teologia biblica da cidade

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Revista Batista Pioneira v. 1, n. 2, dezembro/2012 FUNDAMENTOS BÍBLICOS DE MISSÕES URBANAS Wendal Mark Johnsson 1 RESUMO Há acadêmicos que dizem que a Bíblia começa num jardim e termina numa cidade. Assim, este artigo procura delinear o tema da “cidade” nas Escrituras, focalizando principalmente o uso linguístico e teológico deste termo. O conceito teológico da cidade é estudado especificamente em três áreas: a cidade como fim teleológico da criação, a cidade no período pós-queda e a graça comum, a cidade como fim escatológico da história da redenção. Palavras-chaves: Missões. Missões urbanas. Cidade. ABSTRACT Some scholars say that the Bible begins in a garden and concludes in a city. This article traces the theme of the city throughout Scriptures focusing on the linguistic and theological usage of the term. Specifically, the concept of the city is studied from perspective of God’s original creation intent, as a Post-Fall common grace blessing, and the ultimate goal of redemption history. The article concludes by looking at the city as an interpretive lens by which the mission of God’s people can be more fully 1 O autor é doutor em Missiologia pelo Southern Baptist Theological Seminary (Louisville / EUA) e professor do Southeastern Baptist Theological Seminary (Wake Forest, North Carolina / EUA). E-mail: [email protected] Este artigo é parte integrante da Revista Batista Pioneira Bíblia, Teologia e prática impresso: ISSN 2316-462X online - ISSN 2316-686X http://revista.batistapioneira.edu.br/

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  • Revista Batista Pioneira v. 1, n. 2, dezembro/2012

    FUNDAMENTOS BBLICOS DE MISSES URBANAS

    Wendal Mark Johnsson1

    RESUMOH acadmicos que dizem que a Bblia comea num jardim e termina numa

    cidade. Assim, este artigo procura delinear o tema da cidade nas Escrituras,

    focalizando principalmente o uso lingustico e teolgico deste termo. O conceito

    teolgico da cidade estudado especificamente em trs reas: a cidade como fim

    teleolgico da criao, a cidade no perodo ps-queda e a graa comum, a cidade como

    fim escatolgico da histria da redeno.

    Palavras-chaves: Misses. Misses urbanas. Cidade.

    ABSTRACTSome scholars say that the Bible begins in a garden and concludes in a city. This

    article traces the theme of the city throughout Scriptures focusing on the linguistic

    and theological usage of the term. Specifically, the concept of the city is studied from

    perspective of Gods original creation intent, as a Post-Fall common grace blessing,

    and the ultimate goal of redemption history. The article concludes by looking at the

    city as an interpretive lens by which the mission of Gods people can be more fully

    1 O autor doutor em Missiologia pelo Southern Baptist Theological Seminary (Louisville / EUA) e professor do Southeastern Baptist Theological Seminary (Wake Forest, North Carolina / EUA). E-mail: [email protected]

    Este artigo parte integrante da

    Revista

    Batista PioneiraBblia,Teologia e prtica

    impresso: ISSN 2316-462X online - ISSN 2316-686X

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    understood.

    Keywords: Mission. Urban mission. City.

    1. INTRODUOAo resumir a histria de Gnesis a Apocalipse, mais de um pastor urbano disse:

    A Bblia comea dentro de um jardim, e termina em uma cidade.2 Esta afirmao

    de Roger Greenway serve como uma boa descrio da teologia bblica da cidade.

    Outros, tais como Tim Keller e Ray Bakke, fizeram semelhantes afirmaes sobre

    a centralidade da cidade como tema principal em uma teologia bblica de misses.

    Falando de forma um pouco mais reservada, mas com a mesma convico sobre a

    importncia da cidade no contexto da teologia bblica, Andrew Davey diz:No existe na Bblia uma grande narrativa urbana que conduz o leitor desde a cidade de Caim at a Nova Jerusalm, de forma semelhante a uma narrativa histrica do sculo vinte, que leva o leitor de Atenas a Chicago ou Los Angeles. Entretanto, o urbanismo mostra sua influncia em todo o contedo das Escrituras, lanando uma sombra, puxando, desafiando, devorando, sempre solicitando uma resposta.3

    Citaes como estas de Greenway e Davey representam a opinio da maioria dos

    missilogos urbanos. Para estes, a cidade tema dominante nas Escrituras e serve

    como principal lente interpretativa para entender a misso bblica do povo de Deus.

    Este artigo determina a base bblica de misses urbanas como uma subdisciplina

    missiolgica distinta dentro do contexto mais amplo de missiologia acadmica. O

    argumento deste autor que a urgncia e a legitimidade do movimento de misses

    urbanas baseia-se no ensino compreensivo do que a Bblia diz sobre o propsito de

    Deus e seu plano para a cidade, em todos os tempos e todos os lugares. Esse artigo

    no pretende formular uma teologia urbana exaustiva. Ao contrrio, tem o humilde

    propsito de examinar trs questes-chave dentro das Escrituras: a cidade como o

    fim teleolgico da criao, a cidade ps-queda e a graa comum, e a cidade como o fim

    escatolgico da histria da redeno. Cada tema teolgico ser abordado por meio da

    sntese do material bblico pertinente. Antes de abordar estes temas teolgicos, ser

    de ajuda clarificar as definies dos termos usados nas Escrituras, a fim de chegarmos

    a uma definio bblica correta do termo cidade.

