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Jornalista: Os segredos da profissão e o dia a dia de quem trabalha na área VIÉS.01 TENDÊNCIAS: Das ruas para o editorial de Moda ENSAIO FOTOGRÁFICO: Produção de palha em Sales Oliveira 80 Anos e três histórias Cinema de Animação em Ribeirão Preto

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Publicação do Curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo do Centro Universitário UniSEB

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Page 1: Revista Viés

PUBLICAÇÃO LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO UNISEB-COC

Jornalista: Os segredos da profissão e o dia a dia de quem trabalha na áreaVIÉS.01

TENDÊNCIAS: Das ruas para o editorial de Moda

ENSAIO FOTOGRÁFICO: Produção de palha em Sales Oliveira

80 Anos e três histórias

Cinema de Animação em Ribeirão Preto

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2 AGOSTO|2011

A Revista Viés traz reportagens, tex-tos e fotos produzidas pelos alunos do último ano do curso de jornalismo do Centro Universitário UNISEB COC. A proposta foi uma revitalização da revis-ta já editada anualmente pelo curso de Jornalismo. Os alunos criaram o novo nome da revista, decidiram novo for-mato, elaboraram pautas, redigiram tex-tos, produziram fotos e a diagramação. Em busca de boas histórias os alunos--repórteres foram a campo com blocos, gravadores e máquinas fotográficas. O resultado foi uma revista que aborda assuntos variados como cultura, mídia, moda, esporte, terceira idade e temas polêmicos.

A matéria de CAPA traz a vivência de três jornalistas em diversas fases da carreira, como estudante, estagiário e profissional, desvendando as etapas, prazeres e dificuldades da profissão.

Na editoria MÍDIA, MODA E CUL-TURA abordamos o tema dos patrimô-nios culturais da cidade, o trabalho de

EDITORIAL

animação gráfica visto hoje nos cinemas e propagandas e a explosão das mídias sociais com os blogs dos mais variados temas. O Lado B traz novidades do mercado de livros, Cds e filmes. E tam-bém um editorial da moda das ruas e a tendência do algodão orgânico.

A REPORTAGEM da Viés foi a cam-po e passou um dia numa fazenda de equoterapia em Ribeirão Preto. Em Salles Oliveira conheceu o trabalho de produção da palha, o que resultou em um ENSAIO FOTOGRÁFICO.

A série MEMÓRIAS E BOAS HISTÓ-RIAS aborda histórias de vida de per-sonagens que acompanharam o cresci-mento da cidade. Trazemos também a história da sorveteria Geraldo e a práti-ca da corrida para a terceira idade.

E, por fim, a INVESTIGAÇÃO sobre a polêmica do Aeroporto Leite Lopes de Ribeirão Preto fruto da disciplina Jornalismo Investigativo do professor José Antônio Bonato. Parabéns aos alu-nos pela conquista. Boa leitura!

A Revista Viés é uma publicação integrante do projeto pe-dagógico do curso de Jornalismo do Centro Universitário UniSEB. A produção da revista é resultado da interação de duas disciplinas dos alunos do 7. semestre de Jornalismo: Jornalismo em Revista, com a professora Gabriela Zauith, e da disciplina Projeto Editorial, com professor César Muniz.

UniSEB COC - Centro Universitário - Unidade Rua Abrahão Issa Halack, 980 - Ribeirânia - CEP 14096-160 Fone: (0xx16) 3603-9800 - Ribeirão Preto / SP

CHAIM ZAHER Presidente do Sistema SEB/COC Reitor do UNISEB/COC

ADRIANA BAPTISTON CEFALI ZAHER Vice-presidente do Sistema SEB/COC

LUIZ ROBERTO LISA CURI Diretor Nacional de Ensino Superior SEB

REGINALDO ARTHUS Vice-reitor do UNISEB

JEFERSON FERREIRA FAGUNDES Pró-reitor de EAD

KARINA PRADO FRANCHINI BIZERRA Pró-reitora de Graduação

CANDIDA LEMOS FRANÇA MARIZ Coordenadora do Curso de Jornalismo

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VIÉS 3

EXPEDIENTE GABRIELA ZAUITH Coordenadora da Revista Viés Editora

CÉSAR ROCHA MUNIZ Coordenador de Planejamento Gráfico Coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo

MARILDA FRANCO VASCONCELOS Revisora Coordenadora do Curso de Letras

REPORTERES Aline de Negreiros Bonilha Ana Luiza Marques Gabriel Anderson Marcelo da Silva Gouvea André Dutra de Oliveira Pereira de Souza Barbara Urbinati Balieiro Carla Batista Stechini Carolina Carvalho da Cunha Caue Pontoglio Marques Diego Moreno Gomes Castanheira Fernanda de Lima Souza Francine Doracenzi Estevão Gabriel Cardoso Rodrigues Gabriela Macedo Bressan Giulia Pereira Trés Juliana Jurkovick Garzon Lívia Palmieri Betinelli Luís Ricardo de Figueiredo Monteiro de Oliveira Marcio Augusto Polacchini Mariana Luciano da Silva Marilia Sallum Medici Marina de Castro Scalon Melmuara Thaiane Donegá Cândido Osvaldo Bezzon Neto Roberta Saltori Stephanie Locci Gomes Thais Campos de Souza

SUMÁRIOA Palha Salense 4Lado B 10Patrimônio Histórico: Preservação e proteção da memória 14Moda ecológica 19A moda das ruas 21Cinema animado 30Blogs: Espaço e reconhecimento 32Jornalismo em pauta 36Guerra no ar 42Histórias de vida 43Sorveteria cativa freguesia ribeirãopretana há 38 anos 49O esporte sem idade 51Cavalgadas de reabilitação 54

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4 AGOSTO|2011

A PALHASALENSEP

alha de milho. Este é o produto que movimenta a economia da pequena Salles Oliveira, que fica a 57 km de Ribeirão Pre-

to, interior de São Paulo. Com cerca de 10 mil habitantes, o município emprega boa parte dos trabalhadores na indús-tria da palha, que destina a maior parte de sua produção ao mercado tabagista. Entre-tanto, a presença de trabalho de menores de idade chamou a atenção da promotoria, que tem tomado medidas para evi-tar a prática.

Tudo começou há mais de 50 anos, por iniciativa de João Tiziotti, que levou a cidade ao posto de capital mundial da palha. Sua economia é de-pendente desta atividade que abastece principalmente o mercado interno, sendo parte

da produção exportada.A plantação do grão de mi-

lho toma conta da paisagem salense. São centenas de pa-lheiras espalhadas, muitas ile-gais, mas todas responsáveis por manter a tradição, que é orgulho dos salenses. É tam-bém a inspiração do artista plástico Atílio Paschoal Passa-glia, que cria quadros utilizan-do palha, tinta e terra. Uma de suas obras, que trata do desmatamento, foi exposta na Bienal de 2008, em São Paulo, e publicada no livro do evento.

A palha é a matéria prima utilizada para diversas finalida-des, como artesanato, emba-lagem de doces, alimentos e forragem para animais, porém a destinação principal é o ci-garro de palha.

O processo de produção se dá em várias etapas. Primeira-

Produção de palha de milho é tradição e garante sustento de famílias em Sales Oliveira

mente, os trabalhadores re-cebem o milho que vem das plantações, fazem a quebra das espigas e a separação da palha. Essa palha vai receber uma dose de enxofre e será levada à estufa para o clare-amento. As partes que não podem ser aproveitadas para o cigarro são cortadas com um facão, e o que sobra ainda passa por um controle, sendo separadas em níveis de quali-dade. Feito isso, elas são pren-sadas para serem embaladas em pacotinhos, como os que existem no comércio. Esses pacotes passarão por uma se-gunda prensa, em tábuas, para então finalizar o processo de produção da palha para cigar-ros. Neste momento estão prontas para serem comercia-lizadas.

O produto final sai das pe-

Cauê Marques Diego Moreno

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SALENSEO CLAREAMENTO

a palha na estufa (à direita),

com fumaça (abaixo, à esquerda)

com o enxofre (abaixo à direita) faz o clareamento

quenas indústrias ao custo que varia de R$ 0,30 a R$ 1,00. O consumidor final, que vai uti-lizá-la para enrolar o fumo, paga entre R$ 0,50 e R$ 2,00. A variação de preço acontece devido às diversas qualidades de palha oferecidas.

A preocupação do Minis-tério Público é com o empre-go de jovens e crianças que têm na palha uma maneira de ajudar a família. Para coibir a prática, a fiscalização foi inten-sificada, mas essas pessoas não querem deixar a atividade e a remuneração oferecida e aca-bam levando o trabalho para a casa, onde estão livres dos fiscais.

Os palheiros contam que a maior preocupação que eles têm é quanto à quebra da tra-dição. Eles acham importante que as crianças aprendam o ofício para que a cidade man-tenha o título que possui.

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6 AGOSTO|2011

depois a palha é rasgada e separada por qualidade

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as partes que não servem para fazer o cigarro são cortadas

o próximo passo é dobrar no tamanho certo e cortar na tesoura as palhas de melhor qualidade

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8 AGOSTO|2011

dobradas e aparadas as palhas são dispostas em latas para a primeira prensa

PRENSA

saindo da prensa a palha é empapelada

o maço também é prensado, mas entre madeiras

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passando no facão novamente os maços são aparados

após todo processo o pacote é fechado e está pronto para a venda

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10 AGOSTO|2011

Gabriel Rodrigues Osvaldo Bezzon

Alternativo, ousado, in-trigante, rebelde, cons-ciente, polêmico. Essas são algumas caracterís-ticas que personificam

o termo Lado B que preten-demos explorar. Nem sempre valorizadas pelo público, as obras dessa categoria podem, muitas vezes, acabar surpre-endendo aqueles que dão uma chance à experimenta-

Duff McKagan (companheiro dos tempos do Guns) e Ian Astbury, vocalista do Cult. Ufa! E tem muito mais feras nesse disco, como M Shadows, o vocalista do Avenged Seven-fold, o guitarrista Rocco De Luca e Andrew Stockdale, o vocalista e guitarrista do Wol-fmother. Não conhece algum desses? E que tal saber que Fergie (do Black Eyed Peas), Ozzy Osbourne, Chris Cor-nell (Soundgarden) e Lemmy (do Motorhead) também fa-

ção. Para os que continuam céticos, lembrem-se que Os Beatles, O senhor dos Anéis e Tropa de Elite são apenas alguns “Lados B” que tiveram a oportunidade de mostrar a que vieram.

“Simplesmente Slash” é o título de um CD bem curio-so do famoso guitarrista do Guns N´Roses lançado no ano passado.

