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CADERNO CRH, Salvador, v. 26, n. 68, p. 233-252, Maio/Ago. 2013 233 Roberto Véras de Oliveira SUAPE EM CONSTRUÇÃO, PEÕES EM LUTA: o novo desenvolvimento e os conflitos do trabalho 1 Roberto Véras de Oliveira * DOSSIÊ Este artigo discute, pela ótica do trabalho e de seus conflitos, a emergência de uma nova agenda de desenvolvimento no Brasil. Tem como foco as revoltas e greves dos trabalhadores que atuam na construção de dois dos principais empreendimentos do Complexo Industrial Portuário de Suape, a Refinaria Abreu e Lima e a Petroquímica Suape, durante os anos de 2011 e 2012. Esta abordagem pretende apreender os processos desencadeados pelos conflitos, mediações e nego- ciações e o que tem estado em disputa, com as demandas dos trabalhadores e os discursos e práticas governamentais, empresariais e sindicais. Perguntamo-nos se essas mobilizações, além de trazerem ganhos imediatos para os trabalhadores, têm permitido que estes se façam reco- nhecer como legítimos portadores de demandas sociais. E em que medida tais demandas vêm sendo não só objeto de denúncia pública, mas, também, um modo de problematizar os termos que dão sustentação ao novo discurso desenvolvimentista. Palavras-chave: Desenvolvimento. Trabalho. Sindicalismo. Construção civil. Suape. INTRODUÇÃO Este artigo discute, pela ótica do trabalho e de seus conflitos, a emergência de uma nova agenda de desenvolvimento no Brasil. Tem como foco as revol- tas e greves dos trabalhadores que atuam na constru- ção de dois dos principais empreendimentos do Complexo Industrial Portuário de Suape, a Refinaria Abreu e Lima e a Petroquímica Suape, durante os anos de 2011 e 2012. Busca problematizar, a partir deste caso, a reedição de uma construção prático discursiva de teor desenvolvimentista no País. O Complexo Industrial Portuário Governa- dor Eraldo Gueiros – Suape, ou CIPS, está situa- do na Região Metropolitana de Recife – RMR, 2 Litoral Sul de Pernambuco, nos municípios de Ipojuca e Cabo de Santo Agostinho, abrangendo uma área de 13,4 mil hectares. A partir da primei- ra edição do Programa de Aceleração do Cresci- mento – PAC, em 2007, se constituiu em um dos maiores polos de investimentos do país. Pernambuco vive um boom econômico, após um período de declínio. A economia regional es- teve, por décadas, sob forte impacto dos incenti- vos fiscais da Superintendência do Desenvolvimen- to do Nordeste – SUDENE. De 1963 a 1969, o es- tado foi o principal beneficiário dessa política, re- cebendo 36,9% dos incentivos (seguido da Bahia, com 32,8%). Tal participação caiu, entre 1970 a 1974, para 25,7% e, de 1975 a 1984, para 16,6%. Acompanhando a evolução dos investimentos in- centivados pela Sudene, o PIB estadual cresceu * Doutor em Sociologia. Professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba – UFPB – e membro do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPB – PPGS– e do Programa de Pós-Gra- duação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Campina Grande – PPGCS/UFCG. Av. Washington Luis, 268, apto 201, Bessa. Cep: 58035-340. João Pessoa – Paraíba – Brasil. [email protected] 1 Este artigo resulta de reflexões realizadas a partir do projeto “O novo desenvolvimentismo no Brasil visto a partir de suas implicações sociais no Nordeste”, desen- volvido no âmbito do Laboratório de Estudos e Pesqui- sas sobre Políticas Públicas e Trabalho – LAEPT/UFPB, em parceria com a Fundação Joaquim Nabuco – FUNDAJ e o Observatório PE – UFPE. Ao mesmo tempo em que agradeço as contribuições dos colegas, assumo toda res- ponsabilidade pelo seu conteúdo. Agradeço, ainda, as importantes contribuições dos pareceristas anônimos. 2 A RMR inclui os municípios de Abreu e Lima, Araçoiaba, Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Igarassu, Ipojuca, Itamaracá, Itapissuma, Jaboatão dos Guararapes, More- no, Olinda, Paulista, Recife e São Lourenço da Mata.

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SUAPE EM CONSTRUÇÃO, PEÕES EM LUTA: o novodesenvolvimento e os conflitos do trabalho1

Roberto Véras de Oliveira*

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Este artigo discute, pela ótica do trabalho e de seus conflitos, a emergência de uma nova agendade desenvolvimento no Brasil. Tem como foco as revoltas e greves dos trabalhadores que atuamna construção de dois dos principais empreendimentos do Complexo Industrial Portuário deSuape, a Refinaria Abreu e Lima e a Petroquímica Suape, durante os anos de 2011 e 2012. Estaabordagem pretende apreender os processos desencadeados pelos conflitos, mediações e nego-ciações e o que tem estado em disputa, com as demandas dos trabalhadores e os discursos epráticas governamentais, empresariais e sindicais. Perguntamo-nos se essas mobilizações, alémde trazerem ganhos imediatos para os trabalhadores, têm permitido que estes se façam reco-nhecer como legítimos portadores de demandas sociais. E em que medida tais demandas vêmsendo não só objeto de denúncia pública, mas, também, um modo de problematizar os termosque dão sustentação ao novo discurso desenvolvimentista.Palavras-chave: Desenvolvimento. Trabalho. Sindicalismo. Construção civil. Suape.

INTRODUÇÃO

Este artigo discute, pela ótica do trabalho e deseus conflitos, a emergência de uma nova agenda dedesenvolvimento no Brasil. Tem como foco as revol-tas e greves dos trabalhadores que atuam na constru-ção de dois dos principais empreendimentos doComplexo Industrial Portuário de Suape, a RefinariaAbreu e Lima e a Petroquímica Suape, durante osanos de 2011 e 2012. Busca problematizar, a partirdeste caso, a reedição de uma construção práticodiscursiva de teor desenvolvimentista no País.

O Complexo Industrial Portuário Governa-dor Eraldo Gueiros – Suape, ou CIPS, está situa-do na Região Metropolitana de Recife – RMR,2

Litoral Sul de Pernambuco, nos municípios deIpojuca e Cabo de Santo Agostinho, abrangendouma área de 13,4 mil hectares. A partir da primei-ra edição do Programa de Aceleração do Cresci-mento – PAC, em 2007, se constituiu em um dosmaiores polos de investimentos do país.

Pernambuco vive um boom econômico, apósum período de declínio. A economia regional es-teve, por décadas, sob forte impacto dos incenti-vos fiscais da Superintendência do Desenvolvimen-to do Nordeste – SUDENE. De 1963 a 1969, o es-tado foi o principal beneficiário dessa política, re-cebendo 36,9% dos incentivos (seguido da Bahia,com 32,8%). Tal participação caiu, entre 1970 a1974, para 25,7% e, de 1975 a 1984, para 16,6%.Acompanhando a evolução dos investimentos in-centivados pela Sudene, o PIB estadual cresceu

* Doutor em Sociologia. Professor do Departamento deCiências Sociais da Universidade Federal da Paraíba –UFPB – e membro do Programa de Pós-Graduação emSociologia da UFPB – PPGS– e do Programa de Pós-Gra-duação em Ciências Sociais da Universidade Federal deCampina Grande – PPGCS/UFCG.Av. Washington Luis, 268, apto 201, Bessa. Cep: 58035-340.João Pessoa – Paraíba – Brasil. [email protected]

1 Este artigo resulta de reflexões realizadas a partir doprojeto “O novo desenvolvimentismo no Brasil visto apartir de suas implicações sociais no Nordeste”, desen-volvido no âmbito do Laboratório de Estudos e Pesqui-sas sobre Políticas Públicas e Trabalho – LAEPT/UFPB,em parceria com a Fundação Joaquim Nabuco – FUNDAJe o Observatório PE – UFPE. Ao mesmo tempo em queagradeço as contribuições dos colegas, assumo toda res-ponsabilidade pelo seu conteúdo. Agradeço, ainda, asimportantes contribuições dos pareceristas anônimos.

2A RMR inclui os municípios de Abreu e Lima, Araçoiaba,Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Igarassu, Ipojuca,Itamaracá, Itapissuma, Jaboatão dos Guararapes, More-no, Olinda, Paulista, Recife e São Lourenço da Mata.

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10,6% ao ano de 1970 a 1975, 6,6% de 1975 a1980 e 2,4% de 1980 a 1985, invertendo sua rela-ção com o PIB regional (com médias anuais, res-pectivamente, de 10,2%, 7,2% e 4,4%). Após al-guma recuperação no final dos anos 1980,Pernambuco cresceu, na década de 1990, commédias anuais de 2,0% e o Nordeste, com 3,0%.Concorreu para tal evolução a exclusão do estadodo II Plano Nacional de Desenvolvimento – PND,lançado em 1975, o qual previu investimentos paraa Bahia (Pólo Petroquímico de Camaçari), Alagoase Sergipe (Complexo Cloroquímico), Maranhão(Pólo Minerometalúrgico) (Lima e Katz, 1993).

A proposta do Porto de Suape surgiu nosanos 1960, inspirando-se nos complexos indus-trial-portuários de Marseille-Fos, na França, e deKashima, no Japão (Suape/Governo Pernambuco,2010).3 Ainda durante os procedimentos prelimi-nares, em 1975 foi publicado um manifesto assi-nado por intelectuais pernambucanos, lideradospelo economista Clóvis Cavalcanti, em um protes-to (sobretudo de teor ambiental) à construção doporto,4 evidenciando a relevância pública que oprojeto já havia adquirido, assim como o seu cará-ter controverso (Cavalcanti, 2008). O processo, noentanto, seguiu. Em 1977, foi realizada a desapro-priação da área e foram iniciadas as obras deinfraestrutura (porto, sistema viário, abastecimen-to d’água, energia elétrica e telecomunicações). Em1978, foi formalizada a criação da empresa públicaestadual “com a finalidade de administrar a im-plantação do distrito industrial, o desenvolvimen-to das obras e a exploração das atividades portuá-rias” (Suape/Governo Pernambuco, 2010). Quantoàs comunidades locais, estabeleceu-se um mistode esperança e medo, conforme apurou o relatórioque deu suporte ao Plano Diretor de preservação e

revitalização do Cabo de Santo Agostinho, Vila de

Nazareth, povoados de Baibu e Suape, realizadopor Sena Caldas & Polito Arquitetos AssociadosLtda (1980, apud Rocha, 2000).

