sensibilidade a antimicrobianos de escherichia coli patogenica e salm

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 1 Monalisa de Sousa Moura Souto Sensibilidade a antimicrobianos de Escherich ia coli patogênica e Salmonella spp. isoladas de fezes de bezerros do Centro Oeste e Alto Paranaíba de Minas Gerais Dissertação apresentada ao programa de Pós- Graduação em Ciência Animal da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Ciência Animal Área de concentração: Medicina Veterinária Preventiva Orientador:  Andrey Pereira Lage Coorientadora:  Ana Paula Reinato St ynen  Belo Horizonte Escola de Veterinária/UFMG 2011

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    Monalisa de Sousa Moura Souto

    Sensibilidade a antimicrobianos de Escherichia coli patognica e Salmonella spp. isoladas de fezes de bezerros do Centro Oeste e Alto Paranaba de Minas Gerais

    Dissertao apresentada ao programa de Ps-Graduao em Cincia Animal da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial para obteno do grau de Mestre em Cincia Animal

    rea de concentrao: Medicina Veterinria Preventiva

    Orientador: Andrey Pereira Lage

    Coorientadora: Ana Paula Reinato Stynen

    Belo Horizonte Escola de Veterinria/UFMG

    2011

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    Dedico minha me pelo apoio incondicional, minha mestra, verdadeiro modelo de perseverana, dedicao e pacincia. Mais do que para mim, esse um sonho dela.

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    Agradecimentos

    Agradeo a Deus, pela oportunidade, fora e coragem dada para mais esta vitria.

    minha me, Rosngela, por toda batalha dedicada a mim, pela compreenso, carinho, palavras de nimo, incessantes incentivos e pela certeza da vitria.

    Ao meu pai, Dsio, pela confiana, expresses demonstradas e s vezes caladas, mas sempre com orgulho no corao.

    Aos meus irmos, Leandro e Pedro Lucas, pelo carinho, incentivo, amor. Pelos choros nas despedidas, pelas contagens regressivas para o encontro. Eu os amo muito e digo que apesar de tudo, valeu pena.

    Ao Ernesto, meu noivo, por ter me dado fora, carinho e amor. Por ter suportado todos meus momentos de estresse, de desnimo, de tristeza, por ter resistido a distncia. Te amo.

    vov Nair e toda a famlia pelo carinho, amor, orgulho, almoos e jantares especiais que tornaram meus dias de folga muito agradveis e me deram nimo para continuar a caminhada.

    Ao Alex e a Daiane pelo companheirismo, carinho e generosidade, se tornando uma extenso da minha famlia.

    Telma, por ter me iniciado no laboratrio, me acolhido em sua casa, em seu quarto. Obrigada pela amizade, carinho e ensinamentos.

    Juliana que me ajudou no laboratrio e principalmente, na vida, me escutando e aconselhando em vrios momentos difceis que passei.

    Jordana que foi meu brao direito no laboratrio e tornou meus dias e finais de semana bem mais divertidos.

    Agradeo a todos do laboratrio, Giovanna, Ana Paula, Telma, Juliana, Jordana, Fernanda, Elaine, Danilo, Karina, Ethiene, Clarice. E no poderia deixar de esquecer a Rebequinha. Vocs me ensinaram muito, me fizeram crescer e adquirir uma enorme experincia. Esses com certeza foram os anos que mais aprendi em toda minha vida. Muito obrigada!

    minha coorientadora, Ana Paula, por me guiar, ensinar.

    Ao meu orientador, Andrey, por ter me acolhido, ajudado, ensinado, no laboratrio e em todos os momentos difceis que passei longe de casa.

    Ao professor Marcos, por nos acolher sempre e por todo carinho.

    Aos professores e funcionrios da Escola de Veterinria UFMG.

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    CAPTULO 1

    ASPECTOS GERAIS DA DIARREIA EM BEZERROS ....................................................... 9

    RESUMO ............................................................................................................................. 10

    ABSTRACT .......................................................................................................................... 10

    INTRODUO ...................................................................................................................... 10

    1. DIARREIA EM BEZERROS. ................................................................................................ .11

    1.1. AGENTES ETIOLGICOS E FISIOPATOGENIA .............................................................. 11

    1.1.1. ESCHERICHIA COLI..........................................................................................12

    1.1.2. SALMONELLA ...................................................................................................... 15

    1.2. TRATAMENTO ....................................................................................................... ...16

    1.3. CONTROLE E PREVENO............................................................................................18

    2. ANTIMICROBIANOS ......................................................................................................... 18

    2.1. CLASSE DOS ANTIMICROBIANOS .............................................................................. 19

    2.1.1. ANTIMICROBIANOS QUE INTERFEREM NA SNTESE OU AO DO FOLATO............ 19

    2.1.2. ANTIMICROBIANOS -LACTMICOS ................................................................... 20

    2.1.3. AGENTES ANTIMICROBIANOS QUE AFETAM A SNTESE DAS PROTENAS BACTERIANAS.....................................................................................................................21

    2.1.4. AGENTES ANTIMICROBIANOS QUE AFETAM A TOPOISOMERASE II ....................... 24

    2.2. MECANISMOS DE RESISTNCIA AOS ANTIMICROBIANOS........................................... 25

    2.3. USO DE ANTIMICROBIANOS EM MEDICINA VETERINRIA........................................ 29

    3. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ....................................................................................... 33

    CAPTULO 2

    SUMRIO

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    SENSIBILIDADE AOS AGENTES ANTIMICROBIANOS DE ESCHERICHIA COLI E SALMONELLA SPP. DIARREIOGNICAS ISOLADAS DE BEZERROS EM MINAS GERAIS ..................................... 43

    RESUMO ............................................................................................................................. 44

    ABSTRACT .......................................................................................................................... 44

    1. INTRODUO ................................................................................................................. 45

    2. MATERIAL E MTODOS ................................................................................................. 47

    3. RESULTADOS ................................................................................................................ 48

    4. DISCUSSO ................................................................................................................... 56

    5. CONCLUSO .................................................................................................................. 60

    6. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ..................................................................................... 60

    Cap. 2: Sensibilidade aos agentes antimicrobianos de Escherichia coli e Salmonella spp. diarreiognicas isoladas de bezerros em Minas Gerais

    Tabela 1: Perfil de susceptibilidade a nove antimicrobianos de 62 amostras de Escherichia coli diarreiognica isoladas de bezerras do Centro Oeste e Alto Paranaba de Minas Gerais, Brasil, no perodo de dezembro de 2006 a janeiro de 2007 ............................................................. 50

    Tabela 2: Prevalncia de resistncia a vrias classes de antimicrobianos de 62 amostras de Escherichia coli diarreiognica isoladas de bezerras do Centro Oeste e Alto Paranaba de Minas Gerais, Brasil, no perodo de dezembro de 2006 a janeiro de 2007. ........................... 51

    Tabela 3: Resistncia aos antimicrobianos de 62 amostras diarreiognicas de Escherichia coli isoladas de bezerras do Centro Oeste e Alto Paranana de Minas Gerais, Brasil, no perodo de dezembro de 2006 a janeiro de 2007, a nove antimicrobianos. ............................................. 53

    Tabela 4: Perfil de susceptibilidade a nove antimicrobianos de 26 amostras de Salmonella spp. isoladas de bezerros do Centro Oeste de Minas Gerais, Brasil, no perodo de junho a outubro de 2008. .............................................................................................................................. 55

    Tabela 5: Prevalncia de resistncia a vrias classes de antimicrobianos de 26 amostras de Salmonella spp. isoladas de bezerros do Centro Oeste de Minas Gerais, Brasil, no perodo de junho a outubro de 2008. ..................................................................................................... 56

    LISTA DE TABELAS

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    Tabela 6: Resistncia aos antimicrobianos de 26 amostras de Salmonella spp. isoladas de bezerras no Estado de Minas Gerais, Brasil, no perodo de junho a outubro de 2008, a nove antimicrobianos. ................................................................................................................. 57

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    CAPTULO 1

    ASPECTOS GERAIS DA DIARREIA EM BEZERROS

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    Resumo

    Esta atualizao sobre diarreia em bezerros tem como objetivo abordar sobre os principais agentes bacterianos causadores de diarreia (Escherichia coli e Salmonella spp.), sua fisiopatogenia, tratamento e preveno. Alm disso, aborda o uso de antimicrobianos na Medicina Veterinria, caractersticas das classes dos antimicrobianos e seus mecanismos de resistncia.

    Palavras-chave: diarreia, Escherichia coli, Salmonella spp., antimicrobianos, resistncia.

    Abstract

    This update on diarrhea in calves aims to approach on the main bacterial causes of diarrhea (Escherichia coli and Salmonella spp.), their pathogenesis, treatment and prevention. Approaching use of antimicrobials in veterinary medicine, the characteristics of classes of antimicrobials and their mechanisms of resistance.

    Keywords: diarrhea, Escherichia coli, Salmonella pp., antimicrobial, resistance.

    Introduo

    A diarreia em bezerros uma das mais importantes enfermidades, sendo responsvel por significativas perdas econmicas na atividade agropecuria, resultante de mortalidade, custos com tratamento, perda de peso, baixa converso alimentar (Bruning-Fann e Kaneene, 1996; Barrington et al., 2002).

    A diarreia ocorre nos primeiros meses de vida e devido a uma alterao da funo gastrointestinal com hipersecreo intestinal ou m absoro e digesto, caracterizada por aumento na frequncia de defecao ou aumento do volume das fezes (Radostits, 2007). Pode ser causada por enteropatgenos bacterianos, virais e parasitrios ou pode ter etiologia no infecciosa, devido principalmente a erros de manejo alimentar e higinico (Alves, 1997; Benesi, 1999; Langoni et al., 2004).

    Os principais enteropatgenos causadores de diarreia de origem bacteriana so a Escherichia coli (E. coli) e a Salmonella e apesar de ambas provocarem diarreia, a doena causada pelas duas espcies possui algumas caractersticas diferentes. A infeco por E. coli acomete bezerros mais jovens, nos primeiros dias de vida, causando infeces principalmente, no intestino delgado superior. A salmonelose, por outro lado, acomete bezerros mais velhos, sendo comum at os trs meses de idade, localizando-se principalmente, no leo-clon, cuja mucosa invadida pela bactria ocasionando diarreia do tipo inflamatria.

    As diarreias resultantes de infeces por E. coli so no inflamatrias, do tipo aquosa, tambm chamada de secretria. Este tipo de diarreia resulta do aumento da secreo de cloreto para o lmen intestinal. Alm disso, ocorre o comprometimento da absoro de sdio e o aumento da permeabilidade da mucosa intestinal (Pawlowski et al., 2009).

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    A salmonelose em bezerros provocada, principalmente, por dois sorotipos de Salmonella, S. Typhimurium e S. Dublin, e a infeco causada por estes sorotipos possui algumas caractersticas distintas. A S. Typhimurium permanece localizada no intestino e linfonodos mesentricos, enquanto S. Dublin mais invasiva e pode levar infeco sistmica provocando septicemia (Santos et al., 2002).

    A identificao do agente infeccioso causador da diarreia em bezerros de extrema importncia, assim como a pesquisa sobre a sensibilidade e resistncia das amostras aos antimicrobianos. O diagnstico correto direciona a tomada de deciso em relao ao uso de antimicrobianos eficazes e minimiza a ocorrncia de resistncia bacteriana. Esta uma preocupao nos tratamentos devido ao crescente desenvolvimento de resistncia a estes, e por ser zoonoses, aumentam o risco para sade pblica, com a possibilidade de transferncia de bactrias com genes de resistncia antes no observados em humanos. Alm disso, a identificao do perfil de sensibilidade e resistncia de amostras aos antimicrobianos pode ser usado como marcador epidemiolgico.