O álbum conta com parti-cipações incríveis como Iggy Pop, Kid Rock, Dave Grohl,

LAD

O B

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zem parte dessa álbum que promete entrar para história no segmento alternativo?

Pra finalizar, minha dica é ouvir a música Gotten, can-tada por Adam Levine, voca-lista e guitarrista do Maroon 5. Pode até dar trabalho di-gitar um link desse tamanho: http://letras.terra.com.br/slash/1661163/traducao , mas, com certeza irá valer a pena. Nesse site você encontra a letra original (em inglês) e a tradução, além é claro de po-

der ouvi-la. Você não pode perder!”

“Donnie Darko” é um adolescente que, apesar de brilhante e muito inteligente, despreza a maioria de seus colegas de escola. Ele também tem um amigo imaginário, que poderia nao significar nada de mais, exceto pelo fato de que esse amigo é um coelho gigante e monstruoso que acaba encorajando o estu-dante a fazer brincadeiras um tanto quanto nocivas às pes-

soas que o cercam. Um dia, uma visão desse coelho faz com que Donnie saia de sua casa no meio da noite, fazen-do-lhe uma previsão que, de início, o jovem julga absurda. Os acontecimentos seguintes, no entanto, irão mudar para sempre sua perceção do que é verdade ou mentira. Assis-ta uma, duas, três, quatro ou cinco vezes e você ainda vai estar insatisfeito pelo pouco que percebeu. Cheio de me-táforas, conspirações, teorias

das mais variadas e um clima que beira mais o terror que o suspense, Donnie Darko ar-rebanhou milhares de fãs pelo mundo todo, ganhou o status de cult e, até hoje, é ampla-mente discutido em rodas de estudantes, admiradores de cinema ou no barzinho alí da esquina.

Concordamos que não é – exatamente – um lançamento, mas vai ganhar versão nova e remasterizada nesse mesmo ano.

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12 AGOSTO|2011

O Baile. Um filme de 1983 que é sem palavras. Isso mes-mo, é difícil descrever a beleza e inteligência desse filme, mas ele também é literalmente sem palavras. Em quase suas duas horas de duração o fil-me é mudo, possui apenas tri-lha sonora. Nessa época o ci-nema mudo já havia acabado mas o diretor Ettore Scolla felizmente resolveu arriscar e nos proporcionar essa be-líssima obra de arte que hoje ocupa um espaço especial na maioria das locadoras de todo país.

Com selo da Platina Filmes e produzido em conjunto pela França, Argélia e Itália, essa comédia musical é uma

adaptação de um espetácu-lo teatral e conta a história da França da década de 30 à década de 80, a partir dos personagens reunidos em um salão de dança.

Tudo começa em 1936, quando surge a Frente Popu-lar do país, na sequência vem a ocupação nazista, durante a 2ª Guerra Mundial. Já em 1944 outros dois fatos importantes, a libertação de Paris e a ex-plosão da música americana no famoso estilo Glenn Miller. Dois anos depois chegam ao país por intermédio dos sol-dados americanos as meias de seda e o jazz. Em 1956 a balada se torna rock´n´roll e de repente estamos em 1968

e o salão de baile onde tudo acontece é invadido por ra-dicais. Um salto na história em já é a vez da disco music em 1983 e quase que magica-mente somos transportados para os dias atuais e para as nossas próprias vidas depois do poético fim de “LE BAL”

Motion City Soundtrack – My Dinosaur Life – For-mada em 1977, esse quin-teto de Minnesota(EUA) vendeu pouco mais de 600 mil discos durante sua car-reira, entre 3 álbuns, so-mente nos Estados Unidos. O ano de 2010, no entanto, foi bem proveitoso para a banda, pois, após 5 anos de produção, conseguiram lan-çar seu 4º trabalho, intitula-do My Dinosaur Life. Com uma faixa escolhida por Tim Burton para integrar a trilha sonora do filme Alice (Always running out

of time), os 5 garotos final-mente caíram nas graças dos críticos e, aos poucos, vem conquistando o públi-co internacional. Com um estilo pouco definido, in-fluenciado por Blink 182 e Fall Out Boy e tendo Mark Hoppus(baixista e bateirista do Blink 182) em sua pro-dução, o disco usa e abusa da experimentação, passan-do pela mixagem eletrôni-ca e instrumental acústico. Uma ótima dica para quem gosta de boa música.

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VIÉS 13

Palavras Envenenadas – O livro conta a crônica de um dia que passa muito ra-pidamente, enquanto nar-ra a história de diferentes pessoas envolvidas no caso da jovem Bárbara Molina, desaparecida desde os 15 anos de idade. De forma surpreendente e através de uma narrativa brilhante-mente desenvolvida, capaz de deixar tenso o mais frio dos leitores, Maite Carranza leva seus leitores por um mundo não muito distante deste em que vivemos, jo-gando em nossa cara uma realidade grotesca e, mesmo

assim, inegável. Enquanto aborda a luta dos familia-res de Barbara e do policial designado para encontrá-la e a luta pela sobrevivência da própria Bárbara, a auto-ra nos faz compreender a gravidade de um problema enfrentado por mais jovens do que ousaríamos admitir. Uma leitura imperdível para todos aqueles que não se contentam com contos de fadas e romances “água com açúcar”. E imperdível, acima de tudo, para todos aqueles que se importam.

“Agora já não posso ir a parte alguma. Acreditam que eu esteja morta. Minha mãe leva flores à montanha e as joga ao vento no dia do meu aniversário, e meus irmãos erguem um balão com meu nome.”

Maite Carranza é escrito-ra, espanhola, antropóloga e adora mistérios. Vencedora do prêmio Edebé de litera-tura por “Palavras Envene-nadas”, escreve novelas e obras literárias de grande impacto. É a autora da trilo-gia “A Guerra das Bruxas” e de outros 40 títulos.

Eu, detetive – O Caso do Sumiço é um livro de Stella Car e Laís Carr Ribeiro. O so-brenome delas é igual e nos transmite a sensação de já tê--lo lido ou ouvido antes. E isso não é um engano. Ambas são escritoras conhecidas que em 1991 se juntaram para escre-ver esse livro.

Lais Carr Ribeiro é autora de versões em português de clássicos da literatura infan-til mundial como “O Patinho Feio” e “Os Três Porquinhos”. Só que neste livro, por mais que a escrita seja simples e que ele venha acompanhado de um mapa bem caricato com informações sobre a ci-dade e as pessoas onde o cri-me ocorreu, definitivamente não é uma obra infantil.

O livro da editora Moderna, que faz parte da coleção Vere-das, tem apenas 72 páginas e além de uma boa literatura, é também uma excelente diver-são. E uma curiosidade, todo escrito em primeira pessoa: “EU me sentei ao lado dela e o Míudo, mais que depwressa, se grudou do outro lado...”

Gostou? Ta afim de ser um detetive também? Então cor-ra para a livraria mais proxima e começe a desvendar esse mistério....

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Patrimônio Histórico:Preservação e proteção da memória

Preservar, proteger e revitalizar ca-sas, prédios e fachadas permite construir uma identidade e uma melhor compreensão da cidade em que se vive. Conservar e cuidar

do antigo é poder contar, por meio de um olhar mais atento, a história de um lugar e sua importância histórica e social. Pensando nisso pesquisadores da Rede de Cooperação Identidades Culturais de Ribeirão Preto elaboraram um projeto para a revitalização da região central de Ribeirão Preto.

A Rede possui um modelo de legis-lação para a proteção das fachadas dos bens históricos, a revitalização da rua José Bonifácio, a ocupação de alguns prédios históricos da iniciativa privada e o uso cultural de outros espaços vazios. “Para cada patrimônio temos uma estra-tégia diferente, mas a proposta é criar alternativas que atendam às entidades culturais da cidade”, diz a Secretária da Cultura, Adriana Silva. O projeto, criado em janeiro de 2009 pela Secretaria da Cultura de Ribeirão Preto, conta com 33 técnicos das áreas de arquitetura, histó-ria, turismo, comunicação, artes, econo-mia, geografia e ciência da informação.

No centro da cidade, o projeto abran-ge o Quarteirão Paulista, o prédio Die-derichsen, a casa do ex-prefeito Camilo de Matos na rua Duque de Caxias e o Casarão Murdocco, na rua São José.

Na primeira fase do projeto, realizou-

-se um inventário de referências finali-zado em novembro de 2010 as quais agregam vários aspectos. Entre elas pes-quisas sobre a identificação dos prédios tombados, análise da formação histórica e da paisagem natural e o levantamen-to do perfil social e econômico a fim de identificar os possíveis impactos na so-ciedade e na economia. “Para que as po-líticas públicas de preservação possam atuar, é preciso ter um inventário que dê consistência real, mostrar que os proje-tos serão feitos em cima de dados con-cretos”, afirma a historiadora e diretora de patrimônio da Secretaria da Cultura de Ribeirão Preto, Lílian Rosa.

O grupo de pesquisadores propõe que o Quarteirão Paulista paisagem mais limpa de interferências visuais. “Quere-mos tirar outdoors, placas, fiações e deixar o centro da cidade mais pareci-do com o que era em sua origem”, diz a arquiteta envolvida no projeto, Juscélia Fiuza.

Para financiar a reforma do casarão Camilo de Matos, considerado patrimô-nio privado, a proposta é criar um sistema de permuta entre poder público e priva-do, articulação que está em processo de negociação. “A permuta prevê a troca do patrimônio por um terreno público de igual valor. A ação de fomento é colabo-rar para que o proprietário seja empresá-rio de alguma atividade cultural com sede em seu imóvel”, diz a secretária.

Edifício Diederichsen

Em 1934, Antonio Diederichsen adquiriu um terreno para a cons-trução de um grande edifício. Foi construído então o primeiro “arranha céu” da cidade, com

cinco pavimentos além do térreo que seria destinado a vários usos como comércio, hotel, cinema e locação.

O prédio foi doado ao Patrimônio da Santa Casa de Misericórdia, insti-tuição que o administra até os dias de hoje.

Carolina Carvalho da Cunha

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Edifício Diederichsen

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Em parceria com o IAB (Instituto dos Arquitetos do Brasil) foram feitos levan-tamentos sobre os 73 bens tombados incluindo o município de Bonfim Pau-lista, considerados de valor histórico e pensou-se em uma forma de captação de recursos para a realização das obras. Para a execução de projetos arquitetô-nicos de alto custo será preciso recor-rer a leis de incentivo fiscal como a Lei Rouanet ou ProAC (Programa de Ação Cultural) no qual empresas ou cidadãos podem ajudar a financiar através da isen-ção de impostos.

