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Só se dá importância para vida quando a mesma está em perigo de acabar ( Rumiko ) http://www.flickr.com/photos/dai_by_my_hand/8652939713/ Petruz pegou o tapete que forrava o interior do tubo, enrolou num formato de canudo e o colocou debaixo do braço. Era pequeno, porém pesado, por causa de sua textura e espessura. Depois, correndo ao encalço da moça, ele pergunta: - Posso levar seu sabre? - Não é um sabre, senhor – replica a menina, estendendo, mesmo assim, a arma para Petruz – é uma Shikomizue. O nome dela é Shiko-Mizu no Ryu. - Chico...mi...? – o garoto disfarça, não completando a palavra que por enquanto era difícil para ele pronunciar e memorizar. Como ele não terminou o que iria dizer, Rumiko prosseguiu. - Mas antes de se unir a Rumiko nessa peregrinação, o senhor precisa saber que talvez possamos nos perder e andar sem rumo. - Tudo bem! Eu já estou perdido há anos, mesmo. - Podemos ter que dormir ao relento, sobre a brisa fria da madrugada. - Eu já durmo assim há muitos meses. - Podemos passar fome por dias. - Eu já... – Petruz faz uma pausa – eu já estou com fome faz muito, muito tempo. Rumiko olha para o garoto com um semblante triste, porém despreocupado. E ele coça os cabelos emaranhados e se escusa: - Desculpa Rumiko. Nós mal começamos e eu... Enfim, eu não quero que pense que estou reclamando. - Oh, não senhor. Não foi isso que me veio à cabeça. Venha com Rumiko, por favor. A moça leva o garoto até um beco longo, sujo e praticamente abandonado, não muito distante do local onde estavam anteriormente. Chegando lá, ela pede para o garoto se sentar em qualquer lugar e explica. - Vamos ficar aqui até a noite cair, aí será mais seguro sair. Tudo bem para o senhor? - Sim! Sem problema. Rumiko senta- se próxima à um latão enorme de lixo e Petruz veio sentar-se de frente à ela, encostando- se na parede oposta do beco, mas antes pergunta se ela queria seu tapete. - Oh, não, senhor – ela responde abraçando os joelhos e fechando os olhos – Pode ficar com ele por agora. Petruz coloca-o no chão e se senta em silencio. Ele olha disfarçadamente ao redor e percebe que o local era realmente bem reservado, afastado de qualquer rua movimentada e que, quando escurecesse, seria um lugar perfeito para se esconder. E isso o deixou meio preocupado, pois em sua cabeça passou muitas hipóteses relacionadas ao porque da moça tê-lo levado ali. Pensou que talvez ela fosse esperar ele adormecer e depois fugir. Pensou até que poderia ser assassinado por ela naqueles instantes seguintes, mas isso nunca aconteceu. Além do mais, ele reparou numa coisa que não combinava com a cena. Ele era

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Só se dá importância para vida quando a mesma está em perigo de acabar

( Rumiko )

http://www.flickr.com/photos/dai_by_my_hand/8652939713/ Petruz pegou o tapete que forrava o interior do tubo, enrolou num formato de canudo e o colocou debaixo do braço. Era pequeno, porém pesado, por causa de sua textura e espessura. Depois, correndo ao encalço da moça, ele pergunta:

- Posso levar seu sabre? - Não é um sabre, senhor – replica a menina, estendendo, mesmo assim, a arma para Petruz – é uma

Shikomizue. O nome dela é Shiko-Mizu no Ryu. - Chico...mi...? – o garoto disfarça, não completando a palavra que por enquanto era difícil para ele

pronunciar e memorizar. Como ele não terminou o que iria dizer, Rumiko prosseguiu.

- Mas antes de se unir a Rumiko nessa peregrinação, o senhor precisa saber que talvez possamos nos perder e andar sem rumo.

- Tudo bem! Eu já estou perdido há anos, mesmo. - Podemos ter que dormir ao relento, sobre a brisa fria da madrugada. - Eu já durmo assim há muitos meses. - Podemos passar fome por dias. - Eu já... – Petruz faz uma pausa – eu já estou com fome faz muito, muito tempo.

Rumiko olha para o garoto com um semblante triste, porém despreocupado. E ele coça os cabelos emaranhados e se escusa:

- Desculpa Rumiko. Nós mal começamos e eu... Enfim, eu não quero que pense que estou reclamando.

- Oh, não senhor. Não foi isso que me veio à cabeça. Venha com Rumiko, por favor. A moça leva o garoto até um beco longo, sujo e praticamente abandonado, não muito distante do local onde estavam anteriormente. Chegando lá, ela pede para o garoto se sentar em qualquer lugar e explica.

- Vamos ficar aqui até a noite cair, aí será mais seguro sair. Tudo bem para o senhor? - Sim! Sem problema.

Rumiko senta- se próxima à um latão enorme de lixo e Petruz veio sentar-se de frente à ela, encostando-se na parede oposta do beco, mas antes pergunta se ela queria seu tapete.

- Oh, não, senhor – ela responde abraçando os joelhos e fechando os olhos – Pode ficar com ele por agora.

Petruz coloca-o no chão e se senta em silencio. Ele olha disfarçadamente ao redor e percebe que o local era realmente bem reservado, afastado de qualquer rua movimentada e que, quando escurecesse, seria um lugar perfeito para se esconder. E isso o deixou meio preocupado, pois em sua cabeça passou muitas hipóteses relacionadas ao porque da moça tê-lo levado ali. Pensou que talvez ela fosse esperar ele adormecer e depois fugir. Pensou até que poderia ser assassinado por ela naqueles instantes seguintes, mas isso nunca aconteceu. Além do mais, ele reparou numa coisa que não combinava com a cena. Ele era

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testemunha de um assassinato e sabia quem era o culpado, que era justamente a mocinha poucos passos à sua frente. Mesmo assim, quando pediu para carregar a arma do crime, ela cedeu sem questionar, sem se preocupar ou expressar algum sorriso malicioso. Seria isso parte de algum plano dela para tentar incriminá-lo? Ou ela já confiava nele a ponto de deixa-lo do lado mais seguro da espada? Petruz prefere ficar com a segunda opção, porque, olhando para ela agora, à sua frente e de olhos fechados, o ruivo, por alguma razão, não conseguia imaginar Rumiko jogando-o numa fogueira em que ela mesma acendeu. Como o silêncio imperava de modo irritante, pois a menina tinha o estranho hábito de não perguntar nada sobre ele ou qualquer outro assunto, o garoto achou melhor tentar puxar uma conversa:

- Sabe... eu nem sempre fui um mendigo. Quero dizer,... eu não nasci nas ruas. - Rumiko sabe disso, senhor. - Hã? Sabe? E como você sabe? - Seu vernáculo não é o de um mendigo que nasceu nas ruas, senhor. - Ah é? Certo...,bom, você... você quer saber o meu nome? - Sim! – Rumiko ergue o rosto, encarando Petruz com um olhar sedento – Isso muito me prazeria,

senhor. - Ah é? Bem... Eu me chamo Petruz! – o garoto estufa o peito – Daniel Alves Petruz. E eu pertenço

à família...hã... Naquele momento, vendo o rosto ansioso de Rumiko, Petruz achou que não deveria revelar ainda à sua nova colega assassina que ele pertencia à uma família de classe política. Ele estava tão acostumado a dar o nome de sua família em reuniões chatas e visitas irritantes, que agora, depois de estar a tanto tempo sem falar com alguém, ele quase deixou escapar sua linhagem. Então ele tentou disfarçar.

- Pertenço a uma família qualquer. Que bobagem a minha...! Rumiko desmanchou sua ansiedade e olhou para Petruz com uma face repreensiva, mas logo ela sorriu e retorquiu:

- O senhor pertence à família política dos Alves, cujo ultimo líder foi Álvaro Alves Petruz, o suposto melhor governador que esse estado já teve. Judeu ortodoxo do grupo dos Sefardim1A, não Hassídico1B e um dos homens mais influentes, respeitados e importantes do campo político do Brasil.

Petruz esbugalha os olhos de surpresa. Rumiko exprime um olhar de desaprovação e termina: - Definitivamente não é uma família como qualquer outra, senhor. Não deveria ter vergonha do

nome de seu pai. - Como sabe que sou filho do governador Álvaro? Só por causa da semelhança dos nomes? - Certamente seus nomes serem parecidos sendo que vocês não são parentes, seria muita

coincidência. Mas assim que o viu, Rumiko teve a sensação de que já o tinha visto antes. O garoto lembrou-se desse momento, quando Rumiko mostrou-se espantada assim que seus olhos se encontraram.

- Levou um tempo para reconhecê-lo – segue a moça – pois o senhor está muito diferente, mas a verdade é que Rumiko já o viu ao lado de seu pai há muito tempo atrás.

- Ah é? Quando? Quer dizer,... onde? Rumiko inclina o rosto lindamente, e pergunta com um notável receio, de modo que sua voz quase não sai.

- O senhor não se lembra de mim? - N-não... – Petruz cora, sentindo seu coração acelerar – acho que nunca te vi antes. - Hunn... de fato, o senhor era ainda muito novo na ocasião. – a moça reajusta a posição da cabeça e

sua voz volta ao normal – Rumiko o viu numa conferência pública. - Com meu pai? - Hai. Com o senhor seu pai. - Ah é? Então, diga-me. Eu já fui a muitas conferencias com meu pai, mas ele fazia questão de

andar sempre com muitos guarda costas. Assim eu poderia ser filho de qualquer um. Como soube que eu era filho dele?

- Sua pergunta não tem fundamento, senhor. - Hum?

De fato, a pergunta de Petruz era infundada. Sendo ele o único garoto no meio de um bando de homens adultos, não poderia estar ao lado de um político famoso e adorado durante uma conferencia se fosse ele

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um simples filho de um dos guarda costas. Rumiko, contudo, aceita a pergunta com educação e responde com esclarecimento.

- Houve uma vez em que meu sensei me pediu para estudar sobre seu pai. Nessa época, enquanto colhia informações sobre o senhor Álvaro, Rumiko acabou esbarrando em informações que pertenciam ao senhor também.

- Seu... “Sânsei”? Rumiko abaixou a cabeça e ficou em silêncio após isso. Petruz decidiu não se aprofundar no assunto por enquanto e tentou continuar com o rumo da conversa por outros meios.

- Bom! Então você conheceu meu pai? - Não diretamente, senhor. – a moça ergue a cabeça lentamente – Mas Rumiko já leu muita coisa a

respeito de seu pai. - Imagino. Você sabe até a doutrina religiosa dele. Por acaso é judia também? - Iie! – ela entrelaça os dedos das mãos, apoia seu queixo sobre eles e pisca o olho para Petruz num

simpático sorriso – Rumiko é Shiksa. O ruivo enrubesce novamente, apertando as coxas com força, comprimindo os lábios e tentando olhar pra qualquer outro lugar que não fosse os olhos grandes da moça. Rumiko não entendeu o porquê do desconforto de Petruz, então dá um tempinho para ele se recompor. Ela nunca teve intimidade com rapaz algum do Gen-Bu, mas conversava com quase todos quando lhe era possível e, em nenhum deles, ela havia encontrado tanta timidez e inocência, por isso achou uma graça ver Petruz corar. O que acontece é que a palavra Shiksa, pronunciada por Rumiko sem qualquer inibição, tinha um sentido duplo. Rumiko usou no sentido que se refere à uma mulher judia que falhou ao seguir os preceitos ortodoxos da religião judaica. Não era o caso dela, mas Rumiko gostava de deixar claro sua posição em relação à qualquer doutrina religiosa. Só que esse mesmo termo pode ser usado para se referir à moças ou mulheres não-judias, que representam para homens e até mesmo garotos judeus, uma tentação irresistível ao ponto de fazer com que os mesmos sejam enfeitiçados por seus encantos e abandonem sua religião. Foi nesse sentido que Petruz entendeu. A moça afasta as grossas franjas da frente do rosto com a mão esquerda e continua distraidamente.

