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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA FEDERAL DA 19ª VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MINAS GERAIS Distribuição por dependência ao processo nº 2002.38.00.033.853-6 O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República que esta subscreve, no uso de suas atribuições legais conferidas por lei, com fundamento nos artigos 127, caput, 129, incisos II e III, 212 e 227 da Constituição Federal; Lei Complementar n. 75, Lei n. 7.347/85, Lei n. 8.069/90, Lei n. 8.078/90 210, inciso I, 213 da Lei 8.069/90 e na Portaria n. 796/00, vem, perante V. Exa. propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA em face de: SBT – CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A, empresa concessionária de serviços de radiodifusão, por seu representante legal, com endereço para citação na Av. das Comunicações, 04, Bairro, Vila Jaraguá, Osasco – SP, CEP: 06278-030; TV GLOBO LTDA., empresa concessionária de serviços de radiodifusão, por seu representante legal, com endereço para citação na Rua Lopes Quintas, 303, Bairro, Jardim Botânico, Rio de Janeiro – RJ, CEP: 22460-010, TV ÔMEGA LTDA. (também conhecida como REDE TV), empresa concessionária de serviços de radiodifusão, por seu representante legal, com endereço para citação na Rua Bahia, 205, Bairro, Alphaville, Barueri – SP, CEP: 06465-110,

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA EM MINAS GERAIS

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA FEDERAL DA 19ª VARA DASEÇÃO JUDICIÁRIA DE MINAS GERAIS

Distribuição por dependênciaao processo nº 2002.38.00.033.853-6

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República queesta subscreve, no uso de suas atribuições legais conferidas por lei, com fundamento nos artigos127, caput, 129, incisos II e III, 212 e 227 da Constituição Federal; Lei Complementar n. 75, Lein. 7.347/85, Lei n. 8.069/90, Lei n. 8.078/90 210, inciso I, 213 da Lei 8.069/90 e na Portaria n.796/00, vem, perante V. Exa. propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICACOM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA

em face de:

SBT – CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A, empresa concessionária de serviçosde radiodifusão, por seu representante legal, com endereço para citação na Av. dasComunicações, 04, Bairro, Vila Jaraguá, Osasco – SP, CEP: 06278-030;

TV GLOBO LTDA., empresa concessionária de serviços de radiodifusão, porseu representante legal, com endereço para citação na Rua Lopes Quintas, 303, Bairro, JardimBotânico, Rio de Janeiro – RJ, CEP: 22460-010,

TV ÔMEGA LTDA. (também conhecida como REDE TV), empresaconcessionária de serviços de radiodifusão, por seu representante legal, com endereço paracitação na Rua Bahia, 205, Bairro, Alphaville, Barueri – SP, CEP: 06465-110,

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RÁDIO E TELEVISÃO RECORD S/A, empresa concessionária de serviçosde radiodifusão, por seu representante legal, com endereço para citação na Rua da Várzea, 240,Bairro, Barra Funda, São Paulo – SP, CEP: 011040-080,

RÁDIO E TELEVISÃO BANDEIRANTES LTDA., empresa concessionáriade serviços de radiodifusão, por seu representante legal, com endereço para citação na RuaRadiantes, 13, Bairro, Morumbi, São Paulo – SP, CEP: 05699-9000,

pelos fundamentos de fato e de direito adiante expostos:

DOS FATOS

A presente exordial tem por suporte representação da TV BEM – Instituto deDefesa do Telespectador, estabelecida nesta Capital, requerendo atuação deste órgão ministerialno sentido de tomar as providências cabíveis quanto à programação dos sábados e domingos dasemissoras-rés, que têm exibido, no horário compreendido entre 06:00 e 20:00 horas, filmesinadequados para tal faixa horária. Apontam tais denúncias os efeitos danosos daqueles filmessobre a criança e o adolescente (v.g., erotização precoce, estímulo à violência,desvirtuamento de valores éticos etc.), com suas cenas requintadas de libidinagem, tensão,violência, tortura etc. (DOC. 01).

Diante de tal provocação, o Ministério Público Federal determinou a abertura donecessário procedimento investigatório, tendo, de imediato, oficiado ao Ministério da Justiça(Coordenação Geral de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação / SNJ) (DOC. 02), a fim deque o mesmo, no exercício de sua atribuição administrativa conferida por lei, apresentasseinformações detalhadas sobre as irregularidades eventualmente ocorridas, bem como sobre asprovidências porventura adotadas.

Em resposta, datada de 03 de setembro do corrente ano, o órgão executivo emquestão, agindo com grande presteza, informou-nos fundamentalmente o seguinte (DOC. 03):

"Atendendo ao solicitado no ofício nº 533/02-PRMG-SOTC-FAM, de 28/08/02, sobre a exibição de filmes inadequadospara a faixa etária no período compreendido entre 6:00 e20:00 horas aos sábados e domingos, temos a informar que asemissoras já foram cientificadas, por escrito, da necessidadede respeitar a Portaria 796/00 e o Estatuto da Criança e doAdolescente. (DOCS. 04, 05, 06 e 07)Anexamos cópia da correspondência enviada aos dirigentesdas emissoras através do Ofício Circular nº 04 (DOC. 08), de

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10.05.02. Como pode ser observado nos documentos anexos aemissora SBT reincidiu na transgressão.Anexamos também a relação dos filmes inadequados para oshorários, por várias emissoras, além da programação do SBTe da Globo, uma relação de filmes que foram transmitidospor outras emissoras que estavam em desacordo com ohorário indicado por este órgão.

1 – SBT – SISTEMA BRASILEIRO DE TELEVISÃO1.1. – Dia 11/08/02 – domingo – 12:00 horas (este filmeoriginou a correspondência de advertência, ofícioMJ/SNJ/CCLASS/Nº 167 de 13/08/02).Sessão Premiada – ‘PROCURADO’Classificado e publicado no DOU de 23/01/01, portaria nº 04, como‘Programa não recomendado para menores de 14 anos: inadequado para antesdas 21:00 horas’.Impropriedade: Violência.1.2. – Dia: 17/08/02 – sábado 14:30 horas (transgrediu)Festival de Filmes – ‘SELENA’Classificado em 28/11/00 – como ‘Programa não recomendado para menoresde 12 anos: inadequado para antes das 20:00 horas’Impropriedade: conflitosPortaria nº 79 de 06/12/00 – publicada no DOU de 07/12/00 páginas4/5.1.3. – Dia 18/08/02 – domingo – 12:00 horas (transgrediu)Sessão Premiada – ‘O DEMOLIDOR’Classificado como: ‘Programa não recomendado para menores de 14 anos:inadequado para antes das 21horas. O filme foi classificado e publicado noDOU de 03/11/95. Em 10/09/99 foi solicitado recurso da classificaçãoanterior, revisto o filme foi INDEFERIDO, sendo mantida a classificaçãoanterior, como: INADEQUADO PARA ANTES DAS 21HORAS. Com a impropriedade: VIOLÊNCIA.Recurso publicado no DOU de 20/09/99.(...)

2 – REDE TV2.1. Dia 17/08/02 – sábado – 16:15 horasTV Magia – ‘ O DIA DO COBRA’Classificado e publicado no DOU de 30/11/92 portaria nº 4337, (Processonº 08000-12436/89-11) como ‘Programa não recomendado para menores de14 anos: inadequado para antes das 21 horas’.Impropriedades: situações aos valores éticos e consumo de drogas.(...)2.5. – Dia 25/08/02 – domingo – 18 horasTV Magia ‘OS AMOTINADOS DO PRESÍDIO’

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Classificado e publicado no DOU de 16/09/91, portaria nº 3740, como‘Programa não recomendado para menores de 14 anos: inadequado para antesdas 21 horas’Impropriedade: violência e tensão.(...)

