teoria dos polissistemas

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1 TEORIA DOS POLISSISTEMAS Itamar Even-Zohar Tradução: Luis Fernando Marozo 1 Carlos Rizzon 2 Yanna Karlla Cunha 3 1. Sistema e polissistema no funcionalismo moderno: o estático frente ao dinâmico. A ideia de que os fenômenos semióticos, ou seja, os modelos de comunicação humana regidos por signos (tais como a cultura, a linguagem, a literatura, a sociedade), podem ser entendidos e estudados de modo mais adequado se os consideramos como sistemas, mais que como conglomerados de elementos díspares, converteu-se em uma das ideias diretrizes do nosso tempo na maior parte das ciências humanas e sociais. Assim, a coleta positivista dos dados, tomados de boa fé desde um fundamento empirista e analisados sobre a base de sua substância material, foi substituída por uma aproximação funcional baseada na análise de relações. Considerá-los como sistemas fez com que fosse possível formular hipóteses acerca de como operam os diferentes componentes semióticos. Imediatamente, abriu-se o caminho para alcançar o que através de todo o desenvolvimento da ciência moderna considerou-se objetivo supremo: a observação de leis que regem a diversidade e a complexidade dos fenômenos, mais que o registro e a classificação desses. Uma vez que as aproximações pré-funcionalistas não tentavam detectar tais leis, o que anteriormente se tomava por fenômenos (isto é, objetos de observação/estudo) na realidade coincidia com os fenômenos que podiam formular hipóteses a partir de uma aproximação funcional. Assim sendo, a ideia de sistema tornou possível não só explicar adequadamente fenômenos “conhecidos”, mas, também, desconhecidos. O funcionalismo alterou profundamente tanto as estruturas como os métodos, as perguntas e as respostas de todas as disciplinas em que foi introduzido. Contudo, apesar das premissas comuns, o enfoque funcionalista nunca se unificou de todo. Grosso modo, circularam dos programas diferentes e incompatíveis. Infelizmente, nem sempre se tem compreendido este feito, o que causa prejuízo ao desenvolvimento de diferentes disciplinas 1 Professor Adjunto de Literatura na Universidade Federal do Pampa/Campus Jaguarão 2 Professor Adjunto de Literatura e Língua Espanhol na Universidade Federal do Pampa/Campus Jaguarão 3 Mestranda em História da Literatura na Universidade Federal de Rio Grande.

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Estudos Literarios

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    TEORIA DOS POLISSISTEMAS

    Itamar Even-Zohar

    Traduo: Luis Fernando Marozo1

    Carlos Rizzon2

    Yanna Karlla Cunha3

    1. Sistema e polissistema no funcionalismo moderno: o esttico frente ao dinmico.

    A ideia de que os fenmenos semiticos, ou seja, os modelos de comunicao humana regidos por

    signos (tais como a cultura, a linguagem, a literatura, a sociedade), podem ser entendidos e

    estudados de modo mais adequado se os consideramos como sistemas, mais que como

    conglomerados de elementos dspares, converteu-se em uma das ideias diretrizes do nosso tempo na

    maior parte das cincias humanas e sociais.

    Assim, a coleta positivista dos dados, tomados de boa f desde um fundamento empirista e

    analisados sobre a base de sua substncia material, foi substituda por uma aproximao funcional

    baseada na anlise de relaes. Consider-los como sistemas fez com que fosse possvel formular

    hipteses acerca de como operam os diferentes componentes semiticos. Imediatamente, abriu-se o

    caminho para alcanar o que atravs de todo o desenvolvimento da cincia moderna considerou-se

    objetivo supremo: a observao de leis que regem a diversidade e a complexidade dos fenmenos,

    mais que o registro e a classificao desses. Uma vez que as aproximaes pr-funcionalistas no

    tentavam detectar tais leis, o que anteriormente se tomava por fenmenos (isto , objetos de

    observao/estudo) na realidade coincidia com os fenmenos que podiam formular hipteses a

    partir de uma aproximao funcional. Assim sendo, a ideia de sistema tornou possvel no s

    explicar adequadamente fenmenos conhecidos, mas, tambm, desconhecidos. O funcionalismo

    alterou profundamente tanto as estruturas como os mtodos, as perguntas e as respostas de todas as

    disciplinas em que foi introduzido.

    Contudo, apesar das premissas comuns, o enfoque funcionalista nunca se unificou de todo. Grosso

    modo, circularam dos programas diferentes e incompatveis. Infelizmente, nem sempre se tem

    compreendido este feito, o que causa prejuzo ao desenvolvimento de diferentes disciplinas

    1 Professor Adjunto de Literatura na Universidade Federal do Pampa/Campus Jaguaro

    2 Professor Adjunto de Literatura e Lngua Espanhol na Universidade Federal do Pampa/Campus Jaguaro 3 Mestranda em Histria da Literatura na Universidade Federal de Rio Grande.

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    semiticas. A incapacidade de distinguir entre ambos os programas no s deu uma ideia

    equivocada de seus respectivos contedos, mas tambm tornou difcil apreciar com que propsito

    cada um deles foi concebido. lamentvel que, enquanto em algumas partes da tradio semitica

    isso considerado um tpico bvio, existam na ordem do dia apresentaes incorretas da situao.

    Referir-me-ei a ambos os programas como teoria de sistemas estticos e teoria de sistemas

    dinmicos, respectivamente. A teoria de sistemas estticos tem sido erroneamente considerada o

    nico enfoque funcional ou estrutural, e mencionada habitualmente como a doutrina de

    Saussure. Nos escritos de Saussure e em obras posteriores na sua tradio, o sistema concebido

    como uma rede esttica (sincrnica) de relaes na qual o valor de cada elemento uma funo

    das relaes especfica em que toma parte. No entanto, detecta-se desse modo que a funo dos

    elementos, assim como as leis que os regem, apenas existe para explicar mudanas ou variaes. O

    fator da sucesso temporal (a diacronia) , assim, eliminado do sistema, e estabelece-se a regra

    que fica fora do alcance das hipteses funcionais. Ela declarada, portanto, extra-sistmica, e, uma

    vez que identificada exclusivamente com o aspecto histrico dos sistemas, praticamente eliminada

    do mbito da lingustica.

    As vantagens de introduzir o conceito de sistema para substituir a coleo de dados realizados

    mecanicamente so evidentes. At mesmo a reduo do sistema a um aspecto a-histrico e extra-

    temporal, por assim dizer, no indefensvel per se. O cenrio lingustico da poca de Saussure,

    com sua intensa concentrao sobre na mudana histrica, concebida em termos no sistmicos (em

    termos brandos), constitua claramente um obstculo para descobrir no como a linguagem difere

    em perodos diferentes, mas, em primeiro lugar, como opera. Mediante procedimentos redutores era

    possvel alcanar um nvel de abstrao suficiente, e os principais mecanismos de funcionamento da

    linguagem se manifestavam. Obviamente, a partir do ponto de vista de um modelo abstrato, a

    coexistncia possvel de opes diferentes dentro de um mesmo sistema em um dado momento no

    tem que ser necessariamente levada em conta, se, a princpio, tais opes so reduzveis. Como se

    sabe por outros campos de pesquisa (a termodinmica, por exemplo), mais efetivo, a partir de um

    ponto de vista metodolgico lgico, comear desenvolvendo uma teoria de sistemas fechados.

