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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO - SEED
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL - PDE
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PARANÁ - UFPR
CADERNO PEDAGÓGICO
IRES APARECIDA FALCADE-PEREIRA
PROPOSTA EDUCATIVA DE DESENVOLVIMENTO MORAL NO
TRATAMENTO DE EDUCANDOS PRIVADOS DE LIBERDADE
CEEBJA DR MÁRIO FARACO
Av Brasília S/N – Vila Macedo – Piraquara – PR
CURITIBA
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IRES APARECIDA FALCADE-PEREIRA
CADERNO PEDAGÓGICO CIÊNCIAS
Material didático-pedagógico:
caderno pedagógico – apresentado
para o PDE - Programa de
desenvolvimento Educacional da
SEED.
Orientação: Dra Araci Asinelli-Luz
CURITIBA - PARANÁ
2011
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DADOS DE IDENTRIFICAÇÃO
Professora PDE: Ires Aparecida Falcade-Pereira
Área: Ciências/Biologia
NRE: Curitiba
Professora Orientadora: Dra. Araci Asinelli-Luz
IES vinculada: UFPR
Escola de Implementação: CEEBJA Dr. Mário Faraco
Sujeitos da implementação: alunos privados de liberdade da Fase I – Ensino
Fundamental – Unidade Complexo Médico Penal - CMP
Autora: Ires Aparecida Falcade-Pereira
Editora: SEED
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APRESENTAÇÃO
Prezadas(os) professoras e professores
O presente Caderno Pedagógico visa trabalhar aspectos de educação moral de
alunos privados de liberdade do CEEBJA DR Mario Faraco, do município de Piraquara
– PR. O contexto de aplicação deste projeto, o Complexo Médico Penal CMP,
compreende estudantes jovens e adultos, homens e mulheres que, em sua maioria, estão
em tratamento por terem cometido crimes ou infração grave pelo uso de substâncias
psicoativas ou por apresentarem Transtornos Globais de Desenvolvimento - TGD.
Este material se caracteriza como possibilidade didática para o ensino de
Ciências, na Educação de Jovens e Adultos – EJA, e o estudo e aprimoramento de
metodologias e práticas pedagógicas a serem utilizadas neste contexto escolar. As
abordagens e atividades propostas serão testadas e avaliadas no decorrer de sua
aplicação.
A realidade da escola no Sistema Penitenciário exige do(a) professor(a) de
biologia ou ciências habilidades técnicas e saberes voltados à compreensão da história
dos sujeitos marginalizados, o compromisso da construção de conhecimento
significativo, focado em valores reconhecidos socialmente, e que possibilite aos
estudantes a reflexão e revisão dos motivos que os levaram à condição de privados de
liberdade.
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SUMÁRIO
UNIDADE I
EDUCAÇÃO MORAL NO ENSINO DE CIÊNCIAS .............................................08
UNIDADE II
A JUSTIÇA SEGUNDO KOHLBERG.......................................................................12
UNIDADE III
O CUIDADO SEGUNDO GILLIGAN.....................................................................18
UNIDADE IV
A TEORIA BIOECOLÓGICA DE BRONFENBRENNER..................................24
CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................29
REFERÊNCIAS...........................................................................................................30
ANEXOS........................................................................................................................31
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INTRODUÇÃO
A intenção desse caderno pedagógico é implementar a proposta de ensino de
ciências/biologia de forma interdisciplinar, trabalhando os conceitos de ética1 e moral
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no sistema penitenciário. A educação ética e moral no Ensino de Ciências com
estudantes em privação de liberdade se fazem fundamentais no processo de educação
para a reinserção social do estudante.
O objetivo, ao apresentar a proposta de educação moral para o ensino de ciências
junto a estudantes privados de liberdade, é verificar o potencial transformador que a
educação traz em si mesma. Ele está organizado em tópicos, com atividades práticas
sugeridas para serem aplicadas em sala de aula. O material está voltado para EJA
(Educação de Jovens e Adultos) fase I, podendo, porém, ser utilizado em qualquer fase,
já que suas atividades e sua linguagem são direcionadas ao público jovem e adulto,
independente de gênero.
Na primeira parte da proposta serão apresentadas atividades de sensibilização e
conceituação de educação ética e moral, articuladas e/ou (re)significadas aos aspectos
existenciais e sua aplicação no ensino de Ciências/Biologia. Ao oferecer uma proposta
diversificada, que contemple textos e informações científicas sobre a educação moral, a
ética do cuidado, a ética da justiça e ecologia do desenvolvimento humano, utilizando
fábulas, jogos cooperativos, músicas, filmes, propicia-se aos estudantes a tomada de
consciência sobre os efeitos de seus próprios atos. Esta tomada de consciência é de
fundamental importância, tendo em vista a necessidade dos estudantes privados de
liberdade retomarem a vida de forma diferente.
Esta proposta de trabalho visa assim abrir espaço para discussões e troca de
informações, bem como promover a saúde, as relações interpessoais, o resgate da
identidade e a restauração da auto-estima, da autoconfiança, da autopercepção, a causa
dos problemas e possibilidades de resolução, desenvolvendo e criando uma rede de
solidariedade e respeito mútuo, independente de gênero, etnia, tradições espirituais ou
condição social.
As atividades elaboradas e desenvolvidas buscam a valorização das diferenças
1
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individuais e as experiências de vida de cada um(a), com a possibilidade de superação
de seus medos e conflitos, colaborando para a reinserção social.
Na constância das atividades estará a promoção de cada sujeito, de sua qualidade
de vida, dos direitos e deveres éticos e morais, incentivando o convívio salutar através
de jogos educativos e cooperativos, visando ocupar o tempo ocioso e preencher o
espaço de convivência e vazio existencial.
Transpassando e permeando as atividades elencamos os seguintes critérios:
- Definição, comunicação e negociação de combinados e limites;
- Relações de respeito mútuo, compromisso e cooperação entre todos os agentes
educativos, bem como entre estudantes e educadores;
- Estímulo à prática das atividades escolares de forma responsável e criativa;
- Verbalizações de expectativas positivas com relação ao desempenho dos
envolvidos em todos os aspectos curriculares;
- Relações abertas, honestas, propositivas;
- Estímulo e exercício dos princípios de altruísmo, cooperação e solidariedade
entre os pares;
- Reconhecimento e valorização por parte da escola dos avanços e êxitos dos
estudantes;
- Respeito mútuo entre professor(a) e estudante.
Este caderno pedagógico contempla quatro unidades temáticas nas quais
abordaremos questões pertinentes às ações bioecológicas e que promovam a reflexão
sobre a consciência planetária, focadas no desenvolvimento humano ético e moral
pertinente ao ensino de ciências/biologia.
Na Unidade I abordaremos Educação Moral e o Ensino de Ciências; na Unidade
II abordaremos a ética da justiça apresentada por Kohlberg (1989); na unidade III
abordaremos a ética do cuidado apresentada por Gilligan (1990) e na unidade IV
estudaremos a teoria bioecológica de desenvolvimento humano, de Bronfenbrenner
(1996).
O CONTEXTO:
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O CEEBJA DR MÁRIO FARACO é uma escola estadual de Educação de
Jovens e adultos em privação de liberdade, situada na região metropolitana de Curitiba,
com sede em Piraquara. A escola atende todo o complexo penitenciário da região
metropolitana e penitenciárias centrais do estado do Paraná, ao todo são nove unidades.
Ela atende, portanto jovens e adultos em privação de liberdade, de ambos os
sexos, em todas as fases da educação básica: alfabetização, fase I, fase II do ensino
fundamental e ensino médio. Tem alunos de 18 a 60 anos freqüentando seus bancos
escolares.
A escola é afastada do espaço geográfico de convivência social mais amplo,
ficando restrita às relações internas dos estudantes e profissionais que atuam no sistema
prisional. Fica isolada e tem muito pouca influência dos familiares e sociedade como
um todo. Tem os profissionais específicos para o sistema penitenciário e interage em
último caso com as unidades de saúde e justiça fora do espaço prisional.
