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SÍNTESE E CARACTERIZAÇÃO DE ACETATO DE CELULOSE OBTIDO A PARTIR DO BAGAÇO DA CANA-DE-AÇÚCAR. Simone Cristina Freitas de Carvalho* Aluna de graduação em licenciatura em Química, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Altamira Taísa Soares Santos* Aluna de graduação em licenciatura em Química, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Jaécio Carlos Diniz Professor do Departamento de Química, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Simone Alves Serafim Rocha Técnica de laboratório, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Cícero Bosco Alves de Lima Professor do Departamento de Química, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. E-mail: [email protected] RESUMO: O trabalho visa à preparação de acetato de celulose, a partir do bagaço de cana-de-açúcar, material que costuma ser descartado e acaba tornando-se lixo, causando desastres ao meio ambiente. Obteve-se a celulose inicialmente através de um pré-tratamento, purificação do bagaço de cana-de- açúcar, nesta etapa avaliou-se a influencia da retirada de extrativos presentes no bagaço. Apresenta como método para obtenção a acetilação homogênea, utilizando-se o ácido acético como solvente, o anidrido acético como agente acetilante, sendo o ácido sulfúrico o catalisador, fez-se o monitoramento da reação retirando alíquotas da reação a cada quatro horas nas primeiras doze horas de reação. A confirmação da reação de esterificação foi possível a partir de medidas de difração de raios-X, espectroscopia na região do infravermelho, calorimetria exploratória diferencial (DSC), e a titulometria para determinação do grau de substituição através de uma reação de saponificação. O acetato de celulose com 4 horas de reação apresentou um bom grau de substituição 2,77, assim como o acetato de celulose obtido com 8 horas, 12 horas que obtiveram graus de substituição de 2,78 e 2,84 respectivamente, enquanto o acetato

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SÍNTESE E CARACTERIZAÇÃO DE ACETATO DE CELULOSE OBTIDO A PARTIR DO BAGAÇO DA CANA-DE-AÇÚCAR.

Simone Cristina Freitas de Carvalho*

Aluna de graduação em licenciatura em Química, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

Altamira Taísa Soares Santos*

Aluna de graduação em licenciatura em Química, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

Jaécio Carlos Diniz

Professor do Departamento de Química, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

Simone Alves Serafim Rocha

Técnica de laboratório, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

Cícero Bosco Alves de Lima Professor do Departamento de Química, Universidade do Estado do Rio

Grande do Norte.

E-mail: [email protected]

RESUMO: O trabalho visa à preparação de acetato de celulose, a partir do

bagaço de cana-de-açúcar, material que costuma ser descartado e acaba

tornando-se lixo, causando desastres ao meio ambiente. Obteve-se a celulose

inicialmente através de um pré-tratamento, purificação do bagaço de cana-de-

açúcar, nesta etapa avaliou-se a influencia da retirada de extrativos presentes

no bagaço. Apresenta como método para obtenção a acetilação homogênea,

utilizando-se o ácido acético como solvente, o anidrido acético como agente

acetilante, sendo o ácido sulfúrico o catalisador, fez-se o monitoramento da

reação retirando alíquotas da reação a cada quatro horas nas primeiras doze

horas de reação. A confirmação da reação de esterificação foi possível a partir

de medidas de difração de raios-X, espectroscopia na região do infravermelho,

calorimetria exploratória diferencial (DSC), e a titulometria para determinação

do grau de substituição através de uma reação de saponificação. O acetato de

celulose com 4 horas de reação apresentou um bom grau de substituição 2,77,

assim como o acetato de celulose obtido com 8 horas, 12 horas que obtiveram

graus de substituição de 2,78 e 2,84 respectivamente, enquanto o acetato

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obtido com 24 horas de reação teve GS de 2,47, sendo, portanto caracterizado

como um diacetato de acordo com dados da literatura.

PALAVRAS CHAVE: Bagaço de cana-de-açúcar, celulose, acetato de celulose. 1. Introdução

Atualmente, o impacto ambiental causado pela crescente demanda de

novas tecnologias está entre as grandes preocupações da humanidade. A

necessidade de desenvolver materiais biodegradáveis vem sendo objetivo de

vários centros de pesquisa e cada vez mais, grandes empresas, seja por

imposição governamental ou por estratégia de marketing, despertam interesses

em reduzir o impacto ambiental gerado por suas linhas de produção.

