovações não resultam da escolha feitade acordo com opções conhecidas ou de-

    terminadas. Ao contrário, as inovações re-sultam também das iniciativas das organi-zações na resolução de problemas (errandoe acertando), e aí emerge a importânciadas decisões de natureza estratégica pornovos produtos, formas de produção, dis-tribuição, etc. Assim, de alguma forma, aorganização termina por competir, não

    somente por mercados já existentes, mastambém na criação de outros mercados(Barros, 2004).

    Chandler e Simon são autores con-temporâneos entre si, e suas formulaçõestêm alguns aspectos em comum: a críticaaos pressupostos neoclássicos da teoria darma como ponto de partida. Suas abor-

    dagens revelam a limitação e a falta deacuidade da escola neoclássica no trata-mento de temas econômicos como a ino-vação tecnológica ou mesmo a diferencia-ção entre elas nos mercados, por exemplo.

    Em outro aspecto em comum, osdois autores têm seus trabalhos na con-uência da Economia e da Administração.

    Em ambos, é possível identicar a impor-tância do conceito de estratégia quandoiluminaram um debate conceitual que,longe de se esgotar, abriu caminho parao aprofundamento de outras questões. Aaproximação da estratégia – tema de na-tureza mais administrativa – ao raciocínio

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    econômico levou diretamente à discussãodas mudanças organizacionais.

    O exame da literatura leva a con-cluir que a organização se dene por suaestratégia e que os conhecimentos obje-tivados na produção também se relacio-nam com sua capacidade de aprenderpara tornar-se ou manter-se competitiva.Ou seja, a inovação e a mudança organi-zacional dependem dessa capacidade.

    Com tantas palavras associadas à no-ção de movimento – inovação, mudança eaprendizado –, ca claro que a perspectivada rma em evolução e em busca de com-petitividade está presente em Chandler eSimon. Para Nelson, essa busca vincula-seàs aptidões essenciais da organização, entreas mais importantes às voltadas à inovação.

    Evidentemente, a noção de aptidões essen-ciais de Nelson é muito próxima da noçãode competências organizacionais. Esta, porsua vez, sendo um termo bastante dissemi-nado, será tratada adiante.

    4_As competências

    necessárias para competirO papel central ocupado pela inovação nocontexto da Economia Baseada no Conhe-cimento leva à constatação de que as com-petências organizacionais serão mais oumenos desenvolvidas em função do quan-to as organizações são capazes de aprender.

    Do discutido anteriormente, con-sidera-se que as organizações são diversas

    entre si, uma vez que, por não dominaremtodos os conhecimentos necessários e/oudisponíveis, desenvolvem estratégias e es-truturas guiadas na busca por competiti-vidade, vale dizer, por mais conhecimentoe aprendizado.

     A capacidade de aprender das orga-nizações, por seu turno, está relacionada

    ao grau de adesão ou de atrelamento daorganização a algum(ns) nó(s) das redesde conhecimento existentes na economiaque são voltadas para a inovação. Da mes-ma forma, a aprendizagem vincula-se àadoção e ao desenvolvimento pelas pró-prias organizações de práticas de aprendi-zagem geradoras de conhecimentos.

    Neste tópico aborda-se o desen-volvimento, a incorporação e o uso dascompetências pelas organizações, segun-do alguns autores. Neste item são trata-das as origens teóricas e o contexto dodebate sobre a noção de competênciasorganizacionais.

    4.1_Competências: origens do conceito ea visão organizacional

     A origem econômica da noção de com-petências organizacionais está no inte-rior da abordagem da rma baseada emrecursos que, por sua vez, se aninha namicroeconomia. O livro clássico da te-

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    oria da rma baseada em recursos é Tetheory of the growth of the rm, editado

    em 1959 por Edith Penrose. Nesse livro,a autora desenvolve uma linha de análiseem que procura aproximar a teoria mi-croeconômica do que ela chama de “or-ganizações de carne e osso”. Ela se afastadas denições tradicionais da economianeoclássica que qualicam a rma comomera unidade administrativa. Para a au-

    tora, a rma é uma coleção de recursosprodutivos que podem ser dispostos en-tre diversos usos e, a qualquer momento,determinados por uma decisão admi-nistrativa. Entre os recursos disponíveisna rma, estão os físicos (constituídosde bens tangíveis como plantas, terra erecursos naturais, estoques não vendidos

    de bens nais, etc.) e humanos (trabalhoqualicado ou não, staffs   administrati-vo, nanceiro, legal, técnico e gerencial)(Penrose, 1980, p. 24).

    Penrose conceitua diferentementerecursos e serviços. Os recursos da rmasão compostos do conjunto de serviçosque podem ser denidos independen-

    temente de seu uso ou não. Os serviçosconstituem-se na forma como o recursoserá usado no âmbito da rma. Na rma,um mesmo recurso pode ser utilizado dediversas maneiras, em diversas combina-ções e com propósitos diferentes. Comocada rma usa seus recursos de maneira

    diversa, a distinção entre recurso e ser-viço torna-se a fonte do caráter único

    que cada rma assume (Penrose, 1980,p. 24-25). A autora estuda o crescimento da

    rma e conclui que, no interior das gran-des corporações, a gestão é caracterizadapela atuação de um time de gerentes, enão pela atuação individual de um úni-co deles. O gerenciamento da empresa

    torna-se decisivo entre as principais con-dicionantes de seu crescimento. A com-posição da equipe de gestão e seu métodode trabalho surgem como fundamentaispara o bom desempenho da organiza-ção. As capacidades, as experiências e oentrosamento passam a ser qualidadesvalorizadas dentro da equipe de gestão e

    adquiridas com o tempo de trabalho con- junto. Com isso, não se pode melhoraro desempenho de gestão simplesmentecontratando mais gente para trabalhar.Os recém-contratados à empresa podemchegar com boa especialização e quali-cação, mas precisarão ganhar experiênciatrabalhando juntos antes de contribuir

    ecientemente com as decisões da em-presa (Slater, 1980, p. xi). A organização seria, então, uma

    fonte de recursos diversos dotada de umahistória, uma trajetória, um conjunto derecursos herdados (acumulados), relaçõesinternas (formais e informais) próprias e

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    de competências. As competências, nes-se contexto, seriam denidas como a

    capacitação tecnológica e comercial dasorganizações. Em última análise, suashabilidades únicas e traço distintivo daempresa. Essas competências são seu ei-xo de coordenação no processo de cres-cimento, síntese dos conhecimentos eexperiências acumulados na organizaçãoe fonte de vantagens competitivas con-

    sistentes. O modo pelo qual a empresa éadministrada em suas diversas atividadesé também a particular forma pela qualas competências geram suas vantagenscompetitivas (capacidade de obter servi-ços dos recursos) (Souza, 2004).