UNIDADE I
TEMA: A EDUCAÇÃO ÉTICA E MORAL NO ENSINO DE CIÊNCIAS
Tempo de aplicação: 3 aulas
OBJETIVOS:
- Levar o estudante a compreender o potencial transformador da educação, bem como a
importância da educação ética e moral no processo de sua reinserção social.
- Refletir sobre a atuação da educação moral, ética do cuidado, ética da justiça e
relações bioecológicas humanas.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
- Oportunizar a sensibilização frente valores éticos e morais existentes nas relações
humanas, bem como a forma com que os estudantes os concebem e os utilizam no dia-
a-dia;
- Conceituar a Educação Ética e Moral no Ensino de Ciências/Biologia;
- Mobilizar para as relações interpessoais cooperativas, adotando atitudes de respeito
pelas diferenças,
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- Compreender a desigualdade social e de gênero como problema de todos e como
realidade passível de mudanças;
- Adotar no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças e
discriminações;
- Fornecer elementos para reconhecer o papel crítico da educação moral e da
consciência individual e coletiva para o alcance e desenvolvimento da sustentabilidade
das relações socioambientais.
MATERIAIS NECESSÁRIOS:
Filme A guerra do arco-íris
Lápis, borracha e caderno
O PROCESSO
1. A EDUAÇÃO MORAL
―Toda moral consiste num sistema de regras, e a essência de toda moralidade
deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por essas regras‖ (PIAGET,
p.11, 1932).
As regras sociais que consistem na moral prática das sociedades são aprendidas
e transmitidas dos adultos para as crianças. Esta é elaborada pela sucessão ininterrupta
das gerações adulta anteriores, normalmente estabelecida pelo respeito à pessoa que as
reproduz (ex. criança respeita a regra que o pai lhe transmite).
As práticas regulares individuais e coletivas das regras, na sequência à sua
imitação egocêntrica, a cooperação e o interesse as tornam lei, assim como a tomada de
consciência das mesmas num momento posterior.
A natureza e qualidade das relações que as pessoas mantêm com seus pares, ou
seja, a socialização, buscam atingir um estado de equilíbrio e desenvolvimento da
razão, resultam em estado de cooperação, onde os indivíduos identificam-se como
iguais em direitos e deveres, podem controlar-se mutuamente e atingir assim a
objetividade de suas ações.
Piaget (1932) assim se refere quanto à construção da moralidade ou relações
sociais é preciso distinguir, em todos os domínios, dois tipos de relações sociais: a
coação e a cooperação, a primeira implicando um respeito unilateral, de
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autoridade, de prestígio; a segunda uma simples troca entre indivíduos iguais
(PIAGET, p.53, 1932).
No que se refere às regras morais, quando o indivíduo não toma consciência das
regras prescritas, abusa da situação em lugar de procurar a igualdade, não cumprem nem
transformam seu comportamento.
Para existir a moral, que é regra estabelecida pelo coletivo, o universal se
sobrepõe ao individual, a norma que é importante é a reciprocidade, origem das lógicas
das relações. A razão e a cooperação andam juntas na consciência moral e o respeito
mútuo aparece como condição necessária da autonomia, sob seu duplo aspecto,
intelectual e moral. Ocorre a partir daí a coerência interna e o controle recíproco. ―Do
ponto de vista moral, substitui as normas da autoridade pela norma imanente à própria
ação e à própria consciência, que é a reciprocidade na simpatia‖ (PIAGET, p.94, 1932).
Nesta perspectiva, as pessoas, se reconhecem como iguais em direitos e deveres,
mesmo com a diversidade étnica, de gênero ou condição social. Ocorre assim a
possibilidade da convivência harmônica entre os diferentes, mas não desiguais.
A partir da moralidade estabelecida, as transformações do agir humano mostram
e referem-se à fragilidade da vida, nossa civilização moral e tecnológica referiu-se até
agora como humana em si mesma e suprema, referindo-se à humanidade global como
ponto de referência, sobrepondo-se às outras formas de vida.
Reconhecer à natureza humana um direito próprio e uma significação ética e
moral autônoma, independentemente da sua condição de meio para a satisfação das
necessidades e desejos humanos, significam abandonar a postura tradicional que
considera o homem/mulher como o ápice da natureza e coroa da criação, servindo de
fundamentação metafísica à ética em cujo domínio inclui-se a natureza e que reconhece
como dever a preservação das condições sob as quais se pode, inclusive, manter
inalterada a essência do humano.
A educação moral e ética, portanto, transcende a natureza humana e perpassa
pela questão ambiental, sendo tarefa importante de uma administração biocêntrica,
preocupada com a vida no planeta. Sua meta constitui verdadeiro desafio. Trata-se de
mudar comportamentos, abrir espaço no dia a dia dos cidadãos para a preocupação com
a qualidade de vida e a preservação da natureza em constante processo, cada vez mais
acelerado, em desenvolvimento.
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Aqui nos referimos ao contrato referendado entre os seres pensantes,
reconhecendo o direito de todos os seres que habitam o planeta: A Carta da Terra como
código de conduta ética frente a vida e a vida do planeta.
Trata-se, portanto, de uma possibilidade para formar cidadãos com visão ampla
de mundo e não apenas consciência das relações entre a
sociedade e natureza. Neste contexto, a educação moral e ética é fundamental para
mobilizar a população local na busca de outros procedimentos capazes de gerar atitudes
individuais e coletivas, comprometidas com maneiras mais harmoniosas, saudáveis e
sustentáveis de vida no planeta. Tanto para a geração atual como para as futuras,
portanto, discutir e ensinar Ciências/Biologia, é acima de tudo agir moral e ética, com
cuidado, justiça e responsabilidade.
DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES PROPOSTAS:
ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS:
Aula/atividade I:
1- Após uma aula dialogada sobre a educação moral e ética;
2- Todos assistirão o filme A guerra do Arco-íris 20 minutos.
3- Em seguida será aberta uma troca de idéias e percepções acerca do filme
conectando-o com o conteúdo de educação moral e ética no ensino de ciências.
4- Cada estudante, escreverá uma carta à humanidade fazendo um apelo a uma prática
para a sustentabilidade do planeta.
Aula/atividade II
1- O(a) professor(a) inicia a atividade com a música Somos Todos Irmãos de Rodrigo
Sater ou Planeta Água de Guilherme Arantes;
2- Troca de idéias mobilizadas pelas letras da música, ligando-a ao conteúdo da
consciência moral trabalhado na aula anterior;
3- O(a) professor(a) fará uma explanação breve da definição e função das fábulas e logo
em seguida, orienta as (os) estudantes a se dividirem em grupos de 4 elementos cada
um.
4- O grupo escolherá uma fábula para realizar a atividade;
5- Os(as) estudantes realizarão em seus grupos a leitura, análise e discussão da fábula,
bem como a elaboração para apresentação na plenária.
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6- Todos os grupos farão a apresentação das fábulas e moral das mesmas.
Obs: as fábulas se encontram em anexo
Aula/atividade III
1- Plenária dos grupos;
2- Finalização e fechamento esta unidade.
UNIDADE II : ÉTICA DA JUSTIÇA SEGUNDO KOHLBERG
Tempo de implementação: 3 aulas
Objetivo Geral:
- Compreender o conceito de justiça baseado na igualdade e sensibilizar-se pela
necessidade de construção de uma sociedade justa.
Objetivos Específicos
- Identificar a presença de regras e componentes comportamentais no contexto escolar e
do Sistema Penitenciário
- Conhecer os conceitos e práticas da ética da justiça na concepção e legislação
vigentes;
- Discutir e analisar a ética da justiça, seus conceitos e valores;
- Analisar e perceber a importância da ética da justiça para a convivência humana;
- Identificar os fatores que influenciam na formação da ética moral no ensino de
Ciências;
- Correlacionar a ética da justiça como necessária
Áreas Envolvidas: Língua Portuguesa, Estudos da Sociedade e da Natureza (Ciências,
História e Geografia), Artes.