    O enfoque esttico, entendido desse modo, realiza efetivamente seu objetivo. No obstante, tomado

    pelo que no ; ou seja, como modelo que visa a explicar mais de perto as condies em que um

    sistema funciona no tempo, pode perturbar a pesquisa cientfica. Existe uma clara diferena entre

    tentar dar conta de alguns princpios gerais que regem um sistema fora do tempo e procurar dar

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    conta do funcionamento de um sistema tanto no princpio como no tempo. Uma vez admitido o

    aspecto histrico dentro de um enfoque funcional, devem ser realizadas vrias inferncias. Em

    primeiro lugar, deve admitir-se que tanto a sincronia como a diacronia so histricas, enquanto que

    a identificao exclusiva dessa ltima com a histria insustentvel. Consequentemente, a sincronia

    no pode nem deve se identificar com a esttica, considerando que, em um dado momento,

    funcionam no eixo mais de um complexo diacrnico. Portanto, por um lado, um sistema sincrnico

    compe-se de sincronia e diacronia; por outro, cada uma delas separadas tambm , obviamente,

    um sistema. Em segundo lugar, se as ideias de estruturao e sistematicidade j no necessitam ser

    identificadas com a homogeneidade, um sistema semitico pode ser concebido como uma estrutura

    heterognea e aberta. Raramente , portanto, um monossistema, mas que se trata necessariamente

    de um polissistema: um sistema mltiplo, um sistema de vrios sistemas com intersees e

    sobreposies mtuas, que usa diferentes opes concorrentes, mas que funciona como um todo

    estruturado, cujos membros so interdependentes.

    Se o enfoque esttico e sincronstico surge da escola de Genebra, as razes do enfoque dinmico

    encontram-se nos trabalhos dos Formalistas Russos e dos Estruturalistas Checos. Lamentavelmente,

    a noo do sistema dinmico foi amplamente ignorada tanto em lingustica como na teoria da

    literatura. O enfoque sincronstico - interpretado de modo errneo triunfou. Tanto para o leigo

    como para o profissional, o estruturalismo se identifica ainda com esttico e sincronstico,

    estrutura homognea e enfoque ahistrico, na maior parte dos casos.

    Sincronstico resulta mais apropriado que sincrnico uma vez que aceitamos que sincrnico

    no se identifica necessariamente com esttico.

    2. O polissistema: processos e procedimentos.

    2.1.Procedimentos gerais do polissistema

    Visto neste contexto, o termo polissistema mais que uma conveno terminolgica. Seu

    propsito tornar explcita uma concepo do sistema como algo dinmico e heterogneo, oposta

    ao enfoque sincronstico.

    Desse modo, enfatiza a multiplicidade de intersees e, a partir disso, a maior complexidade na

    estruturao que isso implica. Salienta ainda que, para que um sistema funcione, no necessrio

    postular sua uniformidade. Uma vez reconhecida a natureza histrica de um sistema (um grande

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    mrito na hora de construir modelos mais prximos ao mundo real), impede-se a transformao

    dos objetos histricos em seres de acontecimentos ahistrico sem coeso entre si.

    No obstante, nunca demais enfatiza, no momento de estabelecer que no existe propriedade

    alguma relacionvel com o polissistema que no possa, como tal, relacionar-se com o sistema.

    Se estivermos dispostos a entender por sistema tanto a ideia de um conjunto-de-relaes fechado,

    no qual os membros recebem seu valor de suas respectivas oposies, como a ideia de uma

    estrutura aberta que consiste em vrias redes-de-relaes desse tipo que concorrem, ento o termo

    sistema apropriado e completamente suficiente. O problema que os termos estabelecidos

    tendem a reter noes antigas. necessrio, assim, dar novos termos para ressaltar os conceitos

    que realizam, inclusive se, a princpio, os termos antigos seriam suficientes.

    H que se admitir que o nvel de anlise exaustivo pode ser mais limitado, na medida em que mais

    difcil manejar um sistema aberto que um fechado. Talvez eles deixem maior lugar a desordens, e

    a noo de sistmico j no se identificar erroneamente com a de sistemtico. Estas so

    certamente desvantagens a partir do ponto de vista da teoria de sistemas estticos. Contudo, a partir

    da perspectiva da teoria dos sistemas dinmicos no o so de alguma forma. O sincronismo pode,

    sem dvida, dar conta da ideia geral de funo e funcionamento, mas no do funcionamento da

    linguagem, ou de qualquer outro sistema semitico, em um territrio especfico no tempo. Sempre

    pode-se reduzir a heterogeneidade da cultura na sociedade s classes dominantes somente, mas isso

    no se sustenta uma vez que o fator tempo, isto , a possibilidade de mudana e seus mecanismos

    orientadores, levado em conta. A profunda heterogeneidade da cultura talvez mais palpvel,

    por assim dizer, em casos tais como quando determinada sociedade bilngue ou plurilngue

    (situao que at h pouco foi comum na maioria das comunidades europeias). No mbito da

    literatura, por exemplo, isso se manifesta em uma situao em que uma comunidade possui dois (ou

    mais) sistemas literrios, como se tratasse de duas literaturas. Para os estudiosos de literatura,

    legitima-se somente uma delas, ignorando a outra, ao enfrentar tais casos, naturalmente mais

    conveniente do que se ocupar de ambas. Na realidade, esta uma prtica comum nos estudos

    literrios; nunca demais enfatizar sobre a insuficincia dos resultados.

    A hiptese do polissistema, no entanto, est concebida precisamente para dar conta de tais casos,

    assim como os menos destacados. No s torna possvel, desse modo, integrar pesquisa semitica

    objetos (propriedades, fenmenos) at aqui impensados ou simplesmente deixados de lado, mas,

    mais precisamente, tal integrao possibilita agora uma pre-condio, um sine qua non para uma

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    adequada compreenso de qualquer campo semitico. Isso quer dizer que no se pode dar conta da

    lngua standard sem coloc-la no contexto das variedades no-stander; a literatura para crianas no

    ser considerada um fenmeno sui generis, mas sim relacionado com a literatura para adultos;

    literatura traduzida no se desconectar da literatura original; a produo de literatura de massa

    (suspenses, novelas sentimentais, etc.) no ser rejeitada simplesmente como no-literatura para

    evitar reconhecer sua dependncia mtua com a literatura individual.

