rojeto dissonante: alternativa de produção, distribuição e acesso de conteúdo sonoro para...
DESCRIPTION
Este artigo discute alternativas de produção, distribuição e acesso de conteúdos sonoros e as possibilidades de promoção do Direito à Comunicação por meio de ferramentas de comunicação na rede mundial de computadores. Como tema de estudo, escolheu-se o Projeto Dissonante, dissonante.org, que é uma iniciativa comunitária (CABRAL, 2009), inserida em atividades de ensino, pesquisa extensão, que oferece contas de rádio web para grupos interessados em fazer sua própria comunicação. Desde 2007, o projeto já recebeu inscrições de mais de 500 coletivos diferentes do Brasil e de outros países como Portugal, Chile e Espanha. Analisando a atuação dos coletivos que fazem parte do Dissonante, esse texto apresenta elementos para compreender como o exercício da comunicação dentro dos parâmetros do ―faça- você-mesmo‖ contribui para a efetivação do Direito à Comunicação, aproximando o conceito dos debates da Economia Política da Comunicação.TRANSCRIPT
Confederação Iberoamericana de Associações Científicas e Acadêmicas da Comunicação
Confederación Iberoamericana de Asociaciones Científicas y Académicas de la Comunicación
Projeto Dissonante: alternativa de produção, distribuição e acesso de
conteúdo sonoro para promoção do Direito à Comunicação
Leyberson Lelis Chaves Pedrosa1 , Fernando Oliveira Paulino
2, Juliana Soares Mendes
3,
Jairo Faria Guedes Coelho4, Angélica Sonaglio
5 e Emanuelle Campos
6
ST5: Economia Política da Comunicação
Resumo: Este artigo discute alternativas de produção, distribuição e acesso de conteúdos sonoros e as
possibilidades de promoção do Direito à Comunicação por meio de ferramentas de comunicação na rede
mundial de computadores. Como tema de estudo, escolheu-se o Projeto Dissonante, dissonante.org, que
é uma iniciativa comunitária (CABRAL, 2009), inserida em atividades de ensino, pesquisa extensão, que
oferece contas de rádio web para grupos interessados em fazer sua própria comunicação. Desde 2007, o
projeto já recebeu inscrições de mais de 500 coletivos diferentes do Brasil e de outros países como
Portugal, Chile e Espanha. Analisando a atuação dos coletivos que fazem parte do Dissonante, esse texto
apresenta elementos para compreender como o exercício da comunicação dentro dos parâmetros do ―faça-
você-mesmo‖ contribui para a efetivação do Direito à Comunicação, aproximando o conceito dos debates
da Economia Política da Comunicação.
Palabras chave: Internet, economia política da comunicação, mudança social
Resumen: El artículo discute formas de producción, distribución y acceso de contenido sonoro y las
posibilidades de promoción del Derecho a la Comunicación a través de herramientas de comunicación en
la red mundial de ordenadores. Como tema de estudio, se eligió el Proyecto Disonante, dissonante.org,
que es una acción comunitaria (CABRAL, 2009) inserida en actividades de enseñanza, investigación y
extensión que ofrece cuentas de radio web para grupos interesados en hacer su propia comunicación.
Desde 2007, el proyecto ya ha inscrito más de 500 diversificados colectivos, de Brasil y de otros países
como Portugal, Chile y España. Analizando la actuación de los colectivos que hacen parte del Disonante,
esta ponencia presenta elementos para comprender como el ejercicio de la comunicación dentro de los
parámetros de ―haga-tú-mismo‖ contribuye para la efectividad del Derecho a la Comunicación,
acercándole el concepto hacia los debates de la Economía Política de Comunicación.
Palabras-clave: Internet, economía política de la comunicación, cambio social
1 Leyberson Lelis Chaves Pedrosa, Bacharel em Comunicação, mestrando em Comunicação na Faculdade de
Comunicação da Universidade de Brasília, Email: [email protected]; 2 Fernando Oliveira Paulino, Doutor em Comunicação e professor na Faculdade de Comunicação da Universidade de
Brasília. Diretor da Associação Latino-Americana de Investigadores da Comunicação (ALAIC). Email: [email protected]; 3 Juliana Soares Mendes. Bacharel em Comunicação, mestranda em Ciências Sociais no Centro de Pesquisa e Pós-
Graduação sobre as Américas (CEPPAC) da Universidade de Brasília. Email: [email protected]; 4 Jairo Faria Guedes Coelho, Bacharel em Comunicação, mestrando em Comunicação na Faculdade de Comunicação da
Universidade de Brasília. Email: [email protected]; 5 Angélica Elisa Sonaglio é estudante de comunicação da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília. Email:
[email protected]; 6 Emanuelle Campos é estudante de comunicação (Publicidade e Jornalismo) na Universidade Católica de Brasília. Email:
Abstract: This paper discusses alternative for radio content production, distribution and access and the
possibilities of promoting the right to communicate through communication tools at the worldwide
network. Project Dissonante, dissonante.org, was chosen as a study subject. The project is a Community
Initiative (Cabral, 2009) that allows teaching, researching and mobilization activities since it offers Web
radio accounts for groups interested in making their own communication. Since 2007, the project has
already enrolled more than 500 different collectives from Brazil and other countries such as Portugal,
Chile and Spain. By analyzing the performance of groups that are part of project Dissonante, this paper
presents evidences that helps us understand how the practice of communication within the parameters of
"do-it-yourself" practices contributes to the realization of the right to communicate, approaching the
concept to Communication Political Economy debates.