Na tentativa de reduzir os impactos ambientais gerados por essas

macromoléculas desenvolver novas tecnologias onde suas propriedades são

necessárias, grupos de pesquisa em todo o mundo voltam suas atenções para

polímeros naturais, biodegradáveis e renováveis. De um modo geral, um maior

número de pesquisas é destinado à celulose, ao amido, à quitina e à quitosana

que são polímeros produzidos pela própria natureza e não necessitam do

emprego de metodologia industriais complexas e tão pouco solventes

específicos para suas sínteses.

Entre esses polímeros naturais, destaca-se aqui a celulose que além de ser

biodegradável e renovável é o material natural mais abundante do mundo e o

Brasil, sendo um país tropical, apresenta grandes vantagens climáticas que

favorecem a produção desse material.

De acordo com dados de 2005 da Organização das Nações Unidas

para Agricultura e Alimentação (FAO), o Brasil é o maior produtor mundial de

cana-de-açúcar e a sua produção é maior do que a dos quatro maiores

produtores seguintes (Índia, China, Tailândia e Paquistão) juntos. De acordo

com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção

brasileira de cana-de-açúcar atingiu 734,0 milhões de toneladas em 2011, um

aumento de 2,3% o menor dos últimos seis anos. Essa desaceleração deve-se

principalmente à falta de chuvas regulares nas principais regiões produtoras do

Brasil. Mas a procura de álcool combustível, tanto para o mercado interno

como para a exportação vem incentivando a expansão da plantação de cana-

de-açúcar e o surgimento de novas usinas.

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A quantidade de bagaço de cana-de-açúcar seco oriunda dessa atividade

corresponde a 280 kg para cada tonelada de cana-de-açúcar processada.

Atualmente, o bagaço de cana de açúcar é em sua maioria queimado para

gerar energia para as usinas, mas uma quantidade considerável é ainda

desperdiçada, e por essa razão, vários artigos têm sido produzidos buscando

alternativas para sua reciclagem. Por exemplo, a utilização da celulose para a

produção de álcool pelo processo de hidrólise enzimática e hidrólise ácida,

produção de compósitos e derivados celulósicos.

O acetato de celulose (AC) é um dos derivados da celulose com maior

importância comercial, principalmente devido às seguintes propriedades: é um

polímero neutro, tem a capacidade de formação de filmes transparentes e tem

um baixo custo. O AC pode ser usado em processos de separação por

membranas, tais como hemodiálise, nanofiltração e osmose inversa, matrizes

para libertação controlada de fármacos, sensores e proteção de filmes ópticos,

separação de gases e preparação de filmes de alumina.

Os derivados acetilados da celulose podem ser produzidos por dois tipos

diferentes de reações de acetilação: homogênea e heterogênea. Ambas as

reações ocorrem geralmente através do uso de ácido acético como solvente,

anidrido acético como agente acetilante, e ácido sulfúrico e perclórico como

catalisadores. O acetato de celulose é, assim, produzido pela substituição dos

grupos hidroxila das unidades de glicose por grupos acetila. Como

consequência pode-se obter materiais com diferentes graus de substituição

(GS) (sendo o grau de substituição o número médio de grupos acetila que

substituem as hidroxilas por unidade glicosídica), o qual pode variar de zero

(para a celulose) a 3 (para um material tri-substituído). O GS é um parâmetro

de extrema importância, pois afeta a cristalinidade do polímero, o potencial de

biodegradabilidade e a solubilidade em diferentes solventes, entre outras

propriedades. Por exemplo, celulose (GS = 0) é insolúvel na maioria dos

solventes (S), mas ao se aumentar o GS do acetato de celulose, a solubilidade

se altera (GS ≈ 1, S: água; GS ≈ 2, S: tetraidrofurano ou acetona; GS ≈ 3, S:

diclorometano ou clorofórmio). Assim, a determinação do GS do acetato de

celulose é importante para que se defina sua utilização.

Várias são as técnicas experimentais comumente para a determinação do

GS: por via química ou por técnicas instrumentais de análise. Dentre estas

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últimas, as mais usadas são a cromatografia gás-líquido, espectrometria de

massa, cromatografia líquida de alta eficiência, espectroscopia e infravermelho,

e ressonância magnética nuclear de prótons (1H-RMN) e de carbono (13C-

RMN).

