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Revista Jurídica UNIGRAN. Dourados, MS | v. 2 | n. 4 | jul./dez. 2000. 51 TEORIA CONSTITUCIONAL - UMA ABORDAGEM SOBRE OS DIREITOS SOCIAIS, ESPECIALMENTE O DIREITO À MORADIA NO BRASIL 1 Loreci Gottschalk Nolasco 2 Resumo: Este trabalho se propõe a analisar a dicotomia constituição – cidadania; políticas de solidariedade social – reformas sociais; modernidade – pobreza; moradia - dignidade humana; princípio da efetividade máxima constitucional – concretização e aplicabilidade da Constituição Federal. 1. Introdução. Este artigo procurará identificar as estruturas estatais e o reconhecimento dos direitos fundamentais, principalmente os de segunda geração, chamados “direitos coletivos e sociais”, especialmente o direito fundamental à moradia, introduzido na Constituição Federal de 1988, através de EC 26/2000, resultado da Segunda Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos Humanos (Habitat II) de 1996, e do Plano de Ação Global – Carta de Intenções, onde coube ao Brasil relatar sobre o Direito de Moradia, como direito fundamental do homem. A referida Emenda entrou em vigor na data de sua publicação, segundo o art. 2º que ocorreu em 15 de fevereiro de 2000. Resta-nos saber se a partir de tal data já está assegurada a moradia a todos, uma vez que há previsão expressa desse direito na Lei Maior. Por outro lado, procurarei analisar o processo de intervenção estatal, através do paradigma do Estado Social e o fracasso do Plano Nacional de Habitação, criado como instrumento jurídico para viabilizar o financiamento da casa própria. 1 Trabalho apresentado à disciplina Direito Constitucional IV no Curso de Mestrado Interinstitucional em Direito da Universidade de Brasília / UNIGRAN. 2 Mestranda no Curso de Direito da UnB/UNIGRAN, área de concentração Direito Constitucional. Professora na UNIGRAN.

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Revista Jurídica UNIGRAN. Dourados, MS | v. 2 | n. 4 | jul./dez. 2000. 51

TEORIA CONSTITUCIONAL - UMA ABORDAGEM SOBRE OS DIREITOS

SOCIAIS, ESPECIALMENTE O DIREITO À MORADIA NO BRASIL 1

Loreci Gottschalk Nolasco 2

Resumo: Este trabalho se propõe a analisar adicotomia constituição – cidadania; políticas desolidariedade social – reformas sociais; modernidade –pobreza; moradia - dignidade humana; princípio daefetividade máxima constitucional – concretização eaplicabilidade da Constituição Federal.

1. Introdução.

Este artigo procurará identificar as estruturas estatais e oreconhecimento dos direitos fundamentais, principalmente os de segundageração, chamados “direitos coletivos e sociais”, especialmente o direitofundamental à moradia, introduzido na Constituição Federal de 1988,através de EC 26/2000, resultado da Segunda Conferência das NaçõesUnidas sobre Assentamentos Humanos (Habitat II) de 1996, e do Planode Ação Global – Carta de Intenções, onde coube ao Brasil relatar sobreo Direito de Moradia, como direito fundamental do homem.

A referida Emenda entrou em vigor na data de sua publicação,segundo o art. 2º que ocorreu em 15 de fevereiro de 2000. Resta-nossaber se a partir de tal data já está assegurada a moradia a todos, uma vezque há previsão expressa desse direito na Lei Maior.

Por outro lado, procurarei analisar o processo de intervençãoestatal, através do paradigma do Estado Social e o fracasso do PlanoNacional de Habitação, criado como instrumento jurídico para viabilizaro financiamento da casa própria.

1 Trabalho apresentado à disciplina Direito Constitucional IV no Curso de Mestrado Interinstitucionalem Direito da Universidade de Brasília / UNIGRAN.2 Mestranda no Curso de Direito da UnB/UNIGRAN, área de concentração Direito Constitucional.Professora na UNIGRAN.

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Por fim foi possível detectar a necessidade urgente de se criar emnovas e modernas metas e procedimentos administrativos e judiciais,trazendo como exemplo, entre outros, um modelo de direito reflexivoidealizado por Helmut Willke, a fim de oferecer soluções para a criseatual do Estado Social e enfim solucionar/amenizar o problema da moradiano Brasil.

2. Constituições: A Organização do Estado e a definição daCidadania

Quando falamos em Constituição, logo lembramos dosmovimentos revolucionários do passado, de homens que a associaramaos ideais de liberdade e igualdade, entendendo-os como direitos universaisde todos os homens, buscando inseri-los nas constituições escritas, comodireitos fundamentais dos cidadãos. Essa lembrança faz parte de nossaHistória, da política, que organiza o poder em sociedade, na forma de umEstado, bem como a descrição dos direitos e deveres de que gozam osindivíduos nessa sociedade, em sua condição de cidadãos.

Evidencia-se, portanto, uma complexa trama de questõesenvolvidas na compreensão da cidadania enquanto dimensão pública daparticipação dos homens na vida social e política. Complexos tais comosócio-políticos e culturais, modificam-se de tempos em tempos, de acordocom os diferentes momentos históricos, a compreensão do que se entendepor cidadania, é que se criem instituições que efetivamente ordenem asatividades dos homens na organização de sua vida em sociedade, bemcomo em relação ao exercício do poder político.

Significa dizer que, com relação à questão da cidadania, é precisoque existam numa sociedade interesses específicos e identificáveis, quese tornem aspirações de todos os homens, para transformar-se emreivindicações de direitos, efetivamente concretizados, garantidos ereconhecidos pelas instituições políticas de uma determinada sociedade.Assim, a sociedade, a política, a cultura, irão sofrer uma alteração maisou menos profunda gerada pelo reconhecimento desses novos direitosconquistados através da cidadania. Nesse sentido, Célia Galvão Quirino

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e Maria Lúcia Montes 3, propõem:

Se quisermos compreender em termos políticos concretos como, numadada sociedade, se constróem a definição e a garantia dos direitos de cidadania,será preciso considerar a dinâmica que se estabelece entre a reivindicação denovos direitos por parte dos membros dessa sociedade e a organização dasinstituições políticas, que, precisamente, vêm tornar possível o exercício dessesdireitos.

Essa forma de se conceber a função de uma constituição trazimplícita a idéia da participação de todos em sua elaboração, expressandode forma concreta a realização daquele pacto social de que a constituiçãonão é apenas uma norma jurídica. Nasce então, paralelamente àconsolidação dos Estados a idéia de representação como meio derealização do contrato social, a fim de que, através da soberania,viabilizem-se mecanismos institucionais que permitam

ao povo delegar poderes aos representantes por eles escolhidos, para queestes, em seu nome, em seu interesse e como mandatários de sua vontade,elaborem a Lei Maior, sua Constituição, que os organiza enquanto nação eenquanto Estado. Esta é também a origem do poder Legislativo, ao lado doExecutivo e do Judiciário, como parte permanente dos poderes através dosquais se organizam as atividades que compete ao Estado desempenhar, nocumprimento de suas atribuições 4.

Sem essa interação não se concretizaria a conquista e a garantiados direitos de cidadania, nem no plano político, como sendo aquele que

organiza as instituições de um país e o próprio exercício do poderdo Estado, assegurando aos cidadãos, segundo a forma de sua organização,um maior ou menor número de direitos, - nem no plano social, - em que osdiversos grupos, classes, camadas etc. que integram a sociedade, com interessese aspirações distintos, por vezes mesmo antagônicos, reivindicam do Estadoo reconhecimento dessas aspirações como novos direitos que lhes devem sergarantidos 5.

3 Quirino, Célia Galvão & Montes, Maria Lúcia. Constituições Brasileiras e Cidadania. SP: ÁticaS.A, 1987. p. 15.4 Ibidem, p. 29.5 Ibidem, p. 30.

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O sentido histórico no qual se fixou a noção de cidadania, segundoMargrit Dutra Schimdt 6,

Diz respeito a situações e movimentos libertários e revolucionáriosque tiveram a finalidade de definição de espaços de grupos emergentes e declasses na sociedade. A burguesia, nova classe emergente, - esclarece a autora- foi além de estabelecer novos parâmetros para definição do indivíduo esuas relações com a sociedade e o estado baseados na trilogia: liberdade,igualdade, fraternidade, postulou um projeto político de organização socialexpresso na fundamentação jurídica, em que o direito era, de fato, substitutodo privilégio. Falar, portanto, em cidadania – segundo ela – é reafirmar odireito pela plena realização do indivíduo, do cidadão, e de sua emancipaçãonos espaços definidos no interior da sociedade.

É, no dizer de João Gilberto Lucas Coelho 7, através do exercício dacidadania e a organização crescente das pessoas que vão assegurar passos efetivos deavanço em favor da expressão da liberdade e de sua organização social, política eeconômica de forma justa e igualitária.

Norberto Bobbio defende que

Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitoshistóricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutasem defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modogradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todos 8.

É possível afirmar que, desde a época das primeiras revoluçõesmodernas, assistiu-se a um processo de progressiva ampliação - Bobbio 9

fala em multiplicação, que ocorreu no âmbito dos direitos sociais - dosdireitos fundamentais garantidos pelas constituições dos diversos paísescomo parte da cidadania, ampliando-se também a quantidade de cidadãos

6 Souza Júnior, José Geraldo. Org; (colaboradores) Alayde Sant’anna... (et al.), O direito achado narua. Brasilia: UnB – Curso de Extensão Universitária a Distância, 1990, p. 139.7 Souza Júnior, José Geraldo. Org; (colaboradores) Alayde Sant’anna... (et al.), op. cit. p. 137.8 Bobbio, Norberto. A era dos Direitos. RJ: Campus, 1992., p. 5.9 Bobbio, Norberto. op. cit., p. 70. Neste sentido diz o autor: “Bem entendido, esse processo demultiplicação por especificação ocorreu principalmente no âmbito dos direitos sociais. Os direitosde liberdade negativa, os primeiros direitos reconhecidos e protegidos, valem para o homem abstrato.Não por acaso foram apresentados, quando do seu surgimento, como direitos do Homem.”

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do que poderiam gozar de tais direitos. Esse processo de ampliação dosdireitos na Inglaterra, e em momentos distintos em outros países, segundoMarshall, citado por Célia Galvão Quirino e Maria Lúcia Montes, levouao reconhecimento de novos direitos, políticos e sociais 10, os chamados direitossociais, que desde o século XX, somaram-se aos direitos fundamentaisantes reconhecidos pelas primeiras constituições modernas, (...) que vaidesde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e segurança até o direito departicipar por completo da herança social e levar a vida de um ser civilizado, deacordo com os padrões que prevalecem na sociedade.

Os chamados direitos sociais são frutos de variadas reivindicações,que incluem desde o direito a condições dignas de vida, a uma justaremuneração pelo trabalho, rural ou urbano, até o direito à educação, à saúde,à previdência social, à moradia etc., como forma de realização de uma idéia de justiçasocial que procura diminuir 11, pois as desigualdades sociais produzem nasociedade muitas vítimas, que por viverem em condições subumanas, sãoimpedidas de participar integralmente da vida social e política de umanação, mesmo que seus direitos civis e políticos lhes sejam formalmenteassegurados.

De um lado, verifica-se que,

ao longo desse processo contínuo de extensão da cidadania que,quanto mais se ampliam os direitos fundamentais que o Estado deve asseguraraos cidadãos, tanto mais aumenta, concomitantemente, o grau necessário deintervenção do Estado na sociedade e na vida dos próprios cidadãos, parapermitir a implementação e a garantia desses mesmos direitos por elesreivindicados 12.