MATERIAIS NECESSÁRIOS
- Documentário Socorro Nobre
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- História de desenvolvimento moral de Kohlberg
O PROCESSO
TEORIA DO DESENVOLVIMENTO MORAL - ESTÁDIOS MORAIS
SEGUNDO KOHLBERG
A teoria do desenvolvimento moral estabelecida por Kohlberg (ética da justiça e
do direito) avalia segundo a sua ótica os aspectos práticos da honestidade em seguir as
normas pré-estabelecidas de acordo com o Desenvolvimento Moral como o próprio
autor designou.
Kohlberg estabeleceu a teoria da consciência moral3 oferecendo conceitos de um
desenvolvimento da capacidade de julgar moral, a qual segundo ele efetua-se da
infância até a idade adulta passando pela adolescência. Para ele, existe um modelo
invariável, um ponto de referência normativo da via evolutiva analisada empiricamente,
constituída por uma moral guiada por princípios. Visa assim reduzir a multiplicidade
empírica das concepções morais encontradas a uma variação de conteúdos em face das
formas universais do juízo moral, e explicar as diferenças estruturais que subsistem
como diferenças dos estádios de desenvolvimento da capacidade de julgar moral. Sua
teoria utiliza resultados da ética filosófica para a descrição das estruturas cognitivas que
subjazem a juízos morais guiados por princípios. Desta forma, a filosofia moral de
Kohlberg está organizada em vista de adiantamentos filosóficos, ligados a Kant e ao
direito natural racional sobre a ―natureza do juízo moral‖. (HABERMAS,1989).
São três os pontos de vista a partir dos quais Kohlberg introduz as premissas
tomadas de empréstimo à filosofia: cognitivismo, universalismo e formalismo.
Kohlberg distingue seis estágios do juízo moral que se podem compreender nas
dimensões da reversibilidade, universalidade e reciprocidade como uma aproximação
gradual das estruturas da avaliação imparcial e justa de conflitos de ação moralmente
relevantes:
NÍVEL A - PRÉ-CONVENCIONAL
Estágio 1: O Estágio do Castigo e da Obediência
O direito é a obediência literal às regras e à autoridade, evitar o castigo e não
fazer mal físico. O que é direito é evitar infringir as regras, obedecer por obedecer e
3 A teoria do desenvolvimento aqui exposta foi extraída do livro de Habermas “Consciência
moral e agir comunicativo”.Tradução de Guido Almeida. Rio de Janeiro :Tempo Brasileiro, 1989
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evitar causar danos físicos a pessoas e propriedades. As razões para fazer o que é direito
são o desejo de evitar o castigo e o poder superior das autoridades. Este estágio adota
um ponto de vista egocêntrico. Uma pessoa neste estágio não considera os interesses
psicológicos dos outros. A perspectiva de sua autoridade é confundida com a própria
autoridade. (HABERMAS, 1989, p.152)
Estágio 2 - O Estágio de Objetivo Instrumental Individual e da Troca
O que é direito é seguir as regras quando for de seu interesse imediato. O direito
é agir para satisfazer as necessidades e interesses próprios e deixar que os outros façam
o mesmo. O direito é também o que é eqüitativo, isto é, uma troca igual, uma transação,
um acordo. A razão para fazer o que é direito é servir às necessidades e interesses
próprios num mundo em que é preciso reconhecer que as outras pessoas também têm
seus interesses. Este estágio adota uma perspectiva individualista concreta.
NÍVEL B – CONVENCIONAL
Estágio 3 - O Estágio das Expectativas Interpessoais Mútuas, dos
Relacionamentos e da Conformidade
O direito é desempenhar o papel de uma pessoa boa (amável), é preocupar-se
com as outras pessoas e seus sentimentos, manter-se leal e conservar a confiança dos
parceiros e estar motivado a seguir regras e expectativas. O que é direito é corresponder
ao que esperam as pessoas que nos são próximas ou àquilo que as pessoas geralmente
esperam das pessoas em seu papel como filho, irmã, amigo, etc. ―Ser bom‖ é importante
e significa ter bons motivos, mostrar solicitude com os outros – porque, se estivéssemos
no lugar do outro, iríamos querer um bom comportamento de si próprio (regra de ouro).
Este estádio adota a perspectiva do indivíduo em relação com outros indivíduos. Ele ou
ela não se considera a perspectiva generalizada do sistema. (HABERMAS. 1989)
Estágio 4 - O Estágio da Preservação do Sistema Social e da Consciência -
O direito é fazer o seu dever na sociedade, apoiar a ordem social e manter o
bem-estar da sociedade ou do grupo. O que é direito é cumprir os deveres com os quais
se concordou. As leis devem ser apoiadas, exceto em casos extremos em que entram em
conflito com outros deveres e direitos sociais estabelecidos. O direito também consiste
em contribuir para a sociedade, o grupo ou a instituição.
NÍVEL C - PÓS-CONVENCIONAL OU BASEADO EM PRINCÍPIOS
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As decisões morais são geradas a partir de direitos, valores ou princípios com
que concordam (ou podem concordar) todos os indivíduos compondo ou criando uma
sociedade destinada a ter práticas leais e benéficas.
Estágio 5 - O Estágio dos Direitos Originários e do Contrato Social ou da
Utilidade -
O direito é sustentar os direitos, valores e contratos legais básicos de uma
sociedade, mesmo quando entram em conflito com as regras e leis concretas do grupo.
O que é direito é estar cônscio do fato de que as pessoas adotam uma variedade de
valores e opiniões, que a maioria dos valores e regras são relativos ao seu grupo. Essas
regras ―relativas‖, contudo devem em geral ser apoiadas no interesse da imparcialidade
porque elas são o contrato social. As razões para fazer o que é direito são em geral:
sentir-se obrigado a obedecer a lei porque fizemos um contrato social, fazer e respeitar
leis, para o bem de todos e para proteger seus próprios direitos e os direitos dos outros.
As obrigações de família, amizade, confiança e trabalho também são compromissos ou
contratos assumidos livremente e implicam o respeito pelos direitos dos outros. Ele ou
ela considera o ponto de vista moral e o ponto de vista legal, reconhecem que estão em
conflito e acha difícil integrá-los. (Habermas,1989, p.154).
Estágio 6 - O Estágio de Princípios Éticos Universais
Esse estágio presume a orientação por princípios éticos universais, os quais toda
a humanidade devem seguir. No que diz respeito ao que é direito, o estágio 6 é guiado
por princípios éticos universais. As leis ou acordos sociais particulares são, em geral,
válidos porque se apoiam em tais princípios. Quando as leis violam esses princípios,
agimos de acordo com o princípio. Os princípios são universais de justiça: a igualdade
de direitos humanos e o respeito pela dignidade dos seres humanos enquanto indivíduos.
Este estádio adota a perspectiva de um ponto de vista moral de onde derivam os ajustes
sociais ou onde se baseiam. A perspectiva é a de qualquer indivíduo racional que
reconhece a natureza da moralidade ou a premissa moral básica do respeito por outras
pessoas como fins, não meios.
Kohlberg compreende a passagem de um para outro estágio como um
aprendizado. O desenvolvimento moral significa que a pessoa em crescimento
transforma e diferencia de tal maneira as estruturas cognitivas já disponíveis em cada
caso que consegue resolver melhor do que anteriormente a mesma espécie de
problemas, a saber, a solução consensual de conflitos de ação moral relevante. Para ele,
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os estágios do juízo moral formam uma seqüência de estruturas discretas e invariáveis,
irreversível e consecutiva. Formam uma hierarquia no sentido de que as estruturas
cognitivas de um estágio superior superam as estruturas dos estádios inferiores, mas
sempre conservam as estruturas de forma reorganizada e diferenciada. (HABERMAS,
1989, p.160)
DESENVOLVIMENTO DA ATIVIDADE (AULA I)
Contando História:
A mãe doente:
Pedro tinha sua mãe muito doente estava acamada em casa. Sua situação financeira não
era boa, estava desempregado e não tinha dinheiro para comprar o remédio da mãe. A
mãe não podia ficar sem o remédio, pois corria risco de morte. Pedro então se dirige à
farmácia e explica a situação ao dono da farmácia, pedindo que vendesse o
medicamento a prazo que quando pudesse pagaria por ele. Como o remédio era muito
caro, o farmacêutico disse que não poderia fornecer medicamento fiado. Para Pedro
restavam duas alternativas: roubava o medicamento e salvava sua mãe ou deixava sua
mãe morrer a míngua para não burlar a lei.