    1. Diarreia em bezerros

    A diarreia em bezerros considerada uma sndrome, pois decorre de uma interao entre fatores como a imunidade, o ambiente, a nutrio e a infeco por diferentes microrganismos com potencial patognico (Benesi, 1999). Independente dos fatores associados haver sempre uma alterao da funo gastrointestinal com hipersecreo ou m absoro e digesto, resultando em diarreia.

    A diarreia uma das mais importantes doenas de bezerros neonatos da produo de leite e de carne. Ela responsvel por grandes prejuzos econmicos na atividade agropecuria devido aos ndices de mortalidade dos animais afetados, os custos com tratamentos e ainda, perda de peso e o menor desenvolvimento dos bezerros doentes em relao aos sadios (Bruning-Fann e Kaneene, 1996; Barrington et al., 2002).

    No Brasil, a diarreia uma das doenas que mais provocam prejuzos na criao de bezerros. Nos estados de Minas Gerais, So Paulo e Rio de Janeiro, a diarreia, a tristeza parasitria e a pneumonia so responsveis pelas maiores perdas econmicas, seja pela mortalidade ou pelo gasto com o tratamento dos animais doentes (Leite e Lima, 1982; Feitosa et al., 2001; Botteon et al., 2001). Estudos mostram que a frequncia de bezerros com fezes caractersticas de diarreia alta (19,75%) na regio do Mdio Paranaba Rio de Janeiro e Minas Gerais (Botteon et al., 2008), onde esto localizados grandes rebanhos produtores de leite.

    1.1. Agentes etiolgicos e fisiopatogenia

    Enteropatgenos de origem bacteriana, viral e parasitria podem estar envolvidos isoladamente ou associados na patognese da diarreia, com destaque para E. coli, Salmonella spp., rotavrus, coronavrus, Eimeria spp., Giardia e Cryptosporidium spp. (Alves, 1997; Langoni et al., 2004). A diarreia tambm pode ser de etiologia no infecciosa ocorrendo em decorrncia, principalmente, de erros de manejo alimentar e de higiene. Essa condio pode ser precursora das diarreias infecciosas, uma vez que os animais ficam debilitados e susceptveis a infeces (Benesi, 1999).

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    Os microrganismos bacterianos mais comumente encontrados e de maior importncia econmica para diarreia em bezerros so a E. coli e a Salmonella spp., que causam a colibacilose e a salmonelose, respectivamente (House, 1978; Radostits, 2007).

    1.1.1. Escherichia coli

    Escherichia coli um bastonete Gram-negativo, anaerbio facultativo, mvel ou imvel. um importante comensal da microbiota intestinal dos mamferos saudveis, coexistindo sem causar danos ao hospedeiro (Nataro e Kaper, 1998; Wu et al., 2008). No entanto, ao adquirirem e expressarem uma combinao de elementos genticos mveis, tais como plasmdeos, transposons e ilhas de patogenicidade, alm de bacterifagos, torna-se um patgeno altamente adaptado, capaz de causar uma variedade de doenas, desde gastroenterites a infeces extraintestinais como os do trato urinrio, septicemia e do sistema nervoso central (Pizarro-Cerd e Cossart, 2006; Croxen e Finlay, 2010).

    Existem seis patotipos de E. coli causadoras de infeces intestinais: E. coli enterotoxignica (ETEC), E. coli produtora de toxina Shiga/E. coli enterohemorrgica (STEC/EHEC), E. coli enteropatognica (EPEC), E. coli enteroagregativa (EAEC), E. coli enteroinvasiva (EIEC) e E. coli difusamente aderente (DAEC) (Nataro e Kaper, 1998; Kaper et al., 2004; Croxen e Finlay, 2010). Em bovinos os patotipos ETEC, EPEC e STEC/EHEC so os principais causadores de diarreia e disenteria, sendo o primeiro o mais comumente associado com diarreia em bezerros (Franck et al., 1998; DebRoy e Maddox, 2001; Ok et al., 2009).

    E. coli enterotoxignica (ETEC)

    As E. coli enterotoxignicas (ETEC) so consideradas a principal causa de diarreia em bezerros (Acres, 1985; Qadri et al., 2005; Ok et al., 2009). Produzem citotoxinas e causam diarreia aquosa aguda em bezerros recm-nascidos nos primeiros dias de vida de colorao amarela, branca-acinzentada, sendo 80% dos casos de diarreia por ETEC em bezerros de at quatro dias de vida. Raramente provoca diarreia em bezerros mais velhos ou em animais adultos (Acres, 1985; Butler e Clarke, 1994; Ok et al., 2009). Pode levar a bacteremia e morte do animal infectado se este no for rapidamente tratado com fluido, eletrlitos e antimicrobianos (DebRoy e Maddox, 2001).

    Aps ingesto, as ETEC colonizam a mucosa do jejuno distal e leo proximal via fatores de colonizao (CF) como fmbrias ou outras adesinas (DebRoy e Maddox, 2001; Qadri et al., 2005; Croxen e Finlay, 2010). Algumas infeces podem resultar em atrofia das vilosidades e bacteremia ou podem causar poucos danos estruturais ao entercito, porm, a presena de enterotoxinas levam a graves alteraes fisiolgicas nas funes dos entercitos, como hipersecreo de fluidos dentro do lmen intestinal (Acres, 1985; DebRoy e Maddox, 2001).

    Adesinas e toxinas so dois fatores de virulncia importantes em amostras de ETEC (Mitchell et al., 1974). As adesinas de maior importncia so a K99 e a F41, elas podem estar combinadas ou no na mesma amostra ETEC de bezerros (Acres, 1985; Jay et al., 2004). O pili K99 liga-se ao receptor N-glicolilneuraminicacido-GM3 presente nas clulas do intestino delgado do hospedeiro possibilitando a aderncia da bactria que se multiplica e secreta toxinas que causam a diarreia (Jay et al., 2004).

    As enterotoxinas so peptdeos ou protenas extracelulares classificadas como termolbil (LT) ou termoestvel (ST). As

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    ST podem ainda ser classificadas em STa e STb, sendo a primeira de grande importncia no desenvolvimento de doena em bezerros e em seres humanos (Foster e Smith, 2009; Croxen e Finlay, 2010). A toxina LT uma protena de alto peso molecular com estrutura e funo similares da toxina da clera e que encontrada em ETEC isoladas de humanos e sunos (Acres, 1985; Qadri et al., 2005). Ela liga-se aos receptores presentes no entercito e uma vez interiorizada, modifica o componente da protena G (Gsa), que regula a atividade da adenil ciclase que, por sua vez, provoca aumento do contedo de cAMP e consequente perda de ons-cloro e gua (Argenzio, 1985). A toxina ST uma protena de baixo peso molecular e atua sobre a guanilato ciclase, levando ao aumento do cGMP e ativa o CFTR (cystic fibrosis transmembrane conductance regulator), resultando em falha na absoro de Na+2 e efluxo de gua para dentro do lmen (Croxen e Finlay, 2010; Krause et al., 1994). A produo de toxinas dependente do pH do meio e se torna limitada quando este menor do que 7,0 (Foster e Smith, 2009). Ambas as toxinas atuam como segundo mensageiro para ativar protena quinase II que induz secreo de cloreto que por sua vez, atrai osmoticamente a gua para o lmen intestinal, superando a capacidade de absoro das vilosidades, resultando em diarreia(Argenzio, 1985; Golin-Bisello et al., 2005).

    E. coli enteropatognica (EPEC)

    As E. coli enteropatognicas (EPEC) pertencem a famlia de patgenos que formam leses conhecidas como attaching and effecing (A/E) nas clulas epiteliais intestinais, esta famlia tambm inclui as EHEC. As bactrias aderidas s clulas epiteliais destroem as microvilosidades e subvertem a actina celular do hospedeiro para formar uma estrutura semelhante a um pedestal, em

    cima do qual permanecem intimamente ligadas (Kaper, 1994; Kenny et al., 1997; DebRoy e Maddox, 2001).

    As molculas requeridas para induo da leso de A/E so codificadas na ilha de patogenicidade LEE (Locus of Enterocyte Effacement), que organizada em 5 operons policistrnicos LEE1 a LEE5. Os produtos codificados por ela so: o sistema de secreo tipo III (TTSS) (LEE1 a LEE3); o sistema de translocao de protenas (LEE4) e os genes do operon eae e tir no operon LEE5 (Barba et al., 2005; Gyles, 2007). O TTSS injetado dentro da clula alvo do hospedeiro onde fosforilado e ento inserido na membrana citoplasmtica do entercito passando a translocar diretamente protenas efetoras da bactria para dentro do citoplasma da clula do hospedeiro num nico passo (DebRoy e Maddox, 2001).

    A adesina intimina, uma protena de 94 kDa da membrana externa da bactria codificada pelo gene eae e responsvel pela aderncia s clulas hospedeiras. O receptor epitelial para a intimina recebe o nome de Tir (translocated intimin receptor) e uma protena tambm codificada pela LEE que translocado pelo TTSS e inserido na membrana citoplasmtica do entercito onde tambm funciona como um receptor para outras molculas codificadas pelo LEE (Kenny et al., 1997; Oswald et al., 2000). Alm disso, aps a fosforilao, a protena Tir recruta Nck que ativa protena da sndrome neural Wiskott-Aldrich (N-WASP) e o complexo de protena 2/3 relacionado actina (ARP2/3) para mediar o rearranjo de actina e formao do pedestal (Croxen e Finlay, 2010).

    As EPEC possuem um grande repertrio de protenas efetoras que so translocadas para dentro da clula do hospedeiro pelo TTSS subvertendo assim, o processo celular do hospedeiro, como por

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    exemplo, a formao do rearranjo do citoesqueleto e modulao imune, bem como contribuem para a diarreia. Algumas dessas protenas efetoras translocadas so: a Map (protena associada mitocndria) que pode atuar regulando o dinamismo da actina e quebrar a estrutura e funo da mitocndria; EspF que desencadeia morte mitocondrial, inibe a fagocitose e destri junes intercelulares; EspB que tem duplo papel, uma como protena de translocao de TTSS e outra como efetora que previne a fagocitose; Cif que responsvel pela preveno da progresso do ciclo celular e induz a apoptose; BFP (bundle-forming pili) que forma adeses localizadas (Croxen e Finlay, 2010).

    A diarreia provocada por EPEC, frequentemente crnica e mucoide, ocorre pela perda de superfcie absortiva ocasionada pela formao dos pedestais e consequente destruio das microvilosidades. Essas modificaes provocam a perda da capacidade de transduo de sinal e alteraes no transporte eletroltico celular (DebRoy e Maddox, 2001). Alm disso, as infeces por EPEC provocam a destruio da funo da barreira epitelial, atravs da perda da resistncia epitelial, e aumento da permeabilidade da monocamada, que ocorre atravs da destruio das junes apertadas e aderentes (Muza-Moons et al., 2004).

