setor de tratamento tÉcnico

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REDE DE BIBLIOTECAS CESMAC SETOR DE TRATAMENTO TÉCNICO Bibliotecária: Ana Paula de Lima Fragoso Farias CRB/4 - 2195 R639p Roberto, Naftali Tuany Souza Psicodiagnóstico infantil: um estudo de caso / Naftali Tuany Souza Roberto Maceió: 2020. 15 f. TCCP (Especialização em Avaliação Psicológica) Centro Universitário CESMAC, Maceió AL, 2020. Orientador: Bruno Gustavo Lins de Barros. 1. Psicodiagnóstico infantil. 2. Estudo de caso. 3. Avaliação psicológica. 4. Técnica projetiva. I. Barros, Bruno Gustavo Lins de. II. Título. CDU: 159.98

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REDE DE BIBLIOTECAS CESMAC

SETOR DE TRATAMENTO TÉCNICO

Bibliotecária: Ana Paula de Lima Fragoso Farias – CRB/4 - 2195

R639p Roberto, Naftali Tuany Souza

Psicodiagnóstico infantil: um estudo de caso / Naftali Tuany Souza

Roberto – Maceió: 2020.

15 f.

TCCP (Especialização em Avaliação Psicológica) – Centro Universitário

CESMAC, Maceió – AL, 2020.

Orientador: Bruno Gustavo Lins de Barros.

1. Psicodiagnóstico infantil. 2. Estudo de caso. 3. Avaliação psicológica. 4.

Técnica projetiva. I. Barros, Bruno Gustavo Lins de. II. Título.

CDU: 159.98

1

PSICODIAGNÓSTICO INFANTIL: UM ESTUDO DE CASO

Naftali Tuany Souza Roberto1

Bruno Gustavo Lins de Barros2

RESUMO

O presente artigo se refere ao estudo de caso realizado a partir da prática de Supervisão do

Psicodiagnóstico do curso de Pós-graduação em Avaliação Psicológica. O caso clínico de uma

criança de seis anos de idade, residente em um Assentamento da zona rural do Município de

Maragogi e que atualmente faz parte do primeiro ano do ensino fundamental I da rede pública

municipal, foi encaminhada pela escola e solicitada a Avaliação Psicológica. O

Psicodiagnóstico foi construído a partir de entrevistas e da técnica projetiva do desenho e foi

de extrema importância para a identificação da demanda da criança. O diagnóstico indicou um

possível excesso de exigências por parte dos pais podendo estar relacionado com queixas e

sintomas atuais relatados e descritos no estudo de caso.

Palavras-chave: psicodiagnóstico infantil, estudo de caso, avaliação psicológica, técnica

projetiva.

ABSTRACT

This article refers to the case study carried out from the practice of Supervision of

Psychodiagnosis of the Postgraduate course in Psychological Assessment. The clinical case of

a six-year-old child, who is currently part of the first year of elementary school I in the

municipal public network, residing in a settlement in the rural area of the municipality of

Maragogi, was referred by the school and requested a Psychological Assessment.

Psychodiagnosis was built from interviews and the projective drawing technique and was

extremely important for identifying the child's demand. The diagnosis indicated a possible

excess of demands on the part of the parents, which may be related to current complaints and

symptoms reported and described in the case study.

Keywords: child psychodiagnosis, case study, psychological assessment, projective

technique.

1 Graduada em Psicologia e Pós-Graduanda em Avaliação Psicológica- email: [email protected]

2 Professor Orientador Mestre em Pesquisa em Saúde- email: [email protected]

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1. INTRODUÇÃO

A Avaliação Psicológica (AP) segundo o Conselho Federal de Psicologia (CFP)

através da Resolução N° 9 de 25 de Abril de 2018 (009/2018), que estabelece diretrizes para a

realização de AP no exercício profissional se caracteriza como um processo estruturado de

investigação de fenômenos psicológicos, composto de métodos, técnicas e instrumentos, ela

tem o objetivo de prover informações à tomada de decisão, no âmbito individual, grupal ou

institucional, com base em demandas, condições e finalidades específicas.

De acordo com a resolução 009/2018 a decisão do psicólogo deve ser baseada em

métodos e/ou técnicas e/ou instrumentos psicológicos reconhecidos cientificamente para uso

na prática profissional da (o) psicóloga (o). Dentre as fontes fundamentais de informação

temos os Testes psicológicos aprovados pelo CFP para uso profissional dos psicólogos.

