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UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA PRÓ-REITORIA ACADÊMICA CURSO DE FARMÁCIA KARINY B. SANTOS História da Vigilância Sanitária

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Page 1: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRAPRÓ-REITORIA ACADÊMICA

CURSO DE FARMÁCIA

KARINY B. SANTOS

História da Vigilância Sanitária

Niterói2010

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KARINY B. SANTOS

História da Vigilância Sanitária

Trabalho apresentado pela disciplina de Saúde Pública do curso de Farmácia da Universidade Salgado de Oliveira – UNIVERSO, como parte dos requisitos do curso.

Professor(a): Mauro da Conceição

Niterói2010

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Vigilância Sanitária

A Vigilância Sanitária é uma das mais antigas faces da Saúde Pública e desde sua

origem expressa a preocupação que as sociedades têm com o nocivo e o seu

controle. Os primeiros registros de ações datam da Idade Antiga e visavam o

controle sobre as práticas de cura, sobre o meio ambiente e sobre produtos

relacionados à saúde e a doença. As organizações sociais sempre estiveram

envolvidas com o desenvolvimento de atividades ligadas à saúde e também ao

estabelecimento de normas e regras capazes de modelar comportamentos que

pudessem resultar em riscos à saúde da coletividade. O campo da saúde tem sido

alvo de normatizações, que incluem sanções para o caso de descumprimentos, em

códigos como, por exemplo, o de Hamurabi, o Antigo Testamento e o Manu. Esses

Códigos são tão antigos que na Índia em 300 a.C. uma lei proibiu a adulteração de

alimentos, medicamentos e perfumes.

O reconhecimento da saúde como um direito humano conquistado com a criação da

Organização Mundial da Saúde, logo após a Segunda Guerra Mundial, também

estimulou o aperfeiçoamento e a intensificação das práticas de controle sanitário no

campo da vigilância.

Hoje pensar a saúde pública sem ações eficazes de controle de salubridade é

impossível. Cada vez mais há a valorização de regulamentações que visam à

garantia dos produtos e serviços consumidos diariamente pela população de todo o

mundo.

A Vigilância Sanitária no Brasil

Pode-se afirmar que a vigilância sanitária originou-se na Europa dos séculos XVII e

XVIII e no Brasil dos séculos XVIII e XIX, com o surgimento da noção de “polícia

sanitária”, que tinha como função regulamentar o exercício da profissão, combater o

charlatanismo e exercer o saneamento da cidade, fiscalizar as embarcações, os

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cemitérios e o comércio de alimentos, com o objetivo de vigiar a cidade para evitar a

propagação das doenças.

Essa noção apresentará significados diferentes ao longo do tempo, dependendo do

entendimento que se tem de dano ou doença e suas formas de ocorrência.

As primeiras ações de fiscalização e punição no Brasil, embora de eficácia reduzida,

data do século XVI. Com a chegada da família real no Brasil em 1808 o país passa a

fazer parte da rota comercial inglesa e sofre mudanças de ordem econômica

aumentando assim a necessidade de um controle sanitário que permitisse a

aceitação dos produtos brasileiros no mercado e que evitassem a disseminação de

doenças no país.

Em 1810, através de um Regimento da Provedoria, surge no Brasil a Polícia

Sanitária baseada no conceito desenvolvido por Peter Frank de polícia médica. As

atividades sanitárias tinham caráter fiscalizador, julgador e punitivo e as autoridades

possuíam o poder de tributar e arrecadar taxas sobre os serviços executados.

Normas de controle sanitário passaram a vigorar como a quarentena e o Lazareto

para isolamento de doentes, controle de alimentos, inspeções de açougues e

boticas, medicamentos e alimentos bem como a concessão de licença para o

exercício da medicina e da farmácia.

Pouco a pouco a legislação foi sendo completada e aperfeiçoada, mas durante o

império houve pouca evolução do sistema, que apesar de desenvolver essas ações

de controle tinha pouco alcance do território e atuava principalmente ao redor da

sede do governo. Somente após a independência os serviços sanitários foram

municipalizados e passaram a serem exercidos pelas Câmaras Municipais que

estabeleceram também seus regimentos.

Em 1829 foi criada a Sociedade de Medicina e Cirurgia que passou a atuar como

aliada do Estado na elaboração de normas sanitárias e no combate de doenças. Em

1832, foi elaborado pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro um Código de

Posturas que estabelecia normas para enterros e cemitérios, doenças contagiosas,

águas infectadas, matadouros, currais, açougues e gênero alimentícios e para o

exercício da medicina e da farmácia, controle de medicamentos, hospitais, casas de

saúde e introduzindo inclusive a prática de licenciamento e controle nas fábricas.

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Em 1851 uma portaria do Ministro dos negócios proíbe a criação de novas casas de

saúde sem a consulta prévia à Junta de Higiene Pública. Mas mesmo com as

tentativas de controle sanitários desenvolvidas o país sofria com epidemias e com o

descontrole sanitário que atingia principalmente a camada mais pobre da população.

Os sistemas de saúde, vão se estruturando voltados para a doença e com imenso

descaso para o cunho preventivo e coletivo e de promoção da saúde.

Somente com a instalação da república que se iniciou a organização das

administrações sanitárias estaduais e a constituição de órgão de Vigilância Sanitária

na Unidades da Federação, e passaram a ser de responsabilidade da União o

estudo das doenças e medidas de profilaxia, fiscalização e análise das substâncias

importadas. As ações de combate à doença passaram a ser fundamentadas nas

pesquisas bateriológicas.

No final do Séc XIX e início do Século XX houve o predomínio das campanhas de

controle do agente etiológico dos vetores e este período foi marcado pelo

sanitarismo Campanhista adotado por Oswaldo Cruz, médico respeitado nos meios

acadêmicos, especialista em microbiologia. Cruz enfrentou as críticas da opinião

pública e da imprensa que desabonavam seus métodos de desinfecção. O maior

conflito enfrentado nesta época foi a Revolta da Vacina que aconteceu no Rio de

Janeiro em 1904. No dia 31 de outubro uma lei obrigava todos os cidadãos a tomar

vacina, os governos no intuito de sanear a cidade agiam como se estivessem em

guerra, os agentes de saúde invadiam as residências de forma pouco cortês. No dia

10 de novembro a população se revoltou e enfrentou a polícia, o resultado foi

desastroso: 30 mortos centenas de feridos e quase mil pessoas presas por se

recusarem a tomar a vacina. Apesar dos conflitos Oswaldo Cruz não admitia

interferências políticas em seu trabalho, aspecto que, sem dúvida, deve ser

observado rigorosamente para o sucesso das ações de Vigilância Sanitária.

Ainda neste ano foi implantado um novo regulamento dos Serviços Sanitários da

União, que previu a elaboração de um Código Sanitário e a instituição do Juízo dos

Feitos de Saúde Pública que tinha a incumbência de julgar as causas de interesse

da saúde pública. Durante as primeiras duas décadas deste século as ações de

Vigilância Sanitária adquiriram uma certa consistência de Estado.Na década de

1920 foi criado, com a Reforma Carlos Chagas, através do Decreto-Lei nº 3.987, o

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Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP) que veio a substituir a antiga

Diretoria Geral de Saúde Pública que vigia desde 1897, e que, apesar dos esforços,

tinha ações de pouco alcance no país.

Em 1923, um novo Decreto de nº 16.300 incluiu a totalidade da vida social na ordem

sanitária e se fixaram dispositivos e normas minuciosas, mas muitas vezes

inaplicáveis. O Decreto estabeleceu as competências do DNSP e normatizou o

controle do exercício profissional, o licenciamento prévio e a fiscalização de

estabelecimentos e produtos e fixou multas e penas de prisão inafiançáveis para

falsificadores de produtos sob controle do DNSP.

Foi incorporada ainda a expressão Vigilância Sanitária que passou a ser empregada

para o controle sanitário de doentes e de estabelecimentos.

A era Vargas, em 1930, foi marcada pela emergência de um Estado forte, autoritário,

centralizador que agia independentemente das oligarquias regionais e as estruturas

da saúde pública passaram por reformas que resultaram na criação de órgãos

especializados com funções ampliadas, foram eles: Serviço Nacional de

Fiscalização de Medicina (SNFM), o Instituto Oswaldo Cruz, a Comissão de revisão

da Farmacopéia e a comissão de biofarmácia; e muitos decretos foram sancionados

nas áreas de alimentos, entorpecentes e águas e minerais.

Em 1941 acontece no Rio de Janeiro a Primeira Conferência Nacional de Saúde

mas a participação social nos debates sobre políticas públicas para a saúde ainda

não existia e a conferência se aproximava mais de um encontro técnico de

administradores do Ministério da Saúde e dos Estados. Nesta época, a educação e

a saúde integravam um único Ministério.

Após a queda de Vargas em 1945 o país viveu uma fase de investimento estrangeiro

principalmente nas indústrias farmacêuticas e de alimentos. Em 1946 o decreto nº

20.397 regulou a indústria farmacêutica com normas para controle de produtos,

disposições sobre psicotrópicos e entorpecentes e regras que incluíam a licença

prévia e a responsabilidade técnica neste tipo de estabelecimento.

A área de alimento teve sua regulamentação decretada em 1950 pela Lei nº 1283

que tornou obrigatório a prévia fiscalização de produtos de origem animal. A

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Segunda Conferência Nacional foi realizada em novembro deste mesmo ano, mas

assim como a primeira não teve grande força política. As discussões se

concentraram nas condições de higiene e de segurança no trabalho e na prestação

de assistência médica sanitária e preventiva para trabalhadores e gestantes.

Em 1953 a Lei nº 1944 obriga a iodação no sal de cozinha, este foi um marco na

prevenção de doenças na área de alimentos uma vez que a ausência do consumo

de iodo está relacionada com o bócio endêmico.

Ainda neste mesmo ano, o Departamento Nacional de Saúde foi transformado em

Ministério da Saúde que amplia e centraliza as ações de Saúde Pública, sem deixar

autonomia aos Estados e municípios. Em 1961 regulamenta-se o Código Nacional

de Saúde.

Os anos de 1962 e 1963, que precederam a ditadura, foram marcados pelas

discussões sobre as propostas de descentralizações e municipalizações dos

serviços de saúde. A primeira grande discussão se deu na Terceira Conferência de

Saúde realizada em dezembro de 1963.

Com o golpe de 1964 o Brasil passa a ser conduzido pelo binômio desenvolvimento

e segurança. O Campo de ação da Vigilância Sanitária se expande e há a

incorporação de novas práticas e objetivos como, por exemplo, o controle dos

produtos e serviços de interesse sanitário. O termo Vigilância Sanitária passa a

denominar o conjunto de ações nas áreas de portos e fronteiras.

Uma reforma Administrativa aconteceu em 1967 e resultou na redefinição das áreas

e competências dos ministérios. O Ministério da Saúde passou a ser responsável

pela política nacional de saúde e houve um incremento nas ações de prevenção

vigilância de portos e fronteiras e controles de medicamentos, alimentos e drogas.

Em 1970 surge a Secretaria de Saúde Pública.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) editou resoluções sobre as condições

higiênicas na produção e manipulação de alimentos, sobre os efeitos das técnicas

modernas de industrialização de alimentos e sobre resíduos e aditivos. Essas

regulamentações influenciaram diretamente as medidas de regulamentação no

Brasil.

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Em 1971 foi criada a Central de Medicamentos (CEME) responsável pela regulação,

produção e distribuição de medicamentos em todo país. O ano de 1973 foi marcado

pela revisão de legislações sanitárias, edição de leis e sanção de decretos; alguns

deles vigoram até os dias atuais.

A consagração da Vigilância como atividade permanente com base no controle de

qualidade se deu com a criação da Lei nº 6.360/76 a chamada Lei de Vigilância

Sanitária. O Ministério da Saúde através do decreto nº 79.056 teve uma nova

estrutura formalizada e o campo de controle sanitário passou a condição de

secretaria ministerial surgindo então a Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária.

Em 1977 a Lei nº 6.437 atualizou as disposições penais e administrativas e

promulgou instrumentos que até hoje são utilizados pela Vigilância Sanitária no

exercício de suas funções que são a aplicação de autos de infração, notificação,

defesa, impugnação, apreensão de amostras, inutilização de produtos e

cancelamento de registros. Toda década de 1970 foi marcada pela intensa produção

de leis, decretos e resoluções normativas destinadas ao controle sanitário do país.

Dessa estrutura nascem as primeiras ações de Vigilância Sanitária baseada no

Poder de Polícia, basicamente cartorial, mas sem ações que repercutissem de forma

eficaz na saúde da população.

A década de 1980 foi fundamental para as mudanças ocorridas na saúde pública

brasileira. A época foi marcada por um intenso movimento de exercício da cidadania

e pela redemocratização da sociedade. No setor de Vigilância Sanitária aparecem as

dissonâncias das ações do Estado que durante algum tempo oscilou entre o papel

de defensor da saúde da população e dos interesses comerciais dos produtos

produzidos no país. Por pressão de Órgãos como os Conselhos de Defesa do

Consumidor e o Instituto de Defesa do Consumidor o governo passa a se preocupar

mais com o cidadão.

No final da década de 1980 o Brasil passou por um processo de democratização da

saúde, denominado Reforma Sanitária, que resultou em mudanças significativas

para o setor. A 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, foi o marco

da Reforma e muitas das sugestões ali propostas se concretizaram na Constituição

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Federal do Brasil de 1988, que reconheceu a saúde como um direito de todos e um

dever do Estado.

Pela primeira vez uma equipe de sanitaristas assume o órgão nacional de Vigilância

Sanitária em 1985. O objetivo era submeter o sistema de saúde a uma reforma que

visasse a ruptura do modelo autoritário e centralizador e propor a construção de um

novo modelo, mas a equipe foi destituída em 1987; este ano foi marcado pela

divulgação na mídia de eventos de calamidade sanitária que resultou em uma

produção intensa de normas que regulamentassem serviços e produtos em todo

país.

