teoricas da arquivologia

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    Encontros Bibli: revista eletrnica de biblioteconomia e cincia da informao, v. 18, n. 37, p.61-82, mai./ago., 2013. ISSN 1518-2924. DOI: 10.5007/1518-2924.2013v18n37p61

    Correntes tericas da ArquivologiaTheoretical currents of Archival Science

    Carlos Alberto vila ARAJO1

    RESUMOA Arquivologia se constituiu, como disciplina cientfica, no final do sculo XIX, a partir daconsolidao de um modelo custodial e patrimonialista. No sculo XX, desenvolveram-se

    diversas teorias, sistematizadas neste texto em quatro eixos, ampliou seu escopo de estudos eproblematizaes. Como efeito desta ampliao, desenham-se perspectivas contemporneascom modelos sistmicos, abarcando diferentes tipos de arquivos, preocupadas com o contextosociocultural dos arquivos e tambm inserindo nas prticas as tecnologias digitais.

    PALAVRAS-CHAVE: Information Literacy. Competncia em Informao. Leitura. Mediao deLeitura. Biblioteca Pblica.

    ABSTRACTArchival Science was formed, as a scientific discipline, in the late nineteenth century, from theconsolidation of a custody and heritage model. In the twentieth century, several theories havebeen developed, systematized in this article in four axes. As a result, Archival Science has

    expanded its scope of studies. As a result of this expansion, there are contemporary perspectives

    with systemic models, covering different types of archives, concerned with the socioculturalcontext of the archives, and also insering digital technologies in the practice of archives.

    KEYWORDS: Archival Science. Epistemology of Archival Science. Theorerical currents ofArchival Science.

    1 Universidade Federal de Minas Gerais - [email protected]

    ARTIGO

    Recebido em:04/03/2013

    Aceito em:27/07/2013

    v. 18, n. 37, 2013.p. 61-82ISSN 1518-2924

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    1 INTRODUCOO campo relacionado aos arquivos tem uma longa histria (de, ao menos, alguns

    milnios) enquanto atuao profissional e prtica institucional. Sua construo

    enquanto campo de conhecimento autnomo vem se processando nos ltimos cincosculos, sendo que sua consolidao enquanto uma disciplina cientfica se deu no finaldo sculo XIX (RUFEIL, 2009). De l para c, diversos estudos, pesquisas, prticas ereflexes foram se desenvolvendo, constituindo diferentes perspectivas ou correntesde estudo, que resultam hoje na riqueza e diversidade conceitual e terica que compeo campo da Arquivologia.

    O objetivo deste texto apresentar uma sistematizao dessa produocientfica diversa, por meio do agrupamento de teorias e reflexes a partir de suafiliao, mais ou menos explcita, s diversas correntes de pensamento que perpassam,de uma maneira geral, as vrias cincias sociais e humanas nas quais a Arquivologiase insere enquanto modalidade especfica do conhecimento cientfico.

    Para a consecuo deste objetivo, foi realizado um amplo rastreamento naliteratura da rea, produzida em diferentes pocas e em diferentes contextos,selecionada principalmente a partir de sua presena em manuais, tratados e livrosintrodutrios ao campo da Arquivologia. A seguir, procedeu-se identificao dos

    fundamentos destas produo terica, para ento se realizar o agrupamento do qualresultaram os eixos apresentados a seguir.

    2 DAS ORIGENS CONSOLIDAO CIENTFICARefletir sobre a origem da Arquivologia conduz obrigatoriamente s primeiras

    atividades culturais humanas entendendo aqui cultura como a ao simblica,humana, de interpretar o mundo e de produzir registros materiais dessas aes em

    qualquer tipo de suporte fsico. uma parte destes primeiros registros materiais queconstitui a origem daquilo que sculos depois ser conhecido como documento de

    arquivo. Mas foi com a inveno da escrita e d o estabelecimento das primeiras cidades,no incio dos processos de fixao das coletividades num territrio especfico, h maisde cinco milnios, que apareceram as primeiras manifestaes de espaos especficos(que seriam conhecidas, sculos depois, como as instituies arquivsticas) voltadospara a guarda e a preservao de acervos documentais. No Egito Antigo, na Grcia

    Clssica, no Imprio Romano, nos mundos rabe e chins do primeiro milnio e na

    Idade Mdia na Europa, ergueram-se e consolidaram-se diversos arquivos relacionados

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    com os mais diversos fins religiosos, polticos, contbeis, jurdicos, entre outros(SILVA et al, 1998).

    Contudo, foi aps o Renascimento, a partir do sculo XV, que comearam a

    surgir os primeiros traos efetivos daquilo que se poderia chamar de um conhecimentoterico especfico da Arquivologia. Com o Renascimento, renasceu o interesse pelaproduo humana, pelo estudo de sua histria e evoluo poltica e econmica.Salientou-se assim o interesse pela salvaguarda e preservao dos registros dasatividades humanas nas mais variadas esferas.

    Proliferaram, a partir do sculo XVII, tratados e manuais voltados para as regras

    de procedimentos nas instituies responsveis pela guarda das obras, para as regrasde preservao e conservao fsica dos materiais, para as estratgias de descrioformal das peas e documentos, incluindo aspectos sobre sua legitimidade, procednciae caractersticas, sendo que De re diplomatica, de Dom Jean Mabbilon, publicada em1681, considerada uma obra fundadora do campo pois contm os primeiroselementos da doutrina arquivstica (FONSECA, 2005, p. 31). A produo simblica

    humana, compreendida como um tesouro que precisaria ser devidamente

    preservado, tornou-se objeto de uma viso patrimonialista (o conjunto da produointelectual e esttica humana, a ser guardado e repassado para as geraes futuras).