    4.2_O contexto do debate

    sobre competências A apreensão do conceito de competên-cia só é possível quando sua discussão sevincula à evolução histórica do mundoda produção (Fleury; Fleury, 2000, p. 19).O debate a respeito do uso do conceitode competências no campo dos estudosorganizacionais iniciou-se na década de

    1970  com a participação de pesquisado-res dos EUA  e da Europa. Nesse debatequestionou-se intensamente o modelotaylorista-fordista de organização do tra-balho. As primeiras posições procuravamidenticar os conhecimentos, as habili-dades e as atitudes do trabalhador como

    suas competências. De maneira simples,tais abordagens ainda se mantinham

    vinculadas aos conceitos tradicionais dosrequisitos necessários para a ocupação deum cargo.

    Uma análise importante desse con-ceito é desenvolvida por Zarian (2001).Esse autor francês examina as característi-cas históricas do trabalho industrial eidentica três mudanças ocorridas no -

    nal do século XX  que interferem no traba-lho na empresa contemporânea:a_ Passa a prevalecer a noção de

    evento. O evento seria aquiloque perturba o funcionamentonormal da máquina produtivade maneira parcialmenteinesperada de modo a ir além

    da capacidade de autorregulaçãoda própria máquina. O eventopode acontecer nos ambientesinterno e externo da organização(Zarian, 2001, p. 41-42).

    b_ Intensicação e dependênciada comunicação. Este fatoconsiste no

    “[...] entendimento recíproco e bases de

    compromissos que serão garantia do

    sucesso das ações desenvolvidas em con-

     junto” (Zarian, 2001, p. 45).

    c_ Predomínio do serviço. Passa avigorar a noção de que trabalhar

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    é gerar serviço. Assim,o serviço seria

    “[...] uma modicação no estado ou nascondições de atividade de outro ser hu-

    mano, ou de uma instituição, que cha-

    maremos de destinatários do serviço (o

    cliente, o usuário ou o setor público)”

    (Zarian, 2001, p. 48).

    Essas três características implica-

    riam importantes mudanças no funcio-namento das organizações. Os eventosimprevistos tornam-se cada vez mais fre-qüentes (mas ainda imprevistos em seuconteúdo e consequências). Com isso, asexigências em relação aos trabalhadores eorganizações ultrapassam as atividades aeles anteriormente prescritas. Assim, tra-

    balhar signica ir além dos limites descri-tos para tarefas de cada cargo, e torna-se

    “[...] o prolongamento da competência que

    o indivíduo mobiliza em face de uma

    situação prossional cada vez mais mu-

    tável e complexa” (Fleury; Fleury, 2000, p. 20).

    Zarian constata que, no padrão

    taylorista-fordista, a forte pressão pela di-visão do trabalho diminui a importânciada comunicação na produção. Na percep-ção do autor, na atualidade, o desempe-nho das organizações vincula-se fortemen-te à qualidade das interações. Em outraspalavras, o desempenho das organizações

    liga-se às comunicações que ocorrem den-tro delas por meio de seus indivíduos. A

    noção de serviço envolve o atendimentoao cliente interno ou externo à organiza-ção e, por ser central, logo está em todas asatividades. Por extensão, a comunicaçãotorna-se fundamental na realização dosserviços (Fleury; Fleury, 2000, p. 20).

    Na comunicação estabelecem-seos processos de troca de informações e

    aprendizado necessários à solução dosproblemas surgidos a partir dos eventos,assim como os acordos sobre os objetivosorganizacionais. As relações entre evento,comunicação e aprendizado integram-se,portanto, ao aprendizado organizacional.

    O efeito combinado da presençados conceitos de evento, serviços e comu-

    nicação nas organizações conduziria aosurgimento de um “modelo da compe-tência” ou de uma “lógica da competên-cia” (Zarian, 2001, p. 134). A competên-cia seria denida segundo três elementoscomplementares como:

    “[...] a tomada de iniciativa e respon-

    sabilidade do indivíduo em situações prossionais com as quais ele se defron-

    ta [...]”; “[...] uma inteligência prática

    das situações, que se apóia em conhe-

    cimentos adquiridos e os transforma à

    medida que a diversidade das situações

    aumenta [...]”; “[...] a faculdade de

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    mobilizar redes de atores em volta das

    mesmas situações, de compartilhar de-

    saos, de assumir áreas de responsabili-dade” (Zarian, 2001, p. 68, 72, 74).

    O autor explica o surgimento desse mo-delo ou a lógica e, dada a denição decompetências do indivíduo, apresentaos seus desdobramentos práticos, ou se-

     ja, as competências organizacionais deles

    decorrentes.Os aspectos vinculados à questãodas competências e sua gestão abremuma agenda extensa de discussões. Entreelas, as formas de organização do traba-lho e de remuneração a elas associadas, ea formação e educação do trabalhadorsegundo as novas exigências do mundo

    do trabalho. Especialmente neste últimoaspecto, a contribuição de Zarian é im-portante por estabelecer ligações entre odebate sobre competências do âmbitoestritamente privado das organizações eas políticas públicas voltadas para a for-mação do trabalhador.9

    Fleury analisa a posição de Zarian

    sobre competências e conclui pela neces-sidade de um desenho de modelo querelacione as competências individuaisdos trabalhadores às competências orga-nizacionais, buscando compor um todocoerente nas formas de ação em termosestratégicos na organização.

