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  • http://www.periodicos.ufrn.br/ojs/index.php/saberes/index

    ISSN 1984-3879, SABERES, Natal RN, v. 2, n.esp, jun. 2011

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    EDUCAO PARA AS RELAES TNICO-RACIAIS E ENSINO DE HISTRIA NA EDUCAO BSICA

    Crislane Barbosa Azevedo*

    Resumo: Com base em pesquisa bibliogrfica e fontes normativas, neste estudo de carter propositivo, discorre-se acerca das polticas pblicas para a Educao Bsica com nfase nas relaes entre o ensino de Histria e a educao para as relaes tnico-raciais e apresenta possibilidades de aes didticas promotoras e valorizadoras das identidades dos alunos dos diversos nveis da escolarizao bsica. Para tanto, foi feita pesquisa bibliogrfica e em fontes legais. Observa-se o muito j promulgado e regulamentado. Espera-se que as instituies de ensino obtenham condies humanas e materiais para assumirem efetivamente seu papel social e poltico de reconhecimento, valorizao e difuso da pluralidade tnico-racial do Brasil. Contribuem para tanto, aes docentes e institucionais (Projeto Poltico-Pedaggico) em perspectiva multicultural, transversal e interdisciplinar bem como a diversificao de estratgias metodolgicas, linguagens e recursos didticos.

    Palavras-chave: Educao das relaes tnico-raciais; Ensino de Histria; Educao Bsica.

    Abstract: Based on a literature and regulatory sources, in this study with its propositional discourses themselves about public policy for Basic Education, with emphasis on the relationship between history teaching and education for the ethnic-racial relations and its possible actions promoting educational and optimizing the identities of students of different levels of basic schooling. Therefore, it was made in literature and legal sources. There is much already enacted and regulated. It is expected that the educational institutions to obtain human and material conditions to effectively assume its social and political recognition, appreciation and dissemination of ethnic and racial diversity of Brazil. Contribute to both, teaching practices and institutional (political and pedagogical project) in a multicultural perspective, cross-and interdisciplinary as well as diversification of methodological strategies, languages and teaching resources.

    Key words: Education of the ethnic-racial relations; Teaching of History; Basic Education.

    De forma paradoxal, a sociedade brasileira e a sua organizao escolar, apesar da

    * Doutora em Educao e Professora Adjunta do Departamento de Educao da Universidade Federal do Rio

    Grande do Norte.

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    forte experincia de passagem por um processo civilizador de origem europeia fruto de longo perodo de colonizao portuguesa, expe caractersticas e requerem tratamento pautado na diversidade tnico-racial. O processo de silenciamento histrico-cultural por que passaram indgenas e africanos e seus descendentes no foi suficiente para apagar costumes, valores, histrias, vises de mundo que so hoje culturalmente reconhecidos e legalmente institudos como formadores da histria do Brasil.

    Diferentes aes desenvolvidas junto aos rgos estatais em prol do reconhecimento e valorizao de histrias de afro-brasileiros e remanescentes de naes indgenas podem ser consideradas como fruto das lutas de movimentos sociais organizados, a exemplo do movimento indigenista, do movimento negro, do movimento feminista, entre outros, contra a discriminao e em busca do reconhecimento de direitos de cidadania. As atuais aes voltadas para o tratamento das relaes tnico-raciais so afirmadas como pluralidade cultural e integram as polticas pblicas para a educao escolar bsica. A Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, Lei n. 9.394 de 1996 (Art. 26), confirmou o estabelecido pela Constituio Federal de 1988 (Art. 242) ao determinar que o ensino da Histria do Brasil dever levar em conta as contribuies das diferentes etnias para a formao do povo brasileiro, especialmente das matrizes indgena, africana e europeia.

    Diante do exposto, questiona-se: de que maneira pode-se articular a educao das relaes tnico-raciais e o ensino de Histria na Educao Bsica (Educao Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Mdio e Educao de Jovens e Adultos)?

    A partir do desenvolvimento de pesquisa bibliogrfica e anlise de fontes normativas, neste artigo de carter analtico, discorre-se a respeito da normatizao relativa Educao Bsica com nfase nas relaes entre o ensino de Histria e a educao das relaes tnico-raciais e apresenta possibilidades de aes didticas promotoras e valorizadoras das identidades dos alunos dos diversos nveis da escolarizao bsica.

