sentenca - crime de prefeito - intempestiva prestacao de contas - contas aprovadas - absolvicao
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PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA
2ª VARA FEDERAL
ROGÉRIO ROBERTO GONÇALVES DE ABREU
Juiz Federal
Processo: 2001.82.00.007794-1
Natureza: Ação penal pública
Autor: MPF
Réu: Antônio José da Silva
S E N T E N Ç A1
DIREITO PENAL. CRIME DE RESPONSABILIDADE
DE PREFEITO. Ausência de prestação de contas
(art. 1º, VII, DL n. 201/67). Em posterior tomada de
contas, o TCU aprovou as contas com ressalvas de
caráter formal. Comprovação de simples má gestão
e inaptidão para procedimentos de controle
(prestação de contas). Ausência de dolo. Atipicidade
da conduta. Improcedência do pedido.
RELATÓRIO
Tratam os presentes autos de AÇÃO PENAL PÚBLICA promovida pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de ANTÔNIO JOSÉ DA SILVA, já
devidamente qualificado, dando-o a denúncia como incurso no art. 1º, VII, do
Decreto-Lei n. 201/67.
Narra a denúncia (f. 02-5) que ANTÔNIO JOSÉ DA SILVA, então
prefeito do município de Mulungu/PB, violando do disposto no art. 4º da MP n.
2178-35/2001, deixou de prestar contas referentes aos valores recebidos do
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) nos exercícios de
1999 e 2000, relativos ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
Em razão disso, o FNDE teria determinado a suspensão dos repasses ao
município, de verbas para alimentação escolar.
Determinação de notificação do acusado para apresentar defesa
preliminar e para se manifestar sobre a proposta de suspensão condicional do
processo (f. 45-8).
1 Sentença tipo D, cf. Res. CJF n. 535/2006.
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O acusado apresentou sua defesa preliminar (f. 65-7). Suscitou
preliminar de ilegitimidade passiva e carência de ação, uma vez que, ao tempo
do escoamento do prazo para a prestação de contas (15/01/2001), não mais
seria o prefeito do município de Mulungu/PB, transferindo-se a
responsabilidade pela prestação de contas a seu sucessor. Aludiu também à
existência de ação de prestação de contas em tramitação na comarca de
Alagoinha/PB, com efeito prejudicial em relação ao presente processo.
Nova intimação para manifestação sobre a proposta de suspensão
condicional do processo (f. 71-2). O acusado peticionou informando que não
aceitava a proposta (f. 79).
Denúncia recebida em 31/10/2002 (f. 86-7).
Decisão declinando a competência para o TRF da 5ª Região (f. 124-9).
Interrogatório (f. 197-202).
Despacho do relator determinando a intimação das partes para os fins
do art. 10 da Lei n. 8038/90 (f. 204).
A PRR 5ª Região requereu (f. 205-6) a intimação da defesa para
apresentar defesa prévia e a apreciação de diligências já requeridas pelo MPF.
Deferida a primeira providência (f. 208).
O acusado deixou transcorrer “in albis” o prazo concedido (f. 210).
Nomeou-se defensor dativo ao réu (f. 211), intimando-se em seguida para
apresentação de defesa prévia.
A Defensoria Pública da União requereu ao relator que fosse o réu
intimado para constituir advogado para patrocínio de sua defesa (f. 212-3), o
que foi deferido (f. 214).
Determinada a devolução dos autos ao juízo da 2ª vara federal (f. 227-
31) em reconhecimento à inconstitucionalidade da Lei n. 10628/2002.
Determinada nova intimação do réu para constituir advogado para
patrocínio a sua defesa. (f. 234). Após habilitação, nova intimação para o
acusado apresentar defesa prévia (f. 252). O denunciado, mais uma vez,
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deixou transcorrer “in albis” o prazo (f. 257), motivo pelo qual determinou-se
nova intimação para constituir outro advogado (f. 258).
Defesa prévia apresentada pelo acusado (f. 264), indicando duas
testemunhas para oitiva em juízo.
Oitiva das testemunhas indicadas na defesa prévia: Nelson Rufino da
Silva (f. 321) e Antônio Belo da Silva (f. 322).
Aberto o prazo para diligências (f. 325):
a) O MPF requereu (f. 330-1) a juntada aos autos dos acórdãos n.
711/2004 e 927/2004 proferidos pelo TCU em julgamento de tomada de contas
especial instauradas contra o réu pelos fatos apurados na ação penal (f. 332-
72). Deferiu-se a juntada dos documentos (f. 373).
b) A defesa deixou transcorrer “in albis” o prazo (f. 377).
Aberto o prazo para alegações finais (f. 378), o MPF pugnou pelo
julgamento de procedência do pedido com a condenação do acusado (f. 381-5)
e o acusado, mais uma vez, deixou transcorrer o prazo (f. 388).
