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Ministério Público Federal P ROCURADORIA DA R EPÚBLICA NO PARANÁ F ORÇA -TAREFA L AVA J ATO EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 13ª VARA FEDERAL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CURITIBA/PR. AUTOS Nº: 5045241-84.2015.4.04.7000 CLASSE: Ação Penal AUTOR: Ministério Público Federal RÉUS: Fernando Antonio Guimarães Hourneaux de Moura, José Dirceu de Oliveira e Silva, Cristiano Kok, Gerson de Mello Almada, João Vaccari Neto, José Adolfo Pascowitch, José Antunes Sobrinho, Julio Cesar dos Santos, Julio Gerin de Almeida Camargo, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, Milton Pascowitch, Olavo Hourneaux de Moura Filho, Pedro José Barusco Filho, Renato de Souza Duque e Roberto Marques. O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL comparece, tempestivamente, perante Vossa Excelência, para apresentar RAZÕES DO RECURSO DE APELAÇÃO interposto, requerendo seu envio ao E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região após a apresentação de contrarrazões pelos apelados, para processamento e julgamento. Curitiba, 11 de julho de 2016. Roberson Henrique Pozzobon Procurador da República Julio Carlos Motta Noronha Procurador da República 1/109

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Ministério Público FederalPROCURADORIA DA REPÚBLICA NO PARANÁ

FORÇA-TAREFA LAVA JATO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 13ª VARA FEDERAL DA SUBSEÇÃO

JUDICIÁRIA DE CURITIBA/PR.

AUTOS Nº: 5045241-84.2015.4.04.7000

CLASSE: Ação Penal

AUTOR: Ministério Público Federal

RÉUS: Fernando Antonio Guimarães Hourneaux de Moura, José Dirceu de Oliveira e Silva,

Cristiano Kok, Gerson de Mello Almada, João Vaccari Neto, José Adolfo Pascowitch, José

Antunes Sobrinho, Julio Cesar dos Santos, Julio Gerin de Almeida Camargo, Luiz Eduardo

de Oliveira e Silva, Milton Pascowitch, Olavo Hourneaux de Moura Filho, Pedro José

Barusco Filho, Renato de Souza Duque e Roberto Marques.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL comparece, tempestivamente, perante

Vossa Excelência, para apresentar RAZÕES DO RECURSO DE APELAÇÃO interposto,

requerendo seu envio ao E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região após a apresentação de

contrarrazões pelos apelados, para processamento e julgamento.

Curitiba, 11 de julho de 2016.

Roberson Henrique Pozzobon

Procurador da República

Julio Carlos Motta Noronha

Procurador da República

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

AUTOS Nº: 5045241-84.2015.4.04.7000

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

APELADOS: CRISTIANO KOKFERNANDO ANTONIO GUIMARÃES HOURNEAUX DE MOURAGERSON DE MELLO ALMADAJOÃO VACCARI NETOJOSÉ ANTUNES SOBRINHOJOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVAJULIO CESAR DOS SANTOSLUIZ EDUARDO DE OLIVEIRA E SILVARENATO DE SOUZA DUQUEROBERTO MARQUES.

RAZÕES DE APELAÇÃO

Colenda turma,

Eminentes Julgadores,

Douto(a) Procurador(a) Regional da República

SUMÁRIO

1. RELATÓRIO............................................................................................................................................................ 52. OBJETO................................................................................................................................................................. 113. FUNDAMENTAÇÃO......................................................................................................................................... 133.1. Contra a absolvição de CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES das imputações dos crimes de

organização criminosa, corrupção ativa e lavagem de dinheiro....................................................................133.2. Contra a absolvição de RENATO DUQUE das imputações do crime de lavagem de ativos

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................................................................................................................................................................................................. 313.3. Contra a absolvição de JULIO CÉSAR de parte das imputações de prática do delito de

lavagem de capitais (itens 4.3.2 e 4.3.5 da denúncia), por falta de prova suficiente para a condenação (art. 386, VII, do CPP)............................................................................................................................. 41

3.4 Contra a absolvição de LUIZ EDUARDO de parte das imputações de prática do delito de lavagem de capitais (itens 4.2.2 e 4.3.5 da denúncia), por falta de prova suficiente para a condenação (art. 386, VII, do CPP);............................................................................................................................ 49

3.5. Contra a não consideração dos contratos nº P-8887/01-MO-PJ-1014/05 e P-8887/01-MO-PJ-1018/09 celebrados entre a ENGEVIX e a JAMP para o compto das condutas de lavagem de ativos praticadas por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES e RENATO DUQUE58

3.6 Contra o número de atos de corrupção considerados no dispositivo da sentença recorrida............................................................................................................................................................................... 63

3.7. Contra a dosimetria da pena fixada na sentença recorrida..........................................................653.7.1. Oposição à análise do Juízo quanto às circunstâncias judiciais enumeradas no artigo

59 do Código Penal......................................................................................................................................................... 663.7.1.1. Da culpabilidade considerada nas penas de GERSON ALMADA, JOÃO VACCARI, JOSÉ

DIRCEU, FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO, JULIO CÉSAR e ROBERTO MARQUES, assim como CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES e RENATO DUQUE38....................................................................................67

3.7.1.2. Da conduta social considerada nas penas de GERSON ALMADA, RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU, FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO, JULIO CÉSAR e ROBERTO MARQUES, assim como CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES............................................................................69

3.7.1.3. Dos motivos considerados nas penas de GERSON ALMADA, RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU, FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO, JULIO CÉSAR e ROBERTO MARQUES, assim como CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES............................................................................71

3.7.1.4. Das circunstâncias consideradas nas penas de LUIZ EDUARDO e JULIO CÉSAR, assim como CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, em relação a todas as imputações, de RENATO DUQUE, em relação ao delito de lavagem de capitais, de FERNANDO MOURA, no que respeita aos delitos de lavagem de dinheiro e organização criminosa, e de JOSÉ DIRCEU e ROBERTO MARQUES, no tocante ao delito de organização criminosa.......................................................................................................... 72

3.7.2. Oposição à análise do Juízo quanto às circunstâncias atenuantes e agravantes.............743.7.2.1. Da agravante prevista no artigo 61 do Código Penal em relação ao delito de

corrupção praticado por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES, RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU e FERNANDO MOURA.......................................................................................75

3.7.2.2. Da incidência da agravante prevista no artigo 62, inciso I, do Código Penal nas penas fixadas para RENATO DUQUE, JOSÉ DIRCEU e GERSON ALMADA................................................................76

3.7.2.3. Da incidência da agravante prevista no artigo 2º, §3º da Lei 12.850/2013 na pena fixada a JOSÉ DIRCEU...................................................................................................................................................... 77

3.7.3. Oposição à análise do Juízo quanto às causas de diminuição e de aumento de pena. 783.7.3.1. Da incidência do aumento de pena previsto no artigo 2º, §4º, III e V da Lei

12.850/2013 nas penas fixadas a FERNANDO MOURA, JOSÉ DIRCEU, JULIO CÉSAR, LUIZ EDUARDO e ROBERTO MARQUES, bem como a CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES............................79

3.7.3.2. Da incidência do aumento de pena previsto no artigo 1º, §4º da Lei nº 9.613/98 nas penas fixadas para GERSON ALMADA, JOSÉ DIRCEU, LUIZ EDUARDO, JULIO CÉSAR, FERNANDO

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MOURA, assim como em relação a CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES e RENATO DUQUE..................803.7.4. Considerações finais quanto à dosimetria das penas fixadas aos apelados......................833.8. Contra o reconhecimento da continuidade delitiva quanto aos atos de corrupção ativa e

passiva envolvendo a ENGEVIX................................................................................................................................... 853.9. Contra o reconhecimento da continuidade delitiva quanto aos delitos de lavagem de

ativos..................................................................................................................................................................................... 903.10. Contra o valor fixado na aplicação do artigo 387, caput e IV, CPP........................................1024. PEDIDOS............................................................................................................................................................ 106

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1. RELATÓRIO

Trata-se de processo criminal iniciado por denúncia (evento 01) oferecida pelo

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em desfavor de, dentre outros acusados1, FERNANDO

ANTONIO GUIMARÃES HOURNEAUX DE MOURA [“FERNANDO MOURA”], JOSÉ DIRCEU

DE OLIVEIRA E SILVA [“JOSÉ DIRCEU”], CRISTIANO KOK, GERSON DE MELLO ALMADA

[“GERSON ALMADA”], JOÃO VACCARI NETO [“JOÃO VACCARI”], JOSÉ ADOLFO

PASCOWITCH, JOSÉ ANTUNES SOBRINHO [“JOSÉ ANTUNES”], JULIO CÉSAR DOS SANTOS

[“JULIO CÉSAR”], JULIO GERIN DE ALMEIDA CAMARGO [“JULIO CAMARGO”], LUIZ

EDUARDO DE OLIVEIRA E SILVA [“LUIZ EDUARDO”], MILTON PASCOWITCH, OLAVO

HOURNEAUX DE MOURA FILHO [“OLAVO MOURA”], PEDRO JOSÉ BARUSCO FILHO

[“PEDRO BARUSCO”], RENATO DE SOUZA DUQUE [“RENATO DUQUE”] e ROBERTO

MARQUES, pela prática de diversos crimes, no período compreendido entre 2003 e 2015,

conforme a seguir exposto.

Sucintamente, apurou-se um gigantesco esquema voltado para a prática de

crimes no seio e em desfavor da Petrobras, perpetrados por meio de um verdeiro cartel

formado por grandes construtoras do país. Nesse desiderato, houve o pagamento de

propinas a pessoas que detinham altos cargos na Estatal, e também a agentes políticos, a

fim de preservar o alto lucro das empresas componentes do cartel e a divisão das obras na

forma escolhida pelos executivos das empreiteiras. Frustrava-se, assim, a competição dos

certames e se garantia a hegemonia das empresas cartelizadas.

Dentre as empresas formadoras do núcleo econômico da organização criminosa

constam as sociedades empresárias integrantes do Grupo ENGEVIX. Cabia aos réus

GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, na condição de gestores e

agentes das empresas, a função de as representar nos negócios espúrios mantidos com

1 O Juízo a quo promoveu o desmembramento do feito no que respeita a CAMILA RAMOS DE OLIVEIRA E SILVA e DANIELA LEOPOLDO E SILVA FACCHINI para os autos de ação penal nº 5030173-60.2016.4.04.7000, após o Tribunal Federal Regional da 4ª Região dar provimento ao Recurso em Sentido Estrito nº 5049160-81.2015.4.04.7000 interposto pelo parquet federal contra decisão proferida pelo Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba que negou o recebimento da denúncia em relação às acusadas.

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agentes públicos e operadores.

Apurou-se, ainda, que os cargos de comando de diretorias da Petrobras eram

preenchidos por meio de indicações de integrantes do Poder Legislativo e Executivo, com

o intuito de que fosse garantido o pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos,

sendo que esse núcleo político se encontra, em parte, sob investigação perante os

Tribunais Superiores e, em parte, em Curitiba.

Por sua vez, os funcionários do alto escalão da Petrobras (núcleo administrativo)

também tinham sua participação no recebimento de propina, assegurando às empreiteiras

formadoras do cartel as obras que tinham interesse e a membros da agremiação política

que os haviam indicado o recebimento de vantagem indevida.

A Diretoria de Serviços, por indicação do Partido dos Trabalhadores (PT), no

interregno de 2003 a 2012, restou ocupada por RENATO DUQUE, a qual tinha, ainda, de

2003 a 2011, PEDRO BARUSCO na Gerência Executiva de Engenharia. RENATO DUQUE foi

indicado à Diretoria de Serviços da Petrobras pelo então Ministro-Chefe da Casa Civil JOSÉ

DIRCEU. Em decorrência, o Partido dos Trabalhadores – PT e o próprio JOSÉ DIRCEU, em

conjunto com LUIZ EDUARDO, JULIO CÉSAR, ROBERTO MARQUES e FERNANDO

MOURA e OLAVO MOURA, recebia parcela das vantagens indevidas destinadas pelas

empreiteiras contratadas pela Petrobras à Diretoria de Serviços.

Para a operacionalização desse esquema criminoso, um núcleo financeiro

assegurava que os pagamentos indevidos (“propina”) chegassem ao seu destinatário final

sem que os sistemas de controles detectassem o percurso dos valores espúrios. Nesse

esquema, figuravam como importantes operadores financeiros, dentre outros, MILTON

PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, bem como JULIO CAMARGO e JOÃO

VACCARI.

Diante de tal quadro, os réus CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES, MILTON

PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH foram denunciados pela prática dos

seguintes crimes, em concurso material: 1) organização criminosa (art. 2º, caput e § 4º, II,

III, IV e V c/c art. 1º, §1º, da Lei nº 12.850/13); 2) corrupção ativa (art. 333, caput e

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parágrafo único do Código Penal): CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES, e MILTON

PASCOWITCH, por 129 vezes em concurso material; JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, por 128

vezes em concurso material; 3) lavagem de dinheiro (art. 1º c/c art. 1º, §4º da Lei nº

9.613/98): CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, por 19 séries independentes de atos

delituosos em concurso material; MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH,

por 25 séries independentes de atos delituosos em concurso material.

A FERNANDO MOURA e JOSÉ DIRCEU foram imputados a prática dos

seguintes delitos: 1) organização criminosa (art. 2º, caput e § 4º, II, III, IV e V c/c art. 1º, §1º

da Lei nº 12.850/13); 2) corrupção passiva (art. 317, caput e §1º, c/c art. 327, §2º, todos do

Código Penal): FERNANDO MOURA, por 4 vezes em concurso material; JOSÉ DIRCEU, por

31 vezes em concurso material; 3) lavagem de dinheiro (art. 1º c/c § 4º da Lei nº 9.613/98):

FERNANDO MOURA, por 5 séries independentes de atos delituosos em concurso

material; JOSÉ DIRCEU, por 11 séries independentes de atos delituosos em concurso

material.

Os réus JULIO CESAR, LUIZ EDUARDO, OLAVO MOURA e ROBERTO

MARQUES foram denunciados pela prática dos delitos de: 1) organização criminosa (art.

2º, caput e § 4º, II, III, IV e V c/c art. 1º, § 1º da Lei nº 12.850/13); 2) lavagem de dinheiro

(art. 1º c/c § 4º da Lei nº 9.613/98): JULIO CÉSAR, por 3 séries independentes de atos

delituosos em concurso material; LUIZ EDUARDO, por 9 séries independentes de atos

delituosos em concurso material; OLAVO MOURA, por 5 séries independentes de atos

delituosos em concurso material; ROBERTO MARQUES, por 1 série de atos delituosos.

A GERSON ALMADA, RENATO DUQUE, PEDRO BARUSCO e JULIO CAMARGO

não foi imputado o crime de organização criminosa porque já condenados pelo delito em

outros feitos conexos2. Contudo, foi GERSON ALMADA denunciado pela prática, por 129

vezes, em concurso material, de corrupção ativa (art. 333, caput e parágrafo único, do

Código Penal), enquanto RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO foram denunciados pela

2 GERSON ALMADA foi condenado em sede da ação penal nº 5083351-89.2014.4.04.7000. Já RENATO DUQUE, PEDRO BARUSCO e JULIO CAMARGO foram condenados pela prática do delito de associação criminosa (art. 288 do Código Penal) em sede da ação penal nº 5012331-04.2015.4.04.7000.

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prática, por 31 vezes em concurso material, do delito de corrupção passiva qualificada, em

sua forma majorada (art. 317, caput e §1º, c/c art. 327, §2º, todos do Código Penal). Da

mesma forma, GERSON ALMADA, RENATO DUQUE, PEDRO BARUSCO e JULIO

CAMARGO restaram denunciados pela prática do delito de lavagem de capitais (art. 1º c/c

§2º, II e §4º da Lei nº 9.613/98): GERSON ALMADA, por 19 séries independentes de atos

delituosos em concurso material; RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, por 14 séries

independentes de atos delituosos em concurso material; e JULIO CAMARGO, por 1 vez.

JOÃO VACCARI foi denunciado tão somente pela prática delituosa, por 31

vezes, em concurso material, do delito de corrupção passiva qualificada, em sua forma

majorada (art. 317, caput e §1º, c/c art. 327, §2º, todos do Código Penal).

Finalmente, JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, MILTON PASCOWITCH e LUIZ

EDUARDO foram também denunciados pela prática do delito de fraude processual (art.

347, caput e §1º do Código Penal).

Esboçados os contornos das imputações veiculadas na presente ação penal,

retoma-se a partir do já consignado no detalhado relatório constante dos memoriais do

MPF (evento 879).

O assistente de acusação apresentou alegações finais em sede do evento 884.

Em sede do evento 895, o Juízo competente determinou que fosse o sigilo dos

autos de interceptação telemática nº 5031929-41.2015.4.04.7000 levantado, a fim de que

fosse viabilizado o acesso aos defensores, bem como a juntada das decisões judiciais de

homologação dos acordos de colaboração de PEDRO BARUSCO, JULIO CAMARGO,

MILTON PASCOWITCH, JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, AUGUSTO MENDONÇA, RICARDO

PESSOA, EDUARDO LEITE e DALTON AVANCINI, a qual foi efetuada no evento 896. Na

mesma oportunidade, estendeu, em decorrência das medidas então adotadas, o prazo

para que as defesas apresentassem seus memoriais até o dia 02/05/2016.

A defesa de JOÃO VACCARI apresentou suas alegações finais em sede do

evento 914. Considerando-se o despacho de evento 895, porém, o Juízo concedeu-lhe

prazo até 02/05/2016 para complementação da peça, caso desejasse (evento 917).

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Diante das alegações, apresentadas pela defesa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ

EDUARDO (evento 923), de que estaria impossibilitado o acesso à mídia em que constante

o resultado das medidas cautelares objeto dos autos nº 5031929-41.2015.4.04.7000, o

Juízo estendeu o prazo para a apresentação de memoriais até o dia 03/05/2016,

considerando-se que o problema fora resolvido em 27/04/2016, apenas um dia após

reclamação da defesa.

Promoveu-se a juntada dos memoriais dos réus GERSON ALMADA (evento

958), CRISTIANO KOK (evento 960), MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH

(evento 962), OLAVO MOURA (evento 964), JOSÉ ANTUNES (evento 966), JOSÉ DIRCEU e

LUIZ EDUARDO (evento 969), FERNANDO MOURA (evento 971), JULIO CÉSAR (evento

973), PEDRO BARUSCO (evento 974), ROBERTO MARQUES (evento 976), JULIO CAMARGO

(evento 977) e RENATO DUQUE (evento 979).

Após, portanto, a regular instrução, a sentença foi prolatada no evento 985,

momento em que o Juízo a quo julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva,

conforme segue:

888. Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva.889. Absolvo Cristiano Kok, José Antunes Sobrinho, Júlio Gerin de Almeida

Camargo e Olavo Hourneaux de Moura Filho das imputações por falta de prova suficiente para condenação (art. 386, VII, do CPP).

890. Absolvo Renato de Souza Duque, Pedro José Barusco Filho, João Vaccari Neto e Roberto Marques das imputações de crime de lavagem de dinheiro por falta de prova suficiente para condenação (art. 386, VII, do CPP).

891. Condeno Milton Pascowitch, José Adolfo Pascowitch, José Dirceu de Oliveira e Silva, Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, Roberto Marques e Júlio Cesar dos Santos pelo crime de pertinência à organização criminosa do art. 2º da Lei nº 12.850/2013.

892. Condeno Gerson de Mello Almada:a) pelo crime de corrupção ativa, por cinco vezes, pelo pagamento de vantagem

indevida a Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho, em razão do cargo destes na Petrobrás (art. 333 do CP), e ao grupo político de José Dirceu de Oliveira e Silva, por solicitação deles (art. 333 do CP);

b) pelo crime de lavagem de dinheiro do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/1998, por dezesseis vezes, consistente nos repasses, com ocultação e dissimulação, de recursos criminosos provenientes dos contratos da Engevix Engenharia obtidos com cartel e ajuste fraudulento de licitação, através de contratos superfaturados ou simulados, para a Jamp Engenheiros Associados e a JD Assessoria.

893. Condeno Renato de Souza Duque pelo crime de corrupção passiva, por cinco vezes pelo recebimento de vantagem indevida em razão de seu cargo como Diretor na Petrobrás e o pagamento, por sua solicitação, de vantagem indevida ao grupo

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político dirigido por José Dirceu de Oliveira e Silva (art. 317 do CP).894. Condeno Pedro José Barusco Filho pelo crime de corrupção passiva, por cinco

vezes pelo recebimento de vantagem indevida em razão de seu cargo como gerente na Petrobrás e o pagamento, por sua solicitação, de vantagem indevida ao grupo político dirigido por José Dirceu de Oliveira e Silva (art. 317 do CP).

895. Condeno João Vaccari Neto pelo crime de corrupção passiva, a título de participação, pelo direcionamento ao grupo político de José Dirceu de Oliveira e Silva de parte da vantagem indevida destinada à Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobrás e que foi acertada com o Diretor Renato Duque em decorrência de seu cargo como Diretor na Petrobrás (art. 317 do CP).

896. Condeno Milton Pascowitch: a) pelo crime de corrupção passiva, por cinco vezes, pela intermediação do

recebimento de vantagem indevida para Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho em razão dos cargo destes como Diretor e gerente na Petrobrás, com direcionamento de parte para o grupo político de José Dirceu de Oliveira e Silva por solicitação deles (art. 317 do CP); e

b) pelo crime de lavagem de dinheiro por doze vezes, do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/1998, consistente na intermediação do paamento, com ocultação e dissimulação, de recursos criminosos provenientes dos contratos da Petrobrás.

897. Condeno José Adolfo Pascowitch: a) pelo crime de corrupção passiva, por cinco vezes, pela intermediação do

recebimento de vantagem indevida para Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho em razão dos cargo destes como Diretor e gerente na Petrobrás, com direcionamento de parte para o grupo político de José Dirceu de Oliveira e Silva por solicitação deles (art. 317 do CP); e

b) pelo crime de lavagem de dinheiro por doze vezes, do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/1998, consistente na intermediação do pagamento, com ocultação e dissimulação, de recursos criminosos provenientes dos contratos da Petrobrás.

898. Condeno José Dirceu de Oliveira e Silva:- pelo crime de corrupção passiva, por cinco vezes, pelo recebimento de parte da

vantagem indevida destinada pela Engevix à Diretoria de Engenharia e Serviços da Petrobrás, em razão do cargo de Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho na empresa estatal (art. 317 do CP); e

- pelo crime de lavagem de dinheiro por pelo menos oito vezes, do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/1998, consistente nos repasses e recebimentos, com ocultação e dissimulação, de recursos criminosos.

899. Condeno Luiz Eduardo de Oliveira e Silva pelo crime de lavagem de dinheiro por pelo menos duas vezes, do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/1998, consistente nos repasses e recebimentos, com ocultação e dissimulação, de recursos criminosos.

900. Condeno Júlo Cesar dos Santos pelo crime de lavagem de dinheiro por pelo menos uma vez, do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/1998, consistente nos repasses e recebimentos, com ocultação e dissimulação, de recursos criminosos.

901. Condeno Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura:- pelo crime de corrupção passiva, por cinco vezes, pelo recebimento de parte da

vantagem indevida destinada pela Engevix à Diretoria de Engenharia e Serviços da Petrobrás, em razão do cargo de Renato de Souza Duque e Pedro José Barusco Filho na empresa estatal (art. 317 do CP); e

- pelo crime de lavagem de dinheiro por pelo menos duas vezes, do art. 1º, caput, inciso V, da Lei nº 9.613/1998, consistente nos repasses e recebimentos, com ocultação e dissimulação, de recursos criminosos.

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No evento 1004, o Juízo a quo expediu mandado de prisão preventiva contra

FERNANDO MOURA. No evento 1020, encaminhou ofício ao Supremo Tribunal Federal,

endereçado ao Excelentíssimo Ministro Luís Roberto Barroso, no interesse dos autos da

Execução Penal 2/DF, informando a condenação de JOSÉ DIRCEU.

No evento 1040, procedeu o Juízo sentenciante à correção de erro material da

sentença, consignando que MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH foram

condenados pelo delito de corrupção ativa, bem como reconheceu a atenuante do art. 65,

I, do Código Penal para JOSÉ DIRCEU, passando a pena do acusado a ser de 20 anos e 10

meses de reclusão e 245 dias-multa. Na mesma oportunidade, deu provimento aos

embargos de declaração apresentados pela defesa de LUIZ EDUARDO (evento 1037), de

modo a agregar no dispositivo da sentença a absolvição, por atipicidade, de LUIZ

EDUARDO, MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH da imputação da prática

do crime do art. 347 do Código Penal, corrigindo, assim, erro material da sentença.

Quanto aos demais embargos, opostos pela defesa de MILTON PASCOWITCH

(evento 1028) e GERSON ALMADA (evento 1065), não houve procedência (eventos 1030 e

1065).

É o relatório.

2. OBJETO

O presente recurso volta-se apenas aos seguintes aspectos da sentença, que, no

mais, merece ser mantida na íntegra:

1. Contra a absolvição de CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES das imputações

dos crimes de organização criminosa, corrupção ativa e lavagem de ativos por falta de

prova suficiente para a condenação (art. 386, VII, do CPP);

2. Contra a absolvição de RENATO DUQUE das imputações do crime de

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lavagem de ativos, por falta de prova suficiente para condenação (art. 386, VII, CPP);

3. Contra a absolvição de JULIO CÉSAR de parte das imputações de prática do

delito de lavagem de capitais (itens 4.3.2 e 4.3.5 da denúncia), por falta de prova suficiente

para a condenação (art. 386, VII, do CPP);

4. Contra a absolvição de LUIZ EDUARDO de parte das imputações de prática

do delito de lavagem de capitais (itens 4.2.2 e 4.3.5 da denúncia), por falta de prova

suficiente para a condenação (art. 386, VII, do CPP);

5. Contra a não consideração dos contratos nº P-8887/01-MO-PJ-1014/05 e

8887/01-MO-PJ-1018/09 celebrados entre a ENGEVIX e a JAMP para o compto das

condutas de lavagem de ativos praticadas por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES;

6. Contra o número de atos de corrupção considerados no dispositivo da

sentença recorrida no que respeita ao Grupo ENGEVIX;

7. Contra a dosimetria das penas fixadas na condenação dos apelados,

especialmente em relação à análise do Juízo a quo quanto às circunstâncias judiciais

enumeradas no artigo 59, caput, do Código Penal; à análise do d. Juízo quanto às

circunstâncias atenuantes e agravantes; e à análise do Juízo quanto às causas de

diminuição e de aumento de pena;

8. Contra o reconhecimento de continuidade delitiva entre os crimes de

corrupção ativa e passiva em relação aos fatos denunciados nesta ação penal envolvendo

o Grupo ENGEVIX;

9. Contra o reconhecimento de continuidade delitiva entre os crimes de

lavagem de capitais relativos aos fatos denunciados nesta ação penal;

10. Contra o valor fixado na aplicação do artigo 387, caput e IV, CPP.

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3 . FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Contra a absolvição de CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES das

imputações dos crimes de organização criminosa, corrupção ativa e lavagem de

dinheiro

CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES restaram denunciados pela prática

delituosa dos crimes de (i) pertinência a organização criminosa, (ii) corrupção ativa, por

129 vezes, em concurso material, e (iii) lavagem de ativos, por 19 séries independentes de

atos delituosos, em concurso material, consubstanciadas nos pagamentos decorrentes da

celebração de catorze contratos fraudulentos de prestação de serviços entre a ENGEVIX e a

JAMP Engenheiros Associados e cinco contratos fraudulentos de prestação de serviços

entre a ENGEVIX e a JD ASSESSORIA.

A sentença proferida pelo Juízo a quo reconheceu a materialidade dos delitos

de pertinência a organização criminosa e corrupção ativa – exceção feita ao ato

envolvendo o contrato da ENGEVIX para as obras do Módulo 1 de Cacimbas – Fase II –,

assim como parcialmente do delito de branqueamento de capitais. De acordo com a

decisão, não há que se falar em lavagem de dinheiro decorrente dos dois primeiros

contratos celebrados entre a ENGEVIX e a JAMP Engenheiros Associados, uma vez que não

denunciado o efetivo repasse dos valores. No mesmo sentido, não haveria repasse de

valores indevidos decorrentes da primeira contratação da JD ASSESSORIA pela ENGEVIX,

pois comprovada a prestação de serviços pela empresa de JOSÉ DIRCEU:

231. Reporta-se a denúncia aos seguintes contratos obtidos pela Engevix Engenharia junto à Petrobrás por cartel e ajuste de licitações e nos quais teriam sido oferecidas propinas aos dirigentes da Petrobrás:

a) dois contratos da Engevix Engenharia para construção dos módulos 1, 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas (UTGC;

b) contrato do Consórcio Skanska-Engevix URE para a execução de obras e implementação das unidades de recuperação de enxofre III e de tratamento de gás residual na Refinaria Presidente Bernardes (RPBC);

c) contrato do Consórcio Integradora URC/Engevix/Niplan/NM para a execução

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de obras de adequação da URC da Refinaria Presidente Bernardes (RPBC);d) contrato do Consórcio Skanska/Engevix para a execução das obras de

implementação do on-site da unidade de propeno da UN-REPAR, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR; e

e) contrato do Consórcio Integração (Engevix e Queiroz Galvão) para a execução das obras de implementação das tubovias e interligações do off-site da carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves – RLAM.

(…)556. Considerando cumulativamente a ausência de prova da prestação de

qualquer serviço, salvo em relação ao primeiro contrato, e os próprios depoimentos de Milton Pascowitch e de José Antunes Sobrinho, além dos das testemunhas arroladas pela própria Defesa no Peru, de se concluir que os repasses decorrentes dos contratos em questão, salvo do primeiro, visavam mero repasses de valores, sem causa lícita, da Engevix para a José Dirceu de Oliveira e Silva.

557. Esse o relato sintético das provas documentais dos repasses entre a Engevix Engenharia, a Jamp Engenheiros, a JD Assessoria, Pedro José Barusco Filho e Renato de Souza Duque.

(…)645. Reputo caracterizado um crime de corrupção por contrato, ou seja, cinco,

ainda que tenham se consumado mediante dezenas de repasses de dinheiro e envolvido mais de um beneficiário.

646. Não reputo suficientemente provado o crime de corrupção em relação ao primeiro contrato de Cacimbas (Fase II). Para este contrato, teria havido, segundo a denúncia, mera oferta de propina, sem aceitação e pagamento. Sem aceitação e pagamento, a única prova a respeito da oferta consiste nas declarações de Milton Pascowitch e que, sozinha, não ampara a condenação criminal.

647. Como os valores utilizados para pagamento da propina tinham como parcial procedência contratos obtidos por intermédio de crimes de cartel (art. 4º, I, da Lei nº 8.137/1990) e de frustração, por ajuste, de licitações (art. 90 da Lei nº 8.666/1993), e como, para os repasses, foram utilizados diversos mecanismos de ocultação e dissimulação da natureza e origem criminosa dos bens, os fatos também caracterizam crimes de lavagem de dinheiro tendo por antecedentes os referidos crimes, especialmente o segundo contra a Administração Pública (art. 1.º, V, da Lei n.º 9.613/1998).

648. Com efeito, caracterizadas diversas condutas de ocultação e dissimulação, tudo isso no âmbito das obras contratadas pela Petrobrás.

649. Os crimes de lavagem ocorreram, em um primeiro momento, pelos repasses mediante superfaturamento dos doze contratos de consultoria e assessoria celebrados, no período de 13/04/2007 a 21/12/2012, entre a Jamp Engenheiros e a Engevix Engenharia. O valor da vantagem indevida devida a Milton Pascowitch, aos agentes da Petrobrás e ao grupo político foi embutido no contrato, a fim de conferir às transações a aparência de licitude.

650. Prosseguiram com os quatro contratos de prestação de serviços simulados entre a Engevix Engenharia e a JD Assessoria no período de 01/03/2009 a 02/11/2010 e que, conforme visto, não envolvem prestação efetiva de serviços. Os contratos foram simulados para conferir aos repasses a aparência de licitude.

(…)886. Portanto, resta também provada a materialidade e a autoria do crime do art.

2º da Lei nº 12.850/2013, devendo ser responsabilizado, neste processo, Milton Pascowitch, José Adolfo Pascowitch, José Dirceu de Oliveira e Silva, Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, Roberto Marques

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e Júlio Cesar dos Santos.