    E. coli enterohemorrgica (EHEC)

    As amostras de E. coli classificadas como enterohemorrgicas (EHEC) caracterizam-se pela produo de no mnimo um membro da classe de citotoxinas denominadas Shiga e da leso do tipo A/E. Amostras que produzem a toxina Shiga, mas que no so capazes de produzir leso do tipo A/E esto includas nesse grupo, mas so chamadas de E. coli produtoras de toxina Shiga (STEC) (Gyles et al., 2007; Croxen e Finlay, 2010).

    As EHEC colonizam o leo distal e o intestino grosso causando gastroenterites graves. Possuem vrias ORFs (open reading frame) que codificam fatores de virulncia. Um dos principais genes de virulncia o stx que codifica a chamada toxina Shiga (Stx), que semelhante toxina produzida por espcies de Shigella e que inicialmente foi chamada de Verotoxina devido observao de sua ao txica em clulas VERO, que uma linhagem celular derivada de rim de macaco verde africano. As Stx so subdividias em Stx1 e Stx2 e as amostras de EHEC podem produzir apenas um ou os dois subtipos da toxina Shiga (Nataro e Kaper, 1998; Pruimboom-Brees et al., 2000).

    O processo de ligao inicial de EHEC no est bem definido, mas pode envolver um pilus tipo IV, chamado de pilus coli hemorrgico, que favorece a ligao das bactrias nas clulas do hospedeiro. Da mesma forma que EPEC, a ligao ntima de EHEC nas clulas do hospedeiro ocorre atravs de interao de intimina e Tir. Esta aderncia pode ser aumentada pela ligao da intimina com outro receptor, a nucleolina, localizada na superfcie da clula hospedeira, cuja expresso aumentada pela presena da Stx2 (Robinson et al., 2006).

    O genoma de EHEC possui o mesmo LEE de EPEC, porm o mecanismo de formao da estrutura semelhante ao pedestal ligeiramente distinto das EPEC, no ocorrendo fosforilao do Tir e a formao de pedestal independente de Nck. O rearranjo de actina que necessrio para a formao do pedestal mediado por TccP (Tir cytoskeleton-coupling protein), que se liga ao Tir atravs de protenas do hospedeiro IRTKS (insulin receptor tyrosine kinase substrate) e interage com N-WASP para ativar o complexo ARP2/3. Outros fatores como ECP (E. coli common pilus) e HCP (haemorrhagic coli pilus) tambm esto ligados. As EHEC tambm

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    injetam muitas das mesmas protenas efetoras de EPEC dentro das clulas do hospedeiro para manipular o processo de infeco, no qual possvel quebrar a estrutra e funo da mitocndria, inibir a fagocitose, induzir apoptose (Croxen e Finlay, 2010).

    Amostras de EHEC colonizam o clon onde causam necrose das extremidades das vilosidades. Em bezerros, a infeco por essas amostras est associada diarreia da primeira oitava semana de idade (China et al., 1998), do tipo mucoide e, s vezes hemorrgica, frequentemente recorrente apesar do tratamento, resultando em desidratao, enfraquecimento e uma reduzida taxa de crescimento, mas raramente fatal (DebRoy e Maddox, 2001).

    1.1.2. Salmonella

    O gnero Salmonella constitudo por bactrias Gram-negativas em forma de bastonete pertencentes famlia Enterobactereaceae. So microrganismos aerbios, em sua maioria mveis com flagelos peritrquios, no esporulados e no capsulados, oxidase negativa e catalase positiva (Uzzau e Fasano, 2000; Ibarra e Steele-Mortimer, 2009).

    A Salmonella uma importante causa de diarreia nos bovinos, seus sinais clnicos incluem diarreia sanguinolenta, anorexia, febre, desidratao e prostrao dentro de 18 a 48 horas (Waray e Sojka, 1978; Tsolis et al., 1999). As diarreias bovinas causadas por S. Typhimurium so do tipo inflamatria, ocorrem em animais com at trs meses de idade e a infeco permanece localizada no intestino e linfonodos mesentricos. A infeco por S. Dublin invasiva e sistmica, podendo resultar em meningoencefalite, poliartrite, osteomielite ou pneumonia em bezerros, com ou sem presena de diarreia. Em vacas e novilhas prenhes a infeco por S. Dublin pode

    provocar abortos, assim como o sorovar S. Newport (Hinton et al., 1975; Rings et al., 1985; Bispham et al., 2001). A doena por S. Dublin est associada morbidade em bovinos jovens e adultos (Sojka e Field, 1970; Waray e Sojka, 1978).

    As diferenas observadas entre as infeces causadas por S. Typhimurium e S. Dublin ocorrem provavelmente devido a caractersticas gentipicas distintas existentes entre os dois sorotipos, incluindo diferenas nos Sistemas de Secreo tipo 1 (TTSS-1) e tipo 2 (TTSS-2), codificados respectivamente pela Ilha de Patogenicidade de Salmonella 1 (SPI-1) e pela Ilha de Patogenicidade de Salmonella 2 (SPI-2), dois grandes grupos de genes associados com a invaso e a sobrevivncia da bactria dentro das clulas hospedeiras (Wallis et al., 1999; Tsolis et al., 1999; Santos et al., 2002).

    O TTSS-1 essencial invaso bacteriana e tambm promove o acmulo de fluido e influxo de neutrfilos. igualmente importante na fase intestinal da infeco por S. Typhimurium e por S. Dublin em bezerros. Entretanto TTSS-2 de pouca ou nenhuma importncia na infeco de S. Typhimurium, mas contribui para a infeco por S. Dublin se tornar sistmica (Tsolis et al., 1999; Wallis et al., 1999; Santos et al., 2002).

    Aps a ingesto e colonizao intestinal de Salmonella pelo hospedeiro, a bactria invade os entercitos no epitlio intestinal alcanando a submucosa por basicamente dois processos distintos: pode ser fagocitada por fagcitos profissionais, como macrfagos, que a reconhecem efetivamente internalizando-a; ou pode tambm invadir clulas fagocticas e no fagocticas usando o TTSS-1, onde protenas efetoras induzem o rearranjo do citoesqueleto de actina resultando em uma membrana ondulada localizada e rpida internalizao da bactria (Salcedo et al.,

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    2001; McGhie et al., 2009). Este processo conseguido pelo complexo de translocao, atravs do TTSS-1, de algumas protenas, como SipB, SipC e SipD, na membrana da clula hospedeira, que requerido para entrega de outras protenas para dentro do citoplasma da clula eucaritica (Fu e Galn, 1998). Em adio ao TTSS-1, adesinas fimbriais e afimbriais da superfcie da Salmonella podem tambm mediar adeso e internalizao da bactria via independente do TTSS-1 (Guo et al., 2007).

    Aps sua internalizao, a Salmonella sobrevive e replica dentro do fagossoma modificado, o SCV (vacolo contendo Salmonella). Este processo mediado por TTSS-1 e TTSS-2 (Ibarra e Steele-Mortimer, 2009; McGhie et al., 2009). Um conjunto de protenas efetoras liberadas por SPI-1 (SipA, SipC, SopB, SopD, SopE e SopE2) tem a funo de induzir deformao da membrana e rearranjo do citoesqueleto de actina subjacente, desencadeando internalizao da bactria dentro do SCV. O TTSS-2 tem papel na sobrevivncia e replicao de Salmonella aps invaso, evita fuso do SCV com o lisossomo e ainda parecem suprimir a apresentao de antgenos pelas clulas dendrticas, limitando o reconhecimento e a resposta imune do hospedeiro para as clulas infectadas. Os SCVs migram da borda luminal da clula para a membrana basal onde a Salmonella interage e entra nos macrfagos associados com as placas de Peyers no espao da submucosa. Os SCVs so importantes para sobrevivncia e transporte da Salmonella nas clulas epiteliais e tem papel chave na sobrevivncia dentro das clulas fagocticas. Portanto, a habilidade de sobrevivncia e proliferao nos SCVs o principal fator de virulncia para Salmonella (Foley e Lynne, 2007)

    Ao atingir a lmina prpria da parede intestinal dos bovinos, a Salmonella estimula uma reao inflamatria

    caracterizada por enterite fibrinopurulenta necrosante, que pode resultar na formao de uma pseudomembrana no leo terminal e cranial (Tsolis et al., 1999). Existem dois mecanismos pelos quais S. Typhimurium pode estimular essa resposta inflamatria. Uma possibilidade que quando o TTSS-1 invade e migra atravs das clulas epiteliais, ele pode facilitar o reconhecimento pelo NOD (Nod-like receptors) e TLR (Toll-like receptors), desencadeando ou estimulando diretamente eventos de sinalizao pr-inflamatrios nas clulas do hospedeiro (Inhora et al., 2002; Sieling e Modlin, 2002). Um segundo mecanismo, a produo, dependente de TTSS-1, de quimiocinas como da interleucina-8 (CXCL8-IL8), iniciando a cascata de sinalizao (McCormick et al., 1998; Alexander et al., 2009). A resposta inflamatria pode ser tambm devido morte celular de macrfagos (McGhie et al., 2009).

    Aps estimular a cascata de sinalizao pr-inflamatria ocorre um aumento na expresso de muitas quimiocinas, como IL-8, GCP-2, GRO-, GRO- no tecido intestinal e isto promove uma infiltrao severa e aguda de neutrfilos para o local (Santos et al., 2002; Zhang et al., 2003). Esta reao inflamatria causa a secreo de fluido, que resulta em liberao de protenas do soro para o lmen intestinal e atribuda perda da barreira da permeabilidade intestinal (Santos et al., 2002).

    1.2. Tratamento

    O tratamento de diarreia com antimicrobianos nem sempre apresenta bons resultado, tornando o tratamento suporte essencial para a recuperao do animal. No entanto, o uso de um antimicrobiano especfico pode diminuir a ocorrncia de resistncia dos microrganismos. Para tal, necessrio selecionar um agente antimicrobiano com um espectro de

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    atividade adequada, utilizar um protocolo de dose que atinja e mantenha concentrao teraputica eficaz no local da infeco, tratar por um perodo adequado, evitar resduos e efeitos locais ou sistmicos adversos e, minimizar o potencial para transferncia de genes de resistncia a antimicrobianos (Constable, 2009).

    Os medicamentos devem ser administrados somente nos bezerros que apresentem sinais sistmicos da doena como inapetncia, desidratao, letargia e pirexia ou que tenham sangue ou fragmentos de mucosa nas fezes, o que indicativo da quebra da barreira hemato-intestinal e supe risco aumentado de bacteremia (Constable, 2009). No indicada a administrao de antimicrobiano para bezerros diarricos que tm apetite, nvel de atividade, temperatura retal e estado de hidratao normais e ausncia de infeces concomitantes tais como pneumonia ou onfaloflebite (Ortman e Svensson, 2004). Neste caso, os animais doentes devem ser separados dos saudveis e monitorados frequentemente.

    O tratamento do quadro de diarreia em bezerros consiste na eliminao do microrganismo do trato intestinal e no combate desidratao para que a absoro normal seja restaurada o quanto antes (Foster e Smith, 2009). Para isto, pode-se fazer uso de antimicrobianos e uma adequada fluidoterapia, alm destes, tambm pode-se usar agentes analgsicos e anti-inflamatrios, alimentao continuada de leite de vaca, vitaminas B e lipossolveis (Constable, 2009).

    Os antimicrobianos de primeira escolha para o tratamento de diarreia em bezerros sistematicamente doentes incluem: amoxicilina ou ampicilina (10mg/Kg, IM, 12/12h), sulfonamida (25mg/Kg, IV ou IM, 1X/dia), e amoxicilina oral (10mg/Kg, 12/12h), administrados sozinhos ou combinados com inibidor de clavulanato de

    potssio (12,5mg/Kg, 12/12h) (White et al., 1981; Constable, 2004).

