sÍndromes parkinsonianas

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SÍNDROME PARKINSONIANAS 1 SÍNDROMES PARKINSONIANAS NEUROLOGIA

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SÍNDROME PARKINSONIANAS

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 5

A DOENÇA DE PARKINSON ........................................................................ 5

2.A - Introdução ............................................................................................................ 5

2.B – Epidemiologia ...................................................................................................... 6

2.C - Fisiopatogenia ..................................................................................................... 6

Genética na Doença de Parkinson ........................................................................... 8

2.D – Manifestações Clínicas ..................................................................................... 8

2.D.1 - Manifestações motoras ................................................................................. 9

2.D.2 - Manifestações não motoras ..................................................................... 13

2.F – Diagnóstico ........................................................................................................ 14

2.F.1 - Passo 1 ............................................................................................................ 15

2.F.2 - Passo 2 ............................................................................................................ 15

2.F.3 - Passo 3 ............................................................................................................ 16

2.G – Tratamento ....................................................................................................... 16

2.G.1 - Manejo não farmacológico ........................................................................ 17

2.G.2 - Tratamento farmacológico ........................................................................ 17

Quando iniciar terapia farmacológica? ................................................................ 17

Quais drogas temos como opção? ........................................................................ 17

Quais podem ser os efeitos adversos da terapia dopaminérgica? .............. 18

2.G.3 - Tratamento cirúrgico .................................................................................. 19

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Estimulador Cerebral Profundo ............................................................................. 19

2.G.4 - Tratamento paliativo ................................................................................... 19

2.H – Prognóstico ...................................................................................................... 19

Outras Síndromes Parkinsonianas ............................................................ 20

Condições Hereditárias e Degenerativas ........................................................... 20

3.A.1 Doença de Lewy ............................................................................................. 20

3.A.2 - Atrofia de Múltiplos Sistemas .................................................................. 21

3.A.3 - Paralisia Supranuclear Progressiva........................................................ 22

3.A.4 - Degeneração Corticobasal ........................................................................ 23

3.A.5 - Doença de Wilson ....................................................................................... 23

3.A.6 - Neurodegeneração associada a acúmulo de ferro cerebral (NBIAs)25

3.B – Condições Adquiridas (Parkinsonismos secundários) ......................... 25

3.B.1 - Parkinsonismo Vascular ............................................................................ 25

3.B.2 - Parkinsonismo Induzido por Drogas ...................................................... 26

3.B.3 - Parkinsonismo pós Encefalítico ............................................................... 27

3.B.4 - Parkinsonismo pós traumático ................................................................ 27

3.B.5 – Hidrocefalia de Pressão Normal ............................................................. 27

3.B.6 - Calcificação dos Núcleos da Base .......................................................... 28

3.B.7 - Parkinsonismo por Manganês ................................................................. 28

3.B.8 - Parkinsonismo infeccioso e Demência-de-Guam .............................. 29

REFERÊNCIAS ............................................................................................... 30

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INTRODUÇÃO

As síndromes Parkinsonianas, também co-nhecidas como Síndromes Rígido-Acinéti-cas ou síndromes extrapiramidais hipoci-néticas, representam um grupo de desor-dens que fazem parte dos distúrbios do movimento (condições caracterizadas por anormalidades do movimento na ausência de fraqueza, sejam elas excesso de movi-mento, chamado de hipercinesia, ou falta de movimento, chamado de hipocinesia).

As síndromes parkinsonianas são defini-das por um quadro de diminuição e lentifi-cação dos movimentos voluntários, acom-panhados de uma ou mais características como rigidez muscular, tremor ou instabili-dade postural. Elas recebem o seu nome devido ao seu protótipo e principal causa ser a Doença de Parkinson.

Apesar da Doença de Parkinson ser a causa mais comum de síndrome parkinso-niana, diversas outras condições são inclu-ídas nesse grupo, desde desordens here-dodegenerativas até causas adquiridas. Devido a maior raridade de ocorrência des-sas outras doenças, a abordagem diagnós-tica delas pode ser didaticamente reali-zada por uma falsificação do diagnóstico de doença de Parkinson – ou seja, iremos pensar nelas quando notarmos caracterís-ticas atípicas para o quadro clássico da Doença de Parkinson.

A DOENÇA DE PARKINSON

2.A - Introdução

A Doença de Parkinson é uma doença neu-rodegenerativa progressiva, que repre-senta a causa mais comum que existe de síndrome Parkinsoniana. Relatos acerca da Doença de Parkinson datam desde a época de da Vinci, que já havia descrito ‘’pessoas cujas almas não conseguiam controlar seus movimentos, embora suas extremidades ficassem tremendo continu-amente’’. Mas foi James Parkinson quem primeiro fez uma monografia exclusiva-mente dedicada à condição, chamada ‘’En-saio sobre a Paralisia Agitante’’, em 1817. Ali, ele descreveu as características clínicas da doença com tanta exatidão, que Char-cot decidiu popularizar a doença com seu nome em homenagem anos depois. (a mo-nografia se encontra disponível na internet para os amantes de história da Neurolo-gia).

Atualmente, apesar dos muitos avanços feitos no entendimento de sua patogênese e da descoberta de terapias cada vez mais eficazes em aliviar os sintomas, ainda se trata de uma doença incurável que pro-gride invariavelmente para incapacidade motora apesar dos nossos esforços, da qual ainda não conseguimos responder al-gumas das perguntas mais básicas, como ‘’de onde ela vem?’’ e ‘’como ela surge?’’.

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2.B – Epidemiologia

Em 2016, um estudo estimou a prevalên-cia global da Doença de Parkinson em 6,1 milhões de pessoas. Ela é mais comum em pessoas mais idosas, então dependendo da idade média da população, pode ter prevalências locais diferentes.

Vários fatores de proteção e de risco já são bem definidos para a doença. Dentre os fa-tores de risco, os que mais se destacam são idade avançada e história familiar, mas vale mencionar que traumatismos cranio-encefálicos de repetição, morar em área rural e ingerir água de poço também cur-sam com maior risco da doença. Dentro dos fatores de proteção, tabagismo e his-tórico de ingestão de café são os mais bem documentados.

2.C - Fisiopatogenia

A fisiopatologia da Doença de Parkinson é complexa e ainda não totalmente compre-endida. Na análise macroscópica, não se notam alterações grosseiras cerebrais (ex-ceto por atrofia cerebral, que pode ser branda em pacientes mais idosos), e o mais notável ao realizar os cortes para vi-sualizar estruturas profundas é a despig-mentação da Substância Negra mesence-fálica no tronco cerebral.

Na patologia, alterações características nos pacientes são perda neuronal e gliose,

principalmente na pars compacta da subs-tância negra e no locus ceruleus da ponte, mas degeneração neuronal também pode ser vista em outros núcleos do tronco, como o núcleo dorsal do vago. Essa prefe-rência da doença por neurônios da Subs-tância Negra resulta em perda gradual de neurônios dopaminérgicos que se proje-tam para o putâmem (diferente do que ocorre no processo de envelhecimento normal, que afeta principalmente as proje-ções de dopamina para o núcleo caudado). A depleção de dopamina resultante disso se correlaciona com o grau de bradicinesia clínica, e pode explicar também outras ma-nifestações da doença, além de justificar a boa resposta que esses pacientes apre-sentam ao tratamento com drogas dopa-minérgicas.

Os mecanismos fisiopatológicos precisos que levam à essa neurodegeneração ainda não são completamente compreendidos, mas envolvem uma cascata de eventos que resulta de interações entre fatores ge-néticos e anormalidades de processa-mento de proteínas, estresse oxidativo, disfunção mitocondrial, inflamação, regu-lação imune e outros fatores ainda desco-nhecidos.

Não há consenso sobre os critérios patoló-gicos definidores da Doença de Parkinson, mas a maioria dos especialistas acredita que os Corpúsculos de Lewy constituem o

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principal marco patológico da condição. Eles são inclusões neuronais intracitoplás-micas eosinofílicas compostas principal-mente de alfa-sinucleina, uma proteína pré-sináptica. Mas essa definição possui diversos problemas. Os corpos de Lewy não são específicos da Doença de Parkin-son, e podem ser encontrados em diversas outras doenças neurodegenerativas e in-clusive em cérebros de pessoas normais idosas.

