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Teorema Espectral Fabiani Coswosck CEUNES/UFES August 6, 2010 Contents 1 Introduªo 4 1.1 Terminologia e Notaªo ............................................ 5 2 Conceitos BÆsicos 6 2.1 Espao Vetorial, Produto Interno e Norma .................................. 6 2.2 Soma Direta e Decomposiªo Ortogonal ................................... 9 2.3 Exemplos .................................................... 12 2.3.1 2 (N ), o conjunto das sequŒncias complexas quadrado-somÆveis ................. 12 2.4 Aplicaıes Lineares ............................................... 14 2.4.1 Homomorsmos e Isometrias ..................................... 15 2.4.2 Espaos de Aplicaıes Lineares .................................... 16 2.4.3 Topologias Forte e Fraca de Operadores em L (H) ......................... 18 2.5 Exemplos .................................................... 19 2.5.1 O operador H em 2 (N ) ....................................... 19 2.6 Funcionais Lineares e Espao Dual ...................................... 20 2.7 Adjunto de um Operador Limitado em Espaos de Hilbert ......................... 22 3 `lgebras 24 4 Teoria Espectral 27 4.1 SØries para o Resolvente ............................................ 28 4.1.1 SØrie de Neumann ........................................... 28 4.1.2 SØrie de Taylor do Resolvente ..................................... 28 4.2 Exemplos .................................................... 31 4.2.1 O espectro do operador H ....................................... 31 5 CÆlculo Funcional Contnuo 32 6 Teorema Espectral 38 7 Conclusªo 43 7.1 Teorema Espectral e Diagonalizaªo de Operadores em Dimensªo Finita ................. 43 A Tpicos de Teoria da Medida 45 A.1 Teoremas de ConvergŒncia ........................................... 46 1

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Teorema Espectral

Fabiani CoswosckCEUNES/UFES

August 6, 2010

Contents

1 Introdução 41.1 Terminologia e Notação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

2 Conceitos Básicos 62.1 Espaço Vetorial, Produto Interno e Norma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62.2 Soma Direta e Decomposição Ortogonal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92.3 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

2.3.1 `2 (N�), o conjunto das sequências complexas quadrado-somáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . 122.4 Aplicações Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

2.4.1 Homomor�smos e Isometrias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152.4.2 Espaços de Aplicações Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 162.4.3 Topologias Forte e Fraca de Operadores em L (H) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

2.5 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 192.5.1 O operador H em `2 (N�) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

2.6 Funcionais Lineares e Espaço Dual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 202.7 Adjunto de um Operador Limitado em Espaços de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

3 Álgebras 24

4 Teoria Espectral 274.1 Séries para o Resolvente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

4.1.1 Série de Neumann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 284.1.2 Série de Taylor do Resolvente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

4.2 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 314.2.1 O espectro do operador H . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

5 Cálculo Funcional Contínuo 32

6 Teorema Espectral 38

7 Conclusão 437.1 Teorema Espectral e Diagonalização de Operadores em Dimensão Finita . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

A Tópicos de Teoria da Medida 45A.1 Teoremas de Convergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

1

Apresentação

A Análise Funcional é a disciplina da Matemática que estuda certas "estruturas algébrico-topológicas"1 . Maisespeci�camente, seu tema são os operadores lineares em espaços vetoriais de dimensão in�nita (ou �nita). A teoria évasta, complexa e extremamente importante para a Matemática devido a sua ubíqua relação com outras disciplinas,tais como a teoria das equações diferenciais parciais, a pesquisa operacional e a Mecânica Quântica.O Teorema Espectral é um resultado fundamental da Análise Funcional. Didaticamente, ele permite uma intro-

dução "transversal" ao tema, no sentido de proporcionar ao iniciante a oportunidade de estudar de forma integradavários tópicos da teoria. Naturalmente, essa característica também constitui uma di�culdade para quem labora comos rudimentos da álgebra e da análise. Contornar essas di�culdades foi um dos desa�os deste trabalho de conclusãode curso.

O Teorema Espectral visto nos cursos introdutórios de álgebra linear diz o seguinte:

�Todo operador auto-adjunto A : Cn ! Cn é diagonalizável, i.e., existe uma base ortonormal de Cn comrespeito à qual a matriz de representação de A é diagonal.�

Fabiani apresenta no seu Trabalho de Conclusão de Curso uma versão algébrica do Teorema Espectral, que essen-cialmente constitui uma descrição da *-álgebra fracamente fechada gerada num espaço de Hilbert por um operadorauto-adjunto limitado.Cabe ressaltar que o teorema de diagonalização acima possui diversas generalizações em espaços vetoriais de

dimensão in�nita. Todavia, em nenhuma dessas generalizações reconhecemos imediatamente o caso elementar �razão pela qual Halmos achou pertinente discutir o tema num artigo2 .

Breve contextualização do Teorema Espectral

Aqui, apresento um resumo da teoria que pode servir como guia para leitura do texto de Fabiani. Destaco que osenunciados apresentados aqui diferem daqueles enunciados no texto, mas são equivalentes.

Sejam H um espaço de Hilbert e L (H) a *-álgebra dos operadores limitados em H, munida da conjugação de�nidapelo adjunto de Hilbert. Considere um operador limitado A em H; o espectro de A é de�nido por

� (A) := f� 2 C = �I �A é invertível em L (H)g

No caso de A ser auto-adjunto (A� = A), a *-álgebra P �(A) gerada por A em L (H) é dada por:3

P �(A) =

(nXk=0

�kAk ; a0; :::; an 2 C; n 2 N

)

P � (A) é *-homomorfa à álgebra P dos polinômios numa variável complexa, sendo o *-homor�smo dado por

�A : P ! P � (A) ; �A

nXk=0

�kzk

!=

nXk=0

�kAn

No contexto da Análise Funcional, uma pergunta que colocamos naturalmente é a de saber qual é a *-álgebraC� (A) gerada por A em L(H) que é topologicamente fechada com respeito à topologia da norma. Embora essaquestão esteja naturalmente relacionado à anterior, ela é signi�cativamente mais complicada e sua resposta dependedos seguintes fatos não-triviais:

(i) O espectro de A é um subconjunto compacto não vazio de C;(ii) Aplicação espectral polinomial (válido para operadores limitados em geral, não necessariamente

auto-adjuntos):� (p (A)) = p (� (A)) ; 8p 2 P

1W. Rudin, Functional Analysis � 2nd edition, McGraw-Hill, 1991: Prefácio.2P. R. Halmos, What does the spectral theorem say?, American Mathematical Monthly, Vol. 70, No. 3 (1963): 241-247.3Usamos a convenção A0 = I.

2

(iii) Fórmula para o raio espectral (válido para operadores limitados em geral, não necessariamenteauto-adjuntos):4

� (A) := sup fj�j ; � 2 � (A)g = limn!1

kAnk1=n

A partir desses fatos, provamos que o isomor�smo �A : P ! P � (A) constitui-se numa isometria quando P émunido da norma da convergência uniforme no espectro de A,

kpkA := sup fjp (z)j ; z 2 � (A)g ; 8p 2 P

Combinado esse resultado com o Teorema de Stone-Weierstrass5 , obtemos o teorema que responde a questão sobreo fecho topológico da *-álgebra gerada por A:

Cálculo Funcional Contínuo: se A é um operador auto-adjunto, então existe um (único) isomor-�smo isométrico entre C�(A) e a *-álgebra C0 (� (A)) das funções contínuas de�nidas no espectro deA

��A : C0 (� (A))! C� (A)

cuja restrição a P é idêntico a �A.

O espaço dos operadores limitados L (H) possui muitas topologias (a topologia da norma é apenas uma delas),úteis para diferentes �ns. Portanto, também é natural nos perguntarmos sobre o fecho da *-álgebra gerada pelooperador A com respeito à essas topologias. O Teorema Espectral (na versão algébrica apresentada por Fabiani) éessencialmente a resposta à pergunta sobre qual é *-álgebra W �(A) gerada por A em L(H) que é topologicamentefechada com respeito à topologia fraca (ou forte) de operadores.

Teorema Espectral: se A é um operador auto-adjunto, então existe um (único) isomor�smo entreW �(A) e a *-álgebra das funções complexas Borel-mensuráveis regulares limitadas de�nidas no espectrode A

��A : B0 (� (A))!W � (A)

tal que:- A restrição de ��A a P coincide com �A;- ��A é limitado, considerando B0 (� (A)) munido da norma do supremo em � (A) e L(H) munido da

norma de operadores.- ��A é contínuo em relação à topologia fraca em B0 (� (A)) e à topologia fraca de operadores em L(H).

A construção de ��A apresentada por Fabiani baseia-se no Teorema de Riesz-Markov, que fundamenta a de�niçãode medida espectral. O apêndice sobre Teoria da Medida foi inserido para coletar os fatos necessários, dentre osquais (usados apenas na demonstração do Teorema Espectral) o Teorema de Convergência Dominada e o Teoremada Densidade de Funções Contínuas em L1.

O texto de Fabiani evolui em torno da construção explícita dos *-homomor�smos �̂A e ��A sem discutir os aspectostopológicos destacadas acima. Embora ela mencione conceitos de álgebra, o tema não é desenvolvido �limitação quedecorreu das limitações de tempo e espaço.

Lúcio Fassarella7/07/2010

4Destacamos que a prova de (iii) apresentada aqui depende do Princípio da Limitação Uniforme, sobre o qual não tivemos oportunidadede discutir aqui.

5Teorema de Stone-Weierstrass : o conjunto dos polinômios numa variável complexa é denso no conjunto das funções contínuas numdomínio compacto, considerando a topologia da convergência uniforme.

3

1 Introdução

O presente documento exibe uma versão algébrica do Teorema Espectral para operadores lineares auto-adjuntoslimitados que atuam em espaços de Hilbert (outra abordagem, usando operador de multiplicação, pode ser encontradonas referências).

Motivações para o tema

Na resolução de certas equações diferenciais ordinárias é encontrada como solução funções de operadores. Emalguns casos, ela é obtida mediante a função exponencial que, por possuir uma expressão em série de potências, édesnecessário um conhecimento mais aprofundado sobre o assunto. Para ilustrar este fato, considere o problema dedeterminar a solução, para a seguinte equação:

d

dtu (t) = Au (t) ; u (0) = u0 (�)

onde u0 é um elemento dado do espaço de Banach N e A : N ! N é um operador linear contínuo.Prova-se que a solução da equação (�) possui a forma

u (t) = eAtu0

onde

eAt :=

1Xj=0

tj

j!Aj ; t 2 (�1;+1)

e a convergência de eAt é analisada mediante a norma de operadores em espaços de Banach.

Funções de operadores

O Cálculo Funcional Contínuo e o Teorema Espectral de�nem "naturalmente" a ação de funções contínuas efunções Borel-mensuráveis regulares limitadas em operadores auto-adjuntos. Precisamente, se f é uma função com-plexa contínua de�nida no espectro de A, tomamos uma sequência (pn) de polinômios que converge uniformementepara f em � (A) para de�nir o operador f (A) pelo limite na topologia da norma

f (A) = limn!1

pn (A)

Se g é uma função complexa Borel-mensurável regular limitada no espectro de A, tomamos uma sequência (fn) defunções contínuas que converge pontualmente6 para g em � (A) para de�nir o operador g (A) pelo limite na topologiafraca

g (A) = w � limn!1

fn (A)

O Teorema Espectral garante que essas de�nições são �naturais�, no sentido de que a correspondência entre funçõese operadores preserva as relações algébricas (é um *-isomor�smo).

O texto foi desenvolvido pressupondo que o leitor possua conhecimentos de Álgebra linear, medida e integraçãoe noções de espaços métricos.

O trabalho está estruturado do seguinte modo:No capítulo 2, forneceremos os conceitos e resultados básicos para o desenvolvimento do texto.No capítulo 3, de�niremos Álgebras e faremos uma breve discussão sobre o assunto.No capítulo 4, será feito o estudo do espectro de operadores lineares limitados em espaços de Hilbert que auxiliará

no desenvolvimento do capítulo 5, onde trataremos do cálculo funcional contínuo.Finalmente, no capítulo 6, apresentaremos e provaremos o teorema espectral usando como ponto de partida o

Cálculo Funcional Contínuo.

Esperamos que proporcione a outros estudantes material de apoio e conhecimento para estudos posteriores.

6Portanto, (fn) converge em L1 com respeito a qualquer medida de Borel regular em � (A) :

4

1.1 Terminologia e Notação

Dado um número complexo z denotaremos por Re (z) e Im (z), respectivamente, as partes real e imaginária de z.

Coletamos aqui alguns símbolos usados e seus signi�cados:

N = f0; 1; 2; :::g : conjunto dos números naturais (incluindo o zero)N� = f1; 2; :::g : conjunto dos números naturais (excluindo o zero)C : conjunto dos números complexosP : *-álgebra dos polinômios com coe�cientes complexosV : espaço vetorialN : espaço vetorial normadoH : espaço com produto interno ou espaço de HilbertL (N ) : álgebra dos operadores limitados sobre o espaço vetorial normado NC (X) : espaço das funções complexas contínuas de�nidas no espaço topológicoX, munido da topologia

da convergência uniformeh; i : produto internok k : norma (de vetor, de operador, de funcional linear, de função)Re : designa a parte real de um número complexoIm : designa a parte imaginária de um número complexoker : designa o núcleo de uma aplicação linearIm : designa a imagem de uma aplicação linear

5

2 Conceitos Básicos

2.1 Espaço Vetorial, Produto Interno e Norma

Nesta seção de�nimos os conceitos de espaço vetorial, produto interno, norma, métrica e completeza �todos elesocorrendo na de�nição de espaço de Hilbert. Com isso, �xamos a terminologia e notação utilizadas ao longo do texto.Pelo bem da brevidade, não deduzimos todas as propriedades que eventualmente mencionamos e usamos aqui; parauma exposição detalhada, sugerimos os livros [8], [5], [7].

De�nição 1 (Espaço Vetorial) Um espaço vetorial é um conjunto (não-vazio) V equipado com a seguinte estru-tura:Existe uma aplicação

V � V ! V; (x; y) 7! x+ y

chamada adição que satisfaz as seguintes condições, para x, y, z 2 V:(E:i) Comutatividade:

x+ y = y + x

(E:ii) Associatividade:(x+ y) + z = x+ (y + z)

(E:iii) Identidade aditiva: existe um elemento em V, denotado por 0 tal que

x+ 0 = x

(E:iv) Inverso aditivo: para qualquer x 2 V, existe um elemento de V, denotado por �x, tal que

x+ (�x) = 0

Existe uma aplicaçãoC� V ! V; (�; x) 7! �x

chamada multiplicação escalar que satisfaz as seguintes condições, para x, y 2 V, �, � 2 C:(E:v) Associatividade:

� (�x) = (��)x

(E:vi) Distributividade:

� (x+ y) = �x+ �y

(�+ �)x = �x+ �x

(E:vii) Identidade multiplicativa:1x = x

De�nição 2 (Subespaço) Um subconjunto (não-vazio) V1 de um espaço vetorial V tal que, para todo x, y 2 V1 e� 2 C valem

x+ y 2 V1 ; �x 2 V1é chamado subespaço vetorial de V.