Um programa de preservação e pro-teção do patrimônio está respaldado num conjunto de ações que incluem

desde a elaboração de projeto, captação de recursos, realização da obra e ocupa-ção cultural. “Estamos trabalhando com mais de 16 projetos simultâneos e os prazos são relativos. O Programa está relacionado ao Plano Municipal da Cul-tura e este foi criado para 20 anos”, diz Adriana Silva.

Moradores e comerciantes que ainda se lembram de uma Ribeirão Preto do passado aprovam e esperam pelas revi-talizações da área central. “Tenho sau-dade de quando não tinha tantas placas, tantos fios, tanta sujeira. Se esse projeto puder parecer um pouco que seja com passado, já ficarei mais satisfeito”, afirma o comerciante José Paulo.

Casarão Camilo de MattosA casa pertenceu ao prefeito de Ribeirão Preto Camilo de Matos que governou de 1929 até 1930

Recursos

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Solar Murdocco

Franciso Murdocco, italiano, foi um sapateiro e comerciante de calça-dos em Ribeirão Preto. Nos ter-renos onde foi construído o solar, também localiza-se uma modesta

casa térrea, também de propriedade de Murdocco.

O solar apresenta um estilo arquite-tônico com influências francesa, alemã e italiana, além de um sistema de aque-cimento solar incomum para a época, instalado no segundo andar.

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Rua José Bonifácio

A rua José Bonifácio teria surgido no final do século XX, sendo edificada legalmente em 1883, com a retificação do córrego Ribeirão Preto. A partir dos anos 20, as antigas construções térreas, marcadas por construções de caráter funcional, que serviam de comércio e moradia, começaram a ser substituídas por pequenos sobrados. Esses sobrados buscaram inspiração na construção imperial, caracterizados por uma arquitetura eclética.

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VIÉS 19

Moda ecológica é cara, mas correta

Algodão colorido e ecológico: O uso de materiais que não poluem a natureza é a nova estratégia do mercado têxtil. Com um apelo “ecologicamente correto”, consumidores são atraídos pela ideia de usar produtos naturais e orgânicos. Roupas que utilizam matérias-primas naturais e que utilizam práticas de preservação ambiental são encontradas em lojas de Ribeirão Preto.

A marca Algodoeiro tem como ma-téria-prima o algodão ecológico. O gene da semente determina a cor do algodão e dispensa o processo de tingimento, altamente poluente.

Desta forma, evita o lançamento de re-síduos na natureza, preservando rios e mares, juntamente com a economia de energia e de 60% da água, que seriam uti-lizadas neste processo.

Esse tipo de algodão é cultivado desde a antiguidade, nas regiões de paí-ses atualmente denominados como Egito e Índia. E também pelos povos andinos, como os incas, cuja produção se destina-va a vestimentas e artesanato. A produ-ção industrial desse algodão tornou-se inviável, por possuir fibras mais fracas e

menos uniformes que o algodão branco. Com tecnologia e pesquisas em

melhoramento genético, a Embrapa Al-godão, em Campina Grande (Paraíba), tornou possível a extensão das fibras e a produção do algodão ecológico em di-versas cores, como marrom, verde, safira e rubi. As cores são produzidas desde 2000 e levam o selo “Algodão Cor Natu-ral Embrapa”. A parceria com as marcas de roupa se dá por meio de cooperati-vas de agricultores, que produzem o algodão com as sementes certificadas, cuja produção não necessita de de-fensivos nem adubos químicos.

De acordo com a Embra-pa, “as roupas produzidas com esse tipo de fibra são muito procuradas, principal-mente por pessoas alérgicas a corantes e para uso por recém-nascidos”.

A Algodoeiro, com sede em Caruaru (Pernambuco), já pode ser en-contrada em Ribeirão Preto. “A ideia presenteou o mercado de Ribeirão. Além disso, segue totalmente o con-ceito de roupas ecologicamente cor-retas”, afirma Carla Francisco, dona da

loja aberta este ano na cidade.

Carla Francisco

Page 20: Revista Viés

20 AGOSTO|2011

Práticas sociais e de preservação ambiental

agridem o meio ambiente. É este concei-to que as novas gerações devem ter em mente”, afirma Aline Bueno, jornalista.

O único problema em comprar peças sustentáveis é o preço para o consumi-dor. Devido à escala de produção pe-quena e à oferta inconstante de matéria--prima, boa parte desses produtos é cara. Uma camiseta de algodão feita de tecido orgânico, por exemplo, custa três vezes mais do que uma produzida pelos méto-dos tradicionais.

Com um conceito de uma moda pro-duzida com fibras e matérias-primas 100% naturais, a marca “Reserva Natu-ral”, com fábrica em Passos, Minas Gerais, está há seis anos em Ribeirão Preto. A marca traz modelos feitos com algodão e linho, adornadas com bordados manuais, nervuras e fuxico.

De acordo com a marca, os processos de fabricação são monitorados, incluindo tingimento das peças e acessórios feitos por empresas que não poluem os manan-

ciais, tratando a água utilizada e devolven-do-a purificada ao meio ambiente, assegu-rando a preservação ambiental.

O cuidado também é feito na hora de escolher seus fornecedores, que utilizam boas práticas ambientais e sociais em seus processos.

Os tecidos são manufaturados com fibras oferecidas pela própria natureza, como o algodão, o linho, a seda e outros, que por não serem produzidas ou mani-puladas quimicamente pelo homem, não

Carla Francisco

Page 21: Revista Viés

A MODA DAS RUAS Looks de rua viraram nosso editorial de moda! Tem chapéu panamá, estampa xadrez e muito mais...

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22 AGOSTO|2011

Das ruas...A

moda diz muito sobre a persona-lidade de cada pessoa. Por mais que algumas peças sejam consi-deradas tendências e façam parte do guarda-roupa de grande parte

Maria VicenteBiólogaUsa: estampa xadrez

Melina FaustinoEstudanteUsa: chapéu Panamá

Suelem CaladoLocutora

Usa: saia alta

das pessoas, as combinações e a esco-lha dos acessórios evidenciam o estilo da cada um e expressam sua identidade visual, específica e única. Independente do valor e de onde as peças foram com-

Page 23: Revista Viés

...para os editoriais de moda!

pradas, pode-se criar um look cria-tivo e estar na moda. A equipe de moda da Viés foi às ruas de Ribeirão Preto em busca de bons looks. Seis tendências se destacaram e foram

Kadidja ToureAssistente de marketing

Usa: blusa com renda

Thais FerreiraJornalistaUsa: macacão Saruel

Julia Simão

Estudante

Usa: vestido longo

transformadas num editorial de moda. Das ruas para o nosso editorial...

Page 24: Revista Viés

Chapéu panamá acervo; brinco Maria Filó; Camisa Riachuelo; Calça acervo; Cinto Valentina; Open boot Emporio Naka

Chapéu panamá

Sinônimo de atitude e personalida-de, o chapéu panamá pode ser usado em produções “praianas”, com biquí-nis e saídas, como também numa pro-dução bem estilosa. Esta peça tem que ser o ponto chave do look!

Page 25: Revista Viés

XadrezHá algumas estações, a estampa xa-

drez está presente nos guarda-roupas de homens e mulheres. A estampa pode ser usada e abusada. Aposte nas camisas usadas sozinhas com calças básicas ou complementando looks com jaquetas e peças e acessórios em couro, entre outros.

Camisa American Eagle; Calça Renner; Cinto Bia Moraes; Peep toe Arezzo

Page 26: Revista Viés

Saia altaAs mulheres adotaram de fato

o comprimento mais alto nas saias. Além de definir as curvas, valorizando a cintura, esta peça fica bem durante o dia e também à noite.

Blusa Missinclof; Brinco Bia Moraes; Saia Hit; Sandália acervo

Page 27: Revista Viés

RendaClássica e feminina, a renda deixa

qualquer produção muito elegante. Ela pode aparecer em roupas mais sociais ou esporte-fino, como também em de-talhes de blusinhas, saias e shorts.

Vestido Eva Albuquerque; Clutch Acervo; Anel acervo; Peep toe Rosifini

Page 28: Revista Viés

SaruelAs peças saruel conquistaram as

mulheres modernas. Calça, short, ma-cacão ganharam este detalhe que dife-rencia uma peça comum, tornando um look simples muito mais estiloso.

Blusa Zara; Calça Equus; Scarpin C&A

Page 29: Revista Viés

LongoO comprimento longo em vestidos

e saias é uma tendência confortável e bonita. E não ache que só se pode usar “longos” em eventos formais. Este comprimento pode ser usado no dia a dia, facilmente.

Estúdio Faculdade de Comunicação Social da UNISEB-COCFotos estúdio Cauê MarquesFotos rua Ana Luiza MarquesModelo Nayara Cândido Maquiagem Fernanda LimaProdução estúdio Roberta SaltoriProdução roupas Mel Cândido

Vestido Acervo

Page 30: Revista Viés

Cinema AnimadoFazer um filme de

animação pode não ser

tão divertido quanto

assisti-lo. Mas isso não

desanima a equipe

da Usinanimada.

Francine Estevão

A animação brasileira ainda está en-gatinhando e fica atrás de gran-des produções norte-americanas e japonesas como “Toy Story” e “Pokémon”, consecutivamente.

No entanto, esse cenário começa a mudar no Brasil, a exemplo do recente lançamento “Rio”, de Carlos Saldanha, com recorde de público e bilheteria nos Estados Unidos.

Trabalhar com animação - técnica que permite dar a desenhos ou bone-cos a ilusão de movimento, seja em fil-mes, curtas metragens, séries de TV ou

propagandas - pode parecer divertido, mas ainda assim é trabalho. E trabalho duro. Mesmo sem rotina fixa, há sempre um cronograma e uma meta diária para cumprir. Não é preciso ser um operário padrão, trabalhar das oito ao meio-dia e das duas às seis da tarde. Mas ainda as-sim, pode ser mais intenso. “Quando a gente está com projeto, trabalha aos sá-bados, domingos, de madrugada”, conta Gustavo Russo, ou Jon, como é conhe-cido.

Jon, professor formado em Rádio e TV, é um dos diretores da Usinanimada, estúdio de animação de Ribeirão Preto, juntamente com Rogério Shareid, forma-

do em Desenho Industrial. Os dois for-mam a equipe fixa do estúdio e, quando uma produção exige, contam com o au-xílio de colaboradores.

Um trabalho leva tempo para ser concluído. Entre produção, montagem e edição, além dos incontáveis detalhes, o resultado é de cinco segundos por dia de animação. E, acredite, Jon diz que isso é muito. “É bastante coisa, porque é um processo muito lento. Tudo é animado separadamente. Cada pecinha. Alguns trabalhos duram um ano de produção para um resultado de cinco ou dez mi-nutos.”

