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COMUNICAÇÃO E PESQUISA

PROJETOS.,.PARA MESTRADO E DO'UTORADO

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I'~,-.1l.. -..-:-.'- -- --- -HACKEREDITORES

LUCIA SANTAELLA

-

te~.••:.<e

-'(e).{e

>~(-­{.·r.1.••••••••••••.'e'.(.•.1•.'.)•.)".,

p ••••••••••••••••••.'••••••••à memória de Philadelpho Menezes.,

• •for the sake of knowledg~.

•••••'.))

••••••••••••••••••••••••••'.•••••••:',.)

CONSELHO EDITORIAL

Antonio Albino Canelas Rubim, Antonio Fausto Neto,Ciro Marcondes Filho, José Luiz Braga, José Salvador Faro,

Lucia Santaella, Luiz Martins, Muniz Sodré,Nilda Jacks, Paulo Cunha, Sérgio Capparelii, Vera França

EDITOR DA COLEÇÃOJosé Luiz Aidar Prado

© 2001 by Lucia Santaella

Criação Fotoqráfica da Capa. Roberto Temin

CapaAREA Comunicação Visual

Revisão de TextoLucila Lombardi

1a edição: 20011a reimpressão: 20022<1 reimpressão: 2006

Catalogaç ão na fonte - Biblioteca Central PUC-SP

Santaella , LuciaComunicação e pesquisa: projetos para mestrado e doutorado';

Lucia Santaella - São Paulo: Hacker Editores, 2001,216 p.Bibliografia .ISBN: 85-86199-29·9

1. Comunicação - Pesquisa. 2. Comunicação e semiótica3. Pesquisa - metodologia 4. Pesquisa - projetos

I.Título 2. SérieCDD 302.2072

2006Hacker Editores

Fonefax: (Oxx11) 3733 7912www.hacker-editores.com.br

SUMÁRIO

Nota de apresentação

Introdução

1. Definição de comunicação

2. Emergência e desenvolvimento da área de comunicação

Capítulo 1Histórico das teorias, modelos e âmbitos depesquisa na comunicação

1. A mass communication research e seus desdobramentos

2 . As teorias críticas3 . Os modelos do processo comunicativo

3.1 Modelos lineares

3.2 Modelos circulares

3.3 Modelos in terat ivo s

3.4 O modelo lingüístico-funcional

3.5 O modelo semiótico-informacional

3.6 O modelo semiótico-textual

3.7 Os modelos cognitivos

4. As tendências culturológicas e midiáticas

5 . Conceitos de comunicação nas ciências vizinhas

11

13

16

23

27

31

384452535455

56

5759"6270

I . A onipresença da comunicação 752 . Digitalização e cibe respaço 783 . A teia inter-multi e transdisciplinar da comunicação 804. Traçado geral do mapeamento 845. Os territórios da comunicação 86

5.1 O território da mensagem e dos códigos 865.2 O território dos meios e modos de produção das mensagens 875.3 O território do contexto comunicacional das mensagens 8a5.4 O território do emissor ou fonte da comunicação 885 .5 O território do destino ou recepção da mensagem 89

6. As in ter fac es dos territórios da comun lcaçáo 906.1 As me.nsagens e suas marcas 916.2 Interfaces das mensagens com seu modo de produção 926 .3 Interfaces das mensagens com o contexto 926.4 Interfaces dos meios como contexto 936 .5 Interfaces das mensagens com o sujeito produtor. .: 946.6 Interfaces dos meios com o sujeito produtor . 946.7 Interfaces do contexto com o sujeito produtor 956.. 8 Interfaces da mensagem com sua recepção 956.9 Interfaces dos meios com a recepção das mensagens 966.] O Interfaces do contexto com a recepção 966.11 Interfaces do sujeito produtor com a recepção 96

7. Inserção das teorias e ciências da comunicação no mapa 987.1 Teorias da mensagem, códigos e suas interf~ces 987 .2 Teorias dos meios e suas interfaces 997.3 Teorias do contexto e sua sjn terfa ce s 997.4 Teorias do sujeito e suas interfaces 1007.5 Teorias da recepção e suas interfaces 100

,

Capítulo 2Mapeamento da área de comunicação

Capítulo 3A pesquisa, seus métodos e seus tipos

1. A ciên~ia como coisa viva

2. O valor das teorias

3. A pesquisa como alimento da ciência

75

103

103109 '112

4 . A lógica no coração da metodologia

5. Abdução, indução e dedução

6. O método das ciências

7. As metodologias específicas das ciências

8 . Tipos de métodos

9. Tipos de pesquisa

10. Procedimentos, técn icas e instrumentos

Capítulo 4O projeto de pesquisa e seus passos

1. Questões de um projeto

2. A escolha do tema

3. Estudos preliminares

3 .1 O pré-projeto

4. Â elaboração do projeto

4.1. Os antecedentes

4.2. A definição do problema

4.3 O estado da questão

4.4 A .apresentação das justificativas

4 .5 A explicitação dos objetivos4.6 A formulação das h ípóteses :

4.7 O quadro teórico· de referência

4.8 A seleção· do método

4.9 A equipe de pesquisa

4.10 O cronograma

4.11 Os recursos necessários

4 .12 A bibliografia

4 .13 Nota final

Roteiro de leituras

Bibliografia

Sobre a autora

.'•114 •117 •122 •127 •133139 .'148 •151.:.'•153 •157 .'159

161 •162 •163 •164167 .1172 .'174 .'176 .;182185 •187 •188 •188188 •189 •190 •.1195 ••216 ••.'••(.'.."

•••••••••••••••••••••••••••••••••••.)

NOTA DE APRESENTAÇÃO

A quantidade de literatura sobre metodologia c ientíficaç .metodologia da pesquisa científica, metodologia do trabalho cie~~· .

tífico , projeto de pesquisa etc., publicada no Brasil ou traduz.idà.

. para o português, é surpreendentemente grande . Há um título , illf"::-.: . . .

clusive, que j á passou da 20a edição (SEVERINO, 2000). Uma>

boaparte dessa literatura está indicada na bibliografia ao firi-ãl~ ': '

deste volume. Tendo em vista a existência prévia dessa literatura;

para evitar redundâncias desnecessárias , decidi dedicar grand:~:-­

parte deste livro à contextualização da área de comunicação, com

atenção voltada para a sua história, o histórico de suas teorias e o

mapeamento de sua conjuntura atual. Tal decisão também foi de­

vida ao fato de quejulgo ser essa uma informação imprescindível

para que o pesquisador, especialmente .aquele que es tá s~'inic ian-

do na área, possa nela se localizar, .algo que não é nada fácil de se

conseguir sem ajuda, dada a complexidade crescente da cornuni­

cação no mundo contemporâneo.

A. maior parte d-abibliografia publicada sobre metodologia está

voltada para as ciências sociais, para a psicologia e a educação.

De que tenho notícia, só existe um livro dedicado especificarnen­

te à reflexão sobre pesquisa e projetos de pesquisa em comunica-

.. " :

Lucia SantaellaKassel, janeiro 2001

ção (LOPES, 1990), além de alguns balanços e inventários da

pesquisa nessa área no Brasil (por exenlplo MELO, 1983 , 1984;MELO, org. 1983). Urna vez que, em nenhum nlonlento, ,naidealização e feitura deste livro , acalentei qualquer pretensão deque as informações nele contidas possam substituir a excelênciada reflexão realizada por Lopes, e tamb ém para evitar U1l1a certa

angústia da influência, busquei" dar ao texto que se segue, tanto,

quanto possível, urna versão complel11entar ao texto de Lopes, de1110do que ambos possam dialogar. Afinal, quando escrevenlOS,

'especialnl ente Ul11livro COl110 este, conlinclinações didáticas, nossomovimento se dirige na direção do leitor. É o leitor que desejamospossi vel mente beneficiar. U ma vez que a complenlentaridade é

, sempre um benefício, está lançado o diálogo.

/

•.'•.'•••.~

.'•.'••.1•A qualquer observador·do mundo contemporân~o,atémesmo •

entre os mais leigos, o termo "comunicação" e as noções que ele . \

carrega se impõem masslvamente. É voz corrente a afirmaçãode . 'que estamos inseridos em uma civilização da comunicação. Ora, . :o ser humano sempre foi por natureza um ser simb ólico , ser delinguagem e de comunicação. Comunicar-se, portanto, não é no- \.vidade para o humano. Então onde está a novidade? Ela só pode •estar na mul!iJ2.!icação crescente e acelel:ada 'dos meios de' ql~e o . 'ser huma~dlspõepara criar, registrar, transmitir e arm~zenar lin- •

guagens e informações (BAYLON e MIGNOT, 19?9: 3). . •De fato, desde a-revol uçào eletro-mecânica, 'com suas máqui- •

nas capazes de produzi;" e reproduzir linguagens - especialmente •

as máquinas de impressão, a fotografia e o cinema - a cornplexi- •dade do campo da cOl11unicação cO~l1eçou ' a crescer exponencial- . :mente. Tal exponenciaçã~ :fica'y isível quando se comparam as

má~uihas :le.tro-m,e~ânicas C~I~ as máquinas-aparelhos da rev~- :1uçao eletrônica, r ádioe televisão, estas cap~zes de urna potência

. de difusão que as anterioresnão podiam sonhar alcançar. Na pas- •sagern que estamos vivenciando da revolução ,~l etrôn i c a 'i)ara a •

revolução digitalcom sl~as máquinas-dispositivos computacionais •. .,', .•'.;

Comunicação & Pesquisa12

aliadas às telecomunicações em dimensão planetária, a exponen­

ciação da complexidade do campo da comunicação começa a atin­

gir proporções gigantescas.

A entrada do século XXI deverá ser lembrada no futuro COl110

a entrada dos meios de comunicaç.ão em urna nova era: a da trans­

formação de todas as mídias em transmissão digi tal, como se o

mundo inteiro estivesse, de repente, virando digital. Transmissão

digital quer dizer a conversão de sons de todas as espécies, iI11a­

gens de todos os tipos, gráficas ou videográficas, e textos escritosem formatos legíveis pelo computador. Isso é conseguido porque

as informações contidas nessas linguagens podem ser quebradas

em tiras de 1 e Oque são processadas no computador e transmiti­

das via telefone, cabo ou fibra ótica para qualquer outro computa­

dor, através de redes que hoje circundam e cobrem o globo corno

unia teiasem 'centro nem periferia, ligando cornunicacionalrnente,

em tél~lpO quase real, milhões e milhões de pessoas, estejam elasonde estiverem, em um mundo virtual no qual a distância deixou

de existi r.

Vem daí o papel central que os fenômenos da comunicação

passaram adesempenhar eITI todos ossetores 'da vida social e in­

,di~idtial eo papel fundamental que a comunicação COI110 área de

conhecimento está fadada a desempenhar em muitas outras áreas,

e não apenas naquelas que lhe são vizinhas: da biologia à econo­

mia, da inteligência e vida artificiais à antropologia, da filosofia àetnologia etc.

Uni crescimento tão acelerado das bases reais.de lL111a área de

conhecimento só pode produzir confusões e dificuldades de COITI­

preensão, inclusive naqueJ~sque trabalham na área e nela pesqui­

sam. As afirmações de qu~ a complexidade da comunicação advérn

da sua natureza inter, multi e mesmo transdisciplinar já se torna­

ram um truisrno. Em.função disso, parece urgente dar um passo à

frente e tentar divisar quais são os fios e os desenhos que essa

multidisciplinaridade está criando .

•• 14

•••••'.••••••••••••••••••••.'•.'.1.,'.;.)

Comunicação [, Pesquisa Lucia Sentaeüe

Durante três anos, de 1992 a 1995, fui consultora ela área ele

c?l11unicação no CNPq. A Iistagern de disciplinas e campos de

que ,o CNPq dispunha corno componentes ela área de comunica­

ção mais se parecia a Ul11a enumeração caótica que, como recurso,

pode ser muito bom para dilatar a arnbiguidade dos sentidos na

poesia, ITIaS se presta bem mal corno auxílio à compreensão I:acio­

nal e objetiva dos estados de coisas que a. realidade apresenta.

~~t~.~yezes, tínhamos de julgar projetos, nitidalTIente interdis­

ciplinares, que suscitaval11 fortes dÚvidas gUalito à sua inserº-ªo

ou não na área de comunicação. Ora, o conhecimento poele não'

ter fronteiras, quando o tomamos em se~tido lato, mas pesq'UTSãs (

e~pecíficas devem necessariamente estar enquadradas em árec:..s <-

de conhecimento definidas, inclusive nas suas interfaces. . z

Desde essa época, senti a necessidade e fiz in úrneras premes- .

sas a mim mesma de que um dia pensaria com calma na elabora-

~ção de um mapa geral dos campos recobertos pelaárea de cornu­

~icação que, pelo menos, fosse capaz de avançar uns passos eIll

relação à enumeração caótica _d~ que o CNPq dispunha. A pro­

Dlessa ficou guardada em uma gaveta da memória . . . ' .

Há pouco mais de um ano, fui convidada pelo edi tor da Hacker,

José Luiz Aidar Prado, para escrever este livro sobre Comunica­

ção & Pesquisa, para fazer parte da coleção Comunicação &, fun­

dada pela editora. Ao dar início aos trabalhos para a escritura do

livro, voltou imediatamente a necessidade de que as reflexões e

mesmo indicações sobre os caminhos da pesquisa em comunica­

ção fossem antecedidas por um mapeamento da área e dos carn­

pos que ela cobre. Foi então que minha promessa teve de ser tira­

da da gaveta .

Muito rapidamente me dei conta de que não poderia elaborar

esse mapa apenas conl o repertório dos conheci mentes sobre a

área de comunicação que estavam arquivados em minha rnernó­

ria, assim como não poderia me valer apenas elos livros panorârni­cos sobre os campos e teorias da comunicação que circulam no

..-... .

1. DEFINIÇÃO DE COMUNICAÇÃO

Não são poucos os autores que têm colocado ênfase na plura­lidade dos fenômenos que podem ser chamados de comunicacio­nais ena conseqüente polissemia do termo "comunicação". Ten­do isso em vista, Fiske (1990: 1), por exemplo, perguntou se po­demos considerar como UIn campo de estudo algo tão diverso e

••

•••

•••••••

17Lucia Santaella

multifacetado quanto a comunicação humana, concluindo pelanatureza multidisciplinar da comunicação e definindo-a como "in­teração social através de mensagens". Batendo na mesma tecla,Baylon e Mignot (1999: 9-10) acabaram por concluir que a comu- .nicação "é uma relação dos espíritos humanos, ou melhor, doscérebros humanos".

Segundo Nôth (1990: 169-170), para se começar a definir co­municação, deve-se tentar separar a esfera dos fenômenos .comu­nicativos da esfera dos eventos não comunicativos. Entretanto, aoinvés de postular uma clara ruptura entre os fenômenos comuni­cativos e não comunicativos, pode-se conceber uma transição gra­dual que vai dos modos de interação proto-comunicativa mais ru­dimentares até os mais complexos. Dessa maneira, sem pretenderuma unificação dos diversos conceitos, o .autor toma como ponto •de partida os fenômenos unilaterais, continuando com as interações •simples, para as bilaterais, então as intencionais, as lingüísticas,para terminar com a metacomunicação. Nõth comentou que as •teorias dos níveis biológicos de interação também sugerem uma •transição gradual dos modos de interação não comunicativos paraos comunicativos. De uma perspectiva diferente, Kelkar (1984:112-14) também distinguiu vários graus de "primitivismo" dos •eventos comunicativos

Defensor de uma visão generalizada da comunicação, fenômenoque teria início já em situações muito rudimentarmente comunica- •cionais, foi Meyer-Eppler. Em sua definição, comunicação é a "re- •cepção e o processamento de sinais detectáveis física, química oubiologicamente por um ser vivente" (1959: 1). De acordo com estateoria, qualquer processamento de informação por organismos in­dividuais (que não sejam máquinas) constituem uma instância decomunicação. A cooperação ativa da fonte do sinal no processonão é necessária. A fonte pode inclusive ser um objeto inanimado.

A maioria dos estudiosos rejeitaria aplicar o termo "comuni­cação" a uma tal situação, pois, sem algum tipo de atividade da

Comunicação & Pesquisa16

contexto brasileiro. Para dar início ao trabalho, portanto, fiz umprimeiro levantamento dos livros-textos de comunicação de publi­cação ou re-edição recentes em várias línguas. Para esse levantamen­to, utilizei não apenas os meios de busca que se tornaram atual­mente muito facilitados graças à internet, mas fiz também entre­vistas on line com vários pesquisadores de minhas relações quetrabalham na área de comunicação no Brasil e em outros países.

Com o estudo dessa bibliografia, pude elaborar uma primeiraversão de um mapa da área de comunicação. Tendo essa primeiraversão em mãos, passei para uma segunda fase de pesquisa biblio­gráfica em um número bem maior de títulos de livros na área decomunicação. A leitura dessa bibliografia adicional permitiu quea primeira versão do mapa fosse sendo gradativamente testada,burilada, autocriticada e aprofundada. Dessa pesquisa, resultou omapeamento que será apresentado no capítulo dois. Esse mapea­mento tem a finalidade de servir como uma orientação preliminar,um reconhecimento do território, para todos aqueles que se en­contram diante da necessidade de elaborar um projeto de pesqui­sa na área de comunicação. Antes do mapeamento, entretanto, epara lhe dar fundamento, é necessário, em primeiro lugar, nos en­tendermos sobre o sentido que estamos ~andC? para "comunica­ção". Em segundo lugar, é preciso esboçar o panorama do desen­volvimento histórico das teorias, modelos e tendências das pes­quisas em comunicação. É o que será feito, respectivamente, nes­

ta introdução e no próximo capítulo.

"Uma ação torna-se uma mensagem quando é percebida tanto pelo

próprio ser quanto por outras pessoas. Em outras palavras: os sinais

de trânsito se tornam mensagens quando há um receptor que, no

lugar de destino, pode avaliar o significado destes sinais. Tal defini­

ção inclui a comunicação entre seres humanos e animais, assim como

entre os próprios animais. De fato, todos os organismos biológicos,

incluindo as plantas, recebem, avaliam e enviam mensagens. Resu­

mindo: a comunicação é um princípio de organização da natureza".

portamento humano" (1949: 3). Qualquer forma de comportamentonão-verbal pode, desta maneira, tornar-se comunicativo. Aindasegundo Nõth (ibid.: 171), Ruesch (1972: 82-83) descreveu o pro­

cesso de transformação do comportamento em comunicação da

seguinte forma:

LUCia senteene

Nõth chamou atenção para o fato de que a interação semiótica,como definida por Shannon & Weaver, ainda não implica qual­quer congruência entre a mensagem do emissor e a interpretação do .receptor. Porém essa característica de congruência é um critério adi­

cional de distinção estabelecido em algumas definições de comu­nicação. É uma característica que já é sugerida pela etimologia dapalavra, que implica "um repartir comum de informação". Umaformulação clara do critério de congruência é dada por Richards,quando diz que "a comunicação [...] acontece quando uma mente aoagir sobre seu meio ambiente influencia outra mente, e, nesta outramente, ocorre uma experiência que é semelhante à experiência naprimeira mente e que é causada, em parte, por aquela" (1928: 177).

Subindo mais um degrau, o critério adicional para se definircomunicação é o de intencionalidade. Intenção é atividade dire­cionada a um objetivo, envolvendo, portanto, a volição. Na co­

municação, intenção é a tentativa consciente do emissor de influen-

: ciar o receptor através de uma mensagem, sendo a resposta doreceptor uma reação baseada na hipótese das intenções da parte

- - - - - ~ _. - - . - - -I - -- - --

parte da fonte do sinal, tem-se um domínio muito baixo do campocomunicacional. Entretanto, Meyer-Eppler definiu essa situaçãosob o nome de "comunicação unilateral" por prever o papel queum observador desempenha nesse tipo de processo, o que já o

caracterizaria como comunicativo com dois subtipos: observação

e diagnóstico. Na comunicação observacional, um observador

percebe e processa sinais de uma fonte inanimada. Esta situação

comunicativa é típica da física e química. Na comunicação diagnós­tica, os sinais originam-se em um emissor vivo. Esta forma deprato-comunicação unidirecional de um organismo a outro é caracte­rística das observações na biologia, medicina e psicologia.

Entre aqueles que reservaram o sentido de "comunicação" paraa interação mútua entre duas entidades, há alguns pesquisadores

que incluíram nessa interação tanto máquinas quanto células bioló­gicas. No terreno das máquinas, para a cibernética e a teoria de siste­mas, há comunicação onde houver interação entre quaisquer doissistemas. Assim, Klaus(l969) em seu dicionário de cibernéticadefiniu comunicação como "a troca de informação entre sistemasdinâmicos capazes de receber, estocar ou transformar informação".

Para outros teóricos de sistemas, a comunicação só começaria naesfera biológica da vida. Desse modo, Rosnay (1975: 135) descreveuas moléculas da vida como "indivíduos informacionais" com memó­ria e capacidade de reconhecimento. A troca de informação, nesseprocesso químico de comunicação, acontece tendo como base o có­digo genético. Para Rosnay, a "história da comunicação" se estendedesde a comunicação entre moléculas e células biológicas até asinterações entre organismos e, finalmente, entre seres humanos.

Também baseado no critério de interação mútua entre organis­mos encontra-se o conceito bastante amplo de comunicação deShannon & Weaver. Estes definem comunicação como "todos os

procedimentos pelos quais uma mente pode afetar outra. Isto, ob­

viamente, envolve não apenas o discurso oral e escrito, como tam­bém música, artes visuais, teatro, balé, e, certamente, todo com-

•••••••••••••••••••••••••••••••••--~--------------------------...............-------

20 Comunicação [, Pesquisa Lucia Santaella 21

do emissor. Assim sendo, a maioria das expressões corporais visí­veis de emoções não são intencionais.

Numa tradição lingüístico-serniótica que vai de Buyssens

)(1943) até Prieto (1966, 1975) e Mounin (1970, 1981), .a intencio­nalidadetem sido discutida como um traço distintivo de comuni­

} . ~ação. P~ra Prieto (1966: 20; cf. HERVEY, 1982), todo ato co~u­ln~ativo pressupõe uma intenção da parte do emissor, que tem queser identificável por parte do receptor.

? .

Em seguida, Nõth (ibid.: 172) esclareceu que qualquer uso dalinguagem se caracteriza, evidentemente, sempre como umyro­cesso de comunicação. No entanto, quando os lingüistas discutema função comunicativa da linguagem, nisso fica implicado que alinguagem pode também ser usada com funções não comunicati­vas. Para alguns lingüistas, interação verbalé comunicação e "co­municação" é o termo genérico que cobre todas as funções dalinguagem. É neste sentido que Jakobson fala de seis funções dacomunicação verbal.

Outros lingüistas restringiram o termo "comunicação" para ape­nas uma das várias funções da linguagem, geralmente aquela maisimportante. Nesse sentido, Martinet definiu comunicação como afunção central da linguagem que se refere à "necessidade que alguémtem de ser entendido" (1960: 18): Para François (1969: 75), outrasfunções como a expressiva e a apelativa não são comunicativas.

Por fim, definido como "a habilidade de se comunicar sobrecomunicação, de se comentar sobre as ações de significação dealguém e de outros", o conceito de metacornunicação foi primei­ramente desenvolvido no contexto d;Psicopatologi;-(BATESONet al., 1956: 208). Assim, metacomunicação não se restringe auma metalinguagem científica (cf. SCHLIEBEN-LANGE, 1975),mas é um princípio da interação social cotidiana. Por isso mesmo,sua perda pode ser a causa da esquizofrenia.

Watzlawick et al. (1967) foram mais longe ao afirmar que arnetacornunicação está onipresente em qualquer instância da intera-

.ção social. Com seu axioma metacomunicativo, Watzlawick et aI.postularam a tese da impossibilidade de não se comunicar (1967: 48­51). Depois de enfatizar que a comunicação pode ocorrer tantoverbalmente como em muitas modalidades não-verbais, os cria­dores deste axioma argumentaram: "O comportamento não temoposição. Não há algo como o não comportamento. Ninguém podenão se comportar" (ibid.: 48). Assim, também "ninguém pode nãose comunicar" (ibid.: 49). Mesmo o silêncio e o "não comporta­mento" têm o caráter de uma mensagem.

l)evjto (1997: 20-31) definiu os princípios da comunicação--humanacorno se segue: a comunicação é um pacote de signos; acomunicação é um processo de ajustamento; a comunicação en­volve conteúdo e dimensõ~s relacionais; as seqüências comunica­tivas são pontuadas; a comunicação envolve transações simétri­cas e complementares; a comunicação é transacional; a comuni­cação é inevitável, irreversível e irrepetível.

Pacotes de signos dizem respeito aos diferentes tipos de sig­nos que concorrem para compor uma mensagem. Esses pacotesem geral nos passam despercebidos, mas quando há uma contra­dição na relação de um pacote com outro, por exemplo, quando.expressamos medo com as palavras e o resto do corpo se mantémrelaxado, tomamos consciência desse princípio dá comunicação.

Embora duas pessoas possam estar utilizando os mesmos sis­temas de linguagem, a comunicação só ocorre através de um pro­cesso de acomodação ou ajustamento contínuos para permitir quea comunicação ocorra. Esses ajustamentos são tanto mais neces­sários nos casos de comunicação entre pessoas de gerações, cul- •turas e classes sociais diferentes. •

A comunicação se refere, ao mesmo tempo, a algo que estáfora do intercâmbio entre emissor e receptor e à própria relaçãoentre esses dois parceiros. Esses dois aspectos se reportam à di­mensão do conteúdo e da relação comunicati va.

••••••••••••••••'.

'-VIIIUIII~Q'TQV v r C;:'L!UJ;:'Q

•• Embora os eventos comunicativos sejam transações contínuas,• como participantes ou observadores, segmentamos o fluxo con-• tínuo da comunicação em pequenos pedaços. Costumamos cha­

mar alguns desses pedaços de causas ou estímulos e outros de

• respostas ou efeitos.As relações comunicativas podem ser tanto simétricas quanto

complementares. Nas simétricas, os indivíduos envolvidos espe­lham o comportamento um do outro. Nas complementares, o com­portamento cie um serve como estímulo para o comportamen­to complementar do outro.

Quando a comunicação é vista como um processo transacional,cada pessoa é, ao mesmo tempo, emissor e receptor, simultanea­mente enviando erecebendo mensagens.

A comunicação é inevitável porque, mesmo quando não que­remos, estamos o tempo todo emitindo mensagens para o outro.Ela é irreversível porque não podemos voltar atrás naquilo que jáfoi comunicado. Por fim, a comunicação é irrepetível porque to­dos e tudo estão continuamente mudando. Em razão disso,mes­mo quando lemos o mesmo livro , ou assistimos a um mesmo filmepela segunda ou quarta vez, esse filme não será para nós o mesmofilme.

z Tendo esse panorama como pano de fundo, tomando-se agoraas constantes, isto é, os traços comuns a todas as definições queforam enunciadas acima, pode-se extrair uma definição ampla egeral de comunicação que assim se expressa: a transmissão dequalquer influência de uma parte de um sistema vivo ou maquinal

• para uma outra parte, de modo a produzir mudança. O que é trans­mitido para produzir influência são mensagens, de modo que a

. ' comunicação está basicamente na capacidade para gerar e consu-mir mensagens. Assim definida, a comunicação, algo que muitoscomunicólogos atribuem só aos humanos, já "está presente nasformas mais 'humildes de existência, sejam elas bactérias, plantas,animais ou fungos, além de aparecerem nas suas partes subcornpo-

nentes, tais como unidades subcelulares (por exemplo, as mitocôn­drias), células, orgúnculos, órgãos e aSSilTI por diante" (SEBEOK,1991: 22-23). Bem antes de operar no mundo macroscópico dasrelações sociais humanas, a comunicação já opera na microscopiados corpos vivos (ver JOHNSTON et aI, 1970; TOMKINS , 1975 ;NEHER, 1992; SONEA, 1995).

Transportada inicialmente pelo código molecular primordial ,sujeita a uma contínua mudança qualitativa e quantitativa dos seg­mentos genéticos e, posteriormente, transportada pela rede imuno­lógica de células que operam através de substâncias mediadorasativas, a comunicação é, necessariamente, uma propriedade de todae qualquer forma de vida (SEBEOK, 1993: 3).

Além de sua presença nos sistemas vivos , são nada menos doque processos de comunicação que fazem as máquinas e os gran­des sistemas cibernéticos funcionarem , conforme Wiener (1961)já demonstrou (ver também ECO, 1971).

Uma tal ampliação do sentido de comunicação não é mera so­fisticação inconseqüente. Ela se tornou hoje imperativa, pois, jános fenômenos de massa e, muito mais hoje, no fenômeno explo­sivo das redes planetárias, a dinâmica da comunicação se faz mui­to mais entender à luz dos modelos do funcionamento dos siste­mas vivos em nível microscópico, e mesmo à luz das leis que apsicanálise extrai dos mecanismos do inconsciente, do que dosprocessos conscientes de comunicação humana em nível social. Épor isso que estes têm muito a aprender com aqueles.

2. EMERGÊNCIA E DESENVOLVIMENTO DA ÁREA

DE COMUNICAÇÃO

Na longa história da cultura humana, a preocupação com osfenômenos da comunicação é uma preocupação recente. Ela datade meados do século XX, tendo coincidido com a explosão do s

meios de comunicação de massa e a consequente emergência da

cultura de massas. Desde então, a comunicação e as questões queela traz consigo foram se tornando cada vez mais sensi vel mentepresentes até sua inegável onipresença resultante da recente proli-

feração das redes planetárias de telecomunicação. ,Embora os fenômenos da comunicação certamente já existis-

sem antes da cultura de massas, esses fenômenos não eram 'tão

abundantes nem tão diversificados corno passaram a ser. No mun­

do grego, dominado pela cultura da oralidade, a comunicação era

estudada sob o nome de retórica, arte, especial mente oratória, de

persuadir (ver BARTHES , 1970) . A invenção de Gutenberg, no

século XV, que trouxe consigo a cultura do livro, foi revolucioná­

ria e inaugural de Lllll novo tipo de cult~lra, a cultura do livro, das

belles l~ttres. Entretanto, não chegou aproduzir um pensamentoespeculativo, teórico ou reflexivo sobre a comunicação. Enfim,não produziu moditlcações substanciais nos modos de sentir os

fenômenos comunicacionais , com exceção feita ao fato de que

data dessa época o surgimento das metáforas,do universo impreg­

nadas da imagem do livro: o "universo corno livro", "o livro da

~ natureza" etc. (ver ROTHAKER) 1979) ,Isso se deu muito provavelmente porq.ue a linguagem verbal,

oral ou escrita, é sentida como algo tão natural quanto é natural acomunicação que ela permite. Esse senso de naturalidade não pro­

picia que questionamentos e problemas sejam levantados.

Na invenção da fotografia e do telégrafo, que se tornaram alia­

cios diretos do jornal, no século XIX, encontram-se os gérrnens da

revol ução comunicacional que, tendo emergido na revel ução in­

dustri al , cresceu exponencialmente com os meios eletrônicosde 'com unica ção massiva, rádio e TV, em meados do século XX,para alcançar surpreendentes dimensões planetárias COll1 a revo­

lução ci berespaci al , na virada do século XX para o XXI.

AI suns defendem a idéia de que a comunicação de massa teveo "

seus precursores já ern sociedades agr ícol as e pré-agrícolas

24 Comunicação (;. Pesquisa 25•

Lucia Santaella ,. •

.'(STRAUBHAA,R e LAROS:g, ~997: ,~7). J:- rigor, e~t~et~nto, o,primeiro meio de comunicação de massa foi o livro in:pres90qL~e, •a partir da prensa mecânica, 'no século XIX, foi atingindo tiragens •

cada vez mais numerosas (MCQUAÍL, 198.3: 19 apud ·S ~~- . 'TAELLA 2000: 34; CROWLEY e HEYER 1999: 81-130) . Entre- .Jtanto , o fato de que o livro seja lido por um indivíduo no recesso . 'de sua solidão meditativa, mesmo quando a tiragem do livro alcan- •

ça números significativos, o processo comunicativo que o livro •

instaura, especialmente quando comparado COIn meios quantita- •

tivarnente poderosos corno o rádio e a TV, não costuma ser enqua- •

drado no perfil de comunicação de massas. •Do livro para o jornal, ocorreu um salto no caminho para a

comunicação massiva, visto que a tiragem diária do jornal alcan- ~ça números com os quais poucos livros podem sonhar. Além dis- •

so, a natureza descartável do jornal já começa a acomodá-lo dentro •

do requisito da provisoriedade que é básico na cultura de massas. De ' •fato,- novos método'sd~ produção, acasalados COIU a explosão .,

demogr áfica e a emerg ência-de novas audiências nos grandes centros •

urbanos, levaram ao advento da imprensa e prepararam o terreno para •

os meios de massa (CROWLEY e HEYER, ibid.: 135-213). •, A grande explosão da comunicação massiva, entretanto, viria •

com seus do~s gigantes,.o. rádio e. a TV que, tendo seus alimentos . •fundamentais na publicidade, Instauraram a cultura popular '

massiva, Foi só então que a comunicação se instituiu como área •

de conhecimento reclamando para si urna certa autonomia , 'por ••exemplo, nos estudos da publicidade, nas análises de conteúdo

das mensagens veiculadas pelos meiose na pesquisa de opinião: •

Segundo nos informa Noth (1990: 169), técnicas de persuasão, •transferência de informação e liderança de opinião enquadraram- •

se como tópicos desse novo campo de pesquisa (cf. SCHRAMM, •

1963; CORNER & I-IAWTHORN, 1980), campo que foi se de- •

senvolvendo até chegar à proposta de uma ciência da comunica- •

ção COI11 a pretensão de "entender a produção, processamento e •

••

efeitos dos sistemas de símbolos e sinais através do. desenvolvi­

mento de. teorias testáveis que contenham leis gerais" (BERGER

& CHAFFEE, 1987: 17) . Mas isso já nos leva aos interiores das

teorias da comunicação, assunto que reservei para ser tratado no

próx imo capítulo.

•.) 26

••••.;I.,•.;••••••."••e\.'

•.1.,••••••••••.'

Comunicação fI Pesquisa

.'

HISTÓR'ICO DAS TEORIAS, MODELOSE ÂMBITOS DE PESQUISA

NA COMUNICAÇAO

Este 'capítulo tem por função apresentar ~lm breve panorama

do desenvolvimento histórico das teorias , modelos e te~dências

da pesquisa em comunicação, Un1 tal panorama parece fundamental

corno port~. de entrada para aqueles que pretendem elaborar um

projeto de pesquisa na área . Por isso mesmo , conforme deve ser

cabível a urna mera portade entrada , limito-me a indicar os carn­

pos de pesquisa acerca dos quais existe urn certo consenso corno

sendo definidores da área de comunicação no seu todo .

O panoramanão incluirá as teorias mais específicas e setoriais

dos veículos de comunicação (imprensa, fotografia, cinema, rá­

dio, TV etc.). Tamb ém não incluir á teorias híbridas que se desen­

volvem no cruzamento de áreas, tais COll10 antropologia da comuni­

cação, comunicação política, etc. Nemincluirá as variadas e possí-

.veis conexões dacomunicação, COl110, por exemplo, com as tecno­

logias ou com as instituições, etc.., pois tudo isso nos levaria a ca­

minhos sern fim de ramificações e especializações. Se não são

aqui consideradas no seu aspecto de teorias, essas ramificações

serão, entretanto, levadas em conta quando ela construção elo nos­

so mapeamento da área ele comunicação a serrealizada no capítulo 2.

Há duas obras bastante relevantes que trataram elo desenvolvi­

rnento histórico das teorias c1~ comunicação: Teorias da Comuni-

cação, de Mauro Wolf (1987) e História das Teorias da Comuni­cação, de A . e M. Mattelard (1999) . Wolf desenvolveu uma cui­

dadosa história das teorias da cOlllunicação de massa , desde osseus primórdios, entre as duas guerras mundiais do século XX,até as tendências que estavam surgindo pouco antes da escritura

de sua obra, publicada originalmente em italiano, en11985 . Antes

da emergência daquilo que o autor chamou de "novas tendências",

foram oito os momentos através dos' quais os estudos sobre os

meios de comunicação de massa se desenvolveralll: a teoria hipo­

dérmica, a teoria ligada à abordagem empírico experimental, a

teoria que deriva ~a pesqu~sa ernpfrica de campo, a teoria de base

estrutural-funcion~1ista,a teoria crítica dos mass media, a teoria

culturológica, os cultural studies e as teorias comunicativas . ., " , ,~ ~ . " , ' ,

No decorrer de sete capítulos, A. eM. Mattelard apresentaram

Ul11 amplo panorama do desenvolvimento das teorias.da cornuni­

cação e de sua inserção no contexto histórico e soci ~l" ~:.~m que se

originaram. Dada a -impossibilidade de colocar as teorits em uma i '

seqüência linear, visto que tendências distintas de investigação

foram se desenvolvendo paralelamente, os capítulos se distribuem

em grandes ternas: o organismo social, os empirismos do n6va....

.mundo, a teoria da informação, ~ iJ1.ç1ps.t1~i'a cultural, ideologia epoder, a.economia .polftica da 'c~ ll1ú ni~Tação , o retorno .qq~ co ti dl a-

. ... ;. .A'h.

no 'e , por fim, o domínio da comunicação .. , Outra obra que desenvolve'u LlI11a aproximação histórica das

origens.,lilétodos e usos da comunicação n?s meios de rnassas'é a

de Severin e Tankard (1992). A introdução aos estudos de massmedia da primeira parte é seguida pela apresentação dos modelos

de comunicação de massa na segunda parte, enquanto a t.erceira

parte está voltada para os estudos de percepção e linguagem. Aquarta parte é dedicada às pesquisas sócio-psicológicas, a quinta

parte aos efei tos: e usos dos mei os de massa e a sexta 'e' últi 111a'

parte, à questão das instituições midiáticas,

Tornando como referência o contexto bt:asiLeiro, Lopes (1990 :

43-59) apresentou Uj11 panorama da periodização da pesquisa em

~onlunicação social. Essa pericdização encontra sua correspon­, dênci a na noção de paradigmas científicos qu~, à luz do conceitode Kuhn (1'976), foram tornados pela ~Lltora co~o :"I~'atri ~es clis­

ciplinares de determinadas construções teóricas sobre o objeto da

, comunicação comumente adotadas nas 'pesquisas de Comunica-

ção Social" (LOPES, ibid.: 32).

Fora,m 'os seguintes os períodos levantados: dé~ada de 50, ca­

racterizada por pesquisas funcionalistas baseadas em métodosquantitativos: de conteúdo, de audiência e de efeitos. Década de

~9, caracterizada por pesquisas furicionalistas baseadas em méto­

dos comparativos e de estudos 'de comunidades, na linha da co­

municação ~ desenvolvimento. Nessa época, começaram a surgir

os primeiros estudos sobre indústria cultural 'b ase'ado~ na E~colade Frankfurt. D écada de 70,quan~0se deu o apogeu' da influ~~ciadessa Escola sobre os estudos da comunicação no B'~-asi~, ao mes­

mo tempo que as pesquisas funcionalistas encontravam sua conti-.nu id ade ern estudos descritivos d,e comunicação nacion~l'e i~;t~~:~~ .. .. .

'nac ion al. Por fim, ~ década de 80, que se' caracterizou pelas pes-

quisas funcionalistas sobre aspectos da produção e circulação da

~G?w un i cação , por estudos crfticos de modelos t~óri~~s"~ busca de

u~a teoriae metodologia latino-americanas; caracterizou~seain­

da pela politização das P..esquisas sob infiuên~ia' ~eGra1?ls'ci, pe­

}as metodologias qualitativas e por temáticas como novas tecno­

) 9,?.l.as , transnacionalização da .cu lt ur é}. e comunicação' popular

(i,Qid.: 43-44). '~ . ~ ; ... o .

Também no Brasil , mais recentemente, Rüdiger (2,000) publi-

cou um artigo no qual traçou, em passos largosvuma trajetória

hi~tó:··ica do campo da comunicação nos seguintes períodos: (a) o

periodo clássico da Escola de Columbia, de 194Q. a 1960; (b) acontribuição do funcionalismo e a ascensão da serniótica de 1960

_ 'I: _ , . . ... o . , • .- -.' . • .

a 1980; (c) o retorno à hipótese da mídia forte ea retornada do

28 Comunicação [; Pesquisa-: -- ., .

Lucia Santaella .'29 •

••••.'••.'••.1.J.;.).).)•.)••.).)••.)••••.)•.).)

legado crítico, de 1970 a 1990, e (d) a emergência dos estudos

cultu-rais, desde 1980.Para finalizar esse tópico dos panoramas históricos das teorias

da comunicação, vale a pena mencionar o 'livro de Fiske (1990).Realizando uma síntese radical, esse autor estruturou o seu livro

tomando como base a redução de todas as teorias da comunicação

a apenas duas escolas fundamentais: preocupada com o modo corno

emissores e receptores codificam e decodificam, COIno transmis­

sores usam canais e meios de comunicação, a primeira escola vê a

comunicação como transmissão.de.mensagens. Daí se preocupar

com assuntos· como eficiência e exatidão, pois a comunicação é

vista corno um processo que afeta o comportamento ou estado de

espírito dos receptores. Fiske chama essa escola de processual.

Sua tendência é basear-se nas ciências sociais e psicologia, d-irí­

gindo-se para atos de comunicação. Nessa escola, a interação so­

cial é vista como um processo através do qual pessoas se relacio-.

nam umas COlll as outras ou afetam o comportamento e respost~emocional das outras. Por acreditar na intenção do emitente corno

fator crucial, a mensagem, por sua vez, é vista COlllO aquilo que é

transmitido no processo comunicacional. A intenção do emis's'6i~

pode ser explícita ou implícita, consciente ou inconsciente, mas

deve ser recuperável através da análise.

. Para a segunda escola, a comunicação é produção e tro'ch'a'~

significados. Por isso, preocupa-se com o modo COl1l0 as mensa­gens ali textos interagem com as pessoas a fim de produzir signifi­

cados, preocupa-se, portanto, com o papel que os textos desernpe­

nham em urna cultura. Por isso mesmo, a eficiência comunicattva

não é um problema para essa escola. Mal entendidos são evidêl~­

cias de diferenças culturais. O principal método dessa escola en­

contra-se na serniótica, ~ Ciência dos signos e significados. Para

ela; estudar comunicação é estudar textos e cultura. Nesse contex­

to; a interação social é concebida corno aquilo que cóns'titui o

indivíduo COl1l0 membro de uma determinada cultura ou sociedade'.

...... '.:~.. ~'l...,

1. A MASS COMMUr:IICATION RESEARCH E

SEUS DESDOBRAMENTOS

..... ':i>~. /'''2..:',; ;';", .

Ullla C!~J:fllhadahistória dà'coinl1UÚ1icClÚon research, nos Esta­dos Unidos, desde suas origens até ~'segllnc(aIl~~t~d~dos'anos 80,pode ser encontrada ern Delia (1987: 21-98). Seu texto está divi-'"

didoern três partes. A primeira vai de 1900 até 1940. Centrada es­

pecialrnente na figura do cientista político Lasswell, nela é apre­

sentado o nascimento das pesquisas subseqüentemente na análise

de ternas políticos e sociais da comunicação pública, na análise de

contcüoo, l:a análise quantitativa elas mensagens e na pesquisa"

cornunicacional focada comercialmente. A segunda parte' vai de

1940 a 1965. 19~0 trouxe consigo, segundo o autor, a consolida­

çã~ ~a ciência da comunicação através das tradições fundadas

pnncipatmente pelo psicólogo Hovlanel, de um lado, e o sociólo-

31Lucia Santaella

A mensagem, por sua vez, é a construção de signos que, na

interação com os receptores, produzem significados. Toda a ênfa­

se aqui recai sobre o texto e o modo como é lido, sobre o proces­

so de descoberta de significados que ocorre quando o receptor

interage e negocia COlll o texto. Essa negociação implica a expe­

riência cultural baseada em códigos e signos compartilhados em

maior ou menor medida. Assim sendo, a mensagem não é algo

enviado de A para B, mas um elemento de uma relação estrutura­

da que inclui o emissor/receptor e a realidade externa (ibid.: 2-3).

Embora tenha me valido das obras apresentadas aci ma, são

distintos dela~.os agrupamentos e a seqüência que escolhi dar àapresentação ?O desenvolvimento histórico das teorias da comu­

nicação. A meu ver, as teorias, 1l10d~I.()s e âmbitos da pesquisa ern

comunicação se agl:ljpalll em quatro grandes tradições: (1) á mass

COI11771.Unicatiqn research. e seus desdobramentos, (2) as teorias

críticas, (31:.:~,s modelos do processo comunicativo e (4) as corren­tes culturolôgicas e midiáticas

x.omurucaçao CJ r esqursujU••••••••••••e'e••••••.'.J

• i

•••••••••••(.)

