sindrome de abstinencia

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Sndrome de Abstinncia no Recm-NascidoNeonatal Abstinence Syndrome

Arthur Figueiredo Delgado1 Joselina Magalhes Andrade Cardieri2 Lilian Maria Cristfani3 Renata Dejtiar Waksman4 Embora os estudos sobre teratologa e toxicologia fetais tenham se iniciado no principio deste sculo, a potencialidade dos agentes qumicos em produzir efeitos txicos sobre o embrio ou feto em desenvolvimento s foi reconhecida aps a tragdia ocorrida com o uso da Talidomida, no incio da dcada de 60. Alm disso, o fato de que a exposio a agentes qumicos durante a gestao poderia causar conseqncias imediatas e permanentes, aps o nascimento, s foi amplamente constatado no incio da dcada de 70. Assim, nos ltimos 20 anos, presenciamos um grande aumento no nmero de relatos de efeitos indesejveis de agentes qumicos sobre o feto em desenvolvimento e sobre o recm-nascido. Inmeros agentes foram apontados como causadores de efeitos adversos ao recm-nascido, detectveis ao nascimento ou mais tardiamente e ao longo do desenvolvimento. Atualmente, vrios agentes tm evidncias suficientes para confirmar sua ao neurotxica para o ser humano em desenvolvimento. Destes, alguns so drogas de abuso como herona, me-

Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo. Disciplina de Pediatria Neonatal. * Esta reviso parte dos trabalhos de Ps-Graduao em Pediatria dos autores. 1 Assistente da Unidade de Terapia Intensiva do I.Cr. 2 Assistente da Unidade de Pneumologia do I.Cr. 3 Aluna da Complementao Especializada do I.Cr. (Oncologia). 4 Assistente do Servio de Consultas de Urgncia e Triagem do I.Cr.

tadona, lcool, cocana e maconha. Quando se avaliam os dados disponveis sobre a toxicidade dos agentes qumicos ao ser humano em desenvolvimento, as evidncias exigidas para se caracterizar sua ao txica so semelhantes quer seja tal agente uma droga de uso teraputico, uma droga de abuso ou um agente fsico ou ambiental. Os dados disponveis so mais numerosos em relao s drogas de uso teraputico, para as quais testes rigorosos so realizados antes de sua comercializao. Para as drogas de abuso, entretanto, no existem testes padronizados (a no ser que ela seja de uso teraputico tambm) e as informaes podem ser escassas ou inexistentes at que os efeitos sejam detectados em humanos. Por outro lado, o controle da exposio a substncias de abuso tambm difcil ou impossvel. Assim, a contribuio de tais substncias para o surgimento de manifestaes neurotxicas no ser humano em formao significante e pode estar aumentando, sendo importante alertar a populao geral sobre as conseqncias drsticas de seu uso. Estatsticas americanas revelam que a prevalncia do uso de drogas entre as mulheres em idade frtil alta: aproximadamente 34 milhes de 56 milhes de mulheres nesta faixa etria usam lcool com freqncia, mais de 18 milhes so fumantes e mais de 6 milhes usam maconha. Revelam tambm que as mulheres no reduzem o uso de tais drogas at que a gravidez seja confirmada, o que pode ocorrer at 2 meses aps a concepo, podendo o feto j estar, irreversivelmente, afetado24. Baseados em inmeros dados isolados na literatura, revisamos alguns efeitos txicos das principais drogas de abuso, com nfase para a sndrome de abstinncia no recm-nascido. Cocana Inmeras variantes sociais e econmicas