O trabalho em equipe é importante

Rái Sossaith

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para dar agilidade aos projetos. Quan-to mais colaboradores, mais trabalhos podem ser executados paralelamente, entre os autorais e os comerciais. Os autorais são independentes, produzidos e concebidos pela equipe da Usinanima-da com fins especificamente culturais e educativos.

O grupo já realizou trabalhos como “Sambatown”, em 2010, curta metragem

Rái Sossaith

Sambatown

Imagens: Usinanimada

Laurinha

premiado pelo Ministério da Cultura, e “Rái Sossaith”, contemplado com o Prêmio Estímulo para Curta Metragem 2009, por meio da Secretaria Estadual de Cultura de São Paulo.

O grupo também desenvolve séries e, atualmente, está trabalhando na pro-dução de “Laurinha”, via PROAC (Pro-grama de Ação Cultural). A personagem, que surgiu em 2009, vai agora virar uma

série. “Temos até o fim do ano pra fazer o que são 20 episódios. A Laurinha não é vinculada a nenhuma emissora. Quando estiver pronto vamos tentar a veicula-ção”, afirma Jon. A parte final de comer-cialização também fica a cargo da equipe.

A verba para os trabalhos geralmen-te vem de festivais, editais e projetos de incentivo e apoio à cultura. E a inspira-ção? Para Jon, isso depende de cada um. “Tudo serve de influência. O que a gen-te vivencia, lê, vê ou escuta influencia na criação. Não tem uma regra. Inspiração vem de tudo.”

Para quem quer seguir a profissão, Jon dá o recado. “Tem que ter muita pa-ciência e perseverança. As pessoas con-fundem porque é bonitinho e divertido e acham que também é divertido fazer. Pessoas ansiosas, que não têm paciência, não dá certo. Mas a satisfação sempre vem ao fim de um trabalho árduo”.

Não é necessário ser formado em al-guma área específica, já que grande parte do trabalho se aprende na prática. Um dos cursos indicados no Brasil é o da Academia de Animação e Artes Digitais, em São Paulo. Mas o forte mesmo são os cursos no exterior, por exemplo, nos Estados Unidos.

E em tom de brincadeira, Jon deixa claro o objetivo da Usinanima-da. “Independente de qualquer tipo de projeto, o que for animação a gente vai fazer. O nosso objetivo é construir um império, ficar trilhardário”. Brincadeiras à parte, pensar, produzir conteúdo e trabalhar com cultura são as principais motivações. Além disso, eles pretendem continuar fazendo cada vez mais séries e quem sabe até um longa metragem.

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Carla Stechini, Gabriela Bressan e Lívia Palmieri

Nos últimos anos, os blo-gs conquistaram um grande espaço na rede virtual e se tornaram um lugar onde as pesso-

as expõem suas vidas, opinam sobre assuntos que domi-nam e, com isso, conquistam leitores. Segundo dados do Technorat, buscador que mo-nitora blogs, o número de di-ários on-line cadastrados na web em março deste ano é de oito milhões, ante cem mil há apenas dois anos. Mas esse dado cresce abruptamente: a cada 7,4 segundos, um novo blog é criado.

Seja qual for o tema abor-dado, a finalidade de todos que publicam seus textos na Internet é serem lidos e, consequentemente, reconhe-cidos. Para o psicólogo Lucas

Vinco, a busca pelo reconhe-cimento é o principal motivo da exposição. “Temos neces-sidade de referendar ao olhar do outro nossas felicidades, alegrias, pensamentos e tris-tezas. Nós nos construímos a partir do outro.”

Blogueiras e blogueiros discutem todo tipo de assunto, desde expor opiniões sobre moda, culinária, emagrecimento e um diário sobre o cotidiano de um casal com seu cachorro. A exposição, entretanto, pode trazer consequências. “É difícil saber se a exposição trará consequências positivas ou negativas. Antes de se expor, o mais importante é saber os motivos pelos quais se expõe”, disse Vinco.

São criados 12 mil novos blogs por dia

275 mil entradas diárias 10.800 atualizações por

hora. Fonte: www.technorat.com

Roberta Saltoriwww.donadamanga.wordpress.com

BLOGS: ESPAÇO E RECONHECIMENTO

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Moda e JornalismoRoberta Saltori (página ao

lado), 21, estudante de jorna-lismo, é uma blogueira que usa seu espaço na web para

opinar sobre cultura pop e “paixonites do momento”. Ela

mantém o blog “Dona da Manga” (www.donadaman-ga.wordpress.c om), há dois anos com um número ex-pressivo de acessos diários. “Quando comecei não ima-ginava que mais de mil pes-soas iriam parar para ler o que escrevo. Com certeza o blog só contribuiu para meu networking”.

Escrever artigos sobre moda e comportamento levou a blogueira a sen-tar na primeira fila do São Paulo Fashion Week (SPFW), um dos eventos de moda mais importan-tes do Brasil. Roberta

encara a exposição como algo natural, e justifica que, mesmo não querendo, os blogueiros ficam expostos, pois “o blog é uma vitrine para o mundo”.

A blogueira Mili Pavan (à esquerda), 27, começou seu blog homônimo (www.mili-pavan.blogspot.com) há cerca de um ano, quando se mudou para Ribeirão Preto. Mili con-ta que a principal motivação para criar seu blog foi a ne-cessidade de conhecer pes-

soas. No início, escrevia sobre diversos assuntos e, depois de

Tiago Pereirawww.paposegoles.com

uma enquete, percebeu que suas leitoras gostavam mais de seus posts com dicas de moda e acatou a preferência de seu público.

Com uma quantidade gran-de de acessos diários, Mili conseguiu uma nova profis-são: agora, além de blogueira, ela também presta consulto-ria de moda. “Eles queriam aprender a se vestir. Portanto, hoje minha profissão é traba-lhar como personal stylist e tudo isso graças ao sucesso do blog.”

Na Internet e na cozinhaMas não são só de mulhe-

res que vivem os blogs. Tiago Pereira, 30, publicitário, de-signer gráfico e diagramador, também é blogueiro nas ho-ras vagas e abriga seus textos no seu blog “Papos&Goles” (www.paposegoles.com.br). “Entrei na blogosfera em 2007 com o blog “SeuModesto” e depois criei o “Papos&Goles”, que fala sobre cinema, música, arte, propaganda, humor e li-vros”, contou.

Atualmente, o blog “Seu-Modesto” está desativado, mas Pereira ainda continua na web. Sua última criação foi o blog “SerMagro” (www.pa-posegoles.com.br/sermagro), que apesar de estar no mes-

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mo domínio do Papos&Goles, tem uma outra linha narrati-va: a difícil trajetória de sua semana de dieta. O blogueiro comenta sobre obstáculos e superações. Amante de doces e cerveja, ele conta a difícil tarefa de ser uma pessoa saudável e resistir às tentações que aparecem diariamente.

Além de satisfação pessoal, o blogueiro também conquis-tou coisas palpáveis com seus posts. “Conheci inúmeras pessoas interessantes por conta do blog, algumas pessoal-mente e outras não. Já tive alguns artigos publi- cados em jornais e revistas e os blogs também já me serviram como portfólio.”

Outro exemplo é o publicitário Ra-fael Mantesso (ao lado), 28, que fun-dou o blog “Marketing na Cozinha” (www.marketingnacozinha.com.br), em 2008. Atualmente, o blog recebe sete mil visitan-tes por dia, mantém uma média de dois posts di-ários e tem patrocina-dores em sua com-panhia.

Mantesso comenta sobre restaurantes, de-sign de utensílios domésticos, curiosidades e publicidade. A úni-ca coisa relacionada que não tem no s i t e

Rafael Mantesso(www.marketingnacozinha.com.br)

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são receitas culinárias, mas excluir esse tipo de conteúdo de seu espaço foi proposital. “Queria saber o que acontecia no mundo da gastronomia que não fossem receitas e fotos de pratos. Esse lugar não existia, resolvi criar o blog e ser essa referência.” Mantesso considera o blog seu “cartão de visitas”. “É através dele que capto clientes, dou palestras, aulas e cur-sos no país inteiro. Sem contar a renda que ele gera através de publicidade.”

Segundo Mantesso, o “Marketing na Cozinha” não é um es-paço para se expor. Apesar de os textos e a curadoria serem dele, a opção foi manter sua vida particular longe dos posts. “É um distanciamento que optei fazer, acho que para o segmento em que atuo, fica mais profissional assim.”

Vida de CachorroUm diário sobre a criação de um Bull Terrier por um casal

é o tema do blog “Jimmy Gosta de Sapatos” (www.jimmygos-tadesapatos.com.br). “Quando vi que aquela coisinha tão pe-quena era tão cheia de personalidade, vi que ia ter muito tra-balho e decidi relatar a nossa experiência com nosso primeiro cão”, disse Paloma Okano, 27 (ao lado).

O blog, que tem cerca de 900 acessos diários e uma média de um post a cada dois dias, surgiu através do gosto pela escri-ta e do encorajamento do marido de Paloma, no caso Rafael Mantesso, do “Marketing na Cozinha”.

A blogueira considera a experiência de re-latar a vida de um casal com um cachor-ro um hobby caseiro. “O que colhi foi uma experiência pessoal, conselhos e troca de informações. Também estou aprendendo a admi-nistrar melhor esta coisa de blog, conhecendo um mundo virtual extenso”.

Os assuntos são sobre o cão e a vida dela e de seu marido, mas apesar de expor tudo em um diário on-line, a blogueira tem que recon-tar a rotina para familiares e amigos. “É como se fosse uma vida dupla, e enquan-to a minha irmã ainda não sabe o que é

Paloma Okano(www.jimmygostadesapatos.com.br)

Foto

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rés

um blog, continuo me sentindo anôni-ma.”

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Jornalismo em pauta

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Aline Bonilha Giulia Trés Thais Campos

Na hora de decidir sobre o futuro profissional, alguns jo-vens encontram resistência dos pais e familiares. O jor-nalismo é uma das profissões que causa mais polêmica. Admirada por uns e incompreendida por muitos, alguns pais perguntam: “Por que não fazer Medicina, Engenharia,

Direito?”.Quem realmente quer ser jornalista tem a resposta na

ponta da língua: “Porque quero levar as notícias à população, quero investigar os temas mais polêmicos, saber conversar de tudo um pouco, escrever, relatar, estar informado de tudo o que acontece no mundo, sentir o frio na barriga na hora de

aparecer ao vivo ou dar um furo de reportagem... ”.Alguns requisitos são básicos para ter sucesso nesta pro-

fissão. Dominar a língua portuguesa, ter o hábito da leitura diária de jornais, revistas e sites de notícia, e talvez um dos requisitos mais importantes: ter fontes. O jornalista pode não saber de tudo, mas deve conhecer pessoas que saibam e em quem possa confiar.