Nesse trabalho serão utilizados alguns métodos para caracterização do

acetato de celulose retirando-se uma porção do produto a cada 4 horas de

reação durante as primeiras 12 horas de reação para verificar o quanto reagiu,

como: DSC Calorimetria Exploratória Diferencial e DRX Difração de raios-X.

2. Objetivos

2.1 Geral

Este trabalho tem como objetivo geral, sintetizar e caracterizar o

acetato de celulose, obtidos através da reação homogênea monitorada do

bagaço de cana-de-açúcar através do uso do ácido acético como solvente,

anidrido acético como agente acetilante, e ácido sulfúrico como catalisador.

2.2 Específicos

Determinar o grau de substituição do acetato de celulose obtido

com 4,8.12 e 24 horas de reação através do método por via química;

Caracterizar os produtos obtidos a cada 4 horas de reação por

técnicas de Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC), Difração de raios-X

(DRX) e Espectroscopia na região do infravermelho por transformada de

FOURRIER (FTIR);

3. Referencial teórico

Em busca de novas alternativas que possam suprir os efeitos da poluição

desenfreada causada pela atividade humana, a utilização de materiais ditos como

lixo na confecção de materiais que possam servir como ferramentas para serem

usadas e técnicas de despoluição de ambientes aquáticos, libertação controlada de

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fármacos, entre outros adquire um importante papel tanto do ponto de vista

econômico, quanto social. Um dos materiais que vem sendo estudado quanto a sua

utilização nesses aspectos é o acetato de celulose.

O acetato de celulose é o mais importante derivado de celulose, sendo

produzido a partir da acetilação do biopolímero em presença de anidrido acético,

ácido acético glacial e ácido sulfúrico. (CERQUEIRA et al., 2007). É usado,

principalmente, em aplicações como membranas em processos de separação,

filtração, incluindo diálise, hemodiálise e osmose reversa, visando estudar o

processo de permeabilidade a diferentes íons (FILHO et al.,2008; LOEB et al.,

1997; SAKAI, 1994).

O acetato de celulose é um dos derivados da celulose com maior

importância comercial, principalmente devido às seguintes propriedades: é um

polímero neutro, tem a capacidade de formação de filmes transparentes, tem um

baixo custo e pode ser obtido a partir de materiais que são descartados. A

utilização do bagaço de cana de açúcar no Brasil para produção de acetato de

celulose é uma alternativa interessante do ponto de vista ambiental, pela remoção

deste resíduo do meio ambiente e pela possibilidade agregar valor ao bagaço de

cana-de-açúcar.

A cana-de-açúcar foi introduzida no Brasil na época colonial. Os primeiros

exemplares vieram da Ilha da Madeira em 1502 (LIMA, 1984). A cana-de-açúcar é

composta de um eixo principal (talo), raízes, folhas e inflorescências

(FERNANDES, 1984). Dos constituintes da cana-de-açúcar, apenas o talo vem

apresentando valor econômico por sua capacidade de acumulação de açúcares e

produção de fibras.

O uso do bagaço da cana-de-açúcar apresenta vantagens, pois além de ser

o maior resíduo agroindustrial da indústria sucroalcooleira, com uma produção de,

aproximadamente, 280 kg/t de cana moída, possui baixo custo (OLIVÉRIO, 2005 e

SUN et al., 2004). Estima-se que sejam produzidos cerca de 54 milhões de

toneladas de bagaço seco anualmente em todo o mundo. Muitos processos e

produtos têm feito uso deste resíduo agroindustrial como matéria-prima, devido,

além da grande quantidade produzida, às suas características físico-químicas.

4. Procedimentos metodológicos

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4.1 Purificação do bagaço de cana-de-açúcar

A purificação foi feita segundo MEIRELES, 2007, com modificações como

descrito a seguir.

Adicionou-se 76 mL de água destilada a 4,00 g de bagaço seco e moído.

Deixou em repouso por 24 horas e filtrou. Adicionou-se 76,00 mL de hidróxido de

sódio 0,25 mol.l-1 ao bagaço, deixou mais 18 horas em repouso, logo após a

mistura reacional foi filtrada e lavada com água destilada. O bagaço foi colocado

em refluxo com 3 porções sucessivas de 450 ml de uma mistura 20% v/v de ácido

nítrico e etanol. A mistura reacional foi trocada a cada hora. Após o refluxo filtrou-se

e lavou-se a mistura com água destilada até que a solução da lavagem se tornasse

incolor (até eliminar todo o ácido). Isto é controlado medindo-se o pH da água

resultante, após a lavagem do bagaço, com auxílio de papel indicador. Quando o

pH da água estiver neutro (pH=7) a lavagem é encerrada. O bagaço purificado foi

congelado em freezer, com temperatura de aproximadamente -32ºC, em seguida

foi liofilizado em um liofilizador de bancada modelo L101, marca Liotop.