O termo Sinucleinopatias foi cunhado en-tão para representar o grupo de desordens que cursa como marcador patológico prin-cipal a presença de agregados anormais de alfa sinucleina. Dentro desse grupo en-contramos, além da Doença de Parkinson, a Doença de Lewy e a Atrofia de Múltiplos Sistemas, que também são causadoras de síndrome Parkinsoniana. Inclusões como os Corpúsculos de Lewy são classica-mente consideradas como tóxicas, mas ainda não sabemos se elas têm papel tó-xico ou neuroprotetor (e assim só repre-sentariam uma defesa do organismo ao processo patológico) na doença. Essa falta de especificidade de achados patológicos há tempos levanta a possibilidade de que a Doença de Parkinson possa não ser uma entidade específica, mas sim uma sín-drome clínica resultante de diferentes cau-sas patológicas.

Mais recentemente, essa visão patológica tradicional da Doença começando com de-generação de neurônios dopaminérgicos da Substância Negra foi desafiada, e um neuropatologista chamado Heiko Braak propôs que as alterações na verdade co-meçariam no bulbo olfatório e na medula oblonga (bulbo) do tronco cerebral, e só depois progrediriam rostralmente num processo ao longo de anos para a Substân-cia Negra e córtex cerebral. Essa teoria aju-daria a explicar por que alguns achados não motores da doença, como diminuição da função olfativa, constipação intestinal e distúrbios do sono, podem ocorrer até anos antes das manifestações motoras clássicas.

Em resumo, a doença parece vir de intera-ções complexas de fatores genéticos e processos celulares, que levam a perda neuronal distribuída em localizações típi-cas no sistema nervoso. Seja qual for o ga-tilho inicial ou progressão do processo pa-tológico, tudo se culmina em perda de neu-rônios dopaminérgicos na Substância Ne-gra, que parece ser o substrato necessário para a manifestação cardinal da doença – a bradicinesia. Nos próximos anos espera-mos descobrir ainda mais sobre os misté-rios por trás de todas essas questões, com esperanças de que esse melhor entendi-mento nos ajude no desenvolvimento de medicamentos que alterem a história natu-ral da doença.

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Genética na Doença de Parkinson

Embora a maioria dos casos da Doença se-jam considerados esporádicos, há cada vez mais evidências de fatores genéticos influenciando na sua patogênese, princi-palmente nos casos de Doença de Parkin-son de início precoce (menores de 50 anos).

Diversas mutações em genes já foram des-critas, e padrões de herança diversos já fo-ram encontrados. Causas monogenicas da doença parecem representar 1,4% dos ca-sos. Cada gene implicado pode resultar em características distintivas da doença, e pa-drões de herança, história familiar, curso dos sintomas e presença de outras mani-festações podem nos ajudar a suspeitar clinicamente delas. Alguns exemplos se-guem:

PARK1 – mutações do gene da alfa sinu-cleina – forma autossômica dominante, com quadro de Doença de Parkinson tí-pica, só que com início mais precoce e curso mais rapidamente progressivo.

PARK2 - Parkin - Causa parkinsonismo de início precoce e progressão lenta, podendo cursar com distonia, hiperreflexia e compli-cações precoces relacionadas a terapia do-paminérgica.

PARK6 – PINK1 - Causam parkinsonismo autossômico recessivo de início precoce

(por volta de 40 anos). Características não usuais são distonia já na apresentação, hi-perreflexia e progressão lenta da doença.

PARK 8 – LRRK2 – leva a quadros autos-sômicos dominantes sem patologia de cor-pos de Lewy. É uma mutação bastante prevalente, principalmente entre portu-gueses, judeus e população árabe norte africana. Clinicamente, é um parkinso-nismo assimétrico dopa responsivo com desordem de comportamento proemi-nente, incluindo ataques de ansiedade, de-pressão, paranoide e suicídio, mas sem de-clínio cognitivo. Tremor de perna unilateral na apresentação e distonia de pé são ca-racterísticas proeminentes.

PARK 9 – degeneração palidopiramidal com paresia da mirada para cima supranu-clear e demência (doença de Kufor-Rakeb) – Quadro de início precoce (por volta de 15 anos) com parkinsonismo rapidamente progressivo, espasticidade e paralisia su-pranuclear da mirada para cima.

2.D – Manifestações Clínicas

A Doença de Parkinson faz classicamente parte do grupo dos distúrbios do movi-mento, ou seja, doenças aonde as manifes-tações que dominam o quadro são dificul-dades de gerar ou inibir movimentos mo-tores, na ausência de fraqueza. Embora isso seja verdade, também vemos que cada vez mais vêm sendo descritas

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manifestações não motoras da doença, mostrando ser uma condição complexa com envolvimento difuso do sistema ner-voso central, e não somente de estruturas que regulam a motricidade.

Como visto acima, a doença pode ter idade de apresentação bastante variável, porém sua incidência aumenta conforme o avan-çar da idade, tornando ela uma condição mais comumente vista em idosos. É uma doença de caráter progressivo, e os sinto-mas vão piorando ao longo de anos, le-vando a uma incapacidade cada vez mais severa.

2.D.1 - Manifestações motoras

A Doença de Parkinson é o protótipo da Síndrome Parkinsoniana, uma síndrome extrapiramidal caracterizada pela tétrade de:

- Bradicinesia

- Rigidez muscular

- Tremor

- Prejuízo dos reflexos posturais

Importante de se notar é que todas essas características motoras na Doença de Par-kinson possuem em comum o fato de se iniciarem de forma unilateral, e apesar de com a progressão poderem se espraiar

para o outro lado, se mantêm assimétricas durante toda a história natural da doença.

Bradicinesia – É a manifestação obrigató-ria e mais característica da doença. Ela é definida como uma lentificação do movi-mento, associada a uma perda progressiva de amplitude na realização de movimentos repetitivos.

Ela está presente no início da fase motora da doença em até 80% dos pacientes, e com a progressão se desenvolve em todos. É tida como a principal causa de incapaci-dade nesses pacientes. Apesar de ela ser a característica mais comum, é também a mais difícil dos pacientes descreverem com precisão, e o clínico precisa estar atento pois ela pode ser relatada como ‘’fraqueza’’, ‘’desajeitamento’’, ‘’cansaço’’ e até dor.

Dependendo do local do corpo afetado, ela pode se manifestar de diferentes formas. Nos braços, ela normalmente começa dis-talmente com perda da destreza manual, dificultando atividades como abotoar rou-pas, amarrar sapatos e escrever. Eles po-dem se queixar de escrita reduzida e ter problemas com cheques não sendo mais aceitos por alterações nas suas assinatu-ras. Nos membros inferiores, ela se mani-festa com marcha mais lenta e de passos curtos, com os pacientes precisando au-mentar a frequência dos passos para

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compensar a perda de amplitude (festina-ção), além da diminuição do balançar dos braços característica da doença. Com o tempo, congelamentos da marcha podem ocorrer, principalmente ao passarem por entradas estreitas ou ao mudar o aspecto do piso aonde estão andando. A virada desses pacientes fica lenta, precisando dar vários passos para os lados antes de iniciar a volta (virada em bloco). No rosto, ela se manifesta com perda das expressões faci-ais, dando um aspecto frio e indiferente ao paciente.

