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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

TEMPO DE LEMBRAR, TEMPO DE APRENDER:MEMÓRIAS DA CIDADE.

ZONA RURAL

Elaboração:Liz Clara Ribeiro de Campos

Nicole Ribeiro - Estagiária de Serviço SocialEva Maria de Andrade Okawati

Revisão:Prof. Severino Tavares - Núcleo de Comunicação - PML

Cleir Jorge BrandãoFernanda Serenário

Capa:Arte: Marcelo Ribeiro Máximo - Design/DTI/SEPLAN/PML

Fotos: Luiz Jacobs - Núcleo de Comunicação/PML Família Dutra - Cedida por Olga de Carvalho Dutra - Distrito de São Luiz

Foto Capa:Adelino Marques Neves e Edith Maria Neves

Agradecimentos especiais:Ao Grupo de Idosos de São Luiz

Aos idosos que contribuíram com depoimentosÀ Escola Municipal Francisco Aquino Toledo

Aos alunos da 3° série da Escola Municipal Francisco Aquino Toledo

Diagramação e Editoração:Geomar Sanches - Secretaria de Planejamento - PML

Fotos:Luiz Jacobs - Núcleo de Comunicação - PML

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

INTRODUÇÃO

Este projeto nasceu com o objetivo de reconstruir, através de depoimentosde idosos, os aspectos da história de ocupação da cidade de Londrina. Os depoimen-tos coletados no volume "I" tratam do município em geral, mais especificamente daocupação urbana. Os dados foram sistematizados e hoje fazem parte do material pe-dagógico que vem sendo utilizado pelos professores, em sala de aula, junto às tercei-ras séries do ensino fundamental das escolas municipais.

No decorrer do projeto, sentiu-se a necessidade de direcionar essa açãocom enfoque sobre os distritos rurais, uma vez que possuem um registro escasso desua história. Assim, o material constitui-se numa continuidade desta reconstrução dosaspectos históricos e culturais do município de Londrina-Pr., sob uma perspectivadistrital.

A fim de ilustrar a proposta, foram inicialmente identificadas, dentre a popu-lação, pessoas que detivessem informações históricas e um tempo de residência nosdistritos suficiente para respaldar o projeto.

Após a seleção, foi realizado o contato direto com o público escolhido, a fimde expor a iniciativa, bem como verificar a disponibilidade de serem concedidas asentrevistas, realizadas com a participação de uma estagiária do curso de Serviço Soci-al, que se utilizou de um instrumento de coleta de dados semiestruturado, o que permi-tiu que os idosos pudessem falar de sua realidade com certa liberdade de expressão.

Os depoimentos foram gravados e posteriormente transcritos e, no momen-to da entrevista, os idosos foram orientados sobre o processo de publicação do mate-rial e assinaram permissão para o uso dos dados da entrevista, bem como das fotosque hoje são utilizadas neste material.

Foi realizado o lançamento oficial do Projeto no Distrito de São Luiz e cujasfotos podem ser conferidas no Anexo. Nesse dia, foram realizadas atividades lúdicas einformativas, integrando crianças e idosos do grupo de convivência desse distrito, con-figurando uma ação intergeracional.

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

ORIENTAÇÃO AOS PROFESSORES

A proposta pedagógica da Rede Municipal de Ensino de Londrina, na áreade conhecimento de história, aborda como eixos os temas: história local e do cotidia-no; identidade; memória e patrimônio cultural. Para atender a essa perspectiva, a his-tória oral torna-se um instrumento extremamente relevante, que deve ser utilizado emsala de aula por meio de narrativas, entrevistas, relatos e diálogos com pessoas dacomunidade, para dar sentido tanto ao passado quanto ao presente.

Conforme Le Goff (apud Siman, 2003), a memória é muito importante paraa construção de uma consciência histórica: "Foi através da memória de meus pais - emais ainda pelo contato com uma memória dos tempos de sua infância e da sua juven-tude, que sobrevivia nos seus caracteres, nas suas ideias, nos seus comportamentoscotidianos - que se edificou em mim o sentido da duração, da continuidade histórica e,ao mesmo tempo, das rupturas".

Nesse sentido, segundo Jean-Pierre Wallot, o trabalho com a história oral éum método de pesquisa, baseado no registro de depoimentos orais concedidos ementrevistas, que possibilita a construção de uma visão mais concreta da história socialdo grupo de pertencimento. O registro de experiências vividas por pessoas que vive-ram em outro tempo pode contribuir para que as crianças compreendam melhor opassado, além de possibilitar que pessoas pertencentes a diferentes categorias soci-ais, especialmente aquelas que geralmente são excluídas da história oficial, possamser ouvidas, com a vantagem de que os seus pontos de vista, também, sejam conhe-cidos, reconhecidos e valorizados.

A utilização da história oral, como metodologia para o ensino de história,oferece várias possibilidades, entre elas: história oral de vida; história oral temática etradição oral. Este trabalho utilizou as categorias história oral de vida e história oraltemática, pois teve como base a narrativa de idosos pioneiros, moradores dos distritosde Londrina, sendo que, de forma geral, evitou-se fazer perguntas, deixando o entre-vistado livre para falar sobre os temas propostos.

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

Assim, como subsídio ao trabalho do professor da 3ª série do ensino funda-mental ou 4º ano do ensino fundamental de 9 anos, o qual, conforme a proposta peda-gógica, deve ensinar conteúdos da história e geografia do município de Londrina, ela-boramos, em parceria com a Secretaria Municipal do Idoso, o projeto "Tempo de Lem-brar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Distritos Rurais". Este material tem aintenção de complementar o acervo sobre a história de Londrina, especialmente, noque se refere à sede dos distritos e área rural.

Esperamos que esse material possa efetivamente contribuir para a compre-ensão do conhecimento histórico de nossa cidade e para a valorização do nossopatrimônio cultural.

As entrevistas foram gravadas e posteriormente, após análise, foram sele-cionados alguns trechos para serem lidos e discutidos pelos alunos, sob a mediaçãodo professor da turma. Sugerimos aos professores que, se possível, fossem formula-dos convites a esses idosos, que nos relataram histórias tão interessantes, para viremàs salas de aula e conversar com os alunos.

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CARACTERIZAÇÃO DOS DISTRITOS DE LONDRINA

ESPÍRITO SANTO

O Distrito do Espírito Santo, que compreende também o Patrimônio Regina,foi criado em 1994, pela Lei Municipal nº. 5.842, de 20 de junho de 1994.

O Distrito sediou o primeiro aeroporto de Londrina, que ficava na ViaçãoVelha, a cerca de 20 km da sede. Em 1925, a família Godoy adquiriu na região aFazenda Santa Helena, onde hoje se localiza a "Mata dos Godoy".

GUARAVERA

O local onde atualmente situa-se o Distrito de Guaravera pertenceu ao donode uma serraria que repicou sua gleba em lotes.

O aglomerado, localizado a 40 km de Londrina, foi elevado à categoria deDistrito Administrativo no dia 11 de junho de 1951, juntamente com a localidade de SãoLuiz, por intermédio do Decreto-lei nº. 666.

O nome Guaravera é de origem indígena. Hoje, o Distrito compreende tam-bém o Patrimônio denominado "Barro Preto".

IRERÊ

Fundado em 1932/1933, o Distrito de Irerê estálocalizado onde era a antigaFazenda das Marrecas, depropriedade do engenheiroagrônomo Aristides Carvalhode Oliveira.

Foi elevado oficial-mente à condição de Distrito,através do Decreto-lei nº. 02 daComarca de Londrina, em 10 deoutubro de 1947.

O Distrito possui área total de 135,95 km². Estando situado a 25 km da sede domunicípio, cuja interligação com Londrina é feita pela PR-445.

Sua área urbana é margeada pelo Córrego das Marrecas, servindo paracaptação de águas do Distrito durante vários anos.

Compreende ainda o Patrimônio Taquaruna.

Igreja Católica do Distrito de Irerê

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LERROVILLE

O núcleo urbano do Distrito de Lerroville originou-se da estrada que ligava oentão distrito de Tamarana, hoje município, ao distrito de Paiquerê. A ocupação iniciou-se no ponto mais alto do espigão por onde passa a estrada e constituía-se, no início,local de comércio para os agricultores circunvizinhos.

Entre 1963 e 1964, foi intensificada a cultura cafeeira no Distrito. O cultivodo café foi preservado, mesmo após a introdução da soja como grande perspectivaeconômica, na década de 1970, em todo o Estado, bem como em 1975, quando ocor-reu a grande geada que atingiu também a região.

O Distrito de Lerroville foi criado através da Lei Municipal nº. 4.783, de 29 denovembro de 1963, e está localizado a 49 km da sede do Município.

MARAVILHA

A história do Distri-to de Maravilha está tambémrelacionada à história do café,principal responsável pela co-lonização do Norte do Paraná.

O patrimônio foielevado a Distrito, através doDecreto-lei nº. 6914, de 2 desetembro de 1977.

PAIQUERÊ

A grande fertilidadedo solo propiciou intenso movi-mento migratório para a região.Devido às dificuldades de abas-tecimento, decorrentes da gran-de distância que separa o Dis-trito da sede do Município, tor-nou-se urgente a necessidadede instalação de comércio de gê-nero de primeira necessidade.

A economia do Dis-trito de Paiquerê esteve inici-almente pautada em atividadeagropecuária, sendo que, em1952, foi iniciado o plantio de café. Atualmente, esta cultura foi substituída pela soja.

Em 21 de dezembro de 1964, Paiquerê foi elevado a Distrito, através do Decre-to-lei nº. 4992. É formado, ainda, pelos patrimônios de Guairacá (Cel. Santos) e Bairro dosNogueiras. Sua primeira designação foi "Cruzeiro do Sul".

Fachada da igreja católica do distrito de Maravilha

Fachada da igreja católica do Distrito de Paiquerê

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

SÃO LUIZ

Há poucas informaçõesdisponíveis a respeito do Distrito deSão Luiz. Também, não há regis-tros sobre sua evolução histórica.

Foi criado em 11 de ju-nho de 1951, por meio do Decre-to-lei nº. 666.

WARTA

A Companhia de Terras Norte do Paraná, responsável pela colonização daárea, hoje ocupada pelo Município de Londrina, reservou, através de um funcionário, oEngenheiro Inácio Szankokim, uma porção de terra, localizada ao norte do Estado doParaná, para ser colonizada por poloneses e/ou descendentes de poloneses.

Atraídos por folhetos de divulgação da nova e promissora área a sercolonizada, imigrantes poloneses de Santa Catarina vieram conhecer a região enela identificaram características semelhantes ao seu local de origem, além deterras de melhor qualidade.

Assim, em 1932, Eduardo Cebulski chegou à região e adquiriu o primeirolote daquela área, trazendo posteriormente sua família.

Chegaram outros colo-nos e, em 1940, podiam-se contaraproximadamente umas 30 casasde madeira ali construídas.

Para escolher o nomedessa colônia, foram reunidos todosos moradores do local e, por suges-tão de João Lamgowski, foi adota-do o nome de Warta, por ser o nomede um rio da Polônia, significandonessa língua "que tem valor" e porser um nome de fácil pronúncia, tam-bém, para os povos de língua latina.

Em 14 de dezembro de 1953, foi criado o Distrito de Warta, através doDecreto-lei Estadual nº. 1542. Localiza-se a 23 km da sede do município de Londrina.

Fachada da igreja católica do Distrito de São Luiz

Fachada da igreja católica do distrito da Warta

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O nome do meu pai era Francisco Terciotti e da minha mãe Carolina. Eleseram os donos dessas terras. A gente era do Estado de São Paulo e ele ficou commuita vontade de vir para o Paraná e quis vir embora.

Quando ele comprou o sítio, aquiera tudo mato. Londrina estava começando,só tinha 'uns tocos' no meio da rua, umavendinha e uma igrejinha de madeira". (ElziraTerciotti Pieroli - Patrimônio Regina)

"Eu nasci em Itápolis, Estado de SãoPaulo e vim pra cá com 15 pra 16 anos. Deixeimeus pais no Estado de São Paulo e vim sozi-nho. A gente era 'colonho' e a vida era difícil. Eutinha vontade de sair daquela vida de 'colonho'e vim pra cá. Trabalhei um ano e meio aqui nomeio da peãozada só derrubando mato, tavaabrindo a região. Ganhei um dinheiro e fui bus-car minha família, meu pai, minha mãe e duasirmãs menores, pra ter uma vida melhor". (IdazílioPaduã - Distrito de Maravilha)

"Homens pioneiroschegaram de longe

cheios de Fé.Na terra vermelha,no seio da mata,na cova profundaplantaram café.Vanguardeiros.