podem coexistir em populaes que utilizam drogas, prejudicando a anlise dos efeitos txicos das mesmas. Assim sendo, freqente a presena de desnutrio materna, uso indiscriminado de fumo e lcool, que acabam confundindo a avaliao da ao de drogas como cocana e anfetamina na gestao e no feto31. A grande maioria dos trabalhos3'4-15'26'27 tem relatado inmeros efeitos malficos do abuso de cocana para a gravidez, o feto e o recm-nascido, tais como: maior taxa de aborto espontneo, retardo de crescimento intrauterino, alteraes vasculares placentrias, trabalho de parto prematuro, microcefalia, sndrome de abstinncia do recm-nascido, malformaes do trato genitourinario e distrbios do comportamento. A porcentagem de sofrimento fetal (lquido amnitico ou recm-nascido impregnado de mecnio, bradicardia ou taquicardia fetal) significativamente mais elevada em relao a gestaes normais15'31. A cocana age no sistema nervoso perifrico inibindo a conduo nervosa, prejudicando a reutilizao da noradrenalina com conseqente aumento dos seus nveis fisiolgicos, provocando vasoconstrio (inclusive placentria), taquicardia e aumento da presso arterial secundariamente3. Em nvel central a cocana tem ao direta em receptores de dopamina, serotonina e noradrenalina, prejudicando tambm a reabsoro desses neurotransmissores17. Muitas vezes a avaliao dos sinais e sintomas da sndrome de abstinncia do recm-nascido torna-se difcil. Desse modo, crianas de grupos de alto risco (mes com histria de uso da droga com teste urinario de triagem positivo ou no, recm-nascidos com teste de triagem positivo) devem ser comparadas com recm-nascidos de gestaes normais. Tal comparao deve ser feita por pessoal treinado, utilizando-se um "score", sendo o de Finnegan12 o mais utilizado. Em recente trabalho que estuda a evoluo perinatal de fetos expostos cocana e/ou hero-

na15 foi estabelecido como tendo "score" normal aqueles recm-nascidos com valores menores que 9, sndrome de abstinncia leve entre 9 e 12 e maior que 12 nos quadros moderados e graves. As crianas nascidas de mes com histria anterior ou atual de utilizao de cocana tiveram significativa percentagem de sndrome de abstinncia em relao quelas nascidas de gestaes sem qualquer histria de abuso de drogas. A tabela l mostra os sinais mais comuns de abstinncia em dois grupos de crianas estudadas15: Grupo A - Teste de urina positivo para cocana na me e/ou filho. Grupo B - Teste de urina negativo mas histria de uso de droga durante a gravidez. As crianas que apresentaram "score" 12 receberam fenobarbital como teraputica para a sndrome de abstinncia. Nos recm-nascidos com abstinncia secundria ao abuso materno de cocana, o tempo de tratamento necessrio foi menor em relao ao grupo que utilizou herona15'17. Vrios estudos sugerem haver um sinergismo na associao cocana e herona para provocar sndrome de abstinncia no recm-nascido17'26. Este efeito no foi descrito para, situaes como retardo de crescimento intra-uterino ou microcefalia. Os resultados da maioria dos trabalhos indicam que os recm-nascidos expostos cocana tm maiores efeitos adversos perinatais em sua evoluo quando comparados a outros grupos econmica e socialmente semelhantes. nfetaminas Nos EUA as anfetaminas foram muito utilizadas durante a dcada de 60 e incio dos anos 70. Estudos mais recentes mostram a diminuio do seu uso, embora o acesso a essas drogas seja fcil, principalmente para as populaes mais pobres29-31. Trabalhos mostram que a maioria das mes que utiliza anfetaminas durante a gravidez continua a us-las aps o parto11. As anfetaminas e a cocana tm semelhanas em sua ao farmacolgica e, conseqentemente, efeitos similares na placenta e no feto. Desse modo, no caso das mes que abusam de anfetaminas durante a gestao, podem ocorrer leses placentrias (em nvel vascular), retardo de crescimento intra-uterino, prematuridade, alteraes comportamentos e motoras em seus recm-nascidos9-10'17. As anfetaminas estimulam a liberao de monoaminas (dopamina, serotonina e noradrenalina), impedindo sua degradao (bloqueio da monoamino-oxidase) e reabsoro. Em adio, a anfetamina age no eixo hipfise-adrenal aumentando os nveis sricos de corticosterona. A sndrome de abstinncia dos recm-nascidos de mes que utilizaram anfetaminas durante a gestao em muito se assemelha que ocorre com a cocana. Estudos utilizando o "score" de Finnegan12 demonstraram alteraes comportamentais e motoras neonatais caracterizadas por: insnia, anorexia, tremores e hipertona. Seguindo uma fase de irritabilidade acentuada, algumas crianas apresentaramse extremamente sonolentas, letrgicas, com depresso neurolgica generalizada e necessitando de sonda gstrica para alimentao631 >38. A associao com opiceos (herona) parece ter uma ao sinrgica em alguns efeitos da droga como se evidencia com a cocana31. Efeitos persistentes com seqelas neurolgicas definitivas devido utilizao das anfetaminas durante a gestao (principalmente durante o ltimo trimestre) continuam sendo pesquisadas em nveis experimental e clnico31-38. lcool Os primeiros estudos relatando malformaes em recm-nascidos de mes alcolatras datam do fim da dcada de 60. Nesta poca, Lemaine & cois.20 publicaram uma srie com 127 recm-nascidos (RN) de mes alcolatras crnicas, portadores de facies peculiar, retardo do crescimento em peso e altura, alta freqncia de malformaes e de distrbios psicomotores. No incio da dcada passada, outros estudos5 vieram confirmar estes achados, que foram relacionados ao consumo de lcool na gestao e designados ento com o termo "Sndrome do Alcoolismo Fetal (SAP)". A exposio pr-natal ao lcool pode levar a um amplo espectro de Iteraes fetais, que dependem da concentrao sangnea de lcool, da idade gestacional do concepto, da paridade e da cronicidade do uso do lcool. Nesse sentido, embora todos os casos documentados de SAF tenham nascido de mes grandes consumidoras de lcool na gestao, nem todas as gestantes alcolatras geram crianas portadoras de SAF2-35. Com base em estudos recentes, tanto clnicos como experimentais, o etanol apresenta propriedades teratognicas bem-estabelecidas2. Estas podem se manifestar, de um extremo, por abortamento ou por profundas anomalias morfolgicas e retardo mental severo. No entanto, no outro extremo, a exposio pr-natal ao etanol pode resultar em disfunes cognitivas e comportamentais sutis, na ausncia de qualquer malformao detctvel. Este ltimo efeito estabelece o lcool como um teratgeno comportamental2. Com relao concentrao srica do etanol, foi demonstrado em dosagem do sangue do cordo, o mesmo nvel observado no sangue materno1. Observa-se tambm odor de lcool na respirao do RN e no lquido amnitico. Comprovou-se, alm disso, que as malfor-