A entrevista psicológica é uma das fontes importantes de informação na AP: “Art. 2º -

Na realização da Avaliação Psicológica, a psicóloga e o psicólogo devem basear sua decisão,

obrigatoriamente, em métodos e/ou técnicas e/ou instrumentos psicológicos reconhecidos

cientificamente para uso na prática profissional da psicóloga e do psicólogo (fontes

fundamentais de informação), podendo, a depender do contexto, recorrer a procedimentos e

recursos auxiliares (fontes complementares de informação).” A Resolução 009/2018 ainda

acrescenta que: “§ 2º A psicóloga e o psicólogo têm a prerrogativa de decidir quais são os

métodos, técnicas e instrumentos empregados na Avaliação Psicológica, desde que

devidamente fundamentados na literatura científica psicológica e nas normativas vigentes do

Conselho Federal de Psicologia”.

A AP foi feita com a paciente Ana, este nome no estudo do caso é fictício (assim como

também todos os outros nomes utilizados no artigo) devido à questão ética e profissional;

onde foram utilizadas as técnicas projetivas. As técnicas projetivas são atividades na qual são

solicitadas a um avaliando que se faça um desenho ou uma representação de uma dada

situação. Através destes desenhos e representações o psicólogo analisa as características com

relação ao indivíduo (BUENO, 2017). Elas se caracterizam por oferecer “acesso ao mundo

dos sentidos, significados, padrões e sentimentos, revelando aquilo que o sujeito não pode ou

não quer dizer, frequentemente por não se conhecer bem” (PINTO, p. 136, 2014).

O caso clínico da criança Ana foi encaminhado pela professora de sua escola que a

acompanha há um ano para fazer a AP devido a observação de sinais de tristeza e apatia. De

acordo com a professora, a criança de modo geral, vem apresentando mudanças de

comportamento na sala de aula como a aparente perda de prazer em fazer coisas que antes

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gostava, as mudanças ocorreram após o recesso escolar. Desta forma, se justifica a avaliação

feita de aspectos emocionais para responder a demanda.

2. PSICODIAGNÓSTICO INFANTIL

Segundo Cunha (2000), o Psicodiagnóstico é uma das possibilidades de AP. Ela é feita

com propósitos clínicos, que visa identificar as forças e fraquezas no funcionamento

psicológico, pode ter foco na existência ou não de psicopatologia. A autora define este estudo

profundo da personalidade do indivíduo como um processo científico de tempo limitado que

“utiliza técnicas e testes psicológicos, para entender problemas à luz de pressupostos teóricos,

identificar e avaliar aspectos específicos (...), comunicando os resultados com base nos quais

são propostas soluções, se for o caso” (CUNHA p. 26, 2000).

Sales et al. (2018), apontam que durante o processo de Psicodiagnóstico Infantil, a

coleta de informações é feita com a criança e também com os pais ou responsáveis, isto

porque, a demanda da criança depende mais de outras pessoas do que a demanda do adulto.

Oliveira (2018), destaca ser necessário conhecer a relação da criança com sua família para

relacionar ao seu desenvolvimento biopsicossocial.

No Psicodiagnóstico Infantil uma característica da avaliação é o fato de a criança

utilizar outros meios de comunicação que levam aos aspectos importantes de sua

subjetividade, diferentemente do adulto que só tem o meio da fala ou associações livres

(SALES et al. 2018). O brincar é a técnica de avaliação utilizada no Psicodiagnóstico Infantil.

Quando a criança brinca, ela projeta seus desejos e fantasias inconscientes e

evidencia aspectos da dinâmica familiar em que está inserida. No entanto, os

adultos são diferentes das crianças, e não aceita o brincar no setting

terapêutico, o processo de alguma forma é semelhante em ambos os casos,

porque tanto o adulto quanto a criança projetam e nos revelam o contexto

que vive e o seu sofrimento psíquico (SALES et al. p. 115, 2018).

O brincar é uma forma de comportamento específico da própria infância, onde são

projetados sentimentos, pensamentos e conflitos, ele é extremamente importante e necessário

no processo de AP. Diante disto, considerando a contribuição do psicodiagnóstico infantil na

identificação da demanda psicológica de uma criança, este estudo tem por objetivo descrever

o caso de um psicodiagnóstico infantil de uma criança de seis anos.