Braços possantesergueram a cidadena terra distante".

(Ode a Londrina - Cora Coralina)

LONDRINA: TERRA DE OPORTUNIDADES

Idazílio Paduã, 76 anos - Distrito de Maravilha

Plantação de café no distrito de Paiquerê

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Meu vô veio de Minas Gerais e comprou cinco alqueires de terra pra cadafilho, então, a família inteira veio pra cá, quando eu tinha oito meses. E é por isso que,até hoje, o lugar que meu avô comprou chama Ponto Mineiro". (Maria Inez Maziero -Distrito de São Luiz)

"O avô do meu maridocomprou terras aqui e repartiu paratodos os filhos, então, a família intei-ra do meu marido veio de Minas Ge-rais pra cá pra plantar café". (Olga deCarvalho Dutra - Distrito de São Luiz)

"Vim de Minas Gerais pratrabalhar na roça com meu pai, mi-nha mãe e meus irmãos. Compra-mos uma casa de madeira na colô-nia Anchieta. Fomos os primeirosmoradores da colônia". (Antônio deFreitas Rocha - Distrito de Irerê)

"Quando vim de Jundiaí do Sul, já era casada. Naquela época, estava vindomuitas famílias de lá pra cá. Meu marido veio pra trabalhar na Serraria Luzitana, do senhorJulio Vieira. Vinha muito caminhão de tora pra cá. O pessoal trabalhava na serraria dia enoite". (Maria Aparecida Lourenço - Distrito de Irerê)

"Eu vim pra cá com meus pais e meus irmãos. A gente veio pra trabalhar praviver. Naquela época, a coisa era feia na Bahia, então, viemos para o Paraná. O meu paisempre quis voltar pra Bahia, mas eu disse que não voltava.

O Paraná era o 'rei do café'. Os pernambucanos, os baianos, os cearenses,os alagoanos, ouviam falar dessa fama do café e viam loucos pro Paraná de mudança.Faziam a colheita e depois iam embora, no outro ano, viravam pra trás de novo. Eunão gostava de ficar mudando, então, falei pro meu pai que, se ele quisesse embora,podia ir, mas eu ia ficar aqui. Meus irmãos disseram que, se eu não fosse embora, elestambém não iam. Acabou ficando todo mundo aqui". (Adelino Marques Neves - Distritodo Espírito Santo)

"A gente tinha parenteque já morava aqui. Eles falavam'venham morar pra cá que aqui émelhor'. De fato, onde a gente mo-rava, a terra era mais fraca. A gen-te mexia com lavoura de mamona,algodão, mas a terra era fraca".(Judite Brenis - Patrimônio Selva)

"Meu pai veio pra cá abrirmata. A 'turma' da Bahia vinha pra cáabrir mata. Vinham naqueles 'pau-de-arara' e de 'maria-fumaça'. Eles co-meçaram abrir mata e plantar café.Foram até a Mata dos Godoy. Tudono machado e na foice.

Pra cortar os troncos mais grossos, tinha o 'traçador', um serrote onde umapessoa puxa do lado e outra do outro lado". (Izolina Maria de Jesus Francisco - Distritodo Espírito Santo)

Antonio de Freitas Rocha, 67 anos - Distrito de Irerê

Izolina Maria de Jesus Franscisco - Distrito do Espírito Santo

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

"O Paraná, naquela época, era uma terra de muita fama. Tinha muita fartu-ra. Muitas famílias vieram pra cá e ganharam dinheiro nas lavouras de café.

Aqui tudo era lavoura de café.Depois que a geada matou, arrancaramtudo e começaram plantar soja, milho.Mudaram tudo.

Quando eu vim do Estado deSão Paulo, minha primeira filha estavacom oito meses. Aqui, minha esposa ga-nhou mais cinco. Criei meus seis filhosaqui, casei todos eles. Graças a Deus,estão todos bem amparados. E estou aquiaté hoje". (Miguel Candido Rezende - Dis-trito de Maravilha)

"Vim de Minas com a famíliajá criada. A gente ficou nove anos na Fa-zenda Santa Branca. Eu fui 'colonho' noveanos lá. Só depois, a gente veio pra sededo Distrito". (Euclides Serafim Vieira - Dis-trito de São Luiz)

"Aqui era muito bom, tinhamuito movimento, era legal mesmo, tinhamuito mato. Era um lugarzinho pequeno,mas de muita fama, tinha muito movimen-to mesmo". (Deusdete Bento da Silva -Distrito de Paiquerê)

"Minha terra natal é Minas Gerais. Eu vim de lá pra Sertanópolis em 1960.Depois de 10 anos que eu vim pra região de Londrina. Vim pra trabalhar na roça, todavida, eu trabalhei na roça com café, algodão. Quando eu mudei pra cá, ainda tinhabastante café". (Geraldo Mendes Martins - Distrito de Paiquerê)

"Eu vim pra cá com minha família pra trabalhar. Ouvi dizer que o Paraná era muito bom eme mandei pra cá. Assim que eu cheguei, comprei um sítio, o mesmo que eu tenho atéhoje. Plantava milho, arroz e feijão". (José Margarido da Silva - Distrito de Guaravera)

"Eu sou de descendência polonesa. Vi-eram muitos poloneses pra cá. Minha mãe nasceuem Santa Catarina, mas minha avó nasceu naPolônia". (Edmundo Kobeleska - Distrito de Warta)

"Quando vim com meu esposo do Es-tado de São Paulo, compramos um sítio perto doHeimital pra plantar café. Trabalhamos dois anosali. Aí meu esposo quis abrir um açougue. Fica-mos cinco meses em Cambé e depois viemospra Warta, e estamos aqui até hoje. Só meu filhomais velho não foi nascido aqui". Virgínia

Paumanhani Buscarini - Distrito de Warta)

Miguel Candido Rezende, 88 anos - Distrito deMaravilha

José Margarido da Silva, 82 anos - Distrito de Guaravera

Virgínia Paumanhani Buscarini, 81 anos e seuesposo - Distrito da Warta

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"Nasci em Dourados, Es-tado de São Paulo, e cheguei aquicom 18 anos". (Maria ManriqueMassoni - Distrito de Lerroville)

"Cheguei do Estado deSão Paulo com dois meses. Meu avôveio primeiro e depois meu pai".(Dirce Ariano Tarmagnani -Patrimônio Regina)

"Vim com meus pais pratrabalhar na roça, casei, tive oito fi-lhos, 18 netos e estou por aqui atéhoje". (Iracema Dias Costetti -Patrimônio Regina)

"Cheguei com sete anos. Morava em um ranchinho de palmito com meupai, minha mãe e sete irmãos". (Iza Minguetti - Distrito de São Luiz)

A CHEGADA...

"Quando cheguei aqui, só tinha a igrejinha e os ranchinhos de pau-a-pique, cobertode sapé no meio do mato. Tinha muito mato, cobra e onça". (Izolina Maria de Jesus)

"Quando eu cheguei aqui, jáexistia o Distrito. Pelo que eu ouço fa-lar, aqui é mais velho que Londrina. Decasa que 'prestava', só tinha a igreja queera de madeira, o resto era tudo ranchocoberto de sapé. Tinha muito mato ain-da. Meu pai ajudou até a abrir a Fazen-da dos Godoy. Ele ajudou a abrir 200alqueires lá, no tempo que era roçadode foice e derrubado de machado nobraço. A gente olhava no caminho e viaduzentos, trezentos peões de mala nascostas, indo pra fazenda trabalhar".(Adelino Marques Neves - Distrito doEspírito Santo)

"Quando cheguei aqui, só tinha a igrejinha e os ranchinhos de pau-a-pique,coberto de sapé no meio do mato. Tinha muito mato, cobra e onça. O Distrito já cha-mava Espírito Santo, por causa do padroeiro, que é o Divino Espírito Santo". (IzolinaMaria de Jesus Francisco - Distrito do Espírito Santo)

Adelino Marques Neves, 67 anos e sua esposa,Edith Maria Neves - Distrito do Espírito Santo

Família de Guida Maria de Menezes Deliberadorjunto à família do capitão Euzébio - Distrito de São Luiz

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"Nasci e me criei em Tamarana e, depois que me casei, vim morar emLerroville. Vim pra trabalhar, dei aulas aqui durante 28 anos pela Prefeitura de Londri-na, agora estou aposentada.

Quando eu cheguei aqui, o lugar era muito pobre. Não tinha nada, só umascasinhas de madeira. A primeira escolinha que eu trabalhei era bem humilde. Foi bemsofrido o trabalho, a gente não tinha condições, nem de transporte. Era muito ruim o trans-porte aqui, por causa do barro, e 'corria' pouco ônibus". (Cacilda Caetano Nogueira - Distri-to de Lerroville)

"Quando eu cheguei, Lerroville tinha treze casas de madeira, e era tudo'samambaiá', tudo mato mesmo. Não tinha água nem luz. Era água de poço e luz delampião.

O nome do Distrito, no começo, era Placa, depois foi Londrinópolis. O ho-mem, que era dono daqui, morreu 'matado', e ele chamava Dr. Lerro, aí o filho delequis colocar esse nome de Lerroville". (Maria Manrique Massoni - Distrito de Lerroville)

"Aqui era puro mato. Em Londrina, só tinha a Casa Fuganti e a Catedral erauma igrejinha feita de tábua. Pra ir na cidade, tinha que ir a pé, por meio de uma'picada', não tinha estrada. Picada é uma trilha feita no meio do mato. A gente ia pra lápra fazer compras. Depois, o Evaristo Góes fez uma venda aqui que tem até hoje.Vendia secos e molhados, roupas, comida, aí facilitou um pouco, o povo começou acomprar mais aqui.

Nossa casa era de palmito e coberta de 'tabuinha' de mais ou menosvinte por trinta. Fazia tudo no machado e no facão. O chão era de 'chão' mesmo".(Dirce Ariano Tarmagnani - Patrimônio Regina)

"As casinhas, quando che-guei eram tudo de 'tábua'. Tinha atécasa coberta com sapé. Sapé é umcapim que cresce mais ou menos naaltura de um metro, 80 centímetros eaí arranca e cobre as casas com ele.E não chove dentro da casa, não dáuma goteira, só que é perigoso pegarfogo. Depois de um tempo, já teve osubprefeito e ele fez desmanchar osranchos, não deixou montar ranchomais. Aí, foi aparecendo as casas dealvenaria e foi ficando melhor.

Asfalto não tinha de jeito nenhum. Aqui era tudo terra até Londrina. Ti-nha um ônibus pra ir pra Londrina cedo e ele voltava à tarde. Se o tempo tivessebom, você voltava, se não, tinha que ficar por lá mesmo. Quando chovia, às vezes,a pessoa ficava parada lá no Paiquerê, outra vez ,do 'rio Taquara' pra cá, vinha apé, porque o ônibus não conseguia vir até aqui.

Quando cheguei, chamavam Lerroville de 'Patrimônio da Placa'. Porquetinha três placas lá na entrada, a da Usina Apucaraninha, da Fazenda 'Ivulhão' e ada Reserva Indígena.

Waldemar Tornero, 72 anos - Distrito de Lerroville

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

Depois de Placa, chamou Londrinópolis. O loteador daqui chamava Ludovicoe foi ele quem colocou esse nome. Depois de Londrinópolis, passou pra Lerroville.Lerroville porque o dono daqui mesmo chamava Dr. Lerro. Ele era francês". (WaldemarTornero - Distrito de Lerroville)

"Conheci demais a famí-lia dos Terciotti, que eram donosaqui das terras. Eles moram por aquiaté hoje. Aumentou bem oPatrimônio porque eles foram ce-dendo um 'pedacinho' pra cada um,uma datinha. Eram pessoas mara-vilhosas, se davam com todo mun-do". (Dirce Ariano Tarmagnani -Patrimônio Regina)

"A gente morou no Espí-rito Santo até derrubar o mato econstruir a casa aqui.