maes fetais estavam relacionadas mais ao nvel srico materno do etanol do quee quantidade ingerida20. A SAF definida como um defeito fetal, que consiste em trs grupos de alteraes: crescimento deficiente, caractersticas dismrficas e manifestaes do sistema nervoso central (SNC). O crescimento deficiente tem origem na vida intra-uterina e continua no perodo psnatal, afetando peso e altura. Isto decorreria de um insulto pr-natal proliferao celular, com reduo do nmero e do tamanho das clulas. Aps o nascimento, a presena de suco pobre, fadiga fcil e distrao suco poderiam explicar, em parte, o dficit de crescimento ps-natal. As caractersticas dismrficas incluem: fissura palpebral pequena, face achatada, filtro nasal achatado e/ou longo, lbio superior fino, queixo pequeno, alm de outras malformaes menos freqentes de face e de membros. Podem ocorrer, tambm, embora raramente, malformaes renais e cardacas1. As manifestaes neurocomportamentais (SNC) so caracterizadas por: microcefalia, tremores, desenvolvimento lento, hiperatividade, problemas de aprendizado, dficit de ateno e problemas de memria. O abuso de lcool considerado como a causa mais importante de retardo mental no mundo ocidental5. O mecanismo de ao das alteraes produzidas pelo lcool no bem conhecido. A hiptese considerada uma diminuio da sntese proteica por inibio da replicao do RNA e dos sistemas de transcrio citoplasmtica. Alm disso, a vasoconstrio umbilical sob efeito direto do lcool poderia explicar alguns dos efeitos encontrados1. Par que a SAF seja diagnosticada, necessrio o encontro de, pelo menos, algumas manifestaes de cada categoria e de uma histria de alta exposio "in tero" do lcool. Os RN que possurem estas caractersticas sero considerados como provveis SAF ou como portadores de "Efeitos Fetais do lcool (EFA)"35. Os casos mais leves possuem sintomatologia pobre, constituda de dficit de crescimento, de retardo mental leve e de discretas malformaes que, muitas vezes, no permitem diagnstico de certeza. O perodo crtico para a exposio ao lcool parece Ser entre duas e oito semanas da concepo, para as alteraes anatmicas, embora no haja um perodo definido para as ou-