    Antimicrobianos de segunda escolha so as cefalosporinas de terceira e quarta gerao, como o ceftiofur e cefquinona; e o de terceira escolha a fluorquinolona. A administrao de fluorquinolona para animais produtores de alimentos nos Estados Unidos proibida por lei por facilitar a emergncia de bactrias com mltipla resistncia a antimicrobianos (Constable, 2009).

    A diarreia em bezerros pode ser acompanhada de clicas intestinais e dor abdominal. Portanto, a administrao de um analgsico eficaz pode ser benfica como parte do tratamento, desde que os efeitos colaterais no sejam deletrios. O meloxicam e o fluxine meglumine (anti-inflamatrio no esteroidal) so indicados quando utilizados em conjunto com reidratao oral (Philip et al., 2003).

    Tambm indicada a alimentao do bezerro com leite de vaca, pois este uma excelente fonte de nutrio, barato, facilmente disponvel, e ainda, possui fatores de crescimento que facilitam a reparao do intestino danificado, assim como mantem o crescimento de bezerros diarricos, desenvolvimento de maior depsito de gordura, melhor regenerao intestinal e menor atrofia tmica. A administrao de eletrlitos oral o tratamento auxiliar para muitos bezerros com diarreia. Baseado na patofisiologia dos organismos, duas caractersticas da terapia de reposio de lquidos so crticas: a primeira maximizar a absoro de sdio e assim, melhorar o grau de hidratao do bezerro; o segundo ponto crtico a reposio de fluidos adequados, uma vez que o bicarbonato, que um agente alcalinizante, pode favorecer a proliferao dos microrganismos patognicos, desta forma deve-se retirar o bicarbonato das solues eletrlitas (Heath et al.,1989;

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    Foster e Smith, 2009). No entanto, formulaes de fluidoterapia com bicarbonato so usadas e apresentam bons resultados.

    importante ressaltar que no somente os animais doentes devem ser tratados em uma propriedade, mas o controle e a preveno da infeco so essenciais para a diminuio dos custos de produo associados diarreia em bezerros.

    1.2.1. Controle e preveno

    A exposio aos agentes infecciosos causadores da diarreia em bezerros pode ser diminuda pelo isolamento dos animais doentes, construo de piquete maternidade e uso de boas prticas de higiene. A resistncia a doenas tambm pode ser aumentada assegurando alta qualidade nutricional para a me e o bezerro e ingesto de quantidade suficiente de colostro pelo neonato. Em um estudo realizado por Berge et al. (2006) foi demonstrado que a falha na transferncia de imunidade passiva est significativamente associada ao aumento da mortalidade, ao nascimento de bezerros fracos e grande necessidade de tratamentos teraputicos. Alm disso, a propagao de patgenos foi menor entre os bezerros que receberam quantidade adequada de colostro, que foram criados em ambiente limpo e ventilado e que receberam suporte nutricional apropriado.

    A vacinao como forma de controle e preveno de diarreias em bezerros tambm uma alternativa, conseguindo reduzir o nmero de bezerros de uma semana que necessitam de tratamento (Khare et al., 2010). Tambm deve-se controlar os surtos de diarreia, reduzindo o tamanho dos lotes do rebanho para minimizar a contaminao ambiental e potencial para infeco, e implementando medidas de controle de roedores e de animais selvagens.

    As medidas de preveno e controle, bem como um adequado manejo das vacas prenhes e dos bezerros recm-nascidos so importantes para uma significativa diminuio do custo de produo da propriedade. Em um experimento realizado por Gow et al. (2005), onde utilizaram manejo sanitrio e higinico adequados, foi observado uma diminuio na taxa de mortalidade de 8,9% (32/360) em 2002 para 3,1% (7/225) em 2003, e ainda, o nmero de animais tratados de 90,3% para somente 20,9%. Este ganho no custo de produo devido no somente ao menor gasto inicial do tratamento ou baixa taxa de mortalidade dos bezerros, como tambm ao melhor ganho de desempenho ao desmame e reduo do risco de doenas no rebanho.

    2. Antimicrobianos

    A ao dos antimicrobianos focada em quatro principais mecanismos biolgicos: biossntese da coenzima folato, biossntese da parede celular, biossntese de protena e replicao e reparo de DNA (Walsh, 2003).

    A escolha de um antimicrobiano para o tratamento de uma infeco bacteriana deve seguir determinados critrios. Em geral, dois importantes princpios so: a identificao, quando possvel, do organismo infectante e a determinao de sua sensibilidade aos agentes antimicrobianos. Alm disso, deve-se levar em considerao alguns aspectos do hospedeiro, como a exposio prvia a antibiticos, a idade, as funes heptica e renal, o local da infeco, a administrao concomitante de outras drogas que possam interagir negativamente com o antibitico e o fato do paciente estar prenhe ou com o

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    sistema imunolgico comprometido (Rang et al., 1997).

    A escolha do antimicrobiano deve ser baseada em caractersticas do agente etiolgico e no mecanismo de ao do medicamento, uma vez que so formulados para agir especificamente em determinado alvo e que existem diferenas estruturais e metablicas entre os microrganismos. Um bom exemplo a classificao dos microrganismos em Gram-positivo ou Gram-negativo que baseada na estrutura de sua parede celular e que de fundamental importncia na escolha do antimicrobiano, onde drogas que tenham baixa lipossolubilidade no conseguem atravessar a parede celular de microrganismos Gram-negativo. Outro exemplo o tipo de membrana externa, que pode ser compacta em alguns microrganismos e em outros no, dificultando a penetrao dos antimicrobianos (Chambers e Sande, 1996a ; Rang et al., 1997).

    2.1. Classe dos antimicrobianos

    De acordo com o mecanismo de ao dos antimicrobianos, eles so agrupados em quatro classes diferentes: os agentes antimicrobianos que interferem com a sntese ou com a ao do folato, os -lactmicos, os que afetam a sntese de protenas bacterianas e os que afetam a topoisomerase II.

    2.1.1. Antimicrobianos que interferem na sntese ou ao do folato

    Os antimicrobianos que interferem na sntese ou na ao do folato so representados pelas sulfonamidas e pelo trimetoprim. As sulfonamidas so drogas sintticas testadas desde 1930 por Domagk, que conseguiu demonstrar seu efeito antimicrobiano. Foram os primeiros antimicrobianos eficazes utilizados por via sistmica na preveno e cura das infeces

    bacterianas no homem e no animal. So anlogos estruturais ao cido -aminobenzico (PABA), que bloqueiam diferentes passos do metabolismo do cido flico e interferem, portanto, na sntese de nucleotdeos (Rang et al., 1997; Walsh, 2003). So antimicrobianos bacteriostticos com amplo espectro de ao, amplamente usados at mesmo no perodo do advento das penicilinas. Entretanto, devido ao aparecimento da resistncia microbiana e dos vrios relatos de seus efeitos adversos (salivao, diarreia, excitao, fraqueza muscular, ataxia, cristalria sulfonamdica), seu uso tornou-se limitado, principalmente na medicina humana (Mandell e Petri Jr, 1996b).

    Na dcada de 70, as sulfonamidas voltaram a ser usadas, mas em associao com o trimetoprim, uma diaminopirimidina. Chamada de co-trimoxazol, essa associao de drogas tem ao bactericida e age inibindo a sntese de folato e a biossntese de DNA. Na primeira etapa, as sulfonamidas competem com o cido PABA pela enzima diidropteroato-sintetase, que uma enzima bacteriana responsvel pela incorporao de PABA no cido diidropterico, precursor imediato do cido flico. Na segunda etapa, o trimetoprim compete com o folato pela enzima diidrofolato-redutase, que uma enzima bacteriana que reduz o folato a tetraidrofolato. Esta reduo no cido tetraidroflico metabolicamente ativo, que um cofator necessrio nas reaes de biossntese dos cidos nuclicos, diminui a sntese de DNA e proliferao celular (Mandell e Petri Jr, 1996b; Rang et al., 1997). Portanto, as sulfonamidas potencializam a ao do trimetoprim, uma vez que elas atuam na mesma via metablica do trimetoprim, embora seja em uma fase anterior.

    As sulfonamidas so rapidamente absorvidas pela via gastrointestinal. Aps serem biotransformadas, principalmente no

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    fgado por acetilao, e conjugadas com cido glicurnico, so excretadas na urina por filtrao glomerular (Rang et al., 1997). Uma pequena proporo pode ser eliminada atravs de secrees como suor, saliva e leite e, por isso, preconiza-se que a utilizao do leite de vacas tratadas com este quimioterpico s deva ocorrer, em mdia, quatro dias aps a ltima administrao (Mandell e Petri Jr, 1996b).

    O emprego das sulfonamidas foi, em grande parte, substitudo por outros antimicrobianos, visto que muitos dos microrganismos inicialmente sensveis a estes quimioterpicos desenvolveram resistncia. Por outro lado, na ausncia da resistncia, as sulfonamidas tm grande vantagem sobre vrios antimicrobianos. Atualmente, elas ocupam destacado papel no tratamento de diversas infeces dos animais domsticos. Alm disso, estes quimioterpicos so amplamente usados na rao de animais de criao, com o objetivo de prevenir as denominadas doenas de confinamento (Rang et al., 1997; Grniak, 2002).

    O uso na medicina veterinria das sulfonamidas possui algumas vantagens, dentre elas, o baixo custo e a administrao oral para ruminantes, pois, ao contrrio de outros antimicrobianos de amplo espectro, elas no causam alteraes na microbiota ruminal (Grniak, 2002).

    2.1.2. Antimicrobianos -lactmicos

    Os antimicrobianos -lactmicos fazem parte de uma ampla classe de antimicrobianos, que inclui a penicilina e seus derivados, sendo o grupo de quimioterpicos mais usado. As cefalosporinas de 1, 2, 3 e 4 geraes tm o maior nmero de molculas semi-sintticas disponibilizadas para tratamento. H tambm, os carbapenmicos como o imipenem, o meropenem, o ertapenem e o panipenem, e os monobatmicos, como o

    aztreonam, que foram desenvolvidos para tratamentos de infeces por microrganismos Gram-negativo produtores de -lactamases que apresentaram resistncia s penicilinas de espectro ampliado (Rang et al., 1997).

    O mecanismo de ao de todos os antibiticos -lactmicos baseado na inibio da sntese dos peptideoglicanos da parede celular das bactrias. Eles se ligam s protenas de ligao das penicilinas (PLP), existentes na parede celular bacteriana, responsveis pelas ligaes cruzadas entre as diferentes fitas de peptideoglicanos que do sustentao e rigidez s bactrias. A interferncia na rigidez da parede celular causa posteriormente a lise bacteriana devido s diferenas de presso osmtica entre os meios intracelular e extracelular (Spinosa, 2002b).

    As penicilinas ligam-se, preferencialmente, s PLP-1B e, as cefalosporinas e carbapenmicos s PLP-2 e PLP-3. A ligao s PLP-4 e PLP-5 no letal para a bactria. Algumas das -lactamases codificadas so especficas para as penicilinas (penicilinases), para cefalosporinas (cefalosporinases) ou para os dois grupos de antimicrobianos (mistas). A eliminao dos -lactmicos principalmente renal (Mandell e Petri Jr, 1996a; Rang et al., 1997).