Dialogando e escrevendo sobre a história contada:
Primeiro fará uma discussão e troca de idéias e opiniões sobre as perguntas, em seguida
cada um escreverá suas idéias próprias no caderno.
1 – Qual atitude que Pedro deveria tomar e por quê?
2 – O que é mais importante, obedecer a lei ou salvar a vida de sua mãe?
3 - O que você faria se fosse sua mãe?
Atividade 2
Música:
Cabocla Tereza – domínio público
Lá no alto da montanha
Numa casa bem estranha
Toda feita de sapé
Parei uma noite o cavalo
Por causa de dois estalos
Que ouvi lá dentro bater
Apei com muito jeito
Ouvi um gemido perfeito
Uma voz cheia de dor:
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"Você, Tereza, descansa
jurei de fazer vingança
por morte de nosso amor."
Pela fresta da janela
Por uma luizinha amarela
De um lampião quase apagando
Vi uma cabocla no chão
E um cabra tinha na mão
Uma arma alumiando
Virei meu cavalo a galope
Risquei de espora e chicote
Sangrei a anca do tal
Desci a montanha abaixo
E galopando meu macho
O seu doutor fui chamar
Voltemos lá pra montanha
Naquela casinha estranha
Eu e mais seu doutor
Topei um cabra assustado
Que chamando nós prum lado
A sua história contou
Há tempo eu fiz um ranchinho
Pra minha cabocla morar
Pois era ali nosso ninho
Bem longe deste lugar
No alto lá da montanha
Perto da luz do luar
Vivi um ano feliz
Sem nunca isso esperar
E muito tempo passou
Pensando em ser tão feliz
Mas a Tereza, doutor
Felicidade não quis
Pus meu sonho neste olhar
Paguei caro o meu amor
Por causa de outro caboclo
Meu rancho ela abandonou
Senti meu sangue ferver
Jurei a Tereza matar
O meu alazão arriei
E ela eu fui procurar
Agora já me vinguei
É esse o fim deste amor
Essa cabocla eu matei
É a minha história, doutor
1 – O que expressa a música?
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2 – Você acha que ela relata um fato real de justiça?
3 – Na sua opinião Tereza merecia a morte?
4 – Qual seria a atitude justa da Lei em relação ao homem que matou sua mulher?
Atividade 3:
1 - Documentário: Socorro Nobre
2 - Assistir o documentário e logo após trocar idéias sobre o conteúdo do mesmo.
3 - Em seguida cada estudante escreverá um texto expressando sua opinião sobre seu
conceito de justiça.
4 – Espontaneamente os alunos lerão suas produções.
5 – Concluir a unidade com a abordagem de se considerar os valores inerentes externos
a justiça como solidariedade, moral humanitária, afeto, respeito ao outro, etc
UNIDADE III: ÉTICA DO CUIDADO SEGUNDO GILLIGAN
Tempo de implementação: 3 aulas
Materiais necessários:
Filme Acorda Raimundo
Papel almaço, lápis, borracha, papel sulfite, caneta hidrocor
Objetivo geral:
- Ampliar o autocuidado, autopercepção, identificando as necessidades de cuidado e
limites, valores pessoais, dificuldades e potencialidades individuais, coletivas e
socioecológicas.
Objetivos específicos:
- Apreciar e desenvolver o cuidado consigo mesmo, percepção do corpo e vida pessoal;
- Adotar hábitos de autocuidado, respeitando as possibilidades e limites do próprio
corpo;
- Identificar e valorizar sua história de vida, suas origens e a dimensão sensível da vida;
- Perceber o cuidado como fundamental na manutenção da vida e nas relações
interpessoais, bem como no cuidado com o planeta;
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- Reconhecer o papel crítico da educação e da consciência pública para o alcance da
sustentabilidade;
- Conhecer e utilizar formas de intervenção, de cuidado individual e coletiva, agindo
com responsabilidade em relação a si, aos outros, a todas as espécies vivas e ao planeta
O PROCESSO
TEORIA DO CUIDADO
Gilligan (1990) aponta que o desprezo pela dimensão sensível, evidenciado na
maioria das teorias, também está presente nos estudos de Kohlberg, os quais são
tendenciosos numa perspectiva masculina, pois as próprias falas relatadas mostram que
os homens se preocupam quanto às pessoas interferirem nos direitos dos outros,
enquanto as mulheres se preocupam quanto à possibilidade de omissão, de não ajudar os
outros quando se poderia ajudar. A concepção de direitos de moralidade, que Kohlberg
caracteriza nos estágios cinco e seis, destina-se a chegar a uma resolução objetivamente
equânime ou justa para os dilemas morais sobre a qual todas as pessoas racionais
possam estar de acordo. A concepção de responsabilidade centra-se, pelo contrário, nas
limitações de determinada resolução e define os conflitos que restam (GILLIGAN,
1990).
Gilligan (1990) conclui: ―dadas as diferenças nas concepções das mulheres do eu
e da moralidade, as mulheres trazem ao ciclo da vida um diferente ponto de vista e
organizam a experiência humana em termos de diferentes prioridades‖. (GILLIGAN,
1990, p. 32)
A distinção entre ética da justiça e do direito, e ética do cuidado e da
responsabilidade percebida por Gilligan abre espaço para explicar o desenvolvimento
moral das mulheres. As mulheres parecem mais inclinadas a revelar sentimentos de
empatia e simpatia, seu julgamento é mais contextualizado, imerso nos relacionamentos
e seus pormenores. Não seria aspecto para uma análise discriminatória do julgamento e
enquadramento moral, colocando a mulher como fraca ou deficiente, mas sim uma
manifestação de maturidade moral que encara o eu como imerso numa rede de
relacionamentos com os outros.
A mulher vê os relacionamentos como uma teia de interconexão na qual
todos pertencem a ela e todos vêm dela – concepção de realidade social – a mulher vê a
vida como conexão, como mantida por atividades de cuidado, baseada num laço de
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apego, mais do que num contrato de acordo. As outras pessoas são para ela parte do
mundo, articulando uma ética da responsabilidade que provém de uma consciência da
interconexão.
As questões de justiça e honestidade também são reconhecidas como
questões da verdade moral. A mulher reconhece que os padrões morais impostos pelos
outros não são necessariamente certos para todos. É fundamental assumir a
responsabilidade por suas próprias ações. A compreensão de si próprio reflete-se na
compreensão do outro – elas estão conectadas e não opostas –, e a afirmação de si é um
ato de comunicação e não de agressão, como interpreta o mundo masculino. Todas as
articulações e conclusões estão centradas nas atividades de cuidado como sinônimo de
uma vida íntegra. Assim, Gilligan cita: ―o ideal de cuidado é pois uma atividade de
relacionamento, de atender e corresponder a uma necessidade tomar conta do mundo
mantendo a conexão de modo que ninguém seja deixado sozinho‖. (GILLIGAN, 1990,
p.73)
Na prática da sociedade, os padrões utilizados para avaliar são sempre os
masculinos e as diferenças são atribuídas a uma falha no desenvolvimento. No entanto,
fica claro que a falta de critérios alternativos que possam abranger o desenvolvimento
das mulheres aponta para as limitações das teorias elaboradas pelos homens. É quando
os relacionamentos que tradicionalmente definiram as identidades das mulheres e
estruturaram seus julgamentos morais já não fluem necessariamente de sua capacidade
reprodutiva, mas se tornam questões de decisão sobre as quais ela tem controle. O
exercício dessa opção a coloca secretamente em conflito com as convenções da
feminilidade, sobretudo na equação moral de bondade e auto-sacrifício. É ainda no seu
cuidado e preocupação com os outros que as mulheres têm julgado a si mesmas e têm
sido julgadas pelos outros.