    Ao refletir sobre a educao das relaes tnico-raciais e a sua vinculao ao processo ensino-aprendizagem em histria contribui-se para a compreenso do atual estgio em que se encontra o ensino da disciplina no pas assim como das aes governamentais em favor do reconhecimento e da valorizao da diversidade da histria e da cultura brasileira. Parte-se do pressuposto de que a interface entre educao das relaes tnico-raciais e ensino de Histria possibilita meios para conscientizao da importncia de grupos como os remanescentes de naes indgenas e os afro-brasileiros, por exemplo, na construo do Brasil, medida que contedos e saberes prprios e relativos s suas especificidades tero

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    lugar nas atividades escolares. Assim, ressalta-se a importncia da promoo de tal conhecimento, tendo em vista a promoo de uma sociedade democrtica, cidad e historicamente consciente.

    A Educao Bsica tem incio com a Educao Infantil. Esta nem sempre esteve presente na legislao educacional brasileira. Apenas na segunda metade do sculo XX ganhou visibilidade nacional, foi reconhecida e passou a integrar a poltica educacional do pas. Na dcada de 1970, assistiu-se ao movimento de mes pelo aumento de creches. Tal reivindicao ganhava fora com movimentos negros que denunciavam as altas taxas de evaso das crianas negras nas primeiras sries de escolarizao e demonstravam assim a necessidade da ampliao do acesso de tal pblico s creches. Na dcada de 1980, conhecida como a Dcada do Repensando ampliaram-se as discusses acerca da criana, da infncia e da educao infantil acompanhando os debates em prol da reorganizao da educao escolar no Brasil. Como fruto desse movimento, a Constituio de 1988 registrou pela primeira vez, a Educao Infantil como um direito da criana. Este, aprofundado pela LDB no. 9.394/96, passou a integrar a Educao Infantil Educao Bsica. Apesar desse movimento, possvel encontrar ainda pr-escolas e, principalmente creches, onde predominam um carter assistencialista em detrimento da ateno aos aspectos pedaggicos, do processo de desenvolvimento cognitivo e de socializao da criana onde tem espao a vivncia na diversidade. Resultados de tais reclamaes nos anos de 1970 e 1980 se fizeram presentes na Constituio de 1988 tambm no que se refere a uma poltica de reconhecimento e valorizao da diversidade tnica e cultural. O racismo, por exemplo, passou a ser considerado crime inafianvel. O contexto era propcio para a produo de uma legislao favorvel a projetos multiculturais, a exemplo das aes afirmativas que ganharam espao junto aos governos na dcada seguinte - 1990. Como, diante desse quadro, trabalhar na Educao Infantil princpios histricos e relaes tnico-raciais?

    Os aspectos materiais e afetivos em todas as instncias so significativos para o desenvolvimento da criana da Educao Infantil. Suas concepes de vida e vises de mundo comeam a se desenvolver nesse perodo. Em decorrncia disso, as palavras e, sobretudo, as aes tm significado e repercusso no processo identitrio da criana. Por muito ausente das polticas pblicas para a educao no Brasil, a educao escolar das crianas de zero a cinco anos vm, nas trs ltimas dcadas, ampliando seu espao. Contribuem para isso, tanto aspectos cientficos como o aumento das pesquisas sobre o desenvolvimento infantil e o reconhecimento e ampliao dos direitos das crianas; quanto aspectos de ordem prtica,

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    como a necessidade de atendimento s famlias cujas mes ingressaram no mercado de trabalho e o aumento de profissionais habilitados para o trato com a escolarizao das crianas em decorrncia do aumento do acesso ao ensino superior no Brasil.

    Aos docentes dedicados primeira fase da Educao Bsica imprescindvel, em primeiro lugar, clareza e coerncia na sua definio de criana, infncia e educao passando obviamente pelo conhecimento da histria da criana e das atuais polticas pblicas para tal modalidade escolar. Tal conhecimento necessrio para evitar equvocos quanto aos direitos das crianas e aos deveres dos adultos para com elas e, consequentemente evitar omisses prejudiciais ao desenvolvimento de meninos e meninas. Nesse aspecto, Romo (2001) chama a ateno para os cuidados que se deve ter com crianas afro-descendentes em prol de um processo educativo marcado pelo respeito diferena tnico-racial e, portanto anti-racista:

    Ao olhar para alunos que descendem de africanos, o professor comprometido com o combate ao racismo dever buscar conhecimentos sobre a histria e cultura deste aluno e de seus antecedentes. E ao faz-lo, buscar compreender os preconceitos embutidos em sua postura, linguagem e prtica escolar; reestruturar seu envolvimento e se comprometer com a perspectiva multicultural de educao. (ROMO, 2001, p. 20).

