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Lauro Carvalho da Silveira UFRN [email protected] Nátaly Santiago Guilmo UFRN [email protected] Ruy Mauro Marine: Repensando a democracia latino-americana GT17: "Democratização e teorias democráticas na América Latina contemporânea" XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE & PRÉ-ALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012 UFPI Teresina, PI

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Lauro Carvalho da Silveira – UFRN – [email protected] Nátaly Santiago Guilmo – UFRN – [email protected]

Ruy Mauro Marine: Repensando a democracia latino-americana

GT17: "Democratização e teorias democráticas na América Latina contemporânea"

XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE & PRÉ-ALAS BRASIL.

04 a 07 de setembro de 2012 – UFPI – Teresina, PI

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“A ciência não é um conjunto de procedimentos destinados a embelezar ou

escamotear a realidade. Cabe à ciência lidar com os fatos, embora isso implique a perder

a elegância e sujar as mãos” (MARINI 2005b, p. 235)

RESUMO O pensamento e o povo latino-americano teve - e ainda tem - que lutar para

conquistar seus espaços. Este trabalho visa expor a importância teórica e política

de Ruy Mauro Marini. Realizando um breve resgate de depoimentos sobre o autor

e de seus principais artigos. Fundamental para evidenciar o caráter classista do

processo de desenvolvimento e da chamada democratização no continente latino,

através de uma teoria crítica, Ruy Mauro Marini demonstra que a resposta ao

período de ditadura e resistência na América Latina foi dada através do sufrágio

universal, leis, da mídia aberta e da cidadania. Assim, a ideologia burguesa

desvinculou socialismo e democracia, associando-a ao individual. Relacionando

conceitos como: Estado, Subdesenvolvimento e Dialética. Ruy Mauro Marini fez

parte de um grupo de autores latinos fundamentais para demonstrar que

democracia e socialismo são inseparáveis.

Palavras-Chaves: Ruy Mauro Marini, América Latina, Democracia, Dependência,

Subdesenvolvimento

1 INTRODUÇÃO

Com o fim da ditadura militar surgiu uma grande expectativa com a

renovação cultural brasileira. A intelectualidade que tanto produziu lutando por

uma nova sociedade teria a chance de frutificar em liberdade. Entretanto, a

renovação intelectual não ocorreu. Com a “transição democrática” regida pelo

imperialismo os intelectuais brasileiros eram os intelectuais da ordem.

O radicalismo político – tão necessário nos países subdesenvolvidos e dependentes – foi derrotado pela ditadura e, no mesmo movimento, o controle da rebeldia intelectual impediu que a divulgação desta extraordinária tradição teórica da qual Marini era protagonista de primeira linha tivesse a merecida divulgação entre as novas gerações e no interior das organizações das classes subalternas. (OURIQUES, 2012)

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Este trabalho busca realizar uma pontual colaboração na imensa tarefa de

retomar um grande pensador latino-americano. Resgatando de forma resumida a

história e as principais contribuições teóricas deste autor capaz de inovar no

método de análise e na prática política.

2 A PRÁXIS DE RUY MAURO MARINE

Ruy Mauro Marine nasceu em 1932 em Minas Gerais, de família

tradicional, logo cedo teve acesso aos estudos e desde então nunca mais parou.

Estudou na atual Universidade Federal do Rio de Janeiro. Entre 1958 e 1961

cursou sociologia brasileira em Paris. Em seguida, passa dois anos lecionando

Ciência Política na Universidade de Brasília (UNB), mas é exilado no México em

64, com o golpe militar. Continuou lecionando no Colégio do México e depois no

Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade Nacional Autônoma do

México, anos depois, se muda para o Chile. No exterior escreve suas principais

obras e no auge de sua carreira intelectual, em 1984, volta a UNB para dar aulas,

mas é “praticamente ignorado pela academia, pelas forças político-partidárias e

pela esquerda em geral” (STEDILE, TRANSPADINI. 2005 p. 12). Em 1997, falece

devido a um câncer.

Com forte rigor metodológico e grande disciplina Ruy Mauro Marini foi um

intelectual brilhante. Em 1969, exilado, publica o seu primeiro livro, Subdesarrollo

y Revolución1, em 1973, é publicado o “Dialéctica de la dependencia”, um

trabalho de bastante fôlego capaz de marcar uma geração inovando no debate

sobre desenvolvimento dependente da América Latina. Com um pensamento

contra hegemônico, Ruy Mauro Marine junto a Andre Gunder Frank, Vânia

Bambira e Theotônio dos Santos refletiram sobre o desenvolvimento e espoliação

pelo capitalismo internacional dos países de Terceiro Mundo – em especial a

América Latina – formando a “Escola da Dependência”.