Em 1989 o Presidente Fernando Collor de Mello assume a presidência e com sua

política neo-liberal traz custos incalculáveis para o setor de saúde. A criação do

Projeto Inovar, que tinha como objetivo dar respostas rápidas à petições dos

produtores, resultou em inúmeras liberações de registros de produtos que não

vinham de encontro as normas da Vigilância Sanitária.

Mas se avaliarmos o período todo desta década, principalmente seu final,

destacamos mudanças no enfoque dado a Vigilância Sanitária visando uma atuação

em cima do risco e da epidemiologia e a visão de cidadania que passou a ser

implicada ao órgão.

Dentre as muitas conquistas da Reforma Sanitária está a Lei Orgânica da Saúde, nº

8.080 de 19 de setembro de 1990, que organizou o Sistema Único de Saúde (SUS)

e redefiniu a atuação da Vigilância Sanitária no País. Antes da Reforma, a Vigilância

Sanitária era definida pelo Ministério da Saúde como um conjunto de medidas que

visem elaborar, controlar a aplicação e fiscalizar o cumprimento de normas e

padrões de interesse sanitário relativos a portos, aeroportos e fronteiras,

medicamentos, cosméticos, alimentos, saneantes e bens, respeitada a legislação

pertinente, bem como o exercício profissional relacionado com a saúde. Com a Lei

Orgânica, a Vigilância Sanitária passa a ser vista como “um conjunto de ações

capazes de eliminar, diminuir, ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas

sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da

prestação de serviços de interesse a saúde” (LEI 8080/90).

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Outros destaques devem ser dados a Lei 8.078 de 1990, também chamada de

Código de Defesa do Consumidor, que estabelece norma de proteção e defesa do

consumidor, a Portaria 1.565 de 1994 que define o Sistema Nacional de Vigilância

Sanitária estabelecendo a descentralização dos serviços e ações de saúde e o

Decreto nº 793 que firmou a obrigatoriedade de se dar destaque ao nome genérico

na rotulagem dos medicamentos.

As conquistas da reforma foram um leque de regulamentações que introduziram

normas que levavam em consideração o enfoque de risco epidemiológico, de

planejamento de inspeções e de prioridades sanitárias.

Apesar de todo esforço, com o aumento da demanda e do reconhecimento da

importância da Vigilância Sanitária, não foi possível a criação de políticas públicas

que garantissem a capacitação institucional para atender toda demanda e as críticas

sobre a atuação da Vigilância Sanitária aumentaram e propostas de reformulação do

modelo foram discutidas.

Novas normas foram instituídas e foi criada a Agência Nacional de Vigilância

Sanitária (ANVISA), uma autarquia com modelo administrativo mais ágil,

independência financeira e estabilidade dos dirigentes com finalidade institucional de

“promover a proteção a saúde da população, por intermédio do controle sanitário da

produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à Vigilância

Sanitária, inclusive ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles

relacionados, bem como controle de portos, aeroportos e fronteiras” (ANVISA,

2005). A nova definição excluía as temáticas do meio-ambiente, ecologia, saúde do

trabalhador e informação e educação sanitária da população e dos consumidores.

Atualmente há três esferas interagindo para garantir a atuação da Vigilância

Sanitária no Brasil, é o que chamamos de tripatite: a esfera federal, a estadual e a

municipal. Todos os órgãos fazem parte do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.

A ANVISA e as Vigilâncias Sanitárias estaduais e municipais agem (ou ao menos

deveriam agir) em sintonia apesar de terem suas próprias competências que foram

definidas pelo Sistema Único de Saúde. A ANVISA é hoje a instituição Federal

responsável Vigilância Sanitária no Brasil, fazendo a gestão dos serviços que

competem ao nível federal. Seu papel é de coordenar as ações de fiscalização

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realizadas pelas esferas estaduais e municipais, regulamentar e dar apoio técnico a

estas esferas. Cada esfera de governo deve agir dentro de sua área de atuação,

sendo assim o município não pode regular fora de sua área e o mesmo serve para o

Estado. No que tange as regulamentações as duas esferas estão impedidas de

aprovar quaisquer tipos de legislações ou atividades que contrariem as normas

federais, devido a hierarquia de poder.

Aos Estados e municípios são atribuídas as responsabilidades operacionais do

trabalho de campo da Vigilância Sanitária, com o processo de municipalização da

saúde as ações executadas passam a ser cada vez mais de responsabilidade

municipal cabendo ao Estado ações complementares e suplementares para o bom

desenvolvimentos das atividades das vigilâncias municipais.

Segundo a Lei Orgânica da Saúde são competências da União a expedição de

normas gerais sobre o sistema nacional de Vigilância Sanitária, definindo e

coordenando o serviço em todo território nacional. Os Estados tem o dever de

coordenar, executar ações e serviços de Vigilância Sanitária e de saúde do

trabalhador, suplementando a legislação sobre normas gerais expedidas pela União.

Aos municípios cabem suplementar as legislações federais e estaduais no tocante a

aplicação e excussão de ações e serviços de Vigilância Sanitária.

Praticas e Conceitos da Vigilância Sanitária no Brasil

No Brasil, a polícia sanitária, que é a prática mais antiga da saúde pública, surge na

época em que vigorava a “teoria dos miasmas”. Ela se rearticula e se modifica, pelo

menos na forma de interpretar os eventos, ao incorporar as várias novas noções que

vão surgindo, como aquelas originadas na era bacteriológica, no período da

introdução da terapêutica; mais tarde, com as teorias sistêmicas e do planejamento,

configuram-se os sistemas de vigilância à saúde, até a incorporação em sua função

de controle do conceito de defesa da cidadania, do direito do consumidor.

Com a Constituição brasileira assumindo a saúde como um direito fundamental do

ser humano, e atribuindo ao Estado o papel de provedor dessas condições, a

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definição de vigilância sanitária, apregoada pela Lei nº 8.080, de 19 de setembro de

1990, passa a ser, nesse contexto, conforme o artigo 6º, parágrafo 1º, a seguinte:

“Entende-se por vigilância sanitária um conjunto de ações capazes de eliminar,

diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários

decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de

serviços de interesse da saúde, abrangendo:

I - o controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se relacionem com a

saúde, compreendidas todas as etapas e processos, da produção ao consumo;

II - o controle da prestação de serviços que se relacionam direta ou indiretamente

com a saúde.”

Essa definição amplia o seu campo de atuação, pois, ao ganhar a condição de

prática capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos decorrentes do meio ambiente,

da produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde,

torna-se uma prática com poder de interferir em toda a reprodução das condições

econômico-sociais e de vida, isto é, em todos os fatores determinantes do processo

saúde–doença.

Com a incorporação da noção de meio ambiente, que hoje significa mais do que o

conjunto de elementos naturais físico-biológicos, mas também as relações sociais do

mundo construído pelo homem abrangem o ambiente de trabalho. Essa atribuição

de intervenção no meio de trabalho é reforçada pelo parágrafo 3º do mesmo artigo

6º da Lei 8.080/90: através das vigilâncias epidemiológicas e sanitárias, busca-se “a

promoção e proteção à saúde dos trabalhadores”, bem como sua recuperação e

reabilitação em decorrência “dos riscos e agravos advindos das condições de

trabalho...”

Apesar das modificações havidas em seus enfoques conceituais ao longo dos

últimos dois séculos, e da ampliação de seu campo de atuação mais recentemente,

a prática de vigilância sanitária parece manter suas características mais antigas,

especialmente as atribuições e formas de atuar assentadas na fiscalização, na

observação do fato, no licenciamento de estabelecimentos, no julgamento de

irregularidades e na aplicação de penalidades, funções decorrentes do seu poder de

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polícia. Essas são suas características mais conhecidas pela população ainda nos

dias de hoje. Suas outras características, normativa e educativa, representam um

importante passo na evolução de uma consciência sanitária e em sua finalidade de

defesa do direito do consumidor e da cidadania.

Fator decisivo para o fortalecimento de sua face educativa foi o estabelecimento do

direito de defesa do consumidor pela Constituição Federal de 1988, consolidado

pelo Código de Defesa do Consumidor, regulamentado pela Lei 8.078, de 11 de

setembro de 1990. Esse código nasce a partir da constatação da incapacidade do

mercado de consumo de proteger efetivamente, com suas próprias leis, o

consumidor. Ao estabelecer como direitos básicos do consumidor a proteção, saúde

e segurança contra riscos decorrentes do consumo de produtos ou serviços

perigosos e nocivos e o direito à informação clara sobre os produtos e serviços, esse

código possibilita a criação de uma nova relação entre Estado, sociedade e

Vigilância Sanitária. Relação de apoio ao seu corpo de leis que embasam as ações

de vigilância sanitária e de direcionalidade ao seu objeto de ação, isto é, importa

mais do que nunca o consumidor, elemento central do controle do processo de

produção de produtos e serviços.

Contribui também nessa direção a Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que

dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS. São oficializados

mecanismos importantes de participação da população no controle de qualidade dos

serviços de saúde, através de conselhos. O usuário, objeto de proteção da Vigilância

Sanitária, passa a ser um aliado importante, um “vigilante voluntário”, da

transformação das condições de saúde, reforçando o papel educativo e

conscientizador da Vigilância Sanitária.

A intervenção do Estado nas relações entre produtores e consumidores expressa-se

de duas formas: uma, através do controle das práticas de produção, determinando

as normas técnicas e padrões de produção e exercendo a fiscalização para o

cumprimento dessas normas, para prevenir e evitar o dano no ato do consumo;

outra, através do estabelecimento do direito básico do consumidor e da

disponibilização do Estado a seu serviço, seja na elucidação dos procedimentos que

motivaram um dano, seja no aparato legal necessário à reparação do dano ao

consumidor.

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Essas noções remetem para a questão da qualidade do produto ou serviço,

preocupação incorporada pelo Código de Defesa do Consumidor, que favorece a

consolidação de dois conceitos importantes: o do controle interno, ou seja, o

prestador /fornecedor é responsável pelo que produz e deve manter controle sobre

sua produção, respondendo pelos seus desvios, imperfeições ou nocividades; e o do

controle externo, exercido pelo Estado ou pelas sociedades organizadas na

vigilância do processo e na defesa do consumidor. O primeiro remete para as

práticas de auto-avaliação englobando os conceitos em voga de gestão da

qualidade total e garantia de qualidade que redundam em manuais ou guias de boas

práticas para o controle interno da qualidade da produção. O segundo, mais

precisamente, refere-se à prática da vigilância sanitária, o controle externo, que se

caracteriza pela elaboração de normas oficiais, licenciamento dos estabelecimentos,

orientação educativa, fiscalização e aplicação de medidas para a proteção da saúde

da população.

Destacam-se quatro dimensões inerentes à prática de vigilância sanitária:

a. A dimensão política: como uma prática de saúde coletiva, de vigilância da saúde,

instrumento de defesa do cidadão, no bojo do Estado e voltada para responder por

problemas, situa-se em campo de conflito de interesses, pois prevenir ou eliminar

riscos significa interferir no modo de produção econômico-social. Essa é sua

dimensão política, relacionada ao propósito de transformação ou mudança desses

processos em benefício, a priori, da população. Contudo, os entraves serão maiores

ou menores dependendo, de um lado, do grau de desenvolvimento tecnológico dos

setores produtores e prestadores, de suas consciências sanitárias ou mercantilistas,

e, de outro, da concreta atuação e consciência dos consumidores.

b. A dimensão ideológica, que significa que a vigilância deverá responder às

necessidades determinadas pela população, mas enfrenta os atores sociais com

diferentes projetos e interesses.

c. A dimensão tecnológica, referente à necessidade de suporte de várias áreas do

conhecimento científico, métodos, técnicas, que requerem uma clara fundamentação

epidemiológica para seu exercício. Nessa dimensão está incluída sua função de

avaliadora de processos, de situações, de eventos ou agravos, expressa através de

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julgamentos a partir da observação ou cumprimento de normas e padrões técnicos e

de uma conseqüente tomada de decisão.

d. A dimensão jurídica, que a distingue das demais práticas coletivas de saúde,

conferindo-lhe importantes prerrogativas expressas pelo seu papel de polícia e pela

sua função normatizadora. A atuação da Vigilância Sanitária tem implicações legais

na proteção à saúde da população, desde sua ação educativa e normativa,

estabelecendo obrigatoriedades ou recomendações, até seu papel de polícia, na

aplicação de medidas que podem representar algum tipo de punição. Assentada no

Direito Sanitário, sua atuação se faz no plano do jurídico, o que significa que

qualquer tomada de decisão afeta esse plano. Para isso suas ações devem estar

corretamente embasadas em leis. Torna-se imprescindível para aquele que exerce a

ação o conhecimento dos instrumentos processuais, das atribuições legais e

responsabilidades.

De suas dimensões política e ideológica pode-se afirmar que interferem no grau de

desenvolvimento ou desempenho das ações em suas realidades. Aqui os conflitos

se manifestam, desde o valor ou importância que a sociedade atribui à prática da

vigilância até os próprios órgãos gestores da saúde, com políticas efetivas ou não de

controle, o grau de consciência dos vários interessados na questão, entre outros.

Nesse plano, sua atuação faz interface com os grupos sociais interessados, com

objetivos nem sempre confluentes.

No plano da dimensão tecnológica, deve desencadear ações para aumentar o

padrão de qualidade, reduzir ou minimizar riscos, evitar danos, o que requer uma

intersetorialidade na saúde, isto é, a articulação de vários setores que trabalham

com saúde, intra ou extragoverno. Ainda é imprescindível sua competência e

fundamentação científica, pois representa uma resposta técnica aos problemas

sanitários, e suas normas serão modelos a serem seguidos pelos

produtores/prestadores.

Na dimensão jurídica, faz interface com os campos da Ética, do Direito Civil e Penal,

em decorrência da aplicação de medidas legais quando da constatação de

problemas sanitários que representem riscos graves à saúde ou crimes contra o

cidadão. As características do poder de polícia decorrem de sua dimensão jurídica.