Quando construiu a casa, que já era de alvenaria, a gente mudou pra cá, praderrubar mato e plantar café. Não ajudei derrubar o mato, mas ajudei a plantar o café.Quando o café estava dando a primeira colheita, já veio a geada e queimou tudo. A gentefoi pra frente, cuidando até 'formar' de novo". (Elzira Terciotti Pieroli - Patrimônio Regina)

"Quando cheguei aqui no Regina, não tinha nada ainda. Tinha só a capelinhade madeira. Não tinha asfalto nada, tudo estrada de chão.

Não chamava Regina ainda, não tinha nome, colocaram bem depois". (Ira-cema Dias Costetti - Patrimônio Regina)

"Guaravera estava abrindo, quando eu cheguei, aqui era tudo mato. Meu paiveio pra cá pra trabalhar de bóia-fria. Morei em uma casinha de madeira com meu pai,minha mãe e seis irmãos.

Antigamente, aqui era muito difícil, a 'molecada' trabalhava na roça, nin-guém estudava. Trabalhavam carpindo algodão. Tinha escola pelos matos, nas fazen-das, mas, quando eu era criança, nunca estudei, mas, depois de moço, eu fiz Mobral".Sebastião Candido da Silva - Distrito de Guaravera)

"Quando eu cheguei, era tudo mato, um 'sertão muito largado', mas eramuito bom. Tinha muita fartura.

Comprei um 'mato em pé', fiz um rancho de palmito pra gente morar e, acada ano, a gente ia fazendo um ranchinho melhor". (José Margarido da Silva - Distritode Guaravera)

"Eu cheguei em 1948. Aqui não tinha asfalto, nada. Eu fui diversas vezes aLondrina a pé.

Era tudo mato, só tinha a Fazenda Rocha Loures, que já era 'aberta', játinha café, tinha gado. Mas essa parte do Distrito era tudo índio, tudo aldeia de índio. Agente 'enturmou' com eles, não tinha problema nenhum.

Sebastião Candido da Silva, 69 anos - Distrito de Guaravera

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

Quando eu entrei aqui naregião, a fazenda do seu João Ro-cha Loures já estava formada. A gen-te conviveu com ele muito tempo.

Ele era uma excelente pes-soa, muito bom, muito lutador. Ele erao dono dessa região de Maravilha.

Ele que deu o nome parao Distrito. Dizia ele que escolheuesse nome porque, quando ele co-meçou 'abrir' aqui, as pessoas vi-nham visitar e falavam: 'Poxa, aquié uma Maravilha!'.

Aí, ele colocou o nome de Fazenda Maravilha. A região era grande. Então,a gente foi comprando as terras.

As primeiras casinhas, a gente fez de palmito. Partia palmito pra cercar epartia tabuinha de 80 centímetros com facão pra cobrir. Costumava pingar dentro,quando chovia, mas dava pra levar. Outras partes, a gente cobria com folha de palmi-to. E era assim, a vida.

Tinha muito bicho aqui. Onça, anta, porco do mato. Se não 'olhava', elescomiam até as roças da gente". (Idazílio Paduã - Distrito de Maravilha)

Quando eu cheguei, o Distrito já chamava Maravilha. O dono das terras erao Doutor João Rocha Loures.

O doutor João Rocha Loures era um homem 'encorpado', um homem de'nome'. Ele era desembargador e 'professor de advogado'. Na época, ele tinha muitojagunço que andava com ele. Ele era bravo só de conversa, mas fazia os outros 'cum-prir a braveza' dele. Ele foi muito bom, tratou de muita gente pobre na fazenda dele.

Dia 23 de julho de 51, a gen-te chegou aqui em Maravilha.

Eu morei ali na sede da fa-zenda Maravilha e 'peguei' 4.500 pésde café. Toquei aquele café seis anos,até a geada matar. Naquele meio detempo, eu comprei uma chacrinha, erapequena, não dá meio alqueire, e alieu estou até hoje.

Quando eu comprei minhachacrinha, era tudo mato. Eu derrubeio mato, queimei e fiz um ranchode palmito, também.

Acho que tinha umas sete casas só. Era tudo 'chão' aqui, tinha um resto de mato,

Idazílio Paduã e o torrador de café - Distrito de Maravilha

Euclides Serafim Vieira, 97 anos - Distrito de São Luiz

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um depósito de tora que eles 'puxavam' aqui. Com o tempo, derrubaram aquele mato e foramplantando lavoura em tudo.

Quando chovia muito, isso aqui era uma lama. Com o tempo, foi chegandomais pessoas e fazendo mais algumas casinhas por aí". (Miguel Candido Rezende -Distrito de Maravilha)

"Desde o começo, o Distrito chamava São Luiz. Quem mandava nisso tudoaqui era o Capitão Euzébio. Ele era o dono desse mundão todo aqui até Tamarana. Aquiera um espinhadeiro, um arranha gato, não tinha casa, não. Espinhadeiro é uma árvorede espinho". (Euclides Serafim Vieira - Distrito de São Luiz)

"Quando a gente chegou,era tudo mato aqui, cada um teve que'abrir' seu pedacinho de terra. Nossacasa era de madeira e a gente usavalampião de querosene pra iluminar".(Maria Inez Maziero - Distrito de SãoLuiz)

"Quando eu cheguei aqui,não tinha nada, era tudo mata virgem.Existia apenas uma picadinha de ca-minhão de tora. Os caminhões levavamperoba e cedro daqui para Londrina.

O capitão Euzébio Barbosa de Menezes era o dono daqui e foi ele quem bati-zou o Distrito e deu um pedaço de terra pro meu pai". (Iza Minguetti - Distrito de São Luiz)

"Quando cheguei, o chãoera de terra e a minha primeira ca-sinha foi feita de palmito". (Olga deCarvalho Dutra - Distrito de SãoLuiz)

"Quando eu chegueiaqui, era tudo mato. Meu pai teveque derrubar o mato para fazer onosso rancho. Nossa casa era depalmito por dentro e tábua por fora,e, como não tinha energia, a genteusava um vidro com querosene e umpedaço de pano. Vizinho era difícil

de achar, tinha poucas casinhas.

O capitão Euzébio, dono das terras, era casado com Dona Morena. Ele eragordo, baixo, forte e gostava de ir na minha casa tomar o meu cafezinho. Quando agente chegou em São Luiz, meu pai foi atrás dele pra comprar duas datas, uma pragente morar e outra pra criar porco. É a mesma data que eu moro até hoje". (MariaAugusta Moraes - São Luiz)

Iza Minguetti, 79 anos - Distrito de São Luiz

Oscar Bittencourt, 96 anos - Distrito de Irerê

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"Quando eu cheguei, Irerê era puro café, e, depois que todo esse café aca-bou, tive que virar bóia-fria". (Antonio de Freitas Rocha - Distrito de Irerê)

"Quando eu cheguei aqui, não tinha rua, só trilho de vaca no meio do mato.O ponto de ônibus era cercado de vara. O Distrito ainda chamava Marreca e só mudoude nome pra ver se evoluía um pouco.

Minha casa era de pau roliço. Eu morei até em rancho coberto de folha debananeira. Naquela época, os ranchos eram cobertos, também, com casca de perobae 'tabuinhas' tiradas de paineiras. Chovia bastante dentro deles". (Maria AparecidaLourenço - Distrito de Irerê)

"Quando eu cheguei noIrerê, não existia Patrimônio, eramato. Eu vim pro Irerê pra trabalharna serraria, ali embaixo. A serrariaque eu trabalhava, era lá na VilaMatarazzo, em Londrina, e em 42,ela mudou pra cá. Quando a gentetava lá em Londrina, a gente puxa-va madeira daqui, aí o dono da ser-raria combinou com o Dr. Aristides,um fazendeiro, que queria que elemontasse a serraria aqui. Aí, nós ar-rancamos a serraria de Londrina emontamos ela aqui.

Quando eu cheguei, o Patrimônio ainda não chamava Irerê. Chamava 'Corgo' dasMarrecas', por causa do 'Corgo' das Marrequinhas". (Oscar Bittencourt - Distrito de Irerê)

"Quando eu cheguei aqui, a Warta era feia. Não tinha água, não tinha luz,não tinha asfalto, não tinha nada. Tinha pouca gente. Agora, tem bastante gente. Ago-ra tá bonita a Warta. Mas quando a gente chegou aqui, sofreu muito.

As casinhas, naquela época, eram tudo 'ruim', de madeira, de palmito. Ti-nha até casinha feita de barro. Não tinha água e nem luz. Quando entrei aqui, naminha primeira casa, as galinhas dormiam dentro. Não tinha nada. Tinha uma mesa decaixote, umas prateleirinhas. Trabalhei muito pra poder ter o que eu tenho hoje.

Na rua, tinha muita terra. Quando chovia, virava um barro só. Quando pas-sava uma condução, tampava tudo de poeira.No começo, a gente alugava um'açouguinho'. Depois, meu marido construiu um açougue nosso e a gente morava nofundo do açougue.

Eles compravam os bois, iam buscar e matavam em um matador que agente tinha nos fundos. Tinha sábado, que eles matavam uns dez bois. E era consumi-do tudo aqui. As 'turmas' dos sítios, das fazendas, naquele tempo, vinham comprar de'quarto' de boi. No começo, eu ajudava. Lavava 'barrigada', fazia sabão. Trabalheimuito. Naquele tempo, não vendia carne em mercado, só no açougue". (VirgíniaPaumanhani Buscarini - Distrito de Warta)

"Quando a gente chegou, as casinhas era tudo de madeira, casinha simples.Hoje, ainda é simples, mas era bem mais. Na época, tinha até casa cercada de palmito ecoberta de 'tabuinha'. Serrava as 'tabuinhas' e cobria a casa. Serrava ela verde, cobria e,

Edmundo Kobeleska, 68 anos - Distrito da Warta

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com a chuva e o sol, ela ressecava e rebitava, saía do prumo, aí era onde dava problema.Quando chovia, parecia uma peneira. Era bem gozado, naquele tempo.

Naquela época, tinha muito bicho aqui. Principalmente, capivara e porco domato". (Deusdete Bento da Silva - Distrito de Paiquerê)

"Naquele tempo, tinha muito café, hoje, tem pouco. Agora, é mais soja, mi-lho e trigo. Os fazendeiros 'forte' ainda têm café até hoje, os mais 'fracos' preferiramplantar soja e milho". (Edmundo Kobeleska - Distrito da Warta)

"O Dr. Rui Alves de Camargo era o dono do patrimônio. Ele que abriu tudo aqui.Eu acho que ele vendia o terreno pro pessoal fazer as casa. Eu conheci ele. Era magro,alto, muito boa pessoa. Naquele tempo, aqui era tudo café. Ele dava 'café a meia'. Apessoa 'pegava' por três anos pra 'formar' café, plantava o que podia, milho, feijão e viviadaquilo. E, quando colhia o café, metade erado dono e metade da pessoa. Naquele tem-po, não havia tanta gente sem emprego. Osfazendeiros davam serviço.

Quando eu vim morar aqui, ain-da não tinha asfalto, era mato 'em roda',mas aqui dentro mesmo, não tinha matonão.

Quando eu cheguei, já tinhabastante gente, bastante movimento. Bas-tante gente trabalhando na lavoura, tinhamuito empreiteiro. Tinha mais gente do quehoje". (Distrito de Paiquerê)

"Quando a gente chegou aqui, dava pra contar as casas que tinha em Lon-drina. O cemitério São Pedro tinha três ou quatro sepultura só. Londrina era uma cida-de feia, ainda. Londrina não parece mais aquela". (Judite Brenis - Patrimônio Selva)

AS DIFICULDADES...

Os Semeadores

"Vós os que hoje colheis, por esses campos largos,O doce fruto e a flor,

Acaso esquecereis os ásperos e amargosTempos do semeador?

Rude era o chão; agreste e longo aquele dia;Contudo, esses heróis

Souberam resistir na afanosa porfiaAos temporais e aos sóis. [...]"

