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2013 RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA Centro de Estudos e Investigação Científica

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RELATÓRIOSOCIAL

DE ANGOLA

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLACentro de Estudos e Investigação Científica

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RELATÓRIOSOCIAL

DE ANGOLA

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLACentro de Estudos e Investigação Científica

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CENTRO DE ESTUDOS E INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA (CEIC / UCAN)

DIRECTOR – Alves da Rocha

RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013COORDENAÇÃO – Nelson Pestana

EQUIPA DE REDACÇÃOAlves da RochaEduardo Sassa Francisco Paulo Gilson Lázaro Guilherme SantosJorge TrulaNelson Pestana Osvaldo Silva Sérgio Calundungo

RECOLHA DE INFORMAÇÃO E PRODUÇÃO DE GRÁFICOSCláudio Fortuna Paxote Gunza José Lumango

INVESTIGADORES PERMANENTES Alves da RochaCarlos VazCláudio FortunaFrancisco PauloNelson PestanaOsvaldo SilvaPaxote GunzaPrecioso DomingosRegina SantosVissolela GomesWilson Silva

INVESTIGADORES COLABORADORESAlbertina DelgadoCarlos Pinto Eduardo SassaFernando PachecoGilson LázaroLuís BonfimMargareth NangaMilton Reis Salim Valimamade

ADMINISTRAÇÃO E FINANÇASMargarida TeixeiraLúcia CoutoEvadia KuyotaAfonso RomãoLeonardo Monteiro

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO .................................................................................................. 8

1. Participação dos cidadãos na gestão e controlo das políticas públicas ....... 9 1.1 Introdução ................................................................................................ 9 1.2 O desempenho das instituições do Estado na viabilização da participação

dos cidadãos nos processos de gestão das políticas públicas .................. 12 1.3 Desempenho das Organizações da Sociedade Civil nos processos

de gestão e controlo das políticas públicas .............................................. 16

2. População, condições de vida e pobreza....................................................... 20 2.1 População ................................................................................................. 20 2.2 Condições de vida e Índice de Desenvolvimento Humano ...................... 27 2.3 Pobreza e poder de compra dos salários ................................................. 29

3. Compromisso com a saúde ............................................................................ 35 3.1 Quadro epidemiológico ............................................................................ 35 3.1.1 Malária ............................................................................................ 38 3.1.1.1 Prevalência e letalidade ...................................................... 38 3.1.1.2 Formas de combate e tratamento ....................................... 40 3.1.2 Doenças respiratórias agudas ......................................................... 42 3.1.3 Doenças diarreicas agudas .............................................................. 44 3.1.4 Disenteria ........................................................................................ 45 3.1.5 Febre tifóide .................................................................................... 45 3.1.6 Tuberculose ..................................................................................... 45 3.1.7 Doença do sarampo ........................................................................ 47 3.1.8 Doenças sexualmente transmissíveis .............................................. 49 3.2 Indicadores-chave da saúde ..................................................................... 50 3.2.1 A mortalidade materna ................................................................... 50 3.2.2 A mortalidade neonatal .................................................................. 52 3.2.3 A mortalidade infantil ..................................................................... 52 3.2.4 VIH/SIDA .......................................................................................... 53 3.3 Saúde preventiva...................................................................................... 57 3.3.1 Programa de cobertura vacinal ....................................................... 57 3.3.1.1 Vacina Pentavalente 3 ......................................................... 58 3.3.1.2 Vacina contra o sarampo .................................................... 58 3.3.1.3 Vacina contra a poliomielite ............................................... 59 3.3.1.4 Situação vacinal em geral .................................................... 60 3.4 Saúde curativa .......................................................................................... 61 3.5 Despesas com a saúde ............................................................................. 63 3.5.1 Na perspectiva do orçamento ......................................................... 63 3.5.1.1 Despesas per capita ............................................................ 65 3.5.1.2 Despesas públicas/Despesas privadas com a saúde ........... 66

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3.5.1.3 Distribuição das despesas dentro do sector ........................ 67 3.5.1.4 Despesas por programas ..................................................... 68

4. Compromisso com a educação ...................................................................... 70 4.1 Introdução ................................................................................................ 70 4.2 Ensino pré-primário (Iniciação) ................................................................ 73 4.3 Ensino primário ........................................................................................ 74 4.3.1 Cobertura escolar ............................................................................ 75 4.3.2 Rendimento escolar ........................................................................ 77 4.3.3 Abandono escolar ........................................................................... 78 4.3.4 Evolução do corpo docente ............................................................. 79 4.3.5 Evolução das infra-estruturas e equipamentos escolares ............... 80 4.4 Ensino secundário .................................................................................... 80 4.4.1 Cobertura escolar ............................................................................ 81 4.4.2 Rendimento escolar ........................................................................ 82 4.4.3 Abandono escolar ........................................................................... 83 4.4.4 Evolução do corpo docente ............................................................. 84 4.4.5 Evolução das infra-estruturas e equipamentos escolares ............... 85 4.5 Educação para adultos ............................................................................. 85 4.6 Ensino especial ......................................................................................... 87 4.7 Manuais e merenda escolar ..................................................................... 87 4.8 Ensino superior ........................................................................................ 88 4.8.1 O crescimento e suas implicações ................................................... 90 4.8.1.1 O crescimento do número de estudantes ........................... 91 4.8.1.2 O crescimento do número de docentes .............................. 101 4.9 Despesas com a educação ....................................................................... 103 4.9.1 Peso da despesa com a educação no OGE ...................................... 105 4.9.2 Repartição da despesa com a educação nos diferentes níveis

de ensino ......................................................................................... 105 4.9.3 Estimativa da despesa per capita com a educação ......................... 106 4.9.4 Despesa per capita nos ensinos primário e secundário .................. 108 4.9.5 Despesa per capita global ............................................................... 109

5. A situação da família e da criança (realidade, compromissos e desafios) ... 110 5.1 Introdução ................................................................................................ 110 5.2 Realidade socioeconómica da família em Angola .................................... 111 5.2.1 Estrutura demográfica ..................................................................... 111 5.2.2 Estado civil e relações conjugais ..................................................... 112 5.2.3 Tamanho e estrutura do agregado familiar ..................................... 113 5.2.4 Habitação e meio ambiente ............................................................ 114 5.3 Água e saneamento ................................................................................. 116

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5.4 Bem-estar e conforto (mobilidade, acesso a informação e novas tecnologias) .............................................................................................. 116

5.5 Impacto da pobreza sobre a família e a criança ....................................... 117 5.6 Os 11 compromissos com a criança e o Orçamento Geral do Estado ...... 120 5.7 Despesas com a família e infância ............................................................ 121

6. Segurança alimentar e nutricional (dos conceitos às realidades) ................ 123 6.1 Introdução ............................................................................................... 123 6.2 Antecedentes do termo segurança alimentar .......................................... 124 6.3 Identidade conceitual sobre segurança alimentar ................................... 125 6.4 Conceitos relacionados à segurança alimentar e nutricional ................... 126 6.5 Política pública da segurança alimentar e nutricional .............................. 127 6.6 Potencial para promover segurança alimentar e nutricional .................. 127 6.7 Segurança alimentar e nutricional na dimensão da disponibilidade ....... 128 6.8 Casos locais de disponibilidade e acesso na segurança alimentar ........... 129 6.9 Segurança alimentar e nutricional na dimensão do acesso .................... 133 6.10 Conhecimento sobre a situação da segurança alimentar

e nutricional ....................................................................................... 137

7. Actores não-estatais na acção do desenvolvimento e da solidariedade ...... 142 7.1 Introdução ................................................................................................ 142 7.2 Hospital Divina Providência...................................................................... 143 7.2.1 Estrutura física do HDP, sua capacidade e funcionamento ............. 143 7.2.2 Áreas de atendimento ..................................................................... 144 7.2.3 Consultas externas .......................................................................... 144 7.2.4 Centro de tratamento de tuberculose ............................................ 144 7.2.5 Consultas pré-natais ........................................................................ 144 7.2.6 VIH/SIDA ......................................................................................... 144 7.2.7 Consultas especializadas ................................................................. 145 7.2.8 Laboratório de análises e radiologia ............................................... 145 7.2.9 Centro Nutricional Terapêutico/Seguimento e Vigilância

Nutricional....................................................................................... 145 7.2.10 Transfusões/Crianças Vacinadas/Vacinas ...................................... 145 7.2.11 Situação epidemiológica ............................................................... 146 7.2.12 Recursos humanos e sustentabilidade do hospital ....................... 146 7.2.13 Relações externas.......................................................................... 147 7.2.14 Dimensão holística ........................................................................ 148 7.3 MOSAIKO – Instituto para a Cidadania ..................................................... 148 7.3.1 Introdução ...................................................................................... 148 7.3.2 Acções desenvolvidas em 2013 ....................................................... 149 7.3.2.1 Aconselhamento jurídico e seminários ............................... 149

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7.3.2.2 Conferências e debates ....................................................... 150 7.3.2.3 Publicações ......................................................................... 150 7.4 Monitoria social e boa governação – o caso do CICA ............................. 150 7.4.1 Resenha Histórica ............................................................................ 150 7.4.2 Monitoria social e boa governação ................................................. 151 7.4.2.1 Área e âmbito de implementação do Projecto ................... 151 7.4.2.2 Acções desenvolvidas em 2012 e constatações feitas......... 151

8. Monografia sobre a situação social no Município do Negage ...................... 154 8.1 Introdução ................................................................................................ 154 8.2 Caracterização geográfica ........................................................................ 154 8.3 Caracterização administrativa e demográfica .......................................... 156 8.3.1 Comuna do Quisseque .................................................................... 164 8.3.2 Comuna do Dimuca ......................................................................... 165 8.4 Caracterização política e social ................................................................ 166 8.5 Igrejas ....................................................................................................... 167 8.6 Educação .................................................................................................. 168 8.7 Saúde ....................................................................................................... 171 8.8 Agricultura e pecuária .............................................................................. 175 8.9 Viação e trânsito ...................................................................................... 178 8.10 Comércio e hotelaria .............................................................................. 179 8.11 Conclusão ............................................................................................... 181

CONCLUSÃO ..................................................................................................... 183

APÊNDICE ........................................................................................................ 185

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................. 190

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INTRODUÇÃO

O Relatório Social de Angola procura, todos os anos, fornecer às pessoas uma visão panorâmica sobre a situação social do país. O CEIC recorre a indicadores esta-tísticos, a dados sistémicos e à análise conjuntural, para dar a conhecer as condições de vida e as percepções dos cidadãos sobre o desenvolvimento do país, nos mais diversos domínios.

A perspectiva multidimensional adoptada associa várias maneiras de abordar a questão do desenvolvimento, levando em consideração quer a relação renda/consumo, quer a perspectiva da privação da qualidade de vida do IDH, do PNUD, quer ainda outras dimensões ligadas à liberdade política, à segurança das pessoas e à participação na vida da comunidade.

Este relatório apresenta uma estrutura idêntica aos demais com uma novidade em relação à inserção, pela primeira vez, de um capítulo dedicado a uma monografia de um município, no caso vertente, o município do Negage. Consagra-se também um capítulo ao problema da segurança alimentar, repetindo os demais capítulos dedicados ao compromisso com a saúde, a educação, a família e a criança, bem como sobre o papel dos actores não estatais no desenvolvimento e solidariedade. O primeiro capítulo está, este ano, menos virado para a “configuração política” e mais para “a participação dos cidadãos na gestão e controlo das políticas públicas”. Há também um apêndice final com a cronologia dos factos político-sociais do ano.

A coordenação

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1. PARTICIPAÇÃO DOS CIDADÃOS NA GESTÃO E CONTROLO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

1.1 Introdução

A preocupação do presente relatório, neste capítulo, prende-se com a forma como decorreu a gestão das políticas públicas no país, durante o ano de 2013, tendo em conta o desempenho das instituições do poder, o funcionamento do espaço público, os modos de participação dos cidadãos, a qualidade das suas interven-ções, a existência e o funcionamento das instituições representativas, bem como, a interacção entre os cidadãos e os governantes ao nível nacional, provincial e local. Pretende-se analisar aspectos concretos do modo de funcionamento da con-figuração política e da participação dos cidadãos, quer como indivíduo, quer em grupos ou organizações sociais, dando lugar também às percepções que os diversos actores sociais têm do espaço político nacional. Por isto, este relatório procura dar a conhecer a configuração política nacional, não meramente formal, mas aquela que as dinâmicas do processo político determinam, através das acções e reacções dos diversos actores envolvidos, dando importância não apenas à acção do poder mas também à participação dos cidadãos no espaço público e à sua percepção sobre o exercício do poder.

O contexto político e social de Angola, em 2013, foi marcado por uma série de dinâmicas que exigem uma profunda reflexão em relação ao papel desempenhado pelas instituições do Estado, com realce para a garantia dos direitos dos cidadãos e a gestão democrática das políticas públicas. Este ano político foi marcado por muitos factos que podem ser arrumados em três grandes temas: a relação entre o poder e os direitos dos cidadãos, a sucessão do Presidente da República, e o processo de implementação das autarquias, como expressão da institucionalização de espaços de decisão democrática, de uma aproximação do poder dos cidadãos e da sua partilha por diversos actores. O interesse primordial destes temas, que estão necessariamente interrelacionados, é ainda maior quando alguns analistas consideram que estes podem ser tendentes a emprestar certa imprevisibilidade, no futuro desenvolvimento político nacional.

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CEIC / UCAN

O relatório presta particular atenção à maneira como as instituições do Estado lidaram com as reivindicações e exigências dos cidadãos ligadas ao direito à mani-festação (Artigo 47.o, CRA), à governação e ao exercício do poder local, às liberdades de expressão e a outros aspectos relacionados com a gestão participativa e descen-tralizada das políticas públicas.

Apesar da Constituição da República garantir e estimular a participação dos cidadãos (Artigo 52.o, CRA), quer ao nível individual, quer através de organizações representativas dos seus interesses, nos processos de formulação das políticas públicas e na monitoria e controlo das formas como estas são implementadas, de uma forma geral, constatou-se que em 2013 as iniciativas de participação das instituições da sociedade civil, com o propósito de acompanhar a gestão das políticas públicas e o controlo das acções do governo, foram escassas, salvo raras excepções como foi o caso do projecto de monitória social implementado pelo CICA, e o acompanhamento da actuação governamental face às situações de abuso dos direitos humanos, feita por algumas organizações da sociedade civil, ligadas à problemática dos Direitos Humanos.

O que foi marcante foram as diferentes tentativas de manifestação e protestos promovidas por cidadãos maioritariamente jovens ligados a um movimento denomi-nado “Movimento Revolucionário”, mas que encontraram da parte das autoridades impedimentos, tendo muitas das vezes resultado em actos de violência e detenção de manifestantes.

Para muitos dos cidadãos os desafios e os constrangimentos, que limitaram a participação dos cidadãos na vida pública, não estão directamente relacionados com a aprovação de novas leis (com excepção da lei sobre as autarquias locais), mas sim com a interpretação que as instituições do Estado fazem dos preceitos constitucionais e com a maneira como estas lidam com as pressões que determinados segmentos da sociedade civil e política fazem para viabilizar a participação dos cidadãos, ao nível da gestão descentralizada das políticas públicas ou mesmo com os actos de mobilização que visam a realização de manifestações públicas contra o Executivo.

Portanto, a percepção generalizada dos cidadãos é a de que em 2013 os cons-trangimentos verificados no exercício de participação cívica dos cidadãos resultam sobretudo da falta de vontade política e não tanto da ausência de mecanismos jurídicos e legais para a viabilização das mesmas.

Apesar das limitações que representam para a participação dos cidadãos o facto de não estarem em funcionamento as autarquias locais, conforme previsto na Cons-tituição, pensamos que o formato institucional existente dispõe de uma série de espaços de interacção, auscultação, consulta e diálogo entre as instituições públicas

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do Estado e os cidadãos, através dos seus representantes mas que na maior parte dos casos não funcionaram, e os poucos que celebraram eventos, o fizeram de maneira pouco inclusiva, numa metodologia que impediu a auscultação e a concertação entre os governantes e os governados e que apresentava certos questionamentos em relação à legitimidade dos indivíduos indicados para representar diversos segmen-tos da sociedade civil com a qual se pretendia dialogar. Como exemplo, podemos citar o caso do processo de diálogo juvenil, o caso dos Conselhos de Auscultação e Concertação Social (CACS), ao nível dos municípios, e outros espaços de interacção entre os cidadãos e os governantes que não funcionaram, facto reconhecido pelo próprio Presidente da República e chefe do executivo, embora na sua qualidade de presidente do partido no poder, aquando do seu discurso de abertura da reunião do Comité Central do MPLA celebrada a 7 de Janeiro deste ano.

Portanto, há a percepção generalizada de que apesar de existirem por lei uma série de espaços institucionais vocacionados para facilitar a actuação efectiva dos cidadãos em processos de interacção com as instituições do Estado, no âmbito da gestão das políticas públicas, na maior parte dos casos, estes espaços não funciona-ram segundo as expectativas e os propósitos que estiveram na base da sua criação.

O modelo de gestão que procura incorporar nas suas estruturas orgânicas espaços de interacção com vários segmentos da sociedade, tendo como propósito o de incorporar a visão e a percepção dos cidadãos e, desta forma, democratizar a gestão das políticas públicas, revelou-se pouco eficaz em 2013. Os cidadãos, à semelhança do que tem acontecido em outros anos, tiveram poucas oportuni-dades de interagir com as instituições do Estado em processos de deliberação, gestão e controlo de políticas públicas, nas mais diversas áreas sociais, ainda que em muitas destas políticas estivesse previsto a sua participação activa como é o caso da Estratégia Nacional de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza, a Estratégia Nacional de Segurança Alimentar, o Fórum Nacional de Educação para Todos e outros.

Perante estas evidências e constatações, colocam-se algumas questões que sur-gem da necessidade de discussão sobre a gestão participativa em Angola, e sobre o aprofundamento das questões relacionadas com os mecanismos e formas de gestão das políticas públicas como resultado dos encontros e desencontros na relação entre as instituições do Estado e os cidadãos em Angola. As questões são as seguintes:

A configuração política do país permite consolidar um formato de gestão das políticas públicas que tenha como eixo basilar a democratização e a participa-ção dos cidadãos na implementação das políticas públicas? Em que medida o contexto social e político de 2013 possibilitou a consolidação de um modelo de gestão pública participativo?

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As diversas dinâmicas e exigências de participação da sociedade civil em Ango-la estão a influenciar o delinear de novas tendências na gestão das políticas públicas?

1.2 O desempenho das instituições do Estado na viabilização da participação dos cidadãos nos processos de gestão das políticas públicas

A realidade angolana tem sido marcada, nos últimos 10 anos, por mudanças sociais, políticas e institucionais que procuram acompanhar as tendências globais em relação aos processos de democratização da gestão das políticas públicas, como ocorre em quase todo o mundo. Neste sentido, temos notado em 2013 que continuam a existir reivindicações da parte dos cidadãos, principalmente dos mais destacados actores da sociedade civil, segundo as quais as diferentes instituições do Estado continuam a levantar barreiras que obstaculizam a efectiva participação dos cidadãos nos processos de tomada de decisão, gestão e controle das políticas públicas. Embora previstos na lei, nos regulamentos e em outros mecanismos institucionais formais e informais, na maior parte dos casos, as dife-rentes instâncias do poder do Estado não conseguiram fazer funcionar, de forma efectiva e regular, iniciativas e espaços de consulta, diálogo, concertação e outros mecanismos que visam assegurar o envolvimento e a participação dos cidadãos, em casos como acções de demolição e realojamento dos cidadãos, Conselhos de Auscultação e Concertação Social, ao nível de todos os municípios, aldeias, comu-nas e províncias, bem como outros processos que requeriam o envolvimento dos cidadãos ou de instituições da sociedade civil, em sua representação.

Esta dificuldade que as instituições do Estado apresentam para viabilizar a participação e o envolvimento dos cidadãos tem feito com que seja muito redu-zido o segmento da sociedade civil que se mobiliza de maneira regular e com base na lei, em prol da conquista de melhores condições de vida, salvaguarda dos seus direitos e democratização das formas de gestão das políticas públicas. Ante inúmeras barreiras e constrangimentos, as mobilizações dos cidadãos tendem a ocorrer de maneira esporádica, pontual e, às vezes, fazendo recurso a estratégias pouco consentâneas com a lei, a ordem e a ética para poder fazer ouvir a sua voz ou assegurar os seus direitos.

Apesar da abertura política e do processo de descentralização, o facto de que não tenha ainda ocorrido a ruptura com as atitudes, comportamentos e práti-cas paternalistas, proteccionistas, autoritárias e centralizadoras, no exercício do poder (em certos casos tende, inclusive, a intensificar-se) faz com que os secto-res mais privilegiados da nossa sociedade desenvolvam formas e mecanismos capazes de influenciar as diferentes instituições que administram as políticas

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públicas em nome do interesse próprio e fora dos espaços e mecanismos formais existentes para o efeito, o que facilita a existência de tráfico de influência e casos de corrupção. Embora, do ponto de vista formal, se tenham realizado encontros de auscultação e concertação social, quer ao nível local, quer ao nível central, com destaque para os Conselhos de Auscultação e Concertação Social, aos níveis municipais e provinciais, o Conselho da República (Artigo 135.o, CRA) não reúne há vários anos e o Conselho Nacional de Concertação Social (CNCS), tendo reuni-do, foi presidido pelo Vice-Presidente da República.

Perante a pressão da rua, foram realizadas, a nível nacional, várias sessões de diálogo com a juventude cujo ponto mais alto foi o encontro dos jovens, em representação de todas as províncias e vários segmentos da nossa sociedade, com o Presidente da República, mas tais encontros ainda estão muito longe de assegurar a participação da população, por meio de organizações representativas, dos mais variados segmentos da população no processo de formulação, controle e gestão das políticas públicas ao nível municipal, provincial e nacional, mesmo porque os promotores das manifestações de jovens e os segmentos que repre-sentam foram ostensivamente deixados de fora destes fóruns.

A Constituição apresenta também uma configuração que prevê a interacção entre os cidadãos e outras instituições do Estado, através de mecanismos oficiais tais como as comissões de trabalho da Assembleia Nacional e o Provedor de Jus-tiça, porém, apesar da sua relevância, do ponto de vista das oportunidades de participação que representam para os cidadãos, estes mecanismos não foram eficazes nem se considera que tenham tido alguma contribuição relevante para a participação dos cidadãos em matéria de responsabilização do Executivo, em relação às políticas públicas que implementou e ao atendimento eficiente e eficaz das demandas dos cidadãos ou mesmo da abertura aos cidadãos para discussão de assuntos do seu interesse, aqui exceptuando o caso de algumas comissões da Assembleia Nacional, que promoveram eventos que contaram com a participação de actores da sociedade civil, com destaque para a 1.a Comissão que auscultou os parceiros sociais do governo antes da aprovação, na especialidade, do Orçamento Geral do Estado, depois deste ter sido aprovado na generalidade, o que se tradu-ziu na irrelevância das muitas propostas recenseadas.

Olhando para o desempenho das instituições vocacionadas para a gestão das políticas públicas, em diversas áreas sociais, tais como a saúde, a educação, a assistência social, etc., os níveis de participação e inserção da sociedade civil na formulação e controlo de tais políticas também foram escassos. Embora tenham sido realizados uma série de eventos, tais como os conselhos consultivos, comis-sões de trabalho que contaram com a participação da sociedade civil, em alguns

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ministérios, não foram criados novos mecanismos, nem sequer foram utilizados de maneira eficiente os tais espaços de participação das organizações da socie-dade civil, na definição e implementação e, muito menos ainda, de avaliação das políticas públicas, em 2013. Ao nível dos municípios, aldeias, comunas e bairros, existem, em muitas delas, comissões de moradores, e outras formas de articula-ção que os moradores e utentes de determinados serviços públicos estabelecem de maneira permanente ou pontual. No entanto, foram muito poucas as oportu-nidades para que estas pessoas pudessem participar na formulação, controlo e gestão de políticas públicas, ao nível local, limitando-se a sua participação à volta de questões muito pontuais, à medida que surgem necessidades que só podem ser resolvidas com a contribuição da população local.

O processo de descentralização administrativa e política ainda não atingiu a fase de institucionalização das autarquias, como está prescrito na Constitui-ção da República (Artigos 213.o a 222.o, CRA) mas foram introduzidas reformas institucionais que visaram dotar os municípios de alguma autonomia que lhes conferem uma certa margem de poder para a tomada de decisão, ao nível local, e tal autonomia tem permitido que, em alguns casos, as administrações locais esta-beleçam relações de parceria com organizações não-governamentais, permitindo a estas uma certa capacidade de influência sobre a gestão, quase nunca sobre a formulação e o controlo de algumas políticas públicas ao nível local. Embora estas experiências ocorram em muito poucos municípios e as suas possibilidades de sucesso sejam muito dependentes do carácter, da personalidade e da vonta-de de quem está à frente de uma dada administração, convém destacar que as limitações deste formato são impostas pelos baixos níveis de descentralização e autonomia efectiva que possuem as administrações locais e pela capacidade dos actores da sociedade civil para se envolverem com as autoridades locais à volta de políticas públicas concretas. A agenda da reforma da administração local que previa a democratização dos processos de tomada de decisão e o envolvimento dos cidadãos na gestão e controlo das políticas públicas esteve muito longe de se concretizar, em 2013. De forma geral, não se conseguiu superar as caracte-rísticas autoritárias e paternalistas muito presentes nas formas de governação e nos mecanismos de interacção entre as instituições do Estado e a sociedade civil. Ao nível nacional, a execução das políticas públicas continuaram a caracterizar--se pela excessiva centralização do poder financeiro e de tomada de decisão no aparato do Estado, cabendo aos níveis municipais e às organizações da sociedade civil, quando envolvidos na gestão de políticas públicas específicas, um papel mais de meros executantes de políticas públicas definidas ao nível central, a quem coube, mais uma vez, mais de 80% das verbas previstas no OGE para pro-gramas e projectos, em 2013.

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Como consequência desta tendência centralizadora e do fraco nível de envol-vimento da sociedade civil, à medida que as políticas são implementadas e os recursos, sobretudo os financeiros, são controlados apenas pelo nível central, verifica-se, em muitos casos, relações de interacção entre as autoridades locais e as organizações da sociedade civil, e até do sector privado, que tendem a ser informais, baseadas nas relações de amizade existentes entre os intervenientes e com fortes riscos de desencadear actos de corrupção e clientelismo, sem mui-ta margem para que as instituições da administração local possam estabelecer compromissos no sentido de identificar, implementar e até monitorar projectos e programas com apoio dos seus parceiros locais da sociedade civil. Por esta razão, salvo raras excepções, podemos dizer que a característica central da gestão das políticas públicas, em 2013, foi a de exclusão da sociedade civil, ao longo de todo o processo de formulação, implementação e controlo das mesmas. Na maior parte dos casos, os processos de tomada de decisão em relação a muitas políticas públicas não envolveram os parceiros sociais do governo, com fortes riscos de se tornarem processos imbuídos de fortes laivos de clientelismo, corporativismo e burocracias desnecessárias. Outro elemento que afectou o desempenho das instituições do Estado na garantia e viabilização do direito de participação dos cidadãos na vida pública teve a ver com a desarticulação e, até certo ponto, frag-mentação institucional que ocorreu nos diferentes níveis do governo. Um caso que pode elucidar este facto é o do Programa Municipal Integrado de Desenvol-vimento Rural e Combate à Pobreza (PMIDRCP) que passou a ser liderado, em todas as componentes, pelo Ministério do Comércio, embora a sua execução seja feita pelas administrações municipais, sem uma grande margem de poder para tomada de decisões ao nível local. Tal desenho institucional dificultou a coordenação entre os diferentes sectores ministeriais, bem como retirou em muitos casos o poder de decisão das administrações locais, tendo como principais implicações a falta de eficiência e efectividade dos Conselhos de Auscultação e Concertação Social (CACS), que em princípio ao nível municipal seriam o espaço onde as administrações locais e os representantes da sociedade civil deveriam identificar os problemas, escolher as prioridades e acompanhar a execução do programa, ao nível de cada município. Podemos então concluir que, ao contrário do que se ambicionava, o processo de descentralização política e administrativa, tal como decorreu em 2013, não permitiu um maior nível de municipalização das políticas públicas, o que de certa forma limitou o desempenho das admi-nistrações municipais em matéria de articulação e envolvimento dos actores da sociedade civil, ao nível local, primando pela rigidez e hierarquização excessiva dos processos decisórios e ausência de participação cívica na gestão e controlo da acção governamental.

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1.3 Desempenho das Organizações da Sociedade Civil nos processos de gestão e controlo das políticas públicas

Desde início dos anos 1990 que os diferentes actores da sociedade civil em Angola vêm falando da necessidade de participação dos cidadãos nos assuntos que são do seu interesse e na vida pública. Em 2013, foram muitas as iniciativas dos diversos actores da sociedade civil no sentido de reivindicar a participação social e o envolvimento dos cidadãos nos processos de identificação, formula-ção, implementação e controlo da execução das mais diversas políticas públicas. Influenciadas por uma conjuntura global que exige das instituições do Estado um maior aprofundamento da democracia, através da criação de mecanismos que possibilitam o surgimento de espaços de diálogo, concertação e auscultação dos governados pelos governantes, tende a aumentar o número de organizações da sociedade civil angolana que se assumem disponíveis para participar activamen-te ao longo de todos os processos de gestão e controlo das políticas públicas. Porém, a participação democrática e o controlo social das políticas públicas não é entendido da mesma maneira pelos diferentes actores de uma sociedade civil que é diversa, complexa e muito pouco articulada à volta de causas comuns.

Para algumas instituições, a participação democrática no processo de tomada de decisão e acções públicas resume-se a uma presença nos espaços em que são convidados pelas instituições do Estado, a realizações de actividades de carácter cultural, cívico, desportivo ou filantrópico, actuando como instituições cujas acti-vidades são complementares às acções do governo. Entretanto, é cada vez mais notória a emergência de iniciativas protagonizadas por uma série de actores da sociedade civil que, contrariamente aos seus confrades que defendem a postura anteriormente descrita, assumem publicamente que a participação democrática nas decisões e acções públicas é um direito que deve ser conquistado. Nesta perspectiva, tais actores realizaram diversas acções com vista à mobilização dos cidadãos à volta de questões como o direito à manifestação, contra as demolições de residências, em favor de uma maior abertura dos governantes ao diálogo e à negociação, em função de situações concretas que tiverem de enfrentar. Em 2013, as acções de mobilização e as tentativas de manifestação intensificaram-se e ganharam maior visibilidade, sobretudo porque aglutinaram a maior parte dos partidos políticos que protestaram contra o assassinato de dois activistas que haviam desaparecido, aquando das manifestações dos ex-militares, em 2012.

Ao nível das comunidades, embora com menos visibilidade, proliferam uma série de organizações comunitárias de base, quer sejam associações de campo-neses, grupos de moradores, fóruns de discussão, que com o apoio de algumas ONG, ou por iniciativa e necessidade próprias, têm procurado dialogar com as autoridades sobretudo ao nível local.

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Da questão do direito de manifestação resultam outros temas, nomeadamen-te o da sucessão de José Eduardo dos Santos, do diálogo com a juventude e o da figura emblemática de Manuel Nito Alves, que pela sua mediatização e impor-tância marcaram igualmente o ano de 2013. Manuel Nito Alves, jovem menor, integrante do Movimento Revolucionário, foi preso por ter mandado imprimir umas camisolas com a inscrição “quando a guerra se torna urgente e necessá-ria”, glosando o título de um livro publicado por Domingos da Cruz que também teve problemas com os órgãos de polícia e que foi posteriormente absolvido em tribunal. O jovem permaneceu na cadeia, sem culpa formada, mais de 50 dias, e foi objecto de várias manifestações de solidariedade, não somente na rua e nas redes sociais, mas também, facto inédito, em pleno parlamento, quando o Presidente da República, na abertura do ano legislativo, se preparava para fazer a sua alocução sobre “o estado da Nação”, os deputados da oposição empunharam cartazes a pedir a libertação do jovem activista.

Na verdade, continuou a ser destaque o movimento de jovens que se autode-nomina “Movimento Revolucionário” que desde 7 de Março de 2011 tem vindo a protagonizar várias tentativas ou manifestações e protestos públicos nas ruas da cidade de Luanda (e também em Benguela) cuja postura se caracteriza pela recu-sa em estabelecer relações de subordinação, tutela ou cooptação por parte do Estado, partidos políticos ou outras instituições da sociedade civil. Estes elemen-tos, na sua maioria jovens, constituem um grupo pequeno mas persistente de pessoas que se mobilizam em torno da conquista, garantia e ampliação do direito de manifestação e outros direitos, sobretudo os civis e políticos. Comenta-se que das suas insistentes reivindicações surgiu a necessidade das instituições do Esta-do responderem com o lançamento do processo de diálogo juvenil que envolveu centenas de jovens em todas as províncias do país e culminou com a Conferência Nacional da Juventude, um evento no qual os jovens apresentaram uma série de preocupações ao Presidente da República que o presidiu, bem como a cria-ção ou recuperação pelo Executivo de programas destinados exclusivamente à juventude. Ao nível dos espaços de concertação e consulta mereceu destaque o envolvimento de algumas organizações da sociedade civil, sobretudo ONG, nos mecanismos de consulta que diversas instituições do Estado criaram à volta da definição de políticas públicas como foi o caso da proposta de Lei sobre as Coo-perativas Agrícolas, da Lei sobre Assistência Social, do desenho de alguns perfis e planos de desenvolvimento municipais, da discussão da nova pauta aduaneira, etc. Embora tais espaços sejam vistos, muitas das vezes, como pouco funcionais e servindo, às vezes, os interesses das instituições do Estado que os utilizam para legitimar medidas que pretendem implementar, ainda que sem a anuência dos seus parceiros sociais, a participação contribui, de certa forma, para a inten-sificação das relações entre o Estado e os cidadãos e pode abrir caminho para

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aumentar, num futuro breve, o conhecimento e cimentar as relações de coopera-ção entre as partes. Do ponto de vista dos resultados concretos destes espaços, pouco há a assinalar, até porque na maior parte dos casos estes espaços não são deliberativos, quanto muito são propositivos, e deixam muito poucas possibilida-des para que os actores da sociedade civil possam dar seguimento à forma como as suas propostas são incorporadas pelas autoridades responsáveis pela gestão destes processos.

De uma forma geral, pode-se concluir dizendo que embora tenha aumentado a pré-disposição e a vontade dos actores da sociedade civil em participarem acti-vamente nos processos de gestão e controlo das políticas públicas, a realidade aponta mais para níveis de participação cujos resultados estão condicionados à vontade política das instituições do Estado e à capacidade de mobilização social e influência política das organizações da sociedade civil.

Por isto também, como expressão da sua completa desilusão com o Estado, o Movimento Revolucionário, que denuncia “a corrupção, o excesso de poder e de tempo no poder” do Presidente da República, insiste na mobilização do des-contentamento dos jovens descamisados para se manifestarem na rua, transfe-rindo para a política institucional a sua influência. Consta que o tema da sucessão entrou, mais recentemente, no espaço público por impulso das manifestações mas tornou-se ainda mais pertinente e objecto de maior circulação na opinião pública, nomeadamente em várias reflexões surgidas no espaço público, pelo facto do Presidente da República ter reconhecido a longevidade da sua perma-nência no poder (35 anos) e ter admitido, em entrevista televisiva, a necessi-dade (e “vontade”, nas suas próprias palavras) de o abandonar para se dedicar ao desporto (sua vocação primeira, segundo ele próprio). Ao ser acometido de doença repentina que o levou a sair do país e o obrigou a permanecer ausente do país, cerca de 40 dias, avolumaram as inquietações e as especulações sobre essa necessidade de sucessão do PR. A doença do PR não foi admitida oficialmente, apesar do facto inusitado da sua longa ausência. Da mesma maneira que não foi formalmente substituído pelo Vice-Presidente da República, como indica a Cons-tituição (Artigo 132.o, 3, CRA), embora este, na prática, tenha assumido “a gestão corrente do Estado”, enquanto a comunicação social pública procurava criar, na opinião pública, a impressão de que o Presidente da República estava no país e em pleno uso das suas capacidades (físicas e mentais) pois a cada obra inaugura-da pelo ministro A ou B, era associada à iniciativa iluminada de “Sua Excelência”1.

1 A questão da saúde do Presidente da República deve ou não ser considerada uma questão de interesse público, tendo, por isto, a opinião pública direito a ser informada sobre ela, no limite do respeito da intimidade da pessoa que exerce o cargo?

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Adrede à questão do estado de saúde do Presidente da República surgem rumores de ter havido acções tendentes a um golpe de Estado, rumores que ganharam consistência retórica ao ser a questão aflorada, nos órgãos de comu-nicação social, pelo 2.o Comandante da Polícia Nacional, o Comissário Paulo de Almeida, aos microfones da Rádio Eclésia2, depois da fuga de informação do interior dos Serviços de Informação e Segurança (SINSE/ex-SINFO) sobre a morte macabra de dois activistas da oposição, Isaías Kassule e Alves Kamulingue, ter sido apresentada, por alguma imprensa, como resultante de uma “guerra” inter-na de poder que teve, por um lado, como consequência mediática a exoneração do director do SINSE (Sebastião Martins) e, por outro, o controlo efectivo dessa estrutura de contra-inteligência interna pela Casa de Segurança da Presidência da República, como no passado, a imputação, não provada em tribunal, de uma mesma intenção de “golpe de Estado” por parte do então chefe do Serviço de Informação Externa (SIE), Fernando Miala, teve como resultado o controlo desta instituição. Medidas estas que são vistas como uma forma de garantir uma suces-são controlada pelo próprio PR, sem grandes constrangimentos, nem excessivos anticorpos no seio da sociedade e do partido de poder e não como uma mudança substancial do poder perante as violações de direitos e, nomeadamente, do direi-to à vida, negado repetidas vezes por execuções sumárias, extrajudiciais, atribuí-das a forças de segurança e de polícia.

Este ano de 2013 foi também marcado pelo facto do Estado angolano ter sido objecto de uma queixa contra si, apresentada pela organização autono-mista, “Protectorado da Lunda-Tchokwé”, junto da procuradoria do Tribunal Penal Internacional (TPI), pela violação de direitos humanos nas províncias das Lundas. Na verdade, houve também, ao longo do ano, várias denúncias de violação de direitos humanos, da liberdade de imprensa e de exclusão socioeco-nómica, em consonância com o reconhecimento do Presidente da República, na sua mensagem ao país sobre “o estado da Nação”, de haver um “crescimento a diferentes velocidades de vários segmentos sociais”, o que por si só é contrário à Constituição. Mas que este desenvolvimento separado, não se deve, nas pala-vras do mais-alto magistrado da Nação, a “uma política deliberada para perpe-tuar a injustiça social”, mas, tão-somente, é inerente ao “período de transição para o Estado social e a economia de mercado que será uma sociedade inclusiva e próspera”.

2 Consta também que o CEMG-adjunto para a Educação Patriótica, o General Egídio de Sousa Santos “Disciplina”, foi falar da questão numa reunião do BP do MPLA.

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2. POPULAÇÃO, CONDIÇÕES DE VIDA E POBREZA

2.1 População

As informações demográficas sobre Angola continuam a ser lacunares e con-traditórias. Mesmo entre as fontes internacionais notam-se, de ano para ano, discrepâncias entre as cifras sobre o número de habitantes em Angola. Daí a relevância do Recenseamento Geral da População a realizar-se durante o mês de Maio de 2014.

O Instituto Nacional de Estatística apresenta uma série sobre a população desde 2003, dispersa por alguns documentos e estudos de sua autoria, mas em especial o Anuário de Estatísticas Sociais 2010, onde se divulga uma projecção até 2015.

Cotejando estas informações com as de algumas instituições internacionais como o FNUAP e o Banco Mundial (World Development Report 2013) verificam-se diferenças significativas para as estimativas da população.

POPULAÇÃO

INE WDR 2013 FNUAP

2003 15507

2004 15957

2005 16420 16500

2006 16896

2007 17386

2008 17890

2009 16889

2010 17430 19100

2011 17992 19400

2012 18577

2013 19184 21500

De acordo com o FNUAP (The State of World Population 2013), a população de Angola em 2013 foi de 21,5 milhões de habitantes, uma diferença de cerca de

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2,3 milhões de habitantes a mais, comparativamente às estimativas do INE. Qual-quer uma das cifras da tabela anterior é baseada em estimativas e, portanto, as diferenças só podem derivar de diferentes modelos de previsão usados. O Recen-seamento Eleitoral de 2008, ajustado pelo de 2012, pode ajudar a compreender a redução do quantitativo de população de 2008 para 2009.

Mas as diferenças projectam-se igualmente noutras variáveis demográficas relevantes:

A taxa média anual de crescimento demográfico é de 3,2% para o INE e de 3,1% para o FNUAP e 2,9% para o Banco Mundial.

A esperança de vida à nascença – importante indicador para o cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano – é de 48,9 anos para o INE e de 51,5 anos para o FNUAP em 2013.

A taxa de fertilidade total é de 5,66 crianças por mulher em idade de procria-ção e de 5,9 para o FNUAP (talvez justificando a diferença para mais nas suas estimativas para a população).

A proporção de população jovem, entre 10 e 19 anos, é de 21%.

Em 2013, a África Subsariana apresentou o seguinte retrato demográfico resumido:

A população total dos seus 48 países foi estimada em 888 milhões de habi-tantes, cerca de 18% da população total mundial.

A taxa média anual de crescimento natural da população tem sido de 2,6%, uma diminuição de 0,3 ponto percentual em relação à média verificada entre 2000/2010.

A esperança de vida à nascença está calculada em 56 anos em termos médios.

A taxa geral de fertilidade é de 5,2 crianças por mulher em idade de reprodução.

A população com idades entre 10 e 19 anos representa 23% do total.

Como se sabe, existe uma polémica sobre se a taxa de crescimento demográ-fico em Angola é ou não ajustada, ou seja, demasiado baixa ou excessivamente elevada? No Relatório Social de 2012 esta matéria era polemizada nos termos seguintes: “O crescimento demográfico em África tem sido considerado como um dos obstáculos ao desenvolvimento económico, justamente porque o continente africano é o último espaço regional no mundo a viver a fase aguda da crise da transição dum regime demográfico arcaico para um regime demográfico moder-no, no sentido dado anteriormente. As consequências de crescimentos demo-gráficos incontroláveis são desastrosas: diminuição da subsistência alimentar, a despeito duma percentagem elevada da população se dedicar à agricultura, em

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particular nos casos em que a taxa de crescimento demográfico supera a da pro-dução agrícola, feita em solos degradados e gastos; êxodo rural maciço (a média da população urbana em África passou de 8% para 45% em menos de 30 anos); deterioração das condições gerais de vida, muito em especial nos centros urba-nos e crescimento das economias informais”.

Para além das posições das diferentes igrejas sobre a necessidade de se garan-tir uma reprodução alargada da população – baseada em princípios de doutrina religiosa – existem outras de natureza mais económica e política que radicam na necessidade de se ocupar um espaço territorial tão vasto e que em determinadas áreas está a ser preenchido por estrangeiros oriundos dos países fronteiriços de Angola (e não só), de acelerar o crescimento económico com base na máxima criação de emprego (modelos de desenvolvimento baseados na intensidade de força de trabalho) e de tornar mais equilibrada a distribuição regional da popula-ção. No entanto, reflexões sobre eventuais efeitos perniciosos decorrentes dum excessivo crescimento demográfico também abundam, como as de Jeffrey Sachs, que entende que “o número de habitantes no planeta continua a crescer em grande escala e, sobretudo, nas regiões que menos condições apresentam para garantir saúde, educação, estabilidade e prosperidade aos cidadãos”3. Os receios deste economista americano residem na escassez de recursos, na pressão do crescimento populacional sobre ecossistemas cada vez mais frágeis (em particu-lar nas regiões mais pobres do planeta), no aumento da pobreza e na ameaça da estabilidade política global.

A distribuição espacial da população em Angola apresenta-se desequilibra-da, essencialmente explicada pelos movimentos migratórios provocados pela instabilidade militar que durante 27 anos abalou a vida dos cidadãos e também pela prolongada crise económica que sacudiu o país durante a guerra civil, com a falência quase completa da agricultura e actividades conexas e mesmo da indús-tria transformadora, apesar de se localizar totalmente nas cidades.

Desde então Luanda e algumas províncias do litoral do país são as de maior concentração da população, cujo índice chegou a mais de 50% em anos ante-riores. Depois de 2002 esperava-se que a paz, a reconciliação nacional e a livre circulação de pessoas e bens pudessem contribuir, juntamente com a deslocali-zação dos investimentos (públicos e privados) e uma maior aposta do Orçamen-to Geral do Estado no combate contra as assimetrias regionais, para se levar o crescimento económico ao interior do território nacional. Porém assim ainda não aconteceu. Quanto mais nos afastamos do litoral maiores são as manchas de sub-desenvolvimento económico e de desertificação humana.

3 Jeffrey Sachs – Common Wealth, Casa das Letras, Lisboa, 2008.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Os gráficos seguintes, construídos na base das informações do INE4, traduzem a realidade actual da dispersão da localização populacional em Angola.

2%2%

3%10%

2%3%

2%

2%

5%

2%

29%

2%

10%

8%

6%

6%4%

4%

REPARTIÇÃO GEOGRÁFICA DA POPULAÇÃO EM 2009

FONTE: INE.

CabindaZaireUíge

Kwanza SulMalanjeLunda Norte

LuandaKwanza Norte

BenguelaHuambo

BiéMoxicoCuando Cubango

CuneneLunda SulBengo

NamibeHuíla

2%2%

3%10%

2%3%

2%

2%

5%

2%

28%

2%

9%

8%

6%

7%4%

4%

REPARTIÇÃO GEOGRÁFICA DA POPULAÇÃO EM 2013

FONTE: INE.

4 INE – Projecção da População 2009-2015, Fevereiro de 2012 e Anuário de Estatísticas Sociais – Dados de 2010, 2012.

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Algumas observações:

Em 4 anos, Luanda continuou a ser a parcela do território nacional de maior concentração populacional e a perda de um ponto percentual entre 2009 e 2013 não significa que tenha diminuído a sua capacidade de atracção de população.

Kwanza Sul e Huambo são duas províncias claramente “ganhadoras” em popula-ção, ao aumentarem as respectivas participações relativas entre 2009 e 2013: de 6,4% para 7,6%, para a primeira, e de 7,6% para 8,3%, para a segunda província.

Os ganhos demográficos do Huambo, embora sem significado ainda definido, podem, no entanto, ser sinais de alguma recomposição do tecido económico e produtivo do país, no sentido da capacidade de atracção de pessoas.

Todavia, 4 anos é pouco tempo para se assistir a movimentos estruturais de recomposição demográfica, ao que se acrescem as eventuais dúvidas sobre as informações estatísticas do INE baseadas em estimativas que, conforme se afir-mou mais atrás, em termos globais diferem bastante dos números avançados por algumas instituições internacionais credíveis.

E não será o Recenseamento Geral da População e Habitação que dissipará estas dúvidas, sendo necessário esperar-se mais 10 anos para se terem termos e padrões de comparação.

Por grandes regiões, o panorama da repartição geográfica da população con-tinua a ser de excessiva concentração – apesar dos ganhos económicos que pode propiciar, os prejuízos sociais arriscam-se a serem maiores, em termos de quali-dade dos equipamentos sociais e de acesso a serviços básicos de educação, saúde e habitação – com Luanda, Kwanza Sul e Benguela a serem as mais representati-vas neste item.

REPARTIÇÃO GEOGRÁFICA DA POPULAÇÃO EM 2009

Luanda, Kwanza Sul, BenguelaCentro NorteLesteCorredor do Lobito

10%

20%

44%

26%

FONTE: INE.

NOTAS: Leste: Lunda Norte, Lunda Sul, Moxico e Cuando Cubango. Centro-Norte: Cabinda, Zaire, Uíge, Kwanza Norte, Malanje e Bié. Corredor do Lobito: Benguela, Huambo, Bié e Moxico.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

REPARTIÇÃO GEOGRÁFICA DA POPULAÇÃO EM 2013

Luanda, Kwanza Sul, BenguelaCentro NorteLesteCorredor do Lobito

11%

20%

43%

26%

Fonte: INE.