Page 16: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

São tradicionalmente suas tarefas: inspecionar, julgar, notificar o infrator, autuar,

lavrar termos de aplicação de penalidades, licenciar estabelecimentos expedindo ou

cassando alvarás, dentre outras atividades. Assim, a ação sanitária, nesse plano,

para ser eficaz, requer a interação com vários órgãos intra e extragoverno, tais como

Ministério Público, Polícia de Defesa do Consumidor, Poder Judiciário, conselhos de

classe e outros órgãos de defesa do consumidor.

Aquele que lida com vigilância sanitária necessita conhecer os aspectos básicos do

Direito Sanitário e Administrativo, especialmente porque a ação em vigilância

sempre requer alguma decisão. O conhecimento dos fatos ou fatores jurídicos é

fundamental, pois uma ação mal embasada juridicamente não terá valor. Além disso,

há limitações em sua competência e, em muitos casos, a concretização de uma

ação representa uma atuação compartilhada; e sem o conhecimento dos

instrumentos processuais, das atribuições de responsabilidades tanto das equipes

quanto dos profissionais, dos prestadores /fornecedores em saúde, no que se refere

às questões éticas e legais, não há como concretizar sua ação.

A prática de normatização é uma atribuição do sistema legal e também uma

dimensão técnica. Cabe aos órgãos de coordenação da Vigilância Sanitária nos

níveis federal, estadual e municipal emanar legislação sobre técnicas e padrões

técnicos minimamente necessários a serem seguidos para promover a proteção da

população.

A introdução do conceito de qualidade e de reparo do dano ao consumidor, em

termos teóricos, permitiu apontar um novo modelo de vigilância sanitária.

A vigilância, que se espera que se faça hoje, terá que levar em conta a forma como

se faz o processo e o seu resultado para o usuário. A sua avaliação não pode se

detiver apenas nos aspectos cartoriais, burocráticos ou estruturais, como era a

prática anterior, porque eles por si mesmos não garantirão os resultados, como não

atendem às novas imposições colocadas pela evolução crescente na sociedade de

uma consciência do direito de consumir boa qualidade.

Essa evolução da forma de pensar de nossa sociedade, que conferiu ao consumidor

um novo status, o de cidadão, e embasamento jurídico de garantia da qualidade nas

relações entre os prestadores /fornecedores e o consumidor, impulsiona uma

Page 17: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

consciência sanitária e a própria Vigilância Sanitária para as tarefas de promover

práticas e espaços saudáveis nos processos de produção da vida e saúde.

Assim, melhorar a qualidade de vida e saúde da população no município deve incluir

o desenvolvimento de ações de vigilância sanitária, buscando-se constituir um

modelo a partir das próprias experiências e realidade dos municípios.

O Campo de Abrangência da Vigilância Sanitária

A definição atual da vigilância sanitária, como já foi visto, torna seu campo de

abrangência vasto e ilimitado, pois poderá intervir em todos os aspectos que possam

afetar a saúde dos cidadãos.

Para facilitar a exposição, assumimos que seu campo de abrangência é composto

por dois subsistemas, subdivididos, a saber:

I – Bens e serviços de saúde

Subsistema de produção de bens de consumo e serviços de saúde, que interferem

direta ou indiretamente na saúde do consumidor ou comunidade. São bens e

serviços de saúde que interessam ao controle sanitário:

1. As tecnologias de alimentos, referentes aos métodos e processos de produção de

alimentos necessários ao sustento e nutrição do ser humano.

2. As tecnologias de beleza, limpeza e higiene, relativas aos métodos e processos

de produção de cosméticos, perfumes, produtos de higiene pessoal e saneantes

domissanitários.

3. As tecnologias de produção industrial e agrícola, referentes à produção de outros

bens necessários à vida do ser humano, como produtos agrícolas, químicos, drogas

veterinárias, etc.

Page 18: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

4. As tecnologias médicas, que interferem diretamente no corpo humano, na busca

da cura da doença, alívio ou equilíbrio da saúde, e compreendem medicamentos,

soros, vacinas, equipamentos médico-hospitalares, cuidados médicos e cirúrgicos e

suas organizações de atenção à saúde, seja no atendimento direto ao paciente, seja

no suporte diagnóstico, terapêutico e na prevenção ou apoio educacional.

5. As tecnologias do lazer, alusivas aos processos e espaços onde se exercem

atividades não-médicas, mas que interferem na saúde dos usuários, como centros

esportivos, cabeleireiros, barbeiros, manicures, pedicuros, institutos de beleza,

espaços culturais, clubes, hotéis, etc.

6. As tecnologias da educação e convivência, referentes aos processos e espaços

de produção, englobando escolas, creches, asilos, orfanatos, presídios, cujas

condições das aglomerações humanas interferem na sua saúde.

II – Meio ambiente

Subsistema que se refere ao conjunto de elementos naturais e daqueles que

resultam da construção humana e suas relações sociais:

1. O meio natural, correspondente a água, ar, solo e atmosfera. Interessam ao

controle sanitário as tecnologias utilizadas na construção de sistemas de

abastecimento de água potável para o consumo humano, na proteção de

mananciais, no controle da poluição do ar, na proteção do solo, no controle dos

sistemas de esgoto sanitário e dos resíduos sólidos, entre outros, visando à

proteção dos recursos naturais e à garantia do equilíbrio ecológico e

conseqüentemente da saúde humana.

2. O meio construído, referente às edificações e formas do uso e parcelamento do

solo. Aqui o controle sanitário é exercido sobre as tecnologias utilizadas na

construção das edificações humanas (casas, edifícios, indústrias, estabelecimentos

comerciais, etc.) e a forma de parcelamento do solo no ambiente urbano e rural;

sobre os meios de locomoção e toda a infra-estrutura urbana e de serviços; sobre o

ruído urbano e outros fatores, no sentido de prevenir acidentes, danos individuais e

coletivos e proteger o meio ambiente.

Page 19: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

3. O ambiente de trabalho, relativo às condições dos locais de trabalho, geralmente

resultantes de modelos de processos produtivos de alto risco ao ser humano. O

controle sanitário se dirige a esse ambiente, onde freqüentemente encontra

cidadãos que são obrigados a dedicar grande parte de seu tempo ao trabalho em

condições desagradáveis, em ambientes fechados e insalubres, em processos

repetitivos, competitivos e sob pressão, o que altera e põe em risco a saúde física e

psicológica e a vida dos indivíduos e da comunidade.

O enfoque de Atuação

Entendendo que a essência da prática da vigilância é uma ação permanente de

avaliação e de tomada de decisão, faz-se necessário referenciar os marcos teóricos

e métodos para essa avaliação.

Ainda que o ato de fiscalizar e o poder de polícia sejam as características mais

antigas da vigilância, sua atuação – a forma de ver as “irregularidades”, de julgar os

eventos – muda ao longo do tempo.

O modelo vigente tem sido alvo de críticas exacerbadas. Fala-se de um modelo

extremamente policial, pouco educador, cartorial, e que valoriza apenas os aspectos

de estrutura e, conseqüentemente, pouco eficaz.

Nesse item referenciamos, de forma resumida, alguns enfoques de avaliação, como

uma das contribuições à construção de uma prática de vigilância sanitária mais

eficaz, voltada para a defesa do cidadão e para a promoção da qualidade de vida e

saúde da população.

O enfoque epidemiológico

Todo o instrumental epidemiológico deverá ser assumido pela Vigilância Sanitária,

visto que o enfoque de risco é parte de sua própria definição. O conceito de risco,

em epidemiologia, corresponde ao conceito matemático de probabilidade, podendo

ser definido como a probabilidade de os membros de uma população desenvolverem

Page 20: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

uma certa doença ou evento relacionado à saúde em um determinado período. É

atribuição da Vigilância Sanitária, em sua prática de observação, detectar riscos e

tomar medidas que os eliminem, previnam ou minimizem.

O instrumental epidemiológico é essencial para a definição de prioridades em face

da realidade em que atua a Vigilância Sanitária, a construção do quadro sanitário, o

conhecimento dos problemas e como subsídio às suas providências.

Há vários livros que descrevem os métodos epidemiológicos de forma didática e

clara, que recomendamos ao final àqueles que necessitarem de aprofundamento ou

conhecimento do tema.

O Enfoque do Planejamento e da Atuação Programática

É atribuição da Vigilância Sanitária detectar riscos e tomar medidas que eliminem,

previnam ou minimizem esses riscos. Para isso deverá planejar as suas ações de

forma a organizar a atuação sobre os problemas sanitários e as práticas de

avaliação.

A Vigilância Sanitária deve delinear sua atuação por meio do conhecimento dos

problemas. Problema é a representação social de necessidades ou agravos de

saúde, definidas por atores sociais e decorrentes das condições de vida e do modo

de produção econômico-social.

A identificação de problemas sanitários deverá ser uma atividade de planejamento

das ações de vigilância sanitária, a ser incorporada de forma sistemática.

Deve partir do reconhecimento de sua área geográfica de abrangência, do

mapeamento dos problemas locais e prioridades com base em fontes de informação,

questionários locais, denúncias, censo de estabelecimentos ou de espaços ou

fenômenos que representem risco à saúde e à vida, para se delinear um diagnóstico

da situação, priorizar ações, definir objetivos e programas, organizar recursos,

articular órgãos internos e/ou setores externos para a operacionalização das ações e

tomada de providências.

Page 21: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Definidos os problemas, será necessário operacionalizar um conjunto de ações para

sua solução, isto é, traçar programas. Ainda que sejam inúmeras as discussões

sobre as diferentes definições de ações programáticas em saúde, entende-se por

programa de saúde uma intervenção planejada de ações com o objetivo de atender

às necessidades de saúde de uma determinada população. Programar, portanto, é

organizar e racionalizar a ação para alcançar determinadas metas e objetivos.

Têm sido comum a implantação e o desenvolvimento de ações de vigilância

sanitária sem planejamento, sem programação. Sua atuação tradicional tem se

resumido ao atendimento das demandas espontâneas, isto é, o atendimento em

resposta às denúncias ou acidentes. Contudo, se considerarmos seu papel de

promotora da saúde e de prevenção de danos, não se pode imaginar uma vigilância

sanitária que não atue também, e principalmente, por meio de programas. Não é

possível pensar uma vigilância que não tenha o diagnóstico de sua área com base

em perfis epidemiológicos, que não defina os riscos potenciais, os objetivos e metas,

as rotinas, que não padronize os principais passos da inspeção ou que deixe de

fazer a avaliação sistemática dos resultados de sua atuação, até para reprogramar-

se.

Ainda em meio às confusões metodológicas ou terminológicas, no bojo das teorias

do planejamento, fala-se em vigilância por projetos e não por programas.

Pela necessidade de se adotar alguma terminologia, e também porque entendemos

que o conceito de programa é o mais apropriado para designar intervenções

organizadas a longo prazo, descreveremos as ações permanentes, sistemáticas,

como programas de vigilância sanitária. Até porque o conceito de projeto, ampliado

para além do seu significado comum de plano, planta, intento, tem características de

transitoriedade. Pode ser compreendido como um esforço complexo para produzir

resultados bem determinados, em um prazo bem determinado e dentro de um

orçamento restrito para isso, envolvendo diversas funções e escalões de

organização e não é, pelo menos totalmente, repetição de um esforço anterior. Por

exemplo, a construção de uma escola ou hospital; a introdução de uma nova

modalidade de atendimento à saúde e a verificação de sua eficácia em relação à

anterior; o teste de determinado medicamento ou vacina ou de uma nova conduta

Page 22: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

médica; a organização da capacitação de profissionais por determinado período,

entre outros.

O Enfoque da Avaliação de Qualidade

Perdura ainda hoje a idéia de que vigilância sanitária é uma prática de fiscalização

restrita às instalações físicas, à emissão de licenças ou alvarás, à verificação das

habilitações profissionais e a outros fatores mais ligados a uma avaliação de

estrutura, pejorativamente conhecida como “vigilância de piso e parede” ou “prática

burocrática e cartorial”.

A avaliação estrutural parte da premissa de que as instalações, equipamentos,

higiene, etc., podem resultar em processos mais adequados, o que é uma verdade,

porém não suficiente. Uma estrutura hospitalar, no que se refere às suas

instalações, por exemplo, pode afetar os procedimentos e provocar resultados

indesejáveis. Mas uma boa estrutura por si só não garante os resultados.

Como orientação às equipes de vigilância sanitária, daremos adiante alguns

exemplos de modelos de avaliação que incorporam o conceito de qualidade para a

avaliação de produtos e serviços. Há outros modelos que poderiam ser adotados

pela Vigilância Sanitária, mas resolvemos optar por estes para a elaboração de

instrumentos operacionais a serem empregados na prática de fiscalização e análise

de processos.

Adaptando o modelo de avaliação para o objeto da vigilância, poderíamos adotar a

Tríade de Donabedian para avaliação de estrutura, processo e resultado, da

seguinte forma:

• Estrutura: refere-se às características relativamente estáveis, como condições

físicas, organizacionais, equipamentos, recursos humanos.

• Processo: conjunto de atividades desenvolvidas nas relações de produção em

geral e, no caso de serviços de saúde, entre profissionais e pacientes.

Page 23: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

• Resultado: obtenção das características desejáveis dos produtos ou serviços, sem

erros, imperfeições ou nocividades; melhoria do meio ambiente e trabalho, ou

mudanças obtidas no estado dos pacientes ou quadro sanitário, que podem ser

atribuídas ao cuidado consumido ou tecnologias introduzidas.

Para cada componente da tríade deverá ser observado um conjunto de indicadores

que melhor retratem a realidade a ser avaliada.

Destaca-se os sete atributos da qualidade propostos por Donabedian:

1. Eficácia: a capacidade do cuidado, na sua forma mais perfeita, de contribuir para

a melhoria das condições de saúde.

2. Efetividade: o quanto de melhorias possíveis nas condições de saúde são obtidas.

3. Eficiência: a capacidade de obter a maior melhoria possível nas condições de

saúde, ao menor custo possível.

4. Otimização: a mais favorável relação entre custos e benefícios.

5. Aceitabilidade: conformidade com as preferências do paciente no que concerne à

acessibilidade, relação médico–paciente, às “amenidades”, os efeitos e o custo do

cuidado prestado.