3. – RÁDIO E TELEVISÃO RECORD S/A3.1. – Dia 18/08/02 – domingo – 19:30 horasTela Máxima – ‘O EXTERMINADOR DO FUTURO’Classificado e publicado no DOU de 11/08/95, portaria nº 875, como‘Programa não recomendado para menores de 14 anos: inadequado para antesdas 21 horas’.Impropriedade: violência e tensão.3.2. – Dia 25/08/02 – domingo – 14 horasTela Máxima – ‘EM PONTO DE BALA’Classificado e publicado no DOU de 24/08/02, portaria nº 899, como‘Programa não recomendado para menores de 14 anos: inadequado para antesdas 21 horas’Impropriedade: suspense.

4. – RÁDIO E TELEVISÃO BANDEIRANTES LTDA.4.1. – Dia 17/08/02 – sábado – 16:00 horasSessão Especial – ‘DRAGON KID’Classificado em 10/06, publicado no DOU de 21/06/99, portaria nº 34,páginas 2/3, como ‘Programa não recomendado para menores de 14 anos:inadequado para antes das 21 horas’.Impropriedades: violência moderada, tensão e desvirtuamento de valores éticos.Tipo: sinopse.

5. – REDE GLOBO5.1. – Dia 04/08/02 – domingo – 13:30 horasTemperatura Máxima – ‘TITANIC’Classificado e publicado no DOU de 23/10/00, portaria nº 66, como‘Programa não recomendado para menores de 12 anos: inadequado para antesdas 20:00 horas’.Impropriedade: tensãoPedido de recurso tornado sem efeito em 09/09/015.2. – Dia 11/08/02 – domingo – 13:30 horas (mesmo com aadvertência feita por telefone com o Senhor Diretor deProgramação da Tv Globo/Bsb de que o filme não estava deacordo com a classificação indicativa publicada no DOU, eque estava sendo feita a chamada para exibição no dia 11/08(domingo) em desacordo com o horário, a emissora nãoatendeu e o filme ‘A MÚMIA’ foi ao ar, no horário previstopela emissora, às 13:30 horas.Temperatura Máxima – ‘MÚMIA’

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Classificado e publicado no DOU de 02/03/01, portaria nº 66, como‘Programa não recomendado para menores de 12 anos: inadequado para antesdas 20 horas’.Impropriedade: violência moderada.(...)” – 1) destacamos parcialmente; 2) a referência aos documentos é nossa

Resta claro e notório, desta feita, de simples leitura que se faça do expedienteacima transcrito, que as concessionárias-rés vêm, reiteradamente, desrespeitando não só asnormas preventivas da Lei 8.069/90, como também os atos emanados do Ministério da Justiça(vejam-se, a propósito, as advertências a elas endereçadas – DOCS. 04, 05, 06, e 07, bem como oOfício Circular/MJ/SNJ/CCLASS/Nº 04, partes integrantes desta prefacial – DOC. 08), dandoensejo, por conseguinte, por parte deste parquet federal, à presente ação.

Importa, aqui, considerar que os experts na área de psicologia infantil, em tomuníssono, apontam para o fato de que o excesso de cenas de violência e de sexo na televisãoatuam como fator decisivo nos desvios e abusos sexuais ocasionados na infância e naadolescência.

Neste diapasão, transcrevemos o seguinte trecho, extraído do parecer doconsagrado Psiquiatra Infantil Haim Grüspun (Assuntos de Família, S.P., Kairós, LivrariaEditora, 1984), mencionado no livro "Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado", pág.222/223:

"...a televisão vem exercendo, cada vez mais, marcante influência sobre aimaginação, fantasia e comportamento da criança. Suas atitudes sãofreqüentemente passíveis de modificação sob a influência de filmes, novelas,programas variados, desde que se apresentem com uma linha mais ou menosconstante de valores e padrões de comportamento: amor-sexo-agressividade-medo-terror..., suscitando reações emocionais".

Certo é que as crianças e adolescentes, como pessoas em desenvolvimento, nãopodem conceber a violência como algo banal e tampouco despertar a sexualidadeprematuramente à idade em que o fariam de forma natural.

Por outro lado, todo o arcabouço jurídico nacional, como adiante se explicitará,determina que os programas destinados ao público infanto-juvenil, bem como a toda a populaçãoem geral devem, não apenas ser educativos, como também respeitar os valores éticos e sociais dapessoa e da família.

A propósito, cumpre salientar que, ainda recentemente, o Poder Judiciário,em sede de primeira instância, apreciando lide semelhante a esta, quiçá idêntica, quefora submetida ao seu crivo por este mesmo órgão ministerial, proferiu veredicto em que

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julgou procedente o pedido deduzido, cujo mérito, pela excelência e brilhantismo deseus fundamentos, pedimos vênia para transcrever integralmente, in verbis:

“2.2 – Mérito

a) Da validade do Parecer que sugeriu a alteração daclassificação para ‘não recomendado para menores de 12anos’ e o Despacho proferido pelo Coordenador-Geral, em10.11.00

Considerando o processo de classificação do quadro ‘Banheira do Gugu’ doPrograma Domingo Legal, exibido pelo Sistema Brasileiro de Televisão –SBT, pode-se destacar as seguintes fases:

- classificação do quadro na categoria ‘livre’, em setembro/95, peloDepartamento de Classificação Indicativa do Ministério da Justiça, motivadopela seguinte afirmação da funcionária Elisabete Costa de Queiroz: ‘assiti oprograma, não tendo sido detectada qualquer restrição etária que justifiquealguma impropriedade, opino favoravelmente à liberação da classificaçãorequerida, ou seja, ‘LIVRE’ (F. 170).

- reclassificação do quadro na categoria ‘impróprio para menores de 14anos: inadequado para antes das 21 horas’, em 20.10.00, pelaCoordenação Geral de Justiça do Ministério da Justiça, motivado pelosfundamentos expostos pelo gerente de programa Reynaldo Jardim:

Recebemos a representação enviada a V. Sa. pela organização nãogovernamental TV BEM-ESTAR.

A vulnerabilidade das crianças e adolescentes fazem com que sofram os efeitosperversos pesados contra valores: erotização precoce e baixo conteúdo moral. Oquadro Banheira do Gugu, inserido no Domingo Legal do SBT é bem oexemplo dessa situação.

Tendo gravado o programa do dia 8 p.p., colocamos o tape ao dispor de V.Sa. já estamos enviando, para publicação no Diário Oficial da União, aclassificação para o referido quadro: ‘não recomendado para menores de 14anos, assim a transmissão deverá ser feita só após 21 horas’.

Trata-se de um quadro inadequado para menores, pois apresenta diversoscasais, vestidos sumariamente, esfregando-se na tentativa de pegar sabonetesdentro d’água de maneira libidinosa. A cena desperta aspectos da sexualidadeque deveriam poupar as mentes em formação de jovens e adolescentes.’ (fls.176/177).

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- reclassificação do quadro para ‘impróprio para menores de 12 anos:inadequado para antes das 20 horas’, em 10.11.00, pelaCoordenação Geral de Justiça, Classificação, Títulos e Classificação –Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça, em decorrênciainterposto pelo SBT que sustentou seu pedido no fato do programa DomingoLegal ser exibido entre 15:30 e 20:30h., não abrangendo o horário para oqual foi liberada a exibição do quadro (21 horas), nos seguintes termos:

‘Atendendo determinação superior, assistimos as gravações que foram feitas noquadro ‘BANHEIRA DO GUGU’, do programa ‘DOMINGOLEGAL’, que em grau de recurso, solicita seja revista a classificação anterior,como ‘Programa não recomendado para menores de 14 anos: inadequado paraantes das 21 horas’.

Após análise do que vimos, chegamos à conclusão que o referido quadro,poderá ser veiculado após as 20 horas, como ‘Programa não recomendado paramenores de 12 anos: inadequado para antes das 20 horas’. (fls. 185)

Antes de analisar a validade do ato administrativo, reforço e adoto oentendimento da MM. Juíza Sílvia Elena Petry, proferida na decisão queexaminou o pedido liminar, a respeito da possibilidade de apreciação pelojudiciário dos atos administrativos praticados por órgãos do poder executivo:

‘A União entendeu que o Judiciário não poderia examinar a matéria dosautos, pois estaria ocorrendo uma ingerência em atividades típicas doExecutivo, com ofensa ao princípio da separação dos poderes.