    Em segundo lugar, preciso ter cincia de que o processo ensino-aprendizagem nesta fase consiste em aes interativas onde se mesclam prticas educativas e de proteo. Educar, de acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educao Infantil, significa:

    [...] propiciar situaes de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relao interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude bsica de aceitao, respeito e confiana, e o acesso, pelas crianas, aos conhecimentos mais amplos da realidade social e cultural (BRASIL, 1998c, p.23).

    Os contatos, dessa forma, precisam ser marcados por sensibilidade e relaes de alteridade. Nesse sentido, a diversidade do grupo infantil com o qual se trabalha necessita ser considerada. importante que as particularidades das crianas em seus aspectos culturais, familiares e sociais sejam conhecidas, respeitadas e valorizadas pelos professores. Dessa

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    maneira, alm de integrar-se de forma saudvel a um processo de socializao a criana aprende sobre si mesma, sua famlia, sua gerao e experimenta assim, um primeiro contato com uma aprendizagem em histria devido presena das relaes significativas entre presente e passado corrente nesse processo.

    Uma postura docente caracterizada por aes interativas negativas e, portanto, diferente desta aqui delineada, pode gerar danos irreparveis construo da identidade da criana e sua trajetria educacional. Esse fato remete-nos formao inicial do docente da Educao Infantil. preciso que durante essa formao, em meio ao domnio de saberes disciplinares e pedaggicos (GAUTHIER et. all., 1998), o futuro profissional vivencie prticas de interao onde sua sensibilidade possa ser exposta, trabalhada e melhor desenvolvida, fazendo com que este desenvolva sua capacidade de exposio afetiva, necessria queles que se dedicam primeira fase da Educao Bsica.

    Mas, como ensinar e aprender histria a partir de demonstraes de cuidado e afeto e tendo em vista a educao das relaes tnico-raciais? O processo to complexo quanto desafiante. Contudo, possibilidades podem ser apontadas. O contar histria pode ser um meio utilizado, por exemplo, para que as crianas aprendam sobre famlia, seus diversos tipos e mudanas atravs do tempo e assim, na historicizao das relaes familiares, compreender mudanas e permanncias a fim de evitar-se discriminaes. Da mesma forma importante historicizar, ou seja, conhecer explicaes acerca da existncia das diferentes caractersticas fsicas das pessoas e valorizar essa diversidade. Acresce a isso, a exposio do professor sobre saberes tradicionais, com referncia aos adultos e idosos. Tal ao pode favorecer a relao das crianas com o respeito sabedoria dos mais velhos, aspecto to presente nas tradies indgenas e africanas. Alm disso, o contar histria materializa a prtica da oralidade, a transmisso de informaes entre geraes e o consequente exerccio da memria, em uma aproximao das atividades dos griots42. Famlia, oralidade, respeito aos mais velhos e valorizao da diversidade entre os indivduos podem igualmente integrar as rodas de conversa.

    A roda ou rodinha, to utilizada nas instituies de educao infantil e inserida na rotina das mesmas, possui um significado importante para

    42 Griots so os guardies, intrpretes e contadores da histria oral de muitos povos africanos. Sua

    funo a de conservao da memria coletiva e sua figura tem enorme funo na conservao da palavra, das narrativas, sem o uso da escrita. Sua arte baseia-se na oralidade e na memria.

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    diversas culturas e tambm para a indgena e africana. Na roda, possvel romper com as hierarquias, existe espao para a fala, todos se vem. na roda que se conta histria, novas msicas e brincadeiras so aprendidas, que so feitos os combinados. Retomar a roda como princpio de organizao, como maneira de aprender coletivamente j um exerccio cotidiano de busca de respeito diversidade. (BRASIL, 2006, p.166-167).

    Nesta busca pelo respeito diversidade, importante considerar as experincias religiosas. Princpios, representaes e festividades de orientaes crists so toleradas frequentemente em instituies educacionais, no ocorrendo o mesmo com as relacionadas s matrizes indgena e africana. O silenciamento, por vezes observado, resulta destrutivo para a auto-estima de determinadas crianas, que no se vem representadas em textos, atividades e valores na instituio em que passa grande parte do seu dia.