    A penicilina foi descoberta em 1928 por Fleming que observou que uma substncia solvel originria de culturas de Penicillium notatum tinha ao antibacteriana. Florey, Chain e Abraham, em 1939, foram os primeiros a isolar a penicilina a partir de um extrato no purificado. Em 1940, Abrahem descobriu que cepas de E. coli eram capazes de produzir penicilases. Em 1943, a penicilina comeou a ser utilizada clinicamente. Kirby descreveu, em 1944, as primeiras falhas no tratamento causadas pela produo de -

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    lactamases. Em 1945, Abraham e Chain elucidaram a estrutura da penicilina. J em 1954, lanada no mercado a primeira penicilina semi-sinttica, a penicilina V. Em 1984, o primeiro agente bloqueador de -lactamases, o cido clavulnico, torna-se disponvel (Rang et al., 1997).

    Atualmente, as penicilinas so obtidas a partir do cido 6-aminopenicilnico, originrio do sobrenadante de culturas do fungo Penicillium chrysogenum. As penicilinas so bactericidas com espectro de ao amplo, cuja estrutura bsica contm um anel -lactmico ligado a um anel tiazolidnico. Elas podem ser destrudas por enzimas -lactamases (penicilases) que quebram o anel -lactmico na regio do grupo carbonila, ou por amidases, que hidrolizam a ligao amdica lateral, tornando-as inativas (Mandell e Petri Jr, 1996a).

    As penicilinas semi-sintticas so derivadas da penicilina por mtodos qumicos industriais e surgiram na busca de medicamentos cada vez mais eficientes que pudessem atingir a grande maioria dos agentes infecciosos. Dentre elas esto amoxicilina, ampicilina, pivampicilina, flucloxacilina, carbenacilina, aziocilina e ticarcilina. Todas so sensveis s penicilases.

    Em 1948, Giuseppe Brotzu isolou a primeira fonte de cefalosporina a partir do sobrenadante das culturas de um fungo encontrado na sada de um esgoto na Sardenha, o Cephalosporium acremonium. Em 1961, isolou-se o ncleo central, o cido 7-amino-cefalospormico (7-ACA). Atualmente, todas as cefalosporinas so derivadas do 7-ACA que possui um anel tiazolidnico ligado ao anel -lactmico. As cefalosporinas que possuem o radical imino metoxi so mais resistentes s -lactamases e possuem maior atividade contra bactrias Gram-negativas. A nica cefalosporina de

    segunda gerao que possui este radical a cefuroxina, enquanto todas as de terceira e quarta gerao, exceto a cefoperazona, possuem este radical (Spinosa, 2002b).

    As cefalosporinas so, primariamente, bactericidas em concentraes teraputicas, provocando a lise osmtica das bactrias sensveis em crescimento. O espectro de ao de todas as cefalosporinas amplo, sendo ativas contra cocos Gram-positivos e bactrias Gram-negativas. Assim como nas penicilinas, uma vez atingida a concentrao inibitria mnima, no se aumenta mais o efeito bactericida com o aumento da concentrao. As cefalosporinas induzem a produo de -lactamases atravs da ativao de genes para a produo destas enzimas, que atuam contra todos os -lactmicos, inclusive contra elas mesmas (Mandell e Petri Jr, 1996a; Walsh, 2003;).

    A excreo das cefalosporinas feita basicamente pelo rim, principalmente pela secreo tubular. Seu uso em medicina veterinria amplia-se cada vez mais, embora o seu alto custo seja um fator limitante (Spinosa, 2002b).

    2.1.3. Agentes antimicrobianos que afetam a sntese das protenas bacterianas

    A classe de antimicrobianos que interferem na sntese de protenas bacterianas composta pelas tetraciclinas, os aminoglicosdeos, o cloranfenicol, os macroldeos, as lincosamidas e o cido fusdico.

    A primeira tetraciclina descoberta, a aeromicina, foi desenvolvida em 1948 por Duggar, a partir de culturas de Streptomyces aureofaciens. Em 1950, Finlay et al. apresentam uma segunda opo de tetraciclina, a terramicina, produzida a partir do Streptomyces rimosus. Logo aps foram desenvolvidas tetraciclinas semi-

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    sintticas, como a metaciclina, a doxiciclina em 1967 e a minociclina em 1972 (Rang et al., 1997). Nos ltimos 30 anos, no houve novas incluses de antimicrobianos a essa classe. Isto promoveu um declnio na terapia de primeira linha pelo gradual desenvolvimento de resistncia bacteriana aps dcadas de uso.

    As tetraciclinas atuam por inibio da sntese protica pelo bloqueio da fixao do complexo aminoacil-RNA-transportador ao ribossomo 30S, o que impede a sntese de enzimas e de componentes celulares fundamentais para a clula. Elas so transportadas para o meio intracelular por um sistema especial, onde uma vez dentro da clula, no conseguem sair. Desta forma, atingem altas concentraes nas clulas do hospedeiro, sendo bacteriostticas para bactrias extracelulares e bactericidas para bactrias intracelulares (Rang et al., 1997).

    O espectro de ao amplo e so eficazes contra bactrias aerbias Gram-positivas e Gram-negativas (Pseudomonas aeruginosa, Proteus e Salmonella so resistentes), clamdias, riqutsias e at mesmo, contra alguns protozorios (Rang et al., 1997). Os organismos sensveis tetraciclina tambm so considerados sensveis a doxiciclina e minociclina. Entretanto, alguns organismos de sensibilidade intermediria ou resistente tetraciclina podem ser sensveis a doxiciclina, minociclina ou a ambas (Performance, 2009).

    Apesar de seu alto grau de resistncia, as tetraciclinas ainda so muito usadas na medicina humana e animal, principalmente pelo seu baixo custo, por ser administrado por via oral e ainda, pela possibilidade de uso como promotor de crescimento em sunos e bovinos, principalmente (Sawant et al., 2007). No entanto, novas geraes de tetraciclinas esto sendo desenvolvidas a partir de modificaes em sua estrutura, como a

    glicilciclina que foi sintetizada em 1993, e em 2005 foi aprovada pelo FDA, sendo ativa contra inmeras bactrias resistentes a tetraciclinas (Pereira-Maia et al., 2010). A excreo da maioria destes quimioterpicos realizada pelas vias biliar e renal, sendo esta ltima por filtrao glomerular (Kapusnik-Uner et al., 1996; Spinosa, 2002c).

    Os aminoglicosdeos fazem parte de um grupo de frmacos compostos de um grupo amino e um grupo glicosdeo. Os medicamentos desta classe so bactericidas, inibidores da sntese proteica das bactrias sensveis. Diversos aminoglicosdeos funcionam como antibiticos que so efetivos contra certos tipos de bactrias. Eles incluem amicacina, arbecacina, gentamicina, canamicina, neomicina, netilmicina, paromomicina, rodostreptomicina, estreptomicina, tobramicina e apramicina. As antraciclinas so outro grupo de aminoglicosdeos, usados na quimioterapia (Chambers e Sande, 1996b; Spinosa, 2002a).

    A estreptomicina foi o primeiro aminoglicosdeo introduzido na teraputica, em 1943, pelo grupo de pesquisadores liderados por Waksman. A seguir, outros foram surgindo, como a neomicina (1949), paramomicina (1956), canamicina (1957), espectinomicina (1961), gentamicina (1963), tobramicina (1968), sisomicina e ribostamicina (1970), netilmicina (1975), entre outros.

    Os aminoglicosdeos so divididos em natural ou em semi-sintticos, de acordo com sua origem. Dentre os naturais esto a estreptomicina (Streptomyces griseus), a neomicina (Streptomyces fradiae), a gentamicina (Micromonospora purprea), a tobramicina (Streptomyces tenebrarius) e a canamicina (Streptomyces kanamyceticus). Entre os semi-sintticos esto a netilmicina (sisomicina) e a amicacina (canamicina).

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    Esses medicamentos tm sido amplamente usados desde sua descoberta por possurem ao bactericida e sinergismo com outros antibiticos (Chambers e Sande, 1996a).

    A destruio bacteriana provocada pelos aminoglicosdeos depende da sua concentrao, quanto maior, mais eficiente. Alm disso, este grupo de antimicrobianos possui um efeito ps-antibitico, isto , persistncia da atividade bactericida residual aps a queda da concentrao plasmtica abaixo da concentrao inibitria mnima. Esta durao da atividade tambm depende da concentrao do frmaco e deve-se reteno do aminoglicosdeo na clula bacteriana (Rang et al., 1997).

    Os aminoglicosdeos tm como alvo o ribossomo e ligam-se s aminoacil-tRNA sintetase inibindo, consequentemente, a sntese de protenas (Carter et al., 2000). So potentes drogas contra bactrias Gram-negativas e, em combinaes sinrgicas com agentes antimicrobianos ativos na parede celular, podem ser efetivas contra bactrias Gram-positivas resistentes (Rang et al., 1997; Walsh, 2003; Methods, 2009). A gentamicina o aminoglicosdeo mais comumente usado e o de primeira escolha em virtude de seu baixo custo e sua atividade confivel contra todos os aerbios Gram-negativos. A amicacina tem o mais amplo espectro antimicrobiano e, juntamente com a metilmicina, eficaz em infeces por microrganismos resistentes gentamicina e tobramicina. A neomicona e a framicetina so muito txicas para serem usadas por via parenteral, sendo administradas apenas topicamente. Os aminoglicosdeos no so absorvidos na via gastrointestinal, exceto pelo uso em neonatos com enterocolite necrosante, sendo geralmente administrados por via intramuscular ou endovenosa (Rang et al., 1997).

    Os aminoglicosdeos so inicialmente transportados atravs da parede celular e da membrana citoplasmtica, ligando-se, posteriormente, aos receptores nas unidades ribossomais 30S. O antimicrobiano associa-se com a superfcie aninica da bactria Gram-negativa e, na sequncia, passa pelo canal pornico da membrana externa. Aps atravessar as membranas, a droga se liga unidade ribossomal 30S provocando erro na leitura do RNAm e impedindo o deslocamento do ribossomo pelo filamento de RNAm, o que resulta na inibio da sntese de protenas (Chambers e Sande, 1996b). Devido ao transporte do aminoglicosdeo atravs da membrana citoplasmtica ser um processo ativo e dependente de oxignio, as bactrias anaerbicas estritas so resistentes a essa classe de antimicrobianos. Eles no interferem na sntese protica das clulas dos animais superiores por no conseguirem se ligar s subunidades ribossomais 40S e 60S (Spinosa, 2002a).

    O cloranfenicol um antibitico que se liga subunidade 50S do ribossomo bacteriano, mesmo stio de ao da eritromicina e da clindamicina. de amplo espectro, eficaz no tratamento de infeces por bactrias Gram-positivas e Gram-negativas e por riqutsias. So bacteriostticos e seu uso clnico deve ficar reservado para infeces graves, nas quais os benefcios do antimicrobiano sejam maiores que o risco de toxicidade (Kapusnik-Uner et al., 1996). Na medicina veterinria est limitado a animais de estimao e animais no destinados ao consumo. Seu uso foi banido na Unio Europia, Estados Unidos, Canad e em muitos outros pases, inclusive no Brasil, para proteo do consumidor dos potenciais efeitos adversos resultantes de resduos de cloranfenicol em carcaas de animais (Fergunson et al., 2005).