Não obstante, o d. Magistrado não reconheceu a autoria de CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES:

686. Cristiano Kok e José Antunes Sobrinho eram sócios e dirigentes da Engevix Engenharia juntamente com Gerson de Mello Almada.

687. Segundo declararam em Juízo (evento 691), o que tem suporte nas outras provas, Gerson de Mello Almada era o responsável pela área de Petróleo da Engevix, Cristiano Kok, pela parte administrativa e José Antunes Sobrinho pela área de construção no setor elétrico.

688. Parece a este Juízo improvável que ambos desconhecessem os pagamentos efetuados pela Engevix Engenharia a Milton Pascowitch, bem como o propósito desses pagamentos. O volume de pagamentos é muito expressivo e é pouco plausível que Gerson de Mello Almada tivesse autonomia para realizá-los sem gerar questionamentos dos demais sócios-dirigentes.

689. Além disso, ambos tinha conhecimento do ambiente de negócios no qual a Engevix se inseria na relação com empresas estatais e com o Governo Federal, o que é ilustrado pela afirmação de Milston Pascowitch de que José Antunes Sobrinho foi o responsável na empresa por decidir pelo pagamento de propinas em contratos da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (item 438).

690. Apesar do juízo de probabilidade, não foi produzida uma prova mais segura, acima de qualquer dúvida razoável, de que tinham eles conhecimento de que esses contratos celebrados no âmbito da área dirigida por Gerson de Mello Almada tivessem de fato o propósito de viabilizar o repasse de propinas.

691. Assim, devem ser absolvidos por falta de prova suficiente de autoria.(…)889. Absolvo Cristiano Kok, José Antunes Sobrinho, Júlio Gerin de Almeida

Camargo e Olavo Hourneaux de Moura Filho das imputações por falta de prova suficiente para condenação (art. 386, VII, do CPP).

Neste ponto, porém, merece reforma a sentença.

Note-se que CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, na condição de altos

executivos da ENGEVIX, tinham pleno domínio das atividades desempenhadas pela

empreiteira, possuindo, portanto, papel igualmente importante ao de GERSON ALMADA

na concretização dos negócios escusos que visavam a resguardar e a zelar pelos interesses

da empresa. Demonstrou-se que, além de os acusados disporem de grande poder de

decisão, não obstante o papel de destaque desempenhado por GERSON ALMADA, as

decisões eram tomadas entre os três de pleno e comum acordo.

GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES ativamente

participavam das decisões estratégicas da empresa de que eram sócios e, uníssonos, com

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plena consciência do esquema criminoso, optaram conjuntamente por direcionar a

ENGEVIX a um modelo de negócio criminoso nos certames e contratos públicos bilionários

da Petrobras.

Nesse liame, observem-se os interrogatórios de GERSON ALMADA, JOSÉ

ANTUNES e CRISTIANO KOK, oportunidades em que afirmaram inexistir relação de

ascendência entre os três sócios controladores da empresa:

GERSON ALMADA: Juiz Federal:- Senhor Almada, antes de entrar no objeto da ação propriamente dita, algumas questões mais gerais da sua posição na Engevix. O senhor é um dos 3 sócios daquela empresa Jackson, é isso?

Interrogado:-Exato.Juiz Federal:- Essa empresa é a proprietária da Engevix Engenharia?Interrogado:-Ela é a acionista da Engevix Engenharia.Juiz Federal:- Então, basicamente existem 3 sócios controladores da empresa?Interrogado:-3 sócios controladores, em partes iguais.Juiz Federal:- Existe alguma ascendência de um em relação ao outro dentro da

empresa?Interrogado:-Não, são partes iguais.Juiz Federal:- E existe alguma espécie de divisão de trabalho dentro da empresa?Interrogado:-Existe uma divisão ligada principalmente à experiência de cada um

de nós. Então eu sempre tive como responsabilidade dentro da empresa, toda a parte industrial e de infraestrutura. O engenheiro Antunes toda a parte de energia e o Cristiano Kok toda a parte administrativa, jurídica, contábil.

Juiz Federal:- Isso há quanto tempo, mais ou menos, que existe essa divisão?Interrogado:-Essa divisão foi feita no momento em que nós adquirimos a

empresa, em 97, 1997, e antes também essa divisão já existia sendo cada um diretor em uma área3.

JOSÉ ANTUNES: Juiz Federal:- Antes de formular algumas questões mais diretas ao senhor, sobre o caso concreto, eu queria algumas informações mais genéricas, o senhor é um dos acionistas controladores da Engevix?

Interrogado:- Do grupo sim, senhor, através da Jackson que é nossa holding, sim.Juiz Federal:- Perfeito. O senhor está nessa posição desde quando?Interrogado:- Na verdade desde que nós adquirimos a companhia em 1997 do

Grupo Rossi, entre três sócios houve um management buyout, quer dizer, três sócios compraram e aí dividimos a participação entre três, um terço, um terço, um terço.

Juiz Federal:- Entre as empresas desse grupo existe a Engevix Engenharia?Interrogado:- Existe a Engevix Engenharia, existe hoje em dia a Engevix

Construções, tivemos concessões em aeroportos que foram vendidas, uma empresa de energia elétrica e geração e um estaleiro, esses são os principais.

Juiz Federal:- Os outros acionistas controladores quem são?Interrogado:- São os mesmos, são os mesmos, sendo que em alguns casos nós

temos sócios, por exemplo, no caso do estaleiro é a Covix, nós tínhamos a Mitsubishi Heavy Industries era sócia.

Juiz Federal:- Mas da Jackson?

3 Trecho do interrogatório de GERSON ALMADA, reduzido a termo no evento 722.

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Interrogado:- Da Jackson só os três sócios.Juiz Federal:- Quem são os três, por favor?Interrogado:- O senhor Cristiano Kok e o senhor Gerson de Melo Almada.Juiz Federal:- Existe alguma ascendência de um em relação ao outro?Interrogado:- Não, nossas partes são absolutamente iguais.4

CRISTIANO KOK: Juiz Federal:- Senhor Cristiano, antes de tratar aqui mais diretamente do objeto dessa acusação, umas perguntas de cunho um pouco mais geral. O senhor é um dos acionistas controladores da Engevix?

Interrogado:- Através de uma holding que nós temos, chamada Jackson Empreendimentos S/A.

Juiz Federal:- Desde quando o senhor tem essa posição?Interrogado:- Desde 1997, quando nós adquirimos a Engevix Engenharia do

antigo proprietário.Juiz Federal:- Quem são os outros acionistas controladores?Interrogado:- Doutor José Antunes Sobrinho e doutor Gerson de Melo Almada.Juiz Federal:- Existe alguma ascendência entre os senhores?Interrogado:- Não senhor, cada um tem um terço das ações.5

Neste contexto, CRISTIANO KOK desempenhava o papel de Presidente do

Grupo ENGEVIX, cabendo-lhe, conforme declinado por GERSON ALMADA, JOSÉ

ANTUNES e o próprio apelado em sede de interrogatório judicial, a responsabilidade

pelas áreas administrativa, jurídica, contábil e de caixa da ENGEVIX:

GERSON ALMADA: Juiz Federal:- E existe alguma espécie de divisão de trabalho dentro da empresa?

Interrogado:-Existe uma divisão ligada principalmente à experiência de cada um de nós. Então eu sempre tive como responsabilidade dentro da empresa, toda a parte industrial e de infraestrutura. O engenheiro Antunes toda a parte de energia e o Cristiano Kok toda a parte administrativa, jurídica, contábil.6

JOSÉ ANTUNES: Juiz Federal:- E dentro do empreendimento, pelo menos dentro dessa empresa Engevix Engenharia, existe alguma divisão de tarefas?

Interrogado:- Sim, sim, ela é absolutamente clara. Se o senhor me permitir um pouquinho de explicação da formação do grupo, os três sócios eram antigos empregados, eu entrei em 1982 lá na Engevix, em 1986 fui diretor estatutário quando o acionista era outro, até em 1996 para 1997, os três compraram a companhia. Quando foi comprada a companhia, eu naturalmente trabalhei sempre no setor elétrico brasileiro todo esse tempo e eu tocava a vice-presidência de energia e recursos hídricos; o Gerson de Melo Almada se preocupava com a área industrial da empresa, ele era a parte industrial da companhia, nós dois nos denominamos vice-presidentes, e o Cristiano Kok fazia um trabalho dentro da companhia que cobria basicamente a área financeira, a área administrativa financeira, o setor de qualidade e a parte jurídica, então ele ficava lá. No desenvolvimento do grupo, que

4 Trecho do interrogatório de JOSÉ ANTUNES, reduzido a termo no evento 691.5 Trecho do interrogatório de CRISTIANO KOK, reduzido a termo no evento 691.6 Trecho do interrogatório de GERSON ALMADA, reduzido a termo no evento 722.

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ocorreu fortemente no início da década passada, até 2006 o setor da minha área, a gente desenvolveu muita coisa até 2006, na verdade praticamente as receitas da companhia eram derivadas do setor elétrico, eu tinha trabalhado nas privatizações lá atrás, conhecia muito isso aí. A Petrobras, que é um pouco da questão, veio para nós em 2005 e permaneceu até 2011, onde fortemente foram obtidos contratos na área de refino, e essa era com o Gerson, 2009 para 2010 houve a aquisição do estaleiro Rio Grande e o ganho daqueles contratos de casco com a PETROBRAS, também ficou na mão do Gerson, eu também me ocupei da criação e fundação, depois venda de uma empresa de energia elétrica chamada Desenvix, essa empresa foi vendida para os noruegueses esse ano que passou por uma série de necessidades, e eu também me ocupei dos aeroportos, das concessões dos aeroportos, Brasília e Natal, que nós implementamos mais recentemente, também vendemos o ano passado em face das dificuldades que nós tivemos. E, finalmente, quando Gerson Almada acabou preso, eu tive que assumir toda a questão lá do estaleiro do sul, coisa que eu vinha fazendo até que eu também tive meus problemas aqui.

(…)Ministério Público Federal:- Senhor Antunes, eu gostaria que o senhor nos

explicasse, o senhor já citou a divisão mais ou menos das atribuições dos três sócios, Almada ficaria na parte industrial, o Kok na administração financeira e jurídica, o senhor no setor elétrico, aeroportos e internacional, seria isso?

Interrogado:- Foi, foi isso que eu fiz.Ministério Público Federal:- Como funcionavam as decisões estratégicas nesses

setores?Interrogado:- As decisões, eu posso lhe colocar, o senhor está me perguntando o

seguinte, cada área da companhia definia a sua estratégia e ela podia estar sendo discutida numa reunião de conselho de administração, então, por exemplo, vai para área internacional? Vai, quanto é que custa? Vale a pena? Quais são os países? Quais são nossos riscos? Então a gente tomava esse tipo de decisão; eu disse “Bem, eu não vou trabalhar na Ásia, não vou trabalhar no Oriente Médio, vou trabalhar na América Latina ou no cone sul da África, lusófona (inaudível), ali só”, por exemplo, esse tipo de decisão era tomada.

Ministério Público Federal:- As decisões da PETROBRAS, da área industrial, que tipo de decisões eram levadas a essa deliberação dos sócios?

Interrogado:- Decisão do tipo, por exemplo, vamos trabalhar na área de refino ou vamos trabalhar, entrar na área de estaleiros que é área de exploração, isso era levado não só aos sócios, também era levado para o conselho de administração, o grupo tinha um conselho de administração e procurava colocar algumas boas pessoas lá como, por exemplo, o professor Pastori, na área econômica que também dava os cenários econômicos para nós, até para ver pra que lado a companhia devia encaminhar seus investimentos; por exemplo, toda estratégia feita para Desenvix que, enfim, nós acabamos vendendo ela em duas (inaudível) para os noruegueses, até em decorrência dos problemas financeiros em que caímos, todas aquelas decisões de pequenas centrais, projetos eólicos, que ganhava os leilões para construir, eram levadas ao conselho de administração e discutidas.

Ministério Público Federal:- O senhor integrava o conselho de administração?Interrogado:- Sim, senhor.Ministério Público Federal:- Os demais sócios também?Interrogado:- Todos os sócios.7

CRISTIANO KOK: Juiz Federal:- E há uma distribuição de tarefas entre os senhores

7 Trecho do interrogatório de JOSÉ ANTUNES, reduzido a termo no evento 691.

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na Engevix Engenharia?Interrogado:- Há uma distribuição muito clara de tarefas desde que nós

adquirimos a empresa, eu sempre cuidei da parte administrativa financeira e contábil da sociedade, doutor Gerson sempre cuidou da parte vinculada às indústrias e infraestrutura, abrangendo todos os contratos na área de PETROBRAS, na área de siderurgia e na área de transportes, e doutor José Antunes Sobrinho, um dos maiores especialistas brasileiros em usinas hidrelétricas, era responsável pela área de energia e recursos hídricos.

Juiz Federal:- Havia decisões comuns também tomadas entre os três sócios?Interrogado:- As decisões comuns eram decisões de caráter estratégico geral da

empresa, para dar alguns exemplos ao senhor, a decisão de investir em usinas hidroelétricas nos conduziu à criação de uma sociedade chamada Desenvix que, ao longo de 15 a 20 anos, chegou a produzir 360 megawatts de potência instalada em pequenas centrais, usinas hidroelétricas e parques eólicos, essa decisão de investir foi compartilhada, a decisão de como fazer o investimento, quem contratar e conseguir, foi tomada por doutor Antunes. Outro exemplo, decidimos implantar um sistema ERP que era um sistema de controle de gestão, essa decisão foi tomada, foi escolhido o sistema Oracle e a implantação desse sistema ficou ao meu cargo porque envolvia o controle administrativo e financeiro de toda a sociedade. O terceiro exemplo...8

Dada a sua atribuição no âmbito da empresa, CRISTIANO KOK restou

responsável por reunir-se com JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH e com ele acertar a celebração

dos contratos entre a ENGEVIX e a JAMP, utilizados para justificar o repasse dos valores a

serem destinados a título de propina aos agentes públicos corrompidos, assim como a

efetivação de referidos pagamentos, possuindo pleno conhecimento de que visavam a

concretizar negócios escusos:

MILTON PASCOWITCH: “Juiz Federal:-E isso era tratado com clareza com o Senhor Gerson Almada, ele sabia dessas doações?

Interrogado:-Lógico, sabia, esse valor era sabido, eu informava ao Gerson que tinha entregue, ou seja, X mil reais para o João Vaccari, ele passava então uma autorização para o Cristiano Kok elaborar um contrato de prestação de serviço, o José Adolfo, meu irmão, sentava com o Cristiano Kok e assinavam esses contratos e nós éramos ressarcidos desses valores pagos. Esses contratos não estão vinculados a nenhuma obra, eles tem uma característica que é da rubrica quatro mil da Engevix, que é uma rubrica vinculada a vice-presidência da empresa e ela tem escopos completamente diferentes da nossa atuação e tem uma característica principal que eram de pagamentos a vista, porque toda a nossa remuneração, por exemplo, Cacimbas começou em 2007 e terminou em 2011, são 70 e poucas medições mensais. Nesse caso de reposição de valores pagos de propina, eles têm vencimento a vista, eles sempre foram pagos em uma parcela só.

(…)Juiz Federal:-Com quem o senhor discutiu dentro da Engevix a respeito desses

assuntos de comissão?

8 Trecho do depoimento de CRISTIANO KOK, reduzido a termo no evento 691.

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Interrogado:-Sempre o Gerson Almada.Juiz Federal:-Cristiano Kok?Interrogado:-Não. Eu nunca conversei com o Cristiano Kok a respeito de propina

ou a respeito de qualquer andamento de empreendimento na PETROBRAS. Quem tinha...

Juiz Federal:-José Antunes Sobrinho?Interrogado:-Também não.Juiz Federal:- Quem tinha?Interrogado:- Quem tinha contato com o Cristiano, porque era das atribuições

dele era o José Adolfo, meu irmão, que fazia parte então de administração, administrativa e financeira da nossa empresa e que conversava com o Cristiano sobre faturamento, sobre recebimentos.

(...)Ministério Público Federal:- O senhor mencionou também que Cristiano Kok era

responsável pela parte financeira...Interrogado:- Administrativa financeira.Ministério Público Federal:- Como que era a participação dele nessa parte

financeira, o senhor falou até que conversava com o Almada e depois...Interrogado:- É todo o relacionamento que eu sempre tive, que a JAMP sempre

teve com a Engevix, sempre teve início em acertos e decisões tomadas por mim e pelo Gerson Almada, em qualquer assunto, com exceção desse de Belo Monte, único, o resto todos tinham o início entre uma conversa minha com o Gerson, depois dessa conversa acertada, os percentuais de remuneração, os valores que iriam ser repassados, as participações, essas coisas todas, na época da liquidação, esse acompanhamento era feito pelo meu irmão José Adolfo que sentava com o Cristiano e acompanhava os contratos, ou seja:- “Nós temos direito a receber tanto.”, eles faziam lá o faturamento e as parcelas eram pagas. No caso do contrato da rubrica 4 mil da mesma forma, os assuntos eram tratados com o Gerson, eu sentava com o Gerson e comunicava que eu havia acertado com o João Vaccari X mil reais ou milhão de reais, ele passava para o Cristiano, o Cristiano elaborava o contrato e era feito o procedimento de assinatura e o pagamento.

Ministério Público Federal:- Certo. O Cristiano, ele tinha ciência de que esses contratos não tinham sido, ao menos não integralmente, prestados pela JAMP?

Interrogado:- Não, ele tinha ciência, mesmo porque o escopo desses contratos eram dados por alguém da área dele, não sei se por ele, mas alguém da área dele, o jurídico respondia a ele. E ele teria que nos pagar o valor de R$ 1 milhão, o jurídico ou ele, embaixo da gestão dele, definia que o escopo seria estudo de viabilidade para participar de leilão das linhas de transmissão.

Ministério Público Federal:- Objetos inexistentes?Interrogado:- Objetos inexistentes, isso.(…)Defesa de Luciano Kok:- Então, a partir disso eu vou fazer pergunta seguinte, o

seu irmão se envolvia com as tratativas para justificar os pagamentos?Interrogado:- Não, eu mencionei já isso, que toda e qualquer tratativa de valores

e negociação na Engevix sempre começou com uma conversa minha com o Gerson, o resto todo é consequência desses acertos que eu fazia com ele.

Defesa de Luciano Kok:- Mas seu irmão participava e conhecia?Interrogado:- Não, da mesma forma que o Gerson falava para o Cristiano Kok eu

falava para o José Adolfo:- “Nós temos que assinar um contrato com a Engevix, referente a obra tal ou referente ao evento tal ou situação tal e você acerta com o

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Cristiano Kok.9

JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH: “Ministério Público Federal:-Certo. O também denunciado aqui Cristiano Kok, ele tinha algum relacionamento com o senhor sobre esses pagamentos?

Interrogado:-Sobre os pagamentos não, a não ser, tem uma ocasião, que é justamente os contratos para dar a cobertura a esses pagamentos de 10 milhões no Partido dos trabalhadores, porque saía fora, então existia um centro de custos, existia um centro de custo que é chamado 4000, esses contratos os senhores sabem, nós até declaramos, eles são de valores altos e foram feitos poucos pagamentos, diferente dos outros contratos, onde houve 60 pagamentos, porque sempre foram ao longo da obra. Esses foram contratos praticamente à vista, no máximo 02 ou 03 vezes, que eram contratos para repor o nosso caixa, o Milton avisava:-“Já fornecemos 2 milhões.”, então a gente tinha que gerar um contrato que repusesse o nosso caixa nesse valor.

Ministério Público Federal:-E isso foi ajustado como?Interrogado:-E isso eu então comparecia, acredito que falava ou com o Gerson ou

com o Cristiano a verdade que, e eu pegava esse contrato na diretoria, esse contrato não circulava pela corporação. Esses contratos (inaudível) foram assinados por mim, que sempre assinei os contratos todos da JAMP e pelo Cristiano.

Ministério Público Federal:-O senhor sabe se o Cristiano tinha conhecimento que esses contratos se destinavam a pagar esses valores para o partido?

Interrogado:-Sim.Ministério Público Federal:-Tinha conhecimento?Interrogado:-Tinha conhecimento provavelmente dado pelo Gerson, tinha

conhecimento.10

Da mesma forma, observa-se que CRISTIANO KOK restou responsável por

acompanhar a contratação e subscrever contratos ideologicamente falsos para a

concretização do repasse de valores espúrios, seja por meio da atuação de MILTON

PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, seja a partir de negócios firmados com JOSÉ

DIRCEU, conforme apontaram os sócios da empresa JOSÉ ANTUNES e GERSON ALMADA,

na linha do quanto demonstrado pelos documentos juntados aos autos (evento 3,

COMP107):

JOSÉ ANTUNES: “Ministério Público Federal:- Só antes da gente prosseguir nesse questionamento, quem foi o responsável, qual foi o sócio responsável por essa contratação?

Interrogado:- Isso aqui foi anterior ao meu trabalho, o presidente da companhia era o Gerson.

Ministério Público Federal:- Certo, mas eu pergunto quem foi o responsável, não o cargo ocupado, o que a auditoria apurou, qual foi o sócio que acompanhou essa

9 Trecho do interrogatório de MILTON PASCOWITCH, reduzido a termo no evento 670.10 Trecho do interrogatório de JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, reduzido a termo no evento 670.

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contratação?Interrogado:- O sócio que acompanhou a contratação foi o doutor Gerson.Ministério Público Federal:- Houve participação também de Cristiano Kok nessa

contratação?Interrogado:- Ele se refere aqui também como sendo um pagamento, na visão

dele, devido ao trabalho que o Milton fez para que se ganhasse os cascos, desde o início, ele achou o sócio chinês, ele foi a pessoa que procurou um projeto sueco mais barato e etc., que a empresa na verdade tem...

Ministério Público Federal:- Foi a justificativa que o Kok apresentou aos auditores?

Interrogado:- Sim, isso foi apresentado aos auditores aqui11.

GERSON ALMADA: “Juiz Federal:- O senhor Cristiano Kok participou dessas reuniões?

Interrogado:-Não.Juiz Federal:- Consta aqui que ele assinava os contratos, o que o senhor discutia

com ele a respeito desse contrato com o José Dirceu?Interrogado:-Todo o contrato da empresa tem que ser assinado pelo menos por 2

diretores e muitas vezes eu assinava em confiança, o Cristiano assinava em confiança, o volume de contratos que a gente tinha era grande. Então ele assinava mais em confiança, sabia que era do senhor José Dirceu o contrato.”12

O próprio CRISTIANO KOK afirmou, em juízo, ter assinado parte dos

instrumentos contratuais fraudulentos celebrados entre a ENGEVIX e a JD ASSESSORIA:

Juiz Federal:- O que o senhor pode me esclarecer sobre esses contratos da Engevix com a JD Assessoria? Do senhor José Dirceu.

Interrogado:- A Engevix contratou a JD Assessoria após uma viagem ao Peru, que foi feita pelos meus sócios, José Antunes Sobrinho, o Gerson de Melo Almada, acompanhados do Milton Pascowitch, e no Peru eles tiveram, foram apresentados pelo doutor José Dirceu a diversas autoridades que poderiam interessar a projetos que a Engevix viesse a desenvolver naquele país; a Engevix tinha uma visão clara que o Peru podia ser um parceiro de negócios importante para o Brasil, fazendo uma integração energética entre os dois países e permitindo que o sistema se complementasse, havia projetos na área de transposição dos Andes, projetos na área de infraestrutura que a empresa tinha interesse em vir a participar. Quando fizeram a viagem com o doutor José Dirceu, me reportaram, eu não tive conhecimento direto, que os contatos foram muito bons. E a partir daí foram firmados alguns contratos com o doutor José Dirceu para dar prosseguimento a esse trabalho de comercialização de serviços no Peru, foi basicamente o que…

Juiz Federal:- O senhor assinou alguns desses contratos?Interrogado:- Assinei alguns desses contratos sim, com o conhecimento desse

escopo.13

11 Trecho do interrogatório de JOSÉ ANTUNES, reduzido a termo no evento 691.12 Trecho do interrogatório de GERSON ALMADA, reduzido a termo no evento 722.13 Trecho do interrogatório de CRISTIANO KOK, reduzido a termo evento 691.

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Ademais, uma vez que responsável pela área financeira da empresa, CRISTIANO

KOK foi o responsável por autorizar o pagamento, pela ENGEVIX, das notas fiscais emitidas

pela JAMP Engenheiros Associados e pela JD ASSESSORIA, ainda que não tenham os

serviços sido prestados.

Destarte, resta evidente, ante os elementos de prova colhidos, que estava na

esfera de conhecimento de CRISTIANO KOK a existência dos pagamentos de propina

efetuados pela empreiteira.

Mencione-se, nessa senda, que o próprio réu, em entrevista à Folha de S. Paulo

(evento 3, COMP10), afirmou ter conhecimento de que a ENGEVIX efetuou o pagamento

de vantagens indevidas a PAULO ROBERTO COSTA mediante a simulação de serviços com

empresas de ALBERTO YOUSSEF. A despeito de aduzir, na oportunidade, que não sabia à

época que as empresas eram do operador financeiro, ele assumiu que os serviços

supostamente contratados não eram reais. Considerando que o artifício em relação à

JAMP e à JD ASSESSORIA foi basicamente o mesmo, reforça-se que CRISTIANO KOK

também tinha conhecimento acerca da falsidade desses contratos.

Por sua vez, JOSÉ ANTUNES era sócio-diretor da ENGEVIX. Consoante

demonstram os trechos anteriormente coligidos, diferentemente de CRISTIANO KOK, a

função por ele exercida não era interna da companhia, meramente administrativa, mas sim

de mercado.

Nessa toada, resta claro que, em sua prática profissional cotidiana, JOSÉ

ANTUNES relacionava-se com diversos diretores ligados a empreiteiras participantes do

“Clube”, além de conviver constantemente com as práticas ilícitas verificadas no mercado.

Assim, é evidente que não desconhecia as relações espúrias que a própria empresa

mantinha com os mesmos agentes.

Ainda, conforme alegado por GERSON ALMADA, JOSÉ ANTUNES participou de

viagem com seu sócio e JOSÉ DIRCEU ao Peru. Nesta oportunidade, o ex-Ministro-Chefe

da Casa Civil, em decorrência de contrato celebrado entre a ENGEVIX e a JD ASSESSORIA,

teria efetivamente prestado consultoria à empreiteira:

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Juiz Federal:- E o que aconteceu, daí?Interrogado:-Daí fizemos uma reunião, o ministro explicou todo o conhecimento

dele, onde ele tinha ajudado, os partidos políticos como ele tinha ajudado, colocou claramente onde que ele podia ter mais força que era México, que era Venezuela, que era África, que era Peru e que era Cuba. Levei para os nossos sócios, debatemos e vamos tentar fazer um trabalho com o Ministro José Dirceu focado em Peru, inicialmente. Porque México a gente está bem estruturado, Venezuela nem de graça, África estamos bem estruturados e Cuba não se sabe. Então, começou-se essa reunião, fizemos duas reuniões prévias com ele e marcamos a ida ao Peru, ele fez uma agenda, tinha uma pessoa dele que acompanhou essa reunião lá, a dona Zaida, foi eu, o Antunes, o Milton, o Ministro e o Carraro que era o nosso diretor internacional. Dessa viagem ficou claro que ele era o termo que eu disse aqui “open door”, era tratado com muito respeito, muita habilidade por todos, e nós tentamos navegar por 2 anos e meio dentro desse conhecimento dele. E nesses 2 anos e meio não tivemos nenhum sucesso, o que é normal também dentro de um serviço de consultoria.

Juiz Federal:- Quem cuidou desse trabalho lá no Peru, da Engevix? O, o senhor, o senhor Antunes ou o senhor Kok?

Interrogado:-O trabalho, a filial do Peru estava ligada ao Antunes, ele que era o responsável. Depois teve uma reestruturação da empresa, mais ou menos 2010, 2011, por aí, e eu fiquei com a área comercial e o doutor Antunes pegou todas as obras. Então todas as obras passaram pela responsabilidade do senhor Antunes e eu passei a ter toda a parte comercial.

Juiz Federal:- Além da viagem inicial, o que mais que o senhor José Dirceu fez?Interrogado:-Fizemos uma reunião a cada 6 meses, mais ou menos, para fazer

um follow-up, ele era rico em ideias, tentou várias vezes convencer-me a ir para o México, onde ele tinha um grande parceiro lá. Mas o México, área de petróleo, área de infraestrutura não tinha nada. Tentou mais de uma vez ir pra Venezuela onde ele tinha grandes contratos. Teve Cuba que nós interessamos, tentamos marcar umas três vezes viagem pra Cuba, ou por problema meu ou por problema dele, essa viagem acabou não sucedendo e quem organizou isso sempre era através do Milton.

Juiz Federal:- E a Engevix conseguiu algum contrato, ampliou algum negócio em decorrência dos serviços aí do senhor José Dirceu?

Interrogado:-Não, não ganhamos nada.Juiz Federal:- Como é que foi definido esse preço aqui, eu tenho aqui o primeiro

contrato, 01/07/2008, 120 mil reais. Como é que foi definido esse preço dos serviços dele?

Interrogado:-Esse preço foi colocado por ele: “Olha, é um custo que eu tenho, depois, quando eu ganhar alguma coisa, a gente faz o acerto." Normalmente isso existe dentro de um contrato vinculado a um sucess fee que você venha a ter, porém o consultor ele precisa de um dinheiro pra manutenção. Então foi fixado isso, depois teve um período, depois da viagem ao Peru, que nós aumentamos esse valor de 20 mil por mês para uma faixa aí de 50 mil por mês e, apesar de serem 5 contratos, na realidade é um contrato só que, por questões internas, a gente fazia. E esses contratos de consultoria voltados a negócios de obtenção de clientes, procura-se fazer por períodos pequenos, 6 meses, 1 ano, nunca contratos muito longos.

Juiz Federal:- Por que houve o distrato do contrato, do último lá em 30 de março de 2011?

Interrogado:-Não ganhamos nada, o mercado interno estava demandando uma loucura nossa, não tínhamos o mínimo de pessoas a verem lá, pra ir lá fora, pra fazer

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propostas. Quer dizer, em 2010, 2011, eu não achava engenheiro pra nada, não tinha engenheiro, não tinha pessoal nenhum. Então não adiantava a gente investir nada lá fora. Então, se eu não vou ter gente pra ir, vamos cuidar do mercado interno, vamos tentar fazer e, paralelamente a isso, nós investimos muito na área de infraestrutura. Então tínhamos muito projetos, então não tinha capacidade, mesmo que ele viesse a conseguir, como ele colocou: “Olha, quero continuar.” Não adianta.

Juiz Federal:- Ele fez alguma outra viagem, fora essa primeira viagem?Interrogado:-Tentamos ir pra Cuba e não conseguimos.Juiz Federal:- Ele fez alguma outra viagem ao Peru, fora aquela primeira?Interrogado:-Pela Engevix, não.Juiz Federal:- Ele apresentava algum relatório de serviços que ele prestava, o que

ele estava fazendo, à Engevix?Interrogado:-Não, fazíamos essas reuniões, almoços, ele esteve jantando na

minha casa, jantamos, almoçamos no clube português, então teve uma série, mas reuniões assim de troca de ideias…

Juiz Federal:- O senhor mencionou que tinha uma reunião a cada 6 meses, é isso, desde 2008?

Interrogado:-Aproximadamente.Juiz Federal:- O senhor José Antunes não participava dessas reuniões?Interrogado:-Participou. De algumas delas participou, pelo menos de 4 eu sei que

participou.Juiz Federal:- A área internacional estava sob a responsabilidade dele, é isso?Interrogado:-Sim, senhor. Excelência.Juiz Federal:- Ele depôs aqui, salvo engano, ele disse que não... fora aquela

primeira viagem, desconhecia qualquer coisa que o senhor José Dirceu teria feito.Interrogado:- Teve em jantar na minha casa, estivemos juntos no escritório do

José Dirceu, talvez pelo nervosismo dessa cadeira ele tenha esquecido, mas pelo menos nessas duas condições eu sei que ele esteve.