1 O livro fundamental na produção intelectual da América Latina. Na época gerou grandes polêmicas com pensadores contrários ao marxismo como Fernando Henrique Cardoso e hoje é considerado um clássico. Foi o primeiro a fugir ao dogmatismo para explicar através da luta de classes e da economia política a exploração política, produtiva e cultural do continente. Entretanto, lamentavelmente, após quase 50 anos, em 2012, foi publicado no Brasil. O livro acaba de ser lançado por uma iniciativa do Instituto de Estudos Latino Americanos.

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Em nosso contexto, é raro encontrar ou um militante capaz de formular

pensamentos críticos ou teóricos que atuem fora de seus gabinetes – o que

deveria ser uma característica corriqueira se torna notável. Ruy Mauro Marine

possuía além de grande capacidade de formulação uma forte participação

política. Foi o fundador e dirigente da Política Operária (Polop) no Brasil e

dirigente do Movimento de Izquierda Revolucionaria (MIR). “Estamos, portanto,

diante de um duplo desafio (...) e para o qual as novas gerações sequer estão

sensibilizadas: a difícil relação entre teoria e práxis” (OURIQUES, 2012). Essa

atuação política o impulsionava a produzir textos que serviam como resposta a

realidade vivenciada realizando análises “desde dentro” – fugindo da lógica

academicista. Ruy Mauro Marine possuía uma prática pedagógica incessante,

tanto nas aulas como em reuniões com militantes estudantis, dirigentes operários

de minas de carvão ou tecelagem. Sempre preocupado em formar quadros com

capacidade de reflexão, formação e exposição oral ou escrita para qualquer

público, “Ruy formava, ensinando a cada educando a aprender a conquistar graus

de autonomia, liberdade e criatividade” (GUTIÉRREZ, 2005 p. 266).

3 A ESCOLA DA DEPENDÊNCIA

Para se entender o contexto político que Marini estava inserido e

compreender o quanto importante foram suas obras devemos retomas algumas

idéias que ilustram o passado intelectual brasileiro a fim de averiguar como se

deu tais debates.

Foram três escolas com grande elaboração teórica e uma quarta que

detinha influência entre o movimento de juventude mais pouca formulação sobre a

realidade brasileira.

3.1 CEPAL

Criada no fim dos anos quarenta, a Comissão Econômica para a América

Latina (Cepal) foi um organismo pensado pela Organização das Nações Unidas

(ONU) com o objetivo de pensar quais as razões para os problemas da America

Latina. Na mesma época do seu surgimento, também são criados o Fundo

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Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Dois de seus principais

intelectuais eram os brasileiros Celso Furtado e Ignácio Rangel.

Segundo esta escola, o desenvolvimento desigual explicaria a

desigualdade em nosso continente. Os países de centro teriam vantagens nas

relações de troca com as periferias, os países centrais apresentavam uma

economia mais homogenia, com grande variedade de produção e de alta

tecnologia. Já os países periféricos contavam com produtos desvalorizados, uma

economia desigual, com poucas especialidades e baixas tecnologias. Por esta

razão os produtos da periferia teriam um preço mais baixo o que acarreta em

desvantagens nos termos de troca dos produtos gerando subordinação e atraso

econômico da periferia.

A solução para tal problema seria industrializar, substituindo importações,

criando novos mercados nas periferias e incorporando novos setores produtivos a

essas economias. Assim, o progresso técnico não seria privilegio dos centros. A

Cepal concebia a responsabilidade de desenvolver tais processos ao Estado.

Seria o Estado que buscaria dinamizar e incentivar políticas públicas para o

desenvolvimento econômico das periferias com uma série de mudanças

estruturais das sociedades periféricas. Porém, sem reflexão crítica ao capitalismo

a exploração do trabalho, concentração da propriedade privada, concentração da

renda, da riqueza dos países. A Cepal defendia que através do desenvolvimento

das periferias poderíamos partir para um capitalismo menos desigual.

3.2 TESES DO PCB

As teses do Partido Comunista Brasileiro (PCB) eram hegemônicas na

esquerda brasileira da época. O PCB exercia grande influência na sociedade

brasileira – de artistas às universidades. Seus teóricos, Nelson Werneck Sodré,

Moises Vinhas, entre outros, contribuíram bastante para o pensamento da

esquerda brasileira.