10 Quirino, Célia Galvão & Montes, Maria Lúcia., op. cit. p. 31 e 32. Argumentam ainda, que“àqueles direitos necessários à garantia da liberdade individual – como o direito de ir e vir, aliberdade de pensamento e de religião, o direito a uma imprensa livre, à justa propriedade e à lutacontra a opressão, considerados direitos fundamentais de todos os homens enquanto membros deuma sociedade, isto é, seus ‘direitos civis’ – o século XIX veio acrescentar a ampliação dos ‘direitospolíticos’, garantindo a extensão da representação, através do direito de votar e ser votado, a grupossociais até então excluídos da escolha de seus próprios governantes ou da participação em funçõesde governo, como as classes trabalhadoras, as mulheres, certas categorias profissionais, os jovens, osanalfabetos, grupos éticos anteriormente discriminados etc.”.11 Ibidem, p. 33.12 Ibidem, p. 33.

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De outro lado, qualquer possibilidade de a constituição de umpaís vir a atingir esse equilíbrio está ligada à natureza dos processos sociaise políticos que ocorrem na sociedade, onde os diversos setores,

representando interesses e aspirações de classes, camadas ou grupossociais distintos, reivindicam novos direitos a serem reconhecidos pelo Estado,dispondo de menor ou maior força de pressão nesse sentido, em função dograu de participação e de organização que seus membros forem capazes deconseguir, na articulação de seus interesses e aspirações, enquanto demandassociais a que o Estado deve responder13.

Quando trata dos fatores reais de poder, as classes, camadas ougrupos sociais distintos, que entendemos serem o conjunto de forças queatuam politicamente, Lassale assegura que é, em essência a

Constituição de um país: a soma dos fatores reais do poder queregem uma nação. Mas que relação existe com o que vulgarmente chamamosConstituição? Com a Constituição jurídica? – pergunta Lassale. Não édifícil compreender a relação que ambos os conceitos guardam entre si. Juntam-se esses fatores reais do poder, os escrevemos em uma folha de papel e elesadquirem expressão escrita. A partir desse momento, incorporados a umpapel, não são simples fatores reais do poder, mas sim verdadeiro direito –instituições jurídicas. Quem atentar contra eles, atenta contra a lei, e porconseguinte é punido 14.É preciso dizer, em outras palavras, que só haverá garantia e

consequentemente efetividade dos direitos de cidadania, resultante dainteração sempre renovada entre a sociedade e a política, tendo comopauta principal a ampliação dos direitos fundamentais, onde houverdemocracia. Isso requer uma atuação constante do poder público e quesuas instituições sejam capazes de captar, canalizar e finalmente integrar à vidapolítica, assegurando, através da lei, o seu atendimento, pela incorporação de novosdireitos ao âmbito da cidadania15.

Com efeito, Bobbio 16 argumenta que

13 Quirino, Célia Galvão & Montes, Maria Lúcia. op. cit. p. 3414 Lassalle, Ferdinand. A essência da Constituição. RJ: Lumen Juris, 1998. p. 32.15 Quirino, Célia Galvão & Montes, Maria Lúcia. op. cit. p. 34.16 Bobbio, Norberto. op. cit. p. 1 e 25.

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O reconhecimento e a proteção dos direitos do homem estão na basedas Constituições democráticas modernas (...) a democracia é a sociedadedos cidadãos, e os súditos se tornam cidadãos quando lhes são reconhecidosalguns direitos fundamentais. Para ele, não importa saber quais e quantossão esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitosnaturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo maisseguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações,eles sejam continuamente violados.

No Brasil, hoje, segundo o professor José Geraldo de SouzaJúnior17, a experiência de luta pela construção da cidadania se expressa comoreivindicação de direitos e liberdades básicos e de instrumentos de organização,representação e participação nas estruturas econômico-social e política da sociedade.

João Carlos Espada 18 afirma que

Os direitos sociais são pretensões, e não só liberdades, já quedeveriam implicar a obrigação por parte de terceiros de assegurarem um tipoqualquer de bens a que se considera que o seu titular tem direito”. Para ele,a obrigação que decorre dos direitos sociais não é negativa, pelo contrário,positiva de agir. Por último, afirma que eles “não acarretam obrigaçõespara indivíduos específicos, exigindo, em princípio, ação, ou a contribuiçãopara uma ação, por parte de todas as outras pessoas em relação ao titulardo direito, os direitos sociais são supostamente in rem.

Finalizando, cabe dizer com as palavras do professor Canotilho19,que as declarações universais dos direitos tentam hoje uma ‘coexistência integrada’dos direitos liberais e dos direitos sociais, econômicos e culturais, embora o modocomo os estados, na prática, asseguram essa imbricação, seja profundamente desigual.

3. O Estado Social: Intervencionismo e problemas. Propostaspara solução da crise

O princípio da democracia social, como princípio objetivo, implícita

17 Souza Júnior. José Geraldo. Org; (colaboradores) Alayde Sant’anna... (et al.) 3. Ed. – O direitoachado na rua. Brasilia: UnB – Curso de Extensão Universitária a Distância, 1990., p. 34.18 Espada, João Carlos. Direitos Sociais de Cidadania. SP: Massao Ohno Editor, 1999. p. 24.19 Canotilho, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina,1999. p. 361/2.

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no reconhecimento de numerosos direitos sociais, pode derivar-se aindade outras disposições constitucionais, tais como a dignidade da pessoahumana e a imposição dirigida ao legislador, no sentido de criar condiçõessociais que assegurem uma igual dignidade social em todos os aspectos.Nesse sentido, para Canotilho20, o princípio de democracia social não se reduz aum esquema de segurança, previdência e assistência social, antes abrange um conjuntode tarefas conformadoras, tendentes a assegurar uma verdadeira «dignidade social»ao cidadão e uma igualdade real, entre os brasileiros.

Segundo o autor português, é preciso que os órgãos de direçãopolítica, desenvolvam uma

actividade económica e social conformadora, transformadora eplanificadora das estruturas socioeconómicas, de forma a evoluir-se parauma sociedade democrática”, e promovam a igualdade real entre os brasileiros.Para ele, é o princípio da democracia econômica e social que “justifica elegitima a intervenção económica constitutiva e concretizadora do Estadonos domínios económico, cultural e social (‘realização e concretização de direitossociais’) 21.

O Estado de Direito, ou Estado Liberal, segundo Márcio Iorio22,

humanizou a ‘idéia estatal, democratizando-a teoricamente, pelaprimeira vez, na Idade Moderna’, mas embora fosse o embrião do idealdemocrático pleno, pleiteando a participação de todos na determinação dosrumos da nação, tombou-se para o outro extremo de utilização da máquinaestatal em prol de interesses unilaterais de uma classe social pela simplesaplicação da filosofia da não-intervenção.

Foi o Estado Social, segundo Bonavides,23 que consagrou o idealde democracia, ou seja, aquele que abarcou os valores expressados naparticipação “tais como a iniciativa, o plebiscito, o referendo e o vetopopular”. Ensina o mestre que ontem (Estado Liberal), quando o Estadoconsagrava a liberdade, a cidadania era abstratamente representada pelos20 Canotilho, J.J. Gomes. Op. cit. p. 33621 Idem, ibidem., p. 325/328.22 Aranha, Márcio Iorio. Interpretação Constitucional e as Garantias Institucionais dos DireitosFundamentais. SP: Atlas, 1999., p. 105/106.23 Bonavides, Paulo. Do Estado Liberal do Estado Social. 6ª ed. SP: Malheiros, 1996, p. 13.

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órgãos do parlamento, mas hoje, depois de três séculos de abstração,quando o Estado apregoa a igualdade – Estado social, a democracia foialçada à categoria de direito positivo.

Assim, o binômio liberdade e igualdade se concretizam, isto é, aabstração e a positivação se realizam em

(...) patamar da concretude constitucional propriamente dita, que éa concretude normativa a caminho da aplicabilidade imediata, acima portantoda retórica programática dos textos constitucionais que correspondem aoperíodo de um Estado social até há pouco meramente doutrinário, impalpávele abstrato” 24. Ou seja, a democracia se torna objetiva, concreta,positiva, pragmática e real, e se torna, “...o mais fundamental dosdireitos da nova ordem normativa que se assenta sobre a concretude do binômioigualdade-liberdade;... marcando um passo avante na configuração dos direitoshumanos 25.

No Estado Liberal, os direitos tinham sua eficácia limitada, eramapenas catalogados na Declaração, porém abstratos, ... distantes e tocadospor poucos. Somente atingiriam aqueles que a eles já estivessem próximos por suacondição social privilegiada. Eram direitos cujo conteúdo encontrava-se fora dos mesmos,nas peculiaridades subjetivas de cada um 26. Mas foi o Estado Social que refletiuum aprofundamento e uma extensão do Estado-protetor clássico, segundo MárcioIorio27, quando cita Pierre Rosanvallon.

Foi a partir do surgimento do Estado Social que a democraciatornou-se direito positivo do povo e do cidadão, concretizando umadoutrina constitucional saindo da dimensão do direito natural para emseguida, ... legitimada na esfera da positividade por imperativo da justiça e darazão humana 28, trazer variações geradoras de um novo direitoconstitucional impregnadas de novos sentido e interpretações, de valorescomo de justiça, da proporcionalidade, da igualdade e da liberdade, ouseja, foi o Estado social que exigiu uma nova hermenêutica do ordenamento

24 Idem, ibidem. op. cit. p. 14.25 Idem, ibidem. op. cit. p. 15.26 Aranha, Márcio Iorio. op. cit. p. 111.27 Idem, ibidem. p. 107. Para maiores esclarecimentos, ler, do autor, nota de rodapé de n. 9.28 Bonavides, Paulo. op. cit. p. 17.

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jurídico, com juristas preocupados em construir uma Constituição viva,aberta e real, que comportasse toda a sociedade, e fizesse realizar os direitosfundamentais, ao contrário dos juristas do Estado liberal, conservadoresda metodologia clássica, positivistas da norma, que a liam e ainterpretavam, segundo os cânones de Savigny 29, indiferentes aos valores e àlegitimidade do ordenamento jurídico, portanto.

Para Bonavides, tanto o desenvolvimento, quanto a democraciasão direitos do povo; direito de expressar a sua própria vontade; de exercíciodireto e imediato do poder através da cidadania, ... para varrer do poder, deforma legítima, os sistemas autocráticos e absolutistas que, perpetrando genocídios eprovocando ameaças letais a paz universal, se fazem incompatíveis com a necessidadedo ser humano 30.

Com a tragédia deixada pela II Guerra Mundial, as injustiças sociaisgeraram ressentimentos e ódios contra a decrepitude de uma espécie de capitalismocujos erros graves se acumulavam ao redor de uma forma de Estado impotente paravencer crise de tão vastas proporções qual aquela do Estado liberal, condenado, já, atransformar-se ou desaparecer 31. Mas ele não desapareceu, transformou-seem Estado Social, ... este o qualificou pelo intervencionismo e tutela sociais 32,preocupado com a democracia do futuro.

A expansão dos direitos sociais e a integração das várias lutassociais, emergentes no final da década de 50, início da década de 60:negros, estudantes, segurança social, habitação, educação, transportes,meio ambiente e qualidade de vida, aceleraram a transformação do Estadoliberal em Estado-Providência: um Estado ativamente envolvido na gestãodos conflitos entre as classes e os grupos sociais, apostando naminimização possível das desigualdades sociais no âmbito do modo deprodução capitalista dominante nas relações econômicas 33.

Mas como falar em intervenção e exigir que o Estado-Providência

29 Idem, ibidem. op. cit. p. 18.30 Idem, ibidem. op. cit. p. 1731 Idem, ibidem. op. cit. p. 37.32 Aranha, Márcio Iorio. op. cit. p. 113.33 Santos, Boaventura de Souza. Pela Mão de Alice – O social e o político na pós-modernidade. SP:Cortez, 1999, p. 165.