Para saber como é a vida de um jornalista em diferentes fases da carreira, a reportagem da Viés conversou com uma estudante de jornalismo, uma jornalista recém-formada e um jornalista que trabalha há anos no mercado. Confira a conver-sa sobre a profissão, estágios e seu cotidiano.

Os segredos da profissão e o dia a dia de quem trabalha na área

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Na faculdadeA estudante Larissa Costa está cursando o 5º semestre de

Jornalismo e, desde o primeiro ano de faculdade, faz estágio. Atualmente, é estagiária de uma emissora de televisão de Ri-beirão Preto e escreve para uma revista de automóveis. “Viver e respirar jornalismo, essa é a minha rotina. Acordo cedo e vou para a emissora, a convivência e as experiências na reda-ção são de extrema importância para o aprendizado de qual-quer estudante. Depois vou para casa e descanso, que nada, es-crever! Já são oito anos de muita ferrugem no sangue, escrevo sobre automóveis, que é uma grande paixão”, afirma Larissa.

A estudante acredita que o estágio é a verdadeira faculda-de, onde se aprende realmente a fazer, escrever e questionar. Até hoje as experiências profissionais vividas pela estudante a ajudaram a determinar o valor do jornalismo e as expectativas para o futuro. “É uma profissão muito importante e bonita se bem feita. Ela envolve paixão, coragem e vontade de fazer bem

ao próximo. Um jeito de transmitir ou decodificar uma infor-mação para que todos entendam de forma fácil e interessante. É o meu objetivo”.

O mercado de trabalho para o jornalista é concorrido e, por isso, ter bons contatos é essencial na hora de achar um emprego. Um jornalista em Ribeirão Preto pode optar por trabalhar em emissoras de TV e rádio, revistas, jornais impres-sos, portais online, assessorias de imprensa, empresas e insti-tuições.

Nova etapaFabiana Padilha se formou no final de 2010 e é agora uma

jornalista. “A sensação foi de mais uma etapa da vida que eu consegui concluir. Claro que dá aquela ansiedade, a gente se pergunta “E agora?”, “como vai ser?”. Pensei em mil coisas, mas depois fui me encontrando”, conta Fabiana.

O início de carreira da recém-formada Fabiana Padilha

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Atualmente, a jornalista trabalha em um portal de notícias como repórter de vídeo. Os estágios que fez durante a facul-dade foram fundamentais. “O jornalista jamais pode ir para o mercado sem ter feito estágio. Foi muito bom, não só para o currículo. A experiência de estágio me deu mais segurança para enfrentar o mercado de trabaho.Essa profissão é mão na massa, prática!”.

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo e a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) com-preendem que o estágio tem importante participação na for-mação dos novos profissionais da imprensa. Porém, eles são proibidos pela lei que regulamenta a profissão de jornalista no Brasil. Por isso, em 2001, o estágio para estudantes de jorna-lismo foi permitido de forma não obrigatória, como atividade complementar. Pelo sindicato, a carga horária de um jornalista é de cinco horas diárias. Mas a maioria das funções exige horas extras e plantões de finais de semana e feriados.

Estagiar permite vivenciar o conteúdo didático ensinado em sala de aula em situações diárias da profissão. Transforma as in-formações acadêmicas em conhecimento prático, o que ajuda o estudante a definir a área na qual deseja atuar. Além disso, permite fazer contatos com profissionais experientes e bem situados no mercado, expandir a bagagem do “saber” sobre a profissão e valorizar o currículo. Conviver com situações diá-rias da rotina de um jornalista, seja qual for a área de atuação, é um dos primeiros e mais importantes passos da carreira.

Para Fabiana, existem boas empresas e que estão sempre contratando. A maioria dos seus amigos da faculdade, forma-

''Um jeito de transmitir ou decodificar uma informação para que todos entendam de forma fácil e interessante.''Larissa Costa sobre “ser jornalista”

A estudante de Jornalismo Larissa Costa

Giu

lia T

rés

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dos no final de 2010, já está trabalhando. A jornalista recém-for-mada contou sua rotina diária: “Eu trabalho das 8h às 17h30, de segunda a sexta-feira. Às vezes trabalho fim de semana também, depende do evento que vai ter. Procuro estar sempre com um livro ao lado da cama. Com a correria, às vezes deixamos de lado a leitura, mas sempre que posso estou lendo, principalmente jornais e tem os dias reservados para ir à igreja e ver os amigos”.

Experiência profissionalQuando conversamos com o jornalista Francisco Ferreira,

descobrimos uma nova perspectiva da profissão. Segundo Chico, como é conhecido, a correria do dia a dia e a concorrência do mercado mudaram o perfil do profissional. Deixou-se de lado o aspecto romântico de antes, pois hoje o jornalismo é como um produto à venda. O jornalista ainda afirma que o resultado é que, muitas vezes, um fato noticiável se confunde com o cotidiano das pessoas e a notícia perde o sentido ao ser transmitida à popula-

ção. “Uma notícia que afeta a vida de uma pessoa vira um drama nacional e o risco disso é tirar o contexto da situação.”

Chico formou-se em jornalismo aos 21 anos, na Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Começou a car-reira num jornal impresso de pequeno porte, aos 20 anos, em sua cidade natal. Aos 26, recebeu um convite de uma emissora de Ribeirão Preto para ser repórter de um jornal local, onde, tem-pos depois, se tornou âncora do principal telejornal da emissora. Hoje, com 26 anos de know how, ele já passou pela experiência de produtor, repórter e apresentador. Atualmente, é apresenta-dor e chefe de jornalismo de outra emissora da mesma cidade.

De acordo com o Ministério da Educação, as faculdades de Comunicação Social brasileiras colocam no mercado de traba-lho aproximadamente 7.500 novos profissionais por ano. Entre eles, cerca de 67% são jornalistas. Mas, com o mercado escasso e com a não obrigatoriedade do diploma, para onde vão esses profissionais?

Douglas Santos

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Em 2009, o STF (Supremo Tribunal Federa) decidiu que o di-ploma não é obrigatório para o exercício da profissão de jornalis-tas. Defensor da regulamentação do diploma, a grande esperança de Chico é que as empresas continuem contratando pessoas for-madas por uma instituição de ensino. “A princípio a postura dos jornalistas não mudou, mas a prática mostra que é necessário a contratação de profissionais formados, como um critério de avaliação. Além disso é uma conquista da categoria e retirar esse direito é um regresso.”

Para ser jornalista, não basta apenas saber escrever ou se portar diante de uma câmera. O ponto principal da profissão é gostar do que faz e aprender diariamente, buscando sempre me-lhorar. Apaixonado pela profissão e sem arrependimentos, Chico Ferreira expõe sua visão sobre o que é ser jornalista de fato. “É preciso ter visão crítica sobre as coisas, ver o mundo de maneira diferente e aliar essa característica à velocidade da informação.”

“A princípio a postura dos jornalistas não mudou, mas a prática mostra que é necessário a contratação de profissionais formados, como um critério de avaliação”Chico Ferreira sobre a não obrigatoriedade do diploma

Chico Ferreira exercendo a profissão jornalista

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André Dutra

O aeroporto de Ribeirão Preto co-locou a cidade em clima de guerra. O motivo da discórdia é uma proposta de reforma da pista que a ampliaria dos atuais 2.100 metros para 2.500 metros. Com isso, seria possível, na opinião dos que são a favor da obra, pousos e decolagens de aviões car-gueiros.

Mas o principal obstáculo para esse plano decolar é um acordo judicial, feito em 2008, que proíbe ampliação da pista do Leite Lopes. A prefeitu-ra, o governo do Estado, parcela da Câmara e empresários e comercian-tes defendem o fim desse acordo. O governo do Estado estuda ir à Justiça para atingir esse objetivo.

O problema para o governo é o Mi-nistério Público, que não admite rever o acordo e tem o apoio de ambienta-listas, moradores no entorno do ae-roporto e de parcela dos vereadores. O temor é que uma eventual amplia-

Guerra no arAmbientalistas e o Ministério Público de Ribeirão se mobilizam para evitar que governo do Estado e prefeitura consigam ampliar pista do aeroporto Leite Lopes

ção possa trazer risco de acidentesO aeroporto Leite Lopes opera em

período integral e registrou um movi-mento de mais de 600 mil passageiros e 40 mil voos em 2010, o quarto maior de todo o Estado de São Paulo, en-tre os aeroportos administrados pelo Daesp, sendo superado apenas pelos aeroportos de Congonhas e Cumbica em São Paulo e Viracopos em Campi-nas. Até abril deste ano já circularam mais de 300 mil pessoas em 106 mil voos que passaram pela cidade

O professor da USP Marcelo Perei-ra de Souza afirma que os moradores do entorno do aeroporto já sofrem com problemas de barulho, risco de acidentes e, ainda, com falta de ilu-minação em trecho da avenida Tho-mas Alberto Wathely. O trecho não é iluminado sob o argumento que a luz atrapalharia pousos de aviões. A escuridão oferece risco de acidentes, principalmente a ciclistas e pedestres.

Marcelo Pereira ainda comenta que o aeroporto seria, na verdade,

um “aeroclube”. O local inicialmente era um campo de aviação, mas com a expansão dele acabou se tornando um aeroporto. “O aeroporto tem que sair do local onde está e ser constru-ído um aeroporto com capacidade de atendimento às necessidades”, diz Marcelo Pereira.

Desde o ano passado a questão do aeroporto tem sido debatida na Câmara de Ribeirão Preto e até foi criado um movimento contrário à construção de um novo aeroporto, formado por pessoas e empresas que defendem a manutenção do Leite Lo-pes. Esse movimento é denominado pelos ambientalistas como “Só o Leite Lopes a Qualquer Custo” (SLLQC). Na corrente contrária, o engenheiro Lenio Severino Garcia afirmou que a justificativa de que a manutenção do aeroporto onde está é um argumen-to usado pelo governo do Estado, mas que os cidadãos podem contestá-lo judicialmente.

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Luís Monteiro

O que ue era para ser um tempo de descanso, Ca-milo Xavier dedicou sua aposentadoria à poesia. Com 84 anos, é autor de seis livros, membro da União Brasileira de Escritores (UBE) e da Acade-mia de Letras e Artes de Ribeirão Preto (ALARP),

além de atual presidente da Academia Ribeirãopretana de Letras (ARL). Atua também como divulgador da cul-tura e da poesia junto aos jovens.