    O conhecimento acerca de diferentes histrias e culturas, nos princpios apregoados pela Lei 10.639/2003, responsvel pela determinao da obrigatoriedade do ensino de Histria e Cultura africana e afro-brasileira, necessita se materializar como premissa educativa e para tanto requer relaes de continuidade. Aes circunscritas aos dias referentes a datas comemorativas contribuem para a estereotipizao de eventos e sujeitos histricos, a exemplo do que ocorre com o 19 de abril - Dia do ndio - que bem poderia ser lido, em algumas instituies, como o dia de pintar o rosto das crianas e, portanto, sem histrias, experincias, exposio de imagens de diferentes comunidades indgenas, brincadeiras etc. ao longo do ano escolar. Em busca de mudanas em tal cenrio e para que se evite que outras datas, como o 20 de novembro - Dia Nacional da Conscincia Negra - no sejam trabalhadas tambm de forma descontextualizada, importante que os profissionais da educao conheam comunidades negras e indgenas locais bem como datas comemorativas existentes no lugar. No mesmo sentido, relevante torna-se o conhecimento acerca das manifestaes culturais locais. Quais os significados, por exemplo, entre outras manifestaes, do maracatu, do congo, da congada, do reisado, do samba de roda, do lambe sujo e caboclinho, do tambor de crioula? Conhecer suas histrias e o porqu das suas celebraes imprescindvel para a compreenso contextualizada de datas, personagens e eventos histricos. Assim, torna-se mais vivel a aproximao das crianas quilo que elas aprendem na creche ou na pr-escola43.

    43 De acordo com a LDB n. 9.394/96, Art. 30, a Educao Infantil ocorrer em creches, para crianas

    at trs anos de idade; e, em pr-escolas, para crianas de quatro aos seis anos.

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    Aes fundamentais tambm no caminho da efetivao da diversidade como princpio educativo na Educao Infantil so as brincadeiras. Por meio delas a criana pode imaginar, prestar ateno, comunicar-se, interpretar, opinar e reconhecer o outro. Dessa

    maneira, o docente pode, ao coordenar o processo educativo e em meio ao brincar, inserir histrias infantis de diferentes referenciais civilizatrios. As crianas precisam ir alm de Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho e Cinderela. Bruna e a galinha dAngola, As tranas de Bintou, Ana e Ana, Histrias da Preta, Menina bonita do lao de fita44, entre outros, so bons exemplos de histrias infantis que ajudariam professores e alunos da Educao Infantil a melhor vivenciarem uma educao plural.

    Diante do exposto fica evidente que o xito do trabalho docente depende em grande parte do conhecimento que se tem dos alunos, de maneira geral e especfica. Tal saber condio necessria para um planejamento coerente e exequvel. Da mesma forma que a professora da Educao Infantil precisa conhecer seus alunos em suas individualidades e dominar conhecimento sobre a histria da infncia, o docente do Ensino Fundamental precisa compreender o pblico da segunda fase da Educao Bsica. Compreender alunos de 06 a 14 anos, implica conceb-los como sujeitos complexos, requer do professor conhecimento de diferentes reas como a Psicologia, Biologia, antropologia, Sociologia, alm da Histria. Dessa forma, o docente adquire condies para analisar a sua prtica pedaggica e perceber a necessidade de redimensionamentos tomando por base a relao entre aprendizagem, desenvolvimento e educao.

    Ao ingressar no Ensino Fundamental, o aluno, ainda criana45, entra em contato com um universo disciplinar. Objetivos de aprendizagem, metodologias e contedos diversificam-se. Nesse novo cenrio escolar, espera-se que o discente tenha aprofundados seus referenciais de tempo e espao, necessrios apropriao do conhecimento histrico. Este, tendo em vista o atendimento das polticas pblicas para a Educao Bsica de modo geral e para o ensino de

    44 Tais histrias abrem possibilidade de uma aprendizagem plural acerca de mudanas corporais;

    beleza fsica das crianas; diferenas de gostos, opinies, jeito de ser, entre as pessoas; histria de antepassados africanos; religiosidade, culinria e outros aspectos da cultura africana no Brasil etc. Referncias completas: ALMEIDA, Gergilga de. Bruna e a galinha dAngola. Rio de Janeiro: Pallas, 2006; DIOUF, Sylviane A. As tranas de Bintou. Trad. Charles Cosac. So Paulo: Cosac Naify, 2004; Silva, Clia Cristina. Ana e Ana. So Paulo: Editora DCL, 2007; MACHADO, Ana M. Menina bonita do lao de fita. So Paulo: tica, 1999; PIRES, Heloisa. Histrias da Preta. So Paulo: Cia. das Letrinhas, 1998. Para outras sugestes, ver: BRASIL, 2006. 45

    Para efeitos de melhor compreenso sobre o pblico da segunda etapa da Educao Bsica, considera-se Ensino Fundamental Menor os cinco primeiros anos da escolarizao fundamental cujo pblico apresenta, em geral, idade entre seis e dez anos e Ensino Fundamental Maior, os quatro ltimos anos, cujo pblico apresenta, em geral, idade entre onze e quatorze anos.