Esta linha política ideológica aplicava de forma mecânica o materialismo

histórico e as leis da economia política à realidade brasileira. Era uma espécie de

“recorta e cola” dos manuais do marxismo revisionista elaborados pelo Partido

Comunista da União Soviética (PCUS). Nos anos 60, firmaram a idéia que o Brasil

seria pobre e desigual, por ser constituído de relações pré-capitalistas na cidade e

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feudais no campo, não tendo as forças produtivas desenvolvidas e sofrendo do

imperialismo estadunidense. Esta análise concluía a importância de, no Brasil, se

apostar no desenvolvimento das forças produtivas para superar o atraso

econômico social. O que influenciou fortemente toda a estratégia política do maior

partido de esquerda da época. Gerando alianças com a burguesia nacional contra

a elite conservadora e atrasada, buscando uma revolução burguesa para concluir

a etapa capitalista e, depois, lutar pela superação da classe trabalhadora.

Tais teses não eram as únicas dentro do PCB, mas era a hegemonia. O

que gerou varias dissidências no partido. Uma das mais significantes foi Caio

Prado Júnior, que travou forte embate teórico e influenciou fortemente intelectuais

da época. Com “A revolução Brasileira” Caio Prado defende a existência de um

capitalismo no Brasil e a necessidade de um projeto popular para o Brasil, ou

seja, “uma revolução nacional, libertadora, popular e não apenas uma etapa da

revolução burguesa” (STEDILE, TRANSPADINI, 2005 p. 19), apesar de ser um

grande avanço, comparado ao pensamento hegemonico do PCB, Caio Prado se

limita a formação histórica brasileira, não avançando para os motivos da

dependência da America Latina ou mesmo do Brasil. Marini irá fazer fortes criticas

as idéias de ele no artigo: “Crítica à revolução brasileira de Caio Prado Júnior”.

Com o golpe de 64, as idéias do PCB foram superadas, provando a inviabilidade

do marxismo esquemático.

3.3 - FOQUISMO

O foquismo se caracteriza por uma corrente política ideológica que

influenciou bastante a juventude, porém, contava com poucas contribuições

teóricas relativas à realidade brasileira. Presente tanto no Brasil, como em vários

países da America Latina. Seu principal intelectual se tratava do Francês Regis

Debray. Na interpretação foquista a Revolução Cubana (1959) foi reduzida a uma

aventura jovem, não levando em conta os processos históricos de acumulo da

sociedade cubana, além dos prolongados processos de lutas sociais que o povo

cubano participou ativamente. Sem uma interpretação teórica clara ou uma linha

política metodológica planejada, suas idéias buscavam a derrota na luta armada

da burguesia, e depois mudar o Estado. No contexto de 64, com a ditadura e

impossibilidade de promover debates, o foquismo cresceu arrastando consigo

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muitos jovens sem acesso aos debates, ou frustrados com os rumos da terceira

internacional.

3.4 A ESCOLA DA DEPENDÊNCIA

A Escola da Dependência “remava contra a maré”, ao contrario da Cepal e

das teses do PCB, ela não tinha uma ampla aceitação na sociedade. O cenário

muda quando a esquerda brasileira sofre grande derrota política e ideológica e as

idéias cepalianas não alcançam o resultado esperado. O Brasil e a America Latina

ainda inseridos no contexto de exploração e com os níveis de concentração de

renda ainda mais elevados necessitam de respostas e projetos. Ruy Mauro

Marini, Andre Gunder Frank, Theotônio dos Santos, Vânia Bambirra e Agustin

Cuerva

com base no materialismo dialético e histórico, como método explicativo e de ação transformadora, e na teoria do desenvolvimento do imperialismo, explicam o caráter desigual, necessário para que esse modo de produção permaneça alcançando seus fins: a apropriação privada da riqueza e da renda, baseada na superxploração do trabalho” (STEDILE, TRANSPADINI 2005 p.29)

A principal obra teórica dessa corrente de pensamento é considerada a

“Dialética da dependência”. Nele se encontram os elementos centrais para se

entender os motivos da dependência da America Latina. Neste livro Ruy Mauro

elabora concepções resgatando clássicos da literatura marxista e sustando a

necessidade das reformas estruturais com a saída pelo socialismo.

Baseando-se em Weber e Schumpeter teóricos como Fernando Henrique

Cardoso, José Serra e Enzo Faletto constituem outra vertente da Escola da

Dependência. Todos os teróricos desta escola entendiam que a América Latina

era dependente e isto deveria mudar. Porém, a fração capitalista via internamente

os motivos desta dependência, ou seja, o Brasil necessitava transformar o modo

conservador que os empresários nacionais agiam, passando a se relacionar

diretamente e de forma interdependente com os países mais avançados

tecnologicamente. Esta solução se preocupava com o avanço do

desenvolvimento – não só brasileiro – do capitalismo mundial.