    Na dimensão da organização, oalinhamento entre estratégias e as com-

    petências organizacionais pode ser iden-ticado em duas abordagens: a da rmabaseada em recursos e a perspectiva daestratégia competitiva (Fleury, 2000, p.44). Segundo a perspectiva da rma ba-seada em recursos – dado o potencial derecursos tangíveis e intangíveis existentesno interior da organização –, as suas es-

    colhas estratégicas não deveriam se de-nir apenas em função das oportunidadesoferecidas pelo mercado. A observaçãodos recursos internos da organização e aposterior denição das vantagens compe-titivas da organização conformam umaestratégia de “dentro para fora” (Fleury;Fleury, 2000, p. 44).

    Hamel e Prahalad (1995) seguemessa estratégia quando criam o conceitode competências essenciais –

    “[...] um conjunto de habilidades e tec-

    nologias que permite a uma empresa

    oferecer um determinado benefício aos

    clientes” (Hamel; Prahalad, 1995, p. 229).

     As competências essenciais têm, segundoesses autores, três características: permitema diversicação da presença da empresa emdiversos mercados, criam efetivamente va-lor para os clientes e, por m, são difíceisde ser copiadas pela concorrência (Mintz-berg et al., 2000). A gestão da organização

    9 No Brasil, a exemplo dovericado na Itália, naEspanha e na França, adiscussão de políticas públicasvoltadas para a formação dostrabalhadores tem contadocom a participação desindicatos. Como exemplo,houve nos governos deFernando Henrique Cardoso(1995-2002) o Plano Nacionalde Formação (Planfor),nanciado com recursosdo Fundo de Amparo aorabalhador (FA). Entretanto,o debate sobre a relação entrecompetências e políticaspúblicas não será aprofundadoneste trabalho por nãoconstar de seus objetivos.

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    empenhar-se-ia no desenvolvimento e naaplicação dessas competências em uma

    abordagem contida na visão da rma ba-seada em recursos de Penrose, uma vezque, conforme essa autora, é do uso dosrecursos tangíveis e humanos da organi-zação que se originam as competênciasessenciais. O conceito de competênciasessenciais é peça importante no posicio-namento da organização diante da con-

    corrência, e, por isso, seu enraizamentona gestão é necessário. Os gestores devemencarregar-se de cinco tarefas ao lidarcom as competências da organização:

    “(1) identicar as competências essen-

    ciais existentes; (2) denir uma agen-

    da de aquisição de competências essen-

    ciais; (3) desenvolver as competênciasessenciais; (4) distribuir as competên-

    cias essenciais, e (5) proteger e defender

    a liderança das competências essen-

    ciais” (Hamel; Prahalad, 1995, p. 261).

     A estratégia competitiva tem co-mo precedente teórico importante a vi-

    são de Schumpeter sobre a competiçãocapitalista. Em Schumpeter, a competi-ção é um processo em que as empresasganhadoras esforçam-se pela inovaçãode produtos, processos ou tecnologias,que, na sua chegada vitoriosa ao merca-do, destroem as antigas referências nele

    existentes. A capacidade de aprender maise mais rapidamente para ocupar o mer-

    cado com o novo permite que a organi-zação acumule conhecimento e, assim,introduza assimetrias de informação co-mo vantagens em relação à concorrência(Araújo Jr., 1999, p. 4).

    Segundo Fleury, esse tipo de estra-tégia exige da empresa compreensão do se-tor, ramo ou indústria em termos de suas

    características e tendências. Uma vez iden-ticado o nicho de mercado privilegiadoem que a empresa pode se posicionar, sãotomadas as decisões gerenciais necessáriaspara a sua mobilização em direção a es-se objetivo. Essa abordagem estratégicapoderia ser chamada como “de fora paradentro”, posto que o posicionamento da

    empresa é denido após o estudo sobreseu mercado (Fleury; Fleury, 2000, p. 44). A organização nesse caso seria bem-suce-dida quando fosse capaz de oferecer ao seucliente o menor custo de um produto emrelação à concorrência, ou então de ofere-cer produtos cujos “benefícios singulares”mais que compensassem custos mais ele-

    vados (Porter, 1992, p. 2).Fleury assinala que, na prática, asempresas combinam as duas visões (r-ma baseada em recursos e vantagem com-petitiva) em busca da melhor escolha emtermos das competências organizacionais.

     As atuais características de funcionamen-

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    to da economia – intensa competição,forte ritmo de inovações, entre outras –

    exigem acima de tudo uma visão estra-tégica que se preocupe tanto com a dinâ-mica do mercado quanto com a própriaorganização e suas possibilidades. A de-nição das competências da organização éelemento-chave dentro da estratégia.

    Fleury liga mais objetivamente asescolhas estratégicas da organização e suas

    competências organizacionais. Em primei-ro lugar, o referencial para as competênciasé dado segundo a estratégia adotada pelaorganização. Em segundo lugar, acrescen-tam-se a essa orientação estratégica os tiposde competência pelas quais a organizaçãopretende se destacar no mercado. Fleuryaponta que as classicações são modelos

    ideais para efeito de análise. Por meio dasvárias combinações possíveis entre eles,porém, é possível identicar e escolherestrategicamente as formas de atuação daorganização de acordo com suas compe-tências, de modo que haja alinhamentoentre as competências organizacionais eindividuais.

    ambém dentro da abordagem darma baseada em recursos, Mills et al . es-tabelecem uma distinção entre recursose competências. Os recursos são a base apartir da qual as competências da organi-zação se manifestam, e essas são avaliadassegundo o desempenho obtido perante os

    concorrentes nos aspectos reconhecidospelos clientes (Mills et al ., 2002). A abor-

    dagem de Mills et al . é bastante semelhan-te à enunciada por Penrose, quando estadiferencia recursos e serviços (forma co-mo o recurso será usado na organização).ais autores pretendem dar mais opera-cionalidade ao conceito de competênciasorganizacionais no que se refere às práti-cas de gestão. Para isso, qualicam mais

    objetivamente alguns serviços da rma(no conceito de Penrose) como compe-tências tendo em vista diversas modali-dades. Para Mills et al ., as competênciasorganizacionais podem ser denidas se-gundo: sua centralidade na empresa (asessenciais), a percepção do cliente emtermos de diferenciação relativamente à

    concorrência (distintivas), sua localizaçãona estrutura da empresa (de unidade denegócio) e o posicionamento na estruturade competências da organização (compe-tência de suporte ou metacompetência).

