revolução mexicana, lutas regionais e de classes

Upload: julio-allievi

Post on 14-Apr-2018

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    1/18

    90

    A Revoluo Mexicana: seu alcance regional, precursores, aluta de classes e a relao com os povos originrios

    Waldir Jos Rampinelli*

    A Revoluo Mexicana, cuja

    periodizao varia de acordo com ainterpretao histrica, completa cemanos ao longo da dcada de 2010 1 .Alguns dos acontecimentosrevolucionrios mais marcantesocorrem entre 1913 e 1915, quando osexrcitos dos camponesesdesempenham um protagonismohegemnico na poltica do pas, porconta de suas vitrias nos campos de

    batalha. Por isso, de 2010 a 2020, acada ano, esto sendo comemoradosfatos significativos do processorevolucionrio cujo alcance chega aosdias de hoje.

    A Revoluo Mexicana, que marca oincio da Idade Contempornea naAmrica Latina, ainda poucoconhecida na regio. Isso se deve aoeurocentrismo que perpassa o estudodas cincias sociais em nosso continente.

    Se a Revoluo Francesa conseguiu

    abolir o sistema feudal, abrindocaminho para uma sociedade burguesa

    moderna, e criou um modelo universal(como apontou Marx) de sistema

    poltico, ou seja, a forma clssica eparadigmtica do moderno Estadodemocrtico burgus; se a RevoluoRussa logrou eliminar o regime polticoczarista e, sobretudo, superou umarealidade de servido camponesa,criando, pela primeira vez na histria dahumanidade, um sistema social nocapitalista; a Revoluo Mexicana interrompida ou trada derrotou ahegemonia da oligarquia, substituindo-a

    por uma burguesia agrria,desencadeando mudanas significativasna economia, na poltica, na diplomacia,nos campos social e cultural e nasrelaes entre Estado e Igreja. Da queo alcance da Revoluo Mexicanaultrapassa, de longe, as suas fronteirasfsicas.

    Neste trabalho, analiso quatro aspectosda Revoluo Mexicana: 1) a influnciado processo revolucionrio nos mbitoslocal, regional e mundial; 2) os

    precursores intelectuais do levantearmado; 3) a luta de classes ocorrida aolongo dos acontecimentos; e 4) aRevoluo e suas relaes com osindgenas.

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    2/18

    91

    1. As influncias da RevoluoMexicana

    1.1. No Mxico

    A Revoluo Mexicana foi a primeirarevoluo social da Amrica Latina, nosculo XX, contra o Estado oligrquicomais avanado da regio. O capitalismomexicano, com sua integrao aomoderno mercado mundial, amadureceuas foras de oposio que se levantaramem armas para derrotar umdesenvolvimento desigual, injusto einteiramente voltado para fora. Esse

    progresso capitalista se apoiava no

    crescimento sustentado daprodutividade do trabalho, ou seja,produtos excedentes que levavam acumulao de capital. A filosofia

    positivista de Augusto Comte e odarwinismo social de Herbert Spencerorientaram e dirigiram um grupo deintelectuais os chamados cientficos na aplicao de seus princpios bsicos,gerando uma oligarquia financeira,

    poltica e exportadora que comandouintegralmente o pas, principalmente a

    partir de 18882.

    O smbolo mais evidente dessedesenvolvimento capitalista, baseadona ordem e no progresso, foi, em

    primeiro lugar, a hacienda mexicana.Ela exercia um mecanismo deexplorao muito mais violento que orealizado pela fazenda no perodocolonial, j que interferia nos usos e

    costumes dos indgenas e doscamponeses para acelerar o processo deacumulao. Se nos tempos da colniaos espanhis permitiam aos nativos ocultivo de determinados produtos paraautoconsumo, inclusive utilizados nasfestas religiosas, agora, em poca deEstado oligrquico, voltado para omercado externo, essa concesso j noseria mais possvel. O capitalismo, quedestri as formas econmicas pr-capitalistas, no dispe de capitais e de

    fora econmica e no tem anecessidade da competitividade parainvestir no campo mexicano com oobjetivo de modernizar sua produo.

    Para tanto, ele se apoia em mtodos derelao de produo anteriores paramaximizar lucros e gerar riqueza.

    A sede da fazenda simboliza tanto opoder quanto a explorao. Uma vezalados em armas, os indgenas ecamponeses bradaram o grito de abajohaciendas y vivan pueblos!. Eles noesto preocupados com o poder centralna capital do pas, e sim com o local, o

    do fazendeiro, que os expropria de suasterras, que os explora no seu trabalho eque os violenta na sua cultura.

    H uma verdadeira guerra colonialpromovida pelo governo da oligarquia eda burguesia exportadora contra ascomunidades indgenas e camponesas,obrigando-as a vender sua fora detrabalho como assalariados com afinalidade de expandir o latifndio egerar lucros. A guerra contra os Yaqui3,de 1878 a 1885, por meio da qual oExrcito Federal lhes arrebatou asfrteis terras do Vale, uma das melhoresdo Estado de Sonora, para entreg-lasaos latifundirios mexicanos eestadunidenses, nada mais significouque a penetrao sangrenta e violenta docapitalismo na regio. Acar, algodoe demais produtos para a exportao

    passaram a ser cultivados nessa regio.

    Enquanto parte das famlias indgenasresistiam aos invasores, outros fugiampara zonas ridas das montanhas e maisoutros eram presos e deportados comotrabalhadores escravos para as

    plantaes de tabaco e caf no ValleNacional ou de henequn em Yucatn4.

    Guerra similar promoveu o Exrcitomexicano contra os Mayas de Yucatn,expropriando suas terras e passando-asaos fazendeiros para que cultivassem ohenequm, destinado a exportao. Uma

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    3/18

    92

    vez desalojados de seu territrio, muitosMayas foram deportados para Cuba,

    para o trabalho nas plantaesaucareiras.

    Essas expropriaes de territriosimensos, que assumiram formas de umaverdadeira guerra colonial, aconteceramtambm de maneira sistemtica contraas terras comunais dos povos indgenasnas demais regies do pas na verdade,guerras das fazendas contra os

    povoados, apoiadas ou pelo ExrcitoFederal ou pelas Guardas Rurais.Enquanto o Exrcito aumentava o seu

    contingente obrigando as pessoas a seincorporarem s suas fileiras por meiode um verdadeiro sequestro a leva ,as Guardas Rurais, por sua vez,transformavam os bandidos querondavam os campos em integrantes desua corporao, pagos pelo Estado e aservio do latifndio. Em ambos oscasos Exrcito Federal e GuardasRurais so camponeses recrutados fora para lutar, por bem ou por mal,

    contra outros camponeses que resistiamao avano do capitalismo5.

    O segundo smbolo do desenvolvimentodo capitalismo no Mxico so asferrovias, os telgrafos e os correios. Asferrovias foram construdas com oobjetivo de escoar a riqueza do pas

    para o exterior. Elas surgiram da Cidadedo Mxico para o Norte, integrando aeconomia mexicana estadunidense,

    subordinando aquela a esta. As estradasde ferro tambm foram projetadas nadireo dos portos, quer sobre o Golfo,quer sobre o Pacfico, com a claraestratgia de abastecer os mercadoseuropeus e asiticos.

    A construo de ferrovias mudou a vidalocal, acelerou a desintegrao dosantigos costumes dos camponeses,aumentou a expropriao das terras dosindgenas, proletarizou os trabalhadorese artesos e acentuou as diferenas de

    desenvolvimento entre as regies.Embora as ferrovias tivessem umobjetivo econmico escoar comrapidez a produo para os mercados

    internacionais e deste modo tornar osistema capitalista mais competitivo tinham elas uma finalidade polticatambm, qual seja, chegar o maisrapidamente possvel a qualquer partedo pas para reprimir as rebelies. Em1876, o Mxico dispunha de 666 km deferrovias, e em 1910 j contava com19.205 km6. Esse crescimento da malhaferroviria, juntamente com um sistemade comunicao, est diretamente

    ligado entrada de capitais externos,que por sua vez vo ocasionar um

    processo de urbanizao. Houve umprogresso econmico nunca antes visto,que fez do ditador Porfrio Diaz 7 ohomem necessrio, isto , o construtorde um Mxico moderno, o heri no sda paz, mas tambm do progresso8. Noentanto, a oligarquia no se havia dadoconta de que os trilhos que escoavamseus produtos trariam de volta oscamponeses armados de Zapata e Villa.