Ao exame clínico, a bradicinesia pode ser aparente já na inspeção geral – o paciente fica sentado completamente parado, com falta de expressão e gesticulação normal, diminuição da frequência do piscar dos olhos (o normal é pelo menos 10 piscadas por minuto), diminuição do volume da voz e cadencia da fala e sialorreia. Pesquisa-mos por ela pedindo ao paciente para rea-lizar movimentos amplos e repetitivos com diferentes partes do corpo, observando a velocidade, amplitude e ritmo deles. Pode-mos pedir para ele realizar movimentos de extensão e flexão do indicador e polegar, com as pontas dos dedos se encontrando uma na outra (manobra ‘’finger tapping’’), podemos avaliar bradicinesia na escrita do paciente, com as letras diminuindo ao longo de uma frase, ou pedindo para ele desenhar uma espiral numa folha, e vendo a distância entre as linhas. Também

podemos pedir para o paciente realizar movimentos de pronação-supinação do antebraço. Nos membros inferiores, pode-mos pedir para ele bater com o pé no chão repetidamente ou quando sentado com as pernas pendentes fazer movimentos de pedalar (manobra do pedalar de Maul-tasch). Lentificação desses movimentos com diminuição progressiva da amplitude, até um momento que os movimentos pa-ram e o paciente os reinicia, é caracterís-tico.

Importante salientar que a quantidade de rigidez e tremor não se correlaciona com a severidade da bradicinesia.

Alguns eventos dramáticos como disparar de um alarme ou barulho de um tiro podem fazer o paciente com DP conseguir fazer por um período várias atividades rapida-mente, como se não possuíssem a doença (cinesia paradoxal). Isso dura cerca de 1 minuto em média e o mecanismo para tal fenômeno é desconhecido, mas parece in-dicar que as vias voluntarias para ação es-tão intactas, e a doença interfere com ou bloqueia seu uso normal.

Rigidez muscular – ela é definida como um aumento de resistência à movimentação passiva (hipertonia), com características de ser constante durante toda amplitude de movimento e não ser velocidade depen-dente, características que diferenciam ela

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da hipertonia espástica vista em quadros piramidais. Ela ocorre em 75-90% dos pa-cientes com Doença de Parkinson.

A rigidez pode ser observada durante a inspeção geral, pela postura fletida de tronco e membros característica do paci-ente, ou pela presença da mão estriatal (uma postura de mão com extensão das in-terfalangianas proximais e distais e flexão das metacarpofalangianas).

A rigidez é testada na beira do leito através de manipulação passiva dos membros. Ela pode somente vir à tona pedindo ao paci-ente para realizar movimentos com o membro contralateral ao testado (Sinal de Froment). Muitos tem o fenômeno da roda denteada associado a rigidez, que consiste em um padrão de resistência desarru-mado, quebrado, resultante de um tremor subjacente que está escondido pela rigi-dez. Se observa uma resistência aos movi-mentos passivos, principalmente na mus-culatura antigravitacional. Manobras como balançar o tronco do paciente estando ele em pé e observar o movimento passivo dos braços e elevar as pernas e soltá-las es-tando o paciente sentado com as pernas pendentes e observando diminuição do balanças das pernas podem ser úteis para detectar quadros sutis (algumas das diver-sas manobras descritas por Robert War-tenberg em seu livro ‘’Diagnostic Tests in Neurology’’).

Tremor – O tremor na Doença de Parkin-son é classicamente descrito como um tre-mor de repouso, ou seja, um tremor que predomina quando a parte do corpo tre-mulante está suportada pela gravidade e não se encontra engajada em manter uma postura ou realizar atividades propositais. A frequência típica do tremor fica entre 3 e 7 Hz. Tremor pode ser o sintoma de apre-sentação em até 80% dos casos, e quase todos os pacientes irão desenvolver tremor em algum ponto do curso da doença.

O tremor usualmente começa intermiten-temente, de forma unilateral, mais comu-mente na mão, e depois se espraia para outras partes do corpo com a progressão da doença. O lado no qual o tremor se ini-cia tende a ser o lado mais afetado pela do-ença durante todo seu curso. Importante notar que a distribuição do tremor pode nos ajudar em termos diagnósticos, sa-bendo que Doença de Parkinson não cos-tuma causar tremor de cabeça (mais co-mumente uma manifestação de tremor es-sencial ou tremor distônico), e sabendo que um tremor unilateral de perna, apesar de incomum, é bastante específico da con-dição. O tremor das mãos costuma ser ti-picamente de flexão e extensão dos dedos ou punho, usualmente com pronaçao-su-pinaçao do antebraço. Embora muitas ve-zes seja chamado de tremor de rolar de pí-lulas (pill rolling) ou contar de moedas, a

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maioria deles não tem o componente rota-tório do rolar de pílulas verdadeiro.

Para avaliar o tremor, precisamos inspeci-onar o segmento tremulante em 3 etapas: 1) Durante o repouso, como com os braços repousando em cima das coxas ou em cima de uma mesa, ou durante a marcha. 2) Com os membros em uma postura man-tida, como com os braços esticados para frente ou segurados com os cotovelos do-brados em 90º (em posição de sentido). 3) Durante a ação, como ao realizar a mano-bra dedo-nariz. O tremor da doença de Parkinson pode estar presente em qual-quer um desses momentos, mas é caracte-risticamente pior ao repouso. O tremor pi-ora com estressores cognitivos, como pe-dir para o paciente realizar cálculos men-tais ou falar os meses do ano de trás para frente. Ele pode se manifestar como um tremor reemergente quando o paciente sai da posição de repouso para a posição pos-tural, tendo alguns segundos de parada do tremor, seguida de retomada dele com as mesmas características.

Como o tremor da Doença de Parkinson di-minui com ações propositais, ele usual-mente é a manifestação cardinal que me-nos incapacita os pacientes, mas quando ele é severo pode gerar dificuldades na es-crita e em outras atividades manuais.

Prejuízo dos reflexos posturais - Repre-senta um prejuízo dos reflexos de manu-tenção da postura, que causam com que o paciente tenha um sentimento de desequi-líbrio e tendência a cair. Deve ser notado que isso é uma manifestação TARDIA na Doença de Parkinson, e a ocorrência de quedas nos primeiros anos do curso de uma síndrome parkinsoniana devem nos alertar para a possibilidade de um diag-nóstico alternativo.

Avaliamos ela clinicamente deixando o pa-ciente em pé e nos posicionando atrás dele, e assim puxamos o paciente firme-mente pelos ombros e observamos suas respostas reflexas (Pull-test). Pacientes com reflexos posturais normais mantêm seu equilíbrio dando um passo para trás. Pacientes com prejuízo dos reflexos postu-rais podem ter que dar diversos passos para trás ou até nem ativarem o reflexo de passos, e caírem em bloco. Sempre garan-tir que você está atrás do paciente para evitar lesões.

A perda dos reflexos posturais é uma causa importante de incapacidade, e resul-tam em lesões por quedas repetitivas, pro-gredindo até deixar os pacientes restritos à cadeira de rodas. Dentre as manifesta-ções motoras principais da doença, a ins-tabilidade postural é a que menos res-ponde às terapias dopaminérgicas.

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2.D.2 - Manifestações não motoras

Desde sua descrição, o foco na da Doença de Parkinson sempre foi em cima das suas manifestações motoras, mas ultimamente vem cada vez mais sendo estudados efei-tos da doença em outros sistemas. Atual-mente é amplamente reconhecido que a condição não se limita às suas manifesta-ções cardinais, e sintomas não motores fa-zem parte importante do quadro clínico da doença, ocorrendo em virtualmente todos os pacientes. Dentro delas, podemos citar principalmente:

- Distúrbios do Olfato

- Distúrbios Gastrointestinais

- Distúrbios do Sono

- Disfunção cognitiva

- Distúrbios psiquiátricos

Distúrbios do olfato – São muito comuns na Doença de Parkinson. Podem se mani-festar como dificuldades na detecção ou identificação de odores. Muitas vezes, isso passa despercebido pelo paciente e pre-cisa ser buscado ativamente no exame fí-sico. Esses déficits podem preceder o início das manifestações motoras em anos, e são tão comuns na doença que se encontrar-mos pacientes com síndrome parkinsoni-ana e testes de função olfativa normais,

devemos considerar a possibilidade de ou-tro diagnóstico.

Distúrbios Gastrointestinais – Constipa-ção intestinal é muito comum na doença, e assim como os distúrbios do olfato, podem estar presentes já desde anos antes do iní-cio das manifestações motoras.