     Além dessas, há a capacidade dinâmica– competência organizacional que viabi-liza permanentemente a adaptação das

    demais competências da organização.O quadro a seguir apresenta sin-teticamente a visão dos autores consulta-dos a respeito do conceito, característicase tipos de competência organizacional.

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    Quadro 2_Competências organizacionais

    Autores Definições/características/tipos

    Hamel ePrahalad(1995)

    • Competências essenciais: são capazes de v iabilizar vantagens reais ao cliente, permitir o acesso a diversosmercados e ser de difícil imitação pelos concorrentes. O principal aspecto relativo às competências essenciais éa capacidade de articulação dos recursos da organização.

    eece e Pisano(1994)

    • Capacidades dinâmicas: permitem a rma gerar novos produtos e processos em resposta às mudançasdo mercado. As capacidaded dinâmicas referem-se especialmente à forma como a organização, usandorecursos internos e externos, desenvolve e renova suas competências internas. Estas capacidades dependem,intensamente do trabalho dos gestores.

    Mills et al .(2002)

    ipos de competência:• Competências essenciais: usualmente se referem às atividades de a lta competência mais no nível corporativo da

    rma e são a chave para a sobrevivência da rma e centrais para sua estratégia.• Competências distintivas: referem-se às atividades de alta competência que os clientes reconhecem como

    diferenciadoras de sua rma em relação aos seus competidores, sendo, portanto, uma vantagem competitiva.• Competência organizacional ou competência de unidade de negócio: pequeno número de atividades-chave

    (duas a seis), esperadas de cada unidade de negócio na organização.• Competências-suporte ou metacompetências:

    atividade que é valorizada por ser o suporte de uma gama de outras.

    • Capacidade dinâmica: capacidade da rma para adaptar suas competências o tempo todo. Estreitamenterelacionada com os recursos importantes para as mudanças.

    Fleury; Fleury(2000)

    Denição: um saber agir responsável e reconhecido, que implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos,recursos, habilidades, que agreguem valor econômico à organização e va lor social ao indivíduo.

    • ipos de estratégia (relacionadas às competências): excelência operacional, inovação no produto,orientada para serviço.

    • ipos de competência (envolvendo organização e seus indivíduos): organizacional, social e técnica.

    Zarian(2001)

    Denição: é a faculdade de mobilizar redes de atores em torno das mesmas situações, é a faculdade de fazer comque esses atores compartilhem as implicações de suas ações, é fazê-los assumir áreas de corresponsabilidade(Zarian, 2001, p. 74).

    ipos de competência: técnicas e sociais, sobre processos, a organização e serviços.

    Fontes: Fleury; Fleury (2000), Hamel e Prahalad (1995), Mills et al. (2002), Zarian (2001).

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    Os conceitos enunciados por Millset al . encontram similaridade naqueles

    apontados por Hamel e Prahalad no quese refere à centralidade das competênciasessenciais para as organizações. Contudo,enquanto para Hamel e Prahalad o reco-nhecimento pelos clientes é uma das ca-racterísticas das competências essenciais,para Mills et al . o reconhecimento ou apercepção do cliente, em termos do va-

    lor proporcionado por uma competência, justica a denição de um tipo especícode competência, a distintiva.

    anto no caso de Hamel e Praha-lad quanto no de Mills et al ., um pontoimportante passa a ser: como tornar umacompetência percebida (Hamel e Praha-lad) ou distintiva (Mills et al ., 2002). A

    resposta pode ser encontrada em doispontos. Em primeiro lugar, é preciso quea organização tenha ou desenvolva umrecurso que, uma vez utilizado, alcancea percepção do cliente. Em segundo lu-gar, o destaque ou desenvolvimento des-sa competência organizacional, vale dizer,sua mobilização, dependerá de uma com-

    petência especíca da organização, queem Mills et al.  (2002). é a chamada ca-pacidade dinâmica da organização. Essacompetência diz respeito à capacidade dea organização adaptar constantemente assuas competências, e a partir dali torná-

    -las perceptíveis ao cliente.

    eece e Pisano são os principais au-tores no que se refere ao conceito de ca-

    pacidades dinâmicas. Sua abordagem tam-bém se lia à rma baseada em recursos dePenrose, que reconhece a relevância das ca-pacidades especícas de cada rma. eecee Pisano chamam a atenção para um sub-conjunto de competências da organização,e as nomeiam capacidades dinâmicas, ouseja, que permitem o desenvolvimento e a

    renovação de suas competências.No foco desses autores, essas ca-pacidades permitem a criação e a disse-minação de novos conhecimentos na or-ganização, conformando as habilidadesda organização em aprender, adaptar-see mudar, renovando-se todo o tempo. Oponto central dessa abordagem seria que,

    diante da incessante mudança no ambien-te, o sucesso na competição relacionar-se--ia à habilidade das organizações em re-congurar seus recursos organizacionaisinternos e externos da melhor forma. alhabilidade dependeria, por sua vez, dotrabalho desenvolvido por seus gestores(Boerner et al ., 2001, p. 109-110).

     A discussão em torno do conceitode competências e seu conjunto variado deautores e respectivas posições sinaliza a suaimportância para a denição das estraté-gias e dos processos nas organizações. Paraa organização, não basta ter competências,é preciso ter “a” competência de mudar/

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    inovar e, assim, manter-se na competição.Ocorre que, para mudar e se recongurar,a organização depende essencialmente deaprender como fazer isso. rata-se de, or-ganizacionalmente, aprender para mudare como mudar. A compreensão sobre co-mo o aprendizado organizacional ocorree a criação das melhores condições paraque isso aconteça é objeto de estudos deinúmeros pesquisadores, como veremos

    no próximo tópico.