    2 CONN, Harvie. Discipling the city. Grand Rapids: Baker, 1992. p. 14.3 DAVEY, Andrew. Urban christianity and global order. Peabody, MA: Hendrickson, 2002. p. 60.

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    2. TERMOS BBLICOS USADOS PARA DEFINIR REAS URBANASWalter Kaiser observa o seguinte: O termo utilizado mais frequentemente para

    descrever cidade no Antigo Testamento (AT) ir, que ocorre um total de 1.090

    vezes.4 Neste artigo, Kaiser continua a discusso sobre a definio bblica de cidade,

    ao avisar sobre o perigo da falcia da raiz, na qual a compreenso moderna da

    palavra deriva-se exclusivamente de seu significado original. Entretanto, no caso do

    uso da palavra ir no hebraico, o significado da raiz o que melhor descreve a natureza

    e o uso da palavra. Ir significa cidade.

    A palavra ir, traduzida como cidade no AT, frequentemente modificada pelo

    adjetivo mibsar, que significa fortificado. Por isso, Kaiser observa:De acordo com o uso habitual, a cidade era um lugar murado, que oferecia proteo. As aldeias vizinhas eram designadas filhas da cidade, e os campos e pastos se tornaram local de vagueio, fora da segurana da cidade.5

    John Oswalt complementa as observaes de Kaiser, ao fazer as seguintes

    observaes sobre a palavra mibsar:Em grande parte, o termo cidade fortificada (ou cercada) termo de designao, indicando os maiores e mais importantes centros habitacionais (II Rs 17.9). Tais cidades eram de grande importncia estratgica, pois eram quase que inexpugnveis at os assrios aperfeioarem suas tticas de cerco (Je 5.17). Esse fato teve bastante importncia para a conquista israelita (Js 10.20, etc.).J que as cidades fortificadas eram to resistentes, seria fcil para os israelitas porem sua f na fora de suas muralhas, e no em Deus. Por isso, os profetas se esforaram para mostrar a tolice de tal confiana (Is 17.3; Lm 2.5; Hs 10.13-14, etc.). Somente Deus a fortaleza do ser humano (Sl 27.1, mz).6

    Cidades eram lugares de refgio e proteo contra agressores. Alm de servirem

    como lugares de abrigo e proteo, as cidades do Antigo Testamento tambm serviam

    de lugar de poder e devoo religiosa. As cidades do AT funcionavam como santurios,

    centros de devoo aos deuses. Muitas vezes, o governante principal (rei) cumpria o

    papel de emissrio dos deuses na terra. Harvie Conn observa:Deuses e humanos viviam em comunidade nas suas ruas. O cidado que passava pelo porto aproximava-se ao centro do

    4 KAISER, Walter. A biblical theology of the city. In: Urban missions 7, n 01, setembro de 2001, p. 6.5 KAISER, 2001, p. 6.6 HARRIS, R. L.; ARCHER, G. L.; WALTKE, B. K. Theological wordbook of the Old Testament, In: Logos library system. Chicago: Moody Press, 1999. CD-Rom.

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    mundo. Seus muros cercavam um pequeno cosmo, os quatro pontos cardeais se encontrando no seu centro, uma torre de santurio onde terra e cu, homem e deus, se uniam, ritualmente consumados.7

    Por isso, a cidade do Antigo Testamento desempenha o papel duplo de proteo

    civil e consagrao religiosa. O contraste entre cidade e vila, dependente do nmero

    de habitantes em cada realidade social, praticamente inexistente no AT. A cidade

    significava segurana e proteo contra inimigos, no era termo indicativo de tamanho

    ou densidade.8 Tendo em mente essa interpretao do AT, ser til entender tambm

    o termo principal usado para descrever cidades no Novo Testamento (NT).

    No Novo Testamento, existe uma distino entre vila e cidade, polis e komi, que

    no to evidente no Antigo Testamento. Harvie Conn diz o seguinte em relao

    palavra komi: Parece que komi tem um sentido tcnico, talvez se referindo a um lugar de habitao que no murado, possivelmente devido sua proximidade com a cidade (Lc 10.12). Belm recebe esta designao em Joo 7.42, assim como Betnia, prxima ao Monte das Oliveiras (Jo 11.1,30).9

    provvel que este termo fosse usado para descrever a cultura de vilarejo/

    campons que caracterizava o tempo de Jesus Cristo. Muitos atribuem a principal

    descrio da cultura na qual Jesus vivia, e os apstolos ministravam, palavra komi.