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    Histria, especificamente, requer o trato com contedos que permitam, entre outros fins, que o aluno compreenda as transformaes pelas quais passaram: as famlias; as territorialidades; os hbitos, as relaes e os significados acerca do corpo; jogos, brincadeiras e outras formas de interao e comunicao, ao longo do tempo e em diferentes espaos. Em termos especficos da diversidade, no mbito dos PCN (BRASIL, 1997) so apresentados como um dos objetivos gerais do Ensino Fundamental o conhecimento e a valorizao da pluralidade do patrimnio cultural do pas e afirma que alunos e professores devem contraporem-se a quaisquer formas de discriminao baseada em diferenas culturais de sexo, de etnia ou classe social, por exemplo.

    A percepo sobre as mudanas e permanncias, diferenas e semelhanas no decorrer da histria da humanidade o caminho propcio para a percepo, reconhecimento e respeito dos alunos diversidade e consequente favorecimento promoo da auto-estima dos discentes, uma vez que inseridos em um processo ensino-aprendizagem valorizador das diferenas individuais.

    Ensinar histria de forma contextualizada e com ateno e respeito diversidade dos alunos requer atividades didticas que incentivem trabalhos coletivos onde sejam valorizadas as trocas e ao mesmo tempo consideradas as especificidades de cada um dos envolvidos. Estas, provenientes de diferentes matrizes civilizatrias precisam encontrar lugar ao longo de todo o ano escolar. Estudar em uma nica unidade didtica aspectos como costumes alimentares, vesturio e cerimnias festivas de um determinado grupo tnico-racial de forma isolada e, portanto, sem contextualizao, contribui sobremaneira para estereotipar ou banalizar os saberes do grupo e os alunos de cujos saberes so representativos.

    Por isso a importncia e necessidade do trabalho conjunto entre escola, comunidade e sistema de ensino. Essa articulao importante tambm para que se evite prticas escolares alijeiradas ou superficiais, implementadas apenas com o intuito do atendimento s determinaes oficiais, mas descontextualizadas da prtica. Um possvel encaminhamento nesse sentido, aponta-nos para a promoo de um currculo multicultural, no qual para alm dos contedos escolares e domnio terico-metodolgico esteja presente nas prticas docentes uma sensibilidade para tratar aes e imaginrio dos alunos em formao e provenientes de diferentes matrizes civilizatrias. Multiculturalismo conforme Silvrio (2000) pode ser entendido como um terreno de luta em torno da reformulao da memria histrica, da identidade nacional, da representao individual e social, bem como da poltica da diferena. e representa uma reao ao etnocentrismo.

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    De certo uma educao multicultural exige dos professores um consistente trabalho de problematizao sobre a formao da sociedade brasileira e uma consequente desconstruo de categorias para que temas e atividades escolares em torno da pluralidade cultural sejam efetivamente trabalhados nas aulas de Histria em prol da destruio de discriminaes e preconceitos veiculados tanto por meio de discursos quanto de aes.

    Numa perspectiva multicultural de currculo em Histria atento educao das relaes tnico-raciais importante pensar na diversidade de conhecimentos; prticas pedaggicas; representaes sobre raa, classe, gnero, orientao sexual etc.; nos lugares ocupados no currculo pelos sujeitos do processo ensino-aprendizagem; dar voz aos alunos; propor uma pedagogia dialgica e um processo ensino-aprendizagem com base na articulao entre ensino e pesquisa. Tais iniciativas exigem do docente um consistente planejamento de atividades.

    Ao lado do planejamento de tais atividades importante atentar para a qualidade dos recursos didticos utilizados, que precisam ser diversificados e provenientes de variadas fontes. O livro didtico, recurso mais presente nas escolas, tem recebido ateno especial nesse sentido. De acordo com o Programa Nacional do Livro Didtico, visando construo de uma sociedade anti-racista, justa e igualitria s esto autorizados pelo Estado brasileiro a ingressar nas escolas pblicas, livros didticos desprovidos de esteretipos como o da identificao exclusiva da histria a alguns heris; caricaturas de perodos ou de personagens histricos e restrio da histria memria individual ou de grupos.