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diminua as desigualdades sociais, se esse Estado está em crise desde adécada de 70 e com ela agravaram-se as desigualdades sociais e os processos deexclusão social ... e de tal modo que estes países - capitalistas – ... assumiramalgumas características que pareciam ser típicas dos países periféricos 34?

Diante disso, repergunta André-Noel Roth35, que papel outorgar aoestado?, que segundo o autor, para responder é preciso dividir o EstadoModerno em Liberal e Social, o primeiro surge com as revoluções dosséculos XVIII e XIX; o segundo inicia-se no final do século XIX até adécada de 70, quando entra em crise. Enfatiza que o Estado Liberal,desenvolveu a economia capitalista, sendo inspirado sob o não-intervencionismo estatal, bem como apregoou a liberdade individual eque a sociedade se auto regula. É um Estado protetor dos direitosindividuais, utilizando-se de monopólios para cumprir seu papel, mas sótem legitimidade para usar da coação jurídica e física, deixando de ...intervir nos campos econômicos e sociais que são de caráter puramente privado 36.Em contrapartida, o Estado Social nasce com a Revolução Industrial,com a destruição ou ... a redução da capacidade auto-reguladora da sociedadecivil necessitou da intervenção do estado na regulação da ‘questão social’ 37. Éincumbido a ele realizar o crescimento econômico do país e a proteção social dosindivíduos 38, regulando, transformando em todos os setores sócio-econômicos. Mas este modelo de Estado está em crise, porque se tornouincapaz de solucionar, seja impondo ou negociando com os diversos atoressociais, os problemas sócio-econômico-jurídicos atuais, motivado pelosurgimento do fenômeno da globalização.

Após refletir a evolução do Direito, reportando-se às estruturasestatais vistas acima, André-Noel Roth, apresenta um modelo de direito,que chama de “reflexivo” idealizado por Helmut Willke, pelo que se deve... favorecer a emergência de um corporativismo renovado dentro de um projeto político-econômico-neomercantilista e constituir uma via intermediária entre a evoluçãoespontânea e a planificação 39.34 Santos, Boaventura de Souza. op. cit. p.1735 Roth, André-Noel. O direito em crise: fim do Estado moderno?, Brasilia: UnB. Revista Noticiado Direito Brasileiro, n 6. 2000, p. 15.36 Idem, ibidem. p. 17.37 Idem, ibidem. p. 17.38 Idem, ibidem, p. 17.39 Roth, André-Noel, op. cit. p. 22.

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A proposta de Willke, segundo André, é

dar ao Estado-Providência uma capacidade, não de direção, masde guia para a sociedade. Este modelo de direito não estaria baseado nocapitalismo e no poder, mas no saber, a fim de ‘estabilizar os progressos dohomem’, correspondendo, assim, às necessidades de nossa sociedade pós-moderna 40.

Ou seja, o modelo apresentado pelo autor irá constituir, atravésde negociações e mesas redondas de cada subsistema – problema específico- uma tentativa para encontrar uma nova forma de regulação social, outorgando aoEstado e ao direito um papel de guia (e não de direção) da sociedade 41.

Poderíamos entender esse modelo de direito reflexivo apresentadopor André-Noel, adaptando-o às lições do professor Canotilho 42, quandofala em política de solidariedade social, dizendo que

os direitos sociais realizam-se através de políticas públicas (‘políticada segurança social’, ‘política da saúde’, ‘política do ensino’), - e no meuentender política da habitação -, orientados segundo o princípio básico eestruturante da solidariedade social. Designa-se, por isso, política desolidariedade social o conjunto de dinâmicas político-sociais atravésdas quais a comunidade política (Estado, organizações sociais, instituiçõesparticulares de solidariedade social e, agora, a Comunidade Européia) gera,cria e implementa protecções institucionalizadas no âmbito económico, sociale cultural...

Para Luciano Mendes de Almeida 43, é preciso elaborar estratégiaspara a promoção dos Direitos Humanos dos Pobres no Brasil, chamando-os de “excluídos” da sociedade. A par disso descreve a realidade atual doBrasil, trazendo dados que denunciam a crise rural e urbana, em váriosaspectos sociais como: emprego, moradia, educação, fome, saúde e outros.

40 Idem, ibidem. p. 22.41 Idem, ibidem. p. 23.42 J. J. Gomes Canotilho. op. cit. p. 482/483.43 Almeida, Luciano Mendes de. Direitos Humanos no Século XXI, Parte II. Paulo Sérgio Pinheiroe Samuel Pinheiro Guimarães. Organizadores. (colaboradores) Antonio Augusto Cançado Trindade...(et.al.) IPRI – Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais Fundação Alexandre de Gusmão.p.831/832.

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Afirma que o Brasil se situa entre as dez maiores economias do mundo, no entanto,o salário mínimo é dos mais baixos do planeta (...) O certo é que a desigualdadesocial é enorme e tem por raiz um conjunto de injustiças sociais. Esclarece o autorque, pela má distribuição do solo urbano, tem-se por conseqüência, oaumento de favelas, o crescimento dos ‘cortiços’ nos centros das grandes cidades(...) e a segregação espacial com o confinamento de larga parte da população nasperiferias onde falta o conjunto da infra- estrutura urbana, gerando a violênciaorganizada pela narcotráfico que confina favelados e elite amedrontados.

Luciano - arcebispo, teólogo e doutor em Filosofia - apresentaalgumas estratégias, dizendo, primeiramente, que é preciso resgatar osvalores de uma sociedade justa, solidária e fraterna, destacando que adimensão econômica é a raiz mais profunda das injustiças sociais, isto é, anegação do primado da pessoa humana e da sua dignidade44, que deve ser superadapelos próprios pobres – agentes principais, segundo o autor – e, pelosdemais membros da sociedade, que devem proporcionar formas e meiospara que os empobrecidos descubram o seu próprio valor e dignidade,pelos quais, recuperam suas forças e habilidades, voltam aos hábitos de trabalho,sentem-se necessários, desenvolvem a criatividade, e afastam o perigo do desânimo edo complexo de inferioridade45. Conclui, ademais, que toda e qualquer estratégia44 Almeida, Luciano Mendes de. op. cit. p. 834/836. Para melhor entendimento das estratégias paraa promoção dos direitos humanos dos pobres que o autor apresenta, citamos parte do artigo, ondediz que: “a) A sociedade justa coloca no centro de todas as suas promoções a dignidade da pessoahumana, a promoção de seus direitos, a condição de exercício de seus deveres que provoca umaeqüitativa distribuição dos bens e das oportunidades devidas. Na sociedade justa, a terra é bemdistribuída, assegurando moradia e trabalho para a população rural, o solo urbano oferece espaçofamiliar para os moradores da cidade e a sociedade assegura serviços básicos de educação, de saúde,e outros indispensáveis à vida digna. Sem atentar à prioridades dos valores sociais não é possívelconceituar progresso, desenvolvimento do país (...) b) A sociedade solidária. “É aquela que nãoexclui ninguém, uma sociedade sem discriminação e sem dominações, uma sociedade que supera osradicalismos ideológicos, os preconceitos raciais e a brutalidade dos nacionalistas exacerbados (...)Não se trata apenas de promover direitos pessoais e grupais, mas de, em virtude da solidariedade,abrir o horizonte de cada cidadão para a abrangência da inteira sociedade, onde não haja excluídos(...) c) Sociedade fraterna. As reformas necessárias nascem da justiça que requer respeito aosdireitos e condição de exercício dos deveres. No entanto, é preciso acrescentar a exigência dafraternidade. Com efeito, somente a promoção da fraternidade, da prática do amor, poderá conseguira superação do egoísmo, animar a partilha e criar condições para a convivência entre pessoas que seofenderam, entraram em conflito e apelaram para a violência e a destruição reciproca. A prática dafraternidade acrescenta às exigências da sociedade justa e solidária, a força do amor, do perdão e dorespeito a toda pessoa humana.”45 Idem, ibidem. p. 839/841. O autor apresenta algumas experiências concretas na promoção dosexcluídos, entre elas, cita: “Escolas Família – Agrícola; Hortas Comunitárias e Moradia em mutirão.

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que tenha como objetivo promover a inclusão dos excluídos, requer ointeresse e o empenho das autoridades em nível nacional, estadual e municipal. Bemcomo - assegura - a colaboração das demais instituições da sociedade, tais como:empresas, universidades, escolas, entidades não governamentais 46.

Segundo João Paulo dos Reis Velloso 47 , apesar de o Brasil investir(gastar) tanto e realizar progressos sociais em diversos campos, faltouuma política social pública bem articulada, a construção de capital humanonecessário para operar a economia moderna dos anos 90, bem como deixoua sociedade brasileira de educar seus eleitores. Argumenta que essas foramas razões para que perguntemos: qual o destino da pobreza e da desigualdadeno Brasil? No fundo – desabafa - estamos interessados em saber o que é amodernidade, num país como o nosso, com uma tradição de dinamismo econômico,mas também com uma herança de forte pobreza absoluta e elevada desigualdade.

Esse mesmo autor indica como solução, uma reforma social dovelho Estado social (“superado e desmantelado”), que proponham

expansão das tradicionais políticas sociais – que chama de ‘ativismo’- em geral fracassadas, (...) que representam altos dispêndios e poucoresultado, do ponto de vista dos indicadores do bem-estar social.Finalizando, diz que temos consciência da necessidade de haver foco, ouseja, prioridades claras nos dispêndios sociais; e mudança de orientação.Mudanças no modelo de crescimento, nas prioridades da área social, noconteúdo das várias políticas nesse campo e nas instituições de planejamento,coordenação e implementação. Saberemos fazê-las? Disso vai depender ofuturo de nossa modernidade econômico-social 48.

46 Idem, ibidem. p. 841.47 Velloso, João Paulo dos Reis e Albuquerque, Roberto Cavalcanti de. (Orgs.) Modernidade ePobreza. (colaboradores) Ricardo Paes de Barros ... (et. al.). SP: Nobel, l994. p. 11/12/13. Nessesentido define o autor que: “De um lado, as políticas sociais públicas não funcionam como mecanismode compensação das graves desigualdades de distribuição de renda, resultantes de nossa herançahistórica e, em particular, do padrão de desenvolvimento realizado, pelo menos, até o início dosanos 70. Em verdade, (...), atuam elas, em boa medida, como mecanismos de perpetuação dapobreza e de desigualdade. Daí a existência de um Brasil sem cidadania social – particularmente os‘despossuídos’ do grande contingente de pobreza absoluta. De outro lado, não construímos a basede capital humano necessária para operar uma economia moderna, nos anos 90. Ou seja, aquela quefunciona dentro do paradigma industrial das altas tecnologias e que exige um nível de escolarizaçãoda mão-de-obra bastante superior ao herdado da nossa experiência de modernização desigual. Emterceiro lugar – continua - , num plano mais amplo, criou-se um problema difuso de governabilidade,a longo prazo: a sociedade brasileira não educou ‘os seus novos senhores’- isto é, os eleitores -, aexemplo do que fizeram a Inglaterra e demais nações hoje desenvolvidas, a partir de quandoemergiram as tendências à criação da sociedade de massas, em fins do século XIX”.48 Idem, ibidem. p. 65,73 e 74.