NOTAS: Leste: Lunda Norte, Lunda Sul, Moxico e Cuando Cubango. Centro-Norte: Cabinda, Zaire, Uíge,

Kwanza Norte, Malanje e Bié. Corredor do Lobito: Benguela, Huambo, Bié e Moxico.

Algumas notas:

O litoral centro do país (Luanda, Kwanza Sul e Benguela) concentra quase 50% da população total de Angola, a que corresponde uma densidade de activida-de económica de quase 90% (PIB, negócios, comércio, banca e seguros). Esta circunstância reflecte-se no emprego, sendo estas três províncias as de maior localização e preferência de mão-de-obra. Luanda pode mesmo ser a província com a menor taxa de desemprego5, dada a importância do seu mercado infor-mal de trabalho, a quase perfeita réplica de um mercado tipicamente liberal, onde as entradas e saídas se processam a grande velocidade de adaptação e sem grandes custos de contexto.

Não são visíveis movimentos migratórios significativos entre as províncias ou espaços agregados, permanecendo as zonas Centro-Norte e Leste com a mesma importância relativa entre 2009 e 2013. Dir-se-á que o essencial das migrações internas ocorreu durante a guerra civil e que a paz e a estabilidade política, depois de 2002, não têm sido factores suficientes para que as províncias mais distanciadas dos centros políticos, económicos e administrativos recuperem a exuberância demográfica dos tempos coloniais ou mesmo seguintes à inde-pendência.

5 Apesar da relevância do tema, o INE, no seu Inquérito ao Emprego em Angola 2009, 2010 e 2011, desvalorizou (ou não quis publicar) o desemprego e as respectivas ta-xas por províncias, preferindo relevar outras variáveis, marginais e secundárias face ao problema das assimetrias regionais no país. No estudo “Desequilíbrios e Assimetrias Regionais” (Alves da Rocha, 2.a edição, editado pelo CEIC/UCAN em 2011) estimou-se uma taxa de desemprego para a região Luanda/Bengo de 17,7% em 2007 (página 87).

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O corredor do Lobito (Benguela, Huambo, Bié e Moxico), uma das grandes esperanças para a difusão do crescimento económico do litoral para o inte-rior, em quatro anos não demonstrou capacidade de atracção significativa de população, apesar das extraordinárias potencialidades económicas que apresenta.

As dinâmicas de crescimento demográfico estão expressas na tabela seguinte.

DINÂMICAS DE CRESCIMENTO POPULACIONAL REGIONAL

2009/2011 2011/2013 2009/2013

Cabinda 3,3 3,4 3,3

Zaire 4,4 4,3 4,4

Uíge 2,4 2,5 2,5

Luanda 2,2 2,3 2,2

Kwanza Norte 4,5 4,4 4,5

Kwanza Sul 5,0 4,8 4,9

Malanje 3,3 3,3 3,3

Lunda Norte 3,7 3,7 3,7

Benguela 2,6 2,7 2,7

Huambo 5,0 4,8 4,9

Bié 3,7 3,7 3,7

Moxico 3,7 3,7 3,7

Cuando Cubango 4,3 4,2 4,3

Namibe 3,8 3,8 3,8

Huíla 2,7 2,8 2,7

Cunene 4,0 3,9 4,0

Lunda Sul 4,3 4,2 4,3

Bengo 4,5 4,4 4,5

ANGOLA 3,2 3,3 3,2

Os destaques vão para as províncias do Zaire, Kwanza Norte, Kwanza Sul e Huambo (as duas com as mais elevadas taxas de incremento demográfico), Cuan-do Cubango, Lunda Sul, Bengo e Cunene. Se as províncias do Huambo e do Kwanza Sul mantiverem o seu ritmo de variação, a sua população de 2013 poderá ser duplicada em 14 anos.

Apenas 4 províncias apresentaram taxas médias anuais de crescimento demo-gráfico 2009/2013, abaixo da média nacional.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

TAXAS MÉDIAS DE CRESCIMENTO 2009/2013 (%)

Huíla

Lunda Su

l

Cunene

Namib

eCuando Cubango

Moxic

oBié

Benguela

Luanda

Uíge

ANGOLABengo

Huambo

Lunda N

orte

Malanje

Kwanza Su

l

Kwanza N

orteZa

ire

Cabinda

3,3

4,4 4,54,9

3,33,7

4,9

3,7 3,7

4,33,8 4,0

4,3 4,5

Acima da média Abaixo da média

3,2

2,5 2,22,7 2,7

FONTE: INE.

2.2 Condições de vida e Índice de Desenvolvimento Humano

São variados os indicadores que medem as condições de vida da população, sendo os mais utilizados o PIB por habitante – ou, segundo as organizações internacionais, o rendimento nacional bruto por habitante em paridade do poder de compra – o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o consumo de electricidade pelas famílias. O IDH é um excelente medidor da evolução das condições de vida dos agregados familiares, ao sintetizar indicadores de rendi-mento, de educação e de saúde, afinal os três eixos fundamentais da vida das pessoas em sociedade.

O indicador de rendimento é o de maior relevância para Angola, agora país de rendimento médio elevado de acordo com a classificação do Banco Mundial6, mas nos restantes as deficiências ainda são evidentes. De resto, as diferenças entre os “ranking” do rendimento por habitante e do próprio IDH continuam a permitir concluir que o crescimento económico não se tem transformado em oportunidades de desenvolvimento social.

Muitos países do Human Development Index das Nações Unidas apresentam um rendimento por habitante inferior ou igual ao de Angola, mas o valor do IDH é superior, equivalendo afirmar que esses países, através de políticas públicas adequadas, conseguiram transformar o crescimento em melhorias das condições gerais de vida da maioria dos cidadãos.

6 World Bank – World Development Report 2014.

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CEIC / UCAN

Segundo evidências empíricas de outros países, a questão central está no modo como se processa a distribuição do rendimento, pelos factores de produ-ção (repartição funcional ou primária) e pelos cidadãos (repartição secundária ou pessoal, com a influência do sistema fiscal e das transferências para a economia).

O Programa de Governo do MPLA para 2013-2017 destaca, em matéria de dis-tribuição do rendimento, “continuar a desenvolver e consolidar as acções que visam uma melhor repartição do rendimento nacional”, acreditando-se ser suficiente a implementação de “programas municipais de desenvolvimento integrado e combate à pobreza”, “programas de rendimento mínimo e outras formas de protecção social” e de “fomento habitacional numa perspectiva de integração económica e social”. Apa-rentemente deixa-se incólume o essencial do actual modelo de reprodução alargada de desigualdade e injustiça. Aliás, o emblema “crescer mais para distribuir melhor”, se inscrito com efectiva vontade política de aplicá-lo, significa precisamente actuar sobre os actuais mecanismos de acesso ao rendimento nacional, tornando-os mais demo-cráticos, transparentes e justos, o que se afigura muito complicado dado o enquis-tamento das actuais fortunas; distribuir melhor é retirar a quem tem para transferir para quem não tem, impossível no actual estado de organização política do país.

O Índice de Desenvolvimento Humano é hoje o indicador mais relevante para a análise das condições de vida da população e para o cálculo duma medida que permita compreender quanto de crescimento económico se transforma em desenvolvimento.

Seguramente que a situação social é hoje bem melhor que em 2002, sendo a evolução do IDH uma boa aproximação à medida destas transformações.

EVOLUÇÃO DO IDH EM ANGOLA

0,000

0,500

0,300

0,400

0,200

0,100

19901992

19941996

19982000

20022004

20062008

20102012

FONTE: PNUD, Human Development Index; Paulo de Carvalho – Exclusão Social em Angola, p. 110, 1990/94.

Ainda não está disponível o Relatório sobre o Desenvolvimento Humano do PNUD 2014, pelo que se transcrevem as observações feitas no Relatório Social de 2012 sobre o comportamento deste indicador:

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

“Baixo valor do IDH entre 1990 e 1999, em média na vizinhança de 0,37. São dos piores anos da guerra civil, durante os quais as despesas orçamentais tiveram uma prioridade quase absoluta em favor da defesa e segurança. A urgência da guerra determinou uma subalternização dos sectores sociais e o IDH só não foi mais baixo pelo facto de o PIB por habitante – uma componente que vale um terço no compósito do desenvolvimento humano – foi aumentando graças à produção de petróleo. Mas mesmo assim, 1998 foi o de mais baixo preço do barril de petróleo.

Um curto período de transição entre 1999 e 2002 em que se pressentia a resolução do conflito militar interno e as condições para o crescimento da economia se estruturavam.

Finalmente, o período de maiores conquistas no desenvolvimento humano em Angola: 2002/2012. É patente o declive positivo da recta representativa do comportamento temporal do IDH, não só devido ao crescimento do PIB e do PIB por habitante, mas igualmente por causa das melhorias nas componentes sociais do índice (esperança de vida e taxa de escolaridade). No entanto, o valor do IDH ainda não ultrapassou a fasquia de 0,5 fundamental para o país deixar o grupo dos países de desenvolvimento humano baixo. Questões relacionadas com a pobreza e a distribuição do rendimento ajudam a compreender a razão pela qual os aumentos marginais do IDH (taxas de crescimento anual) tenham sido muito pouco expressivos”.

Com efeito, o ritmo médio anual de variação do IDH tem sido muito inferior ao do PIB e do PIB por habitante, em paridade do poder de compra. Na verdade, entre 1995 e 2012, as taxas médias anuais de variação foram de, pela ordem apresentada, 2,4%, 8,2% e 5,7%.

2.3 Pobreza e poder de compra dos salários

A questão da remuneração da força de trabalho em Angola é uma das mais relevantes para a melhoria das condições de vida dos habitantes e, por essa via, para corrigir alguns dos mecanismos existentes de repartição do rendimento nacional.

De acordo com as Contas Nacionais do INE7, o salário médio mensal nacional, em 2010, era de 26.117 Kwanzas, um pouco mais de 260 dólares (ou 8,7 dóla-res por dia). Comparado com o salário médio mensal da Função Pública (cerca de 42.337 Kwanzas, em 2010), a diferença é de mais de 16.200 Kwanzas, para menos.

7 INE – Contas Nacionais 2002-2010.

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CEIC / UCAN

Relativamente aos salários da Função Pública constata-se que entre 2003 e 2013 o salário real médio mensal variou cerca de –8,9%. No entanto, e graças ao controlo da inflação (que se reduziu a partir de 2010 de forma sustentada para se situar em 7,7%, em 2013), entre 2010 e 2013, registou-se uma melhoria no poder de compra do salário real, cujo incremento foi de praticamente 4%.

EVOLUÇÃO DO SALÁRIO NOMINAL E REAL EM KWANZAS, COM INFLAÇÃO ACUMULADA DESDE 2003

2003 2005 2011 20130,0

50.000,0

20.000,0

60.000,0

40.000,0

10.000,0

30.000,0

Sálario real Salário nominal

2007 20092004 2006 20122008 2010

FONTE: CEIC, Ficheiro O poder de compra dos salários.

O gráfico anterior permite justamente ver de que modo o salário real e o salá-rio nominal se comportaram, entre 2003 e 2013, tomando como referência de desvalorização a inflação acumulada entre esses dois anos extremos do período. Se a correcção do salário nominal for feita tendo por referência apenas a inflação registada em cada ano do mesmo período de tempo, então verifica-se, também devido aos ganhos da redução da inflação, corrigidos pelos aumentos mesmo que não proporcionais dos salários da Função Pública, um ganho médio anual nos salários reais de 21,5%.

COMPARAÇÃO ENTRE SALÁRIO NOMINAL E REAL EM KWANZAS, COM INFLAÇÃO ANUAL

2003 2005 2011 20130,0

50.000,0

20.000,0

60.000,0

40.000,0

10.000,0

30.000,0

Sálario real Salário nominal

2007 20092004 2006 20122008 2010

FONTE: CEIC, Ficheiro O poder de compra dos salários.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Em termos de ganhos e perdas de poder de compra dos salários médios da Função Pública, a tabela e o gráfico seguintes expressam, em números, o seu comportamento entre 2003 e 2013.

Poder de compra Perda acumulada

2003 –4,4 –4,4

2004 –7,2 –11,2

2005 –0,3 –11,5

2006 –1,5 –12,8

2007 1,1 –11,9

2008 0,2 –11,7

2009 –0,9 –12,5

2010 –4,3 –16,2

2011 –2,7 –18,5

2012 –2,7 –16,3

2013 4,0 –12,9

São claras algumas tendências:

Uma diminuição na perda anual do poder de compra dos salários, entre 2010 e 2013.

Um ganho de poder de compra, em 2012 e 2013, resultado conjugado do controlo da inflação e dos ajustamentos salariais pela inflação e pela produtividade.

EVOLUÇÃO DO PODER DE COMPRA DOS SALÁRIOS

2003 2005 2011 2013-20,0

0,0

-15,0

5,0

-5.0

-10,0

Perda acumulada Poder de compra

2007 20092004 2006 20122008 2010

FONTE: CEIC, Ficheiro O poder de compra dos salários.

A pobreza é um tema polémico, porque ninguém gosta de ser considera-do pobre – ainda que o seja do ponto de vista de critérios internacionalmente definidos – e também devido ao facto de os governos se sentirem mal com a

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CEIC / UCAN

prevalência deste fenómeno, pois corresponde afinal à falência das suas políticas sociais e de distribuição do rendimento.

Também em Angola esta exclusão social, material e imaterial, é tema de muita controvérsia, preocupando as autoridades e a sociedade civil, mas não havendo convergência quanto ao efectivo valor do índice que a mede.

Um medidor aproximado da taxa de pobreza é dado pelo PIB por habitante: quanto mais baixo for o seu valor, maior a probabilidade de a taxa de pobreza ser elevada. Normalmente, e de acordo com muitas evidências empíricas, é nos países onde este rácio é mais baixo que as desigualdades na distribuição do ren-dimento são mais expressivas. Por isso, costuma-se aceitar que um dos caminhos para se alterar a taxa de pobreza é o do crescimento económico. E isto mesmo tem-se verificado em Angola, embora o efeito de contágio sobre os rendimentos da população pobre esteja inquinado pelos mecanismos de “rent seeking” de dis-tribuição da renda petrolífera. O PIB por habitante (sem a correcção pela parida-de do poder de compra, o parâmetro internacional de ajustamento das grandezas económicas de modo a torná-las comparáveis) passou de 826 dólares, em 2002, para 5.762,50 dólares, em 2013, uma progressão média anual de 19,3%, em ter-mos nominais. Por isso é que se pode admitir ter havido uma melhoria dos níveis de vida dos diferentes estratos populacionais, ainda que com diferenças assinalá-veis entre as classes sociais de maiores posses e rendimentos.

EVOLUÇÃO DO PIB POR HABITANTE (DÓLARES CORRENTES)

2002 2005 2011 20130,0

50.000,0

20.000,0

60.000,0

40.000,0

10.000,0

30.000,0

PIB por habitante

2007 20092004 2006 20122008 20102003

FONTE: CEIC, Ficheiro Quadro Macroeconómico Comparativo.

Mas permanecem situações de pobreza significativa em Angola, aliás iden-tificadas no IBEP que representa o primeiro grande estudo sobre as condições de vida da população. De acordo com os seus resultados, a taxa de pobreza em 2009 era de 36,6% e quase 60% dos cidadãos nacionais tentavam sobreviver com menos de 2 dólares por dia.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

O World Development Report 2014 do Banco Mundial apresenta uma tabela onde uma das variáveis de caracterização dos países é a “poverty headcount ratio”, cujo valor para Angola é de 77,1%, em 2010, para uma linha de pobreza de 2,5 dólares por dia, em paridade do poder de compra8. Ou seja, se o míni-mo para se considerar uma pessoa ou um agregado familiar pobre for de 2,5 dólares por dia, então em Angola existiam mais de 77% de pessoas nessas con-dições, o que não deixa de ser relativamente consistente com os dados do IBEP, para 2009.

Outro dado do maior interesse é o valor da taxa de pobreza, se o rendimento limite fosse de 10 dólares, por dia, também em paridade do poder de compra9. A tabela seguinte fornece informações para alguns países.

POVERTY HEADCOUNT RATIO (% da população) (dados para 2010)

Países $2,5/por dia (PPC) $10/por dia (PPC)

Angola 77,1 98,9

Brasil 15,1 64,4

Camarões 42,9 95,2

RDC 97,0 100,0

Congo 81,8 98,7

Malásia 6,2 55,1

Quénia 76,6 98,4

Moçambique 84,4 99,5

Nigéria 86,3 99,8

África do Sul 39,5 79,5

Os países de maior concentração de rendimento, em 2010, eram Angola, a RDC, os Camarões, a República do Congo, o Quénia, Moçambique e a Nigéria, onde o limiar de 10 dólares, por dia, transformaria, virtualmente, toda a popula-ção em pobres.

Como nas versões anteriores do Relatório Social se tem dito, o CEIC tem uma metodologia que lhe permite, em cada ano, e face a um leque de informações económicas e sociais, estimar a taxa de pobreza no país. O exercício foi ajustado pelas novas taxas de crescimento do PIB10 e da população, que segundo o INE é

8 Banco Mundial, World Development Report 2014, p. 301.

9 Este exercício já foi apresentado no Relatório Social de 2011, para uma linha de pobre-za de 10 euros, por dia.

10 Cálculos feitos segundo indicadores do Executivo angolano e do Fundo Monetário Internacional.

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CEIC / UCAN

de 3,2% ao ano (o que, evidentemente, prejudica o valor e a dinâmica de evolu-ção do PIB por habitante, uma das variáveis-chave do nosso modelo11).

Os resultados constam da tabela seguinte.

Taxa crescimento do pib

Taxa crescimentopopulação

Taxa crescimentoPIB per capita

Taxa de pobreza

2009 2,1 3,2 –1,0 40,8

2010 3,6 3,2 0,3 40,6

2011 3,4 3,2 0,2 40,5

2012 5,3 3,2 2,0 39,7

2013 4,1 3,2 0,9 39,3

2014 5,3 3,2 2,0 38,4

2015 5,5 3,2 2,2 37,5

2016 5,9 3,2 2,6 36,5

2017 3,3 3,2 0,1 36,4

O Governo estabeleceu como meta para 2017 reduzir a taxa de pobreza de 36,6% para 28%12. Para isso, tornar-se-á necessário que:

a taxa média de crescimento do PIB, entre 2014 e 2017, seja de 11% ao ano;

se melhorem os canais de redistribuição do rendimento, através dos impostos e das prestações sociais, a que poderá corresponder uma elasticidade rendi-mento/pobreza de –1,85;

a taxa de crescimento demográfico se mantenha em 3,2%. Uma diminuição deste valor pode poupar tempo na obtenção desta meta ou diminuir a exi-gência na melhoria do padrão de distribuição do rendimento nacional no país.

Uma elasticidade rendimento-pobreza de –1,85 pressupõe canais de transmis-são dos efeitos do crescimento económico abertos e politicamente desbloquea-dos. O processo de acumulação primitiva de capital teria de cessar nos contornos injustos, desequilibrados, desestruturantes e assimétricos que o caracterizam actualmente e ser substituído por um modelo de distribuição do rendimento mais centrado no emprego, nas remunerações do trabalho e no incremento da produtividade. O crescimento do PIB é um factor essencial para a redução da pobreza, mas é-o também a alteração do modelo de concentração do rendimento e da riqueza vigente.

11 A outra é a “elasticidade rendimento-pobreza” uma “proxy” do efeito contágio do crescimento económico sobre os rendimentos da população.

12 Vide Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017, p. 40.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

3. COMPROMISSO COM A SAÚDE

3.1 Quadro epidemiológico

O quadro epidemiológico do país mostra tendências divergentes relativa-mente às cinco doenças mais notificadas (Malária, Doenças Respiratórias Agudas (DRA), Doenças Diarreicas Agudas (DDA), Disenteria e Febre Tifóide), ao longo dos últimos anos. Tal como nos anos anteriores e como se pode observar no gráfico abaixo, a malária (56%) continua a liderar as doenças mais notificadas, em 2013, seguida das DRA (21%) e das DDA (9%). Porém, assinala-se uma inversão na ter-ceira e quarta posições que passaram a ser ocupadas pela febre tifóide (5%) e pela disenteria (4%), respectivamente. Mas, diante da progressão, quer da febre tifóide, quer das DRA, ambas em cerca de dois pontos percentuais, regista-se a manutenção das DDA e da disenteria e a descida da malária, em seis pontos per-centuais. Para além de se registar agora a presença da tuberculose convencional (1%). As outras doenças notificadas (4%), no seu conjunto, excluindo a tuberculo-se, permanecem em idêntico nível, em relação ao actual total de 4,4 milhões de notificações, este ano (2013). Há pois uma variação decrescente de notificações, em relação ao ano anterior, de 22,9%, significando uma redução de mais de um milhão de registos.

MaláriaD. Resp. AgudasD. Diarr. Agudas

Tuberculose Conv.Outras

DisenteriaFebre Tifóide

56%1%

5%

9%

4%

4%

21%

QUADRO EPIDEMIOLÓGICO 2013

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CEIC / UCAN

Este cenário, não sendo muito diferente do dos anos anteriores, indica uma dupla realidade: por um lado, uma acção mais eficaz no combate ao vector de transmissão da malária, que resultou na redução considerável de casos noti-ficados e, por outro, o agravamento da qualidade de vida em relação ao meio ambiente, nomeadamente quanto à poluição do ar, ao saneamento e à qualidade da água consumida.

O número de óbitos para todas as doenças registadas cifrou-se, este ano, em 11.904 mortes, o que se traduz num índice de mortalidade de 0,27%, superior ao do ano transacto que foi de 0,23%. O quadro de óbitos, no seu conjunto, tem apresentado uma tendência decrescente em relação aos cinco últimos anos, como se pode verificar pelo gráfico abaixo.

QUADRO DE ÓBITOS COMPARATIVO

2009 2010 20130

5.000.000

2.000.000

7.000.000

6.000.000

4.000.000

1.000.000

3.000.000

0

16.000

4000

20.00018.000

12.000

2000

80006000

14.000

10.000

ões Óbitos

2011 2012

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

Desde 2009 que se verifica uma queda de óbitos, cuja taxa acumulada é de –31,59% e uma taxa média anual de –6,32% devido à variação (negativa) suces-siva de –8,79% (2009/2010); –0,43% (2010/2011); –20,49% (2011/2012); –5,25% (2011/2012) e de –5,5% (2012/2013).

No entanto, ao olharmos para o quadro de óbitos provocados pelas doenças notificadas, parece haver uma evolução do quadro epidemiológico nacional no sentido de uma redução constante das doenças transmissíveis e de uma maior presença das doenças sistémicas, psicossomáticas e traumatológicas, como já se havia assinalado no relatório anterior. Pois, se é verdade que a malária (56%), em relação aos óbitos, em 2013, como sempre, predomina, a ordem das doenças que mais matam tem vindo a alterar-se, num duplo movimento, em que se regista uma redução de óbitos em relação às doenças habitualmente mais notificadas

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

(malária, DRA, DDA, disenterias e febre tifóide) e um aumento significativo dos óbitos por outras doenças como a tuberculose (9%), a malnutrição (7%) e o VIH/SIDA (5%), o que resulta num novo quadro de óbitos, como se pode constatar no gráfico abaixo.

56%

12%

5%

9%

11%

MaláriaD. Resp. Agudas

Outras doenças

Tuberculose Conv.Malnutrição AgudaSida

ÓBITOS

7%

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

É importante mencionar que a ordem de doenças que mais matam tem vindo a alterar-se desde há alguns anos. Em 2013, a malnutrição ganha espaço, com um valor relativo de óbitos de 7,2%, embora tenha apenas 0,5% de notificações, colocando-se entre as quatro doenças mais mortíferas do ano. Devem ainda ser alvo de atenção a tuberculose que tem registado em média 8,6% de óbitos, nos últimos quatro anos e a Sida que vem na quinta posição, registando 4,9% dos óbi-tos do ano.

DOENÇAS MAIS MORTÍFERAS EM ANGOLA

0

10

40

20

60

50

30

Tuberculose Mal nutrição Aguda SidaMalária D. Resp. Agudas D. Diarr. Agudas

2013201220112010

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

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CEIC / UCAN

3.1.1 Malária

3.1.1.1 Prevalência e letalidade

A malária, em 2013, registou cerca de 2,5 milhões de casos clínicos, o que se traduz numa prevalência de 11,84%. Em relação ao ano anterior, apresenta uma variação de –17,95% de casos notificados. O Serviço Nacional de Saúde procura a redução da prevalência da doença, mas a notificação dos casos tem ficado sem-pre acima do programado.

MALÁRIA

2003 2005 2011 2013

ões)

2007 20092004 2006 20122008 2010

3,2

2,52,3 2,3

2,7

3,43,7 3,7

3,5

3,0

2,5

Em relação aos óbitos foram registados 6518 óbitos, o que corresponde a uma taxa de mortalidade de 0,26 e representa, em relação a 2012, uma variação posi-tiva de 13,6% de óbitos.

A análise do gráfico seguinte pode dar-nos uma ideia das flutuações regista-das, nos últimos dez anos (2003-2013). Este gráfico mostra concomitantemente uma grande redução da taxa de mortalidade (numa variação de 1,20 para 0,30) e uma regressão e aumento de casos notificados, depois de se ter observado uma brusca redução dos mesmos, entre 2003 e 2006. A evolução de casos notificados traduz, no entanto, uma certa estabilidade dos casos registados, e uma redução da taxa de prevalência, pois há a considerar um aumento constante da população do país, o que resulta num rácio para menos. Se considerarmos apenas os dois últimos anos, há a constatar uma redução de casos notificados e um contraditório aumento de mortes, o que pode significar, por um lado, a tradução positiva das políticas de combate ao vector de transmissão e de profilaxia e, por outro, uma maior incapacidade dos centros médico-sanitários em dar resposta aos casos notificados e/ou um agravamento nas condições dos doentes, quando recorrem

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

a esses centros médico-sanitários. Também não é de excluir, tal como já se veri-ficou no passado, a possibilidade do surgimento de novas estirpes (ou de outras doenças próximas, como a Dengue e a Xicungunha) e menor eficácia do fármaco utilizado no tratamento.

MALÁRIA

2003 2005 2011 20132007 20092004 2006 20122008 2010

3,2

2,52,3 2,3

2,7

3,43,7 3,7

3,5

3,0

2,5

1,2

0,5 0,60,4 0,3 0,3 0,3 0,2

0,4 0,30,3

Taxa de mortalidade (/1000)ões)

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

Nesta projecção (2003-2013), em relação aos casos notificados, depois de se ter registado cerca de 3,2 milhões de notificações (2003), observa-se uma curva descendente até ao ponto mais baixo de 2,3 milhões de casos (2005 e 2006), seguida de uma retomada ascendente até ao ponto mais elevado, de 3,7 milhões de notificações (2009 e 2010). Estes valores decrescem de forma sustentada, nos anos seguintes, para se fixarem em 2,5 milhões de casos, em 2013, o que corres-ponde a uma variação negativa de meio milhão de casos (16,7%), em relação ao ano anterior e um nível homogéneo a 2004, numa propagação média de 3,1%, por ano.

Em relação à taxa de mortalidade, os números têm mostrado, no período, uma certa estabilidade. Podemos estabelecer uma fraca ou negativa correlação, entre os casos notificados e a taxa de mortalidade, porque observa-se, embora de forma descontínua, desvios de tendência. Por exemplo: para as notificações, entre 2003 e 2006, verificam-se quedas, enquanto, entre 2006 e 2010, há cresci-mento e, entre 2010 e 2013, novamente um decréscimo. No entanto, em relação à taxa de mortalidade há uma queda constante da mortalidade, entre 2003 e 2010. No ano seguinte dá-se uma subida de dois pontos percentuais, para depois se tornar a pronunciar uma queda que se mantém nos dois anos seguintes. Entre 2003 e 2013, a taxa de mortalidade por malária cai, em média, 0,09 pontos per-centuais ao ano.

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CEIC / UCAN

Os grupos mais vulneráveis à doença, e em maior risco, são as mulheres grávidas e as crianças (de menos de 5 anos de idade). A malária é causa de internamento hospitalar em cerca de 10% de mulheres grávidas e cerca de 60% em crianças, com menos de 5 anos de idade, sendo causa de morte de 51,1% destas.

3.1.1.2 Formas de combate e tratamento

Em relação às formas de combate, são utilizados como métodos preventivos o mosquiteiro e a desinfestação com pulverização e fumigação de DTT. O tratamen-to é feito por Coartem e antipiréticos.

CASOS NOTIFICADOS E TRATADOS

2012 2013

ões

1,61,3 1,4

1,2

3,0

2,5

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

Em 2013, dos 2,5 milhões de casos notificados, 52% foram confirmados por laboratório e 48% foram confirmados e tratados com ACT, cifras inferiores às do ano anterior (2012), em que 53,3%, dos 3 milhões de casos notificados, foram confirmados por laboratório e 46,7% tratados.

As medidas implementadas pelo sector com o objectivo de inverter o qua-dro da malária, devem-se por um lado à distribuição de mosquiteiros tratados a 60,8 mil grávidas e a 340,8 mil crianças, menores de 5 anos de idade, bem como à administração de duas doses completas de Sulfadoxina Pirimentamina, para o TIP, a 653,1 mil grávidas, para além de terem sido confirmados laboratorialmente e tratados cerca de 1,3 milhões de casos, o que contribuiu seguramente para a redução de casos de malária e para a estabilidade do número de óbitos.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

INDICADORES DO PROGRAMA DA MALÁRIA (MIL)

Taxa de mortalidade

atribuídaà malária

(todas as idades)

N.o de casosde maláriaconfirmada

tratadacom ACT

Mulheres grávidasque receberammosquiteirosimpregnados

Criançasmenoresde 5 anos

que receberammosquiteiros

tratados

N.o de mulheresgrávidas

que fizeram2 doses completas

da SulfadoxinaPirimentamina

para o TIP

0,3 60,8

340,8

653,1

1314,7

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

Outro factor que contribuiu para a redução dos casos de malária é segura-mente a mudança de atitude positiva das famílias em relação à doença.

CASOS TESTADOS (MO E TDR)

Casos testados (MO e TDR)

100

44,455,6

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

O gráfico acima indica os casos diagnosticados por testes rápidos (TRD) e por microscopia óptica (MO), comummente designada “gota espessa”, que perfazem um total de 4,1 milhões de prescrições médicas, sendo 2,5 milhões de casos posi-tivos, que representam 55,6% do total. Os casos diagnosticados com resultados negativos são cerca de 1,6 milhões, que perfazem 44,4%.

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CEIC / UCAN

3.1.2 Doenças respiratórias agudas

As doenças respiratórias agudas são, a nível nacional, as doenças mais noti-ficadas, depois da malária, como já se deixou dito. Este ano (2013) foram notifi-cados 906.000 casos, de que resultaram 1324 óbitos, numa taxa de letalidade de 0,1%, confirmando uma tendência decrescente anterior, a partir de um pico de 1.317.864 casos, em 2011, depois de uma tendência de progressão de casos noti-ficados, desde 2008, como se pode observar no gráfico abaixo.

DRA

Óbitos ões (mil)

2008

1643

794,8

2009

1896

968,7

2010

1578

987,4

2011

2598

1317,9

2012

1621

1232,7

2013

1324

906

Há uma trajectória coincidente de casos e de óbitos, sendo o ponto mais alto em 2011 e o mais baixo em 2013, que regista um considerável decréscimo de óbitos em relação a 2012, ano em que se deu um acentuado agravamento dos óbitos, quando se vinha verificando uma sustentada redução dos casos de morte, nos anos anteriores, como se pode ver no gráfico abaixo.

Variação de casos de óbitos (%)

ÓBITOS POR DRA

2011 20132009 20122008 2010

2118 16,8 14,6

37,6

18,3

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

A geografia da doença mostra que as províncias mais afectadas continuam a ser Huambo (25,8%) e Luanda (20%), tendo-se, entretanto, verificado uma maior incidência nas províncias do Huambo (14,7 mil), Bié (8,7 mil) e Lunda Sul (8,5 mil).

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Uíg

e

Cabi

nda

Mox

ico

Beng

o

Beng

uela Bié

Cune

ne

Hua

mbo

Huí

la

Kwan

za N

orte

Cuan

do C

uban

go

Kwan

za S

ul

Luan

da

Lund

a N

orte

Lund

a Su

l

Mal

anje

Nam

ibe

Zair

e

DRA POR PROVÍNCIA

Casos Óbitos

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

Luanda é a província que mais mortes regista, facto a que não é alheio a gran-de concentração populacional, o meio ambiente poluído, o fraco saneamento básico e o tipo de actividades aí desenvolvidas.

Os grupos etários mais afectados pelas DRA são os bebés (1 a 12 meses de idade) e as crianças (com 1 a 4 anos de idade), que representam, no conjunto, 405,7 mil novos casos. Os bebés (até 1 mês) são os mais resistentes à doença mas são também os que mais morrem sempre que a contraem.

DOENÇAS RESPIRATÓRIAS AGUDAS POR FAIXA ETÁRIA

Casos Óbitos

1 Mês 1 a 12 Meses

1 a 4 Anos

5 a 9 Anos

10 a 14 Anos

15 a 24 Anos

25 a 49 Anos

50 ou maisAnos

30024.800

172.200

226.500

260 290 121 82 71 113 87

65.100

104.600

180.000

107.50090.200

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

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CEIC / UCAN

3.1.3 Doenças diarreicas agudas

As doenças diarreicas agudas são as terceiras mais notificadas, registando 390.800 casos, resultando em 500 óbitos, traduzindo-se numa regressão de casos em relação aos 495.500 casos, do ano anterior, e um mesmo número de 500 óbitos, parando a tendência de diminuição de óbitos e aumentando a taxa de letalidade da doença, já que em 2011 foram notificados 598,5 mil casos de que resultaram 900 óbitos e, em 2010, haviam sido registados 540,6 mil casos, para 2000 óbitos.

600.000

0

400.000

200.000

Casos

2000

0

1000

Óbitos

20132010 2011 2012

Esta doença assinala, em 2013, uma taxa de regressão de –21,13%, o que representa uma taxa de mortalidade global de 2,6/100.000 habitantes e uma taxa de incidência de 2037/100.000 habitantes.

As províncias de Luanda (97.000), Huambo (55.300) e Bié (49.000) destacam--se como as províncias que mais casos registaram. Os maiores níveis de óbitos foram registados nas províncias de Luanda (100), Benguela (80) e Bié (90).

0

40.000

80.000

60.000

100.000

20.000

Uíg

e

Cabi

nda

Mox

ico

Beng

o

Beng

uela Bié

Cune

ne

Hua

mbo

Huí

la

Kwan

za N

orte

Cuan

do C

uban

go

Kwan

za S

ul

Luan

da

Lund

a N

orte

Lund

a Su

l

Mal

anje

Nam

ibe

Zair

e

DDA POR PROVÍNCIA

Casos Óbitos

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

3.1.4 Disenteria

A disenteria registou, em 2013, 177.500 notificações, das quais resultaram 100 mortes, o que representa um aumento do número de notificações em 35,5%, e um aumento do número de óbitos em 31,8%. A disenteria é assim responsá-vel por 4% do total de casos notificados e 0,9% dos óbitos. No ano anterior, em 2012, registaram-se 131.000 casos, dos quais resultaram 85 em óbitos, o que não demonstra um aumento de eficácia da resposta médico-sanitária aos surtos registados ou um melhor conhecimento das populações sobre os procedimentos a observar para evitar os óbitos.

3.1.5 Febre tifóide

A febre tifóide registou, em 2013, 207.000 casos, a que corresponderam 175 óbitos, mais 40 óbitos que no ano anterior (2012), em que foram notificados 207.400 casos e registados 135 óbitos, o que quer dizer que esta doença decres-ceu em –0,16%, em termos de notificações, mas progrediu em óbitos a uma razão de 29,6%.

3.1.6 Tuberculose

A tuberculose pulmonar está associada a carência alimentar e ao VIH/SIDA e é uma doença cuja acção incapacitante é grande, atingindo particularmente as pessoas entre os 15 e os 45 anos, ou seja, a mão-de-obra activa do país. Em 2013, foram reportados 39.200 casos e 1000 óbitos, que representam uma queda de casos notificados em –16,4% e igualmente de –16,4% de óbitos, isto sem contar com os casos que não chegam ao sistema de saúde nacional.

As taxas de incidência e de letalidade da tuberculose, reportadas pela Direc-ção Nacional de Saúde Pública (DNSP), em 2013, são de 204,4/100.000 habitan-tes e de 2,6%, respectivamente, registando-se também uma incidência de 39,2 mil novos casos, dos quais 1,0 mil óbitos.

Porém, o Banco Mundial reporta uma taxa de incidência da doença, em 2012, de 316/100.000 habitantes. Segundo esta fonte, a taxa de incidência tem vindo a crescer de forma sustentada, desde 2002 a 2012, a uma taxa média de 287,2/100.000 habitantes, como se pode observar no gráfico seguinte.

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CEIC / UCAN

INCIDÊNCIA DA TUBERCULOSE (por 100.000 pessoas)

2003 2005 20112007 20092004 2006 20122008 20102002

260 265 270 276 281 287 292 298 304 310

Incidência da tuberculose (por 100.000 pessoas)

316

FONTE: CEIC de dados do Banco Mundial, 2013.

A distribuição da doença, por província, mostra uma realidade bastante assi-métrica, quer a nível de cuidados e de infra-estruturas afins, quer de redes de serviços.

NOTIFICAÇÃO DE TB POR PROVÍNCIA

ProvínciasCasos novos

BK(+)Casos novos

BK(–)Extra

pulmonarFracos

tratamentosTratados

Bengo 357 185 15 26 0

Benguela 3502 2013 767 1063 141

Bié 634 311 313 127 83

Cabinda 52 675 24 26 68

Cunene 654 230 48 199 31

Huíla 1130 1880 109 217 226

Huambo 525 738 695 51 58

Kwanza Sul 568 413 65 36 0

Kwanza Norte 450 244 18 30 9

Cuando Cubango 268 76 32 46 5

Luanda 5427 8158 1069 806 349

Lunda Sul 247 79 74 41 27

Lunda Norte 321 265 31 97 36

Malanje 333 129 7 48 4

Moxico 405 431 357 132 66

Namibe 626 2504 82 838 220

Uíge 395 376 43 50 33

Zaire 521 333 21 85 11

FONTE: DNSP/Programa de tuberculose, 2013.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Há no país cinco hospitais sanatórios (HS) que são unidades especializadas para atendimento diferenciado e gestão de casos complicados da doença, nas províncias de Luanda, Huambo, Benguela, Huíla e Cabinda. Como há também cinco Dispensários Anti-Tuberculose (DAT), nas províncias de Cabinda, Luanda, Benguela, Lunda Sul e Cuando Cubango.

REDE DE SERVIÇO DE TB E LABORATÓRIOS DE BK

ProvínciasMunicípios Redes de serviços TB

N.o com PNCT DOTS UT Lab. BK

Bengo 8 4 4 1 1

Benguela 9 8 17 2 17

Bié 9 8 8 8

Cabinda 4 4 4 5 4

Cunene 6 5 5 3 4

Huambo 14 7 7 2 7

Huíla 11 13 13 7 13

Cuando Cubango 12 1 1 1

Kwanza Norte 10 4 4 4

Kwanza Sul 9 2 2 8 2

Luanda 9 9 9 20 5

Lunda Norte 4 4 4 4

Lunda Sul 9 3 3 1

Malanje 14 2 2 2

Moxico 9 8 8 4 8

Namibe 5 2 2 5 2

Uíge 16 12 12 5 7

Zaire 6 6 6 1 5

FONTE: DNSP/Programa de tuberculose, 2013.

3.1.7 Doença do sarampo

O sarampo é uma doença que se pode prevenir, no entanto, ainda regista, em 2013, 285 óbitos, para 13.103 notificações, correspondendo a 2,18% de taxa de letalidade. A taxa de incidência situa-se em 68,3/100.000 habitantes e a taxa de mortalidade em 1,5/100.000 habitantes. As províncias que registaram as taxas de mortalidade mais elevadas foram Bié (7,4/100.000) e Lunda Sul (16,4/100.000) como se pode constar no gráfico seguinte.

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CEIC / UCAN

Uíge

Cabinda

Moxico

Bengo

Benguela

Bié

Cunene

Huambo

Huíla

Kwanza Norte

Cuando Cubango

Kwanza Sul

Luanda

Lunda Norte

Lunda Sul

Malanje

Namibe

SARAMPO

Casos Óbitos

92

226

122

711

577

114512

14

13

5

543

13705

2695

80

313

2295

61

20960

372

245

73923

736

1160

2

2

1

1

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

As faixas etárias mais afectadas foram as compreendidas entre o primeiro mês e os nove anos de idade, como se pode ver no gráfico abaixo.

50 ou mais Anos

25 a 49 Anos

SARAMPO POR FAIXA ETÁRIA

00

00

0

2

26

26615 a 24 Anos

10 a 14 Anos

5 a 9 Anos

1 a 4 Anos

1 a 12 Meses

1 Mês

535

99426

2187130

5755118

3366

Casos Óbitos

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

3.1.8 Doenças sexualmente transmissíveis

Para além do VIH, as doenças sexualmente transmissíveis continuam a susci-tar preocupação, não só pelo facto de algumas delas não terem cura, mas tam-bém pela sua tendência progressiva.

20112009 20122008 2010

DOENÇAS DE TRANSMISSÃO SEXUAL

24

61.440

81.732

79.856

92.127

106.283

16 6 69

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

As doenças sexualmente transmissíveis representam 2% do total de doenças notificadas, em 2013, e registam, neste ano, 86.287 casos, o que corresponde a um decréscimo de –9,2%, já que em 2012 registou 94.983 casos; depois de ter registado 104.239 e 79.856 casos, em 2011 e em 2010, respectivamente. Por seu lado, os óbitos passaram de 16 mortes (2010) para 3 mortes (2013), assinalando uma redução em 81% de óbitos.

Segundo o gráfico abaixo, em 2013, foram notificados 399 casos de HBC (Hepatite B), 2897 casos de HCV (Hepatite C) e 1166 casos de Sífilis.

IDENTIFICAÇÃO POSITIVA DE DOENÇAS TRANSMISSÍVEIS

HBS HCV SÍFILIS

2897

399

1166

Observação Microscópica

FONTE: CEIC de dados da DNSP, 2013.

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CEIC / UCAN

3.2 Indicadores-chave da saúde

Os indicadores-chave da saúde que mais interessam neste relatório são a mor-talidade materna, a mortalidade neonatal, a mortalidade infantil e a prevalência do VIH que são aqueles que mais influenciam a posição do país no Índice de Desen-volvimento Humano.

3.2.1 A mortalidade materna

A taxa de mortalidade materna é determinada pelo número de mulheres que morrem durante a gravidez ou o parto, por 100.000 nascidos vivos. Os dados sobre a mortalidade materna são pouco consistentes, ou pouco abrangentes, já que se baseiam, essencialmente, em registos institucionais, não havendo muita informação sobre as instituições de saúde privadas, militares e policiais, ou sobre os nascimentos fora do sistema de saúde formal.

TAXA DE MORTALIDADE MATERNA

2010 2005 2000

450650

890

Estimativas obtidas a partir da consolidação de dados provenientes de centros de prestação de serviços de saúde materno-infantil públicos, em várias províncias, apon-tam para uma taxa de mortalidade materna de 450 óbitos, por 100.000 nados vivos, quando o ODM respectivo prevê a meta de 350 mortes por 100.000 nados vivos.

Isto considerando uma taxa de fertilidade elevada, embora com uma tendên-cia decrescente, como se pode ver no gráfico abaixo.

TAXA DE FERTILIDADE, TOTAL (NASCIMENTOS POR MULHER)

20002001

20022003

20042005

20062007

20082009

20102011

5,65,8

66,26,46,66,8

7

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

É evidente que a gravidez é um estado que ainda comporta riscos para as mulheres angolanas, sobretudo porque, como se pode ver no gráfico abaixo, apenas cerca de um terço das mulheres grávidas do país (1.092.000) frequenta os serviços de saúde materno-infantis (fez, pelo menos, uma consulta pré-natal) e porque somente cerca de 47% (2013) destas tem parto assistido por pessoal de saúde qualificado, o que é superior ao da África Subsariana que apresenta uma média de 41%, que é baixa.

SAÚDE MATERNA (2013)

PlaneamentoFamiliar

GrávidasConsultaPré-natal

Partos

Realizados

ConsultaPós-parto

109.802

368.748

171.884

38.162

1.092.000

Mais de três quartos da mortalidade materna devem-se a causas directas, ou seja, decorrentes da própria gravidez (como abortos espontâneos, hemorragias e infecções), enquanto as restantes mortes resultam de doenças como a malária ou a hepatite.

MORTALIDADE MATERNA EM 2013

Causas DirectasCausas Indirectas

76%24%

Foram notificadas 550 mortes maternas institucionais públicas, tendo como principais causas directas a hemorragia (141), a pré-eclampsia (69), a infecção puerperal (37), a ruptura uterina (27), o aborto (30) e, como causas indirectas, a malária (79) e a hepatite (15).

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CEIC / UCAN

Existe um Plano Estratégico Nacional de Saúde Reprodutiva, onde as Políti-cas e Programas estabelecem a assistência aos cuidados obstétricos a partir do acompanhamento antes, durante e depois do parto. Também aumentou o apoio do FNUAP e da UNICEF, em matéria de saúde reprodutiva, nomeadamente, em formação técnica, fornecimento de kits de parto seguro e apoio técnico na elabo-ração das normas terapêuticas.

3.2.2 A mortalidade neonatal

A mortalidade neonatal é o número de óbitos registados nas quatro primeiras semanas de vida, isto é, entre 0 e 28 dias incompletos após o nascimento, por 1000 nados vivos. Como se pode ver no gráfico abaixo, desde 2000 que há uma tendência decrescente sustentada, embora seja cada vez menor.

TAXA DE MORTALIDADE NEONATAL (por 1000 nados vivos)

2003 2005 20112007 20092004 2006 20122008 2010200220012000

120,9 119,8 118,9 117,8 117,1 115,9 114,3 112,1 109,7 104,6107,1 102,2 99,5

FONTE: CEIC de dados do Banco Mundial, 2013.

A média da queda da taxa de mortalidade neonatal é de 112,3/1000. Esta redução foi possível devido aos cuidados associados à saúde materna e reprodu-tiva, acompanhamento da gravidez, consulta pré-natal, melhor nutrição (tendo a taxa de crianças subnutridas baixado de 31% para 16%), cuidados preventivos, cobertura vacinal, melhores cuidados de higiene e maior acesso à água potável. Por outro lado, o aumento da escolaridade e da escolarização da população per-mite um maior nível de acesso à informação sobre as formas de prevenção.

3.2.3 A mortalidade infantil

A mortalidade infantil, nos termos da definição dos indicadores da UNICEF, é “a probabilidade de morrer entre o nascimento e os cinco anos de idade, por mil nascidos vivos”. A sua taxa é um dos indicadores que espelha o nível de desenvol-vimento humano de um país. Este indicador coloca Angola nas piores posições do IDH. Apesar do fim da guerra, de novos investimentos sociais e programas dirigi-dos, o país continua no grupo de países com uma das piores taxas de mortalidade infantil do mundo (164/1000 (2012)).

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

TAXA DE MORTALIDADE, COM MENOS DE 5 (por 1000 nados vivos)

2003 2005 20112007 20092004 2006 20122008 20102000 20022001

203,4 201,3 199,6 197,6 196,4 194,2 191,1 187,1 182,6 177,9 173,1 168,5 163,5

A elevada taxa de mortalidade infantil e infanto-juvenil, em Angola, está ligada a constrangimentos fundamentais que são: o deficiente fornecimento de serviços e atendimento por profissionais da saúde, o baixo acesso a água potável, a redes sanitárias, ao saneamento básico, a má nutrição crónica e a carência de serviços urbanos adequados, bem como ao estado degradado das vias do interior que ligam as comunas rurais entre si e, sobretudo, à capital do seu município, onde há normalmente melhores infra-estruturas e serviços.

3.2.4 VIH/SIDA

O VIH/SIDA permanece uma grande preocupação, quer de saúde mundial, quer de saúde nacional. Até finais de 2013 registaram-se um total de 15.300 casos de VIH/SIDA, correspondendo a 0,3% do total de infecções registadas no país, numa população estimada em 21 milhões de habitantes.

Os gráficos seguintes mostram a situação do VIH, por idade, e indicam uma realidade pouco abonatória, quer para os homens, quer para as mulheres.