O Complexo de Suape começou a funcio-nar com a incorporação, em 1986, da BR Distri-buidora, Shell, Texaco e Esso, oriundas do Portodo Recife. Em 2005, foi anunciado o projeto daRefinaria Abreu e Lima, produto, inicialmente, deuma negociação entre a Petrobras e a Petróleo deVenezuela S.A. – PDVSA. Conforme Santos (2012),até esse momento, “Suape se caracterizaria porinvestimentos no porto e na instalação de empre-sas de médio porte, com baixa complexidadetecnológica, pouca exigência de qualificação pro-fissional e limitada capacidade de irradiação naeconomia regional”. A partir de 2007, com o Pro-grama de Aceleração do Crescimento - PAC, o Com-plexo passou a atrair grandes investimentos pú-blicos e privados, convertendo-se, desde então, comseu entorno, em um gigantesco “canteiro de obras”.Os investimentos públicos no CIPS passaram deR$ 155 milhões (entre 1995 e 1998) para R$ 136milhões (1999 a 2002) e R$ 147,6 milhões (2003 a2006); enquanto, entre 2007 e 2010, pularam paraR$ 1,46 bilhões. Quanto aos investimentos priva-dos, totalizaram US$ 2,2 bilhões até 2006; sendoque, de 2007 a 2010, reuniram US$ 17 bilhões(Suape/Governo Pernambuco, 2010).

O Complexo, na atualidade, compreendemais de 100 empresas instaladas e dezenas de ou-tras em fase de instalação. Alguns destaques: Refi-naria Abreu e Lima e Petroquímica Suape (Petrobrás);Estaleiro Atlântico Sul – EAS; Energética Suape(termelétrica); Impsa Wind Power (fabricação de ge-radores eólicos); Bunge (refinaria de óleos vegetais,fabricação de margarinas e moinho de trigo); TeconSuape (logística do porto). Oficialmente, estima-seem 25 mil o número de empregos diretos projetadospara as empresas instaladas e em instalação (Suape/Governo Pernambuco, 2010). A Refinaria represen-ta, de longe, o maior investimento, estimado emUS$ 13 bilhões. A previsão oficial é que gerará 1,5mil empregos diretos e algo em torno de 130 milindiretos. As obras de construção tiveram inícioem 2007, com previsão inicial de conclusão para

3 A ideia originou-se de um estudo realizado pelo Padrefrancês Louis Lebret, para a Comissão de Desenvolvi-mento Econômico de Pernambuco, o qual foi publicadoem Lebret (1955). Isso sugere o quanto o projeto Suape,desde suas mais remotas origens, se encontra associadoao pensamento e às políticas desenvolvimentistas.

4 O “Manifesto Suape” foi publicado no semanário Jornalda Cidade (ano II, n. 24, 6, 12/4/75). Encontra-se dispo-nível em: http://cloviscavalcanti.blogspot.com.br/p/ma-nifesto-suape.html (Acesso em 25/06/2012).

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2011, sendo adiada para 2012 e, depois, para 2013.O número de trabalhadores envolvidos na cons-trução da Refinaria e da Petroquímica foi avaliadoem cerca de 50 mil no final de 2012 (Santos, 2012).

Para Moutinho et al (2011), o bom momen-to da economia pernambucana resultou, sobretu-do, de definições estratégicas de desenvolvimentonacional e regional, materializadas nos grandesinvestimentos do PAC, nos quais se destacam, alémde Suape: a Ferrovia Nova Transnordestina, aTransposição do Rio São Francisco, o PóloFarmacoquímico. Acrescente-se a esses: a fábricada Fiat, a Cidade da Copa, entre outros.5 Com isso,o projeto Suape adquiriu peso nas agendas doGoverno do Estado e dos governos municipais doentorno, ganhou posição de destaque na mídia locale no imaginário dos pernambucanos. No discursode Eduardo Campos, o tom é sempre eufórico e oconteúdo, desenvolvimentista:

Pernambuco vive um momento muito especialem sua economia. Investimentos públicos e pri-vados estão tirando do papel empreendimentosimportantes, que transformam a sociedade e avida dos pernambucanos de uma maneira nuncavista em sua história [...] Nesse contexto,Pernambuco, que é destaque no País, centralizaas atenções dos investidores, sendo Suape a molapropulsora desse desenvolvimento (Suape/Gover-no Pernambuco, 2010).

As críticas às consequências ambientais esociais do projeto estiveram presentes desde assuas origens (Cavalcanti, 2008). Contudo, o em-preendimento seguiu. Especialmente, ganhou mai-or legitimidade e força quando da retomada de umaagenda desenvolvimentista no país e na região. Dealgum modo, se estabeleceu incorporando elemen-tos da crítica, em um esforço de justificação.6 Foi

assim que o novo Plano Diretor Suape 2030, pu-blicado em 2011, buscou compatibilizar suas ra-zões econômicas (portuário-industriais) com de-mandas ambientais, culturais, sociais. Em desta-que, incorporou uma ampliação da Zona de Prote-ção Ecológica, de 48% para 59% da área total (Fo-lha de Pernambuco, 30/09/2011). O adjetivo “sus-tentável” ganhou importância crescente nos dis-cursos dos agentes estratégicos de Suape. Em maiode 2008, empresários e políticos se reuniram nasede da Federação das Indústrias de Pernambucopara tratar do tema do “Desenvolvimento Susten-tável do Território Estratégico de Suape”. Na oca-sião, o BNDES apresentou um projeto para a re-gião, prevendo apoio a ações em: controle urbano-ambiental; tratamento de resíduos sólidos; articu-lação de arranjos produtivos locais; sistema viá-rio; transporte público; educação; qualificação pro-fissional; preservação do patrimônio histórico, tu-rístico e cultural (JC,7 17/05/2008). Entretanto, oconvênio só foi firmado em setembro de 2010, coma denominação de Programa Especial de Controle

Urbano-Ambiental no Território Estratégico de

Suape, com recursos não reembolsáveis de R$ 10,9milhões. O representante do BNDES emPernambuco, Paulo Guimarães, em declaração aoJC (12/08/2011), deixou escapar um elemento decompensação nessa iniciativa: “temos uma grandepreocupação com o desenvolvimento social do ter-ritório, porque o banco financiou os principaisgrandes empreendimentos instalados em Suape”.Daí derivou o Programa Suape Sustentável, lança-do em 2011, envolvendo os gestores do CIPS, oitosecretarias de estado, prefeituras, as empresas ins-taladas em Suape, o BNDES, o Banco do Nordes-te, ente outros. Declarou-se, com o referido Pro-

5 As conexões entre a trajetória histórica do ComplexoSuape e as economias estadual, regional e nacional, so-bretudo no que se refere ao seu momento atual, com osinvestimentos do PAC em Pernambuco, no Nordeste eno país, assim como com os investimentos públicos,privados e mistos, impulsionados a partir de então, nãopodem ser menosprezados. Trata-se da atualização dainserção do Nordeste e de Pernambuco na divisão regio-nal do trabalho, que se consumou com forte base naimplementação do projeto da Sudene (Oliveira, 1981).

6 Usamos o termo em um sentido próximo ao atribuídopor Boltanski e Chiapello (2009, p. 52-53): “Já lembra-mos a importância que tem, para o capitalismo, a possi-bilidade de apoiar-se num aparato justificativo adaptado

às formas concretas assumidas pela acumulação do ca-pital em determinada época, o que significa que o espíri-to do capitalismo incorpora outros esquemas, que nãoos herdados da teoria econômica (...) Mas o capitalismonão pode encontrar em si mesmo nenhum recurso parafundamentar motivos de engajamento e, em especial,para formular argumentos orientados para a exigênciade justiça (...) A justificação do capitalismo, portanto,supõe referência a construtos de outra ordem, da qualderivam exigências completamente diferentes daquelasimpostas pela busca do lucro”.

7 Utilizamos as siglas “JC”, para Jornal do Commercio, e“DP”, para Diário de Pernambuco.

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grama, o propósito de transformar o ComplexoSuape e seu Território Estratégico em um modelode “desenvolvimento sustentável”, “equilibrandoo crescimento econômico, a inclusão social e apreservação do meio ambiente” (http://www.suape.pe.gov.br).

Um esforço de justificação das atuais polí-ticas de desenvolvimento parece estabelecido noconstruto discursivo dos agentes estratégicos deSuape, o que não tem ocorrido senão sob uma con-traditória composição entre racionalidades de teoreconômico, social e ambiental. Quanto ao lugardo trabalho no novo discurso desenvolvimentistaem Pernambuco e Suape, ao que tudo indica, temse fixado em dois pontos principais: na capacida-de dos empreendimentos gerarem empregos e nocrescente desafio de qualificar e incorporar os tra-balhadores pernambucanos em mão de obra apta aocupar os agora exigentes postos de trabalho. Umadeclaração de Eduardo Campos ao JC (01/01/2012),no início do seu segundo mandato, é ilustrativaquanto a isso:

Tivemos um tempo em que tínhamos pessoas pre-paradas e não tínhamos oportunidades. Isso eraconstrangedor. Agora, em cinco anos se gerou quase500 mil empregos, o desemprego caiu [...] As opor-tunidades estão chegando e os pernambucanosestão entrando nessas oportunidades. Vamos leros números como eles são! Nós tínhamos 15% dedesemprego. Reduzimos dois terços em cincoanos. Estamos fazendo um grande esforço na edu-cação, que não se muda de um ano para o outro,mas sim de uma geração para outra.

Entretanto, a eclosão de uma onda de con-flitos, protagonizada pelos peões8 dos canteiros deobra de Suape, realçou outros aspectos, produzin-do deslocamentos nas dinâmicas das relações detrabalho, com repercussões econômicas e políti-cas. Especialmente a partir de 2011, revoltas, pa-ralisações e greves, acompanhadas por confusos etensos processos de negociação social e sindical,envolvendo os próprios peões, sindicatos, empre-

sas, governos estadual e municipais, MinistérioPúblico do Trabalho – MPT, Ministério do Traba-lho e Emprego, Justiça do Trabalho, órgãos demídia, entre outros, vêm marcando fortemente acena da região.

Uma abordagem com foco em tais conflitosnos permitirá apreender os processos desencade-ados (conflitos, mediações e negociações) e o quetem estado em disputa em tais processos (com asdemandas dos trabalhadores e os discursos e prá-ticas governamentais, empresariais e sindicais).Perguntamo-nos se, com essas mobilizações, paraalém de estarem conseguindo trazer ganhos ime-diatos para os trabalhadores, estes têm sido capa-zes de se fazer reconhecer9 como legítimos porta-dores de demandas sociais. Em que medida taisdemandas vêm sendo não só objeto de denúnciapública, mas, também, de alguma elaboração, demodo a problematizar os termos com base nos quaisemergiu uma nova perspectiva desenvolvimentistaem Pernambuco e no país?10

8 Não se sabe, precisamente, onde e quando a expressão“peão” passou a ser usada, no Brasil, com o sentido deoperário pouco ou sem qualificação. Um dos primeirosestudos a incorporar o termo com tal conotação foi o deRainha (1980).

9 Aqui, usamos a noção em um sentido mais próximo deNancy Fraser (2008), em sua polêmica com Axel Honneth,a qual prefere tratar “reconhecimento” (dimensão cultu-ral, simbólica) em associação com “redistribuição” (di-mensão social). Quanto à situação que aqui analisamos,realçamos o quão imbricados, embora distintos, se en-contram esses dois movimentos.

