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Amostra com 29 páginas do livro "Salvando na terra e no ar", do autor Abouch Krymchantowski.

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biografia deabouch valenty krymchantowski

Salvando na terra e no ar

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Dedico este livro àqueles com compromisso e dedicação. Fazer bem feito demanda esforço,

disciplina e comprometimento! O Rio de Janeiro e o Brasil não podem mais conviver com tamanha

falta de competência e de eficiência.

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EDITORA JAGUATIRICA DIGITAL

EDITORA Paula Cajaty

REVISÃO Fernando Miranda

DIAGRAMAÇÃO M. F. Machado Lopes

IMAGEM DE CAPA Major PM Daniel de Miranda Queiroz

AUTOR [email protected]

Copyright © 2014 Editora Jaguatirica DigitalNenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida ou armazenada, por quaisquer meios, sem a autorização prévia e por escrito da editora e do autor.

CONTATO Rua da Quitanda, 86, 2o andar - CentroRio de Janeiro - RJ - CEP 20.091-902Tel. (21) 3185-5132 | (21) 3747-1887e-mail: [email protected]

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃOSINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJK96s

Krymchantowski, Abouch Valenty, 1958-Salvando na terra e no ar / Abouch Valenty Krymchantowski. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Jaguatirica, 2014.

136 p. : il. ; 21 cm.

ISBN 978-85-66605-21-1

1. Krymchantowski, Abouch Valenty, 1958-. 2. Médicos - Brasil - Biografia. I. Título.14-10801 CDD: 926.1 CDU: 929:6127/03/2014 02/04/2014

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Agradecimentos

Agradeço àqueles que me incentivaram, estimularam e confiaram no meu sonho e no meu trabalho ao longo dessas décadas de vida. Aqueles que entenderam minha vontade de fazer bem feito e me dedicar. Foram muitos, mas cito aqui alguns nomes indeléveis na minha mente:

Celso de Mello Bastos, Roberto Blanco dos Santos, Paulo Pinho, Roberto Vilarinho, Roberto Luz, Antonio Hermsdorf Maia, William Douglas Resinente, Alberto Pinheiro Neto, Mario Sérgio Duarte, Roberto Sá, Luiz Mariano Beltrame, José Duarte Pinto, Lucio Portugal de Vasconcelos, Paulo Elia, Eduardo Luiz Ribeiro, Francisco Ramos, Edgard Raffaelli Jr., Cristovão Bellot, Sérgio Wolf Meinicke, Sérgio da Cruz, André Luiz Vidal, Luiz Afonso, Rodrigo Gavina, Armando Portocarrero, Antônio Assis, Gustavo Assis, Rogério Cosendey, Luiz Sergio Cosendey, José Roberto Ferreira, Cristiano Milão, Rodrigo Duton, Fabio Machado, Daniel Queiroz, Fábio Gonçalves, Sérgio Thiago Silva, Gilson Fernandes, Marcelo Vaz, Marcelo Mendes, Maurício Gnancio, Claudio Leitão, Adonis Lopes, Carlos Sabóia, Marcelo Bigal, Hylmer Araújo e muitos outros. A Simone Magno, pela preciosa contribuição.

Agradeço aos meus filhos e a minha família por entenderem minha ausência em vários momentos em prol da dedicação à realização de meus sonhos.

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Prefácio

por William Douglas, Juiz Federal

É impossível não se impressionar ao ler as tensas e sinceras linhas de Salvando na terra e no ar. A história, em si digna das páginas de uma jornada épica, retrata a trajetória, não só de talento, mas de vocação para salvar vidas, o que já fica claro nas primeiras linhas do texto. Mas Abouch Krymchantowski não apresenta ao leitor apenas os pontos altos de sua trajetória incrível. Ele traça, de forma objetiva, clara e instigante, um panorama da saúde pública do Brasil, convidando-nos a conhecer o que ocorre nos bastidores dela, notadamente no Rio de Janeiro, por meio de críticas contundentes e comparações tão necessárias quanto vexatórias (de vexames dados pelos governantes e que, esperamos, deixem de ocorrer em breve).