(Machado de Assis, in 'Americanas')

Dona Judite Brenis, 81 anos - Patrimônio Selva

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"Luz elétrica não tinha, era tudo lampião. Só tinha luz elétrica na cidade. Nosítio, ninguém tinha, era lampião e lamparina de querosene.

Naquele tempo, não tinhacarro não. O próprio Godoy engorda-va aquela 'porcada' e, para vender profrigorífico, levava os porcos 'tocando'no meio da mata até na cidade. E hoje,a gente não dá um passo a pé, se nãoquiser.

Quando eu vi o primeirocarro, corri de medo. Quando eu vio primeiro avião passar no norte,corri esconder embaixo da cama, enão fui só eu, gente grande tambémse escondeu.

Os primeiros carros que come-çaram a aparecer se chamavam 'barati-nha'. Os pneus é desses fininhos que agente põe em carroça. A 'capotinha' erade pano". (Adelino Marques Neves - Dis-trito do Espírito Santo)

"Energia elétrica não tinha. Eralamparina de querosene. O pessoal mon-tava nos cavalos pelo meio do mato, prair na vendinha pra comprar comida e que-rosene". (Izolina Maria de Jesus Francis-co - Distrito do Espírito Santo)

"Energia elétrica não tinha. Só tinha lamparina. Nem querosene não tinhanaquele tempo. Naquele tempo, teve uma guerra e ficou faltando querosene, farinhade trigo, muita coisa ficou faltando. Aí, fizeram óleo de mamona, colocavam num vidrocom pavio e ficava clareando. O pessoal também dormia cedo, não tinha nem rádionaquela época". (Dirce Ariano Tarmagnani - Patrimônio Regina)

"A gente usava lampião de querosene e umas lanternas bem antigas quenem existe mais, era com querosene, um paviozinho e tinha um vidro em cima.

Foi no ano de 65 que chegou a energia. Foi a maior alegria do mundo. Umasemana antes de eu ganhar uma das minhas filha, a luz chegou. Mas ainda continuouágua de poço.

A televisão chegou logo, mas só algumas pessoas que tinham. Na casa domeu sogro, parecia um cinema, toda redondeza ia pra casa dele. Ele tinha uma salagrande e a gente sentava tudo no chão assistindo. Aquele tempo, a gente era feliz enão sabia. Aquele tempo não tinha tanta briga, tanta droga e pinga.

Cabaça - Utensílios para armazenar água,cedidos por Antonio de Freitas Rocha

Waldemar Tornero e a lamparina - Distrito de Lerroville

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Quando veio a energia, meusogro deu um rádio pra gente. Era da-quela marca 'Colorado'. Era um rádio tãolindo! Funcionava a pilha e a força. Eu'assisti' muita novela no rádio. As nove-las do rádio eram uma criação na cabeçada gente, a gente criava os personagens.Do jeito que vai falando, você vai crian-do, o jeito da casa, os personagens, ébonito, é gostoso! Na hora da novela, fi-cava bem quietinha no pé do rádio. No-tícias tinha muito pouco". (Maria ManriqueMassoni - Distrito de Lerroville)

"Quando ainda morava no Espírito Santo, a gente vinha a pé até aqui noRegina e voltava todo dia pra trabalhar na roça. A gente ia pra cidade a pé, ninguémtinha um carro. Às vezes, a gente pegava uma carona com um carroção, daquelespuxados por boi. Mas fui muitas vezes pra Londrina, a pé.

A luz chegou muito tempo depois que eu casei. Foi uma alegria, muito bom.É outra coisa. Antes, tinha que fazer brasa pra colocar no ferro de passar roupa, puxarágua do poço, um sacrifício. Pra tomar banho, tinha que esquentar água pra colocarem um balde que a gente abria e caia água. Pra iluminar a noite, a gente usava lamparinade querosene". (Elzira Terciotti Pieroli - Patrimônio Regina)

"Não tinha luz, era tudolamparina, e a gente tomava banhode bacia". (Sebastião Candido daSilva - Distrito de Guaravera)

"As casas já eram demadeira, quando a gente chegouaqui. Água e luz não tinha. A genteusava lampião. A água era de mina.A gente lavava roupa na mina e pe-gava água pra tudo, tomar banho,cozinhar, tudo". (Judite Brenis -

Patrimônio Selva)

"Quando entrei no meio desse mato, não tinha vizinho, mas, logo, foi jun-tando um rancho aqui, outro ali. Minha esposa falava: 'a gente vai ficar aqui sozinhoem um sertão desses?', mas eu sabia que logo ia chegar mais gente.

Luz não tinha. Quando falava em energia elétrica, a gente dizia: 'Que bichoque é esse?'. A gente ia no mato e pegava taquara, espalhava pela casa, que era dechão, e acendia. Isso servia, também, pra espantar as onças". (José Margarido daSilva - Distrito de Guaravera)

"Antes de chegar a energia, a gente usava lamparina. Eu mandei fazer umaslamparininha de lata e usava com querosene". (Miguel Candido Rezende - Distritode Maravilha)

Antonio de Freitas Rocha e o poço de água -Distrito de Irerê

Paisagem - estrada para o Distrito de Irerê

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"A vida aqui foi de dificuldade, não tinha ninguém tranquilo. À noite,como não tinha energia, tomava banho, iluminada só com a luz da lamparinade querosene, e ia dormir. Foi uma vida muito dura aqui. Nunca saía daqui. Lá praLondrina só pra fazer compras. Aí, era festa! Me ajeitava toda pra ir. Ia a cavalo e àsvezes de caminhão de tora". (Iza Minguetti - Distrito de São Luiz)

"Energia elétrica não tinha. Geladeira, essas coisas nem existiam. Era tudona lamparina de querosene. À noite, as mulheres remendavam ou costuravam comlamparina de querosene. Depois de muitos anos que chegou a energia elétrica. Pratomar banho, era aqueles chuveiros puxados por uma corda. A gente esquentava águana lenha e depois tinha um balde e embaixo dele tinha um regadorzinho, como sefosse um chuveiro. Então, a gente enchia ele com água morna.Em cima, tinha umacarretilha que a gente puxava e entrava em baixo pra tomar banho.

Minha esposa fez uma cirurgia uma vez, e, como não tinha como eu pagaruma condução pra ver ela, eu fui a pé daqui pra Londrina, chovendo.

Produto de limpeza, também,não existia. As mulheres lavavam roupaesfregando na mão. A gente queimavamadeira, tirava a cinza, colocava dentroda lata, furava a lata e molhava. Aquelaágua ia pingando em uma outra vasilha.Então, tirava aquela água da cinza e fa-zia sabão daquilo. E ia pro rio lavar rou-pa ou na mina. A gente ajudava elas le-varem as coisas e depois ia buscar.

Vida difícil, mas se fosse pracomeçar outra vez, e eu fosse mais jo-vem, eu voltaria a fazer a mesma coi-sa, tudo de novo". (Idazílio Paduã -Distrito de Maravilha).

"Água era só do poço, e a luz demorou muito pra chegar. Pra iluminar acasa à noite, a gente usava lamparina ou palha de cana de milho. Acendia só para'alumiar', pra gente deitar, daí, meu 'velho' jogava água e apagava, se não era perigosoqueimar tudo". (Maria Aparecida Lourenço - Distrito de Irerê)

"Energia elétrica tinha em algum lugar, outros não. Aqui mesmo, quando eucomprei, não tinha, eu que puxei. Antes, era à base da lamparina, lampião de gás, 'alumi-ava' bem. Mas era só pra pouco tempo da noite, porque ninguém resistia aguentar aquelelampião a noite toda, porque gastava muito". (Deusdete Bento da Silva - Distrito de Irerê)

"Logo no começo, não tinha energia. A gente usava lamparina de quero-sene. Depois que melhorou um pouco, chegou a energia. Aí, eu comprei uma televisãousada. Quase ninguém tinha televisão". (Geraldo Mendes Martins - Distrito de Paiquerê)

"Pra funcionar a serraria que eu trabalhava, a gente montou um motor elé-trico, só depois que fizeram a estação de energia. Em casa, a gente usava lamparina".(Oscar Bittencourt - Distrito de Paiquerê)

"A gente tinha um jipe velho. Quando chovia, a gente tinha que descer do jipe eempurrar. Chegava em Londrina coberto de lama". (Distrito de Paiquerê)

Maria Aparecida Lourenço, 83 anos - Distrito de Irerê

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"Eu ajudei meu marido a fazer o poço de água, um poço de 22 metros. Eleentrava lá no fundo, junto com um empregado, e puxava as pedras pra cima. Pra lavarroupa, ia com meus dois meninos pequenos, em uma mina, lá pra baixo". (VirgíniaPaumanhani Buscarini - Distrito da Warta)

O TRABALHO...

"[...]Não despreze o lavrador

Porque ele é o herói que sustentaa nação.

De manhã se levanta animadoVai à bica lavar o rosto

Depois sobe para o roçado,O dia inteiro, o caboclo a trabalhar.

Colhe os produtos da terraPara nos alimentar.

À tardezinha, desce do roçadocom seu corpo cansado,

Se lava e vai jantar,Depois pega na viola

e canta as modas do passado."

(Wanda Dobrucki Kaspovicz - Vida em Versos)

"Vim pra Lerroville para trabalhar pela Prefeitura de Londrina. Meu trabalhoera cuidar das estradas". (Waldemar Tornero - Distrito de Lerroville)

"O que tinha mais, era genteque vinha pra trabalhar de bóia-fria. Em-prego, fora esse, é só da prefeitura.

Trabalhei minha vida intei-ra de bóia-fria. O trabalho do bóia-friaera 'panhar' algodão. Era carpir soja,colher e carpir café. Bóia-fria faz tudoque aparece. Aquele tempo, tinha bas-tante serviço, saía bastante caminhãocheio de gente. De uns dez anos pracá, ficou fraco. É difícil achar serviço.As máquinas tiraram o serviço de bóia-fria". (Maria Manrique Massoni - Dis-trito de Lerroville)

"Trabalhei demais. Nem foi tanto na roça, trabalhava mais em casa porqueminha mãe era muito doente. Naquele tempo, tocávamos o sítio com bastante gente.As pessoas vinham e trabalhavam com a gente. Não eram peões, era famílias mesmo,

Adelino Marques Neves e o arado - Distrito doEspírito Santo

Waldemar Tornero e um dos seus antigos instrumentos detrabalho - Distrito de Lerroville

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gente que vinha ajudar na roça. Eu ajudava a fazer comida e levava na roça pra eles,depois vinha em casa, fazia um café e levava. Lavava roupa, cuidava das criançasmenores". (Dirce Ariano Tarmagnani - Patrimônio Regina)

"A gente sempre trabalhou na roça, com café. Aqui, tinha bastante café, agoraestá acabando, quase não tem café mais. Agora, só soja, trigo e milho.Meu pai sempretrabalhou de empregado. A gente trabalhava para os outros e morávamos no sítio onde eleia trabalhar. As casas eram todas de madeira". (Iracema Dias Costetti - Patrimônio Regina)

"A gente trabalhava muito no meio do mato, não parava nunca". (JoséMargarido da Silva - Distrito de Guaravera)

"Pra 'abrir' o mato, a gente usava só machado e foice. Naquele tempo, nãotinha motosserra, nada. Era tudo no machado. Juntava uns 60, 70 homens. Uma parteia roçando na frente e outra ia derrubando as árvores maiores. Tudo serviço braçal,não tinha nada feito com máquina". (Idazílio Paduã - Distrito de Maravilha)

"'Colonho' é a pessoa que tra-balhava tocando café de empreita. Tinhamuita gente trabalhando. A Santa Bran-ca, fazenda que eu trabalhei nove anos,ocupava cem 'colonhos'. O 'colonho' équase igual o bóia-fria. Quando a fazen-da queria fazer um serviço por dia, davaum aviso na 'colonha' e ia 50, 60 homenstrabalhar naquele serviço que ele pediu".Eu também trabalhei muito na roça, to-cava o açougue e trabalhava na roça. Euaté comprei uma chácara, mas meus fi-lhos não quiseram ajudar e foi precisovender". (Euclides Serafim Vieira - Distri-to de São Luiz)

"A gente criava porco, vaca e galinha. Tirava leite, fazia queijo /.../ Era gostoso,tinha muita fartura. Meus pais iam pra mangueira de manhã tirar leite. Eu ficava responsá-vel pelo almoço e minha irmã lavava e passava". (Maria Inez Maziero - Distrito de São Luiz)

"Meus pais trabalhavam na roça. Plantavam milho, arroz e feijão. Eu levavaalmoço e café a cavalo pro meu pai na roça". (Iza Minguetti - Distrito de São Luiz)

"As pessoas trabalhavam tudo na lavoura. Aquela época, era só lavoura.Aqui tinha café, algodão e rami.