TESTE DE VIH, EM 2013, POR IDADES, HOMENS

Testes realizados

5 a 14 15 a 19 20 a 29 30 a 39 40 a 49 50 a 59 60 ou mais

886

9935 11.699

59.914

743 3820 3048 2448 1093 4026433

17.437

48.13138.973

FONTE: CEIC de dados do INLS, 2013.

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CEIC / UCAN

Os homens, entre os 20 e os 49 anos, foram os que mais testes realizaram, perfazendo um total de 147.000 testes, dos quais 9300 com resultado positivo, o que representa 74,9% do conjunto de testes positivos. A faixa etária dos 20 aos 29 representa 30,7% de testes positivos, a seguir vem a faixa etária dos 30 aos 39 anos, com 24,7% de testes positivos. Como se pode observar, é evidente que é a população activa a mais afectada, numa grandeza de 80,9% de infecções confir-madas laboratorialmente.

TESTE DE VIH, EM 2013, POR IDADES, MULHERES

5 a 14 15 a 19 20 a 29 30 a 39 40 a 49 50 a 59 60 ou mais

109512.223

54.045

297.680

2132 11.756 6306 2833 1048 302825327.998

161.593

74.729

Testes realizados

FONTE: CEIC de dados do INLS, 2013.

Há uma forte concentração de infecções nas mulheres em idade fértil. A estrutura etária de infecções relevantes tem início aos 15 anos de idade, sendo contínua a sua progressão. A faixa etária que mais realiza testes e que é a mais afectada vai dos 15 aos 49 anos de idade, com um acumulado de 588.000 testes realizados, destes 23.000 testes positivos que representam 90,4% do conjunto de resultados positivos. O grupo mais afectado foi o de 20 a 29 anos, com 46% de testes positivos, seguido do 30 a 39 anos, com 25% de testes positivos.

Os dois cenários apresentam uma idêntica estrutura etária, sendo que o das mulheres é mais alargado. O cenário masculino parece mais moderado, pois tem um número inferior de diagnósticos positivos (12.400 testes positivos), isto é, 32,8% dos diagnósticos positivos, muito distante da realidade feminina que representa 67,2% dos diagnósticos positivos. No entanto, não é evidente que as mulheres são as mais infectadas, pois os homens apenas representam 23,2% dos testes realizados com uma taxa de seropositivos de 6,5%, ao passo que as mulhe-res representam 76,8% dos testes efectuados, com uma taxa de 4% de testes positivos.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

O número de crianças (entre os 0 e os 14 anos de idade) com VIH, segundo o Banco Mundial, tem vindo a aumentar a uma média anual de 7,8%, conforme ilustra o gráfico abaixo.

CRIANÇAS COM VIH

2002 2004 2010 2011

Crianças (0-14 anos) com VIH (mil)

2006 20082003 2005 2007 2009

1921 23

2527 28

30 31 32 34

FONTE: CEIC de dados do Banco Mundial, 2013.

Este facto coloca algumas interrogações sobre a eficácia dos programas de corte vertical, pois muitas destas infecções são contraídas pela via vertical. O pro-grama de prevenção contra a transmissão vertical tem os seguintes resultados: das 436.100 mulheres grávidas testadas, 9854 foram diagnosticadas positivo e destas 4875 entraram em tratamento PTV.

PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO VERTICAL DO VIH

Grávidas testadas (mil) Grávidas em PTVGrávidas positivas

436,1

4875

9854

FONTE: CEIC de dados do INLS, 2013.

As grávidas dos grupos etários dos 20 a 29 e dos 30 a 39 anos foram as que mais procuraram fazer o teste de VIH, sendo igualmente os grupos mais afectados.

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CEIC / UCAN

TESTE DE SIDA, MULHERES GRÁVIDAS, POR IDADES

Testes realizados

15 a 19

38.100900

20 a 29

228.700

5200

30 a 39

112.600

2500

40 a 49

50.600

1100

50 a 59

5400 100

FONTE: CEIC de dados do INSL, 2013.

As grávidas representam 68,4% do conjunto das mulheres que realizaram o teste, o que pronuncia que muitas mulheres realizam o teste, por força do acom-panhamento do estado gestante. O índice de seropositividade é de 38,5%, no conjunto das mulheres.

O acompanhamento e o tratamento médico para muitos doentes a nível nacional ainda continua a ser um problema.

O gráfico abaixo ilustra essa situação.

INÍCIO DE TARV EM ADULTOS E CRIANÇAS

Adultos Crianças

Doentes comacompanhamento

médico

21.506

2125

Doentes comacompanhamento

e TARV

10.616

959

Óbitos de doentesem acompanhamento

707 168

FONTE: CEIC de dados do INLS, 2013

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

3.3 Saúde preventiva

A saúde preventiva tem vários programas como são os de cobertura vacinal (nomeadamente contra o sarampo, a poliomielite, a tuberculose, bem como o de suprimento de vitamina A), o Programa de Luta contra o VIH/SIDA, o Programa de Cesta Básica, o Programa contra a Malária, o Programa de Combate às Grandes Endemias, e outros. Há também campanhas de sensibilização para as chamadas “boas práticas” como são as campanhas da lavagem das mãos e de higiene bocal oral, de prevenção da gripe H1N1, informação e educação sobre puericultura, nome-adamente sobre a alimentação da criança dos 6 meses aos 5 anos e informação sobre a Raiva e o Tétano.

3.3.1 Programa de cobertura vacinal

O calendário nacional de vacinação engloba uma série de vacinas, desde a pri-meira infância, com a Pentavalente 3 e outras como as vacinas contra o sarampo, a tuberculose, a poliomielite, o tétano e a febre-amarela. A cobertura vacinal nacio-nal é estimada em 91%, sendo desigual no território, registando uma cobertura de:

superior ou igual a 100%, para cinco províncias (Cabinda, Uíge, Lunda Sul, Lunda Norte e Kwanza Sul);

80 a 99%, para dez outras (Huambo, Huíla, Zaire, Benguela, Malanje, Cunene, Moxico, Bié, Bengo e Luanda);

62 a 74%, para as restantes três (Kwanza Norte, Cuando Cubango e Namibe).

A província do Namibe apresenta a taxa de cobertura mais baixa, situando-se em 62%.

COBERTURA VACINAL DE ROTINA

BCG Pólio 3 Sarampo Penta 3 TT2 + grávidas

2012

9791

65

8887

2013

9891

8376

84

FONTE: CEIC de dados do PAV.

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CEIC / UCAN

A taxa de cobertura média das vacinas, em 2013, foi de 86,4%, com um fosso a cobrir de 13,6%. O gráfico anterior mostra o bom desempenho dos programas de vacinação de rotina, embora haja uma preocupante baixa de 12 pontos per-centuais na cobertura da pólio que poderá ser explicada pelo facto de não haver registo de casos de pólio nos últimos anos. Mas, a verdade é que o país está exposto à influência negativa dos fluxos migratórios dos países vizinhos que pode-rão ser os vectores da reintrodução da doença, como já aconteceu no passado.

3.3.1.1 Vacina Pentavalente 3

A vacina Pentavalente 3 é administrada às crianças e a sua cobertura nacional é de 91%, nos dois últimos anos (2012-2013), o que corresponde a uma superação em 18% em relação a 2011, cuja cobertura estava em 73%.

3.3.1.2 Vacina contra o sarampo

Embora haja um maior número de crianças imunizadas contra o sarampo e uma correlata diminuição de casos, essa progressão é relativamente fraca, levando em consideração também os ODM que neste caso visam atingir 90% (em 2015), pois passou-se de uma cobertura de 53,4% (em 2001) para 93% (em 2010), correspon-dendo a um forte desequilíbrio entre o meio urbano (74,3%) e o meio rural (38,4%) e a uma ligeira diferença de género.

IMUNIZAÇÃO, SARAMPO (% DE CRIANÇAS COM IDADE ENTRE 12-23 MESES)

2002 2004 2010 20122006 20082003 2005 20112007 2009

74

62 64

4548

8879

77

91 8897

Imunização, sarampo (% de crianças com idade entre 12-23 meses)

FONTE: CEIC de dados do Banco Mundial, 2013.

De acordo com o Banco Mundial, a cobertura de crianças com idade compre-endida entre os 12 e os 23 meses, no ano de 2012, foi de 97%.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

3.3.1.3 Vacina contra a poliomielite

A cobertura vacinal contra a poliomielite apresenta um cenário mais positi-vo, embora não seja totalmente satisfatório, porque desde o ano 2000 que os esforços para a erradicação da doença não têm atingido o seu alvo, em parte, devido à vulnerabilidade do Sistema Nacional de Saúde e aos fluxos migratórios de populações dos países vizinhos, havendo ressurgências de estirpes selvagens do vírus que atingem não somente as crianças, mas também os adultos, como aconteceu recentemente em Cabinda, onde as autoridades sanitárias decidiram vacinar toda a população.

Para além das campanhas de rotina (jornadas de vacinação), tendo em conta os casos que se notificaram em cada província, em 2013 foram realizadas duas jornadas nacionais de vacinação com o lema: “chuta a pólio para fora de Angola (África)”.

JORNADA NACIONAL DE VACINAÇÃO 2013

População alvo (mil)

Uíge

Moxic

o

Benguela

CuneneHuíla

Cuando Cubango

Luanda

Lunda Su

l

Malanje

Cabinda

Bengo Bié

Huambo

Kwanza N

orte

Kwanza Su

l

Lunda N

orteZa

ire

Namibe

1.a 2.a

FONTE: CEIC de dados do PAV, 2013.

Nas duas jornadas de vacinação foram administrados pólio + Vitamina A + Albernd, tendo sido vacinadas um total de 13,7 milhões de crianças contra a pólio e o sarampo.

As quatro províncias mais populosas (Luanda, Benguela, Huíla e Uíge) vaci-naram, na segunda fase, uma população de 3,1 milhões de crianças dos 0 aos 5 anos de idade, uma taxa média de execução de 96%, e somente Uíge teve uma taxa de execução de 100%.

As províncias do Bengo, Cabinda, Kwanza Norte e Sul, Malanje, Lunda Norte, Moxico, Namibe, Uíge, Zaire e Cuando Cubango tiveram uma taxa de execução

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CEIC / UCAN

superior a 100%, com uma média, por província, de 105,8% e de 2,3 milhões de crianças, dos 0 aos 5 anos de idade.

3.3.1.4 Situação vacinal em geral

A cobertura vacinal em relação à BCG é de 84%, ao Sarampo é de 97% e ao Tétano é de 95%.

Relativamente a todas as doenças infantis, os resultados ainda estão muito longe do desejável, embora se possa verificar uma progressão positiva na cobertura vacinal total das principais vacinas contra doenças evitáveis.

Moxico

Bengo

Bengela

Uíge

Cabinda

Bié

Cunene

Huambo

Huíla

Kwanza Norte

Cuando Cubango

Kwanza Sul

Luanda

Lunda Norte

Lunda Sul

Malanje

Namibe

Zaire

Angola

JORNADA NACIONAL DE VACINAÇÃO 2013 (taxa de execução)

107,1

103,0

101,1

112,0

105,0

103,6

112,2

97,1

118,8

106,4

105,7

102,9

102,4

99,6

97,2

98,7

107,9

112,1

121,3

FONTE: CEIC de dados do PAV, 2013.

Do total de crianças previstas para tomarem parte das campanhas de vacina-ção, 6,7 milhões de crianças, em 2013, foram vacinadas, prescrevendo uma efici-ência de 103,0% da actividade.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

A análise comparativa dos resultados da cobertura vacinal, entre 2009 e 2013, apresenta um aumento da cobertura em cerca de 41,1%.

3.4 Saúde curativa

O sistema público de saúde curativa é organizado a três níveis: o primeiro constitu-ído pelos hospitais municipais, centros e postos de saúde; o segundo pelos hospitais provinciais e o terceiro pelos hospitais nacionais especializados. Pela sua natureza, todas as unidades médico-sanitárias de proximidade desenvolvem também acções preventivas, nomeadamente no que tange à administração de vacinas, de despa-rasitantes e aportes vitamínicos, sendo a sua primeira vocação a oferta do pacote essencial de cuidados e serviços materno-infantis e o controlo e combate às doenças transmissíveis e não transmissíveis.

A rede de saúde do Serviço Nacional de Saúde é constituída por 1721 unidades médico-sanitárias, das quais 8 hospitais nacionais (centrais), 32 pro-vinciais, 228 municipais e centros médicos e 1453 postos de saúde, para além do sector privado de saúde que tem crescido muito em Angola, desde o início da sua legalização, em 1992, e só na província de Luanda, em 2005, havia 628 clínicas privadas legalizadas, representando 88% da totalidade de clínicas da capital.

No plano da saúde curativa intervêm também unidades médico-sanitárias do sector privado, de empresas, de organizações da sociedade civil e de igrejas que constituem uma larga malha de hospitais, clínicas e de postos médicos, não somente no plano curativo, mas também a nível de diagnóstico e de intervenção que preenche um espaço de procura que o sistema público não está capaz de satisfazer, nomeadamente da crescente classe média que raramente frequenta as unidades médico-sanitárias públicas.

O Sistema Nacional de Saúde, em termos de recursos humanos para a presta-ção de serviços neste sector, em 2013, conta com 3940 médicos (dos quais 1668 angolanos e 2272 estrangeiros), o que significa 0,0002 por 1000 habitantes.

Já em relação a enfermeiros, o número é de 28,7 mil, representando 0,002 por cada 1000 habitantes. Cifras que melhoram ao juntarmos profissionais de saúde que trabalham nos hospitais, clínicas, centros e postos médicos do sector não-estatal. Constata-se um grande peso do pessoal administrativo, a despeito do pessoal técnico e de diagnóstico.

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CEIC / UCAN

PESSOAL DE SAÚDE POR PROVÍNCIA E POR ESPECIALIDADE

Províncias Médicos Enfermeiros TDT Auxiliares

Bengo 89 819 122 249 201

Benguela 234 3214 692 1135 664

Bié 55 1937 31 250 395

Cabinda 52 1273 377 280 461

Cunene 59 1099 61 337 327

Huambo 109 3499 416 340 690

Huíla 49 1668 436 647 764

Cuando Cubango 15 853 28 407 291

Kwanza Norte 72 900 47 637 32

Kwanza Sul 141 1668 143 512 380

Luanda 325 4717 1473 819 2030

Lunda Norte 63 669 53 180 364

Lunda Sul 39 555 40 190 65

Malanje 94 885 39 395 1025

Moxico 56 1013 98 654

Namibe 47 1632 172 398 121

Uíge 101 1440 121 300 675

Zaire 68 824 104 153 188

FONTE: CEIC de dados da DNRH, 2013.

Para além do pessoal médico-sanitário nacional, há ainda a contar com os médicos, enfermeiros e técnicos de diagnóstico expatriados.

MÉDICOS EXPATRIADOS

Total

Cubanos

2272

1559

Russos 341

Vietnamitas 196

Coreanos 176

FONTE: CEIC de dados do DARH/SFT,2013

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

3.5 Despesas com a saúde

Sendo a saúde um factor importantíssimo para o aumento das condições de vida e do bem-estar dos cidadãos, é também condição necessária para o aumento da produtividade nacional, pois um país com saúde é um país com uma acrescida disposição e disponibilidade para o trabalho, o que concorre mutuamente para o crescimento económico e para o aumento do índice de felicidade dos cidadãos. Uma das responsabilidades primárias de qualquer Estado moderno é garantir o bem-estar dos seus cidadãos, e a saúde é uma delas. Por isto, os Estados têm gasto somas avultadas de dinheiro para o melhoramento do sistema de saúde dos respectivos países.

Como fizemos referência no Relatório Social 2012, “na situação em que ainda se encontra o sistema nacional de saúde, compete ao Estado, através do seu Orçamento Geral, garantir a máxima qualidade na prestação de cuidados primá-rios e não primários de saúde”, sobretudo porque as populações não dispõem de rendimentos que lhes possibilitem recorrer aos serviços privados de saúde.

3.5.1 Na perspectiva do orçamento

Angola precisa ainda de fazer investimentos significativos e de qualidade na saúde quer curativa, quer preventiva para poder alcançar melhores níveis nos indicadores de saúde, que por sua vez são uma condição necessária para que os cidadãos exerçam cabalmente as suas funções, contribuindo assim tanto para a realização social como para a realização pessoal.

O gráfico abaixo espelha o nível das despesas públicas financiadas pelo OGE.

DESPESAS COM A SAÚDE (MIL MILHÕES DE KWANZAS)

2008 2010 201320122009 2011

169,92

266,2

155,27

209,43

231,31

351,31

Despesas com a saúde (mil milhões de Kwanzas)

FONTE: RS 2012 e OGE 2013.

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CEIC / UCAN

Nos últimos anos tem-se vindo a constatar que as dotações das despesas orçamentais com a saúde têm registado um progressivo aumento em termos nominais. De um montante global de 266,2 mil milhões de dólares, em 2009, pas-sou-se para um valor total de 351,31 mil milhões em 2013, o que representa um incremento nominal de 31,97%. A taxa média anual de variação nominal durante o período 2009-2013 é de 6,39%, que tem um menor impacto na recuperação do atraso acumulado, se considerarmos que a população cresce a um ritmo de 3,2% ao ano. Para além de que não podemos deixar de referir que o montante das des-pesas alocadas não é necessariamente o montante realizado ou efectivamente gasto. Por exemplo, de acordo com o Relatório de Execução do OGE 2012, refe-rente ao terceiro trimestre, somente 67,7% das despesas com o sector da saúde foram realizadas até ao 3.o trimestre daquele ano13. O nível de execução das des-pesas públicas em Angola é ainda baixo, o que dificulta ainda mais a melhoria das condições de vida das populações.

Olhando para o peso das despesas públicas com o sector da saúde, no total do OGE, vimos que não tem havido, desde 2000, um crescimento significativo. De 2000 a 2013, o peso médio anual do sector da saúde no OGE é de 4,85%, o que é baixo em comparação com os outros países da região da SADC e com os países desenvolvidos, como veremos adiante.

Entre 2012 e 2013, o peso relativo do sector da saúde, no conjunto das des-pesas totais do Estado, teve um minúsculo crescimento de 0,15%, ou seja, não se alterou muito a escala de prioridades públicas no que concerne às necessidades sociais.

DESPESA COM A SAÚDE NO OGE (2000-2013) (%)

2005 20112007 20092004 2006 20122008 20102000 2001 20032002 2013

4,1

5,9

4,13,4

5,3

4,3 4,64

6,76,3

3,7

5,02 5,14 5,29

FONTE: CEIC a partir de RS 2012 e OGE 2013.

13 O Relatório de Execução do OGE 2012 referente ao 4.o Trimestre e o Relatório de Exe-cução do OGE 2013 não estavam disponíveis no site do Ministério das Finanças até ao momento da compilação do RS 2013.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Medindo o peso das despesas com a saúde, no Produto Interno Bruto (PIB), vê-se que Angola, em comparação com outros países, está com um índice muito baixo.

De acordo com o Banco Mundial, o peso médio das despesas com a saúde, no PIB em Angola, é cerca de 3,97%, muito abaixo do de outros países africanos, como o Congo Democrático, a Namíbia, Moçambique e outros, como podemos ver no gráfico abaixo.

Esta percentagem é ainda mais baixa quando procedemos a um exercício de comparação com países como Brasil, Noruega, Cuba e África do Sul.

Como podemos ver no gráfico abaixo, Angola, em termos médios, é o país que menos investiu em saúde, relativamente ao total dos gastos públicos.

0,00

2,00

4,00

8,00

12,00

6,00

10,00

2007 2008 2009 2010 2011

DESPESAS TOTAIS COM A SAÚDE (% do PIB)

Angola

Brasil

Botswana

China

Cabo Verd

eCuba

Moça

mbique

Namíbia

Nigéria

Noruega

África

do Sul

Rep. Dem

. Congo

Zâm

bia

FONTE: Base de dados do Banco Mundial (2014).

3.5.1.1 Despesas per capita

Em termos per capita, ou seja, despesas por habitante, os dados do Banco Mundial dão conta de que Angola, em termos médios, de 2007 a 2011, gastou em saúde, por habitante, cerca de 173 dólares-americanos, melhor do que a Nigéria, mas pior do que Botswana, Namíbia e África do Sul que apresentam maiores des-pesas per capita.

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CEIC / UCAN

0,00

200,00100,00

500,00

300,00400,00

700,00600,00

2007 2008 2009 2010 2011

DESPESAS PER CAPITA COM A SAÚDE (USD)

Angola

Botswana

China

Cabo Verd

e

Moça

mbique

Namíbia

Nigéria

África

do Sul

Rep. Dem

. Congo

Zâm

bia

FONTE: Banco Mundial, 2014.

Usando dados do OGE 2013, o CEIC estima que os gastos, por habitante, em 2013, foram de 176,18 dólares-americanos14.

3.5.1.2 Despesas públicas/Despesas privadas com a saúde

Na maior parte dos países, o Estado não financia a totalidade dos gastos com a saúde dos cidadãos, são os próprios que pagam uma parte (ou mesmo a totalidade) das despesas com os seus próprios rendimentos ou por meio de seguros privados de saúde.

Dados do Banco Mundial dão conta que em Angola, em 2007, 65,44% das des-pesas com a saúde foram suportadas pelo Estado, enquanto os privados suporta-ram dos seus bolsos 34,56% dos gastos com a saúde.

PESO DAS DESPESAS PÚBLICAS NAS DESPESAS TOTAIS COM A SAÚDE EM ANGOLA

Despesas públicas com a saúde Despesas dos privados com a saúde

2007

65,44

34,56

2008

70,65

29,35

2009 2010 2011

76,70

23,30

60,97

39,03

61,53

38,47

FONTE: Banco Mundial e cálculos do CEIC.

14 Tendo em conta uma população de 19,94 milhões de habitantes e uma taxa de câmbio de 100 Kwanzas por Dólar.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Em 2009, a crise financeira afectou de tal maneira o rendimento dos cida-dãos que nesse ano só suportaram 23,30%, cabendo 76,70% ao Estado. Em 2010 e 201115, a contribuição do Estado nos gastos com a saúde foi cerca de 60%, enquanto os privados suportaram quase 40%.

O aumento das clínicas ou hospitais privados e da oferta dos serviços de segu-ros de saúde por parte das seguradoras no país podem ser uma das razões que fez com que houvesse uma maior participação dos cidadãos nos gastos com a saúde.

Ou ainda, podemos dizer que a degradação dos serviços de saúde pública levaram os cidadãos a gastarem mais dos seus bolsos, indo para os hospitais pri-vados16.

3.5.1.3 Distribuição das despesas dentro do sector

A análise da evolução da distribuição das despesas com a saúde, no interior do sector, nos últimos seis anos, como se pode ver no gráfico seguinte, evidencia a tendência da manutenção da importância dos Serviços Hospitalares Gerais (que teve uma dotação orçamental de cerca de 145 mil milhões de Kwanzas, em 2013, o que representa um aumento nominal de 67,16%, em relação a 2012), enquanto os Serviços de Saúde Ambulatórios e os Serviços de Saúde Não Especificados são substituídos, em termos de importância, pelos Serviços de Centros Médicos e de Maternidade e pelos Serviços de Saúde Pública.

15 Dados de 2012 e 2013 não estavam disponíveis no site do Banco quando estávamos

16 próprios rendimentos vão para os hospitais privados já que os serviços de saúde públi-cos são geralmente gratuitos, embora haja grande dispêndio das famílias que frequen-tam os serviços de saúde públicos, pois são muitas vezes obrigados a comprar os medi-camentos ou a pagar o pessoal médico-sanitário para garantir a assistência conveniente aos seus familiares internados.

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CEIC / UCAN

DISTRIBUIÇÃO DAS DESPESAS COM A SAÚDE (MIL MILHÕES DE KWANZAS)

020

160

80

40

120100

60

140

Serviço de Saúde Não EspecíficadoServiço de Saúde AmbulatórioProdutos, Aparelhos e Equipamentos Médicos

Serviço de Saúde PúblicaServiços de Centro Médico e MaternidadeServiços Hospitalares EspecializadosServiços Hospitalares Gerais

2008 2009 2010 2011 2012 2013

FONTE: RS 2012 e OGE 2013.

Estas tendências podem ser interpretadas como o esforço das autoridades sani-tárias para melhorar a capacidade dos serviços de saúde preventiva e aproximar os serviços hospitalares das comunidades. A dotação dos Serviços Ambulatórios de Saúde teve um ligeiro aumento, de 4 mil milhões de Kwanzas, nas verbas alocadas em 2013, em relação a 2012, que denota uma maior atenção em relação ao tipo de enfermidades que são determinantes no melhoramento dos indicadores de saúde.

3.5.1.4 Despesas por programas

No Relatório Social 2012 afirmamos que os programas de saúde pública têm assi-nalado, nos últimos anos, quedas no nível de financiamento público. Por exemplo, a dotação do Programa de Luta Contra as Grandes Endemias diminuiu de 7,43 mil milhões, em 2010, para 4 mil milhões de Kwanzas, em 2012. Mas, em 2013, esta mesma dotação orçamental aumentou cerca de 27%, passando para 6,25 mil milhões de Kwanzas.

DESPESAS POR PROGRAMAS (MIL MILHÕES DE KWANZAS)

2010 2011 2012 2013

Prog. de combate às grandes endemias

Prog. Nacionalde doençasmentais e

toxicodependência

Prog. de melhoriada saúde

Prog. de lutacontra

o SIDA/VIH

Prog. de combate à cólera

7,43

5,634,92

6,25

1,54 1,6 1,82

5,19

0,67

2,21 2,2

5,38

0,07 0,13 0,75 0,75

FONTE: RS 2012 e OGE 2013.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

O Programa de Luta Contra o VIH/SIDA também assinalou um aumento signi-ficativo de financiamento público, passando de 1,82 mil milhões, no ano anterior, para 5,19 mil milhões, este ano, o que pode representar um maior compromisso do Estado em relação aos encargos de financiamento do Programa Nacional de Luta Contra o VIH/SIDA.

O Programa de Melhoria da Saúde Materno-Infantil, em comparação com as dotações dos anos anteriores, beneficiou também de uma maior dotação orça-mental, em 2013, 5,38 mil milhões de Kwanzas. Este incremento, continuando Angola a ser um país com uma das maiores taxas de mortalidade infantil no mun-do, pode traduzir-se num melhoramento da saúde materno-infantil, sendo por isto de grande importância para a redução da taxa de mortalidade infantil, desde que as verbas cabimentadas tenham sido integralmente executadas.

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4. COMPROMISSO COM A EDUCAÇÃO

4.1 Introdução

A educação continua a ser uma questão estratégica para o crescimento económico-social do país e um factor determinante do progresso social. Na ver-dade e em rigor, quanto maior oportunidade de educação for dada aos cidadãos, maior possibilidade haverá destes participarem na vida pública, económica, social e cultural do país e, por conseguinte, no seu desenvolvimento, tendo em conta as habilidades de cada cidadão. Portanto, a garantia do direito à educação para todos os cidadãos pressupõe garantir a construção de uma sociedade constituí-da por elementos cuja ética e moral está voltada para a promoção da dignidade humana. Os países que queiram melhorar as suas capacidades em termos de mão-de-obra para responder à demanda do desenvolvimento, constantes dos processos produtivos, de organização e gestão e de prestação de serviços de qua-lidade, de maneira a proporcionar um cada vez maior bem-estar às populações, têm que melhorar os seus investimentos na educação. Não apenas na educação básica, mas em todo o sistema de educação e formação profissional a todos os níveis.

Não é possível promover o desenvolvimento do país, assegurar a promoção social dos angolanos e integrar a globalização do desenvolvimento, tirando deste o melhor proveito, sem um forte investimento na aquisição inicial e contínua de conhecimentos, capacidades técnicas e habilidades cognitivas dos cidadãos.

Nunca foi tão justamente lógico afirmar que “o futuro começa agora”. Mas, que futuro? Um futuro de angolanos não empregados, por não serem portadores do perfil técnico-profissional que os mercados exigem para o preenchimento dos empregos criados, mas também um futuro em que os angolanos, não somente são desempregados, mas também perderam a capacidade cognitiva ou têm gran-des dificuldades na aquisição da formação necessária.

Apesar de se insistir num fraco investimento neste sector e na distorção da sua estrutura de despesa, havendo gastos administrativos superiores às áreas de formação académica, a educação, para além de ser factor incontornável na

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

preparação da mão-de-obra nacional e da sua crescente qualidade, é também um indicador importante do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Angola, apesar do considerável crescimento do seu RNB, tem progredido pouco no IDH, precisamente devido ao baixo índice de escolaridade média que se situou em 4,9, em 2013. A economia de Angola, em termos das suas necessi-dades de RH, não tem condições internas de crescimento pois o sistema de edu-cação nacional não produz o número de técnicos necessários a esse crescimento. O país tem carência de engenheiros, químicos, biólogos, administrativos, contabi-listas, informáticos e de outros técnicos. Uma das razões pela qual a Noruega está em primeiro lugar no IDH é o facto de ter uma alta escolaridade média, resultado de fortes investimentos na educação, o que lhe permitiu passar do 7.o lugar, em 1985, para o 4.o lugar, em 1995, e para o 1.o lugar, a partir de 2002, com disponi-bilização sustentada de uma média de 7,1% do PIB, ao longo destes anos. Sendo certo que sempre que um país não coloca as suas prioridades, em termos de des-pesa pública, na educação e saúde, está a adiar o seu próprio desenvolvimento sustentado, sendo pois a educação um dos pilares da soberania nacional.

Consagrada na Constituição da República como direito fundamental17, o direito à educação faz parte dos Direitos Humanos e é basilar para o desenvolvi-mento da pessoa e consequentemente do meio social que a rodeia, pois, por via do direito à educação, os cidadãos alcançam outros direitos fundamentais nos domínios político, económico, social, ambiental e cultural18. A educação é assim um desafio permanente e um compromisso de todos os actores sociais (o Estado, as igrejas, as empresas, os actores comunitários, a sociedade civil e as personali-dades), embora pese uma grande responsabilidade sobre o Estado que é quem determina e conduz a política da educação, no país. Nesse sentido, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, ao consagrar o direito à educação, lembra aos Estados-Membros da ONU que todo o ser humano tem direito à instrução, que deve ser gratuita e obrigatória, pelo menos nos graus elementares e fundamen-tais, e estar orientada para o desenvolvimento da personalidade humana e para o

17 Angola tem consagrado na sua Constituição, desde sempre, o direito à educação, es-tando o Estado angolano obrigado a promover “o acesso de todos à alfabetização, ao ensino, à cultura e ao desporto, estimulando a participação dos diversos agentes parti-culares na sua efectivação, nos termos da lei” (CRA, Artigo 79.o).

18 Uma leitura comparada da Declaração Universal dos Direitos Humanos (Artigo 27.o) e da Constituição da República de Angola (Artigo 79.o) revelam seguramente uma coe-rência do ponto de vista do papel da educação para a vida humana e consequentemente para o progresso das Nações. Do ponto de vista legal (teórico), os dois instrumentos promovem, defendem e protegem o direito à educação no quadro dos princípios de participação, democracia e exclusividade, mas, na prática, será que todos os cidadãos angolanos gozam do direito à educação pública, gratuita e de qualidade?

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fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamen-tais, com vista a promover a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as Nações (DUDH, Artigo 26.o).

Os Estados-Membros da ONU, em particular Angola, reconheceram a impor-tância estratégica de garantir o acesso a uma educação pública e gratuita a todos os seus cidadãos, como sendo um recurso fundamental para a promoção da paz, da justiça social e da dignidade humana. No entanto, a tendência geral da cober-tura escolar, em 2013, é de decréscimo em termos de cobertura bruta para os níveis iniciais, ensinos pré-primário (–8,3%) e primário (–1,5%), e de crescimento para os níveis posteriores, ensinos secundário (+0,5%) e universitário (+3,34%). Esse considerável decréscimo nas matrículas a nível da iniciação (–8,3%) e do primário (–1,5%) representam não somente crianças fora do sistema de ensino, sobretudo para as mais novas, mas também traduz uma fraca recuperação do atraso escolar e da integração tardia. Em relação à iniciação, há uma diferença negativa, entre matriculados e população de correspondência etária, de mais de 188.087 crianças.

O Instituto Nacional de Estatística (INE) considera que a população do país atingiu cerca de 21 milhões de habitantes, em 2013. A população escolar situa--se entre os 5 e os 23 anos de idade. Tomando como referência os indicadores do IBEP, corresponde a 35,4% dos habitantes do país, isto é, um total de 7.434.000 pessoas. Neste ano, houve 6.745.888 matrículas para o ensino não-universitário (incluindo iniciação, ensinos primário e secundário), e 218.678 para o ensino uni-versitário, perfazendo 6.964.564 matrículas a que se juntam mais 584.050 matrí-culas do ensino de adultos (Programa de Alfabetização e Aceleração Escolar). O país regista, assim, no ano lectivo de 2013, em termos de matrículas, uma pro-gressão de cerca de 260.319 novas matrículas, correspondendo a uma progressão de +3,88%, já que no ano transacto houve um total de 6.704.245 matrículas.

POPULAÇÃO E COBERTURA ESCOLAR 2013

Níveis e indicadores

Iniciação(5 anos)(3,6%)

Primário(de 6 a 11 anos)

(17,7%)

Secundário(de 12 a 17 anos)

(14,1%)

Universitário(de 18 a 22 anos)

(9,9%)

População 756.000 3.717.000 2.961.000 2.079.000

Matriculados 567.113 5.162.879 1.015.896 218.678

Bruta 75,0% 139,0% 34,3% 10,5%

Líquida 68,0% 30,7%

FONTE: CEIC, estimativas com base nos indicadores do GEPE – Ministério da Educação, 2013.

Cobe

rtur

a

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

O sistema de educação nacional está estruturado em quatro grandes níveis: iniciação escolar (ensino pré-primário), de um ano; ensino primário, de seis anos, obrigatório e gratuito; ensino secundário, dividido em dois ciclos: primeiro ciclo (7.a, 8.a e 9.a) e segundo ciclo (10.a, 11.a, 12.a e 13.a), a que se junta o Ensino de Adultos.

O estado actual do Sistema Nacional de Educação, em termos de disponibili-dade, acessibilidade, aceitabilidade e adaptabilidade, tidos pelas Nações Unidas como referenciais mínimos, vai ser dado a conhecer através da análise da situa-ção das infra-estruturas, da formação, do recrutamento e qualidade dos professo-res, dos meios de ensino, do material didáctico e das habilitações e competências adquiridas, nos diversos níveis do sistema nacional de educação, levando tam-bém em consideração os meios de acesso e transição de níveis ou os aspectos de descriminação, de liberdade de escolha e da qualidade dos curricula e do mate-rial didáctico-pedagógico.

A nossa abordagem é feita através de cada um dos subsistemas de ensino: iniciação, primário, secundário e universitário, procurando analisar as questões concernentes, nomeadamente, à população escolar, à taxa líquida de frequência, à evolução da cobertura escolar, do corpo docente, das infra-estruturas e equipa-mentos escolares e do correspondente rendimento escolar, com vista a diferen-ciar os indicadores por género, região, província e nos meios urbanos e rural.

4.2 Ensino pré-primário (Iniciação)

No processo de aquisição de saber e de habilidades cognitivas, joga papel fun-damental o primeiro período de desenvolvimento cognitivo das crianças, nos seus primeiros seis anos de vida. Pelo que é preciso investir de forma precoce no ensino e na transmissão de saber às crianças angolanas.

Acontece que o país, neste capítulo, da educação na primeira infância, tem um percurso divergente, indo no sentido contrário, o que é absolutamente preo-cupante, não somente pelo presente de ausência de sistema de ensino para a pri-meira infância, mas sobretudo pelo penhorado futuro que se anuncia como certo, pois a ausência de desenvolvimento cognitivo adequado, na primeira infância, produz efeitos irreversíveis na capacidade de aprendizagem das futuras gerações, limitando-as na sua formação cívica integral e nas suas possibilidades de integra-ção nos processos produtivos e de serviços.

A iniciação escolar começa, no país, aos cinco anos de idade, numa altura do desenvolvimento da criança em que algumas das suas potencialidades já não foram aproveitadas. A iniciação escolar deveria, pois, ser um ciclo de três anos que começaria aos três anos de idade.

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Não obstante esse atraso, a iniciação escolar não é devidamente considerada e tem estranhamente registado, a nível nacional, para o ensino público, um retro-cesso no número de matrículas, em relação aos anos imediatamente anteriores em que se situou sucessivamente em 587.710 crianças (2011), 570.079 crianças (2012) e em 567.113 crianças (2013), para uma população, referente ao nível 5 anos de idade, de 705.600, em 2011, de 726.062, em 2012 e de 756.049 crianças, este ano. Regista-se uma diferença sucessiva de menos 17.631 e de 2966 que cor-respondem a um decréscimo de 3% e de 0,52%, respectivamente. Já em relação à população escolar regista-se um deficit sucessivo de 155.983 crianças (2012) e de 58.936 crianças (2013). E, como já se dizia no relatório anterior, esta tendência vem desde 2008, quando a iniciação registou 711.025 matrículas.

Não é possível, por falta de informação, determinar quantas crianças com mais de cinco anos estão inscritas na iniciação, pelo que não é possível identificar a frequência líquida neste ano inicial do ensino no país.

INICIAÇÃO ESCOLAR

Local

Matrículas

2011 2012 2013

MF F MF F MF F

AngolaPúblico 587.710 570.079 567.113

Privado

LuandaPúblico 39.353

Privado

BenguelaPúblico 60.358 68.482 34.971

Privado 702 363

Cuando CubangoPúblico 33.965

Privado

4.3 Ensino primário

O ensino primário, agora da 1.a à 6.a classes, em regime de monodocência, con-tinua a ser considerado, em teoria, a prioridade da educação nacional, embora o Orçamento Geral do Estado não reflicta isso, sem que no entanto este subsistema tenha deixado de ser a base de toda a cadeia de educação e formação profissional e de aquisição do conhecimento e de uma política sustentada de promoção da qualidade do ensino nacional, como é propósito declarado do Executivo. Na ver-dade, a escola primária, obrigatória, gratuita e de qualidade, é uma necessidade não somente social mas também política, económica e cultural, pelo que o Estado não pode deixar de garantir o acesso universal ao ensino primário (e até mesmo ao ensino geral), sem diferenças sociais, descriminação de género, nem assimetrias

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

territoriais. Este é um compromisso nacional e internacional, sendo inclusive um dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e, particularmente, do Fórum Mundial de Educação para Todos (2000).

A oferta a este nível é ainda insuficiente para que o país tenha uma educação universal, mesmo ao nível do subsistema primário, pois muitas crianças continuam, em todas as províncias, fora do sistema de ensino, impedindo a realização deste direito fundamental que é a educação para todos, devido a insuficiência de pro-fessores e de salas de aula, de fornecimento irregular e insuficiente de livros e de outros materiais didácticos. Continua a haver insuficiência de professores, um gran-de absentismo dos novos professores, nomeadamente aqueles que são colocados longe do seu habitat habitual, a qualidade e o profissionalismo destes deixa muito a desejar, sem que haja políticas adequadas para reverter a situação. Não há ainda um recurso sistemático às novas tecnologias para homogeneizar as capacidades e com-petências do corpo docente e da matriz didáctico-pedagógica da educação nacional.

No entanto, o ensino primário é o subsistema mais demandado pelas famílias que cada vez mais investem na educação e entendem que as suas crianças não podem deixar de frequentar a escola. Porém, continua a haver um elevado núme-ro de crianças, em todas as províncias, fora do sistema de ensino ou que estudam em condições precárias, dependendo o curso normal das aulas dos caprichos da natureza, do absentismo dos professores, do desinteresse das administrações.

O estado do ensino primário, no país, é ilustrado, neste capítulo, através da evolução da cobertura escolar, do corpo docente, das infra-estruturas e dos equipa-mentos escolares e do correspondente rendimento escolar, procurando diferenciar os indicadores por género, região, província e segundo o meio: urbano ou rural.

4.3.1 Cobertura escolar

A cobertura escolar, ao nível do ensino primário, é feita sobretudo pelo ensino público, embora seja desigual geográfica e socialmente porque está mal distribu-ída pelo território e porque as famílias não dispõem dos mesmos recursos para a educação dos filhos. A presença do ensino comparticipado e do ensino privado é cada vez mais significativa mas sobretudo na capital, onde o ensino público cor-responde a 59% e o ensino não público a 41%, sendo 30% para o ensino compar-ticipado e 11% para o ensino privado.

Esta presença é bem modesta (ou mesmo inexistente) nas províncias do interior. Mesmo em províncias como Benguela, que é litoral e onde há um maior crescimento económico, a presença do ensino primário privado não chega a 1% (na verdade, são apenas 0,84%). O que quer dizer que os agentes privados não são suficientemente estimulados para aparecerem em outras províncias,

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oferecendo serviços à classe média que os pode pagar e permitindo a libertação de infra-estruturas e recursos humanos para proporcionar um maior acesso das classes baixas às escolas públicas, pois, quando assim não acontece, são os mais pobres, que mais necessitam da escola pública, que menos a frequentam, sendo os mais ricos e influentes, os que a ela têm maior acesso.

Em 2013, o ensino primário registou, a nível nacional, 5.162.879 matrículas, das quais 22% em Luanda e 11% em Benguela. Há uma desproporção evidente entre os números do país e os das províncias.

A província de Luanda, a capital do país, onde se encontra cerca de um terço da população total de Angola, tem uma população escolar, para o ensino primário, de 1.150.500 e registou 1.125.648 matrículas (das quais 666.472 para o ensino públi-co, 124.173 para o ensino privado e 337.003 para o ensino comparticipado), o que resulta numa cobertura bruta de 98%, muito abaixo da cobertura bruta do país que atinge os 139%. Levando em consideração um atraso escolar, no ensino primário de 59% (IBEP), a cobertura escolar líquida, no ensino primário, situa-se em 48%, o que é também muito pobre, em relação a uma taxa líquida de escolarização, no país, segundo o Ministério da Educação, de 86%19 ou, mesmo segundo os nossos cálculos, de 68%. É bem provável que esta taxa líquida de cobertura escolar, em Luanda, não corresponda à realidade, pois tudo leva a crer que o atraso escolar em Luanda seja inferior ao do país (59%), pela superior qualidade da oferta, nesta pro-víncia, mas para o qual nem o Ministério da Educação, nem a Direcção Provincial da Educação de Luanda, forneceram informação. Certo é que Luanda apresenta uma fraca disseminação da escola pública, que tem apenas 734 instituições escolares, enquanto a escola privada regista 548 e a escola comparticipada 1252 instituições.

A Direcção Provincial da Educação de Luanda considera que há, nesta provín-cia, 41.302 crianças fora do sistema de ensino, distribuídas pelos seguintes muni-cípios, segundo a tabela abaixo.

CRIANÇAS FORA DO SISTEMA DE ENSINO NA PROVÍNCIA DE LUANDA

Municípios Luanda Belas Cazenga Cacuaco Viana Icolo e Bengo Quiçama Total

Números 19.432 2011 2194 5904 8113 3465 183 41.302

No entanto, este número não leva em consideração as crianças cujos pais não as matricularam, neste ano, em que há uma diferença negativa de 24.852 crianças, entre a população escolar do ensino primário e o número de matrículas efectua-das (1.125.648).

19 A taxa líquida de escolarização prevista para 2013, pelo Ministério da Educação, era de 79,8%; no entanto, foi alcançada, segundo a mesma fonte, uma taxa de 86%.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

A província de Benguela registou 474.512 matrículas (das quais 234.595 meni-nas) no ensino primário público, e 3906 (das quais 1969 meninas) no ensino pri-vado, o que corresponde a uma cobertura escolar de 130,2% (bruta) e de 63,83% (líquida), para uma população correspondente ao nível de 364.260 crianças.

Indicador 2011 2012 2013

Taxa de escolaridade(%)

Bruta MED 155

CEIC 140,5 140,7 139

LíquidaMED

CEIC 57,6 57,7 68

FONTE: CEIC a partir de dados do Ministério da Educação.

A taxa bruta do ensino primário, depois de uma constante progressão que reflectia a entrada das muitas crianças que estavam fora do sistema de ensino, começa agora a assinalar um relativo decréscimo, enquanto a taxa líquida progride cerca de 10 pontos percentuais, o que assinala uma regressão correlata ao nível do atraso escolar que não é possível determinar com exactidão, pois não dispomos de dados sobre as faixas etárias dos matriculados. O Ministério da Educação assinala agora em 14% a taxa de crianças fora do sistema de ensino e regista uma situa-ção grave de elevada taxa de atraso escolar, para a educação geral, na ordem dos 69,4%, superior à sua previsão que pretendia situá-la em pouco menos (68,8%). No entanto, a tendência geral é de uma melhoria nos seus indicadores, mesmo em relação às suas próprias previsões, para o ano em análise, em relação à edu-cação geral pública. A relação entre a taxa bruta e a taxa líquida de escolaridade é o que mais deverá interessar na análise do sistema e para os decisores públicos e, particularmente, os altos níveis de atraso escolar. Não nos é permitido, por falta de informação, calcular “taxas de sobrevivência”, isto é, a percentagem de alunos que, começando num determinado nível/ano, acabarão por atingir um outro mais avançado, previamente especificado.

4.3.2 Rendimento escolar

O rendimento escolar, no subsistema primário, pode ser medido pela diferença do número de alunos de um nível escolar para o imediatamente seguinte. A nível nacional, o Ministério da Educação apresenta uma taxa de aprovação de 77%, de reprovação de 11,4% e de abandono escolar de 11,6%, o que corresponde a uma redução, desses indicadores negativos, de cerca de metade, pois o sistema depois da reforma apresentava índices de reprovação de 22% e de abandono escolar de 24%, respectivamente, sendo as percas do sistema, à época, de 46%, quando ago-ra se situa em 23%.

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CEIC / UCAN

Mas, esta realidade não é a mesma em todas as províncias, continuando a haver grandes disparidades entre elas. Por exemplo, a província de Benguela tem uma taxa de aprovação de 77,46% (sendo 74,41% no ensino público e 80,5% no ensi-no privado), ligeiramente superior em 0,45 pontos percentuais ao índice nacional, mas apresenta percas do sistema de 23%, sendo a taxa de reprovação de 15,24% (sendo 12,36% no público e 18,12% no privado) e o abandono escolar de 8,58% (12,17% no público e 5% no privado) igualmente superiores às cifras nacionais.

Não deixa de ser interessante verificar que o ensino primário, nessa provín-cia, apresenta níveis de aprovação decrescentes consoante se avança nas classes, indo de 87%, para a 1.a classe, a 63%, para a 6.a classe, traduzido num rendimento médio, para o ensino primário público, de 74,6%, como ficou dito. Já o ensino pri-mário privado regista níveis mais altos, em quase todas as classes, com excepção da 5.a classe, onde se dá um verdadeiro desastre que se traduz num rendimento negativo de 43%, quando as demais classes registam todas níveis iguais ou supe-riores a 84% (como é o caso da 4.a classe). Maior ainda é a estranheza em relação aos resultados da 5.a classe, no ensino privado, quando a mesma classe, no ensino público, regista um dos seus melhores níveis, com 85% de aprovação.

RENDIMENTO ESCOLAR

Matriculados Aprovação Reprovação Abandono

Angola BenguelaLuanda Cuando Cubango

5.16

2.87

9

3.97

5.41

7

588.

568

598.

894

1.12

5.64

8

474.

512

62.7

23

58.6

81

FONTE: CEIC-UCAN a partir de dados do Ministério da Educação e Direcções Provinciais da Educação.

4.3.3 Abandono escolar

A taxa de abandono escolar, segundo a avaliação feita em algumas províncias, depois da reforma escolar, tem registado valores estacionários devido a factores exógenos ao sistema educativo, mas que influenciam fortemente o comportamento

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

das crianças e a sua permanência na escola. No entanto, em 2013, parece haver algum progresso pois o Ministério da Educação assinala, para todo o sistema de educação geral (isto é, primário e secundário) níveis de abandono escolar de 11,6% e de repetência de 23%, a nível nacional, quando em 2010 se assinalava 24%.

Continua actual a necessidade de investir mais nas áreas como o transporte escolar, o reforço da merenda escolar, a saúde escolar, o desporto e as actividades de tempos livres para tornar a escola mais atractiva para as crianças e para as famí-lias, invertendo deste modo o quadro actual.