6. Legitimidade: conformidade com as preferências sociais em relação a tudo

mencionado anteriormente.

7. Eqüidade: igualdade na distribuição do cuidado e de seus efeitos sobre a saúde.

O termo “amenidades” refere-se às condições de conforto e aparência dos serviços,

atenção dispensada aos pacientes, explicações e outros fatores que envolvem

questões de qualidade ligadas à satisfação do usuário, além da eficácia técnica.

A fiscalização sanitária é um ato de observação e julgamento, ao qual sempre

deverá corresponder uma tomada de decisão. Ao inspecionar estabelecimentos,

processos de fabricação de produtos, cuidados médicos ou o ambiente, sempre se

estará fazendo uma avaliação, que consiste em chamar a atenção para que os

aspectos de estrutura, processo e resultado sejam atentamente observados e

Page 24: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

analisados quanto ao risco que possam oferecer à vida e à saúde de usuários,

consumidores ou comunidade.

Sob essa perspectiva é que serão apresentados mais adiante os principais passos

para a realização das inspeções sanitárias e outras formas de ação que implicam

julgamento de valor.

Os recursos de avaliação de procedimentos propostos pelo CQT ou GQT (Controle

de Qualidade Total ou Garantia de Qualidade Total), aqui descritos de forma breve,

são também de inegável importância para a prática da vigilância sanitária.

A teoria do Controle de Qualidade Total ou Gestão de Qualidade Total surge nos

Estados Unidos na década de 40, idealizada para as indústrias. Expande- se em

todo o território americano e para o mundo, e o modelo japonês é apontado como

aquele que apresenta o melhor desempenho.

Esses conceitos, apesar de antigos, entram em voga em todo mundo nas décadas

de 80 e 90, e no Brasil encontramos várias publicações sobre sua adoção nas

empresas privadas, e mais recentemente sua implantação em serviços de saúde. No

Brasil, as indústrias de medicamentos, soros e equipamentos vêm adotando em

maior ou menor grau esse tipo de controle. Esse método também foi oficializado

pelo Ministério da Saúde em legislação sanitária, que regulamentou a fiscalização

sanitária de medicamentos e as práticas de auto-avaliação das indústrias

farmacêuticas.

Na concepção de Ishikawa, o controle de qualidade é um sistema de métodos de

produção que produzem economicamente bens e serviços de boa qualidade,

atendendo aos requisitos do consumidor.

Em um primeiro enfoque apresentado, mais precisamente no enfoque americano,

essa teoria privilegia a inspeção, a cargo de uma divisão de controle de qualidade,

que tem como objetivo evitar que os produtos defeituosos sejam remetidos ou

consumidos. O controle de qualidade é efetuado por amostragem, após a fabricação

do produto.

Page 25: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Já em um segundo enfoque, correspondente ao modelo japonês, privilegiase a

prevenção, isto é, faz-se o controle de todo o processo de produção, em que todos

participam, e a opinião do consumidor é decisiva.

A descrição de algumas dessas ferramentas tem o propósito de sugerir às equipes

de vigilância sanitária a utilização delas em suas ações. São ferramentas do CQT ou

GQT o ciclo de controle/gerenciamento PDCA, o diagrama de Ishikawa ou “espinha

de peixe”, o diagrama de afinidades, o diagrama de interrelação, o diagrama de

Pareto, a carta de controle e os círculos de controle de qualidade. Destaca-se duas

delas e as adaptamos às possibilidades de avaliação na prática de vigilância

sanitária.

O Enfoque da Avaliação da Tecnologia em Saúde

São tecnologias médicas ou de saúde as drogas, equipamentos médicos e demais

dispositivos, procedimentos médicos e cirúrgicos e os sistemas organizacionais de

atenção médica e de apoio, segundo a definição do Office of Technology

Assessment (OTA – Escritório de Avaliação de Tecnologia), sobre um dos campos

de abrangência da Vigilância Sanitária.

O campo denominado avaliação de tecnologia origina-se nos Estados Unidos da

América, a partir de um conceito geral sobre tecnologia e da formação do OTA, em

1972.

Em 1975, é criado pelo OTA um programa de saúde destinado a avaliar as

tecnologias em saúde, novas e já em uso, para objetivamente verificar eficácia,

eficiência e segurança.

Parte dos processos de avaliação de tecnologia já vem sendo desenvolvida pela

Vigilância Sanitária. A respeito desses métodos, recomendamos vários trabalhos

para aqueles que necessitarem se aprofundar no tema.

Com relação às formas de desenvolvimento, validação e difusão das tecnologias em

saúde, destacamos as principais diferenças de acordo com o tipo de tecnologia:

Page 26: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

1. Os medicamentos e outras substâncias destinadas à terapêutica, desenvolvidas a

partir de conhecimentos básicos de química, farmacologia e patofisiologia humana,

têm na indústria privada a fonte primária de descobertas. Quase todos os países

empregam semelhante processo para a introdução desse tipo de tecnologia. Após o

desenvolvimento de uma determinada substância química, solicita-se ao governo

permissão para testes humanos e, depois de estudos seguros e triagens clínicas, os

resultados são apresentados a ele. Após uma consideração crítica, se os resultados

forem considerados convincentes, a droga é aprovada, devendo respeitar os

regulamentos locais, e liberada para o mercado.

Essa forma de regulação, ainda que cara e demorada, tem como objetivo proteger a

população de drogas sem eficácia e sem segurança.

No Brasil, a regulamentação está a cargo da Secretaria Nacional de Vigilância

Sanitária do Ministério da Saúde e os métodos de aprovação são semelhantes aos

de outros países. Vale destacar que vários instrumentos foram introduzidos mais

recentemente pela Vigilância Sanitária Nacional para aumentar o controle da

qualidade do processo de produção de medicamentos e outros insumos. Contudo, a

prática de avaliação dessas tecnologias em uso no mercado não tem sido

sistemática e revela eventos isolados. Houve recentemente um grande esforço para

retirada de associações de medicamentos inócuos ou nocivos das prateleiras,

proibição da fabricação e cancelamento dos registros, gerando grande resistência

por parte dos laboratórios.

2. Procedimentos podem ser definidos como combinações de técnicas médicas e

cirúrgicas com drogas ou dispositivos ou ambos. Aparecem através de pesquisas

médicas, envolvendo vários campos do conhecimento, experiências clínicas, grupos

de controle e observações empíricas, geralmente realizados por especialistas.

Em geral, a validação dessa tecnologia não se dá de forma clara e, na maioria dos

países, sem um órgão do governo para oficializá-la. Um estudo de caso é publicado

em um jornal médico e o autor pode apresentá-lo em congressos, palestras ou

mesas-redondas.

Page 27: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

As sociedades científicas de especialidades médicas e o meio de origem, quase

sempre as universidades, são de extrema importância na divulgação e no

reconhecimento dessas tecnologias.

Sem dúvida, trata-se de um processo complexo, pois envolve a questão do

desempenho médico, que é pouco ou nada regulado, e com certeza faz-se muita

experimentação não controlada e fora dos padrões de saúde. Há vários trabalhos na

literatura internacional que mostram procedimentos largamente utilizados na prática

médica e completamente inúteis.

Os avanços desse tipo de técnica têm dependido de médicos habilidosos e criativos,

requer incontáveis e pequenas mudanças da prática médica e se difunde por

caminhos ainda pouco observados. Contudo, e felizmente, observa-se recentemente

o crescimento do número de protocolos de conduta e padrões sobre procedimentos,

em nível nacional e internacional, especialmente gerados e utilizados em instituições

hospitalares. Nesse tipo de controle, vêm adquirindo cada vez mais importância as

comissões de ética.

No Brasil, eventuais portarias do Ministério da Saúde, sanitárias ou com a finalidade

de pagamento, têm referendado determinados procedimentos. Contudo, não há um

processo sistematizado de avaliação e aprovação dessas técnicas, conforme os

enfoques tratados aqui.

Ao deparar com dúvidas suscitadas por procedimentos novos ou diferentes em suas

fiscalizações de rotina, ou por denúncias de danos à saúde, de modo geral a

Vigilância Sanitária recorre às sociedades de especialistas, aos conselhos de classe

e às universidades. Trata-se de processo parcial e restrito, desencadeado a partir de

denúncias de charlatanismo, imperícias ou negligências médicas, não configurando

propriamente uma avaliação de tecnologia sistematizada.

O atual Código de Ética Médica pune o médico que utilizar procedimento não

aprovado pela legislação sanitária. Mas a maioria dos procedimentos não estão

legalmente formalizados. E esse fato constitui um problema para a Vigilância

Sanitária tomar alguma decisão, pois sua função é combater procedimentos sem

comprovação científica de eficácia.

Page 28: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

3. Sobre os equipamentos médico-hospitalares e outros dispositivos médicos,

denominados “correlatos” na legislação sanitária brasileira, seu desenvolvimento

requer conhecimento na área de ciências biomédicas, engenharia, computação e

outras.

É uma história de invenções de médicos que transferem seus protótipos para

pequenas empresas, e estas para as grandes companhias se o equipamento obtiver

sucesso. Estas, por sua vez, registram a patente e submetem-se à regulação.

Contudo, esse tipo de tecnologia não sofre o mesmo tipo de normatização que as

drogas e, em alguns países, segue à margem de qualquer controle. Os Estados

Unidos, por exemplo, têm um programa que regula todos os equipamentos segundo

sua eficácia e segurança, e países como Canadá, Japão e Holanda investigam

minuciosa e rigorosamente a tecnologia.

No Brasil, a tarefa de regulação dessa tecnologia tem sido atribuída à Secretaria

Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, que regulamenta as

condições de registro e aprovação dos correlatos, que são aprovados para o

mercado após análise da documentação apresentada pela empresa e da certificação

de conformidade, expedida geralmente por instituições conveniadas ligadas a

universidades, que realizam avaliação por amostragem dos equipamentos ou

dispositivos.

Portarias mais recentes do Ministério da Saúde dispõem sobre os padrões técnicos

a serem seguidos na fabricação dos equipamentos, ou para sua importação,

referenciando padrões nacionais [Normas Técnicas Brasileiras (ABNT)] e

internacionais [ISO (International Standards Organization) e IEC (International

Eletrothecnical Comission)], bem como instituem programas de garantia de

qualidade envolvendo a avaliação de equipamentos e procedimentos, o que

representa um passo importante nas formas de atuação da Vigilância Sanitária

acerca da avaliação de tecnologia.

4. As organizações médicas e de apoio, que se incluem na definição de tecnologia

médica ou de saúde, em vários países estão sujeitas, em modalidades diferentes, à

regulação por órgãos do governo; no Brasil, essa tarefa cabe à Vigilância Sanitária.

Os profissionais da saúde, por intermédio de seus conselhos de classe, são

Page 29: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

licenciados para exercer a profissão e, no caso dos médicos, são certificados quanto

às especialidades.

Há ainda os mecanismos privados de regulação, que são os sistemas de

acreditação, a cargo de comitês de especialistas ou sociedades, que estabelecem

os critérios técnicos para a avaliação de qualidade, e a certificação das instituições

de saúde é dada de acordo com o cumprimento desses parâmetros.

A Vigilância Sanitária exerce controle nesse âmbito através das normatizações e

fiscalização, com base no que está oficialmente reconhecido como científico,

consagrado e legalmente fundamentado. A Vigilância Sanitária tem sido responsável

pelo registro de produtos, dispositivos e equipamentos médicohospitalares,

licenciamento de estabelecimentos de produção de medicamentos e outros insumos

e de prestação de serviços de saúde, com fundamentação em padrões

determinados e consagrados por normas técnicas nacionais ou internacionais, que

representam o consenso técnico-científico, expressados em normas legais

elaboradas em grande parte por ela.

Contudo, ela não tem exercido um papel direto no acompanhamento do processo de

validação ou do ciclo de vida de uma determinada tecnologia, desde o seu

desenvolvimento e validação, e por referência até às necessidades da população.

Muitas vezes ela é criticada por realizar avaliações formais ou burocráticas, e com

razão, pois com certeza têm baixo impacto. Idealmente, os processos de adoção

dos vários tipos de tecnologia devem se concentrar na avaliação de eficácia e

segurança, custo e efetividade. Também devem considerar a relação com as

necessidades de saúde. Relação que nem sempre tem sido clara.

Em alguns países do Primeiro Mundo, essa tarefa cabe a comissões

governamentais ou órgãos próprios responsáveis por ciência e tecnologia em saúde

para avaliar e validar a introdução de novas tecnologias.

A parcela hoje atinente à prática da vigilância sanitária pressupõe que algum órgão

já tenha validado as tecnologias, restando a ela, nesse campo, a formalização

oficial, autorização dos produtos e correlatos e a observação das condições técnicas

de funcionamento das organizações de saúde ou daquelas que fabricam ou

Page 30: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

comercializam produtos relacionados à saúde. Seu método, em geral, é a

observação por referência a tecnologias aceitas. Ao detectar um procedimento sem

comprovação científica, cabe a ela tomar providências, referenciando- se ao que

está fundamentado em lei.

Contudo, a estruturação desse campo está por ser feita e exige uma redefinição das

políticas de vigilância sanitária e ciência e tecnologia.

A Vigilância Sanitária no contexto do SUS

O Estado Brasileiro organizado sob a forma de Federação caracteriza-se por uma

reunião indissolúvel de Estados e um poder central, denominado União. A repartição

de competências entre a União, o Distrito Federal, os Estados-membros e os

Municípios, ocorre de acordo com o estabelecido pela Constituição Federal de 1988,

que define:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e

econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao

acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e

recuperação.

A Lei Orgânica da Saúde, Lei 8080/90, no seu artigo segundo, define "Saúde" como

"um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições

indispensáveis para o seu exercício".

Após o ordenamento jurídico das Leis 8.080/90 e 8.142/90, iniciou-se o processo de

descentralização da atenção à saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, SUS.