    A ideia de que a Bblia um livro rural, e deve ser entendida num contexto rural,

    uma interpretao moderna das Escrituras, especialmente do NT, que tem se tornado

    bastante comum na poca moderna. Esta crena popular baseia-se no trabalho feito

    pelo Chicago School of Urban Anthropology [Escola de Antropologia Urbana de Chicago],

    que tendia a descrever a vida camponesa em termos romnticos e idlicos. Robert

    Redfield e Louis Wirth exemplificam esta linha de pensamento. O trabalho de

    Redfield descreve a vida no campo ou nos vilarejos como um lugar de estabilidade

    relacional idlica, enquanto as cidades so lugares que isolam e desumanizam as

    pessoas. Louis Wirth, em Urbanism as a way of life [Urbanismo como estilo de vida],

    representa o pensamento tpico do Chicago School:O superficialismo, o anonimato, o carter transitrio das regies sociais urbanas, explicam a sofisticao e a racionalidade geralmente atribudas aos habitantes de cidades. Nossos relacionamentos com pessoas conhecidas tendem a ser

    7 CONN, Harvie; ORTIZ, Manuel. Urban ministry. Downers Grove, IL: Inter-Varsity Press, 2001. p. 84.8 CONN; ORTIZ, 2001, p. 84.9 CONN, Harvie. Lucan perspectives and the cities. In: Missiology 13, n 4, Fall 1985. p. 409-28.

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    baseados em utilidade, no sentido de que cada pessoa envolvida em nossas vidas percebida como um meio pelo qual podemos alcanar nossos alvos pessoais. De um lado, o indivduo alcana certo grau de liberdade ou emancipao do controle pessoal ou emocional que exercido por grupos ntimos. Por outro lado, ele perde a autoexpresso espontnea, a moral e o senso de participao, que vem de uma vida vivida em sociedade integrada. Isto constitui um vcuo social para o qual Durkheim alude, ao tentar explicar os vrios tipos de desorganizao social que existem na sociedade tecnolgica.10

    Existe uma verdade parcial na afirmao de Wirth, que ser discutida adiante.

    Porm, a palavra grega komi e as conotaes antropolgicas derivadas desta palavra

    (que muitos projetam em todo o NT) no refletem completamente o mundo urbano

    no qual Jesus viveu no norte da Galileia, sem falar do mundo urbanizado dos apstolos

    no Imprio Romano. Intrpretes bblicos modernos no podem usar a palavra komi,

    interpretada com a lente do Chicago School, como filtro hermenutico pelo qual todo o

    NT interpretado. Flvio Josefo escreveu o seguinte pargrafo em relao Galileia

    Romana no primeiro sculo, descrevendo a intensa urbanizao desta rea:Estas duas Galileias, de to grande tamanho, e incluindo grande contingente de estrangeiros, sempre conseguem oferecer forte resistncia em ocasies de guerra; (42) pois os galileus se habituaram com a guerra desde sua infncia, e sempre foram muito numerosos. Alm do mais, o pas nunca faltou com homens de coragem em grandes quantidades; pois seu solo frtil e rico, e cheio de plantaes de rvores de todos os tipos, tanto que at os mais preguiosos se motivam a se empenharem no cultivo da terra: (43) consequentemente, toda terra cultivada por seus habitantes, e nenhuma parte encontra-se ociosa. Ademais, as cidades desta regio so numerosas; e as muitas vilas presentes aqui so to cheias de pessoas por todo lado, que a menor delas possui mais de quinze mil habitantes.11

    Presumindo que o nmero usado por Josefo em relao ao tamanho das cidades

    da Galileia seja exagerado, sua descrio da regio ainda indica que a Galileia era uma

    rea intensamente urbanizada durante a vida de Cristo.

    Evidncias arqueolgicas recentemente encontradas na cidade de Sforis oferecem

    mais provas sobre a urbanizao presente no mundo de Jesus no primeiro sculo.

    10 WIRTH, Louis. Urbanism as a way of life. Disponvel em http://www.bolender.com. Acesso em 15/12/07.11 JOSEFO, Flvio. The works of Josephus complete and unabridged. Peabody, MA: Hendrickson Publishers, 1987. In: Logos library system, CD-Rom, p. 541.

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    Sforis, capital da regio da Galileia, era localizada apenas a quatro milhas do lar de

    Jesus, na cidade de Nazar. Carsten Thiede escreve:A nova capital da Galileia, Sforis (Zippori), reconstruda aps sua destruio no ano 4 a.C., ficava a apenas quatro milhas de distncia. A cidade havia sido destruda brutamente pelos romanos quando a regio revoltou-se depois da morte de Herodes, o Grande. Com permisso imperial, Herodes Agripa comeou a reconstru-la como um modelo da cultura greco-romana, onde judeus praticantes e romanos ricos poderiam viver juntos pacificamente. Grego era a lngua comum - de fato, Galileia tinha sido bilngue h muito tempo.12

    Esta cidade era chamada a Joia da Galileia.

    Os Evangelhos foram escritos em um mundo urbano. Por este motivo, o termo polis

    ocorre cento e sessenta vezes no Novo Testamento, com metade destas ocorrncias

    localizadas no Evangelho de Lucas. H. Bietenhard observa o seguinte em relao ao

    termo polis: Ele (polis) nunca significa estado, mas sempre cidade, se referindo a uma

    colnia cercada ou seus habitantes.13 Este breve estudo oferece provas suficientes para

    indicar que a Bblia no desconhece a realidade urbana de incio ao fim. Ao contrrio,

    a Bblia mostra compreenso da realidade urbana. Para continuar a desenvolver esta

    ideia, o foco agora ser a cidade como fim teleolgico da criao.