tras alteraes. Quanto ao nvel seguro de consumo de lcool na gestao, pode-se considerar que, mesmo nas primeiras semanas, o uso ocasional de lcool (menor que 15ml/dia) no acarreta danos ao feto. Entretanto, existe clara correlao entre o uso abusivo do lcool e os efeitos fetais20. Atravs de estudos controlados, considera-se que os efeitos fetais intensos ocorrem em casos de mes grandes consumidoras (5 ou mais doses em uma s ocasio ou 45 doses por ms; l dose = 15ml de lcool). No caso de consumidoras moderadas (menos que 45 doses por ms e nunca mais que 5 doses em uma s ocasio), o risco de danos fatais pequeno33. No mundo ocidental, a freqncia de SAF de l a 2 casos/1000 nascidos vivos e a de EFA de aproximadamente 3 a 5 casos/1000 nascidos vivos. No caso de se considerar a populao de mes alcolatras crnicas, o risco de SAF chega de 30 a 50%. H poucos relatos na literatura sobre a "Sndrome da Abstinncia Fetal ao lcool". Este quadro pode durar 24 horas, e se caracteriza por choro excessivo, irritabilidade e convulses. O tratamento realizado com fenobarbital, na dose de 3 a 5mg/kg 33. Maconha a droga de uso ilegal mais freqentemente utilizada pela populao, sendo o.delta-9-tetrahidrocanabinol (delta-9-THC) seu principal componente ativo, reponsvel por quase todos os efeitos caractersticos da droga. Vrios termos so utilizados na literatura especfica da droga: - Cnnabis - matria crua obtida da planta Cannabis sativa - Marijuana ou maconha - mistura de folhas modas, ramos, sementes e, s vezes, flores da planta. - Hashish - resina obtida aps a mistura da planta com leo solvente, obtendo-se um produto de maior potncia. KCannabis contm mais de 400 componentes qumicos, muito comuns a vrias plantas, 61 deles so exclusivamente encontrados nela e denominados cannabinoides. Dentre eles, o delta-9-tetrahidrocannabinol o mais potente e, conseqentemente, o mais estudado2'3-8. O consumo desta droga faz-se atravs do hbito de fumar maconha, o que dificulta o

estado da farmacologia e toxidade da droga, devido aos produtos produzidos com sua queima. A fumaa produzida pela queima da maconha semelhante do tabaco: ambos contm centenas de ingredientes qumicos com atividade biolgica potencial ou conhecida, misturados em meio ao vapor. O quanto de droga ativa absorvido pelo fumante depende da maneira pela qual o cigarro fumado: inalaes profundas garantem maior absoro. Enquanto a dose de delta-9-THC pode ser apuradamente calculada em laboratrio, a droga "das ruas" tem um teor de delta-9-THC que varia de O a 18% (em mdia l a 2%). Estas consideraes mostram as dificuldades dos autores em estudar a toxicidade e os efeitos da droga no feto em desenvolvimento; fundamental para a compreenso da farmacologia e toxicidade de um componente o conhecimento do quanto de substncia ativa liberado nos tecidos. Assim, os estudos em animais tm a vantagem de permitir o uso de quantidades especficas da droga, de modo a obter uma precisa correlao entre dose e efeito. A maioria dos estudos em animais avalia os efeitos do delta-9-THC, que um componente ativo e quantificvel da maconha. Mas, importante salientar que ele representa um dos componentes da droga natural, e os efeitos causados por outros componentes tambm provaram ser importantes. Assim, uma alternativa seria expor os animais fumaa da maconha embora, des: te modo, a quantidade de delta-9-THC liberada e absorvida seriam apenas estimadas. Estudos em mulheres grvidas que usam a droga, classificam-nas em grupos de acordo com o nmero de "sesses de fumo" por dia ou semana. Mas, desde que a potncia da droga utilizada por uma determinada populao raramente conhecida, difcil ter uma estimativa real do quanto de droga absorvido4. Isto leva a dificuldades na interpretao dos resultados obtidos por vrios autores. Por exemplo, se um autor relata evidncias de alteraes morfolgicas ou neurolgicas nos RN filhos de mes usurias da droga, e outro no as encontra, no h como saber se tal fato se deve ou no a diferenas quantitativas ou qualitativas no material inalado. Por outro lado, com outras drogas, como lcool, opiides, cocana e anfetaminas, temos mais segurana na interpretao dos resultados, pois so estes os compostos primariamente ativos.