Considero que tal entendimento estaria contrariando a ampliação do controlejurisdicional da Administração, adotado pela Constituição de 1988.

Ora, no caso em ato discutido nos autos é a atual Portaria do Ministério daJustiça, publicada no Diário Oficial de 13.11.2000, que considerou o‘Quadro Banheira do Gugu’ era recomendado para menores de 12 anos,revogando a sua Portaria anterior de 23.10.2000. Esta entendera que oprograma não poderia ser assistido por menores de 14 anos (...)

Desta forma, entendo que o pedido dever ser analisado pelo Judiciário sim, poishá indício de que o ato administrativo estaria ferindo o princípio maior dalegalidade ... (fls. 133/139)

Acrescento aos argumentos acima expostos que apenas as questões atinentes àconveniência e oportunidade do ato administrativo tem sua análise vedada aoPoder Judiciário, uma vez que importaria em substituir o mérito doadministrador pelo do juiz.

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Entretanto, quanto a validade do ato administrativo, os próprios requisitosexpressamente dispostos na Constituição Federal de 1988, cuja observância édever de todo e qualquer órgão da administração pública, objetivamexatamente o controle dos atos do Poder Público: legalidade, impessoalidade,moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput).

Leciona Maria Sylvia Zanella di Pietro, que o Poder Judiciário podeexaminar os atos da Administração Pública de qualquer natureza, sejamgerais ou individuais, unilaterais ou bilaterais, vinculados ou discricionários,mas sempre sob o aspecto da legalidade e, agora, pela Constituição, tambémsob o aspecto da moralidade (arts. 5º, inciso LXXIII, e 37).

A classificação de diversões públicas e programas de rádio de televisão, competeà União Federal (art. 21, CF/88), que a exerce através do Ministério daJustiça (Secretaria Nacional de Justiça – Coordenação-Geral de Justiça,Classificação, Títulos e Qualificação). E essa competência não é uma faculdadeda Administração, mas um dever, diante das normas insertas no art. 220 daConstituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei8.069/90).

Se por um lado a Constituição Federal e o ECA vinculam a atividade doEstado, ante a obrigatoriedade da classificação dos programas televisivos; poroutro, não fixam a conduta a ser adotada pelo administrador a quem cabe,após a análise e estudo de cada programa, classificá-lo segundo a conveniênciada Administração, ou melhor, dos administrados – razão de existir doEstado, que deve visar sempre o interesse público.Assim, se o ato de classificar é vinculado, a classificação atribuída a cadaprograma é ato discricionário, mas este fato não afasta a apreciação do ato peloPoder Judiciário:

Quanto aos atos discricionários, sujeitam-se à apreciação judicial, desde quenão se invadam os aspectos reservados à apreciação subjetiva da AdministraçãoPública, conhecidos sob a denominação de ‘mérito’ (oportunidade econveniência)...Não há invasão do mérito quando o Judiciário aprecia os motivos, ou seja,os fatos que precedem a elaboração do ato; a ausência ou falsidade do motivocaracteriza ilegalidade, suscetível de invalidação pelo Poder Judiciário.

O motivo é pressuposto de fato e de direito que serve de fundamento ao atoadministrativo, e ainda que o ato seja discricionário, o motivo deve estarpresente; assim também como a motivação, que é a exposição do motivo, ouseja, a demonstração por escrito, necessária para verificar a legalidade do atopraticado.

No caso do parecer proferido pelos servidores da Coordenação Federal deJustiça, Classificação, Títulos e Qualificação, aprovado pelo Gerente de

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Programa, Reynaldo Jardim, e pelo Coordanador-Geral, Mozart Rodrigues daSilva, que fundamentou o despacho que alterou a classificação do quadro‘Banheira do Gugu’, permitindo sua exibição a partir das 20 horas, não estápresente o pressuposto de direito a embasar o ato.

A alteração da classificação baseou-se apenas no pedido de reconsideração feitopelo SBT, fundamentado no fato do Programa Domingo Legal ser exibidoapenas até as 20:30 horas, impossibilitando exibição do quadro ‘Banheira doGugu’, cuja veiculação era permitida apenas para após às 21 horas, ante aclassificação que lhe foi atribuída: não recomendada para menores de 14 anos;e na ‘promessa’ da empresa de que sua exibição seria ‘cercada de cuidados’.

Os documentos constantes nos autos apontam para um desvirtuamento dafunção administrativa em que o interesse público cedeu ao interesse particular:ao invés do Programa Domingo Legal adequar-se às exigências daadministração, alterando, por exemplo, o horário da sua programação, umavez que o quadro a ‘Banheira do Gugu’ foi anteriormente classificado parainadequado para menores de 14 anos (fls. 170/171 e 180/181), através doato devidamente motivado, a Administração se submeteu aos apelos da mídiatelevisiva, deixando de observar a Constituição Federal e o Estatuto daCriança e do Adolescente, que garantem a estes o acesso às diversões eespetáculos adequados à sua faixa etária e a exibição no horário recomendadopara o público infanto-juvenil de programas com finalidades educativas,artísticas, culturais e informativas – características distantes do quadro aBanheira do Gugu, considerado pela própria Administração com inadequadopara menores, pois apresenta diversos casais, vestidos sumariamente,esfregando-se na tentativa de pegar sabonetes dentro d’água de maneiralibidinosa (f. 171).

A promessa de exibição ‘cercada de cuidados’ é completamente evasiva, nãopossibilitando qualquer avaliação de que consistiria essa expressão em concretopara justificar a alteração do horário de exibição. Não foi proposta qualqueralteração no quadro que pudesse excluísse o resultado dos pareceresapresentados pelos profissionais especializados pela questão, bem como querecomendasse alterações das conclusões da própria Administração queentendiam como inadequada a exibição no horário anterior a 21:00 h, dondese evidencia que o ato administrativo encontra-se desviado do interesse público.

Assim, entendo estar ausente o(s) motivo(s) de direito a conferir legalidade aoparecer que alterou a classificação do quadro ‘Banheira do Gugu’, permitindosua exibição para antes das 20 horas, implicando na anulação do despachopelo Coordenador-Geral, em 10.11.2000, caracterizando a ilegalidade do ato.

c) Da inexistência de censura na classificação dos programastelevisivos

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A Constituição Federal ao mesmo tempo em que garantiu a liberdade deexpressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,independente de censura ou licença (art. 5º, IX), estabeleceu alguns princípiosquando a manifestação dessas atividades fosse realizada através do rádio etelevisão:

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e ainformação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquerrestrição, observado o disposto nesta Constituição...................................................................................................

§ 3º Compete à Lei Federal:

I – regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao poder públicoinformar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem,locais e horários em que sua apresentação se mostra inadequada;

II – estabelecer meios legais que garantam à pessoa e àfamília a possibilidade de se defenderem de programas ouprogramações de rádio e televisão que contrariem o dispostoart. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas eserviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisãoatenderão aos seguintes princípios:

I – preferências a finalidades educativas, artísticas, culturaise informativas;

II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produçãoindependente que objetive sua divulgação;

III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conformepercentuais estabelecidos em lei;

IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e dafamília.

A classificação dos programas televisivos, bem como a vedação da exibição dedeterminados programas em horários normalmente assistidos por crianças eadolescentes em plena formação física, moral e social, não configura censura,pois não é proibida a exibição do programa, mas indicado o horário adequadopara sua veiculação.

O argumento do Réu de que a classificação do quadro ‘Banheira do Gugu’como inadequado para menores de 14 anos, permitindo sua exibição apenas

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após as 21 horas, representa uma verdadeira proibição de exibir o quadro,uma vez que o Programa Domingo Legal termina por volta das 20:30 horasnão merece prosperar, ante a alteração constante pelas emissoras dos horáriosde transmissão dos programas, visando simplesmente aumentar os índices deaudiência.