    5_A aprendizagem organizacional eseus elementos

    Na economia do aprendizado, mudare aprender são verbos que integram umprocesso circular e cumulativo voltado à

    competição, à inovação e novamente àcompetição, e assim por diante. O ritmoditado pelas mudanças e pela avidez domercado por inovações obriga as organiza-ções a estabelecer estratégias que, por suavez, só se viabilizam com a identicação eo uso de seus recursos e competências. Asmudanças ou não das competências das

    organizações relacionam-se à transforma-ção da organização (em suas estruturas eprocessos, p. e.) e de seu ambiente externo.

    Os processos de aprendizagem orga-nizacional combinam a leitura do ambien-te de atuação da empresa, dos seus recursosinternos e das possibilidades oferecidas pe-

    las redes constituídas no(s) sistema(s) dosquais a organização toma parte. Na parteseguinte, são apresentados um histórico arespeito das origens do debate da apren-dizagem organizacional e as questões maisatuais relativas ao tema.

    5.1_Breve histórico da teoria

    O debate sobre aprendizagem organizacio-nal inaugurou-se com os primeiros arti-

    gos na década de 1960, mas, somente nonal dos anos 70, uma série mais regularde estudos e publicações começou a serdivulgada. Entre os trabalhos mais signi-cativos desse período, estão os de Argyrise Schön (1978), Duncan e Weiss (1979) eMarch e Olsen (1975). Nas décadas de 80 e 90, o volume de trabalhos publicados

    internacionalmente cresceu de maneiraexpressiva, transformando o tema em umdos principais entre os estudos organiza-cionais (Prange, 2001, p. 42).

    Os conceitos de aprendizagem deciclos simples e duplo e as teorias de açãoesposada e em uso de Argyris e Schön(1978) são referências comuns nos traba-

    lhos desse período. Outra presença cons-tante nos trabalhos da área é a espiralde conhecimento e os modos de trans-ferência de Nonaka e akeuchi (1997).Peter Senge, que ajudou a popularizar aexpressão organizações de aprendizagem,ou seja, a organização permanentemente

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    orientada em suas estruturas e processospara o aprendizado, é outro autor bastan-te referenciado10 (Senge, 1990).

     A inserção da aprendizagem comotema da organização precisa levar em con-sideração o complexo contexto de intera-ções sociais, como apontam a Filosoa, aSociologia, a Psicologia e a Pedagogia esuas várias possibilidades de abordagem.Com tais fundamentos, esse é um assun-

    to cuja delimitação conceitual não é sim-ples. Neste item apontaremos a evoluçãoepistemológica da questão (destacandoa variedade de abordagens possíveis e astentativas de classicação como forma declarear o campo). Os principais assuntosda aprendizagem organizacional são, en-tão, destacados com o objetivo de conec-

    tá-los à discussão econômica.

    5.2_O debate sobre aprendizagem

    organizacional

    Há grande variedade de perspectivas sobrea aprendizagem organizacional no campodos estudos organizacionais. A opção des-te estudo é a de aproximação com a apren-

    dizagem organizacional com base na siste-matização já realizada por autores detrabalhos expressivos no campo.

    Nicolini e Meznar apontam pe-lo menos duas razões para a variedade deposições no debate sobre aprendizagemorganizacional. A primeira razão reside

    nas várias características da aprendizagemorganizacional. Sob esse fenômeno se abri-gariam, por exemplo, quatro tipos de pro-cesso: a aquisição de conhecimento, a dis-tribuição e a interpretação de informaçãoe a memória organizacional. A decisão deestudar a aprendizagem envolveria de saí-da uma escolha de qual das característicasdo fenômeno abordar (Nicolini; Meznar, 1995 citando Huber, 1991).

    Uma segunda razão consiste nas di-versas maneiras de conceituar aprendiza-gem organizacional. Citando Shrivastava(1983), esses autores apontam ser possívelsintetizar a aprendizagem organizacionalde quatro maneiras diferentes: como ex-periência institucional, como fenômenode adaptação, como processo de mudan-

    ça de pressupostos compartilhados e, porm, como processo de relações resultantesde ações e conhecimentos desenvolvidos(Nicolini; Meznar, 1995).

     A pesquisa sobre a aprendizagemorganizacional pode envolver, portanto,priorizações quanto a qual característicado fenômeno estudar e, por outro lado,

    uma escolha quanto à sua própria deni-ção. Independentemente da sua validade,as simples combinações de possibilida-des de abordagens entre as duas razõesapontadas por Nicolini e Meznar já sãosucientes como referência da multipli-cidade de visões existentes.

    10 Segundo Antonello (2005, p.14), a expressão “organizaçãode aprendizagem” tem entradoem desuso, prevalecendo aexpressão “aprendizagemorganizacional” para essamesma acepção.

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    Na expressão de Prange, existe uma“’selva de aprendizagem organizacional’,que está se tornando cada vez mais den-sa e impenetrável”, residindo aí uma dasprincipais preocupações dos pesquisado-res (Prange, 2001, p. 42). Como consequ-

    ência, é grande o número de estudos quecompilam a produção e a pesquisa realiza-da sobre o tema tentando identicar seuspontos comuns e diversidade de posiçõesentre os autores. O quadro a seguir sin-tetiza os principais pontos destacados por

    Quadro 3_Aprendizagem organizacional – alguns aspectos destacados da literatura

    Autores Pontos destacados

    Fiol e Lyles(1985)

    • apontam as áreas de consenso e dissenso dentro do campo;• distinguem aprendizagem organizacional de adaptação organizacional e mostram que a mudança nãonecessariamente implica aprendizado;

    • apontam que a aprendizagem pode ser de alto e de baixo nível e que isso pode provocar impactos diferenciados nagestão estratégica da rma.