Como juiz federal e professor, me deparo em diversos momentos com situações semelhantes e me reconheço em muitas das palavras do meritório autor. Sua indignação é uma velha conhecida para mim e muitos colegas de profissão: o descaso do governo, o descaso das instituições, a falta de interesse e investimento daqueles que deveriam zelar pela população... Enfim, muitas das questões levantadas pelo Dr. Abouch, perpassam a vida pessoal e profissional de brasileiros que, indignados, não conseguem transmitir ou direcionar, objetivamente, seu descontentamento. É justamente por reunir essas questões e abordar as indignações de tantos com uma “preocupação clínica” que a obra se torna ainda mais relevante. Depoimentos como este, do Dr. Abouch,

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são relevantes porque apresentam a visão de quem está efetivamente realizando e mudando as coisas, e não uma visão acadêmica – distante da práxis, mas extremamente importante – trata-se aqui da visão de alguém que está no calor dos fatos e ainda conseguiu criar coisas novas, em meio a situações tão adversas.

Não posso deixar de transmitir aqui, aproveitando esta oportunidade maravilhosa, a forma como conheci o Dr. Abouch Krymchantowski. Eu havia acabado de ser aprovado em primeiro lugar no concurso de Delegado de Polícia do Estado do Rio de Janeiro, e ingressei no curso de formação da polícia, na ACADEPOL. Lembro, como se fosse hoje, de, entusiasmado com a conquista, com as possibilidades e com a instigante carreira, aprender a ser policial. Eu tinha 23 anos de idade à época, o mais jovem Delegado da história da Polícia Civil. Na Academia, tínhamos toda a sorte de aulas, algumas mais teóricas, outras mesclando teoria e prática, mas a aula do Dr. Abouch foi totalmente diferente do que havia visto até aquele instante. Já no primeiro dia de aula lidamos com experiências reais de salvamento. Aprendemos primeiros socorros, soltos no pátio, administramos glicose e soro simulando situações reais de resgate, em suma, nas aulas era visível o esforço do professor para dar àqueles alunos ao menos as condições básicas para realizar os primeiros passos de um salvamento, até mesmo quando se tratava de um ferimento com projétil de arma de fogo – uma de suas especialidades.

Posso dizer hoje que conhecer o Dr. Abouch deixou uma marca indelével em minha vida e

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influenciou minha forma de encarar e desempenhar minha profissão. Ele reclama da falta de respeito aos seus direitos, e da falta de condições de trabalho, mas jamais utilizou isso como desculpa ou pretexto para ignorar seus deveres. Mais que isso, ele sempre foi além do dever. Por isso, o considero um exemplo de idealismo e comprometimento com a sua profissão e com o serviço público.

Os fatores mais relevantes que me fizeram perceber essas características do autor foram, primeiro, o fato – raríssimo, mas felizmente não único – de um médico famoso e bem remunerado estar ali, em meio a toda aquela falta de condição e incentivo, por amor a nem sei bem o que, mas o fato é que ele estava ali. Segundo, observar o compromisso que aquele homem tinha com seus propósitos e ideais: seus alunos sempre saiam das aulas levando consigo algum conhecimento. A admiração que surgiu naquele treinamento evoluiu gradativamente para uma amizade da qual me orgulho muito, pois, ainda como aluno, continuo a aprender com este grande mestre.