    O passo seguinte se deu com a Revoluo Francesa e as demais revoluesburguesas na Europa, que marcam a transio do Antigo Regime para a Modernidade.Operou-se uma profunda transformao em todas as dimenses da vida humana (napoltica, na economia, no direito) e, dessa forma, tambm os arquivos foram

    drasticamente transformados. Surgiu a o conceito moderno de Arquivo Nacional, que

    tem no seu carter pblico (no sentido de nacional, relativo ao coletivo dos nascentes

    Estados modernos) sua marca distintiva. So formadas as grandes colees, operam-seamplos processos de aquisio e acumulao de acervos o que reforou a natureza

    custodial destas instituies. A necessidade de se ter pessoal qualificado para asnascentes instituies modernas levou formao dos primeiros cursosprofissionalizantes (dos quais o curso da cole des Chartes, criado em 1821, paradigmtico), voltados essencialmente para regras de administrao das rotinasdestas instituies.

    Por fim, com a consolidao da cincia moderna como forma legtima deproduo de conhecimento e de interveno na natureza e na sociedade, tambm ocampo das humanidades se viu convocado a constituir-se como cincia. Surgiram ento,no sculo XIX, aqueles que seriam os precursores do estabelecimento do projeto de

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    constituio cientfica da Arquivologia: a formalizao do conceito de fundo (oprincpio do respeito aos fundos, de Natalis de Wailly, de 1841) e oHandeigling voor hetordenen em beschrijven van Archieven (conhecido como o Manual dos holandeses), de

    1898. O modelo de cincia ento dominante, oriundo das cincias exatas e naturais,voltado para a busca de regularidades, estabelecimento de leis, ideal matemtico einterveno na natureza por meio de processos tcnicos e tecnolgicos, se expandiupara as cincias sociais e humanas atravs do Positivismo. Esse o modelo queinspirou as pioneiras conformaes cientficas da Arquivologia, que privilegiou osprocedimentos tcnicos de interveno: as estratgias de descrio, classificao e

    ordenao dos acervos documentais dos arquivos. Operou-se um verdadeiro efeitometonmico: aquilo que antes era uma parte do processo ( operaes tcnicas parapossibilitar o uso das colees) se tornou o ncleo, o essencial, em alguns casos a quasetotalidade do contedo do nascente campo da Arquivologia, que se tornou a cincia(positiva) voltada para o desenvolvimento das tcnicas de tratamento dos acervos

    guardados nos arquivos. Esse movimento de consolidao positivista da Arquivologia

    promoveu, assim, sua libertao de outras reas, sobretudo a Histria. At ento, a

    Arquivologia era considerada uma cincia auxiliar da Histria, num modelo que

    privilegiava a dimenso patrimonial de acervos custodiados para servirem produo

    historiogrfica (SILVA, E., 2012, p. 40). Mais do que oposies, os trs movimentos acima destacados se somam. Aperspectiva patrimonialista voltou-se para os tesouros que devem ser custodiados,ressaltando a importncia da produo simblica humana. A entrada na Modernidadeenfatizou as especificidades da instituio arquivo, que devia ter estruturasorganizadas e rotinas estabelecidas para o exerccio da custdia. E a fundamentaopositivista priorizou as tcnicas particulares da Arquivologia a serem utilizadas para oadequado tratamento do material custodiado. Constituram-se assim, nos finais do

    sculo XIX, os elementos que marcaram a consolidao de um paradigmapatrimonialista, historicista, custodial e tecnicista (SILVA et al, 1998) para aArquivologia.

    Contudo, ao longo do sculo XX, foram se desenvolvendo pesquisas, reflexes eestudos em diferentes pases e realidades, que foram gradualmente conduzindo superao deste paradigma, e levando por fim a abordagens contemporneas queproblematizam os arquivos a partir de um quadro explicativo muito mais complexo.Para a identificao de tais estudos, foi realizado um amplo levantamento bibliogrficorelacionado a diferentes pocas e contextos, para a identificao de teorias, conceitos e

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    mtodos mais utilizados e referenciados em manuais, tratados e livros introdutrios. Aseguir, buscou-se sistematizar tais estudos, que so apresentados, a seguir, organizadosem quatro eixos, segundo sua filiao a correntes tericas mais amplas das cincias

    humanas e sociais. Ao final, apresenta-se um panorama dos estudos contemporneos,realizados j com a conjugao das teorias sistematizadas nos quatro eixos.

    3 O APORTE DO PENSAMENTO FUNCIONALISTAO modelo vigente no final do sculo XIX, como se viu, acabava por privilegiar um

    pensamento voltado essencialmente para dentro: para os documentos e acervos

    guardados nos arquivos; para as rotinas e dinmicas dos arquivos; e para as regras dedescrio e ordenao destes acervos. No comeo do sculo XX surgiram manuais einiciativas que evocavam mudanas no modo de se conceberem os arquivos. Adjetivos

    como vivo, dinmico e ativo comeam a ser usados para apontar a direo de uma

    necessria mudana a ser operada nos arquivos de modo a se combater sua inrcia eseu fechamento sobre si mesmo. O discurso da eficcia, o imperativo do retorno, para asociedade e as empresas, dos investimentos feitos foi um dos motes dessa abordagem.De outro lado, o ideal iluminista da universalidade, isto , do acesso a todos os cidados,

    tambm convocou a que se pensasse e problematizasse as funes dos arquivos. nesse contexto que se desenvolveram as teorias funcionalistas2 da Arquivologia, aolongo do sculo XX.

    Sendo ao mesmo tempo um sintoma da afirmao disciplinar da Arquivologia eum ensaio da redefinio de suas relaes com a Histria e a Administrao, foi

    publicado em 1922 A manual of archive administration, por Hillary Jen kinson. O autorbuscou enfatizar a administrao dos arquivos, argumentando que o profissional nodeve ser um historiador. Para ele, o mais importante no deter o conhecimento em

    Histria (ou na rea com a qual lida o arquivo, por exemplo, metalurgia), mas sim ementender de arquivo, dos aspectos relacionados ao arquivo (edificao, custdia, etc),

    do ponto de vista da Arquivologia. Jenkinson prope uma espcie de libertao da

    2 O Funcionalismo uma forma de pensamento presente em diversas cincias humanas e sociaisque estuda os fenmenos a partir de uma lgica biolgica, do modelo de organismo vivo: umtodo composto por partes (rgos) que se interrelacionam, exercendo determinadas funespara a manuteno do equilbrio do todo. Tambm conhecida como perspectiva da integrao.Sua origem se d na Sociologia com Durkheim, na Antropologia com Malinowski e na Psicologia,

    em parte, com o Behaviorismo. Depois, o Funcionalismo se manifestou em cincias sociaisaplicadas, como a Pedagogia, a Comunicao, a Administrao e, como analisado neste texto, naArquivologia.