- O governador Álvaro era um bom homem. Rumiko, de certa forma, gostava dele. E imagina que o senhor não esteja alimentando o desejo de também ser um homem da política.

- Oh, não! Eu estudei muito sobre o assunto por incentivo de meu pai, mas não tinha nenhuma intenção em ser um político porque não era o que queria para o meu futuro.

- Que pena. – Rumiko ergue o rosto e sorri – Se o senhor ainda nutrisse a vontade de ser um político, com a linhagem que possui, seria um homem de grande futuro.

- Você acha... Quer dizer... Está falando sério? Petruz olha com mais atenção para Rumiko e nota que, apesar de ela ainda estar sorrindo, seus olhos diziam que ela não estava brincando. Ele se cala, vira o rosto e espera a moça começar uma nova conversa. Mas isso não vem a acontecer. E, devido à fome que sentia, a fraqueza causada pela desnutrição e o frio irritante, ainda mais agora sem o seu cobertor, Petruz logo adormece.

Quando a noite cai e algumas luzes se acedem, iluminando as ruas, ele acorda assustado. Havia

tido um sonho estranho, cujo maior enfoque foi o assassinato que tinha presenciado naquela tarde. A noite estava muito fria e uma garoa fina e gelada caía lenta e interminavelmente, mas o garoto não sente falta de seu cobertor. E ao sentir um delicioso e distante aroma de rosas e perceber que sentia-se aquecido, ao menos a parte de cima de seu corpo, ele entende o por que. Estava coberto por uma pequena, porém quente e bem confortável peça de roupa, que lhe fora posta nas costas enquanto dormia. Era o blusão estranho que sua recente adquirida colega usava. Contudo, ao tatear ao redor, ele percebe que não estava mais com a espada de Rumiko em mãos. Petruz esfrega os olhos e nota que a moça também não está mais ali. O garoto ri num suspiro e não se surpreende. Ele sabia que, se acaso adormecesse, Rumiko iria aproveitar para ir embora. Também estava ciente de que, para alguém tão ágil e completo como Rumiko, ter como acompanhante um moleque que mal tinha forças para andar seria um estorvo. O garoto amaldiçoa sua fraqueza, sua timidez, seu medo... Mas agora já era tarde.

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Pelo menos ela havia deixado sua blusa japonesa, que era quente e cheirava à rosas, embora ele estivesse falando sério quando afirmou que passaria frio ao lado dela. Petruz cruza os braços e encolhe as pernas para aquecê-las ao menos um pouco. A peça de roupa que Rumiko lhe deixou era quente, mas não era grande o suficiente para todo o seu corpo. Apesar do frio, a ferida em seu braço não doía, mas ainda incomodava. De nariz gelado e doendo, ele esfrega as ventas com uma das mãos e, súbito, espirra. E no momento seguinte, uma voz macia e agradável lhe saúda:

- Odaijini2, Petruz san! O garoto se vira rapidamente para o outro lado do beco, que dava numa saída contrária àquela em que eles entraram, vê Rumiko se aproximar silenciosa como um gato e quase não a reconhece. A moça havia saído para observar como estava as coisas ao redor, já que fazia mais de horas que o assassinato tinha acontecido e, antes de voltar para o beco, ela pôs suas roupas de civil “comum”, com exceção do gorro.

- Fico feliz que tenha acordado, senhor. Está esfriando muito e temos que sair deste lugar. Petruz se levanta prontamente, mas com dificuldade em esconder a sua alegria por ver o rosto de Rumiko mais uma vez. Então ele nota a moça remexendo numa enorme caçamba de lixo.

- O que está fazendo? – ele pergunta enquanto enrola o tapete. Rumiko tira um saco de lixo de cor vermelha de dentro da caçamba e responde à Petruz com um rabo de olho.

- Vamos comer alguma coisa, senhor. Afinal, foi o senhor mesmo que disse estar com fome. - E nós vamos comer...o que tem aí? Nesse lixo?

A menina ri graciosa, imaginando o que se passava na cabeça do raapz e rasga o saco de lixo, revelando que seu conteúdo não era nada além de uma bolsa de academia em formato cilíndrico. E Petruz respira aliviado:

- Uma... Mochila-saco... Rumiko assente com a cabeça e desata o laço trançado que prendia a abertura da mochila, enfia a sua Shikomizue dentro e retira um pote branco, que na verdade era um carretel e que continha um rolo de bandagens, o qual parecia estar úmido. Em seguida, ela pede para Petruz mostrar o braço lesado. O rapaz obedece, esticando o braço em silêncio e a moça passa algumas voltas da bandagem na ferida, que já estava escurecida.

- Essa lesão já deve estar infeccionada. Esse produto não vai curar a infecção, mas vai impedir que fique pior do que já está. Amanhã o senhor precisa ir a uma drogaria ou um posto de saúde, tudo bem?

- Sim, tudo bem. Rumiko termina o tratamento dando um nó nas bandagens e exclama:

- Owarimashita! – diz ela com a voz manhosa, afirmando que tinha terminado – Grata pela compreensão e confiança.

- Claro... sem problema. Petruz passa a mão sobre as bandagens em seu braço. Ele estava gelado, mas pelo menos a dor, que já era pouca, agora sumiu completamente. A moça pega sua mochila, realmente parecida com aquelas usadas por peregrinos, e a joga nas costas.

- Saa, Ikemashô! Após tais palavras, Rumiko anda em direção à saída do beco enquanto o garoto, sem entender o que ela disse, fica parado no lugar a observa-la, imaginando o que fazer. A moça dá uns quatro passos e volta-se para Petruz. Então, com a cabeça, ela faz um sinal para ele a seguir. Só aí o garoto pega o tapete e vai atrás dela, enrolando-o no caminho e resmungando.

- Você precisa parar de falar essas palavras estranhas. Eu não as entendo... - Gomen Nasai, ainda há algumas palavras que Rumiko não tem mais o costume de pronunciá-las

em português, senhor. E pode deixar o juutan aí, senhor. Será um peso a menos. - De onde você é? – Petruz olha para o pequeno tapete em suas mãos, soltando-o em um dos cantos

do beco após deduzir que Rumiko falava dele quando disse “juutan”. - Rumiko nasceu aqui mesmo, na ilha de Vera Cruz, mas passou os últimos 15 anos no arquipélago

japonês. - Que massa! É por isso que você é tão forte! Deve ter sido treinada lá, certo? - O senhor fala muito rápido, mas está com a razão. Meu Sensei era o melhor espadachim de

Kyoto e um dos melhores do Japão, se não do mundo.

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- Espadachim? Que legal! E você sabe voar e fazer aqueles raios de fogo com sua espada? - Nani? – Rumiko olha espantada e confusa para o garoto.

Petruz percebeu que a menina não entendeu a brincadeira mal feita e mal colocada, então ele desconversa:

- Ah...Nada. Deixa pra lá. Acho que estou viajando demais. Deve ser a fome. - Are3? Via...jando??? - É! Estou boiando um pouco. Mas eu sempre desconfiei que aquelas acrobacias dos filmes

fossem impossíveis de se realizar. - Mas afinal, do que é que o senhor está falando? Rumiko não está entendendo. - Deixa pra lá. Mas diga, se você é da ilha de Vera cruz, por que seu nome é tão incomum?

Rumiko observa o rapaz por mais alguns passos, depois volta seu olhar para frente. Então Petruz continua:

- Você não tem cara nem traços de japonesa. Sendo assim, você deve ser, no máximo, neta de japoneses. Como é mesmo que eles são chamados? Deixa eu lembrar...

- Sansei. – responde a moça, permitindo que Petruz seguisse seu raciocínio sem perder tempo pensando.

- Acho que é isso! E se for então isso já daria a você o direto e o dever de ter um nome brasileiro, não é isso mesmo?

- É muito perspicaz, senhor Petruz. De fato, o nome “Rumiko” não é um nome de batismo. Ele me foi dado por meu Sensei, na época do meu treinamento. Quando o sensei Gengetsu decidiu me adotar, ele apagou meu nome e cortou minha raiz. Então ele me disse um nome que eu deveria carregar enquanto fosse leal à ele.

- Rumiko? - Yô! - E qual era o seu nome verdadeiro? - Nome verdadeiro, senhor? - É! Você sabe... O seu antigo nome?

A moça voltou a ficar em silêncio, simplesmente observando o rosto de Petruz sem exibir o seu já costumeiro sorriso. Na verdade, ela estava com um olhar tão neutro que não fazia menção de que iria ou mesmo se queria dizer qual era seu nome anterior. Percebendo a relutância da moça, Petruz imaginou que não deveria forçar, mas não quis fechar a conversa com aquele clima ruim, então ele atropelou os pensamentos de Rumiko com outra coisa que lhe causava uma imensa duvida.

- Tem uma coisa que eu ainda estou pensando e queria que você me explicasse. - Pode falar senhor – replica a moça com um entusiasmo renovado, mostrando que ela queria

mesmo evitar o assunto de anterior. - Como fez aquilo? Aquilo de fazer as pessoas dormirem? - Com uma dose certa de Tengudake4 dá para se fazer coisas interessantes. - Tengu.. dake? - Uhn! Tengudake pode ser usado para vários sintomas. Pode inclusive causar a morte, embora não

fosse esse o objetivo de Rumiko. - Aí você transformou esse tal de tengudake numa espécie de pó e colocou naquelas esferas. - Gasubonbe5. - Gasubonbe – Petruz vai repetindo cada palavra estrangeira que ouve, no ingênuo pensamento de

aprender uma língua nova. - O efeito atinge qualquer um que respire ao menos uma vez a fumaça que contem esporos do

Tengudake. A maior vantagem é que, assim que se inala o primeiro ar misturado com os esporos, a pessoa pode adormecer de dez à quinze minutos depois que ainda assim não se recordará do que aconteceu.

- Por isso esperou as bombas explodirem para agir? Rumiko morde os lábios inferiores num sorriso de satisfação. Sentia-se ótima quando alguém entendia o seu “Modus Operandi”, sem que ela precisasse explicar ou dar satisfações de como agiu ou porque agiu.

- Mas então... – Petruz funga o nariz – E eu? Porque eu não fui atingido?

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- A bebida energética que Rumiko lhe deu possui um ingrediente que anula o efeito do Tengudake durante os 30 minutos seguintes em que ele é ingerido.

- Foi por isso que você me deu? - Rumiko lhe deu porque não queria mais. E também não queria jogar fora. - Mas você me disse que se eu não quisesse, você iria jogar fora, lembra? - Sim, mas não podemos jogar alimento fora, desde que ainda esteja saudável, porque sempre tem

alguém que quer. O senhor não concorda? - Claro... – Petruz desvia o olhar sabendo que ele nunca pensou por esse lado – claro que concordo. - Se não fosse para o senhor, Rumiko teria dado para outra pessoa.