A formação e bem estar das crianças e adolescentes foram priorizadas pelaConstituição Federal de 1988 (art. 227) e reforçada pela Lei 8.069/90, quedetermina:

Art. 74. O poder público, através do órgão competente, regulará as diversões eespetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias aque não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostrainadequada.

Parágrafo único. Os responsáveis pelas diversões e espetáculos públicos deverãoafixar, em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do local de exibição,informação destacada sobre a natureza do espetáculo e a faixa etáriaespecificada no certificado de classificação.

Art. 75. Toda criança ou adolescente terá acesso às diversõese espetáculos públicos classificados como adequados à suafaixa etária.Parágrafo único. As crianças menores de dez anos somente poderão ingressar epermanecer nos locais de apresentação ou exibição quando acompanhadas dospais ou responsável.

Art. 76. As emissoras de rádio e televisão somente exibirão,no horário recomendado para o público infanto-juvenil,programas com finalidades educativas, artísticas, culturais einformativas.

Parágrafo único. Nenhum espetáculo será apresentado ou anunciado sem avisode sua classificação, antes de sua transmissão, apresentação ou exibição.A observância pelas redes de televisão e rádio, que exercem suas atividadesatravés de permissão e/ou concessão do Poder Público, das normas a respeitoda classificação dos programas que visam a proteção das crianças eadolescentes, não implica em censura ou retorno à ditadura; esta sim, restariaconfigurada se fossem desrespeitadas as normas acima transcritas, impondo àpopulação infanto-juvenil uma programação inadequada para sua idade,unilateralmente pelas empresas de radiodifusão, sem qualquer controle peloEstado.

Assim, antes as normas insertas na Constituição Federal, estabelecendoprincípios a serem observados na produção e programação das emissoras detelevisão, priorizando à formação e bem estar da criança e adolescente, bem

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como à determinação de que compete à lei federal regular as diversões eespetáculos públicos – o que foi feito pela Lei 8.069/90 ( ECA), entendo quenão há que se alegar imposição de censura, mas a prevalência do interessepúblico, consoante opção política manifestada pelo legislador constituinte.

Os efeitos da presente sentença estendem-se a todo territórionacional, uma vez que atinge ato administrativo de órgãofederal em sua substância que trata de matéria de formagenérica. Não há, pois, como anular o ato administrativocircunscrito a determinada região, o que configuraria umaanomalia jurídica. Não se lhe aplica, portanto, o art. 16 da Lei7.347, de 24 de julho de 1985, com a nova redação dada pelaLei 9494/97. (destaques nossos)

III – DISPOSITIVO

Diante do exposto, julgo procedente o pedido do autor, paradeclarar a nulidade do parecer proferido pelos servidores da CoordenaçãoFederal de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação, aprovado peloGerente de Programa, Reynaldo Jardim, e pelo Coordendor-Geral, MozartRodrigues da Silva, e, consequentemente, declarar nulo o respectivo despachoproferido em 10 de novembro de 2000, que alterou a classificação do quadro‘Banheira do Gugu’ do Programa Domingo Legal, exibido pelo SistemaBrasileiro de Televisão.Em consequência da anulação do despacho que alterou a classificação para 12anos, ante a ausência de motivos que fundamentam o ato, permanece válido odespacho anterior, proferido em 23 de outubro de 2000, mantendo aclassificação para o quadro ‘Banheira do Gugu’ como ‘Programa nãorecomendado para menores de 14 anos: inadequado paraantes das 21 horas’, que deverá ser observado pela empresa-ré (SBT), casoo quadro volte a ser exibido”. (DOC. 09) – o negrito consta do original

Diante de todo o exposto, conclui-se que as Requeridas vêmfrequentemente desrespeitando a classificação exarada pelo Ministério da Justiça,infringindo, destarte, dispositivos insertos na Magna Carta, no Estatuto da Criança e doAdolescente e na Portaria nº 796 do próprio Ministério da Justiça, o que implica emagressão ao telespectador, em especial, crianças e adolescentes que assistem a filmescompletamente impróprios e inadequados para suas faixas etárias.

DO DIREITO

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A Constituição determina que o Estado deve velar pela educação e condições devida das crianças e adolescentes, concedendo-se a estes direito à proteção especial, de modo apropiciar uma educação saudável e a formar um cidadão consciente de seus deveres e direitos,respeitoso pelas leis e solidário para com os outros cidadãos.

Nossa Carta Magna, por outro lado, preza pelo fornecimento de condições paraque tanto a criança quanto o adolescente possam otimizar suas capacidades, resguardando-oscontra abusos e ofensas.

Mais especificamente no tocante ao tema em foco, o art. 221, inciso IV daConstituição Federal estabelece que a programação das emissoras de televisão atenderá aoprincípio do respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Ademais, é dever do Estado colocar crianças e adolescentes a salvo de toda formade violência, ex vi do art. 227 da Constituição Federal.

A Constituição é clara. É dever do Estado colocar crianças e adolescentes asalvo de toda forma de violência. A Constituição conferiu sentido abrangente à expressão, como que não se deve entender violência tão somente como a força física material, mas tambémcomo formas de influência em prol da violência a que fiquem submetidos crianças e adolescentes,devendo o Poder Público combatê-las.

A nível infra-constitucional, temos que o Estatuto da Criança e Adolescente, Lein. 8.069, de 13 de julho de 1990, em seu artigo 6º, prediz a regra básica da hermenêutica dasnormas relativas à criança e ao adolescente, determinando o norte que deve guiar o intérprete:

“Art. 6º. Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a queela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais ecoletivos, e a condição peculiar da criança e adolescente como pessoas emdesenvolvimento.”

Destarte, deve o intérprete estar imbuído, na interpretação de questões quedizem respeito às crianças e adolescentes, de que são eles pessoas em desenvolvimento,cabendo ao Poder Público assegurar condições para que tal desenvolvimento concretize-se de forma sadia e frutífera.

Da mesma forma, o artigo 3º determina:

“Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentaisinerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata estaLei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades efacilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral,espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.”

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Nestes termos, garante o artigo 7º do Estatuto:

“Art. 7º. A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde,mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento eo desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.”

Função do Estado é efetuar atividades que garantam o desenvolvimentoharmonioso e sadio à criança e adolescente, ou seja, dever é do Estado deles afastar instrumentosde violência e agressividade.

O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, em seu art. 71, que a criança eo adolescente têm direito a informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos e produtose serviços que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

Outrossim, o mesmo Diploma Legal estabelece, em seu art. 75, que toda criançaou adolescente terá acesso às diversões classificadas como adequadas à sua faixa etária, bemcomo, em seu art. 76, que as emissoras de televisão somente exibirão, no horário recomendadopara o público infanto-juvenil, programas com finalidades educativas, artísticas, culturais einformativas.

Na mesma linha, o art. 74 do ECA estabelece caber ao Poder Público, através doórgão competente, regular as diversões e espetáculos públicos, informando a natureza deles, asfaixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostreinadequada.

O cumprimento das obrigações em tela, constantes do Estatuto da Criançae do Adolescente, não representam qualquer embaraço à liberdade das empresas-rés,visto que a medida reclamada não importa em exclusão dos filmes da grade deprogramação das mesmas, os quais continuarão sendo livremente veiculados, no horárioadequado.

Ademais, todo o arcabouço legal em defesa do consumidor, em particular oCódigo de Defesa do Consumidor, subsume-se inteiramente ao presente caso, visto que ostelespectadores caracterizam-se, indubitavelmente, como consumidores dos serviços prestadospelas emissoras de televisão.

Saliente-se, assim, que o Código de Defesa do Consumidor estabelece, em seu art.6º, inciso I, que são direitos do consumidor a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscosprovocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ounocivos.

A Portaria 796, por sua vez, de 8 de setembro de 2000, em cumprimento àsdeterminações da CF e do ECA, estabelece os parâmetros de classificação indicativa a

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serem observados pelo Departamento de Classificação Indicativa do Ministério daJustiça (DOC. 10).