    Aprofundando, pode parecer trivial dizer que a hiptese do polissistema implica uma rejeio dos

    juzos de valor como critrios para uma seleo a priori dos objetos de estudo. Isso deve ser

    enfatizado particularmente no caso dos estudos literrios, nos quais ainda existe confuso entre

    pesquisa e crtica. Aceitando a hiptese do polissistema, necessrio aceitar tambm que o estudo

    histrico de polissistemas histricos no pode circunscrever-se s chamadas obras-primas, apesar

    de alguns as considerarem a nica maneira de se iniciar os estudos literrios. Este tipo de elitismo

    no compatvel com uma historiografia literria, do mesmo modo que a histria geral no pode

    mais apenas ser a narrao das vidas de reis e generais. Em outras palavras, enquanto estudiosos

    dedicados a descobrir os mecanismos da literatura, no temos a possibilidade de ignorar que

    qualquer juzo de valor predominante em um dado perodo faz parte integral desses mecanismos.

    Nenhum campo de estudo, seja cientfico em sentido lato ou em sentido mais rigoroso, pode

    selecionar seus objetos segundo regras de gosto.

    Excluir a seleo de objetos de estudo segundo o gosto no implica que setor algum das cincias do

    homem exclua valores particulares ou a valorizao, em geral, como fatores ativos dos quais d

    conta. No possvel compreender o comportamento de nenhum sistema humano sem estudar tais

    normas de valorizao. Neste ponto, pois, gostaria de fazer uma advertncia contra uma

    interpretao errnea de meu argumento; aqui no se defende um programa objetivista no sentido

    ingnuo desta palavra. Como ficar claro a seguir, no corao mesmo de qualquer teoria da

    estratificao funcional se encontra o estudo das normas culturais.

    2.2.Estratificao dinmica e produtos sistmicos

    A heterogeneidade pode reconciliar-se com a funcionalidade se assumimos que as unidades

    (elementos ou funes) que aparentemente so irreconciliveis, mais do que se correlacionam umas

    com as outras enquanto unidades (elementos ou funes) individuais, constituem sistemas de

    opes concorrentes parcialmente alternativos. Esses sistemas no so iguais, uma vez que esto

    hierarquizados no seio do polissistema. O que constitui o estado sincrnico (dinmico) do sistema

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    como sugeriu Tynianov- a luta permanente entre vrios estratos. O que constitui a mudana no

    eixo diacrnico a vitria de um estrato sobre outro. Neste movimento opostamente centrfugo e

    centrpeto, os fenmenos so arrastados do centro periferia, enquanto, no sentido contrrio, certos

    fenmenos podem abrir passo para o centro e ocup-lo. Um polissistema, no entanto, no se deve

    pensar em termos de um centro apenas e somente uma periferia, posto que teoricamente se supem

    vrias dessas posies. Pode ter lugar um movimento, por exemplo, no qual certa unidade

    (elemento, funo) transfira-se da periferia de um sistema periferia do sistema adjacente dentro do

    mesmo polissistema, e nesse caso poder logo continuar movendo-se, ou no, at o centro do

    segundo.

    Tradicionalmente, somos com frequncia confrontados com os resultados de tais transformaes ou

    sem nos dar conta de que tenham ocorrido, ou ignorando sua origem. Como na prtica o

    (uni)sistema foi identificado exclusivamente com o estrato central, isso , com a cultura oficial tal

    como se manifesta, inter alia, na lngua standard, a literatura canonizada ou as pautas de conduta

    das classes dominantes, as periferias foram concebidas, no melhor dos casos, como categoricamente

    extra-sistmicas, ponto de vista que coincide, logicamente, com o ponto de vista interno das

    pessoas na cultura (cf. Lotman et al., 1975; Voegelin 1960). Esta atitude conduziu a certo nmero

    de resultados. Em primeiro lugar, no havia conscincia das tenses entre estratos em um sistema,

    e, portanto, o valor (funo, significado) de uma pluralidade de unidades passava despercebido;

    estas unidades estavam em clara oposio com outras unidades concorrentes, cuja existncia e

    natureza se ignoravam. Em segundo lugar, como j se afirmou, no se podia dar conta do processo

    de mudana, e as mudanas tinham que ser explicadas em termos de invenes individuais a partir

    de mentes imaginativas ou influncias de outra fonte, normalmente no nvel individual e,

    frequentemente, isolado (outro escritor, uma obra especfica, etc.). Em terceiro lugar, as mudanas

    manifestadas materialmente (no caso de distintas do processo de mudana) no podiam integrar-se,

    posto que sua natureza estava oculta aos olhos do observador. Consideramos, por exemplo, a

    reduo da criatividade do artista a vagas noes, tais como imaginao e inspirao. Ao

    empreg-la, supe-se renunciar possibilidade de desemaranhar o intrincado complexo que

    constitui as condies nas quais um escritor trabalha, parte do qual consiste em certas construes

    pertinentes, enquanto que parte funo da capacidade pessoal do escritor para criar novas

    condies impostas no sobre ele, mas sim por ele mesmo.

    As causas iniciais pelas quais uma transferncia tem lugar, as razes de transferncias especficas e

    como se realizam (levadas a cabo), so questes das quais a teoria dos polissistemas vem ocupando-

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    se de modo crescente, em proporo direta com o aumento do nmero de casos em que vem sendo

    colocada a prova nos ltimos anos.

    Uma coisa ficou clara: as relaes existentes dentro do polissistema no s do conta de processos

    do polissistema, como tambm de procedimentos no nvel do repertrio. Isso quer dizer que as

    constries do polissistema resultam relevantes em relao aos procedimentos de seleo,

    manipulao, amplificao, eliminao, etc, que tem lugar nos produtos de feitos (verbais e no-

    verbais) pertencentes ao polissistema. Assim, aqueles que se interessam no pelos processos que

    tm lugar em seu campo especfico, como a lngua e a literatura, mas pela constituio de feitos

    dos produtos (por exemplo, emisses lingusticas, textos literrios), no podem ignorar o estado do

    polissistema particular com que se defrontam. Naturalmente, quando se tratavam unicamente de

    produtos oficiais (emisses da lngua standard, obras-primas da literatura), o trabalho das

    constries do polissistema no podia ser frequentemente detectado. Como os pesquisadores no

    conseguiam visualizar a conexo entre, por um lado, a posio de textos e modelos (propriedades,

    caractersticas) no todo estruturado (ao qual pertencem) e, por outro lado, as decises tomadas na

    sua produo, o nico refgio possvel ficou nas explicaes locais (por exemplo, no estudo da

    traduo, erros, interpretaes equivocadas, m imitao, etc.). (Para uma discusso mais

    detalhada da literatura traduzida vide A posio da literatura traduzida no polissistema literrio.)