Keywords: Internet, political economy of communication, social change
1. Introdução
O Projeto Dissonante é uma iniciativa de extensão que propõe a construção de
uma alternativa de Comunicação livre baseada no funcionamento de um servidor de
rádio web para ―grupos, coletivos, organizações sociais e indivíduos que desejem
transmitir e retransmitir programas de rádio em tempo real de qualquer lugar do mundo‖
(ARCANJO, PEDROSA, 2007, p. 8). A concepção do servidor origina no Trabalho de
Conclusão de Curso de Pedro Arcanjo e Leyberson Pedrosa, orientados pelo Professor
Fernando Oliveira Paulino em 2007. O projeto somou-se a diferentes atividades
conjuntas de promoção da Comunicação enquanto direito humano, por meio da
extensão na Universidade de Brasília, como a rádio Ralacoco e o Projeto Comunicação
Comunitária.
O início das referidas ações de extensão na Faculdade de Comunicação da UnB
se remete a 2002, a partir da efetivação da Rádio Laboratório de Comunicação
Comunitária – Ralacoco FM, ralacoco.dissonante.org, via a criação da disciplina7 e
Projeto de Extensão Comunicação Comunitária -www.unb.br/fac/comcom. O intuito
das iniciativas era promover o encontro e a troca de experiências entre o conhecimento
acadêmico e o saber popular. Tanto o Dissonante, a Ralacoco quanto a disciplina estão
atualmente reunidos sob o Programa de Extensão Comunicação Comunitária da
Faculdade de Comunicação.
Como princípio orientador, o Dissonante entende a Comunicação Social como
um direito humano, livre e aberto a todas as pessoas; um possível instrumento para a
7 A cada semestre, estudantes de varias áreas: Jornalismo, Publicidade, Audiovisual, Nutrição, Biblioteconomia, Serviço
Social, entre outros cursos, matriculam-se nas disciplinas Comunicação Comunitária 1 e 2, estudando conceitos associados a
comunicação para mobilização social e aplicando os conceitos apreendidos em atividades de campo em comunidades do Distrito Federal, como Planaltina, região administrativa onde existe um campus da UnB.
mobilização e transformação social libertadora (FREIRE, 2007). Portanto, seu material
de divulgação (cartilhas, vídeos-tutoriais e artigos) e o site www.dissonante.org refletem
o esforço de estimulam um processo dialógico sobre a importância do uso de uma
tecnologia social – do servidor de rádio web – perante os grupos ou pessoas com
objetivos e vontades diferentes de se expressar.
O Dissonante recebe diariamente pedidos para criação de rádio web e já foram
estabelecidas mais de 500 contas, promovendo rádios de divulgação de temas
transversais como saúde da mulher, esportes, tecnologias, inclusão digital e educação
ambiental. Os coletivos inscritos são bastante diversificados, de diferentes partes do
Brasil ou de outros países como Chile, Espanha, imigrantes do interior da França, assim
como também fazem partes rádios comunitárias e, inclusive, uma experiência com a
polícia rodoviária responsável por parte das estradas do Rio Grande do Sul. A gestão do
projeto é feita por um coletivo de pesquisadores e voluntários, juntamente a participação
de bolsistas de extensão do Programa Comunicação Comunitária. .
Após quase cinco anos de existência do Dissonante, busca-se nesse artigo refletir
e apresentar elementos para compreender como a produção e veiculação das rádios em
tempo real pelos coletivos contribuem para efetivar o direito à comunicação, tendo em
vista conceitos da Economia Política da Comunicação e as intenções iniciais contidas
no trabalho de conclusão de curso:
―O Projeto não pretende se configurar como única alternativa capaz de sanar
os principais problemas com os monopólios de Comunicação, mas busca
oportunizar um caminho livre para que se exerça o direito de comunicar por
meio da transmissão e reprodução de conteúdos em áudio produzidos de
forma coletiva ou individualmente. Nessa lógica, fortalece as manifestações
sociais e ações políticas em diferentes esferas da micro-estrutura da
sociedade‖ (ARCANJO, PEDROSA, 2007, p. 8).
Portanto, o presente artigo debate também como práticas de comunicação pela
internet podem contribuir para iniciativas de transformação e mobilização social, além
de explorar a potencialidade do uso da internet na promoção do direito humano à
Comunicação e as dificuldades existentes na sua efetiva aplicação,
2. Economia Política da Internet na Comunicação
Algumas tendências econômicas, políticas e legislativas se desenvolveram de
modo a converter a internet em um veículo comercial como outro qualquer. Assim
como outros avanços tecnológicos, a internet se converteu em um meio de obtenção de
lucro, já que a rentabilidade gerada pelos recursos que as ferramentas web oferecem é
vista pelas empresas como oportunidade de transformá-la em uma indústria.
Tamara Villarreal e Genève Gil (DOWNING, 2004) utilizam o conceito de
enclosure, sugerido por Boal8, para explicar esse fenômeno. Segundo os autores, Boal
utiliza o termo para denominar essas tendências de industrialização da internet em uma
alusão ao movimento homônimo ocorrido no século XIX, na Inglaterra, quando grandes
proprietários de terra cercaram terras comunais para uso privado e, assim, os
agricultores livres se viram obrigados a trabalhar para a pequena nobreza em troca de
salários.