Já a Portaria 692, de 21 de novembro de 1996, estabelece a competênciaadministrativa para a classificação em comento ao Departamento de Classificação Indicativa(DOC. 11).

Abrindo um parênteses, impende, a essa altura, transcrever valiosos trechos doartigo “Ação Civil Pública e Programação da TV”, do brilhante Professor JOSÉ CARLOSBARBOSA MOREIRA (AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Coordenador ÉDIS MILARÉ, Ed. Revistados Tribunais p. 277), o qual serve de fundamento à presente causa, no que diz respeito àextensão do pedido em tela e à impossibilidade de se argumentar no sentido de que eventualatuação jurisdicional aqui caracterizaria censura aos meios de comunicação:

“Se é certo, como se mostrou acima, que encontra lugar entre os interessesdifusos o dirigido à observância, pelas emissoras de televisão, dos preceitosconstantes do art. 221 da Lei Maior, segue-se, em lógica elementar, que a açãocivil pública, disciplinada na Lei 7.347, é instrumento adequado à vindicaçãode semelhante interesse em juízo. Ela constitui, sem discussão possível, um dos“meios legais” que, de acordo com o art. 220, § 3o , n. III, devem garantir “àpessoa e à família que contrariem o disposto no art. 221”; isto é: que não dêema indispensável preeminência a “finalidades educativas, artísticas, culturais einformativas”, ou que não respeitem os “valores éticos e sociais da pessoa e dafamília” – para só nos referirmos aos princípios (que aqui mais nos instruem)dos incs. I e IV...............................................................O art. 3o da Lei 7.347, em seu art. 3o, aduz que: “A ação civil poderá terpor objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ounão fazer”. Significa isso que, procedente o pedido, tem o órgãojudicial a possibilidade de proibir a exibição do programaincompatível com a Constituição, e bem assim, em termosgerais, a de impor à emissora que adapte sua programação àsdiretrizes do art. 221. Atente-se, ao propósito, no art. 11 da Lei 7.347:“Na ação que tenha por objeto o cumprimento da prestação da atividadedevida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou decominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível,independentemente de requerimento do autor” (cf. o art. 213 e seu § 2o doEstatuto da Criança e do Adolescente).

..............................................................Ademais, por força da remissão do art. 21 do Titulo III do Código de Defesado Consumidor, incidem as disposições do respectivo art. 84, de restoincorporadas recentemente ao Código de Processo Civil: pode o juiz, porexemplo, aplicar multa à emissora, ou determinar medidascomo busca e apreensão ou impedimento da atividade

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nociva, inclusive mediante requisição de força policial (Lei8.078, art. 84, §§ 4o e 5o)...............................................................No assunto de que se trata, porém, a questão está resolvida a priori pelaConstituição mesma, que, bem ou mal, optou, e cuja opção é vinculativa para acomunidade nacional. À vista do art. 221, há um tipo de interesse difusojulgado merecedor de tutela jurídica, à qual não pode aspirar, de seu lado, ointeresse que se lhe contrapõe. Quem quiser dar pasto ao sadismo,ao voyeurismo ou à pura e simples “grossura” dispõenaturalmente da possibilidade de recorrer, dentro de certoslimites, a outros meios, que não é este o lugar próprio pararelacionar; não tem como exigir, todavia, que o satisfaçampor intermédio da telinha. Seria absurdo que o ordenamentojurídico viesse a proteger, de alguma forma, pretensão avessaaos seus próprios ditames...............................................................7. A outra objeção previsível usará como ponto de apoio a disposiçãoconstitucional que veda “toda e qualquer censura de natureza política,ideológica e artística” (art. 220, § 2o). Daí certamente quererá alguém tirarque não é lícito à autoridade alguma interferir na programação da TV, sejapara proibir tal ou qual exibição, seja – de maneira mais geral – para forçá-laa obedecer a tais ou quais parâmetros, como os fixados no art. 221.Demonstra-se com facilidade a incorreção desse entendimento.Conforme oportunamente ressaltado (supra n. 2), o § 2o do art. 220 integraamplo conjunto de disposições atinentes, de modo direto ou indireto, à atividadedos meios de comunicação social. Para bem avaliar-lhe o significado e o alcance,é mister levar em conta todos os outros textos correlatos. Há séculos se sabe que“incivile est, nisi tota lege perspecta uma particula eius posita, iudicare velrespondere”. Não é por acaso que o art. 220, caput, contém a expressaressalva “observado o disposto nesta Constituição”. Já se indicaram acimailações óbvias dessa cláusula final. A liberdade de criação artística ede difusão de idéias e conhecimentos não é absoluta;obrigatoriamente há de respeitar outras liberdades e direitostambém consagrados na Lei Maior. Aliás, nenhuma liberdade é,nem pode ser, absoluta: o ordenamento jurídico constitui, tem de constituirsempre, a expressão de um compromisso entre solicitações divergentes deproteção a valores suscetíveis de contrapor-se uns aos outros. A interpretação dequalquer lei, e com relevo particular a da Constituição, há de atender a essacontingência básica.Ora, uma vez que outras liberdades e direitos devem ser preservados, é forçosoadmitir alguma sorte de controle sobre as transmissões eventualmente capazesde lesá-los. Se os órgãos administrativos têm limitado seu âmbito de ação, noparticular, pela proibição da censura, cumpre assegurar aos titulares daquelasliberdades e direitos (e a outros legitimados por força de norma constitucionalou legal) a utilização de meios aptos à respectiva (e eficaz) defesa, toda vez quealguma liberdade ou direito protegido seja objeto de violação, atual ou iminente,

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imputável a qualquer transmissão pela TV. Semelhante possibilidade tem deconviver – e na verdade convive -, no sistema constitucional brasileiro, com avedação da censura, sem que a ninguém aproveite invocar esta vedação paracontestar aquela possibilidade. Acrescente-se que isso de aplica indiferente aosdireitos individuais e aos direitos coletivos, a que a Carta de 1988 deu, em boahora, tão grande realce”.

DA LEGITIMIDADE ATIVA

O Ministério Público, como já se deixou claro, é o órgão ao qual a ConstituiçãoFederal incumbiu a guarda dos interesses individuais e coletivos que sejam indisponíveis. Assim,tem-se como funcão institucional do Ministério Público, determinadas naquela CartaFundamental:

“Art. 129. São funcões institucionais do Ministério Público:

II- zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviçosde relevância pública aos direitos assegurados nestaConstituição, promovendo as medidas necessárias a suagarantia;

III- promover o inquérito civil e a ação civil pública, para aproteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e deoutros interesses difusos e coletivos;”

No mesmo sentido dispõem os artigos 1º e 2º da Lei Complementar 75 de 1993:

“Art. 1º O Ministério Público da União, organizado por estaLei Complementar, é instituição permanente, essencial à funçãojurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordemjurídica, do regime democrático, dos interesses sociais e dosinteresses individuais indisponíveis.

Art. 2º Incumbem ao Ministério Público as medidasnecessárias para garantir o respeito dos Poderes Públicos e dosserviços de relevância pública aos direitos assegurados pelaConstituição Federal.”

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A ação civil pública aqui proposta com o escopo de assegurar os direitos difusosrelativos aos cidadãos em geral, tem como legitimado de forma clara o Ministério Público, nostermos da Lei n. 7.347, artigo 5º:

“Art. 5º A ação principal e a cautelar poderão ser propostaspelo Ministério Público, pela União, pelos Estados eMunicípios. Poderão também ser propostas por autarquia,empresa pública, fundação, sociedade de economia mista ouassociação.”