Este ordenamento reivindica a descentralização das políticas sociais e de saúde

visando à completa democratização e integração das instituições e à diminuição da

distância entre centros decisórios e cidadãos.

A respeito da Vigilância Sanitária, cada esfera de Governo tem uma competência e

cabe aos municípios a execução de todas as ações, desde que assegurados nas

leis federais e estaduais. Esse é o processo chamado de municipalização das ações

de VISA, onde está previsto que o Estado e a União devem atuar em caráter

Page 31: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

complementar quando o risco epidemiológico, a necessidade profissional e a

necessidade tecnológica assim exigirem.

A perspectiva da descentralização / municipalização aparece, nesse contexto, como

um instrumento adequado para o uso e a redistribuição mais eficiente dos escassos

orçamentos públicos e para busca de maior eficiência e resolutividade dos serviços

prestados.

O princípio da descentralização nos diz que, quanto mais próximo do problema

estiver a possível solução, mais rapidamente ele será combatido e eliminado.

Considerando o caráter regional das ocorrências, entende-se que o município é

quem melhor conhece seus problemas.

Sendo assim, as tomadas de decisão e ações devem ser priorizadas no âmbito dos

municípios, entendendo que a municipalização possibilita a construção e

fortalecimento da vigilância com impacto direto na estruturação e operacionalização

do SUS.

 

Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, SNVS.

A Lei nº. 9.782/99 criou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, ANVISA, e

definiu o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, SNVS.

A ANVISA tem por finalidade institucional:

Promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da

produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância

sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a

eles relacionados, bem como o controle de portos, aeroportos e fronteiras.

A partir da criação da ANVISA, iniciou-se o processo de reestruturação e

organização das ações de Vigilância Sanitária no Brasil visando o estabelecimento

dos focos de observação da realidade sanitária, direcionados para a identificação da

relação dinâmica e associada à interação entre produtos e / ou serviços de saúde

aos seus consumidores, no âmbito da pós–comercialização.

Page 32: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

A complexidade do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, SNVS, e suas

interfaces:

No estabelecimento e fortalecimento da relação sistêmica, com vistas à

consolidação do Sistema de Vigilância Sanitária, um dos maiores desafios é o

estabelecimento da avaliação de riscos à saúde, principalmente associados a novas

e emergentes tecnologias, relativas a substâncias, aparelhos e /ou equipamentos

(produtos destinados aos cuidados de saúde), ou associadas aos serviços de saúde

(atenção e assistência à saúde).

A observação e avaliação de riscos são de fundamental importância, diante do

processo de intensa transformação do perfil produtivo e de consumo de bens e

serviços destinados a promover e proteger a saúde. Sendo assim, as ações

baseadas na precaução e prevenção em saúde despontam como prioritárias, para o

Sistema de Vigilância Sanitária.

Diante do caráter de atuação preventiva, necessidade de avaliação e emergência da

identificação de riscos, vêm sendo utilizados princípios do direito sanitário que

possibilitam e fundamentam as tomadas de decisão, particularmente quanto à

aplicação diferenciada entre os princípios da Precaução e da Prevenção.

Page 33: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

O princípio de precaução pode ser invocado sempre que seja necessária uma

intervenção urgente em face de um possível risco para a saúde humana, animal ou

vegetal, ou para a proteção do ambiente, quando as evidências científicas, ainda

não permitam uma avaliação completa do risco.

Este princípio não deve ser utilizado como pretexto para ações protecionistas, sendo

aplicado, sobretudo, para os casos de saúde pública, porquanto permite, por

exemplo, impedir a distribuição ou mesmo a retirada do mercado de produtos

susceptíveis de ser perigosos para a saúde.

Existem diferenças entre os conceitos de precaução e de prevenção. A prevenção

está associada à riscos conhecidos e já bem identificados, o conceito de precaução

está relacionado aos riscos desconhecidos e que ainda precisam ser melhor

conhecidos e / ou identificados pela sociedade. Neste sentido, o conceito de

precaução possui uma amplitude maior que o da prevenção.

Para a implementação de ações no Sistema de Vigilância Sanitária, como parte da

garantia da segurança sanitária, o monitoramento da qualidade dos bens e produtos

destinados à saúde na pós-comercialização tornou-se uma vertente fundamental.

 Carlos Chagas

Carlos Justiniano Ribeiro Chagas (Oliveira, 9 de julho de 1878 — Rio de Janeiro, 8

de novembro de 1934) foi um médico sanitarista, cientista e bacteriologista

brasileiro, que trabalhou como clínico e pesquisador. Atuante na saúde pública do

Brasil, iniciou sua carreira no combate à malária. Destacou-se ao descobrir o

protozoário Trypanosoma cruzi (cujo nome foi uma homenagem ao seu amigo

Oswaldo Cruz) e a tripanossomíase americana, conhecida como doença de Chagas.

Ele foi o primeiro e o único cientista na história da medicina a descrever

completamente uma doença infecciosa: o patógeno, o vetor (Triatominae), os

hospedeiros, as manifestações clínicas e a epidemiologia.

Foi diversas vezes laureado com prêmios de instituições do mundo inteiro, sendo as

principais como membro honorário da Academia Brasileira de Medicina e doutor

Page 34: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

honoris causa da Universidade de Harvard e Universidade de Paris. Também

trabalhou no combate à leptospirose e às doenças venéreas, além de ter sido o

segundo diretor do Instituto Oswaldo Cruz.

Infância e juventude

Carlos Justiniano Ribeiro Chagas nasceu no município de Oliveira, Minas Gerais, em

9 de julho de 1878, filho de José Justiniano Chagas e Mariana Cândida Ribeiro de

Castro Chagas. O lugar de seu nascimento foi na Fazenda Bom Retiro, onde seus

antepassados, de ascendência portuguesa, se enraizaram.

Seu pai, cafeicultor, morreu quando tinha quatro anos de idade, ficando a cargo de

sua mãe a administração do cultivo de café e da criação dele e de seus outros

quatro irmãos: Maria Rita, José (que morreu com três anos de idade), Marieta e

Serafim. Eles vão morar em outra propriedade da família, a Fazenda Boa Vista,

próxima a Juiz de Fora, também no estado de Minas Gerais.

Em Oliveira, teve convivência direta com três tios maternos, Cícero, Olegário e

Carlos. Os dois primeiros eram advogados formados em São Paulo e incentivaram o

sobrinho a se dedicar aos estudos. Porém, o último, era formado em Medicina e

organizou uma casa de saúde na cidade. As ações desse tio o influenciaram para

seguir a carreira médica.

Aos oito anos de idade e já alfabetizado, foi matriculado no Colégio São Luís,

dirigido por jesuítas, em Itu, interior de São Paulo, mas foge do internato em 1888,

para ir ao encontro da mãe, em Juiz de Fora, ao saber que os escravos recém-

libertados estariam depredando fazendas. A punição para essa fuga foi a expulsão

de Chagas do Colégio pelos padres jesuítas.

Após encerrar os estudos secundários, Chagas ingressou no curso preparatório para

a Escola de Minas de Ouro Preto por vontade de sua mãe, que gostaria de vê-lo

formado em Engenharia. Aí, com a companhia de colegas do curso, aderiu a vida

boêmia. Adoentado, em 1896, depois de reprovado nos exames, volta para Oliveira.

Page 35: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Estudos

Carlos Chagas e seus filhos, Evandro Chagas e Carlos Chagas Filho.

Durante o tempo de recuperação em sua cidade-natal, seu tio Carlos fortaleceu a

vontade de Chagas em ser médico e ajudou-o a vencer a barreira de sua mãe, que

acabou aceitando a opção de seu filho. Seguiu então para São Paulo, para obter os

diplomas básicos exigidos para matrícula no curso médico. Conseguindo tal

certificado, em fevereiro de 1897, segue para o Rio de Janeiro a fim de entrar à

Faculdade de Medicina.

Aos 18 anos, passou a cursar a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, onde este

mesmo tio trabalhava, em abril de 1897. Tal faculdade vivia uma "revolução

pasteuriana", pois havia adquirido as teses de Louis Pasteur e estava passando por

um processo de renovação. Chagas, assim, também leva essas idéias adiante em

seu trabalho. Ao longo do curso, dois professores exerceram grande influência em

sua carreira: Miguel Couto, que apresentou a Chagas as noções e as práticas da

clínica moderna e com quem passaria a ter uma estreita amizade; e Francisco

Fajardo, que colocou Chagas no estudo de doenças tropicais, especialmente da

malária, e que seria de grande importância para sua futura carreira. Assim, esses

dois professores apresentaram os dois caminhos que se abriram para Chagas no

decorrer de seu curso médico: a clínica e a pesquisa científica.

Page 36: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Concluído o curso, em 1902, para elaborar sua tese (pré-requisito para o exercício

da medicina), dirigiu-se ao Instituto Soroterápico Federal, na fazenda de

Manguinhos, levando uma carta de apresentação de seu professor, Miguel Couto, a

Oswaldo Cruz, diretor do Instituto, onde teve seu primeiro contato com aquele que

veio a trabalhar, ser seu grande mestre e tornar-se amigo.

Aceito e orientado por Oswaldo Cruz, Chagas começou a trabalhar no Instituto

Soroterápico Federal (que após 1908 passou-se a chamar Instituto Oswaldo Cruz) e

elege como tema de sua tese o ciclo evolutivo da malária na corrente sangüínea.

Assim, em março de 1903, estava concluído a sua tese, o "Estudo Hematológico do

Impaludismo" e em maio do mesmo ano terminou seus estudos. Oswaldo Cruz, que

assumiu simultaneamente a direção de Manguinhos e a Diretoria Geral de Saúde

Pública, nomeou Chagas como médico do instituto, cargo que foi recusado por

preferir, em 1904 trabalhar como clínico no Hospital de Jurujuba, em Niterói. Nesse

ano instalou seu laboratório particular no Rio de Janeiro e casou-se com Íris Lobo,

que dessa união nasceriam seus dois filhos, Evandro (em 1905) e Carlos Filho (em

1910); ambos seguiriam a carreira médica do pai.

Carreira: Combate à malária

Devido à tese de doutorado sobre a malária, em 1901 foi recrutado por Cruz para

missão de controlar a doença em Itatinga, interior de São Paulo, que atacava a

maioria dos trabalhadores da Companhia Docas de Santos, que construía uma

represa na região, causando a paralisação das obras. Assim, realizou a primeira

ação bem-sucedida contra a malária no Brasil, colocando em prática procedimentos

que mais tarde se tornariam corriqueiros nas outras campanhas.

Segundo ele, para se impedir a propagação da doença em regiões em que não

havia ações sistemáticas de saneamento, fazia-se necessário concentrar as

medidas preventivas nos locais onde viviam os homens e os mosquitos infectados

com o parasito da malária. Seguindo tal orientação, em cinco meses Chagas

consegue debelar o surto da doença - fato que serviu de base para o efetivo

combate à moléstia no mundo inteiro.

Page 37: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

De volta ao Rio de Janeiro, Chagas continuou servindo a Diretoria Geral de Saúde

Pública e, em 19 de março de 1906, transferiu-se para o Instituto Oswaldo Cruz. Foi

solicitado, no ano seguinte, pela Diretoria Geral, a organizar o saneamento na

Baixada Fluminense, onde estava acontecendo obras para a captação e

bombeamento de água ao Rio de Janeiro. Junto com Arthur Neiva, seguiu para

Xerém, e os resultados positivos que conseguiu nessa obra confirmaram a sua

teoria da infecção domiciliar da malária.

Doença de Chagas

Trypanosoma cruzi.

Ciclo de vida do Trypanosoma cruzi.

Page 38: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Em junho de 1907 Chagas foi enviado pelo Instituto à cidade de Lassance, Minas

Gerais, perto do Rio São Francisco, para combater uma epidemia de malária entre

os trabalhadores de uma nova linha de trem da Estrada de Ferro Central do Brasil,

instalando-se durante dois anos num vagão de trem, montando um pequeno

laboratório e um consultório para atendimento dos doentes.

Neste tempo, capturou, classificou e estudou os hábitos dos anofelinos, mosquitos

transmissores da doença, e examinou o sangue de animais em busca de parasitas.

Assim, Chagas identificou no sangue de um sagüi uma nova espécie de protozoário,

ao qual deu o nome de Trypanosoma minasensis. Um engenheiro da ferrovia

alertou-o para a infestação de um inseto hematófago nas residências rurais, da

espécie Triatoma infestans, conhecido como barbeiro, assim chamado porque suga

o sangue das pessoas durante a noite, atacando o rosto delas. Chagas levou alguns

deles ao seu laboratório e percebeu que nos seus intestinos havia outros

Trypanosoma minasensis, já numa fase evoluída.

Por Lassance não ter condições para uma pesquisa mais aprofundada, enviou

alguns exemplares de barbeiros para Cruz, pedindo que os alimentasse em sagüis.

Um mês depois, foi comunicado da presença de tripanossomos no sangue dos

animais. Voltou ao Rio de Janeiro para confirmar a pesquisa, e descobriu que não se

tratava dos Trpanosoma minasensis, mas de uma nova espécie. Chagas chamou

esse novo parasita de Trypanosoma cruzi; mais tarde batizou de Schizotrypanum

cruzi, em homenagem a Oswaldo Cruz.

Retornando a Lassance, Chagas suspeitava que o parasita poderia causar algum

mal aos outros animais e aos humanos, visto que o barbeiro estava sempre em

lugares freqüentados por pessoas e o hábito desse inseto em mordê-las. Recolheu

amostras de sangue de um gato infectado em 14 de fevereiro de 1909 e, em 23 de

abril do mesmo ano, descobriu o Trypanosoma em uma menina de três anos,

chamada Berenice, que apresentava febre e anemia. Tal tripanossoma foi o

segundo descoberto a causar uma doença, a tripanossomíase americana, pois até

então o único confirmado é o causador da doença do sono, ou tripanossomíase

africana, transmitida pela picada da mosca tsé-tsé.