Juiz Federal:- E essas reuniões posteriores, o senhor Milton estava presente?Interrogado:-Sempre, em todas as reuniões que eu tive com o doutor José Dirceu,

o Milton estava presente. E também ele declarou aqui que não seguiu, que mais uma vez é uma mentira, que todos esses relacionamentos, todas essas reuniões ele esteve presente.14

Referida viagem foi, inclusive, confirmada por JOSÉ ANTUNES, o qual, por sua

vez, confirmou não ter participado de outras prestações de serviço por JOSÉ DIRCEU:

Juiz Federal:- Qual a relação da Engevix com o ex-ministro José Dirceu, o senhor pode esclarecer?

Interrogado:- Doutor, eu não tinha relação com o ministro José Dirceu, mas eu quero expor o fato, pra mim, o senhor José Dirceu eu conheci numa viagem pra Lima, Peru, da seguinte maneira, o Milton Pascowitch, que fazia captação de negócio, conversou com o meu sócio, Gerson Almada, e propuseram implementar nossa participação no Peru, que nós já tínhamos, nós tínhamos, eu trouxe aqui, tem uma série de contratos, todos contratos pequenos de consultoria de engenharia em Lima, mas o doutor Gerson, por sua relação lá com o presidente Alan Garcia, pelas suas relações no país, poderia nos ajudar. Eu, na verdade, concordei com essa viagem, essa viagem foi feita, foi feita no dia 28 de maio de 2008, voamos para Lima, tivemos

14 Trecho do interrogatório de GERSON ALMADA, reduzido a termo no evento 722.

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um dia de reuniões lá visitando algumas autoridades, das quais uma delas eu me lembro muito bem, que era o ministro de minas e energia, com o qual a gente tinha já serviços em andamento por lá, e voltamos no dia seguinte, no dia 30. Eu não tive depois com o doutor José Dirceu outros contatos e outras relações, ele era uma relação mais direta do doutor Pascowitch e, eventualmente, do doutor Gerson.

Juiz Federal:- O senhor era responsável pela área internacional?Interrogado:- Eu era responsável pela área internacional naquele momento, e

tinha comigo, foi comigo também nessa viagem um diretor internacional que eu contratei para me ajudar, doutor Alessandro Carraro, nessa viagem ele me acompanhou.

Juiz Federal:- E por que o senhor foi nessa viagem na qualidade de responsável pela área internacional da Engevix?

Interrogado:- Na verdade, como eu criei a área, eu tinha diretor internacional já nessa época, o doutor Alessandro, mas como eu criei a área, fiz as relações lá e como era um ex-ministro indo para uma missão, tentando abrir possibilidades para nós lá, eu achei por bem acompanhá-lo.

Juiz Federal:- E qual foi a remuneração do senhor José Dirceu por essa viagem, esse contrato?

Interrogado:- Doutor, o primeiro contrato dele com a Engevix, nesse primeiro caso, foi em torno de cento e poucos mil reais, com o qual eu achei que era razoável, ele podia desenvolver os negócios por lá.

Juiz Federal:- Mas depois prosseguiram os serviços do senhor José Dirceu para a Engevix, depois dessa viagem?

Interrogado:- Teve um só contato, meritíssimo, que foi o seguinte, em algum momento do ano seguinte eu recebi a pedido do Gerson uma missão cubana que tinha interesse em instalar usinas eólicas em Cuba, e nós estávamos instalando aqui, até pela Desenvix, então nós aceitamos a missão, mas não deu mais nada, os cubanos não tinham condições, o assunto não prosperou.

Juiz Federal:- Mas qual a relação do senhor José Dirceu com esse...Interrogado:- Não, porque esse contato da visita dos cubanos conosco veio pela,

por ele.Juiz Federal:- Mas por esse contato foi paga alguma comissão para ele?Interrogado:- Não, não, não foi, dali para a frente, do primeiro contrato, eu

pessoalmente não tomei mais conhecimento de nada, quer dizer, não tenho, não tive nenhuma relação mais com ele, ficou basicamente na visita ao Peru, depois um outro contato de interesse da visita dos cubanos aqui, não teve mais nada.

Juiz Federal:- Essa visita ao Peru que o senhor acompanhou, isso acabou resultando em algum contrato para a Engevix no Peru ou algum negócio novo, ou acréscimo de negócio?

Interrogado:- Não, não resultou em nada.15

Note-se que as declarações de GERSON ALMADA são coincidentes com as de

MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ANTUNES que, em seus respectivos interrogatórios

(eventos 670 e 722), afirmaram não ter ocorrido prestação de serviços por JOSÉ DIRCEU

após referida viagem para o Peru. Face aos esclarecimentos apresentados, verifica-se que,

ainda que o ex-ministro tenha realizado lobby perante autoridades peruanas no âmbito do

15 Trecho do interrogatório de JOSÉ ANTUNES, reduzido a termo no evento 691.

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primeiro contrato celebrado entre a ENGEVIX e a JD ASSESSORIA, os demais pagamentos

por ele recebidos, em verdade, correspondiam ao repasse de vantagens indevidas

provenientes da ENGEVIX, em decorrência de diversas contratações com a PETROBRAS.

Uma vez que não houve sucesso nos serviços de consultoria decorrentes do primeiro

contrato celebrado entre a empreiteira e a empresa de JOSÉ DIRCEU, a única explicação

plausível é que tenham os demais contratos sido utilizados para o repasse de valores

indevidos, o que, efetivamente, restou consignado na sentença pelo d. Magistrado a quo.

Destaque-se, ademais, que ao menos três dos quatro contratos fraudulentos

celebrados entre a ENGEVIX e a JD ASSESSORIA, quais sejam os de nº 4000/01-MO-PJ-

1010/09, 4000/01-MO-PJ-1038/09, 4000/01-MO-PJ-1037/10 (evento 107), respectivamente

datados de 01/03/2009, 01/09/2009 e 02/05/2010, tinham como objeto a prestação de

serviços para a área internacional da empresa, da qual era JOSÉ ANTUNES o responsável

ao menos até a reestruturação promovida entre 2010 e 2011, de acordo com o afirmado

por GERSON ALMADA.

Conforme demonstram documentos acostados ao evento 3 e reconhecido em

sede de sentença, os pagamentos em favor da empresa de JOSÉ DIRCEU continuaram a ser

efetuados pela JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, a pedido da ENGEVIX, mesmo no

período em que se encontrava preso, em flagrante metodologia de pagamento de

propinas disfarçadas de prestação de serviços.

Por oportuno, mencione-se que MILTON PASCOWITCH, em seu interrogatório,

declinou que comentou com JOSÉ ANTUNES a respeito de solicitação de vantagens

indevidas realizada por JOÃO VACCARI, possuindo JOSÉ ANTUNES conhecimento,

portanto, que havia, independentemente do ramo, pagamentos de propina por parte da

ENGEVIX, que se concretizavam, sobretudo, por meio de contratos firmados com a JAMP,

bem como do papel de operador financeiro desempenhador por MILTON PASCOWITCH:

Ministério Público Federal:- O senhor saberia dizer se a decisão pela assinatura desses outros quatro contratos também passou por ambas as diretorias, do Gerson Almada e do Antunes?

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Interrogado:- Esses contratos todos têm referência ao José Dirceu?Ministério Público Federal:- Todos têm referência ao José Dirceu.Interrogado:- Eu acredito que tenham passado só pelo Gerson.Ministério Público Federal:- O senhor José Antunes nunca comentou com o senhor

sobre esses contratos?Interrogado:- Não, houve o Antunes, eu comentei com o Antunes, houve uma

solicitação do João Vaccari sobre o contrato de gerenciamento das obras de Belo Monte, ele me disse:- “Olha Milton, conversa com o pessoal da Engevix, que eu estou sabendo que a gerenciadora já recebeu (inaudível) o primeiro pagamento e algumas parcelas, porque as empreiteiras já receberam e o contrato de gerenciamento é em função do andamento das obras das empreiteiras, para que a Engevix me dê uma posição aí sobre esse andamento que está aí.”, eu comentei com o Gerson, aí o Gerson comentou com o Antunes, porque aí a diretoria ou a vice-presidência era do Antunes, aí já era vice-presidência, ele concordou com o pagamento, nós assinamos um contrato entre a Engevix e JAMP de R$ 2 milhões, houve o pagamento de quinhentos e pouco que se referia ao pagamento que eu fiz em dinheiro para o João Vaccari de R$ 400 mil e depois desse contrato teve andamento diferente, foi cancelado e o Antunes passou a fazer esses acertos, se é que eles existiram, que eu não tenho conhecimento, de uma forma independente.

Ministério Público Federal:- E esse contrato eram pagamento de propina referentes a Belo Monte?

Interrogado:- Referentes a Belo Monte.Ministério Público Federal:- Cujo pagamento teve a solicitação do Vaccari?Interrogado:- De Vaccari, 1%.Ministério Público Federal:- E aprovação de Almada e Antunes?Interrogado:- É eu só me relacionava com o Almada, eu não sei se internamente o

Gerson participou disso. Mas ele encaminhou a solicitação e quem decidiu foi o Antunes.

Ministério Público Federal:- O senhor não sabe dizer se houve outros pagamentos?

Interrogado:- Não, não sei dizer a continuidade, que seria até R$ 2 milhões feito pela JAMP não foi, o contrato foi cancelado, só foi feito um pagamento de quinhentos e pouco, que se você tirar, se o senhor tirar as despesas de impostos, etc., vão dar os R$ 400 mil que foram pagos.

Ministério Público Federal:- E esse objeto contratual não foi prestado?Interrogado:- Não, não foi prestado.Ministério Público Federal:- Nem devolvido à Engevix posteriormente?Interrogado:- Não.Ministério Público Federal:- Os recursos.Interrogado:- Não.16

Ademais, conforme declinou CRISTIANO KOK em seu interrogatório, JOSÉ

ANTUNES era responsável, em parte, na companhia de GERSON ALMADA, por efetuar

doações às agremiações políticas:

Ministério Público Federal:- Um último questionamento, com relação a doações da Engevix a partidos políticos, no caso o objeto da denúncia são doações para o

16 Trecho do interrogatório de MILTON PASCOWITCH, reduzido a termo no evento 670.

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partido dos trabalhadores, como eram discutidas essas doações da pessoa jurídica Engevix?

Interrogado:- Normalmente eu recebia do Gerson ou do Antunes uma relação de pessoas, dizendo “Olha, precisamos fazer esses pagamentos de doações de campanha, porque nós combinamos isto”. Não tenho outra informação.

Ministério Público Federal:- O senhor Antunes mencionou a pouco que havia reuniões em que os três sócios, o senhor, ele e o Almada, definiam prioridades, eram expostos motivos para certas doações, o senhor reconhece a existência dessas reuniões?

Interrogado:- Informais, não existiram reuniões formais nesse sentido não.Ministério Público Federal:- Informais?Interrogado:- Informais. Havia troca de informação, o Gerson pedia “Eu preciso

fazer isso daqui”, o Antunes pedia “Preciso fazer isso aqui”, eu nunca pedi nenhuma doação.

Ministério Público Federal:- O senhor alguma vez foi mencionado nessa reunião ou o senhor mesmo, pessoalmente, participou de reuniões com João Vaccari Neto?

Interrogado:- Nunca participei, não o conheço.Ministério Público Federal:- Foi em alguma dessas oportunidades mencionados

acerca de pedidos de João Vaccari Neto, vinculados às obras da PETROBRAS?Interrogado:- Não, eu nunca tive essa vinculação, nunca soube dessa vinculação.Ministério Público Federal:- Houve uma doação de cerca de 4 milhões de reais

que, segundo revelado por Milton Pascowitch, teria se dado como uma retribuição em parte ao valor dessa contratação das sondas pela Ecovix, o senhor teve conhecimento disso à época?

Interrogado:- Não, desconheço.Ministério Público Federal:- E quem estabeleceu que essa doação deveria ser feita,

desses cerca de 4 milhões de reais?Interrogado:- Doutor Gerson, doutor Antunes, eu não sei qual doação foi feita por

qual, que doações foram feitas.Ministério Público Federal:- Doações ao diretório do partido.Interrogado:- Sim, isso era usual, o número que eu tenho é que em 2014 as

doações atingiram 10 milhões de reais, em 2010 atingiram 14 milhões de reais, o número global é o que eu tenho, eu não sei distinguir o que é de quem, foram doações oficiais aos vários partidos políticos através ou do diretório nacional ou através de comitês de campanha, mas são absolutamente transparentes, constam na nossa contabilidade, constam no site do TSE.

Ministério Público Federal:- O senhor alguma vez determinou que fossem feitas doações ao partido dos trabalhadores?

Interrogado:- Eu autorizei através de pedidos que fossem feitos ao diretório nacional do partido dos trabalhadores ou ao diretório nacional do PMDB, eu não tenho, foram vários partidos e várias doações.

Ministério Público Federal:- Eu pergunto só em relação ao partido dos trabalhadores porque é objeto dessa denúncia.

Interrogado:- Perfeito.Ministério Público Federal:- Mas, outros partidos políticos...Interrogado:- Se existiam os pedidos partidos do Gerson ou do Antunes, eu os

processava, podia vir um email dizendo “Autorizo o pagamento de tanto ao diretório nacional do PT”, me davam a conta do PT, eu solicitava do pessoal da tesouraria proceder o pagamento.17

17 Trecho do interrogatório de CRISTIANO KOK, reduzido a termo no evento 691.

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Destarte, resta comprovado que, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, ainda que

divididos em áreas específicas dentro da empresa, possuíam pleno conhecimento do

esquema de cartelização e corrupção existente no seio e em desfavor da Petrobras, assim

como do pagamento de valores espúrios de forma dissimulada. Não se faz crível que os

ilícitos praticados em favor da ENGEVIX eram de conhecimento apenas de GERSON

ALMADA, sobretudo frente à afirmação uníssona dos três sócios de que o controle da

empresa era exercido de forma igualitária por eles.

Nessa seara, impende observar que, embora GERSON ALMADA alegue não ter

informado seus sócios do processo de cartelização praticado pelas empreiteiras relativo às

obras da Petrobras, sua afirmação não se sustenta. Isso porque é da natureza dos cargos

exercidos por CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES a participação na tomada de decisões

da magnitude atinente à participação da empreiteira em um cartel ou ao pagamento de

vantagens indevidas a funcionários da PETROBRAS e aos núcleos políticos que os mantêm

no poder, inclusive de forma simulada, não sendo crível que GERSON ALMADA detivesse

poder para que, individualmente, tomasse todas as decisões atinentes à prática delituosa.

Tal fato restou, inclusive, reconhecido pelo d. Magistrado a quo em sede da

sentença (itens 688 e 689).

Dada a vultuosidade dos valores recebidos da Estatal e dos pagamentos

espúrios direcionados a agentes públicos corrompidos, não é crível que os demais sócios

desconhecessem o esquema. Note-se que os repasses da ENGEVIX para a JAMP ocorreram

ao longo de mais de cinco anos, totalizando valores que ultrapassam R$ 50 milhões. É

evidente que CRISTIANO KOK, na condição de responsável pelos setores administrativo,

jurídico e financeiro da empresa, e JOSÉ ANTUNES, como acionista da ENGEVIX, tinham

conhecimento de que referidos serviços não foram prestados por MILTON PASCOWITCH e

JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, constituindo, em verdade, repasses de valores indevidos

destinados a PEDRO BARUSCO, RENATO DUQUE e ao núcleo político do Partido dos

Trabalhadores – PT.

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Comprovada, portanto, a autoria de CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES,

requer-se a reforma da sentença para que restem condenados, considerando o quanto

alegado nos itens “3.5”, “3.6”, “3.8” e “3.9” das presentes razões de apelação, pela prática

dos delitos de (i) pertinência à organização criminosa (art. 2º, caput e § 4º, II, III, IV e V c/c

art. 1º, §1º, ambos da Lei 12.850/13); (ii) corrupção ativa (art. 333, caput e parágrafo único

do Código Penal), por 128 vezes, em concurso material (art. 69 do Código Penal); e (iii)

lavagem de ativos (art. 1º, V, c/c o art. 1º § 4º, da Lei 9.613/98 (na redação anterior à Lei

12.683/2012)), por 18 séries independentes de branqueamento de capitais,

consubstanciadas nos pagamentos decorrentes da celebração de 14 contratos de

prestação de serviços fraudulentos com a JAMP Engenheiros Associados e de 4 contratos

de prestação de serviços fraudulentos com a JD ASSESSORIA, na forma do art. 69 do

Código Penal. Requer-se, ademais, seja considerado o quanto alegado no item “3.7” desta

manifestação no que tange à dosimetria das penas a serem a eles aplicadas.

3.2. Contra a absolvição de RENATO DUQUE das imputações do crime de

lavagem de ativos

Restou comprovada a materialidade dos delitos de lavagem de ativos praticados

através da celebração de contratos de prestação de serviços fraudulentos entre a ENGEVIX

e a JAMP Engenheiros Associados, a fim de que fossem a origem, movimentação e

disposição de valores espúrios prometidos a funcionários da Diretoria de Serviços da

Petrobras dissimuladas:

647. Como os valores utilizados para pagamento da propina tinham como parcial procedência contratos obtidos por intermédio de crimes de cartel (art. 4º, I, da Lei nº 8.137/1990) e de frustração, por ajuste, de licitações (art. 90 da Lei nº 8.666/1993), e como, para os repasses, foram utilizados diversos mecanismos de ocultação e dissimulação da natureza e origem criminosa dos bens, os fatos também caracterizam crimes de lavagem de dinheiro tendo por antecedentes os referidos crimes, especialmente o segundo contra a Administração Pública (art. 1.º, V, da Lei n.º 9.613/1998).

648. Com efeito, caracterizadas diversas condutas de ocultação e dissimulação, tudo isso no âmbito das obras contratadas pela Petrobrás.

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649. Os crimes de lavagem ocorreram, em um primeiro momento, pelos repasses mediante superfaturamento dos doze contratos de consultoria e assessoria celebrados, no período de 13/04/2007 a 21/12/2012, entre a Jamp Engenheiros e a Engevix Engenharia. O valor da vantagem indevida devida a Milton Pascowitch, aos agentes da Petrobrás e ao grupo político foi embutido no contrato, a fim de conferir às transações a aparência de licitude .(grifos nossos)

O d. Magistrado, porém, condenou apenas o executivo da ENGEVIX GERSON

ALMADA, bem como os operadores financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO

PASCOWITCH pela prática de referidos delitos de lavagem de ativos. A autoria de

CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES foi anteriormente analisada no item “3.1” desta

apelação.

RENATO DUQUE, por sua vez, foi absolvido por falta de provas:

692. Renato de Souza Duque, Pedro José Barusco Filho e João Vaccari Neto já foram condenados criminalmente na ação penal 5012331-04.2015404.7000 por crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro por, em síntese, terem recebido propinas em contratos da Petrobrás com o Consórcio Interpar, o Consórcio CMMS, o Consórcio CMMS e a Construtora OAS, e as submetido a esquemas de ocultação e de dissimulação (evento 714, arquivo sent4).

693. Importante não olvidar que Pedro José Barusco Filho, além de ter colaborado com as investigações, promoveu a devolução de cerca de noventa e sete milhões de dólares que mantinha em contas secretas no exterior. Como se verifica nos documentos constantes no evento 715, arquivos extr3 e extr4, a conta judicial que acolheu os depósitos chegou a ter saldo de R$ 205.003.392,78, tendo sido repassados R$ 157.000.000,00 em devolução parcial dos valores das propinas às vítimas.

694. Embora não tenha celebrado acordo de colaboração, importante não olvidar que foram descobertas contas secretas milionárias mantidas por Renato de Souza Duque no Principado de Mônaco. A prova consistente nessas contas foi objeto de exame na sentença prolatada em 21/09/2015 na ação penal 5012331-04.2015.4.04.7000, especificamente nos itens 492 a 526 dela (evento 714, arquivo sent4). Como ali consignado identificadas duas contas em nome de off-shores controladas por Renato de Souza Duque no Banco Julius Baer, no Principado de Mônaco, com saldo total de 20.568.654,12 euros, montante absolutamente incompatível com os rendimentos declarados de Renato de Souza Duque.

695. Mesmo nesta ação penal, constam os depoimentos incriminatórios contra Pedro José Barusco Filho e de Renato de Souza Duque dos criminosos colaboradores Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef, Júlio Gerin de Almeida Camargo, Milton Pascowitch, José Adolfo Pascowitch, Ricardo Ribeiro Pessoa, Augusto Ribeiro de Mendonça Neto e Dalton dos Santos Avancini (tópicos II.10 e II.11).

696. Especificamente Júlio Gerin de Almeida Camargo declarou que repassou valores de propinas a José Dirceu de Oliveira e Silva (item 408) a pedido de Renato de Souza Duque, embora em outros contratos que não os da Engevix Engenharia.

697. Especificamente Milton Pascowitch declarou que os repasses de propinas ao grupo político decorriam dos acertos com os dois referidos agentes da Petrobrás.

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698. Isso sem olvidar que Pedro José Barusco Filho, acusado colaborador, admitiu os crimes e que Renato de Souza Duque encontrava-se entre os beneficiários, além de que parte dos valores era destinado a agentes ligados ao Partido dos Trabalhadores.

699. Além disso, foram produzidas provas documentais de repasses pontuais efetuados diretamente por Milton Pascowitch para Pedro José Barusco Filho e para Renato de Souza Duque. Ressalve-se que tais condutas não integram o objeto da imputação, sendo apenas referidas incidentemente no curso da denúncia.

700. Então devem responder Pedro José Barusco Filho e Renato de Souza Duque por cinco crimes de corrupção passiva, já que responsáveis pelo direcionamento de parte da propina para o grupo político de José Dirceu de Oliveira e Silva.

701. Não há prova, porém, de que ambos teria participado dos estragemas de ocultação e dissimulação desses repasses, devendo ser absolvidos da imputação por crime de lavagem.

Neste ponto, porém, merece reforma a decisão.

Conforme restou consignado nos autos, RENATO DUQUE, assim como seu

Gerente Executivo de Engenharia, PEDRO BARUSCO, recebia os valores indevidos do

esquema em razão de contratos de empreiteiras com a PETROBRAS em espécie ou por

meio de transações bancárias, algumas com destino no exterior, para outras contas de

titularidade de offshores mantidas pelos denunciados, sendo que eram os operadores

financeiros os responsáveis por executar tais pagamentos.

ALBERTO YOUSSEF, em depoimento judicial, confirmou que RENATO DUQUE

recebia pagamentos de JÚLIO CAMARGO, representante e operador de empresas que

participavam do esquema, operacionalizados por ALBERTO YOUSSEF:

Ministério Público Federal:- Sobre o senhor Julio Camargo, qual que era a sua relação com ele?

Depoente:- Além de fazer os recebimentos das obras da Toyo, que o Julio representava, a Mitsui e na Toyo, eu também operacionalizava alguma coisa de caixa 2 para ele.

Ministério Público Federal:- Para ele em decorrência de obras da Petrobras ou...?Depoente:- Em decorrência de obras da Petrobras e que ele tinha que fazer

pagamentos para essas pessoas.Ministério Público Federal:- O Julio fazia pagamentos, então, em favor de

empresas, dessas que o senhor citou?Depoente:- Sim.Ministério Público Federal:- Mas, para qual diretoria?Depoente:- Tanto para a diretoria de abastecimento, quanto para a diretoria de

serviço.Ministério Público Federal:- E ele alguma vez falou ao senhor a quem ele pagava

na diretoria de serviços?

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Depoente:- Várias vezes eu mandei dinheiro para o Rio de Janeiro para ele pagar a diretoria de serviços, no caso o Barusco, o Duque.

Juiz Federal:- O senhor sabia disso na época, ele falou disso para o senhor?Depoente:- Na época ele comentava, às vezes comentava.Ministério Público Federal:- Que ia entregar valores para Duque e Barusco?Depoente:- Sim18.

AUGUSTO MENDONÇA, colaborador e proprietário da SOG, empresa partícipe

do esquema, em depoimento judicial, confirmou que efetuou pagamentos não apenas

para RENATO DUQUE, como também PEDRO BARUSCO. Anotou o depoente que tais

pagamentos ocorriam com o trânsito dos valores por contas de empresas de terceiros e

eram justificados com base em contratos simulados:

Ministério Público Federal:- E como que os pagamentos eram feitos, à parte política o senhor já citou, e ao diretor Renato Duque, ao diretor Paulo Roberto Costa, ao Pedro Barusco?

Depoente:- Ao Paulo Roberto Costa, esse acerto foi feito com o José Janene, os dois contratos que nós pegamos foram mais ou menos na mesma época, esse acerto foi quase que concomitante para os dois contratos com o José Janene, que me introduziu o Alberto Youssef que me propôs que nós poderíamos comprar notas fiscais das empresas que de alguma forma ele controlava, então ele me apresentou o Valdomiro e nós acabamos fazendo esses negócios com eles, assinávamos um contrato, eles nos forneciam a nota fiscal, nós pagávamos, e ele se encarregava de pagar ao Paulo Roberto Costa ou a quem quer que seja, o nosso compromisso estaria liquidado. Na de serviços, inicialmente no contrato da Repar nós utilizamos outras empresas, que foram 4 ou 5 empresas, aonde nós fazíamos os pagamentos e eles se encarregavam de entregar o dinheiro, ou seja em espécie, ou seja em depósitos no exterior.

Ministério Público Federal:- Para os componentes da diretoria?Depoente:- Exatamente. Para contas indicadas pelo Pedro Barusco.Ministério Público Federal:- Alguma vez o senhor pediu que fosse entregue a

Pedro Barusco ou a Renato Duque valores em espécie no Brasil?Depoente:- Sim. Valores em espécie, durante um período eles mandavam retirar

no meu escritório, então eu pedia para eles irem pegar no meu escritório e eu pessoalmente entregava a um portador que eles mandavam lá.

Ministério Público Federal:- Ambos, tanto o Pedro Barusco quanto o Renato Duque, tinham seus portadores, seus emissários?

Depoente:- Não, não existia separação entre eles, para mim era uma coisa só.Ministério Público Federal:- E o senhor discutia isso abertamente com eles

também, conversava sobre isso com eles?Depoente:- Sim19.

No mesmo sentido, o depoimento de RICARDO PESSOA. Ele reconheceu que

18 Processo 5045241-84.2015.4.04.7000, Evento 464, TERMOTRANSCDEP1, Página 35.

19 Processo 5045241-84.2015.4.04.7000, Evento 464, TERMOTRANSCDEP1, Página 51.

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efetuou pagamentos de valores ilícitos para RENATO DUQUE, para o que se valeu do uso

de empresas de outros operadores:

Ministério Público Federal:- Os valores que eram transferidos a eles, como funcionava essa transferência?

Depoente:- No caso específico de Barusco sempre foi dado em dinheiro e no caso de Alberto Youssef também.

Ministério Público Federal:- O dinheiro que era passado para Barusco era também para Renato Duque?

Depoente:- Pelo menos ele me informava isso.(…).Ministério Público Federal:- Como que o senhor fazia para gerar essa

disponibilidade em dinheiro?Depoente:- A disponibilidade em dinheiro?Ministério Público Federal:- Isso, para…Depoente:- Eu nunca usei nenhuma empresa do senhor Alberto Youssef, a gente

usava as empresas do senhor Adir Assad, a SM Terra Planagem e a Rock Star, e durante um período também as empresas do Advogado Trombetta. E alguma coisa muito pequena com Mário Góes20.

Cite-se, outrossim, no mesmo sentido, o depoimento judicial do colaborador

EDUARDO LEITE, vice-presidente da CAMARGO CORRÊA, outra empreiteira que participava

do esquema. O colaborador reconheceu que a CAMARGO CORRÊA pagava valores ilícitos

no âmbito da Diretoria de Serviços da PETROBRAS para RENATO DUQUE valendo-se de

empresas de fachada de JÚLIO CAMARGO:

Ministério Público Federal:- E o senhor, nesse período, o senhor tomou conhecimento de, em primeiro lugar de ajustes entre concorrentes nos contratos da Petrobras?

Depoente:- Isso. Quando eu assumi em 2009 a diretoria comercial de óleo e gás, me foi transferido pelo diretor anterior da Camargo, que cuidava dos assuntos de Petrobras o que ocorria naquele cliente, basicamente nós tínhamos algumas obras contratadas, um contrato em início de execução que era o da REPAR aqui no Paraná e uma licitação ganha que ainda não havia sido assinado o contrato que era a RNEST, refinaria do nordeste. Em ambos os contratos ele me informou que havia tido um acordo de mercado, no qual a Camargo tinha mantido esses contratos e que existiam responsabilidades, ou melhor, propinas a serem pagas fruto desses contratos na proporção de 1% para a diretoria de abastecimento e 1% para a diretoria de engenharia. Já existiam alguns contratos celebrados com os chamados intermediários, que efetuavam os pagamentos, no caso da diretoria de serviços o doutor Júlio Camargo, através da Piemonte e Treviso, que já tinham contratos com a Camargo e também me foi apresentado posterior o senhor Alberto Youssef ficou sendo responsável por operacionalizar os pagamentos à diretoria de abastecimento.

20 Processo 5045241-84.2015.4.04.7000, Evento 468, TERMOTRANSCDEP1, Páginas 17 e 21.

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(…).Ministério Público Federal:- Certo. Com relação aos pagamentos de propinas que

o senhor referiu para as duas diretorias da Petrobras, qual era a dinâmica, percentuais, como isso acontecia?

Depoente:- Quando me foi passado que era 1% para cada uma das diretorias, de abastecimento e de serviços, engenharia e serviços, eu cheguei a ser cobrado pelos interlocutores dessas diretorias e pelos próprios diretores em algum momento realizaram essa cobrança. Mais o Renato Duque, o Paulo Roberto nem tanto, foi o Alberto Youssef que o representou. Então, eu tive uma reunião com o Renato Duque e Pedro Barusco conjuntamente com o doutor Júlio na casa do doutor Júlio Camargo aonde me foi passado o que a Camargo devia de contratos anteriores e quais eram os contratos futuros que fariam parte desse 1% que era devido, e no caso da diretoria do Paulo Roberto o Youssef que me foi apresentado em torno de 2009 era quem fazia essas cobranças.

Ministério Público Federal:- Essa oportunidade então que o senhor se reuniu com o Duque, Barusco e Júlio todos ali falaram abertamente sobre esses pagamentos, vinculando a obras, projetos específicos?

Depoente:- Sim. Sim. Sim. Quem tinha o controle de tudo que era devido efetivamente era o Pedro Barusco, mas a conversa foi aberta21.

Dessumi-se diante do quadro probatório reunido que os instrumentos

empregados para os pagamentos no presente caso eram basicamente os mesmos em

relação a pagamentos de outras empresas operacionalizados por outros operadores.

PEDRO BARUSCO confirmou que manteve contato com o operador MILTON

PASCOWITCH, a fim de tratar do pagamento e recebimento de valores indevidos da

ENGEVIX. PEDRO BARUSCO também afirmou que gerenciava para RENATO DUQUE os

valores que recebia de MILTON PASCOWITCH em decorrência de contratos celebrados

entre a Petrobras e a ENGEVIX:

Juiz Federal:-A Engevix, essa empresa o senhor conhece?Interrogado:-Sim.Juiz Federal:-Ela era uma das empresas que pagava esses valores?Interrogado:-Sim.Juiz Federal:-O senhor teve contato com executivos da Engevix?Interrogado:-Sim.Juiz Federal:-Sobre esses pagamentos?Interrogado:-Não, essa questão dos pagamentos eu discutia com o representante,

o Senhor Milton Pascowitch.(…).Juiz Federal:-O senhor recebia então, já que o senhor entrou nesse assunto, o

senhor recebia como esses pagamentos de vantagem indevida, de propina?Interrogado:-Lá fora.

21 Processo 5045241-84.2015.4.04.7000, Evento 468, TERMOTRANSCDEP1, Páginas 56-58.

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Juiz Federal:-Em contas no exterior?Interrogado:-Nesse caso do Senhor Milton Pascowitch, né? Sim.Juiz Federal:-Quais contas o senhor recebeu da Engevix, o senhor se recorda?Interrogado:-Eu acho que teve uma chamada Aquarius Partner, está nos autos. Eu

me recordo dessa Aquarius e a outra, eu não lembro se foi no Banco Delta ou no Banco Cramer, mas foi em um dos dois, foi nessa Aquarius Partner, em uma dessas contas, em um desses bancos.

Juiz Federal:-O Ministério Público na folha 18 da denúncia ele se reporta a uma conta Aquarius Partner.