A insistência das mulheres no cuidado é em primeiro lugar autocrítica mais do
que autoprotetora, ao passo que os homens inicialmente concebem a obrigação para
com os outros negativamente em termos de não-interferência. O desenvolvimento de
ambos os sexos parece, portanto, ocasionar integração de direitos e responsabilidades
pela descoberta da complementaridade dessas perspectivas díspares. Para as mulheres, a
integração de direitos e responsabilidades ocorre mediante um entendimento da lógica
psicológica dos relacionamentos. Esse entendimento modera o potencial autodestrutivo
de uma moralidade autocrítica pela afirmação de que todas as pessoas precisam de
cuidados. Para os homens, o reconhecimento através da experiência da necessidade de
21
responsabilidade mais ativa em cuidar corrige a indiferença potencial de uma
moralidade de não-interferência e desvia a atenção da lógica para as conseqüências da
escolha (GILLIGAN e MURPHYhy, 1979; GILLIGAN, 1990).
Assim, Gilligan confirma a noção de cuidado, que se amplia de uma
obrigação paralisante de não prejudicar os outros para uma obrigação de agir
responsavelmente para com o eu e os outros e assim manter a conexão. ―Uma
consciência da dinâmica dos relacionamentos humanos torna-se central para o
entendimento moral, juntando o coração e o olho numa ética que liga a atividade do
pensamento à atividade do cuidado.‖ (GILLIGAN, 1990, p.160)
A descoberta de Gilligan confirma a tese de que as dimensões de cuidado
e de justiça caracterizam todas as formas de relação humana, tanto da vida privada
quanto da pública, pois tanto homens quanto mulheres utilizaram as duas dimensões de
orientação moral e gênero diante dos conflitos apresentados; porém as mulheres tendem
a focalizar mais o cuidado e os homens a justiça. Para ela, as mulheres norteiam-se por
um princípio moral distinto que leva a priorizar o outro em suas ações morais, indo
além do princípio de justiça.
Miller (1976) apela para ―uma nova psicologia das mulheres‖, que
reconheça o diferente ponto de partida do desenvolvimento das mulheres, o fato de que
―as mulheres permanecem, constroem e se desenvolvem num contexto de ligação e
associação com outros‖, que ―o senso do eu das mulheres torna-se muito mais
organizado em torno de serem capazes de fazer, e depois de manter, associações e
relacionamentos‖, e que ―finalmente, para muitas mulheres, a ameaça de rompimento de
uma associação é percebida não precisamente como uma perda de um relacionamento,
mas como algo mais próximo de uma total perda do eu‖ ( apud GILLIGAN, 1990,
p.181).
Mais tarde, Habermas (1992) propõe a incorporação da dimensão da valoração
na definição dos problemas de ordem moral. Ele reconhece as relações intersubjetivas
que, para Gilligan, são o cuidado recíproco com o reconhecimento da dependência e
vulnerabilidade. Ele chama a atenção para a importância do engajamento do ser humano
no processo de socialização como condição para a individuação/processo de formação
da pessoa humana, e é este processo que ele reconhece como parte da moralidade.
Assim,
22
―a moralidade atuaria em dois planos: na postulação do respeito à igualdade de direitos
entre todos os indivíduos e/ou, na modernidade, no respeito à liberdade subjetiva da
individualidade inabalável, vinculada ao princípio da justiça; e na proteção de rede de
relações intersubjuntivas de reconhecimento mútuo através das quais os indivíduos
sobrevivem com membros de uma comunidade, onde compartilham o mesmo mundo e
os mesmos valores, os quais estariam vinculados ao princípio da solidariedade." (apud
BENHABIB, 1992, p.50).
Admitiu a necessidade de haver uma reestruturação do pensamento moral e,
para isso, a chave seria o equilíbrio dos dois pontos de vista para a compreensão do
desenvolvimento moral. Esta afirmação endossa as afirmações de Gilligan e deixa claro
que ―em termos ontogenéticos, nem a justiça, nem o cuidado possuem primazia alguma,
pois ambas as dimensões são essenciais para que as crianças recém-nascidas, frágeis e
dependentes, se desenvolvam como uma pessoa autônoma e adulta.‖ (BENHABIB,
1992, p.37).
Atividade I:
Música: Tocando em Frente de Almir Sater ou Caçador de Mim de Milton
Nascimento.
1 – Ouvir a música acompanhando a letra;
2 – Cantar a música sem o acompanhamento do som;
3 – Marcar na letra as partes que chamou mais atenção e que achou mais significativas
para si;
4 – Cada um exporá suas anotações no coletivo para os colegas;
O Velho e a Jabuticabeira
O velho estava cuidando da planta com todo o carinho
quando um jovem se aproximou e perguntou:
- Que planta é essa que o sr. está cuidando?
- É uma Jabuticabeira - respondeu o velho.
- E ela demora quanto tempo para dar frutos?
- Pelo menos uns 15 anos - informou o velho.
- E o sr. acredita viver esse tempo todo? - Indagou irônico o jovem.
23
- Não, não creio que viva mais tanto tempo, pois já estou no fim da minha jornada.
- Então, que vantagem você leva com isso, meu velho?
- Nenhuma, exceto a vantagem de saber que ninguém colheria jabuticabas
se todos pensassem como você...
Não importa se teremos tempo suficiente para ver mudadas
as coisas e pessoas pelas quais lutamos,
mas sim que façamos a nossa parte,
de modo que tudo se transforme a seu tempo.
Dinâmica:
Minha impressão
1- Estudantes em pé espalhados pela sala. A(o) professora cola nas costas de cada
participante uma folha de papel sulfite;
2- Cada participante terá uma caneta hidrocor em mãos, ao encontrar seus colegas
irá escrever uma característica de acordo com sua impressão;
3- Durante a música, cada estudante irá escrever no mínimo em três colegas
diferentes e no máximo que conseguir;
4- Quando a música terminar, cada estudante retira a sua folha das costas,
analisando as características que lhe foram atribuídas;
5- Cada participante apresenta para o grupo a sua opinião sobre as características
atribuídas a si, argumentando de acordo com sua auto- percepção;
6- A professora fechará com comentários sobre os sentimentos e percepções
apresentados.
Aula II –
Filme:
Acorda Raimundo
1 – Assistir ao filme;
2 – Levantar os pontos críticos do mesmo escrevendo no flipsharp;
24
Dinâmica de grupo: Eu sou Alguém
Objetivos:
- perceber os seus valores pessoais;
- perceber-se como ser único e diferente dos demais
Material: papel sulfite e lápis
1-Grupo em círculo, sentado
2- Distribuir uma folha de papel e um lápis para cada participante, pedindo que listem
no mínimo, dez características próprias.
3- Solicitar que dividam a folha ao meio, escrevendo em um lado as que facilitam a sua
vida e do outro, as que dificultam;
4- Formar subgrupos para partilhar as conclusões individuais;
5 – Plenário - Compartilhar com o grupo as descobertas feitas sobre si mesmo:
- O que descobriu sobre si mesmo(a) realizando a atividade?
- Qual a característica própria que você mais aprecia? Qual a que lhe desagrada?
- Quais as características mais comuns ao grupo?
Atividade III:
1 - Assistir o DVD Carta da Terra com Leonardo Boff;
2 – Em duplas, produzir cartazes sobre os cuidados que devemos desenvolver para com
as outras formas de vida.
3 – Os mesmos serão afixados na escola.
UNIDADE IV:
TEORIA DO DESENVOLVIMENTO BIOECOLÓGICO
Tempo de implementação: 3 aulas
Recursos físicos e materiais: salas de aula, auditório, filmes, documentários, DVD,
tvpendrive, CD, textos, papel, caderno, bexigas, cartolinas, revistas, jornais, pincel
atômico, tinta guache, cola, tesoura. jogos diversos .
Documentário :
Direito inalienável a vida
- Objetivo Geral:
25
- Levar os estudantes a compreender que todas as pessoas são iguais, independente do
gênero, raça, credo, nacionalidade, orientação sexual, status social, em relação aos
direitos da existência, sobrevivência, saúde, educação, cultura, esporte, lazer, trabalho,
convivência familiar e comunitária, respeito, dignidade e liberdade, e diferentes no
exercício desta mesma existência.
- Propiciar no espaço escolar do sistema penitenciário, mobilização para a promoção da
igualdade das relações de Gênero e qualidade de vida, explorando recursos e
possibilidades no ensino de Ciências.