Estas observaes no devem levar a crer que o estudo das aes da maconha catico, mas antes salientam os cuidados na interpretao, comparao e extrapolao dos resultados das pesquisas com a droga. Estudos dos efeitos do delta-9-THC em animais no so idnticos aos com maconha. Efeitos da maconha sobre o usurio Dependem da dose, do ambiente, da expectativa das condies fsicas e da personalidade de quem a usa. Os efeitos, em geral, obtidos com doses pequenas, so euforia, alteraes na sensopercepo, diminuio do senso de identificao, -desrealizao e, algumas vezes, alucinaes visuais. Os sinais mais evidentes de seu uso crnico so conjuntivas congestas, diminuio da fora muscular, taquicardia, seguidos de sedao e sono. Com altas doses ocorre um quadro de intoxicao aguda com ideao paranide, iluses, delrios, confuso, excitao, alucinaes e hipotenso postural. Geralmente, o indivduo desenvolve tolerncia e a suspenso sbita do uso pode resultar em nervosismo, irritabilidade e insnia28. Estudos dos efeitos do delta-9-THC em fatos, durante a gravidez A administrao de delta-9-THC a animais grvidos para anlise dos efeitos txicos ao embrio e recm-nascido, geralmente, leva a resultados ambguos. Um dos maiores problemas encontrados pelos autores que os efeitos adversos observados podem no ser resultantes da ao direta da droga sobre o embrio ou feto, mas sim serem secundrios a efeitos txicos do delta-9-THC sobre a me. Por exemplo, o delta-9-THC em ratos causa uma anorexia intensa com conseqente desnutrio e desidratao materna. Causa tambm alteraes de comportamento materno no parto e inibe a produo e liberao de leite, fatores que contribuem para o prejuzo do desenvolvimento da prole. Hutchings & cols,22-23, analisando os efeitos da administrao de delta-9-THC a ratas grvidas, descreveu trs efeitos dose-dependentes na prole: - ao nascimento, observou um aumento dose-dependente na proporo de machos nascidos vivos/fmeas nascidas vivas, sugerindo que fetos femininos so mais sensveis aos efei-