Distúrbios do sono – Diversos tipos de distúrbios do sono podem ocorrer na do-ença, como fadiga diurna excessiva, dis-túrbio do sono REM, síndrome das pernas inquietas e movimentos periódicos dos membros. Dentro desses, o distúrbio do sono REM merece menção, por ser uma ocorrência bem relatada dentro do grupo das sinucleinopatias. Se caracteriza por perda da paralisia do sono, resultando na atuação dos sonhos, podendo se manifes-tar com vocalizações e atos motores du-rante a noite. Comumente os companhei-ros desses pacientes relatam já terem sido acordados a noite por movimentos ou sons emitidos por eles, e eles podem já terem inclusive caído da cama. Muitas vezes têm início também até anos antes das manifes-tações motoras.

Disfunção cognitiva – Disfunção cognitiva e demência são comuns na Doença de Par-kinson, mas tendem a se manifestar tardi-amente, normalmente anos após os sinto-mas motores (diferenciando da Demência por Corpos de Lewy). A demência é

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comumente do tipo subcortical, com lenti-ficação psicomotora, dificuldades de me-mória, função executiva e visuoespacial.

Distúrbios psiquiátricos – Psicose, aluci-nações, distúrbios do humor como depres-são, ansiedade, apatia e abulia comumente ocorrem durante o curso da doença.

Outros – Muitas outras manifestações não motoras podem perturbar esses pacientes, gerando incapacidades e diminuindo a qualidade de vida. Podem ser: distúrbios autonômicos como hipotensão postural, disfagia, disfunção sexual ou sialorreia; dor; achados dermatológicos como derma-tite seborreica e aumento da ocorrência de melanomas.

2.E – Classificação

Tendo falado das manifestações motoras, vale a pena a menção de que muitos espe-cialistas consideram que a doença possua diferentes fenótipos clínicos, que são de-terminados de acordo com quais manifes-tações motoras se apresentam de forma mais severa no quadro. Esses são:

- Fenótipo tremulante – aonde o predomí-nio é de tremor. Tem como característica uma progressão mais lenta doença, com menos prejuízos neuropsicológicos.

- Fenótipo Rígido-Acinético – aonde pre-dominam a rigidez e bradicinesia, sem tanto tremor.

- Fenótipo com instabilidade postural e desordem de marcha.

Mas cuidado – a progressão dos sintomas motores na doença é imprevisível, e o fe-nótipo clínico do paciente pode mudar com o tempo.

2.F – Diagnóstico

O padrão ouro para o diagnóstico da Do-ença de Parkinson é exame neuropatoló-gico, mas conseguimos fazer um diagnós-tico suficientemente acurado usando infor-mações da anamnese e do exame físico. Para isso, dependemos principalmente da habilidade do médico de reconhecer as manifestações clínicas cardinais da do-ença.

Os critérios diagnósticos da doença atual-mente se apoiam no reconhecimento das manifestações motoras típicas associadas a critérios de suporte e ausência de crité-rios de exclusão. Conforme a doença foi sendo estudada, novos critérios de suporte e sinais de alarme vem sendo incluídos nas considerações diagnósticas, incluindo exa-mes complementares, mas ainda não exis-tem formas 100% acuradas de distinguir a doença de outras formas de parkinso-nismo in vivo.

Podemos seguir alguns passos no nosso raciocínio diagnóstico:

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2.F.1 - Passo 1 - Primeiro, devemos fazer o diagnóstico de uma síndrome parkinso-niana. Para isso, precisamos de evidência clínica de bradicinesia (critério obrigatório) associado a rigidez ou tremor de repouso. Note que instabilidade postural tende a ser uma característica tardia na Doença de Parkinson, e se presente precocemente in-clusive fala a favor de um diagnóstico al-ternativo, então não entra nos critérios di-agnósticos.

2.F.2 - Passo 2 – Agora, precisamos pro-curar fatores que irão nos ajudar a deter-minar ou excluir que a causa da síndrome parkinsoniana é Doença de Parkinson. Para isso usamos critérios de suporte, red flags e critérios de exclusão.

• Critérios de suporte – São característi-cas que aumentam a confiança de que o diagnóstico é Doença de Parkinson.

Podem ser: Resposta boa e sustentada a terapia dopaminérgica; Flutuações moto-ras ou discinesias como efeito adverso da terapia dopaminérgica; Tremor de repouso de um membro; Presença de disfunção ol-fativa (hiposmia); evidencia de desenerva-ção simpática cardíaca na cintilografia com Metaiodobenzilguanidina (MIBG); Hipere-cogenicidade da substancia negra no Ul-trassom Transcraniano.

• Sinais de Alarme (Red Flags) – São si-nais de que pode ser potencialmente outra

doença, mas não são isoladamente crité-rios de exclusão. A presença de 3 deles ex-clui a possibilidade de Doença de Parkin-son.

Podem ser: quedas recorrentes se inici-ando dentro de 3 anos de doença; ausên-cia de progressão dos sinais motores; dis-fagia precoce; disfunção respiratória inspi-ratória, com estridor noturno; ausência de características não motoras da doença após 5 anos de início do quadro (hiposmia, constipação, distúrbio do sono REM); si-nais piramidais não explicados por outra condição (ex AVE prévio); parkinsonismo bilateral e simétrico.

• Critérios de Exclusão – São sinais que eliminam a possibilidade de se tratar de Doença de Parkinson.

Podem ser: sinais cerebelares; Lentificação e limitação das sacadas (movimentos ocu-lares rápidos) para baixo (lentificação e li-mitação das sacadas para cima pode ocor-rer com a idade avançada e deve ser avali-ada cuidadosamente); diagnóstico de de-mência do tipo frontotemporal dentro de 5 anos do início do quadro; sinais parkinso-nianos restritos aos membros inferiores por mais de 3 anos; uso recente de bloque-adores dopaminérgicos; ausência de res-posta a doses altas de Levodopa; perda sensitiva cortical, apraxia ideomotora ou afasia progressiva; neuroimagem funcional

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do sistema dopaminérgico pré-sináptico normal; documentação de outra condição que cause parkinsonismo.

2.F.3 - Passo 3 – Agora aplicamos os cri-térios.

• Chamamos de doença de Parkinson cli-nicamente estabelecida quando temos parkinsonismo + ausência de critérios de exclusão + ausência de sinais de alarme + presença de pelo menos 2 critérios de su-porte.

• Chamamos de Doença de Parkinson cli-nicamente provável quando temos parkin-sonismo + ausência de critérios de exclu-são + ausência de critérios de suporte e red flags ou presença de 1 red flag contraba-lanceada por 1 critério de suporte ou pre-sença de 2 red flags contrabalanceados por 2 critérios de suporte.

Devemos lembrar que o diagnóstico da Doença de Parkinson é um ‘’diagnóstico de gaveta’’ (citação direta do Professor Flávio Costa), que precisa ser constantemente re-visado em cada visita clínica, pois ao longo do curso da condição podem surgir novos critérios de suporte, exclusão ou sinais de alarme.

Ressonância Magnética de Crânio normal-mente faz parte da investigação inicial, e tem como objetivo excluir anormalidades estruturais que possam justificar o quadro.

Outros exames complementares, como Dat-Scan, Ultrassom Transcraniano e PET podem ajudar muito também na avaliação diagnóstica, quando solicitados em suas indicações precisas.

No momento, só podemos fazer o diag-nóstico de Doença de Parkinson após o surgimento das manifestações motoras da doença, mas a esperança é de que no fu-turo teremos biomarcadores melhores que possibilitem o diagnóstico ainda na fase pré-motora, possibilitando tratamento com drogas modificadoras da história na-tural da doença (que ainda serão desenvol-vidas) precocemente.

2.G – Tratamento

A Doença de Parkinson talvez seja a do-ença neurodegenerativa que possui a mais ampla variação de tratamentos disponí-veis. O manejo desses pacientes é com-plexo, e requer uma abordagem individua-lizada considerando fatores como quais são os sinais e sintomas do paciente em questão, sua idade, estágio da doença, grau de incapacidade funcional além de seus sintomas não motores. Então, vere-mos que raramente dois pacientes diferen-tes com Doença de Parkinson terão uma prescrição igual, tornando o tratamento muito individualizado.

