ricardo reis
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Heterónimos de Fernando Pessoa
RICARDO REIS – O POETA DA RAZÃO
1. Aspetos biográficos
A partir da carta a Adolfo Casais Monteiro nasceu no Porto (1887); foi educado num colégio de jesuítas ; ”É latinista por educação alheia e semi-helenista por educação própria”; médico; viveu no Brasil, expatriou-se voluntariamente por ser monárquico; Manifesta interesse pela cultura Clássica, Romana (latina) e Grega (helénica); Fisicamente: ”Um pouco mais baixo, mas forte, mais seco” do que Caeiro; ” de um vago moreno”; cara rapada;
2. Perfil poético e filosofia de vida
Ricardo Reis, heterónimo de Fernando Pessoa, é o poeta clássico, da serenidade epicurista, que aceita, com calma lucidez, a relatividade e a fugacidade de todas as coisas, como se comprova em poemas como “Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio”, “Prefiro rosas, meu amor, à pátria” ou “Segue o teu destino”. Na verdade, estas composições mostram aceita a antiga crença nos deuses, enquanto disciplinadora das nossas emoções e sentimentos, mas defende, sobretudo, a busca de uma felicidade relativa alcançada pela indiferença à perturbação.
A filosofia de Ricardo Reis é a de um epicurismo triste, pois defende o prazer do momento, o “carpe diem”, como caminho da felicidade, mas sem ceder aos impulsos dos instintos. Apesar deste prazer que procura e da felicidade que deseja alcançar, considera que nunca se consegue a verdadeira calma e tranquilidade – ataraxia.
Propõe assim uma filosofia de vida de base moralista, pois pretende levar os outros a adoptar a sua filosofia de vida. Por outro lado, intelectualiza as emoções e aborda a temática da miséria da condição humana do FATUM (destino), da velhice, da irreversibilidade da morte e da efemeridade da vida. Mostra total aceitação do Fado, da ordem natural das coisas;
A sua filosofia moral segue os princípios do epicurismo e uma filosofia estóica:
- “Carpe diem” (aproveita o dia), ou seja, aproveita a vida em cada dia, como caminho da felicidade;
- Buscar a felicidade com tranquilidade (ataraxia);
- Não ceder aos impulsos dos instintos (estoicismo);
- Procurar a calma, ou pelo menos, a sua ilusão;
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- Seguir o ideal ético da apatia que permite a ausência da paixão e a liberdade (sobre esta apenas pesa o Fado).
Ricardo Reis, que adquiriu a lição do paganismo espontâneo de Caeiro, cultiva um neoclassicismo neopagão (crê nos deuses e nas presenças quase divinas que habitam todas as coisas), recorrendo à mitologia greco-latina. Aceita a brevidade, a fugacidade e a transitoriedade da vida, pois sabe que o tempo passa e tudo é efémero. Daí fazer a apologia da indiferença solene diante o poder dos deuses e do destino inelutável (Fado). Revela mesmo uma concepção dos deuses como um ideal humano, devendo nós, por isso mesmo, imitá-los. Considera que a verdadeira sabedoria de vida é viver de forma equilibrada e serena, “sem desassossegos grandes”, à imagem dos deuses olímpicos e da própria Natureza.
A filosofia de Reis rege-se pelo ideal “Carpe diem” – a sabedoria consiste em saber-se aproveitar o presente, porque se sabe que a vida é breve. Há que nos contentarmos com o que o destino nos trouxe. Há que viver com moderação, sem nos apegarmos às coisas, e por isso as paixões devem ser comedidas, para que a hora da morte não seja demasiado dolorosa. Recusa mesmo o envolvimento nas coisas do mundo e dos homens.
Em síntese, segue os ensinamentos clássicos, adotando:
1. Epicurismo
- busca da felicidade relativa
- moderação nos prazeres
- fuga à dor
- ataraxia (tranquilidade capaz de evitar a perturbação)
- prazer do momento
- Carpe Diem (caminho da felicidade, alcançada pela indiferença à perturbação)
- Não cede aos impulsos dos instintos
- calma, ou pelo menos, a sua ilusão
- ideal ético de apatia que permite a ausência da paixão e a liberdade
2. Estoicismo : considera ser possível encontrar a felicidade desde que se viva em conformidade com as leis do destino que regem o mundo, permanecendo indiferente aos males e às paixões, que são perturbações da razão
- aceitação das leis do destino (“... a vida/ passa e não fica, nada deixa e nunca regressa.”)
- indiferença face às paixões e à dor
- abdicação de lutar
- autodisciplina
3. Horacianismo
- carpe diem: vive o momento
- aurea mediocritas: a felicidade possível no sossego do campo (proximidade de Caeiro)
4. Paganismo
- crença nos deuses
- crença na civilização da Grécia
- sente-se um “estrangeiro” fora da sua
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pátria, a Grécia 5. Neoclassicismo
• Culto do Belo, como forma de superar a efemeridade dos bens e a miséria da vida
• Intelectualização das emoções
• Medo da morte
• Quase ausência de erotismo, em contraste com o seu mestre Horácio
- poesia construída com base em ideias elevada
- Odes (forma métrica por excelência)
3. CARACTERÍSTICAS ESTILÍSTICAS
A precisão verbal e o recurso à mitologia, associados aos princípios da moral e da estética epicuristas e estóicas ou à tranquila resignação ao destino, são marcas do classicismo erudito de Reis.
De facto, como Poeta clássico, privilegia a ode, o epigrama e a elegia. Prefere a frase concisa e a sintaxe clássica latina, frequentemente com a inversão da ordem lógica (hipérbatos), favorecem o ritmo das suas ideias lúcidas e disciplinadas. Procura a
submissão da expressão ao conteúdo, defendendo que a uma ideia perfeita corresponde uma expressão perfeita. Daí as particularidades:
- Estrofes regulares de verso decassílabo alternadas ou não com hexassílabo
- Verso branco
- Recurso frequente à assonância, à rima interior e à aliteração
- Predomínio da subordinação
- Uso frequente do hipérbato, com a inversão da ordem lógica a favorecer o ritmo das suas ideias disciplinadas
- Uso frequente do gerúndio e do imperativo (ou presente do conjuntivo com valor imperativo)
- Uso de latinismos (astro, ínfero, insciente...)
- Metáforas, eufemismos, comparações, imagens de tonalidade clássica
- Estilo construído com muito rigor e muito denso
- Classicismo erudito:
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A cada qual, como a 'statura, é dada
A justiça: uns faz altos
O fado, outros felizes.
Nada é prêmio: sucede o que acontece.
Nada, Lídia, devemos
Ao fado, senão tê-‐lo.