Isso mostra que são diferentes as concepções internas ao debate da

dependência. De um lado, os marxistas, que defendiam uma ruptura social para

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uma possível mudança e a inviabilidade de igualdade no capitalismo. Do outro, os

capitalistas weberianos e schumpeterianos, que defendiam maior iniciativa

privada e maior criatividade das elites para superar o atraso.

Como resultado dessas disputas e da hegemonia liberal nas universidades,

atualmente, quando se trata de dependência, comumente só um lado deste

debate é estudado na academia. Mesmo com uma derrota teórica é Fernando

Henrique Cardoso o porta voz das teorias da dependência no Brasil, mesmo

sendo o mineiro Ruy Mauro Marine a grande referencia mundial da Escola da

Dependência.

4 DIALÉTICA DA DEPENDÊNCIA

Na obra de Ruy Mauro Marini se destaca a importância da diferença entre

ortodoxia e dogmático. Ele acreditava que um dos grandes erros do marxismo foi

o dogmatismo, pois não existe uma verdade única, apenas um caminho, que

esteja sobreposto a qualquer realidade. Já a ortodoxia, se baseia na exigência e

no rigor do método para uma fundamentar os fenômenos estudados. Assim, é

importante compreender que o método como caminho explicativo, teórico e

prático, para o entendimento da realidade em permanente processo de

transformação.

Na “dialética da dependência”, Marini utiliza o método materialista

demonstrando que a historia da America Latina não é uma historia individual de

um continente, separada da história resto do mundo, ela é integrada a uma

historia global. Ruy Mauro busca – indo além de entender o sistema de dentro ou

de fora – compreender a forma de articulação do capitalismo na América Latina e

pelo mundo, ou seja, o importante é não apenas entender como, a América Latina

se porta no jogo de acumulação mundial, mas também como isso modifica,

inclusive nos países mais desenvolvidos, mecanismos de exploração.

A dependência é vista, por Marini, como uma relação de subordinação

própria do sistema capitalista, sendo o mecanismo central de submissão do

território, do espaço, da sociedade, dos países periféricos, subdesenvolvidos,

como forma de perpetuação do poder de reprodução do capitalismo na esfera

internacional e só acabaria com o fim da exploração capitalista, da exploração, da

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concentração de renda e apropriação privada. Já “a superexploração é um

mecanismo particular desenvolvido pelos capitalistas da America Latina para

reverter sua perda de lucro na relação de dependência com o mundo” (STEDILE,

TRANSPADINI 2005 p. 33). Esse avanço teórico sustenta a explicação da

particularidade da exploração capitalista na América Latina.

É mediante o aumento de uma massa de produtos cada vez mais baratos no mercado internacional, que a América Latina não só alimenta a expansão quantitativa da produção capitalista nos países industriais, mas também contribui para que sejam superados os obstáculos que o caráter contraditório da acumulação de capital cria para essa expansão. (MARINI, 2005a. p. 148)

Enquanto a exploração deve ser vista como criação de valor, a superexploração

serve para os capitalistas das periferias compensarem suas perdas nas relações

desiguais capitalistas.

5 LUTA DE CLASSES NA AMÉRICA LATINA

Com a forte industrialização que a América Latina passou na década de 60

velhas burguesias foram abaladas, assim como as camadas pequeno-burguesas

e semi-proletárias. Gerando um desmoronamento dos sistemas de dominação e

das formas de organização dos Estados Latinos2 concomitante a crise econômica

mundial que ocorria no período, exigiu uma nova forma de produção para uma

nova divisão internacional do trabalho. O contexto mundial era de

“desenvolvimento do movimento revolucionário na Ásia e Oriente Médio...

grandes lutas operárias nos países capitalistas avançados... a distância crescente

entre o bloco imperialista e os países socialistas...” (MARINI, 2005c p. 244) com

repercussão na América Latina tornando velhas formas inúteis. O

desenvolvimento econômico se estendeu para os anos 70 e assim como o

capitalismo, teve um crescimento acelerado no continente: o proletariado cresceu,

se reuniu conquistou direitos, lutando contra longas jornadas, desemprego, baixos

salários... Aumentaram seu peso social e passaram a contar com o “proletário

agrícola”. As “camadas médias assalariadas” também cresceram neste período e

2 “Mas o decisivo é o que o faz em uma situação política transformada: a ruptura das antigas

alianças de classes e o desmantelamento do populismo, colocaram o movimento operário frente a um Estado que é órgão explicito da dominação da classe burguesa”. (Ibidem, p. 245)

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adotaram formas de luta e organização semelhante ao proletariado. A quantidade

de jovens, estudantes secundaristas e universitários, aumentou bruscamente no

período, em decorrência do forte crescimento demográfico que a América Latina

vivia, essa juventude teve grande peso político no continente optando por se

organizar e ir à luta. Somando-se a novos sindicalistas e novas feministas, estas

em um contexto de “modernização” ampliaram seus horizontes de construção ao

lado do proletariado.