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    subservincia, por parte do arquivista, a outros campos do saber, em prol de umconhecimento especfico sobre os arquivos. Argumenta Jenkinson que os arquivos seformam porque tm duas qualidades importantes, a imparcialidade e a autenticidade,

    as quais levam ao conhecimento da verdade a verdade arquivstica, no a verdadehistrica ou de qualquer outra rea, que seria j conseqncia da investigao e do usodestes arquivos por parte dos profissionais de outras reas. Tal ponto de vista comeoua trazer a questo da eficcia para o universo dos arquivos: tanto a eficcia na gestodos arquivos como instituies (dotadas de recursos, procedimentos, etc) como daadequao de sua funo para a sociedade qual os arquivos atendem.

    Poucos anos depois, em 1928, Eugenio Casanova publicou Archivistica. J semanifesta nele uma preocupao sistmica, pois ele no separa o arquivoadministrativo do arquivo histrico (dado que o segundo deriva do primeiro) e nomesmo conceito integra tanto os arquivos pblicos como os privados. De acordo comele, a Arquivologia composta por trs partes: uma relativa administrao geral dos

    arquivos enquanto instituies (chamada archiveconomia, termo tomado aosalemes); outra relativa organizao interna dos documentos; e outra relativa suanatureza jurdica e seus servios. Um dos tpicos mais importantes diz respeito sfunes dos arquivos, e Casanova aponta que, alm de recolher os documentos

    representativos da atividade de entidades e organismos, garantindo sua segurana epreservao, tambm constitui sua funo fazer isso com um menor esforo, poupandotrabalho, e utilizando com o mximo de economia as instalaes, o pessoal, o tempo eadministrando os custos.

    Mas no perodo entre-guerras que um outro tipo de preocupao aparece parao campo da Arquivologia: trata-se da questo da avaliao de documentos, que emergeem consequncia tanto do aumento da produo de documentos como do imperativoda eficcia no mbito das organizaes. At ento, havia diferentes posies em relao

    ao assunto. Na Inglaterra, adotava-se como postura a ideia de que, na destruio dedocumentos, no deveria haver qualquer interveno, por parte dos profissionais dearquivo, pois isso no faria parte das suas atribuies. Tal posio, sustentada porJenkinson e adotada pela Arquivologia inglesa, propunha como soluo deixar a tarefade eliminao a cargo das prprias administraes.

    At o incio da dcada de 1940, predominava nos Estados Unidos a ideia inglesade deixar por conta das administraes o papel decisrio sobre a avaliao dedocumentos. Dois autores, contudo (Philip Brooks, em 1940, e Schellenberg, em 1956),vieram a desenvolver uma teorizao prpria sobre o valor dos documentos. Brooks

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    chamou a ateno para trs categorias de valor: a instituio de origem, o estudo da

    histria administrativa da entidade produtora e a histria em geral.Mas o trabalho de Schellenberg, que se tornou um marco na Arquivologia, que

    se constituiu a principal referncia para os arquivistas americanos. Lopes (2000) chegaa propor que, com Schellenberg, constitui-se segunda vertente da Arquivologia: atradio norte-americana, essencialmente pragmtica, que concebe um arquivista

    voltado para todos os tipos de arquivos, em oposio corrente tradicional, francesa,

    italiana e espanhola, focada nos arquivos histricos. Tambm Delsalle (1998, p. 191)destaca a importncia dessa corrente como uma nova teoria arquivstica.

    Schellenberg (1973) considerou a existncia de um valor primrio (para aentidade produtora) e um valor secundrio (para a investigao). Introduziu ainda adistino entre valor evidencial e valor informativo como dois aspectos do valorsecundrio o que significou, em certa medida, a incorporao dos critrios alemespara orientar a avaliao.

    As ideias americanas sobre avaliao representam uma sntese das posiesinglesa e alem e procuram atingir um objetivo muito concreto: conservar um mximode informao preservando um mnimo de documentos. Conforme Kolsrud (1992), osEUA conseguiram a faanha de destruir 99% da documentao produzida em certos

    servios administrativos governamentais com um impacto imenso tanto na questoda eficcia do funcionamento destes rgos como proporcionando uma grande reduode custos. G. Philip Bauer chegou mesmo a defender que o valor dos documentosdeveria ser ponderado em funo dos custos de sua preservao, soluo pragmticaque veio a ser enfatizada em anos mais recentes (PINKETT, 1981). Formou-se assim ocampo da Archival Appraisal relacionado com a avaliao dos documentosarquivsticos.

    Outro conceito que se afirma no ps-guerra, e que tambm se insere na

    perspectiva funcionalista, o derecord group uma adaptao americana do princpioda provenincia tal como este era concebido na Europa. Tal conceito surgiu em 1941,

    no National Archives de Washington, para possibilitar uma flexibilidade na organizaodos documentos produzidos por diferentes entidades. Como explica Pinkett (1981), osdocumentos recebidos pelos arquivos americanos, procedentes das administraes,tendiam a apresentar-se muito mais desorganizados do que os europeus, onde atradio administrativa era mais propcia a possibilitar o respeito pela ordem originalaps as incorporaes nos arquivos definitivos.

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    A formalizao deste conceito acabou por propiciar o surgimento do fenmenoda records management , a gesto de documentos arquivsticos, bastante ligado aocontexto do crescente aumento da produo documental. Arecords management visava

    a interveno da ao arquivstica logo na primeira idade dos documentos, isto , nafase da sua produo e tramitao nos servios administrativos, com a finalidade deaplicar mtodos de economia e eficcia na gesto documental. De acordo com Pinkett(1981), essa viso americana marca a preponderncia das consideraes pragmticassobre o arranjo de documentos.