    Por fim, a industrializao e a classeoperria vo acentuar a entrada docapitalismo e de suas respectivascontradies no pas. O processo deformao do mercado mundial,

    juntamente com o ciclo de expanso docapital central, incorporou regies daAmrica Latina ao seu raio de ao,especialmente partes de alguns pases

    que ofereciam matrias-primas que lhesinteressavam para o processo deacumulao, preparando, desse modo, ocaminho para as rupturas. Os primeirosoperrios mexicanos trabalham nasminas, nas fbricas txteis e na indstriade cigarros. Porm, so os ferroviriosque adquirem maior conscincia de lutade classes, influenciados pelostrabalhadores estadunidenses assimcomo pelas ideias do liberalismo

    juarista, do humanismo cristo, do

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    4/18

    93

    socialismo utpico e do anarquismo. Asgreves organizadas por essestrabalhadores adquirem importncianacional. Mas os grandes movimentos

    de operrios, mineiros, ferrovirios ecamponeses por melhorias salarial,laboral e organizacional foramreprimidos violentamente pelosexrcitos das oligarquias latino-americanas, com o apoio do capitalismointernacional. A represso greve dostrabalhadores de Cananea (Mxico-1906), dos mineiros de Iquique(Chile-1907), dos operrios de RoBlanco (Mxico-1907), dos

    ferrovirios de So Lus Potos(Mxico- 1907) e dos camponeses

    bananeiros de Tegucigalpa (Honduras-1954) configura apenas alguns dosexemplos mais conhecidos deverdadeiros massacres cidades essasdoloridas at hoje, j que foramalisadas pelo silncio e pela morte,nas palavras de Julio Cortzar. Apesarde toda a represso, as greves doMxico no deixaram de ser osmovimentos precursores da RevoluoMexicana, sendo a de Cananeaimortalizada pelo muralista DavidAlfaro Siqueiros no trabalho intituladoDo Porfirismo Revoluo, de 1966.

    Na realidade, a paz porfiriana tentavacamuflar uma grande luta de classes quese avizinhava.

    A Revoluo Mexicana logrou destruiro velho Estado da oligarquia e da

    burguesia exportadoras que vinha daConstituio liberal de 1857,estabelecendo um novo Estado burgus,garantido pela Carta Magna de 1917.Desse modo, impediu-se que aoligarquia se transformasse diretamenteem burguesia industrial.

    1.2. Na Amrica Latina

    A Revoluo Mexicana tem alcancecontinental, de modo especial naAmrica Hispnica, por conta dafacilidade do idioma e da similitude dos

    problemas. Ela era acompanhada pelasoligarquias dos mais diversos paseslatino-americanos, preocupadas com odestino imposto a seus pares mexicanos.Os movimentos operrios tambm aseguiam de perto, comemorando osavanos e as conquistas dos exrcitoscamponeses. Rio de Janeiro, BuenosAires, Montevidu e Santiago do Chile,

    cidades com grupos mais organizados,foram os lugares onde muito se apoiouo processo revolucionrio. O zapatismofoi o movimento que mais atraiu aateno e a solidariedade dos operrios,dos grupos revolucionrios, dossindicalistas, dos anarcosindicalistas edos socialistas fora das fronteirasmexicanas. J os intelectuais ereformistas adotavam uma posio dereserva. Inclusive, as trs faces

    armadas da Revoluo Mexicana ocarrancismo, o villismo e o zapatismo tiveram seus representantes no exterior.Enquanto os carrancistas e os villistas sedirigiam mais aos prprios mexicanosno exlio e buscavam estreitar contatodiplomtico com as autoridadesestadunidenses tentando facilitar acompra de armas e a busca de apoio,

    por sua vez o zapatismo tratava deestender a influncia de seu Plano de

    Ayala a toda a Amrica Latina. Cubatornou-se o centro mais importante dasideias zapatistas no exterior. O generalJenaro Amnezcua, a partir de Havana,mantinha uma constantecorrespondncia com jornais emilitantes do Rio da Prata e dos EstadosUnidos. A Revoluo Mexicana, dessemodo, teve influncia no fim de vriosEstados Oligrquicos na Amrica Latina,sendo o da Guatemala o mais notrio

    deles. Para Enrique Semo,

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    5/18

    94

    ... a revoluo mexicana de 1910-1920 o motor fundamental dodesenvolvimento do capitalismo naAmrica Latina nas dcadas de1920 e 1930; ou seja, que aimportncia e a influncia darevoluo mexicana vo muito almdas fronteiras de nosso pas, e influiradicalmente em todas as mudanasque se produzem na Amrica Latinadurantes esses anos, nodesenvolvimento do capitalismo9.

    Alguns chegaram a pensar que aRevoluo Mexicana poderia

    proporcionar Amrica Latina o padro

    e o mtodo da revoluo socialista;outros como Jos Carlos Maritegui se equivocaram em suas anlises aocomparar Obregn a Zapata e Madero.

    1.3. No Mundo

    A Revoluo Mexicana chamou aateno das principais potnciasmundiais da poca pelas dimenses do

    processo revolucionrio e por ocorrerem um pas subdesenvolvido ao lado deum desenvolvido. As pressesinternacionais sobre os programas e as

    polticas da Revoluo Mexicana porparte da Alemanha, da Inglaterra, daFrana e do Japo tinham comofinalidade disputar com os EstadosUnidos a hegemonia sobre a AmricaLatina. Por isso, nada mais oportuno ehistrico que se utilizar desse evento

    para auferir vantagens nas relaes

    internacionais. Por outro lado, o Mxicoera um pas rico, principalmente emcommodities, destacando-se os mineraise o petrleo.

    As disputas e as rivalidades entre aspotncias mundiais j se davam noMxico mesmo antes do incio daRevoluo. A ditadura de Porfrio Diaz,querendo sair do predomnio dosinvestimentos estadunidenses, procuraacercar-se dos europeus, convidando-osa aplicar seus capitais no pas. Essa

    atitude irrita profundamente o governode Washington que, baseado em seudestino manifesto, considerava oMxico como territrio de sua esfera de

    influncia.A elite governante mexicana tomou aatitude de se distanciar dosinvestimentos dos Estados Unidos segundo Friedrich Katz pelosseguintes motivos: a) porque tinha umenvolvimento maior com os europeusque com os estadunidenses; b) porqueas companhias europeias, menossolidamente estabelecidas, costumavam

    aceitar mais facilmente as propostas doscientficos de participao comoscios das mesmas; c) porque o

    predomnio de Washington eraincompatvel com o conceito dedesenvolvimento econmico que tinhamos prprios cientficos10.

    2. Os precursores da RevoluoMexicana

    Os intelectuais tiveram um papelfundamental como precursores daRevoluo Mexicana. O clube de debate

    El Ateneo de la Juventud, fundado porJos Vasconcelos, Isidro Fabela eAlfonso Reyes, tinha por finalidadesuperar o cientificismo, o dogmatismo eo positivismo. Foi na cidade de SanLuis Potosi, em 1900, que um pequenogrupo de intelectuais comeou a seorganizar em torno das ideias do

    liberalismo do sculo XIX: democracia,anticlericalismo e livre empresa. CamiloArriaga tornou-se o grande lder dessemovimento contra Porfrio Diaz.

    A burguesia mexicana passou adefender o nacionalismo econmico.Para um astuto burgus mexicano quetivesse um pouco de nacionalismo e

    bom tino para os negcios seriadesejvel uma mudana poltica eeconmica que aumentasse seu peso nogoverno para desafiar o grande poder

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    6/18

    95

    dos monoplios estrangeiros, abrindo,desse modo, um mercado interno doqual participassem os camponeses comsua economia de consumo.