Interrogado:-Isso.Juiz Federal:-Banco Pictet.Interrogado:-É Pictet.Juiz Federal:-O senhor teria recebido um depósito de 260 mil dólares?Interrogado:-Isso. E teve outro depósito de 600 mil dólares.Juiz Federal:-E na folha seguinte ele se reporta a uma conta Daydream.Interrogado:-Ah, Daydream, é Lombard Odier, exatamente, Banco Lombard Odier.Juiz Federal:-Essas contas Aquarius e Daydream, eram do senhor?Interrogado:-Sim, eu era o beneficiário, né?(…).Juiz Federal:-Esse um milhão de dólares que o senhor se refere é a sua parte

apenas?Interrogado:-Sim, sim. Agora eu não me recordo bem, porque o Senhor Milton ele

também tinha um canal assim de relacionamento com o Diretor Renato Duque, porque também tinham alguns contratos na área de serviço, compartilhado, porque o Senhor Milton trabalhava com o Senhor Renato Duque. Então, eu entendo que esse dinheiro era para mim.

Juiz Federal:-O Senhor Renato Duque também recebia esses pagamentos do Senhor Milton Pascowitch, que o senhor mencionou anteriormente.

Interrogado:-Meritíssimo, eu até ler o depoimento do próprio Senhor Milton Pascowitch, eu achava que sim, mas eu não tinha certeza, eu não tinha a informação. Mas ao ler o depoimento do Senhor Milton Pacowitch, do acordo dele, ele fala claramente que também depositava para o Senhor Renato Duque.

Juiz Federal:-Mas não fazia parte dos acertos, independentemente do que o senhor leu no depoimento do Senhor Milton Pascowitch, não fazia parte dos acertos que o senhor recebia e também recebia o Senhor Renato Duque?

Interrogado:-Não, mas é que o seguinte, era uma questão de gerenciamento. Por exemplo, nessa tabela normalmente eu gerenciava a parte do Doutor Renato Duque, porque depois eu até cheguei a fazer um acerto de contas com ele, porque eu estava acumulando o dinheiro dele. Mas eu vi que o Senhor Milton também pagava diretamente ao Doutor Renato Duque. E eu saí em 2011, Meritíssimo, da PETROBRAS. Depois nesse período eu parei de receber da Engevix e provavelmente o Doutor Milton continuou pagando diretamente ao Diretor Renato Duque, que o Diretor Renato Duque continuou na PETROBRAS.

Juiz Federal:-O senhor tratou desses assuntos diretamente com o Senhor Renato Duque sobre propina?

Interrogado:-Sim.Juiz Federal:-Uma vez, várias vezes?Interrogado:-Algumas vezes.(…).Juiz Federal:-O senhor chegou a receber propinas da Engevix por outro

intermediador ou de outra maneira sem interferência do Senhor Milton Pascowitch?

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Interrogado:-Não, Engevix sempre foi tratada com o Senhor Milton Pascowitch22.

O colaborador MILTON PASCOWITCH corroborou as declarações de PEDRO

BARUSCO:

Juiz Federal:-Certo. Na PETROBRAS, com quem o senhor tratou sobre esses assuntos?

Interrogado:-Sempre Pedro Barusco, no caso de obras de refino, que é o que estamos apreciando agora, que são essas obras em refinaria.

(…).Juiz Federal:-De remuneração que o senhor diz é de propina?Interrogado:-De propina, exato.(…).Interrogado:-O Pedro mencionou que eu paguei R$ 100 mil a ele, eu até

estranhei, mas efetivamente eu fiz o pagamento de R$ 100 mil a ele, o Pedro. E não me recordo de ter dado, posso ter pago uma ou outra despesa para o Pedro nesse tempo todo, mas não me recordo de ter pago nada, posso ter pago algumas despesas. E para o Renato Duque eu não paguei nada nesse período.

Juiz Federal:-Transferências no exterior, o senhor fez?Interrogado:-Não, não fiz nenhuma. Até essa altura então.Juiz Federal:-E depois o senhor fez?Interrogado:-Depois eu fiz.Juiz Federal:-Para quem?Interrogado:- Fiz para o Pedro Barusco duas remessas, uma de 600 mil dólares na

conta Daydream e uma de 200 mil dólares na conta Aquarius Partner e fiz ao Renato Duque, no exterior, um pagamento de uma obra de arte que ele comprou aqui no Brasil e esse pagamento foi prometido e pago a uma conta indicada pelo marchant que vendeu o quadro.

Juiz Federal:-E quanto foi?Interrogado:-380 mil dólares.Juiz Federal:-E esse pagamento era relativo a algum contrato específico?Interrogado:-Aos contratos dos cascos, na verdade eles não eram, os recursos que

nós tínhamos lá no exterior que foram utilizados a origem é o faturamento que nós tínhamos do contrato dos cascos, da nossa parte. Mas na verdade isso fazia parte de um valor global, que era devido e que, seria pago, no futuro seria pago.

Juiz Federal:-Mas era um valor global não entendi, envolvendo...Interrogado:-Envolvendo esses e envolvendo os outros, isso.Juiz Federal:-Os cascos e da refinaria?Interrogado:-Os cascos e da refinaria.Juiz Federal:-Ah, então esses pagamentos no exterior não foram só relativos

aos cascos?Interrogado:-Não, foi relativo aos cascos e foram relativos a esse total que

existia, vamos dizer assim reprovado23. (grifos nossos)

A ciência de RENATO DUQUE quanto aos artifícios utilizados pela ENGEVIX

para o repasse de valores indevidos restou comprovada, ademais, não apenas pelo fato de

22 Processo 5045241-84.2015.4.04.7000, Evento 670, TERMOTRANSCDEP1, Páginas 6-12.

23 Processo 5045241-84.2015.4.04.7000, Evento 670, TERMOTRANSCDEP1, Páginas 41-42.

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manter tratativas com MILTON PASCOWITCH, como também por ser o responsável por

determinar que o operador financeiro destinasse parcela das vantagens indevidas a ele

prometidas ao Partido dos Trabalhadores – PT. Neste sentido, impende destacar as

declarações de MILTON PASCOWITCH:

Juiz Federal:- E antes dessas reuniões que o senhor tinha diretamente com o Senhor Vaccari, o senhor tinha conhecimento que ainda, mesmo antes disso, havia valores destinados ao partido dos trabalhadores?

Interrogado:- Ah sim, porque como está na tabela, o Senhor Renato Duque falava:- “Tanto para o partido, tanto para cá.”, depois esse negócio de 1 para o abastecimento, 1 para a Diretoria de Serviços também foi ele que determinou.

Juiz Federal:- Isso era informado pelo Senhor Renato Duque?Interrogado:- Sim.Juiz Federal:- E o senhor tinha alguma outra fonte de conhecimento, fora o

Senhor Renato Duque?Interrogado:- Não, o meu círculo de relacionamento era o Senhor Renato Duque,

que orientava, que decidia isso e os operadores que eu gerenciava aquela parte que cabia para... Isso na questão da propina.

Juiz Federal:- E os operadores mencionavam também tinham parte do partido?Interrogado:- Sim, mas não entrava em detalhe. Quer dizer, essa divisão que tinha

aí o operador sabia24.

A conclusão é corroborada, ainda, pelos diversos contatos telefônicos mantidos

por RENATO DUQUE com MILTON PASCOWITCH, no período entre 22/06/2010 e

29/10/201425, assim como pelas 23 visitas do operador financeiro recebidas por RENATO

DUQUE na sede da Petrobras entre 2003 e 201226.

PEDRO BARUSCO, em seu interrogatório judicial, informou ter se reunido com

MILTON PASCOWITCH e RENATO DUQUE para discutir o pagamento das vantagens

indevidas prometidas:

Ministério Público Federal:-Uma outra questão que eu pergunto ao senhor diz respeito a esse percentual de um milhão de dólares realizado relativamente aos valores que foram prometidos ele é pequeno. Como que se dava, o senhor chegava a cobrar o Milton Pascowitch, ele dava alguma explicação por não pagar, como que funcionava isso?

Interrogado:-Eu tinha uma tabela mais detalhada que essa, que foi destruída logo que iniciou a Operação Lava Jato, antes de eu fazer o meu acordo, essa foi reconstruída. Então, essa tabela, por exemplo, às vezes eu marcava, era raro assim,

24 Processo 5045241-84.2015.4.04.7000, Evento 670, TERMOTRANSCDEP1.25 Autos n. 5031859-24.2015.4.04.7000, evento 01, INIC1.26 Evento 3, COMP106.

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mas uma vez a cada 06 meses marcava com o Milton Pascowitch, aproveitando sei lá, uma viagem de trabalho a São Paulo, ele estava no Rio de Janeiro, a gente marcava para fazer um, aí especificamente, por isso que eu digo nessas reuniões específicas eu lembro que eu fiz uma com ele e o Senhor Renato Duque em um hotel em São Paulo, a gente estava lá, fizemos uma reunião específica sobre isso, aí não discutimos nenhuma generalidade, discutíamos os pagamentos, os contratos e os pagamentos.

Diante disso, infere-se que RENATO DUQUE não só tinha ampla ciência dos

artifícios usados para a lavagem dos valores que recebia, como participava ativamente da

prática, executando atos materiais para a consecução da lavagem, encetando tratativas

com operadores financeiros do esquema, como MILTON PASCOWITCH, acerca da forma de

pagamento dos ativos, agindo, pois, com dolo direto.

Nesse contexto, não restam dúvidas de que RENATO DUQUE não só sabia que

eram utilizados contratos de prestação de serviços fraudulentos para justificar o repasse,

pela ENGEVIX, de valores indevidos destinados à Diretoria de Serviços a MILTON

PASCOWITCH, como efetivamente beneficiou-se de referido artifício de dissimulação e

ocultação da origem, disposição e propriedade dos valores. Observe-se que o então

Diretor de Serviços da Petrobras era o responsável por determinar o montante destinado

ao núcleo político e a quantia que receberia em conjunto com PEDRO BARUSCO, tendo

efetivamente recebido parcela, ainda que pequena, dos valores.

Portanto, deve ser reconhecida a autoria delitiva por parte de RENATO DUQUE,

condenando-o pela prática do crime de lavagem de ativos (art. 1º, V, c/c o art. 1º § 4º, da

Lei 9.613/98), por 14 vezes27, na forma do art. 69 do Código Penal.

27 O número de atos em concurso material corresponde à prática de 14 séries de condutas delitivas, consistentes nos pagamentos efetuados pela ENGEVIX em favor da JAMP Engenheiros Associados, com fulcro em 14 contratações fraudulentas celebradas entre as empresas. No âmbito de cada contrato, os pagamentos efetuados se encontram em continuidade delitiva, enquanto entre os contratos delitivos, as condutas encontram-se em concurso material, conforme alegado no item “3.9” da presente peça.

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3.3. Contra a absolvição de JULIO CÉSAR de parte das imputações de

prática do delito de lavagem de capitais (itens 4.3.2 e 4.3.5 da denúncia), por falta de

prova suficiente para a condenação (art. 386, VII, do CPP)

JULIO CÉSAR foi denunciado pela prática dos delitos de organização criminosa

e por três séries independentes de atos de lavagem de capitais, quais sejam:

i) a dissimulação da origem, movimentação e disposição de R$ 387.000,00

depositados pela JAMP Engenheiros Associados na conta-corrente do Escritório LEITE &

ROSSETTI, em 27/12/2011, com a finalidade de efetuar o pagamento parcial do preço do

imóvel em que está localizada a sede da JD ASSESSORIA, na Av. República do Líbano, nº

1827, Ibirapuera, São Paulo/SP, em conjunto com JOSÉ DIRCEU, LUIZ EDUARDO, MILTON

PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH;

ii) a ocultação e dissimulação da origem, movimentação, disposição e

propriedade e propriedade de R$ 750.000,00, no período entre 25/05/2012 e 30/07/2012,

mediante a realização de 5 (cinco) transferências bancárias através da conta da JAMP

Engenheiros Associados à CAMILA RAMOS, filha de JOSÉ DIRCEU, sob o pretexto de

adquirir o imóvel localizado na Rua Assungui, nº 971, Saúde, São Paulo/SP, matrícula

22.249 do 14º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo/SP, em conjunto com JOSÉ

DIRCEU, LUIZ EDUARDO, MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH;

iii) a ocultação e dissimulação da origem, movimentação, disposição e

propriedade de R$ 1.814.546,00, mediante a realização de 22 (vinte e duas) transferências

eletrônicas, no valor de R$ 1.508.391,91, e outros repasses de valores em espécie à

arquiteta DANIELA FACCHINI, no período entre 02/05/2012 e 23/12/2014, em

contraprestação aos serviços de reforma por ela prestados no imóvel designado como

Chácara nº 1, da Gleba N, no lugar denominado “Parque do Vale da Santa Fé”, Vinhedo/SP,

em conjunto com JOSÉ DIRCEU, MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH.

Após a regular instrução do feito, sentenciou o d. Magistrado a quo:

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748. Júlio Cesar dos Santos era sócio da JD Assessoria e Consultoria, empresa utilizada para recebimento das propinas dissimuladas em contratos de consultoria. Ingressou no quadro social da empresa desde a sua constituição (evento 3, comp12).

749. Também é o titular e proprietário da empresa TGS Consultoria e Assessoria em Administração Ltda.

750. As provas são no sentido de que ele não estaria envolvido diretamente nos crimes de corrupção, mas que José Dirceu de Oliveira e Silva utiliza os seus serviços para ocultação do patrimônio.

751. Como visto (itens 486-492), o imóvel em Vinhedo, que recebeu valores substanciais para reforma de Milton Pascowitch, encontra-se em nome da TGS Consultoria e Assessoria, por aquisição registrada em 24/04/2014 (matrícula 16.728, evento 3, comp138), muito embora o proprietário de fato, confesso quanto ao ponto, seja José Dirceu de Oliveira e Silva, desde pelo menos 2010.

752. Como se não bastasse, também encontra-se em nome da TGS Consultoria imóvel na cidade de Passa Quatro/MG, na qual reside a mãe de José Dirceu de Oliveira e Silva e que pertence de fato a José Dirceu de Oliveira e Silva, como por ele mesmo admitido, desde pelo menos 2004 (item 493). Como ver-se-á adiante, consta, porém, que o imóvel teria sido adquirido pela TGS em 1988.

753. Há provas de que Júlio Cesar dos Santos tem relacionamento próximo com José Dirceu de Oliveira e Silva, prestando-lhe serviços para aquisições e vendas imobiliárias, além de intermediação de contatos de outra natureza.

754. No processo 5031929-41.2015.4.04.7000, foi decretado, a pedido da autoridade policial e do MPF, a quebra do sigilo telemático de comunicações armazenadas em endereços eletrônicos dos acusados, entre eles de Júlio Cesar dos Santos (decisão de 07/07/2015, evento 8, daquele processo).

755. A Polícia Federal elaborou o Relatório nº 460 acerca de mensagens encontradas no endereço [email protected] (evento 3, comp13, junto à denúncia). Destaquem-se alguns:

a) mensagem de 17/06/2008, de Júlio Cesar para José Dirceu de Oliveira e Silva relativamente à negócio não esclarecido envolvendo a empresa "Brascan" (fl. 4 do relatório);

b) mensagem de 18/06/2008, de José Dirceu de Oliveira e Silva a terceiro informando que Júlio do Cesar Santos é o responsável por tratativas de imóveis de seu interesse (fl. 10 do relatório);

c) mensagem de 11/10/2012, de Luiz Eduardo de Oliveira e Silva a Júlio do Cesar Santos solicitando informações sobre a "situação dos imóveis Vinhedo" (fl. 28 do relatório);

d) mensagem de 28/07/2008, de Júlio Cesar para José Dirceu de Oliveira e Silva intermediando contato de deputado federal para discussão de "campanha, ajudas e apoio" (fl. 36 do relatório);

e) mensagens de 21/05/2008 a 24/05/2008, entre Júlio Cesar dos Santos e José Dirceu de Oliveira e Silva, acerca de contrato para transferência do imóvel de matrícula M. 2.548 do Registro de Imóveis de Passa Quatro e no qual consta que teria sido adquirido pela TGS em 1988, tratando-se aqui de venda simulada pois o imóvel, como visto no item 493, já era, desde pelo menos 2004, de José Dirceu de Oliveira e Silva. (fls. 75-82 do relatório);

f) mensagem de 14/07/2011 de Júlio Cesar dos Santos para Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, acerca de contrato para transferência do imóvel de matrícula 14.831 de Vinhedo da TGS para a JD Assessoria, com preço de R$ 110.000,00, tratando-se aqui de venda simulada pois o imóvel, como visto no item 492, já era de José Dirceu de Oliveira e Silva. (fls. 83-87 do relatório);

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g) mensagem de 15/09/2009 de Júlio Cesar dos Santos para terceiro, acerca de contrato para transferência do imóvel de matrícula 14.831 de Vinhedo de Floriano da Silva para a TGS, com o preço de R$ 500.000,00, indicando que no contrato de venda simulada da TGS para a JD Assessoria teria havido subfaturamento (fls. 101-108 do relatório);

h) mensagem de 20/12/2006 de José Dirceu de Oliveira e Silva para Júlio Cesar dos Santos acerca da aquisição de imóvel em nome da filha do primeiro (fls. 265-266 do relatório).

756. Como adiantado, Júlio Cesar dos Santos, em Juízo, preferiu ficar em silêncio (evento 692). Antes, porém, no inquérito, havia admitido que a TGS figurava como proprietária formal dos imóveis em Vinhedo e de Passa Quatro, embora de propriedade de José Dirceu de Oliveira e Silva (item 489).

757. Não há justificativa para aquisição e permanência por tão longo tempo de imóveis por José Dirceu de Oliveira e Silva em nome de pessoa interposta junto ao registro imobiliário.

758. A única justificativa apresentada foi no sentido de que a utilização da TGS teria por finalidade evitar "inflacionar" o preço do imóvel, já que o adquirente seria José Dirceu de Oliveira e Silva. Entretanto, os imóveis não só foram adquiridos pela TGS mas permaneceram anos registrados em nome da TGS, o que retira credibilidade da justificativa apresentada.

759. Os fatos podem caracterizar crimes de lavagem de dinheiro, observando que o imóvel em Vinhedo foi adquirido pela TGS por R$ 500.000,00 e que foi lavrado instrumento particular de compra e venda do mesmo imóvel da TGS para a JD Assessoria pelo preço de R$ 110.000,00 em absoluta discrepância, mais um possível expediente de lavagem de dinheiro.

760. Não obstante, a aquisição e manutenção desses dois imóveis em nome da TGS não constitui objeto da acusação.

761. Relativamente aos crimes de lavagem que constituem objeto da presente ação penal, Júlio Cesar dos Santo deve ser reputado partícipe da ocultação e dissimulação que envolveram os repasses de valores de Milton Pascowitch para reforma do imóvel em Vinhedo, já que manutenção da propriedade beneficiada em nome da TGS fazia parte da ocultação do real beneficiário da reforma.

762. Já quanto à lavagem envolvendo a aquisição simulada do imóvel de matrícula 22.249 da filha de José Dirceu para a Jamp Engenheiros, embora o acusado tenha participado do negócio como corretor, não há prova suficiente de que tinha conhecimemto da simulação, com o que deve ser absolvido.

763. Não vislumbro prova suficiente para responsábilizá-lo pelos crimes de corrupção, já que não existe prova de que beneficiou-se diretamente do repasse do valores, antes apenas atuando para ocultar o produto do crime.

764. Apesar disso, não há falar em ausência de dolo de lavagem. Júlio Cesar dos Santos tinha conhecimento de que José Dirceu de Oliveira e Silva havia exercido cargos públicos relevantes e igualmente, como é notório, que respondia à Ação Penal 470 junto ao Supremo Tribunal Federal, tendo ciência, portanto, que a utilização de sua empresa para ocultar patrimônio dele envolvia a ocultação do produto de crimes contra a Administração Pública. Desnecessário, para caracterização do dolo da lavagem, que ele tivesse conhecimento específico do crime que teria originado os recursos ilícitos. Oportuno destacar novamente o seguinte trecho de depoimento de Milton Pascowitch a respeito de Júlio Cesar dos Santos:

"Ministério Público Federal:- Ele tinha conhecimento que o senhor recebia valores

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indevidos e repassava para o Dirceu?Milton Pascowitch:- Sim. Sim. Sim."765. Assim, devem ser condenados criminalmente, na medida de sua

participação, como auxiliares de José Dirceu de Oliveira e Silva, na prática de crimes de lavagem, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva e Júlio César dos Santos.

(…)886. Portanto, resta também provada a materialidade e a autoria do crime do art.

2º da Lei nº 12.850/2013, devendo ser responsabilizado, neste processo, Milton Pascowitch, José Adolfo Pascowitch, José Dirceu de Oliveira e Silva, Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, Roberto Marques e Júlio Cesar dos Santos. (grifos nossos)

No que tange às absolvições de JULIO CÉSAR quanto às práticas do delito de

lavagem de dinheiro, especificamente aquelas consubstanciadas na compra simulada do

imóvel da filha de JOSÉ DIRCEU pela JAMP Engenheiros Associados e no pagamento

parcial da aquisição da sede da JD ASSESSORIA, merece reforma a decisão.

Inicialmente, impende mencionar que a materialidade dos delitos restou

comprovada:

474. A transação ainda encontra registro documental em carta enviada pelo acusado Luiz Eduardo de Oliveira e Silva para José Adolfo Pascowitch datada de 19/12/2011 e na qual consta a solicitação para a realização do referido depósito de R$ 387.000,00 pela Jamp Engenheiros em favor da Leite e Rossetti Advogados por conta do referido contrato entre a Jamp e a JD (evento 47, arquivo ap-inqpol30, p. eletrônica 28 e 561 do inquérito, inquérito 5005151-34.2015.4.04.7000).

(...)478. Então, o referido contrato celebrado em 15/04/2011 entre a Jamp

Engenheiros e a JD Assessoria deu causa ao repasse de R$ 1.368.290,70, em notas fiscais (líquidos), mais R$ 387.000,00 como pagamento de parte do preço do referido imóvel.

479. Até aqui esses repasses tem por base um contrato formal, embora, como visto, Milton Pascowitch tenha declarado que se trata de mera simulação para o repasse de propinas.

(...)648. Com efeito, caracterizadas diversas condutas de ocultação e dissimulação,

tudo isso no âmbito das obras contratadas pela Petrobrás.(…)651. Prosseguiram também, desta feita exclusivamente entre Milton Pascowitch e

o grupo político de José Dirceu de Oliveira e Silva, com a simulação do contrato entre a Jamp Engenheiros e a JD Assessoria em 15/04/2011 e que, conforme visto, não envolve prestação efetiva de serviços. O contrato foi simulado para conferir aos repasses a aparência de licitude.

(…)653. Também caracteriza o emprego de mecanismos de ocultação e dissimulação

a aquisição simulada, em 22/05/2012 e com recursos de propina, pela Jamp Engenheiros do imóvel em nome da filha de José Dirceu de Oliveira e Silva, já que não houve deliberadamente a transferência do bem.

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No que respeita os atos de branqueamento de capitais através da compra

simulada do imóvel de CAMILA RAMOS, filha de JOSÉ DIRCEU, impende destacar que

JULIO CÉSAR era, à época do negócio fraudulento, sócio de JOSÉ DIRCEU na JD

ASSESSORIA. Conforme demonstra o contrato social da empresa, JULIO CÉSAR participou

do quadro social da JD ASSESSORIA desde a sua constituição, em 05/01/1998 (evento 3,

COMP12), até 25/11/201328. Conhecia, portanto, intimamente JOSÉ DIRCEU.

Note-se, na linha do já destacado pela sentença proferida pelo Juízo a quo, que

é evidente que o apelado tinha conhecimento tanto do fato de que JOSÉ DIRCEU

assumira cargos públicos de extrema relevância, quanto de que respondia, durante o

período em que JULIO CÉSAR foi sócio da JD ASSESSORIA, ação penal perante o Supremo

Tribunal Federal pela prática dos delitos de corrupção passiva e lavagem de capitais. Não é

crível, portanto, a afirmação de que não teria conhecimento acerca da ilicitude de valores

percebidos por JOSÉ DIRCEU.

Corroboram esta conclusão as declarações de MILTON PASCOWITCH, no

sentido de que JULIO CÉSAR tinha conhecimento do fato de que o operador financeiro

era responsável por receber valores ilícitos prometidos ao ex-ministro com a finalidade de

repassá-los a JOSÉ DIRCEU.

Em adição, MILTON PASCOWITCH confirmou que JULIO CÉSAR participou do

negócio simulado de compra e venda do imóvel no nome de CAMILA RAMOS, tendo sido

o responsável por providenciar a documentação necessária (evento 670):

Juiz Federal:- Uma referência também sobre essa parte de bens, uma aquisição que o senhor teria feito do imóvel que seria da filha do José Dirceu.

Interrogado:- Isso, da Camila. O José Dirceu me solicitou, não é que ele me solicitou, ele me comentou que ele estava querendo trocar, tirar a Camila de onde ela morava, no Bairro da Saúde ali e ela iria comprar um outro apartamento, agora não sei se era Santo André, São Caetano, algum lugar desse e que precisava vender o imóvel. Eu perguntei qual era o imóvel, ele me disse qual era o imóvel, quanto ele estava querendo pelo imóvel, disse que era R$ 500 mil e nós damos uma olhada, se o valor não era o valor de mercado, era um pouco acima do valor de mercado, mas fazia sentido mesmo porque eu também tinha recursos dele mesmo para fazer isso que está aí e nós fizemos a aquisição desse imóvel, quando nós fizemos aquisição

28 Anexo 1.

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desse imóvel o contrato foi feito pelo Júlio César, a documentação foi cuidada pelo Júlio César, a escritura ele que fez e teria que depois fazer a escritura definitiva. E quando ele entrega a documentação, acho que uns 60 dias depois apareceu um vínculo de inalienabilidade que o próprio José Dirceu tinha colocado para a Camila. E durante esse processo todo ainda houve uma solicitação de um valor complementar, que eu acho que foi de R$ 250 mil, que foi utilizado para adquirir o apartamento.

Juiz Federal:- Mas foi resolvido esse problema da cláusula de inalienabilidade?Interrogado:- Não, porque depois o José Dirceu foi preso, depois veio a Operação

Lava Jato. E também essa propriedade nossa, vamos entender assim, é uma propriedade transitória, porque na verdade é mais uma ocultação do que uma propriedade.

Juiz Federal:- Mas essa aquisição ela envolvia repasses desses valores de propina ou era uma aquisição de imóvel que lhe interessava?

Interrogado:- Não, era o imóvel dele mesmo, até que eu argui o Luiz Eduardo e o Bob de como que se paga comissão que foi paga ao Júlio César de uma operação dentro de casa, ou seja, é do bolso direito para o bolso esquerdo e vai gastar R$ 40 mil, R$ 42 mil de comissão.

Juiz Federal:- Esse imóvel seria transferido em nome de quem?Interrogado:- Da JAMP, que comprou.Juiz Federal:- O imóvel de fato ficaria com...Interrogado:- Não, o imóvel seria de propriedade do José Dirceu, mas estaria em

uma, dentro da JAMP Empreendimentos de forma transitória transitória, depois eu não sei qual seria o destino, provavelmente seria vender esse imóvel. (grifos nossos)

Nesta senda, não é possível considerar que JÚLIO CÉSAR não tinha

conhecimento de que se tratava de venda simulada, uma vez que tinha ciência de que o

imóvel era gravado com cláusula de inalienabilidade. O apelado ainda assinou o contrato

de promessa de compra e venda como testemunha do ato (evento 3, COMP142), tendo

recebido de JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH a minuta do instrumento contratual em seu

endereço de e-mail, na data de 22/05/2012 (evento 3, COMP13 a COMP16, p. 39/52).

Ademais, recebeu valor expressivo como comissão pela realização de negócio

que sabia ser simulado, conferindo-lhe aparência lícita, já que tinha consciência de que a

compra e venda estaria impedida pela cláusula de inalienabilidade.

Não se faz plausível, portanto, a conclusão de que atuou meramente como

corretor da compra e venda em questão. JULIO CÉSAR não apenas mantinha relação

íntima com o condenado JOSÉ DIRCEU, a ponto de ter consciência acerca da ilicitude de

seus ativos, tendo consciência acerca do papel desempenhado por MILTON PASCOWITCH,

como ajudou o ex-ministro a ocultar e dissimular sua origem, natureza e propriedade,

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inclusive no negócio simulado de compra e venda do apartamento de CAMILA RAMOS, já

que qualquer pessoa normal estranharia um negócio de compra e venda em que o imóvel

encontra-se gravado por cláusula de inalienabilidade. Restou, portanto, sua autoria

comprovada na prática deste delito de branqueamento de ativos.

Em relação ao pagamento parcial do preço do imóvel em que está localizada a

sede da JD ASSESSORIA, consubstanciado na transferência de R$ 387.000,00 a partir da

conta da JAMP Engenheiros Associados para a conta-corrente do Escritório LEITE &

ROSSETTI, em 27/12/2011, restou também comprovada, no decorrer da instrução

processual, a autoria de JULIO CÉSAR.

A participação do apelado no ato delituoso restou evidenciada por mensagem

de e-mail datada de 08/02/2012, em que a minuta do contrato de compra e venda do

imóvel é enviada por JULIO CÉSAR a LUIZ EDUARDO (evento 3, COMP13 a COMP16).

Conforme se depreende da minuta, em papel com o timbre da TGS CONSULTORIA E

ASSESSORIA EM ADMINISTRAÇÃO LTDA., empresa de JULIO CÉSAR, à TGS, representada

pelo apelado, caberia a comissão pelo negócio. Não obstante, JULIO CÉSAR não fora o

responsável pela indicação do negócio. Ao contrário, conforme alegado por GILBERTO

MARIA ROSSETTI (evento 3, COMP131), o imóvel fora indicado pelo sócio do Escritório

LEITE & ROSSETTI HUMBERTO FERNANDES LEITE a ROBERTO MARQUES, assessor de JOSÉ

DIRCEU, com quem mantinha relação de amizade.

A participação de JULIO CÉSAR no negócio resta comprovada também pela

mensagem de e-mail, datada de 01/06/2015, em que LUIZ EDUARDO informa JULIO

CÉSAR da necessidade de conversarem a respeito de problemas relacionados à aquisição

do imóvel em questão, que apresentava dívidas, aparentemente, de IPTU. A conclusão de

que se trata do imóvel em que localizada a sede da JD ASSESSORIA é possibilitada pela

menção ao advogado da parte vendedora, GILBERTO ROSSETTI. Lembre-se que a parcela

inicial devida pela compra do bem foi transferida ao escritório LEITE & ROSSETTI

ADVOGADOS. Ademais, a inscrição municipal do imóvel indicada na mensagem de e-mail

corresponde àquela do bem localizado na Av. República do Líbano, nº 1827, Ibirapuera,

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São Paulo/SP (evento 3, COMP13 a COMP16).

Observe-se que em referido diálogo LUIZ EDUARDO menciona que JULIO

CÉSAR foi o responsável pela entrega da documentação do imóvel quando da efetivação

do negócio jurídico de compra e venda. No mesmo sentido, GILBERTO MARIA ROSSETTI

(evento 3, COMP131), declarou que JULIO CÉSAR participou das negociações referentes à

compra do imóvel situado na Av. República do Líbano, nº 1827, sendo, portanto, de seu

conhecimento o fato de que a parcela inicial foi adimplida por MILTON PASCOWITCH,

através da conta de sua empresa JAMP Engenheiros Associados, em razão dos valores

ilícitos que deveriam ser repassados em favor de JOSÉ DIRCEU, tendo sido a transferência

formalmente justificadas em contrato fraudulento celebrado entre a JAMP e a JD

ASSESSORIA E CONSULTORIA.

Ainda, no mesmo sentido do anteriormente alegado, não se pode dizer que

JULIO CÉSAR mantinha mera relação de corretagem com JOSÉ DIRCEU, uma vez que era

seu sócio, sendo certo que detinha conhecimento acerca de seus negócios espúrios.

Finalmente, o negócio foi efetuado em 27/12/2011, data em que JULIO CÉSAR

ainda figurava como sócio da JD ASESSORIA, o que comprova, categoricamente, o seu

conhecimento acerca do fato de que a JAMP adimpliu a parcela inicial da compra do

negócio, embora não tenha havido prestação efetiva dos serviços contratados pela JAMP

Engenheiros Associados, com base na qual foi formalmente justificada a transferência dos

valores.