    A gesto documental afirmou-se como uma nova rea com estreito vnculo com

    a Administrao, marcando uma ruptura com a Arquivologia at ento mais voltadapara a documentao de interesse histrico. Passou a referir-se no s produo e usode documentos, mas, tambm, avaliao e seleo destes. Essa nova rea foi encaradapelo Congresso americano como fundamental para a administrao, a ponto de, em1947, ter sido criado um grupo especfico para se dedicar ao problema darecords

    management , com o objetivo de reduzir os custos da produo documental e melhorara qualidade dos documentos. Em conseqncia dos trabalhos desse grupo, foipromulgado em 1949 um decreto que criou oGeneral Service Administration, ao qualficou submetido o Arquivo Nacional, agora com a designao deNational Archives and

    Records Service(NARS).Uma iniciativa paralela, de acordo com Delsalle (1998) deu-se, tambm nosEUA, a partir de 1914, por iniciativa de Irene Warren, da Universidade de Chicago, quereuniu um grupo de interessados em classificao de documentos. Em 1927 esse grupoformalizou uma associao em Chicago que, em 1954, tornou-se nacional: a AmericanRecords Management Association. No seio desta associao criou-se posteriormente operidicoRecords Management Quarterly .

    Destaca-se tambm o impacto da evoluo tecnolgica, principalmente a partir

    da segunda metade da dcada de 1940, em variados aspectos dos arquivos e das etapasda vida dos documentos. A esta evoluo associou -se o fenmeno que ficou conhecido

    como exploso documental. Os meios automatizados, que comearam a ser

    associados ao tratamento da informao, revolucionaram os processos at entousados e fizeram surgir novas abordagens dos documentos, sobretudo dirigidas aoscontedos informativos, j que a informao havia ganhado estatuto de recursoindispensvel da investigao e do desenvolvimento. O fenmeno da explosodocumental colocou para os arquivos um novo problema e, como conseqncia, anecessidade de medidas de carter pragmtico para as incorporaes nos j saturados

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    arquivos histricos tal fato potencializou o problema da avaliao e das eliminaes.Delsalle argumenta (1998, p. 192) que, junto com a preocupao com novos tipos dedocumentos e novos princpios arquivsticos (a teoria das idades do documento de

    Schellenberg), as novas tecnologias compem um quadro que revoluciona aArquivologia no perodo que vai de 1950 a 1980, desde o impacto do microfilme (que pela primeira vez problematizado teoricamente na Gazette des Archives de 1950) srepercusses da tecnologia digital no fazer arquivstico.

    Uma vertente completamente diferente, dentro da Arquivologia, mas quetambm representa uma manifestao do pensamento funcionalista, a que vincula a

    atividade arquivstica ao cultural. Conforme Alberch i Fugueras et al (2001), trata-se de uma parcela muito pequena do campo (que se desenvolveu em grande parte natradio da pesquisa histrica e da gesto de documentos no mbito administrativo)mas que, nem por isso, tem menor importncia, na medida em que vem desempenharuma outra funo dos arquivos - uma funo cultural e pedaggica por meio da qual

    os arquivos se dinamizam. Conforme os autores, tal mbito de atividades representauma funo, porque tem a fora de situ -la em p de igualdade com a clssica eirrenuncivel funo jurdico-administrativa dos arquivos, e , ao mesmo tempo,

    estratgia de ao e dinamizao, porque pressupe vontade de atuao, de

    movimento, de manifestao de uma fora, desejo de fazer chegar esses servios eprodutos ao grande pblico.Conforme argumentam Alberch i Fugueras et al (2001), o objetivo primeiro dos

    arquivos, de organizar e conservar adequadamente os documentos, adquire toda a suadimenso cidad ao se assumir que eles colaboram para a aceitao dos valores depatrimnio pblico, memria, identidade e conhecimento. Existe, pois, um papel dosarquivos no fomento e difuso dos valores assumidos pela sociedade comofundamentais.

    4 PENSAMENTO CRTICO NA ARQUIVOLOGIAAo longo do sculo XX, o impacto do pensamento crtico3 sobre o positivismo, a

    sociedade e o ser humano comeou a se manifestar no espao reflexivo sobre os

    3 A perspectiva crtica refere-se a um amplo movimento do pensamento nas vrias cinciashumanas e sociais. Sua postura epistemolgica bsica a dvida, a suspeio de que a realidade

    tenha uma existncia nela mesma, e tambm a ideia de que o conflito, e no a integrao, queestrutura a realidade humana. Nesse sentido, os estudos realizados nesta perspectiva buscamanalisar fenmenos ocultos ou escondidos por detrs das aparncias, como a ideologia (no caso

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    arquivos. Tambm tendo como centro de preocupao as relaes entre os arquivos e asociedade, desenhou-se uma perspectiva calcada sobretudo na denncia de processosde dominao, de aes ideolgicas ocultas por detrs de prticas tidas como

    pretensamente neutras, no questionamento sobre as reais necessidades a serematendidas e sobre os enquadramentos culturais promovidos. Essa abordagem seconstruiu tanto na crtica ao paradigma patrimonialista quanto corrente funcionalista.Seu ponto de partida uma concepo da realidade humana como fundada no conflito,na luta de interesses entre atores em posies desiguais por condies de domnio elegitimidade por meio principalmente (mas no s) do conceito de ideologia.

    O desenho de uma Arquivologia crtica comeou principalmente a partir deanlises sobre os critrios utilizados pelos arquivos e pelo revisionismo das prticasps-Revoluo Francesa. o caso, por exemplo, da anlise de Bautier, em 1961, sobreos erros e contradies da Revoluo Francesa, com a reordenao dos arquivosbaseada em concepes ideolgicas (SILVA et al, 1998). Nos anos 1960, alguns autores

    comearam a questionar a suposta naturalidade dos princpios e prticas

    arquivsticas.No mesmo perodo, a questo do poder de posse de documentos tambm

    ganhou destaque com os processos de descolonizao na frica, sia e Amrica. A

    reconstituio dos patrimnios arquivsticos nacionais foi inclusive tema de debate naXVIIConfrence Internationale des Tables Rondes des Archives- CITRA (SILVA et al,1998), reconhecendo-se que a identidade de um pas se rev, em grande parte, nos seusarquivos.