    Intelectuais de distintos extratos sociaisjuntaram-se em uma luta contra aditadura porfirista. Os intelectuais daclasse alta como Francisco I. Maderoe Camilo Arriaga representam um

    pequeno nmero de famliasoligrquicas de geraes mdias e

    jovens. Afastados dos problemas dasmassas, esses intelectuais eram

    profissionais e homens de negcios que

    refletiam a crise econmica e as tensessociais que afetavam a sua classe,buscando, ento, novas alianaspolticas para introduzir a democracialiberal no pas. Por sua vez, osintelectuais de classe mdia e baixa como Antonio Diaz Soto y Gama, JuanSarabia, Librado Rivera e RicardoFlores Magn esto maisfamiliarizados com os problemas degrande parte da populao e mais

    influenciados pelas obras anarquistas esocialistas, passando a defender aformao de alianas com os operrios eos camponeses.

    Ricardo Flores Magn o grandeintelectual precursor da RevoluoMexicana. O magonismo tornou-se aexpresso ideolgica e poltica de umaexperincia histrica, isto , a primeiratentativa frustrada dos trabalhadores

    mexicanos de abrirem um processo paraa sua total emancipao 11 . JosRevueltas chegou a dizer que asatividades revolucionrias de FloresMagn e dos magonistas so o ponto dearrancada no qual se deve por osantecedentes contemporneos de umaconscincia socialista prpria, nacional,da classe operria mexicana12.

    O jornal Regeneracin, editado porFlores Magn inicialmente no Mxico e

    posteriormente nos Estados Unidos,

    conta com o apoio dos pequenoscomerciantes instalados ao longo dafronteira e dos trabalhadoresferrovirios andantes pelos povoados e

    cidades. A circulao do peridicopassou de onze para vinte milexemplares, em setembro de 1905, etrinta mil em 1906, exercendo umainfluncia nacional ao longo de dezoitoanos13.

    Regeneracin diz Armando Bartra algo mais que um veculo paradifundir o pensamento magonista.

    Regeneracin o magonismo. O

    jornal expressa toda a fora e, aomesmo tempo, toda a debilidade doPartido Liberal Mexicano. Ele se tornaum educador, um agitador e umorganizador coletivo. Constitui-se nacoluna vertebral de uma organizao

    poltica e no condutor de ummovimento de massas. Chegaclandestinamente aos mais diversosrinces do pas, ajudando a disseminaros ncleos secretos de carter partidrio

    e, ao redor desses, as clulas ou osclubes que vo formandoorganizaes amplas com um carter de

    participao de massas14.

    2.1 O Partido Liberal Mexicano

    O programa do Partido LiberalMexicano, de 1 de julho de 1906, foi o

    primeiro documento que apresentou,pblica e nacionalmente, as principais

    ideias da Revoluo Mexicana, comotambm se tornou o nico conjunto deprojetos que avanava mais que aprpria Constituio de 1917. Foi anica corrente que formulou, em termos

    polticos explcitos, uma disjuntiva noburguesa para o avano do processorevolucionrio. A exposio dos 52

    pontos do Partido Liberal Mexicano fazum chamado a todo o povo sobre algunsitens importantes da vida nacional, tais

    como:

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    7/18

    96

    a) ponto 4: O exrcito futuro deve serde cidados, no de obrigados, e, paraque a nao encontre soldadosvoluntrios que a sirvam, dever

    oferecer-lhes um salrio decente edever suprimir do cdigo militar estadureza, este rigor brutal que estrangulae ofende a dignidade humana;

    b) pontos 10-14: em que defendida anecessidade de uma instruo universal,livre e laica 15 , com melhores salrios

    para os professores primrios;

    c) pontos 21-33: Capital e Trabalho:oito horas/trabalho, salrio mnimo,

    proibio do trabalho para menores de14 anos, condies de trabalho salubre ehiginico, indenizao

    por acidente de trabalho,descanso dominical,salrios em espcie,abolio das tiendas deraya 16 e cancelamentodas dvidas;

    d) defesa da soberania do

    Mxico diante dointervencionismo dosEstados Unidos; adoode uma posio anti-imperialista eanticapitalista;

    e) defesa da reformaagrria, afirmando-se queo crescimento do mercado interno seria

    bom para os homens de negcio;

    e) pontos 34-35, 50: afirmava que asterras no cultivadas, as terras dogoverno, as terras roubadas pelos

    porfiristas e os ejidos que tinham sidodestrudos ou divididos podiam

    proporcionar terra suficiente para todosos camponeses e que os bancosagrcolas podiam proteger os interessesdos camponeses pobres; pregava areforma agrria apenas sobre as terras

    improdutivas17.

    O Partido Liberal Mexicano exerceuinfluncia significativa nas grandesgreves do pas, como a de Cananea(1906), a dos operrios de Rio Blanco

    (1907) e a dos ferrovirios de San LuisPotosi (1907). Igualmente teve umpapel importante na formao de umaconscincia anti-imperialista, j quealguns proprietrios de minas e fbricasnas quais ocorreram os tais movimentos

    paredistas eram estadunidenses. Almdisso, os trabalhadores dos EstadosUnidos recebiam salrios diferenciadosem relao aos mexicanos pela mesmatarefa realizada e o Exrcito do Norte,

    juntamente com o mexicano, ajudou asufocar a greve de Cananea. Da a

    consigna do PartidoLiberal Mexicano delevante armado hasta eltriunfo de la revolucin.Prometia realizar ecumprir as reformastrabalhistas j no decursodo processorevolucionrio, semesperar as decises de umfuturo poder legislativo.

    2.2. As duas grandessadas para a queda dePorfrio Diaz

    Duas grandes sadaspassaram a ser discutidas para golpearde vez o porfiriato. Enquanto o PartidoLiberal Mexicano, juntamente commuitos integrantes das classes mdias e

    baixas, defendiam uma revoluoarmada com fins socioeconmicos, porsua vez, Francisco I. Madero e osmembros insatisfeitos das classesmdias e altas pregavam uma mudanano violenta, com fins principalmente

    polticos. As figuras mais importantesdo Partido Liberal Mexicano haviamcomeado sua luta contra Porfrio Diaz,entre 1900 e 1903, nos Clubes Liberais,

    ao passo que Madero e seus seguidores

    Porfrio Diaz (1830-1915)

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    8/18

    97

    iniciaram a sua entre 1909 e 1910 nosClubes Antireeleccionistas 18 . Arepresso a esses clubes acabouensinando ao prprio Madero e a seus

    seguidores que a revoluo armada seriao nico caminho para uma verdadeiramudana no pas. Em 1910, os

    propsitos da Revoluo Mexicana noestavam ainda bem definidos a no sera queda do ditador Diaz pelos

    principais grupos revolucionrios quetinham poucos objetivos em comum emuitas contradies no seu conjunto.

    O Partido Liberal

    Mexicano buscavauma revoluoarmada eanticapitalista com osoperrios e oscamponeses, tentandoatingir a meta de umarevoluo social(Terra e Liberdade);

    j a antirreeleio comMadero e elementos

    das classes altas emdias buscavam ainstalao de umademocracia polticacom o lema Sufrgioefetivo, no reeleio.

    A revoluo maderistafoi um movimentoreformista que tentava

    preservar e reforar osistema de livreempresa. Os seguidores de Madero noeram revolucionrios burgueses nosentido histrico de estruturar umaeconomia capitalista moderna sobre umsistema scio econmico-feudalanacrnico. Eles buscavam, antes detudo, liberar, estimular e aumentar acapacidade produtiva de um sistemacapitalista j estabelecido no Mxico,

    porm obstrudo pelo monoplio e pelo

    recesso porfiriano, como tambm

    ameaado pelos de abajo. Para Zapata,a revoluo era camponesa contra olatifndio19.