    Nicolini eMeznar (1995)

    • reveem as diferentes abordagens para aprendizagem organizacional apontando as causas para a diversidade deperspectivas;

    • discorrem sobre a importância do esquecimento ou desaprendizagem organizacional;• propõem a abordagem de construção social e o caráter institucional da aprendizagem organizaciona l.

    Easterby-Smith

    e Araujo (2001)

    • apontam as diferenças entre os conceitos de aprendizagem organizac ional e organização de aprendizagem;

    • apontam os problemas e as oportunidades da discussão sobre aprendizagem em termos dos trabalhos empíricos,desenvolvimentos teóricos e utilização.

    Prange (2001)• compara os desenvolvimentos teóricos em aprendizagem organizacional aplicando critérios de consistência,

    contribuição descritiva X prescritiva;• defende o uso de metáforas e analog ias no estudo da aprendizagem organizacional.

    Huysman (2001) • revisa deciências da literatura de aprendizagem organizac ional destacando quatro tendências (à melhoria, à açãoindividual, à adaptação ambiental, à aprendizagem planejada) e suas respectivas propostas para sua correção.

    Elkjaer (2001)

    • vê a existência de duas abordagens diferentes para aprendizagem organizac ional e organizações de aprendizagem:como ferramenta gerencial (cognição individual) e segundo sua ocorrência em ambientes sociais (aprendizagemsituada);

    • defende que uma teoria sobre aprendizagem organizacional e organizações de aprendizagem deve ser tomada pelaperspectiva da teoria da aprendizagem social.

     Antonello (2005)

    • revisa a literatura existente e constata a evolução do conceito de aprendizagem organizacional;• entende que o conceito de mudança permeia todas as visões sobre aprendizagem organizac ional;• identica seis focos na abordagem da aprendizagem organizaciona l: aprendizagem individual e coletiva, cultura,

    gerenciamento do conhecimento, melhoria contínua, inovação e sistemas/processos.

    Fontes: Antonello (2005), Elkjaer (2001), Easterby-Smith e Araujo (2001), Fiol e Lyles (1985), Huysman (2001), Nicolini e Meznar (1995) e Prange (2001).

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    seis trabalhos sobre a produção teórica deaprendizagem organizacional.

    O quadro anterior – também umacompilação – exemplica o esforço de sis-tematização que repetidas vezes é realizadopelos pesquisadores com um duplo intui-to: organizar as principais ideias do campoe apresentar a própria contribuição.

    O trabalho de Fiol e Lyles (1985),o primeiro desse quadro, revisa a litera-tura e identica em meio à variedade deposições três pontos de consenso entreos autores sobre aprendizagem organi-zacional: a relevância do alinhamento, adistinção entre aprendizagem individuale organizacional e a presença de quatrofatores contextuais no processo de apren-dizagem (cultura, estratégia, estrutura e

    ambiente). Analisaremos cada um delespela sua importância para este estudo.

    a_Relevância do alinhamento daorganização com o ambiente

    Este consenso está centrado na noção deque, para garantir sua sobrevivência delongo prazo e crescimento, a organização

    deve alinhar-se por si própria ao ambien-te para manter-se competitiva e inovativa.O alinhamento da organização torna-sepeça importante na gestão estratégica, im-plicando o desenvolvimento de potencialda organização em termos de aprendiza-gem, desaprendizagem ou mesmo de re-

    aprendizagem com base em comporta-mentos passados (Nicolini; Meznar, 1995)e (Fiol; Lyles, 1985, p. 804).

    b_Distinção entre aprendizagem individual eorganizacional

    O aprendizado individual é importan-te para a organização, mas a produçãode conhecimento organizacional não ésimplesmente a soma dos aprendizadosindividuais. Isso porque a organizaçãoé capaz de criar e manter sistemas deaprendizado que não somente atuam so-bre seus integrantes, como também sãocapazes de comunicar suas formas deorganização, história e normas a outros.Ou, de outra forma, o aprendizado orga-nizacional é capaz de viabilizar a leitura e

    a compreensão de seu ambiente e, assim,providenciar as ações para tornar suas es-tratégias viáveis (Fiol; Lyles, 1985, p. 804).

    c_Presença de quatro fatores contextuais noprocesso de aprendizagem: cultura,estratégia, estrutura e ambiente

    Para os autores envolvidos com a apren-

    dizagem organizacional, esses fatores es-tabelecem com ela uma relação circular,posto que, de uma só vez, eles criam aaprendizagem, são criados por ela e tam-bém a reforçam (Fiol; Lyles, 1985, p. 804).

    O Quadro 4 mostra que os pontosde consenso identicados ainda possuem

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    dentro de si grande conjunto de questõesem aberto.

    No que se refere ao alinhamentoda organização ao seu ambiente, as po-

    lêmicas subjacentes remetem a questõescomo a de validade da teoria contingencial:na relação entre ambiente e organização, oque determina o que e em que proporção?

    Quadro 4_Aprendizagem organizacional – consensos e questões em aberto

    Consensos Questões em aberto

     Alinhamento daorganização com oambiente

    • críticas quanto a uma excessiva ênfase dada à força da abordagem dagestão estratégica em relação ao ambiente;

    • crítica quanto a uma dicotomia patente entre a organização e o ambiente.

     Aprendizagemindividual eorganizacional

    • não há denição clara sobre a relação entre a aprendizagem individuale a organizacional.

    Fatores contextuais

    • Cultura: postura cognitiva organizacional, formada por ideologiasinternas e padrões de comportamento, ou como estilos estratégico ecognitivo;

    • Estratégia: estratégia produz stress , que provoca adaptação eaprendizagem. Por outro lado, a denição de objetivos estratégicostambém é dependente da capacidade de aprendizagem da organização.Os processos de formulação e implementação estratégica sãoestimuladores de aquisição de conhecimento;

    • Estrutura: alguns autores veem a estrutura como resultado daaprendizagem organizacional. Outros entendem que as diferentesestruturas têm impacto sobre a aprendizagem. Nessa segunda linha,há disputas para identicar qual estrutura é mais conducente à

    aprendizagem;• Ambiente: aqui discussões já abordadas no ponto consensual sobre o

    alinhamento da organização relativamente ao ambiente são retomadas. Além disso, há discussões sobre a relação entre a complexidadeambiental e a capacidade de aprendizagem da organização (grandecomplexidade prejudica aprendizagem por sobrecarga de exigência, ebaixa complexidade também prejudica a capacidade de aprendizagempor produzir sonolência organizacional).