    2.2.1. Estratos canonizados frente a estratos no-canonizados

    Parece ter sido Shklovskij quem conceitualizou pela primeira vez as distines socioculturais na

    produo de textos em termos de estratificao literria. Segundo ele (1921, 1923), na literatura,

    certas propriedades so canonizadas enquanto que outras permanecem no-canonizadas. A partir

    desse ponto de vista, por canonizadas entendemos aquelas normas e obras literrias (isso , tanto

    modelos como textos) que nos crculos dominantes de uma cultura so aceitas como legtimas e

    cujos produtos mais marcantes so preservados pela comunidade para que formem parte de sua

    herana histrica. No-canonizadas quer dizer, pelo contrrio, aquelas normas e textos que esses

    crculos rejeitam como ilegtimas e cujos produtos, em longo prazo, a comunidade esquece

    frequentemente (a no ser que seu status mude). A canonicidade no , portanto, uma caracterstica

    inerente s atividades textuais a nvel algum: no um eufemismo para boa literatura frente m

    literatura. O fato de que em certos perodos certas caractersticas tendam a agrupar-se em torno a

    este ou aquele status no implica que tais caractersticas sejam essencialmente pertinentes a um

    status determinado. Obviamente, as prprias pessoas-na-cultura podem em um ou outro perodo

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    conceber em tais termos estas distines, mas ao historiador est permitido us-las somente como

    prova do conjunto de normas de um perodo.

    Nesta como em outras questes, a prtica terminolgica de Shklovskij apenas sistemtica. Em

    Rozanov e outras publicaes oscila entre literatura (ou linha) no-canonizada, por um lado, e

    subalterna, por outro (Mladshaja literatura [linija]). Alis, ainda que para assuntos profanos,

    canonizados (knonizirovannyj) parece ser a palavra mais natural em russo, no lugar de

    cannico (kanonicheskij), a distino se torna menos clara em algumas outras lnguas,

    particularmente no ingls. Enquanto que cannico pode sugerir (e assim ocorre nos escritos de

    muitos crticos de fala inglesa ou francesa) a ideia de que certas caractersticas so intrinsecamente

    cannicas (em Francs canonique), canonizado (em Francs canonis) sublinha claramente

    que tal estado resultado de um ato (atividade) exercido sobre um certo material, no uma

    caracterstica da natureza primordial desse material em si. Por isso que recomendo ater-se

    prtica de Shklovskij tambm em outras lnguas europeias.

    As tenses entre cultura canonizada e no-canonizada so universais. Esto presentes em toda

    cultura humana, simplesmente porque no existe uma sociedade humana no estratificada, nem

    sequer utopicamente. No h no mundo uma s lngua no estratificada, apesar de a ideologia

    dominante que rege as normas do sistema no admita uma considerao explcita de nenhum outro

    estrato mais que os canonizados. O mesmo vale para a estrutura da sociedade e tudo o que este

    complexo fenmeno implica.

    A ideologia de uma cultura oficial como a nica aceitvel em uma dada sociedade tem como

    consequncia uma massiva compulso cultural que afeta a naes inteiras mediante um sistema

    educativo centralizado e que torna impossvel, inclusive a estudiosos da cultura, observar e valorar

    o papel das tenses dinmicas que operam no seio da cultura para sua efetiva manuteno. Como

    um sistema natural que necessita, por exemplo, de regulamentao trmica, os sistemas culturais

    necessitam tambm de um equilbrio regulador para no entrar em colapso ou desaparecer. Este

    equilbrio regulador se manifesta em oposies de estratos. Os repertrios canonizados de um

    sistema qualquer se tornariam estanques muito provavelmente passado certo tempo, se no fosse

    pela competncia dos rivais no-canonizados que ameaam frequentemente substitu-los. Pela

    presso que sofrem, os repertrios canonizados no podem permanecer inalterados. Isso garante a

    evoluo do sistema, que o nico modo de conserv-lo. Em contrapartida, quando no se d sada

    presso, frequentemente somos testemunhas ou do abandono gradual de um sistema e do

    deslocamento at outro (por exemplo, o latim substitudo por suas diferentes variedades

  • 9

    vernculas romnticas), ou de seu total colapso por meio de uma revoluo (deposio de um

    regime ou desaparecimento total de modelos conservados at o momento, etc.).

    Parece que quando no existe sub-cultura (literatura popular, arte popular, cultura inferior em

    qualquer sentido, etc.), ou quando no se permite exercer presso real sobre a cultura canonizada,

    h poucas oportunidades para que exista uma cultura canonizada dotada de viabilidade. Sem o

    estmulo de uma forte sub-cultura, qualquer atividade canonizada tende a fossilizar gradualmente.

    Os primeiros passos em direo fossilizao se manifestam em um alto grau de fechamento uma

    crescente esteriotipao dos diversos repertrios. Para o sistema, a fossilizao um transtorno

    operacional: a longo prazo, impede fazer frente s cambiantes necessidades da sociedade na qual

    funciona. Caso se conceba esta incapacidade em termos de incapacidade cultural - conceito

    superficialmente explicado at o momento-, h varias manifestaes possveis dela. No caso da

    literatura, um dos principais organizadores da cultura humana, isso no significa necessariamente

    que a desintegrao imediata se torne iminente. A literatura como instituio sociocultural pode

    continuar existindo para sempre, mas seu grau de adequao pode muito bem ser julgado segundo

    sua posio na cultura. (Por exemplo, ser empurrada periferia no seio de uma cultura pode ser

    claro indcio de tal inadequao.).

    Geralmente, o centro do polissistema inteiro idntico ao repertrio canonizado mais prestigiado.

    Assim, o grupo que rege o polissistema, o que em ltima instncia determina a canonicidade de

    certo repertrio. Uma vez decidida a canonicidade, esse grupo ou adere s propriedades

    canonizadas por ele (o que, por conseguinte, d a ele o controle do polissistema), ou, se

    necessrio, modifica o repertrio de propriedades canonizadas com o fim de manter o controle. Em

    contrapartida, se fracassam no primeiro ou no segundo procedimento, tanto o grupo como seu

    repertrio canonizado so empurrados margem por outro grupo, que se encaminha em direo ao

    centro, canonizando um repertrio diferente. Os que ainda buscam aderir ao repertrio canonizado

    deslocado somente em vrias ocasies podem obter o controle do centro do polissistema;

    normalmente, se encontram na periferia do canonizado, denominados pejorativamente (pelos

    portadores da cultura oficial) epgonos. Apesar disso, como os polissistemas podem fechar-se,

    possvel que os epgonos possam perpetuar um repertrio estabelecido durante muito tempo, de

    modo que finalmente se identificam - do ponto de vista da estratificao- com o grupo original que

    deu incio ao estado de coisas.