4.3.4 Evolução do corpo docente

O corpo docente, em 2013, para o ensino primário, regista 152.657 professo-res, que corresponde a um acréscimo de 13.498 e a um crescimento relativo de 9,7% em relação ao ano anterior. Não há ainda informação suficiente para avaliar o impacto do Plano Mestre de Formação de Professores (PMFP), estabelecido em consequência da reforma educativa (2002-2012), cujo objectivo é melhorar a capa-cidade pedagógica, metodológica e académica dos professores, supervisores e for-madores. O que se tem como certo é que apesar do recrutamento constante, a capacitação e a valorização de professores, demonstrado pela taxa média de cres-cimento de docentes, estes são ainda insuficientes, mesmo porque muitos deles são de baixa qualidade académica e pedagógica e outros têm dificuldades na sua colocação e sedentarização, nomeadamente nas áreas rurais e periurbanas. Para além do facto de haver descontinuidades na contratação, integração e requalifica-ção de professores.

Ano Novos docentes Taxa de crescimento

2002 83.601 7472 9,81%

2003 112.785 29.184 34,91%

2004 113.785 1000 0,89%

2005 130.128 16.343 14,36%

2006 150.758 20.630 15,85%

2007 167.989 17.231 11,43%

2008 106.940 9079 8,49%

2009 121.206 14.266 13,34%

2010 125.290 4084 3,36%

2011 133.469 8179 6,5%

2012 139.159 5690 4,26%

2013 152.657 13.498 9,7%

FONTE: CEIC a partir de dados do Ministério da Educação (Evolução da Educação e Ensino em Angola).

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CEIC / UCAN

Depois de uma regressão de cerca de 2,5 pontos percentuais, no ano anterior, este ano (2013) o corpo docente, do ensino primário, registou uma progressão de 9,7%, correspondendo a 13.498 novos professores recrutados, quer dos que saí-ram das escolas de formação de professores, quer de outras formações.

4.3.5 Evolução das infra-estruturas e equipamentos escolares

O ensino primário, juntamente com a iniciação, registaram uma evolução em infra-estruturas que se cifrou num total de 56.252 salas de aulas. Apesar de terem sido construídas mais 3379 novas salas de aulas, correspondendo a uma progres-são de cerca de 6,3%, em relação ao ano anterior, a relação de 120 alunos por sala continua a ser preocupante.

EVOLUÇÃO DAS INFRA-ESTRUTURAS

0

10.000

40.000

30.000

20.000

50.000

60.000

2009 2010 2011 2012 2013

Salas de aulas Novas Salas Progressão%

4.4 Ensino secundário

Os indicadores nacionais da educação mostram o quanto o sistema de ensino sofre de um estrangulamento na passagem do ensino primário para este nível sub-sequente. O ensino secundário está repartido por um 1.o Ciclo (com uma duração de 3 anos: 7.a, 8.a e 9.a classes), um 2.o Ciclo normal (com uma duração de 3 anos: 10.a, 11.a e 12.a classes)20 ou ainda 2.o Ciclo técnico ou de formação de professo-res (ambos com uma duração de 4 anos: 10.a, 11.a, 12.a e 13.a classes). O ensino secundário está concentrado nas zonas urbanas e tem uma fraca frequência nas zonas rurais.

20 Lei de Bases do Sistema de Educação (Lei 13/01), Artigos 19.o e 33.o, 1 e 2.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

4.4.1 Cobertura escolar

A cobertura escolar, ao nível do ensino secundário, é feita quase exclusivamen-te pelo ensino público. A presença de agentes privados é quase insignificante na maior parte do território e concentra-se sobretudo na capital e faixa litoral. Os demais agentes são as escolas secundárias das igrejas, nomeadamente da Igreja Católica, que não somente tem um sistema de ensino próprio como assume a ges-tão de muitos estabelecimentos do Estado.

Em 2013, foram matriculados, no ensino secundário, 1.015.896 estudantes (sendo 685.265 do 1.o Ciclo e 330.631 do 2.o Ciclo), para uma população corres-pondente ao nível de 2.961.000, o que equivale a uma cobertura bruta de 34,3% e líquida de 30,7%, considerando um atraso escolar de 10,4%, já que o Ministé-rio da Educação considera um atraso escolar geral (ensino primário e secundário) de 69,4% e o IBEP assinalou um atraso escolar de 59% para o ensino primá-rio. Se considerarmos uma população correspondente ao nível de 2.717.790 que é a considerada pelo Ministério da Educação (sendo de 1.451.505 do 1.o Ciclo e de 1.266.285 do 2.o Ciclo), teremos uma cobertura bruta de 37,4% e líquida de 33,5%.

Indicadores nacionais do ensino secundário Meta para 2013

Matrículas

1.o Ciclo 706.791 685.265,00

2.o Ciclo 407.251 330.631,00

N.o de professores por níveis de ensino

Ensino Secundário, 1.o Ciclo 86.101 83.605,00

Ensino Secundário, 2.o Ciclo 35.692 42.044,00

Número de sala de aulas

Ensino secundário, 1.o Ciclo 4808 4686,00

Ensino secundário, 2.o Ciclo 3332 2924,00

Taxa Bruta de Escolaridade

Ensino Secundário, 1.o Ciclo 48,70% 47,20%

Ensino Secundário, 2.o Ciclo 32,20% 26,10%

Infra-estruturas e equipamentos escolares

Escolas a construir no Ensino Secundário (1.o e 2.o Ciclos) 19 19,00

Escolas a reabilitar no Ensino Secundário (1.o e 2.o Ciclos) 5 3,00

As matrículas no ensino secundário são uma consequência particular do atraso escolar e do fraco rendimento no subsistema anterior. Estas matrículas são desi-guais nas diversas províncias e concentram-se sobretudo no litoral, nas duas prin-cipais províncias: Luanda e Benguela, como se pode ver no gráfico seguinte.

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CEIC / UCAN

MATRÍCULAS NO ENSINO SECUNDÁRIO

1.o Ciclo 2.o Ciclo Médio/Técnico

0

100.000

200.000

500.000

600.000

400.000

300.000

700.000

BenguelaAngola Luanda Cuando Cubango

Luanda concentra cerca de um terço dos estudantes do 1.o Ciclo e mais de metade dos estudantes do 2.o Ciclo do secundário. O gráfico acima mostra tam-bém que o ensino secundário apresenta uma taxa de escolarização muito baixa, quer no 1.o Ciclo (47,2%), quer no 2.o Ciclo (26,1%).

4.4.2 Rendimento escolar

O rendimento escolar no secundário, a nível nacional, não é determinável por falta de informação, sendo que o Ministério da Educação considera uma taxa de aproveitamento, no ensino geral, de 77% e uma taxa de reprovação de 11,4%. No entanto, tomando a província de Benguela como exemplo, podemos dizer que os níveis de aproveitamento se situam em 65%, sendo, para o 1.o Ciclo, 64,1% e, para o 2.o Ciclo, 67,7%. Os níveis de reprovação são de 23%, sendo de 24,4%, para o 1.o Ciclo e de 19,32%, para o 2.o Ciclo. Quer uma taxa, quer outra, são inferio-res às respectivas taxas para o ensino geral. A taxa de aprovação desce um pouco quando se considera apenas o sexo feminino, pois que de um conjunto de 75.872 matrículas, 48.370 obtêm aprovação, o que corresponde a uma taxa de aprova-ção de 63,8%, sendo 62,8% para o 1.o Ciclo e 66,34% para o 2.o Ciclo. O ensino público (55,70%) apresenta níveis de aprovação mais baixos que o ensino privado (71,23%).

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

ENSINO SECUNDÁRIO EM BENGUELA

Nível RegimeMatrículas Aprovados Reprovados

MF F MF F MF F MF F

1.o Ciclo

Público 109.477 53.855 69.877 33.529 26.927 13.669 12.673 6657

Privado 2985 1501 2218 1136 468 208 299 157

Total 112.462 55.365 72.095 34.765 27.395 13.877 12.972 6814

2.o Ciclo

Público 35.057 16.300 23.576 10.629 6787 3348 3325 1402

Privado 6959 4207 4866 2976 1129 787 964 444

Total 42.016 20.507 28.442 13.605 8116 4135 4289 1846

TOTAL 154.478 75.872 100.537 48.370 35.511 18.012 17.261 8660

Neste exemplo, podemos observar uma queda constante nos níveis de apro-veitamento que regista 64% para o 1.o Ciclo do secundário público (no privado são 74%) e 48% para o 2.o Ciclo do secundário público (no privado são 70%).

RENDIMENTO ESCOLAR

0

120.000

40.000

80.000

60.000

20.000

100.000

2.o Ciclo Total2.o Ciclo Privado

2.o Ciclo Público1.o Ciclo Total

1.o Ciclo Privado1.o Ciclo Público

MF F MF F MF

MATRÍCULAS APROVADOS REPROVADOS

F

4.4.3 Abandono escolar

O sistema de educação nacional, às perdas da reprovação, junta a desistên-cia que atinge, nos dois níveis, 11,17%, sendo 11,53%, no 1.o Ciclo e 10,21% no 2.o Ciclo. O ensino privado apresenta um maior índice de abandono (12,7%) que o ensino público (11%). Na relação de género, o sexo feminino (50,17%) tem um nível de abandono ligeiramente maior.

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CEIC / UCAN

ABANDONO ESCOLAR

0

120.000

60.000

20.000

100.000

80.000

40.000

Público Privado Total Público Privado

1.o Ciclo 2.o Ciclo

Total

4.4.4 Evolução do corpo docente

Em relação ao corpo docente do ensino secundário, em 2013, há a assinalar um total de 125.649 professores (sendo 83.605 para o 1.° Ciclo e 42.044 para o 2.° Ciclo).

DOCENTES DO ENSINO SECUNDÁRIO

0

50.000

90.000

70.000

30.00040.000

80.000

60.000

20.00010.000

Efectivos 1.o Ciclo Novos docentes

2008 2009 2010 2011 2012 2013

Ano o Ciclo Novos docentes Taxa de crescimento

2008 52.077 2067 3,97

2009 59.024 6947 13,34

2010 60.689 1665 2,8

2011 67.086 6397 10,54

2012 71.415 4329 6,45

2013 83.605 12.190 17

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

4.4.5 Evolução das infra-estruturas e equipamentos escolares

Em relação às infra-estruturas, foram construídos mais 19 edifícios escolares, havendo agora um total de 7610 salas de aulas (sendo 4686 para o 1.o Ciclo e 2924 para o 2.o Ciclo).

Met 2013

II

III

IV

Trim

estr

e

REABILITAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE ESCOLAS

Escolas a construir no Ensino Secundário (1.o e 2.o Ciclos)Escolas a reabilitar no Ensino Secundário (1.o e 2.o Ciclos)

5,00

3,0019,00

19,00

19,00

3,00

3,00

I 3,0019,00

17,00

4.5 Educação para adultos

No quadro do desenvolvimento das políticas educativas, em 2013, foi formu-lado e implementado o Programa de Alfabetização e Aceleração Escolar (PAAE), bem como criada a Comissão Nacional de Alfabetização, como um mecanismo de articulação entre os diferentes departamentos ministeriais e a sociedade civil para tratar da questão da alfabetização.

A taxa de analfabetismo, no país, está calculada em cerca de 30% da população angolana, que se estima em 21 milhões de habitantes segundo as projecções do INE, o que quer dizer cerca 6,3 milhões de adultos.

Segundo o Ministério da Educação21, em 2013, resultado da acção conjugada do Estado e de parceiros sociais, para lá da sua própria previsão de 584.050, foram matriculados na alfabetização 636.387 adultos22. O que se traduz numa progres-são bruta de 58.120 efectivos no programa de alfabetização, nos três módulos e no programa “Sim Eu Posso”, como se pode ver na tabela seguinte.

21 Comissão para a Política Social do Conselho de Ministros, “Mapa de Monitoria e Ava-liação dos Indicadores do Sector Social”.

22 Não sei por que razão foi referido pela Direcção Nacional de Educação de Adultos, durante o Conselho Consultivo do Ministério da Educação (Saurimo, 19 a 21 de Março de 2014) que, em 2013, foram alfabetizados, em todo o território nacional, 990.203 jovens e adultos, por um corpo de alfabetizadores estimado em 15.600.

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CEIC / UCAN

EVOLUÇÃO DOS EFECTIVOS DA ALFABETIZAÇÃO(2009-2013)

2009 2010 2011 2012 2013

532.491 532.943 561.424 578.267 636.387

- (+0,08%) (+5,3%) (+3%) (+10%)

FONTE: CEIC a partir de dados do Ministério da Educação.

Em Luanda, que conta com 3228 alfabetizadores e 2386 alfabetizadoras, foram alfabetizados 260.550 adultos (sendo 64.312 homens e 196.238 mulheres).

Angola Luanda Benguela

Matrículas MF 636.387 133.691

Matrículas F 85.141

Aprovados MF 260.550 103.838

Aprovados F 196.238 66.892

Reprovados MF 14.695

Reprovados F 8818

Abandono MF 15.158

Abandono F 9431

5614

Já em províncias como Benguela, foram matriculados na alfabetização 133.691 adultos, tendo sido alfabetizados 103.838 adultos (dos quais 66.892 mulheres). A tabela abaixo mostra claramente uma forte implicação das mulheres neste pro-grama, embora aparentemente sejam também as mulheres as que mais o aban-donam.

ALFABETIZAÇÃO EM BENGUELA EM 2013

Matrículas Aprovação Reprovação Abandono

MF F MF F MF F MF F

SIM EU POSSO 43.710 30.328 34.607 24.559 5281 3160 3822 2609

MÓDULO 1 37.330 26.584 26.228 19.056 4367 3146 6735 4380

MÓDULO 2 18.143 10.080 13.942 7842 2223 1213 1978 1025

MÓDULO 3 34.508 18.149 29.061 15.435 2824 1297 2623 1417

TOTAL 133.691 85.141 103.838 66.892 14.695 8818 15.158 9431

Em termos de rendimento da alfabetização pode-se notar uma prevalência das mulheres, como está expresso no gráfico seguinte.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Sim eu posso

Módulo 2

Módulo 3

TAXA DE APROVAÇÃO NO PROGRAMA DE ALFABETIZAÇÃO E ACELERAÇÃO ESCOLAR

Masculino

75

83

76

Módulo 1 67

81

85

78

72

4.6 Ensino especial

O ensino especial registou 26.651 matrículas, em 2013. Há pouca informação sobre o ensino especial no país todo. No entanto, o caso de Benguela pode ser ilus-trativo, como se vê no gráfico abaixo.

NÚMERO DE ALUNOS MATRICULADOS NO ENSINO ESPECIAL

9.a Classe

6.a Classe

5.a Clas

se

4.a Classe

8.a Classe

7.a Classe

3.a Classe

2.a Classe

1.a Classe

Iniciaçã

o

4867

149

50

112

44

95

11698

64

4.7 Manuais e merenda escolar

É sabido que os níveis de aproveitamento e de desistência estão também asso-ciados ao facto de os alunos disporem de boas condições de estudo contando nomeadamente com manuais para estudar, quer no acompanhamento das aulas, quer no estudo complementar em casa. No entanto, como se pode ver no gráfico seguinte, os manuais não foram todos produzidos (previa-se editar 48.305.387) e dos que o foram (46.790.200), apenas 93,6% foram distribuídos (43.790.200), no 4.o trimestre do ano, pois no 1.o trimestre do ano, altura em que se devia fazer a distribuição de todos os manuais, apenas foram distribuídos 9.706.743 manuais dos então 40.025.892 produzidos, por falta de transporte.

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CEIC / UCAN

Met 2013

II

III

IVTr

imes

tre

MANUAIS EM 2013

Manuais distribuídos Produção dos manuais

48.305.387,00

46.787.387,00

45.777.387,00

42.523.067,00

I 40.025.892,00

42.523.067,00

43.790.200,00

42.770.380,00

37.000.025,00

9.706.743,00

Outro factor que contribui para o bom desempenho escolar das crianças é a merenda escolar, no entanto, apesar deste programa ser de âmbito nacional e ter como propósito combater o insucesso escolar, proporcionando às crianças escola-rizadas condições nutricionais melhoradas, o mesmo não tem merecido a melhor atenção das autoridades públicas (agora sob gestão das administrações munici-pais, segundo DP 138/13, de 24 de Setembro) e continua a registar números irrisó-rios para o conjunto da população estudantil.

4.8 Ensino superior

O ensino superior continua a ser, manifestamente, uma das apostas do Execu-tivo angolano e, ao mesmo tempo, um dos centros das preocupações da socieda-de, das famílias, dos partidos políticos, das igrejas e da mídia. Essa dupla condição reflecte, de modo fiel, o paradoxo que paira sobre esse subsistema de ensino. Se, por um lado, é inegável o seu processo de franca evolução, visível sobretudo no que toca à expansão da rede de Instituições de Ensino Superior (IES) por todo o país23, por outro, é cada vez mais perceptível que tal crescimento se vem fazendo, sob diversos aspectos, em prejuízo da devida atenção a ser conferida à qualidade de ensino e, com efeito, à dimensão estratégica da qualificação superior para a

23 Actualmente, o país conta, no activo, com 17 universidades (10 das quais privadas), 19 institutos superiores autónomos (sendo 12 privados) e 3 escolas superiores autó-nomas (todas públicas). O que corresponde a 43,6% de instituições públicas e 56,4% de instituições privadas. Contudo, é preciso referir que a distribuição dessas institui-

só Luanda concentra 62,5% das universidades e cerca de 30, 76% dos institutos autó-nomos.

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economia, a cidadania e cultura nacionais24. Quanto mais se dilata a oferta pública e privada, mais parecem tornar-se óbvias as distorções no que concerne ao atendi-mento dos padrões médios de exigência académica e científica.

Não é difícil de notar e reconhecer, como aliás vem sendo assinalado por dife-rentes autores25, que grande parte do insucesso que se regista no ensino superior advém dos subsistemas anteriores, responsáveis que são pela formação deficitá-ria dos jovens ingressantes. Pois, a qualidade de um nível de ensino depende da qualidade anterior do nível abaixo dele e com o qual tem uma ligação umbilical. No entanto, existem e persistem insuficiências inerentes ao próprio subsistema de ensino superior, quer ao nível da legislação e da implementação de políticas e pro-gramas, quer do funcionamento interno das IES, as quais, em alguns casos, funcio-nam de modo ilegal26 ou não revelam idoneidade suficientemente para o exercício da missão a que se propõem, embora lhes seja mantido o reconhecimento legal (ou oficioso, em alguns casos) sem sequer terem sido alvos de inspecção e avalia-ção por parte do órgão de tutela, no caso o Ministério do Ensino Superior27.

Aliás, a questão da qualidade de ensino, um dos principais problemas do sub-sistema do ensino superior angolano hoje, é a área na qual o Ministério do Ensino Superior encontra as suas maiores dificuldades, no quadro das políticas de desen-volvimento e reforma do ensino superior. Até então, ao que se constata, esse sub-sistema não dispõe de indicadores gerais claros com os quais se possa mesurar a

24 Ao referir-se ao ensino superior, um relatório sobre o sector privado em Angola chega à seguinte conclusão: “Apesar do acesso à educação ter melhorado nos últimos anos, a qualidade permanece uma preocupação” (Estefanía Jover, et. al., Angola – Private Sector

, Dezembro de 2012). Para uma abordagem crítica sobre o assunto, Cf. Paulo de Carvalho, “Evolução e crescimento do ensino superior em Angola”, in Revista Angolana de Sociologia, n.o 9, Mangalde: Edições Pegado, pp. 21-59, 2012.

25

O lugar e o papel das ciências sociais na construção do país e do futuro dos angolanos”, in Revista Angolana de Sociologia, n.o 1, Mangalde: Edições Pegado, pp. 85-92, 2008.

26 Excepção digna de nota é a do caso da denominada Universidade Deolinda Rodri-gues, no Bié, que chegou mesmo a ser encerrada em 2012 pelo governo da província. Cf. ANGOP. Disponível em: http://www.portalangop.co.ao. Acessado em Outubro de 2013.

27 A este propósito, uma das questões mais suscitadas é a do carácter meramente comercial de algumas instituições privadas, revelado, por exemplo, quer na cobrança

-ção, quer na abertura de novos cursos, com o consequente aumento da oferta de vagas e turmas, sem a devida autorização do órgão de tutela. Cf. Alfredo Buza e Jitenga Alberto, “Políticas públicas de desenvolvimento e de reforma do ensino superior no contexto da República de Angola”, comunicação apresentada na 2.a Conferência do FORGES – Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa – 6, 7 e 8 de Novembro de 2012, Macau, p. 12.

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qualidade do ensino oferecido pelos diversos cursos das IES. Não sabemos, portan-to, qual a variabilidade – ritmo de crescimento e queda – dos índices da qualidade do ensino superior até à data presente. Na verdade, a rigor, não se pode sequer falar em qualidade no ensino superior, posto que a ausência de um Sistema de Avaliação do Ensino Superior28 não permite haver dados objectivos, quer sobre o desempenho dos estudantes, quer sobre o desempenho das IES.

Neste sentido, 2013 foi um ano marcante, na medida em que veio não só reve-lar uma tendência de crescimento quantitativo acima das metas preconizadas, mas também alertar para a ingente necessidade de uma maior aposta nas infra-estru-turas académicas, na pesquisa científica, na avaliação interna e externa do desem-penho dos estudantes e das instituições, na qualificação pedagógica e científica do quadro docente, na democratização dos processos de gestão e decisão académica, dentre outros muitos aspectos que concorrem para a melhoria da qualidade de ensino e da eficiência do subsistema29. O desenvolvimento sustentado do ensino superior depende do investimento equilibrado na expansão da cobertura da rede e na qualidade do ensino, da pesquisa científica e da extensão, contrariamente à visão política oficial que tende a encarar o crescimento qualitativo como uma rea-lidade subsequente e não paralela ao crescimento quantitativo.

4.8.1 O crescimento e suas implicações

Em 2013, o subsistema do ensino superior foi uma das áreas do sector social que mais cresceu, fruto do significativo alargamento, que já mostra consolidar-se a partir de 2009, da oferta pública e privada pelas 18 províncias do país. O cresci-mento operou-se não só com o aumento do orçamento alocado às universidades públicas (de 11.758.988.134,00 Kz em 2012 para 20.582.665.112,00 Kz em 2013), do número de empregos directos (de 12.761 em 2012 para 13.825 em 2013), de pessoal não docente (de 143 em 2012 para 1116 em 2013), de vagas disponíveis (de 31.000 em 2012 para 32.240 em 2013), de bolsas de estudo internas e externas (6000/800 em 2012 para 6464/1200 em 2013) e de graduados30. Ele deu-se também,

28 Espera-se, no entanto, que os empecilhos que até então emperravam a entrada em funcionamento do Instituto Nacional de Avaliação e Acreditação (INAA) estejam já superados.

29 Esse imperativo chegou a ser reconhecido pelo próprio Presidente da República, ao mencionar a “melhoria clara da qualidade do ensino” como a principal prioridade do executivo angolano para o ensino superior. José Eduardo dos Santos, Mensagem sobre o Estado da Nação, Proferida na Abertura da II Sessão Legislativa da III Legislatura da Assembleia Nacional, Luanda 15 de Outubro de 2013, p. 6.

30

total de 90 cursos ministrados em todo o país. No entanto, esses dados são relativos a apenas 52,77% das IES que remeteram a informação solicitada pelo Ministério do Ensino Superior.

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e com maior visibilidade e impacto, com o aumento exponencial do número de matrículas registadas e com o aumento considerável do número de docentes.

A grandeza desse crescimento será mais bem mensurada, certamente, se se levar em consideração, antes de mais, as metas previstas para 2013 no Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017 (PND)31, documento que resulta do programa de gover-no do partido no poder sufragado nas últimas eleições de 2012. Deve ainda ser tido em conta, por conseguinte, as dinâmicas do crescimento demográfico e socioeconó-mico, as quais, não raro, exigem a revisão das referidas estimativas em função das pressões que exercem sobre toda a cadeia do sistema de ensino, incluindo o seu topo.

4.8.1.1 O crescimento do número de estudantes

Em termos globais, o número de matrículas efectuadas situou-se em 218.678, ou seja, 16,7 pontos percentuais acima do estimado (182.250)32. A taxa de crescimento anual foi de 31,4%. Houve, assim, um crescimento em mais de um terço de estudan-tes matriculados em IES em relação ao ano de 2012, que contou com 150.000 matrí-culas, o que se traduz em apenas 7,1% a mais do alcançado no ano anterior.

EVOLUÇÃO DO NÚMERO E DA PERCENTAGEM DE MATRÍCULAS NO ENSINO SUPERIOR 2009-201333

2009 2010 2011 2012 2013

N.o % N.o % N.o % N.o % N.o %

98.777 +12,3 107.039 +8,4 140.016 +30,8 150.000 +7,1 218.678 +31,4

Média de Crescimento

Global18%

FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e no MPDT, 2012-2013. 33

Trata-se, como bem ilustra o gráfico seguinte, do maior aumento nos cinco últi-mos anos, fixando-se perto da meta estabelecida para 2014, que é de 221.43434. E a manter-se tal ritmo ascendente, tudo indica que, em menos de três anos, serão atingidas as metas previstas para os próximos quatro anos35 em termos de cresci-mento global de matrículas, o que, por si só, entretanto, não deve constituir moti-vo de plena satisfação. Para que se torne sustentável, esse crescimento deve ser

31 Ministério da Administração do Território, Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017, Luanda: Dezembro de 2012.

32 Id. Ibid., p. 119.

33 Os dados referentes a 2009, 2010 e 2011 incluem as IES privadas que estavam a fun-

34 Id. Ibid., p. 119.

35 Ou seja, até 2007, ano limite de execução do Plano Nacional de Desenvolvimento.

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acompanhado do correspondente incremento de recursos humanos (sobretudo docentes), salas de aula, equipamentos (laboratórios, bibliotecas, oficinas, etc.) e outros meios, implicando, desse modo, a recontextualização da planificação do crescimento de todo o subsistema.

CRESCIMENTO REAL E ESTIMADO DO NÚMERO DE MATRÍCULAS NO ENSINO SUPERIOR2009-2014

Crescimento real

0

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

20132009 2011 20142010 2012

FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e no MPDT, 2012-2013.

No que respeita à relação entre público e privado, verifica-se que 60,2% do total de matrículas em 2013 corresponde à população discente do ensino supe-rior privado, ao passo que 39,8% aos estudantes da rede pública. Esse crescimento desigual vem acentuando-se desde 2010, ano em que as IES privadas já contavam com quase 55% do número de estudantes do ensino superior, quando em relação às instituições públicas se verificou um decréscimo da média anual de crescimento.

EVOLUÇÃO DO NÚMERO E DA PERCENTAGEM DE MATRÍCULAS NA REDE PÚBLICA E NA REDE PRIVADA DE ENSINO SUPERIOR 2009-2013

2009 2010 2011 201236 2013

N.o % N.o % N.o % N.o % N.o %

Rede Pública 48.380 49 48.242 45,1 67.183 48 - - 86.918 39,8%

Média Anual de Crescimento –2,5% –0,3% 39,3% - -

Rede Privada 50.397 51 58.797 54,9 72.833 52 - - 131.760 60,2%

Média Anual de Crescimento 31,4% 16,7% 23,9% - -

FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e no MPDT, 2012-2013. 36

36 A ausência, em diferentes tabelas, de dados relativos ao número de estudantes no ano de 2012 constitui uma lacuna relevante. Contudo, como se pode perceber ao longo da

a perspectiva conjuntural da análise.

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Com efeito, no ensino superior público, o crescimento do acesso, que, a despeito das estimativas oficiais, se anunciava muito mais elevado em função, principalmen-te, do surgimento das novas 6 universidades públicas37, para além da Universidade Agostinho Neto, dos institutos38 e das escolas39 superiores autónomas no âmbito da criação das 7 regiões académicas40 que configuram o actual mapa académico angola-no, revelou taxas relativamente modestas. Acredita-se que o mesmo se deva, dentre outras razões, ao facto de, até à data da sua existência legal, muitas dessas instituições (institutos e unidades orgânicas) não terem ainda instalações disponíveis, ficando a sua entrada em funcionamento adiada até aqui. Assim são os casos de seis (37,5%) dos 16 institutos autónomos públicos criados, que são: Instituto Nacional de Petróle-os (no Kwanza Sul), do Instituto Superior Politécnico, do Instituto Superior Pedagógico e do Instituto Superior de Tecnologia Agro-Alimentar (em Malanje), do Instituto Supe-rior de Pescas (no Namibe) e do Instituto Superior de Ciências da Saúde (no Uíge). Também aguardam por infra-estruturas cinco (9,8%) das 51 unidades orgânicas das 7 universidades públicas existentes, nomeadamente: Escola Superior de Hotelaria e Turismo e Instituto Superior Politécnico (ambos da Universidade Agostinho Neto), Faculdade de Agronomia e Faculdade de Medicina Veterinária (ambas da Universida-de Lueji-a-Nkonda) e Faculdade de Economia (da Universidade Kimpa Vita).

Na tabela que se segue, observa-se que a Universidade Agostinho Neto apre-senta uma diminuição de 15,4% no total de estudantes matriculados no ensino

37 Universidade 11 de Novembro, Universidade José Eduardo dos Santos, Universidade Katyavala Buila, Universidade Kimpa Vita, Universidade Lueji-a-Nkonda e Universidade Mandume ya Ndemofayo.

38 Em funcionamento são: Instituto Superior de Ciências de Educação da Huíla, Instituto Superior de Ciências de Educação de Luanda, Instituto Superior de Ciências de Edu-cação do Huambo, Instituto Superior de Serviço Social, Instituto Superior de Tecnolo-gia de Informação e Comunicação, Instituto Superior Politécnico de Malanje e Instituto Superior Politécnico do Kwanza Sul.

39 As três escolas criadas estão no activo neste momento, designadamente: Escola Supe-rior Pedagógica do Kwanza Norte, Escola Superior Pedagógica do Bengo e Escola Supe-rior Pedagógica do Bié.

40 Cada região académica compreende uma delimitação territorial que compreende de duas a quatro províncias: região académica I (Luanda e Bengo), região académica II (Benguela e Kwanza Sul), região académica III (Cabinda e Zaire), região académica IV (Lunda Norte, Lunda Sul e Malanje), região académica V (Huambo, Bié e Moxico), região académica VI (Huíla, Namibe, Cuando Cubango e Cunene) e região académica VII (Uíge e Kwanza Norte). Ver Decreto n.o 5/09, de 7 de Abril de 2009, publicado no Diário da República I Série, N.o 64 – Estabelece a criação das regiões académicas que delimitam o âmbito territorial de actuação e expansão das instituições de ensino superior. Nota-se que este Decreto surge, como de resto alude o seu preâmbulo, em conformidade com o previsto na Resolução n.o 4/07, de 2 de Fevereiro, publicado no Diário da República, I Série, N.o 15 – Aprova as Linhas Mestras para a Melhoria da Gestão do Subsistema do Ensino Superior (particularmente o previsto na Linha Mestra K).

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público, alcançando somente 26% em 2013, dos 51,1% em 2009. Ainda assim, den-tre todas (públicas e privadas), é a instituição que mais cresceu ao longo dos cinco anos, e o seu decréscimo foi como que compensado no interior da rede pública pelo aumento de matrículas nas novas universidades: Universidade Mandume ya Ndemofayo (de 3,1% em 2009 a 9,6% em 2013), Universidade José Eduardo dos Santos (de 5,0% em 2009 para 9,3% em 2013), Universidade 11 de Novembro (de 6,6% em 2009 para 8,6% em 2013), da Universidade Lueji-a-Nkonda (de 4,0% em 2009 para 8,1% em 2013), Universidade Katyavala Buila (de 4,6% em 2009 para 8,0% em 2013) e Universidade Kimpa Vita (de 2,7% em 2011 para 5,2% em 2013).

EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE MATRÍCULAS EM INSTITUIÇÕES PÚBLICAS DE ENSINO SUPERIOR 2009-2013

Ano

2009 2010 2011 2012 2013

Escola Superior Pedagógica do Kwanza Norte 944 1544 2129 - 3292

Escola Superior Pedagógica do Bengo 392 793 1093 - 899

Escola Superior Pedagógica do Bié 663 683 1052 - 1581

3594 3922 4656 - 5901

2356 2864 2619 - 2046

2203 1819 2532 - 2615

265 705 - 1321

Comunicação - - - - 537

- - - - 1671

329 465 954 - 1746

Universidade 11 de Novembro 3074 2943 4207 - 7497

24.712 19.585 20.536 - 22.660

Universidade José Eduardo dos Santos 2308 3203 4771 - 8120

Universidade Katyavala Buila 2160 2772 6063 - 6978

Universidade Kimpa Vita - - 1769 - 4588

Universidade Lueji-a-Nkonda41 1864 2566 6020 - 7105

Universidade Mandume ya Ndemofayo 1468 2191 5380 - 8361

Total 46.067 45.617 64.486 86.918

FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e do MESCT, 2012-2013.41

Já na próxima tabela, é possível notar que a Universidade Jean Piaget, uma das instituições privadas mais antigas do país42, mantém, desde 2009, o maior número

41 Agregados os números de matrículas da Escola Superior Pedagógica da Lunda Norte e da Escola Superior Politécnica da Lunda Sul.

42 Criada em 2001, 9 anos após a criação da primeira instituição privada em Angola, a Universidade Católica de Angola.

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de matrículas: actualmente possui 10,6% dos estudantes da rede privada e 6,3% do total dos estudantes do ensino superior. A seguir, apresentam ainda um cres-cimento considerável no quadro da rede privada as seguintes instituições: Uni-versidade Técnica de Angola (com 7,5%), Universidade Metodista de Angola (com 6,4%), Universidade Independente de Angola (com 6,2%), Universidade Gregório Semedo (com 5,1%) e Instituto Superior Politécnico Metropolitano (com 4,6%). Por seu turno – e contrariamente à tendência geral –, outras instituições registam uma diminuição no número de estudantes durante o quinquénio, como são os casos da Universidade Privada de Angola (de 4871 em 2009 para 3003 em 2013), do Insti-tuto Superior de Ciências Sociais e Relações Internacionais (de 3316 em 2010 para 3111 em 2013) e da Universidade Lusíada de Angola (de 5089 em 2009 para 5065 em 2013). Mas, à semelhança do que se verificou em relação ao ensino público, essa queda foi compensada pelo crescimento das instituições mais recentes43.

43 Entre 2009 e 2013, foram criadas as seguintes instituições autónomas privadas: Instituto Superior Politécnico de Benguela (2011), Instituto Superior Politécnico do Cazenga (2011), Instituto Superior Politécnico Gregório Semedo da Huíla (2011), Insti-tuto Superior Politécnico de Humanidades e Tecnologias “Ekuikui II” (2011), Instituto Superior Politécnico Independente (2011), Instituto Superior Politécnico Kangonjo (2011), Instituto Superior Politécnico Pangeia (2011), Instituto Superior Politécnico de Tecnologias (2011), Instituto Superior Politécnico da Tundavala (2011), Instituto Superior Politécnico Metropolitano de Angola-IMETRO (2012), Instituto Superior Poli-técnico de Cabinda (2012), Instituto Superior Politécnico Lusíada de Benguela (2012), Instituto Superior Politécnico Lusíada de Cabinda (2012), Instituto Superior Politéc-nico Jean Piaget de Benguela (2012), Instituto Superior Politécnico Católico de Ben-guela (2012), Instituto Superior Politécnico de Ciências e Tecnologia-INSUTEC (2012), Instituto Superior Politécnico Katangoji (2012), Instituto Superior Politécnico Atlântida (2012), Instituto Superior Politécnico Alvorecer da Juventude-ISPAJ (2012), Instituto Superior Politécnico Internacional de Angola (2012), Instituto Superior de Ciências de Administração e Humanas (2012), Instituto Superior Politécnico Kalandula de Angola (2012), Instituto Superior de Angola (2012), Instituto Superior Politécnico Maravilha (2012), Instituto Superior Politécnico Sol Nascente (2012), Instituto Superior de Tec-nologia e Ciências-ISTEC (2012), Instituto Superior Politécnico do Zango-ISPOZANGO (2012), Instituto Superior Politécnico de Porto Amboim (2012), Instituto Superior Politécnico Ulemba (2012), Instituto Superior Politécnico Lusíada do Huambo (2012), Instituto Superior Politécnico Lusíada da Lunda Sul (2012), Instituto Superior Politéc-nico Deolinda Rodrigues (2012), Escola Superior Politécnica de Benguela (2012), Insti-tuto Superior Politécnico Maravilha (2013), Instituto Superior Politécnico de Porto Amboim (2013). Ver Decreto Presidencial N.o 168/12, de 24 de Julho de 2012, publi-cado no Diário da República, I Série, N.o 141 – Autoriza a criação de várias instituições de ensino superior privado. Muitos desses institutos resultaram do desmembramento daquelas universidades cujos pólos estavam disseminados pelas províncias, como se pode deduzir das designações adoptadas. Todavia, vale frisar que algumas delas

como mostram os dados constantes na tabela seguinte.

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CEIC / UCAN

EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE MATRÍCULAS EM INSTITUIÇÕES PRIVADAS DE ENSINO SUPERIOR 2009-2013

Ano2009 2010 2011 2012 2013

Universidade Jean Piaget 7323 8597 8495 - 13.993Universidade Técnica de Angola 4005 5908 7044 - 9925Universidade Independente de Angola 5842 5489 6561 - 8180Universidade Metodista de Angola 1710 2496 2109 - 8508Universidade Lusíada de Angola 5089 5586 5722 - 5065Universidade Gregório Semedo 3845 4033 5722 - 6795Universidade Óscar Ribas 3083 3936 4942 - 4883Universidade Católica de Angola 3691 3697 4524 - 4425Universidade de Belas 2786 2737 4414 - 3899

1390 3680 5873 - 4469

Internacionais-CIS 2448 3316 3583 - 3111

Privado de Angola) 4871 3889 3222 - 3003

1390 2227 3080 - 6079- - 1658 - -- - - - 320

872 1078 1505 - 1363934 987 1081 - 1209

1118 1141 1047 - 1972- - 991 - 1555

Tecnologias “Ekuikui II” - - 750 - 2839

- - 510 - 1554- - - - 1096- - - -- - - - 641- - - - 940- - - - 2603- - - - 258- - - - 1900- - - - 1419- - - - 611- - - - 931- - - 688- - - - 6915- - - - 4530- - - - 1825- - - - 1825- - - - 1069- - - - 1226- - - - 785- - - - 5613- - - - 1.129

Total 50.397 58.797 72.833 - 131.760FONTE: CEIC com base no GEPE do MES e do MESCT, 2012-2013.

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É interessante constatar, por outro lado, que, do total de matriculados em 2013, 120.564 são estudantes do sexo feminino, contra 98.114 do sexo mas-culino. A mesma preponderância verifica-se quer no ensino superior privado (com 48,9% de população masculina e 51,1% de população feminina), quer no ensino superior público (com 38,7% de população masculina e 61,2% de popu-lação feminina). Esse dado representa um progresso significativo, se compara-do aos dados dos anos anteriores, à luz dos quais a desigualdade de género nas instituições de ensino superior angolanas, em particular, e africanas, em geral, com a absoluta vantagem para os homens, era considerado um problema cen-tral do subsistema e um dos motivos da sua crise de legitimidade44. É também um sinal de que os constrangimentos socioeconómicos, culturais e ideológicos que antes bloqueavam o protagonismo social e intelectual das mulheres vêm tornando-se cada vez mais uma realidade do passado, em função da democra-tização da sociedade. O papel da mulher na vida social tem crescido a cada dia, e o ensino superior vem demonstrar ser um dos canais privilegiados para essa emancipação45.

PERCENTAGEM DE HOMENS E MULHERESNO ENSINO SUPERIOR - 2013

HomensMulheres

55,2%

44,8%

FONTE: CEIC, com base no GEPE do MES, 2013.

44 Na medida em que as IES passaram a ser vistas como instituições antidemocráticas, no sentido em que reproduziam e endossavam a lógica sexista e patriarcalista das rela-ções sociais. Cf. Víctor Kajibanga, “Ensino superior e dimensão cultural do desenvolvi-mento”, comunicação apresentada na Semana Social: Educação para a Cultura de Paz, Luanda, 1999.

45 Angola segue, assim, uma tendência geral na África Austral, onde a taxa geral de matrículas de mulheres no ensino superior vem crescendo desde 2011, com um per-centual de 49,9. Cf. SADC: Monitor do Género, Harare: SARD, 2013.

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CEIC / UCAN

RELAÇÃO ENTRE HOMENS E MULHERES NO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO E PRIVADO - 2013

Ensino Superior Público Ensino Superior Privado

Homens Mulheres

0

10.000

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

70.000

FONTE: CEIC com base no GEPE do MES, 2013.

O exame da evolução do número de matrículas, no entanto, só estaria com-pleto se fosse possível desagregar os números na base de outras operações. Por exemplo, comparar com, certa precisão, as taxas bruta e líquida de matrículas, bem como identificar a distinção de matrículas por cursos e segundo as taxas de renda familiar, o que a indisponibilidade de dados estatísticos oficiais não permi-te46. É necessário saber, em concreto:

o número total de matrículas de estudantes com idade prevista para cursar o nível superior (de 18 a 22 anos);

o número de matrículas por idade e ano curricular;

o número de matrículas em cada curso;

o número de matrículas de acordo com as taxas de renda familiar.

Sem essa verificação, não se pode conhecer a real natureza do crescimento, isto é, aferir em que medida a evolução do número de matrículas reflecte, de facto: 1) o aumento da capacidade potencial de atendimento e de inclusão do subsistema; 2) a diversificação do ensino superior em função da crescente heterogeneidade dos ingressos do ensino secundário em termos de competência académica, inte-resses e vocações; 3) o nível de adequação da formação superior às necessidades

46 Lamentavelmente, os dados necessários não constam da informação estatística cedida pelo Gabinete de Estudos, Planeamento e Estatística (GEPE) do Ministério do Ensino Superior, muito embora tenham sido solicitados expressamente.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

efectivas do país, de acordo com o previsto no Plano Nacional de Formação de Quadros (PNFQ)47. Ou ainda, não é possível saber até que ponto o ensino superior se afirma, assim, como um factor de mobilidade social de um número cada vez maior de angolanos, uma vez que o crescimento das matrículas, em geral, benefi-cia primordialmente as camadas mais pobres.

Em todo o caso, sendo apenas possível fazer um cálculo estimativo da evolu-ção da taxa bruta com base no crescimento real de matrículas48, e considerando a dinâmica de progressão do número de matrículas e a previsão de crescimento do número de ingressos do 2.o Ciclo do ensino secundário, é provável que a evo-lução actual represente os primeiros passos de um processo de universalização do ensino superior, e não o resultado da eficiência do subsistema em termos de acesso. Como aponta a tabela seguinte, não obstante o crescimento constante da taxa bruta de matrículas de 2009 a 2013, com ênfase para este último ano (com 10,5%) – bem acima das expectativas (7%)49 –, a resposta à demanda por vagas na faixa etária de 18 a 22 anos situa-se ainda bastante aquém do dese-jado. É possível deduzir, assim, que a taxa líquida se situaria em percentuais muito mais baixos, apontando para um aceleramento do número de matrícu-las de estudantes com idade acima dos 22 anos50 em prejuízo do alargamento do percentual da população estudantil na faixa etária correspondente ao nível superior.

47 Essa, aliás, a par da qualidade de ensino, foi anunciada por José Eduardo dos Santos como uma das medidas prioritárias do Executivo angolano no que ao ensino superior diz respeito. Cf. José Eduardo dos Santos, Mensagem sobre o Estado da Nação, Proferida na Abertura da II Sessão Legislativa da III Legislatura da Assembleia Nacional, Luanda, 15 de Outubro de 2013, p. 6.

48 Na verdade, consideramos, de acordo com a tabelaa taxa bruta deverão ser revistas com base no crescimento real do número de matrícu-las e no crescimento da população estudantil com idade correspondente para frequen-tar o ensino superior. Ver Ministério da Administração do Território, Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017, Luanda: Dezembro de 2012, p. 118.

49

prevendo uma média anual de crescimento da taxa bruta de 1% até 2017, exceptuando 2015. Seguramente tal previsão se tenha baseado, por sua vez, em projecções igual-mente modestas do crescimento da população.

50 Como se sabe, a inclusão de estudantes com idade abaixo dos 18 anos é caso raro.

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CEIC / UCAN

EVOLUÇÃO DA TAXA BRUTA DE MATRÍCULAS NO ENSINO SUPERIOR 2009-2013

Ano N.o de Matrículas

População(de 18 a 22 anos)51 Taxa Bruta Média de

Crescimento Global

2009 98.777 1.392.638 7,09%

8,90%

2010 107.039 1431.283 7,47%

2011 140.016 1.471.176 9,51%

2012 150.000 1.512.600 9,91%52

2013 218.678 2.079.000 10,5%

FONTE: CEIC com base no GEPE do MPDT e do MES, 2012-2013.5152

Isso quer dizer, por conseguinte, que não estamos diante de um crescimen-to regular ou de um fluxo estável, mas sim de um crescimento compensatório de atrasos acumulados ao longo dos anos de instabilidade causada pela guer-ra civil que, como se sabe, impossibilitou a expansão da cobertura do ensino superior por todo o território nacional, o que, neste momento, se vai tornando possível. De modo que ocorre, agora, a inclusão daqueles que foram ficando de fora do subsistema em virtude da escassez e da falta de diversidade da oferta no passado53.

De resto, é previsível que essa compensação continue a ditar o crescimen-to do número de estudantes para além das próximas quatro décadas, a julgar pela lógica do próprio processo de universalização, que, como todo o proces-so na área da educação, se dá a longo prazo e é cumulativo. Assim, ao mesmo tempo em que vai absorvendo, o subsistema exclui aqueles que, no futuro, tal-vez venham a ser incluidos em detrimento de um número cada vez menor de excluídos, até que a cobertura escolar seja capaz de atender a totalidade da demanda. Mas, para que assim aconteça, outros factores devem ser pondera-dos no sentido de se evitar distorções, nomeadamente: 1) a melhoria do fluxo por meio da criação de mecanismos de recuperação e aceleração; 2) o fomento de bolsas de estudo internas, visando sobretudo garantir a dedicação exclusi-va e impedir a desistência daqueles estudantes com bom rendimento e mais

51

de 2,7% para 2009, 2010, 2011 e 2012, e de 2,9% para 2013.

52 Para 2012, a taxa bruta inclui a população de 19 a 22 anos.

53 Não se ignora os anos acumulados por repetência de alunos nos níveis anteriores ao ensino superior. Porém, considera-se esse acúmulo menos expressivo do que o atraso gerado pela baixa cobertura da rede de instituições.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

carenciados54; 3) a diversificação dos curricula dada a crescente heterogenei-dade dos egressos do ensino médio, em matéria de competência académica, interesse e vocações

4.8.1.2 O crescimento do número de docentes

Outra evolução que se pode constatar, como ficou dito, é quanto ao número total de docentes no ensino superior, que passou de 3222, em 2009, para 6900, em 2013, resultando numa média de crescimento global de 53,4%. Essa evolução indica o esfor-ço empreendido no recrutamento de novos docentes para o quadro da carreira docen-te – sob critérios variáveis de instituição para instituição e muitos dos quais academica e cientificamente questionáveis55 –, a par do ingresso dos estagiários. Uma vez que os dados disponíveis não fazem a necessária diferenciação de categorias (entre titulares, associados, auxiliares e assistentes) nem de classes (entre professores e assistentes) e muito menos das áreas de formação dos docentes, é impossível identificar o peso de cada uma dessas componentes, o que muito contribuiria para determinar um dos indi-cadores internacionalmente consagrados da qualidade do ensino.

EVOLUÇÃO DO NÚMERO E DA PERCENTAGEM DE DOCENTES NO ENSINO SUPERIOR2009-2013

2009 2010 2011 2012 2013

N.o % N.o % N.o % N.o % N.o %

3741 +16,1 4652 +24,4 5499 +18,2 6350 +13,5 6900 +8

Média de Crescimento Global 53,4%

FONTE: CEIC com base no GEPE do MESCT e no MPDT, 2012.