10 Tanto quanto no contexto de implementação do proje-to da Sudene, também agora, com o PAC e outras inici-ativas de políticas de desenvolvimento do Governo Fe-deral, a dinâmica econômica do Nordeste e de Pernambucose encontram sob fortes vínculos com tais políticas.Mesmo se efetivando uma dissidência na coalizão deforças que dá sustentação ao Governo Dilma,protagonizada pelo Governador de Pernambuco, Eduar-do Campos (questão essa que não será tratada aqui),consideramos que a orientação desenvolvimentista nãosó foi marcante no seu primeiro mandato (embaladopela proximidade política com Lula), como essa conti-nua sendo uma referência no seu mandato atual (quan-do o mesmo tem mantido certa ambiguidade entre oapoio ao Governo Dilma e a assunção de uma posição deoposição). As obras do PAC, os projetos “estruturantes”,os investimentos em Suape, os vinculam fortemente aum realce desenvolvimentista, não obstante certasnuances diferenciadoras entre ambos os projetos políti-cos e as possíveis divergências que venham a serexplicitadas entre seus expoentes (veja-se, por exemplo,polêmica entre Eduardo Campos e o Governo Dilma,quando da publicação da Medida Provisória 595, conhe-cida como MP dos Portos, em dezembro de 2012, tidapara o primeiro como ameaça de perda de autonomia doGoverno pernambucano sobre o Porto de Suape (JC, 26/03/2013). A análise das diferenciações práticas ediscursivas aí implicadas certamente será de muita im-portância para o aprofundamento dessa reflexão.

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A VOLTA DO DESENVOLVIMENTISMO: agen-da e debate

O emblema maior do novo discursodesenvolvimentista do Governo Federal tem sidoo PAC, lançado em 2007. O Governo Lula passoua incorporar o referencial do papel indutor do Es-tado com vistas ao crescimento econômico, real-çando, ao mesmo tempo, o seu compromisso coma geração de emprego e renda e a estabilidademacroeconômica (Pêgo; Campos Neto, 2008).Objetivou-se, por meio de investimentos, princi-palmente em infraestrutura, aumentar a produti-vidade das empresas, estimular investimentos pri-vados, gerar emprego e renda e reduzir as desi-gualdades regionais. Até 2010, segundo dados ofi-ciais, foram investidos mais de R$ 600 bilhões,oriundos do Governo Federal, de empresas estatais edo setor privado, com destaque para os setores deenergia, transporte, habitação, saneamento, recursoshídricos, além de programas de impacto social, comoo “Minha Casa Minha Vida” (habitação) e o “Luzpara Todos” (distribuição de energia elétrica). A par-ticipação do investimento total no PIB passou de16,4%, em 2006, para 18,4%, em 2010 (Brasil, 2010).Em 2010, foi lançado o PAC 2, redefinindo, mas,sobretudo, confirmando, os eixos estruturantes dasua primeira edição (Brasil, 2012). Para Batista Jr.(2007), não obstante as críticas, ocorreu “uma mu-dança na orientação da política econômica”, ondeessa “pode ser excessivamente cautelosa ou lenta,mas ela é significativa. O governo Lula está migran-do, aos poucos, para o desenvolvimentismo, talvezum desenvolvimentismo ‘light’”.

Os indicadores econômicos e sociais que, apartir de 2004, passaram a apresentar tendênciassistematicamente positivas, podem ser creditadosduplamente ao novo dinamismo econômico e àsnovas condições políticas, nas quais se estabele-ceu um certo patamar de lutas salariais e sindi-cais. Em balanço recente, Krein et al (2012, p. 119)admitem que, na Era Lula, não só devem ser com-putados “os impactos positivos do aumento pro-gressivo do dinamismo econômico sobre o merca-do e as relações de trabalho no Brasil”, mas, tam-

bém, é preciso que sejam destacadas que “as polí-ticas públicas e as lutas e conquistas do movimen-to sindical foram decisivas para acrescentarmelhorias ao mercado de trabalho brasileiro”. Es-pecialmente para os segmentos ligados à CentralÚnica dos Trabalhadores – CUT, constituída sobrelações históricas com o Partido dos Trabalhado-res, prevaleceu, nesse momento, a adoção de umaestratégia ambivalente, que reforçou uma situaçãojá presente nos anos 1990: a perda de protagonismopolítico do sindicalismo no cenário nacional, aomesmo tempo em que o mesmo se manteve pre-sente e atuante (Araújo; Véras de Oliveira, 2011).

Ao lado da emergência de uma nova agendae um novo discurso político orientado ao desen-volvimento, ressurgiu um debate acadêmico sobreo tema. O primeiro a utilizar a expressão “novodesenvolvimentismo” foi Bresser-Pereira (2003),para quem o fracasso da “ortodoxia neoliberal” emgarantir estabilização macroeconômica e crescimen-to coloca a possibilidade de uma nova política eco-nômica, na América Latina. Em contraste com o“populismo da esquerda burocrática e sindical”(herdeira do nacional desenvolvimentismo), pro-põe uma estratégia nacional de desenvolvimentosem protecionismo e com rigor fiscal e monetário,baseada em uma indústria competitiva, voltada àexportação. Requer Estado e mercado fortes, polí-ticas públicas permanentes e flexibilização das re-lações de trabalho (Bresser-Pereira, 2006). Sicsú et

al (2007) apostam no fortalecimento do“empresariado nacional” como “núcleo endógeno”do desenvolvimento, associado a um “Estado for-te” e a um “pacto nacionalista”, mas sem que setrate de um retorno à política de substituição deimportações, ao protecionismo e ao Estado empre-sa. Atribuem maior ênfase, comparativamente aBresser-Pereira, à compatibilização entre crescimen-to econômico e equidade social.

Ridenti (2009) questiona a pertinência do re-torno do desenvolvimentismo, tão criticado no pas-sado. Lembra que, sob tal referência, omitiram-se ascontradições de classes, ao priorizarem-se as contra-dições entre nações. Por isso, é preciso não deixar dese perguntar: a quem serve o desenvolvimento? Isso,

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sob pena de serem reeditados os mesmos problemasdo passado. Quanto a Fiori (2012a e 2012b), pergun-ta-se: por que o “desenvolvimentismo de esquer-da”, ressurgido recentemente, estreitou-se tanto noseu “horizonte utópico”, tornando-se uma “ideo-logia tecnocrática”, sem capacidade de mobilizaçãosocial, não sendo, também, capaz de construir umanova base teórica? Na sua crítica, o autor argumentaque a “Escola Campineira”, embora surgida de umacrítica ao paradigma cepalino, teria sido sufocada,mais recentemente, com a crise socialista e a ondaneoliberal, tendo perdido sua capacidade teórica eseu conteúdo político. Com a retomada do discursodesenvolvimentista, restaria a sensação de um “hori-zonte utópico” estreito, sem poder de mobilização.Em resposta a Luis Fiori, Carneiro (2012) propõeque o “novo desenvolvimentismo” é uma formula-ção da equipe da Fundação Getúlio Vargas – FGV/SP, que privilegia as políticas macroeconômicas, su-bordinando a essas as políticas sociais,condicionando ganhos salariais à elevação da pro-dutividade. Enquanto o “desenvolvimentismo deesquerda”, centrado na UNICAMP (“EscolaCampineira”) e na UFRJ, priorizaria a dimensãosocial do desenvolvimento.

Boschi (2011), discutindo o retorno dointervencionismo estatal na América Latina, insis-te na dimensão social como fator de desenvolvi-mento e no papel estratégico do Estado como seuindutor e garantidor de inclusão social. Coloca,assim, em evidência a política, o projeto nacional,a necessidade de constituição de coalizões de apoioa um novo compromisso desenvolvimentista. Tam-bém para Pochmann (2012), a condição para umsalto no desenvolvimento da América Latina é aconstituição de uma “nova maioria política”. So-bre o Brasil, haveria duas alternativas: uma orien-tada à exportação de commodities e a outra, a in-vestimentos em valor agregado e em conhecimen-to. Apenas com investimentos nesta direção seriapossível superar o subdesenvolvimento.

Para outros, a retomada de políticas de de-senvolvimento justifica um novo ciclo de pesqui-sas sobre o tema. Eli Diniz (2011) destaca que, nomundo, vem ressurgindo um pensamento crítico

ao liberalismo, assim como retorna a referência dodesenvolvimento, com nova ênfase no papel doEstado, nas liberdades substantivas (Amartya Sen),na questão ambiental. Quanto ao Brasil, o cresci-mento e o emprego ganham importância. Observa,ainda, que, no debate atual, embora com diferen-ças, em geral se busca associar mercado e Estado,o econômico e o social, ganhos salariais e elevaçãoda produtividade. Mas admite que ainda não seconstituiu uma articulação de forças capaz de darsustentação a um projeto desenvolvimentista. Draibee Riesco (2011) propõem a adequação dos referenciaisanalíticos ao estudo das mudanças recentes nas po-líticas econômicas e sociais na América Latina, paramelhor se avaliar sobre se está em gestação um novodesenvolvimentismo na região. Formulam a noçãode Estado Latino-Americano Desenvolvimentista de

Bem Estar – ELADBES, visando realçar a relação en-tre economia e política social. Sugerem que as atuaispolíticas desenvolvimentistas estariam repondo asarticulações entre os dois âmbitos. Acrescentam,ainda, que, embora haja sinais de esgotamento dociclo neoliberal, não parece se tratar de mero retor-no ao desenvolvimentismo, nem simplesreafirmação do neoliberalismo. O rumo a seguirserá decidido no campo da política. Kerstenetzky(2011) também evidencia a relação entre desenvol-vimento e equidade. Após constatar umasegmentação entre tais termos, propõe a sua conci-liação, opondo-se ao argumento de que a possibili-dade de construção de um Estado do bem estar socialrequer a existência prévia de desenvolvimento e deque o gasto social é, por si só, economicamenteineficiente. Defende como condição para tanto que aspolíticas sociais sejam economicamente orientadas eas políticas econômicas, socialmente orientadas.

O debate, aqui brevemente mapeado, alimen-ta-se de uma agenda que vem se estabelecendo, noBrasil e na América Latina, sob um novo discursodesenvolvimentista. As diversas posições em ge-ral reconhecem o retorno a um papel mais centraldo Estado na economia. Muitas vezes, sugeremalguma compatibilização entre desenvolvimento eequidade. Mas o modo de conceber essa relação éum aspecto de importante diferenciação entre as

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perspectivas adotadas. Destacar o lugar do social

requer dar um realce especial ao momento da polí-

tica, assim como tomar esta para além da discus-são sobre o papel do Estado. Para Boschi (2011, p.16), “as diversas políticas que se busca colocar emprática mobilizam atores e interesses que enfren-tam um jogo de estratégias, uma dinâmica que, pornatureza, é incerta”. Pôr em evidência a dimensãosocial do desenvolvimento requer tratar comcentralidade a problemática do trabalho referida àquestão da cidadania. Com Ivo (2012, p. 206):

Da minha perspectiva, considero que avaliar arelevância da agenda social do desenvolvimentohoje implica analisar um padrão decisivo do Es-tado na distribuição e no enfrentamento da di-mensão estruturante e qualificada de inserçãopelo mercado de trabalho e na proteção susten-tada em direitos sociais, ou na regulação das re-lações não mercantis (base de que tratam as po-líticas sociais).