Naquele tempo, eles tinham vários jeitos de ajustar as pessoas. O peãotrabalhava de diarista. Na lavoura de café, era o 'colonho'. O 'colonho' chegava nafazenda e o fazendeiro dava quatro, cinco mil pés de café pra ele tocar e pagava umamesada por mês. A produção toda era do fazendeiro e ele pagava um salário fixo. E aliele plantava alguma coisa. O fazendeiro dava um pedacinho de terra pra ele plantar eia levando a vida desse jeito.

Picareta, cedida por Waldemar Tornero - Distrito deLerroville

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Eu vim pra trabalhar na lavoura, mas trabalhei pouco tempo. Eles tinham umamáquina de arroz aqui, que tinha muito movimento, e o dono da máquina fornecia proscomerciantes. Eu peguei uma máquina pra trabalhar de operador e trabalhei quase uns20 anos de beneficiar arroz.

Depois, saí da máquina e fui tocar um comércio de carne, um açougue.Trabalhei 'uns par' de ano e depois voltei pra lavoura de novo. Aí chegou o tempo deaposentar. Me aposentei, tá com uns quatro, cinco anos. Nunca tive férias na vida".(Deusdete Bento da Silva - Distrito de Paiquerê)

Quando cheguei, eu era ge-rente da serraria que tinha aqui. Tinha10 máquinas e 40 homens que traba-lhavam lá. A madeira era daqui mes-mo. Nós fomos até Faxinal, tirando ma-deira. Muito dessa madeira, a genteconsumia aqui mesmo. Vendia pra ume pra outro pra fazer casa. E muita ma-deira ia pra Londrina, também.

Aí, eu continuei morandoaqui, trabalhando de carpinteiro. Fizmuita casa aqui no Patrimônio.

A minha primeira casa, que era encostada com a serraria, foi eu que fiz. Eessa, que eu moro hoje, também. Eu era carpinteiro, desde que morava no Estado deSão Paulo, onde eu nasci". (Oscar Bittencourt - Distrito de Paiquerê)

"Eu cuidava da casa e cozinhava pra família inteira, desde pequena. Traba-lhei, também, muitos anos na casa do Dr. Edson, que era genro do dono do Distrito, ocapitão Euzébio Barbosa de Menezes. A família do Dr. Edson gostava muito de mim.Trabalhava o dia inteiro na casa deles". (Maria Augusta Moraes - Distrito de São Luiz)

"Na fazenda, onde eu fui trabalhar, eu tocava café. Depois que a geadamatou o café, como o homem gostava muito de mim, ele mandou eu pegar o 'retiro'.Retiro é tirar leite. Eu não sabia nada de retiro, mas a 'precisão' aumentava, as filharadatudo pequena, eu resolvi enfrentar. Na casa onde eu morava, não tinha energia, mas,na mangueira, onde ficam as vacas pra tirar o leite, tinha. Tinha que atravessar umriozinho pra ir pra mangueira. Pra atalhar, a gente subia um barranco, eu as crianças eminha irmã. Às vezes, tava chovendo, a gente escorregava no barranco e a lamparinacaía dentro da água. Aí, a gente acabava de chegar no escuro.

Eu não tinha prática. Então, tinha dia que eu chegava, pra tirar leite, às trêsda manhã. Tinha 73 vacas pra tirar leite, e eu não sabia nem amarrar uma vaca direito,mas toda vida eu tive vontade de trabalhar. Foi indo, até que eu aprendi". (GeraldoMendes da Silva - Distrito de Paiquerê)

"A gente trabalhava de arrancar 'colonhão' pela raiz de 'enxadão'. A gentearrancava no braço, pra depois plantar café. Não tinha trator naquele tempo, não tinhanada. Arava com animal, com aquele arado de mão. Desde pequeninha, eu trabalhava

Foice, cedida por Adelino Marques Neves -Distrito do Espírito Santo

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na roça e em casa, também. Meus pais eram linha dura". (Izolina Maria de Jesus Francis-co - Distrito do Espírito Santo)

"Quando cheguei aqui, era tudo pasto e café. Naquele tempo, eu trabalhava de'camarada'.Se quisesse um prato de comida, tinha que trabalhar. 'Camarada' trabalha 'pracasa dos outros', mora na casa do pa-trão, trabalha na roça, faz de tudo, carpe,colhe café, abana café. Recebia uma'mixaria', pra comprar uma roupinha, umcalçado. É um trabalho livre". (EdmundoKobeleska - Distrito da Warta)

"Trabalhava o dia inteiro nalavoura. A gente andava quatro quilô-metros a pé pra chegar na lavoura.

Saía às seis horas e chega-va lá perto das sete. Eu e minha cun-hada ia e voltava a pé". (Judite Brenis - Patrimônio Selva),

Pé de café cultivado por Idazílio Paduã - Distrito de Maravilha

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SAÚDE...

CAFEZAL

"Que saudades tenho...Do verde dos cafezais

E suas floradas brancasExalando seu perfume...

Que saudades tenho...Das pessoas que trabalhavam na colheita de café

Aqueles garotos que corriam no meio dos cafezais descalçosHoje são doutores

Que saudades tenho...Dos amigos que se foram

Dos amores que se perderam no tempoMas seguro nas mãos de Deus e vou levando minha vida..."

(Arlete Kioshi Fujioka - Vida em Versos)

"Médico nunca teve. Quando ficavadoente, tinha que ir na Santa Casa, lá em Lon-drina. Meu pai contava que um amigo dele le-vou muitas vezes a filha na Santa Casa nascostas e voltava. Não tinha nem um cavalo. Enão tinha estrada boa como a gente tem ago-ra, era trilha". (Adelino Marques Neves - Distri-to do Espírito Santo)

"Quando ficava doente, saía aí 'promundo' caçando um benzedor pra benzer. Na-quele tempo, tinha benzedor, e benzedor bom.Eu lembro que minha mãe levava a gente prabenzer. Fazia remédio caseiro, de erva domato. Baiano conhece muito remédio do mato.Com a força de Deus, a gente sarava. Se asituação fosse muito grave, tinha que 'caçar'um médico, a pé ou montado a cavalo. E aestrada era tudo chão, tudo 'buraqueira', nãotinha asfalto, não tinha nada, só estrada debarro. Quando chovia, a gente não dava umpasso que caía, escorregava na lama".(IzolinaMaria de Jesus - Distrito do Espírito Santo)

José Margarido, 82 anos - Distrito de Guaravera

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"Naquela época, nem um farmacêutico tinha aqui. Quando ficava doente,tinha que ir na farmácia em Tamarana. Lá tinha farmacêutico, mas médico mesmo, dejeito nenhum. E o povo desse tempo era muito difícil ir ao médico. Tratava em casa eia na farmácia.

O farmacêutico dava re-médio e era bom. Hoje, você vai aomédico e ele manda você fazer ummonte de exame, que custa tudo di-nheiro. Depois que você leva os exa-mes pra ele que ele receita o medica-mento. Naquele tempo, não. Se apessoa tivesse uma dor no estôma-go, por exemplo, ia na farmácia, o far-macêutico olhava bem porque queestava com aquela dor de estômago,já dava o remédio e, dali a três dias, apessoa estava boa. Tomava tambémmuito chá de erva, remédio caseiro eresolvia bastante". (Waldemar Tornero- Distrito de Lerroville)

"Naquela época, a gente não ficava doente. Eu não lembro de ter ficadodoente nem uma vez. Nem eu, nem meus irmãos, nem meu pai e minha mãe, quemorreram na casa dos 90 anos. Às vezes, a gente tinha uma gripe, um resfriado, masa gente tomava um chazinho e ficava bom. Naquela época, quase nem existia compri-mido. Médico não tinha, só tinha uma farmácia que funcionava mais ou menos. Sealguém ficasse doente, tinha que ir pra cidade". (Judite Brenis - Patrimônio Selva)

"Quando era criança e ficava doente, meu pai tinha que me levar nas costasa pé pra Londrina. A gente ia bem de madrugada e, quando era nove, dez horas, jáestava de volta. O doutor atendia cedo, meu pai tinha que trabalhar na roça". (DirceAriano Tarmagnani - Patrimônio Regina)

"Médico não tinha. Quando ficava doente, corria pra Tamarana ou Londri-na". (Cacilda Caetano Nogueira - Distrito de Lerroville)

"Ganhei todos os meus filhos, em casa, com parteira. Naquele tempo, nemem médico, a gente ia. Graças a Deus, nunca fiquei doente". (Elzira Terciotti Pieroli -Patrimônio Regina)

"Não tinha médico. Minha mãe uma vez teve 'tifo' e o patrão foi levar ela decaminhão pra se tratar em Cornélio. Eu tive 'febre colerina' e tratei só com remédio dafarmácia". (Sebastião Candido da Silva - Distrito de Guaravera)

"Médico era difícil. Um filho meu morreu à míngua, não tinha onde correr.Eu deixei ele internado no hospital em Londrina e, quando eu voltei pra buscar, eletinha morrido. Ninguém nem me avisou. Só Deus ajudava. Ainda bem que, naqueletempo, a gente tinha mais saúde". (José Margarido da Silva - Distrito de Guaravera)

"Posto de saúde não existia. Pra minha esposa ganhar o primeiro filho, agente foi daqui a Londrina em um caminhão de tora. Se precisasse de médico, tinha

Paisagem - Estrada para o Distrito da Warta

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

que alugar uma condução e ir pra Londrina. Eu ajudei a carregar muitas pessoas, que'arruinava' lá no sitio, na rede, até aqui, pra arrumar uma condução pra ir pra Londrina.Mesmo as pessoas, que não tinha condições, tinha que se virar.

Depois que eu melhorei de vida, eu comprei um jipinho. E, nesse jipinho, eucarregava os doentes. Tinha noite de eu ir buscar uma parteira pra assistir uma mu-lher, chegava em casa, tinha outro que chamava e eu tornava voltar pra buscar amesma e levar pra outro lugar". (Idazílio Paduã - Distrito de Maravilha)

"Médico não tinha, quando eu cheguei. Se ficava doente, era só 'remedinhode casa', 'banho' com ramo, chazinho, essas coisas. Quando ia no médico em Londri-na, tinha que esperar o dia que dava certo, o dia de marcar a consulta. Se tivessemuito ruim, morria. Às vezes, não tinha nem condução pra levar. Tinha que ir de ôni-bus, doente. Ainda bem que, naquele tempo, não tinha tanta doença como tem hoje.