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    Os macroldios so representados pela eritromicina, claritromicina e azitromicina. Eles inibem a sntese de protena, no entanto, por terem ao bactericida ou bacteriosttica, dependem da concentrao do antimicrobiano e do microrganismo. O stio de ao o mesmo do cloranfenicol e da clindamicina e, os trs agentes podem competir entre si quando administrados simultaneamente (Kapusnik-Uner et al., 1996).

    As lincosamidas, como por exemplo, a clindamicina, so usadas clinicamente no tratamento das infeces causadas por Bacterides sp. e nas infeces sseas e articulares por estafilococos. Seus efeitos indesejveis consistem, basicamente, em distrbios gastrointestinais.

    O cido fusdico tem um espectro restrito de ao, sendo ativo, principalmente, contra bactrias Gram-positivas, provocando efeitos indesejveis como distrbios gastrointestinais, erupes e ictercia (Rang et al., 1997; Spinosa, 2002c).

    2.1.4. Agentes antimicrobianos que afetam a topoisomerase II

    Esta classe de antimicrobianos representada pelas quinolonas e fluorquinolonas, ambas derivadas do cido nalidxico. Porm, as fluorquinolonas apresentam um tomo de flor ligado ao seu anel, o que no observado nas quinolonas. Elas possuem uma estrutura de anel bsico, no qual se liga um cido carboxlico na posio trs e, no caso das fluorquinolonas, um flor na posio seis. Muitos destes componentes tambm possuem uma piperazina na posio sete.

    As quinolonas foram descobertas por Lesher em 1962, mas seu uso permaneceu latente por mais de duas dcadas. O cido nalidxico foi o primeiro

    antimicrobiano dessa classe a ser usado clinicamente. Na dcada de 1980, as fluorquinolonas foram introduzidas no tratamento contra agentes infecciosos (Acar e Goldstein, 1997).

    So bactericidas para a maioria das bactrias Gram-negativas e atuam inibindo as enzimas de replicao e reparo do DNA, como a topoisomerase II (girase do DNA) e IV, que so enzimas responsveis pela manuteno de um DNA funcional (Walsh, 2003). Takei et al. (2001) mostraram que algumas fluorquinolonas como norfloxacina, ciprofloxacina e levofloxacina apresentam preferncia para alvo a topoisomerase tipo IV, enquanto esparfloxacina e nadifloxacina para a topoisomerase tipo II (DNA girase). Gatifloxacina, moxifloxacina e outras tm preferncia para alvo a topoisomerase tipo II e IV, igualmente. As fluorquinolonas tm excelente distribuio nos tecidos e fluidos corporais. Dentre elas, a ciprofloxacina a que apresenta maior espectro de ao contra bastonetes aerbios Gram-negativos (Rang et al., 1997).

    As quinolonas de primeira gerao esto, cada vez mais, caindo em desuso com a descoberta de novas substncias. Quando comparadas com as fluorquinolonas, possuem menor espectro de ao e o desenvolvimento de resistncia microbiana ocorre bem mais rapidamente. Elas possuem pequeno espectro de ao, agindo somente contra E. coli, Proteus sp. e Pseudomonas, enquanto as fluorquinolonas possuem largo espectro de ao e so usadas contra bactrias Gram-positivas e Gram-negativas, bem como Mycoplasma, Chlamydia e Staphylococcus, incluindo aqueles resistentes meticilina (Grniak, 2002).

    As vias de eliminao diferem entre as quinolonas. A secreo renal predomina para a ofloxacina, a lomefloxacina, a norfloxacina, a

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    ciprofloxacina e a cinoxacina. A perfoxacina e o cido nalidxico so, predominantemente, eliminados por via no-renal (Grniak, 2002).

    H diferenas nas propriedades farmacodinmicas de cada fluorquinolona e, provavelmente, devido a isso, pode-se observar uma grande variao na concentrao inibitria mnima e na sensibilidade aos antimicrobianos (Boyd et al., 2009).

    2.2. Mecanismos de resistncia aos antimicrobianos

    O surgimento de drogas eficazes e seguras contra infeces bacterianas foi um grande avano que tornou o tratamento mdico mais efetivo, bem como diminuiu, drasticamente, a morbidade e a mortalidade relacionadas s doenas microbianas (Rang et al., 1997; Mota et al., 2005).

    Infelizmente, juntamente com o desenvolvimento de defesas quimioterpicas contra os microrganismos, estes tambm desenvolveram mecanismos de resistncia aos antimicrobianos. Esses mecanismos surgem, basicamente, devido capacidade de adaptao gentica dos microrganismos s alteraes ambientais (Khachatryan et al., 2005).

    A resistncia aos antimicrobianos est relacionada no somente ao uso desses, mas tambm com o notvel nmero de mecanismos genticos para desenvolvimento de resistncia presentes nas bactrias, como a possibilidade de sofrer mutao cromossmica, de manifestar um gene latente de resistncia cromossomal, de adquirir novo material de resistncia gentica atravs de troca direta de DNA por conjugao, atravs de bacterifago (transduo), atravs de plasmdeo extracromossomal de DNA (tambm por conjugao) ou ainda por

    aquisio de DNA, via transformao (Khachatryan et al., 2005).

    Os mecanismos genticos de resistncia bacteriana aos antimicrobianos so classificados como intrnsecos ou adquiridos. A resistncia intrnseca aquela que faz parte das caractersticas naturais, fenotpicas do microrganismo e transmitida somente de modo vertical prole, como por exemplo, os microrganismos que no possuem parede celular. Desta forma, agentes antimicrobianos que tm como alvo a parede celular, como as penicilinas, so ineficazes. Outro fator a ser considerado a localizao do microrganismo dentro do hospedeiro, como as bactrias intracelulares, uma vez que antimicrobianos que no conseguem penetrar na clula hospedeira, consequentemente no tero ao sobre os microrganismos intracelulares (Martnez e Baquero, 2002; Vaz, 2009). Esse problema facilmente resolvido, quando se conhece o agente infeccioso e o mecanismo de ao do antimicrobiano.

    A resistncia adquirida reflete uma verdadeira modificao na composio gentica de uma bactria, fazendo com que um antimicrobiano outrora eficaz deixe de ser ativo (Kaye et al, 2000). As resistncias adquiridas devem-se s modificaes genticas por mutao, aquisio exgena de DNA e rearranjos intramoleculares no DNA (Kaye et al., 2000; Khachatryan et al., 2005).

    Essas modificaes genticas de resistncia a antimicrobianos podem ser por determinantes cromossmicos e extracromossmicos. Nos determinantes cromossmicos, temos as mutaes, que apesar de pouco frequentes (1/10 bilhes), numa infeco onde o nmero de clulas muito alto, a probabilidade de uma mutao resultar em uma resistncia antimicrobiana pode ser grande para algumas espcies

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    bacterianas e algumas drogas (Ojo et al., 2008; Vaz, 2009).

    Outro exemplo so os integrons que tambm conferem resistncia s bactrias. Sepp et al. (2009) mostraram que amostras de E. coli positivas para o gene intl-1 apresentaram um valor da concentrao inibitria mnima (MIC) significativamente superior s amostras que no o continham. Esses genes foram encontrados em populaes de E. coli intestinal de indivduos que no haviam recebido antimicrobiano, mostrando que esse gentipo no ocorreu devido a uma presso antimicrobiana. Como exemplos de determinantes extracromossmicos, temos os plasmdeos, que so elementos genticos que esto livres no citoplasma, so componentes genticos distintos do cromossomo e so capazes de se replicarem sozinhos. A maior parte da resistncia a antimicrobianos determinada por aquisio de plasmdeos (Rang et al., 1997).

    Aps adquirirem os genes de resistncia a antimicrobianos, estes podem ser transferidos entre os elementos genticos mveis no interior da bactria e entre bactrias. Dentro da bactria, alguns segmentos de DNA, os transposons, podem ser transferidos de um plasmdeo para outro e ainda para o cromossomo e vice-versa, ou ainda para uma nova espcie bacteriana quando so inseridos nos plasmdeos e, mesmo que este no seja capaz de se replicar na nova espcie, o transposon capaz de transferir genes para o cromossomo da nova espcie ou ainda para seus plasmdeos (Rang et al., 1997; Whittle et al., 2001). Este mecanismo provavelmente responsvel pela ampla distribuio de genes de resistncia em diferentes plasmdeos e em espcies no relacionadas.

    A transferncia de genes de resistncia entre bactrias se d por conjugao, transduo e transformao. A

    conjugao envolve um contato clula a clula, atravs de uma fmbria sexual, durante o qual o DNA cromossmico ou extracromossmico transferido de uma bactria para outra. A transduo o processo pelo qual o plasmdeo de DNA envolvido num vrus bacteriano, denominado fago, e transferido para outra bactria da mesma espcie. A transformao se d quando a espcie pode, em condies naturais, sofrer uma mudana, captando um DNA livre em seu ambiente e incorporando-o ao seu genoma, atravs do mecanismo normal de entrecruzamento. Isto s possvel quando o DNA que chega vem de uma clula pertencente mesma cepa da bactria hospedeira ou de uma cepa estreitamente relacionada com esta (Vaz, 2009; Rang et al., 1997). Desta forma, a co-transfercia de genes de resistncia ao mesmo tempo entre bactrias possvel. Assim, se uma cepa de E. coli de animal, por exemplo, ingerida em quantidade suficiente e, se a amostra apta a colonizar o intestino humano, h a possibilidade de transferncia de genes de resistncia da bactria residente para a microbiota intestinal humana (Trobos et al., 2009).

    As bactrias podem desenvolver mltiplos mecanismos contra um agente nico ou classes de agentes, sendo que uma nica alterao pode resultar no desenvolvimento de resistncia a antimicrobianos diferentes, denominado multiresistncia (Kaye et al., 2000).

    Em relao s classes de antimicrobianos, temos alguns mecanismos de resistncia mais comumente encontrados em cada grupo. A resistncia para os antimicrobianos inibidores do cido flico normalmente mediada por plasmdeos, podendo resultar em produo de enzimas que so menos afetadas pelas sulfonamidas, desenvolvimento de vias metablicas alternativas, produo aumentada do PABA, diminuio da permeabilidade ou

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    efluxo ativo das sulfonamidas (Mandell e Petri Jr, 1996b; Rang et al., 1997; Edrington et al., 2008).

    Dentre os -lactmicos, a resistncia s penicilinas significativamente maior que s cefalosporinas. Provavelmente, isto ocorre devido s penicilinas serem bastante usadas e, ainda, por algumas cefalosporinas serem mais resistentes ao das -lactamases. A resistncia s penicilinas muito comum, tendo como principal causa a inativao enzimtica das penicilinas pela produo de -lactamases. H outras formas como a reduo da permeabilidade aos antimicrobianos devido aos lipopolissacardeos de membrana, mais comumente observado em microrganismos Gram-negativos e alteraes estruturais nas PLPs (Spinosa, 2002b; Walsh, 2003; Alexander et al., 2009).

    As cefalosporinas so altamente resistentes as penicilases e, em muitos pases, ela foi marcada como um grupo de antimicrobianos que dispensa teste de susceptibilidade. Porm, algumas bactrias produzem -lactamases capazes de hidrolisar o anel -lactmico das cefalosporinas, inativando-as. Em contrapartida, algumas cefalosporinas, principalmente de terceira e quarta gerao, so mais resistentes ao dessas enzimas, com exceo de algumas bactrias que produzem -lactamases de amplo espectro (E. coli, Klebsiella pneumoniae, Enterobacter spp.), capazes de hidrolisar at mesmo esses antimicrobianos mais recentes (Spinosa, 2002b; Hendrisken et al., 2008). Um estudo realizado por Edrington et al. (2008) mostrou que de 18 amostras de Salmonella isoladas de bezerros, 7 foram resistentes cefoxitina, 11 ao ceftiofur e nenhuma resistncia foi observada para ceftriaxona.