Médico ortopedista nascido nesta cidade, está casado há 54 com Ilse e pai de quatro filhas, todas formadas: Renata, antropóloga, Luciana, enfermeira, Adriana, peda-goga e Camila, advogada. Camilo André Mércio Xavier fez medicina em Porto Alegre (seu pai era gaúcho e sua mãe, do interior de São Paulo), quando ainda não havia o curso em Ribeirão. Na volta, na década de 50, abriu clínica e foi médico do Co-mercial Futebol Clube. A

“Com os olhos bem abertospercorro meu universo

o que eles me dizem:empolgue-se vibre

ignore os empecilhosnão se detenha avance”.

Camilo André Mércio Xavier, do livro.”AlvOroçO”

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Boas histórias, histórias de vida.

Três oitentões descortinam o passado: racionamento de alimentos durante a II Guerra Mundial, o “footing” vigiado pelas mães, um médico que se descobre poeta. Célia, Camilo e Omar contam suas histórias, relatam fases da vida e se revelam afinados com os tempos de hoje: administração de condomínio, jogos no computador, estímulo cultural aos jovens... Humanismo, acima de tudo. Por Luís Monteiro, Marcelo Gouvea e Márcio Polacchini.

Um homem das letras

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partir de 1960 tornou-se professor de Ortopedia na Faculdade de Medi-cina da USP. Mas como sempre gos-tou de inovar, aproximou-se, como pesquisador, de colegas da Engenha-ria de São Carlos e juntos criaram o primeiro curso de Bioengenharia do país, voltado para aparelhos lo-comotores.

Depois de 37 anos aposentou-se no posto mais alto da carreira. Ti-nha então setenta anos e energia de sobra para desenvolver novos pro-jetos com viés cultural. Foi quando começou a escrever e revelou nos versos sensibilidade incomum. Sem esconder, no entanto, a condição de homem engajado de seu tempo.

Dentre suas produções recen-tes, publicou “AlvOroçO” em 2010. Em parceria com diversos intelectu-ais e com apoio da reitoria da USP, fez surgir “Ribeirão Cultural: Inicia-ção Poética”, uma coletânea de 50

poesias de alunos de escolas públi-cas e do Serviço Social da Indústria. Um estímulo importante para os talentos precoces, como Jéssica Ja-bor Dias, do oitavo ano do SESI, cujo poema se encontra publicado nesta página.

Voos mais altos na educação. Hoje seu maior empenho é proporcionar mais cultura aos jovens. Leva pales-trantes de áreas diversas à Escola Estadual Otoniel Mota, a qual consi-dera sua casa, pois ali cursou toda a educação básica.

Para a Feira do Livro de 2011 ide-alizou a “Arca Cultural” para pro-porcionar o acesso dos estudantes aos livros de autores ribeirãopreta-nos. Posteriormente o projeto per-correria as escolas públicas. Está à procura de patrocínio, mas faz ques-tão de esclarecer que não bate à porta de políticos.

Homem simples, educado e com-

prometido com a cultura e com seus semelhantes. Muitos são os frutos colhidos nas cruzadas culturais de Xavier.

União que nos faz melhor

Já parou para pensar Que não estamos sós,Que nós temos uns aos outros,Gente que está junto a nós?

Que juntos temos mais força,Que podemos mais, Que juntos somos melhores, Que união nunca é demais?

Que se a gente estiver junto,Sabendo com quem contar,Podemos conseguir muitas coisas, Podemos nos ajudar?

E é essa força Que nos faz acreditar Que num segundo Podemos o mundo mudar

Jéssica Jabor dias em “Ribeirão Cultural — Iniciação Poética”

Foto Anderson Marcelo

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Fé, alegria e um exemplo de vida

Marcelo Gouvea

Nascida em Serra Azul, é professo-ra aposentada de escola rural em Sertãozinho. Quando tinha quatro ou cinco anos, o pai, comerciante de tecidos, proprietário da pri-

meira loja “Renner” da cidade, levou a família para visitar o avô, que era cego, em Portugal, onde ficaram por um ano. A ameaça de guerra na Europa os fez retornar. E em 1950 se mudaram para Ribeirão.

Além dela e dos pais, tinha mais qua-tro irmãos: um comerciante, um bioquí-mico professor da USP, e dois médicos, sendo um deles ordenado padre aos 74 anos.

Seus relatos, em português impecá-vel, nos transportam para outra época. Era sexta-feira santa, não havia barulho

nenhum na cidade, nem o trem apitava. Diante do atual Centro de Convenções, existia um pomar aberto de jabuticabei-ras. Perto da Catedral, ficava um lago com muitos peixinhos, até que um dia apareceu um martim-pescador... Onde hoje é o Clube Recreativa (local consi-derado nobre na cidade) era o Comer-cial Futebol Clube. Segundo ela, muita gente não gostava do Comercial, pois dizia ser time de rico.

O “footing” era em frente ao cine São Paulo (que já não existe mais), na Rua São Sebastião, dobrando até a es-quina da General Osório. As moças, de braços dados, andavam do lado de dentro da calçada, enquanto os rapazes olhavam. Algumas mães também ficavam por ali, conversando e “fiscalizando”, conta Célia, com uma risadinha.

Lembranças do colégioCélia fez o curso Normal interna

no Colégio Santa Úrsula. E diverte-se ao lembrar histórias pitorescas de lá. Numa delas, conta que uma prima foi colocada no internato por causa de um namorado. O rapaz, que morava perto, mandava bilhetes pelas alunas externas.

O combinado era ela ficar no pátio num determinado horário para ele poder vê-la de cima do muro. Um dia a freira Encarnação o surpreendeu e exclamou enfática e demoradamente: “Ehhh Mane-co!!!”. Ele respondeu: “Ehhh Madre!!!” E sumiu... Anos depois os namorados se casaram.

Em outro caso, o uniforme, impecável, apresentava saia azul abaixo do joelho, meias altas e blusa branca de fustão com mangas compridas. Léia, de Ituverava, divertia as colegas com longos “discur-sos” no retorno das férias, começando com “Adeus, liberdade...”. Às vezes, sem malícia, contudo irreverente, arregaçava as mangas da blusa. Ao se deparar com a quebra do “decoro”, a primeira freira que a via ordenava: “Baixe as mangas!” Léia obedecia, porém baixa-va também as meias. E quando outra religio-sa man-dava: “Suba as meias!”, a aluna atendia, mas, do mesmo modo, subia outra vez as mangas. E não se emendava.

A entrevistada - com olhos brilhan-do - não esconde as próprias desobe-diências, embora, garante, fosse com-portada. Certa vez, depois de ter sido molhada por uma colega com água da

Anderson Marcelo

“Moro com Deus e Nossa Senhora” disse Maria Célia Marques, solteira, 83 anos, que nos recebeu em seu apartamento, 10º andar, localizado na rua Bernardino de Campos, no centro de Ribeirão Preto.

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pia, tentou revidar e atingiu uma freira. Correu sem ser identificada. Recorda ainda que, junto com quatro colegas, aproveitando o bolso enorme do aven-tal, furtava pão em algumas refeições. Mais tarde, no refeitório, onde era proi-bido comer, abriam uma lata de sardinha e se deli-ciavam num banquete.

A demolição do Colégio Santa Úr-sula para construir um “shoping” deu tristeza. Havia, entretanto, o consolo de que preservariam a fachada e a capela. Conversa apenas.

Numa época em que poucas mu-lheres dirigiam automóveis, Célia tirou a carta de motorista, sem reprova, escon-dida da família. Zombavam da sua baixa estatura (hoje 1,40 cm, antes era mais

alta, garante). Apesar do delegado rigo--roso, que no percurso a tinha mandado parar na frente de uma garagem, não caiu na armadilha. Tirou a carta, apesar de não pensar em dirigir na época, com a justificativa: “Tudo o que a gente pode aprender, não se deve desprezar”.

Ao observar a vista de uma janela voltada para a avenida Independência, vê-se diante de um cenário repleto de edifícios. Célia os viu crescerem, mas ainda não havia outros prédios naquele horizonte quando foi morar lá. Mostra, entre outras coisas, onde havia um asi-lo de mulheres “Anália Franco”, que dali viu pegar fogo “inteirinho”. Ninguém morreu. Depois, em outra janela, mais uma vista ampla, permitindo en-xergar a

avenida Nove de Julho, antes residencial, hoje tomada pelo comér-cio. Avista-se, longe, até o local onde estava montada a Agrishow.

Recentemente, Célia tomou aulas particulares de informática e revelou muita facilidade no uso do computador, tanto que não precisou recorrer a ano-tações. Partilha e-mails com amigos e se mantém atualizada pelos sites de notí-cias. Diverte-se com jogos, como paci-ência, sudoko e bubble splash.

Se as transformações da cidade através do tempo impregnaram sua vida, não puderam abalar a simpatia e a von-tade de aprender dessa mulher religiosa e de bem com a vida no alto dos seus 83 anos de existência.

“...divertia as colegas com longos “discursos” no retorno das férias, começando com “Adeus, liberdade...”.

Anderson Marcelo

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Márcio Polacchini

O fusquinha amarelo ano 77 estaciona às 8h30 em frente um prédio na área central de Ribeirão Preto. Desce, elegante,

óculos escuros, com passos rápidos, Omar Garcia Barbosa, 81 anos, o síndico. Não mora ali, mas comparece pontual e diariamente para lidar com os assuntos do condomínio de 56 apartamentos, dois dele. Com-binamos entrevistá-lo.

Órfão aos quatro anos de idade, no colo do pai, na rua Tibiriçá ainda sem calçamen-to, ouviu: “É, Omar, sua mãe foi embora”. Suas lembranças passam, além de Ribeirão, que priorizamos, por Altinópolis, Batatais e São Paulo. Também por Aparecida, onde, com dez anos, morou pouco mais de três meses em um seminário. Não esqueceu os tapas que o padre Pedro lhe deu. Fiquemos na década de 40. O primeiro emprego foi aos 13 anos na loja “A Principal”, esquina da rua General Osório com a Saldanha Marinho. Arranjado pela tia, Dora, prostituta famo-sa, dona de uma movimentada casa de tolerância no centro da cidade. Fazia faxina, arrumava a

O saque na Casa Robinloja, entregava pacotes. Basta-va a “carteira de saúde” para trabalhar. Os 140 cruzeiros de salário entregava ao tio Egídio, com quem morava. Ele lhe de-volvia 10, para passar o mês.

Certa vez, a tia Dorinha o apresentou ao diretor artísti-co da rádio Clube. Aprovado em teste, passou a fazer parte do elenco da emissora como “o menino cantor”. Participava três vezes por semana em um

programa.Cantava ainda em cidades

vizinhas. Recebeu elogios de Sílvio Caldas, intérprete de su-cesso, que numa ocasião se exi--biu no mesmo palco.