Para os estudiosos do trabalho, por seu lado,está posto o desafio de levar em conta as implica-ções da retomada das políticas de desenvolvimen-to quanto às condições, relações e ações coletivaslaborais. É o que, por exemplo, se traduz emRamalho e Fortes (2012, p. 09), quando se detêmsobre as experiências de desenvolvimento da Bai-xada e Sul fluminense, sob a perspectiva de “pen-sar as regiões como espaços sociais e históricos,com organizações políticas e identidades própri-as, buscando nas particularidades regionais ele-mentos que possam influenciar na construção denovos projetos de desenvolvimento e seus impac-tos sociais e econômicos”. Entra, aqui, o elementodo território. A abordagem desses espaços regio-nais se faz com um foco nas questões do trabalho,sob a referência dos seus nexos com os modelos dedesenvolvimento implementados no país ao longodo século XX e na passagem para o século XXI:

[...] se, na era nacional-desenvolvimentista, o tra-balho assumiu um papel central na constituiçãode identidades coletivas e formas de participa-ção política, como repensar a articulação entreesses elementos quando se retoma o debate so-bre o desenvolvimento em um novo contexto?(Idem, p. 10).

É nesse registro que pretendemos discutirSuape (considerando seus vínculos com a novaagenda e discurso desenvolvimentistas emPernambuco e no país) pela ótica dos conflitos dotrabalho que lá vêm tendo lugar mais recentemen-te (com suas implicações recíprocas frente a talagenda e discurso).

TRABALHO E TRABALHADORES NA CONS-TRUÇÃO CIVIL EM SUAPE

Evidências de um desenvolvimento contraditório

É evidente o excelente momento da econo-mia pernambucana. Enquanto o PIB do Brasil cres-ceu, de 2005 a 2012, a taxas anuais de 2,9%, 3,8%,5,4%, 5,1%, -0,2%, 7,5%, 2,7% e 0,9%, respecti-vamente; o de Pernambuco, na mesma sequênciade anos, teve um melhor desempenho: 4,2%, 5,1%,5,4%, 5,3%, 5,2%, 9,3%, 4,5% e 2,3% (IBGE, 2005a 2012). Tal performance se reflete nos indicado-res econômicos de Ipojuca e Cabo de Santo Agos-tinho, graças a Suape. Em 2003, Ipojuca já detin-ha o quarto maior PIB de Pernambuco (5,9%), comCabo em terceiro (6,2%), Jaboatão em segundo(8,5%) e Recife em primeiro (33,3%). Em 2005, oPIB per capita de Ipojuca se tornou o maior doEstado, representando mais de 4,6 vezes o da ci-dade de Recife. Em 2007, o PIB de Ipojuca passoua terceiro, invertendo sua posição com Cabo. Em2010, chega ao segundo lugar (com 9,6% do PIBestadual), alcançando um PIB per capita de 5,8vezes o da capital (IBGE, 2003 a 2010). O cresci-mento populacional em Cabo e Ipojuca tambémteve evolução expressiva, sendo de 21,0% e 36,0%,respectivamente, em 2000 e 2010; enquanto o Nor-deste e Pernambuco cresceram no mesmo perío-do, correspondentemente, 11,1% e 10,9% (IBGE,2000 e 2010).

Entretanto, a problemática social persiste.Enquanto Ipojuca registrou um PIB per capita, em2010, a preços correntes, de R$ 112.924,25, o va-

lor do rendimento nominal médio mensal per capita

dos domicílios particulares permanentes, para o

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mesmo ano, ficou em R$ 416,18 – abaixo do Salá-rio Mínimo, que, na época, era de R$ 510,00 (IBGE,2010). Em Ipojuca, a taxa de analfabetismo, embo-ra tenha caído, entre 2000 e 2010, de 28,7% para19,2%, manteve-se acima das verificadas paraPernambuco, 18,0%, Nordeste, 19,1%, e Brasil,9,6% (IBGE, 2000 e 2010). Uma já comprometidainfraestrutura urbana e de serviços passou a sofreruma forte pressão com o extraordinário fluxo mi-gratório para a região (Monteiro, 2011).

Nessa fase de implantação dos maiores em-preendimentos de Suape, ganham destaque osimpactos da construção civil nas dinâmicas eco-nômica e social da região.

Emprego na RMR e na construção civil emCabo e Ipojuca

Entre fevereiro de 2003 e de 2013, a taxa dedesocupação da RMR caiu de 12,1% para 6,5%.No mesmo período, os empregados com carteira

de trabalho assinada no setor privado passaram de35,0% para 47,1% do total e os empregados sem

carteira de trabalho assinada no setor privado, de15,1% para 10,0%. Um claro sinal de melhora noperfil da ocupação da região, mesmo consideran-do-se que esta passou a receber significativos flu-xos migratórios, invertendo-se a direção históricados mesmos. Quanto ao rendimento médio real

habitual da população ocupada, para o mesmoperíodo, também cresceu, passando de R$ 1.057,25para R$ 1.376,00, embora sempre se mantendo empatamares mais baixos, quando comparados aoconjunto das RM pesquisadas (que passou de R$1.555,33 para R$ 1.849,50, no mesmo intervalo)(IBGE/PME, 2003 a 2013).

Nesse contexto, o setor da construção civilna RMR, observado pela distribuição da popula-ção ocupada, ganhou crescente participação, comestoques de ocupação cada vez maiores. Passou de5,7%, em fevereiro de 2005, para 7,6%, em feve-reiro de 2007 e 7,8%, em fevereiro de 2013. Entrefevereiro de 2005 e de 2013, os empregados com

carteira de trabalho assinada no setor privado tive-ram aumento expressivo, passando de 24,7% para42,5% do total de ocupados no setor, respectiva-mente. Isso, enquanto os empregados sem carteira

de trabalho assinada no setor privado passaram de24,9% para 13,5% e os “por conta própria”, de43,9% para 37,2% (IBGE/PME, 2005, 2007 e 2013).

Para o município de Ipojuca, a Tabela 1mostra a evolução da dinâmica do emprego formalna Construção Civil, de janeiro de 2006 a marçode 2013. Destaque-se a elevação do nível decontratação em 2009 (coincidindo com o início dasobras de terraplanagem da Refinaria e daPetroquímica), assim como em 2010 (quando co-meçaram as obras de construção das duas plantasindustriais11). Mas o grande salto no nível de

11 Para a construção da planta da Refinaria Abreu e Lima, aPetrobras firmou contratos com cinco consórcios, novalor global de R$ 8,9 bilhões: Camargo Corrêa – CNEC(R$ 3,4 bilhões); Conest-UHDT, formado pelas empre-

sas Odebrecht e OAS (R$ 3,19 bilhões); RNEST - Conest,constituído pela Odebrecht e OAS (R$ 1,48 bilhão); Con-duto – Egesa (R$ 649 milhões); Construcap – Progen(R$ 120 milhões) (Revista Grandes Construções, 2010).

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contratação ocorreu a partir de 2011, quando asreferidas obras ganharam ritmo. Sobressai, ainda,a rotatividade no emprego, atingindo em 2012 asimpressionantes marcas de 36.992 admissões e29.451 demissões.12

Ainda sobre o perfil do emprego formal naconstrução civil em Ipojuca, entre janeiro de 2008e de 2013, destaca-se, pelo elevado volume de con-trações, baixo nível salarial e extraordináriarotatividade no emprego, o segmento de serventes

de obras (17.612 admissões, 10.428 desligamen-tos, 7.184 de saldo, com salário médio de admis-são de R$ 637,05). Mas, de outra parte, evidencia-se, também, a elevada e diversificada demanda porocupações com maiores exigências de qualificaçãoprofissional (exemplos: instalador de tubulações,montador de estruturas metálicas, soldador, entreoutros) (MTE/CAGED, 2003 a 2013).

Qualificação como necessidade, oportunida-de e justificação

Em reportagem da Revista Exame (07/04/2010), evidenciando o descompasso entre o cres-cimento econômico e a disponibilidade de mão deobra qualificada, Marcelo Odebrecht, presidentedo grupo que leva seu nome, comentou: “a faltade gente qualificada é uma de nossas piores fra-quezas, pois impede que o país cresça por váriosanos seguidos”. Órgãos de mídia, em tom sensaci-onalista, têm falado de “apagão de mão de obra”.13

Estudo de Moutinho et al (2011), diante da cres-cente carência de trabalhadores qualificados para

os diversos novos segmentos produtivos emSuape, evidenciou o desafio de converter traba-lhadores com baixa escolaridade em operários qua-lificados. Também Monteiro (2011) comentou queas elevadas exigências de qualificação profissionalcontrastavam com o perfil da mão de obra dispo-nível na região, destacando esse como um grandeproblema para os novos empreendimentos.

Essa questão se tornou, assim, um decisivodesafio da política de desenvolvimento no Brasil eem Pernambuco, ao se situar entre, de um lado, asdemandas empresariais (para que sejadisponibilizada mão de obra que atenda às suasnecessidades de qualificação e em quantidade su-ficiente para que os salários possam ser mantidosem padrões competitivos) e, de outro, as deman-

das dos trabalhadores (para que agora sejam cria-das – especialmente para os pernambucanos –oportunidades de uma melhor inserção no merca-do de trabalho). A legitimação das políticas públi-cas de qualificação profissional dependem, nessecontexto, de sua capacidade de se colocarem comocentrais, para ambas as demandas, ao mesmo tem-po em que as venham atender, em alguma medida.Notamos, quanto a esse aspecto, um quê deambiguidade discursiva. No caso aqui em tela, naspalavras de Eduardo Campos, diante do sucessoeconômico de Suape,

[...] o desafio agora é capacitar a população para anova realidade do nosso mercado de trabalho. Par-cerias, convênios e contratos estão promovendouma inédita mobilização em prol da formação eespecialização da mão de obra pernambucana(Suape/Governo Pernambuco, 2010).

O elemento de ambiguidade, para fins dejustificação, requer que os agentes estratégicos daagenda desenvolvimentista, governantes e empre-sários, afinem o discurso. Neste, as demandas aci-ma referidas tendem a ser enunciadas como (qua-se) uma mesma questão. Não fica suficientementeexplícito no discurso governamental, como indicao fragmento acima, que a ação do Estado nessaárea não pode, necessariamente, deixar de lidarcom, pelo menos, essas duas visões do problema,diferentes nos seus sentidos, podendo implicar

12 Isso, provavelmente, se deve a causas diversas. Entre asquais, podemos considerar: essa é uma característica dosetor (contratações por empreitadas e alto grau desubcontratação); trata-se de uma estratégia empresarialrecorrente na gestão do emprego no Brasil, com o fim derebaixar salário; pode ser um recurso usado pelos traba-lhadores, em condições de demanda de mão de obraaquecida, com o propósito de barganhar melhores salári-os e condições de trabalho. No caso em particular, avali-amos que tal questão merece análise mais detida, aomesmo tempo em que admitimos que o primeiro ele-mento tem tido um peso mais decisivo.