    Alm disso, as obras didticas precisam: abordar a temtica de gnero e da no violncia contra a mulher; promover positivamente a imagem da mulher, de afro-descendentes e descendentes de etnias indgenas brasileiras, considerando a participao destes em diferentes trabalhos, profisses e espaos de poder; abordar a temtica das relaes tnico-raciais, do preconceito, da discriminao racial e da violncia correlata; contemplar contedos referentes ao que determina a Lei n. 9.394/96, modificada pela Lei n. 10.639/2003 e Lei n. 11.645/2008. necessrio ainda que o livro didtico de Histria seja isento de preconceitos de condio regional, econmico-social, tnico-racial, gnero, linguagem e qualquer outra forma de discriminao; seja isento de doutrinao religiosa ou poltica, respeitando o carter laico e autnomo do ensino pblico; e, no seja tratado como veculo de publicidade ou de difuso de marcas, produtos ou servios comerciais. Divergncias em tais caractersticas so motivos para excluso da obra do referido Programa do Governo Federal. (BRASIL, 2009).

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    Ao considerar ainda as singularidades dos alunos que se remetem cultura indgena e africana, importante que o docente reconhea a relao entre aprendizagem, corpo e emoo. A integrao do corpo com a natureza e com o sagrado tem significados que transcendem o espao da sala de aula e influenciam no processo cognitivo. Vises de mundo abertas para o outro, vivncias em rituais plurais e crenas em verdades mltiplas, diferentes do padro civilizatrio ocidental preponderante nas instituies de ensino formal, requerem do professor, em sala de aula, domnio terico-metodolgico da sua rea de conhecimento e sensibilidade frente escola e seus alunos.

    Um dos desafios para os sistemas educacionais no pas refere-se qualificao dos professores, principalmente daqueles que atuam nos primeiros anos do Ensino Fundamental. Muitos destes com formao polivalente e sem curso superior, precisam ser habilitados para o trabalho com temticas voltadas para questes de etnicidade. As aes formadoras precisam envolver princpios, orientaes e prticas para a desconstruo de esteretipos de raa, etnia, sexo, religio etc. e para tanto so requeridos conhecimentos para alm de teorias historiogrficas e correntes pedaggicas. necessrio, sobretudo, sensibilidade para percebermos as diferentes posturas e vises de mundo dentro de uma sala de aula.

    Em relao, especificamente, formao de professores de Histria com atuao direcionada para o Ensino Fundamental Maior e Ensino Mdio, merece ateno uma observao. Os PCN-Histria e os PCN-Temas Transversais sugerem caminhos para a efetivao de um ensino plural em termos tnico-raciais, diferenciando-se das Diretrizes para Formao de Professores da Educao Bsica (BRASIL, 2001a), mais caracterizadas pela formao por competncias. Alm disso, as Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de Histria (BRASIL, 2001b) privilegiam a formao do historiador, pautada na pesquisa. Diante das diferentes propostas de formao docente, cabe aos professores formadores o enfrentamento de mais um desafio. Tais docentes devero analisar e rever permanentemente suas prticas de forma sensvel educao das relaes tnico-raciais de modo a ir alm da considerao dessa educao como um tema de estudo ou um contedo a ser trabalhado em determinado momento da formao.

    A lei 10.639/2003 busca atendimento por meio de todas as disciplinas. Apesar disso, Histria dada ateno especial. Nesse sentido, importante salientar a necessidade de estudar a histria do continente africano e as influncias deste no continente amerciano; analisar o processo que desembocou em prticas discriminatrias e racistas para com os negros na Amrica, relacionando tal processo com a memria da escravido e as

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    consequncias desta prtica; apreender as novas pesquisas acerca das experincias concretas de criao e de transformaes culturais identitrias.

    Com relao especfica frica, urgente acabar com a falta de conhecimentos sobre o continente e suas tradies, muitas das quais inerentes formao da populao brasileira. Tal ausncia de conhecimento responsvel pela considerao do continente como um bloco homogneo e cujas caractersticas denunciam um amontoado de problemas polticos, econmicos e sociais. Esse pressuposto difuso na sociedade brasileira responsvel tambm por concepes negativas acerca da africanidade no Brasil. Um estudo sobre a frica atento a diversas temporalidades encontra defesa em obras de importantes historiadores desde a dcada de 1960. As observaes de Braudel (1989), sobre as disporas africanas estimulam a pesquisa e o ensino de temas africanistas. O historiador francs, ao se referir Histria ensinada, propunha um ensino mais pluralista e menos etnocntrico. A linearidade marcante na definio dos contedos poderia ser, em sua opinio, substituda pelas duraes, economias, cultura material, povos, entre outras possibilidades. Segundo o pesquisador,

    de notar-se o fato, importante para o mundo negro atual, de que existem fricas vivas no Novo Mundo. Fortes ncleos tnicos se desenvolveram e se perpetuaram at nossos dias no norte e no sul da Amrica, ao passo que nenhuma destas fricas exiladas sobreviveu na sia ou em terras do Isl. (BRAUDEL, 1989, p. 140).