    Nas dcadas de 1960 e 1970, sob forte impulso da Organizao das NaesUnidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (Unesco), ganharam espao as discussessobre as polticas nacionais de informao e, dentro delas, as questes relativas aosarquivos (JARDIM, 1995). Entre as vrias problemticas envolvidas nesse processo

    esto as de direito informao como condio de cidadania em relao com oscritrios de sigilo dos documentos de Estado (MATTAR, 2003) e a necessidade detransparncia por parte do Estado (JARDIM, 1995). O estudo da ao do Estado como

    estrutura totalizadora capaz de legitimar uma cultura dominante encontrou em

    Bourdieu e Gramsci adequados referenciais para a construo das estratgias deanlise (FONSECA, 2005, p. 48), buscando ver em quemedida os registros escritos

    do pensamento marxista) ou o inconsciente (no caso da Psicanlise), entre outros.

    Manifestaes de pensamento crtico tambm se verificam em vrias cincias do campo dashumanidades, desde a Sociologia e a Psicologia at os campos aplicados da Pedagogia,Comunicao, Administrao e Arquivologia.

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    podem estar a servios das classes dominantes (SOUSA, 2007, p. 96). Numa linha bastante diversa, e em dilogo com a Psicanlise, existe tambm

    uma perspectiva crtica mais voltada para a anlise da obsesso das sociedad es

    contemporneas com o arquivamento, com o registro de cada momento da experinciae o adequado tratamento desse registro (COLOMBO, 1992).

    , contudo, no mbito da Arquivologia canadense que se desenvolvemimportantes estudos conforme a perspectiva crtica. Considerado o pai dessaabordagem (FONSECA, 2005, p. 60), Terry Cook inaugurou, em 1994, sob a expresso

    de uma arquivstica ps -moderna, um campo de reflexes na tentativa de superar asvises positivistas calcadas em pressupostos de neutralidade e passividade. Para Cook,uma nova viso da Arquivologia deveria problematizar noes como a de autoridade,evidncia e verdade. Tal postura teria um impacto imenso na prpria prtica

    profissional dos arquivistas, que no deveriam mais apenas seguir um script que vem

    sendo naturalizado pela rotina de repetio de prticas passadas, mas sim questionar

    suas aes percebendo que os arquivos e seus documentos refletem relaes de poder,no so depsitos passivos mas locais ativos onde poderes sociais so negociados,contestados e confirmados (COOK, 1997; SCHWARTZ; COOK, 2002). Em suma, trata-sede uma perspectiva terica que propem uma viragem das preocupaes da

    Arquivologia, da nfase nos documentos e seu contedo para o seu contexto. Osarquivos so vistos como instrumentos de poder que influenciam no direcionamentodo ensino formal, na construo da memria coletiva, da identidade nacional e, enfim, omodo como conhecemos a ns mesmos.

    Desdobramentos desta abordagem foram feitos em estudos sobre usos polticosdos arquivos para a legitimao de sistemas totalitrios em vrios pases. Um oestudo de Caswell (2010) sobre as aes em tribunais pelo regime do Khmer Vermelhono Camboja a partir da teoria da banalidade do mal de Arendt. A autora enfatiza a

    importncia da reflexo crtica dos profissionais de arquivo para no se tornaremcmplices de burocracias da morte, de regimes genocidas, por meio de prticas de

    avaliao ou manuteno de arquivos e de facilitao de prticas de assassinatos emmassa por meio de documentao. Outro exemplo o estudo de Harris (2007) sobre arealidade da frica do Sul com uso de categorias da obra de Derrida, que buscouanalisar o papel dos arquivos no processo de construo da memria sobre o passadoopressivo do regimeapartheid os arquivos como ferramentas de justia e democracia,isto , modeladores das polticas da memria. Um ltimo exemplo o estudo deMontgomery (1995) sobre o uso de arquivos por ONGs de direitos humanos para

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    documentao de abusos a partir do conceito deaccountability . No Brasil, esse tipo deperspectiva tem importncia extrema em questes contemporneas como a Lei deAcesso Informao de 2011 e os trabalhos da Comisso da Verdade relacionados com

    a reconstruo da memria dos perodos ditatoriais vividos no pas.Por fim, deve-se destacar a relevante contribuio de Garca Gutirrez (2008),

    que faz uma grande crtica s perspectivas funcionalistas e tecnicistas, que seriamabsolutistas e sobretudo subservientes a determinadas posies dominantes. Como

    soluo, o autor prope a construo do que ele chama de operador complexo (que

    possibilitaria a explicitao das vrias posies e interesses em determinada questo

    ou tema) em parceria com o operador transcultural (responsvel por equili brar ospossveis tratamentos injustos da memria mediante alertas e recriminaes) para aconstruo de sistemas de preservao, representao e busca de registros doconhecimento humano.

    5 O ESTUDO A PARTIR DA PERSPECTIVA DOS SUJEITOSOutra tradio de estudos se constituiu a partir da crtica tanto aos estudos

    funcionalistas como aos crticos, na medida em que ambos tendiam a ver apenas a ao

    dos arquivos sobre a sociedade e os indivduos, estes tomados apenas como serespassivos, meros receptculos de informao. Foi no resgate ao papel de sujeitos ativos eno estudo de suas apropriaes, suas diferentes necessidades e usos que se construiutoda uma perspectiva de estudos os estudos de usurios de arquivos.