13 Ver, por exemplo, matéria do Jornal Nacional, no siteGlobo.com (http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2012/08/dificuldade-de-encontrar-mao-de-obra-qualifi-cada-afeta-economia-brasileira.html).

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diversas formas de conflitos de perspectivas, as-sim como de acertos, composições.14 Entretanto,como o encaminhamento do problema não temimplicado uma franca explicitação dessas diferen-ças de perspectiva, nem o reconhecimento públi-co dos conflitos que implicam, a questão não temsido posta claramente em termos de contrataçãosocial, mas de atendimento, por parte do Estado(monologicamente), da demanda da sociedade.

O encaminhamento prático da questão, noentanto, ao mesmo tempo em que confirma essaperspectiva, problematiza-a parcialmente. A primeiragrande ação de qualificação profissional no territó-rio de Suape foi, segundo Arioneide Belém, daSuperintendência Regional do Trabalho e Empregode Pernambuco – SRTE/PE (entrevistada pelo au-tor em março de 2013), a realização do Plano Setorialde Qualificação – PLANSEQ da Construção Civil,contando com recursos do Fundo de Amparo aoTrabalhador – FAT e das empresas beneficiadas.Uma edição esteve voltada à qualificação para má-quinas pesadas (de 2007 a 2010), e outras duas parasegmentos mais leves (2007-2008 e 2010-2011). Emambas foram constituídas Comissões deConcertação, reunindo empresas, sindicatos, SRTE,Senai, e outras instituições. Destacou a entrevista-da que, diante da baixa escolarização dos trabalha-dores da região, foi preciso diminuir as exigênciasinicialmente estabelecidas, de modo a ampliar onúmero de cursistas. Para a Secretária Executiva deTrabalho e Qualificação de Pernambuco, AngelaMochel (entrevistada pelo autor e equipe da Fundaj,em dezembro de 2012), o Estaleiro Atlântico Sul –EAS foi um marco no perfil da demanda por mãode obra no estado. Intenso processo de discussãose estabeleceu em torno do cadastramento, seleçãoe treinamento, envolvendo o Estaleiro, as Agênciasdo Trabalho, prefeituras da região de Suape, Senai.Segundo informações do Senai-Pe (O Estado de São

Paulo, 30/08/2010), o número de alunos formados

pela instituição passou, de 19,4 mil para 48,6 mil,entre 2003 a 2010. Com as demandas do setor depetróleo e gás, o Senai-Pe executou, em 2009, o Pro-grama de Mobilização da Indústria Nacional de Pe-tróleo e Gás Natural – PROMINP (do Ministériodas Minas e Energia em parceria com a Petrobras).Segundo Soares Júnior e Martins (2010), o orça-mento do Proninp/Senai-Pe, para 2009, foi de maisde R$ 10 milhões, envolvendo 14 cursos, 389 tur-mas e mais de 6,2 mil alunos. Até 2010, o governode Pernambuco havia criado 13 novas escolas téc-nicas, frente a um total de 16, disponibilizando 13mil vagas. Outras ações nesse campo se estabelece-ram, envolvendo a FIEPE, governos municipais,Universidades, SEBRAE, BNDES, grandes empre-sas (Monteiro, 2011; Soares Júnior e Martins, 2010).

Após tantas iniciativas no campo da quali-ficação profissional, embora tenham sido anunci-adas como oportunidades de uma nova inserçãodas populações locais no mercado de trabalho, ficao alerta do ex-prefeito de Ipojuca, Pedro Serafim,em entrevista para o JC (12/08/2011): “ainda fica-mos com os menores salários”. Mesmo havendosignificativa incorporação de trabalhadores locaisaos empreendimentos de Suape (com destaque paraa construção civil) e mesmo considerando que talincorporação tem implicado conversão ocupacional(com os segmentos majoritários sendo oriundosda lavoura da cana de açúcar), com elevação signi-ficativa dos empregos com carteira assinada, issonão tem significado a instauração de um padrãosalarial e de condições de trabalho muito diferen-tes dos padrões históricos da região. Os conflitosque serão analisados denunciam tal situação.

Reconstituições identitárias

A região de Suape tem a marca histórica dotrabalho na cana-de-açúcar, na pesca artesanal e,mais recentemente, no turismo. Com o ComplexoSuape, estabeleceu-se entre este e as comunidadeslocais uma dinâmica de conflitos, intensificados,nas décadas de 1990 e 2000, com ações de expro-priação (Pérez e Gonçalves, 2012). Para Santos

14 Vista como construção social, em perspectiva relacional,enquanto produto das disputas sociais e dos aspectosvalorativos que se encontram na base dos julgamentos eclassificações sociais sobre o trabalho, a noção de qualifi-cação se refere às possibilidades trazidas com as diversascondições sociais, econômicas, políticas e culturais (verquanto a isso a clássica abordagem de Naville, [1956] 2012).

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(2012), existem, ainda, 28 mil pessoas residindodentro do perímetro do Complexo. Tais conflitos,associados à decadência da base produtiva anteri-or, têm afetado, significativamente, as comunida-des locais, em sua reprodução e identidades.15

Quanto aos moradores da região, absorvidosnos novos empreendimentos, estão vivenciando umprocesso de reconversão ocupacional e identitária.16

Em contraste com suas trajetórias ocupacionaisanteriores, veem-se, agora, imersos na rotina deempresas estruturadas, formais, algumas de gran-de porte. Para muitos desses, o sentimento é demelhora de vida e até de euforia, a exemplo de umaoperária citada por Rodrigues (2012, p. 39):

[...] esse é o meu primeiro emprego. Antes eu erauma dona de casa, agora sou metalúrgica-soldadora do EAS, que vai construir grandes navi-os. O presidente Lula sabe o que isso significa. Mesinto honrada em fazer parte disso, em saber quecada um desses navios terá um pedacinho de mim.

O discurso desenvolvimentista encontranesse tipo de manifestação (da parte dos trabalha-dores oriundos da região e recém-incorporados aosnovos empreendimentos de Suape) uma percep-ção que o complementa e o legitima.

Os trabalhadores dos empreendimentos deSuape são de dois tipos principais: os moradoresda região e os trabalhadores vindos de fora, os“trecheiros”.17 Quanto aos primeiros, “normalmen-

te, são contratados para ocupar os postos de traba-lho mais baixos na hierarquia da obra” (Rodrigues,2012, p. 43). Conforme apurou Rodrigues (2012),as empresas, em Suape, se utilizaram da estratégiade treinamento de trabalhadores agrícolas, comoforma de poder dispor de mão de obra barata edócil. Entre os trabalhadores oriundos da região eos “trecheiros”, em Suape, as diferenças de perfiltêm redundado em tensões. Sendo que esses últi-mos, segundo apurou Rodrigues (2012), têm trazi-do, de andanças pelo Brasil, não só uma experiên-cia profissional, mas, também, sindical e política.

Sindicatos em Suape

Para o sindicalismo, Suape tornou-se umgrande desafio. Requer saber lidar com: grandesempresas; concentrações de trabalhadores;heterogeneidade no seu perfil; discrepâncias sala-riais e de condições de trabalho; caráter explosivodos conflitos; intensas disputas sindicais. Em ge-ral, os sindicalistas não têm conseguido se legiti-mar como representantes das demandas dos tra-balhadores. Para os principais sindicatos filiadosà CUT, com base na região, o Sindmetal-Pe(Metalúrgicos), o Sindipetro-Pe/Pb (Petroleiros), oSindiquímica-Pe (Químicos), o Sticc/Pe (Constru-ção Civil), prevalece, ainda, uma postura de certaperplexidade, segundo evidenciou um dirigentedo Sindmetal-Pe (entrevistado pelo autor em mar-ço de 2013). Isso tem se traduzido, em geral, emníveis baixíssimos de sindicalização. Para um di-rigente do Sindipetro-Pe/Pb (entrevistado pelo au-tor em março de 2013), este tem uma situação dife-renciada, visto que as empresas da Petrobras, emSuape, são suas principais bases de atuação. Quan-to à Força Sindical, antecipando-se ao boom daconstrução civil, trazido com o PAC, criou, em2000, o Sintepav-Pe (para a construção civil “pesa-da”), aproveitando-se da desatenção do Sticc/Pe(conhecido como “Marreta”), criado em 1919 efiliado à CUT desde os anos 1980. O Sintepav-Pepassou a representar, legalmente, os trabalhadoresda Construção Civil “pesada” em Pernambuco,

15 Em depoimento a Cavalcanti e Rocha (2013, p. 10), umdos moradores da comunidade Tatuoca, assim se colo-cou: “tudo que sou tá ligado a Tatuoca! Pra nós, nativos,SUAPE não trouxe benefício. Tiraram muito da nossasobrevivência. Vivo da pesca e de outro giro das frutasque comercializo. Aqui muitas empresas desmataram,não deram satisfação à gente. E a gente manteve a terra”.

16 Em depoimento a Cavalcanti e Rocha (2013, p. 13), umdiretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ipojucaadmitiu: “o trabalhador rural, 60% deles foi trabalharem Suape. Quem foi trabalhar em Suape, não volta maispara o campo, não quer ser mais cortador de cana. Essejá fez treinamento, já adquiriu outro conhecimento, nãovolta mais para ser um cortador de cana”.

17 Para Guedes (2011, p. 182), a origem dos termos “tre-cho” e “trecheiro” pode ter tido relação com a prática dedivisão, entre empreiteiras, do serviço referente a umagrande obra de construção de estrada, em “trechos”. In-dica que, em trabalhos mais recentes, o termo “trecheiro”passou a ser usado com um sentido alargado, como“intinerante”. Propõe que a noção se estabeleça em con-traste com a de “migrante”, cujo “trajeto se justifica peloponto que está em seu fim”, enquanto para o primeiro“a circulação é um objetivo em si mesmo”. Nesseenquadramento inclui os “peões de obra“.

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incluindo Suape. O seu fundador e presidente é omesmo que, atualmente, preside a Força Sindicalno estado, Aldo Amaral. A Conlutas também temtido atuação em Suape. Embora não detenha re-presentação legal nas empresas do Complexo, essaCentral tem deslocado militantes para atuarem nosconflitos da região, tendo conseguido conquistar odireito de participar em assembleias e mesas denegociação (Rodrigo, 2012).

A atuação sindical no setor da construçãocivil no Brasil tem tido, nos processos deterceirização, um desafio especial. Segundo Cockelle Perticarrari (2010, p. 635), embora tais práticastenham como motivação a busca de serviçosespecializados, visam, sobretudo, reduzir custostrabalhistas, quando são subcontratadas empresasarregimentadoras de mão de obra, denominadas“gatos”. As subcontratações podem levar a proces-sos sucessivos, quando subcontratadas subcontratamoutras empresas. As condições de trabalho se di-ferenciam ao longo dessa cadeia. O mesmo ocorreem Suape, onde são praticadas diferençascontrastantes em aspectos como salários, acomo-dações,18 alimentação, transporte, entre outros(Monteiro, 2011; Rodrigues, 2012).