Quanto às funções institucionais do Ministério Público, deixa claro a referida LeiComplementar:

“Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público daUnião:

V - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União edos serviços de relevância pública quanto:a) aos direitos assegurados na Constituição Federalrelativos às ações e aos serviços de saúde e à educação;”

O artigo 82, inciso I, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, por seuturno, confere legitimidade ao Ministério Público para atuar em prol da defesa dos direitosdifusos:

“Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, sãolegitimados concorrentemente:I- o Ministério Público;”

Se, por um lado, temos a atuação administrativa eficiente do Ministério daJustiça no cumprimento das obrigações que lhe foram impostas legalmente (conformedeixam claro os documentos presentemente anexados, aos quais já se fez alusão emoutras oportunidades), qual seja, a classificação dos filmes a serem exibidos pelasconcessionárias dos serviços de radiodifusão de sons e imagens, determinada pelaPortaria 796/2000, é certo que a guarda judicial dos direitos fundamentais em tela cabeao o Ministério Público Federal.

A jurisprudência consagra de forma clara a legitimidade do Ministério PúblicoFederal em tais questões:

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"EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL.MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PUBLICA. 1. OMinistério Público é instituição nacional, subordinada aos princípios deunidade, indivisibilidade e independência funcional (CF. art. 127), ecompreende o Ministério Público da União e o dos Estados(CF. art. 128). 2.A atuação dos agente do Ministério Público se dá em forma estruturalmenteorganizada e mediante repartição de atribuições. 3. E incompatível com osprincípios de regência da instituição e do sistemas de repartição de atribuições aatuação do Ministério Público Estadual, fora do seu Estado ou fora dajurisdição estadual. 4. Compete ao Ministério Público da União, e não ao doEstado, exercer as funções institucionais do órgão relativas a promoção de açõescivis públicas de competência da Justiça Federal."(AC 91.04.13275-0,TRF4, SEGUNDA TURMA, Relator JUIZ TEORI ALBINOZAVASCKI, Data da decisão 17/10/91, DJU 06/11/91, PAGINA27825)."EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL.AÇÃO CIVIL PUBLICA. MPF: LEGITIMIDADE. PROVAPERICIAL. 1- O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL estaautorizado a ajuizar ação civil publica na defesa da moralidade publica etambém para preservar a saúde publica (CF, art. 129, III). 2- Prova pericialde interesse do juízo. 3- Agravo improvido."(AG 96.01.17228-9, TRF1,QUARTA TURMA, Relator JUIZ ELIANA CALMON, Data dadecisão 14/08/96, DJU 05/09/96, PAGINA 65227).”

A legitimidade ativa do Ministério Público Federal é clara, sendo de ressaltar-seainda o disposto na Lei Complementar n. 75:

“Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público da União:III - a defesa dos seguintes bens e interesses:e) os direitos e interesses coletivos, especialmente das comunidades indígenas, dafamília, da criança, do adolescente e do idoso;”

No mesmo sentido, dispõe o artigo 6º da referida lei:

“Art. 6º Compete ao Ministério Público da União:VII - promover o inquérito civil e a ação civil pública para:a) a proteção dos direitos constitucionais;c) a proteção dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos,relativos às comunidades indígenas, à família, à criança, ao adolescente, aoidoso, às minorias étnicas e ao consumidor;”

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De outro turno, sobressai também evidente a legitimidade ativa doMinistério da Justiça, que deverá, portanto, integrar a presente lide como litisconsorteativo necessário do Ministério Público Federal.

Deveras, não se deve olvidar que a relação jurídica em cotejo permeia-se deflagrante interesse da União Federal, haja vista o poder de polícia exercido pelo Ministério daJustiça, através de seu Departamento de Classificação Indicativa, face à atividade administrativaem questão, em consequência do estatuído na Portaria nº 796, de 8 de setembro de 2000, que, emcumprimento às determinações da CF e do ECA, estabelece os parâmetros de classificaçãoindicativa a serem observados pelo referido órgão executivo. Por isso que, em caso de recusa,deverá ser o mesmo incluído no pólo passivo desta demanda.

DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

A competência da Justiça Federal é notória no caso em questão. Sustentam acompetência desta Justiça especializada, no caso, tanto a Constituição da República quanto asLeis n. 8.078/90, 8.069/90, assim como as Portarias MJ n. 692/96 e 796/2000. A lide em questãonão se resume a dano causado à criança e ao adolescente como cidadãos e consumidores. É maisampla. Tem como objeto serviço que tem sua veiculação no mercado, periculosidade enocividade submetidas a consistente análise do Ministério da Justiça, através de seuDepartamento de Classificação Indicativa.

Se, por um lado, temos a atuação administrativa eficiente do Ministério da Justiçano cumprimento das obrigações que lhe foram impostas legalmente, qual seja, a classificação dosfilmes a serem exibidos pelas concessionárias dos serviços de radiodifusão de sons e imagens,determinada pela Portaria 796/2000, a atuação jurisdicional em respeito aos direitosfundamentais em tela cabe, por conseguinte, à Justiça Federal.

A presença do Ministério da Justiça, como órgão da União federal, na demandaem apreço, seja no pólo ativo, seja no pólo passivo, justifica, desta forma, a competência dessaJustiça, como se infere dos termos de nossa Carta Política:

"Art. 109. Aos Juízes Federais compete processar e julgar:

1 - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresapública federal forem interessadas na condição de autoras, rés,assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes detrabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e a Justiça doTrabalho;"

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Nestes termos, havendo evidente interesse da União, conforme ressaltado, oprocesso e julgamento da lide em testilha estão sujeitos à competência da Justiça Federal.

Corroboram ainda para a prevalência dessa competência o Código de Proteção eDefesa do Consumidor, o qual estatui em seu artigo 93:

“Art. 93. Ressalvada a competência da JustiçaFederal, é competente para a causa a justiça local.”

Ainda, é de extrema relevância o magistério da preclara Ada Pellegrini Grinover(in Código Brasileiro de Defesa do Consumidor – Comentado pelos autores do anteprojeto –Ada Pellegrini Grinover e outros, 5ª ed., Forense Universitária, p. 679), quanto ao tema:

“o artigo 93 do CDC rege todo e qualquer processo coletivo,estendendo-se às ações em defesa de interesses difusos ecoletivos.”

A vinculação do Ministério da Justiça, por sua vez, através de seu Departamentode Classificação Indicativa, à atividade administrativa em questão, como já assinalado alhures, éconseqüência do estatuído na Portaria 796, de 8 de setembro de 2000, que, em cumprimento àsdeterminações da CF e do ECA, estabelece os parâmetros de classificação indicativa a seremobservados pelo Departamento de Classificação Indicativa do Ministério da Justiça (DOC. 10).

Assim é que, a lei atribuiu competências diretas ao Ministério da Justiça em prolda proteção da coletividade, daí advindo o interesse da União, configurando-se, portanto, acompetência da Justiça Federal para o julgamento desta ação.

DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL EM MINAS GERAIS

O presente interesse, que aponta para a necessidade de observância dosmandamentos do art. 221 da Lei Maior, qualifica-se indubitavelmente como difuso. Com efeito,em primeiro lugar, ele se caracteriza, à evidência, como “transindividual”, já que não pertence, demodo singularizado, a qualquer dos membros da comunidade, senão a um conjuntoindeterminado – e, ao menos para fins práticos, indeterminável – de seres humanos. Tais seresligam-se uns aos outros pela mera circunstância de fato de possuírem aparelhos de televisão ou,na respectiva falta, costumam valer-se do aparelho do amigo, do vizinho, do clube etc. De outrasorte, é inquestionável que o interesse em jogo é ainda indivisível, eis que, além de serinsustentável a argumentação no sentido de que cada emissora, num dado momento, transmite atodos a mesma e única imagem, também não se concebe modificação que se dirija só ao leitordestas linhas ou ao rabiscador delas.

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Uma vez tecidas essas breves, mas necessárias, considerações, insta frisar que adoutrina é assente no sentido de que a competência territorial nas ações civis públicas que têmpor objeto tais interesses difusos é regulada expressamente pelo art. 93 do CDC. E a regraexpressa da lex specialis é no sentido da competência da Capital do Estado (ou do DistritoFederal ) nas causas em que se discute dano ou perigo de dano de âmbito nacional.