Segundo sugere Boal, é possível relacionar esses movimentos à utilização das
informações na internet com interesses comerciais. Nesse sentido, citando Shapiro9,
Vllarreal e Genève aludem à necessidade de serem preservados e resguardados um
espaço público via web, da mesma forma como fazemos com o espaço físico. Segundo
os autores:
―Inúmeras estratégias de enclosure ameaçam arruinar a existência da internet
tal como a conhecemos hoje, mesmo dentro dos setores menos prováveis. A
promessa das redes de computadores se vê ameaçada, em todos os lugares,
por campanhas orquestradas pelo Estado e pelas forças de mercado visando
enfraquecer seu potencial.‖
Mesmo que interesses comerciais muitas vezes limitem seu uso, o potencial
democrático que a internet apresenta se mostra cada vez mais presente por meio de
iniciativas alternativas de produção, distribuição e acesso a conteúdos audiovisuais pela
sociedade civil na rede.
A partir da utilização dos mecanismos de internet com finalidades lucrativas, os
produtores alternativos se vêem obrigados a buscar outros caminhos diversos àqueles
que já são controlados pela indústria, como é o caso do rádio e da televisão. A internet
se apresenta como uma alternativa que oferece mais possibilidades. Nesse contexto, as
ferramentas de navegação web permitem que a internet se converta em um veículo
acessível a um extenso número de indivíduos e coletivos, os quais podem trocar
qualquer tipo de informação.
Na direção contrária, pode haver a perspectiva de que informações veiculadas na
internet não são confiáveis. Entretanto, a internet permite mais controle da produção
pela audiência. Além disso, essa visão não leva em conta as limitações que implicam os
8 BOAL, I. A. ―a Flow of Monsters: Luddism and Virtual Technologies, em J. Brook & I. A. Boal (orgs.), Resisting the
Virtual Life: The Culture and Politics of Information (São Francisco: City Lights, 1995), pp. 3-16, esp. p. 5. 9 SHAPIRO, A. “Streetcorners in Cyberspace”, em The Nation, 261 (1), 1995, p. 10.
pontos de vista particulares divulgados pelos meios hegemônicos e exclui a
possibilidade de produção de conteúdo alternativo. (DOWNING, 2004, p. 274)
De acordo com John Downing, a internet pode atuar como um meio radical a
partir da ―participação das pessoas na criação de formas interativas de comunicação que
atuam como força de compensação para o fluxo unilateral que é próprio dos meios
comerciais. (idem, p. 275). Apesar dessa visão otimista sobre a produção de conteúdo
alternativo na internet, é necessário ter em conta que o acesso a essas ferramentas não é
amplo, principalmente em países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil.
Dados do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), que o governo brasileiro
desenvolve no intuito de massificar o uso da internet banda larga (de alta velocidade)
por todo o país, indicam que em 2008 cerca de 39% dos brasileiros tinham acesso à
internet. O acesso se dá na maioria das vezes nos domicílios (43%) e em lan houses
(47%). Apesar desses números se destacarem em comparação a outros países, o acesso à
banda larga nos domicílios brasileiros é reduzido, mas o país apresenta um potencial
elevado de ―participar da sociedade da informação, já que possui mais de 64 milhões de
internautas e o brasileiro está entre os que usam mais intensivamente a internet (30
horas e 13 minutos)‖ (MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES, 2010).
Em um sentido ideal, o plano em que trabalha o governo brasileiro auxiliaria no
processo de democratização da internet no país, mas várias críticas a esta política
pública trazem ao cenário discussões que indicam que o projeto se tornará mais um
mecanismo de utilização comercial dos recursos.
Nesse sentido, o pesquisador em Políticas da Comunicação, Murilo César
Ramos, a partir de uma análise dos aspectos estruturais e conjunturais envolvidos no
processo de desenvolvimento do PNBL, critica o plano com o argumento de que:
―[…] ele corre o risco de ser transformado, dada a conjuntura em que está
imerso, em um arremedo tático de curto prazo, ao invés de um projeto
estratégico de longo prazo, como deveria ser o caso de toda política pública
social e de infra-estrutura, voltada à ampliação do Estado e ao bem estar da
sociedade.‖ (RAMOS, 2010)
Para o autor, ―políticas públicas são processos socioculturais e político-
econômicos eivados de conflitos, de contradições, de disputa por espaços de poder na
produção, dispersão e consumo de recursos‖. Nesse sentido, é importante levar em
conta os movimentos dinâmicos a que estão submetidas as ações nos meios de
comunicação, e as iniciativas alternativas se somam às propostas de democratizar o uso
das tecnologias da informação. Cabe ressaltar neste contexto em que as políticas de
comunicação são permeadas por processos sociais, a emergência de uma cultura
audiovisual que pode contribuir para a mobilização social de coletivos na internet.
3. Promoção de redes sociais pela Internet
Desde seu surgimento em 2007, o Projeto Dissonante esteve próximo de
coletivos organizado e também possibilitou diferentes ações de mobilização social, de
oficinas com a função pedagógica de permitir que mais pessoas se apropriassem das
tecnologias de comunicação10
, até a estruturação de emissoras online para o debate e
divulgação alternativa de informações por participantes de movimentos de ocupação11
no Distrito Federal. No transcorrer do processo de criação do servidor de rádio web,
seus idealizadores dialogaram com membros dos coletivos que participavam — a rádio
Ralacoco e o então projeto de extensão Comunicação Comunitária — para que os
grupos assumissem a gestão do Dissonante como parte de sua atuação para a promoção
do direito humano à comunicação. A partir da divulgação do servidor como uma
ferramenta gratuita de tecnologia social, foram criadas rádios web por coletivos
mobilizados com atuação nas áreas de educação, creative commons, jornalismo
científico, gênero, entre outros.