As lutas sociais se modificam de acordo com as transformações sociais, na

America latina não foi diferente. A polarização das forças políticas no contexto da

Guerra Fria é concomitante à urbanização massificada, à salarização, ao acumulo

de resistência popular contra regimes militares e tecnocráticos e, principalmente,

à origem dos movimentos sociais. Na luta contra a forte repressão sobraram

poucas trincheiras para os movimentos que buscavam o poder popular3.

Estimulada por uma burguesia que taticamente assumia a liderança dos

processos de “democratização” e aceitava carregar a bandeira da “democracia”,

tratando de fincá-la no terreno da institucionalidade e do corporativismo

encabeçando campanhas como as “Diretas Já” e estimulando os movimentos a

precipitar suas especificidades. Nesse cenário, coube as massas lutar ou pela

educação ou moradia ou terra ou no local de trabalho ou pelo feminismo ou no

bairro ou pelo meio ambiente ou como juventude...

Nascia assim em nosso continente, filho do imperialismo com a burguesia,

o projeto democrárico-liberal que se firmava no Congresso Nacional aonde, por

meio da elite política, a burguesia garantiria seu projeto e asseguraria o

neoliberalismo. Ruy Mauro Marine indica que o modelo de sociedade sustentado

pela burguesia não é isento de caminhos e possibilidades para a conquista do

poder popular devido a existência de meios para reivindicação de direitos.

Quando a burguesia transfere o controle dos mecanismos de produção e

circulação dos bens e serviços ao Congresso Nacional, possibilita ao movimento

popular “lutar por seu próprio esquema de regime social, baseado na organização

das massas em função de seus interesses imediatos e em sua participação direta

3 “Pouco estudado e quase sem bibliografia referente ao tema, o fenômeno do poder popular é

hoje praticamente ignorado em nossos estudos sociológicos e políticos”. (Ibidem, p. 226

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nos espaços” (MARINI, 2005d p. 228). Deste modo, “a tarefa central da esquerda

latino americana consiste em formular uma alternativa viável a esse projeto,

desenvolvendo-o com as massas” (MARINI, 2005d p. 229) com unidade e

pluralismo político e ideológico.

O controle operário, a co-gestão e auto-gestão das empresas; a luta eleitoral e a participação no Parlamento e nos governos locais; a participação e o controle popular sobre as políticas orçamentária, educacional, de saúde, de transporte público, junto à reinvindicação de uma maior autonomia regional e local; a democratização dos meios de comunicação e o rechaço à censura; a crítica às desigualdades de base econômica, étinica ou sexual: esses são alguns instrumentos que as massas estão utilizando, em todos os lados para defender seus interesses, elevar sua cultura política e amadurecer seus espírito revolucionário. É por essa via que as massas estão capacitando para – diferencialmente do que ocorreu até o momento nas revoluções socialistas – assumir, elas mesmas, a direção do processo de transição socialista. O que no final das contas, é a única garantia segura de seu êxito (MARINI, 2005f p. 220).

A capacidade dos países latino-americanos para se auto determinar

aumentou nos anos 70, mas na década seguinte os Estados Unidos encontraram

formas de modificar este quadro: com o Fundo Monetário Internacional e o Banco

Mundial, os governos latinos foram aprisionados mais uma vez, gerando uma

onda de privatizações em nosso continente. Ruy Mauro Marine aponta a

necessidade de que os Estados da América Latina ajam em prol de suas nações

e não do capital privado, nacional ou internacional. O protecionismo exagerado,

por exemplo, é pratica decorrente para estimular as economias nacionais, porém

apenas transferem lucros para empresários privados. As privatizações premiam a

burguesia com o patrimônio publico. Não existe desenvolvimento real sem

educação, afinal o continente deve ser capaz de acompanhar, e principalmente

criar, as mudanças técnico-científicas, e Educação necessita de investimentos e

planejamento.

Só existirá integração da America Latina com a economia mundial se existir

integração dentro do continente. O que envolverá esforços multinacionais dentro

deste bloco buscando o desenvolvimento conjunto. Mas é importante ressaltar

que essa integração não ficará no campo das grandes negociações ou dos

decretos, ela deve ser projeto político cultural do povo latino. E a esquerda tem

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papel fundamental – organizando, mobilizando e reivindicando – enquanto grande

entidade internacional4 e ao mesmo tempo, nacional estreitamente ligadas às

raízes históricas, culturais e étnicas de cada povo5. O marco que começa a forjar

o mundo de amanha – a construir o sonho de Bolívar e Che Guevara– é a

integração internacional atrelada ao direito a plena autonomia das nacionalidades.