    3. A Revoluo Mexicana e a luta declasses

    3.1. O zapatismo

    O Exrcito Libertador do Sul,comandado por Emiliano Zapata, formado essencialmente porcamponeses, no dispondo os mesmosde uma viso nacional da revoluo, esim to somente local. Eles so

    apegados as suasterras e as suastradies, entrando naluta em maro de1911 sob o lema deTerra e Liberdade.Tornam-se o centronacional de resistncia transao burguesade Ciudad Juarez 20 ,adotando a estratgiade guerra de

    guerrilhas. O sucessodesse grupo armado sedeve ao apoio doscamponeses e clareza de seu

    programaconsubstanciado noPlano de Ayala.

    O Plano de Ayala aata de nascimento dozapatismo. Tornou-se

    um smbolo venerado, a exemplo daSagrada Escritura, tendo como lemaLiberdade, Justia e Lei. Foi a

    primeira bandeira do experimento maisnotvel e mais discutido de reformaagrria na Amrica Latina. A principalcaracterstica do Plano sua recorrncia histria do pas, mais especificamente Constituio de 1857 com suasfamosas Leis da Reforma21, exigindo a

    devoluo das terras expropriadas dos

    Emiliano Zapata (1879-1919)

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    9/18

    98

    indgenas e dos camponeses. O Planono faz referncia paz, aoprogresso e democracia, metasrecorrentes dos demais projetos e

    preocupao eminente dos homensurbanizados daquela poca. Afinalidade reconquistar as liberdadesde um povo republicano e dar lugar prosperidade e o bem-estar22.

    O Plano de Ayala, do artigo 1 ao 3,trata das questes polticas subsequentes ruptura com Madero e da alianatemporria que os zapatistas tinhamestabelecido com a rebelio encabeada

    por Pascoal Orozco23

    , no Norte do pas.J do artigo 9 ao 15, so abordadas asaes a serem postas em prtica, umavez derrotado o regime traidor dosmaderistas com relao eleio para

    presidente.

    Por que o Plano de Ayala revolucionrio? Porque adota asseguintes medidas: a) exige a restituioimediata das terras e a criao detribunais revolucionrios; b) obriga osfazendeiros e latifundirios, e no oscamponeses, a esclarecer e justificar alegalidade da propriedade das terras; c)

    pe o bem-estar coletivo acima doindividual, prefigurando a funo socialda propriedade; d) estabelece o direitode defesa, com armas, das conquistasrealizadas. Com base nesses postulados,

    pode-se afirmar que os zapatistas davamao processo revolucionrio um carter

    anticapitalista. No entanto, o Plano deAyala no apresentava soluo para oproblema do poder em si, j que nopropunha uma forma a ser adotada pelonovo Estado emanado da revoluo.

    Os limites do zapatismo, segundo Gilly,estavam na distribuio das terras a

    partir dos ttulos da poca vice-reinal(artigo 6). Na verdade, o Plano de Ayalarompe, pela via armada, com a estruturado latifndio, mas no se livratotalmente da ideologia pequeno-

    burguesa do ttulo da terra. Ele foiaplicado na regio de Morelos, que em1910, era a terceira regio aucareira domundo com engenhos inovadores para

    processar a cana, utilizando-se demodernas traes a vapor. O Planoavanava ao grito de Abaixo asfazendas, vivam os povoados.

    Zapata e Villa, ao se encontrarem pelaprimeira vez nos arredores da Cidade doMxico, em 4 de dezembro de 1914,lanam o Pacto de Xochimilco, acordoverbal que define as principais linhas daluta armada. Ato seguido, tomam a

    capital do pas, momento simblico dachegada ao poder dos exrcitoscamponeses.

    A capital ocupada pelos exrcitoscamponeses a sntese do queacontece no pas. A guerracamponesa chegou a seu pontomais alto. A velha oligarquia

    perdeu o poder para sempre,juntamente com boa parte de seusbens, fato esse que ainda no haviaacontecido, e no ocorreria to cedonos pases da Amrica Latina. Osrepresentantes da nova burguesiaainda no haviam podido manter o

    poder em suas mos. No apenasno tinham logrado, como tambmtiveram que ceder ao embate dasarmas camponesas, abandonando ocentro poltico do pas, a capital, e osmbolo material desse poder, o

    palcio nacional, ocupado pelastropas zapatistas24.

    No entanto, o zapatismo e o villismono dispunham de um programanacional que inclusse as demais classes,alm dos camponeses. Os operrios nos foram atrados por VenustianoCarranza (ver no quadro cronolgico,em anexo I, a doutrina carrancista)como tambm formaram os famososBatalhes Vermelhos que lutaram aolado da burguesia agrria contra afaco camponesa. Para Cockcroft, essafoi a maior tragdia da Revoluo

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    10/18

    99

    Mexicana. Zapata eVilla acabaramentregando o poderaos representantes da

    pequena burguesia,que por sua vez opassou aos da grandeburguesia. Esta,acabou traindo acausa camponesa.

    3.2 O villismo

    O carter do exrcitodaDiviso do Norte

    de pequenos

    proprietrios,trabalhadores temporrios e agrcolas,mineiros, lenhadores ou braais nosEstados Unidos. Enquanto oscomponentes da Diviso do Norte eramnmades que iam de um trabalho aoutro, os do Exrcito Libertador do Sultinham um forte apego as suas terras.

    Francisco Villa conhecido comoPancho controla todo o centro do pas,

    sendo um grande estrategista. Exemplodisso foi a tomada de Ciudad Jurez,conhecida como o trem de Tria. Astropas villistas, depois de assaltaremuma locomotiva carregada de carvo,obrigaram o telegrafista a se reportar cidade de origem dizendo que osrevolucionrios haviam bloqueado ocaminho. O maquinista, ento, recebeuordens de pr imediatamente a mquinaem marcha r, no sabendo a estao

    central que os vages de carga jtransportavam o exrcito de Pancho. Emcada povoado que passava, otelegrafista local era forado a dizer aCiudad Jurez por que estava alocomotiva regressando. Uma vez

    passada a mensagem, o telgrafo eracortado. Assim, o trem de Tria meteuno corao da cidade o exrcitocompleto da Diviso do Norte. Maistarde Villa diria que na Ciudad Jurezele no teria entrado de trem, mas que

    ela lhe havia cado docu. Jurez tornou-sea Meca do villismo

    A Diviso do Norte,com seu auge em1914, a expressomxima de combatedas massascamponesas, sendoum exrcito de gentedo campo desde ocomando geral,

    passando pelosintermedirios e

    chegando aos menosgraduados. A vitria significa terra paratodos e o fim dos ricos. No entanto, ovillismo no dispunha de um programaacabado, mas sim da grande figura dolder.

    Paco Igncio Taibo II mostra as vriasetapas pelas quais passou Villa ao longodo processo revolucionrio 25 . Na

    primeira (1911-1912), Pancho se alia aFrancisco I. Madero, filho de umoligarca do norte, que levanta o pascontra o ditador Porfrio Diaz sob olema sufrgio efetivo, no reeleio.Villa no apenas ajuda a mobilizar oestado de Chihuahua, mas tambmconvence o lder sobre a radicalidade daRevoluo. Pois se assim, disseMadero, vamos fazer. Mais tarde,quando Madero j estava na presidnciae Villa na priso, este no deixou de ser

    fiel quele, inclusive chamando-lhe aateno para o golpe de Estado que seavizinhava26.

    Assassinado Madero, o prfugo Villacomea a sua segunda etapa derevolucionrio (1913-1915), a maisimportante, por sua definio poltica,ideolgica e social. Ele no apenas sealia a lvaro Obregon, vindo da

    burguesia agrria, e a VenustianoCarranza, rico fazendeiro do norte, paraderrotar o novo ditador Victoriano

    Francisco Villa (1878-1923)

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    11/18

    100

    Huerta, reconhecido por ambos como ogrande estrategista do exrcito irregularda Diviso do Norte (para entender asmudanas constantes de presidentes no

    pas, veja quadro cronolgico, em anexoI). Villa busca apoio na populao dopas, prometendo uma mudana em suaestrutura poltica, agrria e social. Aexpropriao das grandes fazendas, acobrana de impostos forados dascompanhias mineiras estadunidenses e a

    presso sobre os banqueiros visam aofinanciamento de seu exrcito, mastambm distribuio de bens e vveresa toda uma populao faminta. Para

    Villa, diz Paco Ignacio, chegada ahora dos pobres, que agora a revolta terque enfrentar, sem titubeios, os grandesfazendeiros e os militares27.