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Por outro lado, foi, segundo Menelick 49, no início da década de70, quando o Estado Social entra em crise, tornando-se Estado - empresa,que surgem os direitos difusos, a que ele chama

da terceira geração, (...) que compreendem os direitos ambientais,do consumidor e da criança”, sendo necessário, para ele, “requerer do Judiciárioque tome decisões que, ao retrabalharem construtivamente os princípios e asregras constitutivos do direito vigente, satisfaçam, a um só tempo, a exigênciade dar curso e reforçar a crença tanto na legalidade, entendida como segurançajurídica, como certeza do direito, quanto no sentimento de justiça realizada,que deflui da adequabilidade da decisão às particularidades do caso concreto.

Em outras palavras, diferentemente do intérprete do EstadoLiberal - positivista, que aplicava normas à maneira do tudo ou nada 50, ointérprete do Estado Social, preocupado com os problemas sociais, develevar em conta os fatos e os atores sociais em questão, utilizando-se doordenamento jurídico como um todo, adequando ao caso concreto comose fosse um hard case 51, aquela norma que melhor retrate a justiça e arealidade social, convencendo aqueles a quem tenham a pretensão de obrigar 52.

Ademais, pela alta complexificação da estrutura da sociedade, ojulgador intérprete, à vista dessa interdependência dos procedimentosinterpretativos - que se entrelaçam sob a idéia de que a decisão do casoconcreto, para se reputar jurídica, há de ser correta e justa -, perdeu sentidoa velha disputa entre os chamados métodos de interpretação do direito,os quais devem ser utilizados em conjunto e complementarmente, emordem a refletir toda a complexidade do trabalho hermenêutico comoatividade em que se fundem, necessariamente, a compreensão, ainterpretação e a aplicação dos modelos jurídicos, enfim, faz-se necessárioutilizar-se de bons métodos de interpretação no dizer de Häberle 53.49 Carvalho Netto, Menelick de. A hermenêutica constitucional sob o paradigma do EstadoDemocrático de Direito. Revista Notícia do Direito Brasileiro n. 6, jul/dez. de 1998. Brasília; UnB– Faculdade de Direito. 2000, p. 243, 245.50 Idem, ibidem. p. 245.51 Idem, ibidem. p. 247.52 Coelho, Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional. Porto Alegre: Sérgio A Fabris, 1997, p. 48.53 Häberle, Peter. Hermenêutica Constitucional. A sociedade aberta dos intérpretes da Constituição:Contribuição para a interpretação pluralista e “Procedimental” da Constituição. Trad. Gilmar F.Mendes. Porto Alegre: Sérgio A Fabris, 1997, p. 53.

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Salienta Karl Larenz, citado por Coelho54, que

a aplicação ou a aplicabilidade das normas aos casos concretosconstitui aspecto imanente da própria interpretação jurídica, verdadeiracondição de possibilidade do afazer hermenêutico, que não se pode desenvolverabstratamente, antes exige um ir-e-vir ou um balançar de olhos entre anorma e o fato ou entre a possível interpretação e o seu resultado.

E segundo Coelho, ...por essa forma, ele cria a norma de decisão concretaou a norma do caso para realizar a justiça em sentido material, porque estará decidindoem vista das particularidades da situação posta a seu julgamento 55.

Impõe dizer, com Menelick, 56 que

é a diferenciação entre um direito superior, a Constituição e os demaisdireitos, que acopla estruturalmente direito e política, possibilitando ofechamento operacional, a um só tempo, do direito e da política. Em outrostermos, é por intermédio da Constituição que o sistema político ganhalegitimidade operacional e é também por meio dela que a observância aodireito pode ser imposta de forma coercitiva.

Todavia, a concentração de poder está na raiz das violações dosdireitos humanos, tanto políticos e individuais, quanto econômicos, sociaise culturais e os de terceira geração como o direito ao desenvolvimento, aomeio ambiente etc., segundo Samuel Pinheiro Guimarães, o qual afirmaque,

a concentração de poder de toda ordem, às vezes simultânea, emvárias esferas e interdependente, consagrada pela legislação, contra certosgrupos da população reforçaram historicamente sua situação de inferioridadee despossessão e portanto as diferenças entre indivíduos e grupos sociais.Criaram assim os estereótipos que contribuem para ‘justificar e perpetuar adiscriminação e a concentração de poder, inclusive no imaginário dos própriosoprimidos, e a ‘sancionar’ as violações dos direitos desses grupos e aimpunidade dos violadores 57.

54 Coelho, Inocêncio Mártires, op. cit. p. 41.55 Coelho, Inocêncio Mártires, op. cit. p. 43.56 Carvalho Netto, Menelick de, op. cit., p. 233.

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Segundo o autor, uma intervenção coletiva da comunidade, atravésda legislação e do poder de coerção do Estado, desencadearia mecanismosde desconcentração de poder, a fim de atuar com eficácia para modificaro substrato geral de onde brotam as violações.

Por outro lado, afirma Pinheiro, que

as políticas neo-liberais – onde o neo na realidade nada tem denovo mas, significa antigo, segundo ele -, tendem a agravar as violações dedireitos humanos, de todo tipo e assim as três gerações de direitos humanostem sido igualmente afetadas pelos efeitos perversos dessas políticas (...) Emconseqüência, o neoliberalismo propugna, com energia, que o Estado sejareduzido ao mínimo, que a atividade econômica seja o mais possíveldesregulamentada, que o Estado interfira o mínimo via atividade econômica,e em especial que não desenvolva diretamente nenhuma atividade econômica 58.

Finalizando esta abordagem, fundamentamos nosso ponto de vistacom Hélio Bicudo59, quando se refere aos direitos sociais e econômicos,que, ao mesmo tempo em que os direitos do homem são vistos como o meio de seatender aos objetivos de liberdade e paz social, a maioria dos homens e mulheres,sujeitos desses direitos universais, não alcançam condições mínimas para o gozo desses

57 Guimarães, Samuel Pinheiro. Direitos Humanos no Século XXI, Parte II. Paulo Sérgio Pinheiroe Samuel Pinheiro Guimarães. Organizadores. (colaboradores) Antonio Augusto Cançado Trindade...(et.al.) IPRI – Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais Fundação Alexandre de Gusmão. p.1031, 1039, 1040.58 Guimarães, Samuel Pinheiro. op. cit. p. 1041/1043. Esclarece que: “As articulações entre gruposinternos e externos na execução de políticas neoliberais provocam crescente transferência de recursosda periferia para o centro do sistema e agravam as estruturas oligopólicas na economia e na política.Assim dificultam o desenvolvimento econômico e a desconcentração de renda, ao gerar desemprego,exclusão, marginalidade e violência nos Estados centrais, mas especialmente e em grau muito maiormas megalópolies periféricas que se expandem desordenada e miseravelmente. Na periferia, milhõesde seres humanos, têm sido subitamente afetados pelos resultados daquelas políticas, não em razãode qualquer ‘incompreensão’ de seus governos, já que estes se esforçam ao máximo na aplicaçãodessas políticas ou de ‘males inatos’ às sociedades nativas que, se culpadas foram, foi de acreditaringenuamente nos novos mitos ‘centrais’: a globalização e a paz. As políticas neoliberais tem sidoa causa das mais graves violações de direitos econômicos e sociais, e em seguida, políticos, ao criaras condições para a eventual reedição do autoritarismo sempre latente na periferia.59 Bicudo, Hélio. Direitos Humanos no Século XXI, Parte I. Paulo Sérgio Pinheiro e SamuelPinheiro Guimarães. Organizadores. (colaboradores) Antonio Augusto Cançado Trindade... (et.al.)IPRI – Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais Fundação Alexandre de Gusmão. p. 149/150.

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direitos.

4. O Plano Nacional da Habitação como forma de açãoestatal e a sua função social

Planejamento é uma das formas de atuação estatal que, segundoJosé Afonso da Silva,60 significa:

... um processo técnico instrumentado para transformar a realidadeexistente no sentido de objetivos previamente estabelecidos. O planejamentoeconômico consiste, assim, num processo de intervenção estatal no domínioeconômico com o fim de organizar atividades econômicas para obter resultadospreviamente colimados.

A nossa Carta Política de 1988 prevê em seu art. 174, § 1º que Alei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacionalequilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais dedesenvolvimento.

Em outras palavras, a Constituição Federal de 1988 incluiu oplanejamento entre as funções do Estado como agente normativo eregulador da atividade econômica. Segundo João Bosco Leopoldino daFonseca 61, há duas modalidades de intervenção estatal no domínioeconômico brasileiro: direta e indireta. A direta está prevista no art. 173,§ §, 1º, 2º e 3º da Constituição Federal; e a indireta no art. 174, que temcomo finalidade fiscalizar, incentivar ou planejar, que será objeto de nosso estudoneste tópico.

No tocante ao direito social à moradia, planejamento urbanoequivale, para Marshall 62

a planejamento total (...) Não apenas toma a comunidade como umtodo, mas influencia e deve levar em consideração todos os interêsses, costumese atividades sociais. Almeja criar novos ambientes físicos que promoverãoativamente o crescimento de novas sociedade humanas. Deve decidir qual o

60 José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 1997, p.739.61 Fonseca, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 245.62 Marshall, Thomas Humphrey. Cidadania, Classe Social e Status. RJ: Zahar Editores, 1967. p. 98.

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aspecto de que essas sociedades se revestirão e tentar atender a tôdas asdiversificações maiores que estas devem conter 63.

Nosso ordenamento constitucional recepciona então, a Lei 4.380de 21 de agosto de 1964, que criou o Plano Nacional da Habitação, comomeio de ação estatal, ou seja, meta de intervenção do Estado, que noinício trouxe muitos benefícios de natureza social, pois foi elevado onúmero de pessoas que procuraram o Sistema Financeiro da Habitação,instituído pela mesma lei, para obter o financiamento da casa própria, porlongo prazo, crescendo vertiginosamente o número de construções e,paralelamente, o número de adquirentes das unidades residenciais comfinanciamentos obtidos nas sociedades e empresas que observam asistemática do Plano Nacional da Habitação e do Sistema Financeiro daHabitação.

Em relação à intervenção indireta, João Bosco afirma que ao atuarindiretamente na condução, no estímulo e no apoio da atividade econômica empreendidapelos particulares, o Estado adota determinadas formas de política econômica,peculiares a cada campo de atuação 64. Para tanto, deve o Estado adotar medidasde política econômica, ou seja, instrumentos de realização dos objetivosfundamentais.

Para Bosco, o planejamento tem como finalidade fixar metas que servemde norte para os esforços empreendidos 65, que englobem todo o contexto

63 Idem, ibidem. p. 98. Esclarece o autor que: “Os planejadores urbanos apreciam falar de uma‘comunidade equilibrada’ como seu objetivo. Isto significa uma sociedade que contenha umaadequada mistura de tôdas as classes sociais assim como de grupos etários e sexuais, ocupações eassim por diante. Não tencionam construir conjuntos residenciais operários nem de classe média,mas se propõem edificar casas populares e residências para a classe média. O objetivo dêles não éuma sociedade sem classes, mas uma sociedade na qual as diferenças de classe sejam legítimas emtêrmos de justiça social e na qual, portanto, as classes colaborem mais intimamente do que nopresente para o benefícios comum de todos”.64 Fonseca, João Bosco Leopoldino da. Op. cit. p. 247/248. Para melhor esclarecimento da idéia doautor: “A política econômica tem como objetivos fundamentais, nos países desenvolvidos, assegurar ocrescimento sustentado da economia, assegurar o pleno emprego dos fatores de produção, particularmente damão-de-obra, uma relativa estabilidade de preços, e garantir o equilíbrio da balança de pagamentos”.

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econômico e social.

João Bosco diz que a racionalidade desenvolvida pelo pensamentoiluminista do século XVIII, que privilegiou exclusivamente o interesse individual,atribuindo ao indivíduo todo o valor, exaltando-o acima da própria sociedade, nãoproduziu resultados satisfatórios 66 e, portanto, deveria ser substituída pelaracionalidade social, que enfatizasse o interesse da sociedade, como forma debuscar um novo equilíbrio social 67.