A moça interrompe a caminhada e apoia-se na parede de um prédio com a mão esquerda, erguendo a perna direita e dobrando o joelho, no intuito de ajustar seu tênis surrado e velho. Petruz fica parado logo mais adiante e nota, nesse meio tempo, que a mocinha fecha os olhos e respira fundo. Em seguida, com uma virada de rosto bem devagar e desconfiada, ela olha para um beco escuro, do outro lado da rua, e assim fica por uns segundos.

- Alguma coisa errada, Rumiko? - Rumiko não assevera. Mas é melhor irmos andando.

Petruz também olha em direção ao beco escuro e longínquo, mas não vê nada de mais. No entanto, também fica com a sensação de que alguém vai sair dali, portanto permanece parado, observando o lugar.

- Senhor Petruz! – Rumiko lhe chama atenção, poucos passos adiante. O garoto volta-se para a moça, ainda desconfiado, e se aproxima dela em rápidas passadas.

- Não precisa se preocupar com nada, senhor. Rumiko é meio paranoica. - Por que você me chama de senhor? É por causa de minha linhagem? - Iie! É mais por causa do meu Keigo6! - Keigo? O que é isso?

Rumiko responde essa pergunta com um simpático sorriso. Estava tão acostumada a morar no Japão que não conseguia se adaptar ao fato de que agora, muito da cultura nipônica que ela se esforçou para aprender, soaria como novidade ou mesmo bizarrice para outrem. Petruz, porém, imaginando que Rumiko se divertia com sua ignorância, novamente muda de assunto:

- Por quê você se refere a si mesma em terceira pessoa? Ainda observando o garoto sem dizer nada, a moça caminha por mais alguns metros em silêncio e com uma face de confusa, demonstrando não entender porque o ruivo construía tantas dúvidas. Estava na cara de que ele gostava mesmo de conversar, ou de, no mínimo, se meter a fundo na vida dos outros. Seja qual dos dois fosse o motivo, Rumiko estava adorando. Não se lembrava de ter conversado tanto e em tão pouco intervalo de tempo com alguém que não fosse um figurão amigo de seu mestre ou um responsável por algo relacionado aos interesses de seu senhor. Súbito, ela olha para cima, observando uma placa luminosa já quase sobre suas cabeças e diz:

- Chegamos! Petruz focaliza o quê a moça observava e vê um mediano, porém bem ambientado restaurante. A moça pega no braço esquerdo do rapaz e o puxa para dentro daquela taberna sem fazer nenhuma questão sobre suas roupas. E assim que desaparecem dentro do restaurante, há muitos metros atrás, no beco observado por Rumiko, dois vultos surgem das sombras.

- Ela está mesmo por aqui – diz um deles, de olho fixo no estabelecimento onde Rumiko entrou – O senhor Mozu é incrível.

- É sim. – concorda o outro, acendendo um cigarro. - Acha que ela nos viu? - Impossível! Está muito escuro. Além do mais, ela nem nos conhece. - Mesmo assim, vamos seguir de acordo com o plano. Mande dois para o restaurante, mas avise-os

para seguir as ordens. - Claro. Mas e quanto ao garoto? - O que é que tem? - O que vamos fazer com ele quando chegar a hora? - Quem é que vai sentir falta de um mendigo?

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Já dentro do restaurante, que apesar do horário não estava tão cheio quanto deveria, Rumiko diz para o rapaz se sentar próximo à janela que ela lhe indica dirige-se à uma mesinha onde havia os menus. Logo depois volta ao encontro de Petruz e senta-se à mesa. Um garçom encosta-se à mesa deles, com uma face retorcida e falta de pose, tentando deixar claro que ali não era lugar para um moleque de rua e uma moça que não se veste como uma dama. Rumiko lê o cardápio rapidamente e pede o prato de almoço completo do dia, embora já fosse quase hora da janta. O garçom lhe explica que o prato do dia, que no caso era carne assada com macarrão ao molho, verduras cozidas, ovos cozidos, purê de batatas e tantas outras coisas que Rumiko se sentiu inchada só de ler, era servido apenas na hora do almoço. Então ela pede para ele dizer ao cozinheiro para preparar um prato parecido para janta. Em seguida ela faz uma pequena lista do que queria no seu prato, que seria exatamente o mesmo, mas com alguns ingredientes a menos. O garçom anota tudo, mas precisava saber se eles tinham condições de pagar e, portanto, ainda não havia se movido do lugar, escolhendo as palavras certas para perguntar sem ser rude. Antes de ele abrir a boca, a moça pega uma bolsinha em forma de ursinho panda de dentro de sua mochila esportiva e posta sobre a mesa um objeto reluzente. Imediatamente, o homem pede licença e sai de cena, indo às pressas para a cozinha. Petruz olha para o objeto brilhante e só três segundos depois é que ele percebe estar de frente para algo que ele só havia visto em filmes.

- Caramba! Isso é... – ele põe as mãos na boca, depois continua em tom mais baixo – É uma moeda de ouro?

A moça assente com a cabeça e olha enfastiada para as pessoas nas mesas ao redor, verificando seus modos e jeitos de se vestir. Rumiko achava que uma pessoa tem que ter o bom senso de não entrar num lugar que não lhe é apropriado, tanto que ela não escolheu aquela mesa próxima da janela à toa. Havia dois motivos de ela querer sentar-se ali e um deles era porque o lugar era mais reservado e afastado das mesas “preferidas” do restaurante e fora da vista de pessoas metidas à superiores. Mas mesmo que algumas pessoas se trajassem diferentes de outras, isso não dava o direito de alguém, em posição diferente ou superior, julga-las pela aparência. Isso porque muitas pessoas no mundo atual, vitimadas pelos estragos do fim do mundo, poderiam não se vestir muito bem, mas isso não significava que seriam mendigos. Poderiam muito bem ter dinheiro nos bolsos ou mesmo contas nos bancos, aguardando um momento propício de utilizar esse dinheiro. Havia muita gente assim no mundo, principalmente em Vera Cruz. Por esse mesmo motivo que muitos restaurantes e lanchonetes reservavam um lugar para esses tipos de pessoas. Porém, o que Rumiko não havia entendido era que o garçom não estava julgando à ela e sim, seu parceiro Petruz, cuja a única roupa limpa que trajava era o blusão nipônico e rosado de Rumiko.

- Você tem muito dinheiro? – Petruz intervém novamente. - Yô! Tenho 20 moedas de ouro, senhor. - Vi-Vinte? – o garoto quase engasga e toma fôlego para se recompor novamente. - Bom, não são mais vinte. Rumiko teve alguns contratempos. Vinte foi a quantia que Rumiko pode

trazer do Dojo de meu Sensei. - Seu... “Sensei”... Ele é um homem rico? - Dame ne! Mas ele era um homem de visão ampla e, por isso, era também muito trabalhador. - “Era”? O que houve...Por acaso ele...?

Petruz tenta suavizar a intensidade do que pretende perguntar, mas Rumiko antecipa sem rodeios. - Meu Sensei está morto senhor Petruz. Esse é o motivo de Rumiko ter abandonado a vida no Dojo

e iniciar uma procura pelo senhor Oz. Rumiko pretende ressuscitar o mestre Gengetsu, meu sensei.

- RESSUSCITAR? – Petruz se exalta novamente e Rumiko, com uma piscadela, põe o dedo indicador da mão esquerda sobre os lábios, gesticulando um pedido de silêncio.

- Ressuscitar? Isso é possível? - Se Oz existir, sim! - Ressuscitar...! Esse... “feiticeiro” deve seu muito poderoso pra ser capaz disso. Mas qual é o

preço? - O preço, senhor? - Com um poder tão impressionante, ele não deve fazer isso de graça, não é? - De fato, ele não faz tal serviço por caridade.

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- Eu sabia. É por isso que você trouxe moedas de ouro, não foi? - Iie! O preço varia de pessoa para pessoa. E nem sempre é dinheiro. Mas Rumiko sabe de uma

coisa que ele quer muito. - Sério? E o que é?

Rumiko estica-se para frente e Petruz faz o mesmo, deduzindo que ela iria sussurrar um segredo. - O senhor precisa possuir um diamante vermelho para pagar o preço do serviço. Mas tem que ser

um vermelho puro, sem nenhuma modificação química. - Um diamante vermelho puro? Não sabia que existiam diamantes vermelhos na natureza. - Até 1997 existiam apenas quatro deles em todo o mundo. Um deles inclusive foi encontrado aqui

em Vera Cruz. Mas depois do “fim do mundo”, foram encontrados mais alguns. - E você tem uma dessas pedras?

Rumiko sorri com um jeitinho maroto enquanto Petruz leva a mão ao rosto, coçando o olho direito. - Você não tem? E o que vai fazer? - Rumiko sabe onde tem uma delas, senhor.

A mocinha aproxima-se mais, debruçando-se sobre a mesa, estica a mão até a janela e escreve com o dedo indicador a palavra “Ophis” no vidro embaçado pelo frio da garoa. Petruz lê mentalmente a escrita, mas não sabia se soletraria certo, por isso ele pergunta:

- Como é que se lê isso? O quê quer dizer? - Rumiko não assevera. – a moça volta a se acomodar na cadeira – A palavra parece estar em inglês

e Rumiko não sabe nada de tal idioma. - Não acho que isso seja inglês. Mas eu também não sei muito sobre o idioma. O que vem a ser

isso, uma cidade? - Um templo. - Um templo? E onde fica? - Shirenai! – a moça dá de ombros. - O quê? Você... Você não sabe? - Iie! Rumiko não faz a mínima idéia de onde fica, senhor Petruz.

O garoto enerva-se um pouco, mas logo se acalma. Afinal, a princípio, não foi Rumiko que pediu que ele viesse junto e sim o contrário. Nesse momento, dois garçons se aproximam com os pratos que eles pediram. Rumiko havia pedido o prato completo de almoço, ou uma versão noturna do mesmo, porque ele era realmente completo, com tudo de bom que o restaurante servia no domingo. Era o prato mais caro do expediente diário e não era servido à noite, mas como a moça tinha dinheiro, então os donos do restaurante não fizeram questão de discutir com ela. Esse prato é entregue à Petruz e à ela o garçom põe sobre a mesa outro que deveria ser semelhante, mas que não tinha nem legumes, nem carne. Rumiko come sem cerimônia e em silêncio, até que percebe que Petruz está comendo devagar, receoso e olhando para os lados meio sem jeito.

- Dôushita no, Petrus san? Algum problema? - As pessoas... Elas estão olhando para nós, como se fôssemos de outro mundo. - Deve ser por causa de minhas roupas, senhor. Eles devem estar achando-as esquisitas. O senhor

também não gostou delas quando viu Rumiko. - Não, você agora não está tão esquisita quanto antes. Eles estão olhando para mim... Eu estou

imundo, maltrapilho... - Hn! Depois Rumiko cuida disso, senhor. Rumiko já tem algo em mente desde hoje à tarde. - Hã... o que quer dizer?

A menina sorri de olhos fechados e bochechas cheias e volta a se alimentar, não esclarecendo mais nada nos 10 minutos seguintes. Petruz também tenta não ligar para os outros clientes e começa a comer mais despreocupadamente. Estava faminto como jamais esteve em toda a sua vida e há tempos que não via tanta comida. Precisava aproveitar. E para ajudar a relaxar, assim que fitou novamente a palavra no vidro, ele busca mais conversação com a mocinha:

- Como você sabe que tem um diamante vermelho nesse templo? - Rumiko teve uma informação de peso e confiança. - De quem?