De�nição 3 (Produto Interno) Um espaço vetorial complexo H é chamado espaço com produto interno se paracada par ordenado de vetores x e y em H é associado um número complexo hx; yi, chamado produto interno ouproduto escalar entre x e y, satisfazendo as condições abaixo:(P:i) hx; yi = hy; xi(P:ii) hx+ y; zi = hx; zi+ hy; zi(P:iii) h�x; yi = � hx; yi se x 2 H, y 2 H e � 2 C(P:iv) hx; xi � 0 para todo x 2 H(P:v) hx; xi = 0 somente quando x = 0

Observe que o produto interno é linear na primeira variável e antilinear (ou conjugado linear) na segunda variável.Dizemos que funções de duas variáveis nestas condições são sequilineares.

6

De�nição 4 (Norma) Seja N um espaço vetorial sobre um corpo C. Uma norma em N é uma função k�k : N ! Rque associa a cada vetor x 2 N um número real kxk chamado norma de x, de modo a serem cumpridas as condiçõesabaixo para quaisquer x; y 2 N e � 2 C:(N:i) Se x 6= 0 então kxk 6= 0(N:ii) k� � xk = j�j � kxk (homogeneidade)(N:iii) kx+ yk � kxk+ kyk (desigualdade triangular)Pode acontecer que uma função p : V ! C satisfaça as condições (N:ii) e (N:iii) mas não satisfaça a condição

(N:i). Neste caso, dizemos que esta função é uma seminorma.

A partir desta de�nição temos as seguintes consequências para a norma:(a) A norma do vetor nulo é zero, pois

k0k = k0 � 0k = j0j � k0k = 0

(b) A norma do simétrico de x é a norma de x, já que

k�xk = j�1j � kxk = kxk

Com a desigualdade triangular e esses dois resultados obtemos ainda:(c) A norma é uma função não-negativa.De fato,

k0k = kx+ (�x)k � kxk+ k�xk = 2 � kxk

Logo, kxk � 0. Além disso, concluímos que kxk = 0 se, e somente se, x = 0.

De�nição 5 (Espaço Normado) Um espaço normado é um espaço vetorial equipado com uma norma.

É fácil veri�car que

k k : N ! R ; x 7! kxk = hx; xi1=2

é uma norma. Desse modo todo espaço com produto interno pode ser normado.

Teorema 6 Seja H um espaço com produto interno.Para x; y 2 H valem:a) Desigualdade de Cauchy-Schwarz:

jhx; yij � kxk kyk

b) Desigualdade de Minkowski:kx+ yk � kxk+ kyk

c) Identidade de Polarização:

4 hx; yi =�kx+ yk2 � kx� yk2

�+ i�kx+ iyk2 � kx� iyk2

�d) Lei do Paralelogramo:

2�kxk2 + kyk2

�= kx+ yk2 + kx� yk2

A prova desse teorema é simples, qualquer dúvida consultar [7, Theorem 12.2 p.307] [9, p.5, 6 e 8].

Observação 7 Destacamos os seguintes fatos concernentes à relação entre os conceitos de norma e produto interno:i) A norma num espaço normado é induzida pelo produto interno se, e somente se, satisfaz a lei do paralelogramo

[5, teorema 18.1 p.127].ii) No caso de uma norma de�nida por produto interno, a Identidade de Polarização permite-nos recuperar o

produto interno através da norma.

7

Métrica e Completude

Quando temos uma norma em um espaço vetorial normado N podemos calcular distâncias entre vetores (ébastante intuitivo). Assim, tomando x, y 2 N o valor kx� yk representa a distância entre os vetores x e y. Com esseraciocínio podemos dizer que o símbolo kxk é a distância do vetor x à origem, que neste caso resume-se à magnitudedo vetor. Essa distância que acabamos de descrever é um caso particular de métrica.

De�nição 8 (Métrica) Uma métrica num conjunto M , que pode ser ou não um espaço vetorial, é um funçãod : M �M ! R que associa a cada par de elementos x, y 2 M um número real d (x; y), chamado distância de x ay, de modo que sejam satisfeitas as seguintes condições para quaisquer x, y, z 2M :(M:i) d (x; x) = 0(M:ii) Se x 6= y então d (x; y) > 0(M:iii) d (x; y) = d (y; x)(M:iv) d (x; z) � d (x; y) + d (y; z)O par (M;d) é chamado espaço métrico.

Num espaço vetorial normado N , pode-se provar facilmente que, como a�rmado acima, d (x; y) = kx� yk é umamétrica em N . Esta será chamada métrica induzida pela norma.

De�nição 9 (Sequência Convergente e Sequência de Cauchy)Considere uma sequência (xn) num espaço métrico (M;d).Dizemos que (xn) é convergente e tem limite x 2M quando para todo � > 0, existe N 2 N tal que

n � N ) d (xn; x) < �

Nesse caso, denotamosx = lim

n!1xn

Dizemos que (xn) é uma sequência de Cauchy quando para todo � > 0 existe N 2 N tal que

m;n � N ) d (xm; xn) < �

Em qualquer espaço métrico, vale que toda sequência convergente é também sequência de Cauchy. A recíprocanão é geralmente verdadeira �e esse é o cerne da de�nição de espaço métrico completo.

De�nição 10 (Espaço Métrico Completo) Dizemos que um espaço métrico (M;d) é completo quando nele valeque toda sequência de Cauchy é também sequência convergente.

Trabalharemos, especi�camente, com dois tipos de espaços normados completos: Banach e Hilbert.

De�nição 11 (Espaço de Banach) Um Espaço de Banach é um espaço normado completo com respeito à métricainduzida pela norma.

De�nição 12 (Espaço de Hilbert) Um Espaço de Hilbert é um espaço com produto interno que é completo comrespeito à norma induzida pelo produto interno.

Topologia

Em qualquer conjunto, uma métrica de�ne canonicamente uma topologia. Por inspeção direta podemos veri�carque num espaço vetorial normado munido da métrica induzida pela norma, as operações de adição, multiplicaçãoescalar e norma são contínuas. Se a norma for induzida por um produto interno, então o produto interno tambémserá contínuo com respeito à topologia de�nida pela métrica induzida pela norma. Assim, espaços vetoriais normadossão exemplos típicos de espaços vetoriais topológicos.Destacamos que o fato da topologia dos espaços vetoriais normados ser de�nida por uma métrica (induzida pela

norma), implica que os conceitos topológicos podem ser acessados em termos de sequências. Por exemplo, se N éum espaço vetorial normado, o fecho de um subconjunto S � N é o conjunto dos limites de sequências contidas emS que convergem em N .

8

2.2 Soma Direta e Decomposição Ortogonal

De�nição 13 (Soma Direta) Um espaço vetorial V é a soma direta de dois de seus subespaços V1 e V2, o que sedenota por

V = V1 � V2se todo x 2 V possui uma representação única

x = x1 + x2

com x1 2 V1 e x2 2 V2.

De�nição 14 (Ortogonalidade)Seja H um espaço vetorial com produto interno (não necessariamente completo).Dizemos que dois vetores x; y 2 H são ortogonais, e denotamos essa propriedade por x ? y, quando seu produto

interno é nulo,hx; yi = 0

Dado um subconjunto S � H, de�nimos o complementar ortogonal de S por

S? = fy 2 H = y ? x 8x 2 Sg

Lema 15 (Propriedades do Complementar Ortogonal)Seja H um espaço vetorial com produto interno (não necessariamente completo).Para S � H não-vazio, valem:i) O complementar ortogonal de S é um subespaço vetorial fechado de H:

(S?) = S?

ii) O complementar ortogonal de S e o complementar ortogonal do fecho de S são iguais:��S�?= S?

Prova. (i) Por inspeção direta, veri�camos que S? é um subespaço vetorial de H: dados v; w 2 S? e �; � 2 Ctemos que �v + �w 2 S? pois para todo x 2 S vale

h�v + �w; xi = � hv; xi+ � hw; xi = 0

Agora, dado y 2 (S?) tomamos uma sequência (yn) � S? que converge para y, limn!1 yn = y. Pela continuidadedo produto interno, temos:

hy; xi = h limn!1

yn; xi = limn!1

hyn; xi = 0 ; 8x 2 S

Como x 2 S é arbitrário, isso implica que y 2 S?.(ii) Como S � �S, temos S? � �S?. Para provar a inclusão inversa, considere y 2 S?. Dado x 2 �S tomamos

uma sequência (xn) � S que converge para x, limn!1 xn = x. Pela continuidade do produto interno, temos:

hy; xi = hy; limn!1

xni = limn!1

hy; xni = 0

Como x 2 �S é arbitrário, isso implica que y 2 �S?.

Em espaços vetoriais com produto interno, o complementar ortogonal de�ne canonicamente decomposições emsoma direta. Para provar esse fato, primeiro estabelecemos o conceito de projeção.

Lema 16 (Projeção)Seja H um espaço vetorial com produto interno (não necessariamente completo) e seja K � H um subespaço

vetorial completo e fechado.Dado x 2 H, existe um único ~x 2 K tal que

kx� ~xk = inf fkx� yk ; y 2 Kg

9

Além disso, vale que x� ~x é ortogonal a K:x� ~x 2 K?

O elemento ~x 2 K é chamado projeção ortogonal de x em K.Prova. Existência. Denote � := inf fkx� yk ; y 2 Kg � 0. Tomamos (yn) � K tal que

limn!1

kx� ynk = �

Agora, dados n;m 2 N� temos:yn + ym

22 K yn + ym2

� x � �

e pela Lei do Paralelogramo (6):

kyn � ymk2 = kyn � x+ x� ymk2

= 2 kyn � xk2 + 2 kym � xk2 � kyn + ym � 2xk2

= 2 kyn � xk2 + 2 kym � xk2 � 4 yn + ym2

� x 2

� 2 kyn � xk2 + 2 kym � xk2 � 4�2

Isso implica que (yn) é uma sequência de Cauchy: dado " > 0, seja n0 2 N� tal que

n � n0 ) kyn � xk �r�2 +

"2

4

Então, para todo n;m � n0 vale

kyn � ymk2 � 2��2 +

"2

4

�+ 2

��2 +

"2

4

�� 4�2 � "2

Como K é completo e fechado, temos que (yn) converge para um elemento ~x 2 K. Pela continuidade da norma,obtemos

kx� ~xk = limn!1

kx� ynk = �

Unicidade. Seja y 2 K tal que kx� yk = �. Novamente pela Lei do Paralelogramo, temos

k~x� yk2 = 2 k~x� xk2 + 2 ky � xk2 � 4 ~x+ y2 � x

2 � 2�2 + 2�2 � 4�2 = 0Portanto, y = ~x.Finalmente, para provar que x� ~x é ortogonal a K. Dado y 2 K, consideramos as funções

f; g : R! R ; f (t) := kx� ~x+ tyk2 ; g (t) := kx� ~x+ ityk2

Desenvolvendo, temos que f e g são funções quadráticas:

f (t) = t2 kyk2 + 2Re hx� ~x; yi t+ kx� ~xk2 ; g (t) = t2 kyk2 � 2 Im hx� ~x; yi t+ kx� ~xk2

Pelas condições, t = 0 é ponto de mínimo de f e de g. Isso implica que Re hx� ~x; yi = 0 = Im hx� ~x; yi, ou sejahx� ~x; yi = 0.

Teorema 17 (Decomposição Ortogonal)Seja H um espaço de Hilbert e seja K � H um subespaço vetorial.Denote por �K o fecho topológico de K em H, com respeito à norma induzida pelo produto interno.Então, �K é completo e fechado e valem:i) K é denso em H se e somente se seu complementar ortogonal é trivial,

�K = H () K? = f0g

10

ii) H se decompõe como soma direta entre o fecho de K e seu complementar ortogonal:

H = �K �K?

Prova. Sendo H completo e fechado, segue que �K também é completo e fechado. Também, pela continuidade doproduto interno, podemos provar que

�K? = K?

Agora, veri�camos que �K \K? = f0g: dado x 2 �K \K?, tomamos uma sequência (xn) 2 K que converge para x,limn!1 xn = x; então

kxk2 = hx; xi = limn!1

hx; xni = limn!1

0 = 0

Prova de (i) Suponha que K seja denso em H, �K = H. Como �K \K? = f0g, temos

K? = K? \H = K? \ �K = f0g

Agora, suponha que �K 6= H. Tomamos y 2 H8 �K, denotamos por ~y a projeção ortogonal de y em �K e de�nimosu := y� ~y. Então u 6= 0 (pois y =2 �K) e u 2 �K? (pelo ítem anterior). Isso signi�ca que �K? 6= 0. Contrapositivamente,se �K? = 0 então �K = H.Prova de (ii) Dado x 2 H, denote por ~x a projeção de x em �K. Então

x = ~x+ (x� ~x) 2 �K +K?

Agora, suponha que exista y1 2 �K e y2 2 K? tais que

x = y1 + y2

Então~x� y1 = y2 � (x� ~x) 2 �K \K?

Como �K \K? = f0g, concluimos que ~x = y1 e y2 = (x� ~x). Pela de�nição de soma direta, concluimos

H = �K �K?

Corolário 18 Seja H um espaço vetorial com produto interno (não necessariamente completo) e seja T : H ! Hum operador linear. Denote o núcleo de T por

ker (T ) := fx 2 H = Tx = 0g

Então ker (T ) é subespaço vetorial de H e vale

H = ker (T )� ker (T )?

Prova. Por inspeção direta, veri�camos que ker (T ) é subespaço vetorial. A decomposição H = ker (T )�ker (T )?segue imediatamente do Teorema (17).

11

2.3 Exemplos

2.3.1 `2 (N�), o conjunto das sequências complexas quadrado-somáveis

Denotamos o conjunto das sequências de números complexos por

S (N�) := f(an) ; an 2 C 8n 2 N�g

Em S (N�) de�nimos as seguintes operações de soma e multiplicação escalar:

(an) + (bn) := (an + bn) ; 8 (an) ; (bn) 2 S (N�)

� (an) = (�an) ; 8� 2 C; 8 (an) 2 S (N�)

Por inspeção direta, veri�camos facilmente que S (N�) é um espaço vetorial.Em S (N�) consideramos o subconjunto das sequências quadrado-somáveis

`2 (N�) :=

((an) 2 S (N�) =

1Xn=1

janj2 <1)

Podemos provar facilmente que `2 (N�) é um subespaço vetorial de S (N�) � i.e., é um subconjunto que contem asequência nula e que é fechado com respeito às operações de soma e multiplicação escalar; para tanto, usamos aseguinte desigualdade7

ja+ bj2 � 3 jaj2 + 3 jbj2 ; 8a; b 2 C

Agora, usando a identidade (que não por acaso é similar à Identidade de Polarização)

ab =1

4

n(a+ b)

2 � (a� b)2o

; 8a; b 2 C

podemos provar que a seguinte aplicação está bem-de�nida em `2 (N�) e constitui-se num produto-interno:

h; i : `2 (N�)� `2 (N�)! C ; h(an) ; (bn)i :=1Xn=1

an�bn

A norma induzida por esse produto interno é dada por

k k2 : `2 (N�)! [0;1) ; k(an)k2 :=

1Xn=1

janj2!1=2

Proposição 19 `2 (N�) munido das operações de soma e multiplicação escalar e produto-interno de�nidos acima éum espaço de Hilbert. Além disso, o seguinte conjunto constitui uma base (de Schauder) de `2 (N�),

Be =n��kn

�; k 2 N�

o(1)

onde

�kn =

�1 ; n = k0 ; n 6= k

; n 2 N�;8k 2 N�

Para uma discussão e prova da primeira parte dessa proposição, vide [6, Theorem II.7, p.47].