3. MÉTODOS

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Em um processo avaliativo com crianças a entrevista inicial e a anamnese são

importantes fontes de informação na AP, e em geral são feitas pelos responsáveis pela criança

ou com pessoas na qual convivem. Deste modo justifica-se a utilização dessas fontes na

pesquisa.

Os instrumentos de coleta das fontes de informação foram:

3.1 Entrevista de Anamnese:

A técnica utilizada foi uma entrevista semiestruturada com a genitora da criança. No

processo de AP a anamnese também é um importante instrumento de coleta de dados sobre a

história de vida de um avaliando. Ela é um instrumento do diagnóstico psicológico, através

dela além das informações relativas a história de vida do paciente pode-se obter dados sobre

afetos, normas, preconceitos, expectativas, padrões familiares, problemas psiquiátricos

pregressos, etc.” (Ramos, 2011 apud MATOS, LOPES, 2017).

3.2 Entrevistas Psicológicas:

Foram realizadas com uma tia da avaliada e com a professora solicitante. De acordo

com Cardoso et al. (2020), a entrevista psicológica se caracteriza como a coleta de

informações sobre um indivíduo, e de forma geral, ela se apresenta como uma das partes mais

importantes durante o processo de Avaliação Psicológica. Por meio dela é possível direcionar

as demais fases que o psicólogo irá conduzir. FRAGA acrescenta que além dessa condição ela

auxilia no estabelecimento do rapport, facilitando a honestidade e a confiança do examinando

frente ao psicólogo (FRAGA, 2016 apud CARDOSO et al. 2020).

A entrevista psicológica é direcionada a partir do objetivo da avaliação, ela permite

um conhecimento mais aprofundado sobre a história de vida do sujeito ou do ambiente

avaliado. De acordo com Mäder (2016), a entrevista em um processo de Avaliação

Psicológica busca-se investigar o contexto familiar, social, pessoal, condição de saúde física,

autopercepção, autocrítica e expectativas de futuro.

3.3 Técnica projetiva do desenho:

Os desenhos feitos por Ana consistem em um método projetivo de avaliação, ela tem o

objetivo de verificar a construção do sujeito a partir do desenho da criança. Freud (1908/1980)

apud Souza (2011), aponta que a criatividade dos artistas e suas produções tem como uma de

suas fontes o brincar infantil.

A interpretação dos desenhos se vale dos significados e símbolos derivados da

psicanálise, “estes símbolos funcionam como engates a partir dos quais o inconsciente se vale

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para alcançar o caminho da consciência e, disfarçadamente, encontrar uma forma de

expressão” (SOUZA, p. 211, 2011). É através da psicanálise que se pode alcançar a

compreensão da personalidade considerando as produções gráficas e verbais do artista, mas

cabe destacar a importância de estar atento para o perigo de apego a determinados conteúdos

simbólicos.

Os resultados obtidos neste estudo foram analisados mediante os discursos obtidos nas

entrevistas, pela interpretação do desenho e o discurso de Ana no inquérito ao final de cada

desenho.

4. PROCEDIMENTOS

Inicialmente, antes da aplicação dos instrumentos Ana recebeu o acolhimento e foi

estabelecido o rapport com as entrevistadas. De acordo com Oliveira, o rapport se caracteriza

como “a relação harmoniosa, tranquila e serena, determinada e significada pela empatia.

Trata-se de uma relação cordial, afetuosa, de confiança, de apreço e respeito mútuo, relação

eminentemente humana” (OLIVEIRA, p. 15, 2005). As entrevistas psicológicas e a de

anamnese foram feitas em diferentes dias, para que após a cada entrevista pudesse organizar e

sintetizar os dados colhidos. Deste modo, foi acordada uma entrevistada por semana.

Com a avaliada também foi realizado o acolhimento e estabelecimento do rapport. Em

seguida foi solicitada a Ana que ela desenhasse a sua família, o objetivo da técnica gráfica era

de se obter dados sobre o contexto familiar, visto que na entrevista com a professora foi

colocado que a paciente apresentava queixas sobre a mãe, assim como irritabilidade

constante. Após Ana ter feito o desenho da família, foi feito um inquérito sobre o desenho

feito.