Temos abordagens não farmacológicas, farmacológicas e cirúrgicas dentro do

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nosso leque terapêutico. Devemos ter em mente que apesar de todas essas opções de tratamento, todos eles são medidas meramente sintomáticas, e não alteram o curso natural da doença. Ainda estamos na esperança do desenvolvimento de terapias neuroprotetoras no futuro.

2.G.1 - Manejo não farmacológico

Dentro das estratégias não farmacológi-cas, como em todas as doenças é essencial educar o paciente sobre a condição e ofe-recer grupos de apoio para combater o es-tigma de desinformação que circunda a doença, e oferecer suporte psicológico às reações normais de raiva, depressão e an-siedade que comumente acompanham um diagnóstico de doença crônica.

Exercício físico regular é de suma impor-tância também, ajudando a aliviar efeitos secundários ortopédicos da rigidez e dores sentidas por esses pacientes. Tai chi, hi-droginástica e dança são ótimos para me-lhorar equilíbrio, flexibilidade e força, pro-tegendo esses pacientes de quedas e suas complicações. Para os pacientes com hipo-fonia e disartria, tratamento com equipe de fonoaudiologia ajuda a melhorar volume e cadência da fala. Acompanhamento nutri-cional é importante, pois esses pacientes têm risco especialmente aumentado de desnutrição devido a hiposmia e hipogeu-sia.

Conforme a incapacidade da doença pro-gride, terapia ocupacional pode ajudar o paciente a se adaptar a atividades e intro-duzir acessórios de ajuda como bengalas além de modificações no ambiente aonde vive.

2.G.2 - Tratamento farmacológico

Existem muitas drogas disponíveis para o tratamento da doença, e a maioria delas tem como foco aliviar os sintomas motores da condição, oferecendo controle sintomá-tico. Assim como no diagnóstico, temos que tomar uma abordagem sequencial quando pensamos em tratamento farma-cológico.

Quando iniciar terapia farmacológica?

A decisão de iniciar tratamento sintomá-tico deve ser determinada pelo grau com que os sintomas interferem na vida do pa-ciente. Isso pode variar bastante de pessoa para pessoa, e muitos no início do quadro não sentem muitas dificuldades, principal-mente quando o sintoma inicial é tremor de repouso em sua mão não dominante. Mas nunca esquecer de levar em consideração trabalho e hobbies do paciente, riscos de não tratamento e opiniões e valores pesso-ais do paciente acerca dos medicamentos.

Quais drogas temos como opção?

A escolha do tratamento inicial deve ser in-dividualizada, baseada em características

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do paciente e das drogas disponíveis. Te-mos disponíveis 4 principais: Inibidores da Monominoxidase tipo B (iMAO B), Aman-tadina, Agonistas dopaminérgicos e Le-vodopa.

As iMAOB (Selegilina e Rasagilina) são in-dicados para pacientes de qualquer idade com sintomas brandos, pois tem um bene-fício pequeno, mas tendem a ser bem tole-radas e possuir posologia cômoda.

Amantadina também possui efeitos mo-destos sobre os sintomas e tende a ser bem tolerada. Ela parece ser especial-mente efetiva nos pacientes que têm tre-mor como uma manifestação proeminente. Depois, em estágios mais tardios se mos-tra uma boa opção para tratamento das discinesias motoras secundárias a Le-vodopa.

Os agonistas dopaminérgicos têm um efeito melhor do que os acima para o con-trole motor, mas ainda assim pior do que a Levodopa. Eles oferecem menor risco de complicações motoras que a Levodopa, mas podem causar intolerância por ques-tões como sonolência, alucinações e dis-túrbios do controle dos impulsos. Por es-sas razões, não são recomendados para pacientes idosos e nem com histórico de adição.

A Levodopa é o agente mais efetivo, e to-dos os pacientes eventualmente irão

progredir para seu uso, independente de qual medicamento iniciaram tomando. Um detalhe importante é que muitos pacientes irão pedir para adiar o início de tratamento com ela, sob a falsa crença de que começar precocemente a droga se associa ao de-senvolvimento de flutuações motoras mais precocemente também. Isso não é pro-vado, e a resposta a Levodopa não é finita nem dose dependente. Além disso há cada vez mais evidencias mostrando que a es-colha de tratamento inicial para a doença tenha pouco impacto a longo prazo nas flutuações ou discinesias, então atrasar o início da Levodopa priva de forma desne-cessária os pacientes de terem benefício terapêutico precocemente na doença, aonde o potencial de melhora funcional sustentada é o melhor. Apesar de ser o tra-tamento mais eficaz, ela requer mais toma-das diárias e oferece maior riscos de com-plicações motoras dopaminérgicas.

Quais podem ser os efeitos adversos da terapia dopaminérgica?

Vários pacientes com Doença de Parkin-son irão desenvolver complicações relacio-nadas ao uso de Levodopa dentro de al-guns anos após seu início. Dentre elas po-demos citar náuseas, hipotensão postural, distúrbios do controle de impulsos, flutua-ções motoras (alternância entre períodos marcados por resposta positiva ao remé-dio e períodos de retorno dos sintomas) ou

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discinesias (movimentos involuntários anormais trazidos pelo uso da Levodopa que podem ter características coreiformes, distônicas e/ou mioclônias).

Cada um desses efeitos adversos pode ser combatido por modificações individualiza-das na prescrição do paciente, e podemos variar tanto o número de tomadas de uma droga (como por exemplo espaçar as do-ses da Levodopa em mais tomadas diárias para diminuir períodos de flutuação) quanto adicionando drogas adjuntas. Tudo dependerá do tipo de efeito adverso que o paciente possa estar sofrendo e seus mo-mentos de ocorrência.

2.G.3 - Tratamento cirúrgico

Para pacientes com Doença de Parkinson que respondem bem a terapia com Le-vodopa, mas que desenvolvem complica-ções motoras de difícil tratamento, temos como opções aparelhos de assistência. Es-ses tratamentos também são sintomáticos e não atrasam a progressão da doença, mas são uteis para aumentar o tempo de efeito dos remédios sem trazer junto as discinesias dose dependentes. Dentre as opções, o mais amplamente disponível é o uso da estimulação cerebral profunda (Deep Brain Stimulation – DBS).

Importante notar que o uso do estimulador é contra indicado em pacientes que pos-suem demência, psicose, depressão,

parkinsonismos atípicos ou parkinsonis-mos secundários.

Estimulador Cerebral Profundo

Consiste na implantação de um eletrodo gerador de pulso no núcleo subtalâmico ou no globo pálido interno, por cirurgia este-reotáxica. Tem bons resultados, pode ser realizado bilateralmente e permite controle fino dos impulsos por meio de ajustes ele-trônicos sobre o estímulo, além de oferecer a vantagem de modificação ao longo do tempo para lidar com progressão dos sin-tomas. Geralmente sua melhor resposta será tão boa quanto a melhor resposta à Levodopa do paciente no pré-operatório. Ele não tem ação em sintomas axiais não responsivos à Levodopa, como instabili-dade postural, alterações de fala ou deglu-tição.

2.G.4 - Tratamento paliativo

Por ser uma doença incurável e progres-siva, cuidados paliativos focados em pre-venir e aliviar o sofrimento do paciente e suas famílias devem ser instituídos. O foco deve ser no planejamento do cuidado do paciente, e deve ser iniciado precocemente no curso da doença.

2.H – Prognóstico

Como falado, a Doença de Parkinson é uma doença progressiva incurável, que leva a acúmulo progressivo de

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incapacidades motoras e eventual morte relacionada à elas. O tempo de sobrevida é bastante variável, tendo aumentado de-pois da descoberta da Levodopa e do DBS, hoje estando entre 10-15 anos após o di-agnóstico.