tos letais do delt-9-THC. - no perodo ps-natal, encontraram uma inibio dose-dependente da sntese de hormnio do crescimento e de protenas utilizadas no crescimento cerebral. So efeitos transitrios e os animais expostos ao delta-9-THC recuperam-se totalmente aps o desmame. - no encontraram nenhuma evidncia de alteraes neurolgicas ou comportamentais na prole, independente dos efeitos txicos maternos. Conseqncias ps-natais do uso de maconha em humanos Apesar do uso relativamente comum da maconha por mulheres em idade frtil, existem poucos trabalhos com informaes objetivas sobre os efeitos da droga sobre o feto e recmnascido. Fried14 relata que o uso crnico da droga est associado prematuridade, trabalho de parto prematuro e incidncia aumentada de sofrimento fetal. Em 1978, no Canad, fundou-se o Ottawa Prenatal Prospective Study Group, reunindo vrios hospitais, que analisou de 1979 a 1985, aproximadamente, 700 gestantes residentes nesta cidade6. Destas, 12% haviam usado maconha esporadicamente, 3% a usavam 2 a 3 vezes por semana (fumantes moderadas) e 5% a usavam 6 ou mais vezes por semana (uso freqente). Outras variveis, geralmente, associavam-se ao uso da maconha: entre as fumantes moderadas encontrou-se menor nvel scio-econmico, menor escolaridade e maior ndice de tabagismo. O estado nutricional no diferiu nos trs grupos, sendo adequado. No se encontrou diferenas entre as usurias da droga e o grupo controle no que se refere apresentao do feto, Apgar, complicaes, malformaes ou alteraes neurolgicas no perodo neonatal. Outros autores canadenses, analisando crianas com uma semana de vida, observaram que a exposio pr-natal maconha estava associada presena de tremores finos, exacerbao do reflexo de Moro, exacerbao do reflexo de suco e um choro peculiar "cri-du-chat"6'7. Embora tais sintomas possam ser observados em casos de abstinncia, outros sintomas como hiperatividade no so observados. Tambm observada uma resposta prejudicada a estmulos visuais. Observaes similares foram feitas aos 9 e 30 dias de vida, sendo que nes-

ta poca de tremores finos e exacerbao do reflexo de Moro eram os mais evidentes, bem como outros reflexos motores. Nota-se tambm uma lentificao na maturao do sistema visual, constatada atravs do estudo do potencial visual cortical evocado. Na maioria das vezes, estas alteraes neurolgicas so discretas e de curta durao podendo o beb receber alta hospitalar. Se, entretanto, a criana apresentar alteraes motoras exuberantes/recomenda-se o uso de fenobarbital, 3 a 4 mg a cada 6-8 horas. Orientao e esclarecimento sobre a resoluo espontnea do quadro devem ser dados aos familiares. Barbitricos A suspenso abrupta do uso de barbitricos pode levar a sintomas de abstinncia nos indivduos habituados a eles. Se forem usados durante a gravidez, so capazes de ultrapassar a barreira placentria e atingir o feto. Este, aps Q parto, no mais receber a droga e poder ter sintomas de abstinncia, mesmo que a me tenha feito uso da droga por um perodo curto, como semanas pr-parto18>21. Sendo excretados na forma ativa pelos rins ou metabolizados pelo fgado, a imaturidade destes rgos no feto responsvelpela sua excreo retardada e incio tardio dos sintomas de abstinncia. Quando usados como sedativos durante o trabalho de parto, os babitricos provocam nos recm-nascidos uma diminuio de resposta aos vrios estmulos, incluindo os visuais e diminuio da suco. Se usados durante a gravidez ou aps o nascimento, tm a faculdade de aumentar a capacidade de conjugao da bilirrubina atuando sobre a enzima difosfoglucuronil-transferase. Os sintomas de abstinncia, geralmente, so tardios, ocorrendo quando a criana j recebeu alta hospitalar21. Na maioria das vezes, a me no mostra sinais ou no refere uso da droga. Os sintomas agudos so semelhantes aos desencadeados pela falta dos opiceos, com choro persistente, tremores, insnia, mastigao e, mais tardiamente, encontraremos exacerbao do reflexo de .suco, choro prolongado, irritabilidade, sudorese, que podem durar at meses7'25. difcil caracterizar a durao do quadro, -pois o comportamento do beb est relacionado ao meio em que vive. Geralmente, os bebs ficam mais irritados no lar, sendo