Existe muito mais na história do Dr. Abouch do que a admiração de sua atuação como policial. Ele também é um dos maiores especialistas do país em enxaqueca, tendo publicado obras a esse respeito e participado de inúmeros congressos. É palestrante internacional em sua área de atuação, e pesquisador com artigos publicados em revistas científicas de ponta. É um homem de intelecto privilegiado, um cientista, mas nem por isso deixou de ser “operacional”, como falamos no Exército (sou Oficial de Infantaria) e

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na Polícia. Abouch tem o espírito do infante, posso assegurar ao leitor. Ele aprecia a linha de frente e o contato com o inimigo. Nas suas guerras, o inimigo é qualquer coisa que possa prejudicar a vida ou a saúde de alguém, em especial do policial ferido em combate. Ele tem outras, porém, como a guerra de todo médico, de todo policial, de todo cidadão, de todo servidor público. E ele não tem a menor disposição de abrir mão da linha de frente e do combate, o bom combate, e esse livro biográfico, mas também de denúncia, é uma prova disso. Eu poderia dizer para ele, meu amigo, como diz o refrão que aprendi ainda jovem: “Os melhores são apenas bons para a Infantaria”. E Abouch é dos melhores... mesmo na Infantaria.

Talvez daí, desse poliedro de atividades e virtudes, venha a didática e o discurso envolventes no qual se estrutura o texto, ora pessoal e até íntimo, ora profissional, mas sem cair na letargia do discurso tecnicista. Então, aqui o leitor termina por entrar nesta jornada incomum e imprevisível, em muitos aspectos, que é a rotina de um oficial-médico-piloto muito disposto a salvar vidas e, também, a mudar o status quo.

Novamente afirmo que me sinto homenageado por dizer que compartilho da história desse homem, que sabe lidar com dores de cabeça (figurativa e literalmente) e honrado por poder prefaciar o texto que me reacendeu reflexões, viagens, angústias, alegrias e aquela sensação de “quero mais” que apenas bons livros conseguem deixar, ao virar da última página.

Caso você queira conhecer como funciona, ou se lembrar, ou, ainda, se animar por saber que existem

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aqueles que querem que funcione melhor (medicina, serviço público, polícia, país), então ler esse livro é altamente recomendado.

Sem mais, convido você, leitor, a partilhar dessas sensações, casos e histórias e a conhecer um pouco mais desse homem cujo talento é salvar vidas e fazer admiradores ao longo do caminho. Junto, irá conhecer um pouco mais do país onde vive e suas mazelas. E, quem sabe, de irmos mostrando as coisas, elas possam vir a mudar.

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Segundo Prefácio

por Alberto Pinheiro Neto, Coronel RR da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, Ex-Chefe do Estado-Maior Geral Operacional, Ex-Comandante do Comando de Operações Especiais, Ex-Coordenador de Assuntos Estratégicos,

Ex-Comandante do BOPE

A reputação do Dr Abouch Valenty Krymchantowski, renomado neurologista, dispensa longas apresentações, mas a trajetória do Capitão Abouch na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro merece uma atenção especial. Ela se confunde com a própria evolução das chamadas Operações Policiais Especiais e, mais especificamente, com a história do atual Grupamento de Paramédicos de Combate, uma sub-unidade do Batalhão de Operações Policiais Especiais, o BOPE formada por policiais militares exaustivamente treinados e capacitados para exercerem dupla função: combater e resgatar.

Combatentes inseridos nas equipes de operações especiais durante uma missão, têm também a atribuição agregada de atuar como paramédicos. Neste contexto, é de sua responsabilidade o atendimento de emergência e a retirada dos policiais e, em casos extremos, de cidadãos feridos que estejam em área considerada de risco no teatro operacional onde unidades subordinadas ao Comando de Operações Especiais estejam atuando. Os Paramédicos de Combate poderão também ser

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empenhados em caso de ajuda humanitária, de calamidade pública e no estado de emergência, em território nacional ou internacional, apoiando os serviços de Defesa Civil, conforme deliberação das autoridades constituídas.

Inobstante a existência no BOPE de uma forte doutrina de pronto atendimento aos policias vitimados em operações, desde sua fundação em janeiro de 1978, foi do então Tenente Abouch, no início dos anos noventa, a iniciativa de organizar, equipar e treinar, um grupo de policiais militares do BOPE dedicados a este fim. Entre “idas e vindas”, alterações de subordinação, desvios de função, baixo investimento, falta de recursos, em 15 de julho de 2011, por iniciativa do Comando de Operações Especiais, o Grupamento de Paramédicos de Combate é homologado e passa a atuar com um escopo definido e dentro de um planejamento estratégico institucional.