' go Lazarsfeld, de outro. Na terceira parte, para o autor, odesenvol­

vimento da área de comunicação foi grandemente devid~ à sua in­serção nas escolas de jornalismo. Nos anos 80, a característicaprimordial da área estava no alargado espectro de suas perspectivas.

Para Del ia, houve três fontes recorrentes de influência para a

pesquisa em comunicação nos Estados Unidos, no século XX: em. pr ime iro lugar, a identificação dessa pesquisa com o estudo dos

meios de comunicação de massa. Em segundo lugar, a preocu­

pação corn o papel dos meios de comunicação pública na vida so­

" cial e política. Em terceiro lugar, no desenvolvimento das práticas

profissionais .dentro e através das disciplinas das ciências sociais.

O panorama que será apresentado abaixo dessa tradição de

pesquisa não tem nenhuma intenção de ,ser exaustivo, mas apenas

marcar aslinhas de força de sua constituição e desenvolvimento ..A origem mais palpável da mass cornmunication research. re­

monta à obra de H. D. Lasswel1, publicada em 1927, com o título

de Propaganda techniques in the world war. Esse tipo de pesqui-. sa foi fruto da difusão ern larga escala das comunicações de massa

e representou a primeira reação que essaexplosão da comunica­

ção massiva viria provocar em estudiosos de proveniências diver­sas. Trata-se de urna abordagem global dosn~a~s media, indife­rente à diversidade existente entre os vários meios de comunica­

ção . Essa abordagem visava, sobretudo, respond,er à..seguinte in­

terrogação: que ~feito têm ~s mass media ern ~~nla sociedade de

massa? Calcada ern Ullla visão da audiênci~~, .~OlllO urna massaamorfa, que responde cegamente aos estímulos dos meios, essas

pesquisas ficaram conhecidas como hipodérmicas devido à expli­cação dada por Lasswel [ de que a mídia age segundo o modelo da

" ,

"agulha hipodérmica", que provoca um efeito direto e indiferen- I

ciado sobre indivíduos isolados. Por isso 111eSlllO, essa teoria se.. .: .

sustentou sobre dois pilares. O primeiro deles estava no conceito

de sociedade de massa, concebida corno

"um agregado que nasce e vive para além dos laços comunitários e

,co ntra esses mesmos laços, que resulta da desintegração das culturas

I?cais e no qual as funções comunicativas são necessariamente im­

pessoais e anônimas. A frag il idade de uma audiência indefesa e pas­

siva provém precisamente dessa dissolução e dessa fragmentação"

(WOLF, ibid.: 26)., .

O segundo pilar encontrava-se nos modelos teóricos da cornu­

nicação, que davam sustento a esse tipo de pesquisa, a saber, a

teoria da ação elaborada pela psicologia behaviorista de Watson,

pelas teorias do r~lsso Pavlov sobre reflexo condicionado e a psico-

. log ia das massas de Le Bon. Essas teorias se adaptavam perfei­

tarnente às teorizações mecanicistas sobre a sociedade de massa,

fornecendo-lhes "o suporte enl que se apoiavam as convicções

acerca dainstantaneidade e da inevitabilidade dos efeitos:' dos .mass media sobre as massas (WOLF, ibid.:'27).

" ;._ A abordagem ernpfrico experi men tal ou "da persuasão", que, levou, mais tarde, à.superação da abordagem' hipodérmica" apre­

sentou .d.~las.fa.cetas: (a) empírica de tipo psícologico-expenrncn­

t~1 ou de tiposociológico e (b) funcional, representada pela abor­dagem funcionalista dos meiosde massa.

Severin e Tankard (ibid.: 131-203) apresentaram as pesquisas

~.~ócio-psicológic~sern suas várias tendências. Dentre elas, as prin­

cipais ~s.tão, de um lado, nas teorias de consistência cognitiva que

. s ~ desenvolveram na teoria do equiiíbrio de Heider, na teoria si­

métrica de Newcornb, na teoria da congruência de Osgood e na

teoria ela dissonância cognitiva de Festinger. De outro lado, estãonas teorias da persuasão que se desenvolveram a partir do concei­to de atitude de Hovland. Essas duas téndências teóricas maiores

sobre mudança de atitude, a da consistência, de Festinger e ou­tros, e a da aprendizagem, de Hovland, existiram lado a lado por

algum tempo, com pou,ca relação aparente entre si. Foram Daniel

Katz e seus colegas Sarnoff e McClintock que, desenvolvendo a

32 Comunicação fI Pesquisa

I

r ,

Lucia Santaella 33••1

•••.:•.'•.1•••I.;•••••.;•.''.'•••••.'•••••••••.L

teoria funcionalista, reconciliaram esses dois modos distintos de'

lidar CO~l a mudança deatitudePa;-a \Volf (ibid.: , 3'4) ~ a "teoria dos meios de comunicação que

resultou dos estudos psicológicos 'experimentais levou à supera­

ção do entendimento do processo cornunicati vo corno U111a rela­

ção mecanicista e imediata entre estímulo e resposta, o que tornou

evidente, pela primeira vez, na pesquisa sobre comunicação de

massa, a complexidade dos elementos que entram em jogo na re­

lação entre emissor, mensagem 'e destinatário.

A faceta empírica de tipo sociológico, por seu turno, r~!eria­

se a todos os mass media sob o ponto de vista de sua capacidade

de influenciar o público, com atenção, entretanto, à capacidade

' difere~c i a cia de cada mass media para exercer influências distin ­

tas. O 'pro ble ln a continuou aí a ser o dos efeitos , mas colocado de

modo menos simplista do que na teori a hipodérmica. O coração

da pesquisa sociológica de campo consistiu na associação de "pro­

cessos de comunicação de massa às características do 'con texto

, social em 'q ue esses 'processos se realizam" (ibid. : 47 ). Fundarnen­

talmente presente 'nos' influentes trabalhos' de P. Lazarsfeld e R.Merton, dentro desse tipo depesquisa distinguiam-se duas corren­

tes: (a) Oestudo da composição difel:~nciadados públicos ~ dos seus

modelos de consumo de comunicação de massas e (b) as pesqui­

sas 'sobre as mediações sociais que caracterizam esse consumo.

Bastante conhecida se tornou a pesquisa baseada no tw?, step

fl ow communication, desenvolv ida por E . Katz e P. Lazarsfeld

Ci95S; ver também KATZ, 1957). Sob essa ótica, os meios de

comunicação não influenciam diretamente o público iorie step flow ,

"fl uxo unidirecional"), mas o influenciam pela mediação de gru­

pos o'u'de'Jfdei-es que retornam ounão a mensagem da inídia , ,ha­

vendo um fluxo de influência da mídia sobre os líderes e destes

sobre aopinião (SFÉZ; 1994: 83). .Tendo começado com os problemas da manipulação, para pas­

sar aos 'da persuasão, depois à influência, ás pesquisas em cornu-

r .

"a problemática dos mass media a partir do ponto de vista da socie­

dade edo seu equilíbrio, da perspectiva do funcionamento do siste­

'ma social no seu conjunto e do contributo que as suas componentes

(mass media incluídos) dão a esse funcionamento. O que importa aí,

portanto , é "a,dinâmica do sistema social e o papel que nela desem­

penham as comunicações de massa" (W OLF ibid .: 63) .

meação de massa chegaram, assim, ao estudo das funções, que

obtinha seu suporte na teoria sociológica estrutural-funcional ista

cujo grande ideal izador foi Talcott Parsons. .autor da obra The

structure ofsocial action (1937). À luz dessa teoria sociológica, a

pesquisa ern comunicação, que se tornou dominante nos Estados

Unidos, visava definir

35Lucia Santaella

Algum tempo depois, um desdobramento da teoria funcio-

- na lis ta que' alcançou notoriedade foi a hipótese dos " usos e satis­

fações" (uses and gratificdtionsv . Ainda enraizados nas ciências

sociais, os estudos dos efeitos passaram dos usos corno funções

para as funçõesdos 'usos , saltando. iportanto, da pergunta "o que

os mass media fazem com as pessoas'?" para a pergunta "o que é'que 'ás pessoas fazem com 'os mass media'l" Assumindo que a

audi'êncÜi é tão ativa quanto os emissores das mensagens , esses

estudostomaram como base a crença de que a audiência apresen­

ta um complexo conjunto de necessidades que ela busca satisfa­

zer com os mass media. Assim, o traço característico da hipótese

"dos usos e satisfações" foi considerar o conjunto das necessida­

des do destinatário COlno urna variável independen te para o estu­

do dos efeitos. Sob esse ponto de vista, a influência das comuni­

cações de massa permanece incompreensfvel se não se considerar

a sua importância relativamente aos critérios de experiência e aos

contextos situacionais do público, pois "os sistemas de expectati­

vas do destinatário não só intervêm nos efeitos provocados pelos

Comunicação & Pesquisa34••••••••••••.\•••.'•••••••••••••••••,e\

rnass media como também regulam as próprias modalidades de

exposição" (WOLF, ibid.: 78; FISKE, ibid .: 151).Nos anos 80, essa corrente dos "usos e satisfações" aprofundou-

. se no papel assumido pelas audiências e pelo seu envolvimento,este dependente da maneira como as diferentes culturas constróemo papel do receptor, isto é , como grupos particulares no seio de

diferentes culturas realizam leituras singulares, por exemplo, de

um mesmo seriado de TV (A. eM. MATTELART 1999: 151).Em 'franca oposição aos métodos quantitativos e à análise do

conteúdo manifesto da mass comrnunication research, desenvol­

verarn-se, também nos Estados Unidos, pesquisas etnorneto­

dológicas tendo como tarefa dar co~ta da dimensão subjetiva dosprocessos de comunicação. Com isso , buscou-se resgatar' ao re­

ceptor a capacidade de produzir sentido e de desenvolver proce­

dimentos de interpretação. Vendo a comunicação como uma prá­

tica social e textual, os trabalhos etnográfJéq?buscaramr'~c'uperar

a dimensão social não em uma teoria sócio-politica de larga-esca­ra mas nas circunstânciasconcretas da vida cotidiana. Isso envol­v~ a observação daspessoas nop~·ocesso·c.oTn~inicativo, ·fazendo­os faiar sobre seu papel (FISKE··ibid.: 161).

Conforme Wolf, o início dos anos 80, foi marcado por uma

situação de transição nos estudos de comunicação de massa. Nes­

sa fase transicional, sob seu ponto ' de vista, duas t~n~êfências de

pesquisa se destacaram. A elas Wolf deu grande atenção em seu

livro·:.-'~ hipótese do ag enda-setting e o newsmaking . À luz do agen­

da setting, dada sua responsabilidade na.seleção e classificação

das informações, os edi tores e programadores desempenham Ul11

papel importante na formação da realidade social. , - ' : ~

A hipótese do ag enda-setting não defende que os mass-mediapretendam persuadir. Quando descrevem e precisam a realidade

exterior, os mass media apresentam ao público urna lista daquilo

sobre que é necessário ter urna opinião e discutir. O pressupostofundamental do ag enda-setting é que a compreensão que aspes-

......- ..

Lucia Santaella

soas têm de grande parte'da realidade sociallhes ~ fornecida, por

empréstimo, pelos mass media" (SHAW, 1979: 96). Para Bougnoux,

"Antes de chegar até nós como sendo o próprio fumar do mundo ,

. todo acontecimento já foi selecionado pelos desks de agência, pro­

movido, envolvido e aromatizado pelas salas de redação .. . O grande

relato de nossa época, nosso espelho e nossa auto-referência perten­

cem, doravante, aos meios decomunicação de massa ; presentemente

é a imprensa que faz a história e detém a 'função de agenda" (= o que

se deve pensar em cada manhã)" (1994: 161-162)

•37 •

••••.1.;.'.;•••e\

Segundo Sfez (1994: 87), com o agenda-setting , seus autores, •Mac Comb e Shaw (1972) ,. buscaram evitar os inconvenientes, de •

um lado, dasteorias .dos efeitos diretos da mídia, de outro, da •

teoria psicológica t? cognitiva dos "usos e gratificações" . Para eles, •

há efeitos da mídia, mas esses efeitos são indiretos : Usos e gratifi­cações são buscados, mas "a necessidade de orientação é bem . ;

mais flexível, menos racional, menos cognitiva do que se acredi- •ta". Por isso mesmo, o agenda-setting produz influência a longo . ;

.t.J?razo, ao contrário das concepções cognitivas da "necessidade de •

orientação" (ver também SEVERlN e TANKA}~.D, 199.2: 297-229).•

A segunda tendência apontada por Wolf, onewsmaking, ba- •

~...sei a-se em técnicas de pesquisa participativa, pois °qu.e importa •

nesse tipo de investigação é a prysença do investigador no local. •

A abordagem articula-se sempre dentro de doislirnites: a prC?du- •

ção de informações ..de massa depende, <!e Y~ll lado , 9.~ cultura .'profissional dos jornalistas e a organização do tra~al.ho e, de OLl- •

tro, dos processos produtivos . As conexões entre esses dois lados

se constitui no ponto central desse tipo de pesquisa. . •

Depois de quinze anos desde a publicação de seu livro, atual- •

111ente se pode ver queWolf deu mais valor a essas duas tel~dên- •

das do que elas mei..eciam, visto. q.L;e:.n~_o chegaram a.se ~OI1st.~tuir,.)de modo algurn, em teorias da comunicação com a generalidade.'

•~-

Comunicação 0- Pesquisa '36

-"- - - - - _._.._ - - - - -

2. As TEORIAS CRÍTICAS

Na contracorrente da mass communication research qu e 'sedesenvolveu nos Estados Unidos, surgiu na Alemanha, por volta

da segunda guerra mundial, na chamada Escola de ' Frankfurt um,movimento intelectual que passou a ser conhecido sob a rubricade teoria crítica. O ponto de partida da teoria crítica foi a dialéticada economia política fundada no materialismo marxista, ou seja, acrítica à sociedade de mercado na qual se dá a alienação dos indi­

víduos em relação à sociedade como resultante histórica da divi­são de classes.

A teoria crítica se propôs como uma teoria da sociedade noseu todo, insurgindo-se contra as disciplinas setoriais, especia­

lizadas em diferentes campos de competência e subordinadas àrazão instrumental. Desviando-se, em função disso, da compreen-

que estas exigem. Trata-se muito mais "de teorias setoriais, pró­prias do campo específico da imprensa, que só de maneira muitoforçada podem se prestar a uma generalização para todos os cam­pos da comunicação.

Embora tenha sido correto o diagnóstico feito por Wolf de queo início dos anos 80 surgia como um momento de transição, esse

diagnóstico errou de alvo em relação aos rumos dessa transição,

rumos que Wolf não foi capaz de pressentir. Por estar excessiva­mente preso à idéia dos mass media, Wolf deixou de ver que ahegemonia dos meios de massa e a idéia mesma de comunicaçãode massa começaria a ser posta em crise a partir dos anos 80,quando vários fatores vieram precipitar a entrada dos fenômenoscomunicacionais em um universo extenso e diversificado de no­

vas questões. Mas esse é um assunto que será considerado oportu­namente. Por enquanto, passemos para a segunda tradição dosestudos de comunicação.

"divertir-se significa estar de acordo [...]; significa sempre: não de­

ver pensar, esquecer a dor mesmo onde essa dor é exibida. Na sua

LUCia oantaeua

são da sociedade como um todo, essas disciplinas acabam por

funcionar como mantenedoras da ordem social existente.Enquanto a sociologia funcionalista concebia as mídias como

"novas ferramentas das democracias modernas, como mecanis­

mos decisivos de regulação da sociedade" (A. eM. MATTELART,1999: 73), os filósofos da escola de Frankfurt, especialmente Hor­kheimer e Adorno, que durante o nazismo se exilaram nos Esta­

dos Unidos, criaram, em meados dos anos 40, o conceito de indús­tria cultural através do qual desmistificavam as ilusões acalenta­das pelo funcionalismo. À luz desse conceito, a produção dos bensculturais está inserida no movimento global de produção da cultu­ra como mercadoria, selando a degradação do papel filosófico­existencial da cultura. Portanto, através desse conceito de indús­

tria cultural, a teoria crítica se aproximou da questão dos massmedia. De fato, foi sobre a indústria cultural que a teoria crítica

incidiu mais contundentemente a sua crítica.Segundo a lógica da indústria cultural, todo e qualquer produ­

to cultural ~" um filme , um programa de rádio ou de televisão, umartigo em uma revista etc. - não passa de uma mercadoria subme­tida às mesmás leis de produção capitalista que incidem sobrequaisquer outros produtos industrializados: UIn sabonete , um sa­

pato ou quaisquer outros objetos de uso. Diferentemente destes,

os produtos da indústria cultural são simbólicos, produzindo nos

indivíduos efeitos psíquicos de que os objetos utilitários estão isen­tos. Entretanto, todos ilustram igualmente a mesma racionalidadetécnica, o mesmo esquema de organização e de planejamento ad­ministrativo que levam à uniformização e padronização. Em fun­

ção disso, a ubiqüidade, a repetitividade e a estandardização daindústria cultural fazem da moderna cultura de massa um meio de

controle psicológico inaudito. Em uma sociedade como tal,

~omunlcaçao b l-"esqUlsa':>0

••••••••••••••••

••••••

••••••..

Da di versidade radical da teoria crítica em relação a outrasteorias dos mass media, resultou uma concepção diferente por elaprofessada acerca dos próprios mass media, visto que, segundosua ótica, trata-se aí de instrumentos de reprodução demassa que,na liberdade aparente dos indivíduos, reproduzem as relações deforça do aparelho econômico e social (WOLF, ibid.: 94).

Também alinhadas às linhas de força da teoria crítica estive­ram as idéias de Herbert Marcuse. Enquanto Horkheimer e Ador­no retornaram a Frankfurt depois da guerra, Marcuse permaneceunos Estados Unidos, na Universidade da Califórnia. Sua obra so­bre O homem unidimensional (1964) tornou-se uma verdadeirabíblia da juventude contestatória do final dos anos 60. Com suacrítica, Marcuse buscava desmascarar a irracionalidade de ummodelo de organização social crescentemente conduzido pelasdeterminações da ciência e da técnica, que mais subjugam do quelibertam o indivíduo. Nessa sociedade unidimensional, na qual sócirculam "linguagens unidimensionais", não há mais espaço para

o pensamento crítico.Herdeira dessa corrente de pensamento e alinhada, portanto, à

tradição da teoria crítica, encontra-se a extensa obra do filósofoalemão Jürgen Habermas. Em 1962, publicou O espaço público.A rqueologia da publicidade co/no dimensão constitutiva da socie­dade burguesa, onde lançava as bases para suas teses posterioressobre a racionalidade técnica, estas publicadas em 1968, no seulivro sobre A técnica e a ciência co/no ideologia.

Com o desenvolvimento das leis de mercado e com sua intrusãona esfera da produção cultural, dá-se o declínio do espaço público

"a manipulação da opinião, a padronização, a massificação e a ato­

mização do público. O cidadão tende a se tornar um consumidor de

comportamento emocional e acIamatório, e a comunicação pública

dissolve-se em atitudes como sempre estereotipadas, de recepção

isolada" (A. eM. MATTELART, 1999: 82-83).

41Lucia Santaella

que se desenvolvera com a constituição de uma "opinião públi­ca" em fins do século XVII na Inglaterra e no século seguinte naFrança. Esse espaço público caracterizava-se como mediador en­tre Estado e sociedade, permitindo a discussão pública, a troca deargumentos entre indivíduos e o confronto de idéias e opiniõesesclarecidas. Na sociedade de mercado, esse espaço público pas­saa ser substituído por formas de comunicação cada vez maisinspiradas em modelos comerciais de fabricação de opiniões. Aodefender essa tese, Habermas, assumiu posições similares às deAdorno e Horkheimer sobre

Dando continuidade a essa crítica, as posições defendidas pos­teriormente por Habermas no que diz respeito à racionalidade téc­nica funcionaram como uma resposta a Marcuse. Enquanto estenão via outro caminho para a libertação do homem unidimensionala não ser sob a condição de uma revolução completa da ciência edatécnica, Habermas buscou uma alternativa para a degenerescên­cia política do Estado na restauração das formas de comunicaçãonum espaço público estendido ao conjunto da sociedade. A ênfa­se na comunicação viria a ser, daí para a frente, uma tônica daobra de Habermas.

De acordo com A. e M. Mattelart, as reviravoltas lingüísticasnos anos 60, da lingüística pragmático-enunciativa, que incorpo­rou contribuições como as da teoria dos atos de fala (AUSTIN,1962; SEARLE, 1970), da nova retórica belga (PERELMAN eOLBRECHTS-TYTECA, 1958) e da pragmática alemã (WUNDER­LICH, 1972), afetaram as sociologias interpretativas, os teóricos

Comunicação [, Pesquisa

base está a impotência. É efetivamente fuga; não como se pretende,

fuga da feia realidade, mas da última idéia de resistência que a reali­

dade pode ainda ter deixado. A libertação prometida pelo amusement

é a do pensamento como negação" (HORKHEIMER e ADORNO

1947: 156 apud WOLF 1987: 87).

40

da sociologia da ação, especialmente Parsons, repercutindo tam­bém em Habermas . A partir disso, e tomando como base Weber eMarx, Lukács e Adorno, Mead e Durkheim, Habermas foi levadoa elaborar sua teoria do agir comunicativo, tendo em vista estabele­cer os fundamentos conceituais de uma nova razão crítica, autôno­ma , adaptada ao nosso tempo (1981). À razão e ação utilitárias einstrumentais, que encontram nos meios de comunicação de mas­sa seus dispositivos de transmissão privilegiados, Habermas con­trapôs outros modos de ação e de relações com o mundo, quais se­jam, "a ação objetiva e cognitiva que se impõe dizer a verdade, aação intersubjetiva que visa à correção moral da ação, a ação expres­siva que supõe a sinceridade", em suma, "atividades de interpretaçãodos indivíduos e grupos sociais" (A. eM. MATIELART ibid.: 143).

Essa proposta de Habermas foi discutida pelos quatro cantosdo mundo, mas não tardou muito a ser questionada, visto que asexpectativas de compreensão que ela pressupõe parecem tomarcomo base o diálogo entre filósofos, além de que não prevêem assobredeterminações incontroláveis do inconsciente que interferemnas ações humanas (ver PRADO, 1996).

Embora também tenha pertencido à escola de Frankfurt, Walter. Benjamin desenvolveu formas de pensamento bastante autôno­mas que só vieram a ser mais plenamente recuperadas e inteligidasa partir dos anos 80. Dada sua autonomia, essas idéias não se enqua­dram fielmente na tradição da teoria crítica, mas se espraiam portodas as quatro tradições de estudos da comunicação que aqui deli­mitei, produzindo seus efeitos mais especialmente em algumasdas correntes culturológicas e midiáticas, além da grande influên­cia que a obra benjaminiana (ver especialmente 1975) tem exerci­do sobre o pensamento da arte nas suas interfaces com a tecnologia.

Posição também independente, mas mais alinhada com aquiloque poderíamos continuar chamando de uma teoria crítica, en­

.contra-se na obra do poeta e crítico dos meios de comunicação,Hans Magnus Enzensberger (1970). Seu desafio lançado às es-

querdas políticas de liberação do potencial emancipador dos meiosde comunicaçao se tornou mais conhecido depois de ter sido du­ramente criticado por Jean Baudrillard em um dos capítulos deseu livro Por uma crítica da economia política do signo (1972),

no qual BaudrilIard nega aos meios qualquer possibilidade de eman­cipação, pois eles são o que proíbe para sempre a resposta.

No contexto da cultura intelectual brasileira, Lopes (1990: 52)inseriu muito oportunamente a influência de Gramsci, nos anos80 , como constitutiva do paradigma da teoria crítica de extraçãomarxista nos estudos da comunicação.

Oriunda de uma outra cultura, a francesa, mas perfeitamentesintonizada com os princípios da teoria crítica, encontra-se a obraLa société du spetacle, de Guy Debord (1967). Tanto se alinhacoma teoria crítica, que suas teses chegaram aos Estados Unidosno auge do movimento contestatório do final dos anos 60, trazen­do mais munição para os argumentos de Marcuse. Por espetáculo,Debord não quis significar exposição de imagens, mas as relaçõesdegradadas entre pessoas, relações estas mediatizadas pelos meiosde comunicação. Trata-se, portanto, de uma visão de mundo que seobjetivou e da qual não escapa nem mesmo o inconformismo, estetambém convertido em mercadoria em cada um dos pontos em que oconsumo invadiu espetacularmente a superfície de todos os continentes.

Também oriunda da cultura francesa, encontra-se a obra re­cente de L. Sfez (1994) . Embora não esteja diretamente filiada àescola frankfurtiana, pela autonomia de pensamento reivindicadapor seu autor, não só o título da obra, Crítica à comunicaçãn,quanto todo o seu conteúdo localizam-na dentro da moldura deuma teoria crítica à moda contemporânea. Sem desmerecer o am­plo e admirável panorama de tendências e correntes da comunica­ção e suas vizinhanças que o autor apresentou, o modo de proce­der de sua crítica convida a um breve comentário.

Toda a tradição da teoria crítica sustentou sua crítica ao tomarcomo base uma teoria geral da sociedade, a saber, a dialética da

••••

••••••••••••

•••••••

42 Comunicação [, Pesquisa Lucia Santaeua 4j

3. Os MODELOS DO PROCESSO COMUNICATIVO

A distinção entre teoria e modelo não é completamente nítida,por isso mesmo ambos são muitas vezes confundidos. De fato, em

45Lucia Santaella

algunsaspectos, os conceitos de teoria e modelo se sobrepõem,mas isso não significa ausência de diferença.

Segundo LavilIe e Dionne (1999: 93), teorias são generali­zações de grande envergadura da ordem das conclusões ou inter­pretações. O valor de uma teoria é, sobretudo, explicativo; trat a­se de uma generalização de explicações concordantes tiradas dosfatos que foram estudados para sua construção. Do ponto de vistado pesquisador, o valor de uma teoria é analítico, pois ela lheservirá para o estudo e análise de outros fatos do mesmo tipo.

Por teoria entende-se assim um corpo de generalizações e prin­cípios desenvolvidos em associação com a prática em um campode atividade (medicina, sociologia, economia etc.), que forma seuconteúdo como uma disciplina intelectual. Outra definição simi­lar nos diz que teoria é um conjunto coerente de princípios queconfigura uma moldura geral de referência para um campo de in­vestigação e que serve para deduzir princípios, formular hipóte-s,es para serem testadas, executar ações, etc.

O que essas duas definições deixam evidente é tanto o caráterdisciplinar da teoria na constituição de uma área do saber, quantoa ligação da teoria com a realidade empírica, a prática, a expe­riên-Cia e os fatos. Este último aspecto fica mais claro na definiçãode teoria como uma hipótese de trabalho à qual é dada probabili­dade por evidência experimental ou por análise fatual ou concei­tual, mas não estabelecida ou aceita conclusivamente como lei.Em síntese, toda teoria é uma entidade hipotética ou estrutura queexpl ica ou relaciona um conjunto observável de fatos. Mas aqui •surge uma nova dificuldade: a distinção entre hipótese e teoria. •Sobre isso, Newton da Costa (1977: 160) nos diz que •

•"entende-se por hipótese uma suposição que se faz, mas qu~ ainda •

não foi testada de modo intensivo e conclusivo; ela é aceita apenas

provisoriamente, sem status científico definitivo, dependendo, para •

tanto, de futuras verificações e análises críticas. As teorias, ao con-

Comunicação & Pesquisa44

economia política fundada no materialismo marxista. Trata-se, por­tanto, de uma crítica ontológica e epistemologicamente fundamen­tada, não importando aqui a que discussões essa onto-epistemologiapode ser submetida. Sfez, por outro lado, erigiu sua crítica nãomais do que sobre as bases de uma convicção nas iluminações deseu próprio espírito crítico. Sobre o álibi de dicotomias fracamen­te definidas entre forma simbólica e núcleo epistêmico, represen­tação e expressão, o autor alçou seu pensamento ao panteão deum demiurgo, capaz de enxergar quaisquer outras teorias sob oponto de vista de uru olhar de cima. Isso acabou por dar à suacrítica uma dicção arrogante e mesmo pedante, ao mesmo t~mpo

que, por baixo dela, oculta-se um mal disfarçado desejo de com­partilhar da intimidade dos grandes intelectuais, intimidade a que,de certa forma, através de sua crítica, Sfez julga aceder.

Também sintonizada com uma postura crítica, situa-se a obrade Rodrigues (1990) sobre as Estratégias da comunicação. Em­bora não tenha se prendido estritamente à tradição frankfurtiana,visto que seus apoios conceituais se ampliaram especialmente comHeidegger, Foucault, Deleuze etc., seu desencantamento com atécnica e com a instrumentalização do campo da comunicaçãolocalizam seu pensamento na tradição das teorias críticas.

No horizonte da teoria como crítica também tem despontadorecentemente a obra do esloveno S. Zizek (1991, 1992, 2000).Mesmo sem trabalhar diretamente com a teoria da comunicação,sua prática de uma sociologia interpretativa de fenômenos estéti­cos, culturais e midiáticos, que toma como base a psicanáliselacaniana, tem fornecido elementos para aqueles que desejam pros­seguir nos caminhos de uma teoria crítica.

"as teorias são sistemas de proposições que, em linguagem convenien­

te, pelo menos em tese, constituem coleções de sentenças. Natural­

mente é preciso que, na linguagem, haja símbolos que, de algum

modo, tenham conexão com a realidade, com a experiência. Sem o

preenchimento desta condição, não se tem uma teoria da ciência em­

pírica. Às vezes, tal conexão se faz com o auxílio de outras teorias",

Ainda conforme Newton da Costa (ibid.: 54-55), toda teoria deveencerrar uma estrutura conceitual a ela subjacente que se constitui na

alma da teoria. Em razão disso, as teorias empíricas podem tambémser axiomatizadas, o que significa buscar, com maior ou menor rigor,

sua versão global, local ou estrutural. Neste último caso, trata-se decaracterizar a estrutura matemática subjacente à teoria.

Por isso mesrrio, não há verificação cabal da verdade de teo­

rias. Elas são apenas quase-verdadeiras ou aproximadamente ver­

dadeiras, o que não significa que a verificação parcial ou confir­

mação da quase-verdade deixe de ter importância. Daí ser lícito

afirmar que as teorias são pragmaticamente verdadeiras. Vem daítambém que não existe falsificação de uma teoria, pelo simplesfato de que "uma boa teoria não se falsifica propriamente, masapenas se restringe, quando necessário, o seu domínio de aplica­

ção" (DA COSTA, ibid.: 161).Enfim, as teorias formam conjuntos de sistemas cognitivos que

dão conta de domínios variados, segundo critérios mais ou menosclaros. Assim, "as teorias devem sua aceitação à quase-verdade quecontêm. Uma boa teoria em D, devidamente corroborada e resistenteà quase-falsificação é, foi e será eternamente quase-verdadeira emD" (ibid.: 161). Na sua versão proposicional das teorias, Newton daCosta (ibid.: 163) acrescenta que, encaradas local ou globalmente,

As definições acima ajustam-se às teorias que são desenvolvi­

das no campo das ciências empíricas. Entretanto, há também teo­rias não-científicas, quer dizer, teorias que não têm o sentido empí­

rico e indutivo em que a qualificação de "científico" costum,aapa­

recer. A filosofia, a estética, as metateorias, ou quaisquer outros

tipos de especulações reflexivas, por exemplo, não são científi­

cas, visto que não se prestam às confirmações empíricas que asciências buscam. Isso não significa que essas teorias não devamse prestar aos testes do rigor, do poder explicativo, da consistên­cia interna, do insight e do valor heurístico de que as mais varia­das disciplinas podem se beneficiar.

Especulações reflexivas e questões metateoréticas são impor­tantes porque elas nos ajudam a ver o que se ganha e o que se

perde na busca de suporte empírico. Ainda são importantes por­que influenciam, até certo ponto, as direções que as pesquisas to­mam, o que também não significa que questões metateoréticasdevam ser demasiadamente enfatizadas, pois, quando isso suce­de, os pesquisadores podem ser desencorajados a dar prossegui­mento às teorias substantivas e suas aplicações empíricas.

Assim, por exemplo, enquanto toda a tradição da mass commu­nication research sempre se caracterizou dentro de uma vocaçãoempírica, a tradição da teoria crítica, por outro lado, sempre foinitidamente reflexiva e metateorética, especialmente na crítica quedesenvolveu, muito justamente contra grande parte da pesquisaempírica, em especial contra os aspectos instrumentalistas que esta

apresenta. Quanto à tradição dos modelos comunicativos, surgecom ela um outro foco de tensão. Antes de discuti-lo, que sejaexplicitado o que se entende por modelo.

As ciências da computação definem modelo como um sistema

matemático que procura colocar em operação propriedades de umsistema representado. Trata-se de uma abstração formal e, como

tal, passível de ser manipulada, transformada e recomposta emcombinações infinitas. O modelo visa assim funcionar como uma

47Lucia SantaellaComunicação & Pesquisa

trário, são suposições já estabelecidas, tidas como verdadeiras ou

aproximadamente verdadeiras".

46

•••••••

•••••••••••••••••

•••••

réplica computacional da estrutura, do comportamento e das pro­priedades de um fenômeno real ou imaginário (MACHADO 1993apud SANTAELLA e NOTH 1999: 167).

Diferentemente de uma teoria, um modelo não é um recursoexplanatório em si mesmo, mas, na sua capacidade de sugerir re­lações, ele ajuda a formular teorias. Deutsch (1952) afirmou queum modelo é "uma estrutura de símbolos e regras operacionaisque supõe-se corresponder a um conjunto de pontos relevantesem uma estrutura existente ou processo". Por isso, os modelos sãoindispensáveis para o entendimento de fenômenos complexos. Porser uma forma de abstração e seleção de pontos a serem incluídos,o modelo implica julgamentos de relevância. Esses julgamentos,por sua vez, implicam uma teoria sobre aquilo que está sendomodelado. O modelo nos fornece assim uma moldura dentro da'qual consideramos um problema, ele também aponta para lacunasnão aparentes em nosso conhecimento de algo, sugerindo áreas

em que a pesquisa é requisitada.Segundo Deutsch (ibid.: 360-361) são quatro as funções de

um modelo: organizadora, heurística, preditiva e .a função demensuração. A função organizadora aparece na habilidade domodelo para ordenar, relacionar dados e mostrar similaridades econexões anteriormente não percebidas entre eles. Quando expli­ca algo ainda não sabido, o modelo adquire habilidades preditivas.Quando é operacional, implica em predições que podem serverificadas através de testes físicos. As predições podem funcio­nar como recursos heurísticos que levam a novos fatos e métodos.Quando permite predições quantitativas, o modelo se relaciona coma medição de um fenômeno. Se são bem entendidos os processosque ligam o modelo àquilo que é modelado, os dados obtidos coma ajuda do modelo constituem-se em uma medida, com maior oumenor complexidade (SEVERIN e TANKARD, 1992: 36-37).

Para Fiske (1990: 37), UlTI modelo é como um mapa. Ele re­presenta traços selecionados do seu território. Por isso mesmo,

nenhum mapa ou modelo pode ser completo. Mesmo assim, seuvalor está em sistematicamente colocar em relevo esses traçosselecionados, apontar para relações também selecionadas entreesses traços e fornecer um delineamento do território que está sendomodelado.

Assim sendo, o conceito de modelo é muito mais específicodo que o de teoria, de modo que modelos podem fazer parte deteorias, assim como, na maior parte das vezes, pressupõem teori-

, as, dado o poder explicativo que estas possuem. De fato, enquan~

to o traço definidor de teoria está em seu poder explicativo, o demodelo está em sua abstração imitativa, isto é, na sua capacidadepara abstrair caracteres relevantes de dados fenômenos ou pro­cessos, funcionando como IJm simulacro abstrato e permitindo,desse modo, a experimentação simulada do fenômeno ou proces­so com o qual o modelo tem uma relação de similaridade.

Na área de comunicação, ambas as tradições de estudos deteor sociológico, tanto a tradição da communication research quan­to a da teoria crítica, sempre se desenvolveram em franca oposi­ção a um outro grupo de teorias ou, mais propriamente, modelosvoltados para a especificidade dos fenômenos comunicativos. Nosanos 70, por exemplo, os estudos sobre mass media foram marca­dos pela polêmica entre sociologia e semi ótica. A 'tendência parase questionar a pertinência e a legitimidade dos modelos mais pro­priamente comunicativos para o estudo da comunicação extraiumuitos de seus argumentos da multiplicidade de saberes e compe-

.tências (profissionais, institucionais, políticas, científicas etc.) queestão implicadas nos processos de comunicação e que, segundoos oponentes, os modelos comunicacionais tendem a ignorar.

Entretanto, as oposições, o mais das vezes, provinham e conti­nuam a provir de uma visão hipersimplificada que se costuma terdos modelos comunicacionais, ignorando as evoluções por que,através dos anos, foi passando o modelo original dos processos decomunicação.

•••

49Lucia SantaellaComunicação [, Pesquisa48

"urna fonte ou nasc.ente da informação a partir da qual é emitido um

, , si,nal, através d.e um aparelho transmissor; esse sinal viaja através de

um canal , ao longo do qual pode ser perturbado por um ruído. Quan-. ' . . . .

" d? s.a} do canal , o sinal é captado por um receptor que o converte em

. , mensagem qu~, como tal, é compreendida pelo destinatário" (ECO,

1972 : 19 apud WOLF, 1987: 114) .

Esse primeiro modelo dos processos comunicativos teve iní­

c~o. na teoria ?a il:fonllação e da comunicação (ver BORMANN,1980) . A teoria da informação ou ' teoria maternáticada informa­

ção (SHANNC?N e WEAVER, 1949) originou-se nos trabalhos de

engenharia das telecomunicações e teve seu esboço, de autoria de

Shannon, publicado em 1948; A teoria matemática da comunica-

' ção é urna teoria sobre a transmissão otimizada das mensagens. . ' . . . .

cujo esquema resu~e-se ao seguinte: hásempre

.~s?e modelo foi muito imitado, questionado e transformado,dando origem a uma série de modelos subseqüentes. Antes dl~SSO,

110 mesmo ano ern que Shannon publicou o esboço de seu modelo,

Lassw'~11 (1948) também elaborou UI11 modelo muito simples de

~o'm,unicação verbal que haveria de ser influente justamente por sua

sÍ1~'plicidqde.Seu modelo se restringia aos seguintes ter1110S:quem

. diz o queern que canal

para quel11conl que efeito?

~p~sar. de influente, esse modelo de Laswell não chegou a

ganhar a mesma notoriedade do modelo de Shannon, que sempre

se: fez presente, inclusive para ser questionado. Foi assim que, por

considerar inadequada atransposição de problemas de engenha-. , ,

ria para a comunicação humana, Osgood desenvolveu, ern 1954,1I~1 'modelo cornunicacional deri vado' d~ ~ua teoria do significado

Modelo 'verbal = Área de estudo

51

Alguém =pesquisa de audiência

percebe um evento == pesquisa de percep~ão

e reage ~ medida de eficáciaem unia situação =estudo do cenário físico e social

através de alguns meios = investigação de canais ,

para disponibilizar algo ~ adrninistraçao , distribuição, de alguma forma =estrutura , organização, padrão' e contexto =estudo do cenário comunicativo

transmitindo conteúdo =análise de contexto, significado

com .a lguma conseq üência ., estudo' demudanças

e de processos psicolingüísticos em ,ge ral. Na mesma época,Schramm (1954, 1955) afirmou que as f órmulas matem áticas da

teoria da ínt or maçãobaset am-se em probabilidades. Unl51 vez que

o aprendizado altera essas probabilidades, o modelo da teoria

matemática de Shannon não poderia ser .ap licado diretamente à

comunicação humana. A partir disso, Schrarnm desenvolveu unia

série de três modelos , o primeiro ainda similar ao de Shannon, o

segundo introduzindo a noção de que apenas o que é compartilha­do no campo da experiência tanto da fonte quanto do destino pode

ser real mente comunicado, pois apenas essa porção do sinal é co­

nlUI11 a ambos. No terceiro modelo, a comunicação foi concebida

em termos de interação através do feedback e fluxo contínuo de

informação cornparti lhada-Tambérn interacionista já era o rnode­

lo sim étrico de Newcombf lS'óS) 'nas formula ções que introduziu

sobrea teoria da consistência cognitiva. Esse modelo foi expandi­

do no complexo modelodeWestley-McLean (1957) que tinha em

vist:~ 'inc luir fenômenos de comunicação de massa. Ampliando ,

por sua vez, o modelo verbal de Laswell, Gerbner (1956) previ u

dez áreas 'básicas para a pesquisa em comunicação, corno se se­

gue(S·EVERÜ'~·e'TANKARD, '1992: 38-56)':

Lucia SantaellaComunicação (, Pesquisa50•••••'.'.".••••••••••••••••••••••••••••

3.1 MODELOS LINEARES

Essa proliferação dernodelos, já presente na década de 50,não foi menor nos anos .subseqüentes . Para colocar alguma ordem

nessa profusão, Nõth (1990: 174-180) classificou todos o? mode­

los comunicacionais er» três grupos: (3.1) o modelo tradicionallinear, (3.2) modelos circulares e (3.3) modelos que rejeitam, oconceito de fluxo de informação, enfatizando a autonomia dos

organismos em interação. '

o modelo tradicional linear dos elementos básicos que e~ltr~nl

na composição de todos os processos de comunicação correspondeàquele que foi formulado pela primeira vez por Shannon & Weaver

(1949) . As críticas que insidiram sobre esse modelo, chamaram

atenção principalmente para o seu caráter I inear (ver, por e~em­plo, THAYER, 1972; KOCK, 1980). Se o problema da comunica­

ção consiste em "reproduzir em urn ponto dado, de maneira exataou aproximativa, urna mensagem selecionada em um outro pon­to" (A. e M. MATTELART, 1999: 58) ,a linearidade está aí ex­

pressa nos dois pólos do processo que definem urna origem e umfim. Ora, segundo os críticos, uma tal linearidade se revela como

urna representação inadequada do processo de comunicação, pois

linearidade sugere causalidade simples, A atividade do remetente

aparece corno urna causa que tem UI1l efeito calculado na mente. .

do destinatário. Isto leva à idéia de urna interação de um partici-

pante ativo com um passivo. De urna perspectiva ideológica, ess~

é um modelo que sugere um po tencial quase total de manipulaçãodo destinatário. O único fator que parece ameaçar este processo éo elemento de ruído. Evidentemente, a comunicação é um proces­

so mais complexo do que 6 de uma causalidade linear. O remeteu­te não deixa de ser afetado pelo processamento de informação do

destinatário. Desta forma, a linearidade torna-se necessariamente

circularidade.

3.2 MODELOS CIRCULARES

.'•••.'••.'••.'•.'eJ.'.)••.1.).1.:•.'•.:••••.'•.'•'.)

53Lucia Santaella

Quanto ao? modelos circulares de comunicação, o primeiro

delesjá haviasido esboçado por Saussure (1916: 28) quando des­

creveu o caminho dos sinais' acústicos (ondas' sonoras) CO'I~l'o um-riuxo de informação ern duas dit~eções: de um. e~1lissS)J' a um bu­vinte e de volta ao emissor. Este é o modelo dó diálogo.

, Com a 'c i ben~ é ti c a e a teoria de sistemas :f~raJll' introduzidos

novos conceitos, de circularidade 1;0 'lll·odelo ·de 'cOlnúnlcáção. Àteoria d'os sistemas, fundada jã ~n~ i933 pelo biólogo Lud'wig'von

' . Uma importante expansão da 'c'ade ja de comunicação linear

surgiu com a noçãode..repertório de' slgnos.jambérn ~h~má.do de. ' . ... . . . _ . . .

código. ,Os primeiros modelos contendo este elemento foram

apresentados POl~ Moles (19.58: ;163) e Meyer-Eppler (1959: '2).Abraham Moles, engenheiro e matemático, desenvolveu mais tar­

de (1975) seu projeto.de um.a "ecologia dacomunicação" sob a

influência da matemática de Sh'anno~'e da cib~rnética d~ N~rbert

Wiener (1948). Ce~tra1izado 'no concei'to de informação corno

matéria prima, Wiener expandiu ess~ conceito par~ o cat:lPo so­cial, entrevendo a possibilidade utópica de uma organização so­

cial em luta contra a ameaça da entropia, tendência para adesor­dem de um sistema, e em defesa da homeostase ou equilíbrio. Essahomeostase só poderia ser promovida pela informação, 'as .máqui-

, nas que a tratam e as redes que ela tece. .

De certo modo influenciada por essas idéias, a ecologia cornu­

nicacional de Moles é a ciência da inter~ção entre diferent~sesp é­cies no interior de um dado campo, no qual espécies reagem urnasàs outras. Essa ecologia teria dois ramos: de um lado, a con~i 'd'e~a­

ção do ser individual e a interação dOe suas l1lodaÍidades'de cornu­

nicação na sua esfera de tempo e espaço . De outro lado,' a organi­zação dos sisten~~s de transação entl~e os seres (A'. e M .'MATTE-LART ibid.: 65). ' .