Objetivos específicos:
- Perceber a cultura científica seus saberes históricos e inovadores, bem como a visão
tradicional e objetiva da ciência e subjetiva das interações com a natureza.
- Ampliar as representações de universo, espaço, tempo, matéria, pessoa, vida e seus
processos de transformação.
- Ressignificar a natureza da ciência, entendida como uma atividade humana histórica e
politicamente produzida, culturalmente contextualizada, impregnada de valores e
costumes, passível de transformações.
- Ampliar o nível de consciência crítica em relação aos problemas sociais e a capacidade
de analisar o entorno o entorno social, diagnosticando necessidades e buscas de
soluções;
-Acreditar que cada pessoa é agente de transformação da própria vida e do mundo em
que vive;
- Mobilizar os alunos para a prática do respeito às diferenças;
- Conhecer os diferentes papéis que o ser humano desempenha em diferentes contextos;
- Reconhecer a importância das amizades no seu desenvolvimento integral;
- Possibilitar o desenvolvimento das habilidades competências;
- Compreender que a cidadania é conquistada através da participação coletiva e solidária
no processo social, político e econômico, não sendo fruto de uma concessão ou dádiva.
O PROCESSO
As formas encontradas pelos jovens na busca pela autoridade perdida passam a
ser permeadas por sentimentos de raiva, de angústia e mal-estar. Ao se referirem ao
26
abandono da família, eles revelam sentimentos contraditórios, que são compreendidos
como, desde a vontade de romperem com ela, até o desejo de serem por ela
reconhecidos. Se não encontram este reconhecimento na família, procuram outras
vinculações que lhes possibilitem o acesso à autoridade. Esta busca por figuras
alternativas de referência de autoridade pode representar fator de risco para a sua
inserção no mundo das drogas e do tráfico.
O capítulo 36 da Agenda 21 resume os objetivos da educação ambiental como:
"desenvolver na população uma consciência preocupada com o meio ambiente e
com os problemas que lhe são associados, que tenham conhecimentos,
habilidades, atitudes, motivações e compromissos para trabalhar individual e
coletivamente na busca de soluções para os problemas existentes e para a
prevenção de novos."
A TEORIA ECOLÓGICA DE DESENVOLVIMENTO HUMANO
SEGUNDO BROFENBRENNER
Segundo Brofenbrenner, o afeto e as relações são essenciais para o
desenvolvimento humano. Ao estabelecer relações e criar vínculos o sujeito, está
saudavelmente se desenvolvendo.
Esta teoria defende os argumentos que o ser humano se desenvolve de forma
interativa com o ambiente e os elementos que o rodeia, assim sendo ele é um elemento
ativo, com capacidade de intervir no seu meio e alterar as suas circunstâncias.
Brofenbrenner estabelece uma teoria que vem explicar muitos aspectos
importantes do desenvolvimento humano e sua teoria nos estabelece uma forma de
educação efetiva que por si só não discriminaria nenhum dos gêneros humanos, assim
sua teoria se define:
Definição 1
A ecologia do desenvolvimento humano envolve o estudo científico da
acomodação progressiva, mútua, entre um ser humano ativo, em desenvolvimento, e as
propriedades mutantes dos ambientes imediatos em que a pessoa em desenvolvimento
vive, conforme esse processo é afetado pelas relações entre esses ambientes, e pelos
contextos mais amplos em que em que os ambientes estão inseridos.
Definição 2
27
Um microssistema é um padrão de atividades, papéis e relações interpessoais
experienciados pela pessoa em desenvolvimento num dado ambiente com características
físicas e materiais específicas.
Definição 3
Um mesossistema inclui as inter-relações entre dois ou mais ambientes nos quais
a pessoa em desenvolvimento participa ativamente (tais como, para uma criança as
relações da casa, na escola e com amigos da vizinhança; para um adulto, as relações na
família, no trabalho e na vida social).
Definição 4
Um exossistema se refere a um ou mais ambientes em que não envolvem a
pessoa em desenvolvimento como um participante ativo, mas no qual ocorrem eventos
que afetam, ou são afetados, por aquilo que acontece no ambiente, contendo a pessoa
em desenvolvimento.
Definição 5
O macrossistema se refere a consistências, na forma e conteúdos de sistemas de
ordem inferior (micro, meso e exo) que existem, ou poderiam existir no nível da
subcultura ou da cultura como um todo, juntamente com qualquer sistema de crença ou
ideologia subjacente a essas consistências.
Definição 6
Ocorre uma transição ecológica sempre que a posição da pessoa no meio
ambiente ecológico é alterada em resultado de uma mudança de papel, ambiente ou
ambos.
Definição 7
O desenvolvimento humano é o processo através do qual a pessoa desenvolvente
adquire uma concepção mais ampliada, diferenciada e válida do meio ambiente
ecológico, e se torna mais motivada e mais capaz de se envolver em atividades que
revelam suas propriedades, sustentam ou reestruturam aquele ambiente em níveis de
complexidade semelhante ou maior de forma e conteúdo.
Definição 8
A validade ecológica se refere à extensão em que o meio ambiente
experienciado pelos sujeitos numa investigação científica tem as propriedades supostas
ou presumidas pelo investigados.
Definição 9
28
Para demonstrar que o desenvolvimento humano ocorreu, é necessário
estabelecer que uma mudança produzida nas concepções e/ou atividades da pessoa foi
transferida para os outros ambientes e outros momentos. Essa demonstração é conhecida
como validade desenvolvimental.
Definição 10
Um experimento ecológico é uma tentativa de investigar a progressiva
acomodação entre o organismo humano em crescimento e seu meio ambiente, através
de uma comparação sistemática entre dois ou mais sistemas ambientais ou seus
componentes estruturais, com uma cuidadosa tentativa de controlar outras fontes de
influência, quer por designação aleatória (experimento planejado), quer por comparação
(experimento natural).
Definição 11
Um experimento transformador envolve a alteração e reestruturação sistemáticas
de sistemas ecológicos existentes, de maneiras que desafiam formas da organização
social, sistemas de crenças e estilos de vida dominantes numa determinada cultura ou
subcultura.
Atividade I:
1- Assistir ao documentário: Direito inalienável à vida;
2– Em duplas fazer uma relação dos aspectos imprescindíveis ao direito a vida;
3 - Plenária: todos os estudantes farão relato de sua atividade.
Atividade II:
- Palestra; Professora Araci
-os(as) estudantes construirão cartazes para mobilizar e motivar a todos sobre as
diferenças e igualdades de gênero.
Atividade III.
1 – serão realizados jogos e oficinas, campeonatos e concursos de poesias e músicas que
proporcionem a integração, desperte a criatividade e auto-estima, promova a igualdade
das relações Bioecológicas e socioecológicas;
2 - Dinâmica:
29
Cada estudante escreverá num papel um pensamento e colocará dentro da bexiga;
encherá a mesma e deverá manter os balões sem cair no chão ao final da música serão
estourados e cada qual ficará com a mensagem do balão que estiver mais próximo.
Considerações finais
Após a aplicação destas atividades, esperamos ter atingido uma sensibilização e
conscientização, bem como uma tomada de consciência em relação aos cuidados
consigo próprios e com o planeta, promovendo ações de sustentabilidade, instaurando
uma melhora na qualidade de vida com o resgate de atividades coletivas e individuais
saudáveis. A aplicação desta proposta educativa de educação ética e moral deverá ter
propiciado uma tomada de consciência em relação a igualdade de gênero e relações e
ações socioecológicas efetivas no contexto histórico de cada estudante.
Em relação a escola, esperamos estabelecer e incorporar na proposta pedagógica
as propostas político-pedagógicas que promovam o direito inalienável à vida, a
igualdade, estabelecendo uma cultura e prática promotora de relações saudáveis com
aumento da qualidade de vida.
Os jovens/adultos estudantes que participaram destas atividades terão
desenvolvido seu espírito de liderança para possibilitar a multiplicação de seus
conhecimentos sobre os assuntos trabalhados, bem como, tomar iniciativa de
convivência saudável, nos horários livres.