    Tal discusso comeou a ser efetivamente realizada na dcada de 1960, dentrodas discusses mais amplas sobre a liberalizao do acesso aos arquivos, em pelomenos trs grandes discusses promovidas pelo Conselho Internacional de Arquivos: oCongresso Extraordinrio, realizado em Washington, em 1966; a X CITRA, que ocorreu

    em Copenhagen, em 1967; e o VI Congresso Internacional, que aconteceu em Madri noano de 1968 (SILVA et al, 1998). Todavia, a temtica s ganhou maior relevo na dcadaseguinte. Verificou-se o reconhecimento de vrios interesses, em certa medidacontraditrios, tais como o direito liberdade de informao em oposio ao direito privacidade e confidencialidade e necessidade de preservao e segurana dosdocumentos. No VII Congresso Internacional de Arquivos, em Moscou, 1972, foramdiscutidos, entre outras questes, os instrumentos de pesquisa nos arquivos. Dois anos

    depois, no VIII Congresso, em Washington, um dos temas principais foi a revoluo no

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    acesso aos arquivos. E depois de mais dois anos, em Londres, no IX Congress o,debateu-se a utilizao e a utilidade dos arquivos.

    Apesar disso, duas dcadas depois, a temtica continuou sendo muito pouco

    expressiva no mbito do conhecimento cientfico gerado na Arquivologia. Para Conway(1986), tal fato se deve a uma certa relutncia arquivstica para uma maior

    compreenso dos usurios. Conforme Jardim e Fonseca (2004), tal temtica, emvariados levantamentos, no atinge 3% do total de pesquisas realizadas. Os autoresdestacam alguns dos estudos pioneiros do campo, entre os quais o de Taylor, que em1984 estudou os nveis de necessidades de informao, buscando a indicao dos

    melhores instrumentos de pesquisa e a identificao dos tipos de usurios nasdiferentes fases do ciclo vital dos documentos; de Dowler, que em 1992 props que sedevem buscar nas cincias sociais instrumentos para a compreenso real dasnecessidades dos usurios; de Dearstyne, que em 1987 props um modelo com seisreas de estudo, incluindo a de incentivo ao uso dos acervos arquivsticos; de Pugh, que

    em 1992 props conciliar os princpios arquivsticos com as necessidadesinformacionais dos usurios; o de Cox, que em 1992 elaborou quatro campos deestudo; e o de Wilson, que realizou em 1995 umsurvey com arquivistas e detectou quea preocupao com os usurios aparece com uma menor importncia, correspondendo

    sua posio de fase final, ltima etapa do processo arquivstico. Na dcada de 1980, basicamente duas linhas de pesquisa se delinearam. Por umlado, desenvolveram-se estudos para garantir maior acesso aos documentosarquivsticos, por meio da eliminao de barreiras (DUCHEIN, 1983), criao deinstrumentos de recuperao (DOOLEY, 1992) e maior conhecimento dos interessesdos pblicos (PUGH, 1982). De outro lado, desenvolveu-se um conjunto de estudos quebuscaram perceber, na prtica de estudos com usurios, uma reorientao da prticaprofissional como um todo, de forma a que os resultados desses estudos interferissem

    nas demais aes e prticas arquivsticas (JIMERSON, 1989). Uma das maiores defesasdesse argumento feita por Dowler (1988), para quem o uso deve ser a base a partir daqual a prtica arquivstica deveria ser construda. O pesquisador prope que deveriaexistir uma relao entre o uso da informao e os modos como ela ou pode vir a serrecolhida, armazenada, organizada e fornecida. Seria a partir dessa relao que o valordos documentos (e da informao contida neles) iria ser determinado e as prticasarquivsticas definidas. Linha semelhante defendida por Blais, Enns e Richan (1992)

    que defendem que os arquivistas deveriam sair de sua torre de marfim. Juntas, essas duas linhas acabaram por aproximar o campo dos arquivos do

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    conceito de informao e da temtica relativa s necessidades de informao. Nessesentido, Delsalle (2000) argumenta que se ampliou a perspectiva de estudos de usos eutilidades dos arquivos, contemplando-se um leque mais variado como a utilidade

    administrativa jurdica, a utilidade administrativa financeira e a utilidade histrica.Tambm se buscou, progressivamente, elaborar tipologias de usurios:

    Essencialmente, a literatura arquivstica classifica trs grupos distintos de potenciais

    usos dos registros orgnicos: a) acadmico-cientfico; b) administrativo; e c) popular(VILA; SOUSA, 2011, p. 43).

    Em anos seguintes, essa tendncia continuou presente. Conforme aponta Silva

    (2011), uma das mais significativas a aproximao entre a Arquivologia e a gesto do

    conhecimento, com uma agenda de pesquisas que passou a priorizar o usurio do lado

    de dentro do balco, isto , o produtor de documentos e/ou responsvel por suatramitao, numa clara nfase de estudos nos arquivos correntes.

    Coeur e Duclert (2001) destacam tambm haver um incremento geral do

    interesse pelos estudos de usurios, inicialmente focados nos historiadores, passando aabranger tambm o estudo de cidados, notadamente em relao ao interesse pelahistria familiar e em atividades de ensino, bem como a utilizao destesconhecimentos na montagem de exposies e outras atividades por parte dos arquivos.

    Os autores destacam trs grandes tipos de usos dos arquivos: administrativo (reforara eficcia na administrao do Estado e de demais tipos de instituies), histrico (pormeio do qual eles se constituem os principais recursos para a pesquisa histrica) epatrimonial (acessvel a um grande pblico, exercendo um papel cvico). Cidadania edireito informao passaram a compor parte importante das discusses sobreusurios no campo da Arquivologia (BLAYA PEREZ; MENEZES, 2009).

    6 ESTUDOS SOBRE REPRESENTAOQuestes ligadas aos princpios de organizao e descrio dos documentos

    arquivsticos surgiram e foram debatidas durante todo o perodo de consolidao doparadigma patrimonialista. Contudo, foi a partir de 1898, ano da publicao do manualde Mller, Feith e Fruin, que tal questo ganhou um estatuto diferente. Emborafundamental para a consolidao da perspectiva tecnicista no seio deste paradigma, econtribuindo para a autonomizao da Arquivologia como campo de conhecimento,este manual tambm abriu caminho para a construo de um espao reflexivo sobre asnormas e tcnicas arquivsticas.