    2.2.2. Sistema frente a repertrio frente a textos

  • 10

    No (poli)ssistema, a canonicidade se manifesta com maior concretude no repertrio. Enquanto que

    o repertrio pode estar canonizado ou no, o sistema ao qual pertence um repertrio pode ser central

    ou perifrico. Naturalmente, quando um sistema central sede de repertrios canonizados, pode-se

    falar abreviadamente de sistemas canonizados frente a sistemas no-canonizados, apesar da

    impreciso que isso introduz na nossa terminologia. O repertrio se concebe aqui como um

    conjunto de leis e elementos (sejam os modelos isolados, ligados ou totais) que regem a produo

    de textos. Enquanto algumas destas leis e destes elementos parece ser universalmente vlidos desde

    as primeiras literaturas do mundo, claro que grande quantidade de leis e de elementos esto

    sujeitos a condies de mudanas em diferente perodos e culturas. Este setor local e temporal do

    repertrio a fonte das lutas no sistema literrio (ou em qualquer outro sistema semitico). Mas no

    existe nada no repertrio em si mesmo capaz de determinar qual seo dele pode ser (ou tornar-se)

    canonizada ou no, do mesmo modo que as distines entre standard, elevado, vulgar ou

    gria na lngua no esto determinadas pelo repertrio lingustico em si mesmo, mas pelo sistema

    lingustico, isto , o conjunto de fatores que operam na sociedade implicados na produo e

    consumo de enunciados lingusticos. Assim, so estas relaes sistmicas que determinam o status

    de certas unidades (propriedades, traos) em uma dada lngua. A seleo de certo conjunto de traos

    para o consumo de certo grupo de status , portanto, externa ao conjunto mesmo. De modo

    semelhante, o status de qualquer repertrio literrio est determinado pelas relaes que existem no

    (poli)ssistema. Obviamente, um repertrio canonizado apoiado por elites conservadoras ou

    inovadoras e, consequentemente, est limitado pelas pautas culturais que regem o comportamento

    daquelas. Se a elite reclama sofisticao e excentricidade (ou o contrrio, isto , simplicidade e

    conformismo) para satisfazer seu gosto e controlar o centro do sistema cultural, o repertrio

    canonizado se aderir a estes traos to firmemente quanto possvel.

    Neste enfoque, a literatura no pode ser concebida nem como um conjunto de textos, uma juno

    de textos (o que parece um enfoque mais avanado), nem como um repertrio. Os textos e os

    repertrios so apenas manifestaes parciais da literatura, manifestaes cujo comportamento no

    pode ser explicado por sua prpria estrutura. Seu comportamento explicvel no nvel do

    (poli)ssistema literrio.

    Sem dvida, os textos so os produtos mais obviamente visveis do sistema literrio, ao menos em

    muitos perodos de sua histria.

    Evidentemente, para um indivduo qualquer, o que importa o produto final de qualquer atividade:

    para o consumidor individual o nico objeto de interesse so, normalmente, os produtos industriais,

  • 11

    antes do que os fatores que regem a indstria que produz os produtos. evidente, contudo, que para

    qualquer um que se interesse por entender a indstria como uma atividade complexa, esta no pode

    ser analisada exaustivamente por meio de seus produtos, ainda que os produtos possam parecer a

    razo de ser de suas operaes. No sistema literrio, os textos, mais que desempenhar um papel nos

    processos de canonizao, so o resultado desses processos. Somente em funo de representantes

    de modelos que os textos so fator ativo nas relaes sistmicas.

    difcil eliminar imagens respeitadas ao longo do tempo, e parece natural, portanto, que produzir

    e consumir textos tenha sido sempre a atividade mais importante na literatura. Em certos

    perodos, no obstante, o texto era mais marginal em relao a outras atividades no sistema literrio,

    tais como o escritor ou algum acontecimento total sob a forma de atuaes diversas. Gostaria de

    sugerir que, na maior parte dos casos, a defesa de textos (e modelos) antigos, no necessariamente

    indcio de um interesse excessivo neles, mas sim indcio de parcial indiferena em relao a eles.

    Quando foram perpetuados durante tempo suficiente, os textos se tornam gradualmente fatores

    marginais na literatura. (obviamente, podem ser citados e inclusive reverenciados partes dos

    textos, tais como versos, estrofes, ou expresses selecionadas, mas na maior parte dos casos ficam

    separadas de seus [con]textos originais).

    2.2.3. Canonicidade esttica frente canonicidade dinmica

    Parece necessrio, portanto, distinguir claramente entre dois usos diferentes do termo

    canonicidade: um referente no nvel dos textos; outro, no nvel dos modelos. Pois uma coisa

    introduzir um texto no cnone literrio, e outra introduzi-lo por meio de um modelo em um

    repertrio. No primeiro caso, que pode ser denominado canonicidade esttica, um texto aceito

    como produto concludo e inserido em um conjunto de textos santificados que a literatura (cultura)

    deseja conservar. No segundo caso, que pode ser denominado canonicidade dinmica, certo modelo

    literrio logra se estabelecer como princpio produtivo no sistema por meio do repertrio desse.

    Nesta ltima classe de canonizao a que efetivamente gera o cnone, que desse modo se contempla

    como o grupo de superviventes das lutas de canonizao, provavelmente os mais bvios produtos

    de certos modelos estabelecidos com xito. Naturalmente, qualquer texto cannico pode ser

    reciclado em um dado momento e introduzido no repertrio para se converter de novo em um

    modelo canonizado. Mas uma vez reciclado, j no desempenha seu papel na qualidade de produto

    terminado, mas sim enquanto potencial conjunto de instrues, isto , enquanto modelo. O fato de

    que tenha sido em algum momento canonizado e de que se tenha tornado cannico, isto ,

  • 12

    santificado, pode ou no resultar-lo vantajoso em relao a produtos no cannicos que, pelo

    momento, carecem absolutamente de posio.

    Sustenta-se que um sistema funciona melhor com um cnone do que sem ele. Parece que um cnone

    esttico condio primria para que um sistema seja reconhecido como atividade distinta na

    cultura.

    Tambm obvio que, em um nvel superficial, os produtores de textos (escritores) lutam para que

    seus textos sejam reconhecidos e aceitos como tais. Contudo, para estes mesmos escritores, o que

    realmente importa que seus textos sejam considerados manifestaes, realizaes exitosas, de um

    certo modelo a ser seguido. Seria uma terrvel decepo para os escritores que seus textos fossem

    aceitos, mas fossem negados seus modelos literrios. A partir desse ponto de vista, isso significaria

    o fim de sua produtividade no seio da literatura, indicao de sua falta de influncia e efetividade.

    Ser reconhecido como grande escritor, mas rejeitado como modelo para a literatura viva, uma

    situao a que nenhum escritor que participe no jogo pode resignar-se indiferentemente. Os

    escritores com mais aguda conscincia de sua posio e com uma mais vigorosa e flexvel

    capacidade de manobra sempre trataram de modificar tal situao em caso de nela se encontrarem.