Impende destacar que, embora o fato delituoso envolvendo o depósito dos R$

387.000,00 pela JAMP em favor do Escritório LEITE & ROSSETTI insira-se no contexto

delitivo decorrente da celebração do contrato fraudulento de prestação de serviços

celebrado entre a JAMP e a JD ASSESSORIA, em que realizados diversos pagamentos por

MILTON PASCOWITCH em favor de JOSÉ DIRCEU, os quais se encontram em continuidade

delitiva, confirme argumentado no item “3.9” desta apelação, JULIO CÉSAR foi denunciado

tão somente pelo ato delituoso concernente à transferência específica dos R$ 387.000,00,

restando sua autoria comprovada.

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Face ao exposto, deve ser reconhecida a autoria delitiva por parte de JULIO

CÉSAR, condenando-o pela prática do crime de lavagem de ativos (art. 1º, V, c/c o art. 1º §

4º, da Lei 9.613/98), por 2 vezes29, na forma do art. 69 do Código Penal.

3.4 Contra a absolvição de LUIZ EDUARDO de parte das imputações de

prática do delito de lavagem de capitais (itens 4.2.2 e 4.3.5 da denúncia), por falta de

prova suficiente para a condenação (art. 386, VII, do CPP);

LUIZ EDUARDO foi denunciado pela prática do delito de organização

criminosa, bem como do crime de branqueamento de capitais, por 9 vezes, em concurso

material, quais sejam:

i) a dissimulação da origem, movimentação e disposição de R$ 112.620,00,

através de seis transferências bancárias, realizadas no interregno entre 15/08/2007 e

12/01/2009, após a ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES, celebrar com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ

EDUARDO, o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1090/08, datado de 01/07/2008, no valor R$

120.000,00, em razão do qual foram emitidas seis notas fiscais, a fim de que fossem as

vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas ao núcleo

político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ EDUARDO;

ii) a dissimulação da origem, movimentação e disposição de R$ 112.620,00,

através de seis transferências bancárias, realizadas no interregno entre 09/04/2009 e

17/08/2009, após a ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES, celebrar com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ

EDUARDO, o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1010/09, datado de 01/03/2009, no valor R$

120.000,00, em razão do qual foram emitidas seis notas fiscais, a fim de que fossem as

29 O primeiro ato constitui a série de cinco atos de lavagem de dinheiro praticados em continuidade delitiva, entre 25/05/2012 e 30/07/2012, em razão da compra simulada do imóvel de CAMILA RAMOS. O segundo encontra-se consubstanciado no depósito realizado, em 27/12/2011, pela JAMP na conta-corrente do Escritório LEITE & ROSSETTI, a fim de adimplir parcela da compra do imóvel localizado na Av. República do Líbano, nº 1827, Ibirapuera, São Paulo/SP.

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vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas ao núcleo

político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ EDUARDO;

iii) a dissimulação da origem, movimentação e disposição de R$ 300.320,00,

através de oito transferências bancárias, realizadas no interregno entre 05/10/2009 e

05/04/2010, após a ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES, celebrar com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ

EDUARDO, o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1038/09, datado de 01/09/2009, no valor R$

300.000,00, em razão do qual foram emitidas oito notas fiscais, a fim de que fossem as

vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas ao núcleo

político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ EDUARDO;

iv) a dissimulação da origem, movimentação e disposição de R$ 281.550,00,

através de seis transferências bancárias, realizadas no interregno entre 05/05/2010 e

05/10/2010, após a ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES, celebrar com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ

EDUARDO, o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1037/10, datado de 02/05/2010, no valor R$

300.000,00, em razão do qual foram emitidas seis notas fiscais, a fim de que fossem as

vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas ao núcleo

político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ EDUARDO;

v) a dissimulação da origem, movimentação e disposição de R$ 234.625,00,

através de cinco transferências bancárias, realizadas no interregno entre 05/11/2010 e

09/03/2011, após a ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES, celebrar com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ

EDUARDO, o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1000/11, datado de 02/11/2010, no valor R$

300.000,00, em razão do qual foram emitidas cinco notas fiscais, a fim de que fossem as

vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas ao núcleo

político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ EDUARDO;

vi) a dissimulação da origem, movimentação e disposição de R$ 1.006.235,00,

através de treze transferências bancárias em favor da JD ASSESSORIA, realizadas no

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período entre 20/04/2011 e 03/12/2011, após a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS,

representada por MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, celebrar com a JD

ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ EDUARDO, contrato simulado no valor de

R$ 1.500.000,00, datado de 15/04/2011, em razão do qual foram emitidas notas fiscais

fraudulentas. Foi, desta forma, repassada parcela das vantagens indevidas prometidas à

Diretoria de Serviços da Petrobras ao núcleo político, especialmente JOSÉ DIRCEU e

pessoas a ele relacionadas, como LUIZ EDUARDO;

vii) a dissimulação da origem, movimentação e disposição de R$ 387.000,00

depositados pela JAMP Engenheiros Associados na conta-corrente do Escritório LEITE &

ROSSETTI, em 27/12/2011, com a finalidade de efetuar o pagamento parcial do preço do

imóvel em que está localizada a sede da JD ASSESSORIA, na Av. República do Líbano, nº

1827, Ibirapuera, São Paulo/SP, em conjunto com JOSÉ DIRCEU, JÚLIO CÉSAR, MILTON

PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH;

viii) a ocultação e dissimulação da origem, movimentação, disposição e

propriedade R$ 388.366,00, mediante a realização de 17 (dezessete) pagamentos,

realizados entre 14/08/2009 e 06/05/2010, à HALEMBECK ENGENHARIA LTDA, em

contraprestação aos serviços de reforma prestados no imóvel localizado na Rua Estado de

Israel, 379, ap. 131, Saúde, São Paulo/SP, em conjunto com JOSÉ DIRCEU e os operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH;

ix) a ocultação e dissimulação da origem, movimentação, disposição e

propriedade de R$ 750.000,00, no período entre 25/05/2012 e 30/07/2012, mediante a

realização de 5 (cinco) transferências bancárias através da conta da JAMP Engenheiros

Associados à CAMILA RAMOS, filha de JOSÉ DIRCEU, sob o pretexto de adquirir o imóvel

localizado na Rua Assungui, nº 971, Saúde, São Paulo/SP, matrícula 22.249 do 14º Oficial de

Registro de Imóveis de São Paulo/SP, em conjunto com JOSÉ DIRCEU, JULIO CÉSAR,

MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH.

Quando da prolação da sentença, decidiu o d. Magistrado a quo:

734. Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, apesar de ter um papel subsidiário,

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estava envolvido diretamente nos acertos e recebimentos das propinas recebidas pelo grupo político dirigido por seu irmão, José Dirceu de Oliveira e Silva.

735. Não se trata apenas das declarações dos acusados colaboradores. Luiz Eduardo de Oliveira e Silva era sócio da JD Assessoria e Consultoria, empresa utilizada para recebimento das propinas dissimuladas em contratos de consultoria. Ingressou no quadro social da empresa em 05/09/2008 (evento 3, comp12).

736. Luiz Eduardo de Oliveira e Silva figura em atos específicos de lavagem. É ele quem assina, por exemplo, o contrato de consultoria celebrado em 15/04/2011 entre a Jamp Engenheiros e a JD Assessoria (itens 461). É ele quem enviou, em nome da JD Assessoria, carta à Jamp Engenheiros solicitando o pagamento de R$ 387.000,00 em favor da Leite e Rossetti Advogado (item 472). É ele igualmente beneficiário direto de repasses de propinas e de atos de lavagem, pois os pagamentos efetuados à empresa Halembeck Engenharia Ltda. visavam custear serviços de reforma em imóvel registrado em seu próprio nome.

737. Colhida ainda prova circunstancial de seu envolvimento direto nos fatos. Foi autorizada busca e apreensão na empresa JD Assessoria e Consultoria pela decisão de 10/07/2015 (evento 10) do processo 5031859-24.2015.4.04.7000. Entre os documentos apreendidos, destaque-se o constante na fls. 19-21 do Relatório do inquérito policial 5005151-34.2015.4.04.7000 (evento 51, arquivo RelfinalIPL), com apontamentos sobre obras e contratos da Petrobrás e da Transpetro e dirigido à JD Assessoria e Consultoria, mas sob os cuidados de Luiz Eduardo de Oliveira e Silva.

738. Em Juízo, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva optou por ficar em silêncio (evento 691). No inquérito 5003917-17.2015.4.04.7000, havia, em síntese, declarado manter relações com os demais acusados (evento 54, arquivo inq1, fls. 7-10). Afirmou que seu trabalho na JD Assessoria limitava-se à parte administrativa da empresa e negou a prática de qualquer crimes. De mais relevante, declarou que, "entre 2012 e 2013, recebia, mensalmente, em espécie, cerca de R$ 30.000,00, de Milton Pascowitch". Afirmou ainda "que não solicitou quaisquer valores a Milton, sendo que começou a pagá-lo de forma espontânea". De se admitir que a explicação apresentada para os recebimentos em espécie soa extravagante, pois qualquer pessoa normal estranharia a generosidade desses pagamentos.

739. Apesar da negativa na prática de crimes, os depoimentos dos acusados colaboradores aliados à posição de Luiz Eduardo de Oliveira e Silva na JD Assessoria, à prova do envolvimento direto dele em alguns dos atos delitivos, os elementos de corroboração circunstanciais e até mesmo a admissão de recebimento de valores sem causa de Milton Pascowitch, são suficientes para concluir pela pertinência de Luiz Eduardo de Oliveira e Silva no grupo político comandado por José Dirceu de Oliveira e Silva e seu envolvimento, ainda que subsidiário, nos crimes.

740. Como os pagamentos de propinas destinavam-se ao grupo político do qual fazia parte, deve responder, quanto aos crimes de lavagem, pelos dois referidos que contam com sua participação direta. Não foi ele acusado dos crimes de corrupção, ficando prejudicado o exame de sua responsabilidade por eles.

(…)886. Portanto, resta também provada a materialidade e a autoria do crime do art.

2º da Lei nº 12.850/2013, devendo ser responsabilizado, neste processo, Milton Pascowitch, José Adolfo Pascowitch, José Dirceu de Oliveira e Silva, Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, Roberto Marques e Júlio Cesar dos Santos. (grifos nossos)

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Conclui-se, pela leitura da sentença, que LUIZ EDUARDO foi condenado pelo

delito de pertinência a organização criminosa, bem como pelos atos de lavagem de

capitais consubstanciados nos pagamentos em favor da HALEMBECK ENGENHARIA,

destinados a custear a reforma de seu imóvel, e na contratação fraudulenta da JD

ASSESSORIA pela JAMP Engenheiros Associados, em razão da qual foi realizado, dentre

outros, o pagamento de R$ 387.000,00 ao Escritório LEITE & ROSSETTI como parcela do

pagamento da compra do imóvel em que se situa a sede da JD ASSESSORIA.

Foi, portanto, absolvido dos delitos de branqueamento de ativos no que

respeita às contratações fraudulentas da JD ASSESSORIA pela ENGEVIX, bem como da

compra simulada do imóvel de CAMILA RAMOS, filha de JOSÉ DIRCEU, pela JAMP

Engenheiros Associados. Nesses pontos, porém, merece reforma a sentença.

Inicialmente, impende mencionar que a materialidade dos delitos restou

comprovada:

556. Considerando cumulativamente a ausência de prova da prestação de qualquer serviço, salvo em relação ao primeiro contrato, e os próprios depoimentos de Milton Pascowitch e de José Antunes Sobrinho, além dos das testemunhas arroladas pela própria Defesa no Peru, de se concluir que os repasses decorrentes dos contratos em questão, salvo do primeiro, visavam mero repasses de valores, sem causa lícita, da Engevix para a José Dirceu de Oliveira e Silva.

(…)648. Com efeito, caracterizadas diversas condutas de ocultação e dissimulação,

tudo isso no âmbito das obras contratadas pela Petrobrás.(…)650. Prosseguiram com os quatro contratos de prestação de serviços simulados

entre a Engevix Engenharia e a JD Assessoria no período de 01/03/2009 a 02/11/2010 e que, conforme visto, não envolvem prestação efetiva de serviços. Os contratos foram simulados para conferir aos repasses a aparência de licitude.

(…)653. Também caracteriza o emprego de mecanismos de ocultação e dissimulação

a aquisição simulada, em 22/05/2012 e com recursos de propina, pela Jamp Engenheiros do imóvel em nome da filha de José Dirceu de Oliveira e Silva, já que não houve deliberadamente a transferência do bem.

De acordo com o exaustivamente demonstrado durante a instrução probatória –

e inclusive reconhecido pelo Juízo a quo no item 735 da sentença – LUIZ EDUARDO era

sócio da JD ASSESSORIA desde 05/09/2008, empresa utilizada por JOSÉ DIRCEU para o

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recebimento de vantagens indevidas.

Note-se que a data de sua entrada no quadro social da empresa é anterior à

celebração dos contratos nº 4000/01-MO-PJ-1038/09, 4000/01-MO-PJ-1010/09, 4000/01-

MO-PJ-1037/10 e 4000/01-MO-PJ-1000/11, tendo ocorrido na vigência do contrato nº

4000/01-MO-PJ-1090/08. Dos instrumentos contratuais mencionados, LUIZ EDUARDO

assinou os nº 4000/01-MO-PJ-1010/09, 4000/01-MO-PJ-1037/10 e 4000/01-MO-PJ-

1000/11 na condição de testemunha (evento 3, COMP107).

MILTON PASCOWITCH, em adição, quando de seu interrogatório judicial (evento

670), confirmou que LUIZ EDUARDO participava das tratativas acerca da

operacionalização dos pagamentos indevidos no interesse de JOSÉ DIRCEU, tendo

conhecimento, portanto, acerca da ilicitude dos valores por ele percebidos. É de se

observar que o próprio LUIZ EDUARDO, em declarações prestadas no âmbito do inquérito

policial nº 5003917-17.2015.4.04.7000 (evento 54, arquivo inq1, fls. 7-10), afirmou que suas

funções da JD ASSESSORIA referiam-se à parte administrativa da empresa. Em sendo suas

afirmações verdadeiras, é inverossímil concluir que não teria conhecimento de que serviços

não eram prestados em contraprestação aos pagamentos feitos pela ENGEVIX, os quais

eram vinculados aos contratos celebrados pela JD ASSESSORIA com a empreiteira.

Destaque-se que LUIZ EDUARDO mantinha planilha de controle de

pagamentos vinculados às 31 notas fiscais expedidas pela JD ASSESSORIA contra a

ENGEVIX em razão dos cinco contratos celebrados entre as empresas30.

Conclui-se que quando das contratações realizadas pela ENGEVIX, portanto,

LUIZ EDUARDO teve conhecimento de que foram realizadas tão somente para que fosse

atribuída justificativa formal aos repasses de valores ilícitos pela empreiteira a JOSÉ

DIRCEU, uma vez que não houve a contraprestação de serviços pela empresa da qual era

LUIZ EDUARDO sócio, exceção feita ao primeiro contrato, em relação ao qual considerou

o Juízo de primeiro grau que houve efetiva prestação de serviços.

Comprovada, portanto, a autoria de LUIZ EDUARDO nas quatro séries

30 Autos 5003917-17.2015.4.04.7000, evento 56 – AP-INQPOL12, p. 25.

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independentes de lavagem de capitais consubstanciadas nos pagamentos realizados pela

ENGEVIX em favor da JD ASSESSORIA, formalmente justificadas pelos contratos

fraudulentos nº 4000/01-MO-PJ-1038/09, 4000/01-MO-PJ-1010/09, 4000/01-MO-PJ-

1037/10 e 4000/01-MO-PJ-1000/11, pelo que se requer sua condenação.

Em relação aos atos de lavagem de capitais concernentes à compra simulada de

imóvel de CAMILA RAMOS, filha de JOSÉ DIRCEU, também restou a autoria de LUIZ

EDUARDO comprovada.

Conforme declarado por JULIO CÉSAR em sede de depoimento prestado

perante a autoridade policial, LUIZ EDUARDO foi o responsável por requisitar a redação

da minuta do contrato de compra e venda do imóvel localizado na Rua Assungui, nº 971,

Saúde, São Paulo/SP, em que consta como vendedora CAMILA RAMOS, filha de JOSÉ

DIRCEU, e como compradora a JAMP Engenheiros Associados (evento 3, COMP136).

Conclui-se, portanto, que LUIZ EDUARDO tinha conhecimento de que se tratava de

negócio simulado, destinado a justificar o repasse de valores indevidos a JOSÉ DIRCEU.

Em adição, JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH confirmou o envolvimento de LUIZ

EDUARDO ao afirmar que o questionou acerca do pagamento de comissão a JULIO

CÉSAR pela realização do negócio (evento 3, COMP27). MILTON PASCOWITCH prestou

depoimento no mesmo sentido (evento 670):

Juiz Federal:- Uma referência também sobre essa parte de bens, uma aquisição que o senhor teria feito do imóvel que seria da filha do José Dirceu.

Interrogado:- Isso, da Camila. O José Dirceu me solicitou, não é que ele me solicitou, ele me comentou que ele estava querendo trocar, tirar a Camila de onde ela morava, no Bairro da Saúde ali e ela iria comprar um outro apartamento, agora não sei se era Santo André, São Caetano, algum lugar desse e que precisava vender o imóvel. Eu perguntei qual era o imóvel, ele me disse qual era o imóvel, quanto ele estava querendo pelo imóvel, disse que era R$ 500 mil e nós damos uma olhada, se o valor não era o valor de mercado, era um pouco acima do valor de mercado, mas fazia sentido mesmo porque eu também tinha recursos dele mesmo para fazer isso que está aí e nós fizemos a aquisição desse imóvel, quando nós fizemos aquisição desse imóvel o contrato foi feito pelo Júlio César, a documentação foi cuidada pelo Júlio César, a escritura ele que fez e teria que depois fazer a escritura definitiva. E quando ele entrega a documentação, acho que uns 60 dias depois apareceu um vínculo de inalienabilidade que o próprio José Dirceu tinha colocado para a Camila. E durante esse processo todo ainda houve uma solicitação de um valor complementar, que eu acho que foi de R$ 250 mil, que foi utilizado para adquirir o

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apartamento.Juiz Federal:- Mas foi resolvido esse problema da cláusula de inalienabilidade?Interrogado:- Não, porque depois o José Dirceu foi preso, depois veio a Operação

Lava Jato. E também essa propriedade nossa, vamos entender assim, é uma propriedade transitória, porque na verdade é mais uma ocultação do que uma propriedade.

Juiz Federal:- Mas essa aquisição ela envolvia repasses desses valores de propina ou era uma aquisição de imóvel que lhe interessava?

Interrogado:- Não, era o imóvel dele mesmo, até que eu argui o Luiz Eduardo e o Bob de como que se paga comissão que foi paga ao Júlio César de uma operação dentro de casa, ou seja, é do bolso direito para o bolso esquerdo e vai gastar R$ 40 mil, R$ 42 mil de comissão.

Juiz Federal:- Esse imóvel seria transferido em nome de quem?Interrogado:- Da JAMP, que comprou.Juiz Federal:- O imóvel de fato ficaria com...Interrogado:- Não, o imóvel seria de propriedade do José Dirceu, mas estaria em

uma, dentro da JAMP Empreendimentos de forma transitória transitória, depois eu não sei qual seria o destino, provavelmente seria vender esse imóvel. (grifos nossos)

Some-se a isto o fato de, em outro trecho de seu interrogatório, MILTON

PASCOWITCH ter mencionado que LUIZ EDUARDO tinha conhecimento e participava das

conversas referentes ao pagamento de valores ilícitos provenientes da Petrobras a JOSÉ

DIRCEU, tendo, inclusive, requisitado uma parcela dos valores para si (evento 670):

Juiz Federal:-Diretamente com o José Dirceu?Interrogado:-Diretamente com o José Dirceu para discussão de alguma coisa na

área política, alguma solicitação especial, mas sempre com o Luiz Eduardo, irmão dele e o Roberto Marques, que era assessor dele.

Juiz Federal:-Certo. E nesses contatos diretos que o senhor teve com essas pessoas, esse assunto das comissões, das propinas eram tratados?

Interrogado:-De uma forma genérica eram, especificamente percentuais, quanto nós temos a receber desse valor ou não, não era de conhecimento, ou seja, não tinha essa apropriação de valor. Existia a menção que nós tínhamos um percentual bem, um montante bem razoável de valores e que resultava na, vamos chamar assim, nas benesses que foram concedidas.

(...)Ministério Público Federal:- Certo. Com relação a, o senhor mencionou sobre o

Roberto Marques, o vulgo "Bob" Marques, retirava dinheiro em espécie do grupo político do José Dirceu.

Interrogado:- Sim.Ministério Público Federal:- Esse dinheiro em espécie que ele retirava, estava

vinculado também às obras da Engevix?Interrogado:- Estava.Ministério Público Federal:- O Luiz Eduardo da mesma forma?Interrogado:- Da mesma forma.Ministério Público Federal:- Com qual periodicidade que eles retiravam esse

dinheiro?Interrogado:- Ah rezavam para chegar no final do mês.

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Ministério Público Federal:- Mensalmente?Interrogado:- Mensalmente.(...)Interrogado:- Faltou responder o seguinte, obviamente que você entrega recursos

ao Bob, ao Luiz Eduardo e eles estão vendo que as coisas estavam andando, ou seja, eles não recebiam nada através do Júlio, passou a receber, eles falaram:- “Milton, você não quer dar uma parte desses recursos para nós?”, eu falei:- “Posso dar, mas eu vou perguntar para o José Dirceu.”, eu sugeri dar R$ 30 mil para o Luiz Eduardo e para o Bob e pedi autorização e na verdade esse dinheiro ia sair dele mesmo e quem deu essa autorização foi o José Dirceu. E eu passei então a dar todo mês, deste recurso destinado ao José Dirceu R$ 30 mil para o Bob e R$ 30 mil para o Luiz Eduardo.

A instrução processual, portanto, comprovou o conhecimento de LUIZ

EDUARDO quanto ao recebimento de valores indevidos por JOSÉ DIRCEU, os quais eram

pagos por MILTON PASCOWITCH, bem como o seu envolvimento na esquematização dos

subterfúgios utilizados para ocultar as reais origem, natureza e propriedade de referidos

valores.

Comprovada, portanto, a autoria de LUIZ EDUARDO no que tange às cinco

transferências, realizadas de 25/05/2012 a 30/07/2012, no valor total de R$ 750.000,00,

pela JAMP Engenheiros Associados em favor de CAMILA RAMOS, formalmente justificadas

pela compra simulada do imóvel localizado na Rua Assungui, nº 971, Saúde, São Paulo/SP,

a fim de que fossem repassados valores indevidos à JOSÉ DIRCEU.

Face ao exposto, deve ser reconhecida a autoria delitiva por parte de LUIZ

EDUARDO, condenando-o pela prática do crime de lavagem de ativos (art. 1º, V, c/c o art.

1º § 4º, da Lei 9.613/98), por 5 vezes31, na forma do art. 69 do Código Penal.

31 Os quatro primeiros atos consubstanciam-se na realização de, respectivamente, seis, oito, seis e cinco transferências bancárias realizadas pela ENGEVIX em favor da JD ASSESSORIA, formalmente justificadas pelos contratos fraudulentos de prestação de serviços celebrados entre a empreiteira e a empresa de LUIZ EDUARDO. O quinto constitui a série de cinco atos de lavagem de dinheiro, praticados em continuidade delitiva, entre 25/05/2012 e 30/07/2012, em razão da compra simulada do imóvel de CAMILA RAMOS.

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3.5. Contra a não consideração dos contratos nº P-8887/01-MO-PJ-1014/05

e P-8887/01-MO-PJ-1018/09 celebrados entre a ENGEVIX e a JAMP para o compto

das condutas de lavagem de ativos praticadas por GERSON ALMADA, CRISTIANO

KOK, JOSÉ ANTUNES e RENATO DUQUE

A sentença de que ora se recorre consignou, em seu item 456, que:

456. Como a denúncia não abrange propinas efetivamente pagas em relação aos contratos da Engevix Engenharia com a Petrobrás para Cacimbas (Fase II), os dois primeiros contratos do rol podem ser desconsiderados na presente sentença.

Os demais, considerando os repasses líquidos identificados, somam R$ 46.412.340,00.

No entanto, neste ponto, merece reforma o decisum.

Na exordial, o Ministério Público Federal narrou que os executivos da ENGEVIX

GERSON ALAMDA, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, através do operador financeiro

MILTON PASCOWITCH, ofereceram vantagens indevidas a RENATO DUQUE e PEDRO

BARUSCO, para que fosse a ENGEVIX reclassificada e vencesse o certame licitatório

referente às obras para o Módulo 1 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas – Fase

II.

A empreiteira havia sido desclassificada para que a segunda colocada, a GDK,

adjudicasse referida licitação. MILTON PASCOWITCH, então, na condição de representante

da ENGEVIX, com a anuência de GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES,

ofereceu a RAUL SCHIMIDT, representante de RENATO DUQUE, o pagamento de

vantagens indevidas no mesmo montante daquelas prometidas pela GDK. O então Diretor

de Serviços da Petrobras, no então, não aceitou os valores espúrios, informando que a

obra seria efetivamente adjudicada para a GDK.

Não obstante, após escândalo de corrupção envolvendo a empreiteira GDK, a

ENGEVIX foi efetivamente contratada pela Petrobras para a realização das obras do

Módulo 1 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas – Fase II.

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Quanto a este fato, não houve, de acordo com o Juízo a quo, a produção de

prova de corroboração ao quanto declarado pelo colaborador MILTON PASCOWITCH,

impossibilitando, então, a condenação dos denunciados pela prática do delito de

corrupção passiva (item 646).

No entanto, conforme demonstrou a instrução processual, após a celebração do

contrato entre a ENGEVIX e a Petrobras para as obras do Módulo 1 da Unidade de

Tratamento de Gás de Cacimbas – Fase II, a ENGEVIX, através de MILTON PASCOWITCH e

JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, com anuência de GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES, prometeu/ofereceu propinas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, os

quais, desta vez, aceitaram-nas e receberam-nas. Parte dos valores foram, ainda,

destinados ao núcleo político do Partido dos Trabalhadores – PT, representando por JOÃO

VACCARI e JOSÉ DIRCEU.

GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES, MILTON PASCOWITCH

e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH incorreram, assim, na prática do delito de corrupção ativa,

enquanto RENATO DUQUE, PEDRO BARUSCO, JOSÉ DIRCEU e JOÃO VACCARI

praticaram o delito de corrupção passiva, ainda que não tenham sido referidas condutas

delituosas denunciadas.

Sinteticamente, PEDRO BARUSCO, em seu interrogatório judicial, confirmou o

recebimento de valores indevidos em razão do contrato celebrado com a ENGEVIX tanto

para as obras do Módulo 1 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas – Fase II,

quanto para as obras dos Módulos 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas –

Fase III:

Juiz Federal:-Depois tem ali UTGC-Cacimbas.Pedro Barusco:-Sim.Juiz Federal:- É um pouco diferente aqui a anotação naquela repartição, o senhor

pode me esclarecer? 1 parte, 1 Casa, depois tem 0,4. O que...Pedro Barusco:-Ah está vendo, aqui tem uma particularidade, nessa UTGC de

Cacimbas eram 2%, sendo 1% para o partido e 1% para a Casa, mas esse casa estava dividido dessa forma aí 0,4% para o Doutor Renato Duque, 0,3% para mim, que seria esse SAB e 0,3% para o Senhor Milton Pascowitch.

Juiz Federal:-Por que MW para o Senhor Renato Duque?

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Pedro Barusco:-É a forma como eu tratava ele. My Way.Juiz Federal:-Depois tem ali UTGC Cacimbas II, mesma situação é isso?Pedro Barusco:-É, mas ali provavelmente é 0,5% para mim e 0,5% para o Doutor

Renato Duque, não tem mais o Senhor Milton Pascowitch32.

Suas declarações são corroboradas pela planilha de controle por ele mantida

em relação às propinas prometidas pelas empreiteiras e por ele aceitas (evento 3, COMP8).

No mesmo sentido, colocam-se as declarações de MILTON PASCOWITCH:

Juiz Federal:-Indo para os contratos da Engevix com a PETROBRAS, como que começou esse pagamento de comissões ou de propinas?

Milton Pascowitch:-Bom, o primeiro contrato da Engevix na PETROBRAS foi Cacimbas I, um contrato ganho em uma licitação na qual a Engevix foi a primeira colocada, houve uma discrepância, vamos chamar assim, do ponto de vista tributário nesse contrato, o jurídico desclassificou a Engevix, houve a coincidência... Eu estou resumindo porque esses fatos são muito conhecidos, houve a coincidência com aquele fato da GDK ter pago o jipe para o Sílvio Pereira, o jurídico da PETROBRAS retirou a desclassificação da Engevix, a Engevix ganhou aquele contrato.

Juiz Federal:-Certo.Milton Pascowitch:-Este contrato da Engevix, na fase prévia, quando houve a

declaração de ganho para a GDK, por indicação eu não tenho muita certeza agora da pessoa, se foi por indicação do Fernando ou por indicação do Licínio Machado, eu estive no escritório do Raul, que naquela altura atuava como um preposto do Duque, para oferecer a ele se existissem comissões a serem pagas, eu ofereceria, eu ou seja, Engevix ofereceria o mesmo percentual que a GDK estaria oferecendo. E esse percentual que era de 1,5% foi oferecido mas não foi aceito naquela altura porque a obra foi dada a GDK. Então, a promessa de pagamento de propina na PETROBRAS por parte da Engevix começou com o Cacimbas I, após esses eventos.

Juiz Federal:-E não foi feita ao Pedro Barusco, foi feita ao Raul Schmidt?Milton Pascowitch:-A promessa foi feita ao Raul Schmidt, ele conversou com o

Duque, eles deram ganho à GDK, portanto a minha promessa não fazia sentido porque não tínhamos ganho a obra, depois que a obra foi ganha pela Engevix houve a promessa, agora sim, conhecida como Casa, que aí envolvia Pedro Barusco e Renato Duque. Eu nunca mais falei com Raul Schmidt.

Juiz Federal:-Essa segunda promessa o senhor fez diretamente ou outra pessoa fez?

Milton Pascowitch:-Não, eu fiz diretamente ao Pedro Barusco.Juiz Federal:-O senhor fez também ao Renato Duque ou...Milton Pascowitch:-Eu não me lembro de ter conversado com o Renato Duque

assim diretamente sobre percentuais, sobre percentuais sobre contratos, eu acho que essas conversas sempre eram feitas via, no caso de obras de refino, essas promessas sempre eram feitas via Pedro Barusco.

Juiz Federal:-Qual foi o percentual? Foi o mesmo percentual?Milton Pascowitch:-Foi o mesmo percentual, 1,5%.Juiz Federal:-E efetivamente foram pago esses valores?

32 Evento 670.

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Milton Pascowitch:-Não, esses valores foram pagos em um percentual muito pequeno ao grupo da casa, foram pagos ao grupo político sim em recursos valores ou em aquisições ou em reformas de bens ou uma série de outras contrapartidas.

Juiz Federal:-Quais outros contratos houve esses mesmos pagamentos de comissões ou propinas? O senhor se recorda? Da Engevix?

Milton Pascowitch:-Eu não sei os contratos onde houve o pagamento de comissão ou propina, eu sei dos contratos onde eu estava envolvido. Então, houve Cacimbas, houve o contrato de Cacimbas II que era a ampliação do contrato de Cacimbas, houve no contrato da REPLAN, houve no contrato de Propeno da REPAR, houve no contrato da URE/URC da RPBC, e houve também acho que em um contrato pequeno de, se não estou esquecendo nenhuma, de 3 ECOMPS, contrato de ECOMPS.

Juiz Federal:-Cacimbas?Milton Pascowitch:-Cacimbas, Cacimbas III, REPAR, RLAN, RPBC são duas, URC e

URE.Juiz Federal:-Em todos esses o senhor participou diretamente?Milton Pascowitch:-Todos esses eu participei diretamente33.

Em outro trecho de seu interrogatório, MILTON PASCOWITCH confirmou ter

celebrado contratos de prestação de serviços fraudulentos com a ENGEVIX, a fim de que

fossem repassados os valores indevidos destinados à Diretoria de Serviços,

especificamente RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, em razão do contrato celebrado

entre a empreiteira e a Petrobras para as obras do Módulo 1 da Unidade de Tratamento de

Gás de Cacimbas – Fase II:

Juiz Federal:-A denúncia também faz uma referência aqui a esses contratos da Engevix com a sua empresa JAMP Engenheiros, diversos desses contratos, na denúncia a partir da folha 122. Eram esses contratos que o senhor utilizava para o seu comissionamento e para os repasses dos demais?