Com efeito, em relação ao planejamento da Habitação, existe umaparafernália de leis, decretos, resoluções, atos normativos, portarias emedidas provisórias, que pretendem regular as relações contratuais oujurídicas decorrentes do Sistema Financeiro da Habitação.

De tempos em tempos o governo federal, busca flexibilizar asregras para novos contratos a serem firmados no âmbito do SistemaFinanceiro da Habitação, notadamente no que diz respeito aos planos de

65 Idem, ibidem. p. 250. No que respeita a um planejamento global, cita Philippe Maystadt o qualconceitua uma política econômica geral do Estado, “... em que inclui a política dos preços, a políticade rendas, a política da moeda, da poupança e do crédito e a política de emprego, política relativaà concorrência e à dimensão das empresas, política ambiental, política relativa ao comércio exteriore às trocas e política de equilíbrio territorial. Num contexto de políticas setoriais, inclui a políticade minas e de recursos do subsolo, a política energética, a política dos transportes, a política demelhoria e de construção de moradias, a política relativa a determinados ramos da indústria; porexemplo, da siderurgia, e a política relativa a determinadas prestações de serviços, por exemplo, oturismo”. João Bosco acrescenta a política de desenvolvimento em que se abordariam temas como“... política de privatização, política de integração com os países do Cone Sul, política habitacional,política de salários, política de proteção ao consumidor, integrada no esforço de garantia da livreconcorrência”. (p. 250/251)66 Fonseca, João Bosco Leopoldino da. op. cit. p. 253. Segundo o autor, o esforço não produziuefeitos concreto, porque: “A necessidade de encontrar-se um outro caminho ficou demonstradaquer com os acontecimentos econômicos que antecederam e sucederam à Primeira Grande Guerra,quer com os que se seguiram à Grande Depressão. A partir de então, busca-se uma racionalidade quevenha a ser criada de fora, com a participação do Estado. Surgem, a partir do término da PrimeiraGrande Guerra, os esforços dos planificadores públicos. A planificação passa a ser vista comodotada de uma força externa aos fenômenos sociais e econômicos, a aplicar-se sobre eles paraalcançarem as metas propostas. A ação dos planificadores públicos encontrou um problema substancial,qual seja o de sua compatibilidade com o planejamento empresarial, que continuou subsistindoatrelado às leis do mercado. Essa busca de compatibilização é essencial, para que os esforçosdesenvolvidos não se contraponham, mas persigam a possibilidade de colocação de metas queinteressem a ambos os lados”.67 Fonseca, João Bosco Leopoldino da. op. cit. p. 253.

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reajuste das prestações mensais do financiamento.

O grande problema que aflige a maioria dos financiamentoshabitacionais está no saldo devedor, que permanece intocado.

O mutuário, ao contratar o financiamento habitacional junto aoagente financeiro, estará se obrigando ao pagamento de um determinadosaldo. Esse saldo terá que ser pago em prestações mensais. A grandemaioria dos contratos em vigor prevê o reajuste das prestações na mesmaproporção do salário do mutuário, isto é, se há aumento do salário, reajusta-se a prestação; se não há aumento do salário, não se reajusta a prestação.

Por outro lado, diferentemente da prestação, que é reajustadaobedecendo aos reajustes salariais do mutuário, o saldo devedor éreajustado mensalmente pela TR, em nada se identificando com o fato deo mutuário ter ou não aumento salarial. Aí está o grande problema. Umavez não tendo o mutuário reajuste salarial, a prestação não conseguiráamortizar (abater) devidamente o saldo devedor, gerando enorme resíduo(em alguns casos, superior ao valor de mercado do imóvel) a ser suportadopelo mutuário após o pagamento da última prestação. É comum a pessoanão ter dinheiro para pagar e, por isso, chegar a perder o imóvel.

O mutuário ao pagar a prestação não está somente amortizando osaldo devedor, mas também pagando ao agente financeiro pelo empréstimomais um seguro que serve de garantia da quitação do imóvel em caso desinistro.

Dessa forma, ainda que o governo federal edite regras e mais regras,procurando flexibilizar, buscando facilitar a obtenção de financiamentopara aquisição da tão sonhada casa própria, tais normas servirão tão-somente como paliativos, já que toda a problemática está na falta decapacidade de pagamento do saldo devedor pelo mutuário que, por serem sua grande maioria assalariado, e depender unicamente do salário parasaldar suas dívidas, vem sofrendo os efeitos da atual política salarialrecessiva.

Cabe salientar, que o que era na verdade uma ação estatal quetrouxe muitos benefícios de natureza social, traz hoje, muitos desconfortossociais, econômicos e jurídicos aos que necessitam e ingressam no mundo

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do financiamento da casa própria. E a pergunta é, será que o Estado temoferecido defesa à família, uma das primeiras providências que se devetomar, para que, fortalecida, possa alicerçar o edifício de toda umaorganização jurídica, política, econômica e social?

O Estado deve intervir porque é legítimo, afora os problemas decrise de legitimidade política que o Poder Estatal enfrenta, porque temcompetência, e principalmente em momentos de crise, quando será maisimportante sua presença para garantir a plenitude do exercício dos direitoshumanos. O que se pretendeu dizer é que a pretensão da exclusividade dodireito estatal, como única forma jurídica a regular a vida social, vaidepender, para se concretizar, do nível de sua eficácia real que, por suavez, é condicionada pelo grau de legitimidade, de onde aceitaçãoconsensual do regime político, que produz e aplica o direito.

Assim como, segundo Hesse 68,

a força vital e a eficácia da Constituição assentam-se na suavinculação às forças espontâneas e às tendências dominantes do seu tempo, oque possibilita o seu desenvolvimento e a sua ordenação objetiva. AConstituição converte-se, assim, na ordem geral objetiva do complexo derelações da vida.

Ao verificar-se portanto, que o crescimento acelerado não levanecessariamente à maior equidade e justiça social, mister tornar-se-ia oexame da viabilidade de caminhos e instrumentos alternativos para aconsecução do objetivo último – uma sociedade justa e harmonicamenteequilibrada.

Sobre as formas de planejamento, João Bosco cita Friedman, oqual trabalha sob o prisma do planejamento social com perspectivas paraa reforma social, a mobilização social, a análise de políticas e aaprendizagem social; as primeiras, de tendência radical, as segundas detendência conservadora 69.

Sobre a eficácia do plano, João Bosco cita Henri Jacquot o qual68 Hesse, Konrad. A força normativa da Constituição. Trad. Gilmar F. Mendes. Porto Alegre:Fabris, 1991., p. 18.69 Fonseca, João Bosco Leopoldino da. op. cit. p. 256.

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defende a idéia de que o plano é um simples comprometimento unilateral doEstado”, pois o plano apresenta-se “... como um conjunto de medidas a seremtomadas, de tarefas a serem cumpridas, de objetivos a realizar durante um determinadoperíodo 70.

Entretanto, a observação mais amadorista da evolução e daproblemática das grandes aglomerações metropolitanas revelará o fracassodas medidas e “soluções” propostas pelo poder público, profundamentemergulhado nas crises habitacional, de transporte, de saneamento básico,de saúde, de educação e de segurança pública. Os fracassos, raramenteadmitidos, mesmo quando constatados mediante processos de avaliaçãoapropriados, são atribuídos, ora à falta de organização e de apoio, ora àescassez de recursos humanos e financeiros. Contudo, é no próprio métodode atuação e seus modelos teóricos explícitos ou implícitos que devemser procuradas as razões da pouca eficácia da intervenção do poder público.

É mister, para que o planejamento produza resultados satisfatórios,referir-se à teorias sociológicas adequadas e que atendem à realidade social.É conveniente, segundo Fábio Konder Comparato 71, que o órgão deplanejamento suscitasse a colaboração de entidades profissionais e de associações deusuários e consumidores, pondo dessa forma em atuação todos os instrumentosdisponíveis de uma democracia participativa, a fim de que, as funções de controlee avaliação do desempenho executivo dos programas de ação, fossem defato fiscalizados.

Em outras palavras, segundo o prefácio de Aurélio Wander Bastosà obra de Lassale72, se a Constituição escrita não corresponde aos fatores reais depoder, a Constituição real, tanto por um lado – o rei, a aristocracia, a grande burguesia

70 Idem, ibidem. p. 267. Assim, para Jacquot, citado por João Bosco: “o comprometimento dosPoderes Públicos, pelo fato de haver aprovado o Plano, gera para eles obrigações de comportamento,ou seja, os Poderes Públicos estarão adstritos a agir de forma a perseguir e alcançar os objetivosfixados, a tomar todas as medidas que sejam necessárias, suficientes e adequadas para realização dasmetas estabelecidas no Plano”. (p. 268)71 Comparato, Fábio Konder. op. cit. p. 91.72 Lassalle, Ferdinand. A essência da Constituição. 4ª ed. RJ: Lumen Juris, 1998., p. 13. Para melhoresclarecimento diz Lassalle: “ Os problemas constitucionais não são problemas de direito, mas dopoder; a verdadeira Constituição de um país somente tem por base os fatores reais e efetivos do poderque naquele país vigem e as constituições escritas não têm valor nem são duráveis a não ser queexprimam fielmente os fatores do poder que imperam na realidade social: eis aí os critériosfundamentais que devemos sempre lembrar” (p. 53).

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– quanto por outro – a consciência nacional – está ameaçada.

Planejar sem investigar e diagnosticar as causas dosubdesenvolvimento e da marginalização de vastos contingentes dapopulação é tapar o sol com a peneira e tenderá inevitavelmente a agravaraqueles problemas sociais, cuja solução é invocada como legitimação daintervenção sistemática e dirigida do poder público.

Cabe dizer, com Lassale 73

uma Constituição escrita, cuja missão é a de estabelecerdocumentalmente, numa folha de papel, todas as instituições e princípios dogoverno vigentes, que não corresponder à real, irrompe inevitavelmente umconflito que é impossível evitar e no qual, mais dia menos dia, a constituiçãoescrita, a folha de papel, sucumbirá necessariamente, perante a constituiçãoreal, a das verdadeiras forças vitais do país.

Nesse passo a dignidade da pessoa humana apenas restará plenamenteassegurada se e enquanto viabilizado o acesso de todos não apenas às chamadasliberdades formais, mas, sobretudo, às liberdades reais 74.

É preciso, segundo José Joaquim Gomes Canotilho e Vital Moreira,citados por Eros R. Grau 75 , que o sentido da dignidade humana não sereduza à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitossociais, ou invocá-la para construir uma ‘teoria do núcleo da personalidade’ individual,ignorando-a quando se trate de direitos econômicos, sociais e culturais.

Jean Lojkine, argumenta que a planificação estatal, é uma formadesenvolvida da socialização capitalista, para:

... ‘acertar’ as contradições econômicas e sociais que o solapam; masna medida em que a ele se mostra incapaz, a longo prazo, de dominá-lasrealmente, na medida em que a planificação estatal aparece subordinadanão a uma lógica de controle racional, pela sociedade, de seu desenvolvimentocoletivo mas sim à lógica de acumulação do capital privado, a planificação

73 Idem, ibidem., op. cit. p. 41 e 47.74 Grau, Eros Roberto. A ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e Crítica) SP:RT, 1991. p. 218.75 Idem, ibidem. p. 218.

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assim como o conjunto da política estatal agem menos como instrumento deregulação do que como revelador de uma sociedade retalhada pelo conflito declasses antagônicas 76 .