Nesse sentido, inclusive, já se pronunciou o Colendo Superior Tribunal de Justiça:

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO CIVIL COLETIVA.CÓDIGO DO CONSUMIDOR, ART. 93, II. A ação civil coletivadeve ser processada e julgada no foro da capital do Estado ouno do Distrito Federal, se o dano tiver âmbito nacional ouregional; votos vencidos no sentido de que, sendo o dano de âmbito nacional,competente seria o foro do Distrito Federal. Conflito conhecido para declararcompetente o Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo.(STJ-2ª Seção, Conflito de Competência nº 17.532 – DF, rel. Min. AriPargendler, j. 29.02.2000).

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.1. Interpretando o artigo 93, inciso II, do Código de Defesado Consumidor, já se manifestou esta Corte no sentido deque não há exclusividade do foro do Distrito Federal para ojulgamento de ação civil pública de âmbito nacional. Istoporque o referido artigo ao se referir à Capital do Estado e aoDistrito Federal invoca competências territoriaisconcorrentes, devendo ser analisada a questão estando aCapital do Estado e o Distrito Federal em planos iguais, semconotação específica para o Distrito Federal.2. Conflito conhecido para declarar a competência do Primeiro Tribunal Civildo Estado de São Paulo para prosseguir no julgamento do feito. (STJ-2ªSeção, Conflito de Competência nº 17.533 – DF, rel. Min. Carlos AlbertoMenezes Direito, j. 13.09.2000) – os destaques são nossos

Os telespectadores mineiros, nesta esteira, fazem parte do universo depessoas atingidas pela veiculação inadequada de filmes pelas Demandadas, razão maisque suficiente para firmar a competência territorial da Justiça Federal em Minas Gerais,e, mais precisamente, dessa seção judiciária.

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DA NECESSÁRIA EXTENSÃO DO PEDIDO A TODO TERRITÓRIONACIONAL

A presente causa tem por alicerce todo um arcabouço legal, como salientado, quepressupõe atuação administrativa por parte do Ministério da Justiça, o que vem sendo realizadode forma exemplar. Ocorre que, o órgão administrativo referido exara a classificação repetidasvezes mencionada nesta peça com validade em todo o território nacional.

Por isso que, os efeitos da decisão de concessão do presente pedido devemalcançar todos os Estados em que ocorra a veiculação do programa em espeque, sob pena de secriar uma situação insustentável, qual seja, a declaração de que tal veiculação éinadequada para o Estado de Minas Gerais, e, ao mesmo tempo, adequada para osdemais entes federados.

Sobre esse mister, aliás, cumpre fazer menção, novamente, à brilhante decisão quejulgou procedente pedido formulado por este parquet federal, cujo mérito já se transcreveualhures:

“Os efeitos da presente sentença estendem-se a todo território nacional,uma vez que atinge ato administrativo de órgão federal em sua substância que trata dematéria de forma genérica. Não há, pois, como anular o ato administrativo circunscrito adeterminada região, o que configuraria uma anomalia jurídica. Não se lhe aplica,portanto, o art. 16 da Lei 7.347, de 24 de julho de 1985, com a nova redação dada pela Lei9494/97”.

Além do que, em situações análogas, mais especificamente em casos de produtosque se revelem nocivos, nosso ordenamento jurídico (art. 102 do Código de Defesa doConsumidor), prevê a possibilidade de ajuizamento de ações que visem compelir o Poder Públicocompetente a proibir, em todo o território nacional, a produção, divulgação, a distribuição ouvenda deste produto, razão mais que suficiente para, por analogia, aplicar a extensão pretendida.In litteris:

“Art. 102. Os legitimados a agir na forma deste Códigopoderão propor ação visando compelir o Poder Públicocompetente a proibir, em todo o território nacional, aprodução, divulgação, distribuição ou venda, ou a determinaralteração na composição, estrutura, fórmula ouacondicionamento de produto, cujo uso ou consumo se revelenocivo ou perigoso à saúde pública e à incolumidade pessoal.”

Poder-se-ia argumentar no sentido de que o art. 16, da Lei 7.347/85 (LACP), coma redação que lhe foi dada pela Lei 9494, não permitiria tal entendimento.

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No intuito de demonstrar a fragilidade de tal argumentação, transcrevemostrechos de excelente artigo, no qual a sempre imbatível Professora Ada Pellegrini Grinover,comentando a alteração em tela na LACP, demonstra a inaplicabilidade da mesma ao caso, pordiversos aspectos (in Código Brasileiro de Defesa do Consumidor – Comentado pelos autores doanteprojeto – Ada Pellegrini Grinover e outros, 5a ed., Forense universitária, p.724):

“1) Limitar a abrangência da coisa nas ações civis públicas significamultiplicar demandas, o que, de um lado contraria toda a filosofia dosprocessos coletivos, destinados justamente a resolver molecularmente os conflitosde interesses, ao invés de atomizá-los e pulverizá-los; e de outro lado, contribuipara a multiplicação de processos , a sobrecarregarem os tribunais, exigindomúltiplas respostas jurisdicionais quando uma só poderia ser suficiente. Nomomento em que o sistema brasileiro busca saídas até nos precedentesvinculantes, o menos que se pode dizer do esforço redutivo do Executivo é quevai na contramão da história.

Em segundo lugar, pecou pela incompetência. Desconhecendo a interação entrea Lei da Ação Civil Pública e o Código de Defesa do Consumidor, assimcomo muitos dos dispositivos deste, acreditou que seria suficiente modificar oart. 16 da Lei nº 7.347/85 para resolver o problema. No que se enganouredondamente. Na verdade, o acréscimo introduzido ao art. 16 da LACP éineficaz.

Senão vejamos:

Já foi exposta à sociedade a necessidade de se lerem de maneira integrada osdispositivos processuais do Código de Defesa do Consumidor e as normas daLei da Ação Civil Pública, por força do disposto no art. 90 daquele e no art.21 desta.

Desse modo, o art. 16 da LACA, na redação que lhe foi dada pela MedidaProvisória, não pode ser interpretado sem levar-se em consideração os arts. 93e 103 do CDC.

Reza o art. 16, alterado pela medida provisória:

“ Art. 16 . “ A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites dacompetência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgadoimprocedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimadopoderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de novasprovas” (grifos no texto acrescido).”

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Mas o dispositivo há de ser lido em, conjunto com os três incisos do art. 103que permanecem inalterados.

Percebe-se, pela análise conjunta dos mencionados artigos, que o art. 16 daLACP só diz respeito ao regime da coisa julgada com relação aos interessesdifusos ( e quando muito, coletivos) pois a regra permissiva do non liquet, porinsuficiência de provas, é limitada aos incis I e II do art. 103, relativos,exatamente aos interesses transindividuais supra apontados. Na verdade, aregra do art. 16 da LACP só se coaduna perfeitamente com o inc. I do art.103, que utiliza a expressão erga omnes, enquanto o inc. II se refere à coisajulgada ultra partes. Assim sendo a nova disposição adapta-seexclusivamente, em tudo e por tudo, à hipótese de interesses difusos (art. 103, I), já indicando a necessidade de operação analógica para que também o art.103, II (interesses coletivos) se entenda modificado. Mas aqui a analogia podeser aplicada, uma vez que não há diferença ente o regime da coisa julgada nosinteresses difusos e coletivos.

.........................................................

Assim, afirmar que a coisa julgada restringe aos “limites da competência doórgão prolator” nada mais indica do que a necessidade de buscar a especificaçãodos limites legais da competência: ou seja, os parâmetros do art. 93 do CDC,que regula a competência territorial nacional e regional para os processoscoletivos.

E, acresça-se, a competência territorial nacional e regional tanto no âmbito daJustiça Estadual como no da Justiça Federal.

O que se disse arreda qualquer dúvida quanto à previsão expressa dacompetência territorial, de âmbito nacional ou regional, nas ações coletivas emdefesa de interesses individuais homogêneos, o que configura mais umargumento para sustentar a total inoperância do novo art. 16 da LACP paraos objetivos que o executivo tinha em mente ao baixar o art. 3º da MedidaProvisória.