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    Diversas aplicaes prticas de instrumentos de classificao, inclusive desistemas de classificao bibliogrfica, foram testadas nos anos seguintes, embora semuma significativa reflexo terica o que s aconteceu em manuais posteriores, como

    os de Tascn, de 1960, e de Tanodi, em 1961, e em obras tericas de pesquisadorescomo Schellenberg. Nas dcadas de 1970 autores como Laroche e Ducheinproblematizaram os princpios de ordenamento confrontando o conceito derecord group surgido nos EUA com o princpio da provenincia europeu.

    No final desta dcada, comearam a aparecer as primeiras reflexes sobre osregistros eletrnicos, cabendo a Dollar (1992) o pioneirismo na teorizao de tal

    questo, em relao avaliao e ao valor informativo do documento para alm daideia de suporte e contedo informativo.

    Os aspectos relacionados com preservao e autenticidade tambm estiveramno centro dos debates sobre os documentos digitais, envolvendo pesquisadores comoDuranti (1989), que props uma revitalizao dos estudos sobre a Diplomtica e a

    necessidade de aplicao de seus fundamentos aos documentos eletrnicos. Duranti eEastwood (1995) so autores que, nesta linha, vm desenvolvendo reflexes sobre ovalor probatrio dos documentos eletrnicos.

    O impacto dos suportes digitais tambm motivou o crescimento da pesquisa na

    rea de normalizao arquivstica (SILVA, E.; 2012). Na dcada de 1990, contudo, otema mais presente nas discusses tericas da comunidade arquivstica internacionalfoi o da elaborao de normas descritivas. A introduo dos meios informticos foi oprincipal fator a impor a necessidade de padronizao no trabalho descritivo (comocondio para se obter mais sucesso nas pesquisas) mas, tambm, destaca-se a troca deinformaes entre diferentes organismos e a possibilidade de sua ligao em rede.

    Os antecedentes dessa produo se desenvolveram de formas distintas. NosEstados Unidos, com as regras de descrio para arquivos e manuscritos de Hensen,

    que tiveram sua primeira verso apresentada em 1983 e que, nos anos seguintes,passaram a ser aplicadas de forma corrente nos arquivos americanos e depois serviramde base para um formato para troca de registros legveis por mquina. A partir doformato MARC, criado pelaLibrary of Congress, surgiu o MARC AMC para possibilitar atroca de registros arquivsticos. Na Inglaterra, foram desenvolvidas normas dedescrio arquivstica a partir de um projeto nascido na Universidade de Liverpool, soborientao de Michael Cook, tendo como resultado oManual of Archival Description (MAD), tambm com diferentes verses publicadas. No Canad, ao longo da dcada de1980 foram feitos esforos de normalizao por parte da Association of Canadian

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    Archivist e da Association des Archivistes du Qubec, congregados em 1986 noBureauCanadien des Archivistes. Dos trabalhos deste grupo, e de um comit especfico criado aseguir, surgiram as Rules for Archival Description, cuja publicao se iniciou em 1990. O

    modelo seguido foi o da segunda edio das Anglo-American Cataloguing Rules (AACR2), porm com uma elaborao assentada numa cuidadosa anlise dos princpiosque norteiam a prtica arquivstica.

    As trs experincias citadas foram os documentos base de trabalho de umacomisso criada no International Council of Archives (ICA) em 1990, incumbida depreparar uma norma internacional de descrio arquivstica que veio a ser

    denominada General International Standard Archival Description -ISAD (G), aprovadano XII Congresso Internacional de Arquivos, em 1992, em Montreal. A ISAD (G)consagrou o princpio bsico da descrio multinvel e definiu os elementos descritivosessenciais para qualquer tipo de descrio em arquivos. Alguns anos depois, a mesmacomisso se dedicou ao estudo de outra norma, para definio de critrios para a

    preparao de registros de autoridade, para serem estabelecidos pontos de acesso emconsonncia com a descrio arquivstica. Desse estudo surgiu aInternational Standard Archival Authority Record for Corporate Bodies, Persons and Families - ISAAR (CPF),publicada em 1996.

    Em anos recentes, novas pesquisas vm destacando outros aspectosrelacionados com a representao dos documentos arquivsticos, tais como apossibilidade de indexao por assunto como forma de acesso aos documentosarquivsticos (RIBEIRO, 2003) e a importncia de critrios diferentes de classificaoconforme provenincia, assunto e sigilosidade (SOUSA, 2007) e as diferentesdimenses de representao do documento de arquivo, que tem um significado prticoe tambm significado simblico (JIMERSON, 2000).

    7 PERSPECTIVAS CONTEMPORNEASA dcada de 1960 marcou o incio de uma preocupao com a questo terica

    no campo da Arquivologia. Momento importante desse debate foi a VII CITRA ocorrida

    em Madrid no ano de 1962, com o tema O conceito de arquivo e as fronteiras da

    Arquivstica. Instalava -se o debate sobre o objeto da rea e a necessidade de maiorformulao terica.

    Neste sentido, registra-se o pioneirismo de Tanodi (1961) que definiu como

    objeto do campo a arquivalia, um conjunto de documentos produzidos por

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    determinada entidade, relacionada com a vida desta e tendo relaes entre si.Ampliava-se consideravelmente a perspectiva de estudo da Arquivologia - que deixavade ser entendida como a cincia dos documentos de arquivo ou da instituio

    arquivstica.Na dcada seguinte, no mbito do Programa Geral de Informao (PGI) da

    Unesco, criado em 1976, surgiu, no ano seguinte, o Programa de Gesto dosDocumentos e dos Arquivos (RAMP), estruturado em coordenao com o ICA. Talprograma, voltado para diferentes reas da Arquivologia, assegurou a publicao deimportantes documentos, que se somaram aos trabalhos tericos que vinham sendo

    desenvolvidos.Assim, alm de perspectivas ligadas ao acesso (vistas no tpico sobre os

    usurios) e polticas de informao (vistas no tpico de perspectivas crticas), sopublicados e debatidos trabalhos pioneiros nos campos de diferentes tipos de arquivos,do impacto das tecnologias digitais na Arquivologia e, por fim, emergiu uma

    compreenso integrada de arquivos.A temtica sobre os tipos especiais de arquivos teve, de fato, certa relevncia

    nas reunies internacionais do ICA, sendo promovidos encontros sobre arquivosimpressos, de literatura e de arte, audiovisuais, bem como pesquisas, no mbito dos

    estudos RAMP, sobre avaliao de arquivos de imagens em movimento, arquivossonoros, documentos contendo informaes pessoais, entre outros (SILVA et al, 1998).Contudo, a maior inovao terica da Arquivologia surgiu no comeo dos anos