    Boris Ejxenbaum mostrou (1927b, 1929, 1928/31) como Tolstoi reagiu contra a rejeio dos seus

    modelos literrios (enquanto seus textos e sua posio pessoal no cnone literrio j estavam

    assegurados) introduzindo modelos literrios completamente diferentes vrias vezes durante sua

    vida. Um caso muito parecido o da carreira literria de August Strindberg, que em vrias ocasies

    conseguiu permanecer no centro do repertrio produtivo canonizado, mudando de um grupo de

    modelos a outro. Outros escritores, talvez a grande maioria deles, normalmente aderem a um s

    grupo de modelos ao longo de sua carreira literria. Embora possam produzir, de acordo com os

    mesmos modelos (anteriores), textos mais satisfatrios que antes, possvel que percam sua posio

    contempornea (no necessariamente seu pblico, que desse modo se desloca como eles do centro

    para a periferia do sistema literrio). Isso prova evidente de que os escritores adquirem posies

    no sistema literrio no por meio de seus textos enquanto tais. Um novo ocupante dominante do

    centro talvez no os negue sua posio no cnone esttico, mas, ao mesmo tempo, pode rejeit-los

    como modelos aceitveis para confeccionar novos textos. Outras vezes, no entanto, esta rejeio -

    ao menos em suas fases iniciais- implica tambm a rejeio do cnone desses escritores

    destronados, isto , de seus textos.

  • 13

    Esta uma hiptese vigente em muitos estudos culturais. Para algumas discusses recentes vide

    Segal (1982) e Sheffy (1985; 1990), nos quais este tema recebe um tratamento extremamente

    original e interessante.

    2.2.4. Tipos primrios frente a tipos secundrios.

    Como foi dito (2.2), as transferncias esto tambm ligadas necessariamente a procedimentos

    especficos impostos a propriedades implicadas nelas. As transferncias, em outras palavras, esto

    correlacionadas com a transformao. Estes procedimentos, de vrias classes, podem ser definidos,

    s vezes, como pr-condies das transferncias, enquanto que em outros casos so claramente

    resultado destas. Ser um ou outro depende do estado especfico do polissistema e de nossa

    capacidade para descobrir certas regras gerais em relao correlao entre transferncia e

    transformao. No est muito claro, inicialmente, que h dois princpios distintos implicados, j

    que esses procedimentos esto intimamente ligados ao processo que se discute, e j que, ao longo de

    certos perodos da histria da linguagem ou da literatura, os procedimentos tendem a operar de

    modo quase permanente no seio de certos estratos. Parecem ser, de algum modo, mais claramente

    intercambiveis. Temo que esta fosse a descrio do assunto em anteriores obras minhas, mas estas

    foram j corrigidas explicitamente no meu ensaio The polysystem Hypothesis Revisited (Even-

    Zohar, 1978a, 28-35). Como princpio que rege os procedimentos implicados em uma transferncia

    (e na estratificao do polissistema em geral), propus (1990 [1978]b) a oposio entre tipos

    primrios e secundrios. Mas, uma vez que no corpus literrio que eu tinha analisado

    efetivamente os tipos primrios tendiam a aparecer exclusivamente no repertrio canonizado (e os

    secundrios no no-canonizado), comecei a usar o termo sistema primrio para uma prtica

    adequada, pois eliminava o problema e, ainda, incorreta se levamos em considerao perodos

    distintos dos que eu ento discuti (cf. Yahalom, 1978, 1980; Drory 1988).

    A oposio primria frente secundria a de inovao frente ao conservadorismo no repertrio.

    Quando se estabelece um repertrio e todos seus modelos derivados se constroem de completo

    acordo com o que permite, nos depararmos com um repertrio (e sistema) conservador. Qualquer

    produto individual (enunciado, texto) ser ento altamente previsvel, e qualquer desvio ser

    considerado escandaloso. Aos produtos de tal estado os denomino secundrios. Por outra parte, o

    aumento e reestruturao de um repertrio mediante a introduo de novos elementos, como

    resultado do qual cada produto se volte menos precedido, so expresses de um repertrio (e

    sistema) inovador. Os modelos que oferece so do tipo primrio: a pr-condio de seu

    funcionamento a descontinuidade em modelos estabelecidos (ou em elementos deles). Esta ,

  • 14

    evidentemente, uma noo puramente histrica. Um modelo primrio qualquer no tarda muito

    em se transformar em secundrio, uma vez admitido no centro do sistema canonizado, caso se

    perpetue durante suficiente tempo. A luta entre as opes primrias e secundrias to decisiva

    para a evoluo do sistema como a tenso (e luta) entre estratos altos e baixos no sistema.

    Naturalmente, a mudana ocorre quando um modelo primrio se torna dominante no repertrio e,

    consequentemente, no (poli)ssistema: sua perpetuao denota estabilizao e novo

    conservadorismo. Habitualmente, a perpetuao se rege por suas prprias regras especficas. Assim,

    at agora no foi possvel observar a perpetuao de um modelo primrio sem modificaes

    estruturais concomitantes que se podem chamar, de modo ad hoc, simplificao. Isso no

    significa que os modelos primrios sejam mais sofisticados que os secundrios, mas que no curso

    de sua perpetuao, e no seio dos modelos secundrios que finalmente emergem deles, ocorre um

    processo de reduo. Modelos heterogneos, por exemplo, se transformam em modelos

    homogneos; se reduz o nmero de pautas incompatveis (isso , tipos diferentes de ambiguidade)

    no seio da mesma estrutura; relaes complexas so substitudas gradualmente por outras que o so

    menos, e assim por diante. Naturalmente, os procedimentos inversos tm lugar quando um modelo

    secundrio sofre uma manipulao tal que finalmente se transforma em um primrio.

    Como sustentei antes, a canonicidade no se fecha necessariamente com a primariedade, ainda que

    este pode ter sido o caso nas pocas mais recentes, isto , desde a Era Romntica. importante,

    portanto, descobrir as relaes que existem entre canonicidade e inovao. Quanto mais observamos

    a literatura com ajuda dessas noes, tanto mais evidente parece que a compreendemos como um

    mecanismo semitico geral mais do que como um mecanismo exclusivamente literrio. Como

    aqueles que controlam os sistemas os governam com quais instrumentos se luta depende de sua

    eficcia relativa no controle do sistema. Assim, quando o controle somente pode ser atingido por

    meio de mudana, este se torna o principio de orientao. No ser assim, no entanto, enquanto a

    perpetuao, mais que a inovao, possa satisfazer a aqueles que poderiam perder mais com a

    mudana. Naturalmente, uma vez que se produz uma conquista, o novo repertrio no admitir

    elementos que podem verossimilmente por em perigo seu domnio do sistema. O processo de

    secundarizao do primrio resulta, assim, inevitvel. O refora, alm disso, outro mecanismo de

    secundarizao paralelo, por meio do qual um sistema consegue reprimir a inovao. Mediante tal

    processo, novos elementos so retraduzidos, por assim dizer, a termos antigos, impondo desse modo

    funes anteriores a portadores novos, antes que mudar funes. Desse modo, como no caso de um

    novo regime que prolonga as instituies do antigo ao transferir suas funes a novos corpos, de

    igual maneira um modelo literrio primrio, alterado gradualmente, se incorpora aos fazeres de

  • 15

    modelos secundrios de uma etapa prvia. A partir de um ponto de vista semitico, este um

    mecanismo por meio do qual o que se entende de modo menos imediato, o menos decifrvel, deixa

    de ser. O menos familiar e, portanto, mais intimidador, exigente, e carregado de informao, se

    torna mais familiar, menos intimidador, e assim por diante. Empiricamente, isso parece ser o que a

    grande maioria dos consumidores de cultura prefere realmente, e quando se deseja control-los, esta

    preferncia h de ser completamente satisfeita.