Page 39: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Também observou inclusões parasitas no cérebro e no miocárdio dela, que

poderiam explicar algumas manifestações clínicas em pessoas doentes. Para

completar seu trabalho sobre a patologia da nova doença, o cientista descreveu 27

casos de formas agudas e realizou mais de cem autópsias de pacientes que tinham

a forma crônica da doença. Se concluiu, então, o ciclo da doença, tendo identificado

o vetor (barbeiro), o agente causal (Trypanosoma cruzi), o reservatório doméstico

(gato), a doença nos humanos (o caso de Berenice) e suas complicações. Ao longo

da pesquisa, Chagas propôs algumas complicações da doença que, mais tarde,

mostraram-se equivocadas. Exemplo disso foi ao anunciar que o bócio era um

sintoma da tripanossomíase americana. O trabalho que Chagas realizou foi o

primeiro e o único na história da medicina, descrevendo completamente a nova

doença infecciosa: anatomia patológica, o meio de transmissão (Triatoma infestans),

etiologia, suas formas clínicas e sua epidemiologia.

Chagas também foi o primeiro a descobrir o gênero Pneumocystis, um fungo

parasita nos pulmões dos animais experimentalmente infectados com tripanossoma.

Nessa altura ele não o reconheceu como um organismo distinto e portanto ele

descreveu o gênero Schizotrypanum de modo a acomodar ambos os ciclos de vida,

que ele ilustrou. Porém, a sua descoberta levou outros a aprofundar a investigação e

descrever Pneumocystis como um gênero distinto, que agora é reconhecido como

um fungo. Chagas, seguia atentamente a literatura e rapidamente confirmou a

distinção, pelo que novamente adotou o nome Trypanosoma cruzi que havia

originalmente cunhado. Pneumocystis é agora associado a uma outra doença, PCP

ou pneumocistose , causada por uma espécie (P. jirovecii), mas a espécie original

de Pneumocystis, observada por Chagas em espécies de porquinho-da-Índia, não

foi ainda nomeada como uma espécie separada.

Repercussão da descoberta

A descoberta da doença foi levada ao conhecimento da comunidade científica

através de uma nota prévia escrita por Chagas em 15 de abril de 1909 e publicada

na Revista Brasil-Médico em 22 de abril. No mesmo dia, Oswaldo Cruz anunciou

formalmente a Academia Nacional de Medicina, que decidiu levar a Lassance uma

Page 40: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

comissão para verificar o trabalho. Miguel Couto, presidente da comissão, sugeriu

que a nova doença se chamasse doença de Chagas, mas o próprio Carlos Chagas

preferia chamar a doença como tripanossomíase americana.

Na Europa o trabalho teve repercussão em revistas científicas, em especial na

Alemanha e na França, pois esses países tinham interesses em doenças tropicais,

visto que a tripanossomíase africana vinha prejudicando o plano imperialista em tal

continente.

Em agosto de 1909 Chagas publicou o primeiro volume da revista do Instituto de

Manguinhos, Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, um estudo completo sobre a

doença de Chagas e o ciclo evolutivo do protozoário que causa da doença. Esse

trabalho garantiu a ascensão do cientista na instituição, sendo promovido a "chefe

de serviço" em março de 1910.

Em 26 de outubro de 1910, a Academia Nacional de Medicina reconheceu

formalmente o trabalho realizado pelo cientista e o recebeu como membro honorário,

já que tal entidade não dispunha de lugares vagos no momento. Nessa solenidade,

Chagas proferiu a primeira conferência sobre a doença. Em 1911 divulgou os

resultados à Sociedade de Medicina e Cirurgia de Minas Gerais e, em agosto, uma

segunda conferência à Academia Nacional de Medicina. Nesse mesmo ano ocorreu

a Exposição Internacional de Higiene e Demografia, em Dresden, Alemanha, onde,

no pavilhão brasileiro, foi mostrado a doença, que despertou grande público. Em

1912 foi a vez da classe médica paulista recebê-lo para uma apresentação sobre a

doença descoberta em Lassance.

O estudo da moléstia avançou nas décadas de 1940 e 1950 através do Instituto

Oswaldo Cruz, no município mineiro de Bambuí.

Page 41: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Expedição à Amazônia

Carlos Chagas (ao centro) na expedição à Amazônia.

Na década de 1910, o Instituto Oswaldo Cruz promoveu viagens científicas no

interior brasileiro, com o objetivo de investigar os problemas médicos do país. Em

1912, com a crise do extrativismo da borracha na Amazônia, o governo federal firma

parceria com a instituição para verificar as condições de salubridade do vale do Rio

Amazonas e elaborar um plano de exploração racional dos recursos naturais.

Assim, em agosto daquele ano, Chagas liderou um grupo que incluía mais dois

cientistas e um fotógrafo, onde visitaram a população ribeirinha dos rios Solimões,

Negro e Purus e analisaram as condições de moradia, abastecimento de água,

esgoto, alimentação e assistência médica. Também realizaram observações clínicas

sobre as epidemias que assolavam a região, em especial a malária. Também foram

recolhidas amostras de plantas de cunho medicinal, insetos causadores de doenças

e peixes foram analisados em busca de novos parasitas.

A expedição encerrou-se em março de 1913, e os resultados encontrados foram

expostos por Chagas em outubro daquele ano, na Conferência Nacional da

Borracha, organizada pelo Senado Federal no Rio de Janeiro. Com tal conferência e

o relatório escrito por Oswaldo Cruz e entregue para o Ministério da Agricultura, foi

possível formar um panorama da situação de abandono social que a região vivia,

sem assistência do Governo Federal. Também foi possível viabilizar o

desenvolvimento econômico da região. Tal expedição foi fundamental para fortalecer

o movimento que, ao longo da década de 1910, buscou alertar o governo para a

Page 42: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

importância do saneamento rural do país e para a necessidade de uma ampla

reforma dos serviços de saúde pública brasileiros.

Gripe espanhola

A gripe espanhola chegou ao Brasil em 1918 e, no Rio de Janeiro, tal enfermidade

atacou dois terços da população (por volta de seiscentos mil habitantes) e fez onze

mil vítimas, devido às precárias condições de higiene e saneamento, além da falta

de assistência médica. Tal quadro fez com que o então presidente da República

Wenceslau Braz convidasse Carlos Chagas a assumir o controle da situação.

Tal ação não foi fácil, pelo fato do próprio estar doente, além de sua mulher e de

seus filhos. Porém, dentre suas atitudes, criou um serviço especial de postos de

atendimento à população em vinte e sete pontos diferentes da cidade. Ao mesmo

tempo que providenciou tal tarefa, criou cinco hospitais emergenciais e publicou

cartazes e panfletos de alerta aos habitantes e buscando apoio de profissionais da

sua área, conseguindo ajuda da maioria dos clínicos cariocas e de vários membros

da Academia Nacional de Medicina.

No Instituto Oswaldo Cruz, incentivou a pesquisa da doença, como causa da

infecção, meio de contágio e diagnóstico. Chagas trabalhou integralmente para o

desaparecimento da doença, em novembro do mesmo ano.

Direção do Instituto Oswaldo Cruz

Page 43: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Carlos Chagas, em recepção ao Presidente da República Epitácio Pessoa e ao Rei

Alberto I da Bélgica no Instituto Oswaldo Cruz.

Três dias após a morte de Oswaldo Cruz, em 14 de fevereiro de 1917, Chagas foi

nomeado para a direção do Instituto de Manguinhos através de um decreto

presidencial. Ao assumir o cargo, buscou consolidar o modelo estabelecido por Cruz

semelhante ao Instituto Pasteur, onde a autonomia administrativa e financeira eram

as características principais, além de estreitar a relação entre a pesquisa, o ensino e

a fabricação de produtos medicinais e veterinários.

No campo da pesquisa, sua administração ficou marcada pela investigação das

principais epidemias que assolavam a zona rural brasileira em sua época, e com o

objetivo de controlá-las, inaugurou em 1918 o Hospital Oswaldo Cruz, nas

dependências do Instituto, para constituir em um centro de estudos para os

pesquisadores do Instituto. Mais tarde, em 1942, o hospital passaria a ser chamado

Hospital Evandro Chagas.

Chagas foi responsável pela criação de seções científicas independentes,

separando-as por áreas de conhecimento, com o intuito de estabelecer uma divisão

de trabalho mais nítida no Instituto. Assim, são instaladas seções de Química

Aplicada, Micologia, Bacteriologia, Zoologia, Anatomia, Protozoologia e Fisiologia.

Quanto ao ensino, o cientista amplia o programa dos Cursos de Aplicação do

Instituto, oferecidos desde 1908 como especialização em Microbiologia.

Na área de produção, Chagas diversificou os medicamentos e produtos fabricados

no Instituto, com a estimulação do comércio dos mesmos e a renda gerada por eles

tornou-se fundamental para o funcionamento da instituição. Uma medida para a

expansão da área de Produção foi a criação do Serviço de Medicamentos Oficiais,

destinado para produzir, entre outros medicamentos, a quinina, usada no combate à

malária. Na década de 1920 o Instituto ficou responsável por verificar o controle de

qualidade dos produtos utilizados na Medicina brasileira, tanto os fabricados em

laboratórios nacionais quanto os importados. Outra iniciativa foi a incorporação do

Instituto Vacinogênio Municipal, ficando a cargo do Instituto Oswaldo Cruz a

fabricação da vacina antivaríola.

Page 44: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Carlos Chagas e equipe do Instituto Oswaldo Cruz, em recepção a Albert Einstein.

Em 1920 a autonomia administrativa do Instituto ficou preservada, mesmo que

estivesse subordinada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores.

Financeiramente, a autonomia assegurou-se graças ao regulamento criado por

Chagas e aprovado em 1919, onde toda a receita gerada por trabalhos realizados

em Manguinhos a pedido de particulares seria dividida igualmente entre a instituição

e os funcionários que os executassem.

Porém, com o aumento das atividades do Instituto, no decorrer da década de 1920,

acarretou num acúmulo de problemas financeiros, além das limitações

orçamentárias agravadas pela crise econômica de 1929. Isso prejudicou o

aperfeiçoamento tecnológico e a manutenção das instalações físicas da instituição,

com uma conseqüente perda da qualidade dos produtos.

Tal quadro se agravou na década de 1930, onde, com a criação do Estado Novo e a

ditadura de Getúlio Vargas, aos poucos pôs-se o fim da autonomia administrativa e

um aumento da intervenção do Estado. A nova ordem política brasileira trouxe

conseqüências diretas a estrutura e o funcionamento de Manguinhos, que, sob a

denominação de Departamento de Medicina Experimental, passou à jurisdição do

recém-criado Ministério da Educação e Saúde. A partir desse momento até a sua

morte, em 1934, Chagas enfrentou os efeitos da perda do modelo institucional criado

por Oswaldo Cruz.

Page 45: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Direção do Departamento Nacional de Saúde Pública

Ao tomar posse em 1919, para reorganizar a Saúde pública nacional, o presidente

Epitácio Pessoa nomeou Carlos Chagas para a então Diretoria Geral de Saúde

Pública (DGSP), acumulando a função com aquela praticada em Manguinhos. Um

ano seguinte tal instituição se chamaria Departamento Nacional de Saúde Pública

(DNSP), ligado ao Ministério da Justiça de Negócios Exteriores.

Sua primeira atitude, exposta na Bilbioteca Nacional em fevereiro de 1921, foi a

centralização das atividades, que até então a DNSP vinha trabalhando com a

descentralização, onde os estados e municípios brasileiros tinham maior liberdade

de organizar seus sistemas sanitários. Acordos com os mesmos foram essenciais

para a segunda ação - a interiorização, em busca da erradicação das epidemias

rurais, principalmente malária, ancilostomose e tripanossomíase americana. Em

paralelo a esse projeto, criou um minucioso de medidas referentes à higiene pública.

Com apoio da Fundação Rockefeller, Chagas criou o Serviço de Enfermagem

Sanitária e, com o desdobramento desse serviço, fundou, em 1923, a Escola de

Enfermagem Anna Nery, introduzindo o ensino profissionalizante de Enfermagem no

Brasil. Os alunos foram instruídos também no Hospital São Francisco de Assis,

fundado também por Chagas para tal finalidade.

Chagas também foi responsável pela criação do primeiro curso de Higiene e Saúde

Pública do Brasil, onde garantia vagas nos cargos federais aos aprovados. Como

diretor da DNSP, representou o país no Comitê de Higiene da Liga da Nações,

associação sediada em Genebra e percussora da Organização Mundial de Saúde

(OMS). O médico permaneceu à frente do órgão até novembro de 1926, ao fim do

mandato do presidente Arthur Bernardes. A DNSP foi transferida para o Ministério

da Educação e Saúde, em função da reforma política do Estado Novo.

Page 46: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Ensino médico

Chagas acreditava que a ciência médica era sustentada por dois pilares: o primeiro

defende uma estreita articulação entre o ensino e a pesquisa. O segundo dá

importância de introduzir nos cursos de Medicina o estudo específico de doenças

tropicais e o combate dos problemas de saúde pública brasileira, como malária,

ancilostomose e tripanossomíase. Com isso, o país teria profissionais qualificados

para tratar dos problemas sanitários.

Em 1925, o Ministério da Justiça e Negócios Exteriores promoveu a refoma na

Educação brasileira, permitindo a Chagas pôr em prática o seu objetivo, criando a

especialização em Higiene e Saúde Pública e a cadeira de Doenças Tropicais na

Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro no ensino médico.

Morte

Carlos Chagas faleceu aos 55 anos de idade, na cidade do Rio de Janeiro. A causa

de sua morte foi um infarto do miocárdio.

Prêmios e homenagens

Frente da nota comemorativa de dez mil cruzados em homenagem a Chagas.

Page 47: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Verso da nota comemorativa de dez mil cruzados em homenagem a Chagas.

Idealizador do Centro Internacional de Leprologia, Carlos Chagas recebeu diversas

homenagens: uma herma na Praia de Botafogo foi construída em sua memória, de

autoria do escultor Modestino Kanto. Um município do estado de Minas Gerais

recebeu seu nome, além de cédulas de Cruzado (depois Cruzado Novo) terem

circulado com sua imagem durante a década de 1980.