Com o dinheiro ganho na atividade artística, ia aos filmes do cine São Paulo e vestia rou-pas escolhidas pela tia Dora na Casa Castanheira. Era para ele um período de felicidade, anos 44 e 45, primeira metade.

Por outro lado, terminava a II Guerra Mundial. Para expor-tar alimentos para a Europa destruída, faltavam no Brasil alguns produtos, como óleo comestível, açúcar e sal, que foram racionados. A qualidade do pão piorou, com a mistura de fubá à farinha de trigo. O câmbio negro era uma saída só para quem tinha bastante di-nheiro, pois um quilo de açúcar custava cinco vezes mais.

Foto Marcio Polacchini

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Em Ribeirão, toda semana populares faziam passeata e comício contra a cares-tia. O comércio baixava as portas rapida-mente. Já se ouvia falar de saques no Rio e São Paulo.

Uma manhã de 1945, Barbosa, que tra-balhava nas proximidades, assistiu ao saque na Casa Robin, armazém de oito portas na esquina da rua Saldanha Marinho com a Duque de Caxias. Grande número de pessoas que vinham da avenida Francisco Junqueira parou em frente. Não deu tem-po de descer as portas. Alguns entraram. Um deles saiu levando uma mercadoria qualquer. Pronto. A multidão arremeteu-se para dentro, pulou os balcões, carregou pacotes de sal, latas de banha, conservas, rolos de fumo em corda, etc. Em meio à gritaria e empurrões, os empregados fu-giram apavorados. Quase uma hora de pânico. À tarde, Barbosa viu tudo calmo,

porém notou que os dois proprietários da Casa Robin, sentados em um banco, vigia-vam. Dava para avistar um revólver na mão de um deles.

Dias depois, chegou a Ribeirão um trem cheio de policiais do Rio de Janeiro. Era a temida Polícia Especial de Getúlio Vargas, bonés vermelhos e fardas amarelas. Com fuzis e metralhadoras, os soldados ocuparam o centro por umas três sema-nas. Até que se foram. E a cidade voltou ao normal.

Eis que um morador do prédio inter-rompe a entrevista. Está preocupado, pois notou um vazamento de água. Acha que vem do apartamento de cima. O síndi-co Barbosa, educado como sempre, nos pede licença. Solícito, vai atendê-lo. Dá um descanso à sua memória prodigiosa e se transporta para o século XXI, década de 10. É hora de trabalhar.

Em Ribeirão, toda semana populares faziam passeata e comício contra a carestia.

Foto Marcio Polacchini

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Sorveteria cativa freguesia ribeirãopretana há 38 anos

O sorveteiro Geraldo Caramori (a esq.) ao lado do funcionário José Aparecido Cândido. Os sorvetes preferidos do Geraldo? Ameixa, crocante e milho verde.

André Dutra

São poucos os lugares que podem ser considerados pontos obrigatórios das cidades onde ficam. A Sorveteria do Geraldo, há 28 anos em Ribeirão Preto, é um deles.

Com uma média de temperatura anual de quase 38 graus, o sorvete é um boa pedida aos ribeirãopretanos e visitantes para se refrescar.

De origem humilde, Geraldo trabalha-va na fazenda até 1949 quando veio para

a cidade trabalhar na Sorveteria Osca-rino, que ficava na Rua Barão do Ama-zonas. Ele considera o antigo patrão um excelente professor, e trata este primeiro trabalho como uma verdadeira escola em que aprendeu a fazer de tudo um pou-co, desde os serviços mais pesados até a produção dos sorvetes. Em 1952 retor-nou para fazenda do pai, que estava do-ente. Mas em 1961 voltou para Ribeirão Preto e trabalhou novamente na antiga sorveteria. Cinco anos depois conseguiu um empréstimo com o sogro e comprou

o estabelecimento do antigo patrão. Personalidades importantes da cidade

já estiveram na sorveteria, inclusive al-guns políticos, como os últimos quatro prefeitos da cidade. Mas nem só de visitas conhecidas vive o local, que “já foi assal-tado uma vez há muito tempo”, segundo José Aparecido.

A rotina em uma sorveteria começa às seis horas da manhã para iniciar os prepa-rativos e às oito abre as portas aos clien-tes. Os funcionários começam a trabalhar ao meio-dia e a jornada de trabalho só

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termina com a saída do último cliente. Com essa rotina o expediente pode

ser encerrado mais cedo por falta de sor-vete, o que é raro, segundo o próprio Ge-raldo, mas de vez em quando acontece. Em média são 15 a 16 horas de trabalho diário, inclusive fins de semana e feriados.

Mônica Teixeira comenta que sempre traz os familiares que moram em São Paulo para dar uma passada na sorveteria. “A gente adora, o sorvete, não tem igual. Acho que é o melhor sorvete de Ribei-rão”, diz ela.

Com produção diária de 1.000 a 2.000 sorvetes, Geraldo não demonstra can-saço. Um dos motivos é sempre atender bem o cliente, além de gostar do que faz. Em entrevista à Revista Viés, ele conta detalhes sobre a produção do sorvete e revela os planos para o futuro.

Como são produzidos os sorvetes?O sorvete é produzido em tambores

de 15 kg e a base, a massa que se tornará o sorvete, é congelada e batida no dia se-guinte. É preciso ter alguns cuidados du-rante o preparo. O leite, por exemplo, é fervido antes de ser batido. Os produtos são todos naturais, porque são melhores para a saúde e por não terem conservan-tes.

Quais são as principais dificuldades em administrar uma sorveteria?

Um dos problemas é o consumo do sorvete depois de pronto. É complicado de cuidar porque cristaliza e precisa levar para o fogo, mas aí perde a qualidade. Ou-tra dificuldade é o clima, porque quando chove o movimento diminui, mas quando faz frio se mantém.

O funcionário Carlos Correa prepara a massa do sorvete de nozes. Durante o preparo, oferece aos clientes um pouco do sabor feito na hora.

Quais os planos para o futuro?Um dia eu penso em ensinar a fazer

um bom sorvete. Parece fácil, mas não é. Tem que saber escolher bem os pro-dutos, ver se eles são de boa qualidade, depois se aprende a limpar o tambor da forma correta, a descascar a fruta, a bater na máquina... O processo é longo, mas é muito bom.

Tem gente que faz uma faculdade e se forma, estes anos de experiência são para mim quase como uma faculdade. São mui-tos anos, olha quanta coisa eu já passei, mas um dia eu preciso passar o conhe-cimento adiante, para que outras pesso-as possam aprender a fazer um sorvete que seja bom e gostoso, e com qualidade também.

“Um dia eu penso em ensinar a fazer um bom sorvete. Parece fácil, mas não é”

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O esporte sem idade

Stephanie Locci

O aumento pela procura por esportes, principalmente por pessoas com idade mais avançada mostra a preocupação com a saúde e com um envelhecimento saudável. A corrida é um deles. Apesar de ser um esporte de alto impacto, o interesse. O esporte pode ser praticado por idosos, sozinho ou até mesmo em grupos.

As provas e maratonas também servem de estímulo, já que muitos querem vencer seus próprios obstáculos e mostrar que são capazes.

É importante, porém, ter conhecimento dos benefícios e dos ris-cos que o esporte pode trazer. O personal trainer Mateus Juvêncio atenta para os cuidados necessários para a prática da modalidade. “Por ser uma modalidade de muito impacto e como as articulações nos idosos estão mais fragilizadas, nada de exageros. O ideal é correr no máximo três vezes por semana e conciliar a atividade com treinos de musculação ou hidroginástica.”

Quanto aos benefícios decorrentes da corrida, Mateus ressalta a redução da circunferência abdominal e consecutivamente a baixa de riscos cardíacos. Há também redução do colesterol recorrente à perda de gordura e a liberação dos hormônios endorfina e adrenali-na, aliados ao bem estar e à prevenção de doenças psicológicas.

O aposentado em contabilidade Walter Locci, 76 anos, descobriu há 28 anos na corrida a maneira de manter uma vida ativa e saudá-vel. Um porte físico acima do esperado para uma pessoa mais velha. Treina pela manhã todos os finais de semana e participa de compe-tições no clube que frequenta. Ele acredita que o esporte não tem idade para começar, basta você querer. “Comecei tarde, mas não me arrependi. Acho que as coisas acontecem no momento certo”, conta Locci. Leia trechos da entrevista concedida à Viés:

O início da prática de um esporte não tem idade, basta orientação e acompanhamento profissional

Walter Locci em uma competição

Stephanie Locci

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Viés- Porque tão tarde essa procura?

Walter Locci- Busquei no esporte uma nova vida. An-tes disso eu era uma pessoa como outra qualquer: traba-lhava muito e não tinha muito tempo para nada. Depois de um problema de saúde rela-cionado com o stress, o mé-dico pediu para que eu pro-curasse uma atividade física. Ele explicou que o esporte seria uma válvula de escape.

V- Como foi que come-çou a correr?

Como era há muito tempo atrás eu achei que só fosse começar e pronto. Mas como eu leio muito e depois desse episódio eu passei a assinar revistas relacionadas à saúde. Foram essas revistas que me direcionaram.

V- Como é para você ter 76 anos e ter uma vida tão ativa?

W-Olha, não tem explica-ção. Correr para mim é mui-to importante. É uma moti-vação. Sou uma pessoa com idade avançada, mas procuro não me deixar levar por isso.

Walter no lugar mais alto do pódio: 1º lugar

Stephanie Locci

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As vezes eu até exagero na corrida, meus familiares ficam bravos comigo, mas é o que eu gosto de fazer. Corro todo fim de semana no clube de Regatas e às vezes participo de corridas lá. Mas não são corridas de longa distância. Como eu sempre estou por lá e o assunto corrida sempre me cativou, eu acabo me ins-crevendo.

V- Já ganhou algumas medalhas?

W- Sim (risos). A gente corre para isso, né. No co-meço eu ganhei algumas me-dalhas por participação. Eu não podia arriscar muito pela minha idade, mas como eu vi que eu podia mais, eu passei a competir com vontade.

V- Não sofre problemas de joelho e articulações por causa de idade ?

W-Claro, meu corpo não é mais novinho. A máquina já está velha (risos). Tive alguns problemas principalmente no tornozelo e no joelho. Como me cuido muito o médico disse que os problemas não foram graves. Mas hoje em

O treino para idosos deve seguir algumas especificidades e cuidados devem ser tomados. Veja abaixo algumas dicas:

- Realizar junto à seu médico ou personal uma avaliação física para adaptar o treino correto a sua iddade e condição física- Conciliar a prática das atividades físicas com uma alimentação saudável para repor as energias- Alternar os dias de corridas com dias de musculação ou hidroginástica- Estar continuamente se hidratando durante o exercício- O alongamento previamente ao exercício e até mesmo alguns minutos de caminhada é importante.

dia eu tenho que correr com menos velocidade. Segundo ele logo vou ter que diminuir mais ainda.