    3. A CIDADE COMO FIM TELEOLGICO DA CRIAO Deus construtor de cidades. Um bom empreiteiro sempre tem em vista o seu

    produto final. Teleologia o estudo dos fins, ou propsitos finais de certas coisas.

    A construo da Nova Jerusalm o fim escatolgico da criao, demonstrado em

    Ezequiel 40-48 e Apocalipse 21-22. Mas este fim escatolgico baseia-se no propsito

    teleolgico que Deus embutiu no mandato de criao de Gnesis 1.26, que culmina na

    Nova Jerusalm.

    Muitas vezes, telogos se referem aos imperativos morais transculturais e

    transtemporais dos primeiros dois captulos de Gnesis quando falam de mandato

    de criao. Estes so os mandamentos dados ao homem em seu estado ntegro.14

    Um dos mandatos de criao dados a Ado e Eva o de domnio sobre a criao (Gn

    1.26-28). O mandato cultural derivado deste mandato para exercer domnio sobre

    12 THIEDE, Carsten P. The cosmopolitan world of Jesus: New Findings From Archaeology. London: Society for Promoting Christian Knowledge, 2004. In: Logos library system, CD-Rom, p. 15.13 BIETENHARD, H. In: BROWN, Colin (Edit.). Dictionary of New Testament theology. Grand Rapids: Zondervan, 1976. Vol. 2, p. 803. 14 MURRAY, John. Principles of conduct. Grand Rapids: Eerdmans, 1957. p. 27.

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    a criao. O mandato cultural o desenvolvimento da criao de Deus por parte dos

    regentes terrestres de Deus, que reinam debaixo de Sua soberania divina. O mandato

    cultural o produto visvel, tangvel, fruto da criao humana de Deus que cumpre e

    executa o mandato de Deus para exercer domnio sobre a criao. Morton Smith faz a

    seguinte observao, til no estudo deste assunto:J observamos que o domnio no a imagem, mas a consequncia do homem ser feito na imagem de Deus. O domnio funo do homem, no qualidade que faz parte de sua natureza. um comando especfico que o ser humano recebeu, no trmino da criao. Isso tem sido chamado o mandato de criao.Ao homem foi dado domnio sobre toda a terra (Gn 1.26-27; Sl 8; 1 Co 15.24-28; Hb 2.5-8). Esse domnio foi a base lgica para o mandato de criao, para encher a terra e subjug-la (Gn 1.28). Sendo que o homem naturalmente equipado para subjugar a terra, ele tem buscado cumprir esta funo, mesmo como pecador.15

    Quando Gnesis 1.26 cumprido de forma bblica e fiel, o resultado cultura.

    Cultura, parafraseando as palavras de Herman Dooyeweerd, o desbloqueio do rico

    potencial latente da boa criao de Deus. Como avaliamos isso em termos concretos?

    Qual o resultado concreto, fsico, do ser humano ter exercido seu domnio sobre a

    criao? O resultado a cidade. David Lim faz este comentrio perspicaz: A cidade

    a chave para a viso bblica do destino final do homem, e consequentemente, para

    o significado da histria humana. A urbanizao, ento, parece ser consequncia da

    obedincia ao mandato cultural de Deus.16 Poucos telogos do Antigo Testamente

    ofereceram melhores argumentos para o mandato de domnio em Gnesis 1.26 do

    que o argumento feito por Meredith Kline, em seu livro Kingdom prologue [Prlogo do

    Reino]. Kline diz:O cumprimento da mordomia cultural do ser humano se iniciou com o homem servindo na capacidade de prncipe jardineiro no den. Mas o alvo da sua comisso no reino no de ser um sistema de suporte de vida local. Ao contrrio, o alvo mestria global. O mandato cultural exige todas as foras da mente e dos msculos humanos para cumprir a tarefa desafiadora e gratificante que transformar o paraso original

    15 SMITH, Morton. Systematic theology: prolegomena, theology, anthropology, christology. Greenville, SC: Greenville Presbyterian Theological Seminary Press, 1994. Vol. 1. In: Logos library system, CD-Rom, p. 241.16 LIM, David. The city in the Bible, evangelical review of theology, vol. 12, 1988. In: Logos library system, CD-Rom, p. 141.

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    em uma cidade universal. Os cidados da cidade viro a existir atravs do processo de procriao. Sua forma fsica/arquitetural ganharia forma como produto do empenho cultural do homem. A dimenso governamental da cidade foi providenciada na estrutura de autoridade da comunidade, outro mandato da criao. A cidade-reino o agregado e a sntese dos mandatos de criao que definiram a comisso cultural do ser humano. A cidade a humanidade, em formato cultural.17

    A cidade-reino o fim teleolgico da criao; a humanidade em sua forma

    cultural. O mandato de criao foi dado por esse motivo. Se a cidade-reino universal

    o alvo teleolgico original para a criao da humanidade, qual tem sido o efeito da

    queda sobre a original inteno urbana de Deus? Tragicamente, os resultados tm

    sido dolorosos. Tendo dado ateno ao que a cidade deveria ter sido, agora nos

    concentraremos no que a cidade de fato.