Pra começar, esse postinho de saúde que tem aqui, eles foram lá em casaprocurar meu filho pra trabalhar lá. Ele estudou muito pouquinho, mas eles tinham'precisão' de pessoas que morassem aqui pra trabalhar. Ele foi e tá com mais de 20anos trabalhando ali". (Miguel Cândido Rezende - Distrito de Maravilha)

"Como não tinha médico, quando agente ficava doente, tinha que ir de carroça praLondrina. Se tivesse muito ruim, alugava umjipe pra ir, mas, em dia de chuva, ficava tudoencalhado na estrada". (Maria Inez Maziero -Distrito de São Luiz)

"Não tinha hospital nem médico. Euajudei a fazer o parto de muitas mulheres aqui.Não dava tempo de chamar ninguém. Então,elas me chamavam porque eu estava pertinho.Acabei também batizando muitas dessas cri-anças". (Iza Minguetti - Distrito de São Luiz)

"Naquele tempo, não tinha médico.Quando ficava doente, ia na farmácia ou ia deônibus pra Londrina". (Olga de Carvalho Dutra- Distrito de São Luiz)

"Não tinha hospital. Quando ficava doente, ti-nha que ir na farmácia do Três Bocas". (MariaAugusta Moraes - Distrito de São Luiz)

"Médico não tinha, só farmacêutico. Mas, se precisasse de médico mesmo,tinha que alugar uma condução e ir para a cidade. Curandeiro, também, sempre teve,mas eu nunca ocupei, nunca mexi com esse tipo de coisa". (Deusdete Bento da Silva- Distrito de Paiquerê)

"Não tinha medico, mas os farmacêuticos era mais do que um médico. Elesviam o que a criança tinha, passava o remédio e sarava mesmo. Se fosse mais grave,eles diziam e mandavam para o hospital". (Paiquerê)

"Médico não tinha aqui não, quando ficava doente, tinha que ir pra Londri-na, tinha que fazer tudo e ir, era o único lugar que tinha. Às vezes, andava um pouco a

Miguel Candido Rezende, 88 anos - Distritode Maravilha

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pé ou arrumava carro. Quando nasceu minha filha caçula, mesmo, a mulher teve queoperar, foi lá no HU. Foi um sofrimento, tive que arrumar um carro pra levar. Ela quasemorreu na estrada. Tinha parteira, mas a parteira, que tava com ela, não deu conta, oparto complicou. Então, teve que ir fazer cesária.

Existia curandeiro. Eu já fui em uns par deles. Uns, eu achava que eraverdade e outros eu achava que era mentira. Então, eu fiquei meio indeciso, se euacreditava ou não. Mas que tinha, tinha". (Geraldo Mendes da Silva - Distrito de Paiquerê)

"Naquele tempo, se ficasse doente, tinha que arrumar uma condução pra ir prohospital em Londrina. Se tivesse uma pessoa que tivesse um carro, que fosse muito rica,a gente pagava pra poder levar de carro pro hospital, se não, tinha que ir de ônibus. Umavez ,foi por pouco que não ganhei oneném fora de tempo no ônibus. Ti-nha parteira boa, mas, se tivesse al-guma complicação, elas mandavampra Londrina". (Virgínia PaumanhaniBuscarini - Distrito da Warta)

"Quando acontecia de al-guém se acidentar na serraria que eutrabalhava, o patrão mesmo levavapro hospital em Londrina. Logo, abriufarmácia aqui, mas, acidentado tinhaque ir pro hospital". (Oscar Bittencourt- Distrito de Irerê) Deusdete Bento da Silva - Distrito de Paiquerê

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

A ESCOLA...

"Uma coisa que eu lembrobem é que, quando ia pra escola,

a gente passava por umcaminho cheio de mato virgem.

Era uma escolinha simplesno meio do mato".

(Maria Inez Maziero)

"As escolas aqui todas foram abertas por mim. Na época, foi muito sofrido.Aqui, não tinha asfalto. Trabalhei 16 anos nas periferias, no sítio, e tinha que andarmuito a pé. Não tinha asfalto nem daqui pra Londrina. Cansei de posar ali no Irerê, porcausa do barro. Os últimos 12 anos, eu terminei aqui na sede do Distrito, na escolaBento Munhoz". (Cacilda Caetano No-gueira - Distrito de Lerroville)

"Quando começou 'abrir aqui',em cada fazenda grande, tinha umaescolinha de madeira. Com o tempo, fize-ram uma escola aqui na sede e foram tra-zendo todas as escolas pra cá. Hoje, sótem escola aqui na sede". (WaldemarTornero - Distrito de Lerroville)

"A primeira escola tinha bas-tante alunos. Tinha uma aqui e nos sítiostinham muitas escolas, também". (MariaManrique Massoni - Distrito de Lerroville)

"Escola ainda não tinha. Quando eu fiz sete anos, ia na escola lá no EspíritoSanto, a pé". (Dirce Ariano Tarmagnani - Patrimônio Regina)

"Quando chegou escola aqui, eu também já estava casada. A escola que temhoje chama Egídio Terciotti, que era meu irmão. Ele doou o terreno pra escola". (ElziraTerciotti Pieroli-Patrimônio Regina)

"A primeira escola era uma casinha de madeira. Em cada comunidade, tinhauma escolinha de madeira. Ela ainda tá em pé, só que transformaram ela em residência".(Idazílio Paduã - Distrito de Maravilha)

"Uma coisa que eu lembro bem é que, quando ia pra escola, a gente passa-va por um caminho cheio de mato virgem. Era uma escolinha simples no meio domato". (Maria Inez Maziero - Distrito de São Luiz)

Waldemar Tornero, 72 anos - Distrito de Lerroville

Cacilda Caetano Nogueira, 67 anos - Distrito de Lerroville

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

"A escola era uma casinha de madeira pequena. A professora era DonaChiquinha e sua filha Beatriz. Elas foram as primeiras professoras daqui. Ninguémsabia direito o que era escola. As crianças iam pra lá só pra brincar. Logo, a escolaacabou e, depois de um tempo, quando eu tinha 14 anos, ela voltou. Eu tinha vontadede ir pra escola, mas minhas irmãs me ensinavam tudo em casa. Aprendi coisas que oquarto ano não aprende hoje. Era muito rigoroso, se errasse um número, tinha quefazer de novo, dez vezes". (Iza Minguetti - Distrito de São Luiz)

"Meus filhos iam muito longe para estudar. A escola era uma casinha demadeira, com um pátio grande pra criançada brincar. A igreja era pequena e feita demadeira". (Maria Aparecida Lourenço - Distrito de Irerê)

"A escola 'abriu' logo. Eu ajudei a construir. Era de madeira, também. Eraali perto da igreja, onde é até hoje". (Oscar Bittencourt - Distrito de Paiquerê)

"Escola tinha, mas era muitoruim. Pra estudar minhas filhas, foi umsacrifício. Era professor pago, não tinhanada de graça. Só tinha o primário, queera da prefeitura. Era ruim porque eradifícil. A gente tinha que dar um jeito depagar. Não era muito dinheiro, mas, pragente que ganhava pouco, era bastan-te e tinha que pagar. Se não, não estu-dava. Quando elas chegaram no cole-gial, tiveram que ir estudar em Londri-na". (Deusdete Bento da Silva - Distritode Paiquerê)

"A maior parte das minhas crianças estudou no sítio. A escola era meiolonge, mas tinha". (Geraldo Mendes Martins - Distrito de Paiquerê)

"Os três filhos mais velhos do meu pai não estudaram. A gente teve quetrabalhar pra ajudar a criar os outros irmãos. Fomos vivendo e tocando a vida prafrente". (Izolina Maria de Jesus Francisco - Distrito do Espírito Santo)

"Escola já tinha, quan-do eu cheguei, mas só até o 'quar-to ano'. Meu menino mais velhoqueria continuar a estudar, então,meu marido foi indo até que com-prou uma Kombi. Quando chovia,tinha dia dele chegar em casa,duas, três horas da manhã. Ele iapra Londrina estudar e ficava nocaminho porque a Kombi 'enros-cava' por causa do barro. Pra con-tinuar o estudo, ele acabou mu-dando pra lá, até terminar".(Virgínia Paumanhani Buscarini -Distrito de Warta)

Maria Aparecida Lourenço, 83 anos - Distrito de Irerê

Oscar Bittemcourt, 96 anos - Distrito de Irerê

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

"A escolinha era feita de madeira. Uma escolinha de "duas águas". Eu nuncafui na escola. No meu tempo, era muito difícil. Se eu fosse pra escola, quem ia ajudarminha mãe. Mas eu aprendi a ler assim mesmo. Aprendi sozinha. Eu tinha muito erro deportuguês, mas aprendi. Eu gostava de ler e gosto até agora". (Judite Brenis - Selva)

A IGREJA...

VIDA NA ROÇA

"Na imensidão do cafezal,Debaixo do pé de café,

O bebê dorme tranquilamente.O outro brinca com a terra cantarolando.

O pai abana o café, nenhum grão cai fora.A mãe faz os montes.

O suor escorre na face repleta de felicidade".

(Lucia Fukiko Okano - Vida em Versos)

"Quando eu cheguei, já tinha igreja, era pequena e simples, mas tinha. Fo-ram reformando e agora tem uma igreja bonitinha". (Cacilda Caetano Nogueira - Distri-to de Lerroville)

"Igreja não tinha. O padre vinha aqui, a cada dois meses. Onde é a praçahoje, era 'puro capim samambaia', dava uns dois metros de altura. Aí, limparam umpedaço, colocaram um cruzeiro, uma cruz de madeira, e ali rezavam o terço. Falavamque ali ia construir a igreja, até que construíram mesmo". (WaldemarTornero - Distrito de Lerroville)

"Quem começou a igreja católi-ca foi meu sogro. Ele trabalhou pra arreca-dar fundos para construir a igreja. Padre, agente tem agora, antes, o padre que vinhaera de Tamarana.

A gente rezava o terço e fazialeilão ali na praça, no meio da terra e domato. Aí, a gente foi fazendo festa pra ar-recadar dinheiro até construir a igreja".(Maria Manrique Massoni - Distrito deLerroville)

Família Dutra - Cedida por Olga de Carvalho Dutra -Distrito de São Luiz.

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

"A igreja era de tábua, construíramlogo no começo do Patrimônio, só depois fize-ram essa que tem agora". (Dirce ArianoTarmagnani - Patrimônio Regina)

"Quando eu cheguei, já tinha igreja.Era tudo de madeira e tinha missa todo domin-go". (Sebastião Candido da Silva - Distrito deGuaravera)

"No começo, tinha uma igrejinha detábua, e as primeiras pedras dessa igreja, quetem agora, foram tiradas do meu sítio". (JoséMargarido da Silva - Distrito de Guaravera)

"Quando eu cheguei, não tinha igre-ja. A gente celebrava a missa embaixo de umencerado. Fincava 'furquia', colocava a lona emcima e, assim, celebramos muitas missas.

Depois, construímos uma igrejinha pequena de madeira. E, depois de unsanos, construímos essa que tem hoje". (Idazílio Paduã - Distrito de Maravilha)

"Naquele tempo, a igreja era de tábua, no mesmo lugar que é agora. Depoisde tábua passou a 'material'". (Euclides Serafim Vieira - Distrito de São Luiz)

"Quando eu tinha 14 anos,ia com uma turma limpar a igreja, prafazer festa. Era uma igreja de madei-ra". (Maria Inez Maziero - Distrito deSão Luiz)

"Fizeram uma igrejinha demadeira, eu lembro bem dela. Todoprimeiro domingo do mês, tinha terço.O padre vinha de Londrina. Tinha, tam-bém, uma casinha de madeira ondeensina vam as crianças, tipocatequese hoje". (Iza Minguetti - Dis-trito de São Luiz)

A igreja e a escola eram bem pequenas e feitas de madeira". (Olga deCarvalho Dutra - Distrito de São Luiz)

"A primeira igreja era de tábua. Eu ajudei a construir. Eu e meu sobrinho fomoslá em Eldorado comprar forro pra forrar a igreja. Fizemos a parede de tábua e forramos elapor dentro. Depois que veio o Padre Ângelo, ele construiu a igreja de 'material', mas deixouo forro do jeito que agente tinha feito". (Oscar Bittencourt - Distrito de Paiquerê)

Fachada da igreja católica do distritode Lerroville

Fachada da igreja católica de São Luiz

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

"Igreja, desde que eu cheguei, já tinha. Ela era feita de tábua, mas era nomesmo lugar que é hoje. Tinha missa todo domingo e o padre morava aqui mesmo".(Deusdete Bento da Silva - Distrito de Paiquerê)

"Igreja já tinha, quando eu cheguei, mas ela mudou bem, aumentou bastan-te e ficou mais arrumadinha. Sempre tinha festa da Padroeira lá". (Geraldo MendesMartins - Distrito de Paiquerê)

"Igreja já tinha, quando eu che-guei, mas não tinha padre. O padre vinhade Londrina, só uma vez por mês, rezar mis-sa. Era uma igreja de 'tábua'". (VirgíniaPaumanhani Buscarini - Distrito de Warta)

"Quando eu cheguei aqui, já ti-nha uma igrejinha pequena. O povo ficavametade pra fora. As pessoas ficavam empé no corredor. Só os idosos sentavam. Opadre vinha uma vez por mês, às vezes,duas. Um dos primeiros padres, que pas-sou aqui, foi o Carlos Weiss; vinha pra cáa cavalo, quando ainda não tinha asfalto.