Após o desenho da família, a criança teria que desenhar sua escola e contar como era o

ambiente, quem eram seus coleguinhas, e como era sua relação com a escola, com objetivo de

identificar o vínculo que Ana tinha com a escola. Os desenhos de Ana foram recolhidos para

análise, bem como os dados do inquérito. Em geral, todos os dados obtidos foram analisados.

5. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O caso clínico da criança Ana foi encaminhado pela professora de sua escola que a

acompanha há um ano para fazer a AP devido a observação de sinais de tristeza e apatia. Ana

tem seis anos de idade, reside em um Assentamento da zona rural do Município de Maragogi,

atualmente faz parte da rede pública municipal de ensino e estar no primeiro ano do ensino

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fundamental I. Segundo sua professora, Ana ingressou na escola com um ano de atraso, por

decisão da sua genitora.

A criança de modo geral, de acordo a docente, vem apresentando mudanças de

comportamento na sala de aula: tristeza constante, aparente perda de prazer em fazer coisas

que antes gostava, como por exemplo, brincar; prefere se isolar a brincar com outras crianças,

se mostra cansada com frequência, passou a comer menos do que o habitual e tem

demonstrado maior irritabilidade. Essas mudanças ocorreram após o recesso escolar. Desta

forma, se justifica a avaliação feita de aspectos emocionais para responder a demanda.

Como já descrito, a avaliação foi realizada com três entrevistas, onde utilizei

inicialmente a entrevista de anamnese com a genitora da criança, e duas entrevistas

psicológicas, uma com a tia de Ana e outra com a professora. As entrevistas foram bem

aceitas pelas as entrevistadas, todas asseveraram sua contribuição com a AP, não havendo

nenhuma ocorrência. Para a obtenção dos dados foram coletadas as três entrevistas.

5.1 Entrevista com a genitora da avaliada

A entrevista de anamnese com a genitora da criança traz os dados da história de vida

da paciente, a entrevista psicológica com a tia aponta para os dados sobre a relação da mãe

com a criança, sobre o comportamento de Ana em casa e com a vizinhança, bem como a

relação da própria tia com a criança. Já a entrevista psicológica com a professora apresenta

dados do contexto escolar da avaliada. Seguida as entrevistas, foram analisados os dados

obtidos por Ana através da técnica projetiva do desenho.

No processo de desenvolvimento da criança, a mãe relata que Ana entre dois e três

anos começou a comer sozinha; dorme bem, não tem pesadelo, nem insônia. Refere-se ao

desenvolvimento normal da fala, andar e controle (esfincteriano). Ana fala corretamente,

gosta de brincar, mas hoje costuma ficar mais na internet. Em relação ao contexto familiar,

Ana desde o seu primeiro ano até os 04 anos de idade morou com a avó materna. Atualmente

mora com a mãe e dois irmãos mais novos, devido ao falecimento de sua avó. A morte da avó

interferiu na sua mudança de comportamento, por dois momentos, Ana teve uma crise de

choro ao lembrar-se da avó após ter visto um vídeo dela morta no caixão; e ter visto um avião

passar e pensar ter sido abandonada. Diante disto, a mãe acredita que tem que melhorar a

relação com sua filha, que precisa dar mais atenção e carinho.

5.2 Entrevista com a tia da avaliada

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Carol, em sua entrevista relatou que a irmã passou toda a gestação na casa da mãe,

após o nascimento de Ana ela continuou com o convívio, Ana passou, desde então, a ser

cuidada pela avó. A genitora de Ana a deixou na casa de sua avó materna para ir morar com

outro companheiro, na qual teve mais dois filhos com ele. Ana vive tranquilamente com a

mãe, ela nunca se queixou de seu relacionamento com ela, mas que ainda não se adaptou a

conviver com a mãe e pede para morar com outra tia, com quem conviveu quando morava

com a avó.

Depois da morte da avó Ana mudou seu comportamento, diz que demonstra tristeza e

sente falta da avó. Carol relata que preferiria que Ana morasse com ela ou com a tia que

cuidou dela quando morava com a avó, porque sua irmã “não anda com boas companhias,

gosta de beber e sair com todo tipo de pessoas”. Em relação à alimentação dos filhos, a mãe

de Ana sempre procura alimentá-los com o método mais prático, ela não costuma fazer

comida, compra algo rápido, ou alimenta os filhos com o que tem em casa que já está pronto.