(MARINI, 2005d p. 232).

Com Che Guevara nosso continente aprendeu a importância da luta

armada, ainda hoje para pensar a revolução continental ela deve ser considerada.

Segundo Ruy Mauro Marini, a luta armada é a fase superior da revolução latino-

americana6, o que não justifica uma visão etapista e mecanicista dos processos

históricos, para o autor, eles devem ser construídos hoje.

4 A partir da década de 90 o mundo passou a contar com um movimento social capaz de

responder às preocupações de Ruy Mauro Marine, cumprindo o papel de “articulação internacional de trabalhadores” e ao mesmo tempo construindo “identidade em contraposição ao modelo dominante de agricultura, afirmando a economia, a cultura, os valores, os modos de vida do campesinato.” A Via Campesina estabelece relações com movimentos e organizações de diversos países, sendo estimulada e incentivando as organizações nacionais em suas bandeiras especificas, pois entende que o formato do capitalismo atual é mundial e está em todos os espaços, grandes e pequenos, devendo ser combatido em todos estes delineando assim “um projeto de sociedade, (...) O projeto de contra-hegemonia da Via Campesina envolve diferentes elementos. Por um lado, representa uma re-significação da própria idéia de soberania, a qual passa a ser baseada nos povos e não nos Estados nacionais e que inclui novas relações norte-sul...” Disponível em: http://www.uel.br/grupo-pesquisa/gepal/terceiro simposio/flaviabraga.pdf 5 Para pensar a dialética da dependência Ruy Mauro Marine é necessário entender que

imperialismo não é apenas econômico ou político, é cultural. A necessidade de dialogar com outras sociedades e culturas foi potencializada pelo capitalismo, impulsionando mercados consumidores e na busca pela “mão de obra” barata. E este processo de globalização é interiorizado e encontrado em nosso cotidiano. Até que ponto a globalização pode levar à uma Americanização Global? Mesmo com a hegemonia mundial dos Estados Unidos, não existe um risco de homogeneização das culturas. O que Ruy Mauro Marine demonstra no âmbito econômico, subimperialismo, éexiste no âmbito antropológico. Arjun Appadurai demonstra que “para uma política de menor escala, há sempre um receio de absorção cultural da parte da política de maior escala, especialmente das que se encontram na vizinhança” (APPADURAI, 1999 p.331), ou seja, com a globalização existe a possibilidade de dominação e influência entre os mais diversos países, independente de serem potências mundiais. Ainda sim, os processos culturais não são monólogos, são sempre diálogos, construções, relações de poder e não se repetem. O povo tem o poder, o desafio e a possibilidade constante de “inventar cultura, refletir sobre ela, fazer experiências com ela, recordá-la, discuti-la e transmiti-la” (HANNERZ, 1997). 66

Embora Ruy Mauro Marine não exclua a possibilidade de uma revolução pacífica, em um contexto de “fortalecimento constante do socialismo e o avanço permanente do movimento revolucionário mundial, a correlação de forças internacional tornar-se-ia inteiramente desfavorável à burguesia. Isso assentaria as premissas para as revoluções pacificas, capazes de praticar em ampla escala o compromisso e o pluralismo, o que economizaria custos sociais e o sofrimento dos povos que estivessem em condições de praticá-lo” (MARINI, 2005f p. 218). Entretanto essa realidade está distante da América Latina.

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Na história da esquerda latino-americana não faltaram erros, do

anarcosindicalismo para o ultra esquerdismo depois reformismo para militarismo

em seguida ao vanguardismo, sempre as voltas com o reformismo... Tantos

equívocos servem para analisamos experiências, aprendermos. É necessário,

portanto, ir além

Trata-se (...) de investigar e descobrir as perspectivas de transformação social que o atual desenvolvimento das forças produtivas está abrindo, na medida em que este tende a superar as diferenças entre o campo e a cidade, homogeneizar no âmbito mundial as condições técnicas de produção e internacionalizar o processo de trabalho. Trata-se também de determinar até que ponto esse desenvolvimento, que privilegia o trabalho intelectual e os serviços produtivos, afeta o conceito de proletariado, pelas definições que introduz no interior da classe trabalhadora. Trata-se, sobretuto, de entender as novas formas de ação e os mecanismos de participação que as massas estão cirando para intervir de modo mais ativo no plano de gestão empresarial e política (MARINI, 2005f p. 219)

Trata-se também de conquistar a unidade. Esse desafio será superado apenas na

“luta diária com as massas, que implica a discussão ideológica sobre os

problemas concretos, a busca de táticas e formas corretas de luta que permitam o

pleno desenvolvimento dessas práticas” (MARINE, 2005c p. 248).