Milton Pascowitch:-Esses que eu me referia, são esses daí, Cacimbas, Cacimbas II, REPAR, RLAN, ECOMPS, são contratos pequenininhos, RPBC que são dois contratos o URE e URC.

Juiz Federal:-Eu tenho aqui um montante global aqui, pelo menos que eu anotei na decisão de recebimento da denúncia, de cerca de 53 milhões.

Milton Pascowitch:-É ao longo desses 08 anos foi esse o meu montante.Juiz Federal:-O senhor ficou com a maior parte disso ou o senhor repassou a

maior parte disso?Milton Pascowitch:-Não, eu acho que na média ele vai dar muito próximo dessa

avaliação que eu fiz, deve dar aproximadamente 1/3, obviamente que eu não fiz todos os pagamentos para a casa, mas para a política ele vai mais ou menos chegar próximo ao valor que...,

Juiz Federal:-Na área política o senhor não permanecia em débito, como ficava como a casa?

Milton Pascowitch:-Não, eu não tenho essa conta muito exata, eu vou tirar os

33 Evento 670.

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contratos do casco para ver se há liquidação em 100%, pode até distorcer, eu acho que foi muito próximo de zerar a conta34.

Os contratos nº P-8887/01-MO-PJ-1014/05 e P-8887/01-MO-PJ-1018/09, bem

como suas respectivas notas fiscais corroboram o quanto alegado pelo operador financeiro

colaborador (evento 3, COMP95 e COMP96).

Nesta senda, conclui-se que embora, no entendimento do Juízo a quo, não haja

prova de corroboração quanto à prática do ato de corrupção denunciado em relação ao

contrato para as obras de Cacimbas – Fase II, tendo os acusados sido absolvidos, não se

pode estender o raciocínio aos atos de lavagem de ativos praticados através dos contratos

simulados nº P-8887/01-MO-PJ-1014/05 e P-8887/01-MO-PJ-1018/09 celebrados entre a

JAMP Engenheiros Associados e a ENGEVIX.

Conforme sinteticamente demonstrado, a instrução probatória demonstrou a

ocorrência de um segundo ato de corrupção, não denunciado, decorrente da contratação

da ENGEVIX pela Petrobras para as obras do Módulo 1 da Unidade de Tratamento de Gás

de Cacimbas – Fase II.

A dissimulação da origem, movimentação e disposição valores espúrios

prometidos à Diretoria de Serviços e ao núcleo político após referida contratação, por sua

vez, se deu justamente através dos contratos simulados nº P-8887/01-MO-PJ-1014/05 e P-

8887/01-MO-PJ-1018/09 celebrados entre a JAMP Engenheiros Associados e a ENGEVIX.

Destarte, uma vez comprovada a materialidade do delito, já que referidas

contratações foram realizadas tão somente com a finalidade de conferir aparência lícita a

repasses de valores indevidos aos operadores financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ

ADOLFO PASCOWITCH, para que estes os repassassem mediante a prática de novas

condutas de lavagem de dinheiro a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, torna-se

necessária a reforma de decisão, a fim de condenar os apelados GERSON ALMADA,

CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES SOBRINHO e RENATO DUQUE pela prática de duas

condutas35 de lavagem de dinheiro, tipificadas pelo art. 1º, V, c/c o art. 1º § 4º, da Lei

34 Evento 670.35 A primeira conduta consiste nos vinte e quatro pagamentos realizados pela ENGEVIX em favor da JAMP,

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9.613/98 (na redação anterior à Lei 12.683/2012), na forma do artigo 69 do Código Penal.

3.6 Contra o número de atos de corrupção considerados no dispositivo da

sentença recorrida

Inobstante a configuração dos crimes de corrupção ativa e passiva em relação

aos contratos e respectivos aditivos firmados pela ENGEVIX, individualmente ou

consorciada, com a Petrobras para as obras objeto da denúncia tenha sido reconhecida

pelo Juízo na sentença, foram os apelados GERSON ALMADA, RENATO DUQUE, JOSÉ

DIRCEU, JOÃO VACCARI e FERNANDO MOURA condenados pelos delitos em comento

por apenas 5 vezes (itens 892, 893, 898, 905 e 901 da sentença).

Consignou, contudo, o d. Magistrado na decisão em comento:

217. Além disso, as empresas componentes do cartel, pagariam sistematicamente propinas a dirigentes da empresa estatal calculadas em percentual, de um a três por cento em média, sobre os grandes contrato obtidos e seus aditivos.

(…)376. Como já adiantado, os crimes de corrupção e lavagem envolvendo os

repasses de propinas para a Diretoria de Abastecimento foram objeto da ação penal 5083351-89.2014.4.04.7000, com condenação de Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa por corrupção passiva e lavagem de dinheiro e de Gerson de Mello Almada por corrupção ativa e lavagem de dinheiro (evento 714).

377. Também sobre esses contratos, cerca de mais 1 ou 2% do valor deles e dos aditivos seria repassado à Diretoria de Serviços e Engenharia, ocupada por Renato de Souza Duque, sendo ainda beneficiado o gerente executivo da Engenharia Pedro José Barusco Filho. Do total da propina, parte ficava com Renato Duque e Pedro Barusco, parte com os intermediadores, mas cerca de 50% seria destinada ao Partido dos Trabalhadores, em intermediação realizada pelo acusado João Vaccari Neto.

378. Parte dos valores destinados ao Partido dos Trabalhadores era ainda repassada ao acusado José Dirceu de Oliveira e Silva e ao seu grupo, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, Roberto Marques, Júlio César dos Santos e Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura. Os acusados Julio Gerin de Almeida Camargo, Milton Pascowitch e José Adolfo Pascowitch serviram como intermediários do repasse ao grupo de José Dirceu de Oliveira e Silva (grifos nossos).

no período entre 09/01/2006 e 05/12/2007, com fulcro na celebração do contrato nº P-8887/01-MO-PJ-1014/05, em 01/12/2005, atos estes de lavagem de ativos que se apresentam em continuidade delitiva. A segunda conduta respeita a realização de dezoito pagamentos pela ENGEVIX em favor da JAMP, no período de 06/12/2007 a 27/04/2009, com fulcro na celebração do contrato nº P-8887/01-MO-PJ-1018/07, em 01/08/2007, atos estes em continuidade delitiva.

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O pagamento de propina como “regra do jogo”, não só em contratos firmados

pelas empreiteiras cartelizadas com a Petrobras, mas também em aditivos a esses

instrumentos, foi reconhecido, outrossim, por importantes figuras do esquema criminoso

que se erigiu no seio e em desfavor da Estatal, conforme demonstrou a instrução

processual.

Desse modo, verifica-se que houve oferta, promessa, solicitação e recebimento

de vantagens indevidas também nos aditivos contratuais firmados pela ENGEVIX,

individualmente e nos Consórcios por ela constituídos, para obras da Unidade de

Tratamento de Gás de Cacimbas, da Refinaria Presidente Bernardes – RPBC (Consórcios

SKANSKA-ENGEVIX-URE e INTEGRADORA URC), da Refinaria Presidente Getúlio Vargas –

REPAR (Consórcio SKANSKA-ENGEVIX) e da Refinaria Landulpho Alves - RLAM (Consórcio

INTEGRAÇÃO) objeto da presente ação penal, configurando-se, nesse liame, múltiplos atos

de corrupção ativa e passiva praticados por GERSON ALMADA, RENATO DUQUE, JOSÉ

DIRCEU, JOÃO VACCARI e FERNANDO MOURA. Em relação a esse último, impende

destacar que denunciado tão somente pelas práticas de corrupção no âmbito do Contrato

nº 0801.0030185.07.2 e seus respectivos aditivos de aumento de valor, celebrados pela

ENGEVIX para as obras dos Módulos 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas

– Fase III.

Desse modo, equivocou-se o d. Magistrado ao considerar apenas o número de

instrumentos contratuais ao condenar os réus pela prática dos delitos insculpidos nos

artigos 317 e 333 do Código Penal, eis que, conforme reconhecido, praticaram os

apelados, também em relação aos aditivos firmados com a Estatal, atos enquadrados nos

tipos penais em comento, incorrendo, assim, por diversas vezes, nas penas neles previstas.

Ademais, o número de atos de corrupção a serem atribuídos aos executivos

denunciados deve levar em consideração não só o número de contratos e aditivos

denunciados, mas, também, o número de funcionários da Petrobras e agentes políticos

corrompidos. Notadamente no caso da Diretoria de Serviços da Estatal, tanto RENATO

DUQUE quanto PEDRO BARUSCO possuíam autonomia e poder de decisão, havendo,

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inegavelmente, conforme demonstrado durante a instrução probatória, corrupção de

ambos os funcionários, bem como de JOÃO VACCARI e JOSÉ DIRCEU, além de, em

determinado caso, FERNANDO MOURA, culminando em cinco atos criminosos distintos.

Destarte, uma vez demonstrada a perpetuação dos ilícitos pelos apelados,

torna-se necessária a reforma de decisão, a fim de condenar: a) GERSON ALMADA, pela

prática, por 128 vezes, em concurso material, do delito de corrupção ativa; b) RENATO

DUQUE, JOÃO VACCARI e JOSÉ DIRCEU, pela prática, por 31 vezes, em concurso

material, do crime de corrupção passiva; e c) FERNANDO MOURA, pela prática, por 4

vezes, em concurso material, do crime de corrupção passiva.

Finalmente, em sendo provido o item 3.1 do presente recurso, requer-se, ainda,

sejam condenados os apelados CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES pela prática, por 128

vezes, em concurso material, do delito de corrupção ativa.

3.7. Contra a dosimetria da pena fixada na sentença recorrida

Conforme supratranscrito, a sentença objurgada condenou: (a) GERSON

ALMADA pelos crimes de corrupção ativa, por cinco vezes, e de lavagem de dinheiro, por

dezesseis vezes; (b) RENATO DUQUE pelo crime de corrupção passiva, por cinco vezes; (c)

JOÃO VACCARI pelo delito de corrupção passiva, por cinco vezes; (d) JOSÉ DIRCEU pelos

crimes de corrupção passiva, por cinco vezes, e de lavagem de dinheiro, por oito vezes; (e)

LUIZ EDUARDO pelo delito de lavagem de dinheiro, por duas vezes; (f) JULIO CÉSAR pelo

crime de lavagem de dinheiro, por uma vez; (g) FERNANDO MOURA pelos delitos de

corrupção passiva, por cinco vezes, e de lavagem de dinheiro por duas vezes; (h) JOSÉ

DIRCEU, FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO, ROBERTO MARQUES e JULIO CÉSAR

pelo crime de organização criminosa.

O presente tópico visa a delimitar o inconformismo em face das penas fixadas

em cada uma dessas condenações. Por oportuno, a argumentação a seguir exposta

considerará também, entre outras, as prováveis condenações de CRISTIANO KOK e JOSÉ

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ANTUNES pelos crimes de organização criminosa, corrupção ativa e lavagem de dinheiro,

de RENATO DUQUE, JULIO CÉSAR e LUIZ EDUARDO pelo crime de lavagem de dinheiro

(tópicos “3.1”, “3.2”, “3.3” e “3.4” da presente peça).

Nesse cenário, rememorando que a legislação penal vigente adota o sistema

trifásico para dosimetria da pena em concreto (artigo 68, do Código Penal36), a

impugnação do quantum de pena fixado na sentença observará a mesma sequência: (a)

oposição à análise do Juízo quanto às circunstâncias judiciais enumeradas no artigo 59,

caput, do Código Penal37; (b) oposição à análise do Juízo quanto às circunstâncias

atenuantes e agravantes; e (c) oposição à análise do Juízo quanto às causas de diminuição

e de aumento de pena.

3.7.1. Oposição à análise do Juízo quanto às circunstâncias judiciais

enumeradas no artigo 59 do Código Penal

A dosimetria da pena exige do julgador uma cuidadosa ponderação dos efeitos

ético-sociais da sanção e das garantias constitucionais. A análise dos fatores que compõem

as circunstâncias judiciais deve permitir ao jurisdicionado e à sociedade a perfeita

compreensão dos motivos que conduziram o magistrado na sua conclusão.

Nessa toada, se o Estado, por intermédio do Direito Penal, busca a proteção dos

bens jurídicos mais importantes – algumas vezes cumprindo um mandado implícito ou

explícito de criminalização – contra as lesões mais graves, é intuitivo que no bojo do

Processo Penal tutelam-se outros direitos que não apenas os do réu. Quando a ação penal

assegura uma punição efetiva e proporcional daquele que viola um bem jurídico importante

para a sociedade, tutela-se a própria segurança da sociedade, também albergada no texto

constitucional, no art. 5º, caput, da Constituição Federal.

36 Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.37 Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime:

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Assim, neste caso, em que se julga um dos maiores esquemas de corrupção

já descobertos no País, a desconsideração de qualquer uma de suas particularidades,

que contribuem exatamente para conferir aos crimes a sua magnitude deletéria,

representa deixar desprotegida a sociedade que nos cabe escudar.

Passemos, então, à análise das circunstâncias.

3.7.1.1. Da culpabilidade considerada nas penas de GERSON ALMADA, JOÃO

VACCARI, JOSÉ DIRCEU, FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO, JULIO CÉSAR e

ROBERTO MARQUES, assim como CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES e RENATO

DUQUE38

Na sentença combatida, a culpabilidade dos apelados GERSON ALMADA, JOÃO

VACCARI, FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO, JULIO CÉSAR e ROBERTO MARQUES,

em relação a todos os delitos que lhes restaram imputados, bem como de JOSÉ DIRCEU,

em relação ao delito de organização criminosa, foi considerada neutra. Uma vez que

absolvidos, as culpabilidades de CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, em relação a todas as

imputações, e de RENATO DUQUE, no que respeita as imputações de lavagem de ativos,

não foram avaliadas. No entanto, essa conclusão merece reparos.

Inicialmente, aponte-se que a “culpabilidade” ora em questão não se confunde

com a elementar do crime de mesmo nome. De fato, a “culpabilidade”, enquanto

desdobramento do princípio da culpabilidade, apresenta-se como princípio medidor de pena

(objeto deste tópico), como princípio impedidor da responsabilidade penal objetiva, e como

elemento integrante do conceito analítico de crime.

No momento da aplicação da pena já não mais se investiga se o réu é ou não

culpado (o que remontaria à culpabilidade dentro do conceito analítico de crime), pois isso

já restou definido em momento anterior do julgado, mais precisamente na fundamentação

38 No que tange a RENATO DUQUE, a análise a seguir diz respeito às imputações pela prática do delito de

lavagem de capitais.

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da sentença.

Assim, a circunstância judicial atinente à culpabilidade se relaciona à

censurabilidade da conduta, medindo o seu grau de reprovabilidade diante dos elementos

concretos disponíveis no caso em julgamento. Deve-se, portanto, ser entendida como a

reprovação social que o crime e o autor do fato merecem. Trata-se de um plus na reprovação

da conduta do agente.

A culpabilidade, enquanto circunstância judicial, merece ser valorada de forma

exacerbada pelo nível de consciência da ilicitude, pelo alto grau de escolaridade, ou pela

condição social do agente, ou quando esse, por suas condições pessoais, tem alto domínio

sobre as implicações decorrentes do crime. Sob todos esses prismas, os apelados têm alta

culpabilidade.

A consciência da ilicitude é irrefragável, já que se valeram de sofisticados

mecanismos financeiros para ocultar a corrupção e para praticar o crime de lavagem de

capitais. Todos os apelados possuem excelente formação acadêmica e qualificação, com

discernimento acima do homem médio. Ademais, o alto grau de escolaridade é patente, em

face das posições profissionais que ocupavam. Decorrência desse lugar no campo de

trabalho, as altas remunerações percebidas alçaram todos os apelados a uma condição

social muito privilegiada dentro da sociedade brasileira. E, cientes todos de que a propina

mantinha em funcionamento o cartel que fraudava licitações na Petrobras, o domínio, ainda

que parcial, sobre as consequências prejudiciais à Estatal é evidente.

Portanto, a culpabilidade de GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK, JOSÉ

ANTUNES, RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU, FERNANDO MOURA, LUIZ

EDUARDO, JULIO CÉSAR e ROBERTO MARQUES deve ser valorada de modo fortemente

negativo, tendo em vista o dolo direto e intenso dos agentes, dirigindo suas condutas à

prática de diversos crimes, dentre eles, corrupção, formação de cartel, lavagem de dinheiro,

fraude à licitação e crimes contra o sistema financeiro nacional, todos de forma reiterada.

Ainda no vetor culpabilidade, no aspecto reprovabilidade, os criminosos agiram

com amplo espectro de livre-arbítrio. Não se trata de criminalidade de rua, influenciada pelo

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abuso de drogas ou pela falta de condições de emprego, ou famélica, decorrente da miséria

econômica. São réus abastados, que ultrapassaram linhas morais sem qualquer tipo de

adulteração de estado psíquico ou pressão, de caráter corporal, social ou psicológico.

Dessa forma, é idôneo o aumento da pena em virtude da ação delitiva ter criado

entre os apelados um status de superioridade perante a lei, a coletividade e o patrimônio

público.

Em de face de um grupo de indivíduos que loteou os mais diversos setores da

Administração Pública, a aplicação da lei não pode ser branda e neutra. Faz-se por

necessário uma reprimenda em caráter específico a este sentimento de superioridade, como

corolário inafastável do princípio da igualdade de todos perante a lei.

Por tudo isso, a consideração da vetorial “culpabilidade” como negativa é a

medida que se impõe.

3.7.1.2. Da conduta social considerada nas penas de GERSON ALMADA,

RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU, FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO,

JULIO CÉSAR e ROBERTO MARQUES, assim como CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES

A conduta social traduz-se como o comportamento do agente no seio social,

familiar, e profissional, revelando-se pelo relacionamento do indivíduo no meio em que

vive, perante a comunidade, a família e os colegas de trabalho. Nesse passo, não andou

bem a sentença ao considerar a circunstância judicial “conduta social” como neutra para

todos os apelados.

Conforme se provou, todos eles tomaram parte de um dos maiores esquemas

de corrupção já revelados no País, com consequências desastrosas para o ambiente

econômico, social e democrático.

Em função da dificuldade de condenar indivíduos envolvidos nos chamados

“crimes de colarinho branco”39, consolidou-se uma cultura perversa, em que a relação

39 Faz-se aqui referência a Edwin Sutherland e sua obra “White Collar Crimes”, em que o autor passa a

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promíscua entre os agentes públicos e os privados obriga os cofres públicos e a população

a arcar com as mais diversas formas de enriquecimento ilícito de empreiteiras, operadores

financeiros e funcionários públicos corruptos.

De fato, somente pessoas que galgaram relevantes posições sociais,

profissionais e políticas poderiam ter acesso a dirigentes de Estatais, parlamentares e

gestores de grandes grupos empresariais. Nessa relação empresarial inevitável, ao invés de

se pautarem por uma conduta voltada ao desenvolvimento lícito das atividades, os

apelados decidiram adotar uma conduta social em que mutuamente e de forma criminosa

se associavam para maximizar lucros, em detrimento de toda a sociedade. O que se

revelou no curso desta ação foram relações espúrias desenvolvidas ao longo de muito

tempo.

O sujeito que se vale de relevante posição social e/ou profissional para

cometer delitos, com motivações torpes e egoísticas, deve ter sua conduta social

valorada negativamente. Deve-se preservar o valor social do trabalho, reafirmando a

noção de que o sucesso profissional é possível por meios lícitos. Considerar a

conduta social dos apelados como neutra é cristalizar na sociedade a sensação de

que o êxito empresarial depende da abdicação da ética.

Nessa linha, percebe-se que os apelados GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK,

JOSÉ ANTUNES, RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU, FERNANDO MOURA,

LUIZ EDUARDO, JULIO CÉSAR e ROBERTO MARQUES agiram de maneira reiterada e

estendida no tempo. Isso demonstra pouco apreço por regras éticas. Dado o alto grau de

instrução que possuem, não apenas perceberam a gravidade de suas condutas como

também não se recusaram a participar. Usaram sua formação e conhecimento para

produzir males sociais. Constituíram, assim, agentes de múltiplas ações criminosas, com

capacidade, inclusive, de cooptarem e envolverem outras pessoas para alcançarem seus

desideratos.

Ademais, os apelados praticaram os crimes sabendo que os valores eram

estudar as formas de criminalidade por parte da alta sociedade estadunidense.

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repassados a parlamentares, impactando o sistema político e vilipendiando a democracia,

sendo responsáveis por manter a corrupção dentro da Petrobras, bem como os respectivos

mecanismos de lavagem envolvidos.

Deve ser considerado em relação a RENATO DUQUE também o fato de ser

engenheiro da Petrobras, com ótimo salário, muito acima do valor médio ganho pelo

cidadão brasileiro, com previdência garantida e conjunto patrimonial confortável. Embora

possua elevado grau de instrução e discernimento, não resistiu ao instinto de construir um

patrimônio milionário às custas da administração pública (em prejuízo da coletividade).

3.7.1.3. Dos motivos considerados nas penas de GERSON ALMADA, RENATO

DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU, FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO, JULIO

CÉSAR e ROBERTO MARQUES, assim como CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES

Os motivos do crime são as razões subjetivas que estimularam ou

impulsionaram o agente à prática da infração penal. Os motivos podem ser conforme ou

em contraste com as exigências da sociedade. Assim, de acordo com a motivação que

levou o agente a delinquir, sua conduta poderá ser mais ou menos reprovável.

Não se desconhece a necessidade de averiguar a existência de motivo que se

revele como um plus ao integrante do próprio tipo, sob pena de restar impossibilitada sua

valoração.

In casu, é evidente que o motivo dos crimes constituiu o desejo de obtenção de

lucro fácil, seja pelo recebimento de propina, seja pela facilidade encontrada em licitações

da Petrobras. No entanto, não se pode desconsiderar que os crimes de corrupção, lavagem

de capitais e pertinência a organização criminosa possuíam também uma outra motivação:

manter o esquema de cartel funcionando. Funcionando não só em favor dos apelados,

mas também em detrimento da Estatal. Os crimes se retroalimentavam, com motivações

cíclicas: a corrupção era importante para que o cartel existisse; o cartel era importante para

conseguir recursos para pagar a propina. Os motivos dos crimes, umbilicalmente ligados à

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manutenção do esquema ilícito, devem ser valorados negativamente.

3.7.1.4. Das circunstâncias consideradas nas penas de LUIZ EDUARDO e

JULIO CÉSAR, assim como CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, em relação a todas as

imputações, de RENATO DUQUE, em relação ao delito de lavagem de capitais, de

FERNANDO MOURA, no que respeita aos delitos de lavagem de dinheiro e

organização criminosa, e de JOSÉ DIRCEU e ROBERTO MARQUES, no tocante ao delito

de organização criminosa

Na sentença objurgada, não foram consideradas como desfavoráveis as

circunstâncias do crime de organização criminosa quanto aos apelados LUIZ EDUARDO,

JULIO CÉSAR, FERNANDO MOURA, JOSÉ DIRCEU e ROBERTO MARQUES. Entendeu o d.

Magistrado que:

“Considerando que não se trata de grupo criminoso complexo, ou seja, com estrutura rígida e hierarquizada, circunstâncias e consequências não devem ser valoradas negativamente.”

Igualmente, não foram valoradas as circunstâncias do delito em relação a

CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, uma vez que não foram condenados.

No entanto, neste ponto, o decisum merece reforma, considerando-se, inclusive,

a hipótese de provimento do item “3.1” do presente recurso de apelação.

Embora seja evidente a impossibilidade de comparar a organização criminosa

revelada nos autos e pela assim denominada “Operação Lava Jato” com figuras simbólicas

deste tipo de delito, como por exemplo a máfia, que possuiu um destaque tão grande pela

sua estruturação a ponto de render inúmeros filmes que alcançaram o caráter atemporal,

como o “Poderoso Chefão”, essas históricas, notórias e mundialmente conhecidas

organizações delitivas não podem servir como patamar mínimo para a caracterização de

uma organização criminosa sofisticada, mas sim como um dos últimos patamares possíveis

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e conhecidos.

Ademais, o tipo penal da organização criminosa não coloca como requisito

essencial a complexidade ou sofisticação, não constituindo, assim, elemento do tipo . Esses

fatores são delegados ao julgador, que fará o exame e analisará a complexidade da

estruturação e os mecanismos de elisão à lei e ao poder público, para verificar a

necessidade de uma reprimenda maior.

In casu, dentre outros fatores, verificou-se um esquema criminoso que perdurou

por muitos anos, com envolvimento em diferentes contratos públicos e desviando somas

muito elevadas de recursos. Por óbvio, a organização criminosa que engendrou o esquema

possui um grau de sofisticação que não pode ser tido como comum. No mesmo sentido, a

constituição de um regulamento entre as empresas cartelizadas com o nome de “BINGO

FLUMINENSE”, a dissimulação dos encontros, e a ausência de registros das reuniões

revelam sofisticação que supera o ordinariamente visto.

Com isso, apontar as circunstâncias desse caso como neutras, normais ao tipo,

não possui o devido nexo com a realidade. Por isso, impende reconhecer a sofisticação da

organização criminosa e, por consequência, considerar as circunstâncias do delito como

desfavoráveis, impondo o devido aumento de pena aos réus LUIZ EDUARDO, JULIO

CÉSAR, JOSÉ DIRCEU, FERNANDO MOURA, ROBERTO MARQUES, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES.

Em adição, foram as circunstâncias atinentes ao delito de lavagem de ativos

consideradas normais em relação aos apelados FERNANDO MOURA, LUIZ EDUARDO e

JULIO CÉSAR. Conforme consignou o d. Magistrado:

909. Fernando Antônio Hourneaux de Moura Circunstâncias são normais, pois os atos de lavagem imputados ao condenado,

ocultação e dissimulação por meio de doações declaradas, não se revestem de especial complexidade.

910. Luiz Eduardo de Oliveira e Silva (…) . Circunstâncias são normais, pois os atos de lavagem imputados ao

condenado, ocultação e dissimulação por meio de um contrato simulado e pagamento subreptício do preço de um imóvel. não se revestem de especial

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complexidade. (...)911. Júlio Cesar dos Santos (…) Circunstâncias são normais, pois o ato de lavagem imputados ao condenado,

ocultação e dissimulação por meio de repasse de valores para reforma de um imóvel colocado em nome de pessoa interposta, não se revestem de especial complexidade. (…)

Observe-se que os crimes por eles perpetrados envolveram o pagamento e o

recebimento de valores bilionários, em um sistema bastante sofisticado, abarcando

diversos núcleos, grandes empreiteiras, funcionários públicos, operadores, contas secretas

no exterior, em um contexto de desvios dos cofres da Petrobras que se estendeu por

muitos anos.

As peculiaridades dos delitos praticados pelos acusados demonstram, portanto,

que as suas circunstâncias extrapolam e não são inerentes aos tipos penais, devendo ser

levados em consideração quando da fixação da pena base.

Nesta senda, ainda que tenham participado de apenas parte dos delitos de

lavagem de capitais, não se pode supor que não se utilizaram, para tanto, de elementos

complexos.

O mesmo deve ser considerado na hipótese de condenação de CRISTIANO

KOK e JOSÉ ANTUNES pelas imputações de prática dos delitos de corrupção ativa e

lavagem de capitais, e de RENATO DUQUE pela prática do delito de branqueamento de

capitais.

3.7.2. Oposição à análise do Juízo quanto às circunstâncias atenuantes e

agravantes

3.7.2.1. Da agravante prevista no artigo 61 do Código Penal em relação ao

delito de corrupção praticado por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK, JOSÉ

ANTUNES, RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU e FERNANDO MOURA

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Apesar de a recorrida sentença não ter contemplado qualquer circunstância

agravante em relação ao crime de corrupção, vislumbra-se a incidência de duas hipóteses

daquelas previstas na alínea “b” do inciso II do artigo 61 do Código Penal40, quais sejam, o

cometimento do delito para facilitar e assegurar a execução de outro crime.

A tipificação do delito de corrupção ativa não envolve qualquer questão acerca

do animus do agente, suas intenções, ambições ou desejos, visando apenas a reprimir

aqueles que incorrem em uma das condutas trazidas pelos elementos objetivos (oferecer ou

prometer). Com isso, não existe, em sede de análise da tipicidade, qualquer carga sobre o

objetivo da conduta.

Reconhecida a pluralidade delitiva, cabe observar se essas condutas possuem

uma sequência conexa, ou seja, se a existência das demais condutas possui o condão de

assegurar a manutenção de um esquema delitivo. No caso da presente ação penal, o crime

de corrupção teve como objetivo assegurar e facilitar a manutenção do cartel e do ajuste

fraudulento de licitações (conexão teleológica).

Corroborando a tese, o reconhecimento da existência de crimes perpetrados ao

longo de muitos anos demonstra que a corrupção atingiu o seu fim: assegurou a

manutenção do cartel existente em face das licitações realizadas pela Petrobras.

Da mesma forma, evidenciado o envolvimento de funcionários da Estatal,

sobretudo de RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, e do núcleo político que mantinha

RENATO DUQUE na condição de diretor, é irrefragável que a corrupção visou a facilitar a

perpetuação do crime de fraude às licitações.

A corrupção poderia ter sido pontual; a corrupção poderia ter como objetivo a

prática de um ato de ofício legal; mas, não. O crime de cartel perdurou por longo período

(assegurado pela corrupção) e o crime de fraude à licitação envolveu atos ilegais dos

funcionários públicos (facilitados pela corrupção).

40 Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:II - ter o agente cometido o crime:[...]b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime;.

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Com isso, havendo claro intuito de criar e manter um esquema pernicioso no seio

da Administração Pública, os atos de corrupção ativa e passiva não serão proporcionalmente

reprimidos se não existir uma regra específica no tocante ao seu exaurimento (conexão com

os demais delitos).

Ante o exposto, quanto às condenações pelo crime de corrupção ativa, pleiteia-se

a reforma da pena fixada para GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, e

quanto às condenações pelo crime de corrupção passiva, pugna-se pela reforma da pena

fixada para RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI, JOSÉ DIRCEU e FERNANDO MOURA, com

a incidência da agravante prevista no inciso II, alínea “b”, do artigo 61 do Código Penal.

3.7.2.2. Da incidência da agravante prevista no artigo 62, inciso I, do Código

Penal nas penas fixadas para RENATO DUQUE, JOSÉ DIRCEU e GERSON ALMADA

O Código Penal brasileiro, em seu artigo 62, inciso I, confere especial atenção e

prevê o agravamento da reprimenda penal a ser aplicada ao agente que comanda, organiza

ou favorece a prática de um delito.

No caso em tela, considerando-se a existência de diversos núcleos e subgrupos

criminosos na organização que se delineou no seio e em desfavor da Petrobras, verifica-se a

existência de diversos dirigentes dos ilícitos perpetrados.

Nesse sentido, depreende-se da prova carreada aos autos que GERSON

ALMADA era o responsável pela promoção e pela organização do núcleo criminoso

instaurado na ENGEVIX, bem como pelos delitos por meio deles perpetrados. Orientando a

atuação dos demais agentes e administradores da empresa, exercendo controle em todas

as etapas de atuação ilícita atinentes à empreiteira, nos operadores financeiros e agentes

públicos, foi responsável pela prática de delitos de corrupção, formação de cartel, lavagem

de dinheiro, fraude à licitação e crimes contra o sistema financeiro nacional, todos de forma

reiterada.

Não é diferente o que se verifica no contexto da Petrobras, que teve nos

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certames licitatórios conduzidos pela Diretoria de Serviços – gerida por RENATO DUQUE e

PEDRO BARUSCO – o principal foco dos pagamentos de vantagens indevidas. Foram eles,

assim, que permitiram o funcionamento do cartel de empreiteiras no seio da Estatal e que,

diretamente ou por intermédio de operadores, organizaram a oferta e o recebimento das

propinas.

JOSÉ DIRCEU, por sua vez, na condição de membro do núcleo político, não

apenas indicou RENATO DUQUE, como o manteve no cargo de Diretor de Serviços da

Petrobras, a fim de que, ao permitir o funcionamento do cartel de empreiteiras no âmbito

da companhia, organizasse a oferta e o recebimento, direta ou indiretamente, dos valores

indevidos, os quais eram, então, divididos com membros de referido núcleo político.