    O professor de Histria, particularmente, precisa contextualizar prticas e representaes para que os estudantes compreendam fatos e conceitos e assim adquiram condies de analisar consistentemente a sua realidade. imprescindvel que o docente saiba selecionar o que fato histrico para os seus alunos e o que relevante para que o seu pblico especfico compreenda o processo histrico brasileiro. Dessa maneira, tem-se trilhado um primeiro caminho para a problematizao de uma histria local, regional e nacional e que seja ao mesmo tempo atenta e respeitosa para com a ancestralidade. Em outros termos, necessrio introduzir novos temas e contedos considerados universais em uma perspectiva multicultural. Realizado por diferentes meios, em atividades curriculares ou no, esse ensino deve buscar meios respeitosos de convivncia, em que todos se sintam estimulados a expor e defender as suas especificidades tnico-raciais. Como lembram os PCN-Temas Transversais (BRASIL, 1998b), compreender que valorizar as diferenas tnicas e culturais no significa aderir aos valores do outro, mas respeit-los como expresso da diversidade.

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    Alm da perspectiva multicultural, de acordo com as novas orientaes historiogrficas e com os princpios dos PCN, importante considerar a perspectiva de ensino por eixos temticos. Ambas as perspectivas devem vir acompanhadas de uma mudana pedaggica na formao inicial e continuada do docente, o que exige dos professores de Histria, sensibilidade, postura crtica, reflexo permanente sobre as aes relativas ao cotidiano escolar, no sentido de rever saberes e prticas. Isso importante para que no sejam encontradas prticas docentes permeadas pela interferncia de esteretipos e preconceitos em relao a personagens negras e com reflexos destrutveis em relao formao dos alunos.

    A escola, por sua vez, necessita estar aberta para a sociedade e para o dilogo interno entre seus agentes. O objetivo disso , para alm do acesso, a permanncia e o xito do aluno na escola. Para tanto, so recomendadas inovaes temticas e de metodologia. Estas resultam bem sucedidas quando so discutidas, analisadas e trabalhadas coletivamente, de forma gradual e com fundamentao terica. Tais orientaes promotoras de uma educao para a diversidade exigem compromisso tico e profissional. A sua presena no Projeto Poltico Pedaggico (PPP) da escola torna-se por isso, imperativa.

    importante salientar que se considera o PPP um instrumento de trabalho de todos os envolvidos com a instituio de ensino e no um simples fruto da burocracia escolar. Para isso requer a participao de todos na sua confeco, avaliao e reformulaes necessrias. Em uma perspectiva de respeito diversidade, o dialogismo e a ao frente discriminao precisam fazer parte do PPP. A escola, como fruto da sociedade, reflete problemas desta. Se h, portanto, preconceito e atitudes discriminatrias na sociedade, na escola estes tambm existem. Na elaborao do PPP, necessrio a adoo de princpios do multiculturalismo, coletividade, cooperao, circularidade, ancestralidade. Ao considerar que a escola consiste em uma instituio plural e, portanto, de respeito e acolhida das diferenas, preciso que os membros da coletividade escolar, estabeleam mesmo as atitudes a serem tomadas na escola diante de prticas de discriminao - social, cultural, racial, de gnero, econmica, religiosa, entre outras.

    Nesse compromisso coletivo, a ateno a uma educao para as relaes tnico-raciais aparece materializada no somente na prtica multidisciplinar. Ela surge nas propostas de aes interdisciplinares e da transversalidade. Exemplo, nesse sentido, pode ser posta em prtica j com o estudo inicial de palavras de origem indgena e africana no Brasil, com a materializao deste, salientando a origem das palavras, seus significados e usos na arte, na poltica, nas relaes pessoais, na organizao territorial entre outros campos. Momentos

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    especiais para atividades interdisciplinares, multiculturais e de carter transversal, so as experincias extra-classe. Planejamento para explorao do centro da cidade, comunidades, diferentes bairros, templos religiosos e museus, por exemplo, acompanhada de sistematizao e apresentao dos resultados so, em geral, motivadores e instrutivos.

    Entende-se por transversalidade, no algo reservado a uma parcela de atividades localizadas em temas ou unidades didticas especficas. Trabalhar com base na transversalidade significa atentar para as necessidades e questes do presente, encontrando o aluno, possibilidades de valorizao do seu cotidiano. Em um cenrio de prticas didticas tradicionais, evidentemente, torna-se necessrio modificao de conceitos e procedimentos pedaggicos.