É notório, no entanto, que, ao contrário do crescimento do número de estudan-tes, o crescimento do número de docentes em 2013 deu-se de acordo com a res-pectiva meta fixada56. Acresce que, no quadro do quinquénio, 2013 foi o ano com

54 O aumento das taxas bruta e líquida de matrículas depende, em grande medida, da ausência de distorções no subsistema. Tomando como exemplo um estudante de 22 anos que, em virtude de sucessivas reprovações, frequenta o 2.o ano do curso de História na instituição “X”, pode-se notar que ele se encontra no nível de ensino corres-pondente, mas não no ano, pelo que virá a frequentar o 3.o ano já fora das taxas bruta e líquida de matrículas do respectivo ano lectivo. Deste modo, o processo exige medidas que integrem os diferentes subsistemas, para que não haja distorções nos níveis anteri-ores que venha a anular as melhorias alcançadas no ensino superior.

55 Sabe-se que o Ministério do Ensino Superior prepara, neste momento, o dossier concernente aos critérios de acesso à carreira docente, cujo objectivo será uniformizar o processo de ingresso de novos docentes e a ascensão na carreira, atribuindo assim o rigor necessário ao processo.

56 Ver Ministério da Administração do Território, Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017, Luanda: Dezembro de 2012, p. 119.

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CEIC / UCAN

menor crescimento, de apenas 8%, evidência de uma tendência de quebra de rit-mo que tem o seu início, na verdade, em 2011, depois de em 2010 se ter registado um crescimento absoluto de 24,4% em relação a 2009. O decréscimo é ainda mais nítido e preocupante quando confrontados os dados relativos ao ensino público e ao ensino privado, como se dá a ver na tabela abaixo.

EVOLUÇÃO DO NÚMERO E DA PERCENTAGEM DE DOCENTES NA REDE PÚBLICA E NA REDE PRIVADA DE ENSINO SUPERIOR

2009-2013

2009 2010 2011 2012 2013

N.o % N.o % N.o % N.o % N.o %

Rede Pública 1752 46,8 2031 43,7 2768 50,3 4181 - 4306 -

Média Anual de Crescimento 5,2% 15,9% 36,3% - -

Rede Privada 1989 53,2 2621 56,3 2731 49,7 2169 - 2594 -

Média Anual de Crescimento 27,7% 31,8% 4,2% - -

FONTE: CEIC com base no GEPE do MESCT e no MPDT, 2012.

Pode-se concluir que o crescimento do número de professores universitários não só não tem acompanhado o crescimento do número de estudantes, como era de se esperar, mas também vem ocorrendo de maneira invertida, tendo em conta que o desequilíbrio se dá em favor do ensino superior público, e não do privado, cujo crescimento da população estudantil sempre foi maior dentro dos limites de 2009-2013.

Isso reflecte-se, negativamente, como é óbvio, no rácio estudante/docente, ou seja, no número médio de estudantes por cada docente no ensino superior, em geral, e nas redes pública e privada, em particular.

RÁCIO ESTUDANTE/DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR 2009-2013

2009 2010 2011 2012 2013

Rácio 26,403 23,009 25,462 23,622 31,692

FONTE: CEIC com base no GEPE do MESCT e no MPDT, 2012.

RÁCIO ESTUDANTE/DOCENTE NO ENSINO SUPERIOR 2009-2013

2009 2010 2011 2012 2013

Rácio na Rede Pública 27,614 23,752 24,271 - 20,185

Rácio na Rede Privada 25,337 22,433 26,668 - 50,794

FONTE: CEIC com base no GEPE do MESCT e no MPDT, 2012.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Neste momento, como se pode ver nas tabelas acima, há um rácio global de 31,692 estudantes por um docente, ao passo que no ensino público a cifra é de 20,185 e no ensino privado atinge os 50,794 (mais 30,609). Embora não haja dados disponíveis que permitam aferir a distribuição dos respectivos rácios pelas instituições públicas e privadas, pode-se assegurar, com base naqueles dados, que estas últimas – e em particular mais recentes – estejam em pior situação no que diz respeito ao rácio minimamente aceitável (20 estudantes por cada docente).

Ademais, a maior parte dos docentes das instituições privadas lecciona em regime de colaboração, sendo docentes com vinculação efectiva nas instituições públicas de ensino superior. Já no caso das instituições públicas, sabe-se que a escassez de docentes efectivos é mitigada pela contratação de um número consi-derável de docentes expatriados com dedicação exclusiva, ao abrigo de protocolos de cooperação entre o Estado angolano e outros Estados, como ocorre em algu-mas das novas universidades públicas no caso dos docentes cubanos, a quem, em geral, se confiam disciplinas do ramo das ciências exactas e biomédicas. Daí tam-bém ser necessário haver dados relativos ao regime de vinculação dos docentes por instituição.

Resta ainda notar que os dados disponíveis não estão diferenciados por cursos e por ano curricular, dois factores necessários para aferir a variabilidade dos rácios.

4.9 Despesas com a educação

Sendo a educação – como se deixou dito – a chave para o desenvolvimento de qualquer sociedade, nação ou país, o seu financiamento público é fundamental e obrigatoriamente progressivo, de maneira a que se possa ter cidadãos mais qua-lificados e dotados de conhecimentos técnicos e científicos que lhes possiblilite trabalhar em prol do desenvolvimento sustentável e equitativo da sociedade e do país. Para se ter uma educação suficiente e de qualidade é preciso investimento, quer público, quer privado que permita a construção de infra-estruturas escolares, aquisição de material técnico e bibliográfico, formação inicial e contínua, contra-tação de professores e pessoal administrativo capazes e dotar-lhes com a devida capacitação.

O financiamento público do sector da educação pode ser avaliado através da análise das respectivas dotaçãos orçamentais no Orçamento Geral do Estado. O gráfico seguinte ilustra as verbas que o Estado tem vindo a alocar ao sector da edu-cação, nos últimos quatro anos (2010-2013).

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CEIC / UCAN

2011 20132010 2012

DESPESAS PÚBLICAS COM A EDUCAÇÃO(MIL MILHÕES DE KWANZAS)

263,50

341,17376,76

536,93

FONTE: OGE (2010-2013).

Através deste gráfico vê-se claramente que neste período, a dotação orçamen-tal para o sector da educação, em termos nominais, tem vindo a aumentar signi-ficativamente: em 2010 foi alocada uma verba de 263,5 mil milhões de Kwanzas que passou, em 2011, para 341,17 mil milhões (um aumento nominal de 29,5%) e, em 2012, subiu para 376,76 mil milhões de Kwanzas, para se fixar, em 2013, nos 536,93 mil milhões de Kwanzas. O que permite ver que as despesas orçamentais com a educação, entre 2010 e 2013, duplicaram, passando de 263,5, em 2010, para 536,93 mil milhões de Kwanzas, em 2013, correspondendo a um aumento nominal de 103,8%, o que equivale a um crescimento médio anual de cerca de 25,9%.

O aumento das verbas para este sector é de facto importante e necessário ten-do em conta o baixo nível de qualificação que, em geral, Angola regista. Mas, é importante realçar que estas observações referem-se à dotação orçamental e que os números suprareferidos correspondem somente a despesas programadas e não às que efectivamente foram realizadas.

O Executivo tem, ao longo de anos, vindo a registar níveis de execução de des-pesas públicas muito baixos. Por exemplo, o Relatório de Execução Orçamental referente ao 3.o trimestre de 2012 dava conta de que até àquele período haviam sido executadas 67,2% das despesas com a educação, ou seja, 253,31 mil milhões de Kwanzas dos 376,76 mil milhões orçamentados57. É obvio que a não realização efectiva das despesas afecta a qualidade do ensino e frusta o cumprimento de metas pré-estabelecidas.

57 Os dados concernentes à execução orçamental do 4.o trimestre de 2012 e do ano de 2013 até ao momento da compilação deste relatório ainda não estavam disponíveis no site do Ministério das Finanças.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

4.9.1 Peso da despesa com a educação no OGE

Analisando a percentagem ou peso relativo da despesa com a educação, no total das despesas públicas do Estado, vê-se que se tem verificado, desde 2010, uma ligeira diminuição, passando de 8,52% para 8,09%, em 2013. No entanto, os valores monetários absolutos, apresentados no gráfico anterior, traduzem um aumento signaficativo das verbas nominais que passam de 263,5 mil milhões, em 2010, para 536,93 mil milhões, em 2013.

2011 20132010 2012

PESO DAS DESPESAS COM A EDUCAÇÃO NO OGE

8,52%8,18% 8,37%

8,09%

FONTE: OGE (2010-2013).

Parace haver uma contradição, visto que as despesas em valores monetários estão a aumentar mas o peso relativo da educação, no total das despesas do OGE, apresenta uma ligeira diminuição. Mas, não há nenhuma contradição, o que ocor-re é que as despesas totais do Estado, de ano para ano, aumentam, em função das necessidades do próprio Estado e as despesas com a educação não aumentam na mesma proporção, sendo que 8,52% de 3 bilhões é menor que 8,09% de 6 bilhões de Kwanzas.

4.9.2 Repartição da despesa com a educação nos diferentes níveis de ensino

A atribuição das verbas orçamentais aos diferentes níveis de ensino é feita de acordo com a importância estratégica atribuída pelo Executivo a cada nível e em função das suas necessidades. O gráfico seguinte apresenta a dotação do OGE para a educação, distribuída pelos diferentes níveis de ensino existentes no país.

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CEIC / UCAN

DESPESAS COM A EDUCAÇÃO EM DIFERENTES NÍVEIS DE ENSINO(MIL MILHÕES DE KWANZAS)

0,00

500,00

200,00

700,00

100,00

300,00

800,00900,00

400,00

600,00

EducaçãoPré-escolar

EnsinoPrimário

EnsinoSuperior

ServiçosSubsidiáriosà Educação

Outros Serviços Educação

EnsinoSecundário

EnsinoTecnico-

2012 20132010 2011

FONTE: OGE (2010-2013).

Antes de se analisar a estrutura da despesa da educação, pretende-se chamar a atenção para o ensino técnico-profissional que figura com uma verba de 23,53 mil milhões de Kwanzas. Dos OGE consultados, somente no de 2013 aparece esta categoria de ensino com uma dotação orçamental explicita. É de saudar essa inicia-tiva pois o país precisa de investir seriamente no ensino técnico-profissional, pois este ensino tem a vantagem de capacitar mais rapidamente os estudantes para o mercado de trabalho.

A estrutura da despesa do sector da educação denota uma prioridade atribu-ída ao ensino primário, o qual tem reiteradamente a maior fatia da dotação orça-mental da educação. O ensino secundário vem a seguir e o ensino superior é o que recebe menos verbas, em termos absolutos.

4.9.3 Estimativa da despesa per capita com a educação

Duma análise mais detalhada, isto é, do cálculo da despesa per capita de cada nível de ensino nota-se que os níveis do ensino primário (5.162.879 alunos) e secundário (1.015.896 alunos), por albergarem o maior número dos alunos matri-culados, são os que apresentam um menor nível de despesa per capita (despesa por aluno).

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

DESPESAS PER CAPITA COM A EDUCAÇÃO (EM KWANZAS)

0,00

1.000.000,00

400.000,00

1.400.000,00

200.000,00

600.000,00

800.000,00

1.200.000,00

DespesasPer Capita

Ensino Primário

DespesasPer Capita

Ensino Secundário

DespesasPer Capita

Ensino Superior

DespesasPer Capita

Geral

53.251,70 70.393, 0783.017,13

373.382,26

2012 20132010 2011

FONTE: Cálculos do CEIC, a partir dos dados do RS 2012 e do OGE.

Como podemos observar no gráfico abaixo, o ensino superior (218.676 estu-dantes) é o que apresenta a maior dotação orçamental per capita, de todos os níveis de ensino, pois é o ensino com menor número de estudantes matriculados, comparados com o ensino primário e secundário.

20122011 20132010

DESPESAS PER CAPITA ENSINO SUPERIOR (EM KWANZAS)

280.421,15 275.214,60

249.917,06

373.382,26

FONTE: Cálculos do CEIC, a partir dos dados do RS 2012 e do OGE.

Claramente vê-se que o ensino superior, em termos per capita, é o subsistema de ensino ao qual mais verbas são alocadas. De acordo com as estimativas do CEIC, baseadas em dados oficiais do Ministério da Educação, em 2010 estavam matri-culados no ensino superior perto de 107 mil estudantes e as verbas orçamentais atribuídas naquele ano foram de 30,76 mil milhões de Kwanzas, o que nos dá, em termos per capita, uma despesa de 280.421,15 Kwanzas, ou seja, cerca de 2800 dólares-americanos por estudante.

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CEIC / UCAN

A mesma análise pode ser feita para 2011, em que havia cerca de 140 mil estu-dantes universitários matriculados e neste ano a dotação orçamental foi de 39,08 mil milhões de Kwanzas, o que nos dá uma despesa per capita de 275.214,6 Kwan-zas (cerca de 2750 USD por estudante). A diminuição deve-se a um maior aumento dos números de estudantes matriculados em 2011, em comparação com o aumen-to das verbas.

Já em 2012 e 2013 estiveram matriculados no ensino superior cerca de 150.000 e 218.676 estudantes, respectivamente, e nesses anos as verbas foram de 38,04, em 2012, e 82,21 mil milhões de Kwanzas, em 2013, o que nos leva a uma despesa per capita de 249.917,06, em 2012, e de 375.944,32 Kwanzas, em 2013.

4.9.4 Despesa per capita nos ensinos primário e secundário

20122011 20132010

DESPESAS PER CAPITA DO ENSINO PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO (EM KWANZAS)

44.889,31 47.817,23 50.765,59

83.017,13

33.824,8842.250,02

50.700,2653.251,70

Despesas per capita do Ensino Primário Despesas per capita do Ensino Secundário

FONTE: Cálculos do CEIC, a partir dos dados do RS 2012 e do OGE.

Quanto ao ensino primário, em 2010, estima-se que estavam matriculados neste subsistema de ensino cerca de 4,7 milhões de alunos e as verbas alocadas naquele ano foram de 160,12 mil milhões de Kwanzas, o que nos leva a concluir que a despesa per capita do ensino primário, em 2010, foi de 33.824,88 Kwanzas (cerca de 330 USD por estudante).

Em 2011, estavam matriculados 4,8 milhões de alunos e o subsistema benefi-ciou de uma dotação orçamental de 233,15 mil milhões de Kwanzas, o que nos dá uma despesa média por aluno de 47.817,23 Kwanzas (ou seja, 478 USD por estu-dante). Já em 2012, a despesa per capita foi de 50.700,26 Kwanzas já que 5,02 milhões de alunos estavam matriculados e 254,62 mil milhões de Kwanzas foram atribuídos a este subsistema de ensino. Em 2013, a despesa per capita estimada foi de 53.251,70 Kwanzas (cerca de 532 USD por estudante).

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

O ensino secundário é frequentado por 1.015.896 de alunos, o que representa cerca de 19,68% do total de alunos matriculados no ensino primário. Mas, o orça-mento alocado para o ensino secundário é quatro vezes inferior ao que é alocado para o ensino primário, pois o número de alunos matriculados nesse nível é um quinto dos alunos matriculados no ensino primário, fazendo com que a despesa per capita do ensino secundário seja inferior à despesa per capita do ensino pri-mário.

4.9.5 Despesa per capita global

Tendo em conta o número total dos alunos matriculados nos ensinos primário, secundário e superior, calcula-se uma despesa per capita do sector da educação conforme o gráfico abaixo.

DESPESAS PER CAPITA GERAL (EM KWANZAS)

2010 20132011 2012

45.842,66

57.338,5952.145,31

70.393,07

FONTE: Cálculos do CEIC, a partir dos dados do RSA 2012 e do OGE.

Como se pode ver, em 2010, a despesa per capita com a educação, tendo em conta o número total de alunos matriculados, foi de 33.029,53 Kwanzas (cerca de 330 USD por estudante), 41.370,17 Kwanzas, em 2011, 44.325,31 Kwanzas, em 2012, e 70.393 Kwanzas (cerca de 703 USD por estudante), em 2013.

Em termos gerais, a despesa per capita dos ensinos primário e secundário que Angola apresenta é extremamente baixa (muito abaixo dos 9% do PIB per capita) comparada com os outros países da região, como, por exemplo, a África do Sul, que apresenta uma despesa per capita de cerca de 17% do seu PIB per capita.

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CEIC / UCAN

5.1 Introdução

A situação social das famílias e da criança em Angola, como temos vindo a fazer referência nas edições anteriores do relatório social, registou, nos últimos anos, algumas melhorias. Estas melhorias estão em grande medida relacionadas ao “boom económico” que o país tem registado, principalmente na exploração do petróleo, o que tem criado um ambiente macroeconómico bastante favorável para a implementação de políticas e programas públicos que permitam melhorar pro-gressivamente o nível de vida das famílias e crianças, e promover o desenvolvi-mento socioeconómico sustentável.

O progresso registado nos últimos anos é visível e mensurável. De acordo com os últimos dados do Inquérito Integrado sobre o Bem-Estar da População – IBEP (2008-2009), a proporção de pessoas com renda inferior a 1 USD por dia era de 68%, em 2001. Mas, em 2009, a taxa de incidência da pobreza foi estimada em 36,6%58, a taxa de mortalidade infanto-juvenil passou de 250 crianças por mil nados vivos, em 2001, para 164 por mil nados vivos, em 201259, a esperança de vida ao nascer era de 45 anos, em 2000, e passou a 52 anos, em 201260.

Durante os últimos anos foram e estão a ser implementadas políticas e progra-mas que têm contribuído fortemente para o progresso registado nos indicadores socioeconómicos. No domínio da Família e da Criança, destacamos os 11 Com-promissos em prol da Criança Angolana, a Lei sobre a Protecção e o Desenvolvi-mento Integral da Criança (Lei n.o 25/12, de 22 de Agosto), o Programa Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza e recentemente o Programa da Mulher Rural (sendo ainda muito novo).

58 De acordo com a linha de pobreza absoluta estabelecida no IBEP 2008, cifrada em aproximadamente 52$ mensais por pessoa ou adulto equivalente.

59 Estimativas das Nações Unidas, em 2013.

60 Relatório de Desenvolvimento Humano, UNDP 2012.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

Todavia, apesar dos resultados alcançados nos últimos anos, a situação das famílias e da criança ainda é bastante preocupante. Segundo as estatísticas, Angola ainda faz parte dos cinco países com as piores taxas de mortalidade infantil no mundo. De acordo com o QUIBB 2011, aproximadamente metade dos partos ocor-reram em casa (48%), no meio rural, a situação é ainda mais preocupante, pois 73% dos partos ocorrem em casa e, na maior parte destes, sem a assistência de pessoal qualificado, 65% da população não tem acesso a água potável, 58% não tem acesso a saneamento básico apropriado, e apenas 31% das crianças menores de 5 anos possui o registo de nascimento (IBEP 2010).

Neste capítulo, pretende-se analisar os principais indicadores referentes à condição socioeconómica das famílias e das crianças, com base nos dados do Inquérito Integrado sobre o Bem-Estar da População (IBEP, 2009) e do Inqué-rito de Indicadores Básicos de Bem-Estar (QUIBB, 2011). Far-se-á uma caracte-rização da situação da família e da criança em relação a alguns dos indicadores socioeconómicos julgados pertinentes para esta análise, entre eles a estrutura demográfica, o estado civil e as relações conjugais, o tamanho e a estrutura dos agregados familiares, as condições de habitação, o meio ambiente e a posse de bens, e os principais indicadores de pobreza monetária e não-monetária61. Os dados recolhidos permitiram reavaliar as metas e compromissos assumidos pelo Executivo em relação à família e à criança e dimensionar os esforços ainda necessários para a promoção do verdadeiro bem-estar das famílias e das popu-lações.

5.2 Realidade socioeconómica da família em Angola

5.2.1 Estrutura demográfica

A situação da família é fortemente influenciada por três grandes factores, liga-dos directamente à estrutura demográfica do país: elevada taxa de fecundidade, elevada taxa de crescimento da população (3,2%) e elevado índice de dependên-cia total.

O primeiro factor está relacionado com a elevada taxa de fecundidade, estima-da em 6,4 nascimentos (QUIBB, 2011), num país com uma alta taxa de mortalidade (191%), a esperança de vida é muito reduzida (estimada em 52 anos), quando a esperança de vida média na África Subsariana é de 52 anos.

61 Neste subcapítulo, destacamos na nossa análise os domínios da Habitação, Água, Saneamento e Inclusão. Os domínios da Educação e Saúde não são analisados (serão analisados futuramente em relatório próprio).

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CEIC / UCAN

O segundo problema está relacionado com a elevada taxa de crescimento da população, estando o nível de crescimento natural estimado em 3,23%, por ano (QUIBB, 2011). Como já referido na análise passada, este crescimento da popula-ção é desproporcional ao crescimento e desenvolvimento de estruturas que per-mitam melhor acomodação da família e a realização dos seus direitos, agravando a condição das crianças, das mulheres e das famílias em geral. A disposição da população, por sexo, aponta para uma população composta por 48% de homens e 52% de mulheres, o que se traduz num índice de masculinidade de 0,94, ou seja, 94 homens para 100 mulheres. A população urbana, segundo o QUIBB, é estimada em 55% (em 1995 era de 31% como indicava o MICS) e a tendência é de uma cada vez maior concentração urbana, desertificando cada vez mais as zonas rurais, onde vive agora, cerca de 45% da população.

Em terceiro lugar, referimos a elevada taxa de dependência total, estimada em 101 (QUIBB, 2011). Isso significa que, para cada 100 pessoas, em idade activa, exis-tem 101 pessoas, em idade não-activa. Isso ocorre porque a taxa de dependência total é composta pelo índice de dependência das crianças e o índice de dependên-cia dos idosos, uma vez que a população angolana é maioritariamente jovem, com uma média de 20 anos de idade, os níveis de dependência são maiores.

Neste quadro, urge a necessidade de um Estado-Providência, principalmente como promotor e gerador de meios para a subsistência dessa população jovem e pouco auto-suficiente. As políticas sociais deverão estar viradas para esta popula-ção dependente e vulnerável.

5.2.2 Estado civil e relações conjugais

A distribuição da família em relação ao estado civil pode explicar um conjunto de tendências e factos, em relação ao comportamento e a práticas que favorecem (ou não) o bem-estar da mulher e da família em geral. Segundo o IBEP 2010, qua-se metade da população angolana, maior de 12 anos, tem uma relação conjugal (é casada ou vive em união de facto), numa proporção de 52% homens e 47% mulhe-res. A união de facto é a forma mais comum de relação marital, no país. Este facto é reforçado pelo QUIBB 2011, que indica a maternidade como precoce, indicando que 17% das mulheres, com idade entre os 12 e os 19 anos, já tiveram o seu pri-meiro filho. Estas raparigas sofrem impactos negativos muito sérios devido à sua estrutura física, ainda em desenvolvimento, sendo forçadas a assumir responsabi-lidades para as quais ainda não estão preparadas e são impedidas de perseguirem as oportunidades de educação, formação e emprego.

O facto mais preocupante em relação à situação da família é que 63% dos casais não possui nenhum nível de escolaridade, traduzindo-se esta situação em

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

pobreza na família, graves problemas de abandono e negligência na educação e acompanha mento dos filhos, violência, para além de baixos rendimentos para a satisfação das necessidades das crianças.

A população solteira é grande (IBEP, 2008/2009), estimada em 41%, sendo 0,4% da população divorciada e 4% separada. Estas baixas cifras poderão reflectir os estigmas sociais e culturais, associados ao casamento e à família, na qual há um grau acentuado de submissão da mulher, um aparente equilíbrio familiar assente na manutenção do casamento (ou dos relacionamentos) mesmo na presença de altos índices de violência doméstica, de pobreza ou mesmo de intolerância mútua. Nestes casos, a preservação do relacionamento é muitas vezes entendida como uma obrigação social, cultural, religiosa ou um suposto sinónimo de bem-estar. Esta situação levanta, com certeza, questões sérias acerca da condição da mulher na família, a discriminação e as disparidades sociais e do género.

ESTADO CIVIL E RELAÇÕES CONJUGAIS

0

5

35

20

10

30

25

15

40

Divorciado SeparadoSolteiro Casado União de facto

5.2.3 Tamanho e estrutura do agregado familiar

Outro indicador importante que utilizamos aqui para avaliar a condição da família é o tamanho e estrutura do agregado familiar. De acordo com os resultados do QUIBB 2011, o número médio de pessoas por agregado é de 5,3 pessoas, sen-do comparativamente mais elevado que em 2001, que foi estimado em 4,3 (MICS, 2001). Esta tendência de crescimento é inversamente proporcional às tendências de desenvolvimento das sociedades, em que o acesso à informação, educação e bens tende a contribuir para a redução do número de filhos e, consequentemente, para um mais elevado nível de estabilidade familiar.

De acordo com o QUIBB 2011, cerca de 79% dos agregados familiares são che-fiados por homens e 21% por mulheres. Para os agregados chefiados por mulheres

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CEIC / UCAN

60% situam-se na área urbana e 38% na área rural. Em relação ao nível de escola-ridade do chefe do agregado, segundo o QUIBB 2011, 52% não tem nenhum nível de escolaridade (sendo 47% para os homens e 70% para as mulheres), 24% possui apenas o ensino primário (sendo 26% para os homens e 15% para as mulheres), 25% possui o ensino secundário ou mais (sendo 28% para os homens e 14% para as mulheres). Estes dados são contraditórios em relação aos dados do IBEP 2008/2009, no qual 20% dos chefes de família não tinha nenhuma escolaridade, 45% possuía o ensino primário, 29% possuía o ensino secundário e 3% tinha o ensino superior.

TAMANHO E ESTRUTURA DO AGREGADO FAMILIAR

0

10

40

20

60

50

30

UniversitárioSem instrução PrimárioSecundário

QUIBB IBEP

Independentemente de qual estudo possa estar correcto, podemos inferir uma série de questões em relação à qualidade e tipo de relações familiares que se podem estabelecer nas condições em que cerca de 77% das famílias não possui nenhuma escolaridade ou possui apenas o ensino primário. Os altos níveis de vio-lência doméstica e a alta taxa de atraso e de abandono escolar talvez estejam asso-ciados também à baixa escolaridade dos chefes dos agregados familiares.

5.2.4 Habitação e meio ambiente

O direito à habitação está consagrado universalmente e a forma como este direito é exercido têm reflexos no nível de vida das famílias e nos níveis de desen-volvimento do país. De acordo com o QUIBB 2011, 3 em cada 4 agregados familia-res, ou seja, 74% da população vive em casa própria, 16% em casa arrendada, 8% em casa de familiares ou de amigos e 1% em casa ocupada. Notam-se disparidades acentuadas, segundo a área de residência, sendo que nas áreas rurais, 9 agrega-dos, em cada 10, vivem em habitações próprias, o que reflecte um maior acesso à terra comparativamente com as áreas urbanas.

Segundo o QUIBB 2011, a população angolana vive em sobrelotação, com uma média de 3,1 pessoas por quarto de dormir, quando a média nacional de quartos

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de dormir por habitação é de apenas 1,7 quartos. De acordo com o mesmo QUIBB 2011, apesar dos investimentos no sector da construção nos últimos anos (pro-messa de construção de um milhão de casas62), tanto o QUIBB 2011 como o IBEP 2008-2009 mostram que cerca de 43% dos agregados familiares, residentes na área urbana, vivem em habitações sobrelotadas.

Finalmente, 63% dos agregados familiares vivem em habitações com tecto de zin-co, 49% em habitações com paredes de adobe e 49% em habitações com o soalho de terra batida. Por outro lado, 72% da população, na zona urbana, vive em habitações construídas com material não apropriado, ou seja, mesmo as famílias da suposta classe média, com rendimentos médios, ainda vivem em habitações inapropriadas.

A situação continua crítica em relação ao acesso à electricidade. De acordo com o QUIBB 2011, apenas 36% da população tem acesso à electricidade, sendo as disparidades entre zona urbana e rural gritantes, pois 60% da população na zona urbana beneficia de electricidade, mas apenas 4% na zona rural. Também há aqui uma divergência considerável entre o QUIBB e o IBEP 2008/2009 que assinala um acesso à electricidade em 40%. Todavia fica claro e evidente que os desafios neces-sários neste domínio são grandes.

Em relação ao combustível utilizado para cozinhar, mais de 55% da população uti-liza combustível sólido: lenha (37%), carvão (18%), palha, cartão ou papelão (0,1%).

O gás é utilizado para cozinhar por 43% dos agregados familiares (74% para a zona urbana e 5% para a área rural), como se pode ver na figura abaixo. A utilização de combustíveis sólidos para cozinhar coloca a população exposta ao fumo, justifi-cando, assim, a grande proporção de doenças respiratórias existentes no país que representam a segunda doença com maior ocorrência, no país, como já ficou dito.

COMBUSTÍVEL UTILIZADO PELAS FAMÍLIAS PARA COZINHAR

LenhaGásCarvãoPetróleoElectricidade

1%1%

37%

18%

43%

FONTE: CEIC, a partir do QUIBB 2011.

62 Promessa do Sr. Presidente da República, no início da campanha eleitoral para as legislativas de 2008.

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5.3 Água e saneamento

A proporção da população com acesso à água e saneamento apropriados é outro indicador que merece especial atenção porque define, no caso de Angola, um problema social bastante preocupante. Segundo o QUIBB 2011, apenas 15% da população dispõe de água canalizada (o IBEP referia cerca de 8%), cobrindo ape-nas 26% da população urbana e 38% da população mais rica. As principais fontes de abastecimento de água potável são, nas áreas urbanas, os tanques (29%) e, nas áreas rurais, os rios, riachos ou lagoas (47,6%), o que reflecte o nível de vida da população, independentemente do seu nível de receita.

Por outro lado, segundo o QUIBB 2011, mais de metade da população (62,1%) bebe água sem qualquer tipo de tratamento, com grandes níveis de disparidade quanto à área de residência. A população que reside na área rural tem uma proba-bilidade duas vezes inferior de beber água tratada comparativamente à área urba-na (44,4%, na área rural, contra 84,1%, na área urbana). E quanto menor for o nível de escolaridade do chefe do agregado familiar, menor são as hipóteses dos agrega-dos efectuarem qualquer tipo de tratamento da água para beber.

Em relação ao saneamento básico, segundo o QUIBB 2011, apenas 18% possui um sistema de esgotos com uma pia ou sanita, 24% possui uma fossa séptica ou um poço roto, 23% possui uma latrina seca e 25% utiliza o capim, mato ou o ar livre para fazer as suas necessidades. O nível de saneamento básico tende a ser menor quanto mais baixo for o nível de escolaridade do chefe do agregado (por exemplo: 60% das pessoas que fazem as suas defecações ao ar livre ou no capim pertencem a famílias cujos chefes do agregado não têm nenhum nível de escolaridade ou têm apenas o nível primário).

No domínio do saneamento básico, no que diz respeito à recolha do lixo, segun-do o QUIBB 2011, apenas 23% dos agregados familiares depositam o lixo nos locais apropriados (carros de recolha ou contentores). Um factor intrigante é saber que 36% dos agregados familiares, na zona urbana, deposita o lixo nas lixeiras, contra 28% que o deposita nos contentores. Na zona rural, 69% dos agregados familiares deposita o lixo ao ar livre e apenas 18% queima-o ou enterra-o.

5.4 Bem-estar e conforto (mobilidade, acesso a informação e novas tecnologias)

Olhando para os principais indicadores de bem-estar e de conforto, preten-de-se analisar os indicadores de bem-estar que influenciam a qualidade de vida dos angolanos. Para tal seleccionamos a mobilidade, o acesso à informação e comunicação e o acesso às novas tecnologias.

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O acesso à informação e comunicação faz parte dos pré-requisitos de afirma-ção de um Estado Democrático e de Direito. Actualmente registamos uma revo-lução tecnológica global neste domínio e Angola procura a sua integração nesta nova era da comunicação e, segundo o QUIBB 2001, 84% dos agregados familiares possuem um rádio cassete, 57% possuem um telefone celular (sendo 83% para a área urbana e 24% para a área rural), 47% possuem um televisor, 29% possuem um radio cassete com CD. Como a nível global observa-se o desuso do telefone da rede fixa, apenas 2% dos agregados têm acesso ao telefone da rede fixa (sendo 3% para a área urbana e 0,5% para a área rural) e 4% da população angolana tem acesso à internet.

No domínio da mobilidade dispõe-se de informação limitada, todavia cruzan-do alguns indicadores podemos ter uma ideia geral neste campo. No que concer-ne a posse de meios de transportes, 16% dos agregados familiares possui uma motorizada, 11% possui um automóvel, 7% possui uma charrua, 7% possui uma bicicleta, 1% possui uma carroça, 0,6% possui um cavalo ou burro, e apenas 0,3% possui um tractor. Podemos constatar que há aproximadamente 74% da popula-ção que tem necessidade de usar serviços de transportes públicos que são muito ineficientes.

Embora desprovidos de dados para uma análise mais detalhada, na capital do país (Luanda) a circulação rodoviária é bastante caótica, muitas vezes de tal modo capaz de enfurecer o mais pacífico dos homens. Famílias dos agregados residentes nas zonas circundantes e afastadas do centro da cidade, como Zan-go, Viana, Cacuaco, Benfica, Ramiros e Kilamba, gastam diariamente várias horas para fazer o percurso de casa para o centro da cidade e vice-versa, com sérios impactos na sua qualidade de vida e nos seus níveis de produtividade laboral. Estudos recentes indicam que cada três (3) horas diárias gastas no trânsito de casa para o trabalho e vice-versa têm um impacto no nível de produtividade da pessoa proporcional a uma queda de 5% do Produto Interno Bruto (PIB). Para o caso de Angola, onde as pessoas gastam este número de horas somente para um percurso, podemos imaginar qual é o impacto que o actual estado de circulação rodoviária tem no nosso PIB.

5.5 Impacto da pobreza sobre a família e a criança

Apesar de não haver nenhum outro estudo relevante sobre a pobreza, não deixamos de abordar alguns aspectos importantes do bem-estar das famílias. O IBEP considera que 36,6% da população angolana vive abaixo da linha de pobre-za (pobreza absoluta) nacional. Apesar de se notar uma substancial redução dos índices de pobreza em comparação com o ano 2001, em que se estimava em

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CEIC / UCAN

68% a incidência de pobreza (relativa). De acordo com os dados disponíveis, podemos afirmar que houve uma redução na taxa de pobreza, mas atendendo às diferenças na metodologia usada, nas duas análises, é difícil mensurar o nível real da redução da taxa de incidência da pobreza em Angola. Embora se possa verificar uma tendência de redução da pobreza, ainda persistem grandes desa-fios no combate à pobreza e à exclusão social e nas privações sociais (pobreza não-monetária).

INCIDÊNCIA, INTENSIDADE E SEVERIDADE DA POBREZA EM ANGOLA, IBEP 2008

Total Urbano Rural

Incidência Profundidade

58%

19%

37%

Severidade

22%

5%

13% 11%

2%6%

FONTE: IBEP, 2008.

Pelos dados do IBEP, a pobreza é mais acentuada na zona rural, havendo 58% da população a viver abaixo da linha de pobreza, estimada em $1,763. Cerca de 62% dos mais pobres não têm qualquer nível de escolaridade. O impacto da pobreza é maior nos agregados familiares com mais de 7 pessoas, onde 44% destes vivem abaixo da linha de pobreza.

Segundo o QUIBB 2011, 61% dos agregados familiares faz apenas uma ou duas refeições por dia, embora a nível internacional se recomende uma dieta alimentar com três refeições por dia, no mínimo. As disparidades são grandes quando anali-sadas por área de residência, sendo 52% para a área urbana, e apenas 24% fazem três ou mais refeições por dia. A pobreza abate mais as famílias em que o chefe do agregado familiar trabalha por conta própria ou no sector agrícola. Isto exige a rees-truturação dos planos e políticas públicas para o reforço do empreendedorismo,

63 Rácio diário por cada adulto equivalente, IBEP 2008.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

de programas de geração de rendimento e formação, de modo a melhorar os ren-dimentos para o sustento das suas famílias.

INCIDÊNCIA DA POBREZA POR REGIÃO DE ANGOLA

Norte

Capital CentroNorte

Centro

Sul

Leste

51,0% 52,6% 54,8%8,6% 34,2% 39,5%

FONTE: IBEP, 2008.

As taxas de incidência da pobreza, segundo o IBEP, variam significativamente do meio rural para o urbano e entre as diferentes regiões do país. Na região cen-tro (Benguela, Bié, Huambo), a taxa de incidência é de, aproximadamente, 55%; nas regiões do centro-norte de 53%; nas regiões leste e sul, situa-se no intervalo de 40 a 50; a região norte de 34% e a capital (Luanda) tem uma taxa de incidência muito inferior, quando comparada ao resto do país, apenas de 9% contra a média nacional de 36,6%. Deste modo, indagamos os critérios de atribuição de recursos, no âmbito do Programa Integrado de Combate à Pobreza e Desenvolvimento Rural, cuja alocação por região é bastante questionada.

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CEIC / UCAN

DISTRIBUIÇÃO DAS RECEITAS POR QUINTIS DE RENDIMENTO

Angola Urbano Rural

3% 4%3%

Mais pobre

7% 8%7%

Segundo

12% 13%12%

Médio

19% 20%19%

Quarto

59%55%

59%

Mais rico

FONTE: IBEP, 2008.

Há desigualdade na distribuição de receitas. O quinto quintil (ou seja, os 20% da população mais rica) detém 59% de todas as receitas do país, enquanto o pri-meiro quintil (ou seja, os 20% da população mais pobre) detém apenas 3% das receitas do país. Por outras palavras, a receita média de uma pessoa no quintil mais rico é 18 vezes mais alta do que a receita média de uma pessoa no quintil mais pobre. Estes dados justificam a necessidade de programas e intervenções cada vez mais sérias que visem aplicar o slogan “Angola crescer mais e distribuir melhor”, como premissa básica para a equidade social.

A Constituição da República de Angola consagra um conjunto de “direitos económicos, sociais e culturais” e estabelece a responsabilidade do Estado como agente promotor do desenvolvimento social, nomeadamente por meio da “adop-ção de critérios de redistribuição da riqueza que privilegiem os cidadãos e, em particular, os extractos sociais mais vulneráveis e carentes da sociedade” (Artigo 90.o, CRA).

5.6 Os 11 compromissos com a criança e o Orçamento Geral do Estado

Durante anos a fio o Estado proclamou o slogan “à criança tudo que ela mere-ce”, sem que este chavão tivesse, no entanto, uma tradução prática nas políticas e acções públicas ou simplesmente na organização dos órgãos executivos. A Cons-tituição de 2010 veio reafirmar que “as crianças constituem absoluta prioridade, pelo que gozam de especial protecção da Família, do Estado e da Sociedade com vista ao seu desenvolvimento integral” (Artigo 30.o, CRA).

Os 11 compromissos com a criança angolana constituem um marco referencial de política e acção a favor da criança e assumiram a forma de lei através da Lei

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

sobre a Protecção e o Desenvolvimento Inte-gral da Criança (Lei 25/12, de 22 de Agosto). Mas, malgrado a existência deste dispositi-vo legal, do estabelecimento de políticas pró criança e da criação de várias estruturas do Estado, da sociedade civil e das igrejas para a protecção da criança, os 11 compromissos são pouco conhecidos e não têm encontra-do uma concretização prática extraordinária como era de se esperar perante a situação real da criança angolana.

Por esta razão, achamos interessante analisar como este compromisso nacional é enquadrado no Orçamento Geral do Esta-do que é o principal documento de execu-ção das políticas e programas públicos e que exerce uma forte influência no desempenho dos demais actores sociais.

5.7 Despesas com a família e infância

As crianças garantem a continuidade das gerações e são o futuro duma socie-dade, por isso a forma como elas são cuidadas, tratadas e educadas dita o tipo de pessoas adultas que serão no futuro. Mas, para que as crianças se desenvolvam de uma forma sadia precisam de todo o apoio, quer das famílias, quer do Estado.

O gráfico abaixo mostra as dotações orçamentais que explicitamente são desti-nadas às crianças e às suas famílias.

DESPESAS PÚBLICAS COM A FAMÍLIA E INFÂNCIA (MIL MILHÕES DE KWANZAS)

Velhice

2010

11,75

76,99

2011

12,99

115,26

2012

7,17

117,72

2013

9,79

158,03

FONTE: OGE (2010-2013).

Em 2007, durante o III Fórum Nacional sobre a Criança, foram estabelecidos 11 compromissos para com a crian-ça, a serem assumidos pelo Estado, pela sociedade e pelas famílias. Estes 11 compromissos para com a criança foram actualizados, no V Fórum, em Junho de 2011.Os 11 compromissos abrangem as se-guintes áreas:

1. A esperança de vida.2. Segurança alimentar nutricional.3. Registo de nascimento.4. Educação da primeira infância.5. Educação primária.6. Justiça juvenil.7. Prevenção e educação do impacto

do VIH/SIDA nas famílias e nas crianças.

8. Prevenção e mitigação da violên-cia contra a criança.

9. Competências familiares.10. Criança e comunicação social.11. A Criança no Orçamento Geral do

Estado.

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Como podemos ver em 2010 foram alocados 11,75 mil milhões de Kwanzas à família e à infância; em 2011, verificou-se um pequeno acréscimo, mas em 2012 houve uma queda significativa e, em 2013, aumentou-se as verbas moderadamen-te mas não chegou a atingir os níveis de 2010 e 2011.

Nota-se claramente que não há uma consistência em termos de dotações que são alocadas à família e à infância e que são verbas muito baixas, comparadas com os valores que são alocados para os idosos64, embora os idosos sejam muito menos e muitos deles tenham segurança social, garantida pelos anos de trabalho e de desconto.

É importante realçar também que em termos de execução orçamental, as des-pesas com a protecção social (de que faz parte a despesa com a família e a infância) são as que tiveram a menor taxa de execução em 2012, na ordem de 27,4% das despesas, até o terceiro trimestre daquele ano.

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de Angola percebe-se que muito idosos vivem com as suas famílias e as dotações orça-mentais que eventualmente venham a receber as gastam junto com as famílias de que as crianças também são parte.

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6.1 Introdução

A acepção sobre segurança alimentar tem evoluído ao longo do tempo, des-locando-se da compreensão produtivista a uma visão mais abrangente e integra-dora, incluindo as dimensões de disponibilidade, acesso, utilização, estabilidade e outras. A segurança alimentar é multissectorial, é uma política pública, no país, desde 2009, e tem uma dimensão internacional pelas convenções ratificadas pelo Estado angolano. O país possui imensas potencialidades agrárias e pesqueiras para a promoção da auto-suficiência alimentar. Depois do fim do conflito armado, a pro-dução agrícola e pecuária tem aumentado, mas a disponibilidade geral de alimen-tos produzidos internamente é deficitária, o acesso é um problema e a qualidade é fraca. Há riscos e choques à segurança alimentar, seja de natureza económica, agrícola e de calamidades naturais, tal como a seca e a irregularidade das chu-vas que ainda afectam a segurança alimentar de centenas de milhares ou milhões de pessoas. Existem variações de situações de segurança alimentar e nutricional no país, pela diversidade ambiental e de recursos disponíveis, e estudos indicam haver mais insegurança alimentar grave do que de outros níveis.

A segurança alimentar e nutricional é um tema presente no dia-a-dia dos cida-dãos, seja pelo sabor do que se come, das informações de preços dos alimentos, sejam as decisões de políticas que afectam os alimentos e outras variáveis.

Os cidadãos obtêm os seus alimentos pela produção própria, por compra a dinheiro ou permuta, e por doacções, transferências ou remessas. Dos nossos ren-dimentos, a coisa mais importante é a satisfação das necessidades fisiológicas bási-cas que incluem a alimentação.

A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) esti-ma que no mundo existem cerca de 600 milhões de pessoas que passam fome. Em Angola, os dados do IBEP referem que os níveis de pobreza65 são de 58,3 % no meio rural e 18,7 % nas zonas urbanas66.

65 Dados do IBEP, INE, Luanda, 2011.

66 Este índice de pobreza considera como limiar de pobreza uma renda de 1,25 USD/dia/per capita.

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O debate sobre segurança alimentar tem evoluído, embora de forma lenta. As organizações da sociedade civil, através das ONG, foram as primeiras a trazer esta dimensão, no trabalho concreto em projectos de desenvolvimento comunitário, nos workshops e nos estudos e pesquisas. Nos últimos anos, com o surgimento do Gabinete de Segurança Alimentar, os estudos sobre este tema aumentaram sobre-maneira. Em 2009, o Governo de Angola aprovou a Estratégia Nacional de Segu-rança Alimentar e Nutricional vinculada às Convenções Internacionais, Regionais e outras Organizações Internacionais.

Neste capítulo pretende-se contribuir para o debate sobre segurança alimentar e nutricional, seguindo um plano de exposição que tem uma parte introdutória, seguido da sua conceptualização e depois de considerações sobre segurança ali-mentar e nutricional, enquanto política pública do Estado, sua dimensão interna-cional, seguido de uma parte sobre o potencial de Angola para a produção agrícola e pecuária para mais adiante trazer relatos, casos e fragmentos de situações rela-cionadas com a segurança alimentar e nutricional nas suas dimensões de disponi-bilidade, acesso, utilização e estabilidade, na tentativa de ligar a teoria à prática. Para fechar o capítulo, há um subcapítulo com o resumo de alguns resultados de pesquisas e estudos sobre segurança alimentar e nutricional.

6.2 Antecedentes do termo segurança alimentar

O termo segurança alimentar tem origem militar, e surge pela primeira vez depois da 1.a Guerra Mundial. Compreendia-se que um país poderia dominar o outro se tivesse controlo sobre o seu fornecimento de alimentos, sendo assim uma arma poderosa para dominar um país militarmente fraco no plano militar e inca-paz de produzir com suficiência os seus alimentos. Neste sentido, a importância de cada país ter reservas alimentares era uma questão de segurança nacional. Esta concepção vinculava a questão da alimentação exclusivamente à capacidade de produção, portanto, tinha um condão produtivista que se manteve até à década de 1970. Durante a realização da 1.a Conferência Internacional de Segurança Ali-mentar, promovida pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação), em 1974, esta corrente que relacionava estritamente a seguran-ça alimentar à produção agrícola prevalecia. Ademais, era um momento em que os stocks de alimentos, eram bastantes escassos, com quebras de produção em importantes países produtores. Esta situação veio fortalecer o discurso e o apelo à necessidade de uma Revolução Verde a nível mundial, pelos interesses da indús-tria química que achava que o flagelo da fome e da malnutrição só poderiam ser superados com o aumento da produção agrícola, com recurso à utilização massiva de insumos químicos – fertilizantes e agro-tóxicos. Como resultado da Revolução Verde, a produção aumentou, não como era suposto. Entretanto, os problemas

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da fome e da malnutrição persistiam e persistem em várias partes do mundo. Só mais tarde é que a evolução do conceito de segurança alimentar incorporou outras dimensões (MENEZES, 2012).

6.3 Identidade conceitual sobre segurança alimentar

A Estratégia Nacional de Segurança Alimentar (ENSAN) adoptou a definição aprovada na Cimeira Mundial da Alimentação (CMA), realizada em Roma, em Novembro de 1996, que consagra uma visão holística e integradora, segundo a qual “existe segurança alimentar quando as pessoas têm, de forma permanente, acesso físico e económico a alimentos seguros, nutritivos e suficientes para satis-fazer as suas necessidades dietéticas e preferências alimentares, a fim de levarem uma vida activa e saudável”. Esta concepção aponta para a existência de várias dimensões que precisam de estar presentes em simultâneo, como a disponibilida-de dos alimentos, o acesso aos alimentos, o consumo e a utilização dos alimentos e a estabilidade dos alimentos.

A literatura apresenta diferentes conceitos e definições. Um deles refere-se ao acesso permanente, físico e económico, de todas as pessoas a uma alimen-tação suficiente e de qualidade, com vista a garantir uma vida activa e saudá-vel. Outros autores enfatizam que a análise da segurança alimentar e nutricional consiste no acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quanti-dade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais. Outros ainda destacam o acesso aos alimentos, e defendem que a segurança alimentar e nutricional engloba não apenas comer regularmente, mas também comer alimentos de qualidade e adequados aos hábitos culturais, com base em práticas saudáveis e que preservem o prazer ligado à alimentação (CPDA/UFRJ, 2007, citado por ADRA, 2012). São vários enfoques conceptuais, quer centrados no acesso, na qualidade orientado pela oferta e outro pelo lado da procura. O conceito adoptado na ENSAN é teoricamente satisfatório e complexo de efecti-var na prática.