    Para a classe de antimicrobianos que interferem com a sntese de protenas

    bacterianas temos um nmero muito baixo de amostras resistentes para aminoglicosdeos, enquanto que para tetraciclina a resistncia , em muitos casos, quase que total. O mecanismo de resistncia dos aminoglicosdeos pode ocorrer por transporte inadequado atravs da membrana citoplasmtica bacteriana, produo de enzimas que modificam ou inativam o frmaco, sendo codificados por genes adquiridos basicamente por conjugao e transferncia de DNA sob a forma de plasmdeos. Outro mecanismo de resistncia aos aminoglicosdeos pode ser por receptores ribossomais sem afinidade para estes quimioterpicos e, ainda, por incapacidade da droga atravessar a membrana citoplasmtica (Chambers e Sande, 1996b; Spinosa, 2002a). Amicacina, estreptomicina e gentamicina mostraram alta efetividade para amostras de E. coli isoladas de bezerro e animais adultos (Filho et al., 2007; Carson et al., 2008; Gow et al., 2008).

    Determinantes de resistncia a tetraciclinas so amplamente espalhados entre espcies de bactrias Gram-negativas e Gram-positivas. Em muitas espcies Gram-negativas, a resistncia tetraciclina devido aquisio de operon que consiste em um gene efluxo tet(A) e um repressor tet(R) (Sawant et al., 2007). A forma mais comumente observada de resistncia s tetraciclinas a mediada pela transferncia de plasmdeo, mas tambm ocorre por alterao do transporte de membrana de clula (Spinosa, 2002c; Cagnacci et al., 2008;Trobos et al., 2009). Isolados de Salmonella de bezerros mostraram uma resistncia de 94,4% tetraciclina (Edrington et al., 2008). Alexander et al. (2009) mostraram que 92,9% das E. coli foram resistentes a a este medicamento. Amostras de E. coli apresentaram altas taxas de resistncia para tetraciclina, variando de 27% a 68,5% (Filho et al., 2007; Cagnacci et al., 2008; Checkley et al., 2008; Gow et al., 2008; Trobos et al.,

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    2009). Em um estudo realizado por Sawant et al. (2007), observa-se resistncia tetraciclina em 82% das fazendas, 42% das vacas e 14% das bactrias entricas Gram-negativas. Isolados de Salmonella de bezerros apresentaram 33,3% de resistncia canamicina, 61,1% de resistncia gentamicina e estreptomicina, e 100% foram sensveis amicacina (Edrington et al., 2008).

    A resistncia aos antimicrobianos que afetam a topoisomerase II muito observada nas quinolonas de 1 gerao, onde o aparecimento de resistncia se desenvolve bem mais rapidamente que para os das geraes seguintes. Os mecanismos mais freqentes incluem alteraes nos genes que codificam subunidades de alvos de quinolonas DNA girase (genes gyrA e gyrB) e topoisomerase IV (genes parC e parE), encontradas principalmente em amostras de E. coli, ou ainda, por repeties pentapeptdicas de protenas que bloqueiam a ao das quinolonas na topoisomerase II e IV (Hopkins et al., 2005; Robicsek et al., 2006; Cagnacci et al., 2008). Outros mecanismos como a baixa expresso de porinas de membrana externa ou a alta expresso de bombas de efluxo de multidrogas so tambm importantes na resistncia a antimicrobianos (Hopkins et al., 2005).

    Alm de todos estes fatores discutidos acima, existem outros aspectos que tambm esto relacionados resistncia a antimicrobianos. Um deles a virulncia. Tanto a virulncia quanto a resistncia so mecanismos adaptativos selecionados para possibilitar a sobrevivncia sobre condies de estresse. Muitos determinantes virulentos esto localizados nas ilhas de patogenicidade ou em elementos acessrios genticos. Esses fatores so inseridos no microrganismo, seja por aquisio ou at mesmo por deleo, tornando-o patognico (Sokurenko et al., 1999). Desta forma, em alguns casos, a resistncia antimicrobiana e

    os genes de virulncia podem estar ligados no mesmo replicon ou, eventualmente, num mesmo determinante (Martnez e Baquero, 2002).

    Outros mecanismos de virulncia das bactrias que podem prevenir a ao dos antimicrobianos so as toxinas que levam necrose ou formao de abscesso. Neste caso, a disponibilidade de antimicrobiano no local diminuir significativamente, devido a reduo na chegada do antimicrobiano ao local ou por causa da inativao local dos frmacos por pH alterado e protenas livres (Martnez e Baquero, 2002). Da mesma forma ocorrem com as bactrias que colonizam o trato intestinal. Elas tiveram que se adaptar a crescer na presena dos sais de bile, sendo necessrio selecionar mecanismos de expulso desses sais. Thanassi et al. (1997) relataram que E. coli expulsa sais de bile atravs do sistema acrAB, primeiramente caracterizado como um determinante de multirresistncia a drogas (MDR). O mesmo ocorre com Salmonella Typhimurium (Ma et al., 1995).

    Certas condies durante a infeco podem induzir a expresso de ambos os genes de virulncia e de resistncia a antimicrobianos, assim como, uma comum regulao de ambos, podendo estar na mesma rede regulatria ou no mesmo regulador. o que ocorre com a protena MarA de E. coli e Salmonella Typhimurium que regula a expresso de mais de 60 genes cromossomais. Estes genes incluem tanto determinantes de MRD, quanto os genes com potencial papel na virulncia (Barbosa e Levy, 2000).

    Dados epidemiolgicos tm mostrado que, em alguns casos, microrganismos resistentes a antimicrobianos podem apresentar uma diminuio na patogenicidade. Isto baseado no fato de que microrganismos virulentos so mais aptos a produzirem

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    sinais clnicos de infeco, e assim, so mais frequentemente expostos a antimicrobianos, tendo maior risco de desenvolverem resistncia. Entretanto o oposto tambm ocorre. Patgenos como Neisseria meningitidis, Salmonella Typhi, Shigella dysenteriae, Bordetella pertussis, Leptospira icterohaemorragica e Brucella melitensis so raramente resistentes a antimicrobianos (Martnez e Baquero, 2002).

    A relao de epidemia e resistncia tambm est ligada, onde bactrias epidmicas so mais propensas a adquirirem resistncia antimicrobiana. Este fato pode ser explicado por elas serem encontradas em um grande nmero de indivduos alcanando grandes populaes, ou ainda, por serem bactrias com alta taxa de migrao. Desta forma, esto em contato com vrios tipos de microrganismos habitando diferentes habitats em que os genes de resistncia podem ser adquiridos por transferncia horizontal. Assim, uma vez que o fentipo de resistncia adquirido, ele pode ser amplamente disseminado (Martnez e Baquero, 2002).

    A microbiota, apesar de inicialmente possuir a funo de defesa contra infeces, elas tambm podem proteger bactrias patognicas da ao dos antimicrobianos. Isso pode ocorrer de duas formas: quando elas produzem -lactamases e rapidamente inativam os antimicrobianos -lactmicos, ondeas bactrias patognicas, que a princpio eram susceptveis a esses antimicrobianos, conseguem crescer e se multiplicar; e atravs da transferncia de genes de resistncia das bactrias da microbiota para as bactrias patognicas (Sokurenko et al., 1999; Martnez e Baquero, 2002).

    O tipo de criao e a utilizao de antimicrobianos como teraputicos, profilticos e promotores de crescimento tambm influenciam no aparecimento de

    resistncia a antimicrobianos. Em sunos, por exemplo, a resistncia muito observada pelo fato dos antimicrobianos serem frequentemente utilizados como mtodo profiltico e como promotor de crescimento. Isto ocorre devido ao amplo nmero de enterobactrias patognicas presentes e maior probabilidade de disseminao em ambientes de criao intensiva, cada vez mais utilizada pelos criadores (Vaz, 2009).

    As bactrias mais comumente encontradas nestes ambientes so E. coli e Salmonella Typhimurium. A E. coli possui uma resistncia elevada aos antimicrobianos, principalmente, em sunos, acometendo tambm, os bezerros. As tetraciclinas, sulfonamidas e estreptomicinas so praticamente inteis em distribuio mundial, pois conferem resistncia plasmidial e podem, potencialmente, promover a transferncia de genes de virulncia entre as bactrias, produzindo um efeito inverso ao desejado. Quanto Salmonella Typhimurium, h uma ampla gama de amostras resistentes a mltiplos antimicrobianos amplamente utilizados em bovinos, principalmente bezerros, e em sunos, podendo acometer tambm, os seres humanos (Hirsh e Zee, 2003).

    2.3. Uso de antimicrobianos em Medicina Veterinria

    H mais de meio sculo que antimicrobianos so usados para tratar, prevenir e controlar infeces reduzindo a morbidade e a mortalidade de animais. Alm disso, esses medicamentos so adicionados continuamente na alimentao de animais, servindo como promotores de crescimento, aumentando a eficcia alimentar e diminuindo a perda na produo (Bogaard e Stobberingh, 2000).

    Hoje, no mercado veterinrio brasileiro, existem mais de 50

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    antimicrobianos registrados para tratamento de doenas infecciosas de origem bacteriana. Apesar dos comprovados benefcios, seu uso deve ser feito de forma prudente para evitar resduos nos alimentos de consumo humano, maximizar sua eficcia e minimizar o desenvolvimento de bactrias resistentes tanto em animais como em seres humanos. Somente no ano de 2009 foram gastos mais de R$ 2,8 milhes com antimicrobianos para animais (Sindicato, 2009).

    Na medicina veterinria, a escolha do antimicrobiano deve ser baseada na identificao do microrganismo infectante, na classe do medicamento, na sensibilidade dos microrganismos aos agentes escolhidos e nas caractersticas do hospedeiro como raa, idade, exposio prvia a antibiticos, prenhez e administrao concomitante de outras drogas. O objetivo obter sucesso no tratamento e evitar o desenvolvimento de microrganismos resistentes (Rang et al., 1997; Mota et al., 2005).

    O uso cauteloso de antibiticos um dos grandes desafios para os mdicos veterinrios, pois pode ocorrer a transferncia de amostras resistentes do animal para o ser humano, seja por contaminao direta ou pelo consumo de alimentos de origem animal. Assim, a segurana alimentar tambm de responsabilidade dos mdicos veterinrios, uma vez que ela pode ser afetada negativamente pela contaminao microbiolgica e toxicolgica do animal pelo manejo (higinico, densidade de estocagem, limpeza e desinfeco), pelo tratamento veterinrio (uso de antimicrobianos) e pela reciclagem dos dejetos. Esta uma preocupao para a sade pblica, pois a transferncia de resistncias entre microrganismos pode reduzir ou anular o efeito teraputico de antimicrobianos na medicina humana (World, 2000; Sugiura et al., 2009).