Os contrastes salariais e de condições de tra-balho entre “trecheiros” e trabalhadores da região eentre contratados diretos e subcontratados, associ-ados a atrasos em pagamentos, relações com chefi-as, entre outras situações, têm sido fatores de im-portantes conflitos nos canteiros de obra em Suape.

AS LUTAS DOS PEÕES DE SUAPE: O QUEquerem dizer?

No processo de construção dos empreendi-mentos de Suape, os conflitos foram se acumulan-do no ritmo das obras. Em janeiro de 2008, ocor-reu uma paralisação de dois dias dos 2 mil traba-

lhadores atuantes nos serviços de terraplanagemda Refinaria. Queixas: não-pagamento de horasextras, atraso de salários, maus tratos pelas chefes(Jornal Tribuna Popular, 30/01/2008). No mesmoano, ocorreu a primeira greve dos trabalhadoresdo EAS, com duração de três dias (Rodrigues,2012). No início de 2009, os dois mil trabalhado-res ainda atuantes nas obras do EAS realizaramparalisação de um dia, em protesto pelo não paga-mento da Participação nos Lucros (DP, 04/03/2009).Em 2010, os 3 mil trabalhadores do ConsórcioConest, formado pelas construtoras Odebrecht eOAS, realizaram uma paralisação de um dia, con-tra o plano de compensação das folgas de fim deano. Em novembro, os mesmos trabalhadores pro-testaram pelos salários inferiores pagos aos traba-lhadores da região, mesmo para funções iguais (AVerdade, 04/11/2010, www.averdade.org.br).

Revoltas e greves em 2011

Em 25 de janeiro de 2011, os sete mil traba-lhadores da Odebrecht, envolvidos na construçãoda Petroquímica, paralisaram o trabalho, por au-mento de 30% de adicional de periculosidade emelhorias nas condições de trabalho (DP, 09/02/2011). No dia 2 de fevereiro, o Tribunal Regionaldo Trabalho – TRT decretou a greve ilegal. Na noitedo mesmo dia, em protesto, um alojamento foiincendiado. Ocorreram demissões e um trabalha-dor foi preso. Sucederam-se novas depredações(JC, 03/02/2011). No dia seguinte, foi formada umacomissão de seis trabalhadores, para representarsuas demandas (JC, 20/02/2011). No dia 9, emassembleia no pátio de acesso à Refinaria, com maisde cinco mil trabalhadores, e sob um clima de ten-sões, o Sindicato defendeu que as reivindicaçõesdeveriam ser remetidas para a data-base da catego-ria, em agosto. Um conflito se estabeleceu, sendoprotagonizado, de um lado, pelos “baianos”, re-voltados com a posição dos sindicalistas e, de outrolado, por estes, que passaram a desqualificar aque-les como “preguiçosos” e descomprometidos como desenvolvimento de Pernambuco. Procurado

18 Os trabalhadores chegados de fora são abrigados emalojamentos das empresas, hotéis, pousadas,“puxadinhos” em residências. Os consórcios constituí-dos para empreenderem as obras de construção civil emSuape construíam alojamentos. O Conest instalou umcom capacidade para 3.688 trabalhadores, a CamargoCorrêa, para 3.500, a Odebrecht, para 1.296, a KMA 992,totalizando 9.476 lugares. (Monteiro, 2011).

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pelo JC (20/02/2011), o presidente do Sintepav-Penão admitiu as “expressões mais fortes”, mas re-conheceu que acusou os “baianos” de “falta deinteresse no crescimento econômico do Estado”.Chamam a atenção três aspectos da participaçãodo Sindicato no episódio: as dificuldades de afir-mação da sua liderança perante os trabalhadoresinquietos; a adoção de uma estratégia divisionista,alimentando uma tensão latente (entre“pernambucanos” e “baianos”); o recurso ao argu-mento do “compromisso com o desenvolvimentode Pernambuco”, para justificar a desmobilizaçãodos trabalhadores. Entretanto, os acontecimentosevoluíram na direção oposta: a revolta uniupernambucanos e “forasteiros”. A tensão cresceu,houve empurra-empurra, e os dirigentes do Sin-dicato se viram acantonados... Um tiro foi dispara-do, atingindo um trabalhador baiano. Um seguran-ça do Sintepav-Pe foi preso, acusado de “atirar namultidão” (JC, 20/02/2011). Grupos de trabalhado-res se dirigiram à rodovia PE-60, bloqueando, assim,a principal via de acesso a Suape. Com a chegada dapolícia, se estabeleceu um momento de negociação.A principal reivindicação dos manifestantes foi a“presença da imprensa” (Rodrigues, 2012, p. 54).Curioso o fato de ter imperado entre os revoltosos,na ocasião, a necessidade de buscar tornar visíveis,para a sociedade, as suas demandas. Sintomático quea superexposição dos assuntos de Suape, do novodiscurso e agenda desenvolvimentistas tenham con-vivido, até então, com o silêncio dos seus protago-nistas (governantes e empresários, mas, também,sindicalistas), sobre as condições de trabalho decontingentes tão significativos de trabalhadores.

No dia 14 de fevereiro, previsto para a voltaao trabalho, o clima era ainda tenso, com policiaispresentes. No pátio de acesso à Refinaria, formou-se uma assembleia, com o apoio de militantes daConlutas. A paralisação foi mantida, sendo cons-tituída uma comissão de oito trabalhadores(Rodrigues, 2012). Na versão do presidente doSintepav-Pe, as manifestações tinham motivaçãopolítica (DP, 15/02/2011). Já para Adalberto Silva,um dos membros da comissão, o Sindicato defen-dia “os interesses da construtora e não as necessi-

dades dos trabalhadores” (DP, 15/02/2011). A co-missão seguiu para o MPT, que passou a mediaras negociações. A primeira audiência ocorreu nodia 16 de fevereiro. Estiveram representados: oGoverno Estadual (Secretarias do Trabalho, Quali-ficação e Empreendimentos, da Articulação Sociale Regional, da Defesa Social e do Corpo de Bombei-ros Militar de Pernambuco); os empresários (Conest,Petrobras, Sindicato Nacional da Indústria da Cons-trução Pesada – SINICON, Confederação Nacionalda Indústria e Construção); os trabalhadores(Sintepav-Pe; Federação Nacional dos Trabalhado-res da Indústria da Construção Pesada –FENATRACOP, Comissão dos Trabalhadores); aSRTE-PE/MTE; a Prefeitura Municipal de Ipojuca,entre outros (Rodrigues, 2012). Chamou a atençãoo fato de não haver, ali, uma pauta de reivindica-ções. A dificuldade (ou indisponibilidade) do Sin-dicato em atuar como uma agência social19

processadora das demandas dos trabalhadores, eo caráter incipiente da comissão, mesmo diante dequeixas e exigências que pululavam entre os traba-lhadores, é o que, provavelmente, explica tal situ-ação. Nas palavras do Procurador Geral, FábioFreitas: “naquele primeiro momento de reivindi-cação, o Sindicato, praticamente, ele não falou”;acrescentando: sua presença se justificou pelo “as-pecto legal” (depoimento dado a Rodrigues, 2012,p. 58). Os primeiros resultados das negociaçõesforam: a suspensão do pedido de dissídio peloSinicon; o reconhecimento da comissão para com-por a mesa de negociação e a garantia de estabili-dade de 60 dias para seus membros; garantia deque não seriam descontados os dias parados en-quanto durassem as negociações; suspensão ime-diata do movimento grevista enquanto durassemas negociações. Para Adalberto da Silva, a audiên-cia legitimou o processo de negociação. Agora, erapreciso validar, junto aos trabalhadores, os acor-dos firmados: “estamos no processo de convenci-mento entre nossos companheiros para mostrar

19 Faço uso dessa expressão por alusão ao sentido dado porSader (1988, p. 143), ao se referir à emergência entre osanos 1970 e 1980, no Brasil, de “novas formas deagenciamento social”, capazes de elaborarem novas “ma-trizes discursivas”.

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que essa é a melhor maneira encontrada de atingirnossos objetivos” (DP, 17/02/2011). Para a comis-são, em particular, estava sendo travada uma duplaluta por reconhecimento: de um lado, das deman-das dos trabalhadores frente à mesa de negociações;de outro, de si mesma junto aos trabalhadores.

No dia 23 de fevereiro, na segunda audiên-cia, ainda sem que fosse apresentada uma pautade reivindicações, foi formulada uma proposta, aqual foi assinada pela comissão, Fenatracop e Con-federação Nacional da Indústria e Construção, masnão pelo Sintepav-Pe. Entre os 13 pontos apresen-tados, constaram: pagamento de 3hs in itinere aostrabalhadores; estabilidade para a comissão por umano; reclassificação dos trabalhadores em desviode função, com correção salarial; reajuste do valealimentação de R$ 40,00 para R$ 300,00, por mês;pagamento de adicional de horas extras aos sába-dos, de 50% para 100%; não desconto dos diasparados (Rodrigues, 2012). As audiências e o pro-cesso de negociação seguiram. Entre uma e outra,os trabalhadores se reuniam em assembleia. Entre-tanto, conforme observou Fábio Freitas, o Sindica-to estava tão “desprestigiado” que não participoudaquelas assembleias (depoimento dado aRodrigues, 2012, p. 63). Embora se tenha chegado,na audiência no dia 15 de março, a um acordo so-bre alguns itens (ajuste no vale alimentação para R$130,00, estabilidade de um ano para a Comissão,abono dos dias parados, pagamento de 80% parahoras extras), com outros sendo remetidos a umaavaliação posterior (pagamento das horas in itinere)e ou à data base (auxílio residência), os trabalhado-res recusaram o valor do auxílio refeição, que nãodeveria ser menor do que R$ 160,00, e o percentualde aumento pelas horas extras, que não deveria sermenor do que 100% (JC, 18/03/2011). Era mais umforte indicativo da falta de representatividade doSindicato, e mesmo da comissão.

A insatisfação entre os trabalhadores per-manecia.20 Um operário do Conest, em depoimen-

to ao jornal A Nova Democracia (Ano IX, nº 75,mar/2011, http://www.anovademocracia.com.br),comenta: “o governo na televisão fala que Suape éuma maravilha” (um elemento de fissura na dimen-são justificadora do discurso desenvolvimentista?).A paralisação, agora, havia sido estendida para osdemais canteiros de obras de Suape, envolvendocerca de 35 mil trabalhadores. Após outra rodadade negociações, os trabalhadores, em assembleia,no dia 25, optaram pela manutenção da greve (JC,25/03/2011). Na nona audiência, ocorrida no dia 28de março, o Procurador admitiu que havia chegadoao limite sua tentativa de mediar as negociações (ATA,28/03/2011, apud Rodrigues, 2012, p. 65). No dia29 de março, o TRT declarou a greve ilegal e, aomesmo tempo, foram atendidos os 100% no paga-mento das horas extras e os R$ 160,00 de vale ali-mentação (DP, 29/03/2011).