Determinou-se nova intimação do acusado para constituir outro
advogado no prazo de dez dias (f. 389), deixando mais uma vez transcorrer o
prazo concedido (f. 410).
Nomeada uma defensora dativa (f. 411), essa apresentou alegações
finais em defesa do réu (f. 414-7), pugnando pela improcedência do pedido
com a absolvição do acusado.
É o breve relatório.
DECIDO.
FUNDAMENTAÇÃO
A defesa dativa do réu, inicialmente, requereu que fosse oficiado à
prefeitura municipal de Mulungu/PB, solicitando-se cópia do SEDEX
supostamente remetido com a prestação de contas do acusado, salientando
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que seu advogado inicialmente constituído silenciou no momento oportuno de
requerer da diligência, mantendo o réu indefeso.
Entendo que tal providência é desnecessária considerando as provas
já constantes dos autos, motivo por que passo ao exame do mérito.
O MPF denunciou o acusado como incurso no art. 1º, VII, do Decreto-
Lei n. 201/67, em razão da suposta prática da conduta de não prestar contas a
que estava legalmente obrigado no tempo e forma legais. As contas
supostamente sonegadas teriam que ser prestadas ao FNDE e diziam respeito
a verbas transferidas por convênio para alimentação escolar nos exercícios de
1999 e 2000.
Na oportunidade para requerimento de diligências o MPF trouxe aos
autos cópias dos acórdãos proferidos pelo Tribunal de Contas da União
exatamente sobre o caso em apreço, ou seja, a negativa da prestação de
contas pelo acusado ao FNDE nos exercícios de 1999 e 2000.
Em ambos os acórdãos, o TCU registra que a prestação de contas fora
extemporânea, ou seja, prestadas a destempo, motivando procedimento de
tomada de contas especial. Também em ambos os casos, como se pode ver
dos acórdãos, as contas foram aprovadas com ressalvas.
A mim é o que basta para julgar a lide.
O Decreto-Lei n. 201/67 criminaliza, em seu art. 1º, VII, a omissão
dolosa em prestar contas no devido tempo e modo legais como forma de evitar
que prefeitos municipais viessem a promover a dilapidação do patrimônio
público e impedir que os órgãos de controle externo pudessem apurar os fatos
e promover o ressarcimento do erário.
Nessa linha, a omissão dolosa na prestação de contas traduziria
instrumento dos mais eficazes para a prática de outros crimes contra a
administração, o patrimônio e a prestação de serviços públicos, merecendo
eficaz repressão através do enquadramento como fato penalmente relevante.
Daí a existência do art. 1º, VII, do DL n. 201/67.
Ocorre, contudo, que tal não foi o caso revelado pelos presentes autos.
Há que se distinguir dolo e má-fé, de um lado, com desorganização
administrativa de outro. Essa última, via de regra, não se acompanha dos
predicados que justificam a aplicação das sanções de caráter criminal previstas
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no DL n. 201/67. O caso concreto me parece clássico exemplo de má gestão
administrativa e inaptidão para adoção dos procedimentos de controle – não de
conduta criminosa a configurar crime de responsabilidade.
Prova disso é que a tomada de contas realizada pelo Tribunal de
Contas da União constatou – malgrado a ausência da atividade de prestação
de contas a cargo do próprio acusado e malgrado ainda a administração
municipal estar a cargo de outra pessoa – que o objeto do convênio fora
suficientemente bem sucedido a ponto de determinar a aprovação das contas.
As ressalvas, como bem esclareceram os acórdãos trazidos pelo MPF,
disseram respeito a falhas formais, falhas essas que apenas confirmam o que
afirmei acima: má gestão e inaptidão para procedimentos de controle
(prestação de contas).
Em vista de tudo isso, entendo que a conduta do acusado são fora
praticada de forma dolosa. Falta, desse modo, o elemento subjetivo do tipo
penal do art. 1º, VII, do DL n. 201/67, importando em atipicidade absoluta do
fato, determinando em consequência o julgamento de improcedência do pedido
com absolvição do acusado.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, com fundamento no art. 386, III, do Código de
Processo Penal, julgo improcedente o pedido.
Custas “ex lege”.
Transitada em julgado a presente sentença, certifique-se, dê-se baixa
na distribuição e arquivem-se os autos.
Sentença publicada em mãos do diretor de secretaria. Registre-se no
sistema informatizado. Intimem-se o réu e sua defensora. Cientifique-se o MPF.
João Pessoa, 13 de maio de 2009.
Juiz federal ROGÉRIO ROBERTO GONÇALVES DE ABREU
Substituto da 2ª VF/SJPB