    2.3.Intra e inter-relaes

    Os princpios e propriedade discutidos nos pargrafos anteriores a respeito das intra-relaes do

    polissistema parecem ser vlidos tambm em relao s suas inter-relaes. Nestas inter-relaes

    esto implicadas duas classes de sistemas adjacentes: um todo maior pertencente a mesma

    comunidade, e um todo, ou suas partes, pertencente a outras comunidades, seja da mesma ordem

    (classe) ou no.

    2.3.1. Intra-relaes

    No primeiro caso, tal viso se baseia na ideia assumida de que qualquer (poli)ssistema semit ico

    (como a lngua ou a literatura) no mais que um componente de um (poli)ssistema maior o da

    cultura, ao que est subordinado e com o qual isomrfico - e est correlacionado, portanto, com

    este todo maior e seus outros componentes. A teoria dos polissistemas proporciona hipteses menos

    simplistas e reducionistas que outras diante da complicada questo de como se correlaciona a

    literatura com a lngua, a sociedade, a economia, a poltica, a ideologia, etc. J no necessrio

    assumir que os fatos sociais, por exemplo, vo encontrar uma expresso imediata, unidirecional e

    unvoca no nvel do repertrio literrio, como a sociologia primitiva Histria das Ideias,

    Marxismo (ortodoxo) includo, gostariam que acreditssemos. As intrincadas correlaes entre estes

    sistemas culturais, se os contempla como natureza isomrfica e como funes somente no seio de

    um todo cultural, podem ser observadas sobre a base de seus intercmbios mtuos, que

    frequentemente ocorrem de modo oblquo, isto , por meio de mecanismos de transmisso, e

    frequentemente atravs de periferias. Isso se demonstrou no caso de diferentes estratos que

    funcionam em boa medida na periferia, tais como a literatura traduzida. Toury (1977, 1980), Shavit

    e Shavit (1974), Shavit (1978, 1980, 1986), Yahalom (1978, 1980), Sheffy (1985), e outros,

    proporcionam abundante material e analises detalhadas desses casos.

    Mais ainda, se assumimos que o sistema literrio, por exemplo, isomorfo com o sistema social,

    suas hierarquias podero ser concebidas s na interseo com as desse ltimo. A ideia de uma

  • 16

    literatura pouco estratificada que se estratifica mais que eu propus como universal dos sistemas

    (Even-Zohar 1978: 39) pode ser entendida, pois, graas a relaes hipotticas propostas pela teoria

    dos polissistemas em relao ao polissistema literrio. A concepo da literatura como uma

    instituio sociocultural, semi-independente separada s pode ser sustentada, pois se o polissistema

    literrio, como qualquer outro sistema sociocultural, for concebido como simultaneamente

    autnomo e heternimo em relao a todos os demais cossistemas. Assim, os fatos da vida

    literria (byt; Eichembaum, 1929, especialmente 49-86 e 109-114, 1971), isto , a instituio

    literria (constituda, por exemplo, de ideologias literrias, casas editoriais, crtica, grupos literrios,

    ou qualquer outro meio para ditar pautas de gosto ou dar normas), ainda que inegavelmente se

    comportem como sistemas socioculturais semi-independentes que obedecem suas prprias leis,

    devem tambm reconhecer como fatores integrais do sistema literrio propriamente dito. De fato,

    este reconhecimento, mais vago e includo no Formalismo Russo tardio, parece ter constitudo um

    problema central, ao menos para o ltimo Ejxenbaum, que cruzou desse modo muitos limites

    inviolveis a que outros no se atreveriam nem a se aproximar. Mas inclusive em seu caso, estas

    questes esto mais implcitas, antes que expressamente refletidas/analisadas/ponderadas.

    2.3.2 Inter-relaes

    A respeito do segundo caso, isto , as correlaes que um sistema mantm com sistemas

    controlados por outras comunidades, so vlidas as mesmas hipteses. Do mesmo modo que um

    conjunto de fenmenos operando em certa comunidade pode ser concebido como um sistema que

    forma parte de um polissistema maior, o qual, por sua vez, no mais que um componente no seio

    do polissistema mais amplo da cultura de dita comunidade, assim tambm este ltimo pode ser

    concebido como componente de um megapolissistema; isto , um que controla e organiza vrias

    comunidades. Tais unidades, na histria, no esto de modo algum bem definidas ou completas para

    sempre. Pelo contrrio, pois os limites que separam sistemas adjacentes se deslocam continuamente,

    no s dentro dos sistemas, mas tambm entre eles mesmos. As prprias noes de dentro e

    entre no podem ser tomadas estaticamente ou dadas por definitivas.

    Consideramos o caso mais evidente, o das comunidades europeias e suas literaturas e culturas em

    geral. Claramente, ao longo da Idade Mdia, a Europa central e Ocidental constituiu um

    polissistema, no qual o centro estava ocupado pela literatura escrita em latim, enquanto se

    produziam concorrentemente textos nas lnguas vernculas (oralmente ou por escrito) como parte de

    atividades perifricas. Seguindo um longo processo de deteriorizao gradual, este sistema, com seu

    repertrio canonizado perpetuado, entrou em colapso finalmente a meados do sculo XVIII

  • 17

    aproximadamente, para ser substitudo por uma srie de polissistemas monolngues mais ou menos

    independentes, cujas interdependncias com os outros (poli)sistemas se fizeram cada vez mais

    irrelevantes, ao menos a partir do ponto de vista tanto dos consumidores como das ideologias

    dominantes. No obstante, parece que, para poder no s descrever os princpios gerais da

    interferncia, mas tambm explicar sua natureza e causas, necessrio formular uma hiptese de

    estratificao. Pois, quando emergiram gradualmente as distintas naes europeias e criaram suas

    prprias culturas cujos veculos mais explcitos eram suas novas literaturas, lnguas e histrias

    oficiais , certas relaes de centro e periferia estavam inevitavelmente presentes no processo

    desde seu incio. Culturas que se desenvolveram mais tarde e que pertenciam a naes que

    influenciam a outras por seu prestgio ou mediante dominao direta, foram tomadas como fontes

    para culturas mais recentes (incluindo mais recentemente culturas reconstrudas). Como resultado,

    surgia inevitavelmente uma discrepncia entre os modelos transferidos que frequentemente eram de

    tipo secundrio (pela razo evidente de que sua identificao e a extrao de seus princpios

    construtivos era mais fcil), e os originais, dado que estes ltimos poderiam muito verossimilmente

    terem sido empurrados, ento, do centro de seu prprio sistema periferia.