OUTRAS SÍNDROMES PARKIN-SONIANAS

Como falado, a Doença de Parkinson é a principal e mais comum causa de síndrome parkinsoniana, porém está longe de ser a única. As outras condições que cursam com síndrome parkinsoniana podem ser classificadas em hereditárias/degenerati-vas ou adquiridas.

Se levarmos em consideração a doença de Parkinson como protótipo de síndrome parkinsoniana, podemos apreciar esses di-agnósticos diferenciais de forma didática enfatizando suas características falsifica-doras do diagnostico de Doença de Parkin-son (as características que elas apresen-tam que nos chamam atenção para pensar num parkinsonismo atípico).

Condições Hereditárias e Degenerativas

3.A.1 Doença de Lewy

É a segunda causa mais comum de de-mência neurodegenerativa (20% das cau-sas de demência), e faz parte do grupo das sinucleinopatias.

É caracterizada por início de síndrome de-mencial do tipo cortical e de síndrome par-kinsoniana usualmente simétrica, que se desenvolvem dentro de 1 ano de diferença uma para outra,

O quadro caracteristicamente cursa com flutuações marcadas de cognição, alucina-ções visuais importantes, uma hipersensi-bilidade ao uso de neurolépticos e muitos distúrbios neuropsiquiátricos. As alucina-ções visuais da DCL estão presentes pre-cocemente e tendem a persistir – elas são vividas, tridimensionais e animadas, como na forma de animais ou crianças.

O parkinsonismo dela tende a ser simé-trico, ter mais envolvimento axial, instabi-lidade postural e hipopimimia facial, e me-nos tremor.

O padrão de prejuízo típico deles em testes cognitivos é de uma dificuldade predomi-nante em atenção, função visuoespacial e função executiva, com memória relativa-mente poupada no início. Mas devemos ter cuidado, pois é cenário comum vermos uma demência mista, que possui patologia de Doença de Alzheimer também – esses casos irão cursar com déficits cognitivos semelhantes aos de Alzheimer, com preju-ízo precoce da memória episódica.

Geralmente, não é difícil fazer esse diag-nostico em pacientes que começaram com quadro semelhante à Doença de Parkinson

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e desenvolveram demência e alucinações visuais proeminentes dentro do primeiro ano do diagnóstico. O mais difícil é fazer o diagnóstico em pacientes que não tem parkinsonismo precoce proeminente (25% dos casos).

Para o diagnóstico, precisamos então de:

- Síndrome demencial (critério obrigatório) que precisa ser associada a flutuação da cognição e/ou alucinações visuais bem for-madas e detalhadas

- Síndrome Parkinsoniana com início de 1 ano antes até 1 ano depois do declínio cognitivo.

O tratamento para condição é essencial-mente sintomático, podendo ser utilizados drogas anticolinesterásicas (para demên-cia), levodopa (para o parkinsonismo) e sendo enfatizado o cuidado a ser tomado na prescrição de neurolépticos para esses pacientes, que tendem a ser hipersensíveis a essas medicações.

Eventualmente morrem de complicações relacionadas às incapacidades.

3.A.2 - Atrofia de Múltiplos Sistemas

Doença neurodegenerativa do grupo das sinucleinopatias que é caracterizada por qualquer combinação de parkinsonismo (geralmente simétrico), sinais autonômi-cos, cerebelares ou piramidais.

Representa por volta de 5% dos parkinso-nismos.

Pode ser classificada de acordo com qual sistema predomina no paciente, entre AMS-P (parkinsonismo predominante), AMS-C (sinais cerebelares predominam) ou AMS-A (sinais autonômicos predomi-nam). Mas esses fenótipos possuem muito overlap entre si.

O parkinsonismo da condição tende a ser simétrico, de progressão rápida e com quedas e instabilidade postural precoces.

Os achados cerebelares podem ser difíceis de serem apreciados, pois o parkinsonismo sobreposto pode mascará-los. No geral a marcha com base alargada, com dificul-dade de andar em tandem (‘’Ten steps to identify atypical parkinsonism’’) pode su-gerir, mas os movimentos oculares são ca-tegóricos em mostrar os déficits cerebela-res – na AMS, há nistagmo downbeat quando o paciente é colocado deitado em supino com a cabeça pendente em 30º, de-feitos na manobra do cancelamento do re-flexo vestíbulo-ocular, dismetria das saca-das e abalos em onda quadrada, mos-trando o componente cerebelar da desor-dem.

É um diagnóstico difícil de ser feito com se-gurança in vivo, e pode fazer bastante overlap clínico com condições patologica-mente distintas (como por exemplo a

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ataxia espinocerebelar tipo 3 de Machado-Joseph).Não há tratamento se não o sinto-mático. Geralmente responde mal à terapia com Levodopa.Eventualmente morrem de complicações relacionadas às incapacida-des.

3.A.3 - Paralisia Supranuclear Progres-siva

Doença neurodegenerativa esporádica, do grupo das taupatias. Parece representar 4 a 6% dos parkinsonismos. Tende a ter uma sobrevida muito menor que a doença de Parkinson.

Ela é caracterizada clinicamente por uma paralisia supranuclear do olhar, parkinso-nismo, distonias e demência marcantes.

A paralisia supranuclear do olhar se refere a degeneração das vias do controle da mi-rada que mandam sinais para os núcleos dos nervos oculomotores (vias hemisféri-cas, cerebelares e de outros núcleos do tronco cerebral. Isso implica que os movi-mentos oculares voluntários são afetados de forma marcada, porém há preservação dos movimentos oculares reflexos (então um paciente com total incapacidade de olhar para baixo voluntariamente conse-gue olhar para baixo usando o reflexo ves-tíbulo-ocular, movendo a cabeça como na manobra dos olhos de boneca). Essa para-lisia do olhar tende a ser mais proeminente na mirada vertical para baixo

precocemente, e evolui para completa of-talmoplegia com a evolução da doença.

O parkinsonismo da PSP tende a ser um parkinsonismo de predomínio axial, com muita rigidez de pescoço e instabilidade postural precoces. Eles irão ter história de quedas logo nos primeiros anos, que po-dem levar a necessidade do uso de cadeira de rodas (wheelchair sign).

Quase todos desenvolvem paralisia pseu-dobulbar, marcada por degeneração das vias supranucleares para os núcleos dos nervos cranianos bulbares. O quadro é marcado por disartria, disfagia e disfonia acompanhado de labilidade emocional imotivada e aumento do reflexo masseté-rico.

Eles desenvolvem uma síndrome demen-cial subcortical (inclusive, o termo demên-cia subcortical foi cunhado na PSP), carac-terizada por lentificação psicomotora ma-racada, esquecimento e muita apatia que levam a prejuízo da manipulação dos co-nhecimentos adquiridos. Além disso, apre-sentam alterações em testes de lobo fron-tal, como fluência verbal (palavras com uma determinada letra), perseveração mo-tora (ex no sinal do aplauso), comporta-mento de utilização e sinais como Gras-ping palmar ou plantar e palmo-mentoni-ano ao exame físico.

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Na RM, sinais de atrofia mesencefálica (como sinal do beija-flor ou o sinal morning glory) podem sugerir a condição.O trata-mento é sintomático, e esses pacientes tendem a responder mal à terapia dopami-nérgica.

Eventualmente morrem de complicações relacionadas às incapacidades.

3.A.4 - Degeneração Corticobasal

É uma desordem neurodegenerativa que faz parte do grupo das Taupatias. É rara (5 a cada 100.000 pessoas), mas sua real prevalência é difícil de ser estimada devido a heterogeneidade clínica.

Como seu nome implica, ela é caracteri-zada pela presença de sinais e sintomas relacionados a disfunção cortical e disfun-ção dos núcleos da base, que tendem a ser marcadamente assimétricos. É uma de-sordem progressiva da vida tardia caracte-rizada usualmente por início insidioso de apraxia assimétrica, rigidez, tremor, mio-clonias e distonia dos membros, associa-dos com perda sensitiva do tipo cortical e as vezes dor, comportamento de membro alienígena, liberação frontal e sinais pira-midais. Apesar desse ser o quadro clás-sico, cada vez mais vem sendo reconheci-das outras formas de apresentação dessa patologia, como um quadro de Demência Fronto-Temporal com distúrbios de com-portamento ou linguagem proeminentes.