particularmente irritveis com estmulos sonoros, frio e fome, exigindo maior ateno. Este perodo pode durar de 2 a 6 meses. Uma maior incidncia de malformaes relacionadas posio do feto durante a vida intra-uterina , tambm, referida em mes que usam tranqilizantes, talvez por uma diminuio nos movimentos fetais7. Os cuidados necessrios ao RN com sndrome de abstinncia aos barbitricos seriam7'34: - coloc-lo em isolette aquecida, com pouca iluminao, com alimentao freqente. Se, apesar disto, o RN ainda estiver agitado, chorando e com tremores ou com hipertermia, sed-lo com 3 a 5 mg/kg/dia de fenobarbital dividido em 4 doses, ou torazina Img cada 4-6 horas. O uso de chupetas indicado, satisfazendo o reflexo de suco exacerbao. O RN poder receber alta, com orientaes precisas sobre o quadro, e reviso clnica peridica. Alertar aos pais que o problema transitrio. Opiceos No fim de I960, o uso de herona aumentou, consideravelmente, tanto nos Estados Unidos como na Gr-Bretanha. As razes para o aumento ainda no esto inteiramente claras, mas alguns dos fatores incluem mudanas nas atitudes sociais em relao ao uso da droga e s normas sociais estabelecidas em geral, a disponibilidade aumentada desta, e o substancial aumento na populao adolescente (pelo pronunciado aumento dos nascimentos que se seguiram Segunda Guerra Mundial), com suas mudanas sociais associadas. O uso da herona encontra-se centrado, principalmente, nas reas urbanas e os membros dos grupos tnicos e raciais de um nvel scio-econmico mais baixo continuam a ser os maiores representantes, entretanto a herona tem sido usada, tambm, entre pessoas de maior poder aquisitivo, de sociedades afluentes. Existem dois padres bsicos de uso de opiceos e sua dependncia; um envolve o grupo de indivduos que comea durante um tratamento mdico e que obtm seus suprimentos iniciais atravs do mdico; o outro iniciase com o uso experimental ou "recreativo" da droga, evoluindo para uso mais intenso, envolve, principalmente, adolescentes e adultos jovens e representa a porcentagem maior da populao viciada. Embora a herona seja o opiceo ilcito

mais utilizado, possui poucas propriedades farmacolgicas especiais que expliquem sua popularidade; dada por via subcutnea, mesmo viciados mais experimentados no podem distinguir a herona da morfina, o que compreensvel, j que a herona rapidamente convertida em morfina no organismo; quando estas drogas so aplicadas por via endovenosa, os viciados j so mais capazes de diferenci-las (herona atravessa a barreira hematoenceflica mais rapidamente, transformando-se em morfina no crebro, produzindo um rpido incio dos efeitos opiceos). Os opiceos promovem alteraes de comportamento, ajustamento social e no estado fsico que variam muito, de acordo com a droga utilizada. O perodo de recuperao complexo e prolongado, a sndrome de abstinncia demorada e o estado alterado dos pacientes muitas vezes at por semanas, pode induzir ao retorno do uso de opiceos. Por cerca de vinte anos, o tratamento de escolha nos Estados Unidos para o abuso da herona tem sido a manuteno com metadona, opiide sinttico, administrado diariamente, sob superviso mdica, como substituto para a herona30'39-40.Como relatado em vrios estudos30'39'40, recm-nascidos expostos a drogas so, significativamente, menores ao nascimento e possuem uma incidncia maior de retardo de nascimento intra-uterino do que crianas de grupos controle. Especula-se que episdios de abstinncia maternos ou "overdoses" e abuso de outras substncias podem combinar-se com m nutrio materna, infeces e complicaes obsttricas no tratadas, fatores estes que influem no desenvolvimento fetal e um pobre desenvolvimento durante a infncia, conseqente s influncias pr-natais. Mais da metade dos recm-nascidos de mes viciadas em herona apresenta peso inferior a 2.500g ao nascimento, retardo do nascimento intra-uterino e nascimentos prematuros parecem ser os responsveis pelo baixo peso ao nascer destas crianas30. ocorrncia de histiocitose no mecnio, encontrada nas placentas de recm-nascidos expostos herona, sugere episdios de hipoxemia ou outras formas de estresse durante a vida fetal, talvez conseqente a episdios de abstinncia herona e achados de infeco antenatal ou por ocasio do parto, o que levaria ao trabalho de parto prematuro e acelera-