Conforme reflexão de Bernardo Toro (1997, p. 26), podemos considerar
mobilização social como a ação de convocar pessoas ―a um propósito comum, com
interpretações e sentidos compartilhados‖. Portanto, é um ato de liberdade, movido pela
paixão e não por possíveis manipulações ou persuasões. Uma vez que há uma
imaginário compartilhado, mobilizar é também um processo de comunicação. Nesse
sentido, podemos localizar a mobilização social fomentada pelo Projeto Dissonante
como inserida no paradigma dos chamados Novos Movimentos Sociais. De acordo com
Maria da Glória Gohn (2004), a referida perspectiva valoriza a diversidade de
identidades e da cultura, refutando a concepção de que esta seria um conjunto fixo de
normas herdadas do passado. Os Novos Movimentos Sociais lutam pela mudança de
valores e se opõe à discriminação, considerando a política como uma prática presente no
10
O resultado de algumas oficinas que tiveram o suporte do Projeto Dissonante estão disponíveis em www.trilhassociais.com e
http://www.radiotube.org.br/detalhes.php?opt=16&ord=0&crt=&us=170.
11 Em 2008, durante a ocupação da reitoria da UnB por estudantes em favor de uma gestão mais democrática da
universidade e, em 2009, durante o movimento de ocupação da Câmara Legislativa do Distrito Federal devido a denuncias de um
esquema de corrupção envolvendo grande parte dos representantes da Casa
cotidiano. O sujeito da ação é coletivo e difuso, a ação é direta e descentralizada, e a
mídia é utilizada para mobilizar a opinião pública.
Considerando o papel central tanto da cultura como da comunicação para a
mobilização social, é necessário indicar que o lugar da cultura na sociedade se
transforma com as emergências das novas tecnologias da comunicação na modernidade.
De acordo com Jesús Martín-Barbero (2007), a hegemonia de uma cultura audiovisual é
frequentemente criticada pelos intelectuais que acreditam que os meios de comunicação
impedem a aprendizagem, o pensamento (resultado da contemplação) e a leitura. Porém,
como explica Barbero, os intelectuais talvez se sintam ameaçados pela mídia, uma vez
que o audiovisual se refere a uma outra cultura, cujas imagens polissêmicas indicam
novos modos de percepção, de linguagem, de sensibilidades e de texto. No entanto, os
imaginários populares que mobilizam as imagens audiovisuais também produzem um
cruzamento entre arcaísmos e modernidades (BARBERO, 2007, p. 41).
Além disso, os saberes e os livros não estão perdidos, mas relocalizados. Com o
texto eletrônico, a leitura e aprendizagem não mais seguem a linearidade ou
sequencialidade. A disseminação dos saberes é acompanhada por uma expansão dos
aprendizados em todas as épocas da vida (em vez de se limitar ao espaço escolar). Há
um apagamento das fronteiras entre o conhecimento e o saber comum, como também
dos limites entre a razão e a imaginação, a natureza e o artificial, a arte e a ciência. Por
fim, é uma cultura desterritorializada cujas características acima descritas servem de
categorias para compreender o Projeto Dissonante como uma ferramenta que pode
promover a mobilização social de diferentes grupos.
No âmbito da internet, o Projeto Dissonante procura se inserir nas novas redes e
mobilizar seus participantes integrando-se aos novos espaços tecnológicos que o
universo online possibilita. Desde que as novas tecnologias começaram a ganhar espaço
na sociedade, tendo como ícone nos últimos dez anos a internet, os adventos que
surgem com ela mudam as concepções de difusão de conteúdos e de interação entre as
pessoas.
As possibilidades de envio de mensagens multimídia, o acesso rápido a bancos
de dados situados a milhares de quilômetros de distância, a facilidade do acesso a
informações na rede e a difusão dessa informação tornam os grupos de pessoas mais
próximos da ―aldeia global‖ preconizada por MCLUHAN (1964). Nesse sentido, a
internet proporciona a interação das rádios com seus ouvintes fazendo com que estes
espaços possam ―multiplicar os seus interlocutores, bem como ensejar o intercâmbio
entre grupos e pessoas que possuem identidades comuns, mesmo distanciados pela
geografia‖ (MELO, 2005, p. 9).
A internet e as redes sociais fazem o papel de conectar o tradicional com novas
fronteiras globais. As redes sociais são espaços onde conjunto de participantes unem
suas idéias em torno de interesses compartilhados através de um meio (MARTELETO,
2011), neste caso a internet. Dessa maneira, a internet permite com que, no caso de
rádios web, por exemplo, tenhamos o contato com o público que possui contas de rádio
e também os que ouvem as rádios de forma interativa, tendo noção de quem são essas
pessoas, de onde são e qual rádio estão escutando. As redes sociais, apoiadas pelos
computadores, utilizam-se de diversos recursos, como mensagens, fóruns, lista de
discussões, boletins eletrônicos, grupo de notícias, chat, e outros aplicativos que
permitem e instigam a interatividade.
Em função da amplitude dessas características, a rede deve ser compreendida
como um ambiente comunicacional multimídia (BUFARAH, 2011. p.2). O Dissonante
possui uma conta no Twitter12
, uma rede social de microblogging que permite postagens
de textos de até 140 caracteres. O Twitter permite que os usuários sigam o projeto.