Comunicação f., Pesquisa52

3.3 MODELOS INTERATIVOS

Bertalanffy, teve por objetivo fundamental pensar "a globalidade,

as interações dos elementos, maisdo que acausalidade, apreen­

der a complexidade dos sistemascorno conjuntos dinâmicos de

relações múltiplas e cambiantes" (A. e M. MATTELART, .ibid.:

62). O modelo sistêmico permitiu tornar menos linear o modelo

de Shannon aoincorporar o papel que o conceito defeedback (re­

troalirnentação) pode desempenhar no processo comunicativo.

Feedback, o monitoramento e a adaptação que' o emissor faz de

sua própria mensagem, através da observação do efei to desta noreceptor, t01110U-Se um termo chave da teoria dos sistemas de cornu­

- n i c~ção (ver WATZLAWICK et aI. , 1967; NOTH, 1975 , 1989).

No ~ntanto, os avanços introduzidos pela cibernética e pelateoria de sistemas também foram alvos de novas críticas. A pri­

meira delas tema ver com o conceito decontrole, que está impli­cado no modelo da teoria de sistemas, e que sugere um processode otimização, eficiência e de congruência de objetivos entre o

emissor e o receptor (ver LASZL\\ 1972: 251). Bastante serne­lhanteé a segunda objeção, que critica a representação ainda ina­

dequada do papel do receptor. Para superar essas objeções , al­guns modelos que enfatizam a autonomia do receptor nos proces­sos de comunicação têm sido desenvolvidos.

Não obstante as críticas e as modificações que foram econti­

nuam sendo inseridas no modelo original de Shannon, o que não

se pode negar é que o esquema analítico por ele proposto, ou seja,

a essência do modelo tern continuado cOln.o urna presença cons­

tante desde os anos 50 ..Em diversas versões e com mais ou menos

ligeiras transformações, o modelo tem se preservado 1l1UÜO pro­

vavelmente graças a sua aplicabilidade a fenômenos bem hetero-

. gêneos, quer o processo comunicativo se verifique entre máqui­

nas, entre humanos, entre humanos e máquinas, assim COIllO entre

••••••••••••••••••••••••••••••••••.>

54 Comunicação [; Pesquisa Lucia Santaella

microorganismos biológicos. Graças à forma geral do esquema e

graças à sua essencialidade e à sua .simplicidade, ele se fixou corno

um sistema comunicativo geral.Não resta dúvida de que, para urna tal fixação , foram impor-

tantes as contribuições dalingüfsticajakobsoniana e da s:enl iót!ca

de Umberto Eco e Paolo Fabbri, de modo .q ue , aos três tipos de

modelos que foram agrupados por Nõth, e apresentado_s .acirna ,

acrescentam-se mais três tipos: (3.4) o modelo ling üístico-funcio- .nal, (3.5) o modelo semiótico-informacional e (3 .6) o modelo

senliótico-textual.

3.4 O MODELO LINGüíSTICO-FUNCIONAL

Sem reduzir a ling üística à teoria da informação, Jakobson

(1962, 1971) criou UH1a rota intermediária entre ambas na. .suaamplamente conhecida teoria. das funçõesda linguagem.: Sem pl~O~

duzir modificações substanciais no .esquerna analítico 40 nlqd~l~

original, paraJakobson, a informação,com ênfase no seu estatuts

de mensagem, parte de um emissor. para um receptor, através. de

um canal, tendo por base um código comum. A novidade do es­

querna está no foco de referencial idade da mensagem , de onde

são extraídas as funções da linguagem: Esse foco pode estar vol­

tado para fora da mensagem, para aquilo a que ela se refere, paraum terceiro elemento entre o emissor e receptor. Nesse caso, afunção será referencial ou cognitiva . Mas o foco pode estar tarn­

bérn voltado para qualquer um dos outros elementos cornponen­

tes do processo comunicativo: o emissor, quando se tem a função

emotiva, o receptor, quando se tern a função apelativa, o canal,

quando se tem a função fática , o código, quando se tem a função

rnetalingüística e, por fim, a própria mensagem, quando se tem a

função poética. A legitimação e difusão alcançadas por esse es­

querna jakobsoniano foram , sem dúvida, llnl dos motivos do êxitoque levou à permanência do modelo cornun icacional original.

. .- .-.3.5 O MODELO SEMIÓTICO-INFORMACIONAL .

(IDe acordo COlll as diversas situações socioculturais, existe uma di­

versidade de códigos, ou de regras de competência e de interpreta­

ção. E a mensagem tem uma forma significante que pode .ser preen­

chida com vários significados, contanto que existam vários códigos

o caminho percorrido pelo modelo serni ótico-informacional

foi diferente. Longe de ter nascido do assentimento ern relação aomodelo original, ele nasceu da crítica à sua inoperância em pro­

cessos de comunicação humanos. Ao pôr ênfase na necessidade

de tratamento da questão da significação ou produção de sentido,

Urnberto Eco (1972: 26) propôs' que urna teoria da comunicação

mais abrangente só poderia ser encontrada em urna teoria semiótica

geral. Para Eco, só a serniótica poderia ser capaz de explicitar a

significação inerente ao processo comunicativo através da variá­

vel da decodificação e dos sistemas de conhecimento e cornpetên­

cias que a orientam . Disso se originou o que veio a se afirmar

CO'IllO um modelo serniótico-inforrnacional para o estudo da co­

municação, modelo este que salientava que "os efeitos ,e as fun­

ções sociais dos mass media não podem prescindir do modo como

se articula, dentro da relação comunicativa, o mecanismo de reco­

nhecirnento e de atribuição de sentido, que é parte essencial dessarelação" (WOLF ibid.: 123). . ~ ..

A novidade introduzida por esse modelo situava-se no concei­

to de código que, entendido semioticarnente, responsabiliza-se pelo

funcionamento dos fatores semânticos. Passou-se, assim, da no­

ção de comunicação como transferência de informação para a de

transformação de Ul11 sistema em outro, transformação esta garan­

tida pelo código. Com isso, o modelo serniótico-inforrnacional

introduziu, C01110 elemento constitutivo da comunicação, o seu

caráter in trfnseco ele processo de negoci ação en tre emissor e re­

ceptor, para o qual concorrem di versas ordens de fatores.

.'•.'•.'•.'•••••••••.:••.'•••.:••••••••••••I.'

57Lucia Santaella '

"o elemento da ação interpretativa operada sobre as mensagens, atra­

vés dos códigos: assim a dissimetria dos papéis de emissor e de re­

ceptor não era tida suficientemente em 'conside ração (a não ser na

forma de feedback, que é, contudo, um aspecto referenteà direção

da transrnissibilidade das mensagens). No modelo serniótico-texni-j ,

que es tabeleçam várias regras, de correlação entre determinados

significantes e determinados significados. E, no caso de existirem

códigos de base aceitos por todos, há diferenças nos subcódigos"

(ECO e FABBRI, 1978 : 561 apud WOLF, ibid .: 124).

Não obstante o relevo teórico desse modelo não obstante ain-,da a grande di vulgação obtida pela obra semi ótica de Eco ern vá-

rios países do mundo, antes meSl110 da explosão editorial de seu

romance O n071~e da rosa (ver no Brasil, por exemplo, ECO 1971),

a infl uência desse modelo sobre a pesquisa em comunicação ern

geral foi limitada. Segundo Wol:f (ibid. : 125), essa limitação se

explica pela falta de elaboração das conseqüências das hipóteses

da compreensão e decodificação das mensagens sobre os efeitos

sociais dos mass media. Embora o aperfeiçoamento desse modelo

se.mi ótico-informacirmal em um modelo posterior, serniótico-tex­

tual, tenha tomado as relações entre compreensão de mensagens e

efeitos sociais um pouco mais claras, este outro modelo também nãoalcançou uma repercussão maior do que o primeiro,

3.6 O MODELO SEM/ÓTICO-TEXTUAL

Não foram necessários mais do que alguns passos teóricos para

que o modelo sellliótico-informacional se desdobrasse e111 li 111modelo mais complexo serniótico-textual. Esses passos fO~'alll

dados graças à evolucão interna da própria teoria serniótica . O

modelo serniótico-inforrnacional salientava do processo cornuni­catí vo, sobretudo ,

Comunicação & Pesquisa56

o que merece ser salientado agor.a é que os destinat ários não

recebem simples mensagens reconhecíveis a partir de códigos

compartilhados, Recebem, isto sim ; conjuntos de práticas te xtuais

oriundas da cultura. Corn isso, a tra vés da incorporação de contri­

buições advindas da serni ótica da cultura, o modelo serniótico­

te xtual veio possibilitar a apreensão do modo corno , pela media­

ção da cultura, os dados sociológicos dos aparelhos dos mass media(fluxo unidirecional, centralização, formatos rígidos etc.) se trans­

formam ernmecanisrnos comunicativos que incidem sobre pro­

cessos de interpretação, aquisição de conhecimentos e sobre os

efeitos dos' niass media.Com isso , foram realçados não só os papéis desempenhados

pelas mediações culturais que permitem a circulação das práticas

te xtuais , como também o papel do..destinatário na construção e

funcionamento comunicativo, funcionamento este que, com ênfa­

se na dinâmica existente .e n tre destinador e destinatário, ligada àestrutura textual e nela incluída, é estudado pela serniótica e aná­1ise do discurso.

Eill meados dos anos 8q, Wolf (ibid.: 131) detectou acrise em

queo modelo comunicativo inforrnacional e todos os seus desdo­

brarnen tos estavarn imersos. Em seu cI iagnós tico, as razões para

uma tal cri se encon tra varn-se nos segu in tes fatores: a presença de

quadros de, referência mais gerais para os estudos elos mass me­

dia, a !lllt.d.ança de problemáticas consideradas principais , a pro­

gres~i~a esteri Iidade da l~esqll~sa ernpfrica de baixo perfi I e, por

fim, a existência de abordagens ~is,cip.lin~rtllente diferenciadas

sobre o concei to de comunicação.

3.7 Os MODELOS COGNITIVOS

As ciências cognitivas já começaram a se formar nos Estados

Unidos desde os anos 40 a partir da ci bern ética, da teoria da infor­

mação, do progresso da lógica matemática. Depois. dos anos 50,

elas foram recebendo um impulso cada vez maior com o desen­

volvimento dos computadores, das pequisas em inteligência arti­

ficial e com a sofisticação dos experimentos neuro-fisiológicos éneuro-psicológicos, Não se trata, portanto, de um campo unifica­

do de pesquisas, mas de uma vasta encruzilhada de disciplinas e

tendências de pesquisa que tern se expandido continuamente nas

últimas décadas . Por isso mesmo, trata-se de UIll campo tortuoso e

complexo cuja síntese já apresentei em outra ocasião (SANTA­

ELLA, no prelo, b). Dados 0'8 objetivos destetópico, limito-me a

Passados quinze anos, hoje se pode constatar que faltou ao

diagnóstico de Wolf um fator que estaria fadado a desempenhar

um grande papel na crise dos modelos de comunicação: a expan­

são da presença e da irnportância da di mensão da cultura e das

mídias nas sociedades pós-modernas, conforme será discutido no

próxi 1110 tópico.

. Faltou também ao diagnóstico de Wolf perceber para onde a

tradição teórica dos modelos cornunicacionais já estava nitida­

mente migrando em meados dos anos 80, a saber) para as ciências

cognitivas, nas quais os tradicionais modelos inforrnacionais e

cornunicacionais ficam .subsumidos a modelos cognitivos mais

amplos , aptos a estudar as interfaces contemporâneas entre seres

humanos e máquinas inteligentes (ver NÓTH) 1989). Embora o

campo das ciências cognitivas seja altamente híbrido, pode-se afir­

mar que um sétimo tipo de modelo do processo comunicaciorial já

surg!u ·nele. Do mesmo modo , pode-se levantar a hipótese de que,

na sopa bi ótica das ciências cognitivas , outros modelos podemai nda emergir. "

--':-.' .

59Lucia Santaella

, !

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Comunicação & Pesqu isa

esse limite é superado: na troca comunicativa, não são já as 'rnensa­

.gens" que são veiculadas, o que pressuporia urna posição paritária

entre emissores e receptorestéa relação cornu úicativaque secons­

trói em torno de 'conjuntos de práticas textuais't'(WOl.F ibid.: 126-"127).

58••••••••'.•••••••••••••••••••••••••.'

indicar abaixo um brevíssimo roteiro para que possamos chegar auma linha alemã recente de estudos da comunicação cujo pontode partida se situa em um dos ramos das ciências cognitivas.

Para os cognitivistas, a mente é um sistema que recebe, arqui­va, recupera, transforma, transmite e comunica informação. Inte­ressam a eles, portanto, os aspectos universais dos processos deinformação, buscando descobrir princípios fundamentais altamentegerais e explanatórios do processamento de informação. Devido aesse alto grau de generalidade, a visão da mente como um sistemaprocessador de informação se tornou dominante, naquilo que fi­cou conhecido como o modelo computacional da mente. Essemodelo se apoiou epistemologicamente no funcionalismo, para oqual a essência da natureza psicológica do estado ou processomental não está na sua realização física particular, mas sim no seupapel computacional no sistema processador de informação.

Entretanto, com o passar do tempo, o campo conceitual dasciências cognitivas ficou povoado de controvérsias e posiçõesantagônicas ao modelo computacional da mente, assim como opróprio modelo computacional foi se transformando na mesmamedida em que as ciências da computação e da informação, junta­mente com as pesquisas em inteligência artificial, iam se desen­volvendo.

Um dos desdobramentos mais complexos da chamada teoriacomputacional da mente encontra-se na teoria representacionalda mente de J. Fadar, enquanto, no extremo oposto do modelo da

mente em analogia com o computador, situam-se as neurociênciasque estudam a realização física dos processos de informação nossistemas nervosos humanos e dos animais.

Entre outras oposições, ficaram também famosos os debatesentre o cognitivismo e o conexionismo. Os conexionistas tentamreproduzir o comportamento humano usando redes de elementosprocessadores simples, redes neurais, cujas propriedades se asse­melham às das células cerebrais ou de conjuntos delas.

Na vasta encruzilhada de disciplinas que compõem o tecidodas ciências cognitivas , no campo mais específico da psicologiacognitiva, originou-se a abordagem denominada construtivista comdesdobramentos na psicolingüística (BRANSFORD, BARCLAYe FRANKS, 1972; ANDERSON e BOWER, 1973; BOWER eCOHEN, 1982). Tomando como base fundaçõesmais propriamen­te sociocognitivas, uma extensão dessa abordagem ao campo da.comunicação deu origem a uma corrente de pesquisa denominada

. construtivista (ver H. e B. SYPHER, 1988). Tais pesquisas evi­denciaram a relação entre estruturas cognitivas e geração de men­sagens, ligando a diferenciação cognitiva com uma variedade dehabilidades comunicacionais ou relacionadas com a comunicaçãoque documentam a conexão entre estrutura cognitiva e desempe-nho comunicativo. .

Antagônica aos modelos dominantes das ciências cognitivas,tanto os cognitivistas quanto os conexionistas, dentro do mosaicocomplexo de que as ciências cognitivas se compõem, nasceu umaabordagem minoritária, nem por isso menos influente, a partir daspesquisas de dois biólogos chilenos, A. Maturana e F. Varela so­bre sistemas autopoiéticos (ver, por exemplo, 1980). Tais siste­mas se organizam de acordo com a autonomia, a circulação e aauto-referência que constituem sua homeostase e sua auto-organi­zação. Opondo-se aos cognitivistas representacionalistas, para osquais uma entidade cognitiva sempre se refere a um mundopreexistente, na perspectiva autopoiética, que veio a ser tambémchamada de construtivistaradical , a informação não é preestabele­cida como ordem intrínseca ao sistema, mas emerge das própriasatividades cognitivas.

Sob a influência dessa teoria autopoiética, amalgamada comuma versão personalíssima da teoria dos sistemas e com a ciber­nética de segunda ordem de von Foerster, o sociólogo alemãoNiklas Luhmann desenvolveu uma intrincada teoria social queinclui as questões da comunicação e ação, comunicação e percep-

60 Comunicação [, Pesquisa Lucia Santaella 61 ••- I-•

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4. As TENDÊNCIAS CULTUROLÓGICAS E MIDIÁTICAS

Por tendências culturológicas estou aqui compreendendo os .

estudos que abordam os meios de comunicação e suas implica­ções como componentes de uma dimensão sócio-antropológica

ção (1984, 1995, 1970-1995). Ficou famoso o debate entre Haber­mas e Luhmann, publicado em livro (1971), em que Luhmann secontrapôs à teoria de Habermas ao afirmar sua teoria da auto­referencialidade dos sistemas sociais que tem seu eixo na questãoda complexidade de suas relações com seu meio e consigo mesmo.

Tomando como base a teoria de Luhrnann, desenvol veu-se, naAlemanha, uma teoria da comunicação no cruzamento da teoriados sistemas, cibernética de segunda ordem e construtivismo(KOCK, 1980, 1981; FUCHS, 1993; SCHMIDT, 1994, 1995,2000;DE BERG, 1997), com repercussões para além da Alemanha (ver,por exemplo, STEIER, 1989, 1995). No centro desse cruzamento,de um lado, a cibernética de segunda ordem deve ser entendidacomo uma realidade objetiva que não mais se apresenta como umobjeto, mas como uma realidade de segunda ordem, construídarelativamente a nossas posições, na qual o observador tem umainfluência determinante no que pretende observar. Trata-se aí dasubjetividade relativa de um pragmatismo do conhecimento quedesemboca na constatação de uma realidade de segunda ordemque 'inclui o seu próprio movimento em um desenrolar sem fim.

De outro lado, a teoria dos sistemas não deve ser compreendi­da com uma teoria das estruturas, mas dos processos, não de hetero­nomias, mas de autonomias, não do determinismo, mas da liber­dade. A teoria dos sistemas é a teoria da contingência. Ela assumeque toda ação social ou evento é sempre uma seleção de um cam­po de possibilidades, de modo que a realidade poderia ter sido edeve ser diferente (DE BERG, ibid.: 141). "A contingência dizque algo diferente também é possível" (Luhmann) .

63Lucia Santaella

I

maior, a dimensão da cultura, na qual os meios encontram umalógica de desenvolvimento que lhes é própria, mas ao mesmo tempoinseparável das injunções culturais . .

Entre as tendências volt1adas para a comunicação, estudada sobum ponto de vista que se pode chamar de culturalista, encontra-seaquela que, sob o nome de,cultural studies, se esboçou na Ingla­terra, entre meados dos anos 50 e primeiros anos da década de 60,em tomo do Centerfor Contemporary Studies, de Birmingham. Oobjetivo dos assim chamados cultural studies era definir o estudoda cultura que englobasse "quer os significados e os valores quesurgem e se difundem nas classes e nos grupos sociais, quer aspráticas efetivas através das quais esses valores e esses significa­dos se exprimem e nas quais estão contidos" (WOLF 1987: 108).

Em relação a tais definições e modos de vida - entendidoscomo estruturas coletivas - "os mass media desempenham urnafunção importante, na medida em que agem como elementos ati­vos dessas mesmas estruturas" (ibid.: 108). São duas as aplica­ções em que os cultural studies se especificaram: de um lado, ostrabalhos sobre a produção dos mass media enquanto sistema com­plexo de práticas determinantes para a elaboração da cultura e daimagem da realidade social; por outro lado, os estudos sobreo consu­mo da comunicação de massa enquanto espaço de negociação entrepráticas comunicativas extremamente diferenciadas (ibid.: 109).

Embora reunidos em torno de diferentes temas de trabalho,tais como etnografia, media studies, teorias da linguagem e subje­tividade, literatura e sociedade, todos esses estudos encontravame continuam encontrando uma linha comum de atuação tanto naconcepção da cultura como conjurito de todas as práticas sociais ecomo soma de suas interações, quanto na vinculação de seus tra­

balhos a questões suscitadas por movimentos sociais, o feminis- ,mo, por exemplo. Por isso mesmo, atualmente, em universidades

espalhadas pelo mundo inteiro, há departamentos voltados paraos cultural studies, muitos deles quase inteiramente dominados

Comunicação [, Pesquisa62

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por mulheres intelectuais dedicadas à defesa das temáticas das

minorias,Em uma corrente híbrida, tecno-culturalista, pode ser enqua-

drada a obra do canadense McLuhan (ver especialmente 1962,1964). Concebendo os mass media dentro de uma perspectivamuito ampla, McLuhan ligou-os essencialmente às transformações

antropológicas, perceptivo-simbólicas, introduzidas por cada ino­

vação tecnológica e comunicati va. Para McLuhan, os meios decomunicação moldam a organização social porque são estrutu­radores das relações espaço temporais às quais o pensamento esensibilidade do ser humano se conformam. Ficou famosa a suametáfora da aldeia global em que o planeta estava se convertendoem função do meio televisivo, segundo McLuhan, o mais frio e

participativo de todos os meios. Sua visão apoIítica da comunica­ção foi muito criticada nos anos 70, mas recentemente, com oadvento das redes de comunicação planetárias, a iluminação demuitas de suas idéias, especialmente daquela que está contida nametáfora da aldeia global, tem sido amplamente reconhecida.

McLuhan foi inspirador de toda uma geração de teóricos da

mídia, principalmente de origem canadense, que tomaram a si aambiciosa tarefa de construir uma história da civilização de umaperspectiva midiática (HAVELOCK, 1963, 1982; EISENSTEIN, 1979;ONO, 1982; MEYROWITZ, 1985). A maioria das pesquisas em

mídia tende a focalizar apenas uma dimensão do ambiente

midiático, a saber, o conteúdo das mensagens e suas implicações,

tais como a maneira das pessoas reagirem às mídias; a influência

dos fatores econômicos, políticos e institucionais naquilo que é

transmitido pelas mídias; se as mensagens midiáticas refletem ounão as variadas dimensões da realidade; como audiências diversas

interpretam de modo distinto o mesmo conteúdo, e assim por diante.A geração inspirada por MacLuhan, entretanto, por conside­

rar que as mídias não são simples canais para transmitir informa-o,

ção, mas conformadoras de novos ambientes sociais nelas mes-

mas, tem estado mais interessada "em questões como: quais os tra­

ços que caracterizam cada mídia e como esses traços tornam cadamídia física, psicológica e socialmente diferente de qualquer ou­tra? Como o advento de uma nova mídia, em uma matriz existentede mídias, pode alterar as interações sociais e a estrutura socialem geral? Nessa medida; esses teóricos acabaram por convergirna concepção de três estágios civilizatórios básicos, produzidos

pela interação entre mídia e cultura: as sociedades orais , as mo­dernas sociedades da escrita e a cultura eletrônica global (MEYRO­WITZ, 1993, 1994).

Com caracteres próprios, principalmente mais politizados, masalinhado a uma tradição que se pode considerar como origináriaprimeiramente do canadenseJ:larold Innis (1950, 1951) e, depois,

de McLuhan, enquadra-se ainda o projeto de Regis Débray, ini­ciado em 1979 e publicado em 1991, visando à fundação de umamidialogia geral. Centrada na análise do intelectual na sua funçãode oficiante dos aparelhos de transmissão, essa abordagem bus­cou estabelecer uma correlação entre, de um lado, as atividadessimbólicas - ideologia, política, cultura - e, de outro, as formas

de organização e os sistemas de autoridade que os modos de pro­

dução, arquivamento e transmissão da informação induzem. Ins­pirado na idéia de McLuhan de que o próprio meio determina ocaráter do que é comunicado, conduzindo a um tipo próprio de

civilização, Débray se defendeu da acusação de exaltar um determi­

nismo técnico ao colocar ênfase na necessidade de se descobrir as

determinações objetivas dos aparelhos do pensamento (A . e M.

MATTELART, 1999: 179).

Na mesma linhagem, mas utilizando suportes interpretativosdas mídias emprestados da semiótica, situa-se a obra de Bougnoux(1994). Estruturadas como uma teia de relações dos meios de massacom a cultura, literatura e arte, suas interpretações, muitas vezes

agudas e criativas, se sustentam também em alusões à psicanálisee ciências cognitivas.

••••

••••••

65Lucia SantaellaComunicação [; Pesquisa64

Distinta das teorias críticas de origem alemã, mas também an­tagônica aos direcionamentos das pesquisas norte-americanas dosmass media, surgiu a teoria culturológica de extração francesa queteve seu ponto de partida na obra inaugural L 'Esprit du temps, deEdgar Morin (1962, ver ainda 1973, 1986). Esta teoria não sevoltou diretamente aos mass media nem aos seus efeitos sobre osdestinatários, mas para a definição da nova forma de cultura da socie­

dade contemporânea que os mass media inauguraram.Embora seja a cultura realmente nova do século XX, para

Morin, a cultura de massas não é autônoma, mas pode embeber-sede outras culturas - nacional, religiosa ou humanística - nelas seinterpenetrando e, quase sempre, corrompendo-as. Embora tenhauma natureza que lhe é própria, constituindo-se como um conjun­to de símbolos, valores, mitos e imagens, a cultura de massas seinsere na complexa realidade poli cultural das sociedades contem-

porâneas.Tomando a estrutura do imaginário como mediadora entre os

pólos opostos dos processos de estandardização e exigências deindividuação que são próprios da cultura de massas, Morin en­controu no sincretismo o traço "mais adequado para traduzir atendência para homogeneizar a diversidade dos conteúdos sob umdenominador comum" (MORIN, 1962: 29 apud WOLF 1987: 102).

Sob a a'legação da ausência de sistematicidade e do teor vagoe generalizante dessa teoria culturológica desenvolvida por Morin,os sociólogos Bourdieu e Passeron (1963) não tardaram a rei vin­dicar um comportamento mais empírico e mais específico para o

tratamento dos meios de comunicação.Embora não se possa dizer que Morin tenha criado uma escola

de estudos culturalistas no sentido de deixar seguidores, pode-se;

no entanto, afirmar que os estudiosos franceses dos meios de co­municação, que foram contemporâneos ou vieram depois de Morin,

não obstante a inconfundível marca individual de cada um, en­quadram-se todos em uma tradição de estudos culturológicos. Com

a expansão do papel desempenhado pelas mídias no seio da vidasocial, essa tradição passou a adquirir feições culturalistas-midiáticas.

A partir do final dos anos 70, os estudos da comunicação fo­ram absorvidos em um ambiente geral de debates inteiramentenovos que veio a ser chamado de pós-modernidade. Entretanto,foram ainda as feições de uma tradição culturalista-midiática aque­las que mais fielmente caracterizaram essa absorção.

Desde os anos 70, os satélites de comunicação colocavam, nastelas de televisão de quaisquer partes do mundo, eventos de quais­quer outras partes. Essa composição de um panorama internacio­nal pluricultural foi intensificando, especialmente nos países cen­trais, a consciência das alteridades culturais, da existência do ou­tro na sua outridade. Graças a bancos de dados cada vez maispotentes, a memória culturalda humanidade começou a se acu­mular e se tornar cada vez mais acessível. Nas máquinas de xeroxem cada canto e cada esquina, desmembrando os livros em infini­dades de pedaços para atender necessidades personalizadas, nosjogos eletrônicos e no vídeo cassete, transformando os usos atéentão hegemônicos do aparelho de televisão, enfim, na multipli­cação crescente dos canais de TV a cabo, a cultura do disponível .começou a contaminar a cultura de massas com o virus da perso­nalização comunicativa do qual esta jamais se livraria.

Em suma, as novas tecnologias começaram a descentralizar acomunicação massiva, afetando a recepção de massa ao permitirao usuário maior controle sobre o processo de comunicação, atra­vés de canais de televisão a cabo e videotapes que davam à audiên­cia acesso a programas especializados. Com a emergente fragmen­tação e segmentação da audiência, a televisão não podia mais serpensada como um sistema monolítico. O fenômeno do zapping, amudança de canais através do controle remoto executada pelo.telespectador para ficar livre dos comerciais, tornou-se uma preo­cupação central na indústria da publicidade. O emergente Compu­Serve, serviço de in,formação através do computador, que podia

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66Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella 67

ser acessado através de terminais domésticos, deslocava a ênfasenos efeitos dos meios de comunicação de massa para a questão dainteratividade que se insinuava nas novas mídias (SEVERIN eTANKARD, 1992: 12-13). Todas essas mudanças no universo dacomunicação iam brotando no solo mais amplo da irrupção de umintenso debate cultural que viria tomar conta do mundo na segun­da metade dos anos 80, o debate sobre a pós-modernidade

(HARVEY, 1993; SANTAELLA 2000: 85-134; MENEZES 2001).Conforme já discuti em outra ocasião (SANTAELLA, ibid.:

118-119), quando Jean-François Lyotard publicou seu livro Lacondition postmoderne (1979), mal podia supor que essa obrafuncionaria, de um lado, como força aglutinadora de manifesta­ções intelectuais e artísticas que vinham dispersivamente se mani­festando e, de outro, como um estopim daquilo que viria a se cons­tituir em um dos assuntos mais candentes do final do século XX.A tese central do livro denunciava a perda de legitimidade dasmetanarrativas, especialmente políticas e filosóficas que, desde aRevolução Francesa, regulavam os discursos e procedimentos

considerados científicos. Com o abandono dessas narrativas cen­

tralizadoras, a ciência passou a ser paradoxalmente regida pelasfiguras do dissenso e da invenção, do que resultou a pulverizaçãodos discursos na rede flexível dos jogos de linguagem que encon­tram sua forma otimizada de produção e difusão nas novas

tecnologias de comunicação.O fervilhamento do debate pós-moderno e a profusão de posi-

ções diante dele que se seguiram a essa publicação de Lyotard

extrapolam os limites estipulados pelas finalidades do tópico des­

te capítulo. Para reatar a tradição culturalista-midiática dos estu­dos da comunicação no centro do debate pós-moderno, cumprechamar atenção para a posição personalíssima defendida por FelixGuattari (1993). Rejeitando a ideologia da pós-modernidade, pro­

punha que as tecnologias da informação e comunicaç~o ope~am ,

no centro da subjetividade humana em todas as suas dimensões:

da inteligência, memória, sensibilidade e afetos. Militava, em fun­ção disso, pela reapropriação das máquinas de .comunicar numaperspectiva de experimentação social.

Distinta dessa posição é aquela defendida por Paul Virilio(1993, 1996a, b), na sua desconfiança quanto à própria possibili­dade de uma teoria da tecnologia, dada a aceleração de suas mu­danças que motiva um pensamento sob o signo da velocidade.

Quanto mais as transformações tecnológicas aceleram seu ritmo,mais as atividades humanas se reduzem à inércia, substituídas quesão pelos aparelhos que levam à perda da sensação da duração, davida corporal e social.

Ainda mais radical é o negativismo de Jean BaudrilIard (ver,por exemplo, 1974, 1976, 1981, 1983aeb).Emcompletoantago­

nismo a quaisquer crenças iluministas, para ele, a comunicação"virou uma vítima do excesso de comunicação, excesso que levouà implosão dos sentidos, à perda do real em um mundo fantas­magórico povoado de simulacros. Sob esse ponto de vista, a rea­lidade está cada vez mais sendo convertida em signos vazios, anu­

lando-se dramaticamente a nossa capacidade de resistência a esse

esvaziamento. Todos os rincões da vida contemporânea estão sendoinvadidos por objetos e experiências artificialmente produzidos(signos) que não têm mais relação nenhuma com a realidade. Elessão seus próprios simulacros puros, tentando ser mais reais doque a realidade (hiper-reais). Sob esse regime, entram em colapsotodos os antagonismos políticos. Os opostos se dissolvem uns nos

outros, e todos os atos acabam por beneficiar a todos, disseminan­

do-se em todas as direções (SANTAELLA ibid.: 120). Outrasposições menos apocalípticas do que a de BaudrilIard podem serencontradas, por exemplo, em F. Jameson (1~84), em G. Vattimo(1991), Maffesoli (1996) e Lipovetsky (1997).

Embora se situe muito longe das origens das teorias crfticas, o

negativismo baudrillardiano tem um certo sabor atraente', sedu­

zindo aqueles que se filiam às idéias defendidas por aquelas teo-

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68 Comunicação 5- Pesquisa Lucia Santaella 69r

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5. CONCEITOS DE COMUNICAÇÃO NAS CIÊNCIAS VIZINHAS

Além das quatro tradições de estudos específicos de comuni­

cação , acima esboçadas, em várias ciências vizinhas , conceitos eteorias híbridas da comunicação tamb ém construiram seus ninhos.O contorno abaixo, baseado em Noth (1990 e 2000) , de áreascorrelatas à comunicação não é exaustivo, mas ilustrativo de al­guns terrenos em que a comunicação COITIpareCe muitas vezes COITIO

concei to chave.Assim, o CalTIpO da comunicação não-verbal é um ramo da

psicologia social. A delimitação ~as for,mas 'comunicativas 'e não .comunicativas do comportamento cotidiano é L1m .~e seus proble- "ITIaS mais fundal~entais. 'A zoosserniótica, institucionalmente L~m

ramo da biologia e, mais particularmente. ia etologia (ver SMITH,

rias. Porém um tal nível de óatasrrofisrno certamente não é com­

partilhado por muitos. Se ele faz algum sentido àintelectuais blasés,situados em sociedades de primeiro mundo, às' sociedades perifé­ricas devem caber outras estratégias de pensamento e ação quenão caiam, pelo menos, no conformismo catatônico de que nada '

resta a fazer,De fato, as teorias ou reflexões sobre a comunicação que sur­

giram , por exemplo, na América Latina, estão bem longe do ca­tastrofismo conformista. 'A maior palie dessas teorias, com as pecu­liaridades que lhes são próprias, enquadram-se em UlTIa tradiçãoculturológica e também midiática. Mantendo como constantes osternas das apropriações, expropriações, mimetismos , identidade,resistência e, mais recentemente, expropriação e exclusão, essasteorias têm interferido no' debate contemporâneo, nele introd.uzin­do conceitos originais, tais como: hibridização, mestiçagem, mo ­dernidade alternativa, rnediações midiáticas (ver especialmenteCANCLINI, 1990; BARBERO, 1987; SODRÉ, 1991, 1996, 2000a;

PINHEIRO 1994) .

1977), levantam o problema da origem filogenética e dos traços

distintivos da comunicação. Tembrock (1971) define este campousando o termo "biocornunicação".

Numa tradição iniciada por antropólogos e lingüistas antropo­lógicos, tais como Sapir, Whorf, Malinowski, Firth , Leach (1976)e Lévi-Strauss (ver SCHMITZ, 1975), a comunicação tornou-seum termo chave para a análise das sociedades e das culturas. Atese proposta por G ..Bateson (ver LA BARRE, 1964: 191) de que"toda cultura é comunicação" condensa o amplo escopo do con­ceito na antropologia cultural. Essa tradição foi particularmenteinfluente para o desenvolvimento da serniótica especialmente !lOSEstados Unidos. Significativamente, foi a antropóloga MargaretMead que, na Conferência -da Universidade de Indiana de 1962sobre Paralirigüfsticae Cinésica, introduziu "semiótica" como umnovo termo para o estudo de "comunicações padronizadas em todasas modalidades" (ver SEBEüK et al., 1964: 5).

Ainda segundo Nôth (1990: 169), um ramo da lingüística an-tropol ógica que influenciou a sociolingüística foi a etnografia da-cornunicação de Hymes (ver SCHMITZ, 1975). Seus objetos de

estudo são as situações de comunicação e as funções do discurso.Numa extensão crítica do conceito chomskyniano de competência,Hymes (1972) desenvolveu uma teoria da competência comunicati­va para estudar as variedades dos códigos lingüísticos em grupos so­ciológicos eo domínio destes códigos por falantes individuais .

Nas áreas da psicoterapia, psiquiatria e psicanálise, Bateson et~I. (1956), Ruesch (1972), Watzlawick et al. (1967) e outros desen­volv.eram urna teoria geral do C~ITIportalnento humano baseada nateoria da comunicação. Nesta abordagem, psicopatologias, espe­cialmente a esquizofrenia, são definidas corno um distúrbio da

comunicação, e sua análise e terapia são vistas como urna situa-. ção particular de comunicação.

Na sociologia filosófica de Habermas, a teoria da competên­cia comunicativa foi ampliada para cobrir todas as "estruturas ge-

71Lucia SantaellaComunicação' S Pesquisa '70

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rais de possíveis situações de discurso" (1971: 102). Nessa pes­

quisa , Habermas dedicou-se ao sistema de regras "de acordo como qual geramos situações de discurso possível em geral". ParaHaberrnas, a comunicação não se restringe ao "d iscurso" verbal.enão-verbal, mas também inclui atos comunicativos sem troca real

de informação (ibid.: 114~15)..Embora a teoria de Habermas te­

nha, de fato, nascido dentro da sociologia filosófica, é inegável a

sua contribuição específica para os estudos da comunicação. Tan­

to é que Habermas se insere em uma das tradições dos estudos de

comunicação, a tradição das teorias críticas.Sobre as bases do legado pragrnatista norte-americano, nas fi­

guras de Peirce, Jarnes, Dewey e estendendo-se para o neo-pragma­tismo de Rorty, vários autores buscaram avaliar o papel desse le­

gado , nos seus aspectos lógicos, processuais e retóricos, dentro

do quadro de urna 'filosofia da comunicação (LANGSDORF e

SMITH, 1995).Tanto a Iingüística e a análise do discurso quanto a semiótica,

esta última concebida COIllO teoria dos signos e também como teo-

ria da significação, comparecem como teorias da comunicação

ern muitos volumes dedicados a esse tema (ver, por ,exemplo,

PIGNATARI, 1969; TEIXEIRA COELHO 1978; INGLIS, 1990;

FISIZE, 1990; BAYLON e MIGNOT, 1994). Em seu livro sobreLeituras em teo ria da comunicação (The communicaüon theoryreader, 1996) Cobley chegou ao extremo de limitar essas leituras

às teorias do signo, significação, usos do signo, atos de fala, discur-

so e interpretação.Não resta dúvida .de que ambas, lingüística e serniótica, têm

um estatuto que lhes é próprio como ciências, estatuto este que as .

leva além do limite de serem consideradas exclusivanlente corno

teorias da comunicação. Entretanto, as questões de que tratam têmtamanha relevância para os estudos da comunicação, são tantas as

sobreposições e intersecções que apresentam COIll a comunicaçãoque os limites entre elas, especialmente entre a comunicação e

semi ótica, tornam-se tão difusos a ponto de reclamarem por urn

estudo à parte (SANTAELLA e NOTH, em progresso).Realmente, as relações da serniótica com a comunicação nun­

ca for.am vistas com muita clareza e o fato de a semiótica empre­gar termos como "serniose" e "significação" em vez de "cornuni­

cação" , e "signos" em lugar de "mensagem" contribui muito para .

essa falta de clareza. De todo modo, não é por acaso que ambas,

lingüística e serniótica, comparecem em muitos volumes sobre

teorias de comunicação, assim como não é por acaso que algumas

dentre as correntes sernióticas fazem parte de uma das tradições

de estudos de comunicação, a tradição dos modelos do processocomunicativo, como já foi visto.

Todas as misturas entre tradições diversas e muitas vezes an­

tagônicas, assim .como seu aparecimento em ciências vizinhas

foram fazendo da área de comunicação um campo híbrido e pou~co nítido nos seus limites internos e fronteiras. Essa falta de niti­dez só vem aumentando nos últimos anos em função da emergên­cia .recente de novos fatores que, no dizer de A e M. Mattelart(1999: 9), estão situando a comunicação cornot'figura emble­

mática das sociedades do Terceiro Milênio", assunto este reserva­

do para o início do próximo capítulo.

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MAPEAMENTO DA ÁREADE COMUNICAÇAO

o mapeamento a seguir da área da comunicação, seus territó­rios e suas interfaces não levará em conta apenas as tradições depesquisa em comunicação, mas também as linhas de força comque 'a' 'comunicação nos aparece hoje . Por isso mesmo, antes depassarmos à elaboração do mapa, trata-se de discutir a complexi­dade das novas inserções e ramificações C0l11 que a comunicaçãose apresenta no momento atual.

1. A ONIPRESENÇA DA COMUNICAÇÃO

Háhoje UI11 cpnsenso quase incontestável so.bre o caráter hí­brido da comunicação, de UI1l lado, enquanto fenômenocornuni­cacional em si, que se faz presente e interfere em vários setores davida .privada e social e em várias áreas do conhecimento; de outrolado, enquanto área de conheci mento ela mesma que, cada vez

mais, parece situar-se na encruzilhada de várias diséiplinas e ciên­cias já consensuais OLI emergen tes .

As comunicações constituem, ao mesmo tempo, um importan­tíssimo setor industrial, um universo simbólico que é objeto de

"todas as tecnologias de vanguarda, das biotecnologias à inteligên­

cia ahifícial, do audiovisual ao rnarketing e à publicidade, enraizarn­

se num princípio único: a comunicação. Comunicação entre ° ho­

mem e a natureza (biotecnologia), entre os homens na sociedade

(audiovisual e publicidade), entre o homem e seu duplo (a inteligên­

cia artificial); cOI~unicaçãoque enaltece o convívio, a proximidade

ou mesmo a relação de amizade (friendship) com o computador"

co nsu rno maciço, um investimento tecnológico· e 111 expansão

ininterrupta, uma experiência individual diária, LlI11 terreno de con­

fronto político, um sistema de intervenção cultural e de agregação

social, urna l11aneira de informar-se, de entreter-se, de passar o

tempo etc. (WOLF, 1987 : 13). ,Sfez ( 1994 : 25) também nos alertou para o fato de que a-comu-

nicação invadiu todos os domfn ios: a empresa e seu proeminente

setor de "relações humanas"; o marketing. antes restrito ao produ­

to, hoje recobrindo a imagem da própria empresa; os meios polí­

ticos inteiramente entregues ao marketing político e à imagem de

marca; a il11prensa, o audio visual e a edição nos quais a 'rubr ica da

comunicação floresce; as psicoterapias que se pretendem comu­

nicativas, e até as ciências exatas -fís~ca e biologia-estão conta-.

1111 nadas pelo vocábu lo "cornun icação".Além de a oornunlcação ter invadido metáforicamente o con-

junto das ciências humanas e das práticas políticas, sociais, cultu­

rais e econômicas, recordemos ainda, dizia Sfez (ibid.: 28-29),

que a biologia genética origina-se no modelo de trasrnissão codifi­

cada de uma mensagem (ADN); que a ~iên(?ia~Gológica ou etoló­

gica nutre-se de imagens oomunicacionais; que as neu~o-ciências

tornam seu conteúdo de referência de empréstimo à conexão (es­

ses permutadores cerebrais de 111ensagens invisíveis). Enfim,·-

IISe a internacionalização nãoé mais o que .era na época em que os

conceitos de dependênciae imperialismo cultural ainda p~rl11itiam

apreender °desequilíbrio do fluxo mundial de informação e cornu­

nicação, é p~rque novos atores apareceram num cenário doravante

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77Lucia Santaella .

Na época em que Sfez escreveu sua Crítica da comunicação,a~ redes teleinfcrrnáticas ~ão haviam a(nda explodido e abraçadoo glo~o com um~ teia deconexões, nem as questões da globaliza-

i' ç.ã~i ,Q~0Iític9-'econônlica .e da mundializaçãoda cultura 'hav iam

entrado na ordem do dia, de modo que, ao acrescentarmos esses

novos fenômenos à lista de Sfez, a imagem proliferante da cornu­

nicação se torna ainda mais tentacular.

De fato, no início dos ~nos 9'0, quando ainda estávamos"im~rsosnos debates sobre pós-modernidade, começou aentrar el~ cena,

sob a égide da ec;oromia neo-liberal, aquele que seria o. grande

tema dos anos 90, o terna da globalização (ver TANI:TI, 1992, 19.95

e ORTIZ, 1994). Nesse contexto, o papel desempenhado pelos

meios de comunicação passou a ser de U111a, tal ordem aponto' de

se poder afirmar que, sem os meios de comunicação teleinforrnã­ticos, o complexo fenômeno da globalização, tanto nos seus as­

pectos econômicos e políticos quanto certamente culturais não. ,teria sido possível.

Os sistemas tecnológicos complexos de comunicação e infor­

mação C?ertamen te passaram a exercer um papel estruturan te na

organização da sociedade e da nova ordem mundial. D~í a socie­

dade ser definida em termos de comunicação que é definida em

termos de redes. Tendo isso em vista, Mattelart (1997a, -l997b)

criou o conceito de "comunicação-mundo", inspirado node "eco­

nomia-mundo". Para o autor, esse conceito permite continuar a

análise desse novo espaço transnacional hierarquizado: ? lógica

pesada das redes imprime sua dinâmica integradora, ao mesmo

tempo em que produz novas segregações, novas exclusões, novasdisparidades. .

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"(SFEZ, 1994: 21) .

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2. DIGITALIZAÇÃO E Cn3ERESPAÇO

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No contexto dessas transformações . vale notar que, crescen-temente aurnenraqa pelas comuni~ades ciberespaciais que se for­marn ao sabor da espontaneidade desregrada que ~ própria dasredes.jrsociedade informacional e comunicativa na qual estamos.. , .

inserid.os nãose deixa explicar à margem do substrato infraes-trutural que lhedá suporte, a revolução digital.