    O decreto de 12 de dezembro de 1913,expropriando a oligarquia nortenha,apresenta as seguintes justificativas: porsua cumplicidade nos compls, golpesde Estado e quarteladas; por seu carter

    de defraudadores do errio pblico edominadores da sociedade durante 50anos atravs do engano e da fora, chegada a hora de prestar contas e,como a posse de seus bens somenteserviu para comprar traidores eassassinar presidentes, decidimoscortar o mal pela raiz28. Villa, ento,lista as famlias e seus bens a seremtomados. Mais tarde seria decidido odestino das expropriaes. De imediato,

    uma parte da terra seria doada para asvivas e rfos da Revoluo; outra,para os combatentes; e uma terceiraseria devolvida aos legtimos

    proprietrios, j que a mesma foraroubada pelos latifundirios. Isso era aRevoluo! Na medida em que elaavana, Villa vai deixando atrs de sigrandes conquistas sociais, como aconstruo de escolas e hospitais, ocontrole dos preos de alimentos e as

    penses para as vivas e os rfos.

    Quando a Revoluo de ativa setransforma em passiva, pactuada poruma nova burguesia agrriaconsubstanciada na aliana Obregn-

    Carranza com o apoio da classe operria,Villa entra em sua terceira etapa (1916-1920) com a guerra de guerrilha,

    passando a ser um fora da lei,perseguido pelos poderes constitudosmexicanos e pelo governo deWashington. O Centauro do Norte,ento, radicaliza ainda mais suas aes

    para no perder o apoio social doscamponeses. Conhecido como o novoRobin Hood, no apenas tira dos ricos

    para dar aos pobres, mas tambmprocura mobiliz-los. Em 1918, naregio de Chihuahua, tem-se umverdadeiro poder dual: o do governadore o de Pancho Villa. As tropas doexrcito mexicano perseguiam osrebeldes e os camponeses que osapoiavam. Grande parte deles foi levada fora para as cidades grandes, vindo amorrer de fome, minando assim as

    bases de apoio a Villa.

    3.2. Villa e o bom governo

    Pancho Villa, perseguido pelo governomexicano e boicotado peloestadunidense que no mais lhe permitea venda de armas, aposta na conquistado apoio popular. Quando prendecamponeses que lutam ao lado dogoverno, poupa-lhes a vida fazendo-lhesver que, por seremgente de abajo, esto

    do lado errado; outras vezes, fuzila-os,no admitindo que um peo de fazendalutasse pelo seu patro. O general Felipengeles29, seu grande amigo, reunia as

    pessoas nos povoados falando-lhes deluta de classe, de sua condio deexplorados, do capitalismo, danecessidade de humanizar a guerra erespeitar a vida dos prisioneiros.

    Villa pensava em um pas onde todosvivessem bem. Quando governouChihuahua adotou como lema fechar

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    12/18

    101

    cantinas e abrir escolas. O historiadorFriedrich Katz30 chegou a cham-lo degovernador revolucionrio, j que emapenas um ms abrira cinquenta escolas

    em uma cidade com apenas 40 milhabitantes. Embora no tivesse umplano de reforma agrria como odefendido por Zapata, pensava nascolnias militares, onde os camponesesvivessem juntos, trabalhassem juntos edesfrutassem juntos de uma vida melhor.O socialismo para Villa no consistiaem uma sociedade sem classe, mas emuma maior igualdade entre as pessoas. justo que todos aspiremos a ser

    mais, dizia ele, porm, tambm quetodos possamos valer pelos nossosfeitos31.

    No calor das batalhas de Celaya32, emmaio de 1915, o governo villista emitirvrios decretos, assinados por Pancho eEscudero, constituindo um programasocial avanado. Obrigam, por exemplo,que, em todas as minas do pas sob ocontrole villista, seja pago um salrio

    em prata, ouro ou dlar. Estabelece-se ocmbio oficial do dlar em relao ao

    peso em dois por um; probem-se asfamosas tiendas de raya; decreta-se osalrio mnimo de um peso dirio edefendem-se a liberdade de culto e ofim da perseguio religiosa. Villa, noentanto, detestava o clero, pois foram osgrandes apoiadores ideolgicos daditadura porfiriana. Quando tomava ascidades no matava os padres, mas os

    expulsava. Depois da tomada deZacatecas prendeu um grande nmerode padres professores lasallistas, tendo ocnsul francs intercedido por eles.Alguns dias depois recebeu o diplomataum oficial villista muito educado quelhe comunicava que os curas poderiamcontinuar a trabalhar na cidade,conquanto que, em vez de aulas dereligio, passassem a ensinar as Leis daReforma e trocassem as missas por atoscvicos. Diante da negativa dos padres,

    Villa cobrou um resgate de 100 milpesos, metendo-os em um carro decarga ferroviria e enviando-os aosEstados Unidos. O escritor Gregrio

    Lpez y Fuentes33

    descreve em detalhesa visita de um curita a uma fazenda doEstado de Morelos, por volta de 1910.Sem dvida, a aliana entre o dono dasalmas e o dono das terras mantinha umaditadura quase que perfeita.

    Quando Villa assina um acordo de pazcom o governo em 28 de julho de 1920,que alguns chamam de rendio, recebea fazenda de Canutillo para morar,

    transformando-a em uma casa de todosos villistas. Alm de uma escola diurnacom 400 alunos, havia uma noturna

    para alfabetizar os adultos. Os salriosdos trabalhadores eram os mais altos daregio, participando muitos deles doslucros das vendas dos produtos.

    O Manifesto de San Andrs Villa (1916)foi, possivelmente, o documento maisgenuinamente de Pancho. Sem a ajuda

    de intelectuais, tendo apenas umsecretrio a sua disposio, tratou de

    poltica interna e externa. Defendeeleies livres no Mxico com pena demorte para os que fraudarem o voto do

    povo; que os caudilhos e ele includo no podero se candidatar, poisdispem de grupos armados, tornandoilegtimas as eleies; que deputados esenadores que usarem de seus cargos

    para fazer negcios duvidosos que

    redundem em proveito prprio comprejuzo da coletividade sero passadospelas armas; e prope a volta das Leisda Reforma do juarismo, uma bandeirados intelectuais villistas. No entanto,o mais importante do manifesto o seu

    programa anti-imperialista: abolio dadvida pblica e proibio aosestrangeiros de serem proprietrios deterras no Mxico; nacionalizao dasminas estrangeiras e das ferrovias, e ofechamento da fronteira com os Estados

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    13/18

    102

    Unidos para promover a indstrianacional; supresso do telgrafo a 18lguas da fronteira. Chega a falar, maistarde, em uma entrevista para o New

    York World, sobre a abertura de umfosso entre os dois pases, to largo eprofundo que nenhum americanopoderia jamais vir a roubar terramexicana, ouro ou petrleo34.

    O anti-imperialismo de Villa se tornoupblico quando Washington reconheceo governo de Carranza, probe a vendade armas Diviso do Norte (at entoas empresas estadunidenses haviam

    auferido grandes lucros com o comrciode armas e alimentos) e permite a

    passagem de tropas mexicanas porterritrio estadunidense para combateras de Villa na cidade fronteiria degua Prieta. Da a famosa invaso aColumbus, povoado pertencente aosEstados Unidos, mas prximo fronteira mexicana, motivando a entradade uma expedio punitiva de tropas doexrcito do Norte, as quais fortaleceram

    ainda mais a guerra de guerrilhas deVilla, agora no mais apenas contra oditador Carranza, mas tambm contra asforas do invasor general John J.Pershing. Villa tornara-se o inimigocomum dos dominadores estrangeiros edo governo constitucionalista, mas, casoo exrcito de ocupao no sasse doMxico, Pancho poderia converter-seem heri nacional em vida. Foi a nicavez na histria que um chefe deguerrilha, com seus grupos armados,invadiu os Estados Unidos.