Sobre políticas públicas para áreas urbanas Eli Diniz 77, questiona

... como seria possível a reorientação das políticas públicas no sentidodo favorecimento das camadas populares. Uma tendência que se delineia,no contexto das alternativas possíveis, é a que procura combinar a intervençãodo Estado com a participação comunitária. Trata-se de um novo enfoque,cujo êxito ao nível do poder local vem estimulando a busca de um novopadrão de governo e administração, no qual a participação intensa dos gruposinteressados tem um peso decisivo.

Contudo, é mister que nossos planejadores preocupem-se emmanipular novas técnicas de planejamento urbano, efetuando pesquisas emodelagem sofisticadas, usando-as para atender às necessidades sociais eencontrar soluções para o transporte coletivo, as habitações populares e oacesso dos mais pobres a lotes urbanos com infra-estruturas mínimas,dirigidas especialmente à massa de desassistidos, pois

Há uma grande ênfase em valores ligados à dignidade do homem, à

76 Lojkine, Jean. O Estado Capitalista e a Questão Urbana. SP: Martins Fontes, 1997. p. 343, 344e 347. Afirma ainda que: “segregação totalmente diferente da segregação capitalista do estágioclássico onde se opunham no interior da própria cidade, bairros ‘burgueses’ e bairros ‘operários’: anova divisão social e técnica do trabalho leva, nos grupos monopolistas, a uma autonomizaçãoespacial de suas atividades de mando e, por via de conseqüência, a uma apropriação dos principaislugares de concentração dos meios de concepção e de difusão da informação. Ao emaranhadourbano das atividades produtivas, comerciais e residenciais, sucede assim o imenso zoneamento das‘megalópoles’ onde a ocupação do espaço é determinada pelo mecanismo de seleção rigorosa darenda fundiária, mecanismo esse fundado no modo de localização das atividades de direção dosgrupos monopolistas. Enquanto as migrações rurais tinham até então favorecidos essencialmente asaldeias e cidadezinhas vizinhas, agora é para as grandes concentrações urbanas – indústrias outerciárias - que se dirigem os migrantes. Os ‘grandes conjuntos habitacionais’ periféricos surgem nãosó em torno das metrópoles, mas também em torno das capitais provinciais, com todas asconseqüências sociológicas de semelhante alteração: novas concentrações proletárias, novasnecessidades em equipamentos coletivos, mas também a ruína das ‘classes médias urbanas’(comerciante, artesãos, pequenos empresários, profissionais liberais) que dominavam outrora ospoderes políticos locais e mostram-se incapazes de resistir às investidas das operações de ‘renovação’urbana e dos novos centros comerciais”.77 Diniz, Eli. Cintra (Org.), Antonio Octavio. Brasileiro, Ana Maria. Azevedo, Sérgio de. PolíticasPúblicas para Áreas Urbanas -Dilemas e Alternativas. RJ: Zahar, 1982. p. 13, 14.

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sua ‘humanização’ e novamente a busca de ideais igualitários. Estes deverãoser perseguidos através de um outro tipo de desenvolvimento, umdesenvolvimento que respeite a vontade, a criatividade e as condições locais eos limites impostos pela natureza. O racional se aproxima do razoável, dobom senso 78.

5. Princípio Constitucional de efetividade máxima.Concretização e aplicabilidade dos direitos sociais

A incorporação na ordem jurídica de dimensão constitucional, dosdireitos fundamentais considerados “naturais” e “inalienáveis” doindivíduo, chama-se positivação.

Canotilho, quando trata da constitucionalização de direitossubjetivos do homem, diz que a conseqüência principal da proteção dosmesmos se faz mediante o controle jurisdicional de constitucionalidadedos atos normativos desses direitos, esse é o motivo pelo qual, os direitosfundamentais devem ser compreendidos, interpretados e aplicados como normas jurídicasvinculativas e não como trechos ostentatórios ao jeito das grandes ‘declarações dedireitos’ 79.

Norberto Bobbio 80, trata da positivação dos direitos, a que elechama

A passagem de um sistema de direitos em sentido fraco, na medidaem que estavam inseridos em códigos de normas naturais ou morais, paraum sistema de direitos em sentido forte, como o são os sistemas jurídicos dosEstados nacionais, (...) afirma o autor que, “que não permite chamar de‘direitos’ a maior parte das exigências ou pretensões validadasdoutrinariamente, ou até mesmo apoiadas por uma forte e autorizada opiniãopública, enquanto elas não forem acolhidas num ordenamento jurídicopositivo.

Para Bobbio81, a proliferação dos direitos do homem, suscitou o78 Idem, ibidem., p. 48. Para maiores esclarecimentos remetemos o leitor à leitura das páginas 53,54, 59, - artigo de Ana Maria Brasileiro, tema Políticas Sociais para áreas urbanas.79 Idem, ibidem. p. 354.80 Bobbio, Norberto. A era dos Direitos. RJ: Campus, 1992. p. 81.

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reconhecimento dos direitos sociais e, em conseqüência, uma proteçãoassegurada através de uma intervenção ativa do Estado, pois que essesnovos direitos exigem, para sua realização prática, ou seja, para a passagem dadeclaração puramente verbal à sua proteção efetiva, precisamente o contrário daproteção dos direitos de liberdade, que nasceram contra o superpoder doEstado (limitando-o) , isto é, exigem, a ampliação dos poderes do Estado.

Ademais, continua Bobbio 82,

As exigências que se concretizam na demanda de uma intervençãopública e de uma prestação de serviços sociais por parte do Estado só podemser satisfeitas num determinado nível de desenvolvimento econômico etecnológico; e que, com relação à própria teoria, são precisamente certastransformações sociais e certas inovações técnicas que fazem surgir novasexigências, imprevisíveis e inexeqüíveis antes que essas transformações einovações tivessem ocorrido.

A doutrina dos direitos do homem evoluiu muito, desde seuaparecimento no pensamento político dos séculos XVII e XVIII e, -segundo Bobbio 83 -

Descendo do plano ideal ao plano real, uma coisa é falar dos direitosdo homem, direitos sempre novos e cada vez mais extensos, e justificá-loscom argumentos convincentes, outra coisa é garantir-lhes uma proteção efetiva,considera ainda, que, à medida que as pretensões aumentam, a satisfaçãodelas torna-se cada vez mais difícil. Os direitos sociais, como se sabe, sãomais difíceis de proteger do que os direitos de liberdade.

Outra questão que Bobbio considera, é o da aplicação das normasjurídicas, ou do fenômeno a que ele chama ‘implementation’ 84, dizendo que

O campo dos direitos do homem – ou, mais precisamente, das normasque declaram, reconhecem, definem, atribuem, direitos ao homem – aparece,certamente, como aquele onde é maior a defasagem entre a posição da normae sua efetiva aplicação. E, essa defasagem é ainda mais intensa precisamente

81 Bobbio, Norberto. op. cit. p. 72.82 Bobbio, Norberto. op. cit. p. 7683 Idem, ibidem. p. 63.84 Idem, ibidem. p. 77.

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no campo dos direitos sociais. Cita que na Constituição italiana, ... asnormas que se referem a direitos sociais foram chamadas pudicamente de‘programáticas’. Será diz o autor, que ... já nos perguntamos alguma vezque gênero de normas são essas que não ordenam, proíbe ou permitem hic etnunc, mas ordenam, proíbem e permitem num futuro indefinido e sem umprazo de carência claramente delimitado? 85

Segundo Raul Machado Horta, 86 foi

A passagem da Constituição clássica dos séculos XVIII e XIX,cuja matéria praticamente se exauria na organização dos Poderes do Estadoe na Declaração dos Direitos e Garantias Individuais, para a Constituiçãomoderna, que ampliou o conteúdo da matéria constitucional, coincide, também,com a expansão das normas programáticas no documento constitucional.

Jorge Miranda citado por Raul M. Horta 87, entende que

Nas Constituições Sociais, Socializantes ou Socialistas do séculoXX , as normas de fundo, bem como as normas de garantia, dilatam-semuitíssimo e passam a prever direitos sociais e a organização econômica.Deparam-se então, com maior ou menor equilíbrio com as normaspreceptivas, os problemas postos pelas normas programáticas.

85 Idem, ibidem. p. 78. Para melhor esclarecimento da idéia do autor: “E, sobretudo, já nos perguntamosalguma vez que gênero de direitos são esses que tais normas definem? Um direito cujo reconhecimentoe cuja efetiva proteção são adiados sine die, além de confiados à vontade de sujeitos cuja obrigaçãode executar o “programa” é apenas uma obrigação moral ou, no máximo, política, pode ainda serchamado corretamente de “direito”? A diferença, entre esses auto-intitulados direitos e os direitospropriamente ditos não será tão grande que torna impróprio ou, pelo menos, pouco útil o uso damesma palavra para designar uns e outros? E, além do mais, a esmagadora maioria de normas sobreos direitos do homem, tais como as que emanam de órgãos internacionais, não são sequer normasprogramáticas, como o são as normas de uma Constituição nacional relativas aos direitos sociais.Ou, pelo menos, não o são enquanto não forem ratificados por Estados particulares”., que, segundoa “pesquisa realizada pelo professor Evan sobre o número de ratificações das duas Convençõesinternacionais sobre os direitos do homem”, identificou que: “As cartas de direitos, enquantopermanecerem no âmbito do sistema internacional do qual promanam, são mais do que cartas dedireitos no sentido próprio da palavra: são expressões de boas intenções, ou, quando muito, diretivasgerais de ação orientadas para um futuro indeterminado e incerto, sem nenhuma garantia de realizaçãoalém da boa vontade dos Estados, e sem outra base de sustentação além da pressão da opiniãopública internacional”.86 Horta, Raul Machado. Estudos de Direito Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 1995. p. 221.87 Idem, ibidem. p. 222.

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Para ele, é através da norma programática que ocorre a mutaçãoconstitucional, fenômeno que acomoda as novas tendências da vontadepopular, periodicamente compostas pelo Poder Legislativo, responsável pelaconcretização da norma programática.

Para Mortati, citado por Raul M. Horta 88, a norma programática,como princípio constitucional configura a Constituição Compromissória, - istoé, aquela que resulta - dos compromissos entre correntes políticas plurais, nãohomogêneas e freqüentemente antagônicas, que atuam no quadro pluralista daAssembléia Constituinte dos regimes democráticos.

Para o constitucionalista José Afonso da Silva 89, são os elementossócio-ideológicos o conjunto de normas que revelam o caráter de compromissodas constituições modernas entre o Estado liberal e o Estado social intervencionista,o primeiro consagrou um estatuto negativo de proteção ao indivíduo contraabusos do poder absoluto, o segundo busca suavizar as injustiças e opressõeseconômicas e sociais que se desenvolveram à sombra do liberalismo. Todavia,segundo o autor, as reivindicações sociais mal conseguem introduzir-se nas cartasconstitucionais.Não são eficazes, mas, normas constitucionais de princípioprogramático, apenas esquemas genéricos, simples programas a serem desenvolvidosulteriormente pela atividade dos legisladores ordinários. São guias para que oEstado realize seus fins sociais, através da atuação de programas de intervençãona ordem econômica, com vistas à realização da justiça social, valor-fim do Direito,que é uma aspiração do nosso tempo, em luta aberta contra as injustiças doindividualismo capitalista.

Com efeito, para José Afonso da Silva ... o reconhecimento dos direitossociais, como instrumento de tutela dos menos favorecidos, não teve, até aqui, aeficácia necessária para reequilibrar a posição de inferioridade que lhes impede oefetivo exercício das liberdades garantidas 90.

Por sua vez, Cezio Crisafulli, citado por Raul M. Horta 91, rejeita adistinção entre normas programática, diretiva e obrigatória, pois toda norma

88 Idem, ibidem. p. 222.89 Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. SP: Malheiros, 1997, p. 719/ 720.90 Silva, José Afonso da. op. cit. p. 721.91 Horta, Raul Machado. op. cit. p. 223.