Segundo Joel de Rosnay (1997 : 29), estamos vivendo um ver­dadeiro choque do futuro resultante sobretudo dos avanços dasciências físicas e biológicas . Enquanto a f ísica e a eletrônica leva­ram ao desenvolvimento da informática e das técnicas de comuni­

cação, a biologia levou ã biotecnologia e à bioindústri~. Estamos,seI11' dúvida, entrando numa revolução da informação e da 'comu­nicação sem precedentes que está desafiando nossos métodos tra­dicionais de análise e de ação.

No cerne dessas transformações, os computadores e as redesde comunicação passam por uma evolução acelerada, catalisadapela digitalização, a compressão dos dados, a multimídia , a hiper­mídia. Alimentada COI11 tais progressos, a in ternet, rede mundialdas redes interconectadas, explode de maneira espontânea, caóti- .ca, superabundante, tendência que só parece aumentar com a re­cente imigração massiva do e-comércio para o universo das redes ,Nesse mesmo ambiente, nos setores técnicos e científicos, erner- .

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gern tendências inquietantes, tais como a realidade virtual e a vidaartificial.

'Cérebros humanos , computadores e redes interconectadas decomunicação ampliam, a cada dia, um ciberespaço 111~ndial noqual todo elemento de informação encontra-se ern contato vil-tualcom todos e com cada um, tudo isso convergindo para "a consti­tuição de um novo meio de comunicação, de pensamen to e detrabalho para as sociedades humanas", enfim, de urna nova antro.pologia própria do ciberespaço (LÉVY, 1998: 12,2000).

Segundo Lévy (ibid .: 13), a fusão das telecomunicações, dainformática, da imprensa, da edição, da telev isão, do cinema, dosjogos eletrônicos em uma indústria unificada da mu ltimídia é oaspecto da revolução digital que tem sido mais enfatizado. En'tre­tanto, esse não é o aspecto mais importante. A.par dos aspectoscivilizat órios, tais como nQ.vas..estruturas de comunicação, d~ regu­lação e de cooperação, linguagens e técnicas intelectuais inéditas. ' . ,

. modificação dasrel ações de' espaço e. tempo etc., .~ mais impor-tante está no fato de.que a forma e o ponteúdn do ciberespaço

ainda es~ão especlalmenre indeterminados. Diante dis~o ~ãó · s~~ . . . '

trata mats de raciocinar em termos de impacto (qual o impacto

. das infovias na vtg~..econômica, política, cultural, cie~t{fica?), J11aSem termos de projetos. .,. . ' .

Do ponto. de vista do conhe~im~nt;, MatteJ'lart (1999: 165)nos diz que, para melhor considerar, na era das redes transfron­teiriças, a complexidade dos vínculosque unem territórios parti­culares, tanto físicos quanto virtuais, novas configuracões transdis­ciplinares se formam, é delas participam a história, a geografia , age~polltica, a ciência política, ~ economia indus trial e a<'~ntropo ­

logia, Cada uma dessas especialidades contribui para isso ern grausbastante variados , à medida que não experimentam do meSJ110modo a necessidade de estabelecer alia.nças para apreender a novaimportância das redes de comunicação. . .

. Tendo isso em vista , sou levada à hipótese de que, dada aonipresença dos fenômenos comunicacionais, a comunicação comoárea de conhecimento está cada vez mais tornando o lugar de UI11a

79Lucia 'S a n ~a e l l a

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Comunicação 5- Pesquisa

transnacional . Os Estados e as relações interestatais não são mais o

.único pivô de ordenamento do mundo. As grandes redes de info rma­

ção e comunicação, com seus fluxos 'invisíveis', 'imater~~.\ais l ;.f~I~lTÜ~~,. .

'terri tórios abstratos', que escapam às an tigas ter ri tori aI i~J~tfreS'~"

(MATTELART, 1999 : 166). . ~

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3. A TEIA INTER-MULTI E TRANSDISCIPLlNAR

DA COMUNICAÇÃO

N a segunda metade dos anos 80, Del ia (1987: 20-22) lembra­

va que, antes mesmo da coa1escência da comunicação corno urna

, áreade co'nhecilnento que se deu, nos Estados Unidos , na década

de 40, e continuando depois disso, um traço significante da pes- .

quisa em comunicação sempre foi sua fraglnentação como urna

preocupação tópica que cruza virtualmente todas as áreas das ciên -,

cias sociais e das humanidades. Corno um tópico de pesquisa, a "

COlllunicação nunca se limitou a qualquer domínio social (Estado,

sociedade civil, educação etc), a qualquer disciplina ou campo

ciência piloto para cujas questões acabam convergindo muitas

outras ' ciências, Nó centro dessas questões; reside a noção dasredes de comunicação, uma noção que não se deixa entender à luz

de uma visão estritamente tecnológica , pois o funcionmnento das

redes de cOlllunicação apresenta selnelhanças com o comporta­

mente do sistema nervoso , do sistema imunológico, podendo ser

simulado através de programas computacionais que estão no foco

das preocupações dos cientistas de inteligência artificial.Não deve ser por mera casual idade que se acentuam cada vez

mais as interfaces e cooperação das pesquisas em comunicação

com algumas disciplinas, tais como as ciências cognitivas, as ciên­

cias da informação, inteligência artificial e a biologia que, a des­

peito da especificidade de cada uma, estão lidando com questões

que' são, antes de tudo, questões comunicacionais . As ciências da

comunicação têm, portanto, muito para dar e receber nessa con-

vergência .Assim sendo, a comunicação como área de conhecimento .in-

clui, mas está longe de se limitar à visão restrita da comunicação

como fenômeno exclusivamente humano e social que imperou até

finais dos anos 70.

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81Lúcia Santaella

especializado dentro de U111a disciplina, Na verdade, no decorrer

do século, a comunicação se fraturou em uma miríade de frag­

men~os conceituais e práticas de pesquisa (publicidade, símbolos

significantes, pesquisa de rádio, rituais interativos, levantamento

de efeitos, inteligibilidade, análise cultural etc.) . Segundo Delia,

essa fragmentação tem sido, mesmo que de modo implícito, arn­

pIamente reconhecida, mas suas implicações profundas para o

desenvolvimento da pesquisa em comunicação não recebeu a devi­

da ênfase.

Também na segunda metade dos anos 80, no contexto hege­

mônico das pesquisas empíricas de comunicação com teor socio­

psicológico, nos Estados Unidos, FarreIl (1987: 123-124) lança­

va o desafio da incorporação aos estudos cornunicacionais das

competências próprias da especulação reflexiva. Para ele', pelo

menos três grandes feixes de tipos de pesquisa oferecem alternati­

vas importantes às ci ências sociais para a pesquisa em comunica­

ção: abordagens filosóficas da comunicação, que permitem o en­

tendimento de algumas questões críticas da comunicação, abor­

dagens estético-alegóricas , que podem nos fornecer os mais finos

ajustamentos sobre COlno o processo comunicativo funciona, eabordagens interpretativas e críticas, nas quais a experiência da

comunicação como discurso e texto tende a ser emoldurada recriada, .

e qualificada à luz de certas normas derivadas ou inventadas.

Dedicando o seu artigo mais di retamente às abordagens filo­

sóficas, Farrell discutiu quatro grandes domínios reflexivos: a her­

menêutica e fenomenologia, a serniótica e o estruturalismo, o

marxismo e a teoria social e a filosofia não racional ou desconstru­

tivismo. Nesta última, foi posto em relevo o questionamento que

o antilogocentrismo de Derrida e FoucauJt trouxeram.para os pres­

supostos básicos da comunicação de um emissor que sabe o que

diz e .de um receptor para o qual o significado aparece. Contra

isso, Derrida (1973) removeu o sujeito do discurso, substituindo a

primazia da fala pela escritura ou texto e substituindo a busca da

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Comunicação & Pesquisa80

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82 Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella 83

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verdade pela interpretação(ou "desleitura") do,significado. M.a~s

abertamente político, Foucault (1972, .1973) pôs em evidência asfranjas do poder que se ocultam nas regras de formação discursiva.

Para Farrell (ibid.: 137-138), não há contradição em se pensarcomo um herrneneuta, 'um semioticista, um teórico social, ou mes­mo um desconstrucionista, e-continuar pensando como um cien­tista da comunicação. Isso 'certamente traz consigo uma tensãoextraordinária, mas só através dessa tensão as possibilidades ex­traordinárias da comunicação como ciência podem persistir.

Cada vez mais, desde o início dos anos 90, a ilusão acalentadade uma teoria unificada ou de uma metodologia privilegiada paraos estudos de comunicação parece ter sido relegada ao passado.De fato, muitos estudiosos têm sido enfáticos sobre a inserção dacomunicação, principalmente na parte de seus fundamentos, na­quilo 'que Lucien Sfez (1992: 11) caracterizou como o núcleo epis­

temológico da comunicação

"que reúne em torno de pontos comuns grande diversidade de sabe­

res: biologia, psicanálise, mass media studies, instituições, direito ,

ciência das organizações, inteligência artificial, filosofia analítica etc.

Esses conceitos comuns às ciências da comunicação parecem dever

constituir pouco a pouco os elementos de uma forma simbólica emgestação".

Essa mesma linha de argumentação foi utilizada por Eliseo

Verón na apresentação da coleção de publicações na área de comu­nicação sob o título de El mamifero parlante da editora Gedisa(Buenos Aires, Barcelona, México), por ele dirigida. Ao consa­grar o Mamífero'parlante à difusão de teorias e investigações nocampo 'das ciências dacomunicação, Verón explicou que "o plu­ral ciências, frequentemente utilizado, expressa indiretamente a

complexidade de tai campo. Não dizemos ciência da comunica­ção nem comunicologia, porque não se trata de uma disciplina,

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mas de um cruzamento de múltiplas problemáticas corresponden­tes a disciplinas tradicionalmente diferenciadas. As ciências dacomunicação constituem hoje em dia um nó transdisciplinar, nocampo das ciências brandas, comparável ao nó das ciências cogni­tivas, no terri tório das ciências duras".

Em função disso, Verón justificou a presença na coleção deuma ótica antropológica aplicada às sociedades urbanas, de umaótica epistemológica, semiótica, sociológica, histórica, cognitiva,política, todos esses modos pertinentes de acesso aos fenômenosda comunicação, em particular aqueles associados à emergência efuncionamento de tecnologias midiáticas.

Sem dúvida, só esse último item, o das tecnologias midiáticas,com a tendência contemporânea que apresentam para se integra­rem em um único sistema de comunicação cada vez mais comple­xo, está exigindo uma abordagem multidisciplinar para dar contade seus variados aspectos.científicos, institucionais, tecnológicos,políticos, culturais, profissionais etc .

Na mesma linha de pensamento, em prol de uma perspectivamultidisciplinar para a comunicação, Bougnoux (1994: 14-16)defende que o telescópio da comunicação há de favorecer a con­vergência entre ciências e artes, e permitir religar vários pensa­mentos errantes ou dispersos. Para ele, há, pelo menos, cinco co­lunas ou sólidos domínios de estudo sobre os quais se podemedificar as ciências da informação e comunicação: a semiologia, apragmática, a midialogia, a cibernética e a psicanálise.

Tendo como pano de fundo não apenas as concepções maistradicionais de comunicação, mas também a complexidade dassobreposições e ramificações, acima delineada, com que o dese­nho do campo da comunicação hoje se apresenta, buscarei cons­truir, a seguir, o mapeamento da área da comunicação e de suasinterfaces.

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Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella 85

4. TRAÇADO GERAL DO MAPEAMENTO

Sob o título de "universais da comunicação", DeVito (1997: 7),apresentou uma versão sintética dos elementos presentes em todacomunicação humana, seja ela intrapessoal, interpessoal, grupal,pública ou de massa, como se segue: "a comunicação se refere aum ato, realizado por uma ou mais pessoas, de enviar e receber

mensagens que são distorcidas pelo ruído, ocorrem dentro de umcontexto, produzem algum efeito e dão oportunidade à retroali-

mentação" .O contexto tem, pelo menos, quatro dimensões: física, cultu- .

ral, sócio-psicológica e temporal. A dimensão física refere-se aoambiente tangível e concreto no qual a comunicação ocorre, exer­cendo alguma influência sobre o conteúdo do que é comunicado.A cultural se refere às regras e normas dos comunicadores, cren­ças e atitudes que são transmitidas de uma geração a outra. A só­cio-psicológica inclui os papéis sociais desempenhados pelas pes­soas, a formalidade ou informalidade, seriedade ou humor da si­tuação etc. A temporal inclui desde o momento do dia em que acomunicação se dá até o modo como ela se insere na seqüência

temporal de eventos comunicativos (ibid.: 8).O ruído é algum tipo de perturbação que distorce a mensagem.

Em casos extremos, o ruído pode impedir que a mensagem envia­da pela fonte chegue até o receptor. Em casos normais, algumnível de ruído é inevitável pelo simples fato de que a mensagememitida .sempre difere da mensagem recebida. Há três tipos deruídos: físico (tudo que interfere fisicamente na transmissão damensagem), psicológico (idéias preconcebidas) e semântico (signi-

ficados mal-entendidos).Considerando os elementos do processo comunicativo tam-

bém como "universais da comunicação", mas generalizando ain­da mais esses "universais" para recobrir um campo que vai alémda comunicação estritamente humana, a versão dos elementos do

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processo comunicativo, que tomarei como ponto de partida para omapeamento da área de comunicação, apresenta-se do seguintemodo: todo processo comunicacional parte de uma fonte que emi­te uma mensagem ~través de um canal para um destino ou recep­tor da mensagem. E nesse receptor ou destino que a transmissãosurte seu efeito precípuo, quer dizer, produzir nele alguma influên­cia, influência esta que pode retornar modificada ao próprio emis­sor. A mensagem, que sofre, até certo ponto, a interferência devárias ordens de ruído, está sempre inserida em um contexto comu­nicacional, assim como se refere ou designa algo que está fora daprópria mensagem. Para se estruturar como tal, a mensagem de­pende de um código multiplamente determinado que está nela pres­suposto e que, pelo menos em' algumas de suas determinações,deve ser compartilhado pelo emissor e receptor da mensagem.

Não resta dúvida de que essa definição não passa de um meroesqueleto formal ao qual falta carnadura concreta. Para preencheressa falta, alguns estudiosos incorporaram, aos ingredientes comu­nicacionais, fatores neurológicos, psicológicos, sociológicos, re­ferenciais e muitos outros (ver, por exemplo, MEIER, 1969 eDINGWALL, 1980).

Tanto quanto posso ver, para recuperar a carnadura que faltaao esqueleto, não é preciso se livrar dele, visto que ele pode fun­cionar como um primeiro traçado sobre o 9ual desenhar o mapada área da comunicação. Desse modo, considero esse esqueletocomo um núcleo constante da comunicação que deve funcionarapenas como urna espécie de roteiro básico dos territórios, queaqui estarei também chamando de "campos'.' da comunicação.Dentro de cada campo, deve-se então proceder à incorporaçãodos recheios, desdobramentos, ramificações e implicações quesejam capazes de configurar o conteúdo interno desses territóriosdelimitados. Portanto, a tarefa que se apresenta agora é a de preen­cher os campos com os recheios necessários, ponderando sobresuas implicações, como se verá a seguir. Antes disso, resta notar

••••••

5.1 O TERRITÓRIO DA MENSAGEM E DOS CÓDIGOS

5. Os TERRITÓRIOS DA COMUNICAÇÃO

A grande área da comunicação é composta por alguns territó­

rios que foram delimitados de acordo com os elementos do pro­

cesso comunicativo, conforme está discriminado abaixo.

que o mapa é suficientemente flexível para ir incorporando não

apenas possíveis noyos territórios, quanto novos conteúdos den­

tro de cada território e n<?~as relações entre os territórios.

87Lucla Santaella

5.2 O TERRITÓRIO DOS MEIOS E MODOS DE

PRODUÇÃO DAS MENSAGENS

Subsidiário ao campo da mensagem em si, tem-se ocampo do

modo como as mensagens são produzidas. Com que meios elas '

são produzidas? Entram aqui todos os suportes artesanais da es­

crita, pintura, gravura, instrumentos musicais, todos os meios téc­

nicos eletro-eletrônicos de produção de imagem, som e escrita

(jornal, foto, cinema, televisão, vídeo etc.), assim corno as atuaismídias digitais,

Trata-se aqui de focalizar as caracterfsticas de cada suporte,

canal ou mídia particular. Quais são os traços definidores de cada .

meio? Como esses traços se constituem na impressão digital decada meio, diferenciando uns dos outros?

Para pesquisar sobre essas questões relativas ao modo de pro­

dução das mensagens, é necessário levar em consideração o de­

senvolvimento das forças produtivas sociais, pois é de sua histo­

ricidade que advêm os suportes, canais, meios físicos e tecnológi­

cos para a produção das mensagens. As linguagens, sejam elas

quais forem, são materialmente produzidas de acordo com supor­

tes, instrumentos, meios e técnicas que são tão históricas quanto

as próprias linguagens e as instituições que as abrigam (BENJA­

MIN 1972, apud SANTAELLA 2000 : 159). A fotografia, por

exemplo, é uma invenção no século XIX, produto da revoluçãoindustrial, assim como a internet é uma invenção do final do sécu­

lo XX, fruto da revolução cibernética, digital e teleinfornlática.

Também deve sel'o considerada, nesse campo, a publicidade

corno meio de sustento dos meios, quer dizer, a vicariedade dos

meios em relação à publicidade, tal como ocorre especialmente

n~ televisão e mesmo no j0111al e como já está ocorrendo com o e­comércio na internet.

Comunicação [, Pesquisa86

Embora seja algumas vezes esquecida pelos comunicólogos,

uma espécie de ponto cego da retina, a mensagem em si é o dado

mais palpável em todo processo comunicativo, aquele a que sem­

pre se tem acesso objetivo (ver VOLOSINOV, 1973). Nesse cam­

po da mensagem ern si, cabem todas as pesquisas referentes às

linguagens, discursos, sistemas e processos sígnicos das mais diver­

sas ordens: biológicos , corporais, lingüísticos, gestuais, visuais,

sonoros, audiovisuais, hiperrnidiáticos com todas as suas mistu­

ras, além dos processos contracornunicativos, poéticos, artísticos,

quer dizer,'pt~ocessos rebeldes em relação aos sentidos institufdos.>-Também pertencem a esse território as indagações sobre os

modos através dos quais as mensagens, concebidas como constru­ções designos ou processos de significação, são capazes de defla­

gar possíveis efeitos de sentido ou, ao contrário, os questionamen­

tos sobre essa possibilidade, tendo em vista o deslocamento in­

cessante do sentido. Cabem ainda nesse campo os estudos dos có­

digos ou sistemas nos quais os signos e linguagens se organizam,

deten~inandosua grarnaticalidade, ou seja, como os signos se rela- : ,

cionam uns com outros. É nesse campo, portant~, que são estuda­

dos os processos de hipocodificação ou. hipercodificação, assim

C0J110 as regras de produção textuais e. as . técnicas de persuasão.

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89Lucia Santaella

ideológicos, mercadológicos, políticos, culturais, psíquicos lhe são

impostos por essas instituições ou organizações? Como essas ins­tituições ou organizações estão socialmente inseridas? De ondevem sua sobrevi vência? Qual é o sistema político e legal de cons­

t ítuiçãodessas instituições e organizações? Quais são os tipos de

marketing institucional e empresarial dessas organizações?

Nesse campo se enquadram as considerações sobre as redes e

fluxos de informação do ponto de vista do produtor da mensa­

gem. Enquadram-se ainda os questionamentos desconstrutores dosujei to falante como senhor do seu discurso .

5.5 O TERRITÓRIO DO DESTINO OU RECEPÇÃO DA MENSAGEJv\

Aqui cabem pesquisas sobre os modos, como as mensagens

são transmi tidas e difundidas. Quais os tipos de mediações ,so­

ciais, culturais, psíquicas e sígnicas existentes até e no ato de re ­

cepção? Quem é o receptor? Um indivíduo, um cliente, um grupo,

um público, uma audiência ou um receptor virtual? Quais são as

estratificações do público Ou audiência? Quais são ,os efei tos ou

impactos (psicomotores, afetivos ou cognitivos) sofridos pelo re­

ceptor? Qual a eficácia persuasiva da mensagem? Que influências

o receptor recebe das mídias e até que ponto ele pode exercer

influência sobre elas? Como o receptor interfere e transforma ounão a mensagem que recebe?

Por isso mesmo, enquadram-se nesse território os estudos so­

bre mecanismos de decodificação e leitura, esta cOlllpreendiçia,

de um lado, como processo de descoberta de significados que acon­tece quando o receptor entra em negociação e interage com a mensa­

gem, do que decorre o paralelismo e complemen taridade entre codi­ficar e decodificar e, conseqüentemente, a contraparte ética da leitu­

ra. D~ outro lado, a leitura pode também ser compreendida C0J110

processo perceptivo, para o qual concorrem os órgãos sensoriais hu­

manos e, nas máquinas, os sensores (ver BARKER, 1990: 44-63).

.... .....

Comunicação & Pesquisa88

5.3 O TERRITÓRIO DO CONTEXTO COMUNICACIONAL DAS

MENSAGENS.

Neste território, cabem pesquisas sobre a situação comunica­

tiv a e m geral, a situação em que a comunicação se dá. Essa situa­

ção apresenta vários níveis, de~de o nfvel meramente f'ísico , rela­

tivo ao local em que a comunicação se dá, passando pelo cultural,

psico-social até o nível temporal. Por isso mesmo, neste camp~,

entram em cena as formas de cultura a que os processos comum­

cativos dão origem e nas quais germinam, por exemplo, cultura

oral , cultura da escrita, cultura de massas , cultura das mídias,

cibercu'ltura . Aqui tamb ém se enquadram os estudos sobre inter e

multiculturalisrno, assim como as questões sobre mundializaçãoda comunicação e cultura e os intercâmbios do regional e local '

com o global.Ainda cabem nesse campo as pesquisas sobre aquilo a que as

mensagens se referem, o que elas indicam, designam e represen­

tarn, corno representam, a que interesses ideológicos e poderes

sociais atendem, enfim, cabem aqui os variados tipos de relações

da mensagem com seu contexto representativo, isto é, os graus de

referencialidade das mensagens ou aquilo que, de maneira menos

técnica, costuma ser chamado de conteúdo.

5.4 O TERRITÓRIO DO EMJSSOR OU FONTE.DA COMUNICAÇÃO

Este território tem como referência as seguintes questões : por

quem a mensagem é produzida? Qual o enunciador ou sujeito da

mensagem? Esse enunciador é humano ou não? É U111 sujeito sim­ples , um indivíduo, ou é um sujeito complexo, coletivo, ou é hf­

brido? Quais as injunções físicas, psíquicas e sociais sofridas .por :

esse sujeito? Quais são as escolhas éticas desse sujeito? O sujeito '"

está inserido em organismos, máquinas, sistemas, instituições,'

organizações, corporações? Que constrangimentos econômicos,

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6. 'As INTERFACES DOS TERRITÓRIOS DA COMUNICAÇÃO

Os territórios ou campos assinalados nos tópicos do item (5)funcionam como pontos de ancoragem da área de comunicação.Conforme já foi visto, cada um desses campos está repleto de ques­tões que nele especificamente se enquadram. Entretanto, cada carn­po ou território mantém interfaces com os demais, o que gera con­juntos de novas questões', como se poderá ver abaixo. Cumpreassinalar que essa relação proposta entre a ancoragem e asinterfaces cumpre dois papéis: de um lado, garantir, através da "ancoragem, que as pesquisas em comunicação, sob o álibi da inter­multi e transdisciplinaridade, não se dispersem em terras de nin­gu érn. De outro lado, garantir, através das interfaces, que essasancoragens se abram para as possíveis interações e cruzarnen tos

C0l11 áreas, campos ou territórios vizinhos, evitando, assim, que a >

comunicação autocentrada se imobilize em uma camisa-de-força.

Trata-se de garantir, enfim, o equilíbrio instável entre duas forças .

Esse campo da recepção é bastante co~pl~Xb na medida emque diz respeito ao intercurso social das mensagens o qual, nassociedades cornplex as contemporâneas, inclui urna multlpücida­de de meandros típicos da moderna antropologia urbana, dos gra.n­des deslocamentos e itinerários humanos, da onipresença das má­quinas de comunicar, das influências do inter e multiculturalismosobre os processos de recepção etc. Aqui também entram em cenaas instituições, organizações e corporações responsáveis pela cir­culação 'das mensagens. Observe-se que o território (5.4) também

está voltado para as organizações, mas sob o ponto de vista daprodução das mensagens. Neste território (5 .5), entretanto, as or­ganizações aparecem tanto sob o ponto de vista do modo como asmensagens circulam até atingirem os seus destinos, quanto do pontode vista da natureza do receptor que também pode ter o caráter de

uma organização ou algo similar.

6.1 As MENSAGENS E SUAS MARCAS

91Lucia Santaelle

Tanto as forças sintéticas, .centrfpe tas, que preservam um certograu de integração e identidade da área de comunicação, quantoas forças expansivas, centrífugas, que trazem para a área incorpo­

rações de fora.

Para quem sabe ler mensagens, para quem sabe ler os si anos. . b

de que ~s mensagens são compostas , mensagens f~ncionam sern-pre como centros irradiadores para múltiplas direções na ~edida '·em gu~ nelas ,ficam marcas, índices que apontam para todos os .outros componentes do processo comunicativo, ou seja:

(6.1.1) Marcas do suporte,"c'anal ou meio que veicula a mensa­gem. Assim, alinguagem visual na fotografia é distinta da lingu~-'gem visual no cinema qu.e é, por sua ve~ distinta da linguagemYis~lal no vídeo, e assim por diante. . .

(6.1".2) H'á também marcas do contexto na mensagem. Tod'amensagem, ern quaisquer tipos de signos, verbais, visuais 'ou mes­mo sonoros, está sempre prenhe de índices contextuais si tuacio- .nais, históricos, culturais, ideológicos, políticos qu'e ap~ntam,qemodo mais ou menos explícito, para o contexto representado nanlensag.em.

(6.1.3) Há ainda marcas indicadoras do sujeito, simples oucomplexo, ' individual ou coletivo, humano ou não, que emite amensagem e indicadoras também das relações que o sujeito emis­sor mantém com o receptor, Estas marcas costumam ser muitoabunda.ntes. Nas teorias do discurso têm recebido o nome d~

dêiticos, shifters (Jakobson) e embrayeurs (Ruwet) . Trata-se deexpressões 'cujos referentes não podem ser dete;minad'~sa não ser

p.eJa . r~ l aç ão dos interlocutores. Benveniste (1966) mostrou que~s dêiticos se c.oI?stit~eJll em um.a irrupção do discurso, pois s~us

sentidos, n,ão obstar:t,e rel~vem da lingua, não podem ser defini­dos senão por alusão ao seu emprego, ' até o ponto de se po'der''''

Comunicação [, Pesquisa90

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6.3 INTERFACES DAS MEN'SAGENS COM O CONTEXTO

6 .2 INTERFACES DAS MENSAGENS COM SEU MODO DE PRO­

DUÇÃO

Entre o territ ório (5.1)" das mensagens ern si, e o território, "

(5.3), do contexto das mensagens, situam-se as pesquisas sobre asdiferentes ordens das linguagens, tais como ordem educacional,

-­••••••.-••.'••••••.'.'.'•e/•.'.;.'•'.••••••.'

93Lucia Santàella

ordem legal, ordem religiosa etc. e , à microffsica do poder que

nelas se desenvolvem. Situam-se ainda as pesquisas sobre o' con­texto histórico, sócio-cultural; e mesmocivilizacional, engendra­do pelas diferentes formas de comunicação: oral, escrita, imagética,audiovisual, midiática, hiper':'midiática. - - .

Nessa interface, coloca-se ainda em questão se as, mensagens

podem representar acuradamente as várias dimensões da realida­

de ou não.

6.4 INTERFACES DOS MEIOS COM O CONTEXTO

As interfaces do território (5 .2), dos suportes, canais e meiosque veiculam as mensagens, _ç.om o território (5 .3), do contexto

das mensagens, geram pesquisas sobre os tipos de meios de que

as diferentes ordens das linguagens dispõem para veicular suas

mensagens. Assim, por exemplo, tem-se a migração do discurso

religioso para o meio televisivo com os conseqüentes estratos sociais

a que esse discurso serve. Outro exemplo está no descompasso ou

não da educação escolar em relação aos meios de comunicação etc.

Também se situam nessa interface, as pesquisas sobre como

os fatores econômicos, políticos, culturais, ideológicos, jurídicos

e institucionais influenciam o que é ou pode ser e o que não é ounão pode ser transmitido pelas mídias, questões essas que são.tí­

picas das relações- da agenda das mídias com a realidade. Conse­

qüentemente, aqui se colocam as questões sobre as mídias noti­

ciosas como agentes de poder.

Aqui ainda se localizam os estudos sobre os modos pelos quais

o advento de uma nova mídia em L1I11a matriz previamente exis­

tente de mídias pode alterar as interações sociais e a estrutura so­

cial ern geral. Em um nível ainda mais macro, as mídias são tarn­bém estudadas não COIllO simples canais para transmitir informa­

ções, mas como conforrnadóras de novos ambientes sociais corno,é o caso atual das' comunidades virtuais no ciberespaço.

Comunicação [; Pesquisa92

questionar se a referência é possível sem o emprego, ex pl íci to ou

não, de dêiticos.(6.1.4) Ta"r~6ém marcas, mas relativamente distintas das ante-

ri ores, na' medld-a em que não precisam estar necessariamente ex­

plícitas, são aquelas que dizem respeito ao receptor a que a men­sagem se destina, receptor este que pode estar previamente mar­

cado na própria mensagem. Isso é típico, porexemplo, de mensa­

gens publicitárias ou ainda de mensagens que nivelam seu reper­

tório para atingir um público médio, como é o caso de muitas das

programações dos grandes canais de televisão.'

Interfaces qu~ se estabelecem entre o território (5.1), das men­

sagens em si , com o território (5.2), do modo como as mensagens

são produzidas, levam-nos a inquirir sobre as sutis diferenças quedevem ser estabelecidas entre, por exemplo, a linguagem do cine­

ma (campo 5'.1) e o cinema como mídia (campo 5.2), a linguagem

dojornal (campo 5.1) e o jornalisrno como mídia (campo 5.2) ou,

ainda como exemplo, entre as linguagens da arte (campoSi l ) e as

exposições de arte ou os livros de arte (campo 5.2) etc. O modo

COIllO os meios determinam a constituição das linguagens por eles

veiculadas, "as possibilidades que abrem e os limites que impõem

sobreelas ("o meio é a mensagem") , a especificidade dos proces­

sos de comunicação que cada meio constitui , os gêneros que cada

um desenvolve são todos tópicos a serem estudados nessa interface.

6.6 INTERFACES DOS MEIOS COM O SUJEITO PRODUTOR

6.5 INTERFACES DAS MENSAGENS

COM O SUJEITO PRODUTOR

Além disso, nessa interface, situam-se as questões sobre os

sistemas de concessão e propriedade das mídias e, em nível mais

amplo, a formação dos conglomerados de mídias. '

Nas interfaces do território (5.2) dos meios, com o (5.4), do

sujeito da mensagem, inserem-se as pesquisas sobre o domínio ou

não do sujeito sobre os suportes, canais, 'meios ou mídias de que

dispõe, domínio este entendido desde o nível das habilidades téc­

nicas e' criativas do sujeito até sua propriedade econômica dos

tn~ios'ou não. Quer dizer, esse sujeito é proprietário dos meios de

produção de um dado sistema de linguagem ou serve a ele como

empregado? Sob que condições os meios estão disponívies aosujeito? Que conseqüências econômicas e especialmente políti­

cas e ideológicas, isso traz para a maneira com que esse sujeito

trabalha com o meio?

95Lucia Santaella

.. . .

6.8 INTERFACES DA MENSAGEM COM SUA RECEPÇÃO

Nas interfaces do território (5.3), do contexto, com o território

(5.4), do sujeito, pesquisam-se os medos como o sujeito da Il:e.n­

sagem está inserido no contexto, sob os vários aspectos ernque o·

contexto se apresenta: físico, psico-social, culturàl· e temporal.

Situam-se aqui especialmente os estudos sobre a inserção social

do sujeito na esfera produtiva da cultura e das comunicações. Quer

dizer, em que esfera da cultura o sujeito se insere, na da arte,.daciência ou da técnica? E, dentro destas, em que subesfera se inse­re, na da produção, da troca, conservação, distribuição ou difu­

são? (ver SRüUR, 1987) .

6.7 INTERFACES DO .CONTEXTO COM O SUJEITO PRODUTOR

Na interface do território (5.1), da mensagem, com o (5.5), darecepção das mensagens, situam-se as pesquisas referentes.a per­fil de públ ico, faixas repertoriais, nível de audiência, eficáci~ co­

municativa e persuasiva, formação de opinião, manipulação ideo­

lógica, mudanças de atitude e opinião do público frente às mensa­

gens recebidas, os mecanismos de condicionamento que as men­

sagens produzem no receptor etc. É nessa interface que se situam

tanto os estudos sobre o modo como diferentes audiências inter­pretam a mesma mensagem de maneira diferenciada, quanto os

estudos sobre os efeitos afetivos, psicomotores, cognitivos das

mensagens sobre os receptores .

Aqui são também estudadas as interferências que diferentes

tipos de ruídos (físicos, psicológicos ali semânticos) podem pro­

vocar na recepção das mensagens, assim como são estudados os

modos como os processos de hipercodificação ou hipocodificaçãoafetam ou não a recepção de urna mensagem .

Comunicação ~ Pesquise94

Nas interfaces do território (5.1) das mensagens, com o terri­

tório (5.4), do sujeito da mensagem, situam-se as pesquisas sobreautonomia ou não do sujeito sobre sua mensagem, sobre a institu­cionalização do sujeito na linguagem etc.

Pertencem também a esse campo as indagações sobre o papel do

emissor como codificador, sobre sua competência comunicativa, seu

conhecimento dos elementos e regras da comunicação, sobre a

pessoalidade ou neutralidade do ato enunciativo e as questões da

ética daação comunicativa. Uma vez que a comunicação tem conse­qüências, ela necessariamente envolve questões éticas, fundamenta­

das na noção de escolha, o mais das vezes política, e filosofia de vida.

Por isso, a ética está diretamente ligada ao sujeito da comunicação.

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6.9 INTERFACES DOS MEIOS COM A RECEPÇÃO DAS MENSAGENS

6.11 INTERFACES DO SUJEITO PRODUTOR COM A .RECEPÇÃO

6.10 INTERFACES DO CONTEXTO COM A RECEPÇÃO

Entre ,?S territórios (5.4), do emissor ou sujeito da mensagem, .

e o (5.5), da recepção, surgem questões relativas aos modos de '.\

COlllunicação, tais COlllO autoritários, democráticos, passivos,

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••••••­•••••I..'.'(..''.'.'.'••.'•.'••.'••••••

97Lucia Santaella

interativos, etc. que o emissor configura pata a sua relação 'com o

recep.tor.Também pertencem a essa interface indagações referentes ao

proe:e?so de colocar o receptor em uma perspectiva particular, ouseja, 'no desempenho de um determinado papel, requerendo dele

uma resposta em termos desse papel. Esse processo é chamado de

feedforward (DEVITO, 1997: 12).Essa interface é bastante complexa, especialmente quando os

processos comunicativos são considerados à luz dos modelos cir­culares da comunicação, segundo os quais, através de processosde feedback e feedforward, os papéis do emissor e receptor nãosão fixos, mas intercambiáveis. Ainda mais complexa essa interface

se torna quando são examinadasas profundas transformações, até .

o ponto da dissolvência, que se operam nas tradicionais figuras do

emissor e receptor nos processos de navegação no ciberespaço.

Evidentemente, o mapeamento acima exposto figura apenas

como sinalização das linhas de um território complexo. Os preen­chimentos que foram realizados no interior dos campos e de suasinterfaces têm, de urn lado, um caráter indicativo, podendo servir

corno urnaespécie de cartografia que sinaliza para o pesquisador

o terri tório .ou interfaces em que se situa a sua própria pesquisa.'

Por outro lado, tem um caráter sugestivo, convidando o pesquisa-odor a interferir no mapa, completando lacunas, mudando seu tra­

çado, acrescentando novos dados.

Não obstante seu caráter meramente sinalizador, tal como apa­

rece acima , o mapeamento permite que as ciências e teorias da

comunicação, tanto quanto as teorias que têm surgido para estu­

dar os fenômenos cornunicacionais e suas interfaces, já possamser inseridas no mapa da comunicação.

·,1 ~ .

Comunicação & pesquisa

Er1tre os territórios (5.3), do contexto, com o (5.5), da recep­

ção, situam-se as pesquisas sobre questões relativas à inserção ~o

receptor. no contexto comunicativo sob os vários aspectos ern que

o contexto se apresenta: físico, cultural, psico-social e ternporal.

Que papel o receptor desempenha em cada um desses aspectos?

Pertencem também a essa interface as pesquisas etnográficas dos

processos de recepção.

96

Na interface do território (5.2), dos meios, com o (5.5), da re­cepção, inserem-se as pesquisas sobre as reações que os diferen­tes suportes, meios e mídias provocam no receptor. pesquisas fre­

qüentes, nessa interface, por exemplo, são aquelas que se voltam

para as maneiras como as crianças reagem ao serem expostas às

várias mídias, quase sempre à televisão. São aqui também exami­

nadas as variáveis perceptivas e sensórias do receptor que são

requeridas por cada diferente mídia, assim como é examinado omodo como a escolha de um meio sobre o outro pode afetar urnarleterrninada situação ou interação . Pertencem ainda a essa interfaceas questões sobre a bidirecionalidade ,o u unidirecional idade das

mídias, assim cor-no'as hipóteses dos usos e gratificações.Além disso, nessa interface, devem ser pesquisadas as injunções

sócio-econômicas, políticas, legais e mesmo éticas por que passam

os meiosde comunicação para atingirem seus receptores.

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7.1 TEORIAS DA MENSAGEM, CÓDIGOS E SU'AS INTERFACES

7. INSERÇÃO 6AS TEORIAS E CIÊ'NCIAS DA

COMUNICAÇÃO NO ,MAPA... ' ... . ,' . . .. ..

No campo (5.1), da mensagem em si, inserem-se todas as teo­rias e ciências que estudam as linguagens, os diferenciados tiposde signos, os discursos, as mensagens, a significação, os códigos,a informação e os sistemas. Essas ciências são: filosofia da lin­guagem, filosofia analítica, biologia, teoria dos sistemas, ciências :cognitivas, nos seus aspectos voltados para a questão da represen- "tação, inteligência artificial, teorias da informação, ciências dacomputação, lingüística, semióticas concebidas como teorias dos

Assim sendo, a pergunta .crucial que buscarei responder neste.. . ~'. . .

ponto é a seguinte: ,como se inserem as teorias e ciências da comu-nicação no mapa aci ma esboçado? Alerto novamente para o fatode que as sugestões de inserção que serão discriminadas abaixotambém 'têm' u~ caráter e~tritamente sinalizador, sem pretensãode exaustividade.. . ,

Concebida a. comunicação como ~ma área inevitavelmenteinter, multi e transdisciplinar, as teorias e ciências para a pesquisa'e estudo da comunicação em todos os seus níveis, desde o nível dapesquisa básica, conceitual, passando pelos vários níveis das pes­quisas aplicadas até as,pesquisas empíricas, exploratórias e decal"!1p<?, insereIl}-se.no J1!apa como se segue.

Em primeiro lugar, com um caráte~ muito geral, devem serconsideradas as teorias geraisda comunicação que lidam corri osconceitos mais abstratos definidores da área como tal. Teorias dessaordem não se i'ns'erem ern campos específicos nem em suasinterfaces, visto que lidam com conceitos gerais, fundadores daárea. Aqui se enquadram as teorias que elaboram definições emodelos abstratos de comunicação.

99Lucia Santaella

7.2 TEORIAS DOS MEIOS E SUAS INTERFACES

s ignos,: se mióticas concebidas como teorias da significação,

serniótica discursiva, teorias do discurso, teorias literárias, retóri­ca, teorias do jorrialismo, teorias do não-verbal, teorias da gestua­

[idade, teorias das artes, teorias da imagem, teorias da fotografia,cinemà, vídeo, televisão, holografia, nos seus estatutos de lingua­gem e dos processos comunicativos que engendram, teorias dosom, do rádio, teorias do audiovisual, da hiperrnídia, realidadevirtual, telepresença etc ., também nos seus estatutos de lingua-gem e dos processos comunicativos que engendram. .

No campotó.Z) dos meios esuas interfaces, inserem-se as his­tórias, as técnicas e teorias 'dos suportes, canais, meios ou mídias,tais como história, técnica e teoria da pintura, do livro, do jornal,da fotografia, cinema, rádio, TV, do computador e suas extensõesnas redes, na hipermídia e seus programas etc., todos eles agoraconsiderados nos seus estatutos de suportes e meios.

Inserem-se também neste campo as teorias e métodos para oestudo de fatores econômicos, políticos, éticos, jurídicos, merca­dológicós, ideológicos, culturais e psfquicos das mídias, visto queesses fatores se caracterizam como aspectos das mídias, Em razãodisso, é nesse território que brotam as teorias híbridas tais comomídia e política, ética das mídias , mídias e mercado etc. ,

7.3 TEORIAS DO CONTEXTO E SUAS INTERFACES

No campo (5.3) do contexto comunicacionaJ e suas interfaces,localizam-se os diálogos da comunicação com a história, sociolo-gia e política, geopolítica, antropologia cultural, etnologia, histó­ria e semiótíca da cultura, visto que o campo do contexto comuni­cacional implica sempre en: situar os processos comunicativos ern

Comunicação' [, Pesquisa98••••••••••••••.'••••••••'.•••••••••••

7.5 TEORIAS DA RECEPÇÃO E SUAS INTERFACES

7.4 TEORIAS DO SUJEITO E: SUAS INTERFACES

N o campo (5.4) do sujeito ou emissor da mensagem e suas

interfaces, situam-se a psicologia, a psicanálise, a antropologia,

as ciências cognitivas nos seus aspectos voltados especificamente

para a mente e cognição. Nas interfaces, situam-se as teorias das

organizações e as teorias do marketing aplicado à comunicação.

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•••••••••

101Lucia Santaella

cação e decodificação em um meio é simples ou complexa; a in­fluência de todas essas variáveis no impacto político, social epsicológico das mídias; como a escolha de um meio em detrimen­to de outro pode afetar a situação comunicativa; as alterações'

provocadas pela mídias na interação e estrutura social; as mídias

como conformadoras do ambiente social etc. (MEYROWITZ,1994: 50-51).

Também não se pode descartar o fato de que a escolha de um

tema de pesquisa, o mais das vezes, leva à sua exploração em vá­

rios níveis e estratos que .rec lam am pela convivência de diversas

teorias ao mesmo tempo. Assim, por exemplo, o tema da sociali­

zação pode ser visto nos níveis dos processos individuais (apren­

~izagem), interpessoais (interação entre pais e filhos etc.), influên­

cias deredes ou organizações (escolas, igrejas, instituições), fato­

res macroestruturais (influências culturais dos meios de massa).

Como outro exemplo; na comunicação política, os estudos podem

se desenvolver nos níveis intraindividuais (formação de opinião) ,

.interpessoal (influência da família), organizacional (grupos de re­ferência ou grupos étnicos), macrossistêmicos (políticas de difu­

são das campanhas) (BERGER e CHAFFEE, 1987; 108).Enfim, conforme espero ter demonstrado, a comunicação se

caracteriza como uma rede de múltiplas interfaces que não podem

ser ignoradas sob pena dese perder aquilo que a área apresenta de

mais desafiador e que, por isso mesmo, mais merece ser investi­

gado.

Comunicação [, Pesquisa100

No campo (5.S) da recepção da mensagem e suas interfaces,

inserem-se .as ciências sociais e as teorias das mediações, com

ênfase nos aspectos políticos, ideológicos e culturais da comuni­

cação sob o ponto de vista do receptor, as teorias da recepção, as

teorias das relações públicas, a antropologia urbana etc:As teorias foram localizadas em territórios específicos para

servirem como pontos de referência ordenadores da área de co­

municação e.suas .interfaces . Isso não.significa que não haja teo­

rias constelativas e interdisciplinares elas mesmas, teorias que bus­

CaITI colocar em interação uma série dos territórios que foram aci­

ma discriminados. Assim, por exemplo, as modernas teorias .das

mídias têm apresentado um elenco multifacetado de propostas de

pesquisa, tais como: as características de cada mídia individual

ou de cada tipode mídia; os sentidos perceptivos que são requeri-o.dos para a recepção de cada meio; os tipos existentes de proces-

. , \

sos comunicativos, uni ou bidirecionais; quão rapidamente asmensagens podem ser transmitidas; se a aprendizagem da codifi-

perspectivas e conjunturas históricas, ~ociais e culturais, como,por exemplo, ocorre na atualidade com as teorias da globalização,

do multicultural isrno etc. Por isso mesmo, esse território é fértilem teorias híbridas, tais como comunicação e política, comunica­

ção e cultura, sOc1ocomunicação, histórias da comunicação etc.