No sistema penitenciário, estes horários livres são muitos e ocorrem muitas
tentativas de atividades para ocupar este tempo ocioso. Espera-se que estes
multiplicadores levem alternativas de atividades e informações saudáveis para dentro do
espaço de convivência dos privados de liberdade.
O estabelecimento de regras claras e do pensamento crítico em relação as nossas
atitudes e práticas diárias poderá fazer a diferença para cada um individualmente, mas,
sobretudo ao coletivo da sociedade. Nossa responsabilidade com nossos pares
contribuirá para o estabelecimento de vidas mais saudáveis, satisfatórias e felizes.
Promovendo assim a diminuição de conflitos e violência, promovendo a tão almejada
paz.
REFERÊNCIAS
30
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da liberdade. 32ª Ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra: 2009.
FRITZEN,S. J. Exercícios práticos de dinâmica de grupo. Petrópolis: vozes, 1994.
GILLIGAN, Carol. Uma voz diferente. Tradução de Nathanael C. Caixeiro. Rio de
Janeiro: Rosa dos Tempos,1990.
GOFFMAN, Erving. Manicômios, Prisões e Conventos. 2ª Ed. São Paulo: Perspectiva
AS, 1987.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. Rio de Janeiro, Objetiva, 1995.
GUTIÉRREZ, R. O feminismo é um humanismo. Rio de Janeiro: Nobel-Antares,
1985.
HABERMAS, Jurgen. Consciência moral e agir comunicativo. Tradução de Guido A.
de Almeida. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989.
IOZA, R .Cem jogos para grupos. São Paulo Seummers,1996.
PEREIRA, S. E. F. N. Redes sociais de adolescentes em contexto de vulnerabilidade
social e sua relação com os riscos de envolvimento com o tráfico de drogas. 2009.
320 f. Tese (Doutorado em Psicologia Clínica e Cultura) – Instituto de Psicologia,
Universidade de Brasília, 2009.
PIAGET, Jean. O julgamento Moral na Criança. São Paulo, Mestre Jou. 1932
SERRÃO, Margarida e BALEEIRO, Maria Clarice.Aprendendo a ser e a conviver. 2ª
Ed. São Paulo. FTD, 1999.
SLUZKI, C. E. A rede social na prática sistêmica. São Paulo: Casa do Psicólogo,
1997.
SZYMANSKI, H. A relação família/escola: desafios e perspectivas. Brasília: Plano,
2001.
VYGOTSKY, L. S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
WAISELFISZ, J. J. Juventude, violência e cidadania: os jovens do Brasil. São Paulo:
Cortez, 2006.
Psicoterapia comunitária, contribuições. 2010.
Amor exigente. Contribuições.
31
ANEXOS
Educação Ambiental: princípios
Os documentos produzidos ao longo dessa história de encontros e conferências traçaram
os caminhos para pesquisas e práticas em Educação Ambiental, baseada nos seguintes
princípios:
Os documentos produzidos ao longo dessa história de encontros e conferências traçaram
os caminhos para pesquisas e práticas em Educação Ambiental, baseada nos seguintes
princípios:
Educação holística
Significa educar de forma integrada, considerar o todo e não partes isoladas. E
entender que somente compreendendo que os aspectos ecológicos, políticos,
sociais, econômicos, humanos, científicos etc. estão necessariamente interligados
e mantêm uma estreita dependência é que podem ser estabelecidos novos
padrões de qualidade de vida.
Diversidade
Assegurar o respeito às diversas formas de expressão da cultura. A Educação
Ambiental deve estimular a solidariedade, a igualdade e o respeito aos direitos
humanos, usando estratégias democráticas e de interação entre as culturas.
Educação Permanente
A Educação Ambiental é um processo contínuo e, portanto, suas ações não se
encerram. Ela deve começar na escola primária e continuar por todas as fases dos
ensino formal e não formal.
Educação sem limites
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A Educação Ambiental deve extrapolar os limites da escola. A unidade escolar é o
lugar privilegiado da educação. Porém, não é e nem deve ser o único. A Educação
Ambiental deve envolver a todos - movimentos sociais, poder público, empresas e
ONGs.
Multidisciplinaridade
Da mesma forma que a Educação Ambiental não deve ter limites físicos, também
não pode ter limites disciplinares. Ela deve estar presente em todas as áreas do
conhecimento, e não limitada às áreas de ciência e geografia.
Agir Localmente e Pensar Globalmente
A Educação Ambiental deve estimular a consciência crítica sobre o Meio
Ambiente local, possibilitando agir seus problemas e, ao mesmo tempo,
estabelecer ligações desses problemas com os do resto do mundo. É importante
também o contrário: agir globalmente pensando nos efeitos locais.
Referência histórica
As práticas em Educação Ambiental devem levar em consideração, sempre, a
realidade atual, não perdendo de vista as experiências passadas e preparando o
futuro que desejamos.
Sustentabilidade
A Educação Ambiental deve estimular questionamentos sobre o desenvolvimento
das sociedades, buscar reflexões sobre qual desenvolvimento queremos e quais
são os custos sociais e ecológicos que estão associados aos modelos de
desenvolvimento adotados até então. É importante pensarmos sobre o que
deixaremos para as próximas gerações.
Educação Ambiental como estratégia de cidadania
A Educação Ambiental deve ser uma estratégia para a construção de cidadãos
conscientes e responsáveis social e politicamente, que procurem viver numa sociedade
realmente democrática, com justiça social e ecologicamente sustentável.
33
Esse processo é longo e está em permanente construção, o que significa muitas idas e
vindas, muitas trocas entre culturas, conceitos e conhecimentos. É um processo
dinâmico, que permite o encontro de pensamentos e hábitos diferentes e estimula a
busca de melhorias na qualidade de vida.
ANEXO II
Fábula 1:
URUBUS E SABIÁS
Rubem Alves
"Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam... Os
urubus,aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes para o canto, decidiram que,
mesmo contra a natureza eles haveriam de se tornar grandes cantores. E para isto
fundaram escolas e importaram professores, gargarejaram dó-ré-mi-fá, mandaram
imprimir diplomas, e fizeram competições entre si, para ver quais deles seriam os mais
importantes e teriam a permissão para mandar nos outros. Foi assim que eles
organizaram concursos e se deram nomes pomposos, e o sonho de cada urubuzinho,
instrutor em início de carreira, era se tornar um respeitável urubu titular, a quem todos
chamam de Vossa Excelência. Tudo ia muito bem até que a doce tranqüilidade da
hierarquia dos urubus foi estremecida. A floresta foi invadida por bandos de pintassilgos
tagarelas, que brincavam com os canários e faziam serenatas para os sabiás... Os velhos
urubus entortaram o bico, o rancor encrespou a testa , e eles convocaram pintassilgos,
sabiás e canários para um inquérito.
— Onde estão os documentos dos seus concursos? E as pobres aves se olharam
perplexas, porque nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem. Não haviam
passado por escolas de canto, porque o canto nascera com elas. E nunca apresentaram
um diploma para provar que sabiam cantar, mas cantavam simplesmente...
— Não, assim não pode ser. Cantar sem a titulação devida é um desrespeito à ordem.
E os urubus, em uníssono, expulsaram da floresta os passarinhos que cantavam sem
alvarás...
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MORAL: ―Em terra de urubus diplomados não se houve canto de sabiá.‖
Fábula 2: A FÁBULA DA ÁGUIA E DA GALINHA - Leonardo Boff
Esta é uma história que vem de um pequeno país da África Ocidental, Gana, narrada por
um educador popular, James Aggrey, nos inícios deste século, quando se davam os
embates pela descolonização. Oxalá nos faça pensar sempre a respeito.
"Era uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um pássaro, a fim de
mantê-lo cativo em casa. Conseguiu pegar um filhote de águia.
Colocou-o no galinheiro junto às galinhas. Cresceu como uma galinha.
Depois de cinco anos, esse homem recebeu em sua casa a visita de um
naturalista.Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:
- Esse pássaro aí não é uma galinha. É uma águia.
- De fato, disse o homem.- É uma águia. Mas eu a criei como galinha. Ela não é mais
águia. É uma galinha como as outras.