Na maior parte do tempo, Ana é uma criança tranquila e calada.

5.3 Entrevista com a professora da avaliada

De acordo com Maria, após o recesso escolar, Ana apresentou mudança de

comportamento. Não houve nenhum prejuízo em seu desenvolvimento cognitivo, ela continua

desenvolvendo suas atividades muito bem, mas com maior irritabilidade e cansaço na

execução. No entanto, seu desenvolvimento afetivo está tendo prejuízo. Por algumas vezes

tem reclamado da mãe, ela afirma não gostar dela, e que sua mãe não cuida dos irmãos nem

dela. Ana tem preferido se isolar a brincar com outras crianças, diz que os colegas não querem

brincar com ela. Segundo a professora, a criança desde cedo tem sido forçada à maturidade

cognitiva.

5.4 Técnica Projetiva do Desenho

O uso do desenho é comum em atendimentos com crianças na Psicologia, e em

particular na Psicanálise. Através de Freud “foi possível compreender de maneira significativa

e científica que as pinturas, obras artísticas e literárias também possuem um cunho

psicológico, portanto, não apenas a expressão do belo” (SOUSA, 2007 apud LOPES, p. 56,

2017).

De acordo com Rosário (2016), a imagem que cada indivíduo possui de si é

considerada como uma representação da pessoa que pode caracterizar sua identidade. Esta

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imagem se considerada como indício de processos psíquicos do sujeito, na qual irá

caracterizar uma representação imaginária do conteúdo inconsciente.

Através do desenho a criança projeta e articula sua relação com o mundo, sua

linguagem é diferente da linguagem falada, o que não se expressa na fala se revela no

desenho. O desenho importa pela maneira como é construído, pois este fundo revela

elaborações inconscientes (Dolto, 2008 apud Rosário, 2016).

Rosário (2016), aponta que através da técnica do Desenho da família é possível

identificar conflitos familiares, atitudes e sentimentos do avaliando frente à família. Este

instrumento é indicado pela rapidez e eficiência, sendo bem aceito pela criança e pelo

adolescente. Ele pode ser aplicado em crianças a partir dos 5 ou 6 anos, e, também pode ser

aplicado em adolescentes e adultos. (CORMAN, 2003 apud ROSÁRIO 2016).

Por meio da técnica foi possível observar que quando solicitado o desenho da família,

Ana não representou sua situação familiar atual, seus irmãos não foram incluídos na família,

mas enfatizou o prejuízo que tem no laço materno. Ana representou as três mulheres das quais

tinha uma representação materna. Segundo a avaliada uma seria a sua genitora, a outra sua

avó Maria e a outra seria uma tia. Corman (2003), que aponta em seu desenho, que a criança

reproduz as personagens a seu gosto, a valorização de uma dentre elas fica nitidamente

indicada pela maneira como é representada (CORMAN, 2003, p 45 apud ROSÁRIO, 37,

2016).

No inquérito Ana relatou que sente muita falta da avó materna, porque morava com

ela. Relatou precisamente fatos do falecimento da avó, e detalhes do sepultamento: “chorei na

hora que ela estava no caixão, no cemitério não, porque se chora Jesus briga”. Em vários

momentos, Ana relatou o desejo de voltar a morar com a avó, que não deseja morar com a

mãe e nem a tia, apenas a mãe Maria, como ela a chama. Ela relatou: “a mãe Maria era bonita,

era velhinha, mas era bonita. Ela era boa para mim. Cuidava de mim desde que nasci, gosto de

morar com a mãe Maria!”.

Ana relatou enfaticamente várias vezes na sua fala o não gostar de morar com a mãe,

porque a mãe leva amigos para sua casa, eles bebem, fumam muito, inclusive relatou que

quando saem deixam cigarro para a mãe: “eles vão beber, aí disse ô Lene, vou deixar um

cigarro para tu”; e a irrita com algumas brincadeiras. Relatou relapso da mãe com a sua

alimentação e dos irmãos, diz ficar em casa sozinha com o irmão algumas vezes enquanto a

mãe chega do trabalho, mas que seria por pouco tempo. Em geral, a mãe em suas saídas

sempre a leva juntamente com os irmãos.