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A PESQUISA, SEUS MÉTODOSE SEUS TIPOS

Com os capítulos anteriores, que apresentaram respectivamenteum panorama das teorias da comunicação e UlTI mapeamento daárea, julgo ter fornecido ao leitor os antecedentes necessários,mesmo que não exaustivos, para a discussão sobre pesquisa e pro­

jeto de pesquisa em comunicação que se seguirá neste e no próxi­

mo capítulo.

1. A CIÊNCIA COMO COISA VIVA·

o século XIX nos legou a idéia de que ciênciaé corpo siste­matizado e organizado de conhecimento. Frontalmente contra essaidéia e contra qualquer outra definição formal e abstrata, C. S.

Peirce defendeu a visão da ciência como aquilo que é levado a

efeito P?r pesquisadores vivos, a ciência como fruto da busca concre­

ta de um grupo real de pessoas vivas, caracterizando-se, desse modo,

como algo em permanente metabolismo e crescimento (SANTAELLA,

1.992: 108). Para Peirce, há três espécies de seres humanos:

. ((A primeira consiste naqueles para quem a primeira coisa está na

qualidade de sentimentos. Esses homens criam a arte. A segunda

-------------------------------------~"

consiste nos homens práticos, que levam à frente os negócios do

mundo. Estes não respeitam outra coisa senão o poder, e o respeitam

na medida em que ele pode ser exercido. A terceira espécie consiste

nos homens para quem nada parece grande a não ser a razão . Se a

força lhes interessa, não é sob o aspecto do seu exercício, mas por­

que ela tem uma razão e uma lei. Para os homens da primeira espé­

cie, a natureza é uma pintura; para os homens da segunda, ela é uma

oportunidade; para os homens da terceira, ela é um cosmos, tão ad­

mirável que penetrar nos seus caminhos lhes parece a única coisa

que faz a vida valer a pena. Esses são os homens que vemos estarem

possuídos pela paixão por aprender, do mesmo modo que outros

homens têm paixão por ensinar e disseminar sua influência. Se não

se entregam totalmente à paixão por aprender é porque exercitam o

autocontrole. Estes são os homens científicos; e eles são os únicos

homens que têm qualquer sucesso real na pesquisa científica" (CP 1.43).

Porque se concretiza através da busca de conhecimento reali­zada por pesquisadores vivos, a ciência, ela mesma, é coisa viva,não se referindo àquilo que já se sabe, mas àquilo que se está lu­tando por obter através da pesquisa em ato. Isso não significa quea sistematização do conhecimento não faça parte da ciênciae não te­nha nela importância. Significa, isto sim, que o mais relevanteestá naquilo que ainda não se conhece e se está lutando por descobrir.

Concepções similares foram apresentadas por Demo (1985:29, 38, 76) quando afirmou que a ciência é um processo, "umarealidade sempre volúvel, mutável, contraditória, nunca acabada,em vir-a-ser". Entretanto, o fato de que nenhuma teoria possa es­gotar a realidade, "não pode produzir o conformismo, mas preci­samente o contrário: o compromisso de aproximações sucessivascrescentes", pois "a ciência não é a acumulação de resultados de­finitivos", mas principalmente "o questionamento inesgotável deuma realidade reconhecida também como inesgotável".

Newton da Costa (1997: 31) afirmou que "uma das coisas a sefazer para entendermos bem o espírito que norteia a ciência é pro­curar uma classificação razoável das numerosas disciplinas cien­tíficas". Para Peirce, o conhecimento abraça substancialmente tudoo que pensamos ou dizemos, por isso os arranjos das ciências sãomuitos. Entre eles, os que lhe pareciam mais úteis são aqueles quebuscam arranjá-las na ordem de dependência lógica de umas so­bre as outras e no seu grau de especialização (MS 1335: 2~3).

Desse modo, desenvolveu uma gigantesca e instigante classifica­ção das ciências que nos permite visualizar os grandes troncosdas ciências, seus diferentes ramos, as interrelações edistintasformas de ajuda entre elas, assim como as tarefas que potencialmen­te a cada uma cabe realizar (ver-KENT, 1987).

Por ser uma classificação natural, funcionando como um diagra­ma móvel e dinâmico, flexível às readaptações que a passagem dotempo exige, em um outro trabalho (SANTAELLA, 1992), busqueiatualizar essa classificação, utilizando como exemplo a área daliteratura na qual transito com alguma intimidade. Algosimilarpode­ria ser realizado para a área da comunicação. Como isso não vem aocaso no momento e dado que, para os propósitos deste capítulo, estaintrodução à ciência deve ser simplificada, podemos nos restrin­gir a uma divisão básica das ciências em puras e aplicadas. Nas pri­meiras, o conhecimento é buscado pelo conhecimento, sem interessena obtenção de resultados por mais proveitosos que esses ·possam ser.As ciências aplicadas diferem das puras apenas nos seus objetivos,pois, nas aplicadas, são estudados métodos e teorias que têm relevân­cia para determinadas aplicações (DA COSTA, ibid.:30).

Outra divisão importante é aquela que se dá entre as ciênciasformais, nas quais o conhecimento é intuitivo, racional e formal,obtido através do raciocínio dedutivo, e as ciências empíricas, nasquais, além do conhecimento discursivo, obtido peja dedução e.indução, há também aquele que é obtido através da observação eexperimentação que se fundam na percepção sensorial.

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105.Lucia SantaellaComunicação & Pesquisa104

106 Comunicação (, Pesquisa Lucia Santaella 107

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Se aquilo que a ciência busca é o conhecimento, resta definir o

que se entende por conhecimento. A própria palavra ciência vemdo latim scire (saber) e significa conhecimento ou sabedoria. Co­nhecer é deter alguma informação ou saber a respeito de algo.Mas a ciência não é a única forma de conhecimento. Há também oconhecimento filosófico, o artístico, o teológico e o de senso co­mum (CARVALHO et al., 2000: 11-12). Costuma-se dizer que aciência existe, entre outras coisas, para nos tirar do senso-comum.Sobre este último, Demo (1985: 30-31) nos fornece uma excelen­te explanação. Senso comum é conhecimento acrítico, imediatista,crédulo esem sofisticação. Não problematiza a relação sujeito eobjeto. Acredita no que vê e assume informações de terceiros semas criticar. Como não é possível se saber tudo, mesmo o cientistapratica senso-comum nas áreas que fogem de sua especialidade,de modo que o senso comum é uma dose de conhecimento co­mum de que dispomos para dar conta das necessidades rotineiras.

Há uma faceta muito positiva do senso-comum que é o bomsenso ou capacidade para encontrar soluções adequadas em situa­ções inesperadas, quando não dispomos de informação especia­

lizada. Portanto, além de ser forma válida de conhecimento, o sensocomum também possui um lado criativo. Entretanto, tão logo ne­cessitamos de informação especializada, comprovada, confiável,

esta só pode provir da ciência.Para Newton da Costa (ibid.: 40), "conhecimento científico é

crença verdadeira e justificada". Falar em verdade e justificação,

contudo, é tocar nas questões mais discutidas por um dos ramosda filosofia, mais especificamente pela filosofia da ciência: a episte­mologia. Do grego episteme, conhecimento, e logos, explicação,

a epistemologia é o estudo da natureza do conhecimento e dajustifi­cação, especificamente, o estudo dos traços definidores, das condi­ções substantivas e dos limites do conhecimento e dajustificação.

Antes da indicação das questões centrais da epistemologia,cumpre notar que a maioria dos problemas do conhecimento por

ela tratados, alicerçam-se em fundamentos filosóficos desenvol­

vidos especialmente a partir do século XVII, quando se deu onascimento da ciência moderna. É nesse ambiente que surgiram

as primeiras formulações sobre o fundamento do conhecimento,na oposição entre o racionalismo, associado principalmente aosnomes de Descartes e Leibniz, de um lado, e o empiricismo, deoutro, ligado aos nomes de F. Bacon e dos ingleses Locke e Hobbes,culminando no empiricismo radical de Hume. No século XVIII, àfilosofia kantiana como síntese conciliatória entre o racionalismoe empiricismo seguiu-se a razão histórica de Hegel. A complexida­de que esses nomes encerram é evidentemente imensa, não haven ­do aqui condições para entrarmos em qualquer detalhe dessa com­plexidade. O leitor que queira se iniciar no assunto, pode encontrarem Carvalho et aI. (2000) uma apresentação breve e acessível.

O impulso no desenvolvimento da ciência a partir do séculoXIX veio trazer como uma de suas conseqüências o surgimentode .filosofiasespecificamente voltadas para a ciência e, com elas,a consolidação dessa área da filosofia dedicada especificamenteàs questões do conhecimento, a epistemologia.

Temas fundamentais da epistemologia são: (a) a natureza doconhecimento, questão esta ligada às escolas filosóficas idealistae realista, (b) a origem do conhecimento e sua localização na ra­zão ou na experiência, conforme se apresenta na controvérsia doracionalismo versus empiricismo, (c) os tipos de conhecimento(proposicional, não proposicional, isto é, conhecimento por fami­

liaridade, proposicional empírico a posteriori, proposicional não­empírico a priori), (d) as formas do conhecimento (demonstrati­vas, discursivas, intuitivas, perceptivas), (e) as condiçõesdas cren­

ças, (f) as condições da verdade, (g) as condições da justificação,(f} fundacionalismo, (g) ceticismo etc. (ver ANDERSON 1996;AUDI, ed., 1995).

Certamente também não posso me deter nas explicações des­sas questões bastante complicadas, em especial porque a episte-

mologia, tanto quanto a ciência, se transforma historicamente. Com

o prodigioso desenvolvimento das ciências no século XX, opositivismo de Comte, que marcou a filosofia da ciência do sécu­lo XIX, foi seguido por uma série de epistemologias científicas,entre as quais se destacam o neopositivismo ou positivismo lógi- .

co, com sua teoria verificacionista dajustificação (ver AYER 1975)e as amplamente discutidas posições epistemológicas e teorias da

ciência expressas no falsificacionismo de Popper (1975), no histo­ricismo de Kuhn (1976), no anarquismo de Feyerabend (1977),no refutacionismo de Lakatos (1976,1998) (ver sobre isso OLIVA,org., 1990) de cujos confrontos originaram-se os debates sobre

objetivismo versus relativismo (ver, p.e., RORTY, 1997).De acordo com Peirce, à cada descoberta científica, que Kuhn

chamaria de revolução científica, segue-se a criação-de uma novafilosofia da ciência. De fato, foram tantas as descobertas científi­cas no século XX que se tornaram constantes as discussões sobrenovos paradigmas das ciências, sobre a metamorfose da ciência(PRIGOGINE e STENGERS, 1984), assim como as reflexões fi­

losóficas sobre as ciências da complexidade (MORIN, 1996a,

1996b, ver BASTOS, 1999).As breves indicações acima aí comparecem a título de sinal de

alerta ao pesquisador que não deve ignorá-las completamente sob

pena de, muitas vezes, ao acreditar que está carregando a bandei­ra da verdade, incorrer em ingenuidades elementares. Por isso

mesmo remeto o leitor ao livro de Newton da Costa (ibid.) onde,posições extraordinariamente lúcidas sobre o conhecimento cien-tífico poderão ser encontradas. Entre elas, vale a pena apontarbrevemente para suas colocações acerca das ciências empíricas

isto é, ciências não-formais, especialmente para a noção de qua­

se-verdade ou verdade pragmática no tocante ao conhecimento

empírico, noção esta que se aproxima sobremaneira da concep­

ção peirceana da verdade (ver SANTAELLA, no prelo, a).

2. O VALOR DAS TEORIAS

•e

109Lucia Santael!a

Assim, para Newton da Costa, a experiência é fundamental

nas ciências empíricas, pois elas são sínteses de criação racional,de observação e de experimentação, nas quais razão e experiênciase fundem. Nas ciências empíricas

"as explicações são edifícios racionais arquitetados pelo homem,

baseados na observação e na experimentação, qu.e impõem certa or­

dem cognitiva em situações problemáticas. [...] Como se sabe que

qualquer concepção teórica acaba sendo apenas aproximadamente

verdadeira, vê-se que a explicação científica é, por sua própria natu­

reza, aproximada..." (ibid.: 44,46).

Enfim, os princípios epistemológicos ou postulados que o men­cionado autor (ibid.: 51-52) nos apresenta como definidores daciência empírica são resumidamente os seguintes: (a) princípio dapossibilidade (o conhecimento científico é possível); (b) princí­pio da origem (o conhecimento nasce do intercâmbio entre expe­riência e pensamento, sendo simultaneamente reflexo do real econstrução racional); (c) princípio da natureza (o conhecimento

das disciplinas empíricas refere-se a um universo de coisas e fatosque existem independentemente de nós); (d) princípio do critério(os critérios de justificação referentes ao conhecimento perten­cem à lógica dedutiva, indutiva e à metodologia das ciências ex­perimentais); (e) princípio das categorias (a ciência se talha atra­

vés de sistemas de categorias que se modificam historicamente).

Uma vez que a ciência busca, mais do que a mera descrição

d~s fenômenos, estabelecer, através de leis e teorias, os princípiosgerais capazes de explicar os fatos, estabelecendo relações e pre­

dizendo a ocorrência de relações e acontecimentos ainda não ob­servados, o conhecimento científico não pode ser alcançado atra-

Comunicação & Pesquisa108

vés da inocência. Por isso, a ciência desenvolve meios que lhe sãopróprios para chegar àquilo que busca. Esses meios se constituemnos conceitos e redes conceituais que os pesquisadores edificam.Assim são obtidas leis, hipóteses e teorias que nos permitem com­preender e ordenar o universo por meio de explicações, previsõese sistematizações. Conceitos mais gerais quepertencem a todas asciências, como o conceito de objeto, compõem as categorias cien­tíficas fundamentais. As disciplinas particulares se distinguempelos sistemas de categorias específicas que as regem (DA COS­TA, ibid.: 49).

Vem daí o valor das teorias. No primeiro capítulo já foi dadoinício a uma discussão sobre teoria para distingui-la de modelo.Em razão disso, só serão aqui apresentadas algumas informaçõesadicionais relativas às ciências empíricas. Definida de maneirasimples, uma teoria é uma generalização para explicar como algofunciona. Ela nos fornece princípios gerais que nos ajudam a com­preender um número enorme de fenômenos específicos, porque ecomo ~les ocorrem e como estão relacionados entre si, pois a teo­ria fa'z a síntese dos dados, ajudando a prever eventos futuros,eventos que ainda não vivenciamos. As teorias também têm um valorheurístico ou função geradora de pesquisa, pois criam necessidadesde investigação que, sem elas, não poderíamos pressentir.

Contudo, as teorias, como já foi visto, são limitadas e não po­dem revelar a verdade em um sentido absoluto. De uma ciênciapara a outra, o grau de precisão e a conseqüente possibilidade deformalização da teoria varia. Nas ciências naturais, há precisãomuito mais alta do que nas ciências sociais e psicológicas, dimi­nuindo ainda mais nas humanidades até atingir o limite máximo

da imprecisão nas artes.Na definição operacional de Bergere Chaffee (1987: 101-105)"

a teoria consiste de um conjunto de constructos unidos por afir­mações relacionais que são internamente consistentes umas comas outras. Os constructos, por sua' v-ez, são conceitos que se for-

mam indutivamente pela generalização de particulares. Os cons­tructos apresentam vários graus de abstração. Quanto mais abs­tratos, mais áreas são capazes de abranger. Em função disso, as

teorias têm fronteiras que especificam o domínio de fenômenosque elas explicam e aquilo que elas deixam de fora. As teorias sãoúteis na medida em que podem ser testadas experimentalmente.Elas podem ser validadas através da avaliação de suas relaçõesteóricas ou através da aplicação empírica. Mover-se do nível teó­rico para o nível da pesquisa empírica implica na redefinição ope­racional dos conceitos. Nenhuma definição operacional é capazde capturar o significado completo do constructo teórico. Há sem­pre uma defasagem entre o conceito teórico e sua redefinição ope­racional. Quanto mais uma teoria contiver constructos que nãosão passíveis de operacionalização, menos ela será passível de teste.

A seguir, Bergere Chaffee (ibid.: 104) apresentaram a seguin­te lista de atributos de uma boa teoria: (a) poder explanatório (ahabilidade da teoria para fornecer explanações plausíveis para ofenômeno que ela pretende explicar); (b) poder preditivo (capaci­dade de prever eventos); (c) parsimônia (teorias mais simples sãopreferidas às mais complexas, quando ambas cumprem a mesmafunção); (d) falsificabilidade (bastante discutível, este atributo,originário de Popper (ver 1975), diz que uma teoria deve ser ca­paz de ser provada falsa); (e) consistência interna (a lógica inter­na de uma: teoria pode ser conferida independentemente de testesempíricos); (f) desafio heurístico (capacidade de gerar novas hi­póteses, expandindo o espectro do conhecimento potencial); (g)poder organizacional (capacidade de organizar o conhecimentoexistente). '

Além da necessidade das construções teóricas, se a ciência buscao ,conhecimento, cumpre perguntar como essa busca se realiza. Aresposta é consensual: conhecimento se adquire através de pesquisa.

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110 Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella111

112 Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella 113

3. A PESQUISA COMO ALIMENTO DA CIÊNCIA

À luz de Peirce, uma definição muito geral e sintética de pes­

quisa seria a seguinte: toda investigação de qualquer espécie queseja, nasce da observação de algum fenômeno surpreendente, de

alguma experiência que frustra uma expectativa ou rompe comum hábito de expectativa (CP 6.469). Quando um hábito de pen­

samento ou crença é rompido, o objetivo é se chegar a um outrohábito ou crença que se prove estável, quer dizer, que evite a sur­presa e que estabeleça um novo hábito. Essa atividade da passa­gem da dúvida à crença, de resolução de uma dúvida genuína econseqüente estabelecimento de um hábito estável é o que Peirce

chamou de investigação (SANTAELLA, no prelo, a).Da generalidade dessa definição decorre que ela pode se refe­

rir a qualquer tipo de investigação e não apenas à científica. En­tretanto, ela contém aquilo que se constitui no núcleo de qualquerpesquisa: livrar-se de uma dúvida, buscar uma resposta já é umprocesso investigativo, "mesmo que seja imediato, assistemáticoe definido por traços puramente ligados ao senso-comum" (BAR­ROS e LEHFELD, 1988: 13). Toda pesquisa nasce, portanto, do

desejo de encontrar resposta para uma questão. Aliás, um tal de­sejo se constitui sempre na mola central de uma pesquisa, princi­

palmente da científica, pois, sem esse desejo, o pesquisador fene­

ce tragado nos desencantos das obrigações.Por vezes, a pergunta que se busca responder é abstrata. Ou-

tras vezes, é prática e, até mesmo, urgente. De todo modo, só apesquisa nos permitirá respondê-las. Nesse sentido, o esforço diri­gido e o conjunto de atividades orientadas para a solução da ques­tão abstrata ou prática ou operativa que se apresenta, resultará naaquisição de conhecimento, mesmo quando o esforço, as atividadese o resultante conhecimento se situam no contexto não especiali­

zado do nosso cotidiano. Se tem todos esses pontos em comum coma pesquisa em geral, o que faz, então, uma pesquisa ser científica?

Antes de tudo, a pesquisa científica exige, pelo menos como

pano de fundo, um certo estado de alerta do pesquisador para asquestões filosóficas, especialmente epistemológicas, sobre as leisque regem o conhecimento, sua busca, aquisição, validade etc.Lopes (1990: 88), por exemplo, considera a epistemologia um pólointrínseco à pesquisa científica e uma das instâncias da práticametodológica. Assentada sobre essas bases, a pesquisa deve se

conduzir dentro de um determinado campo da ciência a que oobjeto ou assunto da pergunta pertence e à luz de algum quadroteórico de referência e de suas predições, quadro teórico este quedeve ser selecionado em função de sua adequação para respondera pergunta que se tem.

Além disso, para resolver a dificuldade, formulada no problema,

o pesquisador não pode "apenas adivinhar, fazer suposições gratui­tas ou emitir opiniões superficiais e inconsistentes", mas deve reali­zar sua busca através de levantamento de dados, através de ummétodo coletâneo ao quadro teórico de referência e também adequa­do à dificuldade a ser resolvida, método este com suas técnicas espe­cíficas. Tudo isso se constitui em "um processo pelo qual, ao mesmotempo, se busca, examina e prova a solução" (RUDIO, 1992: 9,71).

Só isso pode ser chamado de pesquisa científica porque sóisso pode resultar em conhecimento com as características que aciência exige, isto é, conhecimento verdadeiro e justificado, nosentido em que "verdadeiro e justificado" foi discutido mais aci­ma. Tem-se aí por que a pesquisa é o alimento da ciência. Pesqui­

sa é o modo próprio que a ciência tem para adquirir conhecimen­

to. No seu aspecto gerativo, o conhecimento só pode continuar

crescendo na medida em que as pesquisas são incessantementerealizadas. Caso contrário, o conhecimento se cristalizaria em fór­mulas fixas, nos axiomas das crenças estabilizadas ou em merasimposições burocráticas do fazer científico que Peirce chamaria

de excremento da ciência. Em suma, a pesquisa científica é umaatividade específica e especializada. Demanda de quem se propõe

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4. A LÓGICA NO CORAÇÃO DA METODOLOGIA

Segundo Newton da Costa (ibid.: 1), com o desenvolvimentoprodigioso das ciências no século XX e com o avanço recente dalógica e da metodologia, "ninguém mais domina estas duas disci­plinas completamente". 'Assim, um conhecedor da metodologiadas ciências humanas encontrará obstáculos quase intransponíveisno tocante à metodologia da física e vice versa. Sem negar essasdificuldades, proponho que a concepção peirceana da metodêutica,ou teoria geral do método científico, pode nos ajudar a compreen­der o que está subjacente à enorme profusão atual de métodos,

profusão que s6 tende a aumentar, visto que os métodos são tão .históricos quanto as ciências nas quais eles são gerados.

Devido à falta ainda hoje de edições mais completas e autori­zadas dos manuscritos deixados por Peirce, infelizmente o conhe-

a desenvolvê-la uma certa vocação, um certo grau de renúncia àsagitações da vida mundana e insubmissão às tiranias da vida prá­tica, demanda a curiosidade sincera pelo legado do passado e avontade irrefreável de prosseguir; exige isolamento disciplinadoe conseqüente capacidade para a solidão reflexiva, hábitos de vidamuito específicos, ao mesmo tempo que abertura para a escutacuidadosa e sempre difícil da alteridade, junto com a capacidaderenovada de se despojar do conforto das crenças, quando isso se mostranecessário. Exige, ao fim e ao cabo, amor pelo conhecimento. Sóesse amor pode explicar a docilidade do pesquisador aos rigores daciência, especialmente aos rigores do método.

O conhecimento científico, portanto, não pode ser alcançadode maneira dispersiva e errante, pois a errância é, via de regra,não apenas custosa em termos de perda de energia e recursos masé, sobretudo, sem garantias. Por isso mesmo, junto com as ques­tões epistemológicas, a teoria dos sistemas cognitivos ou concei­tuais engloba questões lógicas e metodológicas.

115Lucia Santaella

cimento que se tem de sua semiótica costuma ser truncado e redu­cionista. A maior parte das pessoas acredita que a semióticapeirceana se limita a umas classificações de signos para seremaplicadas a processos ou sistemas de signos concretos, tais comofotográficos, cinematográficos, literários etc. Embora uma tal apli­cação seja residualmente até possível, nada poderia estar maislonge do que isso da verdadeira natureza de sua semiótica. Paracomeçar, ela é uma disciplina filosófica e científica, que compõea tríade das ciências normativas - estética, ética e lógica ou semió­tica -, estas antecedidas pela quase-ciência da fenomenologia.

Além disso, a semiótica, um outro nome para a lógica, conce­bida em um sentido muito lato, tem três ramos. O primeiro ramo,chamado de gramática especulativa, é aquele do qual mais se sabe,pois é nele que são estudados os variados tipos de signos. O segun­do ramo, chamado de lógica crítica, tomando como base os diver­sos tipos de signos ou modos de condução do pensamento, estudaos tipos de inferências, raciocínios ou argumentos: a abdução,indução e dedução. O terceiro e mais vivo ramo da 'semi ótica,chamado de retórica especulati va ou metodêutica, tem por funçãoanalisar·os métodos a que cada um dos tipos de raciocínio dá origem.

Na realidade, Peirce dedicou toda a sua vida ao desenvolvi­mento da lógica entendida como teoria geral, formal e abstratados métodos de investigação utilizados nas mais diversas ciênci­as. Ora, os métodos são muitos, evoluem no tempo dentro de umamesma ciência e mudam de uma ciência para a outra. Será quenão existem princípios gerais, universais, subjacentes a esses mé­todos? Essa foi a questão que Peirce perseguiu por toda a suaexistência. A teoria dos signos foi desenvolvida como um dos meiospara responder, sobretudo, a essa questão, conforme será explici­tado a seguir.

De início, Peirce definiu que o principal prop6sito da lógica

estava em aprender os modos de conduzir qualquer investigaçãoou pesquisa. Bem depressa descobriu que, preliminarmente a isso,

Comunicação & Pesquisa114

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•era requisito classificar os raciocínios, determinando as proprie­

dades' re la tivas eovalor de qualquer raciccínio . Vale a pena co­

nhecer essa classificação dos raciocfnios por si mesma, quer sejaatingido ou, não 0 -propósito de chegar ao conhecimento de-como

conduzir a pesquisa, pensava Peir~e. Mas antes de ter dado trêspassos nessa direção, descobriu que nada poderia ser feito antes

de estu-dar à anatomia dos raciocínios e ter descoberto de que eles

são compostos (MS 452: 4-10; 449: 24-30), Foi nesse ponto que

Peirce se -deparou com os signos. Como se pode ver, sua indaga­

ção veio de trás 'para diante. Queria descobrir os método~ de con­

duzir apesquisa, percebeu que deveria an~es estudar os raciocí­nios.' Mas para estudá-los, precisava estudar como eles se corpori­

ficam'Logo se deu conta de que raciocínios, e mais do que os ra­

ciocínios, quaisquer pensamentos se corporificam em signos, não

apenas emsímbolos, mas-em variadas espécies de signos. Tem-se

- aí os três ramos da serniótica : dos signos para os raciocfnios e

destes para Os métodos de pesquisa, Nessa medida, a serniótica oulógica peirceana é, sobretudo, uma teoria sígnica do conhecimen­

to, a epistemologia peirceana (nom-e, aliás, que ele detestava) pos­

tula que C? conhecimento só pode se dar pela mediação dos signos,

pelosimples fato de que todo pensamento só se realiza em signos.

Alem disso, sua serniótica é Ul11a lógica crítica dos tipos de racio­

cínio e uma teoria do método científico, como se verá.

Tendo seu ponto de partida ou propedêutica no estudo dos sig­

nos, a 'lóg ica crítica, segundo ramo da semiótica, lida com a estru­

tura do racioc ínio, -não lida com a textura do pensamento, nem

lida C0l11 os sentimentos que o acompanham, nern com os avanços

e recuos, vicissitudes e percalços que são próprios do ato de pen­

sar, mas Sil11 C0111 os processos conscientes do pensamento, aque­les que se submetem ao autocontrole. Excluindo-se assim o psico­

lógico , as estruturas do raciocínio ficam reduzidas, portanto, a

inferências abstraídas das esperanças, medos,' alegrias, dores e '

angústias que se enroscam em nossos pensamentos, Raciocínios

5. ABDUÇÃO, INDUÇÃO E DED-UÇÃO

Embora com peculiaridades próprias, a visão peirceanada

indução .e, especialmente, da dedução não se diferencia radical­

mente das definições encontradas em livros de lógica e metodo­logia, com a exceção de que, para Peirce; não 'se trata apenas de

tipos de métodos, mas de métodos que estão enraizados em nossa

mente, pois se constituem nos tipos de raciocínio que dão forma

aos noss.os pensamentos e inferências, Por isso mesmo, não são

métodos utilizados apenas pela ciência, mas fazem parte de nossa

vida cotidiana, C0111 a única diferença de que, na ciê-ncia, essesraciocínios são burilados através da lógica. Mas a verdadeira novi­

dade está na sua introdução do raciocínio abdutivo, uma criação

inteiramente sua, não obstante tenha se inspirado em Aristóteles.

são, ness~ medida, o esqueleto da vida do pensarnen to, forma des­

provida de seus conteúdos específicos, contextos, texturas e qua­

lidades sentidas. Vem daí a distinção entre cognição e raciocínio,

pois a 'primeira envolve todos esses aspectos .Quando os elementos psicológicos do pensamento são excluí­

dos, sua estrutura é mais ou menos similar para todas as mentes,

representando, de oerto modo, seu aspecto universal. Nos ~eus

estudos, Peirce chegou à conclusão de que há três classes univer­

sais de inferências ou raciocínios que se constituem também nostrês tipos de argumento; abdução, indução e dedução.

Há certamente outras formas de raciocínio, corno o analógico ,

o metafórico, e muitas outras operações de raciocínio que inclu­

em a restrição, a determinação.ia extensão, a abstração etc. e q~e

podem caracterizar as espécies de raciocínio envolvidas na obser­

vação (CP 2.422, 2430, ver também LIZSKA, 1996:68-71). En­

tretanto , essas outras formas ou são misturas dos três tipos univer­sais ou ingredientes deles.

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117Lucia SantaelleComunicação & Pesquisa116

A tarefa da lógica crítica, portanto, é a de determinar a valida­

de ou grau de força de cada tipo de raciocínio. Falar em validadede um argumento é tocar no problema da verdade. Por isso, a lógi­ca crítica, segundo ramo da semi ótica, é também a teoria das con­dições de verdade das representações. Enquanto o primeiro ramoda serniótica tem por tarefa estudar os diferenciados tipos de re­presentações ou signos, o segundo ramo, lógica crítica, deve res­ponder pela validade de um dos tipos dessas representações, osargumentos. Qual é a validade da dedução, indução e abdução?Suas condições de verdade diferem, como se verá.

Na dedução partimos de um estado de coisas hipotético, defi­nido abstratamente por certas características. Entre as caracterís­ticas a que não se dá atenção neste tipo de raciocínio está a con­formidade com o mundo exterior do estado de coisas que o racio­cínio hipotético levanta, pois, na dedução, uma inferência é válidase e somente se existe uma relação entre o estado de coisas supos­to nas premissas e o da conclusão. O objetivo de tal raciocínio édeterminar a aceitação da conclusão. É, portanto, o caso típico doraciocínio matemático que parte de uma hipótese cuja verdade ou

falsidade nada tem a ver com o raciocínio, e cujas conclusões sãoigualmente ideais.

Desse modo, a dedução tem por finalidade provar que algodeve ser, definindo-se, pois, como um método de predição dosfenômenos. A maneira como a predição se processa pode ser resu­mida nas operações do raciocínio dedutivo que consiste em seconstruir um diagrama de acordo com um preceito geral, em ob­servar certas relações entre as partes daquele diagrama não expli­

citamente requeridas pelo preceito, mostrando que essas relações

se mantêm verdadeiras para todos os diagramas desse tipo, e emformular essa conclusão de modo geral (CP 8.209). É por isso quea dedução só trabalha com dados de certeza.

Uma vez que o conceito peirceano da indução difere um pou­co do sentido que lhe é dado, começo pela definição costumeira

de indução. A indução é tida como um processo lógico no qual

uma conclusão proposta contém mais informação do que as ob­servações ou experiências nas quais ela se baseia. A verdade daconclusão é verificável apenas em termos de experiência futura ecertamente é atingível apenas se todos os exemplares possíveisforem examinados (BAVELAS, 1995: 54).

Peirce dizia que costuma-se ensinar que a conclusão da indu­ção aproxima-se da verdade devido à uniformidade da natureza.Só são contemplados como casos de raciocínio indutivo aquelesem que, ao descobrir que certos indivíduos de uma classe têmcertos caracteres, o raciocinador conclui que todos os indivíduosdessa classe têm esse caráter. Para Peirce, essa definição indicaque essa inferência não é indutiva, mas uma mistura de dedução e

presunção ou abdução (CP 2.775).Frente a isso, o ajustamento que ele realizou no conceito de

indução diz que esse raciocínio ocorre quando aquele que racioci­na já está de posse de uma teoria mais ou menos problemática(variando de uma apreensão puramente interrogativa até uma for­te inclinação com poucas dúvidas). Tendo refletido que, se essa

teoria é verdadeira, então, sob certas condições, certos fenôme­nos deveriam aparecer (e quanto mais estranhos eles forem e me­nos antecedentemente críveis, tanto melhor), o raciocinador proce­de ao experimento, isto é, ele preenche essas condições e prestaatenção aos fenômenos preditos. "Quando esses fenômenos apa­recem, ele aceita essa teoria com uma modalidade que a reconhe­ce apenas como provisória e aproximadamente verdadeira". Ajus­tificativa lógica para isso é que, se esse método for persistentemen­

te aplicado ao problema, ele deve, com o tempo, produzir umaconvergência, embora irregular, para a verdade, pois a verdade deuma teoria largamente consiste em que toda dedução perceptivadela seja verificada (CP 2.775). A conclusão que Peirce deu aessas postulações, como se segue abaixo, elucida mais perfeita­mente os aspectos de originalidade da sua concepção de indução.

119Lucia SantaellaComunicação & Pesquisa118

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Faz parte da essência da indução que a conseqüência de uma

teoria seja extraída primeiramente em relação ao resultado desco­nhecido ou quase desconhecido do experimento; e que isso sóseja virtualmente apurado mais tarde, pois, se olharmos os fenôme­nos para encontrar concordâncias com a teoria, é uma mera ques­tão de engenhosidade e labor quantas poderemos encontrar. A

indução (pelo menos nas suas formas típicas) não contribui em

nada para o nosso conhecimento, exceto para nos dizer aproxima­damente com que freqüência, lio curso de tal experiência, a qualnossos experimentos caminham para constituir, uma dada espéciede evento ocorre. Portanto, ela simplesmente avalia uma probabi­lidade objetiva. Sua validade não depende da uniformidade da

natureza, ou de qualquer coisa desse tipo. A uniformidade da na­

tureza pode tender a dar à probabilidade avaliada um valor extre­mamente alto ou baixo; mas, mesmo que a natureza não fosse uni­forme, a indução certamente descobriria isso, na medida em queum raciocínio indutivo pudesse ser desempenhado. Certamente,um certo grau de uniformidade especial é um requisito para isso(CP 2.775). Peirce ainda estudou detalhadamente os tipos de

indução e também de dedução os quais, por questão de espaço,

não serão trabalhados aqui (ver SANTAELLA, no prelo, a).Quanto à abdução, o mais original dos tipos de ra?iocínio?u

argumento, ela se refere ao ato criativo de se levantar uma hipóte­se explicativa para um fato surpreendente. É o tipo de raciocínioatravés do qual a criatividade se manifesta não apenas na ciência

e na arte, mas também na vida cotidiana. Quando nos confronta­

mos com algo que nos surpreende, para o qual não temos resposta

ou explicação, a abdução é o processo através do qual uma hipóteseou conjectura aparece como uma possível resposta ao fato surpreen­dente. De onde vem esse poder de levantar hipóteses?

De acordo com Peirce, a abdução é um instinto racional (ver

SANTAELLA, 1991). É o resultado das conjecturas produzidaspor nossa razão criativa. Ela é instintiva e racional ao mesmo tem-

po. Com a palavra "instinto", Peirce quis significar a capacidade

de adivinhar corretamente as leis da natureza.Desse .modo, o novo é apreendido por nós através de nada

mais nada menos do que a adivinhação. Entretanto, não é a adivi­nhação em si mesma, nem a hipótese que ela engendra que são

instintivas, mas a capacidade humana de adivinhar a hipótese cor­

reta, justamente aquela que é capaz de explicar o fato surpreen­

dente. Peirce chamou essa capacidade de il lume J1aturale, indi­cando com isso que o ser humano tem um insight natural das leisda natureza.

Além de ser instintiva e evolucionária.a abdução é, ao mesmotempo, uma inferência lógica. Esse é certamente o aspecto da

abdução que tem despertado maispolêmica entre os comentadores

de Peirce. Se a abdução nasce de um instinto para a adivinhação,

como ela pode ter uma forma lógica? Para' responder a esta apa­rente ambivalência, Fann (1970: 112) afirmou que o momento doinsight e a adoção da hipótese são instantâneos. Mas o processode construção e seleção da hipótese é consciente, deliberado econtrolado, estando aberto à crítica e autocrítica.

Assim sendo, a abdução segue alguns passos: (1) aobserva­

ção criativa de um fato; (2) uma inferência que tem a natureza deuma adivinhação; (3) a avaliação da inferência reconstruída. Emsíntese, trata-se de um tipo de raciocínio que, sem deixar de terforma lógica, tem um caráter instintivo e é, antes de tudo, um pro­cesso vivo de pensamento.

Embora seja responsável por todas as' nossas descobertas, a

abdução é o mais frágil dentre os argumentos, fonte de todas asverdades e de todas as mentiras. A dedução é o argumento maisforte, mas não assume nenhuma responsabilidade em relação aomundo que nos circunda. A indução é o argumento que confrontaa realidade, mas suas conclusões são apenas provisórias. Tendo as

propriedades e o valor de cada um dos argumentos assim definidos,sobre essa teoria da lógica crítica, Peirce edificou o terceiro ramo da

121Lucia Santaella

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Comunicação [, Pesquisa120

6. O MÉTODO DAS CIÊNCIAS

serniótica, a metodêutica que, do meSl110 modo COJllO são gerais e

formais os outros dois ramos da serniótica, ela também é uma ciência

formal egeral, neste caso, do método da ciência. Por isso mesmo, foi

chamada de metodêutica, para evitar que, com o nome de metodologia,

fosse confundida com uma ciência prática.

"Qualquer hipótese que explica os fatos é criticamente justificável.

Mas entre as hipóteses justificáveis, devemos escolher aquelas que

podem ser testadas por experimentação. Não há mais necessidade de

escolhas subseq üentes, depois que conclusões indutivas e dedutivas :

foram extraídas. Embora a metodêutica não tenha a mesma preocu­

pação com estas últimas, ela deve desenvolver os princípios que

guiarão a invenção das provas, aquelas que deverão guiar o curso

Se as ciências especiais estão preocupadas com a obtenção de

resultados válidos, e a lógica crítica com a análise dos argumentos

ou raciocínios que são utilizados por qualquer inteligência cientí­

fica, a metodêutica tem por tarefa descobrir como analisar as hi­

póteses de modo a encontrar procedimentos que conduzam aos

resultados desejados. Sua função, portanto, é analisar os méto­

dos a que cada um dos tipos de raciocínio dá origem, incluindo o

método da descoberta, de resolução de problemas e especialmen­

te os procedimentos apropriados a qualquer pesquisa.

Trata-se pois de analisar os passos teóricos do método deduti­

vo e, no caso da indução, comprovar a validade de seu método.

Conforme veremos mais abaixo, a validade da indução só se resol­

ve no momento em que Peirce chega à formulação do método da

ciência. Por ora, fiquemos no tratamento da abdução. Ora, o gran­

de interesse da metodêutica está justamente na abdução ou infe­

rência que inicia uma hipótese científica . Pois não é suficiente

que uma hipótese seja justificável, dizia Peirce (NEM 4: 62).

123Lucia Santaella

completo de uma pesquisa, e aquelas que determinam em que pro­

blemas devemos engajar nossas energias".

Estando seguro quanto àvalidade de sua classificação dos argu­

mentes e em meio à consideração dos métodos que essa classifi­

cação originava, Peirce veio a se dar conta de que, longe de serem

processos separados, os métodos abduti vo, deduti vo e induti vo se

integram em um todo coeso corno estágios do processo investigati­

vo. Nessa conce.pção dos três tipos de inferência, raciocínios ou

argumentos como três estágios interdependentes e entrelaçados

da pesquisa científica, nascia a concepção madura de Peirce do

método das ciências, conforme está expressa na síntese abaixo

que nos é fornecida por Fann (1-970: 31-32).

Quando fatos surpreendentes emergem, uma explicação é reque­

rida. A explicação deve ser uma proposição tal que levaria à predi­

ção dos fatos observados, quer como conseqüências necessárias,

quer, pelo menos, como muito prováveis sob certas circunstân­

cias. Uma hipótese, então, tem de ser adotada como plausível nela

mesma e tomando os fatos plausíveis. 'Este passo de se adotar uma

hipótese como sugerida pelos fatos, é o que chamo de abdução (CP

7.202), afirmou Peirce, equalizando-a com o primeiro estágio da in­

vestigação. "A primeira coisa que deve ser feita, assim que uma

hipótese for adotada, é traçar suas consequências experimentais ne­

cessárias e prováveis. Esse passo é a dedução" (CP 7.203). O passo

seguinte é testar a hipótese através de experimentos e comparações

das predições deduzidas da hipótese com os resultados reais do

experim~nto.Quando predições após predições s~o verificadas pelo

experimento, começamos a nos dar contar de que a hipótese se sus­

tenta entre os resultados científicos. "É esta espécie de inferência,

d~ experimentos, testando predições baseadas numa hipótese, a

única que está habilitada a ser chamada de indução" (CP 7.206) .Essa versão corresponde à delimitação dos tipos de inferência

a que Peirce chegou na maturidade, quando as distinções entre

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Comunicação & Pesquisa122

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abdução e indução tornaram-se nítidas e precisas. A indução nãoadiciona nada. No máximo, corrige o valor de uma razão ou mo­difica levemente uma hipótese de um modo que já havia sido con­ternplado como possível. A abdução, por sua vez , é meramentepreparatória. É o primeiro passo do raciocício científico, enquan­

to a indução é o passo conclusivo. Estão nos polos opostos darazão. A primei.~a, abdução, é o polo menos efeti VO , a segunda, o

tipo de argumento mais efetivo. O método de um é o reverso do

outro ..A abdução busca uma teoria, a indução busca fatos (CP

7.217-218, apud FANN, ibid.: 35, 43).

A indução se toma, assim, o único processo comprobatório e a

abdução, aquele processo que leva não à adoção de hipóteses corno

opiniões finais, mas às hipóteses elas mesmas - à sua adoção corno

puro "poder-ser". Assim a probabilidade, que é um traço da induçãosó pode afetar a abdução indiretamente, depois que algum proces­

so dedutivo foi executado sobre a abdução para se estabelecer um

teste indutivo. Sendo colocada no papel de primeira forma de

inferência lógica na pesquisa científica, a abdução evoluiu de sim­

ples subsidiária da indução, papel. em que foi inicialrnenteconsi­derada por Peirce, para ocupar o lugar privilegiado no qual acriatividade ocorre na ciência. ,Ela realiza, por isso mesmo, a fLi­

são perfeita entre os aspectos lógicos e psicológicos do pr?cesso,engendrando as fundações hipotéticas sobre as quais a dedução e '

a indução devem então se construir.

Uma teoria da'ciência era, para Peirce, a maior conquista prá­

tica que a lógica poderia almejar. Nessa medida, a metodêutica éa análise lógica do que deve acontecer na pesquisa concebida como

práticada ciência. No exame do nascimento das'hipóteses , de suaseleção, nas considerações da economia da pesquisa, nos méto­

dos de construção teórica e·de ,teste comprobatório das hipóteses,a metodêutica se delineia como um mapa a ser seguido como guia

para o trajeto sempre em curso da pesquisa.

Ao integrar os três tipos de raciocínio e os métodos que lhessão próprios como estágios interdependentes do método científi­co, Peirce acabou também por fornecer um instrumental analítico

afiado para avaliaroutras propostas lógicas do método científico,tais como o indu tivisrno característico dos métodos ernpiricis-tas,

o método hipotético-dedutivo de Popper, o,anti-método de Feyera­bend etc. Sob o ponto de vista que Peirce nos fornece, o ernpiri­

cismo parece sempre incorrer em uma espécie de hipertrofia da

indução, do mesmo modo que o anarquismo de Feyerabend incor-'

re em urna hipertrofia da abdução. Já ao método hipotético-dedu­

tivo parece faltar uma perna. De fato, foi talo antagonismo de

Popper ao verificacionisrno ernpiricista do positivismo lógico que,

o papel da indução c?mo teste -da realidade empírica acabou por

ser minimizado no seu sistema.