V- Você se considera um viciado em corrida?

W-Não (risos). Bom pen-sando bem, talvez. Todo fim de semana eu preciso ir ao clube treinar. Não posso ficar com o intervalo de tempo entre um treino e outro.

V- E você deixa de fazer as coisas para ir ao clube?

W-Sim, como vou todo fim de semana eu tenho que abdi-car de algumas coisas. Minha esposa não gosta muito disso, mas ela entende e me apoia. Ela também tem uma vida ati-va, mas ela só não trabalha. Eu ainda exerço a minha profis-são.

V- E quando viaja, procu-ra algum lugar para prati-car o esporte?

W-Sou um atleta minha filha (risos). Não posso dei-xar de praticar. Quando viajo para a praia ou qualquer ou-tro lugar eu procuro um local para correr.

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Cavalgadas de reabilitação

A reportagem da Viés passou uma tarde no Haras Manuel Leão e acompanhou as

atividades de reabilitação de crianças com

necessidades especiais no Centro de Equoterapia

Matéria e fotosJuliana Jurkovick Garzon

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Coloquei o pé na estrada. Depois de pouco mais de 20 minutos de viagem pela rodovia Cândido Portinari, entre Ribeirão Preto e Brodowski, a placa indicou o

quilômetro 327, o que significava que o meu destino estava perto.

No meio do caminho já deu para sentir a mudança no ar. A paisagem da estrada é só cana, mas, ao entrar pe-los portões do haras, o verde vai até onde a vista consegue alcançar. No meu caso, já que estava usando óculos de grau, isso significa alguma coisa.

Cheguei ao local e fui direto ao re-feitório procurar pela Néia, a coor-denadora da Equoterapia. Sentei num sofá, no canto do refeitório, e a vista era, no mínimo, refrescante. A brisa soprava de forma leve, o suficiente para você desejar morar ali e esque-cer a fumaça, os prédios e o barulho da cidade. O meu pensamento exato foi: “Deve ser bom trabalhar aqui. É tudo tão tranquilo”.

Fomos dar uma volta pelo haras. No Centro de Equoterapia, um

garoto estava fazendo o tratamento. Mas fui orientada a ficar longe, porque ele já era muito agitado. E, realmente, enquanto conversávamos, ele gritou “Ihaaa!” e parecia feliz. Mas logo fez um estardalhaço e começou a se jogar do cavalo, que, depois, descobri ser, na verdade, uma égua chamada Filó. En-tão, tiveram que tirá-lo do animal.

De acordo com as normas da As-sociação Nacional de Equoterapia (ANDE), a equipe deve ser, minima-mente, formada por três profissionais: psicólogo, fisioterapeuta e profissional de equitação. Outros orientadores,

como pedagogos, também podem contribuir para o tratamento. As ses-sões duram meia hora e não mais do que isso. Parece pouco, né? Não em cima do cavalo. E muito menos para uma criança com dificuldades moto-ras. De acordo com Néia, estudos comprovam que meia hora faz o pa-ciente ter, em média, 300 contrações musculares. Já não parece tão pouco.

Não é todo paciente que pode fa-zer o tratamento. Eles têm que ter idade mínima de três anos, mas não

há limite, pois até idosos, vítimas de derrames ou AVCs (Acidente Vas-cular Cerebral), podem usufruir do método terapêutico. Primeiramente, o médico de cada paciente deve au-torizar a modalidade. É feita, então, a avaliação para definir o objetivo do

tratamento, quais músculos devem ser fortalecidos e quais passos do ca-valo vão ajudar nisso. Para um aluno mais agitado, o cavalo deve dar pas-sos mais largos e caminhar de forma tranquila. Já para um calmo e “pregui-çoso”, a marcha do animal dá o ritmo necessário. Dois cavalos fazem parte da equipe da Equoterapia: a Filó e o Pingo.

Néia voltou para me buscar e me levou até o outro estábulo onde ficam os cavalos usados nas aulas de equita-ção. Dentre os que estavam hospeda-dos por lá, conheci Thor, um dos meus preferidos. A pelagem dele é uma mis-tura de branco com cinza e ele era grande, mas não tanto quanto Bill.

Bill foi o segundo cavalo que vi nes-te estábulo, mas vai ser difícil esque-cê-lo, ou melhor, esquecer a sua altu-ra. Quando olhei na baia, o “quarto” dos cavalos, tive que olhar para cima para ver onde acabava sua cabeça.

Eu tenho 1,75m de altura e tive que subir meu olhar para um cavalo. A mi-nha primeira reação diante desse fato foi olhar para baixo, jurando que de-veria ter um degrau atrás da portinha da baia. Não tinha. O cavalo de pêlo marrom e crina preta brilhante real-mente era maior que eu.

Chegou a hora de mais uma sessão de Equoterapia. Apresentei-me à mãe da garota e pedi para assistir ao trata-mento de sua filha. Ela disse que não havia problema, mas não ficou por lá para conversarmos. A garota come-çou nervosa, sem querer relar muito no animal. Na verdade, ela queria mais abraçar os profissionais do que o Pin-go. Mas, depois que a colocaram no

As sessões duram meia hora e não mais do que isso. estudos comprovam que durante esse tempo paciente tem, em média, 300 contrações musculares.

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cavalo, ela parecia realmente aprovei-tar as voltas que davam pela arena.

Como todos nós, na maioria das vezes as crianças têm receio no pri-meiro contato com aquele grande animal que, mesmo sendo grande para eles, devo ressaltar, são bem menores do que o Bill. Então, o primeiro pas-so do método, depois de definidos os exercícios, é fazer a adaptação dos pa-

já estão cansados demais para se empolgarem e saírem galopando ou, então, para se importarem com uma puxada na orelha.

Depois de terminada a sessão da menina, um casal trouxe o seu filho. Fiz a mesma coisa: apresentei-me aos pais, expliquei o que estava fazendo lá e pedi para ficar. Eles também dei-xaram. Mas, desta vez, a mãe de João Victor veio conversar comigo.

E l a me contou que ele nasceu

prematuro, com seis meses, e que fal-tou oxigênio no cérebro, o que pre-judicou o movimento de seus mem-bros. Depois de ter passado dois meses na incubadora, ele finalmente pôde sair do hospital. A mãe, forma-da em psicologia, abandonou tudo para cuidar do filho, que, apesar de morar em Ribeirão Preto há apenas dois anos, faz questão de dizer que esta é a sua cidade natal, e não São

Paulo, onde nasceu. Agora com 12 anos, João Victor

está na sétima série e só consegue fazer as provas oralmente. Até a de Matemática. Aliás, ele tirou 5,75 na úl-tima avaliação da matéria, que valia 6.

A alegria dele em ver Filó era vi-sível e au-

dível. Ele conversava e sorria totalmente confortável, com o cavalo comendo feno no seu colo. Depois de montar no animal,

ele começou a dar voltas e, conforme Filó requebrava, os seus cachos ruivos dele balançavam como se tivessem sido enrolados.

Um dia perguntaram para ele na es-cola se ele gostaria de andar e correr e a resposta foi: “o que você acha?”. A mãe disse que, mesmo depois de todos esses anos, tudo ainda é difícil. Mas ver crianças em situações con-sideradas mais graves do que a dele, como uma colega cega de São Pau-lo, dá força para não desistir. Em dois

Animais fazem parte da Fazendinha

cientes aos animais. Primeiro a criança se acostuma

a dar feno na boca, a passar a mão pela barriga, a escovar, para só depois montar. O tempo que cada paciente demora para ter confiança suficien-te para subir no animal é variável. O cavalo também é criteriosamente es-colhido. Os tratadores os conhecem desde que eram potrinhos. Então, já sabem quais são os mais mansos. A preferência é pelos mais velhos, que

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meses de tratamento, o médico já co-meçou a notar os resultados positivos da Equoterapia.

Ainda mais importante que as ob-servações dos médicos e dos pais, é quando o paciente também consegue ver os resultados do trabalho. O tra-tamento, aliás, para as crianças, não pode ser definido como trabalho, e sim como se fosse um passeio.

Depois de voltar de sua excursão pela arena, João Victor se despede de

todos, obrigado pela mãe, já que está na hora de ir embora, brincando que ela foi feita para “comandar o BOPE”.

Outra paciente chegou, mas estava na hora de eu ir embora. Na hora do “tchau”, o condutor dos cavalos na Equoterapia confessou que queria ter estudado jornalismo, mas que desis-tiu porque era difícil arrumar um bom emprego e, então, resolveu se dedicar à fisioterapia.

Não conversamos mais, porque o

A arena onde é feita

a Equoterapia

Pingo estava praticamente pedindo comida. E, no Manuel Leão, os cavalos têm preferência.

Durante a viagem de volta, olhando já para o pôr do sol, fiquei pensando em toda a dedicação daquele pessoal do haras, das famílias dos pacientes e na sua força de vontade.

Esse dia me fez perceber como con-sideramos banais ações que podemos fazer todos os dias, só porque conse-guimos fazê-las automaticamente.

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João Victor, a equipe da

Equoterapia e a égua Filó

Quando tropeçamos na vida, acha-mos, muitas vezes, que está tudo ter-minado. Enquanto isso, essas pessoas, essas crianças, estão tentando não cair do cavalo. De novo.

A Equoterapia é um método tera-pêutico e educacional, reconhecido, no Brasil, em 2007, como um trata-mento de reabilitação, que utiliza o cavalo em uma abordagem interdisci-plinar, nas áreas de saúde, educação e equitação. O objetivo é desenvolver o biopsicossocial de pessoas com defici-ência ou com necessidades especiais.

O Haras Manoel Leão foi fundado em 2003 e possui um Centro de Equo-terapia com capacidade para atender 250 praticantes. Filiado ao Ande Brasil (Associação Nacional de Equotera-pia), o haras atende, na maioria, crian-ças com paralisia cerebral. Destes, 63 pacientes dependem de padrinhos para fazer o tratamento semanal.

Qualquer pessoa, ou empresa, pode manter um paciente com R$300 men-sais. O dinheiro é usado na contrata-ção dos profissionais e o haras forne-ce a estrutura e o animal.

O Manoel Leão fica na rodovia Cândido Portinari, quilômetro 327, entre Ribeirão Preto e Brodowski. Informações: 3617-1496.

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