7Explicitamente, temos a seguinte dedução da desigualdade:

ja+ bj2 = jaj2 + jbj2 + �ab+ a�b

� jaj2 + jbj2 + 2 jaj jbj = jaj2 + jbj2 + 2qjaj2

qjbj2

� jaj2 + jbj2 + 2qjaj2 + jbj2

qjaj2 + jbj2 = jaj2 + jbj2 + 2

�jaj2 + jbj2

�= 3 jaj2 + 3 jbj2

12

Observação 20 Embora não tenhamos oportunidade de discutir aqui, é oportuno mencionar que `2 (N�) é um espaçode Hilbert separável com dimensão in�nita e todos os demais espaços de Hilbert separáveis com dimensão in�nita sãoisomorfos a ele (nesse sentido, ele é o �único�espaço de Hilbert com tais propriedades).

Exemplo 21 (Espaço com produto interno que não é completo)Considere o conjunto N � `2 (N�) formado pelas sequências que possuem apenas um número �nito de termos não

nulos,N = f(an) 2 S (N�) = 9N 2 N�; an = 0 8n � Ng

Por inspeção direta, veri�camos que N é um subespaço vetorial de `2 (N�). Vamos mostrar que ele não é completo,considerando as operações de soma, multiplicação escalar e produto interno induzidas de `2 (N�).De fato, como a série �

�1=n2

�converge, segue que a seguinte sequência pertence `2 (N�)

(yn) =

�1;1

2;1

3; :::;

1

n� 1 ;1

n;1

n+ 1; :::

�Agora, considere a sequência de elementos em N dada por

N 3 k 7�! z (k) := (z (k)n) =

�1;1

2;1

3; :::;

1

k � 1 ;1

k; 0; 0; 0:::

�Evidentemente, a sequência (yn) não pertence a N ; entretanto, pela convergência da série �

�1=n2

�deduzimos que

sequência (z (k)n) converge para (yn) com respeito à norma de `2 (N�):

limk!1

k(z (k)n)� (yn)k2 = limk!1

1Xn=k+1

1

n2

!1=2= 0

Logo, para provar que N não é completo basta mostrar que a sequência (z (k))k2N� é uma sequência de Cauchy emN . Dados k1; k2 2 N�, suponha sem perda de generalidade, que k1 < k2. Daí,

k(z (k1)n)� (z (k2)n)k2 =

k2+1Xn=k1+1

1

n2

! 12

<

1Xn=k1+1

1

n2

!1=2

Usando novamente a convergência da série ��1=n2

�, podemos deduzir dessa desigualdade que (z (k)n) é sequência

de Cauchy: dado � > 0 tome N > 0 tal que 1Xn=N

1

n2

!1=2< �

Então para quaisquer k1; k2 2 N; k2 � k1 � N vale

k(z (k1)n)� (z (k2)n)k2 < 1Xn=k1+1

1

n2

!1=2� 1Xn=N

1

n2

!1=2< �

13

2.4 Aplicações Lineares

De�nição 22 (Aplicação Linear) Uma aplicação linear entre os espaços vetoriais V1 e V2 é uma aplicação T :V1 ! V2 tal que

T (�x+ �y) = �T (x) + �T (y) ; 8x; y 2 V1; 8�; � 2 C

Usaremos o termo operador linear quando tivermos V1 = V2.8

Destacamos a seguinte identidade para operadores que é análoga à Identidade de Polarização (6) existente emespaços com produto interno.

Proposição 23 Sejam H um espaço com produto interno (não necessariamente completo) e T : H ! H um operadorlinear (não necessariamente limitado). Vale:

hTx; yi = 1

4fhT (x+ y) ; (x+ y)i � hT (x� y) ; (x� y)i+ i (hT (x+ iy) ; (x+ iy)i � hT (x� iy) ; (x� iy)i)g ; 8x; y 2 H

Prova. Considere x; y 2 H �xados. Para provar a identidade, basta observar que

hT (x+ y) ; (x+ y)i � hT (x� y) ; (x� y)i = 2 (hTx; yi+ hTy; xi) (�)

Assim, pondo y = iy obtemos

i hT (x+ iy) ; (x+ iy)i � hT (x� iy) ; (x� iy)i = 2 (hTx; yi � hTy; xi) (#)

Somando (�) e (#) obtemos 4 hTx; yi.

Para falar em continuidade precisamos de ferramentas que nos permitam calcular e analisar distâncias. Numespaço vetorial normado, usamos a métrica induzida pela norma.

De�nição 24 (Continuidade) Uma aplicação T : N1 ! N2 é contínua no ponto x 2 N1 se, para cada � > 0 dado,existe � > 0 tal que y 2 N1 e ky � xk < � ) kT (y)� T (x)k < �.

Quando T é contínua em todo elemento x 2 N1 diz-se, simplesmente que T é contínua.

O conceito de continuidade possui propriedades interessantes no caso das aplicações lineares. A proposição abaixodiz que em espaços normados basta que a aplicação linear seja contínua em um ponto para termos a continuidadeuniforme.

Proposição 25 (Aplicações Lineares Contínuas)Seja T : N1 ! N2 uma aplicação linear entre espaços normados. As seguintes condições são equivalentes:(i) sup fkTxk : kxk � 1g <1(ii) Existe C > 0 tal que kTxk � C kxk para todo x 2 N1(iii) T é uniformemente contínua(iv) T é contínua(v) T é contínua em 0Prova. (i)) (ii) : Seja 0 < C <1 tal que C = sup fkTxk : kxk � 1g. Para cada x 2 N1, x 6= 0; o vetor x

kxk é

unitário donde T � x

kxk

� � C, ou seja, kTxk � C kxk.(ii)) (iii) : Basta notar que dados x, e y 2 N1,

kTx� Tyk = kT (x� y)k � C kx� yk

(iii)) (iv) : Óbvio!(iv)) (v) : Óbvio!(v) ) (i) : Sendo T contínuo em 0 existe � > 0 tal que x 2 N1, kxk < � ) kTxk < 1. Então, se kxk � 1 vale

k�xk � �. Logo, kT (�x)k � 1, ou seja, kTxk � 1� .

8Observamos que essa terminologia não é universal.

14

Observação 26 Devido à condição (i), as aplicações lineares contínuas entre espaços normados são também chamadaslimitadas.

Neste trabalho, nos restringimos a considerar aplicações lineares contínuas (limitadas). Nos tópicos seguintesusaremos estes conceitos no estudo de alguns operadores.

Proposição 27 Num espaço vetorial normado N , são contínuas as seguintes aplicações de�nidas para � 2 C,x; y 2 N :

(�; x) 7! �x ; (x; y) 7! x+ y ; x 7! kxk

Se a norma de N for induzida por um produto interno, então o produto interno também será uma aplicação contínua:

(x; y) 7! hx; yi

Esses fatos podem ser demonstrados sem di�culdade usando as propriedades da norma e do produto interno.

2.4.1 Homomor�smos e Isometrias

As aplicações lineares são os homomor�smos entre espaços vetoriais � as aplicações que preservam a estruturaalgébrica em foco. Chamamos de isomor�smo linear as aplicações lineares bijetivas.No caso de espaços normados, são também importantes as aplicações lineares que preservam a norma, essas são

chamadas isometrias.

De�nição 28 (Isometria) Dados dois espaços normados N1 e N2, uma aplicação linear T : N1 ! N2 é chamadaisometria linear (ou isometria) quando ela preserva normas

kTxk = kxk ; 8x 2 N1

Quando T for uma isometria sobrejetiva diremos que T é uma aplicação unitária.

Segue imediatamente desta de�nição que toda isometria é injetiva. Basta observar que se Tx = 0 então kTxk =kxk = 0. Assim, x = 0, ou seja, acabamos de provar que o núcleo de T contém apenas o vetor nulo. Isso implica queT é injetiva.

Proposição 29 Se T : H1 ! H2 é uma isometria entre espaços vetoriais com produto interno (não necessariamentecompletos), ela também preserva o produto interno, isto é,

hTx; Tyi = hx; yi ; 8x; y 2 H1

Prova. Pela de�nição de isometria e pela Identidade de Polarização, temos, para todo x; y 2 H1:

4 hTx; Tyi =�kT (x+ y)k2 � kT (x� y)k2

�+ i�kT (x+ iy)k2 � kT (x� iy)k2

�=

�kx+ yk2 � kx� yk2

�+ i�kx+ iyk2 � kx� iyk2

�= 4 hx; yi

15

2.4.2 Espaços de Aplicações Lineares

Dados dois espaços vetoriais normadosN1 eN2, denotamos por L (N1;N2) o conjunto das aplicações lineares limitadasde N1 em N2. Quando N1 = N2 = N , substituimos a notação L (N ;N ) por L (N ).Veri�ca-se que L (N1;N2) é um espaço vetorial com respeito às de�nições usuais de adição e multiplicação por

escalar: para A, B 2 L (N1;N2) e � 2 C,

(A+B) (x) = Ax+Bx ; (�A) (x) = �Ax

Para cada T 2 L (N1;N2) de�nimos a norma da aplicação linear T por9

kTk := sup fkTxk : x 2 N1; kxk � 1g (2)

Equivalentemente,kTk = inf fC � 0 : kTxk � C kxk ; x 2 N1g

Lema 30 k�k é uma norma em L (N1;N2) e vale

kTxk � kTk kxk ; 8x 2 N1

Prova. Considere T; S 2 L (N1;N2) e � 2 C. Se T 6= 0, existe x 2 N1 com Tx 6= 0. Como T (0) = 0, issoimplica que x 6= 0. Usando que kTxk e kxk são ambos não-nulos, pelo item (i) da proposição (25) obtemos

0 <kTxkkxk � kTk

Portanto, kTk 6= 0, satisfazendo a primeira condição de norma. As outras duas são consequências das propriedadesde supremo. Homogeneidade:

k�Tk = sup fk(�T ) (x)k = j�j kTxk ; x 2 N1; kxk � 1g = j�j sup fkTxk ; x 2 N1; kxk � 1g = j�j kTk

Desigualdade triangular: como

k(S + T ) (x)k = kSx+ Txk � kSxk+ kTxk � kSk kxk+ kTk kxk = (kSk+ kTk) kxk ; 8x 2 N1

segue quekS + Tk = sup fk(S + T ) (x)k ; x 2 N1; kxk � 1g � kSk+ kTk

Esse lema mostra que L (N1;N2) munido da norma de aplicações é um espaço normado; o seguinte mostra que éum espaço de Banach.

Proposição 31 Sejam T : N1 ! N2 e S : N2 ! N3 aplicações lineares limitadas entre espaços vetoriais normados.Então S � T é aplicação linear limitada e vale:

kS � Tk � kSk kTk

Prova. Por inspeção direta, veri�camos que S � T é aplicação linear. Agora,

k(S � T )xk � kSk kTxk � kSk kTk kxk ; 8x 2 N1

Pela de�nição de norma de aplicações, isso signi�ca que kS � Tk � kSk kTk.

O teorema seguinte mostra que se N2 é completo, então L (N1;N2) também é completo.

9Observe que designamos a norma de aplicações pelo mesmo símbolo que usamos para designar a norma de vetores. Geralmente issonão causa confusão porque o contexto é su�ciente para de�nir o signi�cado do símbolo.

16

Teorema 32 Se N é um espaço normado e B é um espaço de Banach, então L (N ;B) também é um espaço deBanach.Prova. Considere a sequência de Cauchy (Tn) em L (N ;B). Dado x 2 N , temos

kTnx� Tkxk = k(Tn � Tk) (x)k � kTn � Tkk kxk ; 8n; k 2 N

Isso implica que a sequência (Tnx) é de Cauchy em B. De�na T : N ! B pondo Tx = limn!1 Tnx. Por essade�nição segue que T é aplicação linear. Mostremos que T é limitado (pertence a L (N ;B)). Dado � > 0, existeN (�) 2 N tal que n; k � N (�)) kTn � Tkk < �. Usando a continuidade da norma obtemos, para n � N (�)

kTnx� Txk = limk!1

kTnx� Tkxk � limk!1

kTn � Tkk kxk � � kxk ; 8x 2 N1 (�)

Com isso, provamos que T é limitado:

kTxk = kTnx� Tnx+ Txk � kTnx� Txk+ kTnxk � � kxk+ kTnk kxk = (kTnk+ �) kxk ; 8x 2 N1

Finalmente, veri�camos que (Tn) converge para T . De fato, (�) implica

k(Tn � T ) (x)k � � ; 8x 2 N1; kxk < 1; 8n � N (�)

Pela de�nição de norma de uma aplicação, kTn � Tk � �. Como � > 0 é arbitrário, isso signi�ca que limn!1 Tn = T .

17

2.4.3 Topologias Forte e Fraca de Operadores em L (H)

O espaço dos operadores limitados sobre um espaço de Banach ou Hilbert pode ser munido de diversas topologias,úteis para propósitos distintos. Aqui, mencionamos três relacionadas ao Teorema Espectral: a topologia da norma,a topologia forte de operadores e a topologia fraca de operadores em espaços de Hilbert.

De�nição 33 (Topologia no Espaço de Operadores)Seja H um espaço de Hilbert e L (H) o espaço dos operadores limitados em H.A topologia da norma em L (H), denotada aqui por �N , é a topologia induzida pela norma de operadores, i.e.,

é a topologia de�nida pela seguinte sub-base de vizinhanças

NA;� := fT 2 L (H) = kT �Ak < �g ; A 2 L (H) ; � > 0

A topologia forte de operadores em L (H), denotada aqui por �S, é a topologia de�nida pela seguinte sub-basede vizinhanças

SA;x;� := fT 2 L (H) = k(T �A)xk < �g ; A 2 L (H) ; x 2 H ; � > 0

A topologia fraca de operadores em L (H), denotada aqui por �W , é a topologia de�nida pela seguinte sub-basede vizinhanças

WA;x;y;� := fT 2 L (H) = jh(T �A)x; yij < �g ; A 2 L (H) ; x; y 2 H ; � > 0

Lema 34 As topologias �N , �S e �W são Haussdor¤.10

Prova. O argumento em cada caso é similar, por isso vamos provar apenas o caso da topologia fraca de oper-adores. Sejam A;B 2 L (H) operadores distintos. Então existe x 2 H tal que y := Bx� Ax 6= 0; seja � := kyk2 =2;então A 2WA;x;y;� (óbvio), B 2WB;x;y;� (óbvio) e WA;x;y;� \WB;x;y;� = ; pois: se T 2WA;x;y;� então

jh(T �B)x; yij = jh(T �A)x; yi � h(B �A)x; yij � jh(B �A)x; yij � jh(T �A)x; yij > 2�� � = �

donde T =2WB;x;y;�.