Quanto aos prêmios recebidos, em 1912 chegou o primeiro, o Prêmio Schaudinn,

cedido pelo Instituto de Moléstias Tropicais de Hamburgo, Alemanha. Em 1921 foi

nomeado Artium Magistrum, Honoris Causa, da Universidade de Harvard, EUA; em

1923 ganhou o Prêmio Hors-concours, na Conferência Comemorativa sobre o

Centenário de Louis Pasteur, em Estrasburgo, França, e em 1925 o Prêmio Kummel,

da Universidade de Hamburgo, Alemanha. Ainda receberia em 1926, 1929 e 1934

outros títulos Honoris causa, vindos das universidades de Paris, de Lima e Livre de

Bruxelas, respectivamente.

Município de Carlos Chagas - MG .

Page 48: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Recebeu diplomas da Universidade Nacional de Buenos Aires, em 1917; da

Faculdade de Medicina da Universidade de Hamburgo, em 1925; e da Cruz

Vermelha Alemã, em 1932. Foi nomeado membro da Academia Brasileira de

Medicina em 1910, assim que o estudo foi divulgado. Como não havia vagas na

época, foi decretado que ele seria um membro honorário. Também pertenceu à

Société de Patologie Exótique da França (em 1919), à Physicans Club of Chicago

dos EUA (em 1921), à Associação Médica Panamericana (em 1922), da Sociedade

de Artes Médicas das Índias Orientais Neerlandesas (1924), à Academia de

Medicina de New York e à Kaiserlich Deutsch Akademie de Naturforscher zur Halle

(1926), à Real Sociedade de Medicina Tropical e Higiene de Londres (1928) e da

Sociedade de Biologia de Buenos Aires e Academia de Medicina de Paris (1930).

Recebeu o título, em 1920, de Cavaleiro da Ordem da Coroa da Itália; em 1923 de

Comendador da Coroa da Bélgica e de Cavaleiro da Ordem Nacional da Legião de

Honra da França; em 1924 o Grau de Oficial da Ordem de São Thiago, de Portugal;

em 1925 o de Comendador da Ordem de Afonso XII, Espanha, em 1926

Comendador da Ordem de Isabel, a Católica da Espanha e em 1929 Cavaleiro da

Ordem da Coroa da Romênia. Além disso, Carlos Chagas recebeu duas indicações

para o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia, embora não tenha sido laureado, pelo

fato de ter nascido num país de terceiro mundo.

Osvaldo Cruz

Osvaldo Gonçalves Cruz (São Luiz do Paraitinga, 5 de agosto de 1872 — Petrópolis,

11 de fevereiro de 1917) foi um cientista, médico, bacteriologista, epidemiologista e

sanitarista brasileiro.

Foi o pioneiro no estudo das moléstias tropicais e da medicina experimental no

Brasil. Fundou em 1900 o Instituto Soroterápico Nacional no bairro de Manguinhos,

no Rio de Janeiro, transformado em Instituto Oswaldo Cruz, respeitado

internacionalmente.

Page 49: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Biografia

Casa onde nasceu Osvaldo Cruz, em São Luís do Paraitinga, São Paulo.

Filho de cariocas, nasceu no interior de São Paulo. Aos cinco anos, acompanhou a

família no retorno ao Rio de Janeiro. Ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de

Janeiro em 1887, formando-se em 1892. Casou-se aos 20 anos, com jovem de

família rica. Em 1896, estagiou durante três anos no Instituto Pasteur, em Paris,

sendo discípulo de Émile Roux, seu diretor. Voltou ao Brasil em 1899 e organizou o

combate ao surto de peste bubônica registrado em Santos (SP) e em outras cidades

portuárias. Demonstrou que a epidemia era incontrolável sem o emprego do soro

adequado. Como a importação era demorada, propôs ao governo a instalação de

um instituto para fabricá-lo.

Capa da Revista da Semana (outubro de 1904) sobre a Revolta da Vacina.

Page 50: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Foi então criado o Instituto Soroterápico Federal (1900), cuja direção assumiu em

1902.

Diretor-geral da Saúde Pública (1903), nomeado por José Joaquim Seabra, Ministro

da Justiça, e pelo Presidente Rodrigues Alves, coordenou as campanhas de

erradicação da febre amarela e da varíola, no Rio de Janeiro. A nomeação foi uma

surpresa geral. Organizou os batalhões de "mata-mosquitos", encarregados de

eliminar os focos dos insetos transmissores. Convenceu Rodrigues Alves a decretar

a vacinação obrigatória, o que provocou a rebelião de populares e da Escola Militar

(1904) contra o que consideram uma invasão de suas casas e uma vacinação

forçada, o que ficou conhecido como Revolta da Vacina. A cidade era uma das mais

sujas do mundo, pois dos boletins sanitários da época se lê que a Saúde Pública em

um mês vistoriou 14.772 prédios, extinguiu 2.328 focos de larvas, limpou 2.091

calhas e telhados, 17.744 ralos e 28.200 tinas. Lavou 11.550 caixas automáticas e

registos, 3.370 caixas d´água, 173 sarjetas, retirando 6.559 baldes de lixo e dos

quintais de casas e terrenos 36 carroças de lixo, gastando 1.901 litros de petróleo

(são dados do livro indicado abaixo, de Sales Guerra). Houve um momento em que

foi apontado como «inimigo do povo», nos jornais, nos discursos da Câmara e do

Senado, nas caricaturas e nas modinhas de Carnaval. Houve uma revolta,

tristemente célebre como a revolta do quebra-lampeão, em que todos foram

quebrados pela fúria popular, alimentada criminosamente durante meses pela

demagogia de fanáticos e ignorantes.

Premiado no Congresso Internacional de Higiene e Demografia, em Berlim (1907),

deixou a Saúde Pública (1909).

Dirigiu a campanha de erradicação da febre amarela em Belém do Pará e estudou

as condições sanitárias do vale do rio Amazonas e da região onde seria construída a

Estrada de Ferro Madeira-Mamoré.

Em 1916, ajudou a fundar a Academia Brasileira de Ciências e, no mesmo ano,

assumiu a prefeitura de Petrópolis. Doente, faleceu um ano depois, não tendo

completado o seu mandato. O mundo inteiro lamentou sua morte no dia, com mais

de que um minuto de silêncio.

Page 51: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Homenagens

Nota de 50 mil cruzeiros (anverso).

Na cidade do Rio de Janeiro, uma estação de trem, uma avenida, um bairro e

diversas escolas têm o nome de Osvaldo Cruz, além do instituto soroterápico (atual

Fundação), por ele fundado. Um município do estado de São Paulo também tem o

seu nome.

Em 1909, quando Carlos Chagas descobriu o protozoário causador da

tripanossomíase americana (popularmente conhecida como "doença de Chagas")

batizou-o com o nome de "Trypanosoma cruzi", em homenagem a Osvaldo Cruz.

Homenageado na capital de São Paulo, com o logradouro Praça Oswaldo Cruz, no

início da Avenida Paulista.

Em 1913 foi fundado o Centro Acadêmico Oswaldo Cruz, entidade representativa

dos estudantes de medicina da Faculdade de Medicina da Universidade de São

Paulo (FMUSP).

Em 1936 o sanitarista teve a sua efígie cunhada na moeda brasileira de 400 réis, e,

em 1986, impressa nas notas de Cz$ 50,00 (cinqüenta cruzados). A partir de 1989,

essas notas passaram a valer cinqüenta centavos de cruzados novos.

Em 1983, a Marinha do Brasil homenageou-o com o NAsH Oswaldo Cruz (U-18),

que opera nos rios da Amazônia a partir da cidade de Manaus.

Em 2001, Bruno Giordano fez o papel de Osvaldo Cruz em Sonhos Tropicais, de

André Sturm.

Page 52: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Em 2003, Marcos Palmeira interpretou o sanitarista no curta metragem de Silvio

Tendler Oswaldo Cruz – O Médico do Brasil.

Academia Brasileira de Letras

Oswaldo Cruz é o segundo ocupante da cadeira 5 na Academia Brasileira de Letras,

eleito em 11 de maio de 1912, na sucessão de Raimundo Correia e recebido pelo

acadêmico Afrânio Peixoto em 26 de junho de 1913.

Adolfo Lutz

Adolfo Lutz (Rio de Janeiro, 18 de dezembro de 1855 — Rio de Janeiro, 6 de

outubro de 1940) foi um médico e cientista brasileiro, pai da medicina tropical e da

zoologia médica no Brasil. Pioneiro na área de epidemiologia e na pesquisa de

doenças infecciosas.

Trajetória profissional

Estudou medicina na Suíça, graduando-se em 1879 na Universidade de Berna.

Depois de graduado, foi estudar técnicas de medicina experimental em vários

centros médicos de Londres (Inglaterra - onde estudou com Joseph Lister, 1827-

1921); Leipzig (Alemanha); Viena (Áustria); Praga (República Checa) e Paris

(França - onde estudou com Louis Pasteur, 1822–1895).

Retornou ao Brasil em 1881. Lutz inicialmente trabalha como clínico geral em

Limeira (São Paulo) por seis anos. Desejando seguir em pesquisas médicas, ele

retorna para Hamburgo (Alemanha), onde mais uma vez irá trabalhar com Paul

Gerson Unna (1850-1929), especializando em doenças infecciosas e em medicina

tropical. Com o aumento de sua fama, ele foi convidado para assumir o cargo de

diretor do Hospital Kalihi no Havaí, onde fez sua pesquisa sobre hanseníase. Depois

disso, ele trabalhou por um período na Califórnia (Estados Unidos), antes de retornar

para o Brasil em 1892, atendendo ao convite do governador de São Paulo para

dirigir o Instituto de Bacteriologia (mais tarde, este instituto irá se chamar Instituto

Page 53: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Adolfo Lutz em sua homenagem). A cidade de Santos (São Paulo) sofreu uma

severa epidemia de peste bubônica, e Lutz foi trabalhar com outros dois jovens

médicos brasileiros, Emílio Ribas e Vital Brazil. Lutz e Brazil tornariam-se amigos,

sendo que este daria suporte às pesquisas pioneiras de Vital Brazil sobre antídotos

para picadas de cobra, contribuindo decisivamente para a criação de outro instituto

de pesquisa (Instituto Butantan) em São Paulo, totalmente devotado para essa linha

de pesquisa.

Aedes aegypti

Lutz foi o primeiro cientista latino-americano a estudar e confirmar os mecanismos

de transmissão da febre amarela pelo Aedes aegypti, uma espécie de mosquito que

é um reservatório natural e vetor dessa doença. Lutz foi o responsável pela

identificação do blastomicose sul-americano. Sua dedicação à saúde pública fez

com que lutasse e pesquisasse sobre várias epidemias de diversas regiões do

Brasil, como a cólera, peste bubônica, febre tifóide, malária, ancilostomíase,

esquistossomose e leishmaniose.

Outras de suas maiores realizações foi seu pioneirismo sobre a Entomologia Médica

e as propriedades terapêuticas das plantas Brasileiras. Como zoologista, ele

descreveu várias novas espécies de anfíbios e insetos, como o Anopheles lutzii

(uma espécie de mosquito).

Depois da aposentadoria em 1908, Dr. Adolfo Lutz mudou-se para a Cidade do Rio

de Janeiro, onde trabalhou por mais 32 anos, até a morte em 6 de outubro de 1940,

no Instituto Oswaldo Cruz.

A filha, Bertha Lutz (1894-1976) foi uma importante zoóloga, feminista e política

brasileira.

Page 54: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Vital Brazil

Vital Brazil Mineiro da Campanha (Campanha, 28 de abril de 1865 — Rio de Janeiro,

8 de maio de 1950) foi um importante médico imunologista e pesquisador biomédico

brasileiro, de renome internacional.

Vida e obra

Filho de José Manuel dos Santos Pereira e de Maria Carolina Pereira de Magalhães

foi casado em primeiras núpcias com sua prima em primeiro grau, Maria da

Conceição Filipina de Magalhães, viúvo da primeira, casou-se, então, com Dinah

Carneiro Vianna. Pelo ramo de sua mãe - os Pereiras de Magalhães - Vital tinha

consangüinidade com o protomotor da Independência do Brasil, Joaquim José da

Silva Xavier, o Tiradentes, e era, ainda, sobrinho neto materno do Professor Major

Joaquim Leonel Pereira de Magalhães,que foi, igualmente, avô paterno da primeira

mulher de Vital - Maria da Conceição Filipina de Magalhães. Vital foi tio do célebre

empresário e mecenas das artes Oscar Americano de Caldas Filho, mais conhecido

por Oscar Americano.

Um aspecto inusitado em sua família foi o fato de José Manoel, seu pai, haver

abolido completamente o seu sobrenome em seus filhos, criando, para substituí-lo,

outros com características quase que exclusivamente toponímicas e receberam, no

Cartório do Registro Civil, os seguintes nomes: Vital Brazil Mineiro da Campanha -

Maria Gabriela do Vale do Sapucai - Iracema Ema do Vale do Sapucai - Judith

Parazita de Caldas - Acacia Sensitiva Indígena de Caldas - Oscar Americano de

Caldas (pai do Oscar acima) - Fileta Camponeza de Caldas - Eunice Peregrina de

Caldas; conforme relata o seu filho, Lael Vital Brazil, as paginas 15 e 16, do livro de

sua lavra - "Vital Brazil Mineiro da Campanha, uma genealogia brasileira".

Vital Brazil é mundialmente conhecido pela descoberta da especificidade do soro

antiofídico, dos soros específicos contra picadas de aranha, do soro antitetânico e

antidiftérico e do tratamento para picada de escorpião.

Page 55: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Estudou medicina na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em meio a grandes

dificuldades financeiras, vindo a formar-se com brilhantismo em 1891. Retornando a

São Paulo clinicou em várias cidades do interior do Estado. Presenciou durante essa

época a morte de várias pessoas mordidas por serpentes, principalmente

lavradores.