Eu perguntei pra ele: 'Como o senhor faz, o senhor não cansa?', ele merespondeu: 'Quando eu canso, eu amarro o cavalo, deito no capim fresco e como opedaço de pão que eu carrego no bolso'. Ele batizou meu filho e morreu com 102 anos.Depois, a minha família e a família do vizinho começaram 'engenhar' e decidimosaumentar a igreja. Agora, cabe muita gente". (Judite Brenis - Patrimônio Selva)

AS RELAÇÕES SOCIAIS...

"Naquele tempo, um ajudava o outro.Era aquela 'buniteza'".

(Adelino Marques Neves)

"Os vizinhos se juntavam.Plantavam milho e depois todos se junta-vam pra ajudar a descascar e 'debulhar'na mão. Um mês fazia na casa de umvizinho, ia lá e descascava todo o milho e'debulhava'.

Era muito, então, demorava. Quando terminava aquele, ia na casa de

outro vizinho. Era comunidade mesmo, um ajudava o outro. As pessoas eram mais

Máquina de costura, cedida por Maria AparecidaLourenço - Distrito de Irerê

Fachada da residência de Antonio de Freitas Rocha -Distrito de Irerê

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

unidas. Quando não, se juntava todo mundo na porta da casa e ia contar história.Serviam um café, um chá, um bolo. Agora, ninguém mais vai na casa de ninguém.Todo mundo fica assistindo televisão, ou, por causa do trabalho, volta pra casa tarde".(Dirce Ariano Tarmagnani - Patrimônio Regina)

"Se, por acaso, alguém tinha o porco e não tinha o arroz e o feijão e eu tinhao arroz e o feijão e não tinha o porco, a gente 'barganhava', trocava". (Idazílio Paduã -Distrito de Maravilha)

"E a vizinhança era umabeleza. A gente era tudo um só.Todomundo se conhecia". (Antonio deFreitas Rocha - Distrito de Irerê)

"A gente tinha muita ami-zade com as pessoas. O povo erapobre e humilde. Não tinha briganem violência". (Maria AparecidaLourenço - Distrito de Irerê)

"O povo aqui, toda vida, foigente boa. É um lugar que não saibriga, nada. O povo se dá muito". (Os-car Bittencourt - Distrito de Paiquerê)

"Antigamente, era assim. Todo dia, à noite, os vizinhos se visitavam, corri-am o 'mundo inteiro', onde aguentasse ir. Hoje em dia, você mora ali, eu moro aqui,você não dá noticia, eu também não, cadê o amor do povo, foi pra onde?

Quando alguém novo mudava, um vizinho levava um saco de arroz, outrode feijão, outro, uma lata de óleo, outro um leitão, pra ele começar a criar, outro, duas,três galinha já com pintinhos. Chegava e dizia: 'Olha aqui, pra você começar'. Hoje,você pode mudar oitenta vezes que ninguém nem sai na porta pra te olhar. Eu semprefalo pra minha mulher: 'Você vê, antigamente como era as coisas do mundo, e hoje tátudo mudado. Os próprios irmãos, um não dá bola mais pro outro'.

Os vizinhos chegavam em casa, a gente conversava um pouquinho e de-pois ia rezar terço, rezava terço até meia noite e aí ia contar 'causo'. A hora que nin-guém aguentava mais de sono, cada um ia pra sua casa, e era assim direto. Hoje,você não vê falar mais dessas coisas. Eu não vejo.

Se você adoecesse, era tão bonito. Naquele tempo, todo mundo tocava roça.Se eu tivesse minha roça e adoecesse, não precisava esquentar a cabeça. Qualquer umdos conhecidos juntava aquele 'mundo' de gente e dizia: 'vamos carpir a roça do seuAdelino'. Marcavam o dia e avisava a mulher: 'Você faz almoço que vai vir tantas pessoascarpir a roça de vocês'. Podia levar uma semana, mas deixavam tudo limpinho. A hora quea gente melhorava, chamava todo mundo e perguntava: 'Quanto vou pagar pra vocês?'.

Eles diziam: ' Você não vai pagar nada. Nós fizemos um mutirão'. Hoje, sevocê adoecer, sua roça morre no mato e ninguém vem nem te visitar. Por isso, que agente estranha muita coisa.Se você não tivesse feijão na sua 'tulha' e eu tinha, vocêfalava: 'Eu te dou um saco de arroz, você me dá um saco de feijão?'. Outra hora: 'Eunão tenho um porco gordo, você tem? Você me dá um porco gordo e eu te dou umfrango'. Era assim. A gente trocava. Um ajudava o outro. Era aquela 'buniteza'". (AdelinoMarques Neves - Distrito do Espírito Santo)

Paisagem - Estrada para Paiquerê

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AS BRINCADEIRAS..

Hoje, eu me lembro do meu tempo de criançaOs amigos daquela época, tenho todos na lembrança

Cedo eu saia de casa e ia pra escola estudarQuando voltava pra casa, me preparava pra almoçar.Depois de um breve descanso, começava a trabalhar

Cortava lenha, puxava água, tratava da criaçãoBrinquedo? Só aos domingos, depois da devoção

Cedo ia pra igreja, fazer a oraçãoQuando voltava pra casa, queria brincar

Os meninos de carrinho, bola, às vezes, peteca,As meninas de casinha e boneca

Faziam boneca de pano e até de espiga de milho,Tratavam com todo carinho, como se fossem seus filhos

Às vezes, improvisavam uma capela e um padre, para os seus filhos batizarDepois, tinha comida, doces e bolo para o batismo comemorar

Às vezes, ao som de uma vitrola, fazíamos até um forrozinhoO que eu não vejo, nessa infância de hoje, é essa mesma união

Mal começa um brinquedo, às vezes ,termina em confusão.Ouço muito dizer que o mundo agora mudou

O mundo continua o mesmo, o amor é que acabou.

(Oziel Marcelino)

"Eu não cheguei a brincar mui-to, não tinha tempo. Não brincava muito,mas as brincadeiras eram boas. Brincavade boneca, de roda, jogava bola, brincavade passa anel. Aquele tempo era melhorporque as crianças brincavam na terra, pa-rece que tinha até mais saúde. Hoje emdia, é bom por causa do conforto, só queas crianças ficam muito perto da televisãoe do computador. Isso prende muito as cri-anças em casa e isso não é bom". (Dirce

Ariano Tarmagnani - Patrimônio Regina)

"Dia de domingo, eu ia brincar com minhas primas em uma mina. A gentefazia panelinha de barro e ficava o dia inteiro brincando". (Maria Inez Maziero - Distritode São Luiz)

Coelho, cedido por Edmundo Kobeleska - Distrito da Warta

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"A gente andava no meio do mato, subia em árvore, balançava no cipó. Eramuito divertido". (Iza Minguetti - Distrito de São Luiz)

"As crianças brincavam debolinha de vidro e carrinho de roleman.Elas faziam uma festa". (Antonio deFreitas Rocha - Distrito de Irerê)

"As crianças brincavam debola, de boneca de pano. Amarrava vá-rios sabugos de milho, saía puxando efingia que era boi, e cada sabugo ti-nha um nome". (Maria Aparecida Lou-renço - Distrito de Irerê)

"As crianças brincavam deroda, de pique, de bater peteca, debola". (Paiquerê)

"Eu gostava de ficar pelo meio do mato. Brincar nas árvores, de balançar nocipó. Mas brincava só dia de domingo, quando dava uma folguinha. Trabalhava muito.Nossos pais não deixavam a gente brincar muito não.

Meu pai falava: 'Não posso criar filho sem trabalhar. Todo mundo tem quetrabalhar pra, quando Deus levar todo mundo, saber viver'. E, graças a Deus, ele criounove filhos dele e dez dos outros. Nunca ninguém deu trabalho pra ele. (Izolina Mariade Jesus Francisco - Distrito do Espírito Santo)

Residência no Distrito de Irerê

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AS FESTAS E A COMIDA...

"Aquele tempo era uma maravilha! Muita festa.A gente matava muito frango e vendia".

(José Margarido da Silva)

"Naquele tempo, tinha muitafesta e dava muita gente. Pra fazer chur-rasco, tinha que fazer aquelas valetasde cinco metros e colocar fogo. Mas, de-pois que acabou os cafezais, foi mudan-do tudo, foi ficando mais difícil".(Waldemar Tornero - Distrito de São Luiz)

"Festa, tinha muito. Festasda igreja mesmo. O padroeiro aqui é SãoJosé Operário. Mas, com o tempo, co-meçou a sair briga. O povo não esta-va mais respeitando muito, aí deu uma

parada". ( Dirce Ariano Tarmagnani - Patrimônio Regina)

"Tinha muita festa aqui. A gente se divertia bem, tudo gente boa. Não eracomo é hoje". (Elzira Terciotti Pieroli -Patrimônio Regina)

"Antigamente, tinha maisfesta que agora. O pessoal enfeitava apracinha com palmito, trazia uma car-roça cheia de palmito e fincava por aí.Dava muita gente e dava até bastanterenda. E com essa renda, aos poucos,foram construindo a igreja. O pessoalfazia brincadeira, jogos para as crian-ças, coisa de comer, pro pessoal com-prar. Quem tinha lavoura, doava sacode café, ou frango, porco. (Miguel Cân-dido Rezende - Distrito de Maravilha)

Fogão a lenha, cedido por Geraldo Mendes -Distrito de Paiquerê

Jarra para leite, cedida por Maria Aparecida Lourenço -Distrito de Irerê

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"Aqui, tinha muita festa. E boa. Pra construir a igreja mesmo, a gente tinhaos 'festeiros' que saíam pedindo. As pessoas davam frango, leitoa, dinheiro, davam detudo. Aí, marcava o dia e fazia a festa. Tinha música, alto-falante no mastro. Nãoexistia briga, nada. Amanhecia 'entochado' de gente aqui. Não existia um bate boca,de jeito nenhum. Às vezes, começava um 'qualquer coisa', a gente chegava e pediapra pessoa sair e saía. O povo respeitava as pessoas mais velhas do lugar. Era umacoisa linda. Foi assim que a gente conseguiu o meio pra fazer a igreja.

Carne, a gente não precisava comprar, tinha muita criação de porco, frango ecaça. Milho, arroz e feijão, também, a gente plantava. Essas coisas, a gente não compravaporque tinha muito. E tinha de tudo, a gente plantava e era muito produtivo". (IdazílioPaduã - Distrito de Maravilha)

"Aquele tempo era umamaravilha! Muita festa. A gente ma-tava muito frango e vendia". (JoséMargarido da Silva - Distrito deGuaravera)

"Nas festas daquele tem-po, tinha leilão. Era a festa mais bo-nita que tinha. Cada um dava umbrinde pra festa. No leilão, eles vãogritando, aquele que pagar mais é odono. O dinheiro ficava pra igreja.Tinha procissão, também. Carrega-va a santa na rua com andor. Tinha

procissão com o São Luiz,também.

Aqui, tinha muita gente, só em Londrina podia ter gente igual aqui. Erafazenda pra tudo quanto é canto. Quando tinha festinha de igreja 'empelotava' degente. Vinha de carro, vinha de cavalo, a pé, um 'disparate'". (Euclides Serafim Vieira- Distrito de São Luiz)

"Os mineiros faziam todo ano a novena de Nossa Senhora de Aparecida.Cada ano, era em uma casa. Ficava tudo bem enfeitado e cada um trazia um prato decomida diferente". (Maria Inez Maziero - Distrito de São Luiz)

"Festa sempre tinha, festa aqui, naquela época, era o que mais funcionava,porque corria dinheiro. Era festinha comum. Ali na praça, eles faziam uma barraquinha,colocavam uma música e as coisas pra vender e dava muito dinheiro.Eles faturavambem. Vendiam de tudo: comida, porco, galinha. Hoje, só tem festa uma vez por ano, afamosa 'Festa do Milho'.