Segundo Adalberto Silva, com vistas à con-venção coletiva da categoria, em agosto, era preci-so buscar a unificação dos salários e benefíciosentre as empresas em âmbito nacional. No dia 15de abril, na décima audiência, as negociações fo-ram concluídas sem que as partes chegassem a umacordo sobre o desconto dos dias parados (Rodrigo,2012). Nos canteiros de obras, os conflitos conti-nuaram. Os trabalhadores seguiam insatisfeitos:

Quando reclamamos do péssimo tratamento, dashoras extras que quase nunca pagam e das péssi-mas condições de trabalho, eles gritam com agente coisas como: “vocês eram cortadores decana, passavam fome e hoje tem profissão e salá-rio, tão reclamando de que? Até fardinha vocêstêm.” Veja que absurdo! (A Nova Democracia,Ano IX, nº 76, abril de 2011).

Naquele momento, em levantamento feito peloDIEESE (UOL Notícias, 04/04/2011), foi estimado em170 mil o número de grevistas da construção civilem todo o país, sobretudo envolvendo as obras doPAC. Em geral, as reivindicações se relacionavam a:condições de trabalho; salários; alojamentos, paga-mento de horas extras; equalização de direitos entre

20 Nesse período, a SRTE/PE, com apoio do MPT, realizouuma Auditoria Fiscal do Trabalho no Complexo Suape(incluindo o EAS e os canteiros da Refinaria e daPetroquímica), na qual se registraram “casos de excessode jornada, ocorrências de acidentes, falta de registro emcarteira de trabalho, atrasos nos pagamentos e

superlotação de alojamentos” (SINAIT, 25/04/2011 -http://www.sinait.org.br). Para Vera Jatobá, que coorde-nou a missão, chamou a atenção o alto grau desubcontratação praticado na região (entrevistada peloautor em março de 2013).

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contratantes e subcontratadas, entre outros. Dianteda repercussão das mobilizações, as Centrais Sindi-cais obtiveram do Governo Federal o compromissocom uma agenda nacional de negociações, sobre con-dições de trabalho nas obras do PAC, envolvendoempresários, Governo e sindicalistas.

Em Suape, nas mobilizações da data-base emjulho, havia um clima de insatisfação com a resis-tência das empresas em abonar os dias parados nagreve de fevereiro e março. No dia 1º de agosto, foiaprovado o indicativo de greve. Diante do fato, emnota oficial, o Sinicon entra com pedido de ilegali-dade da greve e justifica, acusando o Sintepav-Pede “atropelar as negociações”, quando “vários itensda pauta de reivindicação já tinham sido concedi-dos pela categoria patronal” (G1.globo.com, 02/08/2011 - http://g1.globo.com/economia/noticia/2011/08/trabalhadores-do-complexo-de-suape-estao-em-greve.html). Segundo o Sintepav-Pe, a propostapatronal não era suficiente. A luta era por 15% deaumento, cesta básica de R$ 300,00, abono dos diasparados na última greve (Força Sindical, 02/08/2011– http://www.fsindical.org.br). Em 5 de agosto, ostrabalhadores suspendem a greve. Foram negocia-dos: aumento salarial de 11%, cesta básica de R$200; abono de 50% dos dias parados na greve demarço; abono total da greve de agosto; concessão depassagens aéreas para os que moram a mais de 1mil km; redução do tempo de folga de campo (cincodias), com 90 dias de intervalo. Desta vez, o secretá-rio de Articulação Social e Regional de Pernambucoparticipou das negociações (G1.globo.com, 05/08/2011). O apelo discursivo do “desenvolvimento dePernambuco” ganha, assim, mais evidência. Não àtoa, a advogada do Sinicon introduziu a seguintefrase: “nós temos um compromisso com o desen-volvimento de Pernambuco” (DP, 06/08/2011).

Em 2012, nova onda de mobilizações

Em fevereiro, os cerca de dez mil trabalhado-res da Odebrecht entraram em greve, por pagamen-to de 150 horas referentes à Participação nos Lucrose Resultados – PLR – de 2011. Para o presidente do

Sindicato, teria contribuído para a revolta o trata-mento desrespeitoso da Odebrecht para com os tra-balhadores (JC, 17/02/2012). Seis dias depois, omovimento foi encerrado, com um acordo firmadoentre a empresa e o Sindicato. Para capitalizar essesresultados, o presidente do Sintepav-Pe assim sepronunciou: “venceram os trabalhadores e o bomsenso. Mas é importante lembrar que sem amobilização a empresa não aceitaria rever a sua po-sição” (DP, 23/02/2012). Esses trabalhadores, noentanto, voltaram a paralisar o trabalho em 18 dejunho, reivindicando cumprimento de normas desegurança do trabalho e o pagamento do adicionalde periculosidade de 30%. A esses se juntaram 400trabalhadores do Consórcio Cabeços, revoltados comum acidente que matou um trabalhador na semanaanterior. As explosões espontâneas continuavamdando o tom das mobilizações em Suape, com aação do Sindicato vindo sempre em seguida (DP,18/06/2012). No dia 19, houve acordo na greve doConsórcio Cabeços, pondo fim à paralisação. En-tretanto, a greve na Odebrecht continuou. O Siniconentrou com pedido de dissídio junto ao TRT, masseguiu negociando. No dia 26 de junho a greve foiencerrada (DP, 26/06/2012).

Em 27 de julho, o Sintepav-Pe assinou acor-do com o Sinicon, incluindo: aumento salarial de10,5%; aumento da cesta básica para R$ 260; equi-paração salarial entre trabalhadores de mesma fun-ção, nas diversas empresas. O acordo foi homolo-gado em assembleia, em 1º de agosto. Entretanto,logo após a homologação, houve revolta, sendodesencadeada uma onda de protestos, com de-predações de alojamentos e a paralisação do traba-lho (JC, 02/08/2012). Em nota oficial, o Sinicon,argumentou: “diante desta posição, as empresasrepresentadas pelo Sinicon analisam a possibili-dade de demissão e outras medidas legais, vistoque as negociações já foram encerradas e a con-venção já foi assinada junto ao sindicato da cate-goria” (JC, 02/08/2012). O Sintepav-Pe, em notaoficial, admitiu que foi tomado de surpresa pelomovimento, criticou os “atos de vandalismo, do-cumentos apócrifos ou pessoas encapuzadas” e sedisse em defesa dos interesses dos trabalhadores

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(DP, 02/08/2012). Frente às acusações de que aassembleia que votou o acordo havia sido esvazia-da, o presidente do Sindicato justificou que teriacomeçado a chover na ocasião, com alguns operá-rios tendo deixado o lugar, acrescentando: “masquem saiu é como se tivesse assinado uma procu-ração para quem ficou” (JC, 02/08/2012). Em 6 deagosto, em sessão de conciliação, realizada no MPT,não houve acordo. No dia seguinte, o TRT decre-tou a greve ilegal (JC, 07/08/2012). O Sintepav-Peorientou os operários para o retorno ao trabalho etentou acordo para evitar o desconto dos dias pa-rados. Mas houve revolta na assembleia do dia 8,que começou com pedras sendo arremessadas con-tra os diretores do Sindicato, que tiveram que sairàs pressas. Dali, a revolta se alastrou, com ônibus ealojamentos sendo depredados. Com a chegada daPolícia, balas de borracha e bombas de efeito moralforam detonadas e prisões efetuadas (JC, 08/08/2012). O Sintepav-Pe divulgou nota, condenando a“ação de vândalos”, afirmando que realizava uma“assembleia informativa”, para poder cumprir seu“papel institucional” de repassar aos trabalhadoresa decisão do TRT. E, na sequência, retorna com oapelo ao discurso desenvolvimentista:

O Sintepav-Pe chama a atenção de toda sociedadepernambucana, em especial o Governo do Estadode Pernambuco, para as consequências de açõesisoladas como as que vêm ocorrendo em Suapenos últimos dias. Atitudes como as que se viramhoje afastam novos investimentos, diminuindoassim o número de empregos e consequentementedesaquecendo a economia estadual.

Por fim, assegurou seu apoio à “causa dosseus filiados”, defendeu os meios legais de luta erecomendou a volta ao trabalho (JC, 08/08/2012).Nesse contexto, de conflitos explosivos, o Sindi-cato, que se propunha a se manter em estrito mar-co institucional e aderente aos termos do discursoestabelecido, se via em apuros. O Sintepav-Pe es-colhe um alvo e parte para o ataque: “O PSTU,que é ligado ao Conlutas, tenta dividir a categoria,distribuindo panfletos afirmando que Pernambucotem um dos piores salários do Brasil e pleiteandoum reajuste de 15%” (declaração do presidente,

no JC, 08/08/2012). A resposta do Conlutas veiocom a dirigente estadual Cláudia Ribeiro: “OSintepav-Pe faz acusações falsas, levianas e menti-rosas. O que os trabalhadores querem são melho-res condições de trabalho. Tudo que aconteceu foigerado por insatisfações da base, que está jogadaem galpões ou em casas onde moram 10, 20 pes-soas amontoadas” (JC, 08/08/2012).

No dia 9 do mesmo mês, o retorno ao traba-lho foi parcial. Um clima de insegurança se insta-lou na região, ocupada por policiais. Muitas em-presas liberaram os trabalhadores para sóretornarem no dia 13. Diante dos acontecimentos,a Secretaria de Articulação Social e Regional foiescalada para atuar no caso (DP, 09/08/2012). Nodia 10, tentativas de retorno ao trabalho encontra-ram a resistência de piquetes. As empresas deci-diram flexibilizar as punições (DP, 10/08/2012). Trêsdias depois, muitos não retornam ao trabalho, emprotesto pelo anúncio de desconto dos dias para-dos e pelo atraso no pagamento do adiantamentoquinzenal. Alguns incidentes foram aindaregistrados. O Sintepav-Pe procurou se afirmarcomo condutor das reivindicações, abordando ostrabalhadores e orientando-os a baterem o ponto,mas sem retornarem ao trabalho. Em nota, a enti-dade propõe que só haja retorno quando houvergarantias de que as empresas abonarão “todos osdias da paralisação iniciada no último dia 1º deagosto” (DP, 13/08/2012). No dia 14, também nãohouve retorno ao trabalho. Um acordo só veio ocor-rer no dia seguinte: o pagamento da quinzena foiliberado e as empresas concordaram em abonar70% dos dias parados (DP, 15/08/2012). As ativi-dades foram retomadas no dia 16 de agosto.

Entretanto, com as notícias de que haveriademissões e descontos de parte dos dias parados,retornou um clima de nova paralisação. Novas ne-gociações foram iniciadas, desta vez com a partici-pação de uma comissão de trabalhadores. Houveretorno ao trabalho, mas ficou no ar uma operação“braços cruzados” (DP, 16/08/2012). Um novoimpasse se estabeleceu. Os trabalhadores exigiam100% de abono dos dias parados. Uma expectativase criou com a reunião prevista para ocorrer em

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Brasília, com representantes das empresas, das cen-trais sindicais e do próprio governo. Na pauta, oimpasse em Suape. Mas os representantes das cen-trais sindicais não compareceram, não havendo in-dicações de solução para os impasses (DP, 17/08/2012). Um representante do MTE foi designado parainiciar nova rodada de negociações (DP, 18/08/2012).No dia 20, ainda sem solução, a situação em Suapevoltou a ficar tensa com o anúncio de centenas dedemissões. No dia seguinte, continuaram as demis-sões “por justa causa” (DP, 21/08/2012). Ocorreu,no dia 23, a volta ao trabalho (DP, 23/08/2012).