- Não, retrucou o naturalista.- Ela é e será sempre uma águia. Este coração a fará um dia
voar às alturas.
- Não, insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará como águia.
Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e,
desafiando-a, disse:
- Já que você de fato é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, então abra
suas asas e voe!
A águia ficou sentada sobre o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao
redor. Viu as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou para junto delas.
O camponês comentou:
- Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha!
35
- Não, tornou a insistir o naturalista. - Ela é uma águia. E uma águia sempre será uma
águia. Vamos experimentar novamente amanhã.No dia seguinte, o naturalista subiu com
a águia no teto da casa.
Sussurrou-lhe:
- Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe!Mas, quando a águia viu lá
embaixo as galinhas ciscando o chão, pulou e foi parar junto delas.
O camponês sorriu e voltou a carga:- Eu havia lhe dito, ela virou galinha!
- Não, respondeu firmemente o naturalista. - Ela é águia e possui sempre um coração de
águia. Vamos experimentar ainda uma última vez. Amanhã a farei voar.
No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram a águia,
levaram-na para o alto de uma montanha. O sol estava nascendo e dourava os picos das
montanhas.
O naturalista ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe:
- Águia, já que você é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, abra suas
asas e voe!
A águia olhou ao redor. Tremia, como se experimentasse nova vida. Mas não voou.
Então, o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, de sorte que seus
olhos pudessem se encher de claridade e ganhar as dimensões do vasto horizonte.
Foi quando ela abriu suas potentes asas.
Ergueu-se, soberana, sobre si mesma. E começou a voar, a voar para o alto e voar cada
vez mais para o alto.
Voou. E nunca mais retornou."
Existem pessoas que nos fazem pensar como galinhas. E ainda até pensamos que somos
efetivamente galinhas. Porém é preciso ser águia. Abrir as asas e voar. Voar como as
águias. E jamais se contentar com os grãos que jogam aos pés para ciscar.
Extraído de artigo publicado pela Folha de São Paulo, por Leonardo Boff, teólogo,
escritor e professor de ética da UERJ.
Fábula 3:
O CAMUNDONGO DA CIDADE E O DO CAMPO
Fábula de Esopo- Fabulista grego do século V a.C.
36
Um camundongo que morava na cidade foi, uma vez, visitar o primo que vivia no
campo. Este era um pouco arrogante e espevitado, mas queria muito bem o primo, de
maneira que o recebeu com muita satisfação. Ofereceu-lhe o que tinha de melhor:
feijão, toucinho, pão e queijo.
O camundongo da cidade torceu o nariz e disse:
-Não posso entender, primo, como você consegue viver com estes pobres alimentos.
Naturalmente, aqui no campo, é difícil obter coisa melhor. Venha comigo e eu lhe
mostrarei como se vive na cidade. Depois que passar lá uma semana, você ficará
admirado de ter suportado a vida no campo.
Os dois puseram-se, então, a caminho. Tarde da noite, chegaram à casa do camundongo
da cidade.
-Certamente você gostará de tomar um refresco, após esta caminhada, disse ele
polidamente ao primo.
Conduziu-o à sala de jantar, onde encontraram os restos de uma grande festa. Puseram-
se a comer geléias e bolos deliciosos. De repente, ouviram rosnados e latidos.
-O que é isto? Perguntou, assustado, o camundongo do campo.
São, simplesmente, os cães da casa, respondeu o da cidade.
-Simplesmente? Não gosto desta música durante meu jantar.
Neste momento, a porta se abriu e apareceram dois enormes cães. Os camundongos
tiveram de fugir a toda pressa.
-Adeus, primo, disse o camundongo do campo. Vou voltar para minha casa de campo.
-Já vai tão cedo? perguntou o da cidade.
-Sim, já vou e não pretendo voltar, concluiu o primeiro.
.
Moral da história: mais vale o pouco certo, que o muito duvidoso.
FÁBULA 4
O SONHO DOS RATOS - FÁBULA DE RUBEM ALVES
Era uma vez um bando de ratos que vivia no buraco do assoalho de uma casa velha.
Havia ratos de todos os tipos: grandes e pequenos, pretos e brancos, velhos e jovens,
37
fortes e fracos, da roça e da cidade. Mas ninguém ligava para as diferenças, porque
todos estavam irmanados em torno de um sonho comum: um queijo enorme, amarelo,
cheiroso, bem pertinho dos seus narizes. Comer o queijo seria a suprema felicidade...
Bem pertinho é modo de dizer. Na verdade, o queijo estava imensamente longe, porque
entre ele e os ratos estava um gato... O gato era malvado, tinha dentes afiados e não
dormia nunca. Por vezes fingia dormir. Mas bastava que um ratinho mais corajoso se
aventurasse para fora do buraco para que o gato desse um pulo e... era uma vez um
ratinho!! Os ratos odiavam o gato. Quanto mais o odiavam, mais irmãos se sentiam. O
ódio a um inimigo comum os tornava cúmplices de um mesmo desejo: queriam que o
gato morresse ou sonhavam com um cachorro... Como nada pudessem fazer, reuniram-
se para conversar. Faziam discursos, denunciavam o comportamento do gato (não se
sabe bem para quem), e chegaram mesmo a escrever livros com a crítica filosófica dos
gatos. Diziam que um dia chegaria em que os gatos seriam abolidos e todos seriam
iguais. "Quando se estabelecer a ditadura dos ratos", diziam os camundongos, "então
todos serão felizes"... - O queijo é grande o bastante para todos, dizia um. -
Socializaremos o queijo, dizia outro. Todos batiam palmas e cantavam as mesmas
canções. Era comovente ver tanta fraternidade. Como seria bonito quando o gato
morresse! Sonhavam... Nos seus sonhos comiam o queijo. E, quanto mais o comiam,
mais ele crescia. Porque esta é uma das propriedades dos queijos sonhados: não
diminuem; crescem sempre. E marchavam juntos, rabos entrelaçados, gritando:―Ao
queijo, já!"... Sem que ninguém pudesse explicar como, o fato é que, ao acordarem,
numa bela manhã, o gato tinha sumido. O queijo continuava lá, mais belo do que nunca.
Bastaria dar uns poucos passos para fora do buraco. Olharam cuidadosamente ao redor.
Aquilo poderia ser um truque do gato. Mas não era. O gato havia desaparecido mesmo.
Chegara o dia glorioso, e dos ratos surgiu um brado retumbante de alegria. Todos se
lançaram ao queijo, irmanados numa fome comum. E foi então que a transformação
aconteceu. Bastou a primeira mordida. Compreenderam, repentinamente, que os queijos
de verdade são diferentes dos queijos sonhados. Quando comidos, em vez de crescer,
diminuem. Assim, quanto maior o número dos ratos a comer o queijo, menor o naco
para cada um. Os ratos começaram a olhar uns para os outros como se fossem inimigos.
Olharam, cada um para a boca dos outros, para ver quanto do queijo haviam comido. E
os olhares se enfureceram. Arreganharam os dentes. Esqueceram-se do gato. Eram seus
próprios inimigos. A briga começou. Os mais fortes expulsaram os mais fracos a
dentadas. E, ato contínuo, começaram a brigar entre si. Alguns ameaçaram chamar o
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gato, alegando que só assim se restabeleceria a ordem. O projeto de socialização do
queijo foi aprovado nos seguintes termos: "Qualquer pedaço de queijo poderá ser
tomado dos seus proprietários para ser dado aos ratos magros, desde que este pedaço
tenha sido abandonado pelo dono". Mas como rato algum jamais abandonou um queijo,
os ratos magros foram condenados a ficar esperando... Os ratinhos magros, de dentro do
buraco escuro, não podiam compreender o que havia acontecido. O mais inexplicável
era a transformação que se operara no focinho dos ratos fortes, agora donos do queijo.
Tinham todo o jeito do gato, o olhar malvado, os dentes à mostra. Os ratos magros nem
mais conseguiam perceber a diferença entre o gato de antes e os ratos de agora. Rubem
Alves Rubem Alves Colaboraçao:Susete Moreira E compreenderam, então, que não
havia diferença alguma. Pois todo rato que fica dono do queijo vira gato.