    4. A CIDADE PS-QUEDA E A GRAA COMUM A inteno original de Deus em relao cidade foi distorcida como resultado da

    queda. Roger Greenway est certo em observar que: Cidades ps-queda no so mais o que poderiam ter sido. Devido queda, as cidades de hoje so centradas no ser humano, so violentas, repletas de atrito, cime e carnalidade. O pecado corre livre pelas ruas e mercados. Ele est entronizado nos lugares altos da vida civil. Cidades so caracterizadas por muitos pactos quebrados, especialmente o pacto quebrado com Deus.18

    No h dvida de que as observaes de Greenway so corretas. Tanto o testemunho

    bblico quanto a observao prtica confirmam a realidade do pecado e da rebelio nas

    cidades do mundo. O Antigo Testamento nota que a primeira cidade foi fundada por

    Caim numa tentativa de evitar o julgamento de Deus, consequncia do assassinato de

    seu irmo Abel (Gn 4.17). Algum tempo depois, Ninrode fundou a cidade de Nnive.

    Esta cidade mais tarde mereceria o ttulo indesejvel de cidade sangrenta (Na 3.1).

    Depois de Ninrode, a torre de Babel foi construda com o propsito explcito de fazer

    um nome para ns (Gn 11.4). No fim das contas, a cidade de Babilnia se tornou

    smbolo definitivo da rebelio contra Deus. Nabucodonosor gabou-se da grande

    cidade que ele havia construdo (Dn 4.30). O resultado de sua arrogncia foi a punio

    17 KLINE, Meredith. Kingdom prologue. Overland Park, KS: Two Age Press, 2000. p. 68.18 GREENWAY, Roger; MONSMA, Timothy. Cities: mission's new frontier. Grand Rapids: Baker, 2000. p. 28.

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    de Deus. O julgamento de Deus contra a cidade de Babilnia chegou ao seu apogeu nas

    profecias de Isaas e Jeremias. Em Isaas, a pessoa do Rei da Babilnia se misturou com

    uma imagem csmica do adversrio angelical de Deus (Is 14.1-21), e se tornou smbolo

    da desobedincia csmica contra a autoridade divina. J no Novo Testamento, o nome

    Babilnia foi usado para descrever a rebeldia de um novo superpoder urbano, Roma,

    que tinha os mesmos objetivos pecaminosos e subversivos, em oposio vontade de

    Deus.

    O efeito cumulativo das referncias urbanas mencionadas acima de convencer

    seus vrios leitores de que a Bblia trata do lugar da cidade na vontade de Deus de

    maneira uniformemente negativa. Este cinismo para com a cidade culmina em The

    meaning of the city [O significado da cidade], obra de Jacques Ellul. Ele diz que a

    alternativa que a humanidade escolhe quando se recusa a confiar no Senhor.19 Em

    outro lugar, ele escreve: a cidade moderna a demonstrao das maiores conquistas

    do homem, organizadas em rebelio contra Deus.20 A retrica de Ellul afiada e

    crtica. Ele articula o que muitos evanglicos americanos, inclusive alguns batistas,

    tm crido h muito tempo: a cidade m e irredimvel. Eles acreditam que melhor

    fugir da cidade do que serem inevitavelmente contaminados por ela. Acreditam que

    melhor buscar intimidade com Deus, ou talvez at mesmo trabalhar na plantao de

    igrejas, em meio ao cenrio seguro e estvel do interior, longe do alcance pecaminoso

    da vida urbana. por isso que o Salmo 23, com suas ricas imagens rurais, se tornou

    o padro pelo qual muitos cristos interpretam a verdadeira intimidade com Deus.

    Harvie Conn documenta as tendncias antiurbanas dos evanglicos americanos

    em seu livro The american city and the evangelical church [A cidade americana e a igreja

    evanglica].

    Mas as Escrituras ensinam que esta litania negativa da rebelio e depravao

    urbana seja a resposta final de Deus para a cidade ps-queda? A resposta no. Mesmo

    que a Bblia seja brutalmente honesta ao tratar da rebelio e depravao urbana, ela

    ainda apresenta a cidade como bno positiva de Deus na vida de sua criao e em

    termos do louvor ao seu nome. As bnos da vida urbana em meio depravao

    inegvel existem devido graa comum de Deus. John Murray define a graa comum

    da seguinte maneira:Graa comum deve ser definida como todo tipo de favor, de qualquer tipo ou grau, exceto a salvao, que este mundo

    19 ELLUL, Jacques. The meaning of the city. Grand Rapids: Eerdmans Publishing Company, 1993. p. 26.20 ELLUL, 1993, p. 37.