    Existem evidncias que mostram que o uso de antimicrobianos na medicina veterinria contribui para a ocorrncia de infeces bacterianas resistentes aos antimicrobianos na espcie humana (Bogaard e Stobberingh, 2000; Mota et al., 2005; Trobos et al., 2009). Como resultado, a Organizao Mundial da Sade recomenda que agncias governamentais criem programas estratgicos de risco para controlar o surgimento e a propagao de patgenos humanos resistentes a antimicrobianos. No Brasil, o Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento criou a Coordenao de Fiscalizao de Produtos Veterinrios (CPV) (link: http:/ /extranet.agricultura.gov.br/sislegis-consulta/consultarLegislaao.dooperao=visualizar&id=7276) que tem como objetivo principal a fiscalizao da fabricao, do comrcio e do uso de produtos veterinrios.

    Para obter eficcia futura de antimicrobianos na medicina veterinria e proteo da sade pblica, necessrio reduzir a quantidade de antimicrobianos usados nos animais, minimizar o requerimento de antimicrobianos na terapia e prevenir as infeces. Isto possvel atravs do melhoramento dos mtodos de criao dos animais, erradicao de doenas, otimizao e desenvolvimento de novas vacinas. Alm disso, caso seja necessrio o uso de antimicrobianos, deve-se dar preferncia s molculas de pequeno espectro de ao com uma poltica veterinria de antimicrobiano sensvel, e descontinuidade da prtica de aditivos alimentares (Bogaard e Stobberingh, 2000).

    Recentes pesquisas tm demonstrado que aps um longo perodo de tempo de exposio a antimicrobianos, algumas espcies bacterianas podem adaptar-se ao ambiente de forma a manter seus genes de resistncia estveis mesmo aps a remoo do antimicrobiano. Felizmente, h estudos contrrios

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    mostrando que aps banir o uso de tetraciclina como promotor de crescimento, h uma reduo significativa de 60% para 8% na resistncia de tetraciclinas de isolados de S. Typhimurium de bovinos (Bogaard e Stobberingh, 2000).

    Os antimicrobianos tambm so usados na medicina veterinria na preveno de doenas. Um exemplo desse uso a adio de antibiticos tais como tetraciclina e neomicina no sucedneo do leite, que tem a finalidade de prevenir doenas e levantar bezerros, diminuir mortalidade, melhorar o ganho de peso e, consequentemente, a sade global (Quigley et al., 1997; Berge et al., 2005).

    Os antimicrobianos so usados no somente na terapia e preveno de infeces bacterianas, mas tambm so adicionados continuamente na alimentao animal como promotor de crescimento para aumentar a eficcia alimentar e diminuir a perda na produo (Bogaard e Stobberingh, 2000). Teve incio no sculo XX, quando diversos experimentos foram realizados a fim de testar a suplementao de vitamina B12 com o objetivo de suprir carncias humanas. Os primeiros testes foram realizados em animais de produo e a vitamina era obtida a partir de caldos fermentados por Streptomyces griseus e S. aureofaciens, dois microrganismos usados para produo de antimicrobianos. Em1950, Stokstad e Jukes conseguiram comprovar que a adio de antimicrobianos na alimentao era capaz de estimular o crescimento dos animais. Aps estes estudos, diversos outros foram realizados, ampliando-se o uso de antimicrobianos como promotores de crescimento (Morril et al., 1977; Quigley et al., 1997; Gorbach, 2001).

    A resistncia a antimicrobianos tem sido muito estudada em propriedades que os usam como promotores de crescimento, onde se tem observado que eles so capazes

    de induzir e transferir genes de resistncia (Bogaard e Stobberingh, 2000; Mota et al., 2005; Sugiura et al., 2009). Alm disso, bactrias comensais e ambientais podem adquirir esses genes de resistncia, transformando-se em reservatrios para transferncia de genes de resistncia bacteriana para outras bactrias patognicas, bem como para bactrias da microbiota e bactrias patognicas de seres humanos (Smith et al., 2007). Apesar dos efeitos benficos que os promotores proporcionam na produo de animais, seu uso deve ser feito com prudncia, evitando o uso indiscriminado, com monitoramento da quantidade usada e do desenvolvimento de patgenos importantes. Os antimicrobianos iniciam uma seleo de bactrias resistentes e, uma vez que haja a descontinuidade do uso de antimicrobianos como promotores de crescimento, na maioria das vezes, ocorre um significante decrscimento na prevalncia da resistncia (Lathers, 2002; Sugiura et al., 2009).

    Durante infeces agudas e surtos de doenas infecciosas, importante o uso de um tratamento antimicrobiano efetivo o mais cedo possvel. Como nem sempre possvel diagnosticar o agente microbiano e nem testar a sua susceptibilidade, este tratamento inicial indicado baseado no conhecimento e na experincia do mdico veterinrio, considerando os padres de resistncia esperados dos diferentes patgenos bacterianos aos agentes antimicrobianos normalmente usados na regio e na espcie animal. (Hendriksen et al., 2008). No entanto, esse conhecimento limitado, devido pequena proporo de diferentes patgenos de animais infectados dos quais so feitos padro de resistncia antimicrobiana e, por ser um padro normalmente regional, no podendo ser aplicado a todo o pas.

    O antibiograma um mtodo que pode ser dispensado quando o perfil da amostra for conhecido, alm da excluso da

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    hiptese de existncia de amostras resistentes. Entretanto, de extrema importncia para avaliar bactrias que costumam apresentar resistncia a um ou vrios antibiticos ou quando houver processos supurativos crnicos ou infeces urinrias que levam alta troca de agentes etiolgicos. Tambm importante nos casos de insucesso de um produto teoricamente eficaz no combate a uma infeco ou desejo de corrigir uma tcnica teraputica j em uso que no demonstra a mesma eficincia (Vaz, 2009).

    Todavia, com a emergncia de microrganismos com grupos de clones virulentos e multirresistentes que podem ser espalhados rapidamente na comunidade, a pesquisa da sensibilidade das bactrias torna-se importante no que se diz respeito escolha do tratamento indicado, obtendo-se sucesso na teraputica e minimizando a ocorrncia deste fenmeno em animais e seres humanos, atendendo necessidade e importncia deste tema amplamente associado sade pblica (Vaz, 2009).

    Atualmente, tanto na bovinocultura como na suinocultura, h uma maior tendncia em se usar mtodos de criao intensivos. Estes sistemas aumentam a probabilidade de infeco devido ao maior contato entre os animais, assim como o nvel de estresse entre eles, favorecendo o aparecimento de doenas infecciosas, induzindo o uso dos antimicrobianos essenciais produo (Sobestiansky e Barcellos, 2007). Desta forma, alta densidade populacional favorece uma maior interao entre microrganismos diferentes, aumentado a taxa de doena no rebanho e, consequentemente, o uso de antimicrobianos no tratamento. Isso favorece uma troca rpida de genes de resistncia e resulta em uma maior ocorrncia de resistncia e multirresistncia (Pantozzi et al., 2010).

    Como principais consequncias, destacam-se as infeces resistentes com maiores ndices de mortalidade, doenas persistentes com maior probabilidade de propagao de microrganismos resistentes a outros indivduos, maiores encargos financeiros com tratamentos e menor nmero de frmacos novos em concepo e desenvolvimento (World, 2000).

    A contaminao de seres humanos com bactrias de origem animal muito comum. Os indivduos mais expostos, como veterinrios, pees, magarefes, entre outros, costumam apresentar um grau de resistncia maior que a populao em geral. Mas, com a automedicao, improvvel que se quantifique a transferncia desta resistncia, pois o mesmo princpio ativo pode ter sido usado em homens e animais (Prescott, 2000).

    Outro problema que existe na transferncia de genes de resistncia no consumo de leite com resduos de antimicrobianos. Onde o uso difundido de antibiticos pelos produtores e mdicos veterinrios no tratamento de doenas infecciosas de vacas de leite, principalmente no caso das mamites, leva a uma alterao da composio qumica do leite, assim como a utilizao de drogas na alimentao animal, como suplementos de dietas tm contribudo para a presena de resduos de antimicrobianos no leite (Silva e Sena, 1984; Nascimento et al., 2001). A presena destes resduos tambm pode ser determinada pela higienizao de equipamentos e utenslios da indstria e/ou a adio proposital de drogas para mascarar a deficincia na qualidade do leite e aumentar seu tempo de vida til (Brasil, 1993; Borges et al., 2000).

    Mesmo em doses teraputicas as substncias ativas e seus metablitos, ainda podem permanecer, em teor residual, no leite, carne, ovos e outros alimentos. Sabe-se que assim como a biodisponibilidade do

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    medicamento depende da via de aplicao, posologia, formulao, forma de apresentao, alm de outros fatores, a carncia e o teor residual tambm esto condicionados a estes fatores (Fulgncio, 1993). Alm disso, importante ressaltar que estas substncias no so eliminadas no beneficiamento podendo representar perigo at nos derivados fabricados com essa matria-prima (Musser et al., 2001; Nero et al., 2007).

    A presena desses resduos no leite, que um alimento consumido diariamente, acarreta uma srie de problemas para a classe mdica, agrcola e a populao em geral, como: aparecimento de cepas bacterianas resistentes aos antibiticos, ocorrncia de reaes alrgicas, txicas e mutagnicas, alteraes genticas com atividade oncognica ou teratognica, alm da interferncia no crescimento das culturas microbianas utilizadas na tecnologia de alimento e conseqncias econmicas para os produtores (Fulgncio, 1993; Biacchi et al., 2004).

    O monitoramento frequente de medicamentos e seus derivados metablicos e o controle de resduos de agentes antimicrobianos no leite muito importante indstria de produtos lcteos e consequentemente ao consumidor, que incapaz de perceber se o leite consumido est livre de antimicrobianos se torna mais susceptvel a enfermidades (Brito, 2006).

    evidente que para maior segurana no consumo de leite de boa qualidade, tanto no que diz respeito manuteno de sua composio natural, como tambm a ausncia de substncias que possam levar a problemas de sade, necessrio o estabelecimento de polticas pblicas efetivas de fiscalizao dos alimentos (Nascimento et al., 2001).

    A FAO/OMS, atravs do Codex Alimentarius vem estabelecendo e

    sugerindo aos pases membros dessa entidade internacional, limites mximos de resduos (LMR) de numerosos medicamentos nos alimentos, como medidas profilticas a sade humana.

    No intuito de avaliar e prevenir riscos, o Ministrio da Sade implantou no Brasil, em 2000, o Programa de Anlise de Resduos de Agrotxicos em Alimentos - PARA, que tem como objetivo, atravs de anlise laboratorial, monitorar no pas os resduos de agrotxicos em alimentos. Da mesma forma, objetivando controlar resduos de medicamentos veterinrios nos alimentos, foi criado, em 2001, o Programa de Anlise de Resduos de Medicamentos Veterinrios em Alimentos - PAMvet. Na implantao do Programa Nacional, o leite foi escolhido como o primeiro alimento a ser pesquisado, com base nos dados do IBGE, nos quais o leite a protena de origem animal mais consumido pela populao brasileira (Souza, 2006).

    No Brasil a Instruo Normativa n 51 (Brasil, 2002) exige a pesquisa peridica de resduos de antibiticos em leite, que no devem ser superiores aos Limites Mximos de Resduos (LMRs) (Programa, 2003), previstos para cada grupo qumico especfico. Vrios kits analticos de deteco de resduos de antibiticos foram aprovados e so autorizados pelo Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento - MAPA Brasil (Brasil, 2004) para o controle da presena dessas substncias em leite, utilizando diferentes princpios de ao e deteco.

    3. Referncias bibliogrficas

    ACAR, J.F.; GOLDSTEIN, F.W. Trends in bacterial resistance to fluoroquinolones.

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    Clin. Infect