Atualmente, a página possui 300 seguidores e segue 131 pessoas de movimentos
sociais, rádios web cadastradas e público em geral. O Twitter está disponível também
não só no seu endereço (http://twitter.com/sejadissonante) mas também na página inicial
do projeto (http://www.dissonante.org).
Denominados com o perfil de ―@sejadissonante‖, o projeto divulga na rede as
rádios que estão no ar, os programas, informações sobre problemas com o servidor,
dicas em geral sobre o que é e como fazer uma rádio web, procura pessoas que postam
informações sobre as rádios cadastradas e recoloca aquela informação na página do
Twitter, fazendo assim com que os coletivos que possuem contas de rádio web, e
também aqueles que são ouvintes, se enxerguem.
Na sociedade das redes (para usar uma terminologia de Manuel Castells), o
associativismo localizado (ONGs comunitárias e associações locais) ou
setorizado (ONGs feministas, ecologistas, étnicas, e outras) ou, ainda, os
movimentos sociais de base locais (de moradores, sem teto, sem terra, etc.)
percebem cada vez mais a necessidade de se articularem com outros grupos
com a mesma identidade social ou política, a fim de ganhar visibilidade,
produzir impacto na esfera pública e obter conquistas para a cidadania. Nesse
processo articulatório, atribuem, portanto, legitimidade às esferas de
mediação (fóruns e redes) entre os movimentos localizados e o Estado, por
12
Das 50 milhões de mensagens postadas todos os dias no Twitter, cerca de 4,5 milhões são em português, segundo pesquisa
divulgada nesta quarta-feira (24) pela consultoria francesa Semiocast. A língua é a terceira mais usada no serviço de microblog,
com 9% do total. (http://g1.globo.com/Noticias/Tecnologia)
um lado, e buscam construir redes de movimento com relativa autonomia,
por outro. (SCHERER-WARREN, 2011, p.5)
4. Acompanhamento e amostra das rádios online
O levantamento de dados para análise das rádios hospedadas no Projeto
Dissonante foi realizado semanalmente e em horários alternados, no período de 1º de
fevereiro a 26 de junho de 2011. Para isso, foram elaboradas planilhas de
acompanhamento com a demarcação de itens essenciais para identificação dos
conteúdos veiculados pelas rádios: nome, link e os dias da semana, bem como os
horários em que houve ou não acompanhamento das rádios que estavam online.
Ao término desse processo, realizou-se a tabulação dos dados obtidos ao longo
dos cinco meses de acompanhamento, levando em consideração os seguintes itens para
análise: nome das rádios; número de rádios individuais fixas e/ou freqüentes ouvidas no
período; rádios que são ou se auto-identificaram como comunitárias ou livres; estilo
musical; se apresentou algum programa especial ou diferenciado no decorrer da
programação; se faz uso freqüente de publicidade e vinhetas da própria rádio ou da
programação; se conta com a presença de locutor em determinados programas; se há
divulgação de mecanismos de interação com o público (e-mail, telefone, redes sociais,
carta, etc.) e quais rádios apresentaram características de rádios com fins comerciais
(identificadas por palavras específicas, uso corriqueiro de publicidade, e programação
similar a emissoras comerciais)
A ponderação das questões teve em vista que o site é um espaço de promoção do
direito à comunicação e considera seus desafios para tal. Sendo assim, o critério de
escolha dos itens tabulados foi realizado tendo, primordialmente, como base a política
de uso dos serviços do Projeto13
- acordada pelas rádios que solicitam uma conta no site
- tais como respeito aos direitos humanos, a liberdade de opinião, credo, crença e a
diversidade política, étnica e religiosa, bem como não disseminar conteúdos ofensivos
de caráter homofóbico, sexista, racista, ou discriminatório em qualquer espécie.
Somente foram consideradas na amostra geral as rádios que estiveram online
por, pelo menos, mais de um mês durante todo o período de audição em horários
aleatórios de acesso para contemplar diferentes turnos e finais de semana. A análise
considera como aspecto principal o perfil das rádios ouvidas, e não necessariamente sua
13
A política de uso pode ser acessada pelo link http://www.dissonante.org/site/index.php?arquivo=projeto
periodicidade, uma vez que a Internet possui dinâmica própria e bastante diferente de
rádios tradicionais em FM ou AM.
As rádios que não entraram na amostra por aparecerem por alguns dias
esporadicamente, e não se repetindo de um mês para o outro podem ser distribuídas da
seguinte forma:
Quadro 1 – As seis rádios que foram excluídas da amostra
Perfil
4 rádios Características de rádio comercial, prevalecendo conteúdos musicais;
1 rádio Institucional educativa, com variedade de músicas em licença Creative
Commons, e com veiculação de campanhas educativas de trânsito e contra
o trabalho infantil;
1 rádio Características religiosas e veiculação de músicas comerciais;
Uma das emissoras que não entrou no escopo da amostra foi a rádio PRF/RS,
gerida por um dos departamentos da Polícia Rodoviária Federal do Rio Grande do Sul.
É importante, no entanto, destacar que no mês em que ela constou nas planilhas de
acompanhamento, os conteúdos veiculados se destacaram por sua diversidade de
temáticas. Eis os apontamentos de dois dias de audição:
Quadro 2 – Apontamentos sobre a Rádio PRF/RS
Rádio PRF/RS
QUARTA-FEIRA – 02/02 - 22h54 às 23h17 Propagandas institucionais, educacionais; músicas
nacionais apresentadas por um locutor.