Assim, verifica-se que, na organização criminosa que se delineou no seio e em

desfavor da Petrobras, RENATO DUQUE, JOSÉ DIRCEU e GERSON ALMADA exerciam,

cada qual em seu contexto, função de liderança, de modo que impende agravar a pena

imposta aos apelados ante o reconhecimento da agravante prevista no artigo 62, inciso I, do

Código Penal.

3.7.2.3. Da incidência da agravante prevista no artigo 2º, §3º da Lei

12.850/2013 na pena fixada a JOSÉ DIRCEU

A sentença recorrida, embora tenha reconhecido a existência de uma organização

criminosa voltada à prática de vários delitos em desfavor da Petrobras, tendo condenado o

apelado JOSÉ DIRCEU pelo delito tipificado pelo artigo 2º da Lei 12.850/2013, deixou de

aplicar a agravante prevista no artigo 2º, §3º do diploma legal em comento.

Especificamente no que respeita ao papel desempenhado por JOSÉ DIRCEU, o d.

Magistrado consignou:

Não reconheço José Dirceu de Oliveira e Silva como o comandante do grupo criminoso, pelo menos considerando-o em toda a sua integralidade (empresários,

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intermediários, agentes públicos e políticos), motivo pelo qual deixo de aplicar a agravante do art. 2º, §3º, da Lei n.º 12.850/2013.

No entanto, merece reforma a respeitável sentença.

A agravante em questão determina que “a pena é agravada para quem exerce o

comando, individual ou coletivo, da organização criminosa, ainda que não pratique

pessoalmente atos de execução”.

Conforme demonstrado nas alegações finais apresentadas pelo parquet federal

(evento 879), JOSÉ DIRCEU exerceu, efetivamente, o comando do núcleo político da

organização criminosa em comento, mesmo que coletivamente com outros agentes

políticos.

Observe-se que foi o responsável pela indicação e pela própria manutenção de

RENATO DUQUE no cargo de Diretor de Serviços da Petrobras, recebendo, em

contrapartida, parcela das vantagens indevidas a ele prometidas. Nesta senda, conclui-se

que JOSÉ DIRCEU não foi apenas mero beneficiário dos valores espúrios destinados aos

funcionários da Diretoria de Serviços da estatal, como, dentro do subnúcleo criminoso do

Partido dos Trabalhadores - PT, detinha o comando necessário para coordenar a conduta

dos demais agentes, mantendo, enquanto foi de seu interesse RENATO DUQUE em seu

cargo.

Impende, portanto, agravar a pena imposta pela prática de organização

criminosa a JOSÉ DIRCEU, com base na agravante prevista no artigo 2º, §3º da Lei

12.850/2013.

3.7.3. Oposição à análise do Juízo quanto às causas de diminuição e de

aumento de pena

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3.7.3.1. Da incidência do aumento de pena previsto no artigo 2º, §4º, III e V

da Lei 12.850/2013 nas penas fixadas a FERNANDO MOURA, JOSÉ DIRCEU, JULIO

CÉSAR, LUIZ EDUARDO e ROBERTO MARQUES, bem como a CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES

O artigo 2º, §4º da Lei n. 12.850/2013 prevê, em seus incisos II, III e V, que a pena

pela prática do delito de organização criminosa será aumentada de 1/6 a 2/3 se (ii) há

concurso de funcionário público, sendo esta condição utilizada pela organização criminosa

para a prática de infração penal; (iii) se o produto ou proveito da infração penal destinar-se,

no todo, ou em parte, ao exterior; e (v) se as circunstâncias do fato evidenciarem a

transnacionalidade da organização.

Embora tenha a sentença reconhecido a aplicação da causa de aumento do

artigo 2º, §4º, II da Lei n. 12.850/2013, em relação a FERNANDO MOURA, JOSÉ DIRCEU,

JÚLIO CÉSAR, LUIZ EDUARDO e ROBERTO MARQUES, impende, ainda, o reconhecimento

das majorantes previstas nos incisos III e V do mesmo dispositivo legal.

Conforme exaustivamente demonstrado no âmbito das investigações da

Operação Lava-Jato e explanado pela denúncia (evento 1) e pelas alegações finais (evento

879) da ação penal nº 5045241-84.2015.4.04.7000, a organização criminosa destinada à

prática de delitos no seio e em desfavor da Petrobras é una, embora composta por

diferentes núcleos.

Referida organização criminosa remetia o produto das infrações penais para o

exterior (como reconhecido, por exemplo, nas sentenças das ações penais nº 5026212-

82.2014.4.04.7000 e 5036528-23.2015.4.04.7000) e mantinha conexão com outras

organizações criminosas independentes (ex: as organizações criminosas capitaneadas por

NELMA KODAMA e CARLOS HABIB CHATER).

Nesta senda, faz-se necessária a aplicação das causas especiais de aumento de

pena previstas no artigo 2º, §4º, III e V da Lei n. 12.850/2013 às penas atribuídas a

FERNANDO MOURA, JOSÉ DIRCEU, JÚLIO CÉSAR, LUIZ EDUARDO e ROBERTO

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MARQUES, majorando-as no fator máximo de 2/3 (dois terços).

Especificamente no que toca a CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, caso provido

o quanto requisitado no item “3.1” do presente recurso de apelação, necessária não apenas

a aplicação das causas especiais de aumento de pena previstas no artigo 2º, §4º, III e V da

Lei n. 12.850/2013 às penas que lhes forem atribuídas, como também da majorante

prevista no inciso II do mesmo dispositivo legal, uma vez que RENATO DUQUE e PEDRO

BARUSCO, membros da organização criminosa em comento, eram funcionários públicos

no sentido do artigo 327 do Código Penal, majorando-se, portanto, sua pena no fator

máximo de 2/3 (dois terços).

3.7.3.2. Da incidência do aumento de pena previsto no artigo 1º, §4º da Lei

nº 9.613/98 nas penas fixadas para GERSON ALMADA, JOSÉ DIRCEU, LUIZ EDUARDO,

JULIO CÉSAR, FERNANDO MOURA, assim como em relação a CRISTIANO KOK, JOSÉ

ANTUNES e RENATO DUQUE

A sentença recorrida, embora tenha reconhecido a existência de uma organização

criminosa voltada à prática de vários delitos em desfavor da Petrobras e tenha condenado

quase todos os apelados pelo crime de lavagem de capitais, deixou de aplicar a causa

especial de aumento de pena prevista no artigo 1°, §4º, da Lei nº 9.613/98.

A majorante supramencionada, de acordo com a redação original do dispositivo

(anterior a 09/07/2012), aplica-se aos casos em que o crime de lavagem de capitais é

cometido de forma habitual ou por intermédio de organização criminosa, em alguma das

hipóteses descritas nos incisos I a VI do caput, in verbis:

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

(...)V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem,

direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a

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prática ou omissão de atos administrativos;(...)§ 4º A pena será aumentada de um a dois terços, nos casos previstos nos incisos I

a VI do caput deste artigo, se o crime for cometido de forma habitual ou por intermédio de organização criminosa.

Após alteração legislativa, a redação de referida causa de aumento tornou-se a

seguinte:

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

(...)§ 4o A pena será aumentada de um a dois terços, se os crimes definidos nesta Lei

forem cometidos de forma reiterada ou por intermédio de organização criminosa. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

Os delitos de lavagem de capitais perpetrados pela organização criminosa

descrita nos presentes autos dataram, conforme constante da sentença objurgada, de

01/12/2005 até 13/11/2013. Nessa senda, conforme reconhecido na decisão, perfeitamente

aplicáveis em sua integralidade os dispositivos constantes da Lei n. 9.613/1998, tanto em sua

redação original, eis que vigente à época de parcela dos fatos, quanto em sua nova redação.

Tendo isso em linha de conta, restando, ainda, patente a configuração in casu de

crimes praticados contra a administração pública, merece reforma a sentença a fim de que

reste reconhecida a causa especial de aumento em apreço. Primeiramente, reconhece-se

que a lavagem de capitais pelos integrantes da organização criminosa se dava de maneira

habitual, porquanto perpetrados repetidamente atos (reiterados) de lavagem de valores

oferecidos e aceitos a título de vantagens indevidas, durante determinado e considerável

período de tempo.

Nesse contexto, diante do número de condutas constantes da exordial acusatória

e reconhecidas na sentença, as quais se estenderam por um interregno de aproximadamente

oito anos, afigura-se configurada a hipótese descrita, que deve, inclusive, ante as

peculiaridades do caso, observar a fração máxima prevista.

Não bastasse a habitualidade da prática do delito de lavagem de dinheiro pela

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organização criminosa delineada na presente ação penal, reconhece-se presente, ainda, a

outra possibilidade de aplicação da causa de aumento em questão, porquanto existente

uma organização criminosa.

A despeito de a Lei n. 9.613/1998, na linha do que observado na Lei n.

9.034/1995, não se ocupar de definir a expressão “organização criminosa” por ela trazida, o

que só ocorreu com o advento da Lei n. 12.850/2013, encontrava-se, ainda à época,

preenchimento a essa lacuna legal no direito internacional.

A Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional,

cognominada Convenção de Palermo, datada de 2000 e promulgada pelo Brasil por meio do

Decreto n. 5.015, de 12/03/2004, confere, em seu artigo 2º, definição legal à noção de

“grupo criminoso organizado” como “grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente

há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais

infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou

indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material”. “Grupo estruturado”,

por sua vez, de acordo com o mesmo dispositivo, seria o “grupo formado de maneira não

fortuita para a prática imediata de uma infração, ainda que os seus membros não tenham

funções formalmente definidas, que não haja continuidade na sua composição e que não

disponha de uma estrutura elaborada”, enquanto “infração grave” seria o “ato que constitua

infração punível com uma pena de privação de liberdade, cujo máximo não seja inferior a

quatro anos ou com pena superior”.

De acordo com o posicionamento majoritário atualmente adotado pelo Supremo

Tribunal Federal, edificado quando do julgamento do Recurso Extraordinário n. 466.343, em

2008, e acaudilhado pelo Ministro Gilmar Mendes, diante do que disposto no §3º, do artigo

5º, da Constituição Federal, tratados internacionais de direitos humanos, tais quais a

Convenção de Palermo, após sua ratificação, possuem status de supralegalidade (e

infraconstitucionalidade) no ordenamento jurídico brasileiro, fazendo-se, assim, aplicáveis ao

direito interno.

Destarte, a despeito de inexistir, antes da Lei de Organização Criminosa, de 2013,

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o tipo penal de pertinência a organização criminosa, que, portanto, apenas a partir do

referido ano passou a ser crime no Direito brasileiro, havia, à época dos fatos narrados na

exordial acusatória anteriores a este período, definição legal à ideia de “organização

criminosa” inserta na majorante do §4º, do artigo 1º, da Lei n. 9.613/1998, podendo ser,

desde logo, reconhecida a sua configuração para fins de observância da causa especial de

aumento trazida pela Lei n. 9.613/1998.

Mencione-se, ainda, que a aplicação dessa majorante consiste em uma resposta

legal ao uso da lavagem de dinheiro para fortalecimento de organizações criminosas,

inexistindo, portanto, bis in idem, configurando-se duas objetividades jurídicas distintas. A

lavagem de capitais tem como bem jurídico tutelado a ordem econômico-financeira, ao

passo que o crime de organização criminosa, assim como o de quadrilha, é espécie de crime

contra a paz pública41.

Portanto, impende majorar, em sua fração máxima, a pena imposta pela prática

de lavagem de dinheiro a GERSON ALMADA, JOSÉ DIRCEU, LUIZ EDUARDO, JULIO

CÉSAR42 e FERNANDO MOURA, assim como a CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES e

RENATO DUQUE, em sendo provido o recurso quanto aos itens “3.1”, “3.2” e “3.5” das

presentes razões.

3.7.4. Considerações finais quanto à dosimetria das penas fixadas aos

apelados.

Mais uma vez, ressalte-se: estamos diante de um dos maiores casos de

corrupção já revelados no País. Não se pode tratar a presente ação penal sem o cuidado

devido, pois o recado para a sociedade pode ser desastroso: impunidade; ou, reprimenda

insuficiente.

Nesse sentido, e dada a pertinência, repisamos a explanação posta nas

41 LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação Criminal Especial Comentada. 3. ed. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 346 e 482. 42 Considerando-se, inclusive, a hipótese de provimento dos itens “3.3” e “3.4” do presente recurso.

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alegações finais: a criminologia voltada ao estudo dos “crimes de colarinho branco”

demonstra que – ao contrário do que afirmam acriticamente alguns, com base na

criminologia genérica – o montante da pena e sua efetividade da punição constituem

relevantes fatores para estancar o comportamento criminoso. Nesse sentido, por exemplo,

propugnam Neal Shover e Andy Hochstetler, professores de sociologia e criminologia de

Universidades Americanas, na obra “Choosing White-Collar Crime”, que é um estudo

criminológico especializado nesse tipo de crime. Segundo os autores:

“O crime de colarinho branco é cometido porque algumas pessoas estimam o ganho como maior do que os riscos ou consequências de serem pegos. Vistos desta maneira, é uma política saudável de controle do crime aumentar os riscos percebidos deles (...)”.

“[U]ma unidade de punição pode gerar um benefício maior contra crime de colarinho branco do que a mesma unidade empregada contra crime de rua.”

No mesmo sentido, aliás, estão os maiores estudiosos mundias do tema

corrupção, como Robert Klitgaard e Rose Ackerman, que chegam a fazer uma fórmula para

indicar que a propensão ao cometimento da corrupção, por um indivíduo, corresponde à

análise de custos e benefícios dos comportamentos honesto e corrupto. Dentre os custos,

destacam a punição e a probabilidade de punição.

Algo que deve ser tomado em conta, e muitas vezes é ignorado pela comunidade

jurídica, é o fator probabilidade de punição. De fato, o crime de corrupção é um crime muito

difícil de ser descoberto e, quando descoberto, é de difícil prova. Mesmo quando são

provados, as dificuldades do processamento de “crimes de colarinho branco” no Brasil são

notórias, de modo que nem sempre se chega à punição. Isso torna o índice de punição

extremamente baixo.

Como o cálculo do custo da corrupção toma em conta não só o montante da

punição, mas também a probabilidade de ser pego, devemos observar que é o valor total do

conjunto, formado por montante de punição vezes a probabilidade de punição, que deve

desestimular a prática delitiva.

Se queremos ter um país livre de corrupção, essa deve ser um crime de alto

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risco e firme punição, o que depende de uma atuação consistente do Poder Judiciário

nesse sentido, afastando a timidez judiciária na aplicação das penas quando julgados

casos que merecem punição significativa, como o ora analisado.

3.8. Contra o reconhecimento da continuidade delitiva quanto aos atos de

corrupção ativa e passiva envolvendo a ENGEVIX

A r. sentença reconheceu entre os crimes de corrupção envolvendo a ENGEVIX

denunciados a continuidade delitiva.

Recorre-se nesse ponto, por entender que cada um dos crimes, além de

envolver agentes diferentes, é dotado de potencialidade lesiva própria, o que justifica que

sejam considerados diversos. Caso assim não se entenda, subsidiariamente requer-se que,

em sendo conferido provimento ao item “3.6” das presentes razões, seja reconhecido o

concurso material entre os diversos atos de corrupção concernentes aos contratos e a

continuidade delitiva entre cada um dos aditivos atinentes a esses instrumentos

celebrados.

A instrução processual comprovou que os apelados, na condição de

administradores e agentes da ENGEVIX, associaram-se aos executivos de outras grandes

empreiteiras com atuação no setor de infraestrutura, para, com abuso do poder

econômico, dominar o mercado de grandes obras de engenharia civil demandadas pela

Petrobras e eliminar a concorrência.

Com isso, lograram frustrar o caráter competitivo de licitações de grandes obras

realizadas pela Petrobras, obtendo vantagens consistentes em impor preços maiores aos

que seriam obtidos em um ambiente de livre concorrência, tornar certa a contratação em

um volume determinado de obras e escolher as obras que lhes eram mais adequadas

conforme a região ou por conhecimento técnico, dentre outras vantagens.

De forma a tornar o esquema ainda mais eficiente, as empreiteiras cartelizadas,

dentre elas a ENGEVIX, representada pelos operadores financeiros MILTON PASCOWITCH e

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JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, corromperam Diretores e empregados do alto escalão da

Petrobras, como RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, oferecendo-lhes vantagens

indevidas (propina) para que não só se omitissem na adoção de providências contra o

funcionamento do conluio, como também para que estivessem à disposição sempre que

fosse necessário para garantir que o interesse das cartelizadas fosse atingido.

Dos valores indevidos oferecidos à Diretoria de Serviços da Petrobras, parte era

destinada automaticamente ao grupo político responsável por manter RENATO DUQUE

no poder: o Partido dos Trabalhadores – PT. Desta forma, foram referidas ofertas realizadas

também a JOÃO VACCARI, representante do PT, e JOSÉ DIRCEU, membro de referido

partido responsável pela indicação de RENATO DUQUE ao cargo, por vezes representado

por FERNANDO MOURA.

Especificamente quanto aos crimes de corrupção de que tratam os autos, no

período entre, pelo menos, 13/06/2006 e 29/12/2011, GERSON ALMADA, na condição de

sócio e administrador da ENGEVIX, com a anuência de seus sócios CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES43 e, ainda, com o auxílio dos operadores MILTON PASCOWITCH e JOSÉ

ADOLFO PASCOWITCH, ofereceu e prometeu vantagens indevidas, assim como viabilizou

os seus pagamentos a empregados públicos da Petrobras para determiná-los a praticar,

omitir e retardar atos de ofício, bem como a agentes integrantes do núcleo político

responsável pela manutenção de referidos funcionários em cargos de direção dentro da

Petrobras.

RENATO DUQUE, então Diretor de Serviços, e PEDRO BARUSCO, então Gerente

Executivo de Engenharia, não só aceitaram tais promessas de vantagens indevidas, para si

e para outrem, como efetivamente deixaram de praticar atos de ofício com infração de

deveres funcionais, e os praticaram nas mesmas circunstâncias, tendo recebido vantagens

indevidas para tanto. JOSÉ DIRCEU e JOÃO VACCARI, respectivamente associado e

representante do Partido dos Trabalhadores – PT, agremiação política responsável pela

manutenção de RENATO DUQUE no cargo de Diretor de Serviços da PETROBRAS, atuaram

43 A presente argumentação inclui, desde já, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES considerando a hipótese de ser o item 3.1 do presente recurso provido.

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como verdadeiros beneficiários das vantagens indevidas aceitas pelo ex-Diretor de

Serviços da estatal e seu Gerente Executivo de Engenharia, passando a receber parte de

referidos valores. Por vezes, tal papel foi assumido por FERNANDO MOURA,

representante de JOSÉ DIRCEU dentro da PETROBRAS e integrante do núcleo político em

que se inseria o ex-Ministro-Chefe da Casa Civil.

Portanto, a corrupção no “esquema criminoso” ora narrado era bilateral e

envolvia não só a corrupção ativa, por parte dos executivos das empreiteiras cartelizadas,

como também, e de forma concomitante, a corrupção passiva de funcionários da Petrobras

e agentes políticos.

Na divisão das vantagens indevidas, o valor da propina repassada a

empregados corrompidos da Diretoria de Serviços, em especial RENATO DUQUE e PEDRO

BARUSCO, era de ao menos 2%, também do valor total do contrato e de seus respectivos

aditivos, sendo que parte desses valores seria destinada a integrantes do Partido dos

Trabalhadores (PT). No presente caso, tal porcentagem variou entre 0,9% e 2,28% dos

valores de contratos e respectivos aditivos celebrados pela ENGEVIX com a Petrobras.

Nessa seara, como resultado da corrupção de empregados da Petrobras, a

ENGEVIX, individualmente ou por intermédio de Consórcios, obteve sucesso na

formalização de contratos com a Estatal em diversos procedimentos. Na presente ação

penal, trata-se das licitações vencidas para as obras referentes à Unidade de Tratamento de

Gás de Cacimbas – Fase III, em Linhares/ES; a URE e URC da Refinaria Presidente Bernardes

– RPBC, em Cubatão/SP; às obras da unidade de propeno da Refinaria Presidente Getúlio

Vargas – REPAR, em Araucária/PR; às obras de offsite da carteira de diesel da Refinaria

Landulpho Alves – RLAM, em São Francisco do Conde/BA.

Conforme descrito na denúncia, para as obras dos módulos 2 e 3 da Unidade de

Tratamento de Gás de Cacimbas – Fase III, a ENGEVIX adjudicou objeto de licitação,

celebrando, com a Petrobras, em 05/03/2007, o contrato nº 0801.0030185.07.2, no valor de

R$ 1.377.035.922,78. A partir dele foram firmados, no período de 05/08/2009 a

20/04/2011, três aditivos de aumento de valor.

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Para as obras da URE da Refinaria Presidente Bernardes - RPBC, sagrou-se

vencedor o Consórcio SKANSKA-ENGEVIX URE, composto por ENGEVIX e SKANSKA. Em

31/08/2007, a Petrobras celebrou o contrato nº 0800.0034522.07.2, no valor de R$

165.500.000,00 com o consórcio em questão. Em razão deste contrato, foram, ainda,

celebrados, no interregno entre 21/10/2008 e 02/12/2011, seis aditivos de aumento de

valor.

A ENGEVIX, ainda, como membro do Consórcio Integradora URC, do qual eram

membros também a NIPLAN e a NM, celebrou o contrato nº 0800.0051044.09.2 com a

Petrobras, na data de 06/10/2009, no valor de R$ 493.508.317,61, para as obras do URC da

Refinaria Presidente Bernardes – RPBC. No período entre 31/03/2010 e 14/03/2011, foram,

ainda, celebrados três aditivos de aumento de valor ao contrato em comento.

Para as obras da unidade de propeno da Refinaria Presidente Getúlio Vargas –

REPAR, restou celebrado, entre a Petrobras e o Consórcio SKANSKA-ENGEVIX, em

30/03/2007, o contrato nº 0800.0030725.07.2, no valor de R$ 224.989.477,13. A Petrobras

celebrou com o Consórcio, em adição, 11 aditivos contratuais de aumento de valor, no

período entre 18/03/2008 e 23/03/2011.

Por fim, para as obras de Implementação das Tubovias e Interligações do off-site

da carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves - RLAM, a ENGEVIX, compondo o

Consórcio Integração com a empresa QUEIROZ GALVÃO, consagrou-se vencedora de

certame, celebrando, em 20/08/2008, com a Petrobras, no valor de R$ 909.448.100,48, o

contrato nº 0800.0044602.08.2. Dele sucederam três aditivos de aumento de preço,

datados de 14/04/2011, 30/09/2011 e 29/12/2011.

Consoante anteriormente referido (item “3.6”), para os contratos e aditivos

referentes às obras de Cacimbas, localizado no Espírito Santo, da Refinaria Presidente

Bernardes – RPBC, situada no estado de São Paulo, da Refinaria Presidente Getúlio Vargas –

REPAR, localizada no município da Araucária, no estado do Paraná, e da Refinaria

Landulpho Alves – RLAM, na Bahia, narrados e imputados na exordial acusatória, o

pagamento de propina restou provado:

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231. Reporta-se a denúncia aos seguintes contratos obtidos pela Engevix Engenharia junto à Petrobrás por cartel e ajuste de licitações e nos quais teriam sido oferecidas propinas aos dirigentes da Petrobrás:

a) dois contratos da Engevix Engenharia para construção dos módulos 1, 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas (UTGC;

b) contrato do Consórcio Skanska-Engevix URE para a execução de obras e implementação das unidades de recuperação de enxofre III e de tratamento de gás residual na Refinaria Presidente Bernardes (RPBC);

c) contrato do Consórcio Integradora URC/Engevix/Niplan/NM para a execução de obras de adequação da URC da Refinaria Presidente Bernardes (RPBC);

d) contrato do Consórcio Skanska/Engevix para a execução das obras de implementação do on-site da unidade de propeno da UN-REPAR, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR; e

e) contrato do Consórcio Integração (Engevix e Queiroz Galvão) para a execução das obras de implementação das tubovias e interligações do off-site da carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves – RLAM.

(…)645. Reputo caracterizado um crime de corrupção por contrato, ou seja, cinco,

ainda que tenham se consumado mediante dezenas de repasses de dinheiro e envolvido mais de um beneficiário.

646. Não reputo suficientemente provado o crime de corrupção em relação ao primeiro contrato de Cacimbas (Fase II). Para este contrato, teria havido, segundo a denúncia, mera oferta de propina, sem aceitação e pagamento. Sem aceitação e pagamento, a única prova a respeito da oferta consiste nas declarações de Milton Pascowitch e que, sozinha, não ampara a condenação criminal.

Confirmou-se, então, o pagamento de propina vinculado à contratação da

ENGEVIX, para obras de Cacimbas, do Consórcio SKANSKA-ENGEVIX URE e do Consórcio

INTEGRADORA URC, para obras da Refinaria Presidente Bernardes – RPBC, do Consórcio

SKANSKA-ENGEVIX, para as obras da Refinaria Getúlio Vargas – REPAR, e do Consórcio

INTEGRAÇÃO, para obras da Refinaria Landulpho Alves - RLAM. Ocorre, no entanto, que se

tratam de momentos, locais e personagens distintos.

As corrupções vinculadas a cinco diferentes obras, para o Juízo a quo,

pertenceriam a um mesmo processo, devendo ser encaradas sob o prisma da continuidade

delitiva. Todavia, neste ponto, encontra-se equivocado o entendimento firmado na r.

sentença recorrida.

Para a caracterização do crime continuado não basta a simples reiteração dos

fatos delitivos sob pena de tornar letra morta a regra do concurso material. É necessário

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que haja homogeneidade de circunstâncias de cada delito, de modo que os subsequentes

possam ser considerados desdobramentos dos antecedentes. A simples semelhança em

termos de tempo e lugar não é suficiente para atrair a continuidade delitiva quando

verificada a diversidade da maneira de execução e de agentes nos diversos delitos.

In casu, em cada obra, há distinção de local (Espírito Santo, São Paulo,

Araucária/PR e Bahia), objeto (obras dos módulos 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás

de Cacimbas, obras de URE da RPBC, obras da URC da RPBC, obras da unidade de propeno

da REPAR e obras de offsite da carteira de diesel da RLAM), agentes (ENGEVIX,

CONSÓRCIO SKANSKA-ENGEVIX URE, CONSÓRCIO INTEGRADORA URC, CONSÓRCIO

SKANSKA-ENGEVIX e CONSÓRCIO INTEGRAÇÃO) e datas (estendendo-se de 13/06/2006 a

29/12/2011). A atuação nos contratos para cada obra apresenta-se, portanto, como isolada

e independente, afastando a ideia da continuidade delitiva.

Assim, diante da diversidade de local, de objeto, de agentes e de empresas

envolvidas em cada uma das obras, há que se reconhecer o concurso material entre os

atos de corrupção correlatos.

Dentro de cada grupo de fatos, ou seja, de um contrato com seus respectivos

aditivos, tendo em linha de conta o que sustentado no item “3.6”, os diversos atos

poderiam constituir, ainda, crimes continuados.

3.9. Contra o reconhecimento da continuidade delitiva quanto aos delitos

de lavagem de ativos

A r. sentença considerou que os atos de branqueamento de capitais narrados na

denúncia seriam fases do mesmo ciclo de lavagem de ativos, entendendo que não

constituiriam crimes separados, mas pertenceriam a um mesmo processo contínuo de

lavagem, com colocação, circulação e integração. Entendeu que integrariam fases de

operações de lavagem, e que as operações caracterizam continuidade delitiva entre elas.

Recorre-se nesse ponto, por entender que não se tratam de ciclos únicos de

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lavagem, mas de condutas distintas sob o aspecto de modus operandi e dos agentes

que praticaram o delito. Cada grupo de fatos, nesse contexto, é dotado de

potencialidade lesiva própria e é suficiente para configurar lavagem, o que justifica que

sejam consideradas crimes diversos. Dentro de cada grupo de fatos, por sua vez, deve ser

reconhecida a continuidade delitiva.

A instrução processual comprovou que GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES44, na condição de administradores e agentes da ENGEVIX, associaram-se

aos executivos de outras grandes empreiteiras com atuação no setor de infraestrutura,

para, com abuso do poder econômico, dominar o mercado de grandes obras de

engenharia civil demandadas pela Petrobras e eliminar a concorrência.

Com isso, lograram frustrar o caráter competitivo de licitações de grandes obras

realizadas pela Petrobras, obtendo vantagens consistentes em impor preços maiores aos

que seriam obtidos em um ambiente de livre concorrência, tornar certa a contratação em

um volume determinado de obras e escolher as obras que lhes eram mais adequadas

conforme a região ou por conhecimento técnico, dentre outras vantagens.

De forma a tornar o esquema ainda mais eficiente, as empreiteiras cartelizadas,

dentre elas a ENGEVIX, corromperam Diretores e empregados do alto escalão da Petrobras

como RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, oferecendo-lhes vantagens indevidas

(propina) para que não só se omitissem na adoção de providências contra o

funcionamento do conluio, como também para que estivessem à disposição sempre que

fosse necessário para garantir que o interesse das cartelizadas fosse atingido.

Parcela destas vantagens indevidas era destinada a agentes integrantes do

núcleo político responsável pela indicação e manutenção de RENATO DUQUE no cargo de

Diretor de Serviços da Petrobras, o Partido dos Trabalhadores – PT. Nesta seara, receberam

propinas JOÃO VACCARI e o subnúcleo político de JOSÉ DIRCEU, composto por

FERNANDO MOURA e outros agentes.

Para que os valores fossem entregues com aparência lícita aos funcionários do

44 A argumentação contante no presente tópico considera que seja o recurso provido em relação ao item 3.1 da presente apelação, incluindo, portanto, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES.

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alto escalão da Petrobras e a atores do núcleo político, empreiteiros e Diretores contaram

com o auxílio de operadores financeiros. Esses disponibilizaram um “serviço” ou

“facilidade” para criar, em favor da empreiteira, uma justificativa econômica para a saída do

dinheiro dos cofres da empresa como se fosse um pagamento regular. O pagamento da

propina (produto e proveito de crimes anteriores) encontrou nesse contexto uma maneira

de se disfarçar de operação lícita.