Nesta mesma época, o Capitão Abouch, de retorno à Polícia Militar, agora como piloto de helicóptero do Grupamento Aeromóvel (GAM), propõe ao Alto Comando da Corporação a criação de um serviço aero-médico que permita um rápido, eficiente e eficaz atendimento ao policial ferido em ação. No mês de maio de 2013, após meses de conversações entre os diversos segmentos envolvidos, o Estado – Maior Geral Operacional edita uma Nota de Instrução regulando critérios e procedimentos para o emprego do sistema de ações aero médicas na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Desta forma, literalmente os Paramédicos de Combate, os “anjos da guarda” dos policiais miltares, receberam “asas para voar”.

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No exaustivo cotidiano da guerra urbana sem aparente solução, posso testemunhar que este foi um imenso desafio. A luta por um ideal e a busca para conferir sentido e significado à uma missão na vida estão relatadas neste livro.

Uma história real, contada sem disfarces, que revela detalhes de um ser humano espetacular, com uma existência extremamente produtiva e de sua luta por uma causa justa.

Leitura indispensável para aqueles que estão à procura de inspiração para a realização pessoal e profissional.

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Como tudo começou...

Tinha 16 anos quando um de meus irmãos sofreu um acidente grave, surfando na praia de São Conrado, e foi internado no Hospital Miguel Couto. Em 1976, os hospitais públicos do Rio de Janeiro funcionavam direito e o Miguel Couto já era o melhor deles. Ele perdeu um olho com uma batida no bico da própria prancha e foi operado. Nunca aventei a possibilidade de ser outra coisa senão médico. Ia visitar meu irmão de jaleco branco para entrar fora do horário permitido. Era um curioso. Até que um dia chegou a hora de meu irmão receber um antibiótico injetável e não havia ninguém na área de enfermagem. Não pensei duas vezes. Fui até o setor e preparei a dose que ele precisava para a aplicação intramuscular. Foi meu primeiro procedimento na profissão com a qual sonhava desde pequeno. Mesmo quando jogava futebol na rua Nascimento Silva e era ao mesmo tempo atleta e médico do time, com direito a maleta de couro de primeiros socorros, já sonhava em ser médico. Um ano depois, ingressaria na Faculdade de Medicina da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, naquela época, a melhor da região.

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Resgate de policiais feridos

Quando passei no concurso da Polícia Militar, no final dos anos 1980, havia alguns anos eu treinava anualmente os paramédicos de Las Vegas, nos Estados Unidos. Todo mês de setembro, ia a campo acompanhado de policiais, dos bombeiros e do serviço privado de emergência, que na época se chamava Mercy. Na maioria dos estados norte-americanos, os médicos não saem do hospital para atender na rua, só os paramédicos. Como eu entendia de emergência pré-hospitalar, o atendimento médico na rua, e era mão de obra gratuita, ia para lá a título de observador. Recebia apenas passagem e hospedagem. Saía em campo na viatura da supervisão nas ocorrências mais graves.

Não me esqueço da primeira ocorrência que peguei. Era uma passeata contra o aborto e um indivíduo sofreu uma parada cardiorrespiratória. Eu o entubei no meio da rua, eles ficaram impressionados, consegui reverter a parada e acho que todos lá pensaram: bem, ele é safo. Em cada ocorrência, ia a ambulância do sistema privado e outra dos bombeiros ou da polícia. Eles faziam o atendimento e o sistema privado transportava quem tinha seguro, para o hospital. Hoje não tem mais o Mercy; na maioria dos estados, quem faz o atendimento privado é o American Medical Response (AMR).