SEXTA-FEIRA- 25/02 - 10h47 às 11h Campanha da Polícias Rodoviária Federal, do
Ministério Público do Trabalho contra a exploração do
trabalho infantil, prevenção de acidentes nas rodovias;
músicas: MPB, vinhetas da rádio.
A tabulação das planilhas dos cinco meses de acompanhamento apresentaram o
seguinte quadro estatístico geral:
Quadro 3 – Amostra das rádios web: dados gerais
Perfil das 13 rádios/coletivos considerados:
Auto-identificação
comunitária
9 - não se identificam como rádios comunitárias;
4 - se identificam como rádios comunitárias.
Musical 9 - apresentam prevalência de músicas do circuito comercial;
1 - prevalência de músicas regionais do Sul do Brasil e músicas comerciais;
2 - prevalência de músicas fora do circuito comercial: nacionais,
internacionais, folclóricas e regionais;
1 - sem exibição musical nos horários acompanhados.
Programação
diversificada
9 - não apresentaram programas temáticos e ou focalizados;
4 - com veiculação de programas diferenciados.
Publicidade 6 - não apresentaram publicidade;
4 - faz uso de publicidade;
1 - exibição de campanha governamental (contra a Dengue);
2 - exibição de campanhas governamentais e publicidade local.
Locução 4 - não tinham a presença de um locutor homem ou mulher;
6 - presença de locutor homem em alguns programas;
2 - presença de locutor homem e/ou mulher em alguns programas;
1 - presença predominante de locutor homem na maioria dos programas e de
locutora em alguns programas.
Canais de interação 8 - não apresentaram canal de comunicação com o ouvinte;
2 - possuem contato, mas não foi especificado;
3 - possuem contato por telefone, dos quais 1 permite ainda o uso de sms e o
outro de participação ao vivo.
Identidade 3 - não veicularam vinhetas próprias ou de parceiros;
9 - possuem vinhetas próprias da rádio;
1 - possui vinhetas próprias da rádio e específicas dos programas.
Características
comerciais
4 foram identificadas com características totalmente comunitárias;
9 apresentam aspectos de rádios comerciais.
5 - Análise dos dados amostrais: diversidade, direitos humanos e publicidade
Esse artigo pretender iniciar o processo de análise sobre os coletivos inscritos no
site do Projeto Dissonante de 2007 até 2011. Dessa forma, considera-se que o
acompanhamento sistematizado em horários aleatórios compreende apenas um
panorama parcial das emissoras online que utilizam o Dissonante enquanto uma
tecnologia social. Quando um coletivo envia uma solicitação de criação de conta de
rádio web, ele apresenta um projeto da rádio a ser transmitida, aceita as políticas de uso
e assume todas as responsabilidades no cumprimento das mesmas. Em seguida, o
coletivo que gere o Dissonante avalia a proposta e libera a conta. Os dois parágrafos
iniciais as Política de uso são:
―I - respeitar os direitos humanos:
a) respeitar sempre a liberdade de opinião, credo, crença e a diversidade
política, étnica e religiosa; b) zelar pela diversidade cultura e regional, sem
cercear nenhum tipo de expressão; c) não disseminar nenhum conteúdo
ofensivo de caráter homofóbico, sexista, racista, ou discriminatório em
qualquer espécie.
II - ter responsabilidade social:
a) responder pelos seus atos de acordo com o item I ; b) ter clareza que é
responsável pelo que expressa‖
Consideramos que o parágrafo I em seu item b indica a necessidade de
diversidade nas emissoras, que podem, por exemplo, explorar músicas regionais ou
alternativas. Levando-se em consideração que a amostra representa apenas momentos
específicos da rádio acompanhada, percebe-se pelo quadro geral (quadro 3) que a
diversidade é fator presente em 31% das rádios ouvidas, que exibiram programação
diferenciada ou em 23% se considerarmos a reprodução de músicas regionais ou
nacionais fora do circuito comercial.
Destaca-se nesse cenário a Rádio UnB - experimental, na qual reproduz os
programas jornalísticas produzidos pelos estudantes de Comunicação da Faculdade de
Comunicação. Seu caráter experimental se refere à fase atual de testes de transmissão e
recepção dos produtos radiofônicos elaborados e executados por estudantes de
Comunicação. Outra rádio que se sobressai em relação à diversidade de conteúdo é a
Master FM, que em sua solicitação de criação de conta apresenta-se como uma rádio
comunitária (apesar do acompanhamento apontar algumas características de rádio
comercial) oscilando entre a exibição de músicas do circuito comercial e músicas
regionais da cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul.
Em relação ao item c do parágrafo I da Política de Uso, analisamos as emissoras
para verificar se há disseminação de conteúdo que seja ofensivo, de caráter homofóbico,
sexista, racista, ou discriminatório. Não é perceptível a veiculação de conteúdos de
caráter preconceituoso nas rádios consideradas. Contudo, é interessante notar que há
uma predominância de locutores do sexo masculino nas grades de programação das
emissoras. As locutoras aparecem minoritariamente somente em 33% das rádios que
tinham a presença de uma pessoa na função de locutor. Esse número diminui para 23%
se incluirmos as rádios cuja programação não tinha nenhuma locução durante o
acompanhamento. Este dado permite futuras investigações e aprofundamentos sobre o
papel da mulher na produção de conteúdo radiofônico para as emissoras que participam
do Projeto Dissonante.