A insegurança alimentar e nutricional é a condição em que as pessoas estão incapacitadas de adquirir alimentos suficientes em qualquer momento. A insegu-rança alimentar pode ser leve, moderada e grave. Ela é grave quando há falta per-sistente de acesso aos alimentos causada por factores históricos como pobreza, baixa fertilidade do solo, baixa educação nutricional e persistência de doenças cró-nicas. Também pode considerar-se insegurança alimentar transitória ou corrente, a falta temporária de acesso aos alimentos que é frequentemente causada pela ocorrência inesperada de um choque, como por exemplo, a seca, as cheias, a bai-xa brusca da produção de alimentos, a subida precipitada e a alta de preços dos

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alimentos. Algumas evidências são as cheias no Cunene antes de 2010 e as irre-gularidades na precipitação e seca há três anos, cujo impacto ainda se sente hoje.

6.4 Conceitos relacionados à segurança alimentar e nutricional

Como foi referido, existem outros conceitos relacionados à segurança alimen-tar e nutricional. A disponibilidade de alimentos refere-se à quantidade de alimen-tos que pode provir da produção própria, importações, reservas, ajuda alimentar ou remessas. O acesso aos alimentos tem a ver com a capacidade das pessoas de adquirirem alimentos por compra ou troca. A utilização que diz respeito ao proces-so (escolha, processamento, confecção e distribuição dos alimentos pelos mem-bros da família) de consumo dos alimentos numa dieta adequada. A estabilidade tem uma relação ao acesso permanente, assim como à qualidade dos alimentos.

Na segurança alimentar e nutricional, os riscos são os factores de pressão a que os agregados familiares estão sujeitos que opõem a manutenção da sua seguran-ça alimentar. Os choques referem-se aos riscos ocorridos, que provocam o rompi-mento nos mecanismos de acesso a alimentos, tornando os agregados familiares vulneráveis.

A vulnerabilidade à insegurança alimentar são os riscos a que os indivíduos, famílias e/ou comunidades estão expostos, pondo em causa o acesso e a disponi-bilidade dos alimentos. Isso ocorre nos agregados familiares que não satisfazem as suas necessidades alimentares (2,100 kcal/dia/pessoa) num dado período de tempo. As manifestações de Insegurança Alimentar são a fome e a malnutrição. O subsistema de promoção da segurança alimentar e nutricional consiste nos espa-ços institucionais onde os marcos de regulação e participação de todo o sistema agro-alimentar, bem como as políticas sociais que intervêm no funcionamento dos sistemas, ou seja, o quadro político-institucional de referência: o sector público, a sociedade civil, o sector privado e os espaços políticos de concertação.

Os meios de sustento são o sistema alimentar que compreende um nível ade-quado de reservas e um fluxo de alimentos e dinheiro gerados por um conjunto de recursos como humanos, sociais, naturais, físicos e financeiros. Este conjunto de recursos geradores de alimentos e rendimentos constituem os meios de sus-tento de uma família ou comunidade. O acesso, o uso e a interacção destes recur-sos servem como base dos meios de sustento também conhecidas como zonas de economia agro-alimentar. Na mesma zona de sustento as pessoas têm as mes-mas oportunidades de gerar renda pois estão influenciadas pelo mesmo ambiente, pelos mesmos hábitos culturais, e têm em princípio acesso às mesmas infra-estru-turas sociais e económicas. As zonas de sustento nem sempre coincidem com as divisões administrativas convencionais (GSA, 2009).

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6.5 Política pública da segurança alimentar e nutricional

O marco legal sobre Segurança Alimentar e Nutricional é o de 2009, quando o Governo aprovou, em forma de Lei, depois de um processo de consulta pública, a Estratégia Nacional de Segurança Alimentar e Nutrição (ENSAN) e o respectivo Pla-no Nacional de Segurança Alimentar (PASAN), que descreve as acções e o quadro institucional de orientação dos diferentes sectores na implementação da ENSAN. A ENSAN prevê a institucionalização do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSAN), órgão de governação de natureza consultiva que teria cor-respondentes ao nível provincial e municipal com participação do sector público, sector privado e sociedade civil, assim como um sistema de financiamento e moni-torização do PASAN. Na prática, a ENSAN não está a ser implementada tal como foi concebida e aprovada (ENSAN, 2009).

O Fórum do Sector Público sobre Agricultura Familiar na Perspectiva da Segu-rança Alimentar, realizado em Dezembro de 2013, recomendou a retomada da ENSAN na sua concepção inicial, sobretudo em termos de Órgãos de Governa-ção. O 1.o Fórum Nacional da Sociedade Civil sobre Segurança Alimentar realizado em Setembro do mesmo ano também se pronunciou no mesmo sentido de reto-mar a ENSAN. Ainda há esperança que este importante instrumento de política pública seja realmente o que poderia conformar e dar consistência e coerência programática, monitorização e melhoria da articulação e coordenação intersecto-rial e inter institucional na implementação das políticas públicas que concorrem à ENSAN, seja no domínio da comercialização rural, das terras, do crédito agrícola, das sementes, da nutrição, da água, do combate à pobreza, das pescas, dos recur-sos biológicos aquáticos, da defesa do consumidor, da agro-indústria e de outras.

A ENSAN possui uma dimensão internacional por via das convenções que Ango-la subscreveu e ratificou, seja das Nações Unidas, por exemplo, a Declaração de Roma resultante da Cimeira Mundial da Alimentação (CMA), realizada em Roma, em Novembro de 1996, e os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) aprovados na Cimeira do Milénio, realizada pelas Nações Unidas, no ano de 2000. Também existem instrumentos ao nível da Nova Parceria para o Desenvolvimen-to de África (NEPAD), da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) (ENSAN, 2009).

6.6 Potencial para promover segurança alimentar e nutricional

Angola possui um potencial de produção agrária: adequada precipitação plu-viométrica e abundantes recursos marinhos; milhões de terras aráveis e agricultá-veis; solos em quantidade e qualidade; recursos hídricos subterrâneos; recursos hídricos superficiais com 7 bacias hidrográficas e 18 principais com riqueza e

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variadíssimas lagoas ricas em biodiversidade e peixe; recursos fitogenéticos, diver-sidade com 5 zonas agro-ecológicas e cerca de 34 zonas agrícolas. Mais de 1/3 da população depende da agricultura itinerante e de sequeiro na época chuvosa que corresponde aos meses de Setembro a Abril. A agricultura familiar é responsável por cerca de 95% da produção total de cereais e leguminosas. Cerca de 98% das explorações agrícolas é detida pela agricultura familiar que possui vários níveis, e há estudos que apontam pelo menos cinco níveis de desenvolvimento, em termos de características sociais, recursos disponíveis – terra em quantidade, qualidade e segurança, mão-de-obra, capital e culturas agrícolas praticadas. A agricultura fami-liar assegura a produção e comercialização da maioria das culturas alimentares. De acordo com os dados do Ministério da Agricultura67, existem em Angola 1,6 milhões de produtores familiares agrupados em associações, em cooperativas e de forma individual em empresas agrícolas familiares. Existem centenas de produto-res intermédios. Ainda existem algumas dezenas de empresários de maior dimen-são, e está a nascer um sector do agro-negócio, que inclui os pólos agro-industriais de capital financeiro estrangeiro ou misto com capital financeiro público68.

As principais culturas alimentares são os cereais (milho, massambala, massan-go e arroz), as leguminosas (feijão e amendoim), as raízes e os tubérculos (mandio-ca, batata-doce, batata comum e tubérculos em geral), as hortícolas e as fruteiras. Dados do Ministério da Agricultura69 dizem que o efectivo de gado bovino é de 4.586.570 cabeças e o sector tradicional ou familiar detém a maioria do gado, com 76%, concentrado nas províncias do Cunene, Huíla e Namibe, em que as popu-lações rurais detêm uma economia de autoconsumo com o leite, o que levou a designar-se esta vasta área por região do “complexo de ordenha” (Correia & San-tos, 1996).

6.7 Segurança alimentar e nutricional na dimensão da disponibilidade

A disponibilidade de alimentos é alcançada quando a produção interna dos sec-tores de agricultura, pecuária, pescas, a importação e o aprovisionamento dos ali-mentos, asseguram, em quantidade e qualidade sanitária, nutricional e biológica, o normal e regular abastecimento dos mercados.

De acordo com dados da FAO, a segurança alimentar é uma questão crucial para Angola, assim como para grande parte dos países africanos. Num ranking de

67 Citado in Relatório Económico de Angola 2012, Centro de Estudos e Investigação Católica de Angola, Luanda, Junho de 2013, p. 65.

68 Ibidem, Relatório Económico de Angola 2012, p. 66.

69 Ibidem, Relatório Económico de Angola 2012, p. 68.

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105 países, Angola ocupa a 101.a posição em consumo de calorias por dia por pes-soa. Um grande desafio para o país é conseguir que o sector agrícola recupere a posição que ocupava antes da guerra civil, encerrada em 2002, e do período ante-rior à independência, ocorrida em 1975.

De acordo com os dados do sistema da ONU em Angola, citando fontes do MINAGRI, a necessidade de cereais para Angola se tornar auto-suficiente é de 2,43 milhões de toneladas e o país produz somente 1 milhão de toneladas por ano de cereais.

As alterações climáticas que se reflectem nos prolongados períodos de estia-gem que variam, de região para região, estão a provocar a redução da produção agrícola. O ano agrícola 2011-2012 foi muito prejudicado, em termos de produção, devido aos efeitos de uma significativa irregularidade pluviométrica, traduzida por prolongado período de estiagem, variáveis de umas regiões para outras, sendo que dos 5,6 milhões de hectares semeados, o MINADER, citado pelo CEIC (2012), estima tenham sido colhidas apenas 3,1 milhões, o que dá uma ideia dos prejuízos causados. Dados do MINAGRI, citados pelo CEIC (2012), referem uma produção de cereais, em 2009/2010, de 1.177.948 toneladas, tendo aumentado 11,9%, no ano de 2010/2011, e 19,6%, no ano agrícola de 2011/2012, e baixado para menos 64%. As leguminosas/oleaginosas aumentaram 2%, em 2009/2010, e aumentaram 27,2%, em 2010/2011, e desceram 63,7%, em 2011/2012. As raízes e as hortícolas também baixaram, enquanto as frutícolas aumentaram.

As áreas cultivadas sem qualquer recurso mecânico foram de 5,1 milhões de hectares, o que equivale a mais de 97%, e as restantes áreas foram trabalhadas com tractor, cerca de 2%, e com tracção animal, menos de 0,5%. Existe um baixo nível tecnológico na agricultura (CEIC, 2012).

6.8 Casos locais de disponibilidade e acesso na segurança alimentar

Os conceitos e quadros de referência são importantes à compreensão da segu-rança alimentar e nutricional. Porém, se se adicionar o conhecimento local sobre a complexidade destes conceitos na vida real ajuda à compreensão de outra manei-ra mais concreta e operacional de segurança alimentar e nutricional e afins. Nesta secção apresentam-se três casos de municípios em regiões agro-ecológicas e zonas agrícolas diferenciadas70, apesar de serem representativos de todo o país.

70 -cípios, cujos documentos públicos eram ainda rascunhos.

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Caso do Município do Puri no Uíge

No município do Puri no Uíge há disponibilidade de terra, solos de qualidade e chove o suficiente para a agricultura. A agricultura é praticada por 844071 campone-ses organizados em associações e cooperativas agrícolas e a área média por família é de 2 a 4 hectares; existem 28 pequenos e médios agricultores com extensão de terra até 100 hectares; a preparação da terra é feita manualmente e usam tracção animal.

As principais culturas são a mandioca que é cultivada durante todo o ano – uma cultura de segurança alimentar a longo prazo, possibilitando às famílias irem de encontro às necessidades do consumo alimentar e outras necessidades finan-ceiras com a venda da fuba de bombó, amendoim, milho consumido fresco, feijão, batata-doce e rena, banana e café em poucas quantidades dada a sua pouca pro-cura. Existem também árvores de fruto: citrinos, abacateiros, mangas, maracujá, cana-de-açúcar. Produz algumas hortícolas nas margens dos rios, faz-se cultura de regadio que são as nacas. As sementes utilizadas são principalmente reservas dos anos anteriores, ou adquiridas nos mercados locais.

A produção são os bovinos, caprinos, ovinos, suínos e aves que funcionam como reserva económica e segurança social – doenças, óbitos – e na educação na compra de material escolar para os filhos, pagar matrículas e propinas. O consumo desses animais pela família é muito baixo e só acontece em ocasiões especiais. Há pessoas a dedicarem-se à criação de gado bovino, que se observa ao longo das estradas princi-pais e nas margens dos rios. Os principais problemas enfrentados com a criação dos animais são os conflitos entre vizinhos ou parentes quando os animais destroem as plantações, ataques por doenças e animais selvagens, e constantes roubos dos ani-mais. Não existem fármacos nem veterinários no município.

Há caça praticada enquanto actividade económica e mais praticada no tempo seco e feita por homens jovens e idosos e diz-se que os animais estão a escassear. A carne é consumida e vendida fresca e seca. A pesca é artesanal com anzol, arma-dilhas, cestos e redes. As capturas estão a diminuir devido à utilização de produtos químicos (veneno) para pescar.

A sul do município existem áreas com escassez alimentar e os agregados fami-liares fazem só uma refeição por dia e não foram reportados casos de malnutrição.

O comércio informal é predominante, mas relativamente fraco, com três mer-cados informais na Sede. Nos mercados informais é autorizada a venda mediante a passagem de um cartão e o pagamento de uma taxa diária.

FONTE: Perfil da Administração Municipal do Puri na província do Uíge.71

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Município de Kambundi Katembo em Malanje

O município de Kambundi Katembo em Malanje com clima bom para a agricul-tura, solos em quatidade e qualidade. Existem 48 Associações de Camponeses e 3 Cooperativas, sendo 6378 famílias, 3 das associações e 3 são de pesca artesanal.

A agricultura é a principal actividade económica da população do município. Há disponibilidade de terras para todos e o acesso, uso e usufruto da terra rege-se pelo direito costumeiro e não há terras legalizados pela lei formal; média das áreas cultivadas pelo sector camponês é de 1 a 2 hectares, a terra é trabalhada de forma manual; os poucos agricultores com fazendas é que preparam as suas terras com máquinas (tractores).

As principais culturas praticadas são a mandioca, o arroz, a banana, o feijão e a ginguba, o inhame, o milho e a batata-doce e rena. O girassol no passado (era colonial) foi uma das grandes produções agrícolas ao lado do arroz.

A actividade pecuária no município é pouco expressiva à excepção das aves e caprinos. A pesca é considerada segunda actividade geradora de rendimento no município e é feita nas lagoas e nos rios que são ricos em peixe72. A pesca é realiza-da com redes e canoas ou manualmente pelas mulheres usando o “muzua” – cesto de pesca artesanal. O peixe é consumido quase todos os dias, seja fresco, seco ou fumado.

A caça é outra actividade geradora de rendimento e é ainda furtiva e pouco regulada. Os principais compradores de carne de caça são os comerciantes ambu-lantes que vêm de Malanje ou de Luanda.

Pratica-se a apicultura, principalmente na zona Leste do município.

A alimentação básica das famílias está assegurada e os níveis de produção per-mitem a reserva de alimentos para as épocas de crise, principalmente a mandio-ca. As famílias fazem normalmente 3 refeições por dia. A dieta alimentar também se considera equilibrada, pois há grande disponibilidade de peixe e carne de caça, para além das verduras que garantem a variabilidade e o equilíbrio da dieta.

A rede comercial formal não existe mas apenas pequenas cantinas, resultantes de iniciativas individuais.

O comércio informal existe e é assegurado por pequenas praças que garantem o abastecimento de bens de primeira necessidade, embora a maioria das mercado-rias seja de bebidas alcoólicas.

FONTE: Perfil da Administração Municipal de Kambundi Katembo na Província de Malanje.72

72 O bagre e o cacusso.

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Caso do município de Cuvelai no Cunene

No município de Cuvelai, na província do Cunene, produz-se milho, massan-go, massambala, amendoim, mandioca, batata-doce e rena, feijão comum e feijão macunde.

A produção familiar é feita em 4 hectares em média e o sistema de produção dos cereais faz-se nas parcelas designadas: Omalunda – lugares onde o gado pernoita por mais de dois meses (antigos currais); Onohenda – lugares recém-desmatados para nova produção; e Onaka – lugares à beira dos rios, riachos ou acumulações de água; Ovivundo – lugar usado na produção de mandioca e batata-doce e é, geral-mente, cercado por espinheiros.

A produção é feita maioritariamente com tracção animal. O processo de sachas – amanhas culturais – varia, tanto pode ser manual como por tracção animal. A colheita é manual com recurso a pequenos recipientes (Ovimbala) e a debulha é, igualmente, manual. Existe o costume de entreajuda designado de Ondjambi na lavoura, na colheita ou mesmo na debulha.

A massambala nas comunas da Mupa e Kalonga. Milho na parte Leste e Nor-te da comuna do Mukolongondyo e na comuna do Cubati Jinguba, batata-doce e mandioca nas comunas de Mukolongondyo e Cubati.

Da produção agrícola, uma parte é seleccionada para semente e outra para reserva alimentar. A outra destina-se para fins comerciais – venda directa ou troca directa. Há ainda outra parte da produção para apoiar festas, óbitos, solidariedade com os vizinhos ou entre os membros da mesma família.

A produção do massango e da massambala nesta zona tem a facilidade da con-servação se manter por muitos anos.

A massambala resiste à seca e às inundações que são frequentes.

A pecuária é o gado bovino, caprino, suíno e galináceo. Existe gado bovino que assume um papel de capital acumulado do património familiar, usado em casos de crises de fome para permuta com alimentação, festas tradicionais, óbitos, casa-mentos, pagamentos de multas ou para reparar danos, aquisição de insumos agrí-colas. O gado produz estrume para fertilizar o solo, tracção animal, leite, pele e outros. O “proprietário” distribui o gado por vários ehumbos, de maneio baseado em critérios hidro pastoris e sociais, e faz parte do sistema de redistribuição social dos recursos. O Cuvelai é uma zona de transumância e está sujeita a pestes bovinas que ciclicamente resultam em muitas mortes de animais.

A pesca tem importância na economia das populações locais e faz-se com anzol em águas correntes do rio e outros lugares de permanência temporária das águas.

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A exploração de mel é feita de forma livre e há produtores tradicionais.

A actividade comercial é a segunda mais importante para os habitantes do município e muito influenciada pela proximidade com a Namíbia. Existe um único mercado informal e lojas ao longo das estradas principais.

FONTE: Perfil da Administração Municipal de Cuvelai na Província do Cunene.

6.9 Segurança alimentar e nutricional na dimensão do acesso

O acesso aos alimentos refere-se à capacidade dos indivíduos para adquirir alimentos apropriados a uma dieta nutritiva por meio de recursos adequados. O acesso aos alimentos pode ser de ordem física – quando os cidadãos têm pleno acesso aos meios produtivos: terra, água, sementes, fertilizantes, assim como ao bom funcionamento dos mercados e boas vias de comunicação, permitindo que os alimentos produzidos internamente ou importados cheguem, de forma ágil e regular, ao consumidor; ou de ordem económica – quando as famílias têm recur-sos económicos suficientes para cobrirem as suas necessidades alimentares bási-cas, sem prejuízo da satisfação de outras necessidades primárias, como sejam a habitação, a saúde, a educação e a informação. A dimensão do acesso está muito relacionada com as fontes de rendimentos, que, por sua vez, estão intimamente ligadas ao acesso à educação e formação, ao emprego e auto-emprego, ao acesso ao crédito e à dinamização diversificada de actividades geradoras de rendimentos. O acesso não é sobre o que as pessoas comem, mas como elas conseguem comi-da. Existem três formas de acesso, a saber, produção própria, compra ou permuta e doações ou transferência de alimentos.

A primeira forma de acesso aos alimentos é a produção própria de alimentos da agricultura, da pecuária e da silvicultura. No caso do nosso país, esta produção faz-se em regiões agro-ecológicas, em zonas agrícolas ou em zonas socioeconómi-cas dos povos locais.

Dados da avaliação rápida do impacto da estiagem na segurança alimentar das populações agrícolas em Angola, em 2012, “Estudo de Caso das províncias do Huambo, Huíla, Malanje e Benguela”, comissionada pela Norwegian Church Aid (NCA) aponta os seguintes aspectos do Huambo: o feijão é cultura de rendimento que não rendeu nem na 1.a nem na 2.a época devido à estiagem; as culturas que sustentam as famílias são o milho e o feijão e foram estas as mais afectadas; a cria-ção de animais é pouca e não pode suprir as carências alimentares e de rendimento das famílias mais vulneráveis. A próxima campanha agrícola começa em Novembro e vai durar 5 meses até Março, quando acontecem as colheitas, mas não existem

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reservas para as famílias camponesas se manterem até lá. Em Junho-Julho, os cam-poneses já estavam a utilizar as reservas para o seu consumo diário. Espera-se que em Setembro-Outubro se esteja já a viver uma situação de fome nas comunas mais afectadas pela estiagem. A estiagem vai provocar a antecipação da transumância, em Agosto, devido à escassez de pastos, e em Setembro a situação será grave com a falta também de água para o gado beber.

Como já foi referido, no caso do Cuvelai, para os pastores do Sudeste de Ango-la, a principal fonte da sua economia é a criação de gado bovino, caprino, ovino, que conforma o estatuto social, o poder e o status dos proprietários de muito gado. Existe um sistema complexo de titularidade e propriedade do gado que não é tão simples de descodificar. O gado pode ser propriedade da linhagem materna ou matrilinear que é herdado pelos sobrinhos do “proprietário” – filhos da sua irmã do ventre da mesma mãe. Este gado não se toca para vender, sacrificar de qualquer maneira, porque está sujeito a um controlo social familiar. O outro gado pode ser propriedade da linhagem paterna ou patrilinear. Depois há o gado adqui-rido por meios próprios, por exemplo, prestando serviços. Este gado pode ser ven-dido, oferecido e trocado sem grandes restrições. Por regra, o “proprietário” com muitas manadas, redistribui-as por várias famílias que as cuidam e beneficiam do estrume, da tracção animal, do leite, da pele e de parte da carne quando se mata um animal. No tempo de cacimbo fazem-se muitas festas e sacrificam-se animais para consumo com massiva participação de membros da comunidade e outros, que envolve mitos e rituais de consumo de carne de boi. As cerimónias e festas sociais têm a ver com a circuncisão dos rapazes, a puberdade das raparigas e a evocação dos espíritos dos antepassados. O gado é o seu capital e funciona como poupança, fonte de rendimento e participação no sistema de redistribuição social que é parte da segurança alimentar.

Em algumas zonas desta região, face aos condicionalismos climáticos, no que tange à escassez de chuva e à sua irregularidade, a agricultura de sequeiro é uma actividade quase marginal, limitando-se à exploração de pequenos espaços de terreno nas vizinhanças das habitações, com base na cultura de cereais, menos exigentes em humidade, como a massambala (shorgum vulgare) e o massango (pennisetum). O milho é reservado para as terras mais pesadas. A actividade pasto-ril subordina-se exclusivamente às condições do meio, com o aproveitamento dos recursos pascigosos naturais, o que lhes dá grandes vantagens na criação de gado bovino, fortalecendo assim a segurança alimentar que, naquela região, de vez em quando é exposta a choques naturais como a seca.

O leite é a alimentação de base com o massango, massambala, milho, carne e verduras, porém, na zona agrícola do Cuanhama, com chanas, em determinadas

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épocas do ano, as populações dispõem de inundação de quantidades apreciáveis de peixe que é aproveitada pela população como estratégia de segurança alimentar.

Os pastores e agropastores do sul de Angola, a recolecção de frutos silvestres, raízes, cogumelos, plantas e insectos jogam um papel importante no sistema social e nas fontes de sobrevivência. Uma pesquisa sobre o uso diverso de recursos flo-restais, feita pela ONG, COSPE, no município da Bibala, no Namibe, obteve resulta-dos interessantes que indicam quão é importante para as populações os recursos que a comunidade extrai da floresta e que há sete sectores de uso de produtos flo-restais: 1) para uso medicinal, em 84%; 2) para uso alimentar, em 50%; 3) para uso agro-pastoril, em 49%; 4) para uso veterinário, em 6%; 5) para uso ritual, em 5%; 6) para uso artesanal, em 4%; e 7) para uso cosmético, em 2%. Por este resultado se observa o papel da recolecção na segurança alimentar e nutricional, seja em ter-mos de disponibilidade, por aumentar a produção e diversificação, mas também no acesso, por gerar rendimentos financeiros.

É do conhecimento geral que a reabilitação das vias de acesso, depois do fim do conflito armado, centrou-se nas principais vias de acesso, faltando ainda muitas estradas secundárias e terciárias que ligam as localidades do interior profundo às principais estradas dos grandes centros de consumo. Esta realidade não é favorável ao incentivo do acesso aos alimentos, quer nas cidades onde os preços são cada vez mais altos, como nas localidades do interior que não conseguem obter os ali-mentos complementares com facilidade. A mesma análise é válida em relação às outras infra-estruturas precárias, e ao sistema de comercialização rural que possui muitas disfunções.

A segunda forma de obter alimentos pelas famílias ou pessoas é a compra da comida ou troca/permuta através da comercialização, mas isso requer ter fontes de rendimento. De forma geral, compram-se alimentos nos mercados formais e informais de diferentes dimensões, nas grandes superfícies, nos supermercados, nos minimercados, nas lojas, nas cantinas, nos “janela aberta”, nos hotéis, restau-rantes e similares. Um exemplo de trocas é referido no “Estudo das Comunidades Agro-Pastoris dos Gambos, na Huíla73”, e os resultados indicam que 78% do rendi-mento monetário da comercialização dos produtos agro-pecuários por Ehumbo74 são obtidos por troca, do qual 80% é referido como sendo proveniente da venda em lojas de comerciantes locais. Os produtos básicos, como o óleo alimentar, o sal, o sabão e o açúcar são importantes no comércio por permuta, sobretudo em se

73 Morais & Correia, 1993, Estudo das Comunidades Agro-Pastoris dos Gambos, na Huíla, ACORD-ADRA.

74 -cias e os currais designação e língua local.

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tratando das pequenas espécies. Prática de permuta entre intermediários e produ-tores é bastante corrente e conhecido, sobretudo no meio rural.

Em 2012, o impacto da estiagem, no Huambo, já se fazia sentir, ao nível dos preços, a fuba vendia-se a 100 Kz/kg, um preço nunca visto nesta altura do ano (época de suposta abundância dado que se trata de época de colheita). Este é um preço habitual somente em Dezembro/Janeiro/Fevereiro, sendo que no ano pas-sado por altura das colheitas estava a cerca de 50 Kz. A lata de milho na altura das colheitas, no ano passado, estava a 25-30 Kz, este ano está já a 35-40 Kz, no municí-pio sede. Regra geral, os agricultores têm reservas alimentares de Junho a Novem-bro, mas se o preço do quilo de fuba, já naquela altura estava a 100 Kz, é sinal de escassez e de diminuição de stocks, deixando antever que não existirão reservas por muitos meses. O aumento do preço do milho e da fuba – base da alimentação – gera uma espiral inflacionária, o carvão também já está mais caro, assim como o óleo alimentar (Norwegian Church Aid, 2012).

A terceira forma de obter os alimentos pelas famílias é a oferta, a assistência alimentar ou as doações, através de sistemas de direito social previstos por lei ou obrigações de apoio do governo. As doações também podem ser de organizações filantrópicas da sociedade civil.

No caso mais recente da seca no sul de Angola foi o Sistema de Protecção Civil. Os padrões alimentares dos povos da região são à base de cereais, principalmen-te massango, mas também o milho, e na falta o leite. O cabaz distribuído incluía o arroz, a fuba de milho, o feijão comum, a conserva de carne, a conserva de peixe, o óleo alimentar, o sal e o sabão. Regra geral, a conserva de carne não era consu-mida e, logo, havia uma dificuldade dos alimentos não terem em conta os aspec-tos relacionados com os padrões alimentares locais e faltou massango no cabaz de doação.

A redução das chuvas nos últimos 3 anos, ou seja, desde 2010, notada no Sul de Angola – nas províncias de Benguela, Cunene, Cuando Cubango, Huíla, Namibe e Kwanza Sul. No sul de Angola causou perda de culturas agrícolas, prejudicou todas as dimensões da segurança alimentar – disponibilidade, acesso, utilização, estabi-lidade – aos alimentos que eles próprios produzem e os que compram. As famílias consumiram as reservas e as sementes, faltou por tempo prolongado e isso pro-vocou insegurança alimentar crónica. Também, por falta de água, o gado bovino começou a ficar desidratado e sem pastos, enfraqueceu os animais, criou morte e perda de peso do gado, e faltou o leite, a alimentação de base daquelas popula-ções. Quando o gado começou a morrer, o preço do boi que antes custava 80 mil Kwanzas passou para 4 mil Kwanzas. Os cereais também subiram de preço mais do que o dobro nos mercados, prejudicando sobremaneira o acesso aos alimentos

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daquelas famílias. Quanto mais distante dos centros urbanos e das principais vias de acesso pior.

O consumo e utilização dos alimentos referem-se à ingestão e utilização dos ali-mentos em quantidade e qualidade, de forma a cobrir as necessidades em micro-nutrientes (vitaminas e sais minerais) e em macronutrientes (hidratos de carbono, proteínas e lípidos) para se atingir um estado de bem-estar nutricional, com base numa absorção correcta dos nutrientes necessários para uma alimentação saudá-vel. Esta dimensão insere-se no âmbito da necessidade de se garantir a distribuição dos alimentos, com equidade, dentro dos agregados familiares (questão etária e de género), de se assegurar a inocuidade dos alimentos, o respeito pelas preferên-cias alimentares (factores culturais), a qualidade da água, o saneamento básico, a higiene e o estado de saúde das populações, assim como a informação e educação nutricional, para uma correcta dieta alimentar.

Os alimentos vendidos ao ar livre nas ruas e nos mercados informais sem o míni-mo de condições sanitárias são uma questão de segurança alimentar e nutricional. De forma recorrente, os meios de comunicação social noticiam factos reportados pelas instituições de defesa do consumidor e das autoridades policiais na denúncia das irregularidades dos comerciantes que vendem bens alimentares fora do prazo de consumo, sendo um problema de segurança alimentar e nutricional.

Os cortes de energia nos centros urbanos criam dificuldades de conservação de alimentos e afectam a sua qualidade.

As disfunções nos subsistemas de abastecimento alimentar – transporte, comunicações e armazenamento, redes de comercialização, mercados de oferta e demanda de alimentos, distribuição e conservação, e outros, provocam problemas estruturais na segurança alimentar e nutricional.

A estabilidade refere-se ao acesso permanente a uma alimentação adequada. Normalmente existem períodos de insegurança alimentar de carácter transitó-rio ou cíclicos associados a determinados momentos das campanhas agrícolas ou empregos sazonais para os quais se torna necessário a existência de mecanismos que garantam a disponibilidade e o acesso aos alimentos durante esses períodos (diversificação das actividades económicas, diversificação da produção agrícola e existência de silos ou armazéns).

6.10 Conhecimento sobre a situação da segurança alimentar e nutricional

Dada a diversidade e complexidade da realidade angolana em vários aspectos, o conhecimento sobre segurança alimentar não é tarefa fácil. O Gabinete de Segu-rança Alimentar (GSA) tem-se destacado nos estudos localizados em determinados

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espaços geográficos sobre segurança alimentar e nutricional, não podendo ser generalizados noutras realidades. O estudo sobre segurança alimentar feito pela Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA), em 2012, em 12 muni-cípios das províncias de Benguela, Huambo, Huíla e Malanje, revela situações de insegurança alimentar, por causa do défice no acesso aos alimentos em quantida-de e qualidade.

No Huambo, dos inquiridos: 7,5% com segurança alimentar, 21,25% com inse-gurança alimentar leve, 23,75% com insegurança alimentar moderada e 47,5% com insegurança alimentar grave, isto é, a maioria da população vive com inse-gurança alimentar grave que se manifesta através de uma significativa restrição quantitativa de alimentos, levando-os à fome com alguma frequência entre adul-tos e crianças.

Na Huíla, o estudo mostra que há insegurança alimentar nos seguintes termos: dos inquiridos, 2,5% com segurança alimentar, 25,83% com insegurança alimentar leve, 20% com insegurança alimentar moderada e 51,25% com insegurança ali-mentar grave (ADRA, 2012).

Em Malanje há um número considerável de agregados familiares a viverem em situação de insegurança alimentar leve que representam 15,83% dos indivíduos inquiridos. A outra franja da amostra é constituída por 29,17% que vivem uma situ-ação de insegurança alimentar moderada. O grupo de agregados familiares a vive-rem em situação de insegurança alimentar grave, enquanto uma condição em que há restrição da quantidade de alimentos que leva à situação de fome com alguma frequência, entre adultos e crianças é a maioria representada por 43,75% do total de inquéritos realizados a 240 domicílios dos municípios do Quela, Kiwaba Nzoji e Kalandula (ADRA, 2012).

Em 2009, o Gabinete de Segurança Alimentar (GSA) do MINAGRI fez um estudo, comissionado pela UNICEF, sobre a Vulnerabilidade, a Insegurança Alimentar no Contexto da Alta de Preços, Análise dos Meios de Sustento e Economia Alimentar dos Agregados Familiares, nas províncias de Luanda, Bié e Cunene.

A síntese dos principais resultados deste estudo indica que, quanto à seguran-ça alimentar e pobreza, na província de Luanda, 13% dos agregados entrevista-dos têm consumo alimentar adequado e estima-se que 37% têm consumo regular. A insegurança alimentar incide mais fortemente sobre 49% dos agregados que têm um nível de consumo alimentar considerado precário. A dieta destes agregados é essencialmente básica e o número de refeições nunca é superior a duas por dia. Estes agregados apresentam muitas dificuldades de acesso a alimentos e, con-sequentemente, fraca capacidade de diversificar a fonte de energia e proteínas.

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O consumo nestes agregados situa-se muito abaixo de 2,100 kcal, por pessoa, por dia, que consiste essencialmente no consumo de cereais ou tubérculos, feijão, vegetais e óleo, numa base diária.

No Bié também 13% dos agregados entrevistados têm consumo alimentar ade-quado e 32% têm consumo regular. Os agregados com nível de consumo precário são de 52%. Todavia, metade dos agregados nesta última categoria tem acesso a cereais (milho, em particular) todos os dias da semana.

Na província do Cunene, apenas 10% dos agregados entrevistados consegue manter um nível de consumo adequado e 25% está no nível regular. Esta província tem uma percentagem elevada de agregados com consumo alimentar precário – 60%. O milho consumido no Cunene é adquirido maioritariamente no mercado, o que limita o acesso adequado a este produto. Aliás, a população do Cunene e as condições do solo e clima não favorecem a cultura do milho e, por isso, eles culti-vam massango e massambala. No Cunene, apenas 21% dos agregados com regime alimentar precário faz uma refeição de milho todos os dias da semana. O acesso ao massango, produzido localmente, é relativamente melhor, 69% dos agregados faz uma refeição diária todos os dias da semana.

Na província do Bié, a inflação alimentar é o risco de natureza económica que mais ameaça o consumo alimentar dos agregados, com uma incidência estima-da em 70%. A seguir vem o ataque de pragas, as doenças nas culturas e a falta de sementes, os riscos de natureza agrícola, com níveis de incidência de 88% e 58%, respectivamente.

A província do Cunene tem a pior interacção de ocorrência de riscos: inflação alimentar (com 83% de incidência), cheias (86%), pragas e doenças (63%) e redu-ção das áreas de pasto (48%) incidem fortemente sobre os agregados. Contudo, o impacto da ocorrência de riscos e choques sobre os agregados depende da capaci-dade destes de gerir ou atenuar esse impacto.

Neste estudo, a vulnerabilidade à insegurança alimentar, os agregados foram agrupados em quatro níveis de vulnerabilidade: Extrema, Elevada, Moderada e Baixa, em função da sua exposição aos riscos e à capacidade de os gerir. Neste sentido, estima-se que 17% dos agregados em Luanda estão numa situação de vul-nerabilidade à insegurança alimentar extrema e 27% em vulnerabilidade elevada.

Na província do Bié, a população em situação de vulnerabilidade extrema à insegurança alimentar é estimada em 21% e 29% em vulnerabilidade elevada.

Na província do Cunene, 32% dos agregados estão em situação de vulnerabi-lidade extrema à insegurança alimentar e 28% em vulnerabilidade elevada. Cerca

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de 85% dos agregados pobres estão no nível de vulnerabilidade extrema e 15% no nível elevado, sendo as cifras mais altas entre as três províncias.

Os dados desta pesquisa indicam que no Cunene, a propriedade de gado pare-ce não resolver situações de vulnerabilidade à insegurança alimentar no curto pra-zo ou para evitar que a situação se degrade para níveis extremos. As decisões sobre a gestão do gado têm a ver também com razões culturais que prevalecem sobre as razões de ordem económica.

O nível de ocorrência de riscos e choques cria sérios constrangimentos à segu-rança alimentar, mas deve servir de oportunidade para analisar a consistência e coerência das políticas económicas e sociais.

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Insegurança graveSegurança Insegurança leveInsegurança moderada

Bié CuandoCubango

Cunene Luanda Huíla Malanje

Há constatações que podem ser feitas de imediato sobre a questão da seguran-ça alimentar no país que são as seguintes:

A identidade conceptual sobre segurança alimentar e nutricional tem evoluído no mundo e em Angola, sendo multidimensional com diferentes aspectos conexos.

A ENSAN adoptou a definição das Nações Unidas sobre segurança alimentar e nutricional, mas ainda há pouco conhecimento sobre o assunto.

O sistema de segurança alimentar no nosso país não funciona de forma adequada.

A ENSAN tem uma dimensão internacional através das Convenções que o governo de Angola subscreveu e ratificou.

Angola possui um potencial de promoção da auto-suficiência alimentar. Desde o fim do conflito armado tem havido substancial aumento da produção agrí-cola e pecuária.

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Pelos dados em referência, há um défice de produção agrícola e pecuária interna, que mostra que o país não possui disponibilidade suficiente para alimentar a sua população, tendo em conta o seu potencial.

Mais do que a disponibilidade de alimentos, a capacidade de acesso aos ali-mentos pelos angolanos é a questão fundamental.

A segurança alimentar e nutricional em Angola está exposta a riscos e choques de ordem económica, por exemplo, preços altos, agrícolas, pragas e doenças e calamidades naturais que nos últimos anos agrícolas reduziram a produção alimentar.

Existem casos que revelam haver um potencial agrário para promoção de segurança alimentar.

As famílias produtoras da actividade agrícola e pecuária desenvolveram ao longo dos anos conhecimentos e experiência de estratégias de segurança alimentar, apesar do atraso tecnológico do sector agrário.

A situação de segurança alimentar é bastante variável em função da diversidade e complexidade do país75.

Há insegurança alimentar no país, seja nas áreas rurais, como em meios urbanos.

75 De recursos, de zonas agro-ecológicas, de zonas agrícolas, de zonas de consumo, do tipo de culturas e sistemas de produção, do tipo de sócio economia, do uso de tecnolo-gias, da quantidade, qualidade e segurança da terras e do conhecimento incluindo os locais das populações.

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E DA SOLIDARIEDADE

7.1 Introdução

O desenvolvimento de qualquer país é visto numa perspectiva multidimensio-nal, fundamento em factores de ordem económica, social, política e ambiental, visando assegurar a sua sustentabilidade (UNESCO, 2010). Esta multidimensionali-dade torna o conceito com desenvolvimento aberto ao concurso de vários actores sociais.

No caso particular de Angola, o Estado é um actor com grande peso na equa-ção desenvolvimentista devido ao modelo económico que o país segue, no âmbito do qual ele (o Estado) aparece como o principal empregador da força de trabalho, para além de deter as empresas com maior expressão no tecido produtivo. Ainda assim, resta espaço para outros actores, com particular realce para as Organiza-ções da Sociedade Civil e Igrejas para continuarem a dar o seu contributo em prol do desenvolvimento social do país, à luz do princípio da subsidiariedade.

No presente capítulo, a análise incidiu sobre o contributo socioeconómico e político de três instituições: 1) Hospital Divina Providência, pertencente à Igreja Católica. Trazemos um retrato completo sobre as acções que o Hospital desen-volveu ao longo de 2013, que culminaram com o atendimento de um universo de 410.700 pacientes nas suas diversas áreas de intervenção; 2) MOSAIKO – Institu-to para a Cidadania. É uma instituição pertencente à Igreja Católica e desenvol-ve uma acção especializada na promoção dos direitos humanos. A nossa análise recaiu sobre as acções que marcaram o quadro interventivo do MOSAIKO, 2013 nos domínios do aconselhamento jurídico, promoção de seminários e ciclo de palestras, produção, exibição e debate à volta de filmes e das publicações feitas; 3) CICA. Sendo uma organização ecuménica, desenvolve a sua acção numa pers-pectiva holística, abarcando a dimensão espiritual e social. Esta última contempla uma diversidade de projectos no domínio social, porém a nossa atenção restrin-giu-se ao projecto de monitoria social e boa governação, tendo abarcado os dados mais recentes do trabalho feito em 2012, à volta dos 22 projectos implementados nos Municípios de Cubal (Benguela), Cele (Kwanza Sul) e Negage (Uíge).

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7.2 Hospital Divina Providência

A unidade hospitalar Divina Providência pertencente à Igreja Católica, nome que deriva da Congregação Pobres Servos da Divina Providência, instituição pio-neira da iniciativa em função da sua dedicação à caridade e ao amor ao próximo.

O hospital surgiu em 1994 para responder às necessidades de saúde das populações do Golfe 1, tendo para o efeito erguido instalações pré-fabricadas de 2000 m², compostas por 5 salas para internamento, gabinetes da administra-ção, e as restantes para consultas externas, de especialidade e diversos exames laboratoriais. Em 2002, o hospital estabeleceu um acordo de cooperação com o MINSA, que veio a desempenhar um papel para a Instituição (Rúbio, 2013:18) e actualmente o HDP é um órgão que depende da Direcção Provincial da Saúde de Luanda.

7.2.1 Estrutura física do HDP, sua capacidade e funcionamento

Com o apoio do Governo, foi possível a construção de instalação auxiliar, o HDP, que é utilizado para o internamento dos pacientes. No quadro geral, esta nova unidade é composta por 7 áreas (Serviços Administrativos, Laboratório, Consultas Externas, Internamentos de Pediatria e Medicina, Tratamento Ambu-latório de TB, Atendimento às Pessoas Vivendo com VIH/SIDA e Hemoterapia), com uma capacidade geral de 109 camas, sendo 55 para adultos e 54 para as crianças (Ibid.).

Para além desta unidade central, a unidade hospitalar Divina Providência con-ta ainda com subunidades de apoio complementares que são as seguintes: “Nos-sa Senhora da Paz” no Golfe 2; “São João Calábria” no bairro Malanjino; “Santa Teresinha” nas imediações de Avô Kumbi – Golfe 1.o posto médico e “Santa Cata-rina”, prestando serviços nas áreas de consultas pré-natais, curativos, consultas de pediatria e de medicina. Os serviços de auxílios que são prestados por essas subu-nidades ajudam a desafogar a unidade central Divina Providência que se encarrega dos casos dos pacientes com complicações mais graves e que necessitem de maio-res cuidados (Ibid., p. 20).

A rede de apoio da unidade hospitalar Divina Providência foi alargada com a entrada em funcionamento do Centro Nutricional Terapêutico, concluído em Janeiro de 2011, com o suporte da ENI FOUNDATION, mas ainda em estado de inopera-cionalidade por escassez de recursos humanos. Para além disso, em Dezembro de 2013, foram concluídas as obras do centro médico “São Marcos”, cuja estrutura inclui uma maternidade destinada a servir as populações do bairro Sapú e arredo-res (Hospital Divina Providência, 2013:3).

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7.2.2 Áreas de atendimento

O Hospital Divina Providência funciona de segunda a sexta-feira das 7h30 às 16h00, principalmente para atender os utentes externos provenientes dos vários bairros de Luanda, sobretudo do Dangereux, Fubú, Golf 1 e 2, Sapú, Camama, Capolos 1 e 2. Os doentes antes de chegarem ao hospital passam por uma tria-gem nas subunidades de saúde. Todavia, no caso dos doentes internados, a unida-de central funciona a tempo integral quanto ao atendimento (Rúbio, 2013:18-19).

Até Setembro de 2013, em média, o hospital atendia diariamente cerca de 200 pacientes externos atraídos pela assistência médica condigna. Comparativamente ao ano de 2012, a média de atendimento foi de 430.616 pacientes, registando uma redução de 4,63%, em relação a 2013.

7.2.3 Consultas externas

A área de consultas externas registou uma subida na ordem de 6,40%, sendo que de 156.748 do ano anterior, passaram para um total de 166.790 em 2013, nos sectores de pediatria e medicina. O sector de pediatria atendeu 80.325 pacien-tes, destes 19.211 ao nível da unidade central, enquanto 61.114 nas subunidades. Quanto à área da medicina foram consultados 86.465 pacientes, dos quais 35.518 ao nível central, isto é, na unidade principal, ao passo que 50.947 foram atendidos nos Postos (HDP, 2013:2).

7.2.4 Centro de tratamento de tuberculose

O hospital atendeu um total de 1244 pacientes, destes 698 representam casos novos, contrariamente a 91 casos de reincidência. No ano anterior, foram aten-didos 1370 pacientes, o que representa uma diminuição de casos em 2013, na ordem de 9,20%.

7.2.5 Consultas pré-natais

Nesta área registou-se uma diminuição de 15,2% da procura dos serviços em 2013, ano em que foram atendidas 17.009 mulheres contra 20.078 do ano anterior.

7.2.6 VIH/SIDA

O hospital começou a prestar serviço nesta área em Setembro de 2003, regis-tando um total de 5431 pacientes. Entre os pacientes em seguimento no ano 2013, 2184 estão em tratamento anti-retroviral (ARVs), contra 2315 pacientes que não fizeram o tratamento, 605 pacientes faleceram, 299 foram transferidos de outros hospitais para o Divina Providência e 28 abandonaram o tratamento.

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A escassez dos recursos humanos dificulta a acção do CATV nesta unidade, fazendo com que o teste voluntário e aconselhamento pré e pós-teste voluntário sejam feitos unicamente aos familiares das pessoas em seguimento no centro do hospital.

7.2.7 Consultas especializadas

Nesta área foram consultados 15.916 pacientes nas especialidades de ecogra-fia, ortopedia, cardiologia, reumatologia, estomatologia, pneumologia e optome-tria. Os serviços de estomatologia foram os mais procurados (61,15%), seguido do de optometria (24,37%).

7.2.8 Laboratório de análises e radiologia

Foram realizados um total de 218.461 exames, 82,35% destes no Divina Provi-dência e 17,38% nos Postos. Este universo constitui uma diminuição na ordem de 10,82% em relação ao ano 2012.

Contrariamente aos exames laboratoriais, a radiologia registou um acréscimo em 2013 na ordem de 1,82% ao examinar 10.533 pacientes contra 10.345 no ano 2012. Este serviço está digitalizado. De maneira que partindo do computador cen-tral, as 10.533 imagens radiológicas foram enviadas aos cinco terminais instalados nas várias secções do hospital, de onde foram visualizadas pelos médicos de forma mais rápida e eficaz.

7.2.9 Centro Nutricional Terapêutico/Seguimento e Vigilância Nutricional

Com uma ligeira subida na ordem de 0,62%, em 2013, o Centro Nutricional Terapêutico registou a entrada de 490 pacientes, dos quais 378 encontraram cura, 84 faleceram, 9 abandonaram e 15 vieram transferidos de outras unidades.

O Centro Nutricional de Seguimento registou um aumento do número de pacientes na ordem de 68,60% em 2013, tendo atingido 1777 contra 1054 que deu seguimento em 2012. O cenário foi diferente na área de Vigilância Nutricional, onde se registou um decréscimo de 16,24% em comparação com o ano 2012, ou seja, em 2013 foram atendidos 35.781 pacientes, enquanto, no ano anterior, foram atendidos 42.719 pacientes.

7.2.10 Transfusões/Crianças Vacinadas/Vacinas

O Centro realizou um total de 1166 transfusões sanguíneas em 2013, contra 1077 realizadas no ano anterior, cujo aumento está na ordem de 8,26%. O grupo 0+ liderou as transfusões (48,11%), seguido dos grupos A+ (25,21%) e B+ (21,61%).