Me formei em dezembro de 1982, e o sonho da maioria dos médicos era fazer um concurso para garantir um emprego público. Eu gostava de medicina pré-hospitalar, mas queria alguma coisa que envolvesse navios, helicópteros e operações militares ou policiais. Queria ser médico militar. Fazia lutas, conhecia armas,

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sabia atirar. Não pensava em ficar atendendo paciente com dor de barriga. Já tinha trabalhado como Oficial-Médico da Marinha de 1983 a 1985, quando, em 1988, fui contratado como professor da Academia de Polícia Civil do Rio de Janeiro. Dava aulas de Medicina Legal e de Primeiros Socorros, inclusive com saídas em viaturas policiais para acompanhar ocorrências traumáticas de rua. Fui o precursor do atendimento pré-hospitalar no RJ, inclusive como diretor médico da primeira firma de ambulâncias UTIs móveis, a Paramédicos Savior. Um ano antes do serviço dos bombeiros começar, o seu primeiro comandante, um Coronel Médico bem intencionado, de nome Portes, me chamou ao QG dos bombeiros para ouvir minhas sugestões sobre veículo e equipamentos a serem usados pelo GSE, o serviço dos bombeiros. Fui também, com muita honra, professor inclusive da ex-chefe da Polícia Civil do estado, delegada Martha Rocha. Então, fiz concurso para ser oficial médico da Polícia Militar. Eu queria participar com algo mais e era o jeito de eu entrar.

Como a validade do concurso era de dois anos, pedi para ficar no fim da fila. Assim, não deixaria de honrar meus compromissos com os norte-americanos. Fui chamado no fim de 1990, e, no dia 14 de fevereiro de 1991, ingressei na Academia de Polícia Militar, que, na época, se chamava Escola de Formação de Oficiais da PM (ESFO). Passei onze semanas aprendendo aquelas coisas todas que não tinham nada a ver com Medicina. Adorava. Era voluntário para tudo.

Fiquei algumas semanas no hospital da Polícia Militar e depois fui para o Centro de Tratamento

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Intensivo, já que havia ingressado como intensivista ou especialista em CTI. No entanto, meu sonho era ser do BOPE e trabalhar na rua. Como souberam que eu era atirador, colecionava armas, tinha experiência em emergências nas ruas e encaixava-me no perfil marcial, ao contrário da maioria dos médicos, me colocaram logo no Batalhão de Operações Especiais, o Bope. Fui para lá em agosto de 1991, poucos meses após o BOPE, como Batalhão, ser criado. Até então era uma companhia independente. Fiquei até 1995. O Rodrigo Pimentel, que escreveu o livro Elite da Tropa, foi meu aluno em seu curso de operações especiais. Só não fiz o curso para ser caveira porque era oficial médico e tinha que ser o médico do curso, assim como dar instruções de primeiros socorros. Tentei fazer o curso de atirador na PM. Passei em segundo lugar no exame de tiro, fiz todas as provas, mas na entrevista veio o primeiro balde de água fria. O coronel me disse: não sei o que você está fazendo aqui, você é médico, o curso é para formar instrutores de tiro, é muito caro, não é pra você não, pode ir embora.

Fiquei quatorze anos na PM, mas todos os cursos que fiz, de piloto de helicóptero, mergulho, escolta especial em moto, fiz fora e por conta própria. Me desiludia muito com a falta de apoio, principalmente daqueles médicos que só queriam o emprego e a aposentadoria.

Em 1991, criei, no próprio BOPE, um grupo de resgate de policiais feridos em serviço, sem nenhum apoio, nem dos médicos da PM. Comprei equipamento e consertei ambulâncias com o dinheiro do meu

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bolso. Peguei duas viaturas que iam ser jogadas fora, descarregadas, como eles chamam. Igualzinho àquela cena de Tropa de elite. Só o pessoal do centro de manutenção de material (CMM) do Batalhão de Choque ficou entusiasmado comigo e me ajudou. Eram uma ambulância e um carro que levava presos, aquele com caçapa. Fui até a oficina e perguntei: o que precisa, quanto é, eu compro. Equipei, consertei com o meu dinheiro as duas viaturas, a ambulância e a patamo, uma antiga veraneio, cuja caçapa foi transformada em um espaço para guardar equipamentos (FIGURA). Eu acompanhava as operações. O grupo foi criado, oficialmente, como Grupamento Paramédico de Apoio Operacional - Resgate e Salvamento, o GPAO-RS, pelo então comandante geral da PM, Sérgio da Cruz, com pouco mais de 20 pessoas, chegou a ter 50, mas com muita dificuldade, com muita gente sabotando. Nós fomos crescendo, teve um momento em que tínhamos quatro, cinco ambulâncias.