Lema 35 Em L (H), a topologia da norma é mais forte do que a topologia forte e a topologia forte é mais forte doque a topologia fraca,11

�N � �S � �W

Prova. Prova de �N � �S Como as topologias são Hausdor¤, para provar essa inclusão basta mostrar que todoelemento da sub-base de �S contem um elemento da sub-base de �N . Com efeito, sejam A 2 L (H), x 2 H e � > 0;se x = 0, então SA;x;� = L (H) é aberto com respeito a �N ; se x 6= 0, de�nimos � := �= kxk e veri�camos queNA;� � SA;x;�:

T 2 NA;� ) k(T �A)xk � kT �Ak kxk < � kxk = �) T 2 SA;x;�Prova de �S � �W Analogamente ao caso anterior, como as topologias são Hausdor¤, para provar essa inclusão,

basta mostrar que todo elemento da sub-base de �W contem um elemento da sub-base de �S. Com efeito, sejamA 2 L (H), x; y 2 H e � > 0; se y = 0, então WA;x;y;� = L (H) é aberto com respeito a �S; se y 6= 0, de�nimos� := �= kyk e veri�camos (usando a desigualdade de Cauchy-Schwarz)

T 2 SA;x;� ) jh(T �A)x; yij � k(T �A)xk kyk < � kyk = �) T 2WA;x;y;�

10Lembramos que uma topologia � num conjunto X é Hausdor¤ quando: para todo par de pontos distintos em X, existem pares deabertos disjuntos em � tais que um dos abertos contem um dos pontos e o outro aberto contem o outro ponto.11Lembramos que num conjunto X, dadas duas topologias �1 e �2, dizemos que a topologia �2 é mais forte (ou mais �na) do que uma

topologia �1 quando �2 � �1, ou seja: todo subconjunto de X que é aberto com respeito a �1 é também aberto com respeito a �2.

18

2.5 Exemplos

2.5.1 O operador H em `2 (N�)

Em `2 (N�), considere o seguinte aplicação

H : `2 (N�)! `2 (N�) ; H (an) :=�ann

�H é um operador bem-de�nido em `2 (N�) porque se a sequência (an) é quadrado-somável, então a sequência (an=n)também é quadrado-somável, pois a convergência de

Pa2n implica (por comparação) na convergência de

Pa2n=n

2.Por inspeção direta, veri�ca-se que H é linear (cálculo que omitimos aqui).Agora vamos veri�car que H é limitada. Para uma sequência (an) 2 `2 (N�) ; (an) 6= (0), temos

kH (an)kk(an)k

=

�P1n=1 a

2n=n

2�1=2

(P1

n=1 a2n)1=2

� 1

Portanto, kHk � 1. Agora, considerando a sequência12��1n�:= (1; 0; 0; :::) 2 `2 (N�)

temos H ��1n� ��1n� =

�P1n=1

��1n�2=n2�1=2

�P1n=1

��1n�2�1=2 = 1

Portanto, kHk = 1.

12Veja (1) na proposição (19).

19

2.6 Funcionais Lineares e Espaço Dual

Dado um espaço normado N , o espaço N � := L (N ;C) é chamado Espaço Dual (ou simplesmente, dual) de N e seuselementos são chamados funcionais lineares contínuos em N . Pelo teorema (32), segue imediatamente que o dual dequalquer espaço normado é um espaço de Banach (com respeito à norma de operadores).

Apresentamos o seguinte fato que será utilizado posteriormente:13

Proposição 36 Seja A : V ! H uma aplicação limitada entre um espaço vetorial V e um espaço vetorial comproduto interno H (não necessariamente completo). Se � � A = 0 para todo funcional linear contínuo � : H ! C,então A = 0.Prova. Suponha A 6= 0, então existe x 2 V tal que y := Ax 6= 0. De�na o funcional linear

� : H ! C ; �w := hy; wi

Veri�camos que � é contínuo:j�wj = jhy; wij � kyk kwk ; 8w 2 H

Agora � �A 6= 0 pois � (Ax) = kyk2 6= 0. Por contraposição, isso prova proposição.

O Teorema da Representação de Riesz mostra como é feita a identi�cação entre um espaço de Hilbert e seu dual.Baseando-se neste teorema de�niremos o adjunto de um operador limitado.

Teorema 37 (Representação de Riesz) Se H é um espaço de Hilbert, então existe uma isometria bijetiva conjugada-linear entre H e seu dual H�, y ! �y, dada por

�yx = hx; yi , 8x 2 H (�)

Prova. Admitindo que �y tem a forma (�) provemos quea) A aplicação y 7! �y é uma isometria.Usando a desigualdade de Cauchy-Schwarz obtemos

k�y (x)k � kxk kyk ) k�yk � kyk

Em particular, �y é limitado. Como

0 � kyk2 = hy; yi = �y (y) = j�y (y)j � k�yk kyk

vale kyk � k�yk. Logo, k�yk = kyk.b) A aplicação y ! �y é conjugada-linear.De fato, dado � 2 C temos

��y (x) = hx; �yi = � hx; yi = ��y (x)

c) Bijetividade.Como toda isometria é injetiva, basta mostrar que toda aplicação � 2 H� tem a forma (�).Se � = 0 tome y = 0.Caso � 6= 0, seja N (�) o núcleo de �. Considerando que � é contínuo, temos que N (�) é fechado; pelo corolário

(18) H = N (�) � N (�)?. Como � 6= 0, temos que H 6= N (�), logo N (�)? 6= f0g. Tome z 2 N (�)

?, z 6= 0.A�rmamos que vale

(�x) z � (�z)x 2 N (�) ; 8x 2 H

pois� ((�x) z � (�z)x) = (�x) (�z)� (�z) (�x) = 0

Como z 2 N (�)?, valeh(�x) z � (�z)x; zi = 0 ; 8x 2 H

Daí,�x hz; zi � �z hx; zi = 0) �x hz; zi = �z hx; zi ; 8x 2 H

13Esta proposição é válida mesmo quando substituimos H por um espaço vetorial normado. Entretanto, esse resultado mais geraldepende do Teorema de Hanh-Banach.

20

Logo,

�x =�z

hz; zi hx; zi =�x;

�z

hz; ziz�

; 8x 2 H

Basta tomar y =��z= hz; zi

�z e teremos

�x = hy; xi ; 8x 2 H

Diremos que o vetor y representa o funcional linear contínuo 2 N � quando = �y. No caso dos espaços deHilbert, o Teorema de Representação de Riesz diz que todo funcional linear contínuo possui um único vetor que orepresenta.

Observação 38 No Teorema de Riesz, a hipótese de H ser completo não pode ser retirada. Considere N � l2 (N�)o espaço das sequências que possuem apenas um número �nito de termos não nulos o qual sabemos não ser completo.De�na f : N ! C pondo f (x) =

P1i=1

xii onde x = (x1; x2; :::; xk; 0; :::; 0; :::). Segue-se que f 2 N �, mas não

existe y 2 N que a representa, isto é, que satisfaça f (x) = fy (x) = hx; yi para todo x 2 N . De fato, suponhaque exista y = (z1; z2; :::; zm�1; 0; :::; 0; :::) em N tal que f (x) = fy (x) = hx; yi, onde m 2 N�. Tome a sequência(�mn ) = (0; 0; :::; 0; 1; 0; :::) em N cuja m-ésima coordenada é igual a 1 e as demais são zero. Com isso, teremos

0 6= 1

m= f (�mn ) = h(�mn ) ; yi = 0 Absurdo!

21

2.7 Adjunto de um Operador Limitado em Espaços de Hilbert

Teorema 39 (Adjunto) Sejam H um espaço de Hilbert e T 2 L (H). Então existe um único operador T � 2 L (H)tal que

hTx; yi = hx; T �yi , para x, y 2 H

O operador T � é chamado o adjunto de T .Prova. Fixado y 2 H, de�nimos a aplicação

fy : H ! C ; fy (x) := hTx; yi

A linearidade de fy segue das igualdades abaixo, calculadas em �; � 2 C e x; z 2 H:

fy (�x+ �z) = hT (�x+ �z) ; yi = h�Tx+ �Tz; yi = � hTx; yi+ � hTz; yi = �fy (x) + �fy (z)

Comokfy (x)k = khTx; yik � kTxk kyk � kTk kxk kyk

vale kfyk � kTk kyk, ou seja, fy é limitado (contínuo). Conforme o Teorema de Representação de Riesz, existe umúnico vetor, que denotaremos por T �y, em H que representa fy, isto é, que satisfaz fy (x) = hx; T �yi. Portanto,hTx; yi = hx; T �yi.Agora, de�nimos a aplicação

T � : H ! H ; y 7�! T �y

Veri�camos por inspeção direta que T � é linear: para �; � 2 C e y1; y2 2 H temos

hx; T � (�y1 + �y2)i = hTx; �y1 + �y2i= �� hTx; y1i+ �� hTx; y2i= �� hx; T �y1i+ �� hx; T �y2i= hx; �T �y1i+ hx; �T �y2i ; 8x 2 H

dondehx; T � (�y1 + �y2)� �T �y1 � �T �y2i = 0 8x 2 H

Isso signi�ca queT � (�y1 + �y2) = �T �y1 + �T

�y2

A prova de que T � é limitado pode ser encontrada na próxima proposição, que coleta essa e outras propriedades doadjunto.

Observe que o teorema acima continua válido para aplicações limitadas de�nidas entre espaços de Hilbert diferentes(cuja demonstração é idêntica à do caso H = H1), passando a ter o seguinte enunciado: se T 2 L (H;H1) entãoexiste um único T � 2 L (H1;H) tal que hTx; yi = hx; T �yi, para x 2 H, y 2 H1.

Observação 40 Considere os operadores T , S 2 L (H). Se tivermos hTx; yi = 0 para todo x, y 2 H então T = 0,pois, neste caso, teremos, em particular, kTxk2 = hTx; Txi = 0 donde Tx = 0 para todo x 2 H. Com isso, quandohTx; yi = hSx; yi, para quaisquer x, y 2 H os operadores S e T são iguais.

Usaremos este raciocínio na prova da seguinte

Proposição 41 (Propriedades Algébricas do Adjunto) Seja H um espaço de Hilbert. O adjunto satisfaz asseguintes propriedades, em todo T; S 2 L (H):(i) [T �]

�= T

(ii) (�T )�= �T �

(iii) [S + T ]�= S� + T �

(iv) [TS]�= S�T �

Além disso, valem(v) kT �k = kTk(vi) kT �Tk = kTk2

22

Prova. (i) Segue da igualdade

hTx; yi = hx; T �yi = hT �y; xi =y; [T �]

�x�=[T �]

�x; y�

(ii) Valeh[�T ]x; yi = � hTx; yi = � hx; T �yi = hx; [�T �] yi

Como o adjunto de �T é o único operador (�T )� 2 L (H) que satisfaz h[�T ]x; yi =x; [�T ]

�y�concluímos que

(�T )�= �T �.

(iii) h[S + T ]x; yi = hSx; yi+ hTx; yi = hx; S�yi+ hx; T �yi = hx; [S� + T �] yi.(iv) h[TS]x; yi = hSx; T �yi = hx; S� [T �y]i = hx; [S�T �] yi.(v) kT �k � kTk, já que

kT �xk2 = jhT �x; T �xij = jhx; T (T �x)ij � kxk kTk kT �xk ) kT �xk � kTk kxk , x 2 H

Pela de�nição de norma de um operador segue-se que kT �k � kTk. Com este resultado e usando o item (i) temosque kTk =

[T �]� � kT �k � kTk. Logo, kT �k = kTk.(vi) Pela proposição (31), temos kT �Tk � kT �k kTk = kTk2; por outro lado,

kTxk2 = jhTx; Txij = jhx; T �Txij � kxk2 kT �Tk

Assim, kTk �pkT �Tk e, portanto, kTk2 � kT �Tk, provando que kT �Tk = kTk2.

Destacamos a seguinte proposição que relaciona o núcleo e a imagem de um operador e seu adjunto:

Proposição 42 (Núcleo e Imagem do Operador Adjunto)Seja T : H ! H um operador limitado. Entãoi) Im (T )? = ker (T �)ii) Im (T ) é denso em H se, e somente se, T � é injetivoProva. (i) Dado y 2 H, valem as equivalências

y 2 Im (T )? , hy; Txi = 0 8x 2 H , hT ?y; xi = 0 8x 2 H , T ?y = 0, y 2 ker (T ?)

(ii) Para demonstrar este item usaremos a identidade provada no Lema (15):

Im (T )? =�Im (T )

�?(�)

()) Suponha que Im (T ) é denso em H. Usando a identidade (�) seguem as igualdades:

Im (T )? =�Im (T )

�?= H? = f0g

Por (i), isso implica que T � é injetiva. (() Agora, suponha que T � é injetiva. Por (i), isso signi�ca que Im (T )? =f0g. Como Im (T ) é um subespaço vetorial fechado de H, pelo Teorema (17) temos que

H = Im (T )? � Im (T )

Logo, Im (T ) = H. Portanto, Im (T ) é denso em H.

Neste trabalho, focalizaremos os operadores auto-adjuntos.

De�nição 43 Seja H um espaço de Hilbert. Um operador T 2 L (H) é chamado dei) normal se TT � = T �Tii) auto-adjunto (ou hermitiano) se T = T �

iii) unitário se TT � = I = T �T , onde I é o operador identidade em H.iv) projeção ortogonal se T � = T e T 2 = Tv) positivo quando hTx; xi � 0 para todo x 2 H

Pela de�nição segue que os operadores auto-adjuntos assim como os operadores unitários são operadores normais.

Corolário 44 Se H é um espaço de Hilbert e A 2 L (H) é auto-adjunto então valem:(i) Im (A)? = ker (A)(ii) Im (A) é densa em H se, e somente se, A é injetivo.

23

3 Álgebras

O conceito de Álgebra pode ser entendido como uma abstração das propriedades dos conjuntos de todos os operadoresde�nidos num espaço vetorial, munidos da operação de�nida pela composição.

De�nição 45 (Álgebra) Uma álgebra é um espaço vetorial (A;+; �) munido de uma operação � : A � A ! A,chamada multiplicação, gozando das seguintes propriedades, para para todo A; B e C em A e todo escalar � 2 C:i) Distributividade com respeito à adição

A � (B + C) = A �B +A � C ; (A+B) � C = A � C +B � C

ii) Associatividade com respeito à multiplicação escalar:

� � (A �B) = (� �A) �B = A � (� �B)

Dizemos que uma álgebra é associativa quando

A � (B � C) = (A �B) � C

Dizemos que a álgebra é comutativa quando

A �B = B �A

Dizemos que a álgebra é unital (ou é uma álgebra com unidade) quando a multiplicação possui elemento neutro(chamado unidade), ou seja, quando existir um elemento I 2 A que satisfaz

I �A = A � I = A ; 8A 2 A

Observe que se a multiplicação possui um elmento neutro, então ele é único pois se bI for outro elemento neutro temosI = I � bI = bI.Observação 46 Para simpli�car a notação, no restante do texto vamos omitir os símbolos � e � para as operaçõesmultiplicação e multiplicação escalar, respectivamente. Especi�camente, escreveremos

A �B = AB ; � �A = �A ; 8 A;B 2 A; 8� 2 C

Uma álgebra pode ser munida de uma estrutura topológica de�nida em termos de uma norma.

De�nição 47 Álgebra normada: é uma álgebra (A;+; �; �) associativa munida de uma norma k � k : A ! [0;1) coma seguinte propriedade:

kABk � kAkkBk ; 8A;B 2 A

Álgebra de Banach: é uma álgebra normada completa.

Exemplo 48 L (N ) munido das operações usuais é uma álgebra, para todo espaço normado N . Se N for um espaçode Banach, então L (N ) é uma álgebra de Banach.Prova. As propriedades algébricas podem ser veri�cadas por inspeção direta. As demais, estão contidas no lema

(30), a proposição (31) e o teorema (32).