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No desenho da família foi possível verificar como estão sendo construídas as

formulações da infância de Ana, de que como a comunicação de amor, desejos e afetos são

claramente identificadas. Nota-se que a técnica projetiva utilizada se mostrou eficaz para a

obtenção dos dados com a criança. Para Pellini (2006):

A ideia da técnica é a de que o sujeito produzirá as respostas que

corresponderia à estrutura de sua personalidade que oferecem um estimulo

ambíguo dando lugar à subjetividade do sujeito através de cada ato,

expressão ou resposta (gestos, percepções, sentimentos, verbalizações e

ações motoras), representando e dando acesso a aspectos de sua

personalidade. Desta forma possibilita um contato com a realidade interna e

externa do indivíduo (PELLINI, 2006 apud SILA, p. 44, 2018).

No segundo momento, conforme solicitado Ana desenhou sua escola, os colegas de

turma, sua professora, a coordenadora e sua filha na qual sente um enorme carinho, inclusive

as chama de tia (SIC). Durante a execução do desenho, Ana foi questionada se queria utilizar

além do lápis grafite os lápis de cor, mas ela preferiu não os utilizar.

Segundo Ramos (2018), a criança através do desenho demonstra seu mundo interior,

seus conflitos, seus receios, suas descobertas, seus sentimentos. Por vezes, a maneira como a

criança desenha reflete na sua forma de pensar e sentir, ela produz aquilo que ela não

consegue expressar.

No inquérito Ana relatou gostar de tudo o que tem na escola, porque gosta de estudar,

mas que não gosta quando os colegas brigam com ela, diz que os amiguinhos de sala não

querem brincar com ela. Relatou não se sentir triste em casa, que dorme bem, acorda quando a

mãe chama: “ô Felipe chama Ana se não vou dar nela”. Ana diz gostar de brincar de qualquer

coisa e de assistir com os irmãos.

Estudiosos como Koppitz (1988), Di Leo (1991), Hammer (1991), Cormann (2003) e

Machover (1967) apud Silva et al. (2010), destacam que através do desenho é possível

realizar a análise da personalidade de um sujeito. Eles entendem que os elementos gráficos

falam mais sobre o sujeito do que sobre o desenho propriamente dito, e de que os desenhos de

crianças poderiam ser vistos como indicadores do desenvolvimento psicológico.

Neste estudo de caso, nota-se um grande prejuízo no contexto familiar da criança, e

que por vezes isso tem refletido, possivelmente, no atual comportamento apresentado por

Ana. A falta da assistência materna tem sido uma das causas da irritabilidade e tristeza

constante apresentada pela avaliada. Durante o processo é relevante destacar a intensificação

do comportamento atual de Ana logo após o recesso escolar. É provável que a mudança se

deu devido a escola ser o ambiente em que Ana se sentia amparada e segura, e por um

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determinado tempo esteve ausente desse ambiente protetor. Por um período de quinze dias,

Ana teve que enfrentar e lidar diariamente com os conflitos internos desenvolvidos pelo

possível comportamento relapso de sua genitora, o que consequentemente a deixou mais

irritada com os colegas de sala, assim como também com a execução das atividades em sala

de aula, e com a sua preferência em se isolar.

Esta AP demonstra o quanto as técnicas projetivas foram importantes no processo da

avaliação, desde a aceitação pela criança quanto as repostas fornecidas por ela. É importante

destacar também a importância que as entrevistas e a anamnese tiveram durante o processo,

pois por meio delas foi possível correlacioná-las com os dados obtidos através do desenho.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A construção do Psicodiagnóstico foi fundamental na identificação da demanda

psicológica da criança. A AP mostrou que a avaliada não apresenta transtornos psicológicos.

Mas que os pais exigem demasiadamente da criança, o que pode ter possibilitado o

desenvolvimento dos sintomas relatados na demanda. O atual comportamento apresentado por

Ana é reflexo de um contexto familiar desestruturado, principalmente pela falta da assistência

materna. Percebeu-se que a AP como processo interventivo possibiliza conscientizar os pais

de suas práticas educativas, bem como sobre as potencialidades da criança, e que ela precisa

sentir-se livre para mostrar o seu potencial de energia e criatividade não havendo

autoritarismo, pressão e exigências em excesso.

Na entrevista devolutiva e encerramento do processo a família foi encaminhada para

um processo de Psicoterapia para atender e ajustar a dinâmica familiar.

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