    Fonte: Nicolini e Meznar (1995) e Fiol e Lyles (1985).

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    Outra questão vincula-se ao tipo de apren-dizado que se estabelece na relação entre in-divíduos (organizações ou não) e ambiente.

     Já com relação à existência de apren-dizagem individual e organizacional, po-dem ser identicadas pelos menos duasposições. Na primeira, considera-se que osagentes da ação e aprendizagem organiza-cional são os membros individuais da orga-nização (Argyris; Schön, 1978; Klein, 1989 in Nicolini; Meznar, 1995). Na segunda,arma-se a importância de tomar a organi-zação e sua estrutura como agentes do pro-cesso (Cyert; March, 1963; Duncan; Weiss,1979; Levitt; March,1988; Lant; Mezias,1990; in  Nicolini; Meznar, 1995). Entreum extremo e outro, há ainda a percepçãode que a aprendizagem pode acontecer no

    nível intermediário dos coletivos ou gru-pos intraorganizacionais. (Huber, 1991 in Prange, 2001, p. 47) e (Crossan et al., 1999).

    Por m, quanto aos fatores contex-tuais, cada um deles integra um campode estudo próprio nas organizações. Des-ta maneira, toda a gama de debates emtorno de conceitos e políticas associados

    à cultura, à estratégia, à estrutura e aoambiente acrescenta-se à discussão sobreaprendizagem.

    Há inúmeras polêmicas subjacentesa cada um dos pontos de consenso sobre aaprendizagem organizacional. Fiol e Lylesbuscam, no entanto, com base nesses, cla-

    rear o campo de discussão, aproximandoas posições existentes em termos de con-teúdo e níveis de aprendizado. Segundo asautoras, a mudança, a adaptação e o apren-dizado nas organizações – com presençaconsistente na literatura – sempre foramassuntos relacionados à forma como asorganizações ajustam-se a seu ambiente. Aseguir, apontaremos como as autoras dife-renciam o que são a mudança e a adapta-ção (Fiol; Lyles, 1985, p. 805).

    Segundo as autoras, a mudançarelacionar-se-ia aos ajustes provocados naorganização em suas maneiras de inter-pretar os eventos e como se desenvolvema compreensão e os esquemas explicativosentre seus membros. A mudança haveriade se referir, assim, a um desenvolvimento

    cognitivo da organização, sendo essa umaatitude consciente. A adaptação, por suavez, consistiria no surgimento de ações erespostas da organização na forma de no-vos comportamentos, não necessariamen-te conscientes. Dessa maneira, para melhordenição sobre o que se origina no ajusteentre a organização e o seu ambiente em

    termos de conteúdo, é preciso identicarse houve alteração comportamental oucognitiva (Fiol; Lyles, 1985, p. 806). A in-terpretação, ou seja, a atitude consciente decompreensão dos eventos como elementoimportante da aprendizagem organizacio-nal receberá maior atenção deste trabalho.

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     A preocupação das autoras é dife-renciar esses dois processos mostrandoser possível ocorrer ajustes no compor-tamento da organização, sem que tenhaocorrido nenhum desenvolvimento cog-nitivo. Da mesma forma, pode haver de-senvolvimento cognitivo na organização,sem que nela ocorra alteração de compor-tamento. Na opinião das autoras, haveriao aprendizado da organização por meiodo desenvolvimento cognitivo (Fiol; Ly-les, 1985, p. 806).

    Essas posições sobre mudança ouadaptação da organização em relação aoambiente se estabelecem na perspectivade que é possível demarcar onde terminaum fato no ambiente e onde se consta-ta a aprendizagem no indivíduo – emnosso caso, a organização – a partir deuma atitude consciente ou alteração deseu comportamento. Em outras palavras,trata-se de separar o indivíduo e seu ob-

     jeto quando do aprendizado. Analisando como acontece o co-

    nhecimento, Maturana e Varela armamque a demarcação entre indivíduo e ob-

     jeto não é uma questão relevante para aaprendizagem. Eles entendem que indi-víduos e objetos interagem compondouma cena em que os dois sofrem modi-cações em um processo de natureza cir-cular. Assim, conforme os autores, “todofazer é um conhecer e todo conhecer é

    um fazer” (Maturana; Varela, 2001, p. 32).Valendo-se desses autores, as organiza-ções são consideradas sujeitos da aprendi-zagem em um processo cuja circularidadediminui a importância de se saber se ofenômeno estudado foi de adaptação aoambiente ou de adaptação do ambienteà organização.

     A concordância com Maturana eVarela torna importante identicar sinaisde que alguma aprendizagem ocorreu.Destaca-se, então, o papel da memóriaorganizacional. Segundo Levitt e March,a memória consistiria no conhecimentoobtido baseando-se na experiência da or-ganização (Levitt; March, citado em Sims,2001, p. 65-66). Diante de um desenvolvi-mento cognitivo importante na organiza-ção, essa memória pode ser alterada nosseus aspectos tangíveis (registros e regrasformais escritas) ou intangíveis (fruto dasdiversas interpretações possíveis dentroda organização, seus grupos e indivíduos).