24

De�nição 49 Uma *-álgebra é uma álgebra (A;+; �; �) munida de uma operação, chamada conjugação ou involução,� : A ! A satisfazendo:

i) Anti-linearidade:(�A+ �B)� = �A� + �B� ; 8 A;B 2 A e 8�; � 2 C

ii) Involução:(A�)� = A ; 8 A 2 A

iii) Reversão ao produto:(AB)� = B�A� ; 8 A;B 2 A

Exemplo 50 O conjunto P dos polinômios complexos munido das operações usuais de soma, multiplicação escalar,multiplicação e da seguinte operação de involução

� : P ! P ; P (z) =nXk=0

akzk P � (z) :=

nXk=0

�akzk

é uma *-álgebra.Prova. É fácil provar que P é uma álgebra comutativa. Como ilustração vamos provar que � é involutiva,

anti-linear e reverte o produto. Tomemos P (z) =Pn

k=0 akzk, Q (z) =

Pml=0 blz

l em P e escalares �; � 2 C. Escreva

P (z) =1Xk=0

akzk e Q (z) =

1Xl=0

blzl

onde ak = 0 para todo k > n e bl = 0 para todo l > m. Temos:- Anti-linearidade:

(�P + �Q)�(z) =

1Xk=0

(�ak + �b) zk

!�=

1Xk=0

(�ak + �b)zk = �

1Xk=0

akzk + �

1Xk=0

bkzk = �P � (z) + �Q� (z)

- Involução:

(P �)�(z) =

nXk=0

akzk

!�=

nXk=0

akzk =

nXk=0

akzk = P (z)

- Reversão do produto: considerando

(PQ) (z) =

nXk=0

akzk

! mXl=0

blzl

!=

1Xk=0

ckAk

onde ck =Pk

l=0 ak�lbl (k = 0; 1; 2; :::), temos

(PQ)�(z) =

1Xk=0

ckAk =

1Xk=0

kXl=0

ak�lblAk = (P �Q�) (z) = (Q�P �) (z)

pois a álgebra dos polinômios complexos é comutativa.

Finalmente, de�nimos o conceito de C*-álgebra:

De�nição 51 C*-álgebra é uma *-álgebra de Banach com seguinte propriedade:

kA�Ak = kAk2 ; 8 A 2 A

Exemplo 52 L (H), o conjunto dos operadores lineares limitados de�nidos num espaço de Hilbert H, com a normade�nida na página 16 é uma C*-álgebra com as operações usuais e a involução � de�nida pelo adjunto.Prova. As condições para ser uma *-álgebra de Banach podem ser veri�cadas por inspeção direta, como no

exemplo (48). A proposição (41) garante que o adjunto de Hilbert satisfaz a propriedade característica de C*-álgebra.

25

Exemplo 53 C (X), o conjunto das funções contínuas de�nidas num espaço topológico compacto X que tomamvalores em C, munido das operações de soma, multiplicação escalar e multiplicação de�nidos ponto-a-ponto, é umaálgebra. Agora, de�nimos a conjugação de uma função f 2 C (X) por

f� (x) := f (x) ; 8x 2 X

Com essa conjugação, C (X) torna-se uma *-álgebra. Como X é compacto, podemos de�nir a norma (como se podeveri�car)

k k : C (X)! [0;1) ; kfk := sup fjf (x)j ; x 2 Xg

Então, C (X) munido dessa norma é uma C*-álgebra.

De�nição 54 (Homomor�smos de Álgebras) Sejam A e B álgebras.Homomor�smo de álgebras entre A e B é uma aplicação linear � : A ! B que preserva a multiplicação, ou seja,

� (AB) = � (A)� (B) ; 8A;B 2 A

Se A e B são *-álgebras, então um homomor�smo de *-álgebras (ou *-homomor�smos) entre A e B é umhomomor�smo de álgebras que preserva a conjugação

�(A�) = [�(A)]� ; 8A 2 A

De�nimos também a seguinte terminologia especial para homomor�smos de álgebras:- Isomor�smo: homomor�smo bijetivo;- Monomor�smo: homomor�smo injetivo;- Epimor�smo: homomor�smo sobrejetivo.

26

4 Teoria Espectral

O espectro é uma generalização do conceito de autovalores para operadores de�nidos em espaços vetoriais comdimensão in�nita. Num certo sentido, o espectro de�ne o �conjunto dos valores complexos que um operador assume�.Com seu estudo obteremos algumas propriedades com a �nalidade de mostrar que o espectro de um operador auto-adjunto é real e compacto.

De�nição 55 Seja H um espaço de Hilbert e A : H ! H um operador limitado. O espectro e o conjunto resolventede A são de�nidos, respectivamente, por:

�(A) = f� 2 C; (�I �A) não é invertível em Hg�(A) = f� 2 C; (�I �A) é invertível em Hg

Também de�nimos o raio espectralrA := sup fjzj ; z 2 � (A)g

O espectro é subdividido em três subconjuntos como descritos abaixo:Espectro pontual:

�p(A) = f� 2 C; (�I �A) não é injetivog

Espectro residual:

�r(A) = f� 2 C; (�I �A) é injetivo mas sua imagem não é densa em Hg

Espectro contínuo:

�c(A) = f� 2 C; (�I �A) é injetivo com imagem densa mas inversa descontínuag

Observe que temos a seguinte união disjunta

�(A) = �p(A) [ �r(A) [ �c(A)

De�nição 56 Seja A 2 L (H). Um autovalor de A é um número � 2 C para o qual existe x 2 H, x 6= 0 satisfazendoAx = �x.

Lema 57 Um número � 2 C é autovalor de A 2 L (H) se e somente se � 2 �p(A).

A prova é simples e será omitida.

Para z 2 � (A), chamado operador resolvente de A em z o operador

RA (z) = (zI �A)�1

As propriedades do resolvente serão discutidas com certo detalhe no decorrer desta seção.

Observação 58 É possível provar que quando H possuir dimensão �nita, o espectro de um operador A : H ! H(que é necessariamente limitado) coincide com seu espectro pontual

�(A) = �p(A)

Realmente, dizer que um operador limitado é injetivo é equivalente dizer que seu núcleo é trivial ker (A) = f0g; nessecaso, o Teorema do Núcleo e da Imagem garante que A também é sobrejetivo �portanto, ele é invertível. Com isso,o espectro de A consiste dos elementos � 2 C para os quais (�I �A) não é injetivo, ou seja, existe pelo menos umvetor não-nulo x 2 H tal que A (x) = �x.

As propriedades do espectro podem ser avaliadas mediante técnicas analíticas; aqui, fazemos uso da série deNeumann e da série de Taylor do resolvente.

27

4.1 Séries para o Resolvente

A teoria das séries de operadores é análoga à teoria das séries numéricas, com de�nições de convergência e testes deconvergência. Faremos uso dos conceitos e resultados sem maiores detalhes.

4.1.1 Série de Neumann

A série de Neumann do operador A 2 L (H) é de�nida por

1

z

1Xn=0

�A

z

�nLema 59 A série de Neumann converge em norma para RA(z) se z 2 C, jzj > kAk, isto é,

limn!1

1z1Xn=0

�A

z

�n�RA(z)

= 0Prova. Sob a condição jzj > kAk, a convergência da série

P1n=0

�Az

�né garantida pelo teste-M de Weierstrass14 ,

considerando

cn :=kAkn

jzjn ; n � 0

e lembrando que a sériePcn é a série geométrica de razão kAk = jzj < 1, convergente. Como a série de potências

1z

P1n=0

�Az

�né convergente, podemos multiplicá-la termo-a-termo e com isso veri�camos que ela é igual ao resolvente

RA (z): 1

z

1Xn=0

�A

z

�n!� (zI �A) =

1Xn=0

�A

z

�n�

1Xn=0

�A

z

�n+1=

1Xn=0

�A

z

�n�

1Xn=1

�A

z

�n= I

Corolário 60 � (A) � D (kAk).

4.1.2 Série de Taylor do Resolvente

Alguns resultados sobre funções em uma variável complexa serão necessários para prosseguirmos. Os teoremasutilizados serão apenas enunciados e suas demonstrações poderão ser encontradas nas referências.Na sequência, vamos utilizar os seguintes resultados da teoria das funções analíticas:

Teorema de Liouville: Toda função inteira (analítica em C) limitada é constante. [3]Teorema das funções analíticas: Uma função f : ! C, � C aberto, é analítica se, e somente se,para todo ponto z0 2 , existe r > 0 tal que �(z0; r) � e f coincide com uma série de potências nodisco �(z0; r). [3]

Proposição 61 Considere A 2 L (H). Dado z0 2 �(A), para z 2 C, jz � z0j < kRA(z0)k�1, a sérieP1

n=0 (z � z0)n[RA(z0)]

n+1

converge em norma para RA(z).Prova. Para z 2 C satisfazendo jz � z0j < kRA(z0)k�1, seja c = k(z � z0)RA(z0)k < 1. Então,

k(z � z0)nRA(z0)nk < cn

Como c < 1, a sériePcn converge; pelo Teste de Weierstrass isso implica que a série

P(z � z0)nRA(z0)n converge.

Imediatamente, X(z � z0)nRA(z0)n+1 = RA(z0)

X(z � z0)nRA(z0)n

também converge. Agora veri�camos por cálculo direto que

(zI �A)1Xn=0

(z � z0)n [RA(z0)]n+1 = I

14Teste-M de Weierstrass para séries de operadores : se (An) uma sequência de operadores e (cn) é uma sequência de números reaispositivos tais que kAnk � cn 8n e

Pcn converge, então

PAn também converge (em norma).

28

Portanto,1Xn=0

(z � z0)n [RA(z0)]n+1 = RA (z)

Dado z0 2 � (A), denominamos a sérieP1

n=0 (z � z0)n � [RA(z0)]n+1 a série de Taylor do resolvente de A em z0.

A proposição acima nos dá imediatamente um resultado que será essencial no estudo do Teorema Espectral.

Corolário 62 Se A 2 L (H) então �(A) é aberto e �(A) é compacto.

Observe que, pelo corolário, o operador resolvente é uma função analítica (holomorfa) em um disco de centro z0e raio kRA(z0)k�1 contido no espectro de A �veja [5, p.204].

Teorema 63 Seja A 2 L (H). Vale a primeira fórmula do resolvente:

RA (z)�RA (w) = (w � z)RA (w)RA (z) ; 8z; w 2 � (A)

Em particular, RA (z) e RA (w) comutam para todo z, w 2 � (A).Prova. Tome z, w 2 � (A). Como os operadores A e (zI �A) comutam e por de�nição RA (z) = (zI �A)�1,

segue que

RA (z)A = RA (z)AI = RA (z)A (zI �A)RA (z) = RA (z) (zI �A)ARA (z) = IARA (z) = ARA (z)

PortantoRA (z) (wI �A) = wRA (z)�RA (z)A = wRA (z)�ARA (z) = (wI �A)RA (z)

ou seja, RA (z) e (wI �A) também comutam.Assim temos a seguinte sequência de igualdades:

RA (z)�RA (w) = RA (z) (wI �A)RA (w)�RA (z) (zI �A)RA (w)= (wI �A)RA (z)RA (w)� (zI �A)RA (z)RA (w)= [(wI �A)� (zI �A)]RA (z)RA (w)= (w � z)RA (z)RA (w)

Teorema 64 Seja X um espaço de Banach e A 2 L (X) um operador limitado. Então(i) O operador resolvente tende ao operador nulo no in�nito:15

limz!1

RA (z) = 0

(ii) O espectro de A não é vazio�(A) 6= ;

Prova. (i) De acordo com a série de Neumann, para z 2 � (A), jzj > kAk vale RA(z) = 1z

P1n=0

�Az

�n. Logo,

kRA(z)k �����1z���� 1Xn=0

�kAkjzj

�n=

����1z����24 1�1� kAk

jzj

�35 = 1

jzj � kAk

Quando jzj tende ao in�nito, kRA (z)k tende a zero. Portanto, limz!1RA (z) = 0.(ii) Suponha, por absurdo, que o espectro seja vazio, isto é, � (A) = C. Seja � 2 L (X)� (funcional linear

contínuo). Dado z0 2 C, usando a expressão do operador resolvente em uma série de Taylor em torno de z0 temosque a aplicação z 7! (� �RA) (z) é analítica numa vizinhança �(z0; r) de z0 pois vale

(� �RA) (z) =1Xn=0

(z � z0)n � ��Rn+1A (z0)

�15Esse limite signi�ca:

limz!1

kRA (z)k = 0

29

Como z0 2 C é arbitrário, isso signi�ca que ��RA é analítica em C, portanto é função inteira. Como k(� �RA) (z)k �k�k kRA (z)k para todo z 2 C, por (i) vale limz!1 (� �RA) (z) = 0. Sendo � � RA contínua segue que a mesma élimitada e, pelo teorema de Liouville � � RA (z) é constante. Como � � RA (z) tende a zero no in�nito concluímosque ela é identicamente nula. Como � é arbitrário, pela proposição (36), isso implica que RA (z) = 0, para todoz 2 C. Absurdo, pois, RA (z) é o inverso de um operador.

Aqui usamos apenas operadores limitados, por isso, convém ressaltar que para operadores não limitados váriosdos resultados apresentados não são válidos. Por exemplo, pode ocorrer que o espectro ou o conjunto resolventesejam vazios.

Observação 65 O Corolário (62) e o Teorema (64) implicam que o raio espectral é um número real (não é in�nito).É um fato não-trivial e importante que para um operador limitado auto-adjunto A vale

kAk = rA

Observe que a fórmula acima relaciona os aspectos algébrico e topológico do operador A.

Teorema 66 (espectro de operadores auto-adjuntos) Seja H um espaço de Hilbert e A um operador auto-adjunto limitado em H.O espectro de A é real

� (A) � R

Prova. Seja � 2 C8R um número complexo não-real e escreva

� = �+ i�I ; �; � 2 R; � 6= 0

Para analisar o operador �I �A, de�nimos

B := (�I �A)� (�I �A)

Considerando que A é auto-adjunto e � 6= 0, temos que

B = �2I + (�I �A)2

Então, B é um operador auto-adjunto e injetivo:

hBu;Bui =D�2u+ (�I �A)2 u; �2u+ (�I �A)2 u

E= �4 kuk2 + 2�2 k(�I �A)uk2 +

(�I �A)2 u 2� �4 kuk2 8u 2 H

Pelo Corolário , temos que B também é sobrejetivo. Isso implica que �I � A também é bijetivo, donde concluimosque � =2 � (A).

30

4.2 Exemplos

4.2.1 O espectro do operador H

Considere o operador H de�nido na seção (2.5.1). Primeiro, veri�camos que

(�I �H) (an) =��

�� 1

n

�an

�; 8� 2 C

Se � =2 f0g [ f1=k ; k 2 N�g, então podemos de�nir o seguinte operador linear em `2 (N�), como se pode veri�carpor inspeção direta,

B� (an) :=

�an

�� 1n

�Também podemos veri�car que B� é limitado e vale

kB�k �1

c, c := inf

n2N�

������� 1

n

�����Veri�camos que B� é o operador inverso de (�I �H):

B� (�I �H) (an) = (an) = (�I �H)B� (an) ; 8 (an) 2 `2 (N�)

Isso signi�ca que o espectro de H está contido no conjunto f0g [ f1=k ; k 2 N�g.Agora, para k 2 N�, o operador ((1=k) I �H) não é invertível pois não é injetivo (seu núcleo contem a sequência�

�kn

�): �

1

kI �H

���kn

�=

��1

k� 1

n

��kn

�= (0)

Portanto, o espectro de H contem o conjunto f1=k ; k 2 N�g.Vamos analisar agora o caso de � = 0. Primeiramente, considere o conjunto

D0 :=�(an) 2 `2 (N�) = �n2a2n <1

Por inspeção direta, veri�ca-se que D0 é um subespaço linear de `2 (N�). Além disso, temos: (i) D0 6= `2 (N�) pois,por exemplo, D0 não contem a sequência quadrado-somável (1=n) e (ii) D0 é denso em `2 (N�) pois (evidentemente)contem os elementos da base Be, �

�kn

�2 D0 ; 8k 2 N�

o que implica que o complementar ortogonal de D0 em `2 (N�) é o subespaço trivial f(0)g:

(an) 2 `2 (N�) ; (an) 2 D?0 )D(an) ;

��kn

�E= ak = 0 8k 2 N� ) (an) = (0)

Podemos veri�car que H possui inversa de�nida em D0:

B0 : D0 ! `2 (N�) , B0 (an) = (nan)

Contudo, B0 não é limitado:

B0

��kn

�=�k�kn

�;

B0 ��kn� ��kn� = k ; 8k 2 N�

Isso implica que o número 0 pertence ao espectro de H! Resumindo,

� (H) = f0g [ f1=n ; n 2 N�g

Além disso, os números 1=n (n 2 N�) são valores no espectro pontual de H e o número 0 é um valor no espectrocontínuo de H.