Matéria do JC (26/06/2012) chama a atençãopara o que, na visão do órgão, se deve apreendercom os acontecimentos: “vinte dias deste mês deagosto abalaram o marco inicial do desenvolvimentoeconômico de Pernambuco”; “a paralisação agres-siva e sem norte [...] escancarou o despreparo dosindicalismo local”; a “escassez de mão de obraqualificada” e os “prazos e orçamentos rígidos paratirar os empreendimentos do papel” “conferem umpoder de negociação distorcido para os trabalha-dores”. Um ator (outsider), ao tentar entrar em cena,para, assim, poder ser reconhecido como portadorlegítimo de demandas sociais, testa os limites dadimensão justificadora do novo discursodesenvolvimentista (aqui incluído seu componentemidiático). Até onde vai o seu alcance?

Os conflitos seguem. Ainda em 2012, umanova greve geral atingiu os canteiros de obras daRefinaria e da Petroquímica, com duração de 24dias (de 30 de outubro a 23 de novembro). Nova-mente o TRT declarou a greve ilegal. Diversosmediadores foram convocados para solucionar osconflitos, entre eles o próprio Brizola Neto, entãoMinistro do Trabalho, e o presidente nacional daForça Sindical, Paulo Pereira da Silva. Mas a grevesó acabou quando o Sinicon e o Sintepav-Pe che-garam a um acordo, com a criação de uma tabelaprevendo novos pisos salariais para 32 categoriasprofissionais (O Estado de São Paulo, 23/11/2012).

Os conflitos em Suape seguem no mesmo rit-mo em 2013, mesmo com o início da desmobilizaçãodas obras de construção da Refinaria e daPetroquímica. Um outro cenário se anuncia, no en-

tanto, quanto mais tal desmobilização avança, cujaprevisão é que se estenda até a virada para 2014.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo, nos detivemos sobre conflitosenvolvendo os peões e as empresas das grandes obrasde Suape. Vimos que esses conflitos se desdobram ese articulam sob focos diversos, opondo: peões “fo-rasteiros” e aqueles de origem local; trabalhadoresdiretos e terceirizados; trabalhadores e forças polici-ais; trabalhadores e Sindicato; militantes da Conlutase do Sindicato; comunidades locais e gestores públi-cos e privados de Suape, entre outros.

Pudemos notar que, não obstante a ausênciade uma organização sindical capaz de captar, siste-matizar e expressar os interesses e demandas coleti-vas dos trabalhadores, estes se mobilizaram e obti-veram conquistas relacionadas a salário, vale refei-ção, horas extras, condições de alojamento, abonode dias parados, reconhecimento e estabilidade paracomissões de trabalhadores, entre outras.

Para além disso, percebemos que, entrandoem cena, sob formas explosivas e inesperadas, ospeões de Suape e suas condições de existência etrabalho se tornaram visíveis para a sociedade. Quequestões, com isso, colocam para o novo discurso eagenda desenvolvimentista? Vimos o quanto ele-mentos das críticas ao projeto Suape foram sendoincorporados, de algum modo, nos discursos e prá-ticas dos atores estratégicos ali implicados. Não àtoa, em agosto de 2011, no auge das mobilizaçõesem Suape, o governador assim se pronunciou:

Cresce na nossa consciência a importância de pla-nejar a expansão dessa região. Não queremos repe-tir desigualdades que se arrastam por quatro sécu-los de história. Porque de desigualdade esse territó-rio de Suape entende. São marcas muito profun-das, que começaram com a exploração dos índios edos escravos, e não poderão se repetir nesse novociclo de desenvolvimento (JC, 12/08/2011).

Em que medida o discurso estabelecido donovo desenvolvimentismo, diante dessa dimensãoque se visibiliza com os conflitos, incorpora algo dacrítica como reconhecimento ou tão somente como

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justificação? Por outro lado, até onde os trabalhado-res têm sido capazes de se fazer reconhecer?21 Comos conflitos aqui sumarizados, sobressai o fato deque aqueles conseguiram, protagonizando aconteci-mentos espetaculares, se tornar visíveis. Ao mesmotempo, ficou evidenciado que a mediação sindical,ao contrário de se constituir como um novoagenciamento social, no sentido de Sader (1988), nãotem sido capaz de processar tais demandas e de seconverter em canal de elaboração de uma nova ma-triz prático-discursiva. Conversas com sindicalistasatuantes em Suape e as evidências trazidas com odesenrolar dos conflitos e negociações nos indicamo quanto o sindicalismo na região está longe de cum-prir esse papel, o que, para tanto, requereria um ou-tro patamar de elaboração estratégica de suas linhasde ação, de modo a contemplar, entre outros aspec-tos: consolidação de sua capacidade de representa-ção diante dos trabalhadores; enraizamento e proje-ção como ator influente no arranjo político einstitucional local; articulação em perspectiva de ca-deias produtivas, de modo a compor ações nacio-nais e internacionais referidas às conexões de Suapecom a economia nacional e global; articulação emuma perspectiva de ação mais ampla, reportada aodebate sobre os rumos do desenvolvimento do país.A abordagem da experiência sindical em Suape, apartir das dimensões propostas acima, certamente,pode vir a ser bastante enriquecida quando postavis-à-vis experiências outras, de relevância internaci-onal, assim como nacional. Neste caso, sobressai ocaso do ABC Paulista (Véras de Oliveira, 2011;Ramalho e Rodrigues, neste dossiê).

Na ausência de uma atuação sindical maisconsistente, os trabalhadores de Suape, se têm con-seguido dar visibilidade a si e às suas demandas,não necessariamente têm sido capazes de se fazerreconhecidos (na sua condição de agentes e porta-dores de demandas) como parte do empreendimentodesenvolvimentista. Voltamos, assim, ao tema dojogo de tensões entre as razões econômicas (referi-

das a noções tais como eficácia, competitividade,crescimento, acumulação) e sociais (reportadas àequidade, redistribuição, proteção social, participa-

ção e controle social), enquanto parâmetros paradiscutirmos os termos e possibilidades do novodiscurso/agenda desenvolvimentista. Os conflitosdo trabalho, no entanto, continuam; as disputas desentidos, também. Migrando desses canteiros aoutros (seja para se integrar a construção da plantada Fiat, que já se inicia, ou para atuar em outrasgrandes obras país afora) e daí aos novos empreen-dimentos, na medida em que vão entrando em fun-cionamento (estaleiros, refinaria, petroquímica, si-derúrgica, indústria de alimentos e bebidas etc.), asreconversões identitárias, as disputas sindicais eos conflitos do trabalho continuarão ganhando no-vos impulsos e seguirão impactando as dinâmicaseconômicas, sociais e políticas na região. A questãoque fica se refere à capacidade dos trabalhadores esuas representações sindicais se afirmarem comoprotagonistas na construção de um novo padrão derelações de trabalho e de uma perspectiva de desen-volvimento que venha a ter nos elementos daequidade social e da sustentabilidade ambiental,aspectos tão estratégicos como o da eficiência eco-

nômica. Isso implicará tensionar e levar ao limiteos termos atuais do padrão de desenvolvimentoembalado na nova edição, em Pernambuco e no Bra-sil, da agenda e discurso desenvolvimentistas.

Recebido para publicação em 21 de abril de 2013Aceito em 10 de junho de 2013

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21 Todo o processo da constituição de mesas de negocia-ções, com a mediação do MPT, as dificuldades de repre-sentação efetiva por parte do Sintepav-Pe e da comissãodos trabalhadores, as ameaças empresariais, as sentençasdo TRT, que aqui vimos, ganha relevância quanto a isso.

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Roberto Véras de Oliveira – Doutor em Sociologia. Professor do Departamento de Ciências Sociais daUniversidade Federal da Paraíba (UFPB) e membro do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPB(PPGS) e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Campina Grande(PPGCS/UFCG). Pesquisador do CNPQ. Preferencialmente, orienta seus estudos e pesquisas para os camposda Sociologia do Trabalho e da Sociologia Política. Tem concentrado sua atenção (na forma de publicações,orientações e participação em eventos) sobre temas como sindicalismo, relações de trabalho, qualificaçãoprofissional, políticas públicas de trabalho, emprego e renda, economia solidária, diálogo social, cidadania,entre outros. É autor e coautor de várias publicações em revistas científicas e livros. Entre estes, Sindicalismo

e Democracia no Brasil – do novo sindicalismo ao sindicato cidadão. São Paulo: Annablume, 2011.

SUAPE UNDER CONSTRUCTION,UNSKILLED LABORERS IN STRUGGLE: new

development and labor conflicts

Roberto Véras de Oliveira

Taking the labor and conflicts point of view,this article discusses the emergence of a new agen-da for development in Brazil. Its focus is theconstruction worker protests and strikes at two ofthe Suape Port Industrial Complex’s main sites,the Abreu e Lima Refinery and the SuapePetrochemical Plant, in 2011 and 2012. Throughthe use of this approach we intend to comprehendthe processes touched off by the conflicts,mediations, and negotiations, as well as what hasbeen at stake with workers’ demands and alsounion, management and government discourseand practices. We ask ourselves if thesemobilizations, besides giving them immediategains, have given workers recognition as legitimateagents of social demands. We also ask to whatdegree such demands have become not only a targetof public outcry but also a way of problematizingthe terms that give sustenance to the newdevelopment discourse.

KEY WORDS: Development. Labor. Unionism. Civilconstruction. Suape.

LA CONSTRUCTION DE SUAPE, DESOUVRIERS QUI LUTTENT: le nouveaudéveloppement et les conflits du travail

Roberto Véras de Oliveira

Cet article examine l’émergence d’un nouveauprogramme de développement au Brésil dansl’optique du travail et de ses conflits. L’accent estmis sur les émeutes et les grèves des ouvriers quitravaillent dans la construction de deux desprincipales entreprises du Complexe IndustrielPortuaire de Suape, la Raffinerie Abreu et Lima etl’entreprise pétrochimique Suape, au cours desannées 2011 et 2012. Cette approche se veutd’analyser les processus déclenchés par les conflits,les médiations et les négociations et ce qui a étéremis en question, en parallèle aux demandes destravailleurs ainsi que les discours et les pratiquesdes gouvernements, des entreprises et des syndicats.Nous nous demandons si ces mobilisations ontpermis, au-delà des gains immédiats obtenus parles travailleurs, que ceux-ci soient reconnus commeles porteurs légitimes des revendications sociales.Et dans quelle mesure de telles revendications nesont pas seulement l’objet d’une dénonciation pu-blique mais représentent aussi une manière deremettre en cause les termes du nouveau discourssur le développement.

MOTS-CLÉS: Développement. Travail. Syndicalisme.Construction civile. Suape.