4.2 Produção e caracterização do acetato de celulose

4.2.1 Acetilação Homogênea

A acetilação foi feita seguindo o procedimento descrito por MEIRELES,

2007.

A 2,0058g de bagaço purificado adicionou-se 40,00 mL de ácido acético

glacial, agitou-se por 30 min à temperatura ambiente. Logo após adicionou-se uma

solução contendo 0,30 mL de H2SO4 concentrado em 17,5 mL de ácido acético

glacial e agitou-se por 15 min à temperatura ambiente. A mistura foi filtrada e o

bagaço foi colocado em um béquer. Ao filtrado adicionou-se 40,00 mL de anidrido

acético, agitou-se e retornou-se o filtrado ao béquer contendo o bagaço. A solução

foi agitada por mais 30 min e deixada em repouso. Após 24 horas adicionou-se

água destilada ao meio reacional até que não houvesse mais formação de

precipitado. A mistura foi filtrada à vácuo com água destilada até a neutralização. O

material foi congelado em freezer, com temperatura de aproximadamente -32ºC, e

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em seguida foi liofilizado em um liofilizador de bancada modelo L101, marca Liotop.

4.2.2 Determinação do grau de substituição

A três amostras de 0,100g do material obtido adicionou-se uma solução

alcoólica contendo 10,00 mL de NaOH 0,25 mol.L-1 e 10,00 mL de etanol,

previamente padronizado com bfitalato de potássio e deixou-se a mistura em

repouso durante 24 horas. Logo após adicionou-se 20,00 mL de ácido clorídrico

0,25 mol.L-1 e deixou-se a mistura por mais 30 min, em seguida a mistura foi

titulada com o hidróxido de sódio previamente padronizado, utilizando como

indicador a fenolftaleína.

Para o cálculo da quantidade de grupos acetilados utilizou-se a equação 1.

%GA = [(Vbi + Vbt)µb – (Va.µa)] M . 100 (1)

mac

Onde:

%GA = porcentagem de grupos acetila

Vbi = volume de hidróxido de sódio adicionado

Vbt = Volume de hidróxido de sódio obtido na titulação

μb = molaridade do hidróxido de sódio

Va = volume de acido clorídrico adicionado

μa = molaridade do acido clorídrico

M = massa molar dos grupos acetila

mac = massa de acetato utilizada

4.2.3 DSC As análises foram realizadas utilizando o equipamento DSC – 60 da

Shimadzu, a partir da temperatura inicial de 25ºC até a temperatura final de 400ºC,

variando 5ºC.min-1, em panela de alumínio em atmosfera de nitrogênio com vazão

de 50 ml.min-1. O instrumento foi calibrado (temperatura e entalpia) usando o zinco

como padrão.

4.2.4 DRX

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Os difratogramas de raios-X das amostras foram obtido utilizando um

gerador de voltagem de 40kV e uma corrente de 20 mA. A faixa de varredura foi de

2 a 60º, com um passo mínimo de 0,02º, usando radiação Cu-Kα de 1,54 Å, com

filtro de Ni.

5. Resultados e discussões

5.1 Purificação do bagaço de cana-de-açúcar

A purificação do bagaço de cana-de-açúcar se dá através do processo de

pré-tratamento, onde ocorre a retirada de constituintes que não são necessários para

obtenção do acetato de celulose, que é o propósito do trabalho, a lignina, a

hemicelulose e os extrativos são solubilizados nesse processo, onde o bagaço bruto

apresenta uma quantidade menor de celulose em relação ao bagaço purificado.

A curva de DSC para celulose purificada apresenta o primeiro pico

endotérmico em aproximadamente 90ºC, o qual corresponde à energia necessária

para que ocorra a saída da água. Essa temperatura se deve à interação da água

com a matriz polimérica. Além disso, analisando os picos relativos à decomposição

do material percebe-se um maior consumo de energia. Nota-se uma coerência neste

consumo de energia, pois a celulose, devido sua pureza, apresenta uma estrutura

mais cristalina do que as amostras tratadas. Isso pode ser explicado pela sua

estrutura altamente cristalina composta de fortes pontes de hidrogênio intra e

intermolecular, sendo necessária uma grande quantidade de energia para o seu

rompimento.