    1980. Algumas manifestaes dessa inovao podem ser observadas j na dcada de1920, na intuio sistmica de Casanova que buscou no separar o arquivoadministrativo do arquivo histrico. Mas o artigo inaugural dessa nova abordagem ode Ducharme e Rousseau, de 1980, que apresenta uma viso sistmica do fluxodocumental. Dois anos depois, Couture e Rousseau formalizam a busca, pela

    Arquivologia do grupo de Qubec, de uma sntese dosrecords management e daarchives administration, a partir de uma viso global dos arquivos, considerando agesto de documentos no campo de ao da Arquivologia, isto , abarcando astradicionalmente chamadas trs idades dos documentos numa perspectiva integrada(COUTURE et al, 1999). Tal abordagem passou a desenvolver-se de formas especficaspor autores de variados contextos, tais como Corts Alonso e Conde Villaverde naEspanha, Menne-Haritz na Alemanha, Cook na Inglaterra e Vsquez na Argentina(SILVA et al, 1998).

    Assim, como decorrncia tanto do impacto das reflexes da Arquivologia

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    integrada como das tecnologias da informao e dos tipos especiais de arquivo, oarquivo passou a ser cada vez mais caracterizado como um sistema de informao, e oobjeto de estudo da Arquivologia, como a informao arquivstica. Na sistematizao de

    Silva (2008), essa seria a terceira fase da Arquivologia, surgida aps uma primeira fasede maior ligao com a Histria e uma segunda com a Administrao. Pouco depois,surgiu a expresso ps-custodial para designar essa nova fase da Arquivologia (COOK,1997), em torno de uma perspectiva informacional para o campo. Nessa mesma linhadesenvolveu-se a perspectiva sistmica em torno da ideia de arquivo total emPortugal, congregando pesquisadores como Silva e Ribeiro (SILVA et al, 1998). Outras

    temticas contemporneas so as que relacionam os arquivos com as atividades deregistro da histria oral e o campo dos arquivos pessoais e familiares (COX, 2008).

    Estudos recentes tambm tm destacado a necessidade de se estudar osarquivos como construes sociais (THOMASSEN, 2006). Nessa mesma linha, DelgadoGmez e Cruz Mundet (2010) propem que a Arquivologia deva acabar com a

    tradicional fissura entre a lgica do arquivo e a sociedade no qual ele se insere. Para

    tanto, a Arquivologia deveria deixar de ser vista como uma cincia que documenta a

    verdade dos fatos para ser uma cincia voltada para a discusso dos documentos como

    resultado e reflexo de uma multiplicidade de tenses sociais que se produzem em

    tempo e lugar determinados isto , que v os documentos como construtosproduzidos segundo determinadas regras do discurso, determinadas condies de

    documentar.

    8 CONSIDERAES FINAISA Arquivologia um campo cientfico com tradio consolidada. Registraram-se

    avanos epistemolgicos importantes nas ltimas dcadas, na medida em que o campo

    buscou agregar as vrias contribuies advindas das diferentes perspectivas tericasdesenvolvidas. Nesse sentido, um importante fato foi a progressiva construo de umacultura de pesquisa na rea, como incremento das atividades em universidades,ampliando o escopo da rea at ento muito marcada por um vis prtico (MARQUES,2012). Tambm importante a sintonia buscada entre a rea e a realidadecontempornea marcada por novos significados e usos dos documentos e dosprocessos de sua organizao. Assim, pode-se dizer que a Arquivologia vemabandonando as ideias relativas custdia passiva dos registros arquivsticos e o seumodelo histrico-tecnicista, cada vez mais assumindo o seu papel enquanto

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    construtora e mediadora ativa na formao da memria coletiva (SILVA, W.; 2012, p.

    69). Nesta mesma linha, tambm Szlejcher (2011) argumenta sobre a importncia dacomplexidade da realidade contempornea (dinmica, multicultural, globalizada,

    inovadora e marcada pelo protagonismo das tecnologias de informao) como umelemento a exigir respostas imediatas e, portanto, a provocar mudanas no campoarquivstico.

    Assim, novos servios, aes dinmicas, modelos voltados para a interao comos usurios e os contextos socioculturais, bem como a utilizao das tecnologias digitaisso sinnimo da vitalidade da Arquivologia. No plano epistemolgico, deve-se ressaltar

    em primeiro lugar um avano na prpria concepo do objeto de estudo do campo: deuma tendncia marcadamente voltada para o concreto (o estudo dos documentos, dasinstituies arquivsticas, das normas construdas para o tratamento destesdocumentos) para uma progressiva incorporao da abstrao: as funes sociais dosarquivos, as relaes de poder que eles sustentam ou alteram, as apropriaes que os

    sujeitos fazem deles, os diferentes significados que os documentos podem assumir.Esse o ponto comum que liga as abordagens contemporneas: o entendimento dosfenmenos arquivsticos num quadro mais amplo de compreenso da resulta suaconsolidao propriamentecientfica enquanto campo de conhecimento.

    E esse desenvolvimento, como se pretendeu demonstrar aqui, tem evidenciadoque a diversidade de correntes tericas que compe o campo da Arquivologia no temsido um empecilho sua evoluo. Antes, so sintoma de sua versatilidade e de suapluralidade, sempre em busca de modelos mais complexos de compreenso darealidade arquivstica.

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