     As alterações da memória organi-zacional signicam a existência de apren-dizado que, por sua vez, exige a verica-

    ção da extensão em que isso aconteceu.Em outras palavras, torna-se necessáriauma métrica para o aprendizado orga-nizacional. Fiol e Lyles atentam para aextensão do desenvolvimento cognitivo,bem como para o nível em que se reali-zou. O aprendizado de baixo nível ca ca-

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    racterizado como o que ocorre segundofenômenos simples e repetitivos e dentroda estrutura e das regras organizacionais.Seus efeitos são normalmente de curtoprazo e apenas parciais sobre a organiza-ção e seus membros. Já no aprendizadode alto nível, é possível ocorrer mudançasnas regras, bem como o aperfeiçoamentono comportamento da organização dian-te de seus problemas. O aprendizado dealto nível é, portanto, mais complexo,sendo capaz de reconhecer relações decausa e efeito nos fenômenos enfrenta-dos pela organização e por seus membros.

     A abordagem de Fiol e Lyles ilu-mina dois aspectos importantes para estetrabalho no que se refere à aprendizagemorganizacional: a denição do foco desua atenção nos aspectos cognitivos daorganização e também dos níveis em queela acontece. Essa abordagem tambémacomoda teoricamente contribuiçõesimportantes como as de Argyris e Schön(1978) – aprendizagem de ciclos simples eduplo – também baseadas em pressupos-tos cognitivistas.

    Segundo tais autores, a aprendiza-gem de ciclo simples envolveria a detec-ção e a solução de problemas de acordocom as regras estabelecidas pela organi-zação (sua teoria de ação). Essa detecção,no entanto, envolve as contradições entrea teoria de ação esposada pelos indivídu-

    os e a teoria em uso, ou seja, aquela real-mente colocada em prática por eles. Osautores apontam que os indivíduos ar-mam seguir uma teoria e, na verdade, in-conscientemente praticam outra. Dessacontradição emerge um comportamentodefensivo em relação à detecção de errose/ou problemas e sua consequente corre-ção. Em outras palavras, surge uma resis-tência a observar de maneira crítica as si-tuações, inibindo o questionamento dasregras e dos procedimentos existentes e achegada às soluções. A aprendizagem deciclo duplo envolveria a superação dessapostura defensiva, o questionamento doestabelecido na organização e, por meiodo aprendizado da situação, a promoçãodas mudanças necessárias para a concre-tização das soluções (Argyris, 2000).

    Do apresentado até aqui a respei-to da aprendizagem organizacional, caa percepção da sua associação à noção demovimento e uxo. Adaptação, alinha-mento, ajustes, desenvolvimento cogni-tivo e interação são palavras que pres-supõem a existência de um movimento

    dos indivíduos e das organizações deuma determinada posição em termos deconhecimento para outra posição. An-tonello também coteja as diversas abor-dagens existentes para esse debate. Emsua síntese para tais abordagens, a noçãode movimento traduz-se na presença da

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    mudança nas organizações e, associada aesta, da aprendizagem.

    Conforme Antonello, a “[...] litera-tura existente promove uma relação for-te entre aprender e mudar” (Antonello,2005, p. 18). A pressão pela mudança se-ria ocasionada pelo ambiente concorren-cial instável no qual as organizações estãoimersas. Nesse ambiente, a capacidade desobrevivência das organizações associa-sediretamente à sua capacidade de mudara si própria. A autora identica na lite-ratura seis diferentes focos de exigênciasde aprendizado organizacional, todoseles permeados pela noção de mudan-ça.11 A relação aprendizagem-mudança étratada de diversas maneiras pelos auto-res. Em Argyris e Schön, a preocupaçãoé sobre o que barra o aprendizado e aconsequente mudança nas organizações.Em outros autores, o objetivo é a criaçãode condições adequadas na organizaçãopara a mudança, ou mesmo classicaçãoda mudança oriunda do aprendizado,entre outros. Antonello aponta que, demaneira geral, o conceito de aprendiza-

    gem organizacional tem como qualidadeseu caráter “dinâmico e agregador” emrelação à discussão da teoria da mudan-ça (Antonello, 2005, p. 17). A despeitodisso, a diversidade de abordagens paraa aprendizagem organizacional é objetode grande debate.

    6_De volta à Economia e concluindoO fenômeno da aprendizagem organiza-cional, se compreendido e de algumaforma gerido ou facilitado, resulta nacriação de outras competências nas or-ganizações, tornando-as mais competi-tivas. O aprendizado das organizaçõesresulta em muito da relação que elas es-tabelecem com seus contextos externo einterno, tanto em termos de inuênciarecebida quanto exercida, sendo, portan-to, relevantes suas escolhas em termos deestratégia e estrutura.

    Em verdade, na raiz da EconomiaBaseada no Conhecimento, também existeuma economia do aprendizado que, paratanto, exige ao menos a identicação deseus elementos no nível organizacional.

    Em termos mais gerais, este traba-lho toma como pertinente o conceito dePrange sobre a aprendizagem organiza-cional como lente para o estudo das mu-danças ocorridas nas organizações. Sobessa lente, a aprendizagem organizacio-nal pode ser denida como:

    Um processo de construção social queresponde a eventos internos e externosna organização, criando novas inter-pretações da realidade que são arma-zenadas na memória organizacional

    quando devidamente institucionali-zadas. Seus produtos – interpretações e

    11 Aprendizagem Individual eColetiva, Melhorias e Gestãode Qualidade otal, Sistema eProcessos, Inovação, Culturae Gestão de Conhecimento(Antonello, 2005, p. 17).

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    mudanças concretas da realidade – têm

    diferentes níveis de complexidade e pro-

     fundidade na organização. (Prange, 2001)

    Os elementos constituintes dessadenição permitem que a conexão daaprendizagem organizacional com a Eco-nomia se sustente. Assim, dos eventos (ex-ternos ou internos) à organização, surgemas perturbações que a levam a aprender(e criar outras interpretações da realidade)e mudar. ais aprendizados e mudanças,por sua vez, podem ter diferentes níveisde complexidade para a organização. Empoucas palavras, com base no que acon-tece nos ambientes internos e externosdas organizações, há a criação de outrosprodutos, incorporação de tecnologias,adoção ou desenvolvimento de inovaçõesorganizacionais, e assim por diante.

    Como destacado em Chandler eSimon, sem o pressuposto de onis