E com relação aos interesses difusos e coletivos? Já admitimos que o acréscimointroduzido pela Medida Provisória ao art. 16 da LACP se aplica aos incs.I e II do art. 103, e somente a estes. Trata-se, agora, de saber qual é o alcanceda expressão “nos limites da competência territorial do órgão prolator” notocante aos interesse difusos e coletivos.Em última análise, é preciso verificar se a regra de competência territorial,nacional ou regional, do art. 93 do CDC é exclusiva dos processos em defesade interesses individuais homogêneos, ou se também incide na tutelajurisdicional dos interesses difusos e coletivos.

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Em última análise, é preciso verificar se a regra de competência territorial,nacional ou regional, do art. 93 do CDC é exclusiva dos processos em defesade interesses individuais homogêneos, ou se também incide na tutela dosinteresses difusos e coletivos.Já afirmamos nossa posição no sentido de que o art. 93 do CDC, emborainserido no capítulo atinente às “ações coletivas em defesa de interessesindividuais homogêneos”, rege todo e qualquer processo coletivo , estendendo-seàs ações em defesa de interesses difusos e coletivos (supra, comentário nº 1 aoart. 93)~. Não há como não se utilizar, aqui, o método integrativo, destinadoao preenchimento da lacuna da lei, tanto pela interpretação extensiva(extensiva do significado da norma) como pela analogia (extensiva da intençãodo legislador).

...............................................................Mas há mais o indigitado dispositivo da Medida Provisória tentou (sem êxito)limitar a competência, mas em lugar algum aludiu ao objeto do processo. Ora,o âmbito da abrangência da coisa julgada é determinado pelo pedido, e nãopela competência. Esta nada mais é do que a relação de adequação entre oprocesso e o juiz, nenhuma influência tendo sobre o objeto do processo. Se opedido é amplo (de âmbito nacional) não poderá por intermédio de tentativasde restrições da competência que o mesmo poderá ficar limitado.Em conclusão: a) o art. 16 da LACP não se aplica à coisa julgada nas açõescoletivas em defesa de interesses individuais homogêneos); b) aplica-se à coisajulgada nas ações em defesa de interesses difusos e coletivos, mas o acréscimointroduzido pela Medida Provisória é inoperante, porquanto é a própria leiespecial que amplia os limites da competência territorial, nos processos coletivos,ao âmbito nacional ou regional; c) de qualquer modo, o que determina oâmbito de abrangência da coisa julgada é o pedido, e não a competência. Estanada mais é do que uma relação de adequação entre o processo e o juiz. Sendoo pedido amplo (erga omnes), o juiz competente o será para julgar a respeito detodo o objeto do processo; d) em conseqüência, a nova redação do dispositivo étotalmente ineficaz.

DAS PROVAS

O autor provará o alegado nesta exordial por todos os meios admitidosjuridicamente, protestando por juntada de documentos durante o processo, de acordo com asdisposições legais, e principalmente a realização de provas documentais, na fase instrutória, tantoquanto depoimentos pessoais, provas periciais, testemunhais, assim como por todos os meiosadmitidos pelo ordenamento jurídico e moralmente legítimos.

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DA TUTELA ANTECIPADA

A tutela antecipada, necessidade do pleno exercício do direito de ação, em prol dadefesa de toda e qualquer ameaça ou lesão a direito, está estatuída no artigo 273 do Código deProcesso Civil e no artigo 84, § 3º, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

Seus requisitos são a verossimilhança das alegações constantes na inicial e ofundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Visa a tutela antecipada a garantir oresultado efetivo do provimento jurisdicional.

A antecipação dos efeitos da tutela é de particular necessidade nas açõesrelativas à defesa do cidadão, as quais exigem celeridade e afetividade processuais comocondições para o resguardo de seus direitos.

A presente ação possui como objeto obrigações de não fazer, sendo de tal formaaplicável o artigo 84 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, assim como seusrespectivos parágrafos:

“Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento deobrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutelaespecífica da obrigação ou determinará providências queassegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento.§ 3º- Sendo relevante o fundamento da demanda e havendojustificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito aojuiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia,citado o réu.”

À evidência, estão plenamente configuradas na ação em cotejo os requisitos para aconcessão da tutela antecipada. De fato, questiona a mesma três pontos essenciais: a) aveiculação de filmes por emissoras de televisão em horários totalmente inadequados; b) aexposição dos telespectadores, em sua maioria, crianças e adolescentes, ao nefastomaterial exibido; c) a classificação exarada pelo órgão governamental encarregado depromover a fiscalização dos mencionados produtos não tem sido obedecida.

Resta inexorável, desta feita, que a ausência da tutela antecipada seria causa darealização de danos em uma amplitude indeterminada, lesando toda uma massa de cidadãostelespectadores. A fim de resguardar a proteção destes, constitucionalmente determinada, há quese obstar, desde já, a produção de tais danos, compelindo-se as empresas-rés a transmitir osfilmes que corriqueiramente têm sido levado ao ar aos sábados e domingos, entre 06:00 e 20:00horas, em horário apropriado, respeitando-se a classificação efetuada pelo Ministério da Justiça.

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DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

Em face da fundamentação acima expendida, diante da relevância do fundamentoda demanda e considerando os sérios prejuízos impostos às crianças e adolescentes emdecorrência da exibição irregular de filmes aos sábados e domingos, no horário compreendidoentre 06:00 e 20:00 horas, exibidos pelas Suplicadas, sendo totalmente temerário o aguardo dedecisão final para o cumprimento da obrigação que resulta cristalina das normas já explicitadas,sob pena das conseqüências advindas da demora na prestação jurisdicional serem irreparáveis,requer o Ministério Público Federal:

1. seja concedida, inaudita altera pars, a antecipação dos efeitos da tutela,compelindo-se as concessionárias-rés à obrigação de não mais transmitir (imediatamente após anotificação do teor da decisão antecipatória) qualquer filme que esteja em desacordo com aclassificação exarada pelo Ministério da Justiça, sob pena de ser imposta multa cominatória, novalor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), por filme exibido contrariamente ao horárioestabelecido por aquele órgão (considerando-se o notório poder econômico das Suplicadas eevitando-se, assim, a inocuidade da medida), a qual se reverterá ao Fundo de que trata a Lei n.7.347;

2. a concessão de liminar em relação à tutela antecipada.

DO PEDIDO

À vista do exposto nesta inicial, requer o Ministério Público Federal:

1. seja a presente causa distribuída por dependência ao processo nº2002.38.00.033.853-6, em virtude da ocorrência do fenômeno da conexão (comunhão de causa depedir), nos termos estatuídos no art. 253, I, do CPC, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº10.358, de 27/12/01;

2. a citação das Requeridas, nas pessoas de seus representantes legais, para,querendo, contestar a presente ação, no prazo legal, sob pena de revelia e confissão;

3. a intimação do Ministério da Justiça a fim de que atue ao lado doMinistério Público Federal, como litisconsorte necessário. Em caso de recusa, fica requerida,desde já, sua citação para compor o pólo passivo desta demanda;

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4. seja julgado procedente o pedido, condenando-se as concessionárias-résna obrigação de não mais transmitir qualquer filme que esteja em desacordo com a classificaçãoexarada pelo Ministério da Justiça, sob pena de ser imposta multa cominatória, no valor de R$500.000,00 (quinhentos mil reais), por filme exibido contrariamente ao horário estabelecido poraquele órgão (considerando-se o notório poder econômico das Suplicadas e evitando-se, assim, ainocuidade da medida), a qual se reverterá ao Fundo de que trata a Lei n. 7.347;

5. no caso de descumprimento da decisão, seja determinada a suspensão,por dois dias, da programação das emissoras-rés que derem causa à infringência, nostermos estatuídos no art. 254 da Lei 8.069/90, uma vez que sobejamente comprovada areincidência referida naquele artigo.

Dá-se à causa, para efeitos fiscais, o valor R$ 1.000,00 (um mil reais).

Belo Horizonte, 19 de setembro de 2002.

FERNANDO DE ALMEIDA MARTINSProcurador da República