Deve-se assinalar ainda que a interdependência dos três está­

gios da metodêutica peirceana não pode ser vista como uma lógi­

ca fixa, presente do mesmo modo em todas as ciências . Embora os

três estágios, abdutivo, dedutivo e indutivo, de que o-método científi­

co se constitui, devam sempre estar subjacentes a todos os proces­sos investigativos, pode haver a predominâ-ncia de um desses mé­todos sobre os outros em cada ciência. Assim, a matemática é,sem dúvida, dominantemente dedutiva, enquanto nas ciências

empíricas domina o método indutivo.- Evidentemente, nas artes,

assim como na interpretação psicanal ítica, no diagnóstico médi-:

co, na inspeção de crimes etc (ver SEBEOK'et al., 1993) o rnéto­do abdutivo reina soberano: Peirce estava ciente disso e chegou' á

afirmar que as variadas ciências (e até mesmo os seres humanos)podem ser diferenciadas umas das outras também pelo tipo deraciocínio e método que nelas predomina. Há assim ciências mais

p~oeminentementeindutivas, como as ciências classificatórias dazoologia, da botânica, por exemplo, enquanto outras ciências são

mais abdutivas. Quando distinguiu entre a abdução teórica e 'aabdução hipotética, Peirce localizou a astronomia e física pura no

124 Comunicação [, Pesquisa

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"a lógica indutiva evolui como a própria ciência. Daí o conhecimen­to científico se caracterizar sempre módulo a metodologia que lhe é

primeiro caso e a biologia e geologia no segundo, visto que nestas

não se pode agir voluntariamente sobre os objetos de observação.No Brasil, Sodré (2000b) está desenvolvendo a hipótese de que acomunicação deve ser urna ciência dominantemente abdutiva. .

De todo modo, nq método científico tout court, para Peirce,domina o método indutivo, não no sentido estreito e empiricistaem que esse método costuma ser compreendido, mas no sentido

aberto que Peirce lhe deu, sentido que foi emprestado pelo desen­volvimento do seu pragmatismo evolucionista à luz do qual aindução é aquele método que,no longo curso do tempo, tende a seautocorrigir. Isso quer dizer que, quando levadas suficientementelonge, incorporando a autocrítica que, aliás, depende da hetero­

crítica, as pesquisas tendem a se autocorrigir. Essa é a única certe­

za que se pode acalentar em relação ao método indutivo e, conse­

qüentemente, em relação à.ciência e à pesquisa: insistir, não de­sistir, abrir-se para o crítica que vem do outro, perseguir a verda­de, embora se saiba que verdade é aquilo que continuamente re­cuará. Daí que nossos esforços, mesmo sabendo que eles nãoserão jamais satisfeitos, têm de ser redobrados. Por isso, segundo

Peirce, a .ciên.cia consiste em distender o arco da verdade, com

atenção no olhar e energia no braço. Em suma, sem paixão, não há

ciência, ela não vinga, do mesmo modo que, sem esse mistério, oda paixão, que é sempre uma força estranha, não vingam muitasoutras coisas na vida.

A coincidência entre a concepção peirceana do método indutivo

como método tout court da ciência e as concepções de Newton daCosta (ibid.: 30, 184) são remarcáveis, quando este afirma, por

exemplo, que "a metodologia geral da ciência empírica confunde­se com os órgãos indutivos basilares, correlacionados às váriasdisciplinas fatuais", ou quando afirma que

127Lucia Santaella

contemporânea. A atividade racional, no domínio da ciência, con­

siste em nos conformarmos plenamente com nossas evidências e li­mitações, sempre seguindo os princípios metodológicos apropria­dos. A justificação de índole probabilística não nos assegura a ver­dade; porém se esta for alcançável, o único caminho para tanto é aciência, desde que assumamos atitude completamente racional".

7. As METODOLOGIAS ESPECÍFICAS DAS CIÊNCIAS

No pragmatismo evolucionista, de que o método peirceano daciência decorre, encontra-se a fundamentação para sua noção daciência como corpo vivo em incessante crescimento, do que seconclui que, para continuar viva, a ciência não pode ser identi­

ficada senão com pesquisa.

Peirce pretendeu que as etapas do método científico fossemprocedimentos apropriados a toda e qualquer pesquisa. Tanto quan­to posso ver, isso não significa que, em função desse método ge­ral, as ciências deixem de dispor de metodologias específicas,

decorrentes de técnicas particulares, criadas e manipuladas pelos

especialistas em cada área da ciência. O método científico, quenasce da interrelação da abdução, dedução e indução, advém deuma lógica universal que habita o coração das metodologias. Umcoração historicamente e localmente mutável. Trata-se de umalógica, portanto, que não anula, apenas subjaz, aos métodos e téc­

nicas específicas que cada ciência tem por função desenvolver e

transformar.Vê-se, com isso, o quanto é equivocado se impor um modelo

metodológico que é próprio de uma ciência sobre outra ou outras.Gerais são os procedimentos básicos que se fundamentam nos trêstipos universais de raciocínio. Entretanto, cada ciência configura

esses procedimentos de uma maneira que lhe é própria, desenvol­vendo metodologias específicas e relevantes para determinadas

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aplicações de acordo com necessidades que brotam dentro dela eque não podem ser impostas de fora . Quanto mais a prática cien­tífica se aproxima desse ideal, mais científica ela é, não se con­fundindo com meras encomendas burocráticas, administrativas,comerciais ou ideológicas que são muitas vezes equivocadamentechamadas de pesquisa científica.

A relação inseparável de uma base lógica universal para todas

as ciências, com as variações históricas e particulares de cada ciên­cia, explica porque, apesar da diversidade nos métodos das ciên­cias, há sempre constantes, regularidades, possibilidades de adap­tações criativas do método de uma ciência para outra. Enfim, ciên­cia é aquilo que os cientistas fazem e métodos nascem das teoriasque criam e de suas práticas. Isso não anula, ao contrário, só in­tensifica as exigências que essa prática lhes impõe, tais como asdo rigor, da coerência, da consistência, da ética, especialmente aética do intelecto, da profundidade, da responsabilidade na obten­ção dos resultados que prometem, e mais outros critérios formaisinternos e critérios externos da ciência que foram muito lucida­mente explicitados por Demo (1985: 30-42).

Distinção até certo ponto similar à que está acima exposta,entre dois níveis metodológicos - o nível lógico geral e o níveldas variações particulares no seio das ciências específicas - foireal izada por Lakatos e Marconi (1992: 106). As autoras chama­rarn de método de abordagem o nível de abstração mais elevada,dando como exemplos desses níveis o método indutivo, o deduti­

vo, o hipotético-dedutivo e o método dialético. Chamaram, então,de métodos de procedimento os métodos menos abstratos, tais comoo histórico, comparativo, funcionalista, estruturalista etc.

Também relativamente similar é a divisão apresentada porDemo (1985: 21-22, 52) da metodologia em duas vertentes maistípicas : de um lado, aquela que é derivada da teoria do conheci­mento que tem uma característica lógica e centra-se nos procedi­mentos lógicos do saber, "geralmente voltada para a questão da

causalidade, dos princípios formais da identidade, da dedução eda indução, da objetividade etc.". De outro lado, tem-se a verten­te voltada para a sociologia do conhecimento, que se refere aoscondicionamentos sociais e "que acentua o débito social da ciência".

Embora de uma perspectiva um pouco diferente, Lopes (1990:81) também propôs uma divisão da metodologia em dois níveis,quando empregou o termo metodologia da pesquisa "para indicara investigação ou teorização da prática da pesquisa, e metodologiana pesquisa para indicar o trabalho com os métodos empregados".Kaplan (1975: 21), Citado por Lopes, também usou a palavra "me­todologia", no sentido de uma metaciência, para indicar o estudo- descrição, explicação e justificação - dos métodos e não os pró­prios métodos. Entretanto, quando Lopes (ibid.: 81) definiu ametodologia .na pesquisa como "os métodos efetivamente usadosnuma pesquisa", isto é, "como um conjunto de decisões e opçõesparticulares que são feitas ao longo de um processo de investiga­ção", é preciso notar aqui que o conteúdo dos dois níveis quepropus não coincidem exatamente com o conteúdo dos dois níveispropostos por Lopes, diferença esta que passo a explicitar.

À luz da metodêutica de Peirce, o nível metodológico funda­mental estaria na interrelação da abdução, dedução e indução comoestágios do método científico, método este que é apropriado atoda e qualquer ciência. Ora, o desenvolvimento da ciência e amultiplicação quase assombrosa dos campos científicos e das teo­rias e métodos que foram criados neste século só vêm compro­

vando que sobre esse nível subjacente, fundamental, erigem-semétodos e técnicas particulares no interior não apenas de cada:ciência, mas das estratificações da pesquisa dentro de uma mesmaciência.

Para Peirce, cada ciência também se define pelo tipo de co­nhecimento que desenvolve. Assim, há ciências mais teoréticas,outras mais classificatórias, outras mais descritivas, enquanto ou­tras são mais dominantemente aplicadas. Tendo em vista o desdo-

128 Comunicação [, Pesquisa Lucia Santaella 129

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bramento de áreas e sub-áreas científicas no desenrolar deste sé­

culo, trabalhei, há alguns anos (SANTAELLA, 1992), na hipótesede que todas as "ciências tendem a se desenvol ver internamente

nesses quatro tipos de estra'tos: "(a) nomológico, relativo a suas

leis e conceitos; (b) classificatório, o estrato dos sistemas de elas­

sifi~axão dos objetos que estuda ;(c) o seu estrato descritivo doobjeto e (d) seu estrato aplicado ao objeto. Ora, cada um desses

estratos gera tipos de pesquisa e metodologias próprias . Essa hi­pótese deve, com muita probabilidade, se aplicar à área da comu­

nicação no estado da arte em que essa área se encontra hoje. As­

sim, os modelos e teorias da comunicação desenvolvem-se no es­

trato nornológico: classificações encontram-se, por exemplo, nos

níveis da comunicação humana estabelecidos por DeVito (1997):

intrapessoal, interpessoal, grupal, pública, de massa. Apresentam­

se, ainda como exemplo, nos níveis de análise da comunicação

que foram estabelecidos para a organização do Manual de Comu­nicação editado por Berger e Chaffee (1987): nível individual,

interpessoal, rede/organizacional e macro-social. No estrato descriti­

vo e aplicado, os exemplos.se perdem de vista. Evidentemente, com­

provar ou não essa hipótese depende de uma pesquisa específica.

Nas agências de fomento àpesquisa no Brasil, a comunicação

está situada estritamente na área das ciências sociais aplicadas.

Tendo em vista o levantamento das tradições de teorias e modelosda comunicação, realizado no primeiro capítulo, e a tentativa de

mapeamento da área, realizada no segundo capítulo, somos leva­

dos à conclusão de que uma tal situação é redutora e está defasada

em relação ao dese~volvimento da área e das perspectivas que ela

apresenta.

Vem do que foi acima exposto a diferença dos níveis metodoló­

gicos que proponho em relação aos que foram propostos por Lopes . .

O nível fundamental é geral ; universal, sustentado nas principais

classes de raciocínios ou argumentos. Demo (1985: 13) iniciou

seu livro com a constatação de que "regras lógicas do conheci-

mento são as mesmas" para todas as ciências, o que é uma outra

maneira de afirmar a existência de um nível metodológico geraltal como enunciei acima. Erigindo-se sobre esse nível subjacente,

surgem variados tipos de metodologias que dependem tanto do

estrato da ciência no qual se inserem, quanto das teorias, méto­

dos, procedimentos e técnicas que são relevantes às finalidades aque as pesquisas se destinam.

Assim sendo, o que Lopes chamou de metodologia da pesqui­sa corresponderia a esse segundo nível, enquanto que a metodolo­

gia na pesquisa, isto é, "decisões e opções particulares que são

feitas ao longo do processo de investigação", se incorporada à

minha proposta, teria de corresponder a um terceiro nível, especí­

fico de cada pesquisa como processo singular.

Conclusão: na base, tem-se o nível mais abstrato do método

científico em geral, no meio, os métodos particulares dos tipos de

ciências e dos estr~tos das ciências. Este nível apresenta uma cer­ta generalidade, pois métodos classificatórios, descritivos, explo­

ratórios, empíricos, experimentais e outros mais repetem-se de

modo relativamente similar em quaisquer ciências. Enfim, no ter­

ceiro nível, tem-se a interferência do pesquisador e de suas esco­

lhas frente às metodologias que sua área científica lhe apresenta e

às exigências que lhe faz o tipo específico de pesquisa que realiza.

Frente a isso, só se pode concluir que metodologias não são e

nem podem ser receituários ou instrumentações que se oferecempara serem aplicados a todos os campos, todos os assuntos e a

todos os problemas de pesquisa. Pesquisas e suas metodologias

exigem intimidade com a área na qual se pesquisa. Para realizar

uma pesquisa em comunicação, por exemplo, é necessário estu­

dar minimamente o desenvolvimento histórico da área, conhecer

o que os comunicólogos estão fazendo, inteirar-se de suas teorias,

familiarizar-se com os métodos que empregam e das diferentes situ­

ações em que os empregam, contribuir, através da competência que o

tempo e a dedicação trazem, com a transformação e o aperfeiçoa-

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130 Comunicação & Pesquisa "'1

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Lucia Santaella 131

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133

"Embora enfatizando o valor da criatividade, convém lembrar que a

pesquisa científica não pode ser fruto apenas da espontaneidade e

intuição do indivíduo, mas exige submissão tanto aos procedimen­

tos do método quanto aos recursos da técnica. O método é o cami­

nho a ser percorrido, demarcado, do começo ao fim, por fases ou

etapas. E como a pesquisa tem por objetivo um problema a ser resol­

vido, o método serve de guia para o estudo sistemático do enuncia­

do, compreensão e busca de solução do referido problema. Exami­

nando mais atentamente, o método da pesquisa científica não é outra

coisa do que a elaboração, consciente e organizada, d~s diversos

procedimentos que nos orientam para realizar o ato reflexivo, isto é, '

a operação discursiva de nossa mente",

Lucia Santaella

Sendo a metodologia o estudo dos métodos, cumpre definir oque é método. Rudio (1992: 15) nos fornece uma definição ampla

e justa, como se segue:

o exame de uma pequena amostra de livros sobre metodologiacientífica, só nas áreas das ciências sociais e psicologia, social oueducacional, sem nem tocarmos nas áreas das ciências formais ounaturais, já é suficiente para nos levar a algumas constatações. Hácertamente consenso metodológico nas pesquisas empíricas, nasexperimentais, estatísticas e quantitativas. A metodologia estatís­

tica, aliás, foi tão hegemônica durante algum tempo a ~o~to de terse tomado sinônimo de pesquisa. Entretanto, com a exceção des­ses tipos de métodos, não existe consenso, não obstante algumassimilaridades, sobre outras variadas espécies de métodos e de pes­quisa. Essa ausência de consenso só vem trazer mais munição paraás postulações enunciadas no tópico anterior de que asmetodologias das ciências são específicas, variando t~nto histori­camente quanto na passagem de uma ciência para a outra.

8. TIPOS DE MÉTODOS

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1

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Comunicação [,. Pesquisa132

mento desses métodos através de pesquisas próprias, enfim, tomar-seo membro de uma comunidade de pessoas que idealmente deveriamunir-se em tomo de um interesse comum: promover o crescimento ea excelência das pesquisas na área em que atuam.

Da multiplicidade potencial de metodologias resulta que, comexceção feita às pesquisas puramente dedutivas, das ciências for­mais, cujas regras são estritas, e as pesquisas quantitativas, esta­tísticas, cujos protocolos são precisos, não há um consenso naconsideração que os metodólogos fazem acerca da questão dométodo, particularmente nas ciências sociais e humanidades. Mashá consenso, e muito grande, nos procedimentos gerais que de­vem ser adotados para a realização de um projeto de pesquisa,conforme será explicitado no próximo capítulo.

No momento, e antes de entrarmos na floresta dos métodos,que será o assunto do próximo tópico, vale a pena recordar breve­mente, em um diagrama mental, o modo como sistematizei as ques­tões vistas até agora. A teoria dos sistemas cognitivos e conceituais,as teorias e filosofias da ciência consideram três esferas para osseus estudos: a esfera epistemológica, relativa às teorias do co­nhecimento, a esfera lógica, da qual decorre, à luz de Peirce, ummétodo geral, subjacente à diversidade das metodologias, e a es­fera metodológica. Esta última esfera, por 'sua vez, de acordo como que foi proposto, divide-se em três níveis: o nível lógico, geral efundamental, derivado da segunda esfera, nível subjacente a todasas metodologias específicas; o nível variável, relativo às especifi­

cidades das diversas ciências e, por fim, o nível da prática metodo­lógica, quando um método é atualizado, dentro de uma área científicaespecífica, em uma pesquisa particular.

------------------------------~r

, ~

"A despreocupação metodológica coincide com baixo nível acadêmi­

co, pois passa ao largo da discussão sobre modos de explicar, subs­

tituindo-a por expectativas ingênuas de evidências prévias. Nada

favorece mais o surgimento do discípulo "copiador" que a ignorân-­

cia metodológica",

Em razão disso, a falta de metodologias hegemônicas acaba

por acentuar a necessidade de orientadores competentes no acom­panhamento da pesquisa e o desenvolvimento da capacidade cria­tiva de escolhas e julgamentos, da ousadia na aplicação demetodologias mistas; integradas, complexas, metodologias estasque vêm se acentuando como uma tendência especialmente na áreade cornunlcação.vtendo em vista seu perfil interdisciplinar (ver

WOLF, 1987: 132, 140).

A tendência a urna maior variabilidade deve ser mesmo uma

marca das diferentes áreas das ciências humanas, pois, nas ciên­

cias formais, as regras de pesquisa devem ser estritas e, nas ciên­

cias da natureza, os protocolos de pesquisa são prescritivos, alémde que essas ciências são menos permeáveis às mudanças de vo­cabulário, discursos, episternes que afetam as ciências humanas(ver FOUCAULT, 1972, 1973), Também não há nas ciências hu­

marias um metavocabulário abrangente, capaz de absorver e orde­nar a variabilidade dos discursos, Essa variabilidade, de resto, acen­tuou-se 'nas últimas décadas do século XX, COI11 a chamada crise

das gran~es narrativas legitimadoras , conforme foi sobejamentetratada nos debates sobre pós-modernidade (ver especialmenteLYOTARD, 1979) ,

Contudo, isso não deve funcionar como álibi para a negligên­cia o~ preguiça metodológica na pesquisa, pois, assim como nãohá ciência sem pesquisa, 'não há pesquisa 'sem método, além deque, conforme nos diz Demo (1990: 24)

Passemos, pois, a urna breve exposição de LIm,a amostragem

da diversidade no tratamento dos métodos a partir de alguns auto­res selecionados, para que se possa, ao final, proceder a uma ten-:

tativa de sistematização dessa diversidade, quer dizer, tentar en­

contrar alguns princípios gerais que estão por trás das repetições

que aparecem na diversidade .Carvalho et al. (2000: 43-69), por exemplo, apresentaral~ o.que

chamaram de tendências metodológicas segundo um critériohistóri-co, No século XIX, o positivismo de Cornte e o materialismo históri­co-dialético de Marx coru sua concepção da realidade social a parti rde uma interpretação materialista da dialética hegeliana entr~.()u­

tras influências. No século XX, o neopositivisrno ou empirismo '"lógico e sua crença de que "haveria uma linguagem, a da ci ência,capaz de exprimir universalmente o que a experiência ,nos ofere­ce"; a fenomenologia de Husserl e sua postulação de que "o conhe­

cimento é o resultado da interação entr.e o que o sujeito observaeo sentido que ele fornece à coisa percebida"; o estruturalismo e' abusca das leis que presidem às estruturas dasmaisdiversas ordens. '

A seguir, os autoresapresentaram as tendências metodológicas

que se notabilizaram a partir da segunda metade do sé~ulo ,XX :, a"escola de Frankfurt corn sua crítica aguda contra a razão instru- '

mental alimentada pela sociedade capitalista; o grupo d?s expoen­tes da epistemologia contemporânea COI~ os férteis de?ates",'q'ue '

geraram entre si e a partir de suas obras: POPl?er, Kuhn , Fe~erabende Lakatos. Por fi 111 as duas últimas tendências, levantadas' pelos, \ " ..

autores, são, de um lado, o pragmatisrno. ique começa em Pei.l:ce',passa por W. Jarnes, Dewey, estendendo-se até Rorty no presente .

De outro lado, o construcionismq, que, a partir de seus fundado­res, M. Scheler e K. Mannheim, levando em conta o papel estru­

turador operado pela linguagem , "considera que tanto o sujeito'como o objeto do conhecimento são construções sociais e históri-

cas" (Para um panorama dos paradigmas históricos da pesquisa,ver também CHIZZOTTI, 1991: 11-16),

J

135Lucia Santaella

( ,

J;i

Comunicação [; P~squisa134'.I.•.'•••'.••••••••.•'

•'.••.'••••••••••'.•

Segundo Demo (1985: 21-22, 52), das duas vertentes método­

lógicas mais típicas por êle estabelecidas, aquela que é derivadada teoria do conhecimento e aquela que se volta para a sociologiado conhecimento, resultam os principais métodos de pesquisa. .Antes de tudo, o método dialético, que o autor privilegia por sero

mais correto para as ciências sociais, pois, "sem deixar de ser ló­

gico, demonstra sensibilidade pela face social dos problemas".

Mais predominante nos países do Terceiro Mundo, por "prestar­

se melhor a compreender suas contradições e alicerçar o desejo

de mudança histórica" (ibid .: 85), o método dialético parte dos

fundamentos propostos por Marx (1977), especialmente nas suas

Contribuições à Crítica da Economia Política. O pressuposto fun­damental desse método repousa na crença de que "toda formação

social é suficientemente contraditória para ser historicamente su­perável" (ibid.: 86).

Os outros métodos, para Demo, são: o empirismo, o positivismo,

o estruturalismo, e o sistemismo. O empirismo originou-se da busca

de superação da especulação teórica ern prol da observação em­

pírica, podendo incluir o teste experimental e a mensuração quan-.

titativa. Segundo Fiske (1990: 135), o método emp írico, baseado

no raciocínio indutivo, na sua versão experimental, apresenta os

seguintes propósitos: (a) colecionar e categorizar fatos objetivos­

ou dados; (b) levantar hipóteses para explicá-los; (c) eliminar, tanto

quanto possível, qualquer interferência de elemento humano nes­

se processo; (d) construir métodos experimen tais para testar e pro-

var ou refutar a confiabi 1iade dos dados e das hipóteses. .

Quando o método empírico é aplicado às ciências sociais,' bus­

ca-se . reproduzir condições ' simi lares às do laboratório. Não

obstante as críticas que podem ser feitas ao ' empirismo, Demo

(ibid.: 102) alertou para o fato de que suas metodolcgias criaram ·

inúmeras técnicas de c.oleta ede mensuração dos dados, acumula­

ram fatos e dados, trouxeram para as ciências sociais o uso dacomputação e assim por diante".

]36 Comunicação [, Pesquisa

1

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..;-... .~

Lucia Santaella. ,.."

Acreditando na objetividade e neutralidade do conhecimento,

e no estabelecimento da verdade como algo factível e definitivo, ..,

as metodofogiaspositivistas' propõem' paratodas as ciências are­

produçãodo"modelo'das ciências exatas e naturais. Urna vez gu~

o método' das' Ciências naturais, por excelência, é o método expe­rimental, baseado na observação, experimentação e rnensuração,essa seqüência e suas exigências são, para o positivismo, as ú1}i­

cas cientificamente aceitáveis. Nessa medida, positivismo e ernpi­

risrno , na maior parte das vezes, se unem sob vários aspectos;

O estruturalismo, 'por sua vez, disseminado entre vária~ das

ciências sociais, na psicanálise e até mesmo na filosofia, nasceu'

das des.cobertas lingüísticas de Saussure sobre a língua c~mo.urrisistema de 'lei s estruturadas de acordo com prescrições internas.

Já o sistemismo se alimen ta dateoria dos sistemas e deconcel?- .

ções funcionalistas. Sob sua ótica, todo fenômeno organizativo é

um sistema de partes concatenadas que mantêm e recobram o equi­

líbrio graças à retroalimentação e dinamismo de recomposição

dos seus elementos.

Tomando por base a divisão de.Lakatos e Marconi (1992) de

dois níveis metodológicos, o dos métodos de abordagem e o dos

métodos deprocedimento, Bastos (1999: 73-83) apresentou a des­

crição 'dos diversos 'métodos inclusos nessa divisão. Assim, .os

métodos de abordagem, conforme o tipo de raciocínio emprega­

do, são: oindutivo, dedutivo, hipotético-dedutivo e o dialético. O

indutivo é aquele que pa-rte de premissas particulares ern direção

a premissas gerais e cuja aproximação dos fenômenos caminha,

assim, para planos cada vez mais gerais. O dedutivo parte de pre­

missas -gerais, teorias e leis, para predizer a ocorrência dos fenô-. - ...

meno~ particulares. Iniciando-se pela percepção de uma lacunanos conhecimentos, o métodohipotético-dedutivo levanta uma

hipótese acerca dessa lacuna e através da inferência dedutiva testa

a predição de f~nô~e!1?s abrangidos pela hipótese. O· dialético,

com? já visto é\cima~ penetra nos fenômenos através de sua ação.

••••••.;••••••••.)e';••••••••••••••.'•

,..: '

recíproca, da contradição inerente a todo fenômeno e da mudança

dialética que ocorre na sociedade e na natureza. Nessa medida,

esse método problernatiza o conhecimento ·"den tro de um contí­

nuo em constantes mudanças" e inacabarnento "que contém um

todo que abarca contrários em incessantes conflitos". (LAKAT.OSe MARCONI, ibid.: 106, BASrOS, ibid.: 75-76) ,

Os métodos de procedimento, conforme estão explicitados em

Lakatos e Marconi (1991) e em Bastos (ibid) são os seguintes:

histórico , estatístico, estruturalista, funcionalista, comparativo ,

etnográfico, tipológico, monográfico ou estudo de caso etc. Nes­

se nível, a diversidade impera e as escolhas só podem ser feitas

tendo em vista a adequação do método ao tipo de problema que a

pesquisa visa trabalhar.

Apesar da diversidade dos métodos até agora apresentados, há

certas repetições . A meu ver, essas repetições se dão porque há

princípios operando nas classificações que os autores elaboram .

Há, assim, uma quase unanimidade na consideração de dois ní­

veis metodológicos, o nível lógico e o nível das especificidades .

Essa divisão está perfeitamente de acordo com a hipótese desenvol­

vida nos tópicos anteriores de que a lógica, com seu estudo dos

. tipos de raciocínio utilizados pelas inteligências científicas , habi­

ta o coração das metodologias. Do nível propriamente lógico, der-i­

vam os métodos indutivo, dedutivo, hipotético-dedutivo e o dialéti­

co, embora seja discutível se a dialética é, de fato , um tipo de lógica.

As regularidades no nível das especificidades se apoiam em

outros tipos de princípios, entre os quais, do mais abstrato para o

mais concreto, destacam-se: (a) sistemas e correntes filosóficas

que trabalham com os fundamentos do conhecimento, mesmo sem

estarem diretamente lidando com metodologia, acabam por gerar

métodos de pesquisa. Esse é o caso, por exemplo, da fenome- ;

nologia. (b) Métodos podem também nascer dos procedimentos

gerais que são adotados por 11111a deter:nli nada área de saber ou

disciplina. É o caso dos métodos histórico, antropológico e etno-

9. TIPOS DE PESQUISA

gráfico, por exemplo. (c) Métodos podem também surgir a partir

de teorias que têm um alto grau de generalidade, garantindo assim

sua aplicabilidade a uma multiplicidade de fenômenos. É o caso

do funcionalismo, do sisternisrno, como é o caso do estruturalis­

1110, e também da maioria das correntes da serni ótica, aquelas que

derivam do estruturalismo. (d) Há métodos que nascem a partir de

teorias específicas, através da redefinição operacional dos con­

ceitos teóricos tendo em vista sua aplicação a fenômenos empíricos.

(e) Há ainda métodos analíticos que advêrn do exercício sistema­

tico de operações mentais como a abstração, por exemplo,

grandemente responsável pelo método classificatório, tipológico,

e a analogia, responsável pelo método comparatista.

Dos tipos de métodos derivam muitos dos tipos de pesquisa.

Para a explicitação destes últimos, antes de tudo, deve ser consi­

derado que, embora as definições de pesquisa coloquem ênfase

na referência à realidade empírica do conhecimentoque a pesqui­

sa busca atingir, existem pesquisas que n.ão têm nada a ver, direta­

mente, com a realidade empírica. É o caso das ciências formais, ' .

como é o caso das pesquisas teóricas que têm por função preen­

cher lacunas no conhecimento, desvendar e construir quadros .

conceituais de referência . Há pesquisas cuja função poderia" estar ­

exclusivamente na discussãode UITI conceito controverso dentro

de um~ determinada área de conhecimento: o conceito de repre­

sentação ou o conceito de consciência, nas ciências cognitivas',

por exemplo, ou o próprio conceito de comunicação, na área de

comunicação, um conceito que, aliás, está longe de ser consensL~al.'

Dessa distinção en.tre pesquisas teóricas e pesquisas que vi­

sarn a um conhecimento referenciado à realidade elllpírica.advérn

a primeira grande divisão. dos tipos de pesquisa: fundamentale

aplicada. O que mobiliza a mente humana; n.os dizem ,L~ v i l1 e ' e: .

139Lucia Santaella

1

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Comunicação f:, .· Pesquisa138

••••••••••••••••.).'••••••••••••••••••

Diorme (1999: 85) são problemas, a busca de um maior entendi­

ment? das questões com que a realidade nos desafia ou a busca de '

soluções para problemas nela existentes. Para chegar aí, a pesqui­

sa é o meio mais apropriado . Para melhor conhecer, o caminho é a

pesquisa fundamental que tem por função aumentar a soma de sa- ·

beres disponíveis, saberes esses que, em algum momento, nunca

se sabe quando, serão utilizados para a solução deproblemas empí­

ricos. A história da ciência está cheia de exemplos dessa espécie.

Nessa medida, a pesquisa fundamental tem por função criar qua­

dros teóricos de referência e mantê-los, tanto quanto possível, li­

vres dos malententidos e das anemias que a impaciência e negligên­

cia teóricas costumam.produzir. Sem bons quadros teóricos de re­

ferência, pesquisas aplicadas ficam debilitadas, de modoque, na

pesquisa, não pode haver nada mais prático do que uma boa teoria.

A motivação principal das pesquisas aplicadas , por seu lado,

está na sua contribuição para resolver um problema, Para tal, ela

aplicará conhecimentos já disponíveis, mas das aplicações P9d,em

resultar não apenas a resolução do problema que a motivou, mas

também a ampliação da compreensão que se tem do problema; 0U

ainda a sugestão de novas questões a serem investigadas: É em ra­

zão disso que os verdadei ros pesquisadores não fazem pesquisa

ad hoc, mas a faZeITI pela vida afora . O conhecimento está em um

continuum cuja origem ecujo fim serão eternamente desconhecidos .

Do final do século passado até meados do século XX, privile­

giando amedição de regularidades constantes nos fenômenos, o

método experimental constituiu-se no modelo oficial de pesquisa,

inclusive nas ciências humanas. Tudo que não se enquadrasse nesse

modelo era repudiado como mero balbucio especulativo . As exi- .

gências e características desse tipo de pesquisa são defi nidas com

rnu ita precisão, conformenos informam Laville e Dionne (1999: :

139), Rudio (1992: 55-69) e Chizzotti (1991: 25-74). '

Os pressupostos da pesquisa experimental 'são positivistas,

segundo os quais afirmações genéricas devem ser substituídas por

conhecimentos rigosoramente articulados.xubmetidos ao contro­

le de verificações empíricas e comprovados por meiode técnicas

precisas de controle. As certezas posi ti vistas vêm da suposição de

quea natureza é uniforme, logicamente organizada e funcional­rnentedeterrninada, Porque o mundo é regido por leis invariáveise constantes, elas podem ser apreendidas, verificadas eprevistasatravés da pesquisa metódica. '

'E m termos gerais, partindo da análise de um fenômeno deii-'

mitado, a pesquisa experimental formula hipóteses prévias de ver'- '

dade e métodos explícitos de verificação, submete o 'fenômeno' àexperimentação em condições de' controle, cuidando da validade

interna das hipóteses para extrair leis, fazer generalizaçõeseela­borar teorias explicativas do fenômeno observado . Não obstante

tenha traçoscomuns com as pesquisas empíricas, as experirnen­

tais não apenas pressupõem uma base empírica, fundada em ob­

servações e no estudo de fatos particulares rumo à generalização,

mas também tomam a experimentação como condição sine qua .non do conhecimento. ' . ,

Não existe pesquisa experimental sem experimento, isto é, a

manipulação deliberada de um aspecto da realidade, -de ntro dêcondições anteriormente definidas, a fim de observar sé certos

efeitos são produzidos. Desse modo, o experimento 'nã'o podeser

confundido com a mera observação ou com experiência. O expé­

rimento é Lima situação criada ~m laboratório para observar 'sob

controle a relação entre fenômenos , Controle quer dizer esforços

para se eliminar ou reduzir os erros de observação; Por lsso.ra

observação tem de ser isolada de -influências capazes'de nela' i"n­tervir. 'A s situações podem também ser criadas fora de lâbo'ràtó- "

rio, mas técnicas rigorosas têm çie ser utilizadas para exercer 60n-'

~role sobre as variáveis que vão ser observadas. .

Para ser experimental, urna pesquisa deve visar a demonstrar .

uma relação de causa e efeito entre duas variáveis. Essa dernoris­

tração apoia-se na atuação do pesquisador sobre a variável inde-

140 Comunicação [, Pesquisa

III

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Lucia-Santaelia 141 -­.)••••••.'•.'•••.''..'.'•••.'•.'••••.,'.;•.'.'••~i '

pendente associada à causa para, em seguida, medir os efeitos

engendrados no plano da variável dependente. O termo variáveltem origem na matemática, onde serve para designar uma quantida­

de que pode tomar diversos valores. Na pesquisa, a variável se

refere a alguma propriedade passível de observação e mensuração,de um determinado fenômenoque pode tomar diferentes valores.Assim, qualquer coisa que pode assumir mais do que um valor,que pode variar, por exemplo, idade, religião, habilidade comuni­cativa, tipo de amor etc. é uma variável. As variáveis dividem-se

em independentes e dependentes. As primeiras funcionam como

causas e as segundas como efeito. Por exemplo, pode-se estruturaruma pesquisa experimental para verificar se aluno estudioso (va­riável independente) é aluno que sabe (variável dependente).

Com suas variáveis mensuráveis, seu recurso à estatística emuma experiência provocada na qual se exerce um controle cerradosobre suas condições, a pesquisa experimental é uma construção

do saber muito particular, afirmaram LavilIe e Dionne (ibid.: 139),construção esta fortemente marcada pelas ciências naturais. Nasciências humanas, entretanto, são raros os trabalhos que podemrespeitar seus cânones estritos, pois seres humanos não podem sermanipulados como partículas de matéria ou ratos de laboratório.

Além disso, sem desmerecer a riqueza dos instrumentos materná­ticos e estatísticos, a maior parte dos fenômenos humanos não podeser medida sem perder sua riqueza, nem a causalidade linear das va­riáveis pode dar conta de sua complexidade.

Entretanto, foram descobertas que se processaram no interiordas ciências ditas duras que precipitaram a crise da hegemonia

das pesquisas experimentais nas ciências humanas . O desenvolvi­

mento tanto da física quanto da matemática, no século XX, foi

cada vez mais demolindo as certezas do cientificismo e as crenças

na infalibilidade da ciência, evidenciando que previsões "absolu­tas são inviáveis. Com isso, a validade das interpretações foramsendo recuperadas (CHIZZOTTI, ibid.: 78) ." Isso não significa que

a pesquisa experimental tenha perdido sua validade, pois, além decontinuar sendo amplamente empregada, com seus rigores, elaserve de referência para se estabelecer categorias de pesquisa e

para julgar seus critérios. Enfim, funcionam como um modelo do

qual as pesquisas podem se afastar através de adaptações, sem per­der, contudo, as exigências das regras do jogo (ALVES, 1988).

Surgiram, a partir disso, perfeitamente legitimados, outros ti­pos de pesquisa que Laville e Dionne (ibid.: 139) chamaram dequase-experimentais e não-experimentais. Apesar da tradiçãoempírica, na sua versão quantitativa e mesmo experimental, do­

minante em toda a tradição da communication research, nos Esta­dos Unidos, Bavelas (1995: 56) alertou para o fato de que grandeparte dessas pesquisas são quase-experimentais, visto que, na co­municação, as variáveis-chave, como as características pessoaisdo ser humano, não são manipuláveis. Dentro das pesquisas não­

experimentais cabe uma grande massa de sub-categorias.

Mais comumente aceita, entretanto, tem sido a divisão das pes­quisas em quantitativas, quando usam do recurso da estatística, epesquisas qualitativas. Estas últimas, segundo Chizzotti (ibid.: 9),abrigam um grande número de divisões e subdivisões que, embo­ra diversas, unem-se na oposição ao modelo experimental e no

pressuposto de que há uma relação dinâmica, uma interdependên­

cia entre o mundo real, o objeto da pesquisa e a subjetividade dosujeito. Enquanto o objeto deixa de ser tomado como um dado inertee neutro, o sujeito é considerado como parte integrante do processode conhecimento, atribuindo significados àquilo que pesquisa.

A abertura que a pesquisa qualitativa permite não pode nos

levar a supor que, com ela, deixem de existir as exigências e crité­

rios que devem regular uma pesquisa. Embora com características

próprias, as pesquisas qualitativas também obedecem a certos pro­

tocolos, tais como a delimitação e formulação claras de um pro­

blema, sua inserção em um quadro teórico de referência, a coletaescrupulosa de dados, a observação, as entrevistas, quando neces-

••••

•••••••••••••••.-••••••••••

142 Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella 143

144 Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella 145 •sárias, a determinação de um método, a análise dos dados, o testedas hipóteses, a necessidade de generalização das conclusões etc.Enfim, o recurso ao qualitativo não pode servir para o pesquisa­dor se abrigar confortavelmente na rejeição aos métodos com adesculpa de que estes são rígidos e castradores da inspiração cria­tiva. Na pesquisa, sem método, inspiração é mito, como o é naprópria arte, pois esta também se submete a métodos que lhe sãomuito próprios.

É preciso considerar neste ponto que não há um consenso emrelação ao sentido que se pode dar à pesquisa qualitativa. Há umsentido amplo, conforme foi discutido acima, e um sentido maisestreito. No sentido estreito, a pesquisa qualitativa é tomada ape­nas como uma parte da pesquisa quantitativa, aquela relativa àanálise de conteúdo. De acordo com Laville e Dionne (ibid.: 225),até os anos 70, a análise do discurso manifesto, colhido através dedocumentos, de questionários, entrevistas, etc., realizada pela pes­quisa quantitativa, privilegiava os cálculos de freqüência dos ter­mos e das expressões utilizados no discurso. Uma vez que essaabordagem não costumava render os frutos esperados, o domínioe as modalidades do que se chamava de análise de conteúdo am­pliaram-se, absorvendo abordagens qualitativas, quer dizer, inter­

pretativas, das unidades de sentido, das relações entre elas e deque delas emana. Não obstante esse sentido estrito, a pesquisaqualitativa acabou por desenvolver autonomia própria, podendose referir a todas as pesquisas que privilegiam a interpretação dos

dados, em lugar de sua mensuração.Além da pesquisa experimental, Chizzotti (ibid.: 27) apresen­

tou o seguinte quadro de tipos de pesquisas: a primeira divisão,conforme já foi discutida acima, entre pesquisa teórica ou funda­mentaI e pesquisa aplicada. Então, a pesquisa descritiva, que serestringe à descrição dos fatos; a analítica, que faz análises interpre­

tativas dos dados e extrai conclusões; a quantitativa, assim cha­mada devido ao suporte em medidas e cálculos mensuráveis que

utiliza; a qualitativa, que ressalta as significações que estão conti­das nos atos e práticas; a nomotética, que tem o intuito de extrairas leis (noinos) da regularidade e da ocorrência dos fatos observa­dos para generalizar, Ainda segundo Chizzotti, as pesquisas analíti­cas podem ser subdivididas de acordo com o método de aborda­gem analítica que utilizam: comparativa, histórica, funcional, es­trutural, sistêmica, dialética. Podem ainda ser classificadas de acor­do com seus objetivos, por exemplo, a pesquisa clínica, que estu­da determinados casos individuais, visando umjulgamento e umaprescrição, e a pesquisa-intervenção, que se baseia na relação par­ticipante do processo de análise e mudança psicossociológica.

Para Rudio (ibid.: 56-60), as pesquisas se dividem em duasgrandes classes: experimentais edescritivas. Estas últimas podem,então, aparecer sob diferentes formas. Abrangendo uma faixa muitoextensa de investigação, há a pesquisa de opinião ou de atitude,que visa saber que pontos de vista, atitudes e preferências as pes­soas têm a respeito de algo. A pesquisa motivacional visa saber asrazões ocultas ou inconscientes que levam as pessoas a fazer umadeterminada coisa, por exemplo, consumir um certo produto. Oestudo de caso se volta para indivíduos, grupos ou situações parti­culares para se realizar uma indagação em profundidade que pos­sa ser tomada como exemplar. A pesquisa para análise de trabalhobusca identificar deficiências, elaborar programas de capacitação,distribuir tarefas, determinar normas etc. A pesquisa documentalexamina documentos a fim de poder comparar usos e costumes,

tendências, diferenças etc. A pesquisa histórica se volta para o .passado, buscando as linhas de força que movem os acontecimentos.

DIria outra divisão dos tipos de pesquisas e os .procedirnentosnecessários para realizá-las foram apresentados por Demo (1985:23-26): a teórica, a metodológica, a empírica e a prática. A teóri­ca coincide em alguns pontos com a que foi acima chamada defundamental. A metodológica se refere à reflexão sobre os méto­dos que direcionam a pesquisa científica, os modos de pesquisar,

••••

a problematização das vias do conhecimento, a "construção de

propedêutica da descoberta da realidade". O cultivo de uma atitu­de típica diante da realidade, nos diz Demo, isto é, "da atitude da

dúvida, de crítica, de indagação rodeada de cuidados para não

sermos ingênuos, crédulos, apressados" é questão fundamental­

mente metodológica. A falta de reflexão bem informada sobre ela

redunda em um tipo de mediocridade científica manifesta na cre­

dulidade em evidências dadas .A pesquisa empírica dirige-se para "a face experimental e

observável dos fenômenos", manipulando fatos e dados e procu­rando traduzir os resultados em dimensões mensuráveis, sendo,

por isso mesmo, na medida do possível, quantitativa. Para Demo

(ibid.: ?5), mesmo que não coincida com o mais relevante da rea­

lidade, esse tipo de pesquisa trouxe para as ciências humanas acontribuição inestimável do "compromisso com afirmações con­troláveis, contra especulações perdidas" ou divagações sem fun­

damento, .M as uma vez que aquilo que é mais relevante não se

manifesta à primeira vista, havendo, além do mais, muitas dimen­

sõesdos fenômenos que são refratárias à mensuração, a dedica­

ção .empírica não pode se restringir ao nível superficial, sempremais fácil de ser mensurado. '

A pesquisa prática se realiza através do teste prático das idéiase reflexões teóricas. Vale aqui, portanto, a inversão do postulado

acima formulado sobre a teoria: nada melhor para a teoria do que

uma boa prática, As chamadas pesquisa-ação e pesquisa-interven­

ção, que têm por objetivo intervir na realidade, também se enqua­

dram na categoria de pesquisa prática.Numa visão ampliada da pesquisa extensiva a trabalhos uni­

versit ários em geral, baseando-se em Andrade (1993, 1995), Bas­

tos (1999:,64,-73) apres.entou uma classificação detalhada dos ti­

v posobásicos de pes9~isa. Para os autores, os tipos de pesquisa se

dividemde acordo com (a) sua natureza, (b) os seus objetivos, (c)os seus procedimentos e (d) o seu objeto.

Quanto à sua natureza, as pesquisas se dividem em trabalho

científico original e não original. Quanto aos objetivos, a pesqui­sa pode ser exploratória, descritiva ou explicativa. A exploratória

é uma espécie de prévia da pesquisa que tem por finalidade am- '

pliar as informações do pesquisador sobre o assunto de sua pes­

quisa, tendo em vista seu aprimoramento rumo à elaboração de

um projeto de pesquisa. A descritiva limita-se a descrever, anali­

sar e classificar fatos, sem que o pesquisador neles interfira. Aexplicativa busca fundamentalmente o porquê das coisas. Quantoaos procedimentos, as pesquisas recorrem a fontes de papel ou afontes de pessoas. Quanto ao objeto, a pesquisa pode ser biblio­

gráfica, de laboratório ou de campo. Nesta última, a coleta de

dados é real izada em campo, quer dizer, os dados são coletados

no local onde se dão os fenômenos pesquisados.Especificamente na área de comunicação, DeVito (1997: 60,

147, 199, 228) dividiu as pesquisas em três grandes classes, dasquais forneceu exemplares como ilustração: a descritiva, ahistóri­

co-crítica e a experimental. A descritiva tem por propósito descre­

ver algo: comportamentos, atitudes, valores etc. Pesquisas descri­

tivas podem se realizar em trabalhos de campo, através da obser­vação sistemática ou por meio da construção de panoramas sobreum certo assunto. A pesquisa histórico-crítica tenta reconstruir opassado para melhor compreender os fenômenos. Ela pode se reali­zar através de vários tipos de documentos: livros, jornais, transcri­

ções, vídeos etc. A definição dada para a pesquisa experimental não

difere muito da apresentação que dela foi feita mais acima.Até os anos 70, as pesquisas em comunicação ficaram dividi­

das nos campos antagônicos da pesquisa empírica, presente nosestudos de mass communication dos Estados Unidos, e da pesqui- '

sa crítica, baseada especialmente nos escritos da Escola de Frankfurt.