7 SOCIALISMO E DEMOCRACIA

Socialismo e Democracia não são sinônimos, mas em sua expressão

superior, são inerentes. Muitos pensadores já defenderam que sociedades

socialistas seriam altamente autoritárias, da mesma forma, a ideologia burguesa é

capaz de defender uma democracia que não necessita de coletivizar os meios de

produção. Entretanto, Ruy Mauro Marine acredita que na essência desses

conceitos eles são inevitavelmente inseparáveis, pois a democracia plena conduz

ao socialismo. Afinal, se a maioria se governasse, não o faria em prol de uma

minoria. Entretanto, essa relação democracia–socialismo é dialética e sempre

estará inserida em um tempo histórico e na realidade de cada país. Diante de

tantos conceitos e definições para a democracia, um detalhe sempre é capaz de

explicitar qual tipo de democracia está em jogo. “a democracia socialista converte

em sujeitos políticos reais as grandes massas populares, o que a democracia

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burguesa limita e reprime” p. (MARINE, 2005f p.209) outro fator e a governança

por consenso e negociação, nunca pela força, por mais que “na perspectiva

histórica essa imposição trate de se justificar como uma medida destinada a

garantir a democracia no longo prazo” (MARINE, 2005f p. 210)

Ruy Mauro Marine defende uma democracia que se expresse não somente

em instituições jurídico-políticas, mas também, em um modo de solucionar os

conflitos entre as classes sociais agentes da revolução, o que se expressa na

aliança de classes7, que é fundamental afinal, o proletariado não faz revolução

sozinho e nenhuma classe vai à luta obrigada, vai a partir de um convencimento

ideológico8, ademais, “submeter pela força contraria a vocação democrática do

proletariado”. (MARINE, 2005f p. 211. Esta aliança nunca será possível entre

classes que se relacionam a partir da exploração de uma perante a outra9. Neste

caso, a coerção sempre será necessário – “não é racional renunciar a ser livre”10

– mas não será exclusiva. A ideologia burguesa é capaz de transformar igualdade

em “subordinação igual de todos ante a lei” (MARINE, 2005f p. 213), liberdade em

“livre disposição de própria força de trabalho” e progresso em “perspectiva

individual de promoção social” e converte a cidadania em possibilidade do

individuo participar da vida do Estado, “o guardião da ordem estabelecida... com

7 Um exemplo é a aliança entre proletariado e campesinato. Os camponeses não necessitam

socializar os meios de produção, e sim que estes sejam partilhados. Mas, para que ocorra a revolução os operários necessitam persuadir os trabalhadores rurais, pequenos agricultores a ir a luta por motivações superiores aos seus interesses imediatos. 8 Na contemporaneidade, após derrotas para projeto socialista e da demonstração de forças de

grupos étnicos, geracionais, ambientais, entre outros, a importância do convencimento é cada vez maior. 9 Embora concessões sejam possíveis. Segundo Ruy Mauro Marine, em contextos onde a

burguesia se vê obrigada a aceitar determinada realidade ou que esteja enfraquecida temporariamente em sua oposição, “a democracia burguesa pode (...) fazer concessões tanto a ela (burguesia) quanto a outros setores a ela vinculados (como os intelectuais burgueses)... As concessões à burguesia, inversamente, estão condicionadas pelas exigências da transição, que contribuem para fixar sua natureza e seus prazos. Se se revelam vitoriosas, essas concessões abrem a possibilidade de acordos específicos, os quais, sem chegar a se configurar como aliança, dado eu excluem objetivos históricos comuns, definem como compromissos”. (MARINE, 2005f p. 215) 10“ É preciso não ter medo, é preciso ter a coragem de dizer. Há os que têm vocação para

escravo,mas há os escravos que se revoltam contra a escravidão. Não ficar de joelhos, que não é racional renunciar a ser livre. Mesmo os escravos por vocação devem ser obrigados a ser livres, quando as algemas forem quebradas. É preciso não ter medo,é preciso ter a coragem de dizer. O homem deve ser livre... O amor é que não se detém ante nenhum obstáculo, e pode mesmo existir quando não se é livre. E no entanto ele é em si mesmo a expressão mais elevada do que houver de mais livre em todas as gamas do humano sentimento. É preciso não ter medo, é preciso ter a coragem de dizer” (MARIGHELLA, 1994. P. 96)

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monopólio da força”. É a ideologia a arma para a “conquista do poder político”

(MARINE, 2005f p. 213), um instrumento de dominação.