Porém, dentro do perfil das rádios da amostra, é importante destacar a presença
da Rádio Alternativa AMUNAM, formada pela Associação das Mulheres de Nazaré da
Mata, em Pernambuco. Sua programação valoriza a diversidade e há a presença de
locutoras e locutores, além da abordagem de temáticas específicas de valorização da
mulher, condizentes com os princípios do Dissonante.
O último parágrafo da Política de Uso do projeto enfatiza o uso das emissoras
para a produção de uma comunicação livre e a autogestão das rádios que participam do
Dissonante. Segundo o referido parágrafo:
―III - por parte do Projeto Dissonante
a)O Projeto não é responsável pela quebra dos itens acima e estimula a ação
coletiva entre indivíduos e grupos para filtrar e excluir possíveis
desrespeitos a esse acordo mútuo. Em caso de problemas, envie e-mail para
b) os servidores do Projeto DIssonante devem ser usados para a promoção
de uma Comunicação Livre. Logo, as rádios participantes não devem usar a
conta de rádio web para fins comerciais e/ou de lucro. Caso isso aconteça, o
ponto de montagem criado será desabilitado e, possivelmente, expirado. ―
Como estratégia para perceber se o parágrafo III da Política de Uso (que trata do
respeito a um uso não comercial do projeto) foram observados o perfil musical,
considerando o circuito musical das rádios comerciais, o tipo de publicidade e a auto-
identificação dos coletivos. Ainda que aproximadamente 30% das rádios se auto-
identificam como rádios comunitárias (legalizadas ou não em FM ou AM), metade delas
apresenta características típicas de rádio comercial. Já a outra metade são geridas por
associações comunitárias. Contudo, um aspecto positivo percebido na observação da
amostra é que 54% das rádios não veiculou qualquer tipo de publicidade comercial, e
15% exibiu apenas publicidades locais, associadas a campanhas governamentais.
Apesar da legislação sobre rádio comunitária (Lei 9.612 de 1998) proibir a
publicidade nas emissoras (permitindo somente a figura do ―apoio cultural‖, sem
especificar melhor o conceito), se faz necessário problematizar como as rádios podem
obter recursos para sobreviver. Evidentemente há possibilidades de se recorrer a ações
para levantar fundos (bazares, rifas, etc.), porém nos questionamos se essas medidas são
suficientes para garantir a sustentabilidade das rádios, principalmente quando as
emissoras online também funcionam como FM ou AM e possuem custos de locação de
espaço, energia elétrica e manutenção de equipamentos. Torna-se necessário buscar
entre o equilíbrio de uma comunicação livre que valorize a internet como um espaço
público (e não meramente comercial) e as necessidades de recursos para manter a
emissora. Além disso, considerando o papel das rádios comunitárias em divulgar
informações de caráter público às populações (sobre saúde, segurança e educação), há
que se iniciar o debate sobre a possibilidade do Poder Público investir nas rádios
comunitárias como difusoras das campanhas governamentais para a promoção da saúde
e demais direitos.
Além dos aspectos referentes ao perfil e conteúdo das rádios do Dissonante,
também verificamos outras características que podem servir para novas aproximações e
comparações das emissoras online do projeto:
Rotatividade: poucas rádios permaneceram fixas na grade, o que demonstra a
variedade e adaptabilidade ou flexibilidade das emissoras online, que se
diferenciam, assim, das rádios tradicionais em FM e AM;
Dificuldades de transmissão: algumas rádios demonstraram certa instabilidade
no sinal de transmissão, chegando a ficar ―fora do ar‖ diversos dias da semana,
ou apresentando ruídos e forte interferências no sinal. Foi observado também,
que não é comum que as emissoras, ao apresentarem qualquer tipo de problemas
na transmissão, oferecerem explicações ou esclarecimentos aos ouvintes sobre as
falhas apresentadas. Esses problemas técnicos revelam também os desafios
apresentados ao Dissonante, que procura ampliar e melhorar o serviço com a
instalação de um segundo servidor no campus da UnB em Planaltina-DF.
Rádios que se destacaram na promoção do direito à comunicação: Rádios como
a Utopia FM, Rádio Web Colaborativa Mucury Cultural e Tâmara FM, além de
se identificarem como rádios comunitárias e livres, apresentaram uma
programação diversificada em seu conteúdo. A programação dessas emissoras
foge de padrões comerciais, evitando, por exemplo, o uso de publicidade,
vinhetas e músicas comerciais. Além disso, em determinados horários
apresentaram programas informativos, regionais e culturais que visavam a
comunidade regional de suas respectivas cidades.
Presença de rádios comerciais: algumas rádios (conforme o quadro 3)
apresentam conteúdo pouco variado e muito semelhante a rádios comerciais.
Afinal, disponibilizam boa parte da programação para publicidade local, não
oferecem um canal de contato com ouvintes (seja por e-mail ou telefone) e
repertório semanal de programas ou músicas é pouco variado.
6. Considerações finais
O Projeto Dissonante trabalha para construir espaços em que indivíduos e,
especialmente, coletivos possam exercer seu direito à comunicação, se reconhecendo
não somente como consumidores de informação, mas também como produtores. Além
de oferecer a possibilidade de criação de uma conta de rádio web, o Dissonante também
estabelece parcerias e se insere em mobilizações sociais para que grupos possam exercer
seu direito de forma mais total. Dessa maneira, o projeto não se caracteriza somente
como um servidor de rádio, mas se constitui como uma articulação em rede que
pretende instigar o “fazer comunicação” de forma mais interativa e conectada.