Nos anos 70, essa oposição ficou mais tensionada pela ascenç~o

dos modelos de comunicação, especialmente os semióticos, como

norteadores da pesquisa. A multipli.cação de métodos e aborda-

•••e

•••••••;e••••e•••••••e•••••

146 Comunicação [, Pesquisa Lucia Santaella 147

10. PROCEDIMENTOS, TÉCNICAS E INSTRUMENTOS

•I

149Lucia Santaella

próprios de observação. Quantoà participação do observador, aobservação pode ser não participante, quando não há envolvimen­to do observador, ou participante, quando o observador se incorpo­ra ao grupo pesquisado. Quanto ao número de observadores, podehaver observação individual ou em equipe. Quanto ao local daobservação, esta pode se dar em campo ou em laboratório, En­quanto técnica de atuação na realidade, a observação se caracteri­za como militante (BARROS e LEHFELD, 1991: 54-55). Há ain­da a observação documental, que se reporta ao uso de bibliotecas.

As técnicas envolvem também a definição da população eamostragem, o controle das variáveis, o instrumento de pesquisa eas técnicas estatísticas. O campo de observação, as unidades deobservação e variáveis devem ser descritas em todos os seus itenscomo se segue: população e suas características; seleção da am?s­tra, que pode ser não-probabilística ou probabilística. A nãoprobabilística se subdivide em amostra acidental, por quotas e in­tencional. A probabilística se subdivide em causal simples, causalestratificada e amostragem por agrupamento. Envolvem ainda adeterminação das variáveis que serão controladas. Então, a defi-nição dos instrumentos, das hipóteses estatísticas que serão utili­zadas, como serão codificados os dados obtidos e como serão fei­tas as tabelas (ver RUDIO, 1992).

A coleta de dados também se faz a partir de uma série de prescri­ções, cujos instrumentos mais usados são os questionários, os for­mulários e as entrevistas que' podem ser estruturadas, padroniza­

das, contendo perguntas que seguem um roteiro pré-estabelecido,ou não estruturadas, despadronizadas, consistindo de uma conver- :sa informal, alimentada por perguntas abertas. Esses instrumentossão usados quando informações não podem ser obtidas por outrosmeios. A interpretação dos dados não é menos baseada em técni-'cas do que os demais passos da pesquisa. Ela implica em classifi­

cação e categorização dos dados, processo de codificação, repre­sentação numérica dos dados e técnicas de análise de conteúdo.

Comunicação [, Pesquisa148

gens e a busca por metodologias mistas e integradas, a partir dosanos 80, acabaram por tornar essas oposições e tensões obsoletas.

Para finalizar este tópico, cumpre chamar atenção para o mo­delo de pesquisa para a comunicação que foi elaborado por Lopes(1990), modelo esse para ser aplicado tanto à leitura ou análise dapequisajá feita, como à pesquisa que se está fazendo. Por se tratarde um modelo aberto e indicador das fases implicadas pela pes­quisa, ele faz uma ponte entre este capítulo sobre os tipos de pes­quisa e o próximo capítulo sobre os passos que a elaboração deum projeto de pesquisa deve seguir. Lopes dividiu seu modelo emquatro instâncias: (a) a instância epistemológica; (b) a instânciateórica, que inclui a formulação teórica do objeto e a explicitaçãoconceitual; (c) a instância metódica, que inclui a exposição e acausação e (d) a instância técnica, que se subdivide em: técnicasde observação, técnicas de seleção e técnicas de operacionalização.

Via de regra, os tipos de métodos são definidores dos tipos depesquisa. Métodos incluem procedimentos, técnicas e instrumen­tos, mas não se confundem com eles, pois estes são partes do mé­todo. Em cada uma das fases do método, o pesquisador deve usarcertos recursos que se constituem em procedimentos técnicos,como seleção da amostra, construção dos instrumentos da pesqui­sa etc. A fase da análise e interpretação dos dados também impli­ca técnicas próprias.

Nas pesquisas experimentais, procedimentos, técnicas e ins­trumentos são muito precisamente definidos .. Envolvem técnicasde observação pois, quando sistematizada, planejada e submetidaa controles de objetividade, a observação pode ser consideradacientífica. Assim, quanto à sua estruturação, a observação podeser assistemática, sem planejamento prévio ou sistemática, que éplanejada, estruturada, controlada, utilizando-se de instrumentos

Aí estão sintetizadas as exigências técnicas que as pesquisas

quantitativas prescrevem. Quando passamos do quantitativo parao qualitativo, isso não quer dizer que as exigências devam ser

abandonadas. Significa apenas que as prescrições passam a ad­quirir feições mais imprecisas de modo a abraçar o universo corn­plexo e ambíguo de tudo aquilo que não pode ser mensurado.

••

•••••••••­••••e•ti)•e.'••••

150 Comunicação & Pesquisa

o PROJETO DE PESQUISAE SEUS PASSOS

Este capítulo será dedicado ãs orientações para se elaborar umprojeto de pesquisa. Há uma farta bibliografia sobre isso e toda

ela é bastante consensual quanto aos tópicos que uma tal elabora­

ção deve considerar e aos passos que devem ser seguidos para que

ela seja bem sucedida. É nesse ponto que toda pesquisa começa:pela elaboração de seu projeto. Sem isso, a pesquisa já estariacomprometida de saída, pois seria o mesmo que fazer uma via­gem sem conhecimento de seu caminho. Iniciar uma pesquisa semprojeto é apostar alto demais na improvisação, além de revelar

ignorância quanto aos limites que a improvisação apresenta. Isso,

se não forem mencionadas as confusões, inseguranças, ingenui­dades, dispêndio temporal, esforços e recursos mal gastos em queuma tal aventura incorreria.

Um mau projeto não é muito diferente da ausência de projeto.

Isso explica por que tantas pesquisas começam sem terminar, ou

por que terminam mal. Sem planejamento rigoroso, mesmoquan­

do consegue realizar a etapa da coleta de dados, o investigador severá perdido em um cipoal, em um emaranhado de dados, semsaber c,omo analisá-los e interpretá-los por desconhecer seu signi­ficado e importância no contexto maior de um problema bem de-

------------------------------------.marcado, de hipóteses apropriadamente formuladas e dos objeti­

. vos que uma pesquisa visa atingir.a projeto funciona como uma visão antecipada, um planeja­

mento dos passos que serão dados pela pesquisa. Churchman(1971: 190, apud R UDIO, ibid.: 45) nos diz que "planejar signifi­

ca traçar um curso de ação que podemos seguir para que nos leve

às nossas finalidades desejadas". Isso não deve.ser entendido ne­

cessariamente como ausência de criatividade e fechamento paraas surpresas do caminho, pois quanto mais o curso de uma ação

estiver bem planejado, mais equipados estaremos para reconhecere lidar com o inesperado, enquanto que, sem planos, via de regra, nos

perdemos nas brumas confusas de um jogo sem regras.Projetar significa, portanto, antevere metodizar as etapas ou

fases para a operacionalização de um trabalho. Qualquer trabalhohumano é processo explícita ou implicitamente projetado. A es­pecialização do trabalho científico exige a construção prévia de

um instrumento técnico que conduza a ações orientadas para umfim e sustentadas sobre uma base de recursos humanos, técnicos,

materiais e financeiros. Esse 'instrumento técnico é o projeto de

pesquisa. Sua elaboração em forma acabada não deve, contudo,ser intimidante a ponto de paralizar a flexibilidade do pesquisa­dor para se adaptar a possíveis mudanças que podem surgir, e quase

sempre surgem, no decorrer da execução de uma pesquisa. Quan­

do o projeto se coloca em ato, no processo de execução, apare­

cem os momentos de fertilidade em que brotam eventuais desco­

bertas de dados não previstos, junto com o aprofundamento dasidéias iniciais.

Como tal, o projeto é apenas uma das etapas da pesquisa. Eleserve de guia para a execução propriamente dita e esta, por sua

vez, deve ser seguida de sua apresentação em forma comunicável,na imensa maioria das vezes, através da escrita. Por isso mesmo,

Peirce colocou no terceiro ramo da serniótica, junto com a metodêu­tica, a retórica especulativa, isto é, o estudo da eficácia comunica-

1. QUESTÕES DE UM PROJETO

.'••~

153

Tudo deve estar previsto em um projeto de pesquisa, desde aescolha de um tema, a coleta de informações preliminares, a deli­mitação de um problema, sua justificativa frente ao que já foi rea­lizado no assunto em que ele se insere, a fixação dos objetivos, o

levantamento das hipóteses, a determinação de um referencial te­órico e de uma metodologia que sejam adequados para testar as

hipóteses e resolver o problema colocado, a coleta dos dados, suaanálise e interpretação e as técnicas próprias para isso, até a pre­visão de recursos humanos e instrumentais, do cronograma, tudoisso para terminar na elaboração de um relatório final, de uma

tese ou de um livro.Inclusas em todos esses passos estão as perguntas clássicas

que um projeto deve enfrentar: o quê?, por quê?, para quê e paraquem?, onde?, como?, com quê? quanto e quando?, quem?, com

quanto? Traduzindo: o que será pesquisado? Por que a pesqu!sa énecessária? Como será pesquisado? Que recursos humanos, Inte­

lectuais, bibliográficos, técnicos, instrumentais e financeiros se­

rão mobilizados? Em que período?Previstas e respondidas todas essas perguntas, o projeto possi­

bilitará ao pesquisador "impor-se uma disciplina de trabalho não

só na ordem dos procedimentos lógicos mas também em termos

de organização do tempo, de seqüência de roteiros e cumprimento

de prazos" (SEVERINO, 2000: 159).Uma visão panorâmica do projeto de pesquisa será apresenta-

da abaixo para ser depois seguida pela discussão detalhada de

cada um dos seus passos.Um projeto começa pela escolha de um tema 9U assunto sobre

o qual a pesquisa versará. .Uma vez que nenhum projeto surge do

tiva da investigaçãocientífica. No momento, ficaremos apenas na

primeira etapa, a da elaboração do projeto.

Lucia SantaellaComunicação [, Pesquisa152

nada, ele deve ser introduzido por uma apresentação voltada para

a gênese do terna, Como o pesquisador chegou a ele? Quais os

motivos relevantes que fisgaram sua curiosidade e produziram nele

dúvidas a respeito desse tema. Essas dúvidas são providenciais,

pois é delas que o problema da pesquisa irá brotar.

Ternas, entretanto, não são virgens. Por isso mesmo, qualquer

proje-to deve ser antecedido por estudos preliminares sobre o terna.

Masque estudos preliminares são esses? Sabemos que a realidade

é uma trama finarnente urdida dedeterminações e a ciência e, mais

ainda, ri filosofia estão longe de terem começado hoje. Felizmenteos temas que escolhemos, ou pelos quais somos escolhidos, não

abraçam a realidade inteira, principal mente porque nosso olhar e

nosso pensamento já estão conformados a um certo modo de ver

,que depende dos referenciais teóricos que dominamos. Esses

referenciais são específicos, próprios das distintas áreas de co­

nhecirnento em que a ciência se subdivide. Uma vez que nos cons­

tituímos corno pesquisadores dentro de alguma área de conheci­

rnento; os estudos preliminares já estão previamente delimitados

pela área de inserção do pesquisador. Dentro de cada área, há ain­

da delimitações que lhe são próprias e que se constituem nas suas

sub-áreas. Den tI'O das sub-áreas, encon trarn-se estratifi cações de

ternas, junto às quais o tema de nossa escolha, via de regra, selocaliza.

Tendo assim localizado o terna , os estudos prelirninares envol­

vern desde leituras bibliográficas, visitas a locais específicos, quan­

do o terna exigir, até discussões com especialistas e colegas. Es­

ses estudos preliminares são substanciais para a delimitação do

problema de pesquisa. Além disso, neles tem início UI11a das exi­

gências fundamentais de um projeto de pesquisa: a revisão biblio­gr áfica, que só poderá se complementar quando o problema esti­

ver pelo menos relativamente definido. De todo modo, através da

busca' de' informação sobre o tema é que as dúvidas vão gradativa­

mente se tornando mais c1aras e o problema pode ir se delineando .

Tudo isso é necessário porque um tema não é ainda um pro­

blerna. Este último se constitui na questão mais fundamental de

toda a pesquisa', por isso mesmo, deve ser precisamente reCol~ta­

do, delimitado e claramente formulado. Isso não acontece por passe

de mágica, nernda noite para o dia. Daí a necessidade de estudos

preliminares, de momentos de concentração cuidadosa e medita­

tiva, de discernimento das fronteiras do problema sem o que não

seria possível extraí-lo do contexto de infindáveis determinaçõesem que um tema se situa. ,

É claro que nos casos em que uma pesquisa se origina de outrapesquisa; a delimitação do problema é sempre mais simples, visto

que essa delimitação, via de regra, já brota enquanto a pesquisaanterior está sendo realizada ;-Poucas são as pesquisas que não

funcionam como geradoras de outras pesquisas. É por isso qu.e 9.Sverdadeiros pesquisadores fazem pesquisa a vida · inteira, pois, .

enquanto fazem uma, já são mordidos pela curiosidade em rela­

ção a novos problemas que vão aparecendo no meio.do caminho éque têm de ser guardados para U111 'a outra ocasião. Ao mesmo tem- '

po que respondem a um problema proposto, as pesquisas são fon­

tes inesgotáveis de novos problemas. Isso não se dá por acaso,

mas é fruto do aprofundamento que as pesquisas nos obrigama

ter em relação aos fenômenos.

Definido o problema, deve ser elaborada a revisão bibliográfi­

ca ou pesquisa sobre o estado da questão, quando são estudados

os trabalhos que se situam na circunvizinhança do problema, tra­

balhos que versam sobre problemas simi lares. A elaboração da

revisão. bibliográfica deve ter em vista a contraposição dos traba- ,

lhos já publicados em relação ao problema que a pesquisa propõe.

Vê-se aípor que a revisão bibliográfica é importante. De um lado,

ela deve comprovar que o pesquisador não está querendo realizar

algo que já foi feito, de outro lado, ela ajuda a encaminhar o passo .

seguinte da pesquisa, a justificativa , quer dizer, a argumentação

sobre a relevância' do trabalho, não. apenas enfatizando que ele

••:.'.•'.":.'.••••••'.••'.~••••­•.1~'.•.'••••

154 Comunicação [, Pesquisa

~ .......

Lucia Santaella 155

156 Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella 157 •ainda não foi feito por outro pesquisador, mas principalmente porque ele deve ser realizado.

Justificado o problema, o projeto se encaminha para a defini­ção dos objetivos, quer dizer, que fins a pesquisa visa atingir?Quais são os aspectos que o problema envolve e em que sua solu­ção resultará no tocante a cada um desses aspectos?

Depois disso, o pesquisador passa para a formulação das hi­póteses. Como suposições de respostas para o problema propos­to, as hipóteses se responsabilizam pelo direcionamento da pes­quisa, na medida em que são elas que a pesquisa terá por finalida­de demonstrar ou testar e comprovar ou não. Ora, não há formula­ção de hipóteses sem um quadro teórico de referência. É por issoque essa formulação já encaminha o pesquisador para a ex­plicitação do seu quadro teórico. Este se constitui em um "univer­so de princípios, categorias e conceitos, formando sistematica­mente um conjunto logicamente coerente, dentro do qual o traba­lho do pesquisador se fundamenta e se desenvolve" (SEVERINO,ibid.: 162).

Tendo chegado neste ponto, o projeto pode então se debruçarsobre as questões metodológicas, técnicas e instrumentais. Enquan­to o método se refere a procedimentos ele raciocínio e analíticosmais amplos, as técnicas são operacionalizações do método dasquais os instrumentos são suportes. .

É no momento da indicação dos procedimentos metodológicosque o pesquisador deve 'localizar o tipo de pesquisa que está rea­lizando, teórica ou aplicada, histórica ou tipológica, crítica ousistêmica, empírica com trabalho de campo ou de laboratório, etc.A metodologia está sempre estreitamente ligada a essa tipologia.Além disso, os métodos devem estar perfeitamente afinados como problema proposto e com as hipóteses. Tendo o problema emmente, o pesquisador deve se perguntar: "como e com que meiospoderei resolvê-lo?" Este "como e com que meios" entrelaça ashipóteses e o método. As hipóteses funcionam como sinalizações

para o caminho a ser percorrido. Por isso, o método deve estarsintonizado nessas sinalizações. Além disso, não pode haver con­tradição entre o método e o quadro teórico de referência, tambémchamado de fundamentação teórica, pois, muitas vezes, o métodoadvém diretamente do quadro teórico.

Por fim, o cronograma da pesquisa deve ser estabelecido comindicação das etapas a serem cumpridas em cada período. A ele sesegue a indicação dos recursos humanos e materiais necessários esua justificativa, tendo em vista o que a pesquisa mobilizará. Aofinal de tudo, deve comparecer a lista bibliográfica preliminar,pois a bibliografia definitiva só pode e deve ser complementadano decorrer da execução do projeto. Muitas vezes o pesquisadordivide a bibliografia em duas p~~tes. Uma parte já consultada paraa elaboração do projeto e outra parte a ser pesquisada no decorrerda execução do trabalho.

Tendo esse panorama geral como pano de fundo, podemospassar para o detalhamento de suas partes. Inicio pelas etapas quedevem anteceder à elaboração do projeto, visto que são elas quetornarão essa elaboração possível.

2. A ESCOLHA DO TEMA

Quando uma pesquisa se desenvolve no seio de uma institui­ção com programas de pesquisa pré-definidos nos quais o pesqui­sador está engajado ou quando uma pesquisa é encomendada poralguma empresa, evidentemente, seu tema não é fruto da escolhado pesquisador. No mundo universitário, entretanto, a imensamaioria das pesquisas nasce da livre escolha do pesquisador. Vemdo pesquisador a necessidade de estudar um determinado assunto.Mas quais são as motivações que nos levam a escolher um tema?

Segundo Barros e Lehfeld (1991: 26-27), os temas podem sur­gir da observação do cotidiano, da vida profissional, do contato erelacionamento com especialistas, do feedback de pesquisas já

­•

real izadas ou do estudo de literatura especializada. Conforme

Lakatos e Marconi (1992: 45), além das possibilidadesacima, as. . ,

fontes para a escolha de um assunto podem ainda originar-se daexperiência pessoal, de estudos e leituras , da descoberta de 'dis­crepâncias entre trabalhos ou da analogia C0111 temas de estudos

. ' . . .

de outras disciplinas 'ou área~ científicas. Enfim, completam asautoras (ibid.: 102), o tema pode surgir de uma dificuldade práti­ca , de uma curiosidade científica, de desafios' encontrados na lei- '

tura de outros trabalhos o~ ?a ~rópl~ia teoria .A despeito de t?das essas diferentes possibilidades, algo ,é

comum a elas: ~m t,en:a surge quase sempre de uma intenção ain­da imprecisa. Uma impreci~ã~que só pode ser indicadora de quea escolha de um tema advém muito menos de urna vontade racio­nal do que de motivos sobre os quais temos pouco domínio éans­ciente . De fato , um . t~ma é algo que nos fisga, para o qual "nossentimos atraídos seI11 saber bem por quê. Por isso mesmo, temasde pesquisa .n.ão devem ser mudados diante da primeira dificulda­de que se apresenta ou diante de influências alheias . Um temanasce de um desejo, que é, por sua própria natureza, sempre obs­

curo, e não costuma adiantar muito a tentativa de lhe virar as cos­tas. Em outras palavras, não podemos ser infiéis ao desejo que sóse deixa mostrar escondendo-se por trás de uma intenção irnpreci­sa através da qual um tema -de pesquisa aparece.

Não obstante a imprecisão, é claro que os temas têm tudo a vercom a história de vida e, especialmente, com a história intelectual

do pesquisador, Em que área científica está inserido, que repertó­rio já adquiriu nessa ~rea,qual a intensidade de seus contatos comoutros pesquisadores e C0111 especialistas na área, seu noviciadoou sua experiência em pesquisa são todos fatores determinantespara a escolha de um tema. Entretanto, esses fatores não são capa­zes de impedi;' q~e os ternas surjam, o mais das vezes', de- modovago, muito geral e: indefinido.A apreciação de Demo (1985: 49­50) sobre isso é especialmente lúcida ~ importante pará que um ;

3. ESTUDOS PRELIMINARES

pesquisador iniciante não se sinta perdido em meio às incerte.zasiniciais e cético em relação à sua capacidade de definir mais pre­cisamente seu tema. Quando nos propomos a realizar um trabalho

científico, diz o autor,

Enfim, a indefinição inicial de um tema é normal; pois o queimporta não é o seu modo de ser, mas a elaboração,que deve serrealizada para que ele vá gradati vamen.te ganhandq concretude, ~ ,precisão e determinação. Para isso, ~ntretanto, opesquisador devese entregar aos estudos preliminares, sem os quais seria impossí­vel caminhar da imprecisão para a definição.

159

"é normal que a primeira impressão seja de perplexidade. Não s~~e­

mos por onde começar, sobretudo se nunca , nos tínhamos metido

antes no assunto . Todavia, é' a s ituação normal .de quem se )~Iga

pesquisador e não detentor de saber ev idente e prévio . [.. .,J QU~I~

parte de evidências , nada tem a pesquisar. O processo de superação

dessa perplexidade inicial é algo central na formação científica d~

LIma pessoa.11

Por onde começar? Buscando informações sobre o terna, sejade ordem factual, seja de ordem teórica. Rudio (1992: 39) muito ,apropriadal11ente nos lembra que, para a realização dos estu~,os

preliminares, é de máxima importância sabermos ern que área, ~

melhor ainda, ern que sub-área do conhecimento ." 110SS0 tema sesitua para que possamos deterrninar os fundamentos teóricos quelhe servem de base, isto é, estabelecer quais as ,relações entre oassunto de nossa pesquisa e a Teoria Científica que desejamos uti­li~ar". Foi por ter essa necessidade en: vista que, no segundo capí-.tulo deste livro, busquei construir ,o mapeamento da área de co­municação para que opesquisadorpossa localizar .emqual terri-

Lucia Santaella '

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Comunicação & Pésquisa '158

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~-------------------------------_.•160 Comunicação [, Pesquisa Lucia Santaella 161

tório seu assunto se situa e quais são as interfaces desse territóriocom os territórios vizinhos. Tanto quanto posso ver, a visualizaçãodesses territórios nos ajuda a compreender de que teorias essesterritórios dependem para existir cientificamente. Justo por isso,procurei também inserir no mapa as teorias que são próprias acada território.

Com uma visão relativamente clara da área de inserção de seutema, é preciso que o pesquisador vá para a biblioteca ler sobre oassunto. Vale notar que biblioteca quer dizer tudo que se podeencontrar nela: enciclopédias, livros, periódicos especializados,que são fundamentais sob o ponto de vista da atualização sobre otema, catálogos, teses e dissertações, jornais, vídeos, isso semmencionar o acesso a bancos de dados que hoje se pode ter a par­tir dos computadores localizados nas bibliotecas ou em nossaspróprias casas. O contato com esse acervo é fundamental não ape­nas para buscar subsídios que orientem e dêem mais segurançasobre a escolha do tema, mas que ajudem a formular o seu enun­ciado. De resto, também para saber se o assunto que se pretendeestudar já foi objeto de outras pesquisas e sob que ângulos essaspesquisas o enfocaram.

É certo que as leituras tomam muito do nosso tempo', mas, narealidade, elas ajudam a diminuir o tempo estéril das idéias con­fusas e pouco definidas que são sempre motivos de angústia parao pesquisador.

Segundo Bastos (1999: 19-20), o levantamento bibliográfico

preliminar é imprescindível. Antes de tomarmos qualquer decisãosobre a nossa pesquisa, precisamos ter o maior número de infor­mações e de leituras que são possíveis nessa etapa de desenvolvi­mento do projeto, não só para melhor delimitar o assunto, " mastambém para desenvolvê-lo longe de um ponto de vista do sensocomum". Juntamente-com o acesso a material bibliográfico, Bas­tos considera a necessidade de diálogo com especialistas para dis­cutir e aprimorar o tema escolhido, confrontando sempre que possí-

vel as sugestões e críticas de um especialista com as de outros es­pecialistas. Essa multiplicidade de pontos de vista é fundamentalpara que o.pesquisador não fique, ~e saída, fixado em um modode ver, em um único tipo de fundamentação te órica, mas que saibafazer uso da riqueza dessa fase preparatória para explorar a diversi­dade que é própria a qualquer uma das áreas das ciências humanas.

Vale enfatizar que todo o esforço dispendidonos estudos'preli­minares se volta produtivamente para a clarificação gradativa dotema, rumo à definição de uma questão, de urn problema a serpesquisado. Contudo, o segredo dos estudos preliminares está naarte 'do pesquisador para saber exatamente o momento em quedeve interrompê-los. A massa de literatura existente desdobra-seinfinitamente. Dela Jorge L. Borges já nos forneceu uma versãocriadora na sua Biblioteca de Babel. Os estudos preliminares de­vem, portanto, cercar as obras mais fundamentais, tendo em vistaum panorama de fundo que habilite o pesquisador a situar suaquestão para poder melhor defini-Ia. Essa arte de saber onde pararé, nesse caso, auxiliada pelo fato de que a pesquisa bibliográficanão se reduz a isso, além de que essa pesquisa preliminar deverádepois ser incorporada ao projeto junto com sua complementaçãoem um tópico sob o título de "Revisão bibliográfica" ou "Estadoda questão", conforme será melhor definido no momento oportuno.

3.1 O PRÉ-PROJETO

Pouco a pouco, dos estudos preliminares um problema de pes­quisa começa a se delinear. A partir disso, o pesquisador devecriar coragem e, apesar de o momento ainda lhe parecer precoce,ensaiar a elaboração de um pré-projeto. Embora tudo pareça ain-

!

da muito vago, é preciso aproveitar as incertezas iniciais para de-las extrair seu sumo. O lusco-fusco da imprecisão é propício paradespertar aquilo que Peirce chamou de uberty, "uberdade", isto é,capacidade de responder criativamente aos estím~.los que nos che-

4. A ELABORAÇÃO DO PROJETO

No detalhamento dos passos a serem dados para a elaboração

do projeto de pesquisa, irei me deter com mais demora em ques-

gam tanto do exterior quanto, principalmente, do interior de nossa

mente. Passeando vivamente pelas idéias e contemplando-as cominteresse desprendido, o pensamento fica entregue ao musement,estado de concentração distraída, condição para a "uberdade" (ver

SEBEOK et al., 1993). É em momentos como esse que, via de

regra, brotam as hipóteses que irão conduzira pesquisa. Tanto

isso é verdade que nunca somos capazes de explicar como chega­

mos às hipóteses. Elas parecem estar simplesmente lá, à nossaespera. :De fato, de acordo com a teoria peirceana da abdução,

hipóteses são frutos de uma espécie de adivinhação, capacidadede que o ser humano é dotado para adivinhar os desígnios dascoisas, tanto quanto o pássaro é dotado do poder voador.

Parece evidente que a "uberdade" só premia aqueles que bus­

cam. A mente só pode passear entre idéias, quando nela as idéias

são férteis, caso contrário temos de nos contentar com idéias fi­

xas, que são o lado do avesso da "uberdade". Vem daí uma outraboa razão para justificar a necessidade dos estudos preliminares.

O anteprojeto é assim uma primeira proposta de sistematizaçãopara ser testada, modificada e aperfeiçoada na medida em que a

delimitação da questão a ser pesquisada for amadurecendo. Trata­se de um ponto de partida que brota sob efeito do pensamento sin­

tético, onde tudo aparece ao mesmo tempo. Realmente, um proje­to não nasce parte por parte, mas em alguns lampejos em que tudoaparece junto e ainda confuso. O anteprojeto é a primeira tentati­va de organizar os fios dessa trama sintética. Para essa organização,

juntamente com os resultados das correções sucessivas a que o ante­

projeto vai sendo submetido, deve entrar em ação o pensamento ana­

lítico, aquele que guiará os passos da elaboração do projeto.

163Lucia Santaella

tões que dizem respeito a pesquisas não-experimentais e não-quan­

titativas, pois para as experimentais e quantitativas já existe um

abundante material bibliográfico (ver especialmente a extensa obra

de Laville e Dione, 1999, as competentes obras de Lakatos e

Marconi (1982a, 1982b e 1992) ou a mais breve, mas não menos

excelente obra de Rudio, 1992). Uma vez que os manuais de ori­

entação para as pesquisas quantitativas se detêm muito pouco nas

questões que têm mais peso nas pesquisas qualitati vas, tais comoestado da questão, quadro teórico de referência, discussão dasestratégias metodológicas não-quantitativas e suas justificativas,é para elas que estarei chamando mais atenção.

4.1. Os ANTECEDENTES

Muitas vezes o pesquisador se sente tímido em se mostrar pre­sente no seu discurso. Realmente, não é fácil encontrar o pontocerto e justo da enunciação de um discurso cien~ífico em que apessoalidade não caia, de um lado, na mera confissão subjetivaadocicada e enjoativa ou, de outro, no pedantismo de uma neutra­

lidade forçada e artificial. De todo modo, buscando evitar esses

dois extremos, há um momento inicial na abertura de um projeto

de pesquisa em que a figura do pesquisador deve aparecer. Cha­mo esse momento de "antecedentes" ou "histórico" para com issodesignar o quadro de referência pessoal da proposta de pesquisa.

A presença desse quadro de referência é muito comum nos

casos das pesquisas que brotam diretamente de pesquisas anterio­

res, o que pode acontecer, por exemplo, quando o pesquisador

decide continuar no doutorado com uma questão que não foi pos­

sível desenvolver ou aprofundar no mestrado. Para introduzir um

novo projeto, o pesquisado,r procede ao breve relato das conclu­sões ou resultados alcançados na pesquisa anterior, com atenção

para o ponto em que sua atenção foi despertada para uma novaquestão. Nesse momento, o relato inclui obrigatoriamente o qua-

Comunicação & Pesquisa162

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4.2. A DEFINIÇÃO DO PROBLEMA

Para Laville e Dionne (1999: 27), conscientizar-se de um pro­blema de pesquisa

165Lucia Santaella :

"depende daquilo que dispomos no fundo de nós mesmos: conheci­

mentos de diversas ordens- brutos e construídos - e entre esses

conceitos e teorias; conhecimentos que ganham sentido em função

de valores ativados por outros valores: curiosidade, ceticismo, con­

fiança no procedimento científico e consciência dos seus limites."

Na fase de definição do problema, entretanto, como já foi dis­cutido e também querem os autores, as capacidades intuitivas ga­nham importância, pois a percepção inicial de um problema é, omais das vezes, pouco racional.

Para se sair da problemática sentida, imprecisa e vaga e sechegar a uma problemática consciente e objetivada, uma proble­mática racional, Laville e DioneIibid.: 98) aconselham o pesqui- 'sador "a jogar o mais possível de Iuz sobre as origens do proble­ma e as interrogações iniciais que concernem a ele, sobre a suanatureza e sobre as vantagens que se teria em resolvê-lo, sobre oque se pode prever como solução e sobre o modo de aí chegar".

Rudio (ibid.: 72) fornece uma exemplificação muito oportunapara se compreender a passagem gradativa em que um tema aindavago vai sendo delimitado de modo a ir se transformando em umproblema de pesquisa. Suponhamos que alguém diga que quer fazeruma pesquisa sobre delinqüência juvenil, essa afirmação apenasindica de modo muito vago e geral um dos elementos do campode observação: a população. Mas se acrescenta que seu interesseestá nos crimes cometidos pelos delinqüentes, passa a nos indicar,então, uma das variáveis a serem observadas. Se complementaque deseja saber se certos crimes que os delinqüentes cometemsão ocasionados pelo efeito do uso de tóxicos, tem-se aí a inten-

. ção de relacionar duas variáveis: se o uso de tóxicos (variávelindependente) ocasiona os crimes (variável dependente), cometi­dos por delinqüentes juvenis. É claro que a delimitação da ques­tão não pára aí, pois há outros elementos no campo de observaçãoa serem levados em consideração. De todo modo, quando apare-

Comunicação [, Pesquisa164

dro de referência pessoal, quer dizer, em que medida o pesquisa­dor está implicado naquilo que deseja realizar.

Mesmo no caso de uma pesquisa não estar na linha de conti­nuidade de uma outra já realizada pelo pesquisador, o interessepor um assunto, um tema ou uma questão não surge do vácuo. Eleé fruto de uma história de vida, de experiências profissionais, in­telectuais, construídas mediante caminhos próprios, dos valores eescolhas que nos definem. Tem-se aí a gênese do tema da pesqui­sa cujas vicissitudes já foram discutidas acima. Trata-se agora, nomomento de elaboração do projeto, de incorporar em um relatoaquilo que, dessas vicissitudes, tem pertinência para a apresenta­ção do tema e daquilo que conduziu à sua escolha.

Embora não compareça em outros livros de metodologia comoum passo necessário à elaboração de um projeto de pesquisa, consi­dero essa apresentação muito importante. Afinal, nós pesquisado­res somos seres viventes. A pesquisa não é algo estranho, à mar­gem de nossa história de vida, mas nela se integra de maneira in­dissolúvel.Quando bem dosado, evitando o mero biografismo ino­portuno, o relato de como o pesquisador chegou ao tema pode darsabor de vida ao projeto. Além disso, ao incorporar aquilo querealmente importa, isto é, como foi se dando o estreitamente gra­dativo da amplitude do tema para a delimitação do problerna dapesquisa, o quadro de referência pessoal vai pouco a pouco seencaminhando para o tópico seguinte, o mais importante do pro­jeto, ou seja, a delimitação da questão proposta pela pesquisa.

cem as duas variáveis, a amplitude do tema já se especificou emuma pergunta, que é substancial para a definição de um problema.Enfim, como parece óbvio, para se passar do tema ao problema, otema deve ser problematizado.

O que é, portanto, um problema de pesquisa? Vejamos algu­mas das definições que já foram formuladas sobre isso. Não háproblema sem uma indagação central, uma dificuldade que se querresolver. Desse modo, o problema de pesquisa é uma interrogaçãoque implica em uma dificuldade não só em termos teóricos oupráticos, mas que seja também capaz de sugerir uma discussãoque pode, inclusive, em alguns casos, passar por um processo demensuração, para terminar em uma solução viável através de es­tudo sistematizado (BASTOS, 1999: 114). Do ponto de vista for­mal, um problema é um enunciado interrogativo. Semanticamen­te, é uma dificuldade ainda sem solução que deve ser determinadacom precisão para que se possa realizar seu exame, avaliação,crítica, tendo em vista sua solução (ASTI VERA, 1974: 94).

Certamente nem todos os problemas que existem podem seprestar à pesquisa científica. Para ser problema de pesquisa, eledeve ser um problema que se pode resolver, com conhecimentos edados já disponíveis, além de outros passíveis de serem produzi­dos. Não se trata de um problema que pode ser resolvido pelaintuição, especulação ou senso comum, pois um problema de pes­quisa "supõe que informações suplementares podem ser obtidas afim de cercá-lo, compreendê-lo, resolvê-lo ou eventualmente con­tribuir para a sua resolução". Finalmente, um verdadeiro proble­ma de pesquisa deve ser capaz 'de produzir compreensão que for­neça novos conhecimentos para o tratamento de questões a elerelacionadas (LAVILLE e DIONNE, 1999: 87-88).

As conclusões pragmáticas que podem ser extraídas das defi­nições acima indicam que um problema deve ser for~uladocomouma pergunta. Há, no entanto, perguntas e perguntas. Indagaçõesgerais, tão gerais quanto o próprio tema, estão muito longe de

4.3 O "ESTADO DA QUESTÃO

Também chamado de "revisão bibliográfica" ou "bibliografia'comentada" , este passo da elaboração do projeto já teve seu iní­

cio nos estudos preliminares. Neste novo momento, entretanto,uma vez circunscrito o problema com clareza necessária para fun-

"consiste em dizer, de maneira explícita, clara, compreensível e

operacional, qual a dificuld~d~~om a qual nos defrontamos e ~ue

pretendemos resolver, limitando seu campo e apresentando suas ca­

racterísticas. Dessa forma, o objetivo da formulaç~o do problema da

pesquisa é torná-lo individualizado, específico, inconfundível".

167Lucia Santaella

permitir o detalhamento do projeto. Além disso, a formulação deveser clara e precisa. Essa clareza se constitui em passo fundamen­tal, pois dela dependerão os passos subseqüentes do projeto, so­bretudo a formulação das hipóteses e a obtenção de parâmetrospara as escolhas metodológicas. A pergunta deve também ser sig­

nificativa, deve conter a promessa de que uma solução pode seresperada, caso contrário não haveria razão para se fazer uma pes­quisa. O problema deve ser, além disso', viável, exequível, querdizer, ele pode ser objetivamente verificado. Em suma, formularum problema, segundo Rudio (ibid.: 75),

Cumpre lembrar aqui que o pesquisador não deve passar paraa próxima etapa do projeto, a revisão da literatura,' antes de tercircunscrito muito bem seu problema através da formulação desua pergunta. Sem isso, correrá o risco de se deixar levar à derivanas inesgotáveis fontes de pesquisa. Para avançar com eficácianos passos do projeto, é preciso saber bem o que se procura. Sócom esse trunfo nas mãos, o pesquisador pode mergulhar nas lei­turas e consultas, o que não significa que, no percurso, estas nãopossam produzir reorientações no problema.

Comunicação [, Pesquisa166

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cionar como um fio condutor e ajudar o pesquisador a dar prosse­

guimento ao seu projeto, o contorno da revisão bibliográfica tor­

na-se também mais nítido.O conhecimento se dá elTI UITI continuum. As interpretações

que fazemos das coisas, fatos e pessoas estão sempre a meio ca­

minho, têm algo de provisório. Essa é a regra número um · que sepode extrair da noção de semiose peirceana. As crenças que ad­

quirirnos através da ciência não são muito diferentes. Nada há

nelas de eternidade. Também ria pesquisa científica, estamos sem­

pre a meio caminho. E só deixamos de estar quando cessamos de

ter dúvidas porque perdemos a disponibilidade para ouvir o que o

outro tem a dizer. 'E m suma, nenhuma pesquisa parte da estaca

zero. Mesmo e~ um tipo muito simples de pesquisá, a explorató­

ria, que visa meramente à avaliação de uma situação concreta des­

conhecida, alguém em algum lugarjá deve ter tido uma preocupa­

ção semelhante. Por isso, a procura cuidadosa e paciente, por ve­

zes até mesmo obstinada, de fontes documentais ou bibliográficasé i mprescindível.

Raros são os problemas e as perguntas que não foram previa­

mente levantados. Mais uma vez é Borges quem nos lembra queos grandes problemas já foram pensados pelos gregos, ' de modo

que aproeza dotempo é a de levar o ser humano a incansavelmen­

te recolocá-los .sob novas e mais alargadas entonações , Mesmo

quando o pesquisador não vai tão longe, não se deslocando muito

na di reção do passado, a abóbada ideati va que recobre as socieda­

des e culturas históricas, determinando os limiares daquilo que dá

para ser pensado em cada momento histórico dado, traz corno

conseqüência que, ITIeSITIO que as perspectivas possam diferir, as .

interrogações e questionamentos de cada historicidade acabam não

sendo a rigor muito distintos . Há, enfim, um inegável Zeitgeist;espírito de tempo, ou aquilo que, com muito mais precisão, Fou­

cault chamaria de episterne, que coloca o pesquisador ernum cfr­

culo de questões no qual muitos estão simultaneamente inseridos.

Por isso mesmo, .aleyis~9 bibliográfica significa, muitas ve­

zes, conforme as palavras deLaville e Dionne (ibid.: 1~3) "seguira informação comoum detetive procura pistas: com imaginação e

obstinação. É,aliás, esseaspecto do trabalho, agir como um dete­

tive, que, com freqüência, torna prazerosa a realização da revisão

da literatura""

Alongo-me tanto - e ITIe alongarei ainda mais - nos meandros

da questão bibliográfica, em primeiro lugar, porque nas pesquisas

não-experimentais e não-quantitativas, essa é a etapa que lhes dá

alma. Dela advirá a melhor escolha de urna teoria ou sínteses de

teorias e conceitos que nortearão a escolha .do método e, conse­

qüentemente, o teste, muitas vezes argurnentativo, de nossas hi­póteses . Se não vamos utilizar métodos e técnicas para medir umcerto aspecto bem recortado da realidade, devemos, em troca, en­

frentar os desafios da imprecisão qualitativa. Para isso, temos de

nos valer da ajuda tanto quanto possível alargada do pensamento

do outro a que podemos ter acesso.

Em segundo lugar, chamo tanta atenção para a pesquisa biblio­

gráfica porque a típica indigência das.bibliotecas nas universida­

des brasileiras muitas vezes acaba por criar em nós uma espéciede autodefesa inconsciente que se manifesta na negl igênciae até

mesmo no desprezo pela obstinação na perseguição das fontes ',

Disso decorre,via de regra, uma autocomplacência muito satis­

feita, despida de inquietação, como são satisfeitas todas as formas

de ignorância. Tanto se sedimentou em nosso país a cultura da

negligência com as fontes que, mesmo quando têm o privil égio de

frequentar universidades com boas biblic?tecas e com ac~sso à in­formação bibliográfica, que hoje se t~rnoL1 tão facilitada pela

internet, os estudantes continuam se contentando com bem pouco.

Enfim, fazer a revisão da li teratura p~ra a constituição do 'es ta ­

do da questão significa passarem revista todos os trabalhos dis­

poníveis, objetivando selecionar tudo que possa servir em urnapesquisa. Nela, o pesquisador tenta encontraressencialmente

168 Comunicação [, Pesquisa

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Lucia Santaella 169 •.1'.•e\e~

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Nesse ponto, as autoras acima alertam para dois fatores: emprimeiro lugar, o cuidado que o pesquisador deve ter nessa etapado trabalho para "não se deixar levar por suas leituras como umcata-vento ao vento". A indagação que foi formulada na circuns­crição de seu problema não pode ser perdida de vista e deve fun­cionar como um centro de gravidade. No fundo, o que deve serfeito aqui é considerar a afirmação de Borges (esse grande estetada arte de ler) de que somos inelutavelmente leitores distraídoscom atenções parciais. No caso da revisão bibliográfica, aceitaressa limitação não é tarefa fácil , especialmente quando falta aopesquisador a experiência de numerosas leituras anteriores, expe­riência da qual sempre se extrai urna espécie de metodologia pró­pria da leitura.

Na ausência de um repertório já formado de leituras, o pesqui­sador, via de regra; se vê perdido em um labirinto de idéias, ten­dências e posições, sem conseguir, de imediato, dar a elas umaconfiguração coerente. Quando isso acontece, Laville e Dionne(ibid.: 112) aconselham o pesquisador a usar a técnica do zoam,partindo "de uma tomada ampla de sua pergunta, sobre um espaçodocumental que a ultrapasse grandemente, mas sem dela desviaros olhos e, assim que possível, fechar progressivamente o ânguloda objetiva sobre ela".

De minha experiência em pesquisas que realizei, algumas de­Ias sobre temas que me eram quase inteiramente novos, extrai umensinamento que talvez possa ajudar o pesquisador iniciante nes­sa fase de seu trabalho. Quando damos início ao levantamento do

estado da arte relativo à questão que estamos pesquisando, geral­mente dispomos de um certo número de títulos colhidos durante afase de estudos preliminares. Cada um desses títulos já funcionacomo uma fonte para novos títulos , nas citações e. referências quefaz, de modo que a listagem bibliográfica que consta no final decada obra se constitui também em uma forite inestimável de pes­quisa. Quando lemos, de fato, os livros com cuidado, essa fontecostuma ser bastante preciosa, pois é dela que começamos a des­tacar os títulos de maior interesse para nós .

Conforme vamos avançando nessas leituras e na coleta dessasfontes, a um dado momento, sentimo-nos, de fato, perdidos emum labirinto, sem vislumbre de qualquer fio que possa rios tirardele. Entretanto, se não desistirmos antes da hora, chegará um ou­tro momento em que nós, como leitores, começaremos a reconhe­cer e, inclusive saber localizar, em termos de linha de pensamentoe posição teórica, as citações que os autores fazem uns dos outros.Quando as redes de referências começam a ser reconhecidas pornós, isso significa que já estamos conseguindo desenhar mental­mente a configuração panorâmica de um tema ou problema depesquisa. Aí é chegado o momento de interromper o estado da ar­te para dar prosseguimento às outras fases da elaboração do proje­to, de modo que só voltamos às consultas bibliográficas, quando,na execução da pesquisa, deparamo-nos com dúvidas não previstas econseqüentemente ainda não resolvidas, algo que sempre acontece.