A aliança camponesa e operária se funda em um objetivo histórico comum,

acabar com a opressão, mesmo com divergências nos interesses de classe

imediatos, é com discussão e consenso que se constitui o Estado operário-

camponês, uma transição socialista. O que não impede a existência de leis,

entretanto, estas perdem o caráter de sanção e ganham a importância de

educação política: “a lei ideal na democracia socialista é aquela que contém mais

preâmbulos que artigos e que serve de ferramenta aos agitadores e

propagandistas para induzir comportamentos revolucionários” (MARINE, 2005f, p.

212). Desta forma, Ruy Mauro Marine diferencia dois conceitos constantemente

associados: Democracia e Igualdade Política. Para existir democracia, é

necessário desigualdade no momento das tomadas de decisão – governa-se, de

fato, para maioria, mas existe um governo – e é necessária uma forma de

dominação.

“A dominação da classe burguesa não requer a educação (Erziehung) nem a formação (Schulung) política de toda a massa

do povo, pelo menos não além de certos limites estreitamente traçados. Para a ditadura proletária esta educação é o elemento vital, o ar sem o qual não podemos viver” (LUXEMBURGO, 1986, p. 90)

8 CONCLUSÃO

Ruy Mauro Marini se mostrou um teórico inserido em sua realidade. Suas

formulações contribuíram para entender, não só o Brasil, mas também a América

Latina: como ela se relaciona internamente e com o mundo. Porém, sua tarefa

não acabou. Em suas próprias palavras:

A tarefa dos revolucionários não é fácil, por vezes a tática se torna fim e a saída mais fácil é escolhida: personalizar o inimigo no político em turno o que rebaixa o nível da luta de classes. No desafio do reascenso das massas é necessário realizar um trabalho ideológico, político e militar buscando “unificar os interesses profundos das massas e converte-los em base para a construção de uma força política e militar autônoma do proletariado. (MARINE, 2005b p. 238)

Suas teorias servem como testemunho de sua preocupação em responder

à realidade com conceitos que não fiquem apenas no papel, mas que sejam

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ferramentas de transformação, que possibilitem uma interpretação correta da

realidade, assim como próprio autor buscava fazer.

Destaca-se na obra de Ruy Mauro Marini os escritos acerca da unidade, do

dogmatismo, das alianças da esquerda, do imperialismo e suas formar de

dominação. Seus três conceitos chaves: dependência, superexploraçao e

subimperialismo explicam as raízes dialéticas do desenvolvimento latino

americano. Seu pensamento continua atual. Os conceitos, por Marini

desenvolvidos, nos permitem avançar entendendo as atuais formas de

subordinação na América Latina. Ele defende que é nas relações de exploração

que surge a semente do novo, forjada nos processos antagônicos da relação de

exploração e que permitem se pensar na superação da exploração e superação

das relações de dependência baseadas no capitalismo e garantidas pelo estado

opressor.

Marxista com grande rigor teórico e ousado para falar que não existe

revolução apenas com uma vanguarda bem esclarecida, mas sim, com as

massas e um a boa e atual leitura da realidade – esse é um método de análise

que perdura11. Ruy Mauro Marini acreditava que quando o povo vai à rua para

defender seus interesses, (saúde, educação, transporte público...) eleva-se a

cultura política e o espírito revolucionário. Deste modo, abrem-se as vias que

capacitaram as massas para assumirem “elas mesmas, a direção do processo de

transição socialista. O que, no final das contas, é a única garantia segura de seu

êxito” (MARINI, 2005f p. 220)

11 “Embora não tenha encontrado muitos discípulos em nosso país, onde grande parte do esforço

analítico está simplesmente destinado à justificar a política econômica em recurso ou ainda, de maneira mais trágica, a adesão do que restou da esquerda brasileira como mera representante dos interesses burgueses, numa competição sem fim sobre quem é mais competente para conduzir o subdesenvolvimento e administrar a dependência.” (OURIQUES, 2012)

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ABSTRACT The thought and the Latin American people had - and still has - to fight to conquer

their spaces. The aim of this paper is to expose the theoretical and policy

importance of Ruy Mauro Marini. It is showed a brief testimony about the rescue of

the author and his main articles. Through a critical theory, Ruy Mauro Marini

demonstrates that the asnwer to the military dictatorship period and the resistance

in Latin America was given by universal suffrage, laws, the open media and the

citizenship, and that was the key to evidence the class character of the

development process and the called democratization in the Latin continent.

Therefore, the bourgeois ideology spun socialism and democracy, linking it to the

individual. Thus, relating concepts such as: State, Underdevelopment and

Dialectic. Ruy Mauro Marine was part of a group of Latin authors to demonstrate

that democracy and socialism are inseparable.

Key Words: Ruy Mauro Marini, Latin America, Democracy, Dependency,

Underdevelopment

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