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Primeira viatura que usamos, ainda no BOPE, em 1991, para o resgate de policiais feridos. Equipada e consertada por mim, já que a PM alegou que não havia recursos para isso.

Como oficial médico, tinha muita dificuldade em gerenciar os paramédicos que não eram da área de saúde, mas sim combatentes que treinei no aspecto da administração, da disciplina e da atividade de socorrer os feridos ainda no próprio local da ação. Eu não tinha conhecimento, paciência ou tato para lidar com a parte disciplinar. Queria que a PM me desse um oficial de tropa para gerenciar o grupo e eu cuidaria apenas da parte médica e operacional. Fomos lotados no mesmo aquartelamento em que funcionavam o Batalhão de Choque, o Bope e o Primeiro Batalhão da PM. Consegui a duras penas convencer o comando a me ceder um oficial de tropa para administrar o grupo, que contava com várias praças (de soldado a subtenente) com a função de paramédicos, treinados e selecionados por mim. Recebi um jovem e brilhante capitão, André Vidal,

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que era dentista fora da PM e tinha uma carreira de destaque no Batalhão de Choque. Ele foi o responsável por tornar meu grupo uma potência na PM e perdurar por quase 20 anos até seu afastamento, para assumir o comando de um batalhão, já no posto de Tenente Coronel. Hoje, em 2014, ele é o atual Comandante do Batalhão de Polícia de Choque e tenho certeza de que será um excelente Comandante.

O meu grupo, então denominado de GESAR (grupamento especial de salvamento e ações de resgate), foi destruído por alguns oficiais médicos da PM em 2011. Nesta época, eu acabara de ser reconvocado ao serviço ativo, após 10 anos na reserva e de uma forma bastante atípica. Ninguém volta da reserva, sobretudo após 10 anos de inatividade! No entanto, eu queria voar como piloto e nesta minha segunda fase como oficial ativo, e já no Grupamento Aeromóvel (GAM), assisti à destruição do GESAR sem nada poder fazer (é aquela típica desgraça do Brasil. Não fui eu que fiz, então vou destruir...). No entanto, meu objetivo era realmente voar, embora me tenha sido pedido que criasse um serviço de ações aeromédicas, integrando as aeronaves ao socorro de PMs feridos em serviço. Atualmente, o Bope tem um grupo de paramédicos de combate e o restante dos paramédicos, que treinei, trabalha no hospital da PM, tripulando ambulâncias.

Trabalhei muito e a qualquer hora. Ainda no Bope, além de acompanhar missões policiais, que não tinham dia nem hora para começar nem acabar, várias vezes me ligavam quando eu estava dormindo, dizendo: o coronel quer todo mundo aqui às 5 da manhã. Eu

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morava no Itanhangá, na zona oeste, tinha que chegar ao batalhão por volta de 3h30 da manhã. Era feito um briefing da operação, servido um lanche. Às 5h, já estava todo mundo pronto. Eu ia com a tropa, equipado como todo mundo, com duas armas (uma pistola e uma submetralhadora 9mm), mas levava também uma mochila de 20Kg com material médico que eu comprava, para atender possíveis feridos.