    Villa calculava ter participado deaproximadamente 1.300 batalhas,algumas delas famosas, como aconquista de Ciudad Juarez e deZacatecas35. Ramn Puente, um de seuscolaboradores, assim definiu Villa:Coragem at a temeridade;desprendimento at a gastana; dio ata cegueira; raiva at o crime; amor at a

    ternura; crueldade at a barbrie; tudoisso Villa em um dia, em ummomento, em todos os momentos davida36. Paco Ignacio diz que Villa era

    o produto das foras mais obscuras dasociedade porfiriana, porm nodaquelas superficiais, mas destas mais

    profundas que faziam de um camponspobre um condenado a uma vida depresdio, carne de troca nas grandesfazendas, carne de canho do exrcito,operrio faminto das novas minas e dasindstrias37.

    Enquanto as esttuas de Zapata

    proliferaram pelo sul pobre do Mxico,as de Villa sofreram todo tipo deresistncia no norte desenvolvido.Quando se construiu uma em sua terranatal, Chihuahua (1956), o escultor, porordem do governador, mudou o bigodee a testa. Na inaugurao, as autoridadesno s omitiram o seu nome nosdiscursos, como tambm na placa de

    bronze. Falou-se apenas do combatenteda Diviso do Norte, cabendo ao povo

    que assistia gritar: Viva Villa, cabrones!

    Na Cidade do Mxico, s em 1969apareceu o primeiro monumento aoCentauro do Norte. Em setembro domesmo ano houve uma longa discussona Cmara dos Deputados, com amplarepercusso na imprensa, sobre se onome de Francisco Villa poderia serescrito com letras de ouro naquelerecinto, tal como dezenas de outros

    lderes e heris. Somente no ms denovembro se chegou permisso,passando a histria oficial a aceitar maisum mito popular.

    4. A Revoluo Mexicana e o MxicoProfundo

    A Revoluo Mexicana pretendeutransformar o Mxico em umasociedade culturalmente homognea. Aopo foi a mestiagem. Aqueles que seassumem como mestios no se

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    14/18

    103

    aceitam como criollos e muito menoscomo indios, pretendendo ser algonovo cujos contedos nunca se definemsatisfatoriamente.

    Por que a Revoluo Mexicana seafirmou como um projeto mestio? Asmassas combatentes so, em sua grandemaioria, camponeses-ndios,desindianizados e assimilados. Osmandos, no entanto, tanto no campomilitar como no ideolgico, soocupados por pessoas vindas das classesmdias urbanas que haviam sidomarginalizadas pelo porfirismo. A

    exceo foi o movimento zapatista.Da etapa armada da RevoluoMexicana participam o MxicoProfundo 38 e o Mxico Imaginrio 39 ,cada um por suas prprias razes e na

    busca de seus prprios objetivos. ARevoluo reconhece a existncia dondio e do Mxico Profundo, sendo queambos possuem valores positivos eresgatveis. A Revoluo se prope,ento, em redimir o ndio, isto ,

    incorpor-lo cultura nacional e pormeio dela civilizao universal. Poroutra parte, a Revoluo apropria-se detodos aqueles smbolos do Mxico

    profundo que lhe permitam construiruma imagem do Mxico mestio.

    Para tanto, defende a concesso debenefcios aos ndios e pobres para queos mesmos se integrem civilizao eacontea a desindiniazao, tais como:

    a) que as terras usurpadas ao longo daColnia sejam devolvidas para que aagricultura tradicional se modernize eseja posta a servio do desenvolvimentocapitalista do pas;

    b) que se levem escolas ao campo e scomunidades indgenas, no para queapenas se estimule e se sistematize oconhecimento de sua prpria cultura,mas tambm para aprender elementos

    da cultura dominante;

    c) que se estendam os servios mdicos,sem levar em conta os conhecimentosmedicinais mesoamericanos40;

    d) que se estimule o trabalho, nodentro da viso mesoamericana, isto ,voltado para uma economia desubsistncia; mas sim sob a ticacapitalista, voltado para a produo doexcedente;

    e) que se valorizem algumasmanifestaes das culturas indgenas ecamponesas, no entanto comoatividades isoladas, fora de seu contexto,e que o apoio dado no seja um

    estmulo ao desenvolvimento culturalprprio e integral das comunidades41.

    4.1. O indigenismo

    A Revoluo Mexicana, uma veztornada governo, institucionalizou um

    projeto poltico e ideolgico para ospovos indgenas buscando umafundamentao terica de acordo comos novos tempos: o indigenismo.

    A poltica indigenista da RevoluoMexicana concebia os seguintes pontos:

    a) a integrao dos ndios uma metadesejvel porque o nico caminho

    para se alcanar a unidade nacional egarantir o desenvolvimento;

    b) a integrao dos ndios umprocesso inevitvel e natural que noMxico foi impedido por duas razeshistricas: i) a dominao exercida

    regionalmente por grupos de ladinos dascidades encravadas nas zonas de refgio,

    beneficiando aos mesmos e mantendo ondio marginalizado; ii) a resistncia aocampo gerando culturas prprias deresistncia. Enfim, se trata de anular acapacidade de deciso dos povosindgenas e incorpor-los plenamente aum sistema de controle cultural no qualas decises so tomadas em mbitosalheios s suas prprias comunidades. ARevoluo, ao lograr esses objetivos,

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    15/18

    104

    teria cumprido sua tarefa revolucionriano que toca ao indigenismo.

    O projeto nacional, no qual desembocou

    a Revoluo, nega tambm a civilizaomesoamericana. um projetosubstitutivo que no prope odesenvolvimento da cultura real dasmaiorias, mas to somente seudesaparecimento como nico caminho

    para que se generalize a cultura doMxico Imaginrio. um projeto noqual se afirma ideologicamente amestiagem, afiliando-se totalmente auma s das vertentes da civilizao: a

    ocidental.Antes que derrotar a Porfrio Diaz, aRevoluo Mexicana pretendeu vencera Emiliano Zapata, ou seja, aquele querepresentou de modo mais genuno asreivindicaes indgenas.

    5. guisa de concluses

    Segundo o historiador Carlos AntonioAguirre Rojas42, a Revoluo Mexicana

    logrou conquistas em vrios setores davida nacional, podendo as principais ser,assim, enumeradas: a) realizou a

    primeira reforma agrria do sculo XXna Amrica Latina; b) acabou com osobstculos principais que se opunham formao de um mercado internonacional; c) levou o pas a adquirirmelhores condies para desenvolverseu prprio processo de industrializao;d) provocou uma reconfigurao

    profunda das classes sociais mexicanas;e) gerou uma emergncia social daclasse mdia urbana; f) criou condies

    para que o chamado Estado de bem-estar-social tivesse uma presena maiorque nos demais pases da AmricaLatina; g) fundou a Universidade

    Nacional Autnoma do Mxico; h)planejou um vasto projeto dealfabetizao; i) promulgou aConstituio de 1917, considerada, napoca, a mais avanada do mundo; j)

    consagrou a educao laica e gratuita,proibindo os ministros de cultosreligiosos a criar escolas primrias; k)

    produziu um avano radical no

    tratamento dos limites da ao doEstado diante da iniciativa privada comrelao propriedade da terra e explorao dos recursos naturais, tantoque isso se transformou em umantecedente importante para a criaode vrias constituies na AmricaLatina, como a da Colmbia; l)estabeleceu-se um forte contedonacionalista e antirreligioso eimplantou-se um Estado promotor do

    desenvolvimento econmico do pas; m)gerou uma renovao completa da elite

    poltica; n) levou a cultura popular amanifestar-se por meio do muralismo; o)ocasionou a configurao territorialdefinitiva; p) por fim, conduziu laicizao da sociedade mexicana.Todas essas conquistas, advindas daRevoluo Mexicana, marcam

    profundamente, ainda hoje, a sociedadeasteca.