31

5 Cálculo Funcional Contínuo

A ação de polinômios sobre operadores A 2 L (H) é de�nida de modo natural: para um polinômio com coe�cientescomplexos P (z) =

Pnk=0 akz

k, de�nimos

P (A) :=nXk=0

akAk 2 L (H)

Essencialmente, o cálculo funcional contínuo extende essa ação para funções contínuas, preservando as propriedadesalgébricas.

Teorema 67 (Cálculo Funcional Contínuo)Seja H um espaço de Hilbert e A : H ! H um operador linear limitado auto-adjunto. Então existe um único

homomor�smo de *-álgebras�̂A : C (� (A))! L (H)

tal que:i) A imagem �̂A na função identidade, id : C (� (A))! C; z 7! z, é o operador A:

�̂A (id) = A

ii) Continuidade: se (fn) � C (� (A)) converge uniformemente para f 2 C (� (A)) então��̂A (fn)

�2 L (H)

converge para �̂A (f) 2 L (H) em norma:

limn!1

kfn � fk1 = 0) limn!1

�̂A (fn)� �̂A (f) = 0Além disso, vale:

iii) Isometria: (o que signi�ca, em particular, que �̂A é injetiva)

k�̂A (f) k = kfk1 ; f 2 C (� (A))

iv) Aplicação espectral:���̂A (f)

�= f (� (A)) ; 8f 2 C (� (A))

Observação 68 Destacamos a seguinte notação para as imagens da aplicação �̂A:

f (A) := �̂A (f) ; 8f 2 C (� (A))

O fato de �̂A ser um homomor�smo signi�ca que a correspondência entre funções contínuas sobre o espectro de A eos operadores em L (H) preserva a estrutura algébrica.

Para provar este teorema utilizaremos um resultado particular (sobre polinômios) juntamente com o teorema deStone-Weierstrass a �m de obtermos uma extensão do homomor�smo �A de P para o conjunto C (� (A)).

Teorema de Stone Weierstrass16 [2, Teorema p.261] [7, Theorem 7.33 ] [4, Theorem 1.1 p.52]Seja X � C um subconjunto compacto. Então o conjunto dos polinômios complexos de�nidos em X

é denso no conjunto das funções contínuas de�nidas em X com respeito a topologia de�nida pela normado supremo,

f 2 C (X) ; kfk1 := sup fjf (x)j ; x 2 Xg

16Destacamos que enunciamos o Teorema de Stone-Weierstrass no caso particular que nos interessa.

32

Lema 69 Seja A : H ! H operador limitado auto-adjunto. Então

�A : P ! L (H) ; �A (P ) := P (A)

é um homomor�smo de *-álgebras.Prova. Considere P (z) =

Pnk=0 akz

k e Q (z) =Pm

l=0 blzl e � 2 C. Escreva

P (z) =1Xk=0

akzk ; Q (z) =

1Xl=0

blzl

onde ak = 0 para todo k > n e bl = 0 para todo l > m.Assim, valem:

i) Linearidade:

�A (P + �Q) =1Xk=0

(ak + �bk)�Ak�

=1Xk=0

ak�Ak�+

1Xk=0

�bk�Ak�=

1Xk=0

ak�Ak�+ �

1Xk=0

bk�Ak�

= �A (P ) + ��A (Q) :

ii) Preserva o produto: temos que

(PQ) (A) =

1Xk=0

ckAk onde ck =

kXl=0

ak�lbl para k = 0; 1; 2; :::

Como

P (A)Q (A) =

nXk=0

akAk

! mXl=0

blAl

!=

1Xk=0

eckAk onde eck = kXl=0

ak�lbl = ck; k = 0; 1; 2; :::

segue-se que P (A)Q (A) = (PQ) (A) e, portanto, �A (PQ) = �A (P ) �A (Q).

iii) Preserva a conjugação:

�A (P�) = P � (A) =

nXk=0

akAk =

nXk=0

ak (A�)k=

nXk=0

ak�Ak��=

nXk=0

akAk

!�= (�A (P ))

onde a terceira igualdade segue do fato de A ser auto-adjunto.

Lema 70 Seja A : H ! H limitado (eventualmente A� 6= A). Se P (z) é um polinômio, então � (P (A)) = P (� (A)).Prova. � (P (A)) � P (� (A)) Seja w 2 � (P (A)). Vamos analisar o polinômio q (z) = w � P (z). Sejam

�1; :::; �n 2 C as raizes de q, isto é,

q (z) = w � P (z) = � (�1 � z) ::: (�n � z)

Evidentemente w = P (�i), para todo i = 1; :::; n. Vale

q (A) = wI � P (A) = � (�1I �A) ::: (�nI �A)

Como wI � P (A) não é invertível, existe pelo menos um k 2 f1; :::; ng tal que �kI � A também não é invertível.Nesse caso �k 2 � (A), donde w = P (�k) 2 P (� (A)).

� (P (A)) � P (� (A)) Seja � 2 � (A). Vamos analisar o polinômio S (z) = P (�) � P (z). Como � é raiz de S,existe um polinômio r (z) tal que S (z) = (�� z) r (z). Então S (A) = (�I �A) r (A). Como �I �A não é invertíveltemos que S (A) não é invertível. Portanto, S (A) = P (�) I � P (A) não é invertível, donde P (�) 2 � (P (A)).

33

Lema 71 Se A 2 L (H), então a sequência�

npkAnk

�converge e vale

limn!1

npkAnk = inf

n2N�npkAnk

Prova. Dados m, n 2 N� de�na rn (m) e qn (m), respectivamente, o resto e o quociente da divisão de m por n.Deste modo, m = qn (m)n+ rn (m) onde qn (m), rn (m) 2 N� e 0 � rn (m) < n. Usando o fato de L (H) ser álgebrade Banach, podemos escrever

kAmk = Aqn(m)nArn(m) � kAnkqn(m) kAkrn(m)

Assim,

kAmk1m � kAnk

qn(m)m kAk

rn(m)m

Observe que, como 0 � rn(m)m < n

m , vale o limite

limm!1

rn (m)

m= 0

Além disso, sendo 1 = qn(m)nm + rn(m)

m , vale

limm!1

qn (m)n

m= 1) lim

m!1

qn (m)

m=1

n

Logo, para todo n 2 N�

lim supm2N�

kAmk1m � lim sup

m2N�

�kAnk

qn(m)m kAk

rn(m)m

�= kAnk

1n

Portanto, lim supm2N� kAmk1m � lim infn2N� kAnk

1n . Segue-se que a sequência kAnk

1n converge e vale limn!1

npkAnk =

infn2N�npkAnk.

Teorema 72 (Teorema do Raio Espectral) Se A 2 L (H), então o raio espectral de A é

rA = limn!1

npkAnk

Prova. Se a série de Neumann 1z

P1n=0

�Az

�nconverge então converge para o resolvente RA (z) = (zI �A)�1

e, neste caso, z =2 � (A). Como essa série converge (pelo Teste de Weierstrass) quando jzj > lim sup npkAnk; pelo

lema anterior, isso implica que rA � lim sup npkAnk. Portanto, temos que provar apenas que rA � lim sup n

pkAnk.

Seguimos a demonstração de [8, Theorem 3.1.10, p.70]. Para iniciar, �xe arbitrariamente � 2 L (H)�, e seja F =� � RA; por de�nição F é analítica no exterior do disco f� 2 C : j�j � rAg.17 A partir da série de Neumann doresolvente, obtemos a expansão em série de Laurent para F ,

F (�) =1Xn=0

� (An)

�n+1; j�j > kAk

Isso implica quelim

j�j!1F (�) = 0

Isso signi�ca que F é analítica no in�nito; consequentemente, a expansão de Laurent acima vale no exterior do discof� 2 C : j�j � rAg.Agora, �xamos temporariamente � com j�j > rA. Assim, em particular, temos que

limn!1

� (An)

�n= 0

17No exterior do disco f� 2 C : j�j � rAg, F se exprime localmente como série de potências (a composição de � com a série de Taylordo resolvente).

34

Como � é arbitrário, segue pelo princípio da limitação uniforme (veja abaixo) que existe uma constante K > 0 talque

kAnk � K j�jn 8n 2 NAssim,

kAnk1n � K

1n j�j

Portanto,lim kAnk

1n � limK 1

n j�j = j�jComo j�j > rA é arbitrário, isso implica que

lim npkAnk � rA

Destacamos que nessa demonstração foi utilizado o Princípio da Limitação Uniforme, ou Teorema de Banach-Steinhaus:

Princípio da Limitação Uniforme: Sejam B1 e B2 espaços de Banach e fTi; i 2 Ig � L (B1;B2)uma família arbitrária de aplicações lineares limitadas entre B1 e B2. Então, são equivalentes:

a) fTi; i 2 Igé pontualmente limitada, i.e.,

supi2I

kTixk <1 ; 8x 2 B1

b) fTi; i 2 Ig é uniformemente limitada, i.e.,

supi2I

kTik <1

Teorema 73 Se A : H ! H é auto-adjunto então kAk = rA.Prova. Se A é auto-adjunto, vale

kAk2 = kA�Ak = kA2kPortanto, kA2nk 1

2n = kAk para todo n 2 N. Pelo Teorema do Raio Espectral (72) segue-se que rA = limn!1 kA2nk 1

2n =kAk.

Proposição 74 Se A : H ! H é auto-adjunto então �A é isometria de P (� (A)) em L (H), isto é,

k�A (P ) k = kPk1 = sup fjP (z)j ; z 2 � (A)g ; 8 P 2 P (� (A))

Prova. Já provamos que �A é um homomor�smo linear. Também temos que ele preserva a conjugação: paratodo polinômio P vale

�A (P )�= (P (A))

�=

wXn=0

anAn

!�=

wXn=0

anAn = P � (A) = �A (P

�) (1)

Denotando P (A)� P (A) = Q (A) onde Q (z) = P � (z)P (z), vale

rQ(A) = sup fjwj ;w 2 � (Q (A))g= sup fjwj ;w 2 Q (� (A))g= sup fjwj ;w = Q (z) ; z 2 � (A)g= sup fjQ (z)j ; z 2 � (A)g= kQk1:

Então, começando pela identidade (1), temos:

k�A (P ) k = k�A (P )� �A (P ) k12 = kP (A)� P (A) k 12 = kQ (A) k 12

Pelo Teorema do Raio Espectral (72), segue

k�A (P ) k = (rQ(A))12 = kQk

121 =

�kPk21

� 12 = kPk1

35

Demonstração do teorema (67) �ítens (i) ; (ii) ; (iii). Existência. Pelo teorema de Stone-Weierstrass,temos que P (� (A)) é denso em C (� (A)). Como �A é linear e limitada, então possui uma única extensão linear elimitada �̂A para C (� (A)). Dessa construção, segue imediatamente que �̂A aplica a função identidade no operador A(item (i) do teorema), é contínua (ítem (ii) do teorema) e é linear. Para provar que �̂A é um *-homomor�smo, bastaveri�car que preserva o produto e a conjugação. Assim, dados f; g 2 C (� (A)) considere sequências de polinômioscomplexos (pn) e (qn) que convergem para f e g uniformemente em � (A), respectivamente,

limn!1

kpn � fk1 = 0 = limn!1

kqn � gk1

Então, usando que �A é *-homomor�smo, obtemos:

�̂A (fg) = limn!1

�̂A (pnqn) = limn!1

�A (pnqn) = limn!1

�A (pn) �A (qn) = limn!1

�̂A (pn) �̂A (qn) = �̂A (f) �̂A (g)

e�̂A (f

�) = limn!1

�̂A (p�n) = lim

n!1�A (p

�n) = lim

n!1�A (pn)

�= lim

n!1�̂A (pn)

�= �̂A (f)

Analogamente, veri�camos que �̂A é uma isometria (item (iii) do teorema): �̂A (f) = limn!1

�̂A (pn) = limn!1

k�A (pn)k = limn!1

kpnk1 = kfk1

Unicidade. Seja � outro homomor�smo de *-álgebras entre C (� (A)) e L (H) que cumpre as condições (i) e(ii). Pela condição (i), ele devem coincidir com �A quando aplicado aos polinômios complexos; como pelo Teoremade Stone-Weierstrass os polinômios complexos constituem um subespaço linear denso em C (� (A)), isso signi�ca que� coincide com �̂A num subconjunto denso do seu domínio. Pela condição (ii), isso implica que elas devem coincidirem todo domínio, ou seja, são aplicações idênticas.

Para provar a propriedade da Aplicação Espectral (item (iv) do teorema), precisamos de mais dois resultadospreliminares.

Lema 75 Seja A um operador limitado no espaço de Hilbert H.Dado ! 2 � (A), de�nimos a função

�! : � (A)! C ; �! (z) :=1

! � zEntão �! é contínua e

�̂A (�!) = (!I �A)�1

Em particular, o resolvente RA (!) é o limite em norma de uma sequência de polinômios de A.Prova. Como ! =2 � (A), �! está bem-de�nida e é contínua em � (A). Como �̂A é um homomor�smo de

*-álgebras, temos�̂A (�!) (!I �A) = �̂A (�!) �̂A (! � z) = �̂A (�! (! � z)) = �̂A (1) = I

e(!I �A) �̂A (�!) = �̂A (! � z) �̂A (�!) = �̂A ((! � z) �!) = �̂A (1) = I

Portanto, �̂A (�!) = (!I �A)�1.

Lema 76 Seja A um operador limitado no espaço de Hilbert H.Seja (pn) uma sequência de polinômios tal que (pn (A)) converge em norma para um operador B 2 L (H). Então,

existe uma função g 2 C (� (A)) tal que B = �̂A (g).Prova. Como a sequência (pn (A)) converge, ela é uma sequência de Cauchy em L (H); como �̂A é isometria,

isso implica que a sequência de polinômios (pn) é uma sequência de Cauchy:

kpn � pmk1 = �̂A (pn � pm) = �̂A (pn)� �̂A (pm) = kpn (A)� pn (A)k ; 8n;m 2 N�

Como C (� (A)) é um espaço topológico completo (com respeito à convergência uniforme), isso implica que (pn)converge para alguma função g 2 C (� (A)). Então, pela continuidade de �̂A obtemos

�̂A (g) = limn!1

�̂A (pn) = limn!1

pn (A) = B

36

Demonstração da propriedade Aplicação Espectral �item (iv). ���̂A (f)

�� f (� (A)). Provar essa

inclusão é equivalente a provar ���̂A (f)

�� C8f (� (A)). Assim, dado ! 2 C8f (� (A)), podemos de�nir a função

contínuag! : � (A)! C ; g! (z) :=

1

! � f (z)Como

!I � �̂A (f) = �̂A (! � f)

temos�̂A (g!)

h!I � �̂A (f)

i= �̂A (g!) �̂A (! � f) = �̂A [g! (! � f)] = �̂A (1) = I

Analogamente, provamos queh!I � �̂A (f)

i�̂A (g!) = I. Isso signi�ca que !I � �̂A (g!) é invertível, donde con-

cluimos que ! 2 ���̂A (g!)