Cansei de largar o que estava fazendo, muitas vezes até o paciente no consultório, para atender um ferido da PM em algum lugar. Uma vez me ligou um oficial, hoje em dia, já coronel, Contreiras, competente, dedicado. Ele era comandante do pelotão de motociclistas, eu o conheci desde tenente. A PM usava uma motocicleta que tinha uma carenagem de acrílico na frente, presa por duas hastes de metal. Dois policiais estavam trafegando pela avenida Brasil, a pista estava sendo recapeada, um deles caiu e aquela haste perfurou o olho do policial militar. Ele foi levado para o hospital de Bonsucesso, na zona norte, que ficava próximo ao local, e me ligaram. O hospital não tinha condições de atender aquele caso. Meu grupo estava dando instruções a agentes da Polícia Federal. Mandei todo mundo para lá.

Era um acidente gravíssimo. A haste entrou pelo olho e atingiu o cérebro do policial. Estava atendendo um paciente, e, do consultório, acionei por amizade um colega dos bombeiros. Nessa época, a PM não tinha helicóptero para levar esse policial para o Miguel Couto, onde ele teria melhores condições de sobreviver. O jeito foi pedir ao Batalhão de Copacabana para

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mandar uma viatura na porta do edifício onde eu estava e correr para lá. Larguei o paciente, desci por trás, com a sala de espera cheia, e da viatura, pelo rádio e com dois celulares nas mãos, fui dando instruções. Infelizmente, ele não sobreviveu. Mas sempre parei tudo para socorrer os policiais, que até hoje são os que mais precisam.

Uma outra vez estava no Batalhão de Choque, aguardando alguma ocorrência, mas como não tinha nada, por volta das 14h, liguei para o oficial de dia do Batalhão de Choque onde ficávamos e disse que resolvi dar uma passada pelo Barra Shopping, próximo à minha casa, para almoçar. Quando saí, vi parada uma das minhas ambulâncias no estacionamento do shopping. Estranhei, porque a base era no batalhão de choque, a 20km dali. Estacionei perto e fiquei esperando. De repente, vêm um cabo e um soldado. Quando me viram, levaram um susto. Disseram que tinham ido ao banco. Perguntei: como assim, vocês vieram ao banco na Barra da Tijuca? Liguei para o oficial de dia e disse que os dois estavam retornando, mas que estavam presos. E pedi para apurar como a viatura saiu e com ordem de quem. Coisas assim foram me cansando. E nunca havia reconhecimento! Minha turma de médicos permaneceu no posto de Tenente por 11 anos! As turmas de hoje, geralmente sem nenhum compromisso com a atividade, chegam ao posto de Major em 6-7 anos!

Um dos meus desentendimentos com o Bope foi por eles quererem que eu só atendesse os policiais do Batalhão de Operações Especiais, mas eles, por terem um treinamento melhor, mais específico, eram os que

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menos ficavam feridos. Quem mais precisava era o batalhão convencional da área. Eu tinha um scanner que ficava monitorando as frequências de rádio dos batalhões. Quando não tinha o que fazer, eu saía com a viatura em patrulhamento e ficava ouvindo o rádio para ver se tinha alguma ocorrência. Quando tinha, eu corria.

Em 2001 desisti e decidi me afastar. Fiquei vários anos na reserva, mas nunca parei de estudar o assunto. Um pouco depois, a PM criou sua aviação. Eu tinha feito o curso de piloto em Fort Lauderdale, Estados Unidos, mas achava que só ia voar por lazer, e que por ser médico nunca teria espaço como piloto militar. Até que em 2005 o chefe do gabinete militar da governadora na época, a Rosinha Garotinho, me disse: se você for piloto comercial e tiver curso teórico do helicóptero Esquilo, está nomeado e vai poder voar nos helicópteros do Governo do RJ. Era o Coronel Mauro Moreira, de excelente caráter, e que tinha sido Capitão do batalhão de Choque na época em que eu era do BOPE. Ele acompanhou de perto toda a minha trajetória na PM. Tinha gente que chegava para pilotar na PM sem nenhuma hora de voo, ainda ia aprender. Eu tinha feito dois anos de voo executivo nesses helicópteros e nunca havia perdido o contato com a atividade policial. Dei muita sorte. Peguei oficiais brilhantes, tanto no comando da PM quanto no Grupamento Aeromóvel (GAM). Muitos ali me ensinaram como fazer voos policiais e como ser exemplo de caráter e de oficial PM. Alguns desses nomes estão na minha lista de agradecimentos desse livro.