Esse fenótipo clínico não é especifico da Degeneração corticobasal, e as mesmas características cognitivas e motoras já fo-ram encontradas em varias outras patolo-gias, como Paralisia Supranuclear Pro-gressiva, Doença de Alzheimer e até qua-dros vasculares – isso faz com que alguns especialistas prefiram usar o termo sín-drome corticobasal para se referir aos pa-cientes com diagnóstico clínico, e reservar o termo degeneração corticobasal para os casos confirmados neuropatologicamente.

A doença tende a progredir até a morte re-lacionada às suas incapacidades, geral-mente dentro de 10 anos após o diagnós-tico.

3.A.5 - Doença de Wilson

A Doença de Wilson é uma doença here-ditária autossômica recessiva rara, que tende a afetar pessoas jovens, caracteri-zada por um déficit da excreção de cobre, que leva a manifestações clínicas multis-sistemicas decorrentes do acúmulo patoló-gico da substância.

Das manifestações multissistemicas, se destacam sinais e sintomas de disfunção neurológica, hepática e ocular.

As manifestações neurológicas tendem a se desenvolver lenta e progressivamente, e são caracterizadas por predominância de distúrbios do movimento. Qualquer tipo de

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distúrbio do movimento pode ser visto na Doença de Wilson (o que a torna um diag-nostico diferencial importante de qualquer paciente jovem com movimentos anor-mais), sendo a mais comum uma síndrome parkinsoniana. A síndrome parkinsoniana tende a ser simétrica, e pode ser acompa-nhada de distonias, tremores (um tremor postural em bater de asas é característico), ataxia, e até coreia numa minoria. Disto-nias afetando a região facial podem dar origem ao riso sardônico, considerado tí-pico da doença.

Essencialmente todos os pacientes que possuem manifestações neurológicas apresentam áreas de pigmentação de co-bre na membrana de Descemet, em for-mato de halo, que são mais bem visualiza-dos quando exame é feito com lâmpada de fenda. Esses halos pigmentados recebem o nome de anéis de Kayser-Fleischer.

Se não tratado, o paciente evolui com di-sartria e disfagia intensas (podendo ser necessária alimentação através de gas-trostomia), além de incapacidade de de-ambulação.

Podem também apresentar diversos qua-dros psiquiátricos, como distúrbios do hu-mor, síndromes ansiosas ou labilidade emocional.

A doença hepática é a forma mais comum de apresentação dos quadros de inicio

infantil, mas tende a estar presente com o tempo nos pacientes com inicio adulto também. As formas de dano hepático são numerosas, podendo levar desde hepato-megalia assintomática até hepatite aguda auto limitada ou fulminante, hepatite crô-nica, cirrose hepática e hipertensão portal.

Outras manifestações possíveis notáveis são – anemia hemolítica, cataratas (as ve-zes em formato de girassol), síndromes tu-bulares renais, cálculos renais.

O diagnóstico da Doença de Wilson nunca deve ser perdido! Pois ela representa uma causa de distúrbios do movimento em jo-vens tratável. Então, é um diagnóstico que merece ser investigado em qualquer pes-soa com menos de 50 anos que apresente movimentos involuntários. O diagnostico começa com testes sorológicos (cerulo-plasmina e cobre séricos), um exame de lâmpada de fenda à procura de anéis de Kayser-Fleischer e dosagem de cobre uri-nário de 24 horas (melhor). Com esses da-dos, o diagnóstico pode ser realizado em locais aonde a testagem molecular gené-tica não está disponível, as vezes necessi-tando da complementação de uma biopsia hepática. Aonde houver teste genético, a procura de mutações do gene ATP7B pode ser realizada.

Quando não tratada, a doença é universal-mente fatal. Por isso, tratamento vitalício

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com objetivo de tratar o excesso de cobre é necessário. O tratamento foca em fases

- remover ou detoxicar o tecido que já tem acumulo de cobre – realizado através do uso de quelantes potentes, sendo o princi-pal a D-Penicilamina ou Trietina.

- prevenir reacumulação – feito primaria-mente usando sais de zinco.

3.A.6 - Neurodegeneração associada a acúmulo de ferro cerebral (NBIAs)

São um grupo de desordens neurodegene-rativas raras, herdadas na sua maioria por forma autossômica recessiva, caracteriza-das por acumulo de ferro cerebral e repre-sentadas por um espectro de desordens que fazem overlap fenotípico, que levam a combinações variadas de parkinsonismo, distonia, declínio cognitivo e outros déficits neurológicos como neuropatia periférica. Seus subtipos são diferenciados essencial-mente à nível molecular.

Dentre elas, a principal é a Neuodegenera-ção associada a Pantotenato-quinase (PKAN, antiga Doença de Hallervorden-Spatz). Ela ocorre por mutações do gene PANK2, e é caracterizada por ter inicio na infância (após um desenvolvimento nor-mal) com distúrbios motores extrapirami-dais tipicamente distonicos e parkinso-nismo e prejuízo cognitivo e demência. Acantocitos no sangue periférico podem

ser vistos. O achado do sinal do ‘’olho de tigre’’ na RM é particularmente sugestivo da doença. Geralmente leva a morte no ini-cio da vida adulta.

Outras causas de NBIA são a Distrofia Neuroaxonal Infantil (que cursa com envol-vimento predominante do sistema nervoso periférico), a Distrofia Neuroaxonal Juvenil (que leva a uma epilepsia mioclonica pro-gressiva), a Doença de Kufor-Rakeb (já fa-lada em PARK 9 na parte de Doença de Parkinson) e a Neuroferritinopatia (autos-sômica dominante, geralmente cursando mais com coreia).

3.B – Condições Adquiridas (Parkinso-nismos secundários)

3.B.1 - Parkinsonismo Vascular

Síndrome parkinsoniana também pode ser causada por danos vasculares aos núcleos da base e/ou suas vias. Então, parkinso-nismo vascular é um conceito amplo, que pode vir de lesões vasculares de diferentes tipos (lacunas, embolias, hemorragias, etc) e em diferentes localizações.

Geralmente esses quadros ocorrem em pacientes com fatores de risco cardiovas-culares importantes (Hipertensão, diabe-tes, dislipidemia, doença arterial periférica, doença coronariana), e são caracterizados por terem parkinsonismo de padrão de progressão atípico (início agudo, ou piora

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em passos), fraqueza e sinais piramidais associados e demência subcortical.

O quadro mais distintivo associado ao dano vascular parece ser o de parkinso-nismo da metade inferior do corpo (lower half parkinsonism), caracteristicamente associada com a doença de Biswanger. Esses pacientes apresentam marcha de pequenos passos, com pés colados ao chão (fenômeno dos pés magnéticos), po-rém sem hipomimia facial, sem postura fle-tida de tronco e com balançar dos braços preservado. Se acredita que a anormali-dade da marcha possa ser resultado de dano a substancia branca periventricular – ali há fibras talamocorticais vindas dos nú-cleos da base para a área suplementar mo-tora que se direcionam para a perna (elas ficam em localização semelhante as fibras que passam do córtex motor para o cere-belo).

A RM nesses casos será categórica mos-trando alterações vasculares suficiente-mente importantes para justificar o qua-dro. Lembrar que a correlação das áreas de infarto com desenvolvimento de parkinso-nismo ainda não é bem estabelecida, e já foi relatada com isquemias frontais, de nú-cleos da base e de mesencéfalo.

Eles não respondem bem ao uso da Le-vodopa, e o tratamento se foca em contro-lar os fatores de risco cardiovasculares.

3.B.2 - Parkinsonismo Induzido por Dro-gas

Existem diversas drogas que podem levar, como efeito adverso, ao desenvolvimento de síndromes parkinsonianas. Normal-mente o mecanismo comum por trás de to-das as drogas que têm potencial de causar parkinsonismo é um de bloqueio, depleção ou diminuição da disponibilidade da Dopa-mina no sistema nervoso central. As mais classicamente descritas são as drogas Neurolépticas e a Flunarizina.