A moça toma um pouco do suco de uva que pediu para acompanhar a refeição e observa Petruz com seu rosto angelical, sem dizer nada. O garoto, meio envergonhado, inclina o rosto para seu prato e exclama:

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- Desculpe! Eu estou me metendo demais em seus assuntos, não é? A moça mostra conforto ao garoto e passa um guardanapo descartável nos lábios. Se ela bem se recorda, Petruz já tinha seus dezessete anos, mas parecia pensar como um garoto curioso de doze.

- Rumiko não acha prudente dizer quem foi, senhor, mas posso lhe falar qual era a informação se desejar.

- Não precisa falar se não quiser. - Não há problema algum, senhor. De qualquer forma, acho que o senhor deveria saber. Isso vai

ajuda-lo a testar a veracidade de minhas palavras e ações. - Não! Eu não estou duvidando de nada que você disse, Rumiko. Só estou com vontade de

conversar um pouco. Pode falar de qualquer assunto. - Arigatai! Vamos falar do diamante vermelho então.

Petruz sente uma brisa maior de conforto e balança a cabeça concordando. Ele via nos olhos de Rumiko que ela não desconfiava dele. Ao mesmo tempo em que fazia de tudo para que ele não pensasse isso. A moça olha para o alto por um momento, como se tentasse lembrar alguma coisa e começa:

- O nome dele é Moussaieff Vermelho, se Rumiko não estiver enganada. E como Rumiko já disse, ele é um dos quatro únicos que existe à vista do público.

- A vista do publico? É por isso que você disse que há mais? - Yô! Há alguns outros que ainda não tinham vindo a público antes do acidente climático. Como o

ciclo monetário agora se resume a ouro e prata... - As pedras preciosas de status raro são de valor inestimável – conclui Petruz, já entendendo onde a

menina queria chegar – por isso o mundo só tem conhecimento dessas quatro pedras. - Zattsuraito7! – Rumiko sorri brilhosa, feliz e orgulhosa com o rápido entendimento de Petruz.

Ela termina o restante de seu prato e continua o esclarecimento: - Quando o GIA8 oficializou o Moussaieff para o mundo em 1997, ele já havia sido retirado de

Vera Cruz9 e lapidado numa forma triangular arredondada por uma empresa localizada em nova Iorque10.

- O GIA? O que isso significa? - Rumiko não se recorda no momento, senhor. Mas o fato é que, após a oficialização da pedra,

muitas pessoas foram visitá-lo no museu ao qual ele foi colocado. E no caos que se sucedeu durante os desastres do “fim do mundo”, ele sumiu.

- Mas se eles são raros, você não vai poder usar seu dinheiro para compra-los, não é? - Rumiko não vai compra-los, senhor. Mas vai, de uma forma ou de outra, conseguir esse diamante. - Certo, mas... Eu só não entendi uma coisa. Como é que você sabe que o tal “mussa-alguma-

coisa” está no templo...ahn... – Petruz olha para a palavra quase sumindo no vidro e continua – como é que sabe que ele está no Templo “ófis”?

- Rumiko já disse. Foi um informante que me contou. E Rumiko não perguntou como ele sabia. - Caramba! Você é bem ingênua! - Hun? O senhor acha? - Se eu acho? Bom, vamos ver – Petruz aproxima as mãos ao corpo, gesticulando que ia contar nos

dedos os fatos que iria esclarecer – Você não sabe se Oz existe. E se existir, você não sabe onde ele está ou onde fica sua casa. Você sabe que é preciso um diamante vermelho para realizar seu desejo, mas você não tem. Você sabe de um lugar onde tem um, mas não faz idéia de onde fica esse lugar. Tudo o que você sabe foi ouvido “de boca”, como uma sequência de boatos maldosos ou exagerados... É... – o ruivo abaixa os braços e conclui – você é bem ingênua!

- Oz pode até não existir, mas Rumiko não acredita que o senhor que me deu a informação estava mentindo. Além do mais, se esse templo existir, Rumiko vai achar. Se esse diamante existir, Rumiko vai encontrar. E se Oz existir, Rumiko vai conseguir ressuscitar meu Sensei.

- Se tais coisas realmente existirem, como você sabe que vai encontra-las? A moça abre um largo sorriso e responde enquanto empurra o prato vazio para o centro da mesa:

- Rumiko tem muita sorte, senhor. Petruz corresponde o sorriso e também acelera seu ato de comer, para sair logo daquele incômodo restaurante. Ele percebeu que enquanto Rumiko tivesse fé em sua busca, ela iria em frente e isso era muito inspirador. Além disso, quanto mais demorasse a busca de Rumiko por seu sonho, mais tempo ele teria de sua companhia.

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Nesse meio tempo, Petruz percebe que a moça, mesmo demonstrando sua alegria e conforto, está um pouco apreensiva. Não era da sua conta, mas ele ainda queria conversar e sabia que não tinha nenhum outro assunto que interessasse a sua nova amiga, então ele termina sua refeição e a questiona:

- Alguma coisa errada, Rumiko? Quer sair daqui também? A mocinha puxa o copo de suco para junto de si, leva a ponta do canudo até os lábios e começa a falar lentamente.

- Não dirija o olhar com muita rispidez, senhor. Mas se prestar atenção atrás de Rumiko, verá dois homens de terno. Um de marrom, o outro de cor vinho.

Petruz espera uns segundos antes de olhar disfarçadamente ao lado do ombro da moça, focalizando os suspeitos ao fundo, perto da porta de saída.

- Sim, estou vendo. Um deles está carregando um guarda chuva enorme, não é isso? - Não é um guarda-chuva, senhor. É uma Shikomizue. O outro também está armado. E se o senhor

prestar atenção, há mais dois homens lá fora, do outro lado da rua. O garoto olha imediatamente para fora e realmente vê dois homens de blusas com capuz, ambas pretas, fingindo conversar embaixo do sereno, e nota que eles também portavam algo como bastões, parecidos com aquele que a moça carregava, só que de cores diferentes. Eles estavam do outro lado da rua, embaixo da lona de uma loja fechada. Já fazia um certo tempo que estavam ali e poderiam ficar ali o dia inteiro que Petruz jamais os notaria, mas agora que Rumiko os citou, eles se destacavam mais facilmente das pessoas que passavam. Naquele instante ele também percebeu que não foi por coincidência que a moça escrevera a palavra no vidro, quando poderia simplesmente pegar uma caneta, visível e facilmente adquirível em qualquer uma das mesas, e escrever tal palavra num papel ou num guardanapo descartável. Ela a escreveu no vidro porque, assim, os homens do lado de fora não saberiam se ela estava olhando para eles ou para a palavra escrita. Então o garoto pergunta:

- Quem eles são, você sabe? - São apenas “alvos”, senhor. Não se preocupe com isso. - Alvos? - Yô! Estão nos seguindo desde que saímos do beco. - Será que sabem do que você fez hoje à tarde? - Talvez, mas não é por isso que estão atrás da gente. Do contrário já teriam nos denunciado. - Então... O que será que eles querem?

Rumiko termina seu suco e diz com naturalidade. - Provavelmente estão querendo matar Rumiko.

Petruz arregala os olhos, assustado, porém fica em silêncio e evita outro ataque de pânico. Mesmo porque, gritar não ia adiantar. Então a moça continua:

- Rumiko pensou que havia escolhido bem o restaurante, mas acho que se enganou. - Oh, meu deus, Rumiko. O quê... O quê nós faremos agora? Vamos fugir? - Iie! Rumiko tem planos de passar a noite por aqui. Vamos continuar a caminhada só amanhã,

tudo bem para o senhor? - O quê? Mas...Mas porque? - Há três dias que Rumiko não dorme, senhor. Se vamos começar uma peregrinação devemos estar

bem descansados. O senhor não concorda? - Mas e se...E se eles... - Ki ni Shinai, Ki ni Shinai11! – a moça faz um sinal com a mão, gesticulando para o garoto se

acalmar – Se eles ousarem nos atacar, nós enfrentaremos eles. - Nós...? – o garoto quase se engasga com as batatas fritas que comia.

A mocinha sorri e pede a conta da refeição que fizeram. O olhar livre e brilhante da moça deixava uma clara sensação de que ela realmente não estava se preocupando com os homens que estavam de tocaia. Para finalizar o “almoço” ela pede para o garçom se aproximar e pergunta:

- Por favor, os senhores servem champanhe aqui? - Sim senhorita. - Traga uma garrafa e duas taças então, por favor. - Alguma marca de preferência?

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- Não entendo muito de bebidas alcoólicas. Por isso traga o que melhor lhe agradar. Um que o senhor recomendaria. Tudo bem?

- Sim senhorita. Só um momento. O garçom se vai apressado e não demora a trazer a bebida, abrindo-a em seguida. Rumiko enche as duas taças até a metade, serve uma para Petruz e diz para ele que é para comemorar.

- Comemorar o quê? - O nosso breve encontro. O senhor ajudou muito hoje e Rumiko quer que o senhor saiba que está

muito agradecida. - Você salvou minha vida só hoje por duas ou três vezes. Quem está agradecido sou eu. - Oro? O que quer dizer, senhor?

Petruz apenas sorri e toma o primeiro gole de seu champanhe, sem mais se importar com os olhares dos outros fregueses e sem se preocupar com os ditos alvos que Rumiko mencionara. Ainda estava com medo, mas a tranquilidade de Rumiko era contagiante.

- Três dias sem dormir, é? E o que esteve fazendo durante esse tempo? Rumiko inclina-se e pega sua mochila, tirando duas revistas de uma abertura lateral e estendendo para Petruz.

- Lendo. – ela responde finalmente. O ruivo vê as capas das duas revistas e franze a sobrancelha.

- “Contos de Fadas: A lenda de Oz” – ele lê em seguida o título da outra capa – “Alpinismo e Educação: montanhas do Fim do Mundo”.

Logo depois, Rumiko coloca um livrete sobre a mesa, que Petruz, após servir-se de outra taça de champanhe, a pega e lê em seguida.

- “Pedras preciosas e raras – Os mistérios dos diamantes” - Rumiko também comprou um livro com desenhos pra colorir e uma caixa de lápis de cor, mas

deixou no trem. - Como é? Você está falando sério. - Sim – a moça balança a cabeça algumas vezes, afirmando – Era uma revista grande, de capa dura,

então Rumiko decidiu não trazê-la consigo. - Não! Eu quero dizer..., você comprou uma revista com desenhos para pintar? - Hun? E o que há de errado nisso senhor? - Nada... – o rapaz coloca a mão na boca – Nada não.

Petruz não queria rir, mas não consegue se segurar. Rumiko o observa com seu rosto sorridente, aparentemente satisfeita por também fazer Petruz sorrir. Pouco depois, o rapaz folheia rapidamente o livrete para ver mais ou menos do que se tratava. Não demorou para ver a foto de um diamante vermelho, apelidado de “Pedra de Fogo” e citado ali como raríssimo e inestimável. Agora Petruz entendia o porquê de Rumiko saber tanto sobre o diamante e sobre Oz, mas não havia entendido porque ela comprou uma revista de alpinismo. Minutos depois, após terminar a segunda taça, ele percebeu que Rumiko não havia nem sequer tocado em seu próprio copo depois que o serviu.