    Um caso muito interessante o que tais relaes parecem bastante transparentes e podem ser

    estudadas com muito detalhe, o de textos traduzidos a partir de uma literatura-objetivo mais

    recente particular literatura-fonte que funcionou, primeiro lugar, como fonte de repertrio para

    aquela.

    No surpreende que, neste caso, os textos se traduzam frequentemente de acordo com os modelos

    mais secundarizados de que se dispe a literatura-objetiva. Consequentemente, podem dar a

    impresso de ser produtos epignicos ao pblico do centro da literatura-objetiva, se esta se

    encontrar em estado de movimento dinmico. Ao mesmo tempo, no obstante, este pode ser o nico

    modo de agradar a outros setores do pblico da literatura-objetiva, se esta a nica maneira que tm

    de identificar um texto como propriamente literrio e consequentemente, aceitvel. Esse trao

    marca caracterstica de tais textos carece naturalmente de importncia funcional a respeito de seu

    papel (ou o papel dos modelos subjacentes) na sua prpria literatura. Somente quando nos

    interessamos por descobrir os processos e procedimentos mediante os quais um sistema evolui ou se

    mantm, se tornam indispensveis tais consideraes. Exemplo de tais casos podem ser encontrados

    em numerosas tradues para o Francs ou ao alemo desde vrias literaturas que desenvolveram

    seus repertrios sobre a base das literaturas francesa ou alem: por exemplo, a poesia flamenca

    decimonnica traduzida ao Francs. Outro exemplo seria o das tradues para o russo de textos

  • 18

    escritos em hebraico durante o fim do sculo XIX e comeo do sculo XX que, por sua vez, foram

    moldados segundo o repertrio russo.

    Sucintamente: para a teoria dos polissistemas, um objetivo principal, e uma possibilidade a seu

    alcance, enfrentar as particulares condies nas quais uma literatura pode interferir em outra, como

    resultado do qual certas propriedades se transferem de um polissistema a outro. Por exemplo, se se

    aceita a hiptese de que provvel que propriedades perifricas penetrem no centro uma vez que a

    capacidade do centro (isto , do repertrio do centro) para cumprir certas funes debilitou-se

    (segunda lei de Shklovskij), ento no tem sentido negar que esse mesmo princpio opera tambm a

    nvel intersistmico. De modo semelhante, por meio da estrutura polissistmica das literaturas

    envolvidas como podemos dar conta dos vrios e intricados processos de interferncia. Por

    exemplo, ao contrrio da crena comum, a interferncia tem lugar, frequentemente, por meio das

    periferias. Quando se ignora esse processo, simplesmente no h explicao para a apario e

    funcionamento de novos elementos no repertrio. Os textos semi-literrios, a literatura traduzida, a

    literatura infantil todos aqueles estratos ignorados nos estudos literrios atuais - so objetos de

    estudo indispensveis para entender adequadamente como e por que ocorrem as transferncias,

    dentro dos sistemas tanto como entre eles. (Para uma discusso mais detalhada da interferncia,

    vide. Infra Leis de interferncia literria).

    2.4.Estabilidade e instabilidade: Volume do sistema

    Para que um sistema sociocultural possa operar sem necessidade de depender de sistemas estranhos

    (isto , de sistemas paralelos de outras comunidades), deve satisfazer vrias condies. Existem

    boas razes para crer, por exemplo, que a heterogeneidade uma dessas condies. Aqui, a lei de

    proliferao parece ser universalmente vlida. Esta lei, que propus em 1975 (Even-Zohar, 1978: 43)

    em uma formulao diferente, significa simplesmente que para satisfazer suas necessidades, um

    sistema disputa efetivamente para se fazer com um inventrio crescente de opes alternativas.

    Quando um sistema dado consegue acumular reserva suficiente, h boas chances de que o

    inventrio domstico baste para se manter e perdurar, a no ser que as condies mudem

    drasticamente. Se no, a nica soluo que fica, ou, ao menos, a mais decisiva, so as transferncias

    intersistmicas, que se levam imediatamente a cabo apesar da resistncia. Naturalmente, seria muito

    desejvel, e se suporia na verdade um grande avano nas nossas teorias, saber o quo grande uma

    reserva suficiente para que o sistema funcione adequadamente. Tal conhecimento no est neste

    momento a nossa disposio, se bem que, a nvel descritivo, pode-se falar de repertrios mnimos,

    sem os quais nenhum sistema literrio poderia funcionar. Estudos do surgimento de repertrios

  • 19

    (literrios) mostraram que, desde o mesmo momento inicial, nenhuma literatura funciona com um

    repertrio pequeno; o mesmo vale para o sistema literrio enquanto complexo maior. Em outras

    palavras, os fatos parecem demonstrar razoavelmente que, uma vez que um sistema comea, a (lei

    de) proliferao se ativa.

    Isso pode dar a impresso de que resulta melhor para os interesses do sistema permanecer instvel;

    mas este no o caso. No nvel do sistema, no se devem identificar instabilidade e mudana, do

    mesmo modo que a estabilidade no deve ser identifica com a fossilizao. Em outras palavras, a

    estabilidade ou a instabilidade do repertrio no refletem, nem geram, necessariamente, estabilidade

    ou instabilidade no sistema. Um sistema incapaz de manter-se durante certo perodo de tempo e que

    se encontra, frequentemente, a ponto do de colapso instvel a partir de um ponto de vista

    funcional, enquanto que um sistema que sofre permanentemente mudanas regulares e bem

    controladas pode ser considerado com justeza estvel, simplesmente porque perdura. S os sistemas

    estveis dessa classe conseguem sobreviver, enquanto que os outros simplesmente se extinguem.

    Desse modo, as crises e catstrofes de um polissistema (isto , fatos que precisam uma

    mudana radical sejam por transferncia interna ou externa), se o sistema as controla, so indcios

    de vitalidade mais que de degenerao. O sistema entra a perigo s quando a mudana se torna

    incontrolvel e, portanto, imanejvel. Naturalmente, a partir do ponto de vista dos que ocupam

    posies no sistema, qualquer mudana que no possa ser controlada coloca a perigo suas posies,

    mas no necessariamente o sistema enquanto tal. H, certamente, casos histricos em que um

    repertrio em perigo colocou em risco o conjunto do sistema, mas na maioria das ocasies, isso

    resultado de uma longa deteno prvia que no permitiu uma dinmica normal.

  • 20

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