�. Como ! 2 C8f (� (A)) é arbitrário, isso signi�ca que �

��̂A (f)

�� C8f (� (A)).

���̂A (f)

�� f (� (A)). Seja � 2 � (A). Suponha por hipótese de absurdo que f (�) =2 �

��̂A (f)

�, o que signi�ca

que o operador f (�) I � �̂A (f) é invertível. Pelo lema (75),hf (�) I � �̂A (f)

i�1é o limite em norma de uma

sequência de polinômios em �̂A (f); como �̂A (f) é o limite em norma de uma sequência de polinômios em A, isso

signi�ca quehf (�) I � �̂A (f)

i�1é o limite em norma de uma sequência de polinômios em A. Pelo lema ( 76), isso

implica que existe g 2 C (� (A)) tal que �̂A (g) =hf (�) I � �̂A (f)

i�1. Então,

�̂A (1) = I =hf (�) I � �̂A (f)

i�1 hf (�) I � �̂A (f)

i= �̂A (g) �̂A (f (�)� f) = �̂A [g (f (�)� f)]

Pela injetividade de �̂A, isso implica que

g (z) (f (�)� f (z)) = 1 ; z 2 � (A)

Como � 2 � (A), isso implica 0 = 1 �Absurdo! Considerando a correção das implicações lógicas, concluimos que ahipótese de que f (�) =2 �

��̂A (f)

�deve ser falsa. Portanto, f (�) 2 �

��̂A (f)

�. Pela arbitrariedade de � 2 � (A),

isso implica que ���̂A (f)

�� f (� (A)).

37

6 Teorema Espectral

Em toda seção considere H um espaço de Hilbert e A um operador auto-adjunto limitado em H.Lembramos a notação que será usada na sequência,

B0 (� (A)) = ffunções Borel mensuráveis limitadas em � (A)g

O Teorema Espectral consiste na extensão do *-homomor�smo �̂A : C (� (A))! L (H) para um *-homomor�smo deB0 (� (A)) a L (H). Na sequência, primeiro desenvolvemos o argumento que motiva a de�nição dessa extensão (o queconsiste em parte da prova) e depois enunciamos propriamente o teorema.

Argumento para a extensão de �̂A

Dado x 2 H, de�nimos o funcional linear

�(A;x) : C (� (A))! C ; �(A;x) (f) := hx; f (A)xi

A�rmamos que �(A;x) é positivo e contínuo. De fato, se f é função positiva f (t) � 0 8t 2 � (A), então podemos

de�nir a raiz f1=2 e o operador B = �̂A�f12

�: Veri�camos que B é auto-adjunto,

B� = �̂A

�f12

��= �̂A

�f12

�= �̂A

�f12

�= B

Daí, deduzimos a positividade de �(A;x):

�(A;x) (f) = hx; �̂A (f)xi = hx;B2 (A)xi = hB� (A)x;B (A)xi = hB (A)x;B (A)xi = kB (A)xk � 0

Como x está �xado, a continuidade de �(A;x) (f) segue da seguinte desigualdade (onde usamos que �̂A é isométrico):���(A;x) (f)�� = ���hx; �̂A (f)xi��� � �̂A (f) kxk2 = kfk kxk2Pelo teorema de Riesz-Markov (85), existe uma única medida de Borel regular �(A;x) sobre � (A), chamada medida

espectral associada ao par (A; x), tal vale:

�(A;x) (f) =

Z�(A)

fd�(A;x) ; 8f 2 C (� (A))

Observamos que�(A;x) (� (A)) = kxk

2

A fórmula integral para �(A;x) nos permite extender naturalmente esse funcional para funções Borel mensuráveislimitadas no espectro de A:18

�(A;x) (g) =

Z�(A)

gd�(A;x) ; 8g 2 B0 (� (A))

sendo que: se g 2 B0 (� (A)) então g é integrável relativamente a qualquer medida de Borel �nita � sobre � (A),Z�(A)

jgj d� � kgk1 � (� (A)) <1 ; kgk = sup�2�(A)

jg (�)j

Finalmente, podemos de�nir a aplicação entre H e o dual de B0 (� (A)) (o espaço dos funcionais lineares contínuos)

�A : H ! B0 (� (A))� ; �A (x) := �(A;x)

Agora, para g 2 B0 (� (A)), pretendemos usar essa aplicação para construir operadores g (A) : H ! H tais que

hx; g (A)xi =Z�(A)

gd�(A;x) ; 8 x 2 H

18Note que usamos o mesmo símbolo para �(A;x) e sua extensão.

38

Para de�nir o operador g (A) combinamos as Medidas Espectrais, a Identidade de Polarização (23) e o Lema deRiesz. Heuristicamente, devemos ter: 8x; y 2 H,

hx; g (A) yi = 1

4fh(x+ y) ; g (A) (x+ y)i � h(x� y) ; g (A) (x� y)i � i [h(x+ iy) ; g (A) (x+ iy)i � h(x� iy) ; g (A) (x� iy)i]g

A expressão à direita pode ser de�nida usando a fórmula integral anterior. Para y 2 H �xado, mostraremos que acorrespondência x 7�! hx; g (A) yi é um funcional linear limitado; pelo Lema de Riesz, isso signi�ca que podemosidenti�car g (A) y com um único vetor de H; �nalmente, provamos que a correspondência y 7�! g (A) y é linear elimitada em y.

Construção da extensão de �̂A

Na sequência, usamos a notaçãof (A) = �̂A (f) ; 8f 2 C (� (A))

Sejam g 2 B0 (� (A)) e y 2 H. De�na�A;g;y : H ! C

por

�A;g;y (x) :=1

4

(Z�(A)

gd�(A;x+y) �Z�(A)

gd�(A;x�y) � i"Z

�(A)

gd�(A;x+iy) �Z�(A)

g (�) d�(A;x�iy)

#)

O seguinte lema é a ferramenta técnica que vamos utilizar nas demonstrações subseqüentes.

Lema 77 Para g 2 B0 (� (A)) limitada e dado um número �nito m 2 N� e elementos x1; y1; ::::; xm; ym 2 H, existeuma sequência de funções contínuas uniformemente limitada (fn) � C (� (A)) tal que

�A;g;yk (xk) = limn!1

hxk; fn (A) yki ; 8k = 1; :::;m

Prova. Por simplicidade, vamos provar o caso m = 1 � o caso geral pode ser provado analogamente. Dadosx; y 2 H, conforme a Proposição (91) considerando as medidas �(A;x+y), �(A;x�y), �(A;x+iy) e �(A;x�iy), tomamosuma sequência de funções contínuas uniformemente limitada (fn) tal que

limn!1

Z�(A)

jfn � gj d�# = 0 ; �# = �(A;x+y); �(A;x�y); �(A;x+iy); �(A;x�iy)

Pelas de�nições das medidas espectrais (na 3a. igualdade), vale:

�A;g;y (x) =1

4

(Z�(A)

gd�(A;x+y) �Z�(A)

gd�(A;x�y) � i"Z

�(A)

gd�(A;x+iy) �Z�(A)

gd�(A;x�iy)

#)

= limn!1

1

4

(Z�(A)

fnd�(A;x+y) �Z�(A)

fnd�(A;x�y) � i"Z

�(A)

fnd�(A;x+iy) �Z�(A)

fn (�) d�(A;x�iy)

#)

= limn!1

1

4fhx+ y; fn (A) (x+ y)i � hx� y; fn (A) (x� y)i � i [hx+ iy; fn (A) (x+ iy)i � hx� iy; fn (A) (x� iy)i]g

= limn!1

hx; fn (A) yi

39

Lema 78 Para g 2 B0 (� (A)) e y 2 H, �A;g;y é um funcional linear limitado,

k�A;g;yk <1

Prova. �A;g;y é linear. Dados �; � 2 C e x1; x2 2 H, conforme o Lema (77) seja (fn) � C (� (A)) umasequência de funções contínuas uniformemente limitada tal que

�A;g;y (�x1 + �x2) = limn!1

h�x1 + �x2; fn (A) yi ; �A;g;y (x1) = limn!1

hx1; fn (A) yi ; �A;g;y (x2) = limn!1

hx2; fn (A) yi

Então:

�A;g;y (�x1 + �x2) = limn!1

h�x1 + �x2; fn (A) yi

= � limn!1

hx1; fn (A) yi+ � limn!1

hx2; fn (A) yi

= ��A;g;y (x1) + ��A;g;y (x2)

�A;g;y é limitada. Analogamente, dados x 2 H, conforme (77) tomamos (fn) � C (� (A)) uniformementelimitada pela norma de g tal que

�A;g;y (x) = limn!1

hx; fn (A) yi

Então:j�A;g;y (x)j =

��� limn!1

hx; fn (A) yi��� � lim

n!1sup kxk kfn (A)k kyk � kyk kgk1 kxk ; 8 x 2 H

Como x 2 H é arbitrário, isso signi�ca que

k�A;g;yk � kgk1 kyk

Lema 79 Dado g 2 B0 (� (A)), existe um operador limitado g (A) : H ! H tal que

�A;g;y (x) = hx; g (A) yi ; 8x; y 2 H

Além disso, valekg (A)k � kgk1

Prova. Dado y 2 H, como �A;g;y : H ! H é funcional linear limitado, pelo Teorema de Representação de Riesz(37) existe um único vetor ~y 2 H tal que

�A;g;y (x) = hx; ~yi ; 8x 2 H

De�nimosg (A) : H ! H ; g (A) y := ~y

Assim:�A;g;y (x) = hx; g (A) yi ; 8x; y 2 H

Linearidade. Agora, considere x; y1; y2 2 H e �; � 2 C. Conforme o Lema (77) seja (fn) � C (� (A)) umasequência de funções contínuas uniformemente limitada pela norma de g tal que

�A;g;�y1+�y2 (x) = limn!1

hx; fn (A) (�y1 + �y2)i ; �A;g;y1 (x) = limn!1

hx; fn (A) y1i ; �A;g;y2 (x) = limn!1

hx; fn (A) y2i

Então:

hx; g (A) (�y1 + �y2)i = �A;g;�y1+�y2 (x)

= limn!1

hx; fn (A) (�y1 + �y2)i

= limn!1

��� hx; fn (A) y1i+ �� hx; fn (A) y2i

= ���A;g;y1 (x) +

���A;g;y2 (x)

= �� hx; g (A) y1i+ �� hx; g (A) y2i= hx; �g (A) y1 + �g (A) y2i

40

Pela arbitrariedade de x 2 H, isso implica

g (A) (�y1 + �y2) = �g (A) y1 + �g (A) y2

Pela arbitrariedade de y1; y2 2 H e �; � 2 C, isso signi�ca que g (A) é linear.

Limitação. Dado y 2 H, conforme o Lema (77), seja (fn) � C (� (A)) uma sequência de funções contínuasuniformemente limitada pela norma de g tal que

�A;g;y (g (A) y) = limn!1

hg (A) y; fn (A) yi

Então,

kg (A) yk2 = hg (A) y; g (A) yi = �A;g;y (g (A) y) = limn!1

hg (A) y; fn (A) yi � limn!1

sup kg (A) yk kfn (A)k kyk

dondekg (A) yk � lim

n!1sup kfn (A)k kyk

Como �̂A e uma isometria e a sequência (fn) é uniformemente limitada pela norma de g, temos

kfn (A)k = kfnk1 � kgk1 ; 8n 2 N�

Portanto,kg (A) yk � kgk1 kyk

Como y 2 H é arbitrário, isso signi�ca quekg (A)k � kgk1

Teorema 80 (Teorema Espectral �Cálculo Funcional Mensurável)Seja H um espaço de Hilbert e A um operador auto-adjunto limitado em H.Então, existe um único homomor�smo de *-álgebras

��A : B0 (� (A))! L (H)

limitado ��A (g) � kgk1 8g 2 B0 (� (A))

tal que:i) A imagem ��A na função identidade, id : � (A)! C; z 7! z, é o operador A:

��A (id) = A

ii) Se (gn) � B0 (� (A)) é uma sequência uniformemente limitada que converge pontualmente para g 2 B0 (� (A)),então

���A (gn)

�é uma sequência que converge fracamente para ��A (g).

Prova. Existência. Considerando os desenvolvimentos anteriores, de�nimos

��A (g) := g (A) ; 8g 2 B0 (� (A))

Podemos veri�car que ��A é *-homomor�smo com a mesma técnica usada para provar os lemas anteriores �o queomitimos por brevidade. A limitação de ��A está provada no lema anterior.Prova de (i) Pela de�nição, ��A restrita a C (� (A)) coincide com �̂A e em particular vale

��A (id) = �̂A (id) = A

Prova de (ii) Agora seja (gn) � B0 (� (A)) é uma sequência uniformemente limitada que converge pontualmentepara g 2 B0 (� (A)). Dados x; y 2 H, temos

x;���A (gn)� ��A (g)

�y�=x;���A (gn � g)

�y�= hx; (gn � g) (A) yi = �A;(gn�g);y (x) ; n 2 N�

41

Portanto, temos quex;���A (gn)� ��A (g)

�y�é igual a

1

4

(Z�(A)

(gn � g) d�(A;x+y) �Z�(A)

(gn � g) d�(A;x�y) � i"Z

�(A)

(gn � g) d�(A;x+iy) �Z�(A)

(gn � g) (�) d�(A;x�i)

#)Como (gn) é uniformemente limitada e converge pontualmente para g, temos que (gn) converge para g em quasetodo ponto com respeito à quaquer medida de Borel � em � (A); pelo Teorema de Convergência Dominada (88) issoimplica que para qualquer medida de Borel � em � (A) vale:

limn!1

Z�(A)

(gn � g) d� = 0

Portanto,limn!1

x;���A (gn)� ��A (g)

�y�= 0

Como x; y 2 H são arbitrários, concluimos que���A (gn)

�converge fracamente para ��A (g).