- Você não vai beber? - Rumiko não pode tomar nada alcoólico, senhor. - Por que não? - Meu sensei não aprovaria. - E não come carne também, pelo visto.

Rumiko ergue as sobrancelhas, demonstrando não compreender o argumento e Petruz explica, apontando para seu prato vazio.

- Reparei que a sua refeição foi a mesma do minha, mas no seu prato não veio carne. É vegetariana, por acaso?

- Rumiko é Ovolactovegetariana. - Ovo... lacto...? Mas eu vi você comer ovos. - Um ovolactovegetariano só não come carne vermelha, senhor Petruz. - Hummm... E no caso do álcool, porque pediu champanhe então? Porque não pediu uma soda ou

um outro suco? A mocinha abre um sorriso mostrando seus dentes brancos e perfeitos:

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- Por que vocês homens adoram álcool. A sakazuki12 de meu sensei sempre continha sake quando ele estava descansando ou sem nada para fazer.

- É, mas nem todos os homens são assim. Além do mais, há mulheres que bebem álcool também. - Hai, hai, Wakateru Yô! Mas o senhor gosta de champanhe. Principalmente depois do almoço. - Sim, mas... – nesse momento Petruz tem um surto de curiosidade – Espere aí! Como...? Porque

você acha que eu gosto de champanhe após as refeições? - Porque seria estranho se não gostasse – responde a moça simplesmente.

Petruz observa Rumiko em silêncio, termina seu copo, serve-se de uma última taça e, quando pensa em fazer outra pergunta relacionada ao fato de ela saber tanto sobre ele, a moça interrompe suas intenções ao retirar um pedaço de papel do bolso e coloca-lo sobre a mesa dizendo:

- Kore! Mite o’ Kudasai. - Como é que é? - Veja isto por favor – traduz ela rapidamente, fazendo uma leve mesura com a cabeça – é mais

sensato dizer ao senhor o que Rumiko pretende fazer agora, já que ficaremos juntos por um tempo.

Petruz olha para o pedaço de papel na mesa, depois pega meio temeroso por estar escrito algo em japonês, já que ele não iria entender nada. Mas quando olha com calma, tudo o que vê são três nomes que pertenciam aos seguintes representantes políticos: Caio Velasqueses, ex-presidente do conselho superior dos três poderes da Ilha de Vera Cruz, hoje nas mãos dos Honoráveis. Ele também é o último presidente de conselho remanescente de toda a América do sul, já que depois dele nenhum outro foi eleito ao cargo; Xeique Keril Alifah, líder palestino que, antes do incidente com o mundo, era representante de pelo menos metade dos países e estados da Ásia, a outra metade não era de sua alçada, mas os responsáveis por ela tinha um certo débito com sua pessoa. Atualmente sua função também é supervisionada pelos Honoráveis; E por último Lomar Armstrong, chefe do conselho político da nova e, hoje independente, Inglaterra, tendo com isso, quase tanto poder quanto a própria família real do país. Foi o responsável por manter a Inglaterra nos níveis de país de primeiro mundo ao iniciar um plano audaciosos que unificou outros países à um único pedaço de terra, dando origem à Nova Inglaterra. Além disso, conseguiu força de trabalho exterior, que manteve os ingleses livres de afazeres obrigatórios para, assim, poderem se preocupar com suas próprias vidas. Em se tratando de política mundial, esses três homens eram muito superiores aos outros políticos comuns, mas agora só são lembrados e ainda respeitados por sua importância no passado. Contudo, eles têm a grande tendência de se tornarem o líder supremo do planeta, porque são vistos como os mais competentes para o cargo. Levando em consideração de que a pessoa que se sentar no trono do Líder Supremo irá mandar em todos os chefes de cada país da Terra, escolher alguém que já esteve no controle de mais de um país ao mesmo tempo seria a decisão ideal, pois esta pessoa saberia como reagir sob esse tipo de pressão e responsabilidade. A mocinha apóia o queixo nas mãos e explica, com seu rosto simpático e carismático:

- Essas são as três pessoas mais influentes no mundo da política atualmente e as mais prováveis de se sentarem no trono de Gilgamesh. Depois que elas caírem, o mundo político ficará desestabilizado por pelo menos dois anos e as eleições para o Líder do mundo serão adiados para, no mais cedo, 2.018.

- Espere um pouco. Caírem? Você quer dizer...? – Petruz faz um olhar de que entendeu a palavra “cair” no sentido de “morrer”, e Rumiko fecha os olhos concordando e concluindo.

- Rumiko vai matá-los, senhor Petruz. E essas tarefas vieram em um momento bem oportuno, porque durante o período de um ano, Rumiko não pode deixar ninguém subir ao trono de líder do mundo.

- P -Por que não? Rumiko arregala seus olhos e exclama com vivacidade:

- Por que o líder desse mundo será meu sensei. Esse era o desejo dele e ele é, de fato, a pessoa mais qualificada para o cargo.

- Mas o seu sensei não está...? Ah é mesmo. É por isso que você está à procura de Oz.

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- Yô! E Rumiko só tem o prazo de um ano para ressuscitar o sensei. Por isso, nós vamos primeiramente eliminar essas pessoas e desestabilizar o sistema político.

- Nós? Ei, espere um pouco aí Rumiko. Mesmo com seus poderes diminuídos, esses aí são homens importantes. Iremos correr risco de vida se tentarmos matá-los. Sabe disso, não é?

- Hai! – a menina parecia estar com fogo nos olhos – Isso não deixa o senhor animado? Só se dá importância para vida quando a mesma está em perigo de se acabar.

Era um convite ousado e descarado da parte de Rumiko e ela sabia que com isso estava pressionando o ruivo numa parede. Mas não estava se importando muito com isso. Nos últimos dois ou três anos, Rumiko sentia-se chateada, incomodada, incompleta, só não sabia bem por quê. Petruz substituía essa falta, pois tinha alguma coisa nele que ela gostava. Além do mais, Petruz não tinha para onde ir, então Rumiko achou que não custava nada arriscar e pedir por uma união, mesmo que breve, pois ela não se sentia especial o suficiente para achar que, em sua jornada, fosse encontrar outra pessoa que não se importasse de desperdiçar alguns dias ao seu lado. Petruz, porém, abaixa a voz e a cabeça, retrucando:

- Ei, ei, calma aí, Rumiko! Eu não penso assim. Hoje demos muita sorte no caso do vice-prefeito. Mas não quero correr o mesmo risco de novo. Eu prezo demais a minha vida.

Nesse momento a chama de excitação dos olhos de Rumiko diminui, mas ela não desfaz o sorriso. A moça fica em silêncio por uns instantes e então pega sua bolsinha em formato de urso panda, faz um gesto com a mão, chamando a atenção do garçom e lhe entrega uma nota de cem bedinas. Dava para pagar a conta e ainda sobrava muito, então ela pede para o garçom trazer duas garrafas médias de vitaminas. Petruz fica incomodado com o silêncio súbito da moça. Sabia que ela tinha ficado chateada e precisaria encontrar um jeito de se desculpar, afinal, acabara de comer como nunca na vida, sendo que, horas atrás, estava para morrer de fome. Mas ele realmente não queria correr risco de vida. Ninguém quer. Rumiko, por sua vez, jamais iria deixar um garoto comum passar pelos mesmos perigos aos quais ela estava acostumada enquanto viva sob o teto do Gen-Bu, mas realmente ficou desapontada em saber que Petruz não compartilhava o prazer de passar por tal sensação de emoção e perigo. Todos os “rapazes” que ela viu entrarem e treinarem no Gen-Bu, só tentavam fazer parte do grupo porque tinham, além de tudo, um “quê” de aventureiros. Outro motivo do convite era que ela também não queria seguir viagem sozinha, sem alguém para ao menos conversar. Mas no fundo ela sabia que era melhor não envolver pessoas inocentes em suas loucuras de aventureira destemida, porque seu mestre lhe ensinou que com a vida não se brinca. Nem com a própria e muito menos com a dos outros. Rumiko nunca aprendeu a ser tão responsável quanto Gengetsu queria que fosse, porque ela sempre o tinha às suas costas, dando sermões, broncas, conselhos e acima de tudo, proteção. Agora ela sabia que não tinha mais jeito. Estava na hora de aprender a ser mais adulta. Rumiko chama Petruz para irem embora ao mesmo tempo em que se levanta para receber o garçom que lhe trazia o troco e as duas garrafas de 450 ml de vitaminas. Rumiko pega as garrafas, entrega uma à Petruz, porém não aceita o troco e diz que vai deixar como gorjeta para os garçons que a serviram, mas com uma condição. Condição essa que Petruz ficou sem saber, pois ela pede para o garçom se aproximar e cochicha em seu ouvido.

- Como queira senhorita – diz o garçom, permanecendo no lugar assim que Rumiko se afasta com Petruz.

Ao passar pelos dois homens de terno, que fingiam tomar uma cerveja e olhar o ambiente, Rumiko interrompe a caminhada e fala num tom que fosse baixo, mas que desse para ao menos um dos homens ouvir:

- Senhores, aquela garrafa de champanhe ainda está cheia e gelada. Também deixei quatro refeições já pagas aos senhores e seus acompanhantes. Sirvam-se, por favor, e não nos sigam mais.

A moça retoma a caminhada enquanto um dos homens a acompanhava com os olhos, tentando imaginar como ela descobriu que eles estão atrás dela. Em seguida, Rumiko avisa à Petruz para não correr, mas que desse uma acelerada no passo, assim, ambos saem apressados do local. A moça teve o trabalho de memorizar boa parte dos rostos que estavam presentes na primeira fila da palestra do vice-prefeito, que poderiam reconhecê-la e, quando entrou no restaurante, certificou-se de que não havia nenhum dos rostos por lá. Foi nesse ínterim que ela percebeu

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os dois homens de terno. Eles não estavam na palestra, mas desde algumas horas antes de ela e Petruz se reencontrarem no beco, que Rumiko desconfiava de que estava sendo seguida. E agora ela tinha essa confirmação. Ela queria evitar um confronto dentro daquele restaurante, pois, se não o fizesse, teria de fugir novamente e agora, após a clara declaração de que Petruz não queria mais se envolver com ela, Rumiko estava ainda mais preocupada com ele. Precisava tirá-lo de sua vida o quanto antes, mas primeiro, gostaria de agradecer pela ajuda e disposição com a qual foi recebida por ele e por isso, iria colocar o plano que ela afirmou ter em mente desde aquela tarde. Os homens do outro lado da rua os veêm sair, mas não esboçam nenhuma reação. Rumiko também avisa à Petruz para que ele não dê atenção, e seguem em direção à uma loja de roupas enorme e chamativa, pouco mais abaixo da rua principal. O coração de Petruz estava acelerado. Ele temia que um ataque rápido lhe viesse pelas costas e lhe retirasse a vida, mas ao notar que Rumiko está com um olhar tranquilo, com um sorriso despreocupado e ainda por cima está à cantarolar baixinho, ele se acalma um pouco.