A comida não era igual hoje. Eu nunca passei necessidade de comida, mashoje é melhor. Naquele tempo era complicado. Nem quando a gente tinha dinheiro, eradifícil de achar o que comprar. Sempre tinha os botecos aqui, mas era tudo coisasimples. Tinha aquele negócio de 'pesar por quilo'. A gente ia só até o balcão e tinhaque pedir de lá mesmo. O dono tinha uma balancinha lá pra dentro, a gente pedia umquilo de arroz, de feijão e ele pesava do jeito dele. Não dava nem pra conferir". (DeusdeteBento da Silva - Distrito de Paiquerê)

Idazílio Paduã "abanando" café - Distrito de Maravilha

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"Meu marido organizava asfestas da igreja. Sempre tinha muitafesta por aqui". (Olga de CarvalhoDutra - Distrito de São Luiz)

"As festas eram muito boni-tas. Tinha um coretinho onde gritavamo leilão". (Maria Augusta Moraes - Dis-trito de São Luiz)

"Antigamente, tinha muitafesta aqui: festa da igreja, bailes e quer-messes". (Antonio de Freitas Rocha -

Distrito de Irerê)

"Tinha um coretinho onde a gente fazia festas das santas e leilão para arrema-tar prenda. As prendas eram pedidas nas casas e as pessoas davam doce, pipoca, frango,garrote. Então, erguiam as prendas, no coreto, para as pessoas colocarem preço.

Nas festas, tinham muitas brincadeiras. Uma delas era a do coelho, onde agente colocava várias casinhas de madeira com números encarrilhadas com o coelhopreso entre elas. Depois, cada um comprava um número e a casinha onde o coelhoentrava era o número vencedor". (Maria Aparecida Lourenço - Distrito de Irerê)

"Festa, tinha muito. Na igre-ja, tinha uma festa por mês. Tinha mo-vimento, tinha bastante gente. Eles fa-ziam leilão, faziam barraquinhas nopátio da igreja. No leilão, eles coloca-vam prenda pro povo arrematar. A pri-meira mulher minha saía nos sítios aí,pra pedir galinha, frango, essas coisas,pra usar de prenda nas festas.

Nas festas de casamento,eles faziam baile e dançavam a noiteinteira. Eu era sanfoneiro, tocava qual-quer qualidade de sanfona". (OscarBittencourt - Distrito de Paiquerê)

"Antigamente, saía muito casamento e todo casamento fazia festa. Aí, tinhacomida do bom e do melhor, brincava todo mundo, ninguém brigava. Era muito difícilsair uma briga. Eu mesmo, quando ia nos bailes, dançava bastante.

Naquele tempo, a gente fazia muita comida caseira, dependia pouco demercado. Engordava porco, matava porco, criava galinha. Arroz, muitas vezes, a gentemesmo limpava no pilão pra comer. Tudo era feito no fogão de lenha. O gosto dacomida fica melhor. A comida feita no fogão de lenha e na panela de ferro é maisgostosa. Hoje em dia, se não for no mercado, passa fome, naquele tempo, não". (Ge-raldo Mendes Martins - Distrito de Paiquerê)

Torrador de café, cedido por Idazílio Paduã -Distrito de Maravilha

Geraldo Mendes, 66 anos - Distrito de Paiquerê

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

"As festas aqui eram muito boas. Eramno salão da igreja, vinha a banda de Londrina, tinhacoreto. Coreto é uma casinha no meio da praça. Temuma escada pra subir e a banda tocava lá em cima.

O pessoal fazia churrasco, leitoa assada,tinha leilão. No leilão, a pessoa gritava: 'Quanto dá nis-so, quanto dá naquilo...'. O pessoal da roça que davaas prendas. Frango, cabrito, carneiro, leitoa". (Paiquerê)

"Antigamente, tinha muita festa aqui. Erana igreja, com alto-falante e tudo, era aquela'buniteza'. Tinha 'missão' de cinco dias, missa diretotodo dia". (Adelino Marques Neves - Distrito do Es-pírito Santo)

"Naquele tempo, tinha muita festa. Festade Reis, festa de fogueira, de tudo tinha festa. Às

vezes, tinha casamento, era baile de dia e de noite. Era gostoso".(Izolina Maria de Jesus Francisco - Dis trito do Espírito Santo)

"As festas que tinham eram melhores do que agora. Tinha muito fazendeiro,muito dinheiro que corria, agora não". (Virgínia Paumanhani Buscarini - Distrito de Warta)

Aparecida Dalto Delmonaco e LinoDelmonaco - cedida por TerezinhaDelmonaco de Castro - Distrito deSão Luiz

Plantação de café - Distrito de São Luiz

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

O COMÉRCIO...

"Quando entrei aqui, já existia uma vendinha,mas só tinha sal, açúcar e querosene".

(Idazílio Pádua)

"Quando cheguei aquiLerroville, só tinha três 'casas de ne-gócio'. Era um bar e dois comércios desecos e molhados, e mais nada. Nãotinha muita casa, também. Depoislotearam aqui e aí começaram a apa-recer mais casas e comércios, e foi au-mentando". (Waldemar Tornero - Dis-trito de Lerroville)

"Quando entrei aqui, já exis-tia uma vendinha, mas só tinha sal,açúcar e querosene.

Depois começou chegar, chegou o 'japonês' Makihara e outros. Eu mesmomontei uma casa de carne que existe até hoje. Agora, é meu filho que movimenta lá".(Idazílio Paduã - Distrito de Maravilha)

"Por aqui só existia duas casinhas, umafarmacinha e um comerciante velho que morava aqui,comércio de secos e molhados. Lá tinha de tudo e ascoisas eram vendidas por quilo. Depois, apareceu um den-tista aí, um dentista muito bom, o primeiro que chegou.Ele alugou uma casinha 'aparelhada' com a venda".(Euclides Serafim Vieira - Distrito de São Luiz)

"O comércio era até bom. Tinha loja, mer-cado. Tudo que eu precisava, tinha aqui, eu ia pra Lon-drina só pra andar à toa". (Antonio de Freitas Rocha -Distrito de Irerê)

"Tinha bastante comércio, açougue, farmá-cia, armazém e tinha uma pensão". (Deusdete Bentoda Silva - Distrito de Paiquerê)

"Aqui sempre teve venda. Vendiam detudo. Acolchoado, arroz, feijão, louça, sapato. Eu sóia pra Londrina, quando precisava comprar alguma coi-sa para as crianças". (Paiquerê)

Paisagem - Estrada para Maravilha

Moedor de café, cedido por IdazílioPaduã - Distrito de Maravilha

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HOJE....

"Hoje, a vida é melhor por muitas coisas, a gente tem mais recursos.Mas, antigamente, o povo era unido, não tinha tanta briga".

(Euclides Serafim Vieira)

"Aqui, a gente pode falarque não evoluiu pela idade que tem.Eu não penso em sair daqui, meu ma-rido e eu somos aposentados, temosum meio de viver, mas, pais de famílianão podem ficar aqui, tem que ir praoutro lugar. Não tem emprego.

Antigamente, tinha porque otrabalho na lavoura era braçal, na en-xada, na foice. Hoje, todo mundo temos maquinários. Tanto é que não temmais serviço de bóia-fria aqui. Os bói-

as-frias perecem. A gente, que tem um meio de viver, já passa apurado, imagina quemnão tem". (Cacilda Caetano Nogueira - Distrito de Lerroville)

"Aqui, tinha muitos habitantes, bem mais que agora, mais até do que emTamarana. Diminuiu porque acabaram os cafezais. A geada queimou os cafezais. Osproprietários não quiseram mais plantar café e, aí,o povo foi mudando tudo, acabou oemprego". (Waldemar Tornero - Distrito de Lerroville)

"Não tem emprego aqui. Nós lutamos muito pra conseguir ônibus circular, eagora eles vão cheios de pessoas que vão trabalhar na cidade. Nós, aqui, temos pou-ca ajuda, sempre foi assim". (Maria Manrique Massoni - Distrito de Lerroville)

Distrito de Irerê

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

"Hoje, a vida é melhor por muitas coisas. Agente tem mais recursos. Mas, antigamente, o povoera unido, não tinha tanta briga. A gente entrava nomeio de uma comunidade, sem medo de nada, o povonão tinha maldade. Hoje, a gente tem medo de tudo.

Sofri muito nesse lugar. Mas, graças aDeus, estou feliz hoje. Consegui alguma coisa. Nãoganhei grande fortuna, mas vivo no que é meu. Tra-balho, meus filhos, também. A gente vive feliz porisso". (Idazílio Paduã - Distrito de Maravilha)

"Depois que acabou esse negócio de'colonho', aqui acabou, se acabou tudo. Acabou oserviço porque acabou todo o café. Só tem uns pezi-nhos aqui e ali. Depois que começou a chegar ostratores, não ocupava gente mais, e aí, aqui ,'zan-gou' muito. Se não tivesse parado o serviço de'colonho', aqui não ia ter lugar mais pra construircasa". ( Euclides Serafim Vieira - Distrito de São Luiz )

"Era o café, o algodão e o rami que garantia, mas acabou tudo. Eles foramarrancando o café e já fazendo a lavoura de soja. Começou a entrar o maquinário e aífoi tirando a mão de obra do pessoal, e hoje acabou mesmo. A maioria dos moradores,hoje, trabalha na cidade. Aqui tem mais ou menos uns dez, doze horário de ônibus pordia, mas todos eles são um sofrimento aqui no Distrito, tudo cheio do pessoal aqui dosítio que trabalha na cidade. De manhã e na parte da tarde, dá até medo da genteandar. Porque aqui não tem o que fazer né, não tem emprego". (Deusdete Bento daSilva - Distrito de Paiquerê)

"Mudou pouca coisa de lá pra cá. Naque-le tempo, ainda era melhor, porque tinha muita influ-ência do café. De uns anos pra cá, diminuiu bastan-te os moradores. Mudou muita gente pra cidade".(Geraldo Mendes Martins - Distrito de Paiquerê)

"Hoje, a maioria das pessoas mudou pracidade porque, na roça, não tem mais como viver.Meu marido trabalha na roça. Tem ano que dá beme tem ano que a gente só fica devendo". (Paiquerê)

"Agora, acabou aquela alegria. Agora, opovo só pensa em trabalhar, assistir uma televisãozinhae pronto. Antigamente, não tinha essa loucura que temhoje. Hoje, a gente tem medo até da sombra. Antes, agente podia sair a hora que fosse por dentro do mato.Ia pra baile, voltava uma, duas horas da manhã a pé.Não tinha perigo. Fora as cobras, não tinha perigo.Hoje, a gente tem medo até de abrir a porta de noite,

se alguém chama". (Izolina Maria de Jesus Francisco - Distrito do Espírito Santo)

Maria Manrique Massoni, 66 anos -Distrito de Lerroville

Moedor de café, cedido por WaldemarTornero - Distrito de Lerroville

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rural

Colcha de retalhos, mala e rádio Vitrola e lampião

Fogão de barro, moedor etorrador de café

Utensílios de cozinha

REFERÊNCIA

SIMAN, Lana Mara de Castro. A temporalidade histórica como categoriacentral do pensamento histórico: desafios para o ensino e a aprendizagem. In: ROSSI,Vera Lúcia Sabongi de; ZAMBONI, Ernesta. Quanto tempo o tempo tem? Campinas:Alínea, 2003.

ANEXOSOFICINA DE LANÇAMENTO

A oficina de lançamento do "Projeto Tempo de Lembrar, Tempo de Apren-der: Memórias da Cidade - Distritos Rurais", aconteceu em 21 de maio de 2009, noDistrito de São Luiz.

Essa oficina consistiu no encontro entre idosos, residentes no distrito, ecrianças da 3° série da Escola Municipal Francisco Aquino Toledo. As duas geraçõespuderam interagir em um cenário criado pelos idosos do grupo de convivência e volun-tários da comunidade, que se empenharam para reproduzir, no espaço onde o grupose reúne, cenas do cotidiano rural.

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Tempo de Lembrar, Tempo de Aprender: Memórias da Cidade - Zona Rual

Machado e pilão Forno de barro

Antonio Alves de Oliveira Crianças da 3° série da Escola MunicipalFrancisco Aquino Toledo

Cozinha da roça Ferramentas

Chuveiro feito com latão eretratos de família

Ferro de passar e relógios