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    pecaminoso recebe imerecidamente da mo de Deus... Deus restringe o pecado e suas consequncias. Deus restringe o trabalho da depravao humana e assim previne que afetos mpios e princpios humanos se manifestem em todas as potencialidades que lhes so inerentes.21

    A cidade das Escrituras o meio pelo qual Deus ministra graa no salvfica e

    misericrdia para a humanidade em meio rebelio humana.

    Mesmo que Caim tenha construdo sua cidade para se proteger do julgamento de

    Deus, Deus estabeleceu cidades de refgio dentro da Terra Prometida, para refletir

    sua justia e paz. Harvie Conn nota que Caim havia construdo sua cidade para se proteger contra vingana. Nas cidades de refgio designadas por Deus, o propsito era o mesmo, mas de acordo com a justia do empreiteiro divino. As cidades de refgio eram smbolos de vida, no de morte, de proteo divina ao invs de autoproteo... A incluso das cidades de refgio dentro das quarenta e oito cidades designadas para o uso da tribo de Levi, espalhadas por toda a Terra Prometida, significava um papel ainda maior para as mesmas... Estas quarenta e oito cidades eram para servir de modelos para a nova sociedade urbana de Deus? Algumas dicas sugerem esta possibilidade... Diferente das cidades capturadas, compaixo, justia e integridade seriam caractersticas do ensino que viria destas quarenta e oito cidades.22

    Don Benjamin, na sua dissertao doutoral Deuteronomy and city life [Deuteronmio

    e a vida na cidade] entende que Israel, aps sua entrada na terra da Palestina, tornou-se

    essencialmente um contexto urbano. Israel tomou posse das cidades j existentes em

    Cana, e baseou nelas a sua sociedade. Estas cidades eram parte (bastante tentadora)

    da herana do povo na Terra Prometida.

    Se Israel herdou um estilo de vida urbano pr-estabelecido devido sua conquista

    das cidades-estado da Palestina, no h dvida de que no Antigo Testamento Jerusalm

    se torna a cidade par excellence de Israel. Jerusalm, a cidade de Deus, funciona como

    centro dos planos missionrios de Deus para seu povo no Antigo Testamento. Sua

    influncia centrpeta, atraindo as naes a si mesma e ento para Deus, se torna o

    tema da teologia de misses do Antigo Testamento. Johannes Blauw comenta sobre o

    chamado missionrio de Israel: Embora enfatizemos a necessidade de Israel ser separada, nunca devemos atribuir esta separao a uma expresso do

    21 MURRAY, 1957, vol. 2, p. 93-122.22 CONN; ORTIZ, 2001, p. 89.

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    particularismo do Antigo Testamento. Ela deve ser vista como sua adeso ao conditio sine qua non para a manuteno da teocracia de Israel, precursor do senhorio de Deus sobre todo o mundo... Israel cumprir um papel sacerdotal como um povo em meio a povos. Ela representa Deus em um mundo de naes. Israel tem a mesma funo para com o mundo que os sacerdotes tm para com o povo.23

    Israel seria o povo missionrio de Deus. Jerusalm seria o centro do esplendor

    missionrio de Deus. O esplendor de Jerusalm seria tal que atrairia naes a si. As

    glrias de Jerusalm e sua atratividade so homenageadas nos Salmos-cidade, como

    Salmos 42, 48, 74 e 122. Harvie Conn observa queA tarefa missiolgica de Israel seria de engajar de forma nica. Sob o domnio da fora centrpeta da glria de Deus manifesta em Jerusalm, os povos do mundo fluiriam para a Cidade Santa, Is 2.2-4. ...Jerusalm seria a alegria de toda terra, Sl 48.2. ...Eventualmente, cidades gentias peregrinariam (Is 60.3) para participar no banquete messinico de Jerusalm (Sl 25.66).24

    evidente no AT que a cidade bno de graa comum que leva a encontros

    missionrios. O entendimento de graa comum em relao cidade continua no NT,

    quando a cidade se torna centro da fora centrfuga da misso da igreja.

    Comentrios j foram feitos sobre o mundo urbano de Jesus. No NT, a cidade

    retratada como o principal campo de batalha da guerra espiritual. Poderes e

    principados guerreiam contra o povo de Deus, como enfatizado em Efsios e

    Colossenses. Em Apocalipse, a cidade de Roma se torna sinnima de rebelio contra

    os propsitos de Deus. Estas referncias mostram que existe continuidade com o

    entendimento da cidade no AT como lugar de rebelio contra os propsitos de Deus.

    Porm, a cidade continua a ser um meio de oferecer graa comum, possibilitando a

    expanso do evangelho. A esta altura, til observar como a cidade funciona como

    foro principal da expanso missionria da igreja apostlica.

    Os apstolos tinham uma estratgia urbana especfica? A resposta sim e no.

    Roger Greenway escreve: O movimento de misses do Novo Testamento era

    primeiramente um movimento urbano.25 Isto inegvel. Roland Allen afirma com

    confiana tpica:Quando ele (Paulo) ocupou dois ou trs centros, ele efetivamente ocupou a provncia toda. Todas as cidades ou vilas

    23 BLAUW, Johannes. The missionary nature of the church. Cambridge: Lutterworth Press, 1962. p. 24.24 CONN; ORTIZ, 2001, p. 91.25 GREENWAY; MONSMA, 2000, p. 36.