o da manuteno pulmonar, o que pode ser um fator relacionado incidncia reduzida de doena de membrana hialina em filhos de viciadas em herona16. Durante a primeira semana de vida, a maior parte das crianas expostas aos opiceos durante a vida intra-uterina mostra uma sndrome de abstinncia bem documentada, que inclui uma variedade de comportamentos associados com o sistema nervoso central e autnomo, como tremores, hipertona, reflexos exacerbados, choro alto e "gritado", alimentao e sono pobres, febre, taquipnia, diarria, secreo mucosa e sudorese19. Estes sinais atenuam-se, dramaticamente, durante o primeiro ms de vida e, por volta de um ms, apenas diferenas mnimas podem ser observadas entre crianas expostas e no expostas. A intensidade da sndrome nem sempre relaciona-se com a dose ou durao do uso de opiceos pela me. No h unanimidade a respeito do melhor mtodo de controlar a abstinncia - h referncias sobre o uso de fenobarbital ou dorpromazina41. Alguns estudos mostram que o mecnio um reservatrio de metabolites de drogas, s quais o feto foi exposto in tero, sendo considerado espcime ideal para screening de drogas em recm-nascidos suspeitos; fcil de coletar, contm drogas que no podero ser detectados na urina, com o passar dos dias, e seu contedo em drogas permanecer at por 3 dias aps o nascimento31. Comentrios /. Exposio 3 outros teratgenos: mulheres que usam opiceos, inclusive as que esto em esquema de manuteno com metadona, geralmente continuam a usar outras drogas lcitas e/ou ilcitas. 2. Complicaes da gestao e do parto: uso de opiceos durante a gestao est associado com vrias complicaes perinatais, algumas das quais causando efeitos danosos diretos para o feto. 3. Desenvolvimento social comprometido: mulheres que usam drogas no conseguem promover, comprovadamente, educao e apoio suficientes para suas crianas, quando comparadas com mulheres que no ingerem drogas. 4. Fatores genticos: mulheres que usam drogas podem possuir comprometimento neurocomportamental, geneticamente determinado,

que poder predisp-las ao abuso de drogas e este carter poder, inclusive, ser transmitido aos seus filhos. A utilizao de drogas de abuso freqente durante a gestao. Muitos efeitos txicos dessas substncias foram comprovados, tanto em modelos experimentais como em estudos clnicos em humanos. Os efeitos neurotxicos durante o perodo de desenvolvimento intrauterino podem ocasionar inmeras seqelas nas crianas, tanto em nvel motor como comportamental. A deteco da sndrome de abstinncia do recm-nascido pode ser difcil, necessitando de uma padronizao de avaliao atravs de um "score". Distrbios neurolgicos concomitantes podem ser confundidos com sinais e sintomas de abstinncia. Nos casos graves, em que o diagnstico feito precocemente pelas alteraes clnicas e laboratoriais (testes de deteco da droga na urina e/ ou mecnio do recm-nascido), a teraputica especfica eficaz, com acentuada melhora do quadro. A melhor utilizao dos servios de pr-natal e programas de tratamento para mes viciadas, durante a gestao, so medidas que devem ser estimuladas e que podem diminuir o nmero de crianas que desenvolvero sndrome de abstinncia. Estudos adicionais sero necessrios para uma melhor compreenso dos efeitos a longo prazo das drogas de abuso nas crianas expostas durante a gestao. Muitas alteraes, principalmente comportamentais, so descritas em trabalhos recentes1336. Na interpretao de sinais e sintomas neonatais, deve estar sempre presente um alto ndice de suspeita de efeitos de drogas consumidas pela gestante ou da sndrome de abstinncia neonatal. Referncias01. ANDR, M. - Nouveau-n de mre alcoolique. In Laugier & Salle - Medicine Prinatale. Paris, Relier, 1989. 02. BECKER, et ai. - Effects of ethanol. In Annals of de

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Aceito para a publicao em 06 de maio de 1991 Endereo para correspondncia Instituto da Criana Av. Dr. Enas de Carvalho Aguiar 647 So Paulo - SP 05403