Ele era médico sanitarista, que atuou em frentes diversificadas: participou das

brigadas de combate contra a febre amarela e a peste bubônica em várias cidades

no Estado de São Paulo e coincidentemente, algumas décadas mais tarde seu primo

- pelo ramo Pereira de Magalhães - Dr. Adhemar Paoliello, igualmente formado pela

Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, médico da The Rockefeller Foundation,

se dedicaria, também como sanitarista, ao mesmo ideal de combater a febre

amarela e a peste bubônica, no Brasil e no exterior. Criou uma das primeiras escolas

do Brasil que alfabetizavam crianças de dia e adultos à noite; desenvolveu materiais

de informação sobre como se proteger das cobras e outros animais peçonhentos

para as pessoas do campo; inventou uma caixa de madeira barata e segura para

que os fazendeiros pudessem capturar as cobras e firmou convênios com as

estradas de ferro para transportá-las, pois eram essenciais à fabricação do soro.

O convite do governo estadual, Vital Brazil ingressou em 1897 no Instituto

Bacteriológico do Estado de São Paulo, dirigido pelo sábio Adolfo Lutz. Foi então

que tiveram início suas pesquisas. Vital Brazil trabalhou junto com Oswaldo Cruz e

Emílio Ribas no combate a peste bubônica, ao tifo, a varíola, e à febre amarela.

Recebeu do governo de Rodrigues Alves a Fazenda Butantan, às margens do Rio

Pinheiros, São Paulo, que viria a se tornar posteriormente o Instituto Butantan.

Foram aí desenvolvidos trabalhos, sem tréguas, num ambiente desprovido de

recursos. Os primeiros tubos de soro antipestoso começaram a ser entregues após

quatro meses de trabalho.

Em 1903 surgiu o soro antiofídico (Piroplasma vitalli), parasita no sangue dos cães.

Após este evento outros soros foram produzidos no Instituto Butantan. As vacinas

produzidas também serviam em combate ao tifo, varíola, tétano, psitacose,

disenteria bacilar e BCG. As sulfuras e as penicilinas vieram mais tarde. As picadas

de aranhas venenosas, escorpião e lacraias deram origem a novos soros.

Page 56: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Freqüentou por longo tempo o Instituto Pasteur. Também é o fundador do Instituto

Vital Brazil, em Niterói.

A importância da especificidade

A descoberta de Vital Brazil sobre a especificidade dos soros antipeçonhentos

estabeleceu um novo conceito na imunologia, e seu trabalho sobre a dosagem dos

soros antiofídicos gerou tecnologia inédita. A criação dos soros antipeçonhentos

específicos e o antiofídico polivalente ofereceu à Medicina, pela primeira vez, um

produto realmente eficaz no tratamento do acidente ofídico que, sem substituto,

permanece salvando centenas de vidas nos últimos cem anos.

Consagrado em congresso científico nos Estados Unidos em 1915, o seu trabalho

logo despertou o interesse da Europa, onde se encontrava a vanguarda da pesquisa

médica da época, e lhe valeu o reconhecimento mundial. O Instituto Butantan

representa um marco na ciência experimental brasileira. Desenvolvendo significativo

número de pesquisas de elevado teor cientifico, educando as populações rurais na

adoção do tratamento e na prevenção de acidentes ofídicos e criando aquela que

foi, possivelmente, a primeira escola de alfabetização de adultos, esse Instituto

desempenhou importante papel social na época e tornou-se conhecido e famoso no

mundo todo.

Instituto Butantan

Vital Brazil foi o criador do Instituto Butantan, em São Paulo, que foi instalado em

uma fazenda antiga e distante da cidade, comprada pelo governo do estado de São

Paulo para que lá funcionasse um laboratório para a produção de vacinas.

O documento de compra da fazenda tem a data de 24 de dezembro de 1899. A

partir desse começo precário e difícil, o Instituto cresceu rapidamente. Em 1901 já

produzia os soros antipestoso e antiofídico, daí ter recebido o nome de Instituto

Serunterápico do Estado de São Paulo. Em 1925, passou a se chamar Instituto

Butantan.

Page 57: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

O Instituto continua um centro de referência e excelência, em diversas áreas

científicas.

Vital Brazil em 1911.

Instituto Vital Brazil

Após deixar a direção do Instituto Butantan, em 1919, Vital Brazil foi para o Rio de

Janeiro. Apesar de convidado por Carlos Chagas para trabalhar em Manguinhos

(renomeada FioCruz), resolveu fundar um novo laboratório, por achar que o Brasil

necessitava de mais instituições científicas, onde o estudo e a pesquisa se

ocupassem da solução de seus graves problemas.

Fundou, com o apoio do então Presidente do Estado do Rio de Janeiro, Dr. Raul de

Morais Veiga, o Instituto Vital Brazil em Niterói.

Sua seriedade, perseverança e dedicação fizeram deste Instituto outro importante

centro de pesquisas, único por sua organização em âmbito nacional e reconhecido

internacionalmente como estabelecimento científico pelos trabalhos de valor aí

realizados. Muitos estudantes brasileiros e estrangeiros se iniciaram na carreira de

pesquisadores estagiando nos laboratórios desse Instituto, formador de cientistas.

Page 58: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Emílio Ribas

Emílio Marcondes Ribas (Pindamonhangaba, 11 de abril de 1862 — São Paulo, 19

de fevereiro de 1925) foi um sanitarista brasileiro. Trabalhou no combate a

epidemias e endemias, tendo criado Instituto Butantan entre outros órgãos públicos

de saúde pública.

Biografia

Nasceu em Pindamonhangaba, São Paulo, aos 11 de abril de 1862. Filho de

Cândido Marcondes Ribas e D. Andradina Marcondes Machado Ribas. Faleceu na

cidade de São Paulo, aos 19 de dezembro de 1925.

Diplomou-se em 1887 pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Depois de

formado, retornou a sua terra natal onde se casou com D. Maria Carolina Bulcão

Ribas, seguindo, logo depois, para Santa Rita do Passa Quatro, onde iniciou sua

atividade clínica.

Nomeado Inspetor Sanitário a 11 de setembro de 1895, iniciou sua carreira como

auxiliar do Dr. Diogo Teixeira de Faria, no Desinfetório Central, em 1896. Teve

oportunidade de combater várias epidemias, não só na Capital, mas também no

Interior, principalmente de febre amarela, em Jaú, Rio Claro, Araraquara,

Pirassununga e Campinas.

Promovido a Chefe da Comissão Sanitária de Campinas em 1896, permaneceu até

15 de abril de 1898, data em que foi nomeado Diretor Geral do Serviço Sanitário.

Exerceu o cargo por quase vinte anos consecutivos, tendo-se aposentado em 1917.

Suas principais realizações:

• Foi o pioneiro na luta contra a Febre Amarela no Brasil e na América do Sul;

Page 59: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

• Foi o criador do Instituto Butantan, na época em que a peste invadiu o nosso país

(1899);

• Foi o idealizador de Campos do Jordão, como estância climática, juntamente com

Victor Godinho, em 1911;

• Foi o idealizador do Sanatório de Santo Ângelo, o primeiro com características

mais humanas de assistência aos hansenianos no Brasil;

• Estudou, com critério e segurança, a forma atenuada da Varíola levando os seus

estudos aos grandes centros científicos, onde foram discutidos e acatados;

• Foi criador da Seção de Proteção à Primeira Infância, da Inspetoria Sanitária

Escolar, do Serviço de Profilaxia e Tratamento do Tracoma;

• Reorganizou o Serviço Sanitário, remodelando o Desinfetório Central, o Hospital de

Isolamento, Laboratório de Análises Clinica e Bromatológicas, o Farmacêutico e a

Seção de Engenharia Sanitária.

Experiência da febre amarela

Dr. Emílio Marcondes Ribas já tinha enfrentado a febre amarela na região de

Campinas, no final do século XIX, contando com o apoio do cientista Adolfo Lutz,

então Diretor do Instituto Bacteriológico.

Dr. Ribas publicou, em 1901, o trabalho “O mosquito considerado como agente de

propagação da febre amarela”, que encontrou forte oposição de médicos

importantes de São Paulo.

Em janeiro e fevereiro de 1903, resolveu fazer uma experiência semelhante à

realizada em Cuba. Unindo-se ao médico e amigo Adolfo Lutz e a mais dois

voluntários, Oscar Marques Moreira e Domingos Pereira Vaz, deixaram-se picar por

mosquitos que estiveram em contato com doentes graves de febre amarela.

A experiência ocorreu no interior do Hospital de Isolamento de São Paulo, atual

Instituto de Infectologia Emilio Ribas, sendo o Diretor da época Dr. Cândido

Page 60: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Espinheira e o médico interno Dr. Victor Godinho. Repetiram a experiência com dois

novos voluntários, Januário Fiori e André Ramos, realizando o mesmo procedimento

anterior.

Uma nova experiência foi realizada em abril de 1903, dessa vez, com três imigrantes

italianos, pagos para permanecerem entre secreções e lençóis usados por doentes

com febre amarela. As experiências revestiram-se do maior rigor científico.

As provas foram acompanhadas por médicos que não endossavam essas teses.

Com os resultados desse trabalho se provou:

• A transmissão da febre amarela pela picada de mosquitos infectados por pessoas

atingidas por essa moléstia;

• O não contágio, através do contato com roupas e objetos usados e sujos dos

doentes.

Em 1903, a Memória dessa experiência foi apresentada no 5º Congresso Brasileiro

de Medicina e Cirurgia, onde Dr. Ribas defendeu a tese de que os meios de defesa

válidos para a eliminação da moléstia deviam dirigir-se à eliminação dos mosquitos

vetores e não aos meios apregoados pelos “contagionistas”.

Nesse mesmo ano, a febre amarela é declarada extinta em todo o Estado de São

Paulo.

Homenagem de sua terra - Cinqüentenário da Morte de Emílio Ribas

História

Um dos bravos e incompreendidos sanitaristas brasileiros do fim do século XIX e

início do século XX que, juntamente com Oswaldo Cruz, Adolfo Lutz, Vital Brasil e

Carlos Chagas, lutaram para livrar a cidade e os campos das epidemias e endemias

que assolavam o país. Formou-se pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro

(1887).

Page 61: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Guiado apenas pela intuição, Emílio Ribas combateu a febre amarela, exterminando

com êxito o mosquito transmissor da doença (hoje conhecido por Aedes aegyptii)

nas cidades paulistas de São Caetano, Pirassununga, Pilar, Campinas e Jaú, o que

lhe valeu a nomeação, em 1898, para diretor do Serviço Sanitário do Estado de São

Paulo.

Sofreu forte oposição dos que acreditavam que a doença era transmitida por

contágio entre pessoas e para provar que esta tese estava errada, deixou-se picar

pelo inseto contaminado, junto com os colegas Adolfo Lutz e Oscar Moreira. Foi a

partir da contaminação de Ribas que Oswaldo Cruz empreendeu a eliminação dos

focos de mosquito no Rio de Janeiro.

Ribas foi fundador do Instituto Soroterápico do Butantã, construído numa fazenda

nos arredores de São Paulo, e colaborou para a fundação do Sanatório de Campos

do Jordão para tratamento da tuberculose, além de ter idealizado e construído a

Estrada de Ferro Campos do Jordão.

Em 1902, Emílio Ribas trabalhou em São Simão (São Paulo), para deter a terceira

epidemia de Febre amarela. Só saiu da cidade quando conseguiu com uma equipe

de médicos e voluntários acabar com a grave epidemia, mandando limpar o rio que

corta a cidade, e tomando medidas para melhorar o Saneamento básico na cidade

que, ao chegar, descreveu-a de forma pouco lisonjeira: 530 prédios, mal

construídos, 90% sem assoalho ou forro, e com péssimo saneamento básico, o que

era verdade.

Page 62: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Conclusão

A Vigilância Sanitária pode ser então compreendida como um ganho para a saúde

brasileira, pois diante do recorte histórico foi possível compreender melhor sua

criação, como está sendo desenvolvida, além de aprimorar os conhecimentos

quanto a sua função.

Assim, pode-se afirmar que a Vigilância Sanitária é um órgão que desempenha suas

funções de maneira interdisciplinar, tendo em vista sua ampla área de atuação nos

mais diferentes setores, é ainda considerada um espaço de comunicação que

possibilita a promoção à saúde da população, já que lida com diversos produtos que

são utilizados por indivíduos das distintas classes sociais.

Por ter a missão de proteger e promover a saúde da população, sempre em defesa

da vida, tal órgão necessita de uma interação muito grande com os cidadãos, para

isso estes podem buscar a efetivação das ações da Vigilância Sanitária pela própria

diretriz do SUS, a de participação da comunidade, ou seja, o sujeito social pode ser

ativo no referido órgão através dos conselhos de saúde. Desta forma a sociedade só

tem a ganhar e a Vigilância Sanitária irá avançar em suas práticas, tendo assim

melhores resultados.

Page 63: Saúde Pública-História da Vigilância Sanitária-Aluna Kariny Santos

Referências Bibliográficas

Livro(s):

- EDUARDO, Maria Bernadete de Paula e de MIRANDA, Isaura Cristina S. de

Miranda (colaboradora). Saúde & Cidadania – Vigilância Sanitária. p. 3 Instituto para

o Desenvolvimento da Saúde - IDS. Núcleo de Assistência Médico-Hospitalar -

NAMH/FSP e Banco Itaú. São Paulo, 1998

Site(s):

- http://portalses.saude.sc.gov.br/arquivos/sala_de_leitura/cartilha_visa/index.htm

- http://www.artigonal.com/medicina-artigos/a-evolucao-da-vigilancia-sanitaria-no-

brasil-2294739.html

- http://pt.wikipedia.org/wiki/Vital_Brazil

- http://pt.wikipedia.org/wiki/Carlos_Chagas

- http://pt.wikipedia.org/wiki/Emilio_Ribas

- http://pt.wikipedia.org/wiki/Oswaldo_cruz

- http://pt.wikipedia.org/wiki/Adolfo_Lutz

- http://www.anvisa.gov.br/institucional/snvs/coprh/cartilha.pdf

- http://ibict.metodista.br/tedeSimplificado/tde_busca/arquivo.php