No caso dos autos, consoante narrado no item “4” da exordial acusatória, o

repasse da propina observou diversos modi operandi e variados agentes, além de

contextos de local e data bastante distintos:

i) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-8983/00-

M0-PJ-1011/07, datado de 13/04/2007, no valor de R$ 28.866.786,00, vinculado ao

contrato da ENGEVIX para as obras de Cacimbas – Fase III, em razão do qual foram

emitidas quarenta e seis notas fiscais e realizadas quarenta e seis transferências bancárias

no valor total de R$ 27.091.478,77, no interregno entre 25/06/2007 e 16/11/2010, a fim

de que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores,

fossem as vantagens indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO

BARUSCO;

ii) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-

8983/00-M0-PJ-1031-07, datado de 01/09/2007, no valor R$ 1.549.047,06, vinculado ao

contrato da ENGEVIX para as obras de Cacimbas – Fase III, em razão do qual foram

emitidas doze notas fiscais e realizadas doze transferências bancárias no valor total de R$

909.324,36, no interregno entre 16/11/2007 e 16/01/2012, a fim de que, mediante a

dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores, fossem as vantagens

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indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO;

iii) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-8983/00-

I0-PJ-1008-10, datado de 01/10/2010, no valor R$ 1.411.377,63, vinculado ao contrato da

ENGEVIX para as obras de Cacimbas – Fase III, a fim de que, mediante a dissimulação da

origem, movimentação e disposição dos valores, fossem as vantagens indevidas

prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO;

iv) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-8983/00-

I0-PJ-6009-11, datado de 23/08/2011, no valor R$ 414.102,85, vinculado ao contrato da

ENGEVIX para as obras de Cacimbas – Fase III, em razão do qual foi emitida uma nota fiscal

e realizada, em 03/10/2011, uma transferência bancária no valor total de R$ 388.635,53, a

fim de que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores,

fossem as vantagens indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO

BARUSCO;

v) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-1015/00-

MO-PJ-1000/08, datado de 19/03/2008, no valor R$ 2.369.333,00, vinculado ao contrato

da ENGEVIX para as obras da URE da Refinaria Presidente Bernardes - RPBC, em razão do

qual foram emitidas dezoito notas fiscais e realizadas dezoito transferências bancárias no

valor total de R$ 1.495.771,91, no interregno entre 30/05/2008 e 15/03/2010, a fim de

que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores, fossem

as vantagens indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO;

vi) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

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financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-1169/00-

IO-PJ-0094/10, datado de 09/10/2010, no valor R$ 4.815.083,18, vinculado ao contrato da

ENGEVIX para as obras da URC da Refinaria Presidente Bernardes - RPBC, em razão do qual

foram emitidas nove notas fiscais e realizadas nove transferências bancárias no valor total

de R$ 2.453.491,56, no interregno entre 10/11/2010 e 02/02/2012, a fim de que, mediante

a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores, fossem as vantagens

indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO;

vii) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-8984/00-

M0-PJ-1005/08, datado de 19/03/2008, no valor R$ 3.484.206,00, vinculado ao contrato

da ENGEVIX para as obras da Unidade de Propeno na Refinaria Presidente Getúlio Vargas –

REPAR, em razão do qual foram emitidas dezessete notas fiscais e realizadas dezoito

transferências bancárias no valor total de R$ 3.363.777,33, no interregno entre

10/09/2008 e 20/01/2009, a fim de que, mediante a dissimulação da origem,

movimentação e disposição dos valores, fossem as vantagens indevidas prometidas

repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO;

viii) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-8984/00-

M0-PJ-1000/10, datado de 01/03/2010, no valor R$ 929.304,00, vinculado ao contrato da

ENGEVIX para as obras da Unidade de Propeno na Refinaria Presidente Getúlio Vargas –

REPAR, em razão do qual foram emitidas duas notas fiscais e realizadas duas transferências

bancárias no valor total de R$ 187.700,00, no interregno entre 25/05/2010 e 25/06/2010,

a fim de que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores,

fossem as vantagens indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO

BARUSCO;

ix) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

94/109

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-1079/00-

M0-PJ-1001/09, datado de 01/11/2008, no valor R$ 6.377.504,80, vinculado ao contrato

da ENGEVIX para as obras do offsite da Carteira de Dísel da Refinaria Landulpho Alves -

RLAM, em razão do qual foram emitidas vinte e seis notas fiscais e realizadas vinte e seis

transferências bancárias no valor total de R$ 5.834.199,43, no interregno entre

27/07/2009 e 21/09/2011, a fim de que, mediante a dissimulação da origem,

movimentação e disposição dos valores, fossem as vantagens indevidas prometidas

repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO;

x) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-1079/00-

I0-PJ-0008/11, datado de 25/08/2011, no valor R$ 381.879,33, vinculado ao contrato da

ENGEVIX para as obras do offsite da Carteira de Dísel da Refinaria Landulpho Alves –

RLAM, em razão do qual foi emitida uma nota fiscal e realizada uma transferência bancária

no valor total de R$ 747.029,28, em 21/10/2011, a fim de que, mediante a dissimulação da

origem, movimentação e disposição dos valores, fossem as vantagens indevidas

prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO;

xi) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-1079/00-

I0-PJ-1001/11, datado de 17/05/2011, no valor R$ 2.487.102,75, vinculado ao contrato da

ENGEVIX para as obras do offsite da Carteira de Dísel da Refinaria Landulpho Alves –

RLAM, em razão do qual foram emitidas quatro notas fiscais e realizadas quatro

transferências bancárias no valor total de R$ 787.271,65, no interregno entre 21/10/2011

e 20/03/2012, a fim de que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e

disposição dos valores, fossem as vantagens indevidas prometidas repassadas a RENATO

DUQUE e PEDRO BARUSCO;

95/109

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

xii) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº P-1079/00-

I0-PJ-0013/12, datado de 23/03/2012, no valor R$ 1.396.734,04, vinculado ao contrato da

ENGEVIX para as obras do offsite da Carteira de Dísel da Refinaria Landulpho Alves –

RLAM, em razão do qual foram emitidas seis notas fiscais e realizadas oito transferências

bancárias no valor total de R$ 2.656.489,10, no interregno entre 20/04/2012 e

21/12/2012, a fim de que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição

dos valores, fossem as vantagens indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e

PEDRO BARUSCO;

xiii) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ EDUARDO,

o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1010/09, datado de 01/03/2009, no valor R$ 120.000,00,

em razão do qual foram emitidas seis notas fiscais e realizadas seis transferências bancárias

no valor total de R$ 112.620,00, no interregno entre 09/04/2009 e 17/08/2009, a fim de

que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores, fossem

as vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas ao

núcleo político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ

EDUARDO;

xiv) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ EDUARDO,

o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1038/09, datado de 01/09/2009, no valor R$ 300.000,00,

em razão do qual foram emitidas oito notas fiscais e realizadas oito transferências

bancárias no valor total de R$ 300.320,00, no interregno entre 05/10/2009 e 05/04/2010,

a fim de que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores,

fossem as vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas

ao núcleo político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ

EDUARDO;

96/109

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

xv) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ EDUARDO,

o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1037/10, datado de 02/05/2010, no valor R$ 300.000,00,

em razão do qual foram emitidas seis notas fiscais e realizadas seis transferências bancárias

no valor total de R$ 281.550,00, no interregno entre 05/05/2010 e 05/10/2010, a fim de

que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores, fossem

as vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas ao

núcleo político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ

EDUARDO;

xvi) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e JOSÉ

ANTUNES, celebrou com a JD ASSESSORIA, empresa de JOSÉ DIRCEU e LUIZ EDUARDO,

o contrato nº 4000/01-MO-PJ-1000/11, datado de 02/11/2010, no valor R$ 300.000,00,

em razão do qual foram emitidas cinco notas fiscais e realizadas cinco transferências

bancárias no valor total de R$ 234.625,00, no interregno entre 05/11/2010 e 09/03/2011,

a fim de que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores,

fossem as vantagens indevidas prometidas à Diretoria de Serviços da Petrobras repassadas

ao núcleo político, especialmente JOSÉ DIRCEU e pessoas a ele relacionadas, como LUIZ

EDUARDO;

xvii) A JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, representada por MILTON

PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, celebrou com a JD ASSESSORIA, empresa de

JOSÉ DIRCEU e LUIZ EDUARDO, contrato simulado no valor de R$ 1.500.000,00, datado

de 15/04/2011, em razão do qual foram emitidas notas fiscais fraudulentas e realizadas

treze transferências bancárias em favor da JD ASSESSORIA, no valor total de R$

1.006.235,00, no período entre 20/04/2011 e 03/12/2011, bem como a transferência do

valor de R$ 387.000,00, em 27/12/2011, para a conta bancária do Escritório LEITE &

ROSSETTI com a finalidade de efetuar o pagamento parcial do preço do imóvel em que

está localizada a sede da JD ASSESSORIA, na Av. República do Líbano, nº 1827, Ibirapuera,

São Paulo/SP, ato para o qual contaram com o auxílio de JULIO CÉSAR. Foi, desta forma,

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repassada, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores,

através de 14 transferências bancárias, parcela das vantagens indevidas prometidas à

Diretoria de Serviços da Petrobras ao núcleo político, especialmente JOSÉ DIRCEU e

pessoas a ele ligadas, como LUIZ EDUARDO;

xviii) JOSÉ DIRCEU e LUIZ EDUARDO, em conjunto com os operadores

financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, dissimularam e

ocultaram a origem, movimentação, disposição e propriedade de R$ 388.366,00,

mediante a realização de 17 (dezessete) pagamentos, entre 14/08/2009 e 06/05/2010, à

HALEMBECK ENGENHARIA LTDA, em contraprestação aos serviços de reforma prestados

no imóvel localizado na Rua Estado de Israel, nº 379, ap. 131, Saúde, São Paulo/SP;

xix) JOSÉ DIRCEU e JÚLIO CÉSAR, em conjunto com os operadores financeiros

MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, dissimularam e ocultaram a origem,

movimentação, disposição e propriedade de R$ 1.814.546,00 (item 495), mediante a

realização de 14 (catorze) transferências eletrônicas, no valor de R$ 1.491.608,10, e outros

repasses de valores em espécie à arquiteta DANIELA FACCHINI, no período entre

02/05/2012 e 13/11/2013, em contraprestação aos serviços de reforma por ela prestados

no imóvel designado como Chácara nº 1, da Gleba N, no lugar denominado “Parque do

Vale da Santa Fé”, Vinhedo/SP;

xx) JOSÉ DIRCEU, LUIZ EDUARDO e JULIO CÉSAR, em conjunto com os

operadores financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, dissimularam

e ocultaram a origem, movimentação, disposição e propriedade de R$ 750.000,00, no

período entre 25/05/2012 e 30/07/2012, mediante a realização de 5 (cinco) transferências

bancárias à CAMILA RAMOS, filha de JOSÉ DIRCEU, sob o pretexto de adquirir o imóvel

localizado na Rua Assungui, nº 971, Saúde, São Paulo/SP, matrícula 22.249 do 14º Ofício de

Registro de Imóveis de São Paulo/SP;

xxi) FERNANDO MOURA, em conjunto com os operadores financeiros MILTON

PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, dissimulou e ocultou a origem,

movimentação, disposição e propriedade de ao menos R$ 950.000,00, no período entre

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24/04/2009 e 20/08/2010, mediante 12 (doze) transferências bancárias realizadas a partir

da conta da JAMP para a conta de LEONARDO ERBELLA HOURNEAUX DE MOURA, sob a

simulada forma de doações;

xxii) FERNANDO MOURA, em conjunto com os operadores financeiros

MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, dissimulou e ocultou a origem,

movimentação, disposição e propriedade de ao menos R$ 1.888.560,00, no período de

09/06/2008 e 02/08/2011, mediante 23 (vinte e três) transferências bancárias realizadas a

partir das contas da JAMP e de MILTON PASCOWITCH para a conta de LÍVIA HOURNEAUX

DE MOURA, boa parte das quais como se fossem doações regulares;

xxiii) FERNANDO MOURA, em conjunto com os operadores financeiros

MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, dissimulou e ocultou a origem,

movimentação, disposição e propriedade de ao menos R$ 940.400,00, no período de

01/06/2009 e 04/05/2010, mediante 09 (nove) transferências bancárias realizadas a partir

das contas da JAMP e de MILTON PASCOWITCH para a conta de ANITA ERBELLA

HOURNEAUX DE MOURA, boa parte das quais como se fossem doações regulares;

xxiv) FERNANDO MOURA, em conjunto com os operadores financeiros

MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, dissimularam e ocultaram a origem,

movimentação, disposição e propriedade de ao menos R$ 290.000,00, no período entre

01/03/2010 e 16/09/2010, mediante 08 (oito) transferências realizadas da conta da JAMP

para a conta de THIAGO COTROFE HOURNEAUX DE MOURA;

xxv) FERNANDO MOURA, em conjunto com os operadores financeiros

MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, dissimulou e ocultou a origem,

movimentação, disposição e propriedade de ao menos R$ 645.000,00, no período entre

15/01/2010 e 30/03/2011, mediante 18 (dezoito) transferências realizadas a partir da conta

da JAMP para a conta de OLAVO HOURNEAUX DE MOURA FILHO.

Caso seja provido o presente recurso no que tange ao item “3.5”, observa-se,

ainda a realização dos seguintes atos de lavagem de capitais:

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xxvi) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos

operadores financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, contrato nº

P-8887/01-MO-PJ-1014/05, datado de 01/12/2005, no valor de R$ 5.450.016,00,

vinculado ao contrato da ENGEVIX para as obras de Cacimbas – Fase II, em razão do qual

foram emitidas vinte e quatro notas fiscais e realizadas vinte e quatro transferências

bancárias no valor total de R$ 5.114.840,05, no interregno entre 09/01/2006 e

05/12/2007, a fim de que, mediante a dissimulação da origem, movimentação e disposição

dos valores, fossem as vantagens indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e

PEDRO BARUSCO;

xxvii) A ENGEVIX, representada por GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK e

JOSÉ ANTUNES, celebrou com a JAMP ENGENHEIROS ASSOCIADOS, empresa dos

operadores financeiros MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, o contrato nº

P-8887/01MO-PJ-1018/09, datado de 01/08/2007, no valor de R$ 1.412.698,22, vinculado

ao contrato da ENGEVIX para as obras de Cacimbas – Fase II, em razão do qual foram

emitidas dezoito notas fiscais, e realizadas dezoito transferências bancárias no valor total

de R$ 1.325.817,28, no interregno entre 06/12/2007 e 27/04/2009, a fim de que, mediante

a dissimulação da origem, movimentação e disposição dos valores, fossem as vantagens

indevidas prometidas repassadas a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO;

Os vários conjuntos de fatos acima descritos, para o Juízo a quo, pertenceriam a

um mesmo processo contínuo de lavagem e consistiriam na colocação, circularização e

integração dos valores. Ou seja, de acordo com o entendimento firmado na r. sentença

recorrida, tais condutas seriam fases de operações de lavagem que, embora compostas

por atos distintos de ocultação e dissimulação, não caracterizariam crimes separados.

Todavia, nesse ponto, encontra-se equivocado o entendimento firmado na r.

sentença, uma vez que as sucessivas manobras realizadas constituem fatos diversos,

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caracterizando cada um dos grupos de operações uma conduta autônoma de lavagem de

dinheiro.

Para a caracterização do crime continuado não basta a simples reiteração dos

fatos delitivos sob pena de tornar letra morta a regra do concurso material. É necessário

que haja homogeneidade de circunstâncias de cada delito, de modo que os subsequentes

possam ser considerados desdobramentos dos antecedentes. Não se observou, assim,

conforme evidenciado nos itens acima, semelhança de modus operandi, agentes, empresas,

tempo e lugar, afastando-se a continuidade delitiva.

Ademais, a ideia de continuidade delitiva, que recebe reprimenda menor

que a verificada no cúmulo material, não se mostra compatível com o caso concreto,

em que, na verdade, os agentes se valeram de diferentes expedientes exatamente

para dificultar a fiscalização Estatal, merecendo, assim, maior repreensão.

Sustenta-se que a unicidade de crimes deve ser reconhecida apenas entre os

crimes praticados no âmbito de cada grupo (intragrupo) de movimentações que

integram cada um dos fatos, no contexto, por exemplo, de um contrato, e não entre crimes

relacionados a fatos distintos. Isto é, entre crimes de grupos distintos (relação

intergrupo), como os crimes delineados nos itens “i” a “xxvii” supra, até mesmo entre os

diversos modos adotados em cada um dos itens, não é o caso de continuidade.

A proximidade comportamental entre condutas pode ser reconhecida no

contexto de um mesmo contrato, entre as transações dentro de cada agrupamento de

fatos (transferências intragrupo), na medida em que guardam nexo de continuidade

entre si.

Na relação intergrupo, contudo, não há que se cogitar de crime continuado. Isso

porque, como o modo de execução e os agentes envolvidos, além de condições de tempo

e local, foram distintos em cada “fase”, rompeu-se o nexo de continuidade entre as

operações de lavagem executadas entre os diferentes grupos de empresa, a afastar, então,

a incidência da regra do art. 71, CP.

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O reconhecimento de um só crime continuado, ao invés do concurso material

de crimes continuados, ignora a múltipla lesão a bens jurídicos, gerando uma pena similar

para aquele que pratica um ato de lavagem e aquele que pratica diferentes lavagens dos

mesmos recursos, em momentos distintos, por modos distintos, usando empresas distintas

e com a atuação direta de agentes diferentes.

Assim, merece guarida a tese de que a continuidade delitiva se impõe apenas

no que toca aos distintos crimes de lavagem praticados no âmbito de cada grupo de

operações, devendo incidir a regra do concurso material entre os distintos delitos de

lavagem refletidos no emprego de diversos grupos de operações.

3.10. Contra o valor fixado na aplicação do artigo 387, caput e IV, CPP.

Do dispositivo da sentença constou:

935. Com base no art. 387, IV, do CPP, fixo em R$ 46.412.340,00 o valor mínimo necessário para indenização dos danos decorrentes dos crimes, a serem pagos à Petrobras, o que corresponde ao montante pago em propina à Diretoria de Serviços e Engenharia e que, incluído como custo das obras no contrato, foi suportado pela Petrobrás. É certo que parte menor desse valor também remunerou serviços técnicos de Milton Pascowitch, mas sendo utilizados os contratos de consultoria como veículos para propina, tornou-se inviável a discriminação dos valores. O valor deverá ser corrigido monetariamente até o pagamento. Os condenados respondem na medida de sua participação nos delitos, segundo detalhes constantes na fundamentação e dispositivo.

Para se chegar ao referido valor, confira-se a fundamentação do Juízo:

455. Os repasses da Engevix Engenharia para a empresa Jamp Engenheiros Associados foram formalizados em contratos de consultoria e assessoria. São eles (evento 3, arquivos comp95, comp96, comp97, comp98, comp100, comp101):

- contrato de prestação de serviços nº P-8887/01-MO-PJ-1014/05, celebrado em 01/12/2005, vinculado ao contrato da Engevix para Cacimbas (Fase II), no valor de R$ 5.450.016,00, com vinte e quatro notas fiscais e repasses líquidos de R$ 5.114.840,05 entre 09/01/2006 a 05/12/2007;

- contrato de prestação de serviços nº 8887/01-MO-PJ-1018/09, celebrado em 01/08/2007, vinculado ao contrato da Engevix para Cacimbas (Fase II), no valor de R$ 1.412.696,22, com dezoito notas fiscais e repasses líquidos de R$ 1.325.817,28 entre 06/12/2007 a 27/04/2009;

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- contrato de prestação de serviços nº P-8993/00-MO-PJ-1011/07, celebrado em 13/04/2007, vinculado ao contrato da Engevix para Cacimbas (Fase III), no valor de R$ 28.866.786,00, com quarenta e seis notas fiscais e repasses líquidos de R$ 27.091.478,77 entre 25/06/2007 a 16/11/2010;

- contrato de prestação de serviços nº P-8983/00-MO-PJ-1031-07, celebrado em 01/09/2007, vinculado ao contrato da Engevix para Cacimbas (Fase III), no valor de R$ 1.549.057,06, com onze notas fiscais e repasses líquidos de R$ 872.621,27 entre 16/11/2010 a 16/01/2012;

- contrato de prestação de serviços nº P-8993/00-IO-PJ-1008-10, celebrado em 01/10/2010, vinculado ao contrato da Engevix para Cacimbas (Fase III), no valor de R$ 1.411.377,63, sem informação quanto aos repasses líquidos;

- contrato de prestação de serviços nº P-8983/00-IO-PJ-6009-11, celebrado em 23/08/2011, vinculado ao contrato da Engevix para Cacimbas (Fase III), no valor de R$ 414.102,85, com duas notas fiscais e repasses líquidos de R$ 425.338,62 entre 03/10/2011 a 06/12/2011;

- contrato de prestação de serviços nº P-1015/00-IO-PJ-1000-08, celebrado em 19/03/2008, vinculado ao contrato da Engevix para a URE da Refinaria Presidente Bernardes (RPBC), no valor de R$ 2.369.333,00, com dezoito notas fiscais e repasses líquidos de R$ 1.495.771,91 entre 30/05/2008 a 15/03/2010;

- contrato de prestação de serviços entre a Jamp e Consórcio Integradora - URC (Engevix/Niplan/NM), de nº P1169/00-IO-PJ-0094/10, celebrado em 09/10/2010, vinculado ao contrato Consórcio para a URC da Refinaria Presidente Bernardes (RPBC), no valor de R$ 2.369.333,00, com nove repasses líquidos de R$ 2.453.491,56 entre 10/11/2010 a 02/02/2012;

- contrato de prestação de serviços nº P-8994/00-MO-PJ-1005/08, celebrado em 19/03/2008, vinculado ao contrato da Engevix para a Unidade de Propeno na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), no valor de R$ 3.484.206,00, com dezoito notas fiscais e repasses líquidos de R$ 3.363.777,33 entre 10/09/2009 a 20/01/209

- contrato de prestação de serviços nº P-8984/00-MO-PJ-1000-10, celebrado em 01/03/2010, vinculado ao contrato da Engevix para a Unidade de Propeno na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), no valor de R$ 929.304,00, com duas notas fiscais e repasses líquidos de R$ 187.700,00 entre 25/05/2010 e 25/06/2010;

- contrato de prestação de serviços nº P-1079/00-MO-PJ-1001/09, celebrado em 01/11/2008, vinculado ao contrato da Engevix para a carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), no valor de R$ 6.377.504,80,00, com vinte e seis notas fiscais e repasses líquidos de R$ 5.834.199,43 entre 27/07/2009 a 21/09/2011;

- contrato de prestação de serviços nº P-1079/00-I0-PJ-0008/11, celebrado em 25/11/2008, vinculado ao contrato da Engevix para a carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), no valor de R$ 381.879,33, com uma nota fiscal e repasse líquido de 358.393,75 em 21/10/2011.

- contrato de prestação de serviços nº P-1079/00-IO-PJ-1001/11, celebrado em 17/05/2011, vinculado ao contrato da Engevix para a carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), no valor de R$ 2.625.325,36, com quatro notas fiscais e repasse líquido de R$ 787.271,65 entre 21/10/2011 a 20/03/2012;

- contrato de prestação de serviços nº P-1079/00-IO-PJ-0013/12, celebrado em 23/03/2012, vinculado ao contrato da Engevix para a carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), no valor de R$ 1.396.734,04, com seis notas fiscais e oito repasses líquidos de R$ 2.656.489,10 entre 20/04/2012 a 21/12/2012.

456. Como a denúncia não abrange propinas efetivamente pagas em relação aos contratos da Engevix Engenharia com a Petrobrás para Cacimbas (Fase II), os dois

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primeiros contratos do rol podem ser desconsiderados na presente sentença.Os demais, considerando os repasses líquidos identificados, somam R$

46.412.340,00.

Verifica-se, assim, que a propina objeto destes autos, considerada vantagem

indevida recebida, perfez R$ 46.412.340,00. No entanto, o valor indicado não configura o

montante total do crime.

Como se pode concluir a partir da leitura da sentença, o douto Juízo a quo

considerou, para fins de cálculo do valor correspondente ao produto do crime, o montante

líquido efetivamente repassado pela ENGEVIX à JAMP Engenheiros Associados, empresa de

MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH. Tais valores líquidos são resultantes

da subtração dos custos de emissão de nota fiscal do montante bruto a ser pago. Desta

feita, uma vez que referidos custos foram também suportados pela ENGEVIX, de modo

que foram contabilizados pela empreiteira como valores a serem pagos a título de

vantagens indevidas, a oneração a que submetida a Petrobras corresponde ao valor bruto

repassado à JAMP pela ENGEVIX, o qual totaliza R$ 46.464.575,08.

Ademais, o montante de R$ 46.464.575,08, como anteriormente dito, configura

o produto do crime, e não baliza para a indenização, como fixado na sentença.

Nesse contexto, é relevante destacar que o art. 91 do Código Penal estabelece,

como efeitos da condenação, a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, e a

perda em favor da União do produto do ato delituoso.

Dessa forma, o MPF entende necessário o perdimento dos valores auferidos

com a corrupção, ou do seu equivalente, servindo para tanto os numerários bloqueados

em contas e investimentos bancários e os montantes em espécie apreendidos em

cumprimento aos mandados de busca e apreensão, na quantia de R$ 46.464.575,08 ,

correspondentes ao valor comprovado de corrupção ligada às obras denunciadas e objeto

da lavagem de capitais.

Tratando-se de condenação que engloba crimes de lavagem de dinheiro, de

relevo a disposição especial do §1º do artigo 7º da Lei nº 9.613/98, que prescreve:

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Art. 7º São efeitos da condenação, além dos previstos no Código Penal:I - a perda, em favor da União - e dos Estados, nos casos de competência da

Justiça Estadual -, de todos os bens, direitos e valores relacionados, direta ou indiretamente, à prática dos crimes previstos nesta Lei, inclusive aqueles utilizados para prestar a fiança, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;

II - a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e de diretor, de membro de conselho de administração ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º, pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada.

§ 1º A União e os Estados, no âmbito de suas competências, regulamentarão a forma de destinação dos bens, direitos e valores cuja perda houver sido declarada, assegurada, quanto aos processos de competência da Justiça Federal, a sua utilização pelos órgãos federais encarregados da prevenção, do combate, da ação penal e do julgamento dos crimes previstos nesta Lei, e, quanto aos processos de competência da Justiça Estadual, a preferência dos órgãos locais com idêntica função.

Com essa norma especial, o Estado brasileiro indica a destinação dos valores

perdidos envolvidos em delitos de lavagem aos órgãos de persecução penal, em resposta

à preocupação internacional de assegurar a eficácia aos órgãos de combate a crimes de

corrupção, lavagem de capitais e organização criminosa45.

Todavia, conforme aponta Luiza Cristina Fonseca Frischeinsen, "a destinação

final dos bens deverá ser fixada na sentença"46. A observação é de todo pertinente, já que

é necessário que o juiz não apenas destine os valores aos órgãos federais, como também

especifique a quais deles em que montante.

Ocorre que a sentença recorrida limitou-se a fixar o valor do dano mínimo a

título de indenização, nada falando quanto ao montante do perdimento e à sua

destinação.

Assim, impondo-se o perdimento dos valores auferidos com a corrupção, no

montante de R$ 46.464.575,08 , é necessário, ainda, que seja dada a correta destinação,

45 Nesse sentido, podem-se citar, exemplificativamente, os artigos 7, 9, 11 (em especial o item 2), 29 e 31 da Convenção de Palermo, inserida no Direito Interno por meio do Decreto nº 5.015/04. A mesma preocupação é manifestada em outros mecanismos internos, como, por exemplo, as ações de 2015 aprovadas na XII Reunião Plenária da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, que prescrevem, como ação 11, a necessidade de “Identificar mecanismos que possibilitem maior efetividade dos órgãos de fiscalização, controle e persecução penal nas ações de prevenção e combate à lavagem de dinheiro por meio do comércio internacional”.46 FRISCHEISEN, Luiz Cristina Fonseca in DE CARLI, Carla Veríssimo (org). Lavagem de Dinheiro – Prevenção e Controle Penal. 2ª ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2013. p. 721.

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nos termos previstos no art. 7º, §1º, da Lei nº 9.613/98: aos órgãos federais de

persecução e julgamento penal, mais especificamente, ao Ministério Público Federal, à

Justiça Federal, à Polícia Federal e à Receita Federal, em quotas iguais.

Tal valor deverá ser objeto de perdimento sem prejuízo do arbitramento

cumulativo do dano mínimo, a ser revertido em favor da Petrobras, com base no art. 387,

caput e IV, do CPP.

Considerando os contratos e aditivos em relação aos quais se comprovou

corrupção envolvendo a ENGEVIX e empregados da Petrobras, bem como que houve

pagamento de propina a RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO enquanto permaneceram

em altos cargos da Petrobras correspondentes à soma dos valores repassados pela

ENGEVIX à JAMP em razão de cada um dos contratos e respectivos aditivos relacionados

às obras dos Módulos 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas – UTGC Fase

III, da Refinaria Presidente Bernardes – RPBC, da Refinaria Getúlio Vargas – REPAR e da

Refinaria Landulpho Alves – RLAM, estima-se o prejuízo mínimo em R$ 46.464.575,08.

Assim, imperiosa a condenação também nesse montante, a título de dano mínimo.

Observado que a propina foi paga com recursos oriundos dos contratos e aditivos obtidos

de forma fraudulenta junto à Petrobras, não há como fixar valor menor que o

correspondente à peita para indenizá-la. Esse valor é calculado independentemente da

quota parte da ENGEVIX nos consórcios que executaram tais instrumentos, ante a natureza

solidária da obrigação, conforme dispõe o art. 942, caput, segunda parte, do Código Civil.

4 . PEDIDOS

Por todo exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pugna pelo

conhecimento e provimento do recurso nos termos colocados, com a manutenção da

sentença nos pontos não recorridos, mas reformando-a para:

1. condenar CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES, considerando o quanto

alegado nos itens “3.5”, “3.6”, “3.8” e “3.9” das presentes razões de apelação, pela prática

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dos delitos de (i) pertinência à organização criminosa (art. 2º, caput e § 4º, II, III, IV e V c/c

art. 1º, §1º, ambos da Lei 12.850/13); (ii) corrupção ativa (art. 333, caput e parágrafo único

do Código Penal), por 128 vezes, em concurso material (art. 69 do Código Penal); e (iii)

lavagem de ativos (art. 1º, V, c/c o art. 1º § 4º, da Lei 9.613/98 (na redação anterior à Lei

12.683/2012)), por 18 séries independentes de branqueamento de capitais,

consubstanciadas nos pagamentos decorrentes da celebração de 14 contratos de

prestação de serviços fraudulentos com a JAMP Engenheiros Associados e de 4 contratos

de prestação de serviços fraudulentos com a JD ASSESSORIA, na forma do art. 69 do

Código Penal, nos termos do item “3.1” da presente peça;

2. condenar a) GERSON ALMADA, por 18 séries independentes, b) RENATO

DUQUE, por 14 séries independentes, c) JOSÉ DIRCEU, por 8 séries, d) LUIZ EDUARDO,

por 8 séries independentes, e) JULIO CÉSAR, por 3 séries independentes, e f) FERNANDO

MOURA, por 5 séries independentes, como incursos nas sanções do art. 1º, caput e §4º, da

Lei n. 9.613/98, em concurso material (art. 69 do Código Penal); nos termos dos itens “3.2”,

“3.3”, “3.4”, “3.5” e “3.9” da presente peça;

3. condenar a) GERSON ALMADA, por 128 vezes, como incurso nas sanções do

artigo 333, caput, do Código Penal, em concurso material (artigo 69 do Código Penal), com

incidência da causa especial de aumento prevista no parágrafo único do mesmo artigo; b)

RENATO DUQUE, JOÃO VACCARI e JOSÉ DIRCEU, por 31 vezes; e c) FERNANDO

MOURA, por 4 vezes, como incursos, em concurso material (art. 69 do Código Penal), nas

sanções do art. 317, § 1º, c/c art. 327, § 2º do Código Penal; nos termos dos itens “3.6” e

“3.8” da presente peça;

4. fixar as penas relativas às condenações dos apelados considerando os

elementos indicados no item “3.7” do presente recurso de Apelação, em especial quanto às

circunstâncias judiciais enumeradas no artigo 59, caput, do Código Penal; às circunstâncias

atenuantes e agravantes; e às causas de diminuição e de aumento de pena;

5. reconhecer a incidência da regra do concurso material (artigo 69 do CP) entre

os atos de corrupção descritos na denúncia (itens “3.2.1.2” a “3.2.4” da peça inicial),

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reconhecendo-se, subsidiariamente, a existência de continuidade delitiva apenas dentro de

cada um dos grupos de crimes, tendo em vista a diferença de local, de objeto, de data e de

agentes envolvidos nas obras, nos termos do item “3.8” da presente peça;

6. reconhecer a incidência da regra do concurso material (artigo 69 do CP) entre

as condutas de lavagem de dinheiro descritas na denúncia (item “4” da peça inicial),

reconhecendo-se a existência de continuidade delitiva apenas dentro de cada um dos

grupos de crimes, tendo em vista a diferença de modus operandi, agentes, tempo, lugar e

sujeitos envolvidos, nos termos do item “3.9” da presente peça;

7. majorar o valor fixado na aplicação do artigo 387, caput e IV, CPP, e decretar o

perdimento dos valores auferidos com a corrupção, ou do seu equivalente, nos termos

expostos no item "3.10" supra.

Curitiba, 11 de julho de 2016.

Deltan Martinazzo Dallagnol

Procurador República

Antônio Carlos Welter

Procurador Regional República

Carlos Fernando dos Santos Lima

Procurador Regional da República

Januário Paludo

Procurador Regional da República

Isabel Cristina Groba Vieira

Procuradora Regional da República

Orlando Martello

Procurador Regional da República

Diogo Castor de Mattos

Procurador da República

Roberson Henrique Pozzobon

Procurador da República

Julio Carlos Motta Noronha

Procurador da República

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Paulo Roberto Galvão de Carvalho

Procurador da República

Athayde Ribeiro Costa

Procurador da República

Laura Gonçalves Tessler

Procuradora da República

Jerusa Burmann Viecili

Procuradora da República(FSD)

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