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constitucional é sempre obrigatória, característica da Constituição rígida, e que aseparação, segundo ele, ‘mutilaria a Constituição, suprimindo dela uma parte essêncial’.

Daí que, a soberania popular não deve ser, segundo Paulo LopoSaraiva 92, mera peça de retórica, mas um meio pelo qual o povo exerçaseus direitos e prerrogativas constitucionais e legais em toda a suaplenitude: viver decentemente, morar, trabalhar, estudar, ser saudável;portanto, diz ele, não é mais aceitável que no texto constitucional incluam-se normas de simples programa, pelo contrário, é mister que as normas eos princípios constitucionais sejam plenamente eficazes, produzindo todosos efeitos jurídicos que todos esperam.

... Portanto, não há, evidentemente, direitos sem garantia. Nãobasta, também, a Constituição proclamar uma série de direitos e garantias,se estes e estas não se podem concretizar. Citando Lassale, diz que averdadeira Constituição é aquela que faz coincidir a verdade normativa coma verdade social. A distância entre o dizer e o fazer vai cada vez mais sendoinsuportável no Brasil, pois o povo está se conscientizando de que, se não semobilizar, jamais poderá avançar no processo de conquistas políticas e sociais,de vez que nenhum Príncipe deseja perder suas regalias. A vitória do povosó será obtida por meio da luta. Neste sentido, é válido afirmar que ‘a lutafaz a lei’. E essas garantias que a Constituição consagrou ... nãodevem ser entendidas como uma benesse do poder para com o povo, masantes como uma exigência das bases que obrigam as cúpulas a revisar seusparâmetros legais e a negociar suas pretensões políticas.

Antonio Augusto Cançado Trindade, com relação ao avanço nabusca de proteção mais eficaz no plano global 93 dos direitos econômicos,sociais e culturais 94, afirma que foram trazidas propostas com ênfase na

92 Souza Júnior, José Geraldo. Org; (colaboradores) Alayde Sant’anna... (et al.), op. cit. p. 141/142.93 Trindade, Antonio Augusto Cançado. Desenvolvimento Econômico e Intervenção do Estado naOrdem Constitucional. Estudos jurídicos em homenagem ao Professor Washington Peluso Albinode Souza. (colaboradores) Arthur Diniz... (et. al.) Porto Alegre: Fabris, 1995. p. 30. “Recentemente,em meados de 1992, também no seio da Subcomissão de Prevenção de Discriminação e Proteção deMinorias das Nações Unidas, têm-se avançado recomendações concretas no propósito de asseguraruma proteção internacional mais eficaz dos direitos econômicos, sociais e culturais”.

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implementação, exigibilidade e justiciabilidade desses direitos, pois ocontrário - a denegação ou a violação dos direitos humanos -materializariam uma pobreza extrema, afetando os seres humanos em todasas esferas de suas vidas 95, inclusive civil e política.

Finalizando este item, cabe-nos dizer que a pessoa humana deveestar no centro do processo de desenvolvimento, para tanto, requer-seum espírito de maior solidariedade e consciência em que, como afirmaTrindade: a sorte de cada um está inexoravelmente ligada à sorte de todos 96.

94 Trindade, Antonio Augusto Cançado. Desenvolvimento Econômico e Intervenção do Estado naOrdem Constitucional. Estudos jurídicos em homenagem ao Professor Washington Peluso Albinode Souza. (colaboradores) Arthur Diniz... (et. al.) Porto Alegre: Fabris, 1995. p. 30. Discrimina asrecomendações propostas da seguinte forma: “Primeiramente, propôs-se a nomeação, pela Comissãode Direitos Humanos das Nações Unidas (a exemplo do que já faz a própria Subcomissão), derelatores especiais para examinar ou investigar determinados aspectos dos direitos econômicos,sociais e culturais (e. g., pobreza externa, e realização do direito a uma moradia adequada), commandatos semelhantes aos dos atuais rapporteurs temáticos. Propuseram-se igualmente, em segundolugar, recomendações pelo Comité de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais aos Estados Partesno Pacto correspondente, acerca de alterações legislativas e de políticas públicas que sejam necessáriaspara harmonizar plenamente a prática dos Estados com as disposições do referido Pacto;paralelamente, sugeriu-se que os Estados deveriam estabelecer mecanismos apropriados (judiciaisou administrativos) de supervisão, em nível nacional, dos direitos econômicos, sociais e culturais.Em terceiro lugar, recomendaram-se maiores avanços na proposta do estabelecimento de umProtocolo Facultativo ao Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, dotando-o de umsistema de petições ou comunicações(supra), assim como na sistematização e consolidação do usode indicadores no processo de monitoramento de tais direitos. Enfim, em quarto lugar, insistiu-sena promoção e utilização do princípio emergente de ‘obrigações mínimas’ relativas aos direitoseconômicos, sociais e culturais”.95 Trindade, Antonio Augusto Cançado. op. cit. p. 31. Complementa o autor, perguntando: “Comofalar de direito de livre expressão sem o direito à educação? Como conceber o direito de ir e vir(liberdade de movimento) sem o direito à moradia? Como contemplar o direito de participação navida pública sem o direito à alimentação? Como referir-se ao direito à assistência judiciária sem aomesmo tempo Ter presente o direito à saúde? E os exemplos – diz categoricamente – se multiplicam.Em definitivo, todos experimentamos a indivisibilidade dos direitos humanos no quotidiano denossas vidas: é esta uma realidade inescapável. Já não há lugar para compartimentalizações, impõe-se uma visão integrada de todos os direitos humanos”.96 Idem, ibidem. p. 37.

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6. Dignidade da pessoa humana como fundamento doEstado Democrático de Direito

A dignidade da pessoa humana é fundamento do EstadoDemocrático de direito, previsto na Constituição Federal do Brasil emseu art. 1º, inciso III, assumindo relevância, pois compromete todo oexercício da atividade econômica e social em sentido amplo e exige aadoção de um programa, segundo Eros Roberto Grau 97, de promoção daexistência digna de que todos devem gozar. Daí porque se encontram constitucionalmenteempenhados na realização desse programa – (...) – tanto o setor público quanto osetor privado.

Cabe dizer, com Canotilho98 que,

O princípio da democracia económica e social contém uma imposiçãoobrigatória dirigida aos órgãos de direcção política (legislativo, executivo) nosentido de desenvolverem uma actividade económica e social conformadora,transformadora e planificadora das estruturas socioeconómicas, de forma aevoluir-se para uma sociedade democrática...

Noutras palavras, se ao Estado Democrático de direito cabe comoobjetivo fundamental construir uma sociedade livre, justa e solidária (art.3º, inciso I, da CF/88), impõe-lhe desenvolver as tarefas necessárias detransformação, modernização, desenvolvimento e realização da ordemeconômica prevista na Constituição de 1988, com o fim de não fazê-latornar-se um papel inútil – sem valor e sem aplicação, para realmentepromover a igualdade real entre os brasileiros e consequentemente aredução das desigualdades regionais e sociais.

Com efeito, José Afonso da Silva, citado por Fernando Ferreirados Santos 99, afirma que

instituir a dignidade da pessoa humana como fundamento do EstadoDemocrático de Direito importa, ainda, em conseqüência, condições mínimas

97 Grau, Eros Roberto. op. cit. p. 217/218.98 J. J. Gomes Canotilho. op. cit. p. 325.99 Santos, Fernando Ferreira dos. Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. SP:Celso Bastos Editor, 1999, p. 79.

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de existência, em que uma existência digna se imponha como fim da ordemeconômica, não se tolerando, pois, profundas desigualdades entre os membrosde uma sociedade.

Para Fernando Ferreira dos Santos 100, o que caracteriza o ser humano,e o faz dotado de dignidade especial, é que ele nunca pode ser meio para os outros,mas fim em si mesmo. Nesse sentido, o Direito e o Estado existem em funçãode todas as pessoas e não estas em função do Estado. Isto é, não se exalta oindividualismo, o homem abstrato, típico do liberalismo-burguês, mas o ser humanoenquanto uma pedra-de-edifício no todo, e, portanto, uma forma do mais alto gênero,uma pessoa, em sentido amplo. Ou seja, cada indivíduo é parte universal econcreta de toda a humanidade, sendo ele paradigma que avalia a ação doPoder Público e um dos elementos imprescindíveis de atuação do Estado brasileiro.

Portanto, o Estado não busca atingir um fim próprio, mas os finsdos múltiplos indivíduos, uma vez que os direitos fundamentais do homem sãoinatos e anteriores ao Estado, em que, num conflito indivíduo versus Estado, privilegie-se aquele, sempre e em qualquer situação, segundo lição de Fernando Ferreirados Santos.

Saliente-se que, a respeito da dimensão negativa, para JorgeMiranda, citado por Fernando Ferreira dos Santos 101, afirma que a dignidadepressupõe a autonomia vital da pessoa, a sua autodeterminação relativamente aoEstado, às demais entidades públicas e às outras pessoas. Para Canotilho, tambémcitado por Ferreira, dignidade é a libertação da ‘angústia da existência’ dapessoa mediante mecanismos de socialidade, dentre os quais se incluem a possibilidadede trabalho e a garantia de condições existênciais mínimas.

Por outro lado, a dimensão positiva constitutiva da dignidade

Presume o pleno desenvolvimento de cada pessoa, que supõe, de um lado, oreconhecimento da total autodisponibilidade, sem interferências ouimpedimentos externos, das possibilidades de atuação próprias de cadahomem; de outro, a audeterminação que surge da livre projeção histórica darazão humana, antes que uma predeterminação dada pela natureza 102.

100 Idem, ibidem. p. 91/93.101 Idem, ibidem. p. 96.102 Santos, Fernando Ferreira dos. op. cit. p. 97.

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Finalizando, o autor diz que em virtude da primazia da dignidade dapessoa humana, esta há de permanecer inalterável qualquer que seja a situação emque a pessoa se encontre, constituindo, em conseqüência, um minimun 103, que todoo ordenamento jurídico deve assegurar, e que nenhum outro princípio ouvalor pode sacrificar ou ferir o valor da pessoa.

Com efeito, diz Fábio Konder Comparato 104,

Se os fundamentos da legitimidade política evoluem historicamente, e se ademocracia parece ser, incontestavelmente, o critério predominante delegitimidade dos tempos modernos, importa reconhecer que, para a sociedadede massas contemporânea, já não basta a afirmação da soberania popular ea garantia dos direitos fundamentais da pessoa humana, como base daconvivência política. Importa, ainda, estabelecer as condições institucionaisde direção eficaz do processo de desenvolvimento nacional.

Se entendermos esse processo como a elevação constante do nível de vida e amelhoria permanente da qualidade de vida de toda uma população, é precisoreconhecer que se trata de uma exigência universal, não limitada a algunspaíses apenas, ou restrita a uma só fase histórica da vida de uma nação. Demodo geral, todos os países, ricos ou pobres, antigos e recentes, devemdesenvolver-se, visando à humanização integral das condições de vida.

Salienta ainda, que em respeito à dignidade da pessoa humana, jánão cabe mais ao Estado tão somente legislar e aplicar as leis, é precisotanto mais, programar e executar as grandes políticas nacionais.

Ademais, é preciso dizer que o Estado, ao realizar tarefaseconômicas e sociais, deve acima de tudo levar em consideração asdivergências nas vidas concretas, pois há uma gama ampla e diversificadade comunidades, em que as pessoas podem ingressar, levando estilos devida diferentes, cabendo ao Estado Democrático concretizar as visões dobem estar de cada povo.