Nesse sentido, pretende desempenhar dois papéis. Inicialmente, fortalecer
coletivos, pré-existentes ou não, de comunicação livre, e estimular a parcerias com
outros coletivos e mobilizações sociais. O segundo papel se refere aos usos do Projeto
Dissonante como tecnologia social para a transmissão de debates ou eventos, como
instrumento pedagógico em oficinas e como ferramenta de divulgação de informação
alternativa, por exemplo, em manifestações sociais. O objetivo dessas ações é permitir
que a rádio web perca seu pretenso caráter de técnica neutra e se converta “em campo
de criatividade, inclusive técnica, para emissores e receptores que terão de lutar a todo
momento: uns para fazer-se ouvir e outros para conseguir escutar” (BARBERO, 2004,
p.189).
Cconsiderando o esforço do projeto em ampliar o direito à comunicação, se faz
necessário conhecer o perfil das emissoras que participam do Dissonante. A partir da
observação e análise das rádios, é possível estimular a articulação entre as emissoras, a
autogestão do servidor e o respeito à diversidade e direitos humanos. Isto é, conhecer as
rádios web do Dissonante permite que pensemos em ações que possam consolidar uma
rede de emissoras online de todo o país (e até algumas internacionais) por meio, por
exemplo, de encontros, oficinas, fóruns, etc. A presente análise, então, se apresenta
como uma primeira etapa de planejamento para futuras ações do projeto.
O perfil de uma amostra reduzida de emissoras revela rádios web que
compartilham os princípios do Dissonante. Algumas dessas rádios se declararam
comunitárias (4 de 13 emissoras). Porém, a maioria, que não assumiu necessariamente o
discurso e o termo “rádio comunitária”, mostraram em sua programação uma demanda
(por vezes silenciada) em produzir sua comunicação. Por exemplo, 9 das 13 emissoras
possuem vinhetas originais para identificar a rádio. Além disso, 54% das rádios não
veiculou publicidade comercial e 15% apresentou apenas publicidades locais
(associadas a campanhas governamentais). Ou seja, há um universo de rádios no
Dissonante a ser explorado e a análise inicial indica avanços para o direito à
comunicação por meio da Internet, exemplificando, portanto, que é possível ultrapassar
cada vez mais a característica limitada do Dissonante como um servidor e consolidar
uma rede de comunicação livre por meio das rádios web no Brasil e no mundo.
Referências:
FREIRE, Paulo. Extensão ou comunicação? 13ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006
ARCANJO, Pedro; PEDROSA, Leyberson L C. Projeto Dissonante – faça-rádio-web-
você-mesmo. Uma experiência de comunicação livre. Brasília , 2007 in
http://bdm.bce.unb.br/bitstream/10483/1719/1/2007_LeybersonPedrosa_PedroMatos.pd
f. Acessado em 25 de junho de 2011.
BARBERO, Jesús Martín. Ofício de cartógrafo: travessias latino-americanas da
comunicação na cultura. São Paulo: Edições Loyola, 2004.
BUFARAH JUNIOR, Alvaro. Rádio na internet, convergência de possibilidades. Anais
do 26. Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Belo Horizonte-MG,
setembro de 2003. São Paulo: Intercom, 2003. [cd-rom]
Décio Pignatari. São Paulo: Cultrix, 1964.
DOWNING, J.D.H. Mídia Radical: rebeldía nas comunicações e movimentos sociais /
John Downing com a colaboração de Tamara Villarreal Ford, Genève Gil, Laura Stein ;
tradução Silvana Vieira. – 2ª ed. – Editora Senac, São Paulo: 2004.
GOHN, Maria da Glória. Teoria dos movimentos sociais. São Paulo: Edições Loyola,
2004.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. La desencantada experiencia del intelectual
contemporáneo. Utopía y Praxis Latinoamericana/ Año 12. N° 39 (Octubre-Diciembre,
2007), pp.33.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensão do homem. Tradução:
MELO, José Marques de. Folkcomunicação na era digital: A comunicação dos
marginalizados invade a aldeia global. Disponível em: <
http://www.marquesdemelo.pro.br/textos/textos_recentes/txt_rec_03.htm>. Acesso em:
11 abr. 2011.
MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES. Um Plano Nacional para Banda Larga:
Sumário Executivo. Brasília: 2010. Disponível em:
<http://www.mc.gov.br/images/pnbl/sumario-executivo1.pdf>, acesso em 27/06/2011.
PAIVA, Raquel. Retorno da Comunidade: os novos caminhos do social. Rio de Janeiro:
Editora Mauad, 2007.
RAMOS, M. C. (2010). Crítica a um Plano Nacional de Banda Larga: uma perspectiva
de economia política das políticas públicas. In: Anais da IV Conferência ACORN-
REDECOM, Brasília, DF, de 14 e 15 de maio. Disponível em: < http://www.acorn-
redecom.org/papers/acornredecom2010ramos.pdf>, acesso em 27/06/2011.
SCHERER-WARREN, Ilse. Das Mobilizações às Redes de Movimentos Sociais.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
69922006000100007>. Acesso em: 20 jun. 2011.
TORO, Bernardo. Mobilização Social: Uma Teoria para a universalização da cidadania.
In MONTORO, T. (org). Comunicação e Mobilização Social. Brasília. Brasília: UnB,
vol 1, 1997, pp. 26-40.