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Quanto às vacinas, das 57.565 de que o Centro dispôs em 2013, 27.782 foram administradas às crianças, assinalando um progresso de 16,93% em comparação com o ano anterior.

7.2.11 Situação epidemiológica

A malária, as doenças respiratórias agudas (DRA), a malnutrição e a tuberculo-se destacaram-se como sendo as principais patologias que afectaram os pacientes que foram atendidos no Divina Providência no ano de 2013, sendo a tuberculose e a malnutrição as mais letais, seguidas das DRA e anemia (Ibid., 2). No caso parti-cular da malnutrição, manteve-se no topo como sendo a principal causa de morte das crianças do 0-5 anos (20,69%).

7.2.12 Recursos humanos e sustentabilidade do hospital

O hospital conta com 360 funcionários, dentre os quais 260 estão integrados na função pública, enquanto 100 trabalham em regime de contrato privado. A tabela abaixo apresenta os recursos humanos do hospital nas suas variadas categorias e desagregados por género.

QUADRO ORGÂNICO DOS RHS DO HDP

CategoriaQuantos são?

TotalHomens Mulheres

Médicos 10 19 29

Enfermeiros 41 74 115

Técnicos de Laboratório 8 21 29

Técnicos de Imagiologia 3 - 3

Catalogadores 1 2 3

25 13 38

Serviço Complementar 58 85 143

FONTE: CEIC, com base nos dados recolhidos no HDP.

O quadro dos recursos humanos que o hospital detém revelou-se insuficiente em 2013, para fazer face às necessidades de saúde dos utentes. O mais agravante é a fuga de funcionários de saúde para postos de emprego com remunerações mais atraentes, devido a razões salariais e excessiva lentidão na actualização das cate-gorias daqueles que atingiram formações superiores.

A sustentabilidade financeira do HDP, no ano de 2013, fundamentou-se nas quatro fontes de arrecadação das suas receitas conforme o gráfico seguinte ilustra.

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ARRECADAÇÃO DE RECEITAS - 2013

OGEServiços HospitalaresDoações/ProjectosEntradas diversas

0,55%

78,87%

16,71%

3,86%

FONTE: Relatório de Actividades do Hospital Divina Providência, exercício 2013, p. 8.

As receitas arrecadadas, em 2013, totalizaram AKz 747.018.842,00, das quais destacam-se 78,78% que resultaram da cabimentação orçamental do Governo e 16,71% que resultaram da comparticipação dos utentes. A receita proveniente da comparticipação dos utentes é ainda necessária pelo papel importante que tem jogado na engenharia financeira do hospital, pois ela tem sido revertida para a remuneração dos funcionários que não fazem parte da função pública, pelo que 2013 não foi uma excepção neste aspecto.

A verba do hospital em 2013 foi utilizada principalmente para a cobertura dos salários com o pessoal, despesa que representou 73,22% de todas as outras efec-tuadas pela unidade.

7.2.13 Relações externas

No âmbito externo, o Hospital Divina Providência estabeleceu acordos de coo-peração com uma companhia petrolífera e algumas Organizações Internacionais, das quais beneficiou de uma linha de crédito que financiou projectos específicos implementados no ano de 2013 no valor de USD 242.532,57. Veja o quadro global desta linha de crédito na tabela abaixo.

QUADRO GLOBAL DA LINHA DE CRÉDITO BENEFICIADA PELO HDP

N.o Financiador Valor global Áreas contempladas

1 Fundação Cariverona € 180.000,00 Tuberculose e laboratório

2 Fundação das Nações Unidas para a População AKz 8.377.426,00

3 BP Angola USD 510.000,00Atenção básica à saúde, melhoria dos serviços sanitários e malnutrição

FONTE: Relatório de Actividades do Hospital Divina Providência, exercício 2013, pp. 12-13.

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Por outro lado, o hospital tem mantido relações de intercâmbio científico e cooperação com instituições internacionais , nomeadamente: Hospital Universitá-rio “Burlo Garofalo” de Trieste (Itália), Hospital Microcitécnico de Cagliari, Hospital S. Cuore de Negrar (Itália), Hospital Divina Providência de Marituba (Brasil) e Ins-tituto de Medicina Integral de Pernambuco (Brasil). Do pacote das 12 acções for-mativas promovidas pelo Divina Providência em 2013 para a capacitação dos seus recursos humanos, 6 tiveram lugar no Brasil, Itália e no próprio hospital, envolven-do formadores nacionais e estrangeiros.

7.2.14 Dimensão holística

O Hospital Divina Providência, para além da sua vocação enquanto unidade de saúde, desenvolve igualmente acções de âmbito espiritual. Para tal conta com o seminário que se encarrega de realizar missas às Quartas-feiras, aos Sábados e aos Domingos, sempre no período nocturno, a partir das 18 horas 30 minutos.

Os seminaristas fazem visitas aos doentes internados, juntando-se a isso os actos de administração da unção e confissão levados a cabo pelo Padre Fernando Alves Tchilunda na condição de Sacerdote, para além de fazer parte do corpo direc-tivo do hospital.

Enquanto propriedade da Igreja Católica, o hospital está aberto a outras deno-minações religiosas, e regista-se um número considerado de pessoas singulares ou grupos religiosos organizados que têm efectuado visitas aos pacientes internados, e prestado apoio espiritual.

7.3 MOSAIKO – Instituto para a Cidadania

7.3.1 Introdução

O MOSAIKO – Instituto para a Cidadania é uma instituição angolana fundada em 1997 pelos Missionários Dominicanos da Igreja Católica, sem fins lucrativos. Foi a primeira instituição a assumir explicitamente como missão a promoção dos Direitos Humanos em Angola, guiada pelo compromisso social, visando o respeito pela dignidade humana e o desenvolvimento da sociedade angolana a partir do contributo de todos.

No centro da actuação, o MOSAIKO – Instituto para a Cidadania – tem o objec-tivo de contribuir para uma Angola melhor, uma Angola que se constrói com um pouco de todos os cidadãos e cidadãs.

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7.3.2 Acções desenvolvidas em 2013

7.3.2.1 Aconselhamento jurídico e seminários

O MOSAIKO fez acompanhamento de 14 casos oriundos de 4 províncias, dos quais 50% foram encerrados com sucesso e os outros 50% estão em curso. A tabela abaixo oferece mais detalhes.

CASOS ACOMPANHADOS PELO MOSAIKO EM 2013

N.o Proveniência Natureza jurídica do caso Situação do caso

1 Luanda (Ingombota) arrendamento) Encerrado

2 Luanda (Cazenga)

Encerrado (resolvido depois de um recurso dirigido junto à área jurídica do BFA-Angola)

3 Luanda (Viana)

Penal (detenção ilegal e prisão arbitrária)

Encerrado (feito um pedido de habeas corpus junto ao Ministério Público de Luanda, com recurso ao Provedor de

4 Luanda (Cazenga)

Cível (reconhecimento da união de facto) paternidade, mas o esposo com a

conciliação retomou à família)

5 Luanda (Rangel)

Laboral (despedimento sem justa causa)

Encerrado (o caso foi encaminhado para a sala de trabalho e o requerente foi indemnizado)

6 Cubal (Benguela)

Encerrado (caso dos professores que estavam sem receber o salário e o caso foi encaminhado à Direcção da Educação

regularizada)

7 Luanda (Cazenga) hospital)

Encerrado (o caso foi encaminhado para a sala de trabalho e o requerente foi indemnizado)

8 Luanda (Cazenga) Bairro Kalawenda

Em curso (encaminhado ao Ministério das

9 Luanda (Viana – CAOP)

10 Luanda (Cazenga) Familiar (fuga à paternidade)

FONTE: MOSAIKO – Instituto para a Cidadania, Relatório de Actividades, 2013.

No capítulo de formação, o MOSAIKO realizou 16 seminários sobre temáticas de Direitos Humanos, correspondendo a 45 dias de formação, com 774 participan-tes, sendo 43% do sexo feminino e 57% do sexo masculino. Os seminários decor-reram em 10 localidades das províncias de Huíla, Cuando Cubango, Kwanza Norte, Kwanza Sul, Luanda, Lunda Norte e Malanje.

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7.3.2.2 Conferências e debates

Foi apresentado o filme “ser humano” produzido pelo MOSAIKO, acompanha-do de debates na Refriango com 20 participantes (55% femininos e 45% mascu-linos) e duas vezes na Universidade Católica de Angola, com 93 participantes na primeira (37% femininos e 63% masculinos) e 87 participantes na segunda (41% femininos e 59% masculinos).

Outrossim, o MOSAIKO realizou um ciclo de palestras sobre “Direitos Humanos das Mulheres”, “Direitos à Nacionalidade”, “Nacionalidade e Cidadania”, no Cazen-ga, com 50 participantes (92% femininos e 8% masculinos), na Paróquia da Boa Nova sobre “Direitos Humanos e Cidadania“, com 50 participantes (40% femininos e 60% masculinos).

7.3.2.3 Publicações

O ano de 2013 foi fértil em termos de publicações, cujos títulos são: Relatório Social sobre o Acesso à Justiça fora dos Grandes Centros Urbanos (31.01.2013); as Actas da IV Semana Nacional sobre “Democracia e Participação” (02.12.2013); Calen-dário 2014 “Liberdades Fundamentais”; 4 edições – “Direito à Habitação”, “Direito à Terra”, “Processo de legalização de terrenos para fins agrícolas” e “Processo de legali-zação de terrenos urbanos” – do boletim trimestral MosaikoInform (2500 exemplares cada edição) e 2 folhetos sobre Constituição da República de Angola, Título I “Princí-pios Fundamentais“ e Título II “Direitos, Liberdades e Garantias Fundamentais”.

7.4 Monitoria social e boa governação – o caso do CICA

7.4.1 Resenha Histórica

O Conselho das Igrejas Cristãs de Angola é uma Organização ecuménica fundada por sete (7) Igrejas Angolanas76, aos 24 de Fevereiro de 1977 sob a sigla de CAIE (Con-selho Angolano das Igrejas Evangélicas). Ao longo do percurso ecuménico, a Organiza-ção passou a designar-se CICA77 e abriu-se à adesão de mais membros, estando hoje a contar com 21 membros, entre eles 20 Igrejas e uma OBF (Organização Baseada na Fé). A caminhada ecuménica conjunta destas igrejas traduz-se na sua cooperação em domínios específicos, com destaque para o social, formação teológica e evangelismo.

CICA é membro do FOCCISA, CITA (Conferência de Igrejas de toda África) e CMI (Conselho Mundial de Igrejas). Está presente nas 18 províncias do país através das

76 São elas: Igreja Metodista Unida de Angola, Igreja Congregacional de Angola, Igreja Evangélica de Angola, Igreja Evangélica Baptista de Angola, Igreja Evangélica Refor-mada de Angola, Igreja Kimbanguista e Missão Pentecostal de Angola.

77 A partir de Julho de 1992 no âmbito da sua 17.a Assembleia Geral.

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suas CECs (Comissões Ecuménicas de Cooperação) e Igrejas membros, o que faz dele um actor importante no panorama social e religioso do país. Outrossim, o CICA segue uma visão holística no desenvolvimento das suas acções, visto que as mesmas abarcam uma dimensão espiritual e outra social, com vista a correspon-der às necessidades plenas da pessoa humana na sua dimensão tricotómica (cor-po, alma e espírito). No que se refere à dimensão social, de realçar as acções do CICA em projectos relacionados com a violência baseada no género, saúde comu-nitária e VIH/SIDA, comunicação e informação, justiça, paz e reconciliação, mudan-ças climáticas e monitoria social e boa governação.

7.4.2 Monitoria social e boa governação

Com o financiamento da Ajuda da Igreja Norueguesa (AIN), o Conselho através do seu Departamento de Assistência e Desenvolvimento (DAD) tem vindo a traba-lhar no projecto de Monitoria Social e Boa Governação (MSBG) desde 6 de Maio de 2010, motivada por dois pressupostos: a visão holística que encarna a sua missão em Angola e o dispositivo legal que consagra o direito dos cidadãos participarem directa ou indirectamente na vida política do país e de serem informados sobre os actos do estado e da gestão dos assuntos públicos (CRA, Artigo 52.o). Portanto, o CICA enquanto voz da Igreja que é sal e luz do mundo e da sociedade Angolana em particular, serve-se da MSBG como seu instrumento operativo para contribuir no alcance de uma gestão eficaz e eficiente das receitas públicas, visando a redução da pobreza e a construção de uma sociedade justa.

7.4.2.1 Área e âmbito de implementação do Projecto

A geografia do projecto compreende 4 províncias: Kwanza Sul (Municípios de Cassongue e Cela), Benguela (Municípios de Balombo e Cubal), Uíge (Município de Negage) e Zaire (Município de Mbanza-Kongo), esta última foi introduzida no mapa do projecto em 2013.

No âmbito deste projecto, as acções de monitoria social incidem sobre o OGE mas de forma particular sobre o Programa de Investimentos Públicos (PIP) e o Programa Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza (PMIDRCP).

7.4.2.2 Acções desenvolvidas em 2012 e constatações feitas

Em cada município, existem 5 grupos de monitoria social, compostos por 5 indi-víduos denominados por Presidência da República, Assembleia Nacional, Tribunal de Contas, Ministério das Finanças e Sociedade Civil, respectivamente, por formas a sentirem-se motivados no cumprimento do seu papel, inspirando-se nos seus nomes, os quais representam os órgãos que têm a responsabilidade de fiscalizar a execução do OGE.

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Os grupos monitoraram 22 projectos em 2012, seleccionados aleatoriamente nos municípios de Negage, Cele e Cubal, tendo havido um acréscimo de 6 projec-tos, em comparação com o exercício de 2011. No âmbito da monitoria social, os grupos visitaram três vezes, cada projecto, totalizando 66 visitas, sendo a primeira para constatar o arranque da obra, a segunda para constatar a sua evolução e em Dezembro a terceira e última para constatar a sua conclusão ou não.

No Negage foram monitorados 9 projectos, relacionados com a construção de 2 escolas com 6 salas de aulas cada, nas localidades de Cáua Grande (Sede Munici-pal) e Aldeia da Missão, 25 casas evolutivas na Sede Comunal de Quisseque, uma quadra polidesportiva na Sede Municipal e um Centro Materno Infantil na Sede Municipal; reabilitação de uma escola de 7 salas de aulas no Cácua Central e 3 casas dos médicos na Sede Municipal; reabilitação e ampliação do Centro de Saú-de e construção do Centro Materno Infantil e seu apetrechamento na Comuna de Cangulo e a reabertura de 6 km de picada, seu nivelamento, compactação, aber-tura de valas de drenagem e colocação de brita em áreas críticas no troço que liga Cangulo com Cahiri (Sede Municipal).

Os 9 projectos estiveram a cargo da Administração Municipal, no entanto 4 deles não foram concluídos no ano civil 2012, fazendo com que o grau de execu-ção dos projectos ficasse na ordem de 56% (CICA, 2012:16). Os fundos gastos na execução destas obras não foram revelados à equipa de MSBG, o que coloca inter-rogações sobre a transparência na gestão dos mesmos por parte da Administra-ção Municipal para além de com esta atitude violar o disposto no Artigo 74.o da Lei referente ao OGE 15/10 de 14 de Julho que obriga “… a publicação de todos os documentos que se revelem necessários para assegurar a adequada divulgação e transparência dos correspondentes orçamentos” (Ibid., p. 17).

No Cubal foram monitorados 6 projectos consubstanciados na construção de um mercado na Sede Comunal (Yambala), 50 casas evolutivas na Sede Municipal, 3 escolas na Sede Municipal, sendo duas com caracter evolutivo, 3 cantinas esco-lares e seu apetrechamento (na Sede Municipal) e reabilitação e construção de um jardim e quadra desportiva (na Sede Municipal). As obras estiveram igualmente a cargo da Administração Municipal, cujo grau de execução foi de 100%, tendo orça-do na ordem de AKz 118.250.000.

No Waku Kungo (Cele) a equipa de MSBG monitorou 7 projectos relacionados com a construção de 2 sistemas de abastecimento de água na Sede Comunal da Sanga e na Comuna do Kissanga Kungo, 50 casas evolutivas na localidade de Cas-songo Sanga; construção e apetrechamento da escola primária na povoação do Tengue (Sede Municipal), 1 Posto de Saúde e 1 residência para os enfermeiros no Canjombe (Comuna do Kissanga Kungo) e 1 residência do enfermeiro no Cassosso (Comuna do Kissanga Kungo).

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A execução dos 7 projectos que consumiu AKz 151.555.802,60, esteve igual-mente sob a responsabilidade da Administração Municipal, dos quais 2 não conhe-ceram a sua conclusão.

A tabela abaixo sintetiza os 22 projectos segundo áreas de intervenção, grau de execução e grau de transparência.

ÁREAS DE INTERVENÇÃO E GRAUS DE EXECUÇÃO/TRANSPARÊNCIA

Áreas de intervenção GE GT

Qt Educação Saúde Desporto Estradas C. Informal(Mercado) Água Habitação – –

N.o 7 6 2 1 1 2 3 16 13

% 31,81 27,27 9,09 4,54 4,54 9,09 13,63 72,72 59,09

FONTE: CEIC/UCAN com base nos dados recolhidos do CICA, 2012:15-22.

Entre os 22 projectos monitorados, as áreas de educação e saúde são as que mais intervenções registaram, com uma diferença bastante ligeira entre ambas. Embora os 22 projectos não constituam uma amostra representativa mas o fac-to da educação e saúde se destacarem entre os 22 projectos monitorados, é uma constatação positiva pois são áreas vitais na promoção do desenvolvimento inclu-sivo e sustentável. Todavia, apesar deste esforço das Administrações Municipais, ainda é notória a insuficiência de infra-estruturas escolares, considerando a super-lotação que se regista em algumas escolas e a existência de crianças que estudam em lugares impróprios, como nas varandas (CICA, 2012:23).

O grau de execução (GE) dos 22 projectos é positivo, com destaque para o Muni-cípio de Cubal que atingiu 100%, seguido do Wuko-Kungo que alcançou 71,42% enquanto o do Negage está na cauda em virtude de ter atingido 56%.

O grau de transparência ainda deixa muito a desejar, isto pelo facto do Municí-pio de Negage ter atingido 0%, enquanto os dois restantes municípios alcançaram 100%.

Restringindo a análise aos 22 projectos monitorados, diríamos que o quadro global dos três municípios revela-se positivo no tocante aos graus de execução dos projectos concebidos e à transparência na gestão dos fundos. Todavia, no terreno ainda se regista a falta de envolvimento das comunidades nos processos de iden-tificação e planificação das acções para que as suas necessidades reais sejam as determinantes principais do tipo de projectos a executar (CICA, 2012:23).

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8. MONOGRAFIA SOBRE A SITUAÇÃO SOCIAL NO MUNICÍPIO DO NEGAGE

8.1 Introdução

Este capítulo analisa a situação social no Negage, um dos 16 municípios que configuram a geografia administrativa da província do Uíge78. Trata-se de um estu-do de caso que resulta de uma pesquisa de terreno realizada entre os dias 14 de Novembro e 7 de Dezembro de 2013. A pesquisa, que combinou os métodos quan-titativo e qualitativo, consistiu na recolha de informações através da aplicação de inquéritos e entrevistas directas e indirectas a um total de 40 famílias residen-tes em seis regedorias das três comunas do município, informações que foram complementadas com dados recolhidos a partir da administração municipal e das respectivas administrações comunais. O objectivo foi, sobretudo, o de captar a percepção da pobreza por parte das populações, vendo até que ponto as políticas, os programas e as acções do poder executivo têm respondido adequadamente às necessidades e aos anseios locais, principalmente no que se refere aos espaços rurais, cujas carências se afiguram, em geral, gritantes.

Neste contexto, parte-se de uma breve caracterização geográfica, administra-tiva, demográfica e histórica do município, para, em seguida, se analisar os princi-pais indicadores de desenvolvimento social, nomeadamente na área da educação, saúde, transporte, agricultura e pecuária. São incluídas, ao longo da exposição, as falas dos entrevistados, de modo a conferir maior fidelidade à abordagem e a valo-rizar directamente a percepção dos actores locais.

8.2 Caracterização geográfica

O município do Negage é um dos 16 municípios que compõem a província do Uíge, região norte de Angola, abrangendo uma superfície de cerca de 2019 km²,

78 Os outros 15 municípios são: Ambuíla, Bembe, Buengas, Bungo, Damba, Alto Cauale, Maquela do Zombo, Milunga, Mucaba, Puri, Quimbele, Quitexe, Sanza Pombo, Songo e município sede do Uíge.

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o que equivale a 3,15% do território provincial. Situa-se no extremo sul da pro-víncia e a 36,6 km² da cidade capital. As suas fronteiras são formadas a norte pelo município do Bungo, a nordeste pelo do Puri, a noroeste pelo município sede do Uíge, a sudoeste pelo do Quitexe, a sudeste pelo município do Alto Cauele e, finalmente, a sul pelo município de Camabatela (província do Kwanza Norte).

Quitexe

Ambuíla

BembeSongo

Bungo

Negage

Puri

AltoCauale

SanzaPombo

Damba

Mucaba

Maquelado Zombo

Quimbele

Santa Cruz

Buengas

Uíje

FONTE: Fragmentos do Uíge e da Cultura Kongo, 2013.

Negage faz parte de um sistema montanhoso de 1300 metros de altitude, coberto por densas manchas florestais e bastante arborizadas e entrecortado por vales e rios de caudal médio. O mais importante rio é o Cáua, que atravessa longitudinalmente a sede do município e onde é possível a navegação através de pequenas embarcações até 20 quilómetros da foz. Devido à extensa vegetação, a fauna é abundante, podendo encontrar-se animais como elefante, búfalo, javali, macacos azuis e outras diferentes espécies raras.

Como em toda a região norte do país, o clima é tropical húmido, com uma tem-peratura média anual de 25 oC. Quanto às estações, apenas se distinguem duas: o tempo quente e chuvoso, que vai de Setembro a Maio, e o tempo de cacimbo, de Junho a Agosto. As chuvas são convectivas, ou seja, típicas de regiões com alto grau de evapotranspiração de superfícies húmidas e aquecidas, com quedas de grande intensidade.

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Essa complexa combinação geográfica conforma uma região tropical propícia, entre outras actividades produtivas:

Ao cultivo do café, da mandioca, do amendoim, do dendém, da batata-doce, do sisal e de outros produtos agrícolas em menor escala.

À extração da madeira e à produção de cestos, cadeiras e alcofas de junco.

À pesca numa área de cerca de 108.200 m².

À pecuária, relativamente aos gados bovino, caprino e suíno.

À avicultura, com a criação de galinhas, patos e peru.

À caça, nomeadamente de antílopes.

À extração de minerais localizados na região, tais como o cobre, talco e zinco.

O município do Negage é ainda caracterizado geograficamente pela existência, no seu território, de zonas turísticas, como a região de Cassadi, onde se encontram as famosas pedras titânicas e misteriosas de Cabala, por possuírem escrituras de desenhos que, até então, não foram descodificadas. O local passou a ser um pon-to de atracção turística no final da década de 1960, depois de despertar o inte-resse da administração colonial, chegando o então Governador-Geral da província de Angola, Rebocho Vaz, mandar fazer uma placa de betão sobre as misteriosas pedras, para proteger as pinturas rupestres dos ventos e chuvas fortes.

8.3 Caracterização administrativa e demográfica

Do ponto de vista administrativo, Negage –, ou antes, “Ngage” – existe há mais de meio século. A localidade, antes uma pequena sanzala, foi, no contexto da administração colonial portuguesa, elevada à categoria de aldeia em 1925 e, mais tarde, à de Posto do Concelho de Ambaca, Distrito do Kwanza Norte. Em 1955, passou a pertencer ao Concelho do Bembe, Distrito do Uíge. Já um ano depois, foi criado o Concelho de Negage, que, em 1958, foi elevado a vila. Finalmente, a 26 de Junho de 1970, por meio da Portaria N.o 19/076, de 15 de Março, publicada no Boletim Oficial N.o 13/62, Negage passou à categoria de cidade, tendo sido os seus serviços administrativos instalados no famoso edifício do Tumbuaza, hoje um património histórico local.

Após a independência de Angola, Negage passou a constituir um dos 16 muni-cípios da província do Uíge, dividido, administrativamente, por três comunas, a saber: Dimuca com 888 km², Quisseque com 603 km² e Negage (comuna sede) com 501 km². Estas, por seu turno, são subdivididas por 38 regedorias, conforme se pode ver na distribuição da tabela seguinte.

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DIVISÃO ADMINISTRATIVA DO MUNICÍPIO DO NEGAGE

Comuna Regedoria

Negage (comuna sede)

Banza Negage 3 km²

Cabala 3 km²

Bengo 4 km²

Cangundo 5 km²

Terra Nova 6 km²

Cangulo 10 km²

Cazanga 10 km²

Cauenda 15 km²

Quituia 15 km²

Bamba Matamba 18 km²

Quindando 20 km²

Quidinga 27 km²

Quiongua 38 km²

Longe Zeca 40 km²

Tema 40 km²

Dimuca

Dala 15 km²

Vunge 22 km²

Malungo 26 km²

29 km²

Tuiango 31 km²

Sede da Comuna 32 km²

Luanda 37 km²

Mussungua Ngombe 42 km²

Panzo 42 km²

Yemba 46 km²

Bango 49 km²

Calunga 50 km²

Longe 56 km²

Zanda 56,6 km²

Biri 61 km²

Bula 61 km²

Quisseque

Quisseque 20 km²

Canzundo 30 km²

Pumba 30 km²

Catumbo do Pumba 32 km²

Quixica 32 km²

Alto Dange 35 km²

Gozolo 40 km²

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

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Tais regedorias – ou “Mbanza”79, como são tratadas em kikongo pela popula-ção local – compreendem um total de 82 aldeias. Elas representam a autoridade do poder tradicional local, que, na prática, exerce a função de auxiliar da adminis-tração central do Estado. Neste momento, este poder está composto por 300 auto-ridades tradicionais, de acordo com a seguinte repartição hierárquica.

AUTORIDADES TRADICIONAIS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Soba grande Adjunto de Soba grande Soba Adjunto de Soba Sekulu

2780 27 82 82 82

FONTE: Muana Damba, “Breve historial do Município do Negage”, 2013.80

Neste contexto, constata-se que a estrutura do poder político e administrativo entre o centro do município e as restantes regedorias é manifestamente uma bifur-cação, sendo que o administrador municipal se encontra no topo da representação da autoridade e os diferentes regedores subordinam-se a ele formalmente.

Existem alguns estudos81 sobre o papel desempenhado pelas autoridades ditas “tradicionais” e a relação quer com o Estado colonial, quer com o Estado inde-pendente e as intermitências entre este último e a rebelião armada da UNITA no controlo e ocupação de certas regiões. O centro dos estudos tem sido o planal-to central, provavelmente, com o argumento vigorante segundo o qual o grupo etno-linguístico Ovimbundu é dos mais importantes e a sua estrutura de poder político-administrativo mantém-se razoavelmente intacta apesar das transforma-ções ocorridas no último século.

Num estudo mais recente e que envolve a cintura agrícola de Angola, segun-do Fernando Pacheco, após o volte-face entre autoridades tradicionais e o Estado

79 “Sede” ou “capital” em português, em referência ao centro do poder político. Esta designação tanto é empregue em zonas sociolinguísticas predominantes pelo Kikongo como também em zonas dominadas pela língua Kimbundu. A designação é usada nas duas línguas e respectivos dialectos, que resultam da fusão entre ambas. Por exemplo, nas regedorias do Cangundo e Quituia existem duas variantes usadas pela população como resultado da fusão entre as línguas Kikongo e Kimbundu, para além da sua proxi-midade lexical e morfológica.

80 Existe uma divergência de informação administrativa entre o número dos regedores (ou Soba Grande) e o número actual das regedorias repartidas pelas três comunas do município do Negage.

81 Fernando Pacheco, “Rural communities in Huambo” in Paul Robson (org.), Communi-ties and reconstruction in Angola – the prospects for reconstruction in Angola from the community perspective, Canada: Development Workshop, 2001, pp. 54-117. Fernando Florêncio, “No reino da toupeira, autoridades tradicionais do M’balundu e o Estado angolano” in Vozes do universo rural – reescrevendo o Estado em África, Lisboa: Ges-press, 2010, pp. 80-175.

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colonial “a lógica da divisão político-administrativa do Estado colonial acabou por se impor e o poder das chefias ‘tradicionais’ foi perdendo importância, de for-ma progressiva, no condicionamento da vida económica e social dos respectivos povos. Para isso contribuíram vários factores, desde a acção de agentes externos já referidos (Estado colonial, Estado independente, Igrejas, ONG), mas também a perda de importância da caça (diminuição das terras comunitárias, proibição do uso de armas de fogo artesanais), a evolução dos sistemas de propriedade ou de uso de terra, o aparecimento de pessoas letradas a nível das comunidades (profes-sores, pastores, enfermeiros e catequistas)”82.

Ainda segundo esse autor, com a reforma que se seguiu da luta armada, Portu-gal incorporou legislativamente através do Decreto N.o 43897, de 6 de Setembro de 1961, o poder tradicional na estrutura organizativa do próprio Estado, trans-formando as regedorias em “unidades administrativas chefiadas por um regedor nomeado pelo governador (de distrito ou de província) ouvindo às populações, e assessorado por um conselho de sua escolha no exercício das suas funções”83.

As regedorias surgem, pois, como resultado da dupla lógica legalista e cultural. A primeira baseava-se no facto de que a sua delimitação deveria seguir procedimen-tos dos usos e costumes, bem como das tradições, das práticas locais, não obstante ser alvo de imposição de regras de cima para baixo. Ao passo que a segunda assenta na delimitação geográfica ou nos limites das zonas de residências das populações.

Do ponto de vista hierárquico, as autoridades tradicionais estão estrutura-das por regedor (ou soba grande), pelo soba e sekulu. Segundo ainda Fernando Pacheco, “estas designações têm sido contestadas pelo facto de se impor na ter-minologia oficial vocábulos de regiões sócio-culturais específicas. Por outro lado, os regedores (sobas grandes) contestam a generalização da terminologia ‘autori-dades tradicionais’ na medida em que isso não deixa transparecer a existência de níveis hierárquicos, ‘nivelando-se o que não se deve nivelar’, pois um soba grande não pode fazer parte da mesma reunião que um simples sekulu”84.

No caso vertente das seis Mbanza do Negage pode-se constatar certa horizon-talidade ao nível das autoridades, não obstante ser o regedor que aparece como principal representante hierárquico, não existindo no caso das seis comunidades a figura de soba grande, como acontece nas regiões do planalto central de Angola.

82 Fernando Pacheco, Autoridades tradicionais e estruturas locais de poder em Angola: aspectos essenciais a ter em conta na futura administrativa autárquica, Luanda: Funda-ção Friedrich Ebert/ADRA, 2002, p.3.

83 Id. Ibid., p. 4.

84 Id. Ibid., p. 6.

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Contudo, dado o peso dos sobas e dos sekulus nas comunidades, os assuntos são geralmente tratados no âmbito do conselho local. Tanto o regedor como o soba e os seus respectivos adjuntos e conselheiros fazem parte das reuniões quando o assunto diz respeito a toda a comunidade.

Por isso, embora à primeira vista a palavra caiba ao regedor que responde pelos assuntos políticos e administrativos, não está autorizado a tomar decisões unilateralmente sem ouvir os restantes membros do conselho de mais-velhos da comunidade, onde além de constar o soba e os adjuntos, compõem, sobretudo, as autoridades religiosas representadas nas comunidades. O papel de conselheiros do regedor ou do soba para além dos respectivos adjuntos cabe aos pastores das distintas igrejas ou mais-velhos influentes, geralmente detentores de conhecimen-tos ancestrais ou possuidores de bens materiais. Sobre estas representações reli-giosas trataremos mais adiante num subcapítulo específico.

A regedoria ou sobado atende pela designação, nas línguas locais de Mbanza. É muito frequente ouvir-se dos representantes das comunidades a designação de Mbanza, que se refere à malha em que está circunscrita o poder local. Deste ponto de vista, o poder ancestral encontra-se sob a autoridade dos sobas e sekulus. Estes estão responsabilizados e são chamados a responder pelas cerimónias fúnebres, pela ausência das chuvas para a produção agrícola e pelas festividades ou suces-so da produção agrícola, do nascimento de novo membro da comunidade e dos rituais de passagem, caso ainda haja. Aos sobas e às mulheres mais-velhas estão reservados o tratamento das doenças ou enfermidades que a medicina conven-cional não consegue dar resposta. Os conhecimentos de botânica são frequente-mente exercidos, quer em relação à cura de doenças graves, quer em substituição e ausência de medicamentos nas comunidades. Esse aspecto, em particular, será aflorado mais adiante, no subcapítulo sobre saúde.

Aconteceu que na regedoria do Pumba, por onde se realizou parte da pesquisa de terreno, foi-nos confidenciado que certo dia após a morte do soba da comuni-dade, os mais-velhos – regedor e seus colaboradores mais directos, conselheiros e pastores deslocaram-se para o enterro, só que ao saírem esqueceram-se do cão de guarda do soba dentro da casa, aí onde é igualmente a sede da regedoria. Ines-peradamente foram convocados no cemitério pela população enfurecida, pois na tentativa de sair da residência do soba, o animal foi forçando a porta e deu a enten-der à população que o soba ainda estava vivo. O cenário gerou uma enorme polé-mica, pois o regedor foi acusado de ter simulado a morte do soba. Como forma de se desculpar, da comunidade lhe foi exigido que convocasse o conselho que iria destituí-lo do poder. Este para se salvar da fúria da comunidade rompeu a porta da referida residência e, para seu espanto, o animal saiu aos pulos, dando a perceber que não se tratava do soba.

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Este exemplo serve para ilustrar a horizontalidade que comporta o poder local em algumas das Mbanza do município do Negage. É que apesar do regedor ser o interlocutor directo com o poder do Estado, representado pelo administra-dor municipal, comunal, ou mesmo pelo governador, os sobas e sekulus desem-penham um papel crucial ao nível da hierarquia do poder local, pois podemos constatar que, em grande parte, os regedores eram relativamente mais-novos que os sobas e sekulus. À medida que os sobas e sekulus se vão tornando mais-velhos e sem forças físicas, há a necessidade de ter um regedor mais-novo e com maior força para se encarregar de estabelecer a comunicação com a admi-nistração, e percorrer longas distâncias que acabam por ser, muitas das vezes, o principal obstáculo entre os poderes – do Estado e local. Os sobas e, princi-palmente, os sekulus são os guardiões da tradição, como os conhecimentos do cultivo, domínio do tratamento das doenças graves e a arte de adivinhação ou religiosa.

Sobre esse assunto, foi-nos confidenciado que no período em que a guerra civil atingiu o município do Negage, especificamente a regedoria do Cangulo, que se situa a escassos quilómetros do centro da cidade, ao ser invadida por homens armados que se suponha pertencerem às forças da UNITA, o soba e o sekulu da regedoria, empoderados pelo poder ancestral, conseguiram tornar invisível a loca-lidade aos olhos dos invasores. Ou seja, os indivíduos das forças da UNITA ao apro-ximarem-se viam as aldeias de longe, mas postos no local apenas encontravam matas desérticas, enquanto isso a população permanecia nas suas casas. Cansados da invisibilidade, os invasores retiraram-se incrédulos e admirados. Outros julga-vam-se enfeitiçados e juravam nunca mais voltar àquela localidade.

Pode-se constatar igualmente que existe uma subordinação política muito for-te entre os regedores e a administração, pois é desta que os regedores dependem administrativamente apesar de fazerem parte do conselho de auscultação e serem muitas vezes chamados a dar pareceres no âmbito dos programas municipais, como a saúde, a habitação, a educação e a mobilização das populações.

Dado o poder que muitos regedores e sobas têm nas suas comunidades, são muitas vezes cooptados para estruturas partidárias, com maior relevância para o partido do governo. Podendo assim pressupor uma maior articulação entre ambos os poderes, quando muito essa convivência pode influenciar as escolhas dos res-ponsáveis nas localidades. Quanto maior for a capacidade de resposta, dados os interesses da estrutura partidária, a proximidade a esta, maior é o nível de inter-venção da governação na localidade. Ou seja, a resolução de muitos problemas locais passa, fundamentalmente, pela habilidade do regedor junto das estruturas partidárias e administrativas.

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O mecanismo de benesses e farda concedido aos sobas ou autoridades locais pelo sistema colonial, recuperado pelo Estado independente sob a forma de sub-sídio – o equivalente a salário mensal – é muitas das vezes a moeda de troca que influencia o relacionamento entre ambos os poderes, tornando os sobas dóceis e mais facilmente subordinados. Estes, muitas vezes, respondem a isso com a estratégia de criação de “sobas aparentes”. São figuras normalmente decorativas que visam proteger os verdadeiros sobas em face dos contextos de crise, como as várias fases da guerra em Angola que implicou o alinhamento destas autoridades com os dois beligerantes, governo e UNITA. Tal estratégia vem demonstrar que as autoridades tradicionais não são entidades passivas, e põe em causa o argumento segundo o qual elas são frequentemente manipuladas pelo Estado para atender a certos interesses. Se é verdade que alguns indivíduos pertencentes às autoridades locais deixam-se enredar pelos subsídios e benefícios materiais concedidos pelo Estado, não é menos verdade que estas e as suas comunidades têm estratégias e interesses próprios que às vezes entram em rota de colisão com os manifestados pelo Estado.

A visão do Estado sobre as autoridades tradicionais é bastante ambígua, talvez por isso haja abertura para várias interpretações, pois o Estado na legislação reco-nhece o seu papel, mas mantém algumas reservas e limitações de carácter legal, e as autoridades assumem-se geralmente como parceiros do Estado e de outros organismos com quem se relacionam. Ou seja, as “relações entre o Estado e o poder tradicional processam-se numa base impositiva, como se se tratasse de um escalão inferior do poder do Estado. Esta é uma realidade tangível, mesmo que o discurso oficial tente ser, por vezes, diferente”85.

Quanto à sua composição demográfica, Negage apresenta, como o resto da província, uma população em crescimento, maioritariamente feminina e jovem, entre os 18 e os 49 anos de idade, como se pode observar nas tabelas seguintes.

POPULAÇÃO DO MUNICÍPIO DO NEGAGE POR GÉNERO – 2012

Masculino Feminino Total

64.345 81.772 146.117

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

85 Id. Ibid., p. 11.

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POPULAÇÃO DO MUNICÍPIO DO NEGAGE POR GÉNERO E GRUPOS ETÁRIOS – 2012

Grupos Masculino Feminino Total

Crianças – 0 a 5 12.872 14.662 27.534

Crianças – 6 a 11 18.454 23.564 42.018

Adolescentes – 12 a 17 5654 8256 13.910

Adultos – 18 a 49 19.936 25.487 45.423

Adultos – 50 a 64 5216 6731 11.947

Adultos – 65 ou + 2215 3070 5285

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

O movimento migratório que se passou a verificar com o fim da guerra civil, a produção agrícola e a segurança na região foram alguns dos factores que vêm determinando o crescimento da população local, embora se constate a existên-cia de elevado número de jovens que abandonaram os espaços rurais, nomeada-mente representados pelas comunas do Quisseque e da Dimuca, e procuraram concentrar-se nos centros urbanos, quer do município (comuna sede do Nega-ge), quer da província (município sede do Uíge), em busca de melhores condi-ções de vida.

Apesar de não haver dados disponíveis sobre a distribuição territorial da popu-lação no município do Negage em particular, é possível constatar no terreno que esse êxodo rural tende a crescer. Como conta Muana Damba, esse facto “provoca um ainda maior despovoamento das áreas rurais e interiores, aumentando a pres-são demográfica e urbanística sobre os grandes centros urbanos, e originando pro-cessos de desequilíbrio territorial que devem ser prevenidos e corrigidos, já que, a médio e longo prazo, esta tendência será uma ameaça à sustentabilidade terri-torial das grandes cidades, nomeadamente o Uíge, cujos níveis de acessibilidade melhoraram consideravelmente nos últimos tempos, deixando de funcionar como elemento dissuasor dos fenómenos de pressão urbana periférica, como se verifi-cava até aqui”86.

Mais adiante, poder-se-á notar como essa realidade está intrinsecamente liga-da a factores de ordem social, sobretudo a inexistência de infra-estruturas sociais básicas nas áreas rurais do município em detrimento da sua sede, onde se tende a concentrar os investimentos públicos.

86 Muana Damba, “Breve historial do Município do Negage”. Disponível em: http://www.muanadamba.net/article-breve-historial-do-municipio-do-negage-120058022.html. Acessado em: Dezembro de 2013.

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8.3.1 Comuna do Quisseque

A regedoria ou Mbanza do Quisseque dista cerca de 18 km da sede munici-pal (cidade de Negage) e a 1 km da sede comunal. É resultado da fusão de qua-tro aldeias situadas num raio de 1,5 km. No passado a comuna do Quisseque foi considerada como o celeiro da produção agrícola do município de Negage. Passa-dos mais de 20 anos, segundo as autoridades locais, o Quisseque continua com uma produção notável se comparado a outras regiões da província, embora registe algumas limitações que tornam difícil a produção com excedente. A regedoria é constituída por quatro Sobados (Quisseque, Cabula, Howassa, Canzundo), sendo a aldeia do Canzundo a que se encontra mais distante da aldeia mãe ou principal (a cerca de 4 km). A população total actual é de 8750 habitantes.

A estrutura do poder tradicional é composta por um regedor e seu adjunto, quatro sobas e correspondente número de sobas adjuntos e nalguns casos com-posta também de sekulus. Quer o regedor, quer os sobas, têm, no exercício das suas funções, o seu séquito composto geralmente por um secretário e conselhei-ros (anciões da aldeia). Esta estrutura responde cada uma ao seu nível, quer por assuntos meramente tradicionais, quer por assuntos administrativos do governo.

A estrada que liga a comunidade da sede do Negage em terra batida e estabe-lece a mesma ligação com a localidade do Quisseque.

Há um fenómeno migratório da camada jovem, principalmente masculina, para as cidades à procura de emprego e de melhores condições de vida, embora em alguns casos se registem roubos frequentes de bens da população por parte desses mesmos jovens internos e externos, sendo os animais de criação as escolhas mais constantes. No entanto, a percepção que se tem é de que a população da aldeia é maioritariamente nova, o que se reflecte até certo ponto na mão-de-obra activa para a produção agrícola.

Existe uma associação de camponeses nas quatro aldeias, não obstante os visados dizerem estar à espera da legalização. A verdade é que estas associações são ainda nominais e fortemente dependentes de agentes externos. Em 2012, poucos, dentre os camponeses, beneficiaram de apoio da EDA, e de uma tentativa de micro-crédito mal sucedida. As principais dificuldades são as vias de acesso e transportação para o escoamento dos produtos agrícolas. No ano passado a localidade do Quisseque che-gou a vender toneladas de banana em algumas localidades da província de Malanje, bem como o frequente abastecimento do mercado municipal do Negage.

Dentre os factores de produção referidos na ficha de entrevista, notou-se tam-bém a escassez de pesticidas para fazer face às pragas e doenças dominantes, prin-cipalmente para a broca da mandioca e as doenças típicas do café.

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As autoridades locais referiram-se à não existência de posto de saúde, pois o posto foi colocado na sede comunal que dista a 1 km da aldeia principal. Foi referi-do igualmente pelos participantes que o nível de abastecimento de medicamentos é bastante irregular.

Esta localidade possui quatro escolas do 1. e 2.o Ciclos, sendo uma para cada aldeia e outra situa-se na sede comunal, em mau estado de conservação. Grosso modo, as escolas leccionam até à 6.a classe, embora haja carência de professores.

Quisseque carece do fornecimento de água potável, embora exista um projec-to para a construção de fontes. Existe um impasse entre a comunidade e a empre-sa encarregue da obra. O empreiteiro pretende colocar a fonte de água em local impróprio segundo as autoridades locais. O acesso à energia eléctrica é outro dos problemas registados, embora a linha de transportação de alta tensão passe pela localidade.

Do ponto de vista da motivação das pessoas, o nível de participação, receptivi-dade, foi bastante satisfatório e houve certa abertura na abordagem das questões mais delicadas.

Em geral, a percepção que se teve, para além dos aspectos específicos acima salientados, é de que as comunidades rurais situadas na periferia dos centros urba-nos, como esta tendem a ter grande influência das dinâmicas urbanas e têm maio-res oportunidades de benefícios das acções do governo local, em relação às mais isoladas. Um estudo mais aprofundado permitirá confirmar noutras comunidades das trinta e oito existentes.

8.3.2 Comuna do Dimuca

A regedoria ou a Mbanza do Vunge situa-se a 12 km da sede do Dimuca a que pertence e a 25 km da sede municipal no sentido Este. Trata-se de uma das aldeias dentre outras que se situam ao longo da via que liga a sede do município com a comuna do Dimuca. É constituída por apenas um sobado, com uma população total de 1503 habitantes.

A estrutura do poder tradicional é composta por um regedor e seu adjunto (no topo da pirâmide), um soba e seu adjunto, e um sekulu, para além dos con-selheiros (anciões da aldeia). Em geral, o regedor responde quer por assuntos meramente tradicionais, quer por assuntos administrativos do governo. O soba e o sekulu aparentemente funcionam mais como figuras decorativas para preencher a estrutura do poder tradicional na sua hierarquia. Na ausência do regedor, o soba em coordenação com o regedor adjunto resolvem os problemas e representam o poder na regedoria.

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As localidades do Vunge tal como a comuna do Dimuca ficam a uma distân-cia considerável da sede municipal, facto que tem limitado, em certa medida, o seu rápido desenvolvimento local. Os representantes locais apontam como princi-pais problemas o fornecimento da água, apesar das fontes que ficam próximas da aldeia, o acesso à energia elétrica e a escassez da produção agrícola. Neste parti-cular, pode-se constatar que a densidade populacional está maioritariamente aci-ma dos 30 anos, o que pode estar na base da pouca produção alimentar e para o comércio. Apesar disso, há produção mais limitada à alimentação e ao comércio, que também é outro problema, pois o mercado fica muito distante daí e as vias de acesso são de difícil transição. A mobilidade é feita por meio de viaturas ligeiras e motorizadas que transportam quase tudo, desde produtos alimentares a electro-domésticos. Constata-se a existência de obras de terraplanagem sobre a via devido à fazenda que se estende nos limites da localidade e é a única área para a transição rodoviária.

A regedoria do Vunge possui duas escolas do 1.o Ciclo, sendo uma em constru-ção definitiva (três salas de aulas, um sanitário para professores e alunos e o anexo que alberga a direcção com apenas dois gabinetes) e a outra de abobes (com ape-nas duas salas de aulas) construída pelos missionários jesuítas que por ali passa-ram, nos anos 1960. Esta escola ainda resistiu até ao surgimento da mais recente, altura em que foi desactivada pela repartição municipal da educação após inaugu-ração da outra.

Verifica-se, porém, a ausência de um posto de saúde na localidade do Vunge, o que tem obrigado a população a deslocar-se para o hospital municipal ou a recor-rer à medicina tradicional.

8.4 Caracterização política e social

A situação social e económica no município do Negage manifesta preocupação tal como se pode observar junto das localidades que foram alvo do estudo, auxilia-da pelas tabelas da administração e outras elaboradas a partir dos dados recolhi-dos localmente. Esta é de tal ordem que ultrapassa a simples observação directa, pois implica um olhar mais aprofundado sobre os problemas que são transversais às próprias necessidades do país de uma forma mais geral. Porém, olhando para as comunidades rurais e o centro da cidade, Negage está distante do benefício social que se regista em outras partes do país. O funcionamento da administração do Estado vive de inúmeras limitações, pois a rede de serviços sociais é bastante limi-tada, outras vezes não funcional. Apesar disso, verifica-se um comércio formal em lojas de conveniência, posto de combustível e comércio informal, razoavelmente instalado que contribui para mascarar as principais carências aí existentes.

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A vida social funciona em torno do sector económico com a presença de algu-mas repartições bancárias (ver tabelas do comércio), numa cidade cujas vias princi-pais, secundárias e terciárias carecem de recuperação, e onde o comércio informal nos mercados de proximidade dominam as atenções da população local entre o centro da cidade e o meio rural, e dos visitantes que por lá se deslocam.

Os sectores sociais como os da educação e da saúde são os maiores desafios que o município enfrenta perante uma população quase envelhecida, pelo menos no nível das comunidades visitadas. Sobre os sectores da educação e da saúde, abordaremos em seguida.