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    nas quais ele plantava igrejas eram centros da administrao romana, da civilizao grega, de influncia judaica, ou de alguma importncia comercial... Eram centros em que ele poderia comear novo trabalho com novo poder.26

    Tanto Greenway quanto Allen esto corretos na substncia de suas alegaes

    baseadas na evidncia bblica existente. Entretanto, injustificvel pensar que os

    apstolos no evangelizavam em pequenas comunidades ou reas rurais. Eckhard

    Schnabel diz o seguinte:No possumos suficientes informaes sobre os primeiros quinze anos do ministrio de Paulo na sia, Sria e Cilcia para provar ou refutar tal estratgia durante os anos de 32/33 e 45 d.C. ...Passagens como Atos 3.48-49 mostram que o trabalho missionrio de Paulo no se limitava somente s cidades, mas alcanava o territrio destas cidades, as pessoas vivendo nos vilarejos.27

    No h razo para imaginar uma oposio inerente entre o evangelismo rural

    e urbano. Certamente, no h motivo para considerar um contexto missionrio

    inerentemente superior ao outro. Ambos podem e devem trabalhar juntos, assim

    como Paulo e sua equipe modelaram em Atos 13.

    A igreja primitiva tinha um compromisso inegvel de fazer Cristo conhecido entre

    judeus e gentios. Isto, por sua vez, levou a uma estratgia onde misses ocorriam na

    forma mais simples possvel, a fim de alcanar o maior nmero de judeus e gentios de

    forma eficaz. A maioria deste pblico-alvo se concentrava nas reas urbanas. Eckhard

    Schnabel resume esta estratgia com as seguintes palavras:A igreja crist primitiva no precisava juntar informao altamente detalhada sobre outros povos e cidades, pois eles no planejavam aes militares complexas ou empreendimentos de alto risco que dependiam de vrios fatores. A informao essencial para estes missionrios lidava com centros populacionais e estradas de acesso.28

    As cidades em si possuam, e ainda possuem, grande parte do objetivo missionrio

    da igreja apostlica: so compostas por judeus e gentios. Em termos simples, as

    cidades possuem uma multido de pessoas necessitadas do evangelho. Por este motivo

    as cidades eram - e devem permanecer - alvos de alta prioridade para a transmisso

    do evangelho. Mais uma vez, Eckhard Schnabel oferece um resumo bastante til da

    26 ALLEN, Roland. Missionary methods: St. Paul's or ours? Grand Rapids: Eerdmans, 1962. p. 13.27 SCHNABEL, Eckhard. Early christian mission. Downer's Grove, IL: Intervarsity Press, 2004. Vol. 2, p. 1300.28 SCHNABEL, 2004, vol. 2, p. 471.

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    prtica apostlica de misses:A estratgia bsica de Paulo era simples: ele queria proclamar a mensagem de Jesus Cristo para judeus e gentios, em obedincia a uma comisso divina, particularmente nas reas em que ela no havia sido previamente comunicada (Gl 2.7; Rm 15.14-21). O planejamento para a implementao deste alvo tambm era relativamente simples: ele viajava nas principais estradas romanas, e nas vias menores que levavam de cidade em cidade, proclamando a mensagem de Jesus, Messias e Salvador, reunindo novos convertidos em comunidades crists locais. ...O que Harvie Conn diz em sentido geral pode se aplicar a Paulo em particular: O livro de Atos trata quase inteiramente de cidades, o trabalho missionrio praticamente limitado a elas.29

    inegvel que o foro urbano desempenhou um papel vital na expanso missionria

    da igreja apostlica. Porm, no s uma questo de onde a igreja apostlica ministrou,

    mas tambm do que eles fizeram quando estavam presentes em determinada regio.

    No ingnuo confiar que o Esprito colocou nas Escrituras indicaes importantes

    para nos guiarem na misso urbana.30 Roger Greenway cita as seguintes melhores

    prticas da igreja primitiva na misso urbana do primeiro sculo: fazer discpulos, foco

    nas famlias, lares e sociedades transformados, igrejas e convertidos, o testemunho dos

    leigos, pregadores leigos, doutrina apostlica e a comunho do Esprito Santo. Foram

    estas atividades, ocorrentes nas cidades do primeiro sculo por meio do poder do

    Esprito Santo, que levaram notvel expanso da igreja em todo o Imprio Romano.

    5. A CIDADE COMO FIM ESCATOLGICO DA CRIAO O mundo tem futuro, e um futuro urbano na Nova Jerusalm. Esta no apenas

    uma realidade espiritual simblica e desencarnada. o que est por vir, o cumprimento

    fsico da inteno original de Deus na criao. G. R. Beasley-Murray escreve:O principal motivo pelo interesse de Joo no novo cu e na nova terra que este ser o cenrio para a Cidade de Deus. ...A Nova Jerusalm faz parte deste novo mundo, ou, em melhores palavras, a Cidade Santa sua forma concreta. ...A cidade enche sua viso porque ela o centro da existncia dos redimidos, assim como o significado da cidade que ela oferece um contexto no qual pode existir a santa comunho entre Deus e sua criao.31

    29 SCHNABEL, 2004, vol. 2, p. 1299.30 GREENWAY; MONSMA, 2000, p. 12.31 BEASLEY-MURRAY, G. R. Revelation. Grand Rapids: Eerdmans, 1974. p. 308.