Unicidade. Seja � outro homomor�smo de *-álgebras entre B0 (� (A)) e L (H) que cumpre as condições (i) e(ii) e seja limitado,

k� (g)k � c kgk1 ; 8g 2 B0 (� (A))Pela condição (i), ele devem coincidir com ��A quando aplicado aos polinômios complexos; como colorário do Teoremade Stone-Weierstrass, temos que toda função contínua em � (A) é limite pontual de alguma sequência uniformementelimitada de polinômios complexos em � (A); pelo ítem (ii), isso implica que � deve coincidir com ��A em C (� (A)).Agora, para provar que � coincide com ��A, basta mostrar que

hx; � (g) yi =x; ��A (g) y

�; 8x; y 2 H; 8g 2 B0 (� (A))

Pela Identidade de Polarização, basta mostrar que

hx; � (g)xi =x; ��A (g)x

�; 8x 2 H; 8g 2 B0 (� (A))

Assim, considere x 2 H �xado. De�na a aplicação

C (� (A)) 3 g 7�! hx; � (g)xi 2 CPela hipótese de que � é *-homomor�smo, concluimos que esse funcional é positivo:

C (� (A)) 3 g � 0) g = g1=2g1=2 ) hx; � (g)xi =Dx; �

�g1=2

���g1=2

�xE=D��g1=2

�x; �

�g1=2

�xE� 0

Pala hipótese de que � é limitado, concluimos que esse funcional também é limitado

jhx; � (g)xij � c kxk2 kgk1 ; 8g 2 B0 (� (A))Pelo Teorema de Riesz-Markov, existe uma medida de Borel regular ��;x em � (A), tal que

hx; � (g)xi =Z�(A)

gd��;x ; 8g 2 B0 (� (A))

Agora, dado g 2 B0 (� (A)) tomamos conforme a Proposição (91) uma sequência de funções contínuas uniformementelimitada (fn) que converge para g em L1 com respeito às medidas ��;x e �(A;x+x); �(A;x�x); �(A;x+ix); �(A;x�ix);�nalmente, usando o fato que � e ��A coincidem em C (� (A)) obtemos:

hx; � (g)xi =Z�(A)

gd��;x = limn!1

Z�(A)

fnd��;x = limn!1

hx; � (fn)xi = limn!1

x; ��A (fn)x

�=

= limn!1

1

4

�x+ x; ��A (fn) (x+ x)

��x� x; ��A (fn) (x� x)

�� i�x+ ix; ��A (fn) (x+ ix)

��x� ix; ��A (fn) (x� ix)

��= lim

n!1

1

4

(Z�(A)

fnd�(A;x+x) �Z�(A)

fnd�(A;x�x) � i"Z

�(A)

fnd�(A;x+ix) �Z�(A)

fnd�(A;x�ix)

#)

=1

4

(Z�(A)

gd�(A;x+x) �Z�(A)

gd�(A;x�x) � i"Z

�(A)

gd�(A;x+ix) �Z�(A)

gd�(A;x�ix)

#)

=1

4

�x+ x; ��A (g) (x+ x)

��x� x; ��A (g) (x� x)

�� i�x+ ix; ��A (g) (x+ ix)

��x� ix; ��A (g) (x� ix)

��=

x; ��A (g)x

42

7 Conclusão

Durante a realização deste trabalho encontramos algumas di�culdades relacionadas a literatura pois a maioria doslivros de análise funcional (aos quais tive acesso) não tratam o Teorema Espectral da maneira como foi apresentado.Porém, no decorrer da elaboração deste trabalho percorremos vários caminhos que proporcionaram uma visão daanálise funcional em seus diferentes aspectos. Acreditamos que nosso objetivo principal foi atingido e como resul-tado obtivemos um texto claro, bem estruturado, acessível a diversos estudantes, mesmo que não possuam muitosconhecimentos sobre o assunto.

Finalmente, concluimos o trabalho deduzindo a versão elementar do Teorema Espectral sobre a diagonalizaçãode operadores auto-adjuntos em espaços vetoriais de dimensão �nita.

7.1 Teorema Espectral e Diagonalização de Operadores em Dimensão Finita

Seja H um espaço de Hilbert de dimensão �nita e seja A : H ! H um operador auto-adjunto.Para o que segue, vamos de�nir o polinômio característico de A:

pA (z) := det (zI �A)

Esse polinômio possui as seguintes propriedades:i) O grau de pA (z) é menor ou igual à dimensão de H,

deg pA � dimH

ii) Como A é auto-adjunto, as raízes de pA (z) são reais.

Isso implica que o espectro de A é �nito e vale

#� (A) � dimH

(Realmente, se � 2 � (A) então (�I �A) não é invertível, ou seja det (�I �A) = 0. Isso signi�ca que � é uma raizde pA (z). Como deg pA � dimH, segue que pA (z) possui no máximo dimH raízes e isso prova a a�rmação.)

Agora, considere� (A) = f�1; :::; �mg � R ; m � dimH

De�nimos as seguintes funções

gk := � (A)! C ; gk (�j) :=

�1 ; j = k0 ; j 6= k

Então, o conjunto das funções Borel mensuráveis (limitadas) em � (A) é dado por

B (� (A)) = fg : � (A)! Cg =(

mXk=1

zkgk; z1; :::; zm 2 C)

Destacamos que a função constante 1 e a função identidade id se escrevem em termos da base fg1; :::; gmg por

1 =mXk=1

gk ; id =mXk=1

�kgk

O Teorema Espectral garante a existência de um *-homomor�smo

��A : B (� (A))! L (H)

tal que��A (id) = A

De�nimos os operadoresPk := ��A (gk) ; 8k 2 f1; :::;mg

43

Destacamos os seguintes fatos:- Para todo k 2 f1; :::;mg, Pk é uma projeção ortogonal,

P �k =��A (gk)

�= ��A (�gk) = ��A (gk) = Pk

eP 2k =

��A (gk)2= ��A

�g2k�= ��A (gk) = Pk

- O conjunto fP1; :::; Pmg constitui-se numa decomposição da identidade em H:

I = ��A (1) = ��A

mXk=1

gk

!=

mXk=1

��A (gk) =mXk=1

Pk

Denotando as imagens desses operadores por

Vk := Im (Pk) = Pk (H) ; 8k = 1; :::;m

os fatos acima signi�cam que temos a seguinte decomposição em soma direta:

H = V1 � :::� Vm

Como vale

A = ��A (id) = ��A

mXk=1

�kgk

!=

mXk=1

�kPk

concluimos que A é uma combinação linear de projeções ortogonais com imagens ortogonais. Isso é equivalente àpropriedade de que A é diagonalizável!

44

A Tópicos de Teoria da Medida

A seguir apresentaremos conceitos e ferramentas necessárias ao Teorema Espectral. Iniciaremos com algumasde�nições básicas e depois enunciamos os teoremas relevantes. Para uma exposição completa, sugerimos [1], [4].

Espaços de Medida

De�nição 81 (Espaço de Medida)Seja X um conjunto não-vazio.Uma �-álgebra em X é uma família A de subconjuntos de X na qual se veri�cam as seguintes condições:a:i) A contem o vazio:

; 2 A

a:ii) A é fechado por complementação, uniões �nitas e interseções enumeráveis:

A 2 A ) X8A 2 A

(Ak)k2N� � A )[k2N�

Ak 2 A ;\k2N�

Ak 2 A

Se A é uma �-álgebra, uma medida (positiva e �-aditiva) em A é uma aplicação na qual se veri�cam as condiçõesseguintes:19

� : A ! [0;+1]

m:i) A medida do conjunto vazio é zero,� (;) = 0

m:ii) Monotonia,A;B 2 A; A � B ) � (A) � � (B)

m:iii) �-Aditividade: se (Ak)k2N� é uma família enumerável de subconjuntos disjuntos de A, então

[k2N�

Ak

!=Xk2N�

� (Ak)

Dizemos que a medida � é �-�nita quando:m:iv) X pode ser obtido como união enumerável de elementos de A que possuem medida �nita:

X =[k2N�

Ak ; Ak 2 A; � (Ak) <1 ; 8k 2 N�

Espaço mensurável é um par (X;A), onde X é um conjunto e A é uma �-álgebra sobre X. Os elementosda �-álgebra A são chamados conjuntos A-mensuráveis (ou conjuntos mensuráveis, quando o contexto não permiteconfusão).Espaço de medida é uma terna (X;A; �), onde X é um conjunto, A é uma �-álgebra sobre X e � é uma medida

sobre A.

Proposição 82 Seja (X;A) um espaço mensurável e sejam �1; :::; �m um número �nito m 2 N� de medidas (�-�nitas) sobre A. Então, dados números positivos c1; :::; cm 2 (0;1) a seguinte aplicação é uma medida (�-�nita):

� : A ! [0;+1] ; � (A) :=mXk=1

ck�k (A)

Além disso, vale:A 2 A; � (A) = 0 () �k (A) = 0 ; 8k = 1; :::;m

19Aqui, [0;+1] = R+ [ f+1g é o conjunto dos números reais positivos extendido.

45

De�nição 83 (Medida de Borel Regular)Seja (X; �) um espaço topológico.A �-álgebra de Borel de X é a �-álgebra B (X) gerada pelos abertos da topologia � , i.e., B (X) é a família dos

subconjuntos de X que podem ser obtidos pela união enumerável de interseções enumeráveis de abertos ou fechadosde X. Os elementos de B (X) são chamados subconjuntos de Borel.Medida de Borel em X é uma medida sobre a �-álgebra de Borel de X.Dizemos que uma medida de Borel � é regular quando valem [4, pp. 256-257]:r:i) � é �nita em compactos:

K 2 A compacto ) � (K) <1r:ii) Para todo A 2 B (X) valem:

inf f� (W ) ; W 2 B (X) aberto contendo Ag = � (A) = sup f� (K) ; K 2 B (X) compacto contendo Ag

Funções Mensuráveis e Integração

Dados dois espaços mensuráveis (X;A) e (Y;B), dizemos que uma função f : X ! Y é (A;B)-mensurável quando

f�1 (S) 2 A ; 8S 2 B

Não resumimos aqui a teoria da integração, apenas lembramos os fatos essenciais:- Considerando a �-álgebra de Borel em C e R, uma função f : X ! C é A-mensurável se e somente se Re f e

Im f são A-mensuráveis.- Dada uma medida � na �-álgebra A, dizemos que f : X ! C é integrável com respeito a � quando Re f e Im f

são integráveis com respeito a �; nesse caso de�nimos a integral de f porZX

fd� :=

ZX

Re fd�+ i

ZX

Im fd�

Lema 84 f : X ! C mensurável é integrável se e somente se jf j : X ! R+ é integrável.

Teorema de Riesz-Markov

O teorema a ser enunciado consiste numa ferramenta fundamental para o desenvolvimento do cálculo funcionalmensurável.

Teorema 85 (Riesz-Markov) Seja X um espaço métrico localmente compacto e �-compacto (i.e., que pode serobtido pela união enumerável de subconjuntos compactos).Se ' : C (X) ! C é um funcional linear positivo contínuo, então existe uma única medida de Borel regular �'

sobre X tal que

' (f) =

ZX

fd�'

Para uma prova, veja [4, pp.135-142].

A.1 Teoremas de Convergência

Na sequência, considere (X;A; �) um espaço de medida, sendo X sendo um espaço topológico, A uma �-álgebra deBorel em X e � uma medida de Borel em A.

De�nição 86 (Convergência em Quase Todo Ponto ��-q.t.p.)Seja (X;A; �) um espaço de medida. Dizemos que uma sequência de funções mensuráveis

�fn : X ! �R+

�converge

para uma função mensurável f : X ! �R+ em �-q.t.p (em quase todo ponto com respeito à �) quando (fn) convergepontualmente para f exceto num subconjunto de medida nula, i.e.,

��X8nx 2 X = lim

n!1fn (x) = f (x)

o�= 0

Notação: fn % f em �-q.t.p.

46

Teorema 87 (Convergência Monótona)Seja (X;A; �) um espaço de medida e sejam g : X ! �R+ mensurável e

�gn : X ! �R+

�uma sequência não-

decrescente de funções mensuráveis,

gn (x) � gn+1 (x) ; 8x 2 X; n 2 N�

Se (gn) converge para g em �-q.t.p, então a correspondente sequência das integrais converge (monotonamente)para a integral de g,

limn!1

ZX

gnd� =

ZX

gd�

Teorema 88 (Convergência Dominada)Seja (X;A; �) um espaço de medida e sejam g : X ! C mensurável e (gn : X ! C) uma sequência de funções

mensuráveis para a qual existe uma função mensurável h : X ! �R+ que a limita em �-q.t.p.,

� (X8 fx 2 X = jgn (x)j � h (x)g) = 0

Se (gn) converge para g em �-q.t.p, então a correspondente sequência das integrais converge para a integral de g,

limn!1

ZX

gnd� =

ZX

gd�

Em particular, se (gn) converge pontualmente para g então vale

limn!1

ZX

(gn � g) d� = 0

Teorema 89 (Densidade de Funções Contínuas em Lp)Seja X um espaço métrico localmente compacto e � uma medida de Borel regular �-�nita em X.Então, para todo p 2 [1;+1), o espaço das funções contínuas com suporte compacto em X é denso em Lp (X;�).

Esse teorema possui a seguinte especialização para o caso de subconjuntos compactos de C:

Teorema 90 (Densidade de Funções Contínuas - caso especial)Seja K � C compacto não-vazio e � uma medida de Borel regular �-�nita em K.Então, para toda função mensurável limitada g : K ! C existe uma sequência de funções contínuas (fn : K ! C)

que converge para g com respeito à convergência em L1 (K;�):

limn!1

ZK

jfn � gj d� = 0

Esse teorema possui a seguinte generalização que é utilizada na construção do *-homomor�smo do TeoremaEspectral:

Proposição 91 (Aproximação de Funções Mensuráveis por Funções Contínuas em L1) Seja K � C com-pacto não-vazio e �1; :::; �m um número �nito m 2 N� de medidas de Borel regulares (�-�nitas) em K.Então, para toda função mensurável limitada g : K ! C existe uma sequência de funções contínuas (fn : K ! C)

que converge para g com respeito à convergência em L1�K;�j

�, para todo j 2 f1; :::;mg:

limn!1

ZK

jfn � gj d�j = 0 ; 8j = 1; :::;m

Se g é limitada, a sequência (fn) pode ser escolhida ser uniformemente limitada pela norma de g:

kfnk � kgk ; 8n 2 N�

Prova. Considere a medida

� :=

mXk=1

�k

47

Dada g : K ! C seja (fn : K ! C) uma sequência de funções contínuas que converge para g com respeito à con-vergência em L1 (K;�),

limn!1

ZK

jfn � gj d� = 0

Pela Proposição (82), isso implica

limn!1

ZK

jfn � gj d�k = 0 ; 8k = 1; :::;m

Agora, suponha que g seja limitada, kgk <1. Usando a sequência obtida acima, de�nimos para todo n 2 N�

~fn : K ! C ; ~fn (x) :=

�fn (x) ; se jf (x)j � kgk

kgk ei arg(fn(x)) ; se jf (x)j > kgk

Por inspeção direta, veri�camos que�~fn

�é uma sequência de funções contínuas uniformemente limitada pela norma

de g ~fn � kgk ; 8n 2 N�

tal que

limn!1

ZK

��� ~fn � g��� d�k = 0 ; 8k = 1; :::;m

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References

[1] CASTRO JR., A. Armando, Curso de Teoria da Medida (Projeto Euclides), Rio de Janeiro, IMPA, 2004.

[2] LIMA, E.L, Espaços Métricos, Rio de Janeiro, IMPA, 2007.

[3] LINS NETO, Alcides, Funções de uma variável complexa (Projeto Euclides), Rio de Janeiro, IMPA, 1993.

[4] LANG, S., Real and Functional Analysis �3rd. ed., New York: Springer-Verlag, 1993.

[5] OLIVEIRA, César R. de, Introdução à análise funcional, Rio de Janeiro: IMPA, 2009.

[6] REED, M., SIMON, B., Methods of modern mathematical physics Vol. I: functional analysis, 2nd edition, SanDiego: Academic Press, 1980.

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[8] SUNDER, V.S., Functional Analysis: spectral theory, Berlin: Birkhäuser, 1998.

[9] TAYER, J., Operadores auto-adjuntos e equações diferenciais parciais, Rio de Janeiro: IMPA, 2007.

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