- E agora? – diz um dos homens dentro do restaurante. - Bom... não podemos mais esperar. Avise o chefe de que vamos agir ainda hoje. - Hoje? - Ela já sabe de nossa presença, então não vamos perder mais tempo. Vamos agir hoje. - Muito bem. Já sabe aonde ir e o que fazer? - Sim. Deixa comigo. Partirei imediatamente. - Espere um pouco... – um dos homens segura o outro pelo braço e observa a mesa preparada para

quatro pessoas, com quatro refeições já pagas e prontas para serem servidas e uma garrafa de champanhe sobre ela – ...não precisa ser tão rápido. Vai lá fora e chame os outros, eles devem estar com fome.

Uma mulher loira, alta e muito bonita, que se vestia com roupas sociais e bem elegantes, olhou feio para Petruz e Rumiko, quando ambos adentraram na loja de roupas. Já era tarde, quase onze da noite e, por isso, a mulher achou que fossem um casal de mendigos ou pior, de assaltantes. Havia dois seguranças no local, um em cada lado da entrada e portando sabres pendurados no cinturão. Eles notaram a mochila-saco nas costas de Rumiko e perceberam a ponta de uma espécie de bastão saindo pela boca amarrada. Não fizeram, contudo, intenção de impedir o casal de entrar. Um outro rapaz magro, também com madeixas louras e bem vestido, se aproxima de Petruz e pergunta o que ele quer. Petruz por sua vez não responde, ele simplesmente aponta com o queixo para Rumiko, que já ia mais à frente, desinibida como sempre, dando a entender que ele estava com ela. O rapaz então dá um olhar desprezível para Petruz e caminha em direção de Rumiko. A mulher loira também se aproxima de Rumiko, faz um gesto para o atendente ficar de olho no rapaz e posta-se na frente da mocinha sorridente. Rumiko interrompe a caminhada e inclina-se rapidamente para mulher, dizendo um “oi” em japonês. A mulher, que pelo visto era a dona ou responsável pela loja, não dá atenção e pede educadamente para Rumiko se retirar, pois ela já estava fechando a loja. Rumiko desfaz o sorriso, passa uma olhada rápida pela loja, até onde seus olhos podem alcançar e comenta:

- Mas a loja ainda está cheia de clientes, senhorita. - Eu sei, mas eles também já vão sair. Além do mais, não vendemos roupas de mau gosto como as

suas. - Oro?

A mulher havia notado, abaixo da blusa e no lado esquerdo do peito da camisa que Rumiko usava, o sinal da Fahrenheit, nome de uma fábrica de roupas especializada em fazer, para os ocidentais, roupas no estilo nipônico. Rumiko não obtinha suas peças lá, pois as roupas orientais que ela usava eram originais japonesas ou chinesas. Mas ela gostava das camisas que eram feitas pela Fahrenheit, não pela aparência, mas sim pela textura usada. A ofensa da mulher, contudo, foi totalmente proposital e não foi dirigida à preferência de marca de roupa da mocinha. Havia visto algo do tipo acontecer em um filme americano, onde uma garota de programa era contratada por um milionário e passa a viver com ele, frequentando festas luxuosas e lugares maravilhosos, mas que não perde seu ar de “pobreza”. Ela sabia que Petruz não seria “o milionário” em questão e achava que,

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com isso, iria jogar o orgulho de Rumiko no chão, fazendo com que ela se zangasse e decidisse assim, ir embora e não voltar nunca mais. No entanto, Rumiko deu risada do comentário da mulher.

- A senhorita também não gostou das roupas de Rumiko. Então acho que preciso mudar meu figurino. Mas de qualquer forma, Rumiko não veio aqui procurar roupas para si, mas sim, para o meu amigo ali.

A moça aponta para Petruz, que já estava próximo da porta de saída, querendo loucamente ir embora por causa do desconforto e embaraço que sentia. A mulher elegante cruza os braços e, com um sorriso cínico ela retruca:

- Nós também não temos roupas para dar aos mendigos. Voltem no ano que vem e, quem sabe, talvez tenha alguma coisa para doar.

- Mas Rumiko não disse que quer roupas doadas – a moça tira seu “ursinho panda” da mochila cilíndrica e estende a mão fechada para a loira – Rumiko está aqui para compra-las.

A mulher abre a mão instintivamente e Rumiko deposita sobre ela duas moedas de ouro. Os olhos da mulher arregalam e uma vergonha enorme toma conta de seu espírito de tal forma que ela quase ficou de joelhos e pediu desculpas. Rapidamente, ela pediu para seus dois atendentes darem total atenção à Petruz e diz à outro rapaz, com o crachá de chefe de vendas no peito, que fique responsável pelo tratamento que seria dado ao ruivo. Rumiko cruza os braços e sorri pasma com o poder que o dinheiro tinha sobre as atitudes dos humanos. E fica pensando em como seria o mundo antes do sistema monetário comprar a alma das pessoas. Petruz é convidado a sentar-se perto de uma área onde tinha vários locais para experimentar as roupas que comprasse. Os atendentes não se preocupavam mais nem com o estado do garoto, sujo e mal vestido. Petruz não queria abusar muito da bondade de Rumiko, então ele pegou apenas algumas camisas sociais, quatro calças, sendo duas Jeans, uma social e uma de moletom, e comprou também um tênis e dois pares de sapato dos mais baratos que pode encontrar naquela loja cara e chique. Além, é claro, das importantes roupas de baixo. Enquanto o garoto experimentava as peças, com o máximo de cuidado para não sujá-las, a dona da loja se aproximou novamente de Rumiko com um sorriso amarelo no rosto.

- Acho que esqueci de me apresentar. Meu nome é Fátima. - Hajimemashite, Fátima san. Rumiko desu – responde Rumiko também sorrindo, com a diferença

de que seu sorriso era sincero – prometo que não vamos demorar muito. - Oh, não. Pode demorar o quanto for preciso. - Mas a senhorita disse que já estava quase fechando a loja. - Sim, eu disse, mas... acho que podemos esperar vocês se decidirem. - Arigato Gozaimasu!

A mulher permanece ao lado de Rumiko, meio nervosa, meio envergonhada. Então ela continua seu “negócio”.

- A senhorita não vai querer comprar alguma coisa? Temos roupas que ficariam muito bem na senhorita.

- Domo Arigato, mas Rumiko não gosta do tipo de roupas que são vendidas aqui. Fátima esbugalha os olhos, sentindo como se uma faca de gelo varasse seu coração. Era a loja mais cara, grandiosa e chique da região. Mulheres de várias partes da cidade vinham até ali no intuito de procurar roupas para uma ocasião especial. Para uma “criança” dizer aquilo, Fátima só tinha uma explicação em mente; achava que Rumiko estava dando o troco pela rudeza com a qual ela os tratou. Troco esse bem merecido, ela acreditava.

- Ah, sim... Desculpe... – replica a mulher num tom baixo e reprimido – Eu não tenho um gosto bom o suficiente para lhe agradar...

No entanto, para uma nova surpresa, Rumiko balançou a cabeça negativamente e respondeu. - Dame ne! A senhorita tem muito bom gosto para roupas. É a mulher mais bonita da loja. Mas

Rumiko não acha que as roupas vendidas aqui ficariam bem nela. - Porque não?

Rumiko torce o bico, observando a loja e pensando numa resposta que satisfizesse Fátima. Gostaria de falar a verdade e dar uma resposta direta, afirmando que aquelas roupas, que faziam as mulheres parecerem bonecas de porcelana, também eram, como ela costumava dizer, roupas de maricas13. Por ser uma loja que vendia roupas para eventos especiais como festas ou reuniões, não havia nela uma seção de roupas esportivas, única seção que Rumiko procuraria se entrasse ali para comprar roupas para si.

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Resumindo, toda peça de roupa dedicada às mulheres se resumiam à saias curtas e apertadas ou longas e rodadas; vestidos com cortes laterais ou sem cortes, mas com as costas à mostra; vestidos sociais com alças finas ou sem alças, mas que se apoiassem na altura dos seios... enfim, somente peças belas, chiques e caras que enalteciam as partes mais voluptuosas de uma mulher. E Rumiko levou muito tempo para vencer as fraquezas de sua feminilidade a fim de poder ser tratada pelos membros do Gen-Bu como um soldado e não como uma simples “mulherzinha”. Por esse motivo, ela não gostava de mostrar nem seus ombros. Numa última olhada para Fátima, ela vê que a mulher ainda esperava uma resposta.

- Rumiko não tem o costume de ir à festas ou eventos, senhorita Fátima – responde ela enfim. - Humm...! Acho que entendi.

Fátima deu uma olhada em Rumiko, examinando-a sem levantar muita suspeita. Era uma mocinha bonita, mas que não tinha nenhum acréscimo à sua beleza natural de menina. Rumiko tinha cabelos negros, lisos e organizados e, embora estivessem envoltos numa única, ridícula e enorme trança, dava para se perceber que estavam um pouco ondulados pelo fato de eles serem lavados com mais frequência que o normal e não serem penteados devidamente. Seu rosto era limpo e aparentemente macio e sua pele clara e meio rosada era tão linda, que chamava desesperadamente por um bom tratamento de pó de arroz. Mas apesar disso, ela não tinha nenhum traço de maquilagem, nenhum pingo de creme facial, não possuía sequer furos nas orelhas, portanto também não usava e nunca usou brincos ou qualquer outro tipo de adorno. Fátima não se conformava como uma mocinha tão simpática, que escondia um corpo que demonstrava ser um modelo perfeito para se experimentar todo e qualquer tipo de visual, pudesse ser tão descuidada consigo mesma. Por isso, quando Fátima disse que entendeu, ela na verdade achou que Rumiko não gostava de se vestir como uma dama. Quando Petruz finalmente saiu de um dos vestiários, já tendo experimentado todas as roupas que iria levar, mas ainda usando seus trapos de mendigo, ele se aproximou de Rumiko e disse: “- Pronto”. Rumiko olhou para a sacola de Petruz e viu que não tinha roupas o suficiente para se passar um fim de semana.

- Senhor Petruz, o que o senhor está levando é pouco. Não tenha receio de pegar mais peças. - Estas são o suficiente. Depois compramos mais em outro lugar, se precisar. Vamos embora, por

favor. - Hai! – Rumiko se volta para Fátima e pede para ela ver o quanto daria aquelas peças.

Com medo de gastar o dinheiro de Rumiko, Petruz pegou peças de roupas que lhe agradasse, mas que não fossem muito caras. Nisso, o resultado final foi de quase a metade do valor referente à uma moeda de ouro, ou seja, menos que 500 bedinas. Como Rumiko mostrou à Fátima duas moedas logo de cara, a mulher tentou incentivar Petruz a gastar mais. Mas Petruz não foi seduzido pelo poder de venda de Fátima e, irritado por causa da mudança de tratamento da mulher, lança um olhar penetrante e odioso para Fátima e se retira antes de Rumiko, ficando a espera dela lá fora. Sempre foi tratado como um príncipe em qualquer lugar que chegasse. E agora, ser visto como um indigente era muito difícil para ele. Mas também era bom, porque lhe estava sendo mostrado um mundo que ele só via pelos mesmos olhos de pessoas fúteis como Fátima.

- Por que será que ele está tão bravo? – diz Rumiko em voz alta, enquanto olhava Petruz se afastar. Rumiko entregou uma moeda de ouro ao caixa e pediu para Fátima adicionar duas blusas masculinas. Peças que Petruz não havia comprado porque o valor das mesmas estava alto devido ao tempo frio que fazia. E também porque sua sensatez o avisou que o dinheiro não era seu. Assim que recebe o troco, Rumiko agradece ao rapaz do caixa e se despede de Fátima. E quando está quase próxima da porta de saída, Fátima pede para que ela espere. O coração da dona da loja estava apertado demais e ela precisava se desculpar com os dois, principalmente depois de lembrar da cara de raiva com que Petruz olhou para ela. Então Fátima se aproxima de Rumiko e se desculpa formalmente.