O segundo fator da revisão bibliográfica para o qual Laville eDione (ibid.: 112-113) chamaram atenção diz respeito à necessi­dade de se evitar que essa atividade se assemelhe a "uma cami­nhada no campo onde se faz um buquê com todas as flores que seencontra". A revisão é, sobretudo, um percurso crítico que deveter em mira a pergunta que se quer responder. Por isso mesmo, emfunção da contribuição que podem trazer para nosso trabalho, ointeresse que as obras despertam em nós são desiguais. Ademais,nem tudo que se lê é realmente bom. paí vem a outra expressão

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170 Comunicação [, Pesquisa

"os saberes e as pesquisas relacionadas com a sua questão; deles se

serve para alimentar seus conhecimentos, afinarsuas perspectivas

teóricas, precisar e objetivar seu aparelho conceitual. Aproveita para

tornar ainda mais conscientes e articuladas suas intenções e, desse

modo, vendo como os outros procederam em suas pesquisas, vislum­

brar sua própria maneira de fazê-lo" (LAVILLE e DIONNE, ibid.: 112).

Lucia Santaella 171

,...-------------------------------------tr172 Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella 173

sinonímica de revisão bibliográfica, "bibliografia comentada". Nãose trata portanto de simplesmente resumir, parafraseando o queestá escrito nos livros, mas sim de fazer considerações, interpreta­ções e escolhas, explicando e justificando essas escolhas, sempreem função do problema posto pela pesquisa.

Felizmente não há receitas a serem dadas para a bibliografiacomentada, sobretudo porque se trata de uma arte ensaística quesó pode ser dominada com a prática e com a observação interessa­da em como ensaistas competentes a realizam. Em segundo lugar,porque as diretrizes de uma revisão bibliográfica dependem mui­to do tipo de pesquisa que está sendo realizada. Luna destaca que

"uma revisão bibliográfica que procure recuperar a evolução de de­

terminados conceitos enfatizará aspectos muito diferentes daqueles

contemplados em um trabalho de revisão que tenha como objetivo,

por exemplo, familiarizar o pesquisador com o que já foi investiga­

do sobre um determinado problema de interesse".

Como resumo final, cumpre assinalar que a revisão bibliográ­

fica deve existir para que clichês sejam evitados, para que esfor­ços não sejam duplicados, para que se possa apreender o grau deoriginalidade de uma pesquisa. Outro aspecto de relevância deuma bibliografia comentada, muito bem lembrado por Luna (ibid.:82), reside na sua constituição - na medida em que condensa ospontos importantes do problema em questão - tanto de fonte deconsulta para futuros pesquisadores que se iniciam na área, quan­to de fon te de atualização para pesquisadores fora da área na qual

. se realiza o estudo.

4.4 A APRESENTAÇÃO DAS JUSTIFICATIVAS

Nos passos para a elaboração de um projeto de pesquisa, mui­tos metodólogos costumam colocar a fundamentação teórica ou

quadro de referência teórico de uma pesquisa junto ou dando se­qüência à revisão bibliográfica. Prefiro colocar ajustificativa logoem seguida da revisão bibliográfica. De um lado, porque julgoque a fundamentação teórica deve vir imediatamente antes da meto­dologia, pois, nas pesquisas qualitativas, em muitos casos, o mé­todo deriva ou de uma teoria que funciona também como um mo­delo aplicativo ou da operacionalização dos conceitos teóricostendo em vista sua aplicação.

De outro lado, porque, no decorrer da bibliografia comentada,ao citar as principais conclusões a que outros autores chegaram,ao indicar discrepâncias entre tendências ou constatar certos en­traves teóricos ou práticos, ao constatar alguma lacuna que suapesquisa pode vir a preencher, .o pesquisador já deve ir ~onduzin­do seu texto na direção da contribuição que se espera da pesquisaa ser realizada.

Essa contribuição constitui-se em uma chave que abre as por­tas de acesso à justificativa, uma vez que, frente aos estudos járealizados sobre o problema, a justificativa visa colocar em rele­vo a importância da pesquisa proposta, quer no campo da teoriaquer no da prática, para a área de conhecimento em que a pesqui­sa se desenvol ve.

Portanto, a contribuição pode ser de 'ordem científica-teórica,quando o conhecimento que advirá da pesquisa proporcionar a constru­ção de uma nova teoria, caso este evidentemente mais raro, ou auxi­liar na amplicação do conhecimento teórico já existente, ou preen­cher lacunas detectadas no conhecimento da área, ou ajudar na com­preensão de conceitos teóricos complexos. Mas a contribuição podetambém ser de ordem científica-prática, quando se pretende dar res­postas a um aspecto novo que a realidade apresenta como fruto do?esenvolvimento das forças produtivas, técnicas etc., ou quandose busca aplicar uma teoria a um dado fenômeno julgado proble­mático, ou ainda quando se tem a intenção de sugerir caminhospara uma determinada aplicação tecnológica e assim por diante.

·4.5 A EXPLICITAÇÃO DOS OBJETIVOS

A palavra "objetivo" é um derivativo do termo latino objectus,"objeto", que significa algo que é lançado diante dos nossos sen-

A contribuição pode ainda ser de ordem social, por exemplo,

quando o conhecimento que resultar da pesquisa estiver voltado

para a reflexão e debate em torno de problemas sociais ou quando

um conhecimento prático é buscado como meio de intervenção narealidade social.

Parece óbvio que é impossível apresentar justificativas semdispor de um problema de pesquisa muito bem circunscrito e deuma revisão bibliográfica caprichosa. Como justificar algo quenão está bem definido e bem recortado contra o pano de fundodos estudos que já foram realizados no mesmo circuito de ques­tões no .qual uma pesquisa se insere?

Enfim, a justificativa deve apresentar os elementos que res­pondem às questões: "por que a pesquisa é relevante"?, "de ondevem sua pertinência"? "qual é o âmbito ou quais são os âmbitosda contribuição que ela trará"? Para respondê-las, Lakatos eMarconi (1~92: 103) fornecem o seguinte roteiro: frente ao está­gio em que a teoria se encontra, indicar as contribuições teóricasque a pesquisa pode trazer, a saber: em termos de confirmaçãogeral; em termos de confirmação na sociedade particular em quese insere a pesquisa; sua especificação para casos particulares;clarificação da teoria; resolução de pontos obscuros etc. Além

disso, o roteiro inclui: importância do tema de um ponto de vistageral; sua importância para casos particulares em questão; possi­bilidades de sugerir modificações no âmbito da realidade abarcadapelo tema proposto; descoberta de soluções para casos gerais e/ou particulares etc.

A apresentação da contribuição que a pesquisa pode trazer é uma

excelente ponte de passagem para a explicitação de seus objetivos.

175Lucia Santaella

tidos ou mente. O derivativo "ivo", presente em "objetivo", indi­

ca uma tendência para ter o caráter de objeto.Um sinônimo adequado para a palavra "objetivo", no contex­

to de uma pesquisa, é a palavra "alvo" ou fim que se pretendeatingir, um fim movido por um propósito. Quando se atira umaflecha, mira-se em um alvo. Os objetivos da pesquisa se parecem,portanto, com uma flecha na direção de um alvo. Uma vez que omirar do alvo antecede o lançamento da flecha, os objetivos tam­bém trazem dentro de si o sentido de intenção que guia a mirada.O que a pesquisa visa alcançar? Esta é a questão central inclusanos objetivos.

Objetivos, via de regra, são hierarquicamente divididos emobjetivos gerais e objetivos _específicos. Os gerais dizem respeitoa uma visão global e abrangente do problema, do conteúdointrín­seco quer dos fenômenos e eventos, quer das idéias estudadas. Osobjetivos específicos têm uma função intermediária e instrumen­tal de modo a permitir que o objetivo geral seja atingido ou queele seja aplicado a situações particulares (LAKATOS e MAR­CONI, 1992: 103).

Por ser uma explicitação da natureza do trabalho, tendo emvista o problema que ele visa resolver, a gama dos objetivos podeser mais extensa do que sua divisão em objetivo geral e objetivosespecíficos. Assim, os objetivos podem também ser de longo pra­zo ou imediatos, podem ser intrínsecos, quando se referem ao pro­blema que se quer resolver, ou extrínsecos, quando chegam até aexplicitação dos resultados esperados.

É curioso observar que a maior parte dos livros sobre metodolo­

gia científica não reserva muito espaço para o tratamento dos ob­

jetivos. Carvalho et aI. (2000: 107) nos explicam que essa ausên­

cia deve se dar porque se a formulação do problema for bemestruturada, a explicitação dos objetivos é dispensável, a não ser

que o pesquisador queira colocar ênfase nos resultados que pre­tende alcançar ao final de seu trabalho. De todo modo ," os autores

Comunicação (, Pesquisa174

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4.6 A FORMULAÇÃO DAS HIPÓTESES

A hipótese, segundo passo mais importante na hierarquia dositens do projeto, está ligada por um cordão umbilical ao problemada pesquisa. Deve, por isso mesmo, ser obrigatoriamente inseridaem um projeto de pesquisa. Não vem do acaso, mas muito justa­

mente da importância do papel que as hipóteses desempenhamem um projeto, o grande espaço que os livros de metodologiacientífica dedicam a elas. Alguns epistemólogos chegam a afir­mar que a essência da pesquisa consiste apenas em enunciar everificar hipóteses.

O problema que o pesquisador circunscreveu, isto é, conse- "

guiu recortar de um fundo temático muito amplo, tem a forma deuma indagação, uma interrogação, uma pergunta para a qual, no

indicam que, na descrição dos objetivos, "é importante que osverbos sejam utilizados no infinitivo, por exemplo: analisar, com­preender, identificar e interpretar.

Luna (ibid.: 35) constata a confusão que costuma existir entreproblema e objetivos, mas acredita que o bom-senso deva ser su­ficiente para dirimir dúvidas. Assim sendo, ou os objetivos coin­cidem com o problema e, então, não é necessário dar entrada aeles no projeto, ou, com a sua entrada, pretende-se chamar aten­ção para a aplicabilidade dos resultados.

Mesmo assim, é bom lembrar que, quando elaboramos proje­tos para agências de fomento ou para orientadores de pesquisa,nesses casos somos obrigados a inserir os objetivos em nosso pro­jeto; muito provavelmente porque a explicitação dos objetivos nosforça a sintetizar, em itens muito claros, o horizonte do projeto, osfios que ligam o problema às conseqüências que resultarão de suapossível solução, assim como as habilidades intelectuais que estãoimplicadas nos procedimentos que serão utilizados para que "osfins pretendidos sejam alcançados.

177Lucia Santaella

seu percurso, a pesquisa buscará respostas. Ora, a hipótese é umaresposta antecipada, suposta, provável e provisória que o pesqui­sador lança e que funcionará como guia ,para os passos subse­qüentes do projeto e do percurso da pesquisa. Se o problema temuma forma interrogativa, a hipótese tem uma forma afirmativa.Não se trata, entretanto, de uma afirmação indubitável, mas ape­nas provável. Funciona como uma aposta do pesquisador de que aresposta a que o desenvolvimento da pesquisa levará será a mes~

ma ou estará muito perto da resposta enunciada na hipótese. Elacria, por isso mesmo, uma expectativa na mente do pesquisador,expectativa esta que costuma dar ao percurso da pesquisa emo­ções similares àquelas que nos acompanham em uma situação desuspense, pois como toda aposta, a hipótese pode ser confirmadaou cair no vazio, caso em quea hipótese tem de ser repensada e asestratégias reconduzidas.

Trata-se, pois, de uma suposição objetiva "que se faz na tenta­tiva de explicar o que se desconhece". Para ter bases sólidas, eladeve estar assentada e suportada por boas teorias e "por matériasprimas consistentes da realidade observável". Portanto, "não podeter fundamento incerto". Mas por ter a natureza de uma suposi­ção, a hipótese tem por característica o fato de ser provisória, de­vendo, portanto, ser testada para se verificar sua validade"(RUDIO, ibid.: 78).

Embora seja importante que a hipótese esteja vinculada "a umateoria que a sustente para ter maior poder de explicação e ter pos­sibilidade de ser comprovada ou verificada na pesquisa" (CAR­VALHO et al.: ibid.: 103), embora ela tenha muito a ver com aexperiência e a competência do pesquisador, embora sua formula­ção implique em uma elaboração racional, uma hipótese surgesempre como um lampejo cuja formação escapa completamentede nosso controle consciente.

Peirce"desenvolveu sua belíssima teoria da abdução justamen­te para evidenciar que uma hipótese nasce como fruto de uma luz

Comunicação [, Pesquisa176

179Lucia Santael!a

para que buscamos respostas. Entretanto, no contexto da ciência,que é sempre especializado, podem surgir dificuldades para sechegar a uma hipótese. Goode e Hatt (1968: 75) dizem que isso sedá sobretudo quando falta ao pesquisador um quadro de referên­cia teórico claro, quando lhe falta também habilidade para utilizarlogicamente esse esquema teórico ou quando ele desconhece astécnicas de pesquisa existentes.

Mesmo que as dificuldades acima não existam e a hipóteseemerja com certa rapidez, isso não deve nos levar a crer que ahipótese possa prescindir do crivo de nosso espírito crítico e a suaformulação, ou seja, o enunciado das hipóteses, tenha de serdesordenada e confusa. Para evitar que se incorra nesses defeitos,Rudio (ibid.: 80-83) elaborou alguns critérios que podem servircomo "balizas demarcando um campo", sem que, com isso, a li­berdade do pesquisador na proposta de sua hipótese seja cons­trangida.

Assim sendo, cabe à hipótese ser plausível, isto é, "deve indi­car uma situação passível de ser admitida, de ser aceita; ela devetambém ter consistência, termo este que indica que o enunciadoda hipótese não pode estar "em contradição nem com a teoria enem com o conhecimento científico mais amplo", do mesmo modoque não pode existir contradição dentro do próprio enunciado; oenunciado da hipótese deve ainda "ser especificado, dando as ca­racterísticas para identificar o que deve ser observado"; além dis­so,"a hipótese deve ser verificável pelos processos científicos"em curso; seu enunciado precisa ser claro, isto é, "constituído portermos que ajudem realmente a compreender o que se pretende

afirmar e indiquem, de modo denotativo, os fenômenos a que sereferem"; não basta ser claro, o enunciado precisa ser tambémsimples, quer dizer, "ter todos os termos e somente os termos quesão necessários à compreensão"; da simplicidade decorre que o

enunciado deve ser também econômico, ou seja, além de utilizartão somente os termos necessários à compreensão, deve fazê-lo

Comunicação ti Pesquisa

natural que advém da capacidade humana para adivinhar, na ciên­cia, as leis que regulam os fenômenos e, na vida cotidiana, as veiassecretas das coisas. Nessa capacidade, residem os arcanos de nos­sa alma criativa. Por isso mesmo, nenhum pesquisador é obrigadoajustificar por que fez a opção por uma certa hipótese e não outraqualquer. Cada um é livre para escolher a que lhe parece maisrazoável. Uma vez que a freqüência com que os pesquisadoresatinam com a hipótese correta é muito grande comparativamenteà espontaneidade imediata e livre com que as hipóteses irrompemem suas mentes, isso funciona como indicador de que aí se locali­za a fonte do poder humano para a descoberta. Mesmo assim, umahipótese é o mais frágil dos argumentos. Em razão disso, parareceber seu veredito, necessita passar pelo teste da experiência.

Segundo Lakatos e Marconi (1992: 104), há diferentes formasde hipóteses. Em primeiro lugar, elas se dividem em hipótese bá­sica e hipóteses secundárias. A primeira corresponde à respostafundamental que as segundas complementam. Entre as hipótesesbásicas , há aquelas "que afirmam, em dada situação, a presençaou ausência de certos fenômenos", ou aquelas "que se referem ànatureza ou características de dados fenômenos, em uma situaçãoespecífica". Há ainda "aquelas que apontam a existência ou nãode determinadas relações entre fenômenos" ou também aquelas"que prevêem variação concomitante, direta ou inversa, entre cer­tos fenômenos etc.

Na sua natureza de complementos da hipótese básica, as secun­dárias podem "abarcar em detalhes o que a hipótese básica afirmaem geral", podem também "englobar aspectos não especificadosna básica", ou ainda "indicar relações ·deduzidas das primeiras", .assim como "decompor em pormenores a afirmação geral" ou"apontar outras relações possíveis de serem encontradas".

O modo de aparecimento de uma hipótese em nossas mentesé, via de regra, tão repentino quanto um relâmpago, fruto da agili­dade natural de nossos poderes de iluminação diante de tudo aquilo

..--- -

• 178•••••e•••••••••••ee••

••••••

180 Comunicação [, Pesquisa Lucia Santaella 181.­•

na menor quantidade possível. Por fim, "uma das finalidades bási­cas de uma hipótese é servir de explicação para o problema que foienunciado". Se isso não acontece, a hipótese não tem razão de ser".

Toda e qualquer pesquisa deve contar com a formulação dashipóteses, caso contrário, estará lhe faltando um norte, pois a fun­ção da hipótese é servir como uma bússola. Ela está no cerne daspesquisas experimentais, pois nestas, a observação de um fenô­meno leva o pesquisador a supor tal ou tal causa ou conseqüência,suposição esta que se constitui na hipótese que só pode ser de­monstrada por meio do teste dos fatos, ou seja, da experimenta­ção. Embora implique em procedimentos lineares que já foramsobejamente criticados, quando se trata de transpor esse modelopara as ciências humanas, essa linearidade nos ajuda a compreen­der o papel articulador que a hipótese deve desempenhar em qual­quer processo de pesquisa, como solução possível antecipada eordenadora das operações que devem resultar dessa antecipação,de modo a verificar seu fundamento ou não.

Nas pesquisas empíricas, que nascem da observação de fatosconcretos, as operações que resultam da hipótese consistem emlevar o pesquisador a saber se a explicação antecipada e plausívelque. a hipótese lhe forneceu resiste à prova dos fatos. Para tal, opesquisador deve armar as estratégias de verificação, determinan- .do as informações que serão necessárias, as fontes às quais recor­rer e a maneira de recolhê-las e analisá-las para tirar conclusões.

Nas pesquisas quantitativas quê, deve-se salientar, são muitoespecializadas, visto que implicam em conhecimentos ou assesso­rias em estatística, deve-se distinguir a hipótese da pesquisa, aquelade que viemos tratando até agora, da hipótese da estatística, isto é,aquela que vai ser utilizada para aplicação das técnicas estatísti­cas e que, de modo geral, costuma ser a primeira traduzida parauma linguagem numérica. De acordo com Rudio (ibid.: 84-85),uma hipótese pode ser constituída de apenas uma variável; podeter duas ou mais variáveis relacionadas entre si sem vínculo de

causalidade ou pode ainda ter duas ou mais variáveis relacionadaspor vínculo de causalidade.

Barros e Lehfeld (ibid.: 30) classificam as hipóteses de acordocom sua natureza em: hipóteses de relação causal e hipóteses nu-las. As causais "demonstram que a todo valor x corresponde um •valor y", apresentando assim uma relação de causa e efeito entreduas variáveis, quando um acontecimento ou característica se apre­sentam como fatores 'que determinam outra caracterfstica ou fe­nômeno. As autoras nos fornecem como exemplo a seguinte hipó­tese: "A falta de desenvolvimento de atividade de lazer conduz àintensificação do grau de tensão do indivíduo que vive nas cida­des". A definição da hipótese nula parece muito complicada paraos leigos em estatística (ver ibid.: 31 e Rudio, ibid.: 86-87). Detodo modo, ela é basicamente um resultado possível da observa-ção de um fenômeno que pode ser verificado estatisticamente. Adefinição do tipo de hipótese depende dos objetivos da pesquisa edo nível de conhecimento que o pesquisador possui do comporta­mento das variáveis e das possibilidades de mensuração.

No contexto das pesquisas quantitativas conduzidas segundopreceitos estatísticos, a hipótese sempre teve significados e fun­ções precisas. Conforme Luna (ibid.: 34), a primazia quase abso­luta da pesquisa quantitativa, durante anos, chegou ao ponto detornar impensável que se dispensasse o uso de testes estatísticospara encaminhar os resultados da pequisa. Quando, nas ciênciashumanas, "começaram a ser introduzidos novos modelos de pes-quisas, a estatística inferencial teve seu uso drasticamente reduzi- •do, do que decorreu uma confusão entre problema e hipótese".Para muitos, simplesmente porque confundem problema de pes­quisa com hipótese estatística, falar em problema parece evocarecos da pesquisa estatística, de modo que lhes parece desnecessá­ria a preocupação com a precisão da formulação do problema dapesquisa.

desempenha nas pesquisas não-quantitativas. Enquanto as quanti­

tativas dispõem de um padrão de base repetívelpara ser aplicado

a quaisquer pesquisas, as não-quantitativas devem encontrar seu

caminho em um emaranhado intrincado de teorias e métodos.

Além disso, enquanto as pesquisas quantitativas partem de

pressupostos epistemológicos tácitos e, portanto, sem exigênciasde questionamentos que são próprios do ernpiricisrno, o mais das

vezes positivista, as não-quantitativas devem levar em considera­

ção a posição epistemológica que assumem, uma vez que elas se

propõem não-quantitativas justamente porque colocam em ques­

tão os pressupostos das quantitativas. Corno se pode ver, tudo tem "

seu preço. E o preço das pesquisas não-quantitativas, em termos

de in vestimen to intelectual, . é . inel utavel mente al to.

De fato, teorias não caem do céu para nos auxiliar a enfrentar

as dificuldades em que a resolução de um problema de pesquisa

sempre acarreta . Muito menos cai do céu a familiaridade que pre- "

cisamos adquirir para lidar com seus conceitos ..Problemas espe­

cíficos exigem soluções específicas, do mesmo modo que solu- '

ções específicas só podem ser encontradas por meio do auxílio de

teorias que se adequam às soluções buscadas. Por isso mesmo,

escolhas teóricas não podem ser feitas por impulso, ainda menos

por imposição, ou para estar de acordo com a especialidade do.

orientador de uma pesquisa, ou, o que é pior, simplesmente pa!'a

agradá-lo. Opções teóricas só podem nascer das exigências inter­nas que o problema da pesquisa cria. Para optar, precisamos co­

nhecer as alternativas que se apresentam, Isso implica ern se de­

bruçar demoradamente sobre os livros com curiosidade e despren­

dimento, com a paci ência doconceito.

Infelizmente, o mercado pedagógico muitas vezes nos obriga

a dar a uma pesquisa a velocidade de urna pista de corrida. Por

isso mesmo, os níveis de complexidade das pesquisas devem ser

dosados de acordo com a experiência prévia que o pesquisador já .

acumulou ou não, ,e em função do tempo que-se tem para realizar

,.,­•••r.••'.•••••.,•••••••••'.'.•••••••••

182

A meu ver, essas confusões edespreocupações que 'resultam

da fal ta de informação e do descuido, sob a' alegação confortá vel

do anti-positivismo e anti-cientificisino, ' podem chegarà disper­

são mais leviana e ao extremo da perversão dó espírito que deve

guiar os procedimentos da pesquisa científica. Sem problema bem

definido e hipóteses bern elaboradas, não é possível haver pesqui ­

sa, seja ela empírica, experimental, quantitativa ou qualitativa,

teórica ou aplicada. O que difere nesses tipos não 'é a ausência ou

presença de problema e hi póteses, mas os meios, isto é, os méto­

dos, que são mais apropriados a cada uma para testar suas 'hipó te­

ses e, conseqUentemente, o modo como o processo de testagern é

diferentemente compreendido em cada urna delas. Até mesmo em

uma pesquisa puramente teórica, há sempre urna tese que é pro­

posta para ser defendida. Essa tese é o problema em relação ao

qual as idéias que se desenvolvem são hipóteses particulares "cuja

demon~traçãopermite alcançar as várias etapas que se deve atin­

gir para a construção total do raciocínio" (SEVERINO, ibid.: 161).

Para isso, é preciso, em primeiro lugar, não confundir hipótese

com evidência prévia e, em segundo lugar, dom'inar com seguran­

ça o quadro teórico em que se funda o raciocínio.

4.7 O QUADRO TEÓRICO DE REFERÊNCIA

Não apenas ternos o direito , mas também o dever de dispen­

sar, quando isso se mostra necessário, a precisão dos cálculos mate­

máticos que dá alicerce às pesquisas quantitativas. Essa dispensa '

pode se dar por motivos vários, entre eles, para buscar o acesso àcomplexidade alinear e não mensurável, à exuberância com que

pulsa diante de nós a realidade tanto na sua dimensão abstrata

quanto concreta. Quando essa dispensa se dá, entretanto, o que se

perde do seu peso em precisão e'ccnfiabilidade, deve ser compen­

sado pela fundamentação teórica de uma pesquisa. Vem daí ti gran-'

de importância do papel que esse passo, ou melhor, mergulho,

.....

Lucia Santaella . 183

....

184 Comunicação & Pesquisa Lucia Santaella•

185 •

4.8A SELEÇÃO DO MÉTODO

ções gerais. Conceitos podem ter significados diferentes depen­

dendo do quadro de referência ou da ciência em que são emprega­dos. Além disso, formam conjuntos sistemáticos logicamente coe­rentes, nisso consistindo a essência de uma teoria. É com tudoisso que temos de nos familiarizar para nos tornarmos capazes deempregar os conceitos com segurança e mesmo operacionalizá­los quando, em pesquisas aplicadas, isso se faz necessário.

Só conseguimos fazer uso realmente eficaz dos conceitos teó­ricos quando eles como que entram em nossa corrente sangüíneacom tal intimidade a ponto de não sentirmos mais sua presençacomo estranha. Só assim nos tornamos capazes de utilizá-los comflexibilidade como diretrizes para os caminhos da reflexão e nãomeramente como fórmulas rígidas a serem obedientemente apli­cadas. Quanto mais conhecemos uma teoria, no confronto comoutras teorias, mais nos tornamos capazes de dialogar com ela emenos escravizados nos tornamos à moldura referencial em quetoda teoria nos enquadra. Se as teorias são inevitáveis, para quenão se lide com a reflexão apenas com os instrumentos mentaisque o senso com.um nos fornece, que, pelo menos, elas sejam es­

colhidas através do filtro da qualidade.

Com o método chegamos ao terceiro termo, completando-se o

trio que dá suporte a uma pesquisa. Do problema para a hipótese

e desta para o método, tem-se aí a coluna dorsal que dá sustenta- •ção a um projeto de pesquisa. Como querem Laville e Dione (ibid.:

124), trata-se de dois movimentos que se unem na constituição deuma tríade coesamente configurada: quando o problema desem­boca na hipótese, tem-se o ponto de chegada do primeiro movi­mento de um itinerário de pesquisa. Este ponto de chegada, entre­

tanto, torna-se o ponto de partida do segundo movimento, indi- .cando a direção a ser seguida para que se possa resolver o proble-

uma pesquisa. Em suma, os meios para se evitar a leviandade de­

vem ser pensados.Também chamado de "fundamentação teórica", "embasamento

teórico" ou de "teoria de base", o quadro teórico de referência éalgo que brota diretamente do levantamento bibliográfico para aelaboração do estado da questão de um problema de pesquisa.Tendo brotado do estado da questão, a fundamentação teórica

implica um avanço em relação àquele, na medida em que resultade uma escolha consciente, crítica e avaliativa da teoria ou com­pósito teórico que está melhor equipado para fundamentar o de­senvolvimento da pesquisa, em consonância com a metodologia

que designa.O quadro de referência teórico consiste no corpo teórico no

qual a pesquisa encontrará seus fundamentos. Ora, todo pensa­mento existe em uma corrente de pensamento. Pensamentos têmgenealogia, situando-se, portanto, em um contexto teórico maior.Por isso, quando um corpo teórico é escolhido pelo pesquisador,este precisa ter em mente o contexto mais amplo em que esse cor­po se insere. Com isso, evita-se um problema muito comum nos

trabalhos de pesquisadores iniciantes: a salada de teorias comgenealogias bastante distintas e, muitas vezes, epístemologtca­

mente antagônicas e incompatíveis.Em suma, todo projeto deve conter os pressupostos teóricos

com os quais as interpretações irão se conformar. Eles são inevi­

táveis simplesmente porque não podemos descartar os pressupos­

tos, sob pena de ficarmos imersos tão somente no senso comum.Por essa razão não apenas temos de escolher pressupostos, mas

temos de escolhê-los com carinho, pois são eles que darão formae cores às nossas interpretações. Formas e cores devem ser esco­

lhidas se não as queremos impostas sobre nós.Teorias lidam com princípios, conceitos, definições e catego-

rias. Esses são os legítimos habitantes das teorias, entidades quesintetizam urna quantidade de fenômenos particulares em abstra-

ma de partida: verificar sua solução antecipada, Para se chegar a

urna confirmação, são os métodos que nos fornecem os meios.

Uma vez que todo o capítulo 3 deste livro foi dedicado à proble­

mática da metodologia e dos métodos, não é necessário repetiraqui o que já foi dito lá. Limito-me, por isso, a chamar atenção paraalguns pontos que, a meu ver, devem ser retidos e!TI nossa mente. .

Na etapa da metodologia, é fundamental que o pesquisadoresteja consciente do tipo de pesquisa que está realizando, poisdesse tipo dependerão os regramentos metodológicos a serem uti­lizados. A melhor pesquisa não é aquela que mais se aproximados métodos das ciências naturais, mas sim aquela cujo método éo mais adaptado ao seu objeto. Antes de tudo, é preciso explicitarse a pesquisa é empírica, com trabalho" de campo ou de laborató­rio, se é teórica, histórica, tipológica ou se tem uma tipologia hí­brida, o que, na área da comunicação, pode ser bem provável.Além do tipo de pesquisa, deve-se tentar evidenciar qual é o ân­gulo de abordagem da pesquisa: econômico, político, social, cul­tural, histórico, técnico etc. O mapa da área de comunicação quefoi tentativamente desenhado no capítulo 2 pode ser de utilidade

para essa tarefa.Mais uma vez, nesta fase relativa ao terceiro sustentáculo do

tripé, o método, em que se erige um projeto de pesquisa, cumpreenfatizar que as pesquisas não-empíricas e as não-quantitativasnão podem ser utilizadas como álibis para a negligência metodoló­gica. Se não há pesquisa sem problema, se não há rota que enca­minhe para a resolução desse problema sem hipóteses, estas exis­

tem para serem testadas. Aí está a tarefa precípua de uma pesqui­sa, contanto que se saiba encontrar para cada tipo de pesquisa o

tipo de teste que ela permite.Pesquisas não-quantitativas exigem que sejam seguidos os

mesmos passos das quantitativas, com a diferença de que a natu­reza interna desses passos difere de um tipo de pesquisa para ou­

tra. Embora não exista um padrão paradigmático a que as pesqui-

4.9 A EQUIPE DE PESQUISA .

. Neste item, cabe nomear quais são os responsáveis pela pes­quisa, desenhando o perfil de cada um e indicando com clareza

quais a tarefas que a cada membro da equipe cabe desenvolver.

sas não-quantitativas se ajustem, elas também dependem da obser­

vação, da coleta de dados, da análise dos dados coletados e de suainterpretação. Sem isso, a pesquisa fica sem chão, flutuando no ar.

Até mesmo II111a pesquisa teórica, fundamental, apresenta to­dos esses itens, quando se sabe adaptar seus significados às novassituações de pesquisa em que eles surgem. Assim, a palavra ob­servação não se restringe necessariamente à observação empírica,daquilo que estreitamente costumamos chamar de realidade, masse estende para a observação documental, estendendo-se até Ines­mo até a observação abstrativa, quando criamos diagramas men­tais da rede de conceitos teóricos com os quais estamos lidando,observando suas configurações e modificando-as conforme asnecessidades da condução..de uma argumentação. Tanto quantoqualquer outra, a pesquisa teórica também depende de uma gran­de coleta de dados, com a diferença de que esses dados são idéias,conceitos, categorias que têm de ser manipuladas técnica, criati­vamente e, sobretudo, metodologicamente. Se isso já é verdadei­ro para as pesquisas teóricas, não é preciso nos estendermos emconsiderações sobre as pesquisas aplicadas, especialmente por­que nestas a metodologia está estreitamente ligada às teorias quedão suporte à pesquisa.

Em suma, a tarefa metodológica é uma tarefa a ser enfrentadasem escusas, pois é dela que nos vêm os meios para comprovar ounão as hipóteses nas quais apostamos.

187Lucia SantaellaComunicação (; Pesquisa186

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••••e•••••••

188 Comunicação [, Pesquisa Lucia Santaella•

189 •

4.10 O CRONOGRAMA

Este item diz respeito ao planejamento do tempo de desenvol­vimento da pesquisa. Cada etapa deve ser cuidadosamente pensa­da, inclusive prevendo o tempo que cada uma deve levar para sedesenvolver. Quanto mais bem formulado estiver o projeto, mais

clareza e segurança se terá na.previsão de sua consecução.

4.11 Os RECURSOS NECESSÁRIOS

Embora a palavra "recursos" pareça indicar apenas os recur­

sos materiais, infraestruturais e financeiros, eles devem ser pensa­dos em termos mais amplos. Parece muito bom que opesquisadortambém pense no tempo que tem para se dedicar à pesquisa, so­bretudo na sua disponibilidade para assumir o modo de vida que arealização de uma pesquisa sempre exige. Enfim, olhando bem nofundo de si mesmo, neste item dos recursos, o pesquisador deve

se perguntar se terá persistência, desprendimento de muitos ou­

tros apegos ou hábitos e mesmo obstinação para efetuar seu traba­

lho. Esses recursos são, às vezes, tanto ou mais fundamentais do

que os materiais.

4.12. A BIBLIOGRAFIA

Quando fazemos tanto a revisão bibliográfica quanto à sele­

ção do quadro teórico de referência para a pesquisa proposta, ouseja, sua fundamentação teórica ou escolha de uma teoria de base,essas atividades podem nos levar a enxergar um horizonte biblio­gráfico pertinente à pesquisa muito mais amplo do que aquele quepodemos absorver enquanto estamos elaborando o projeto. Nessecaso, que, aliás, seria o ideal, no final do projeto devem aparecer

duas listagens bibliográficas, aquela que já foi consultada e aque­la que deverá ser consultada no decorrer da pesquisa. Muitas ve-

zes, esta últimajá se insinua em comentários presentes na escolha •da fundamentação teórica, visto que esta é sempre muito mais es-pecífica e especializada do que havia sido a revisão bibliográfica. ° ••4.13 NOTA FINAL ••

Enfim, a elaboração de um projeto de pesquisa exige o cuida- •

do paciente com os detalhes a que todo bom planejamento nosobriga. É preciso ter amor pelas minúcias e capacidade de olhar •de frente para as dúvidas, sem subterfúgios, sem esquivas. Saberlidar com elas, atendê-las com atenção e energia, conscientes de

que isso significa interromper o fluxo de nossas certezas e partir

para as fontes que nos vêm.do discurso do outro. •Em meio às muitas compensações que um bom projeto nos

traz, entre elas especialmente uma certa garantia de que ajornada •deverá chegar com êxito ao seu destino, a compensação mais gra­tificante se encontra naqueles momentos em que a pesquisa come-ça a adquirir força e determinações próprias, exigências internastão eloqüentes como se viessem de um corpo vivo. De agente do •processo, o pesquisador passa para o estatuto de interlocutor, apal- . •pando e auscultando as determinações internas do ' seu trabalho. •

° Mais gratificantes ainda, como se fossem iluminações súbitas no •meio do caminho, sem que saibamos bem de onde elas vêm, 'são •

os momentos em que nos defrontamos com as surpresas das des-cobertas imprevistas. .

Além de cumprir a função social de fazer avançar o conheci- •mento, tarefa precípua de toda pesquisa, pesquisas também deci­

frarn para cada ~m de nós o mistério dos prazeres muito própriose decididamente intransferíveis que a vida intelectual traz consigo.

dar a este livro, é a de fornecer dados para aqueles que estão embusca das bases e das rotas para uma tal elaboração.

Portanto, neste roteiro final, irei me limitar a renomear e fazerbreves comentários sobre os livros que julgo fundamentais paraque as bases e as rotas que aqui pude oferecer sejam comple­mentadas ou mesmo encontradas, considerando-se as omissõesque indubitavelmente cometi, quer por falta de mais espaço, querpor limitações do meu próprio conhecimento.

Assim sendo, os pesquisadores da comunicação sem familia­ridade com a filosofia, mas que gostariam de ter acesso a um pa­norama sintético ebastante acessível, podem consultar o livroAprendendo Metodologia Científica. Uma orientação para os alu­nos de graduação, de Carvalho et aI. (2000).

Para aqueles que se interessam pela discussão mais geral dosproblemas relativos ao conhecimento científico, do ponto de vistade um cientista de primeira grandeza, indico o livro de Newton daCosta (1997) sobre O conhecimento científico, um dos textos maislúcidos e proveitosos que li nos últimos tempos pela segurançaserena e clareza límpida com que o autor enfrenta questões espi­nhosas da epistemologia, lógica e metodologia das ciências.

Uma discussão competente, honesta e vívida das questõesmetodológicas na área das ciências humanas encontra-se nos li­vros de P. Demo,' a saber, Metodologia científica em ciências so­ciais (1981) e Princípio científico e educativo (1990).

Quem estiver porventura interessado em uma classificação dasciências bastante extensiva e complexa, indico o livro de BeverlyKent (1987) que explorou todos os detalhes complicados da clas­sificação das ciências de Peirce, devolvendo-nos uma versão cui­dadosa e detalhada. Uma tentativa de atualização dessa classifi­cação, frente ao prodigioso desenvolvimento por que passaram asciências desde a morte de Peirce, e aplicada a uma área específicadas ciências humanas, a teoria literária, pode ser encontrada nomeu livro A Assinatura das coisas. Peirce e a literatura (1992) .

•••­•e••••••••••e•ta••••

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ROTEIRO DE LEITURAS

Este livro foi pensado tendo em vista o pesquisador que seinicia nas atividades da pesquisa e que se vê, pela primeira vez,confrontado com a necessidade de elaborar um projeto de pesqui­sa na área de comunicação. Por isso mesmo, o livro foi idealizadotendo em mente que ele se constituísse também como um roteirode leituras tão longo quanto o próprio livro. Em todos os momen­tos que julguei pertinente, indiquei as fontes que estavam por trásdas informações, quase sempre sintéticas, assim como indiquei 0$

títulos que julguei que devessem ser eventual ou oportunamenteconsultados pelo leitor. Essas são as razões por que o texto estátodo salpicado de referências bibliográficas.

Em razão disso, este roteiro de leituras será muito breve. Osdois primeiros capítulos do livro tiveram a intenção de localizar oleitor dentro da floresta de teorias e de um possível mapeamentoda área de comunicação, com indicações de suas fronteiras e suas

vizinhanças. A pretensão é que esses capítulos funcionem comopropedêutica para a tarefa da elaboração de um projeto de pesqui-sa pois é, nesta tarefa, que tive por objetivo tentar auxiliar o leitor. "Por isso mesmo, a função primordial, que espero ter conseguido

Lucia Santaella 191

Essa aplicação poderia ser tomada como ponto de partida para se

pensar em algo semelhante na área de comunicação.Um born panorama com contribuições das ou sobre os movi­

mentos e as grandes figuras da epistemologia da segunda metade

do século XX, ou pouco antes dela, tais como positi vismo lógico,

Popper, Kuhn, Feyerabend etc. comparece em Epistemologia: A

cientificidade e17~ questão, de Oliva (org., ~990).

Extremamente célebre é o livro de Kuhn, Estrutura das revo­

luções científicas (1976). Por isso mesmo, costuma ser muito ado­

tado em cursos de metodologia da ciência. Cumpre notar, entre­

tan to, que, descon textual izada, sol ta do pano de fundo da episte­

mologia positivista, dominante po r volta da época em que o livro

foi escrito, e q~e indiretamente as idéias defendidas por Kuhn

acabam por demolir, sua obra perde muito do seu significado, es­

capando, conseqüentemente, a possibilidade de se compreender

as razõesque fizeram desse livro urna obra tão notável.

Fenômeno até ponto similar ocorre com o livro Contra o mé­

todo,' esboço de U177,a teoria anárquica da teoria do conhecirnento

(1977), de Feyerabend, esse enfant terrible da epistemologia con­

temporânea. O grande valor dessa obra está na defesa quy ela en­

cerra das forças criativas que também movem a ciência, defesa

esta que se insurge contra a visão do método científico como mo­delo rígido de regras inflexíveis. Entretanto, na"contexto da cultu­

ra acadêmica brasileira, nas áreas das humanidades, onde já im­

peram certas negligências COIll os rigores do método, uma tal de­

fesa não faz tantó sentido quanto ela pode fazer nos países comculturas acadêmicas mais exigentes do que a brasileira.

Também muito célebre e, por isso mesmo , fartamente adotada

em cursos nas ciências humanas é a obra A nova aliança: meta­

morfose da ciência (1984), de Prigogine e Stengers. Novamente

aqui, quando deslocada do seu contexto nas ciências naturais e

transplantada, sern os necessários cuidados, para as ciências hu­

marias, esta obra perde muito de seu significado, pois a meta- .

morfose da ciência a que o livro se refere se dá no ambiente das

ciências naturais. Cumpre, portanto, levar em conta os efeitos que

essas metamorfoses podem ou não trazer para as áreas de huma­

nas, para o que seria necessário conduzir as reflexões para ques­

tões epistemológicas mais complexas do que aquelas que podem

ser encontradas no livro.

Se o leitor se interessar por um aprofundamento da lÓgica crí­

tica COlTI seus ' tipos de raciocínio, abdução, indução e dedução, e

da rnetodêutica, a teoria do método científico de Peirce, poderá

buscá-lo em meu livro O método anticartesiano de C. S. Peirce

(no prelo).

Dicas sobre tiposde pesquisa especificamente na área de C.O-'

municação aparecem na extensa e did ática obra Comunicação

humana. O curso básico (1997), de Devito.

Aqueles que buscam inventários da comunicação no Brasil'e

na América Latina devem.consultar os números da Revista Brasi­

leira de Comunicação, editada pela Intercom.

Quanto aos livros específicos sobre metodologia científica, essa

literatura é muito farta. Apresento a seguir uma lista selecionada

daqueles que eu mesma escolhi para' me auxiliarem na tar~fa da

escritura deste livro.

Uma obra extensa e detalhada, muito útil para consultas ~ paradirimir dúvidas 'sobre todas as questões, envolvidas nas pesquisas

empíricas, experimentais e quantitativas é A construção do saber:Manual de metodologia da pesquisa em ciências humanas, de

Laville e Dione. Editado no Canadá, o livro passou por uma com­

pet,ente adaptação para o contexto brasileiro, realizada por Lana

Mara Siman .

Extremamente bem elaboradas, claras, didáticas e de grande

utilidade para todos aqueles que estão diante da necessidade de

elaborar um projeto de pesquisa são as obras M etodologia cientí­

fica (1982), Técnicas de pesquisa (1982) e Metodolooin do tra­

balho científico (1992), de Lakatos e Marconi. Menos extenso. '

192 Comunicação & Pesquisa .I

t

i...."':

Lucia Saritaella•

193 •••••••••••••••••••.'••.'••••••e·•••.•1.;.'

mas não menos excelente, pela clareza de sua exposição e uti)ida­

de, especialmente para os que buscam orientações para a condu- '

ção de pesquisas quantitativas, é o livro Introdução ao projeto de

pesquisa científica (1992), de Rudio.Obra quase única no contexto brasileiro pela excelente con-

traposição entre os princípios q~le regem o desenvolvimento daspesquisas quantitativas, de um lado, e as qualitativas, de outro, é

Pesquisa em, ciências humanas esociais (1991), de A. Chizzotti.

As indicações bibligráficas, distribuídas por áreas.no decorrer do

livro, são também muito úteis.Para aqueles que desejam conhecer os pormenores das exigên-

cias que devem ser atendidas por toda espécie de trabalho acadê­

mico e não apenas pelos projetos de pesquisa, um livro muito adota­

do é Metodologia do trabalho científico (2000), de A. J. Severino.

Resta, por fim, colocar muita ênfase na obra Pesquisa em co­

municação. Formulação de um modelo metodológico, de Maria

Immaccolata V. Lopes (1990) que,' tanto quanto posso ver, com

seu panorama histórico das pesquisas em comunicação no Brasil

e sua esmerada construção de um modelo para a pesquisa em co-

. munieação, continua única no contexto brasileiro. Essa obra fun­

cionou como um ponto de referência para minha almejada busca

de' complementaridade e para um diálogo cujas coordenadas es:­

pero ter conseguido, mesmo que imprecisamente, aqui desenhar.

..•••••••••••••••••••••••e.!•••••••••

194 Comunicação, s P.esq~i~a

~......... '

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