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    Em Apocalipse 21-22, a Bblia chega ao seu auge escatolgico. Nesta consumao

    da histria, o Novo Testamento rene temas primeiro introduzidos em Gnesis 1-2,

    agora chegando ao seu cumprimento climtico. Em Apocalipse 21-22, os mandatos

    de criao originais de Gnesis 1-2 so realizados de forma plena e completa. Como

    fica o mundo quando os mandatos de Deus esto sendo plenamente cumpridos?

    Quando os mandatos de Deus so cumpridos, se parece como uma cidade, como a

    Nova Jerusalm. A Nova Jerusalm o equivalente escatolgico ao Jardim do den.

    Gary Waldecker comenta a respeito deste fato:Qual o lugar da cidade na teologia bblica? Por que o cenrio do incio da Bblia um jardim, mas no final uma cidade? A tese deste artigo que a Nova Jerusalm a forma escatolgica do Jardim. Deus nunca pretendeu que o Jardim do den permanecesse s um jardim. Elementos do den esto presentes na cidade de Apocalipse 20-21, mas ultrapassa a ideia de uma restaurao do paraso ednico. O homem deveria glorificar a Deus ao cultivar todo o potencial que Deus embutiu no seu jardim. A Cidade Santa o resultado final do mandato de Deus em Gnesis 1.28 para dominar, encher e subjugar a terra... A cidade o Jardim do den em sua forma escatolgica. o den restaurado e consumado. A cidade, com toda a sua organizao, desenvolvimento e atividade criativa, o esperado resultado final do mandato de domnio dado aos homens em Gnesis 1.28.32

    Na Nova Jerusalm, a fidelidade de Deus para com a sua criao chega sua

    realizao escatolgica. Tim Keller ecoa os comentrios de Waldecker (acima),

    ao observar que a fidelidade criacional e pactual manifesta nos detalhes da Nova

    Jerusalm:O futuro mundo e universo redimido de Deus retratado como uma cidade. Abrao buscou a cidade cujo empreiteiro e criador Deus (Hb 11.10). Apocalipse 21 descreve e retrata o pice da criao de Deus como uma cidade! Sua redeno est nos construindo uma cidade, a Nova Jerusalm. De fato, quando olhamos a Nova Jerusalm descobrimos algo estranho. No meio da cidade existe um rio cristalino, e em cada lado do rio est a rvore de Vida, dando fruto que sara as naes de todas as suas feridas e todas as consequncias da maldio do pacto divino. Esta cidade o Jardim do den, refeita. A cidade a realizao dos propsitos do den de Deus. Ns comeamos num jardim, mas terminaremos numa cidade; o propsito de

    32 WALDECKER, Gary. The city-eschatological garden, Urban missions 5, n 4, maro de 1988, p. 19-26.

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    Deus para a humanidade um propsito urbano! Por qu? Porque a cidade inveno e desenho de Deus, no apenas um fenmeno sociolgico ou uma inveno da humanidade.33

    Qual ser nossa concluso acerca da teologia bblica da cidade? Na criao, Deus

    teve inteno de construir uma cidade-reino. Desde a queda, o ministrio urbano

    tem sido conduzido em uma cidade completamente desfigurada pelo pecado em

    todos os aspectos. Porm, a cidade continua a ser bno para muitos, por meio da

    manifestao da graa comum de Deus, que oferecida para todos. Misses em geral

    - e particularmente misses urbanas - so motivadas por uma viso escatolgica da

    cidade do porvir: a Nova Jerusalm. Ao olharmos com expectativa para a vinda da

    Nova Jerusalm, achamos motivao para ministrar o Evangelho de forma fiel nas

    cidades para as quais somos chamados. As palavras de Gary Waldecker oferecem boa

    concluso para este captulo:As cidades onde vivemos tendem a refletir a tentativa do homem para desenvolver uma criao que serve seus prprios fins, especialmente ao oferecer segurana e glria prpria. Devido estas motivaes pecaminosas, nossas cidades tendem a serem lugares onde os problemas do ser humano so intensificados. Mas o fato das cidades modernas serem mais bem caracterizadas por contenda do que pela glria de Deus no motivo suficiente para abandon-las. Ao contrrio, devemos proclamar o poder do Evangelho para transformar e fazer discpulos. Ao ser influenciadas pelo Evangelho, a Nova Jerusalm se enraizar nas cidades, transformando suas estruturas a fim de glorificarem a Deus.34

    Esta futura viso escatolgica o que motiva a igreja a engajar as cidades do

    presente com a esperana confiante de que os trabalhos urbanos do presente um dia

    sero consumados por meio da cidade escatolgica, a Nova Jerusalm, que vir.

    REFERNCIAS

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