- Senhorita Rumiko, eu...gostaria de me desculpar pelo modo como os tratei. - Do que está falando? A senhorita nos tratou como clientes. - Não... eu me refiro à rudeza de como os tratei assim que chegaram aqui. Espero que possa me

perdoar. - Daejôbu Desu, Yô14! – responde Rumiko mostrando seus dentes num largo sorriso – Existem duas

regras no mundo dos negócios de vendagem. Uma delas é que o freguês é medido por sua

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aparência. Se o cliente parecer-se com um pescador, você não deve vender à ele um peixe, mas sim, uma vara de pescar. Meu mestre me ensinou isso.

- Sim, você está certa. Meu pai, o antigo dono desta loja, também me ensinou algo parecido, mas eu acho que não estou dando conta do recado. Essa regra não nos dá o direito de tratar alguns clientes como se fossem lixos.

Realmente, Fátima se recorda que, quando a loja ainda era comandada por seu pai, havia uma clientela maior e mais fiel. Depois que ela assumiu e mudou a política da loja, como parar de doar roupas com defeitos e priorizar a vendagem ao máximo possível, mas sem facilitar para o comprador, a frequência de aparição dos fregueses não sumiu, mas diminuiu de certa forma. Porém a visão de Rumiko estava acima disso, então ela acalma o coração da moça.

- Esta regra é a que alimenta seus filhos e filhas, senhorita Fátima. A senhorita deve parar de se culpar agora. Melhorar seu ponto de vista dos futuros clientes é uma coisa boa, mas não mude por nossa causa, porque Rumiko entende perfeitamente o porquê da senhorita ter nos destratado.

- Entende mesmo? - Uhn! Se Rumiko tivesse uma loja de roupas ou de qualquer outra coisa, gostaria que ela fosse

administrada por alguém como a senhorita. Vosso pai deve estar orgulhoso de você. Rumiko se curva em reverência à Fátima e se volta novamente para a saída. Antes de ela atravessar a porta, Fátima grita:

- Você sabe qual a outra regra importante do mundo dos negócios? - O cliente sempre tem razão – responde Rumiko com seu animado jeito de ser.

A moça sai pela porta, acenando com a mão num último gesto de despedida e some da vista de Fátima. Lá fora, Petruz irritado com a espera começa a falar bobagens sem sentido, enquanto Rumiko tenta se desculpar. Meia hora depois, a loja já estava quase vazia, então Fátima chamou seus empregados e disse-lhes para avisar aos clientes restantes que iriam fechar. Depois ela chama o chefe de vendas, aquele que serviu Petruz, e lhe diz para reunir todas as peças de roupa que estava há meses num enorme quarto ao fundo da loja, e que seriam devolvidas à fábrica no fim daquele mês. Pede também para ele colocar junto a essas roupas, as peças da loja que não seriam vendidas por estarem com defeitos como manchas e costuras mal feitas, e também as roupas que estavam ali na vitrine há tempos e que também não seriam vendidas. O rapaz repassa as ordens aos empregados da loja, que começam a fazer o serviço imediatamente para poderem ir para suas casas descansarem. Num dado momento, o chefe de vendas se aproxima de Fátima e pergunta:

- O que a senhora vai fazer com tantas peças roupas? - Vamos doar – responde a mulher com um sorriso verdadeiro, raramente visto em seu rosto. - Doar? – pergunta o rapaz confuso. - Sim. Tem uma casa ótima... Uma espécie de exército da salvação para as vítimas que ainda

sofrem os sintomas do fim do mundo, e que aceita doações de roupas e comidas, logo adiante, no fim da rua.

- Eu sei, mas... Doar? Até mesmo as roupas que estão na vitrine? - Também. Além do mais, precisamos trocar as roupas da vitrine de vez em quando, não é? - Mas teremos de pagar por aquelas roupas, minha senhora. Seria melhor tentar devolve-las. - Tudo bem, eu pago.

Fátima se aproxima da vitrine e vê outros clientes de ainda a pouco, indo em direção à cadeia de alojamentos da cidade, procurando um ponto de táxi ou um lugar para dormir, sumindo aos poucos na escuridão da noite. Logo, ela murmura em voz alta.

- Eu sinto que a presença dessa moça aqui hoje não foi coincidência. - O que quer dizer senhora? - Eu me sinto como se... Como se minha alma já estivesse com um pé no inferno e, de alguma

forma, essa moça veio me avisar disso para que, assim, eu pudesse encontrar um jeito de me salvar.

O rapaz ficou olhando sua patroa com cara de perdido e ela, em contrapartida, disse para ele esquecer o que acabara de ouvir. Fátima diz um “obrigado” baixinho e manda o rapaz voltar ao trabalho.

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Petruz olhou para a sacola de roupas em suas mãos, não acreditando no que acontecia consigo. Desde que perdeu seu pai e passou a morar nas ruas, ninguém lhe dava sequer um “bom dia”. Mas agora que conheceu essa estranha mocinha, os momentos que estava passando ao lado dela pareciam um sonho. Ele se recorda com pesar do momento no restaurante, em que ele apagou a chama de alegria da moça, quando ela indiretamente o convidou para participar de sua busca. Seriam aventuras perigosas e ele realmente não queria se envolver, mas seu coração estava meio incomodado com o trabalho que tem dado à moça até então, sem dar nada em troca.

- Prometo que assim que puder, eu lhe pago por isso, Rumiko – diz Petruz, adiantando o passo. A moça abre seu sorriso carismático para ele, mostrando-se feliz por ver que ele está mais equipado contra o tempo.

- Daijobu Desu! Considere isso como um presente, senhor Petruz. Rumiko não espera e nem quer que o senhor me pague de volta.

- Até blusas você comprou. Elas estavam tão caras. - Hun! Agora o senhor já pode devolver o Hanten15 de Rumiko. - Hanten? – Petruz leva alguns segundos para perceber que Rumiko falava do casaco nipônico que

ele ainda estava usando. - Oh! Claro... desculpe. - Não precisa ser agora, senhor – a moça ri com o desespero do garoto, tirando a blusa no meio da

rua e no frio. Petruz se ajeita, arrumando o Hanten sobre o corpo e pronuncia entristecido.

- Você está chateada comigo? - Orô? – Rumiko inclina a cabeça para o lado – Dôushite? - Quando eu disse que não queria me envolver em seus planos futuros, você pareceu meio

desapontada. - Gomen Ne. Rumiko está envergonhada por deixar escapar seu desaponto. Mas Rumiko entende o

senhor, afinal, como dito, isto não é nenhum turismo. Fique comigo só por hoje senhor. Amanhã Rumiko promete que o deixa em paz.

Petruz engasgou. Não era bem assim que ele via a situação. Rumiko pode ter sido a primeira assassina que Petruz conheceu, mas ele já sabia que pessoas assim existiam. Afinal, ele era filho de um político respeitado por uns e odiado por outros. Por esse motivo, não foram poucas as vezes em que alguns “amigos” de seu pai lhe ofereciam opções de serviços relacionados aos conhecidos “assassinos sequazes”, para acabar com aqueles que queriam ver o mal dele. E como o bom judeu que sempre foi, Álvaro jamais aceitou. Os dois jovens andaram em silêncio por longos minutos até que chegam em um local onde edifícios e moradias de vários tipos alugavam quartos para passarem a noite. Com o mundo em pedaços do jeito que estava, era muito comum encontrar cadeias de aluguéis por toda a parte, desde hotéis, motéis e os famosos e crescentes sleep-and-breakfast, que nada mais eram do que casas ou prédios construídos unicamente para visitantes e transeuntes pernoitarem. Até mesmo as moradias enormes que antes pertenciam a alguém importante ou de posse e que hoje estão abandonadas, são postas para alugar para várias pessoas e mesmo famílias. Rumiko entra em um dos prédios, sem sequer escolher se há um melhor entre os muitos deles e se aproxima do balcão, olhando em seguida para Petruz, que se posiciona ao seu lado. E assim fica por alguns segundos, até que o rapaz retorna o olhar para ela e pergunta:

- O quê? O quê foi? Rumiko dava a impressão de que olhava para Petruz, mas sua visão real focalizava um homem de blusa cáqui perto da porta, conversando com um dos guarda-costas que tomava conta do motel. Mais uma vez, ao saírem da loja de Fátima, ela havia notado que um homem parecia os seguir e por isso escolheu um motel a dedo. O olhar da moça volta a brilhar quando Petruz pergunta novamente o que estava acontecendo.

- O senhor se importa de dividir um quarto com Rumiko? - Hã...? Ah, bem eu... Tudo bem...eu acho. - Se quiser, Rumiko pode pagar um quarto separado para o senhor. - Mas o que é isso? – intervém o homem que estava atrás do balcão – Vocês estão brigados? Isto

aqui é um motel. Se vocês são namorados devem dormir juntos.

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- O senhor tem razão – replica Rumiko rindo sem jeito, remexendo no seu “ursinho panda” – um quarto, por favor.

- Duas centopeias, senhorita. - O que? – espanta-se Petruz – duzentas bedinas? Mas isso é um absurdo. - Heki da yo! – Rumiko concorda, colocando as cédulas no balcão. - Mas Rumiko... esse lugar... – Petruz abaixa a voz para o balconista não ouvir – esse lugar é uma

espelunca. - Heki, Heki! – a moça abana a mão, num gesto nipônico que Petruz não entende.

O raciocínio rápido de Rumiko fez com que ela deduzisse que essa seria a melhor opção. O homem ao fundo, perto do portão chegou pouco depois de Rumiko e Petruz. Ele era um dos homens que Rumiko vira há pouco mais de uma hora atrás, no lado de fora do restaurante. Fingia pedir informações para o guarda-costas, mas na verdade ele já estava à espera de Rumiko, pois sabia que ela apareceria ou por ali, que era a segunda cadeia de motéis da região, ou pela primeira, situada a quilômetros de distância daquele local, em direção oposta à loja de roupas que Rumiko entrou, e que também estava sendo vigiada por outro homem. Rumiko queria que Petruz dormisse em um quarto separado, pois assim ele não correria riscos. Mas quando o balconista fez menção de eles serem namorados, a cabeça de Rumiko criou uma série de dúvidas, filtrou-as em muitas opções e rapidamente escolheu a melhor delas. Petruz era de menor, aquilo era um motel e um casal não poderia dormir separado a menos que contratassem os acompanhantes horrorosos oferecidos pela região, como prostitutas e garotos de programa, e que tinham permissão dos estabelecimentos para oferecer seus serviços e se disponibilizavam para os solteirões de plantão. Rumiko escolheu um motel caro, apesar de vagabundo, porque esses atributos lhe davam os ingredientes que ela precisava no momento. Por ser vagabundo, os clientes não poderiam reclamar muito do atendimento e portanto não seriam incomodados com “serviço de quarto”. E por ser caro, o estabelecimento tinha como política não futricar na vida do casal em questão e muito menos dar informações sobre os mesmo à terceiros. Muitos assassinos, conspiradores e até políticos se valiam desse artifício para suas noites proibidas e, portanto, apreciavam lugares assim. Os motéis, no entanto, não permitiam que alguém de menor contratasse um dos acompanhantes sem antes fazer um levantamento sobre a vida da pessoa e se acaso descobrissem quem Petruz era na realidade, se acaso descobrissem que ele era filho de um governador famoso e que hoje vivia como um mendigo, de uma forma ou de outra a ligação dele com o assassinato daquele dia seriam interligados. Esse fato envolveria muitas pessoas que Rumiko queria evitar encontrar naquela noite. E já havia muitos policiais pelas redondezas, aborrecendo a população e os comerciantes. Ficarem no mesmo quarto evitaria metade dos problemas e por isso Rumiko decidiu aceitar o palpite do balconista de dormirem juntos.