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O difratograma da celulose obtida do bagaço da cana-de-açúcar apresenta

as difrações típicas da celulose I, ou seja, difrações em 2θ: 23º (plano 002), 17º

(plano 001) e 15º (plano 001). Esses picos podem ser atribuídos aos processos de

remoção dos extrativos presentes no bagaço, que possibilitaram uma melhor

organização molecular e que processo utilizado ocorreu sem a modificação de sua

estrutura, formando a celulose tipo I.

Figura 1: Curva de DSC para a amostra de celulose purificada.

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5.2 Obtenção do acetato de celulose As figuras a seguir mostram o esquema e o mecanismo proposto para

reação de acetilação da celulose do bagaço da cana-de-açúcar.

Figura 3: Esquema da reação de produção do acetato de celulose. Fonte: Meireles, 2007.

Figura 2: Difratograma da amostra de celulose purificada.

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Figura 4: Mecanismo proposto para a reação de acetilação da celulose. Fonte: Meireles, 2007.

Na reação de acetilação da celulose, inicialmente, o anidrido é protonado ao

entrar em contato com o hidrogênio fornecido pelo ácido sulfúrico. A protonação faz

com que as cargas neste ponto fiquem desbalanceadas favorecendo o ataque

nucleofílico do oxigênio do grupo ─OH do monômero de glicose da molécula de

celulose sobre o carbono do grupo carbonílico do anidrido acético. Na seqüência,

ocorre a desprotonação do composto, seguido da eliminação de ácido acético,

formado como subproduto da reação.

Segundo DANIEL (1985) durante a acetilação da celulose há uma mudança

gradual das propriedades do polímero, no qual ocorre a formação de uma superfície

mais hidrofóbica, aonde a importância da formação de pontes de hidrogênio

polímero-polímero e polímero-solvente para a sua solubilização é substituída pela

formação de interações de dipolo induzido. Esta mudança está relacionada com a

diminuição do número de grupos hidroxil e sua distribuição ao longo da superfície do

polímero. A acetilação interrompe as interações intra e intermoleculares da molécula

de celulose permitindo que ocorra a interação com o solvente. (KAWANISHI et al.,

1998 apud CARVALHO, 2009). Solventes básicos interagem com grupos hidroxil,

enquanto que solventes ácidos interagem com grupos acetil (TWEDDLE, 1978 apud

CARVALHO, 2009).

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5.3 Determinação do grau de substituição

O grau de substituição, que é o valor médio de grupos acetila (GA) que

substituem as hidroxilas nas unidades glicosídicas, foi determinado por via química

através de uma reação de saponificação. As análises foram realizadas em triplicata.

A representação do mecanismo da reação está descrito abaixo.

Figura 5: Representação do mecanismo da reação de saponificação do acetato de celulose. Fonte: Meireles, 2007.

A saponificação é a reação de hidrólise promovida por uma base. Nesta

reação, o íon hidróxido promove um ataque nucleofílico ao átomo de carbono da

carbonila do acetato de celulose. Em seguida, um intermediário tetraédrico expele

um íon alcóxido, ocorrendo a transferência de um próton conduzindo ao produto da

reação (CARVALHO, 2009).

A Tabela 1 mostra os valores obtidos experimentalmente para a

determinação do GS do monitoramento da reação.

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Tabela 1: Volumes de NaOH utilizados na titulação do acetato de celulose

para produtos da reação de 4h, 8h, 12h e 24h e porcentagem de Grupos Acetila

(%GA).

Tempo de reação

(h)

Massa (g) Volume de NaOH

(mL)

% de grupos

acetila (GA)

4

8

12

24

0,0511

0,0486

0,0523

0,1053

4,95

41,96

4,86 41,98

5,05

9,55

42,94

37,35

Para o cálculo da porcentagem de grupos acetila utilizou-se a equação 1,

para o cálculo do grau de substituição utilizou-se uma regra de três simples.