Verifica-se, portanto, que o Estado, como sociedade política, temum fim geral, constituindo-se em meio para que os indivíduos e as demais103 Idem, ibidem. p. 113, item 42.104 Comparato, Fábio Konder. Desenvolvimento Econômico e Intervenção do Estado na OrdemConstitucional. Porto Alegre: Fabris, 1995, p. 82.

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sociedades possam atingir seus respectivos fins particulares. Assim, pois,pode-se concluir que o fim do Estado é o bem comum, entendido estecomo sendo o conjunto de todas as condições de vida social que consintame favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana: buscao bem comum de um certo povo, situado em determinado território.

Vale dizer, no entendimento de José Alfredo de Oliveira Baracho que:

Qualquer tipo de estrutura econômica ou social deverá,primeiramente, considerar que as pessoas são diferentes entre si, - ou seja -,diferem em temperamento, interesses, capacidade intelectual, aspirações,inclinações naturais, anseios espirituais e modo de vida. Divergem nos valoresque aceitam e usam pesos diferentes para aqueles que compartilham 105.

Todavia o que presenciamos, segundo informações de Baracho, é que

Os princípios fundamentais ou básicos para uma melhor sociedade,na qual todos possam viver, nem sempre realizam, concretamente, um únicotipo de comunidade aceitável por todos, desde que será impossível definir,para todas as pessoas, exclusivo modo de vida e de viver. Não se podeesquecer, que as pessoas são complexas, como são as várias formas derelacionamento entre elas 106 .

Ademais, quando o Estado esfacela-se, acaba marginalizando asociedade e desestimulando as iniciativas, o que é intolerável, pois aSociedade moderna não pode agüentar um sistema administrativo supercarregado edesorganizado, (...) com funções ‘minimalistas’, do século XIX, para Crozier, citadopor Baracho 107.

O sistema arcaico e estático embrutece e atrasa a sociedade, pois,segundo Baracho 108, o Estado não consegue modernizar as atividades e os serviçosque ele criou (saúde, transporte, educação, previdência, justiça).

São evidentes, portanto, as necessidades de modificações daspolíticas públicas, ao passo que a sociedade muda sozinha, quando vê

105 Baracho, José Alfredo de Oliveira. Desenvolvimento Econômico e Intervenção do Estado naOrdem Constitucional. Porto Alegre: Fabris, 1995, p. 100.106 Idem, ibidem. p. 100/101.107 Baracho, José Alfredo de Oliveira. op. cit. p. 102.108 Idem, ibidem. p. 102.

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que é necessário. É o Estado muitas vezes que impede as transformações,procurando levar a sociedade para uma direção oposta à que pretendiainiciar ou experimentar.

7. Morar como direito e garantia humana fundamental

Enfatiza Thomas Humphrey Marshall 109 que o direito básico de ter ocidadão uma moradia, seja lá qual fôr, é mínimo. Para o autor, resolver o problemada habitação é para o Estado em relação à sociedade como umacoletividade, uma das mais sérias preocupações que tem de enfrentar.Daí decorre que, fazer política habitacional é oportunizar aos cidadãosseus direitos de cidadania 110.

No Brasil, inobstante a proteção do Estado, proteção essa,efetivada através de um financiamento da casa própria, não é asseguradauma proteção ampla e profícua. Senão vejamos: o Estado estabelecenormas que prejudicam a defesa do financiado após a efetivação donegócio, já que, como dissemos anteriormente, o cidadão pode chegar aperder o imóvel financiado, pois ninguém, na atualidade, tem reajustesalarial mensal, ao contrário do saldo devedor financiado, chegando numdeterminado momento em que o mutuário se verá impossibilitado de pagarpelo financiamento, e isso inviabiliza os financiamentos em geral.

Perde o Estado neste aspecto a visão de que, a sua maior missãoé a de preservar o organismo familiar sobre que repousam suas bases.Cada família que se desprotege, cada família que se vê despojada, a pontode insegurar-se quanto à sua própria preservação, causa, ou pelo menosdeve causar, ao Estado, um sentimento de responsabilidade, fazendo-odespertar para uma realidade que clama por uma recuperação. O dever deproteção geral aos indivíduos cabe ao mesmo Estado, que deve intervir,sempre, para coibir os excessos, para impedir a colisão de interesses,acentuando a salvaguarda dos coletivos mais do que dos particulares,109 Marshall, Thomas Humphrey. Cidadania, Classe Social e Status. RJ: Zahar Editores, 1967. p. 97.110 Idem, ibidem. p. 98. Para entendermos essa idéia de cidadania, diz o autor: “Surge quando o planode habitação, ao qual, como afirmei, os direitos individuais devem ceder lugar, não se limita a umsetor da camada inferior da escala social nem a um tipo específico de necessidade, mas abrange osaspectos gerais da vida de uma comunidade inteira”.

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para limitar uma liberdade de ação, para que ela não fira a alheia, aindamais quando for letal esse ferimento de quebra de uma estrutura de quedependam todos.

A razão de ser do homestead - local do lar, encontra-se no espíritodo povo pelo respeito à atividade e à independência individual, no sentidode uma maior segurança e proteção em caso de infortúnio. Dar ao indivíduoo direito de morar é promover-lhe o mínimo necessário a uma vida decentee humana. É proporcionar-lhe condições mínimas de sobrevivência. Acasa é o lugar de encontro de várias gerações que, reciprocamente, ajudam-se a alcançar uma sabedoria mais plena e a conciliar os direitos pessoaiscom as outras exigências da vida social.

Os processos e as funções que se desenvolvem na família são decaráter contínuo e exigem múltiplos e constantes esforços. Em épocas decalamidade pública, os homens podem trabalhar, lutar e morrer por seupaís, mas labutam por sua família todos os dias ao correr de sua vida. Asexigências da vida familiar leva os homens a realizarem os mais penososesforços e a assumirem as mais graves responsabilidades, inclusive paragarantir o direito à moradia digna, a de tornar-se um prisioneiro do sistemafinanceiro.

Vale dizer que no seio da família desenvolve-se uma vida socialque está saturada de intimidade. Com efeito, muitas das dimensões maisíntimas do indivíduo encontram expressão manifesta ou implícita na vidafamiliar, que é uma espécie de intimidade cálida, que permite a seuscomponentes manifestar e realizar seu fundo secreto fora do alcance dosolhares indiscretos. A família autêntica é o ambiente onde tudo se adivinha,sem necessidade de ser expresso, onde tudo é comum, sem deixar de serindividual. Na família combinam-se uma espécie de sociabilidade comuma espécie de intimidade. É sede de condutas tipicamenteinterindividuais, como são as de amor mas, ao mesmo tempo, é o lugarem que se aprendem muitos modos coletivos de conduta.

Pergunto: Como efetivar a intimidade e a sociabilidade da família,se nem ao menos o Estado protege de fato, o homem, garantindo-lhe odireito à moradia, ao lugar aconchegante, que todo o homem sabe quedeveria ter para descansar, cultivar os laços de amor e bem-estar familiar?

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A essa e outras questões é que pretendemos responder no decorrerdos estudos e análises por conta da dissertação do Mestrado.

Todavia, o direito à moradia está claramente assegurado em váriosdiplomas legais, tanto internos, quanto externos. Vejamos:

Segundo dispõe o art. 25 da Declaração Universal dos Direitos doHomem, in verbis:

ARTIGO 25 – (1) Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz deassegurar-lhe e à sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação,vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, eo direito à previdência em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez,velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstânciasfora de seu controle...No direito positivo brasileiro, segundo Nishlei Vieira de Mello,111

Nos dias de hoje encontram-se positivadas algumas das reivindicaçõesdos movimentos populares com relação ao direito de morar, o que não significaque não existam as dificuldades em garantir tais direitos. A Constituiçãobrasileira de 1988 atribui como competência da União a instituição dediretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamentobásico e transportes urbanos – art. 21, XX – e estabelece ser competênciacomum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios apromoção de programas de construção de moradias e a melhoria das condiçõeshabitacionais e de saneamento básico – art. 23, IX. Além disso, foi odireito de morar definido como tal pelo Direito Internacional, na ConferênciaHabitat II, ocorrida em Istambul, da qual é signatário o Brasil.Portanto, percebe-se que o direito à moradia é um direito essencial,

já há muito tempo fazendo parte do texto constitucional, agora robustecidocom sua expressa menção no elenco do artigo 6º; proporcionando, nomínimo, a facilitação da exigência de sua concretização. Mas para queseja realmente o direito escrito na Constituição concretizado, é preciso,no dizer de Hesse 112 ... não só a vontade de poder (Wille zur Macht), mastambém a vontade de Constituição (Wille zur Verfassung).

111 Mello, Nisheli Vieira. O direito de morar e o direito à memória – um olhar sobre o Acampamentoda Telebrasília. Brasília: Ed. UnB. p. 88.112 Hesse, Konrad. A força normativa da Constituição. Porto Alegre: Fabris, 1991. p. 18/19. trad.Gilmar Ferreira Mendes.

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Importa dizer, que necessário se faz, urgentemente que estejaimpregnado na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional,segundo Hesse113, a vontade de reestruturar, replanejar e reordenar, criandoum novo instituto da habitação, para implementar o direito à casa própria,que estabeleça novas e modernas metas de financiamentos com reajustesmínimos possíveis, a fim de beneficiar mais famílias, e assim verconcretizada a Constituição Federal.

Conclusões

Considerando que é objetivo fundamental do País melhorar ascondições de bem-estar do povo brasileiro, o que depende de um esforçode desenvolvimento da economia nacional e que o desenvolvimentoacarreta inevitáveis mudanças da estrutura econômica e social do país,bem como requer a atualização constante de aspectos de seu aparelhoinstitucional, entendemos que a intervenção estatal, instituindo a Lei4.380/64, que criou o Plano Nacional de Habitação e o Sistema Financeiroda Habitação, outrora foi eficaz; no entanto, nos tempos atuais, produzresultados desastrosos, talvez pelo desvio do objetivo primeiro, financiara casa própria às famílias carentes e pela incapacidade da administraçãopública e falta de colaboração e crescente esforço coletivo, possibilitandoo fracasso do Plano, sacrificando as liberdades democráticas e individuaisdo povo brasileiro.

Em outras palavras, o que de início se procurou assegurar - umarápida melhoria do homem – proteger a família oferecendo-lhe moradia,como fator de desenvolvimento e de permitir o acesso de uma partecrescente da população aos frutos do progresso e sucesso do plano,entendendo-o como um conjunto de decisões harmônicas destinadas aalcançar, no período fixado, determinado estágio de desenvolvimentoeconômico e social é, na realidade, puro comércio, pura atividade bancária,onde se empresta (financia) dinheiro ao interessado que atende inúmerasexigências com a instituição financeira estatal (Caixa Econômica Federal),pagando-se juros de igual forma por um longo e interminável prazo de

113 Idem, ibidem. p. 19.

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financiamento de sua casa própria – mais de vinte anos - tudo porque ohomem, assim como precisa do alimento, precisa de moradia parapreservar-se com um mínimo de existência digna.

A conclusão desta análise é que o Estado deveria garantir econcentrar a demanda por moradias por um longo período de tempo, oque poderia ser realizado através de uma política habitacional queoferecesse condições favoráveis de financiamento e por uma políticaurbana que permitisse um crescimento urbano menos concentrado, coma reserva de áreas de expansão para a construção.

Caso contrário, o déficit existente em moradias leva forçosamentea uma deterioração da qualidade de vida urbana com ampla repercussãopara o nível de bem-estar individual e coletivo.

Em que pese a ausência de eficácia social, não devemos esmorecer.A inovação constitucional trazida pela EC n 26/2000, merece aplauso, jáque consagra expressamente mais um dos direitos sociais, vinculando olegislador, o administrador e o julgador.

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