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Quando voltei, em 2011, comecei a lutar pela implantação do sistema de ações aeromédicos, para atender ao pedido do meu amigo Coronel Pinheiro Neto, um dos mais brilhantes oficiais que a PM teve. No dia 6 de maio de 2013, finalmente foi publicada no Boletim da PM a normatização do serviço, escrita por mim, com quase tudo que tínhamos pedido. Atualmente, a PM tem um sistema para atender ao policial ferido, mas, se a população precisar, podemos auxiliar os bombeiros. Em uma operação de segurança pública, em casos de tiroteio, para atender feridos, o helicóptero pode pousar em qualquer lugar, até no meio da rua; só é preciso informar aos órgãos de controle de tráfego aéreo. Basta ter bom senso. Os controladores de voo da área terminal Rio sempre nos apoiam. Vibram com nossas missões. São excelentes!

Outro dia fui para uma missão de repressão a crimes ambientais do INEA em Pedro do Rio, distrito de Petrópolis. No caminho fomos acionados para a queda de um helicóptero da polícia civil em treinamento no bairro do Caju. Voltamos, trocamos o equipamento e em minutos estávamos lá. Todos já tinham sido socorridos, mas fomos ajudar, pousamos ao lado, na terra, ali mesmo. Em outra ocasião, fui com o ex-Secretário Estadual Carlos Minc, com o qual é sempre um grande prazer voar, fechar um lixão clandestino em Maricá. Apesar de todas essas missões nós não temos liberdade total, como o pessoal da polícia civil, que recentemente pousou em plena praia de Copacabana para perseguir assaltantes. Se fôssemos nós, estaríamos hoje dirigindo viatura em algum local afastado do interior do RJ.

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No dia da primeira grande manifestação no Rio de Janeiro, no dia 20 de junho de 2013, fiz diversos voos. Pela manhã, voei na aeronave-câmera, mas não gosto, porque tem que ficar muito parado. Depois fiz cinco voos com o helicóptero lotado de munição e bombas. Voando baixo, no meio da camada de gás lacrimogênio, sobre o centro do Rio. Botaram fogo na cabine da PM. Eu não sabia que seria assim. A polícia toda estava de prontidão, e não tínhamos hora para sair. Cheguei às 7h e saí de lá meia-noite.

Cada voo levou cerca de trinta minutos. Na hora do jogo Espanha x Taiti, pela Copa das Confederações, passei na lateral do Maracanã umas seis vezes. Enquanto isso, na Candelária, já se formava aquela multidão, 300 mil pessoas. Voar à noite é problemático, você perde algumas referências, e ainda havia os helicópteros das TVs, prédios dos dois lados... Mas se me perguntarem se a esta altura da vida ainda gosto de voar, digo que sim. É melhor do que um dia em que não se tem nada de mais para fazer. Melhor do que ficar o dia todo atendendo 25 pacientes no consultório.

Poder ajudar policiais feridos em ação é algo sem preço. A Polícia do Rio de Janeiro, militar ou civil, nunca foi valorizada pela sociedade. Todos criticam, mas não mandam seus filhos para melhorar a situação, participar. No entanto, poucos sabem como são as rotinas de trabalho e os riscos imensos da atividade. Pior ainda, em caso de ferimentos em serviço, são os hospitais falidos e caóticos que vão receber esses policiais, apesar do esforço de muitos médicos e enfermeiros em salvá-los. Minha opção pela vida de policial, em conjunto com

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a vida médica, sempre foi pensando nisso. Não medi esforços e sacrifício para realizá-la, mas nem sempre fui bem compreendido.

Resgate a um PM ferido com o uso do helicóptero

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Impresso pela Singular Digitalno outono de 2014

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