    A Revoluo Mexicana esteve, portanto,profundamente marcada pelo carteragrarista, tanto que a luta pela terratornou-se o grande motivo deflagradordo processo; foi caracterizada como

    burguesa agrria, visto ter sido a facovencedora da luta armada; foi chamadade nacionalista, por conta da formaode seu mercado interno e do

    protecionismo de suas riquezas; ditaanti-imperialista por conta de suas leisantimonoplios diante dos EstadosUnidos, que se apropriavam das terras edas minas; e, por fim, anticapitalistadevido ao Plano de Ayala com seus

    princpios coletivistas.

    A Revoluo Mexicana foi tudo isso aum s tempo.

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    16/18

    105

    * WALDIR JOS RAMPINELLI Professor do Departamento de Histria daUniversidade Federal de Santa Catarina; Mestreem Estdios Latinoamericanos Historia Universidad Nacional Autnoma de Mxico(1991) e Doutor em Cincias Sociais - Poltica

    pela Pontifcia Universidade Catlica de SoPaulo (Email: [email protected])

    1 Para a historiografia oficial, a RevoluoMexicana comea em 1910, com o Plano de SanLuis Potos, e termina em 1917, com a

    promulgao da nova Constituio. J para oshistoriadores Adolfo Gilly e Enrique Semo,entre outros, ela continua, sendo interrompidaem 1920, com o assassinato de Emiliano Zapatano ano anterior, com o acordo realizado entrePancho Villa e o governo federal e com achegada presidncia da Repblica de lvaroObregn, abrindo um perodo de estabilizaodo poder burgus frente s massas e em suasrelaes com elas. A revoluo interrompidadeixou no povo um sentimento de noconcluso. Tampouco ela foi dispersada,esmagada ou vencida. Por isso que, com ogoverno de Lzaro Crdenas (1934-1940), aRevoluo retoma seu caminho com a reformaagrria, as nacionalizaes, a educaosocialista e uma poltica externa progressista.GILLY, Adolfo. La revolucin interrumpida.Mxico: Editora Era, 1994, p. 324.2 KATZ, Friedrich. La guerra secreta en

    Mxico. Mxico: Editora Era, 1998, p. 34.3 Povo indgena que vivia no norte do Mxico,atual estado de Sonora. Resistiu bravamente expanso violenta do capitalismo imposto pelosexrcitos mexicano e estadunidense.4 Veja-se a respeito TURNER, John Kenneth.

    Mxico brbaro. 4 ed., Mxico: EditoraMexicanos Unidos, 1984.5

    GILLY, Adolfo. Op. cit., p. 22-23.6 Ibidem, p. 41.7 Ditador mexicano que se mantm no poder de1876 a 1911, com uma breve interrupo entre1880 e 1884. Adotou uma poltica econmicaque trouxe o progresso para uma regio do pas,mas no o desenvolvimento para o povomexicano. Ao contrrio, manteve um padro deacumulao baseado na exportao de produtos

    primrios, acelerou a dependncia da economiae governou com o apoio da oligarquia, doscientficos, dos guardas rurais, do Exrcito, dahierarquia da Igreja Catlica e do capital

    externo. O porfiriato, como conhecido esse

    perodo, adotou o lema de pouca poltica emuita administrao.8 GONZALEZ, Luis. El liberalismo triunfante.In: COSIO VILLEGAS, Daniel (Org.). Historia

    general de Mxico. Mxico: El Colegio deMxico, 2000, p. 665.9 SEMO, Enrique. Reflexiones sobre larevolucin mexicana. In: GILLY, Adolfo(Org.). Interpretaciones de la Revolucin

    Mexicana. Mxico: Editora Nova Imagem,1988, p. 142.10 KATZ, Friedrich. Op. cit., p. 41.11 BARTRA. Armando. La revolucin mexicanade 1910 en la perspectiva del magonismo. In:GILLY, Adolfo (Org.). Op. cit., p. 94.12 REVUELTAS, Jos. Ensayos sobre un

    proletariado sin cabeza. Mxico: Edies da

    Liga Leninista Espartaco, 1962, p. 201.13 COCKCROFT, James. Precursoresintelectuales de la revolucin mexicana. 24 ed.Mxico: Editora Sculo XXI, 2004. Segunda

    parte: los intelectuales como precursores 1900-1910, p. 85-157.14 BARTRA, Armando. La revolucin mexicanade 1910 en la perspectiva del magonismo. In:GILLY, Adolfo (Org.). Op. cit., p. 96.15 Uma das grandes conquistas da RevoluoMexicana foi a concretizao da separao entreEstado e Igreja, consubstanciada nos artigos 3 e123 da Constituio de 1917. A Igreja Catlica,que chegara ao Mxico de mos dadas com oconquistador espanhol, se ps ao lado dosrealistas durante a Guerra da Independncia(1810-1821), condenando morte e ao inferno o

    baixo clero que se levantara em armas contra aCoroa. Mais tarde, apoiou os conservadores emseu conflito com os liberais (1857-1861) eabenoou a interveno francesa e aentronizao do imperador Maximiliano deHabsburgo (1864) no pas. Durante o porfiriato,embora regessem as Leis de Reforma, o perodofoi proveitoso para a Igreja, que recobrou vriosde seus privilgios perdidos. A Guerra Cristeraou Cristiada (1926-1929), envolvendo

    principalmente a regio central do pas com umcusto de aproximadamente 90.000 vidas, olevante do Mxico velho, campons, catlico,apegado aos valores religiosos e contra umEstado laico. A Cristiada foi, tambm, aresistncia da burocracia eclesistica e dahierarquia catlica enfim, do Mxico colonial

    Revoluo Mexicana que lograra vencer,porm no derrotar totalmente essas forasconservadoras. A guerra terminou em umempate histrico, entre governo e igreja, ambosse comprometendo a respeitar seus respectivosreinos, deste e do outro mundo. A Igreja no

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    17/18

    106

    incitaria seus fiis tomada do poder e o Estadono tentaria interferir na ordem interna dainstituio eclesistica.16Tiendas de raya eram os armazns instalados

    nas sedes das fazendas que forneciam alimentospara os trabalhadores, por preos elevados. Acada final de ms, quando os braceiros recebiamseus salrios, destinavam praticamente atotalidade do mesmo ao administrador datienda, estando, portanto, impossibilitados dedeixar a fazenda por conta da dvida que, emcaso de morte do peo, o filho herdava. Era oto conhecido trabalhador acasillado, isto ,

    preso ao patro.17 SILVA HERZOG, Jess.Breve historia de la

    Revolucin Mexicana. 5 ed. Mxico: Fundo deCultura Econmica, 1966, p. 96-101.18 No ms de dezembro de 1908 comeou acircular em So Pedro, estado de Coahuila, olivro A sucesso presidencial em 1910 O

    partido nacional democrtico, de Francisco I.Madero. O autor se mostra um acrrimodefensor da democracia e acredita que aliberdade poltica a panacia de todos os malesda nao. Critica oporfiriato, mas com um vismoderado. Na realidade, Madero busca asubstituio de Diaz, mas no de seu modelo.19 COCKCROFT, James. Op. cit, p. 161 e ss.20 Os acordos de Ciudad Jurez assinados em21 de maio de 1911 entre representantes dogoverno federal e do grupo de Francisco I.Madero, mediante os quais o ditador PorfrioDiaz se comprometia a renunciar e entregar o

    poder a Francisco Len de la Barra, entosecretrio de Relaes Exteriores, cabendo aesse convocar eleies gerais no pas determinavam que cessaria toda a luta armada,obrigando os revolucionrios a entregar suasarmas, estado por estado, ao Exrcito Federal.

    Na realidade tentava-se, no apenas dar porconcluda a revoluo, como tambmrestabelecer a ordem jurdica prexistente semavanar nas reivindicaes da reforma agrria edo Plano de San Luis Potos. Somente oszapatistas se mantiveram armados, j que paraeles a revoluo no havia triunfado e tampoucoterminado, pois a terra ainda no tinha sidodividida. GILLY, Adolfo. Op. cit., p. 83.21 As Leis da Reforma, criadas pelo presidenteBenito Juarez, em julho de 1959, consistem na

    perda dos privilgios da Igreja Catlica. AsLeis, por exemplo, nacionalizam os benseclesisticos, fecham os conventos, estabelecemo registro e o casamento civis, secularizam oscemitrios e suprimem muitas festas religiosas.