Ao nível meramente económico, apesar das potencialidades e de certa pro-dução que ainda serve para alimentação e comércio na cidade e nas zonas rurais, Negage vive actualmente da nostalgia dos tempos áureos do café, de que cuja cidade foi seu produto directo.

Quanto ao aspecto político, segundo os representantes das comunidades, há um perfil que é dominado pelo partido do governo, que exerce bastante influência nas localidades cuja mobilização se verificou in loco. Pode-se constatar à vista desarmada a existência de bandeiras do MPLA, lado a lado, com as da República. Houve casos em que se poderia observar a existência, em partes opostas, das bandeiras do MPLA e da UNITA ou em pontos diferentes, mas visíveis logo à entrada. Para muitos destes mais-velhos é o partido do governo que maior expressão exerce nas comunidades, havendo esporadicamente actividades bastante precárias da UNITA, e uma ausência flagrante de outros partidos como a FNLA que, em alguns casos, é apenas nominal.

Em raras excepções, verificava-se a existência da bandeira do MPLA e, parado-xalmente, nota-se a ausência da bandeira da República, o que imediatamente faz conjurar que a primeira fosse significar a substituição da segunda. Outras vezes, alguns regedores ou sobas apresentavam-se trajados com as camisolas do MPLA, talvez como sinal de alinhamento político ou como se quisessem passar determi-nada mensagem ao grupo. Pois, apesar dos constantes esclarecimentos, a equipa foi muitas vezes tomada como representante da administração do Estado, saída de Luanda, com vista a resolver os seus problemas sociais.

8.5 Igrejas

Importa referir que no município do Negage se regista a presença de várias denominações religiosas, tais como a Igreja Católica cujo antigo edifício se situa no centro da cidade em paralelo às instalações da administração, ao passo que as restantes protestantes estão disseminadas pelas artérias da cidade, sobretudo em zonas periféricas.

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Nas comunidades, ao contrário do centro, regista-se a predominância das igre-jas protestantes, das quais a IERA (Igreja Evangélica Reformada de Angola) e a Igreja Baptista são dominantes, seguindo-se as Igrejas do Bom Deus, Adventista, Tocoista e com expressão limitada das Igrejas Católica, Anglicana e Metodista.

As igrejas protestantes do Negage estão representadas no CICA (Conselho das Igrejas Cristãs de Angola), sendo os pastores da IERA e da Igreja Anglicana os seus representantes locais.

Em grande parte regista-se a presença dos templos da IERA, alguns em bom estado de conservação, outros nem tanto, havendo também uma flagrante carên-cia de espaços para o culto das pessoas que professam outras religiões. Nas seis localidades não há nenhum templo católico, o único são ruínas de um templo anti-go situado na regedoria do Cangulo.

Dado o papel que a IERA vem desenvolvendo na região, trabalhando lado a lado com as administrações e parceiros externos nos projectos de monitoria social, esta leva vantagem sobre as outras. A sua influência está enraizada nas comuni-dades rurais e observa-se a autoridade que muitos pastores representantes desta igreja exercem sobre as populações locais.

Contudo, a convivência entre elas, pelo menos ao nível local, parece harmonio-sa, dado o facto de estarem representadas nos diversos conselhos comunitários.

IGREJAS CRISTÃS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

IERA BAPTISTA CATÓLICA METODISTA BOM DEUS ADVENTISTA TOCOISTA ANGLICANA

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

8.6 Educação

O sector da educação, segundo o responsável da repartição, está em perma-nente crescimento. O paradoxo é que este franco crescimento visto atentamente resume-se apenas no número de ingressos das crianças no sistema de ensino entre o 1.o e o 2.o Ciclos. Apesar do optimismo do nosso interlocutor quanto à melhoria das condições futuramente, a verdade é que se constata a degradação do próprio edifício que alberga a Repartição Municipal da Educação. Visivelmente uma insta-lação antiga, as escolas de proximidade estão igualmente a necessitar de reabili-tação pelo facto do município do Negage receber anualmente imensa chuva. Este factor, do nosso ponto de vista, contribuiu em grande medida para o desabamento das obras mal feitas.

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NÚMERO DE ESCOLAS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Nível de ensino Escolas Estado

Primário 54

1.o Ciclo 6 Regular

2.o Ciclo 2 Degradado

2 Regular

Total 64

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

A educação nas seis comunidades acentua este paradoxo que nos referimos acima, na medida em que nas regedorias que se situam mais próximas do cen-tro da cidade, as suas instalações escolares do 1.o Ciclo estão mais bem equipa-das com o fornecimento do material escolar e beneficiam esporadicamente da merenda escolar. Ao passo que as regedorias que se situam mais distantes do centro, maiores dificuldades enfrentam, chegando a merenda escolar a ser uma forma de manter as crianças na escola, devido ao facto da dieta alimentar ser escassa ou não variável em muitas famílias. Tal fornecimento da merenda escolar verificou-se no ano de 2011 em quase todas as escolas do 1.o Ciclo das trinta e oito regedorias.

Por exemplo, as escolas do Vunge e Pumba, que se situam fora da cidade, apresentam menores condições de trabalho. Ora o problema são as obras com o empreiteiro que não honra os compromissos, ora é do equipamento como as carteiras ou da insuficiência de professores e material escolar (apenas os manuais porque os cadernos são adquiridos nos mercados).

Há, porém, o problema das desistências ou abandono escolar, motivado pela prática da agricultura no horário das aulas, com excepção do Cangundo, pela indisciplina por parte dos rapazes, e pela gravidez precoce que tem afectado as jovens raparigas, sobretudo nas regedorias do Quisseque, Cangulo e Pumba, onde o índice de matriculados relativo às raparigas é inferior ao dos rapazes. Muitas dessas jovens acabaram criando as crianças sozinhas ou com a ajuda dos pais, pois os parceiros frequentemente as abandonam quando tomam conhecimento da gravidez.

Para além da inspecção carecer de meios de transporte para o exercício de fis-calização, sobretudo devido às distâncias que separam o centro e as regedorias, estas comunidades vivem o drama da ausência de escolas do 2.o Ciclo ensino meio--profissional. Como mencionado acima, a maior parte das quais são do 1.o Ciclo cujas classes vão da 1.a à 6a, ao passo que a 9.a classe e as restantes do 2.o Ciclo, maioritariamente é feita fora das localidades, enfrentando novamente o desafio

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de percorrer longas distâncias a pé ou pagando pelo transporte de passageiros ao preço de 100 Kwanzas por pessoa.

NÚMERO DE ALUNOS MATRICULADOS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Nível de ensino Estudantes

Iniciação 5168

Primário 6360

1.o Ciclo 5692

2.o Ciclo 3321

Total 40.541

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

Contudo, o responsável pela repartição da educação manifestou satisfação pelo facto de o sector ter registado algumas melhorias, tais como a bancarização dos salários dos professores, a contratação de mais profissionais formados no ISCED (Instituto Superior de Educação) do Uíge, para integrarem o sector administrativo do qual ele próprio faz parte deste grupo.

De qualquer modo, corroborou o cepticismo dos professores e dos profissio-nais e encarregados de educação das seis comunidades quanto à reforma educati-va no que concerne ao 1.o Ciclo. Para este professor e os responsáveis da educação, o principal constrangimento do sector prende-se com a monodocência que sub-carrega os docentes e tem afectado cerca de 30% do ensino, pois retirou-se dos conteúdos programáticos: o alfabeto e a tabuada, e a ausência desses dois impor-tantes instrumentos tem criado enormes dificuldades na aprendizagem da Língua Portuguesa e da Matemática, disciplinas chaves para o exercício da profissão e do sucesso escolar das crianças.

NÚMERO DE PROFESSORES NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Nível de ensino Professores Professores em falta

Primário 767 14

1.o Ciclo 356 1

2.o Ciclo 109 1

Total 1232 16

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

No caso em particular da comuna do Quisseque, o sector da educação apesar de registar um número considerável de professores para as duas escolas, apresen-ta algumas caraterísticas salientes que podem reflectir a realidade em outras loca-lidades no município em estudo.

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De facto, o quadro docente do Quisseque é composto por 55 indivíduos, a maior parte dos quais se encontra na faixa etária acima dos 40 anos de idade. Em média quase metade desses docentes exerce esta profissão há mais de 30 anos, sendo que três deles têm 35 anos de serviço e ocupam cargos de director ou adjun-to do director. O professor mais-velho tem 60 anos de idade e 35 anos de serviço, ocupando a posição de director com a 9.a classe como nível de escolaridade. Ao passo que o docente mais-novo é uma senhora de 21 anos de idade, 2 anos de ser-viço e a 12.a classe como nível de escolaridade.

Com efeito, o nível de escolaridade dos docentes do Quisseque varia da 4.a ao 3o ano do ISCED, sendo que maior parte dos que possui mais tempo de serviço têm entre a 4.a e a 9.a, e os que menos tempo de serviço possuem situam-se entre o 12.o e o 3.o ano do ensino superior para professores.

Em suma, dos 55 docentes do Quisseque, 50 são homens e somente 5 mulhe-res integram o sector da educação da comuna. Das cinco senhoras, a mais-velha tem 53 anos de idade e 30 anos de serviço, ao passo que a segunda tem 43 anos de idade e 26 anos de serviço, possui a 9.a classe e é professora do 2.o escalão. As duas mais-novas, uma tem 25 anos de idade, 2 anos de serviço e frequenta o 3.o ano do Instituto Superior de Educação do Uíge, e o 6.o escalão do ensino. A segun-da mais-nova tem 21 anos de idade, 2 anos de serviço e está igualmente no 6.o escalão de ensino.

8.7 Saúde

A situação do sector da saúde no município do Negage não obstante se consta-tar algum investimento público acusa preocupação em larga escala a começar pelo próprio hospital municipal cujas instalações foram construídas no período colo-nial. Actualmente o edifício reclama por recuperação das instalações desde a fai-xa principal até à zona que lhe dá acesso. Geralmente é para o hospital municipal onde os habitantes ocorrem para verem as suas preocupações de saúde tratadas. Contudo, a rede de saúde, ao nível das comunas pesquisadas, manifesta melhores condições em instalações, abastecimento permanente em medicamentos e uma maior cobertura em pessoal técnico. Nas seis regedorias pesquisadas, as preocu-pações com a saúde dominaram as conversas que mantivemos, quer com o grupo de representantes das comunidades, quer com o das mulheres que são o segmen-to da população que mais recorre aos postos médicos, e quando não encontram aí tratamento, são imediatamente transferidos para o hospital principal, ou para a capital da província, usando os seus próprios meios de transporte ou pagando para o efeito.

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INFRA-ESTRUTURAS E EQUIPAMENTOS DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Tipo de infra-estruturaComunas

TotalNegage (sede) Quisseque Dimuca

Hospital municipal 1 - - 1

Centro ortopédico 1 - - 1

Centro de tratamento da doença do sono 1 - - 1

Centros de saúde 9 2 1 12

Postos de saúde 7 2 2 11

Total 19 4 3 26

As principais insuficiências constatadas prendem-se, em grande medida, com as instalações limitadas para um número crescente de habitantes, além do abas-tecimento precário em medicamentos, facto que tem obrigado a maior interven-ção das parteiras locais. Paralelamente a isso, constata-se igualmente um défice do pessoal técnico médico e de enfermagem, sendo que poucos são aqueles que aceitam trabalhar nas localidades distantes do centro da cidade, devido, em parte, ao estado precário das vias de acesso.

Curiosamente em nenhuma comunidade, segundo os representantes, existe um médico. Apenas enfermeiros e auxiliares de enfermagem trabalham nas comu-nidades, a exemplo da Regedoria do Vunge. A maioria dos enfermeiros que pres-tam serviços de saúde e assistência às comunidades são moradores locais, com idades acima dos 35 anos.

Recentemente, com a cooperação estabelecida com Cuba, verifica-se a presen-ça de médicos e técnicos superiores de saúde cubanos em serviço no município, sobretudo nas áreas de especialidade, onde é maior a carência em técnicos nacio-nais, sendo o número de médicos e técnicos de saúde cubanos superior ao dos quadros nacionais.

Como se poderá verificar na tabela que se segue, o hospital municipal apresen-ta um quadro de pessoal que varia entre os técnicos de especialidade, médicos e funcionários administrativos num total de 245 pessoas. Dentre este número temos a referir que constam dez médicos, sendo que sete são de origem cubana, um coreano, um vietnamita e apenas um médico nacional. O mesmo acontece com os técnicos superiores de enfermagem, sendo cinco cubanos e quatro nacionais. Dos licenciados, apenas um nacional preenche este quadro. Como mencionado, além do pessoal administrativo em cerca de oitenta e duas pessoas, o pessoal técnico superior é maioritariamente de expatriados.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

PESSOAL TÉCNICO E ADMINISTRATIVO DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Médico TDT87 ENS88 TSE89 Licenciado Total

82 10 15 128 9 1 245

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.878889

Para além deste pessoal técnico-administrativo dos serviços de saúde do muni-cípio, há também terapeutas e parteiras tradicionais90 que não fazendo parte do quadro técnico médico-sanitário, prestam assistência nas comunidades. As partei-ras tradicionais, em alguns casos, são integradas nas unidades sanitárias para pres-tarem os seus serviços, mas contratadas como empregadas de limpeza. O controlo destes terapeutas e parteiras tradicionais é feito pela Associação dos Terapeutas Tradicionais que regista 29 terapeutas, 243 parteiras, das quais 85 contratadas, e 78 agentes comunitários, dos quais 28 oficiais, denominados “promotores de saú-de”, como se pode verificar na tabela abaixo.

TERAPEUTAS TRADICIONAIS E AGENTES COMUNITÁRIOS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Terapeutas locais Parteiras locais Contratadas Agentes comunitários

29 243 85 78

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

As três tabelas que se seguem referem-se às campanhas de vacinação levadas a cabo pelas Unidades Sanitárias do Sector da Saúde do Negage, bem como ao Pro-grama Municipal de Reabilitação Física.

PROGRAMA DE VACINAÇÃO NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Vacina N.o de pessoas vacinadas Campanhas

Sarampo 10.041 Nacional

Febre-amarela 5041 Nacional

Poliomielite 203.854 + 58.449

Tétano 14.366 Nacional

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

87 Técnico de Diagnóstico Terapêutico.

88 Técnico de Diagnóstico Terapêutico.

89 Técnico Superior de Enfermagem.

90 Durante os trabalhos houve por parte dos representantes das comunidades certas

parteiras tradicionais. Foi um assunto tratado com alguma cautela e receio implícito dada a sua natureza e as possíveis associações com práticas de feitiçaria.

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DIAGNÓSTICO DA DOENÇA DO SONO NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

N.o de casos Homens Mulheres

4764 1592 3172

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

PROGRAMA DE REABILITAÇÃO FÍSICA NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Utentes Homens Mulheres Crianças

1499 709 222 568

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

No Negage, o VIH tem níveis de transmissão tidos como preocupantes, regis-tando uma seroprevalência de cerca de 2,26% dos casos testados. O município conta apenas com um Centro de Aconselhamento e Testagem Voluntária (CATV), localizado na sede e onde são realizados todos os testes de VIH/SIDA. Em 2012, foram atendidos aí 2491 pacientes, dos quais 2436 passaram pelo processo de aco-lhimento. Dos pacientes atendidos, 55 casos foram diagnosticados como positivos, dos quais 8 homens e 47 mulheres (destas, 7 grávidas).

TRANSMISSÃO DE VIH NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Casos AcolhimentoMulheres

HomensNão Grávidas Grávidas

2491 2436 55 47 7 8

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

O responsável da saúde afirmou que, comparativamente às mulheres, os homens são mais renitentes ao teste de VIH, principalmente por razões de estig-ma. Por isto, o ATV (aconselhamento e testagem voluntária) passou a ser feito nas consultas pré-natal, onde alguns parceiros aparecem como acompanhantes das gestantes.

Para além das acções de aconselhamento realizadas no CATV e durante as con-sultas pré-natal, há esporadicamente campanhas de prevenção e distribuição de preservativos, no âmbito das deslocações feitas pelas equipas e técnicos de saúde locais. O município do Negage possui igualmente uma clínica móvel que devido a uma avaria se encontra desactivada.

A aplicação do Programa Municipalizado dos Serviços de Saúde teve como efeito imediato a descentralização, passando do nível provincial para o munici-pal. A nível do município, a gestão das verbas para estes serviços encontra-se

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

centralizada pelo Administrador(a), pois os valores vêm no pacote do PMIDRCP – Programa Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza. É a administração que define e disponibiliza as verbas para a aquisição de medi-camentos e consumíveis. Neste processo, nem sempre as quantidades compradas satisfazem as necessidades das unidades sanitárias do município, quer em termos de cobertura, quer em termos da oferta para os diferentes utentes. “Já assistimos à compra de medicamentos no valor de 8 milhões de Kwanzas, que, em termos de quantidade, só cabiam na carroçaria de uma Hilux Cabine dupla. O que vamos fazer?”91.

Esse excerto é do responsável para a saúde, e evidencia a razão de fundo para irregularidades no abastecimento de medicamentos e consumíveis às Unidades Sanitárias do Município.

Justificando a ausência de técnicos de saúde nas comunidades, o Chefe de Repartição de Saúde revelou que periodicamente deslocam-se equipas médicas para as diferentes Unidades Sanitárias, compostas pelos médicos e responsáveis desses Programas dos Serviços de Saúde, quer para realizar consultas médicas, quer para avaliar o desenvolvimento e aplicação dos respectivos programas da sua área de actuação. Todavia, não foi estipulado nenhum calendário fixo para cada unidade, dependendo da disponibilidade de transporte.

8.8 Agricultura e pecuária

Embora baseada na agricultura, actualmente é visível a diversificação das fon-tes de rendimento, dada a vulnerabilidade da economia baseada simplesmen-te na produção agrícola. As actividades complementares passam a ter também um papel preponderante na economia local, com realce para o facto de que há pouco estímulo para uma produção agrícola voltada para o mercado, não só pela desestruturação das redes comerciais, mas também pelas rupturas das diferentes cadeias de valor dos principais produtos económicos, como é o caso do café, que em termos de importância económica para os camponeses passou da primeira posição para a terceira ou quarta, em relação à banana, ao feijão e ao amendoim (ginguba).

91 Responsável para o sector da saúde do Negage.

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PRODUÇÃO E RENDIMENTOS POR HECTARE NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Cultura Produção/Hectare Produção/Tonelada

Mandioca 7086 10,0 70.860,00

Amendoim 2126 0,3 637,80

Milho 229 0,2 45,80

Feijão 2667 0,3 800,20

Feijão macunde 167 0,3 50,00

Batata-doce 709 0,4 283,60

Batata rena 263 4,0 1132,00

Banana 567 10,0 5670,00

Abacaxis 283 10,0 2830,00

500 0,6 300,00

Total 14.617 36,1 82.609,40

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

Nesse segmento produtivo, constata-se que as trocas comerciais baseadas em espécies são quase nulas ao nível das redes de comércio formal, implicando por isso que os camponeses tenham necessariamente de vender os seus produtos a dinheiro para a obtenção de outros de primeira necessidade, o que influencia sobremaneira o seu poder de compra. Expressões como, “o dinheiro não aparece”, comuns no seio das comunidades, são disso ilustrativas.

Tal como a cadeia produtiva, foi igualmente difícil perceber quais são os crité-rios usados para se considerar uma família rica ou pobre. Observou-se, porém, a existência de posições antagónicas: umas baseadas em aspectos físico-materiais, como as condições habitacionais (das moradias) no acesso aos meios de transpor-te, como motorizadas, etc., e outras baseadas em aspectos sociais e organizacio-nais, como status social, o nível de escolaridade, dentre outras. Procurou-se um aprofundamento desses critérios, comparando a outras comunidades.

O sector agrário do Negage possui uma instituição de ensino médio para a for-mação dos profissionais da área, que tem permitido apoiar actividades produtivas e dotar a administração de conhecimento do terreno para integrá-los nos seus pla-nos e orientação. O potencial alvo deste apoio são as cooperativas de camponeses do município, que são maioritariamente constituídas por mulheres, como ilustra a tabela seguinte.

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RELATÓRIO SOCIAL DE ANGOLA 2013

ASSOCIAÇÕES E COOPERATIVAS DE CAMPONESES NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Comuna N.o Associações CamponesesN.o de Associados

Homens Mulheres Total

Sede 24 3388 3657 7045

Quisseque 8 908 870 1778

Dimuca 18 1503 2027 3530

Total 50 5799 6554 12.353

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

No entanto, como se pôde testemunhar durante a pesquisa de terreno, as comunidades queixam-se da insuficiência da actividade pecuária devido, sobre-tudo, aos roubos dos animais que têm sido alvo. Dizem já ter manifestado inúme-ras vezes tais práticas junto das autoridades, mas de nada tem valido a pena. Os roubos são constantes e têm estado na base, inclusive, de sérios conflitos no seio das comunidades, como ilustra o caso relatado na regedoria do Pumba, situada a 30 km do centro da cidade, onde, logo à chegada, a equipa de pesquisadores foi confrontada com a notícia de um óbito. Não obstante, os representantes das famílias decidiram reunir-se com a equipa, e contaram que um jovem havia posto fim à sua própria vida, amarrando uma corda ao pescoço, após ter sido acusado de fazer parte de um grupo de ladrões de gado, o mesmo grupo apontado por um dos conselheiros e pastor da Igreja Bom Deus como o autor do roubo recente de parte da sua criação, tendo-a transportado numa viatura ligeira de marca Toyo-ta. Em consequência, a família do falecido, enfurecida, procurou responsabilizar o pastor pela morte do rapaz, gerando assim um clima de instabilidade na comu-nidade.

Outro episódio ocorreu de igual modo na regedoria ou Mbanza do Cangundo, zona nordeste, com um dos sobas das 4 aldeias que era detentor de mais de 60 cabeças de cabrito. Fruto do roubo que quase lhe levou a vida, acabou com pouco mais de seis cabeças, não obstante ter reservado um espaço equivalente a “um quarto e sala” para criação de cabritos, suínos, patos e galinhas. Segundo o soba, os roubos são maioritariamente realizados na calada da noite, onde os assaltantes usam viaturas ligeiras para transportá-los e os animais são vendidos no merca-do municipal do Negage; outros devido à procura, vendem-nos nos mercados da capital da província. As preferências dos assaltantes são geralmente os cabritos, pelo seu valor no mercado, os patos e as galinhas, por serem mais fáceis de trans-portar, sem se dar por eles. O soba confirmou ainda a existência de encomendas que são feitas por comerciantes do centro da cidade do Negage aos assaltantes de gado.

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Portanto, de acordo com os representantes das seis comunidades, a prática da pecuária apenas se verifica nas fazendas que se despontam no município, a eles nada podem fazer devido ao roubo da criação, sobretudo do gado caprino que maior interesse tem despertado no mercado e é de fácil transporte se comparado com o suíno. Registase, porém, a existência do gado suíno nas seis comunidades alvo da pesquisa e nas redondezas da cidade.

A caminho da comuna da Dimuca pode-se verificar o surgimento de enormes fazendas, com a presença notória de criação, em grande escala, de gado bovino proveniente da sul-africana e namibiana, mas também de produção de cereais, carne, ovos e frangos. A população local, muitas vezes, devido à impossibilidade de cultivar as suas próprias terras, por falta de meios, é obrigada a prestar serviços nestas fazendas, como recurso.

ACTIVIDADE PECUÁRIA NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Espécies Exploração familiar Exploração empresarial Total

Bovinos 1760 691 2451

Suínos 27.259 - 27.259

Caprinos 15.808 - 15.808

Ovinos 7191 - 7191

Bicos 40.930 8862 49.792

Outras 10.040 - 10.040

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

Em 2012, um responsável do Instituto Nacional do Café (INCA) veio a público dizer que está em recuperação um total de 1875 fazendas, com vista a melhorar a produção local. Tendo em conta a realidade e a produção agrícola que se pôde verificar nos mercados do Negage, essa informação merece pouca credibilidade. É certo que existem algumas fazendas com uma produção agro-pecuária inicial, e dependendo do investimento feito, provavelmente, no espaço de um ou dois anos poderão potenciar o mercado local diversificando os produtos.

8.9 Viação e trânsito

O sector de viação e trânsito depende da administração municipal, faz a monito-rização das vias e da actividade de condução em colaboração com a Polícia Nacional.

A qualidade das vias rodoviárias é fundamental para a mobilidade no interior do município e deste para as restantes partes da província, bem como para a liga-ção com outras províncias fronteiriças, como são as do Kwanza Norte e Malanje. A concentração de pessoas e a actividade produtiva e comercial, no município, tem

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obrigado à construção e reparação das principais vias de acesso, como parte da recuperação das infra-estruturas rodoviárias.

Em certa medida, a população do município do Negage concentra-se ao longo do eixo rodoviário da EN 220 – EN 140, num deslocamento do Norte a Sul do muni-cípio. Grosso modo, a actividade de comércio rural, a prestação de serviços de res-taurantes e combustíveis e a venda de equipamentos são feitos ao longo dos eixos principais, provocando um fluxo crescente da população. O centro administrativo do Negage funciona como pólo de atracção e zona de intersecção para outros des-tinos, oferecendo assim maior mobilidade até à cidade. Não obstante, as vias ter-ciárias da pequena cidade encontram-se, na maior parte, em estado avançado de degradação sem qualquer perspectiva de recuperação futuramente.

Segundo a Administração Municipal, a reabilitação da estrada Negage – Luca-la, da variante EN220 até Quimbele e da estrada Negage – Bungo – Damba são indicadores de uma maior mobilidade na região, de mais actividades socioeco-nómicas e de maior concentração populacional. Da mesma maneira que a rea-bilitação da estrada de Negage – 31 de Janeiro que quatro quilómetros após a cidade continua em direcção a Norte e desemboca na Damba, após 117 quilóme-tros (na Estrada Nacional EN 140). Todas estas obras, bem como a construção de uma nova ponte (65 metros) e o prolongamento de outra (17 metros) foram rea-lizadas por uma empresa chinesa, a China Road and Bridge Corporation – CRBC e fiscalizada pela francesa, GAUFF Engineering, ambas contratadas pelo Institu-to Nacional de Estradas de Angola, sem qualquer intervenção da administração municipal, que revela a existência de um hiato entre os planos estratégicos do governo para a recuperação das vias de acesso e a realidade que se pode cons-tatar in loco. A curtíssima malha urbana da cidade do Negage confirma esse hia-to, pois as vias secundárias e terciárias que interligam as ruas e as avenidas da cidade estão em avançado estado de degradação, dificultando a mobilidade das pessoas no próprio centro, para não falar das vias de acesso entre o centro e as regedorias.

A estrada do município do Negage à sede da província do Uíge está em razoá-veis condições bem como a do Negage à Camabatela, altura em que se entra na província do Kwanza Norte, em direcção ao Lucala, bifurcação para Malanje (à esquerda) e Ndalatando (à direita).

8.10 Comércio e hotelaria

O sector do comércio e indústria do Negage tem merecido alguma atenção nos últimos anos. Com a presença de pelo menos cinco dependências bancárias, o comércio ganhou maior impulso na medida em que houve pequenos projectos nos

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ramos que beneficiaram de financiamentos, como forma de incentivo à produção local. Com efeito, nem todos os projectos financiados lograram resultados satisfa-tórios, o que implicou uma redução dos beneficiários.

Quer no centro da pequena cidade, quer nas zonas rurais, verificam-se esta-belecimentos de pequenos comerciantes. O grosso de estabelecimentos encon-tram-se mesmo no centro do Negage.

ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Sede Dimuca Quisseque Cangundo Quindinga Quindando Armazém sede

119 17 37 5 3 3 18FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

Como a tabela que se segue ilustra, o sector hoteleiro no Negage é precário e carece de investimentos pujantes para lhe conferir melhores condições de serviço e atendimento, além da diversidade da oferta. Actualmente, apenas uma hospeda-ria funciona razoavelmente bem, mas com algumas limitações quanto à qualidade dos serviços, desde a alimentação à própria acomodação. Esta hospedaria situa-se a 3 km fora do centro, numa paisagem que permite observar a cidade de longe entre relevos e montanhas.

Segundo o representante do sector, o hotel do Negage encontra-se em fase de conclusão dos trabalhos e, após a sua inauguração, a oferta será melhor quanto às condições de serviço e de acomodação.

REDE HOTELEIRA NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Hotéis (5)

Hotéis em construção

(3)

Hospedarias em construção

(1)

Centros de lazer

(2)

Centros

(7)

Bares e restaurantes

(14)

Boates (1)

Clube

(1)FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

REDE BANCÁRIA NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Bancos Comerciais

BPC (2) BCI (1) BFA (1) Sol (1) Millennium Angola (1)FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

Com excepção do Banco de Poupança e Crédito (BPC) que possui duas agências na cidade, sendo uma central e outra para o atendimento dos idosos, as restantes dependências bancárias possuem uma agência cada no centro da cidade do Negage.

Constata-se que as receitas fiscais que são arrecadadas pela repartição munici-pal dos serviços de notário estão domiciliadas entre os bancos privado Sol e público comercial BPC, que disputam concorrência na mesma avenida principal, a escassos metros da administração. As duas restantes ruas que registam uma movimentação

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constante de pessoas devido à presença de mercados informais, estão servidas cada uma pelos bancos de Fomento Angola (BFA) e Milllennium Angola.

POSTOS DE COMBUSTÍVEL PÚBLICO E PRIVADO NO MUNICÍPIO DO NEGAGE – 2012

Sonangol Pumangol

7 1(24/24)

FONTE: Administração Municipal do Negage, 2012.

8.11 Conclusão

A presente monografia procurou, através da análise de dados e de conjuntu-ra, situar a problemática da pobreza, entre o meio urbano e rural, numa distinção necessária que não aparece claramente nos documentos oficiais, nomeadamente no Programa Municipal Integrado de Desenvolvimento Rural e Combate à Pobreza (PMIDRCP), enfatizando, no essencial, os eixos do desenvolvimento económico e social das comunidades, no espaço temporal de 2007/2017.

Uma conclusão preliminar é a de que o município do Negage, apesar de vários constrangimentos sociais, está em fase de renovação da sua população e de cres-cimento da economia, num misto de formal e informal. No que concerne à Educa-ção, há a assinalar um aumento de crianças e de jovens no sistema de ensino, quer do Estado, quer das Igrejas Católica e IERA, mas persistem problemas recorrentes como o da insuficiência de infra-estruturas, de meios e equipamentos, de qua-se inexistência de inspecção escolar, da fraca qualidade e insuficiência do corpo docente e dos desajustes criados pela reforma educativa ao aplicar a monodocên-cia e ao retirar instrumentos pedagógicos habituais (o alfabeto e a tabuada) que aparentemente estão a dificultar o ensino e a aprendizagem. O sector da saúde apresenta grandes dificuldades em infra-estruturas, quer no município, quer nas regedorias. Tal como permanece o problema da insuficiência (e qualidade) do pes-soal médico, técnico e sanitário e do reabastecimento regular em medicamentos, nomeadamente das regedorias ou mbanzas mais distantes da capital municipal, onde não há sequer farmácias privadas que praticam sempre preços inalcançáveis pela população.

Há maior incremento do comércio e da produção agrícola (café, cereais e outros) e pecuária (avícola, bovina e suína) que têm estimulado ainda mais o comércio. Este dinamismo da produção e do comércio não encontra equivalente na melhoria da rede de estradas que permitiriam o escoamento desses produtos do campo para o mercado (formal e informal), urbano e rural. Embora as campa-nhas agrícolas estimulem a produção, os produtores carecem de incentivos e apoio em técnicas, instrumentos de trabalho, sementes e créditos agrícolas.

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No entanto, a produção familiar ainda é predominante sobretudo no cultivo de frutas, leguminosas, oleoginosas, tubérculos e outros, quer para o mercado, quer para o autosustento das famílias, sendo assim um dos principais esteios da segurança alimentar do município que não regista problemas graves de fome ou ausência de alimentos. Porém, há o desafio da diversificação da dieta alimentar, principalmente das crianças que quase se resume ao milho, ao arroz, à mandioca, à batata, ao feijão, à ginguba e às frutas (banana e abacaxi). O espírito comunitá-rio ajuda a ultrapassar as dificuldades e as carências alimentares que provocam a subnutrição.

Grande dificuldade das comunidades é o acesso à água potável que tem como consequência elevados índices de doenças hídricas, sobretudo diarreias agudas. Enquanto isso, os programas municipais integrados do Executivo não passam o nível formal mas continuam a alimentar o optimismo das autoridades locais que contrastam com a realidade eonómica e social das comunidades, embora haja a registar algumas realizações pontuais conseguidas e muitas reprovadas pelas populações, devido à má qualidade das obras.

Por fim, a mobilidade das populações e a tendência para a horizontalidade dos padrões de consumo, aconselham uma postura crítica em relação a análises socio-lógicas assentes em oposições rotineiras entre urbano/rural, agro/industrial e tra-dicional/moderno, e estimulam o pragmatismo metodológico com vista à criação de conceitos explicativos a partir do terreno empírico.

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A Constituição da República, no seu catálogo de direitos fundamentais, assegu-ra que “é garantido a todos os cidadãos a liberdade de reunião e de manifestação pacífica e sem armas, sem necessidade de autorização e nos termos da lei (Artigo 47.o, 1, CRA), embora acrescente que “as reuniões e manifestações, em lugares públicos, carecem de prévia comunicação à autoridade competente, nos termos e para os efeitos estabelecidos na lei (Artigo 47.o, 2, CRA). No entanto, o poder polí-tico continua a manifestar relutância em cumprir este preceito constitucional e em assegurar a realização de direitos por parte dos cidadãos, pois ao longo do ano de 2013, todas as manifestações convocadas foram motivo de tensão e conflito, entre as autoridades e os manifestantes, resultando algumas delas em agressões físicas e em detenções arbitrárias, ao ponto de autoridades de polícia associarem publi-camente as manifestações a tentativa de golpe de Estado”.

Angola continua a ser considerada, pelas Nações Unidas, um “país de baixo desen-volvimento”, ocupando o 148.o lugar (em 187 países), embora o Banco Mundial, como resultado do crescimento económico sustentado que o levou a atingir USD 6.092,00, em PPC, per capita, tenha passado a considerá-lo “país de rendimento médio supe-rior”. Esta nova classificação tem sido motivo de orgulho para o Executivo, no entan-to, não basta uma sensível melhoria no PNB, sendo poucos os sinais de progressão nos indicadores de desenvolvimento social que fazem os critérios de classificação, nomeadamente para o Índice de Vulnerabilidade Económica (EVI) (inclui indicadores da população, isolamento, concentração das exportações, percentagem da agricultu-ra no PIB e outros) ou para o Índice de Capital Humano (HAI) (inclui a subnutrição, a mortalidade infantil, a frequência do ensino secundário e o analfabetismo).

Os níveis de reprodução social permanecem baixos pois insiste-se numa política de baixos salários e numa distribuição da renda extremamente desigual que não é compensada por um sistema de redistribuição, através do Estado social que é quase inexistente ou grandemente ineficaz. A evolução do salário real é quase estacionária e o poder de compra dos assalariados continua a ser erodido pela inflação acumu-lada, embora os seus níveis tenham caído ao nível de um dígito já há algum tempo.

O Serviço Nacional de Saúde que apresenta níveis satisfatórios, no plano da prevenção de doenças através da vacinação, continua a não dar resposta suficien-te no plano da saúde materno-infantil e no combate às endemias. Assim, como os hospitais, os centros e os postos médicos revelam uma incapacidade quase total

CONCLUSÃO

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de dar resposta satisfatória ao grande número de doentes, muitas vezes devido à má qualidade da água consumida e à falta de saneamento do meio.

O país ainda não debelou o fenómeno das crianças fora do sistema de ensino e muitos jovens e adultos continuam a não ter oportunidade de acesso à escola e alguns não a concluem. E, apesar de transcorridos 13 anos, o país não progrediu sufi-cientemente no sector da educação e ainda não atingiu plenamente nenhum dos seis objectivos estabelecidos pelo Fórum Mundial de Educação para Todos (26 a 28 de Abril de 2000). No quadro do chamado “Marco de Acção de Dakar”, os governos de todo o mundo comprometeram-se a garantir para todos os cidadãos dos seus países, até 2015, “protecção integral da primeira infância, especialmente, para as crianças mais desfavorecidas”, “acesso a todas as crianças, especialmente, as meninas, e con-clusão da escolaridade primária gratuita, obrigatória e de boa qualidade”, bem como “acesso equitativo a programas de aprendizagem e de desenvolvimento de capacida-des para a vida, para todos os jovens e pessoas adultas e melhor educação para con-seguir resultados de aprendizagem reconhecidos e mensuráveis”. Porém, o país não consegue melhorar a qualidade da sua educação e tem investido pouco na formação profissional e profissionalizante e não tem ainda uma ligação segura entre os sistemas de ensino e de aquisição de conhecimento e competências e o mercado de trabalho.

O país foi atingido, nos últimos três anos, por uma prolongada estiagem (menos 60% de precipitação), cujos efeitos afectaram directamente 10, das suas 18 pro-víncias, provocando uma acentuada descida da produção agrícola (menos de 400 toneladas de produtos agrícolas) que atingiu cerca de 350.000 famílias e cerca de um milhão de crianças, com menos de cinco anos de idade. No fim do primeiro semestre do ano (2013), o Executivo divulgou dois planos de combate à fome, com uma cabimentação anunciada de 100 milhões de USD que foram disponibilizados tão-somente em 10%, tendo as Nações Unidas intervindo, através da FAO, UNICEF e da OMS, distribuindo sementes, utensílios de trabalho e capacitando as popula-ções em nutrição, o que mostra que havendo carências alimentares no país, quer nas áreas rurais, quer urbanas, o sistema de segurança alimentar não funciona de forma adequada e que há ainda muitas situações de emergência que continuam a ser deixadas à sorte da intervenção das Organizações Internacionais.

O Estado é o principal actor na acção de desenvolvimento, devido ao modelo económico do país, em que aparece como principal empregador da força de traba-lho, para além de deter as empresas com maior expressão no tecido produtivo. No entanto, outros actores não-estatais (organizações da sociedade civil e igrejas) dão o seu contributo no desenvolvimento social e na solidariedade, à luz do princípio da subsidiariedade, o que resulta numa acção de grande dimensão e importância que nem sempre tem visibilidade.

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Resumo dos factos políticos e sociais de 2013

O ano de 2013 foi marcado por diversos factos político-sociais, dos quais se destacam os seguintes.

JaneiroA Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) convocou uma vigília denominada o “dia do fim”, prometendo milagres em massa, compareceram ao Estádio da Cidadela pelo menos 120 mil crentes, o que ultrapassou largamente a capacidade do recinto (setenta mil pessoas) e levou à perda de controlo da massa de crentes, resultando numa tragédia inesperada, em que pereceram pelo menos 14 pessoas.

FevereiroMais de 700 professores saíram à rua, na cidade do Lubango, para exigir melhores condições laborais e o pagamento de subsídios em atraso.

O Ministério Público Português arquiva o processo-crime contra o activista e jornalista Rafael Marques em que alguns generais angolanos se queixavam de difamação contra o jornalista e activista cívico, devido a afirmações do seu livro “Diamantes de Sangue”.

MarçoO autodenominado Movimento Revolucionário de jovens angolanos convo-ca uma manifestação para o dia 30 do mesmo mês com o objectivo de exigir informações sobre o paradeiro de Alves Kamulingue e Isaías Cassule. Um dia antes da realização da manifestação, a Polícia de Investigação Criminal prende, no mercado de Asa Branca, Alberto Santos, a testemunha do rapto de Isaías Cassule, que veio a ser libertado 120 dias depois.

Já no dia da manifestação a polícia reprime os manifestantes e prende vários activistas.

MaioEmiliano Catumbela, um dos activistas do Movimento Revolucionário, é deti-do na noite do dia 27, quando, em companhia de colegas do grupo, preten-dia realizar uma vigília no largo da Independência para recordar Cassule e

APÊNDICE

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Kamulingue e os milhares de pessoas executadas, na sequência da repressão do falhado golpe de Estado, de 27 de Maio de 1977. Emiliano Catumbela é então acusado de tentativa de assassinato contra o comandante da Maian-ga, Eduardo António Nunes Diogo. Detido, viria a ser liberto um mês depois.

Agentes da Polícia Nacional dispersaram à bastonada os manifestantes que participavam na vigília convocada para esta tarde, em Luanda, pelo Movi-mento Revolucionário, em protesto pelo desaparecimento, há um ano atrás, de Isaías Cassule e Alves Kamulingue. Na sequência, dois manifestantes são presos: Raúl Lindo “Mandela”, de 27 anos, foi brutalmente espancado, e Emi-liano Catumbela, que é então acusado de tentativa de assassinato contra o comandante da Polícia Nacional, do Distrito da Maianga (Luanda). Detido e torturado, viria a ser libertado um mês depois.

JunhoO Presidente José Eduardo dos Santos concede, após 22 anos, uma entrevista exclusiva à SIC, onde chamou de frustrados os mais de 300 jovens manifestantes e falou da sua sucessão.

Mais de 15 mil pessoas saíram à rua em protesto contra a onda de homicídios de camponesas, na localidade diamantífera de Cafunfo, município do Cuango, província da Lunda Norte.

JulhoO ex-comandante provincial de Luanda, da Polícia Nacional, comissário Joaquim Ribeiro, é condenado, em Luanda, pelo Supremo Tribunal Militar, a uma pena de 15 anos de prisão maior e 12 meses de multa (40 Kwanzas/dia), por terem sido dados como provados dois crimes de violência contra inferior hierárqui-co que resultaram em morte, abuso de confiança e conduta indecorosa. Vinte outros réus são também condenados, com penas diversas, neste processo.

AgostoComeça no Tribunal Provincial de Luanda o julgamento da segunda vaga dos implicados no desvio de mais de 100 milhões de dólares-americanos da tesouraria do Banco Nacional de Angola. Mais tarde, todos são libertos.

SetembroManuel Chivonde Baptista (Nito Alves), de 17 anos de idade, detido por man-dar imprimir t-shirts com slogan contra José Eduardo dos Santos, é solto com termo de identidade e residência, pelo Tribunal Municipal de Viana, onde os seus advogados, Odeth Fernandes e Zola Ferreira, da associação cívica “Mãos Livres”, foram informados de que era acusado de crime de injúrias contra titular

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dos órgãos de soberania, com base no Código Penal e na Lei de Crimes Con-tra Segurança do Estado (Lei 7/78).Cerca de 5 mil professores aderiram a uma marcha de protesto no Lubango, província da Huíla. A marcha foi convocada pelo Sindicato Nacional de Professores (SINPROF), reivindicando melhores condições de emprego.

Uma manifestação de protesto contra as injustiças sociais em Angola, organi-zada pelo Movimento Revolucionário, foi mais uma vez violentamente reprimi-da pela Polícia Nacional, em Luanda. Foram detidos 23 manifestantes, dentre os quais vários declararam ter sido agredidos por agentes da Polícia. Um diri-gente do Bloco Democrático, e Vice-Presidente do Sindicato Nacional dos Pro-fessores (SINPROF), Manuel de Vitória Pereira, que se encontrava a distribuir boletins informativos do seu partido, na sua área de residência, também foi detido como manifestante.

Acobertura noticiosa da manifestação também foi fortemente reprimida pela polícia que ordenou aos jornalistas que abandonassem o local, sob ameaça de serem também presos. Coque Mukuta, jornalista da Voz da América, foi brevemente detido por agentes da Polícia, quando tentava apurar o nome de um manifestante detido junto ao cemitério de Santana.

Menos de meia hora depois de terem sido libertados, pelo Tribunal de Polí-cia de Luanda, sob termo de identidade e residência, a Polícia de Intervenção Rápida (PIR) tornou a prender sete membros do autodenominado Movimento Revolucionário, que organizara uma manifestação anti-governamental, repri-mida pela polícia, no dia anterior. Adolfo António, Adolfo Campos, Amândio Canhanga “Sita Valle”, Joel Francisco, Quintuango Mabiala “Dimas Roussef”, Pedro Teka “Pedrowski”, Roberto Gamba “Pastor”, concediam entrevistas aos jornalistas Alexandre Solombe, Coque Mukuta e Rafael Marques quando foram detidos, juntamente com os jornalistas. Estes foram violentamente agredi-dos e os seus materiais de reportagem foram apreendidos e destruídos pelos agentes da PIR. Depois de várias horas, os jornalistas foram libertados, mas os manifestantes permaneceram detidos. Dias depois foram libertados sob cau-ção, fixada em 1.520.000 Kwanzas (cerca de USD 15.400).

OutubroA Procuradoria de São Paulo (Brasil) indicia Bento Kangamba como líder de uma quadrilha de tráfico internacional de mulheres para prostituição, do Brasil para Angola, com ramificações em Portugal, África do Sul e Áustria. A polícia brasileira emite um mandado de captura que é divulgado em todo o mundo através da Interpol. O caso vai a julgamento em breve no Brasil, mas Kangam-ba não será extraditado.

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Na sequência da conclusão dos trabalhos de uma comissão de inquérito Ad-Hoc, a direcção da UNITA suspende, por dois anos, o seu antigo Secretá-rio-Geral da Juventude, Mfuka Muzemba, acusado de ter sido corrompido pelo regime de José Eduardo dos Santos, através de subornos de Bento dos Santos (Kangamba).

NovembroNa Comarca de Luanda, uma rixa entre os detidos causa 14 feridos, três dos quais em estado grave, e leva à exoneração do director e dos seus colabora-dores directos, o caso é encaminhado para a PGR, para dar seguimento ao inquérito mandado instaurar. O facto chamou a atenção da sociedade, depois de denúncias nas redes sociais terem mostrado agentes dos serviços prisionais a espancarem desumanamente detidos daquele estabelecimento prisional.

Reagindo às notícias que davam conhecimento da bárbara execução dos acti-vistas Cassule e Kamulingue, por forças ligadas ao SINSE, a UNITA, maior parti-do da oposição, convoca uma manifestação para o dia 23, em nome da “defesa da vida”, que é imediatamente proibida pela Polícia Nacional, em declarações aos órgãos de imprensa.

Na sequência, o MPLA, partido no poder, acusa a UNITA de querer “criar o caos” no país, ao querer promover manifestações de “arruaça” e de perturba-ção da ordem pública. Apela então aos seus apoiantes a não participar e aos órgãos competentes do Estado a “agir no estrito respeito pela lei e, se neces-sário, pela reposição da ordem e tranquilidade pública”.

Na madrugada de 23, elementos da Unidade de Guarda Presidencial (UGP)atin-gem mortalmente, pelas costas, um dirigente da organização juvenil da Con-vergência Ampla de Salvação de Angola (CASA-CE), Manuel Hilberto Ganga, depois de ter sido detido por estar a afixar cartazes com as fotografias dos activistas executados, Cassule e Kamulingue.

Um militante da CASA-CE, Manuel de Carvalho Hilberto Ganga, foi morto a tiro nas primeiras horas da madrugada por um agente da Unidade de Segu-rança Presidencial (USP). O malogrado foi detido enquanto colava cartazes nas paredes do Estádio dos Coqueiros, levado para a unidade da USP, junto à presidência, onde foi morto com um tiro nas costas.

A manifestação convocada pela UNITA, em protesto pelas notícias dando conta da execução dos activistas Isaías Cassule e Alves Kamulingue, agora com o apoio de todos os partidos da oposição, é violentamente reprimida com disparos sobre os manifestantes, canhões de água quente e granadas de gás lacrimogéneo. São feitos vários feridos, incluindo o presidente da UNITA. Quase três centenas de pessoas foram detidas em todo o país.

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O cortejo fúnebre do militante da CASA-CE, assassinado por operativos da USP, é impedido manu militari de prosseguir na Avenida Deolinda Rodrigues, nas imediações do Jumbo, em direcção ao Cemitério de Santana. O cortejo que juntou centenas de pessoas, muitas envergando camisolas com slogans como “Exigimos Justiça”, foi bloqueado por um forte dispositivo policial, que incluiu o uso de helicópteros, Polícia de Intervenção Rápida, Polícia Monta-da, viaturas com canhões de água e gás lacrimogéneo. O funeral prosseguiu depois de mais de uma hora de impedimento92.

DezembroRegistaram-se novos confrontos entre presos na Comarca Central de Luanda que deixaram 9 mortos e 22 feridos.

92 Resumo dos acontecimentos de 2013 pelo portal Maka Angola e da VOA.

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