Segundo Puleo um triacetato de celulose possui 43,5% de grupos acetila o que

corresponde a um grau de substituição de 2,88, assim verificou-se que os diante dos

resultados para as porcentagens de grupos acetila descritas na tabela os produtos

da reação de 4h, 8h, 12h e 24h obtiveram grau de substituição respectivamente de

2,77, 2,78, 2,84 e 2,47.

4 8 12 16 20 24

2,4

2,5

2,6

2,7

2,8

2,9

Gra

u d

e s

ub

stitu

içoم

Tempo de reaçمo (h)

Grau de substituiçمo

Figura 6: Grau de substituição em função do tempo de reação.

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Através da análise do gráfico obtido com os dados analisados por via

química observa-se que com 4 e 8 horas a acetilação mantém-se constante, mas já

com grau de acetilação bastante considerável, com 12 horas de reação o material já

se encontra no seu estado máximo de acetilação, com grau de substituição

aproximadamente 3, e com 24 horas essa acetilação diminui, apresentando grau de

substituição de 2,47.

5.4 DSC

A Figura apresenta a curva DSC para o acetato de celulose obtido com 4, 8,

12 e 24 horas. Todas as curvas apresentam picos endotérmicos entre a temperatura

ambiente e 100º, este acontecimento é atribuído a dessorção de água ligada a

estrutura do derivado celulósico. E o segundo evento em aproximadamente 300 °C

atribuída à fusão do acetato de celulose. A sua degradação térmica também inicia

próximo a essa temperatura (Filho, et al. 2011). Alguns exemplos vistos na literatura

mostraram picos endotérmicos em torno de 160-300º.

Figura 7: Curvas de DSC para as amostras de acetato de celulose obtido com 4, 8, 12 e 24 horas de reação.

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5.5 DRX

As alterações na morfologia dos polímeros podem ser seguidas através da

avaliação das curvas de DRX. O DRX apresenta resultados que permitem analisar

mudanças na cristalinidade nas amostras após a síntese. A figura refere-se à

difração dos derivados da celulose. O principal pico é localizado em

aproximadamente 8º, é citado como a principal característica de semicristalinidade

do derivado da celulose acetilada. A posição deste pico indica a produção de uma

desordem quando a celulose é acetilada. Esta desordem é causada pela projeção

dos grupos substituintes ao longo do eixo e é associada com o aumento na distância

interfibrilar e também é associada com a quebra das estruturas microfibrilares.

De acordo com os difratogramas, o acetato de celulose apresenta baixa

cristalinidade, e esse grau de cristalinidade diminui com o aumento do grau de

substituição. Esta redução na cristalinidade em relação a celulose ocorre devido a

substituição de grupos hidroxila por grupos acetil que possuem um maior volume.

As amostras submetidas a um longo tempo de acetilação, tem uma

cristalinidade superior as amostras acetiladas a pouco tempo, isso deve ser devido o

acondicionamento melhor da cadeia, com exceção da amostra de 24 horas, que

deve ter ocorrido problemas durante a acetilação.

O acetato obtido com 12 horas apresentou uma maior estrutura cristalina de

acordo com os dados de DRX. Este fato pode ser atribuído a uma melhor

homogeneidade na distribuição dos grupos acetil, produzindo alto grau de

substituição.

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6. Conclusões

Este trabalho contribuiu através da obtenção, modificação e aplicação da

celulose proveniente do bagaço de cana-de-açúcar, de forma a conduzir a um

melhor aproveitamento dessa abundante biomassa brasileira.

Foi realizada a pesquisa bibliográfica, recolheu-se o material e a celulose

extraída pela purificação do bagaço pôde então ser modificada quimicamente,

através da reação homogênea da celulose obtendo-se o acetato de celulose

trissubstituído.

O material obtido foi analisado por via química, através de uma reação de

saponificação para verificar o grau de substituição. As técnicas de analises utilizadas

confirmaram que o material foi acetilado. O acetato de celulose foi produzido a partir

da acetilação homogênea da celulose obtida do bagaço da cana-de-açúcar. Os

valores de GS puderam ser controlados pelo tempo de acetilação, esta

funcionalidade é muito interessante, visto que a produção de celulose biodegradável

Figura 8: Difratograma das amostras de acetato de celulose obtido com 4, 8, 12 e 24 horas de reação.

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é desejável considerando aspectos ambientais e econômicos. As caracterizações

das amostras acetiladas mostraram a formação de uma estrutura mais homogênea,

desde a primeira amostra, que obteve um bom grau de substituição.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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