    22 WOMACK JR., John.Zapata y la RevolucinMexicana. 15 ed. Mxico: Editora Sculo XXI,1987, p. 387.23 Pascoal Orozco, que inicialmente se juntara a

    Francisco I. Madero, mais tarde rebelou-secontra ele.24 GILLY, Adolfo. Op. cit., p. 173.25 TAIBO II, Paco Igncio. Pancho Villa: una

    biografia narrativa. Mxico: Editora Planeta,2006.26Decena Trgica o nome do perodo que vaide 8 a 22 de fevereiro de 1913, no qual a cidadedo Mxico presenciou um levante de tropascontra o governo de Francisco I. Madero,comandadas pelos generais Flix Daz (sobrinhode Porfrio Diaz) e Manuel Mondragn, tendoos mesmos como quartel de base a Ciudadela.

    Por sua vez, o Exrcito Federal, sob o mando dogeneral Victoriano Huerta, postado no Palcio

    Nacional, defendia o presidente constitucional.No entanto, Huerta, apoiado pelo embaixadordos Estados Unidos, Henri Lane Wilson, trai aMadero, tornando-o seu prisioneiro no dia 18,como tambm ao vice presidente Pino Suarez,assassinando-os em 22 do mesmo ms. Dado ogolpe de Estado, Huerta implanta uma ferozditadura no pas, que vai de fevereiro de 1913 a

    julho de 1914, com o apoio do exrcito, daoligarquia, da hierarquia eclesistica, daembaixada dos Estados Unidos e do capitalexterno. Com Huerta no poder, reaparecemalgumas das principais caractersticas do

    porfiriato, intensificadas e exarcerbadas.27 TAIBO II, Paco Igncio. Op. cit., p. 177.28 Ibidem, p. 251.29 Felipe ngeles foi general do ExrcitoFederal, permanecendo ao lado do presidenteFrancisco I. Madero durante a Decena Trgica.Preso pelo ditador Victoriano Huerta, foienviado Frana, em julho de 1913, comoexilado, de l retornando clandestinamente, emoutubro do mesmo ano, para incorporar-se aogoverno paralelo de Venustiano Carranza. Em1914, passou luta armada, formando parte doscomandos da Diviso do Norte e participandode vrias batalhas contra as tropas do ditadorHuerta como a tomada de Torren e a deZacatecas. Esta ltima foi decisiva para a quedade Huerta, ocorrida trs semanas mais tarde.ngeles arquitetou a aliana entre Villa eZapata, fazendo com que este se incorporasse Conveno Militar de Aguascalientes e, emseguida, houvesse a aprovao do Plano deAyala. Aps as sucessivas derrotas de Villa noBaixio, ngeles retirou-se para os EstadosUnidos, organizando l a resistncia ao governode Venustiano Carranza. Volta

  • 7/29/2019 Revoluo Mexicana, lutas regionais e de classes

    18/18

    107

    clandestinamente ao Mxico para incorporar-senovamente s tropas de Pancho Villa que lutamcontra Carranza e para evitar uma intervenodos Estados Unidos em seu pas, que ele julgava

    ser iminente. preso, julgado por uma cortemarcial e fuzilado em 26 de novembro de 1919.Durante seu julgamento, no Teatro dos Heris,em Chihuahua, diante dos juzes e de um grande

    pblico, faz uma extensa defesa na qual discorresobre as ideias liberais, humanas e socialistas,sendo esses discursos o seu testamento polticoe espiritual. Foi o nico verdadeiro intelectualque produziu o Exrcito Federal Mexicano.Com a morte de ngeles, Carranza vingara ogeneral que ousara sair do seu comando paraaderir ao de Villa. GILLY, Adolfo.Introduccin. In: GILLY, Adolfo (Org.). Felipe

    ngeles en la Revolucin. Mxico: Editora Era,2008, p. 10-11.30 Friedrich Katz, historiador austraco, estudoue pesquisou sobre Villa e, principalmente,sobreo villismo.31 TAIBO II, Paco Igncio. Op. cit., p. 793.32 Villa, conhecido como um grande estrategistamilitar, enfrenta a Obregn, em Celaya, centrodo pas. So trs batalhas seguidas, sendo quenas duas primeiras o exrcito de Villa saidebilitado e, na terceira, derrotado.33 LPEZ Y FUENTES, Gregorio. Tierra: larevolucin agrria en Mxico. Mxico: FactoriaEdiciones, 2004.34 TAIBO II, Paco Ignacio. Op. cit., p. 675.35 A batalha de Zacatecas, de 23 de junho de1914, foi fundamental para a queda do ditadorVictoriano Huerta. O Exrcito Federal, com 12mil homens, derrotado, bem como toda suaoficialidade. Villa apreende trens, artilharia,armamentos e demais componentes das forasarmadas. Apenas pequenos destacamentosconseguem fugir do campo de luta. Comtamanha vitria, o caminho para a capital do

    pas estava aberto. Zacatecas ficou naimaginao popular e na memria social,tornando-se a batalha das canes, dos corridose dos filmes comemorativos.36 TAIBO II, Paco Igncio. Op. cit., p. 564.37 Ibidem, p. 44.38

    O Mxico profundo formado por umagrande diversidade de povos, comunidades esetores sociais que constituem a maioria da

    populao do pas. O que os une, e ao mesmotempo os distingue, do restante da sociedademexicana, que so grupos portadores demodos de entender o mundo e organizar a vidaque tm sua origem na civilizao

    mesoamericana, formada aqui ao longo de umdilatado processo histrico. As expresses

    atuais dessa civilizao so muito diversas:desde as culturas que alguns povos ndiossouberam conservar com maior grau de coesointerna, at a grande quantidade de rasgos

    isolados que se distribuem de maneira diferentenos distintos setores urbanos. A civilizaomesoamericana uma civilizao negada, cuja

    presena imprescindvel reconhecer.BONFIL BATALLA, Guillermo. Mxico

    profundo: una civilizacin negada. Mxico:Editora Debolsillo, 2005, p. 21.39 O Mxico imaginrio um pas que seapresenta rico e moderno. A riqueza entendidacomo o resultado natural do trabalho individuale se expressa na propriedade privada. Asdiferenas de riqueza se justificam pelo maiorou menor empenho que cada um se prope a

    produzir. assunto pessoal no qual no deveminfluir diferenas prvias como as queestabeleciam o ter nascido em uma ou outracasta durante a dominao espanhola. Agora,todos os mexicanos eram iguais e cada qualresponsvel de seu prprio destino. O

    patrimnio cultural do pas, que inclui osrecursos materiais, era um todo comum quecada qual deveria aproveitar sua maneira, emlivre competncia, sem privilgios para nenhumgrupo [...] A modernidade do Mxicoimaginrio era um produto de importao. Osavanos tecnolgicos deveriam jogar um papelimportante. Ibidem, p. 156.40 A definio de Mesoamrica, como umaregio cultural com limites e caractersticas

    prprias, foi proposta por Paul Kirchhoff apartir da distribuio de um grande nmero deelementos culturais da mais variada natureza,sendo que alguns deles estavam presentesexclusivamente nessa regio, tais como ocultivo do milho, a utilizao da pele de coelho

    para decorar tecidos, o uso de mercadosespecializados, a escrita jeroglfica, aconstruo das chinampas e o 13 como nmeroritual. A Mesoamrica geogrfica vai do rioPnuco a Sinaloa (norte do Mxico), passando

    por Lerma e chegando aos atuais pases deBelize, Guatemala, El Salvador e parte deHonduras e Nicargua. A fronteira sul daMesoamrica se estendia da desembocadura dorio Motagua ao Lago de Nicargua e da at oGolfo de Nicoya. Ibidem, p. 29.41 Ibidem, p. 169-170.42 AGUIRRE ROJAS, Carlos Antonio.Contrahistoria de la Revolucin Mexicana.Mxico: Editora da Faculdade de Histria daUniversidade Michoacana, 2009, p. 145-160.