É uma condição comum, e se estima que cerca de 20% dos diagnósticos inicial-mente dados como Doença de Parkinson sejam na verdade Parkinsonismo induzido por drogas.

Clinicamente, o parkinsonismo induzido por drogas pode mimetizar todas as carac-terísticas cardinais da Doença de Parkin-son clássica, com bradicinesia, rigidez, tre-mor e instabilidade postural que podem ser inclusive assimétricos em 40% dos ca-sos. Entretanto, há varias características do parkinsonismo induzido por drogas que não ocorrem na Doença de Parkinson, como a presença de discinesias tardias ou crises oculogíricas coexistentes. A pre-sença de síndrome do coelho, uma forma de tremor dos lábios e mandíbula, sugere que o quadro seja secundário ao uso de drogas.

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Após a retirada dos agentes ofensores, a maioria dos pacientes melhora em perío-dos variáveis (semanas a meses), mas em alguns casos parkinsonismo tardio pode persistir.

Há sugestões que pacientes que desenvol-vem parkinsonismo induzido por drogas tenham anormalidades na gânglia basal ou até tenham mais propensão a desenvolver Doença de Parkinson no futuro (então pode ser visto como fator de risco para de-senvolvimento de DP – 10-15% acabam desenvolvendo).

3.B.3 - Parkinsonismo pós Encefalítico

Foi a denominação dada ao quadro parkin-soniano sequelar dos pacientes que sofre-ram de Encefalite letárgica (Doença de von Economo), de 1916 ate 1927. Ele costu-mava deixar uma parcela dos sobreviven-tes com um quadro de parkinsonismo (que poderia ser em extensão) e com crises ocu-logiricas proeminentes.

Esses pacientes anos depois foram os pri-meiros a serem tratados com a Levopa (ler mais em ‘’Tempo de Despertar’’, por Oliver Sacks)

3.B.4 - Parkinsonismo pós traumático

Síndromes parkinsonianas podem estar associadas com Traumatismo Cranio-En-cefalico. Os mecanismos podem ser varia-dos, desde injurias penetrantes, fechadas,

hematomas cerebrais e encefalopatia pro-gressiva por traumas repetitivos (encefalo-patia pugilistica).

O próprio James Parkinson já tinha suge-rido que trauma poderia causar parkinso-nismo – ele achava que a doença vinha da parte superior da medula, na parte cervical, devido a sua mobilidade a tornar particu-larmente susceptível a injurias.

Dentre essas causas, a encefalopatia pugi-lística é a mais bem descrita. Ela foi notada primeiro em boxeadores que desenvol-viam uma lentificação mental com fala ar-rastada, incoordenação e ataxia que lem-bravam os efeitos do álcool (punch drunk syndrome). Há normalmente início insidi-oso de uma encefalopatia com agravação de uma tendência agressiva pré-existente, comportamento antissocial e distúrbio de conduta. Prejuízo de memória e concentra-ção podem se desenvolver e progredirem para demência, além disso um quadro par-kinsoniano pode se desenvolver também.

3.B.5 – Hidrocefalia de Pressão Normal

Alguns consideram a hidrocefalia de pres-são normal dentro dos diagnósticos dife-renciais da síndrome parkinsoniana, de-vido ao seu componente de distúrbio de marcha. É uma condição de fisiopatologia ainda não totalmente compreendida, que cursa com hidrocefalia comunicante em exames de imagem e clinicamente com a

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tríade clássica de distúrbio de marcha, in-continência urinaria e síndrome demencial (embora a maioria dos pacientes não apre-sentem os 3 elementos e essa combinação de achados seja relativamente pouco es-pecífica).

O distúrbio de marcha que deve nos fazer pensar em hidrocefalia de pressão de nor-mal é um distúrbio de difícil descrição, mas que é relatado como uma marcha magné-tica, com pés colados ao chão, marcha apráxica ou marcha frontal. Independente dos termos utilizados, esses pacientes ten-dem a andar lentamente, com passos pe-quenos e uma base alargada, com dificul-dade de virar e com instabilidade postural.

O distúrbio cognitivo característico é de uma demência do tipo subcortical, com lentificação psicomotora, desatenção, pre-juízo de funções executivas e apatia.

Normalmente o quadro é diagnosticado com aspectos característicos de imagem (evidência de hidrocefalia com ângulo agudo entre os ventrículos no corte coronal e proeminência dos sulcos temporais é su-gestivo) e uma resposta positiva ao Tap Test.

O tratamento é feito através da colocação de uma derivação ventrículo-peritoneal, que tende a fazer efeito principalmente no distúrbio de marcha.

3.B.6 - Calcificação dos Núcleos da Base

Calcificações patológicas dos núcleos da base são coletivamente chamadas por al-gumas referências como Síndrome de Fahr. Elas podem ser resultado de diversas condições, e cursar com sintomas neuroló-gicos e psiquiátricos.

Devemos lembrar que calcificações isola-das de globos pálidos em pacientes >50 anos são achados normais em exames de Tomografia de rotina. Mas encontrar calci-ficações de núcleos denteados do cerebelo ou calcificações na substância branca ce-rebral tendem a ser associados a condi-ções patológicas subjacentes.

Existe uma forma familial de calcificações dos núcleos da base chamada de Doença de Fahr, e existem causas secundarias, re-lacionadas a hipoparatireoidismo (principal causa), hiperparatireoidismo, HIV, irradia-ção intracraniana, encefalopatias mitocon-driais, Síndrome de Aicardi-Goutieres, Do-ença de Kosaka-Shibayama e Doença de Nasu Hakola.

3.B.7 - Parkinsonismo por Manganês

Parkinsonismo pode ser causado por into-xicação por Manganês, um dos metais pe-sados mais utilizados no mundo. É repor-tado principalmente em mineradores, mas pode ocorrer também em trabalhadores de solda.

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SÍNDROME PARKINSONIANAS

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Faz um quadro parkinsoniano lentamente progressivo com anosmia e uma marcha característica, em andar de galo (cockwalk gait) que ocorre por distonia dos gastroc-nêmios.

3.B.8 - Parkinsonismo infeccioso e Com-plexo Parkinsonismo-Demência de Guam

Algumas doenças infecciosas podem cur-sar com parkinsonismo como manifesta-ção clínica. Isso é incomum, e principal-mente descrito em conjunto com a demên-cia do HIV, encefalites (principalmente re-lacionadas a vírus Oeste do Nilo e Encefa-lite Japonesa), acometimento dos núcleos da base por abscessos (por exemplo na neurotoxoplasmose), tuberculomas ou Sí-filis.

De importante menção é também a Do-ença de Jakob-Creutzfeldt, uma doença priônica que pode cursar com parkinso-nismo. Normalmente leva a um quadro de ataxia mioclônica proeminente junto de uma demência rapidamente progressiva.

A ilha de Guam se encontra no arquipélago de Mariana, nas ilhas pacíficas. É uma re-gião de relativamente pouca variação ge-nética, já que os Chamorros (nativos da ilha) viviam isolados do resto do mundo até ua colonização. Lá, foi descrita uma parali-sia hereditária desconhecida, de

importante agregação familiar, que tinha características semelhantes à Esclerose Lateral Amiotrófica em alguns e demência e parkinsonismo em outros.

Os nativos chamavam de Lytico quando a doença se apresentava com o componente paralitico e de Bodig quando ela se apre-sentava com o componente parkinsoniano (então é uma condição também referida como Doença de Lytico-Bodig).

A condição chegou a ser a principal causa de morte entre Chamorros adultos nos anos 1940. Existem diversas teorias sobre a etiologia da doença, desde consumo de plantas locais até características das águas da ilha. Oliver Sacks descreveu em gran-des detalhes a condição e suas primeiras descobertas em seu livro ‘’A Ilha dos Dal-tônicos’’.