Os dois sobem ao segundo dos quatro andares, onde ficavam as primeiras acomodações dos amantes, e entram no quarto correspondente ao da chave que receberam do balconista. Dentro havia uma cama de casal velha e ainda desarrumada com uma mesinha ao lado, uma TV com cabo pirateado, embora que mais da metade dos canais estavam ainda fora de sintonia, um ventilador quebrado no teto e, em uma das paredes, um guarda roupa, com roupões de banho, toalhas, cobertores e lençóis. O quarto era enorme, tendo apenas como adição um banheiro com a porta deslizante feita de tiras de madeira. Do lado oposto ao da porta, havia uma janela, também velha e que parecia não ser nada segura. Mas como eles estavam no segundo andar, isso pouco importava. Rumiko caminha até a cama e coloca sua mochila sobre ela. Petruz, mais por timidez do que por cavalheirismo, imaginando que não haveria nenhuma chance de ele e Rumiko dormirem na mesma cama, já se adianta:

- Você pode dormir na cama se quiser. Já faz tempo que durmo no chão mesmo. - Dame! Rumiko também não vai dormir na cama, senhor. É muito macia para meu gosto. - Macia? – Petruz senta-se sobre o móvel – Ela parece que foi feita em cima de blocos de concreto. - Rumiko vai dormir no chão, senhor Petruz. O senhor pode dormir onde melhor lhe agradar.

A moça retira sua Shikomizue da mochila-saco e entrega ao rapaz, que fica olhando para a arma sem entender.

- Se o senhor não se importar, Rumiko vai tomar banho primeiro. Fique com minha Shiko Mizu no Ryu e tome cuidado.

- Tomar cuidado? Tomar cuidado com o que? - Os homens do restaurante estão aqui.

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Os olhos de Petruz demonstram um espanto repentino. O jeito despreocupado de ser de Rumiko emitia tanta tranquilidade e paz de espírito, que o ruivo havia esquecido completamente dos homens mal encarados que os observavam pouco tempo atrás.

- Rumiko ainda não sabe quem são e nem o que querem, mas tem quase certeza de que eles irão nos atacar esta noite.

- Como você sabe? - Um deles entregou algo para o vigia do motel. Rumiko não sabe ao certo o que foi, mas tenho

quase certeza que era uma quantia em dinheiro. - Oh meu deus... Então vamos sair daqui. - Dame yo! - “Não”? Porque não? Acha que é seguro ficarmos aqui? - Hai! Já disse que não precisa se preocupar. Fique alerta enquanto Rumiko toma um banho. Se o

senhor perceber qualquer movimento na porta, o senhor chama por Rumiko. A moça retira sua blusa e a joga na cama. Depois abre sua mochila, pega uma toalha cor de rosa, uma pasta de plástico em que parecia ter uma vestimenta dobrada e um pequeno nécessaire, também de plástico, só então entra no banheiro de calça de moletom e camisa, para finalmente se despir por completo. A água do chuveiro era quente, mas como Rumiko estava querendo se banhar desde quase dois dias atrás, ela não se importaria se o chuveiro só cuspisse água fria, como era comum nos motéis vagabundos de esquina. Petruz se sentou na cama e ficou observando o trinco da porta, com a espada de Rumiko nas mãos já desembainhada e apontada para a entrada. Ele não sentia, mas podia ver a lâmina da espada tremer. Estava com medo, e o medo induzia sua imaginação a fazer com que ele, de vez em quando, visse o trinco da porta girar, mas não sabia dizer se era por isso que tremia. Ele fecha um dos olhos por causa de uma gota de suor que lhe cai nos cílios. Foi só então que Petruz percebeu que estava suando de calor. O Hanten de Rumiko era realmente quente e confortável, por isso a tarde fria e a noite gelada daquele dia não lhe incomodaram tanto quanto nos dias anteriores, em que ele ainda tinha seu cobertor, que era velho, sujo e remendado, mas era quente. E agora que estavam dentro de um cômodo aquecido por ar condicionado, aquela jaqueta japonesa estava incomodando e ele decidiu tirar. No banheiro, Rumiko cantava uma música que, por estar em japonês, era desconhecida para Petruz. Era uma música lenta, suave e, com a ajuda do timbre macio e perfeito da voz de Rumiko, se tornava uma música muito bonita e agradável de se ouvir, mas parecia falar de algo triste. Petruz se lembrou que essa era a mesma melodia que Rumiko cantarolava quando saíram do restaurante. Quinze minutos depois, Rumiko sai do banho, sorrindo aliviada com o frescor proporcionado pela ducha quente e abundante. Era inegável que o lugar, apesar de horrível, era caro demais para se dormir, pois o quarto era espelunca, mas o chuveiro valeu cada centavo gasto. A moça trazia numa das mãos as roupas que trajava ao entrar no banheiro e agora usava um pijama, cuja calça e a blusa eram de uma seda brilhante muito bonita, de cor azul bem claro e com bolinhas brancas. Na outra ela trazia sua nécessaire que, agora suada pelo vapor, vinha enrolada na toalha. Aos seus pés, um par de pantufas em forma de coelhinho cor de rosa. Eram bonitinhas, mas deixava a cena meio engraçada, já que Petruz não conseguia tirar da mente um fato inegável, o de que ali à sua frente estava uma assassina. O garoto observou os pés da menina por um tempinho, mas não riu porque ainda estava assustado com um possível ataque surpresa em que ele, desta vez e provavelmente, tomaria parte. Mas não estava tão assustado para deixar de perceber a beleza natural de Rumiko. Ele até então só havia visto a moça de trança e com roupas largas e pesadas, que não lhe faziam justiça. Mas agora, de cabelos soltos e molhados, usando um pijama que tinha exatamente o seu número e que, portanto, desenhava bem a silhueta de seu corpo, ela parecia outra pessoa. A moça coloca o estojo plástico sobre a mesa ao lado da cama, inclina o corpo para o lado e segura seus cabelos com a toalha, depois esfrega-os com as duas mãos, secando-os.

- A água está ótima, senhor. – diz ela descontraída – Pode ir agora se quiser. - Sim... É claro que eu quero. Tomar um banho quente depois de tanto tempo vai ser bom. - Retire as bandagens antes de entrar no chuveiro e lave a lesão com bastante água. Depois nós

enrolamos seu braço de novo.

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- Está bem. Petruz entrega a espada para sua colega de quarto e pega uma toalha no guarda roupa, correndo para o banheiro. Rumiko recoloca sua shikomizue na bainha, põe a arma embaixo da cama, envolve a toalha na cabeça e, em seguida, começa a secar seus cabelos mais apropriadamente. No andar de baixo, do lado de fora do motel, um dos homens que vigiava a moça acaba de colocar no gancho o telefone que usara para fazer uma ligação ao bairro vizinho. Havia chamado os outros dois homens que estavam se dirigindo para a outra cadeia de motéis, onde ficariam de tocaia para o caso de Rumiko aparecer por lá. Levaria um tempo até eles se reunirem de novo, mas nenhum deles tinha permissão para atacar Rumiko sozinho, portanto estavam loucos para se reencontrarem. Eles estavam sedentos por um pouco de ação.

1A- Sefardim = Grupo de judeus que provinham de uma geração de judeus que viviam na Espanha entre os séculos V e XV. Eram muito inteligentes, pois acompanhavam de perto a evolução cultural secular. Também eram sofisticados e ricos. 1B- Hassídico = Vem de “Hassidismo”, uma parte da ortodoxia judaica, que foi fundada por Israel ben Elieser Baal Schem Tow. É muito comum, ao encontrar Judeus, saber que são hassídicos, pois são conhecidos pelo seu jeito de trajar (chapéus pretos, cabelos encaracolados, barbas e ternos pretos, etc) 2- Odaijini = pode ser interpretado como "Saúde" 3- Are e Oro = São palavras ditas por Rumiko quando ela não entende o significado de uma frase. Significam interjeições de questionamento como Hã/ Hein/ Como/ e variantes. 4- Tengudake = Um cogumelo comestível, porém venenoso. Não há muitos casos de morte, mas ele causa, entre outros sintomas, preguiça, torpor, sonolência, embriaguez, paralisia muscular, alucinações, desarranjo mental, agressão compulsiva, sono profundo... 5- Gasubonbe = nome japonês (adaptado do americano) para Bomba de Gás. 6- Keigo = É a forma polida de se falar propriamente dita. Ex: Existem duas formas de dizer “Adeus”; o “Dewa Sayonara” que é uma forma polida e o “Abayo” que é a forma rude. Para as palavras que tem conotação normalmente impolida, uma pessoa que usa o keigo deve dizê-la com uma leve mesura de cabeça ou, se possível, uma adição da palavra “por favor” em japonês correspondente à situação, (“Onegaishimasu”, “Dozo”, “Kudasai”, etc). 7- Zattsuraito = Adaptação para o japonês da palavra americana That’s Right! 8- GIA = Instituto Norte-Americano de Gemologia 9- A gema foi adquirida de um fazendeiro brasileiro nos anos 90 e possuía, originalmente, 13,90 ct. Em seu estado atual, possui 5,11 ct, mede 11.02 x 10,57 x 6,06 mm. 10- A empresa a qual Rumiko se refere é a William Goldberg Diamond Corp. 11- Ki ni Shinai = “Não se preocupe!” ou “Está tudo bem!” ou “Sem problemas!”. O sentido da palavra é de alguém que não está nem aí se vai chover ou não, se está ou não está atrasada para um compromisso importante ou se está correndo risco de vida. 12- Sakazuki = Sakazuki é uma peça de louça ou porcelana, feita para beber sake (parecida com um pires).

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13- Maricas = Rumiko usa essa palavra num sentido diferente do que se conhece no Brasil. Aqui ela se refere à mulheres frágeis, manhosas, submissas, ou, no sentido que ela mais prefere comparar, uma mulher covarde e acomodada, que aceita ser tratada como um mero pedaço de carne em troca de dinheiro ou segurança. 14- Daejobu/Daijobu = Talvez a palavra mais dita por Rumiko, significa “Tudo bem!” e pode ser usada em qualquer situação para mostrar conforto aos demais. O jeito certo de se escrever é “Daijoubu”. 15- Hanten = é uma espécie de casaco de inverno. Ele é acolchoado com algodão, tanto na cobertura quanto no revestimento e pode possuir tamanhos variados para a mesma pessoa, podendo chegar até a cintura (o caso de Rumiko) ou ir até os joelhos. Errata- Não sei nada de japonês, mas o pouco que sei preciso evitar repassar errado. No capítulo anterior foi explicado que Konbanwa significava boa tarde, quando, na verdade, a sentença “Konbanwa” significa “Boa Noite” e é usado quando se chega em algum lugar.