    A articulao entre a histria vivida pelo aluno e os contedos apresentados pelo professor exige planejamento e capacidade de fazer um diagnstico da realidade de onde se parte e as interaes com os contedos para chegar aos objetivos apresentados pela proposta transversal. um trabalho mais dinmico e desafiador: professores e alunos so agentes da aprendizagem e os recursos didticos devem ser manipulados por ambos. (FREITAS NETO, 2004, p. 68).

    Na sala de aula de Histria, especificamente, alm de dar a devida visibilidade aos diversos sujeitos participantes dos eventos histricos ao trabalhar com os diversos contedos escolares, importante, principalmente no Ensino Fundamental Maior, abrir espao para a discusso acerca da questo racial. No caminho da diversidade, tal discusso toma diferentes dimenses, sendo a mais eficaz delas, a da prtica. O conhecimento histrico trabalhado por meio de filmes e obras literrias sempre precedidas de orientao so aes que contribuem para o desvendamento de problemas referentes questo tnico-racial46. Tais aes podem ser tomadas como ponto de partida para experincias com arte, destacando-se as atividades com teatralizao por meio da construo e encenao de peas elaboradas pelos prprios alunos sob consistente orientao docente ou encenao de diferentes eventos da histria poltica ou cultural, rituais indgenas ou mitos africanos, seguidas sempre de discusso do contedo representado e anlise da experincia. O resultado do processo permite eficazmente a apreenso do conhecimento histrico, o desenvolvimento da oralidade, a promoo da comunicao, a manifestao corporal, o favorecimento da interao e o fortalecimento da

    46 Sugestes de filmes e obras literrias para a Educao Bsica, ver: BRASIL, 2006.

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    auto-afirmao.

    Em meio aos trabalhos com a temtica da educao das relaes tnico-raciais, no ano de 2005, em escola da rede pblica estadual de Sergipe por meio da experincia da dramatizao, as vozes que se fizeram ouvir foram reveladoras. Da seguinte forma, pronunciou-se a aluna MSLS47:

    Bom, foi uma grande experincia pois ganhei muito, essa pea eu fiquei to impogada que comecei a ler tudo quanto foi de livro que falasse de escravido. Pois antes eu tinha um pouco de vergonha de ser negra mais com esse estudo mim fez acorda para a vida e passei a dar valor mais a minha vida e hoje eu mim orgulho de ser negra. Em relao aos membros dos grupos, foi uma grande coisa que aconteceu em 2005 e marcou pois aprendi muito, tivemos muita briga, mais, eu aprendir que devemos criticar na hora serta, respeita a idia do outro, outra coisa que eu fiquei no lucro foi que eu tenho mais confiana em mim mesma! Pois a professora Crislane ela sabe passar essa confiana de que todos capaz. (MSLS, 2 B, 2005).

    O registro acima, da aluna do 2 ano B do Ensino Mdio, exemplifica um imaginrio frequente nas escolas. Adolescentes e jovens que chegam ao Ensino Mdio com problemas identitrios. Mas que podem, por meio da escola, superar impasses no seu prprio reconhecimento e valorizao, preparando-se, assim, para a vida.

    Recentes polticas de promoo tm diminudo a reprovao no Ensino Fundamental. Tal aspecto, ao lado da ampliao das exigncias do mercado de trabalho por escolarizao tem aumentado o pblico que busca o Ensino Mdio. Contudo, o embate entre qualidade e quantidade parece imperar. Se por um lado, convive-se com a busca pela escolarizao mdia, embora esta muitas vezes confunda-se com a busca por certificados e socializao; por outro lado, como mostram Abramovay e Castro (2003), observam-se a evaso, a reprovao e a aprovao sem aprendizagem. Em ltima instncia o que se tem so os precrios resultados nas avaliaes oficiais e, como evidencia Brunel (2004), o aumento cada vez maior de jovens na Educao de Jovens e Adultos (EJA). Diante do problema, Gadotti (1992) defende a adoo da perspectiva educacional multicultural como estratgia em prol da reduo dos ndices de evaso e repetncia de segmentos menos favorecidos da sociedade brasileira.

    47 As atividades foram desenvolvidas, durante todo o ano de 2005, em escola da rede pblica estadual

    de ensino do Estado de Sergipe. A transcrio, para este artigo, dos registros fruto das experincias deu-se de forma literal, no sendo feita, portanto, correo dos equvocos gramaticais em termos semnticos.

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    importante salientar que a expresso multicultural, largamente utilizada no meio educacional, deve caracterizar a sociedade brasileira hoje, procurando romper a fronteira da diversidade e de um discurso de simples apego tolerncia. Deve abranger tambm a relao entre aspectos sociais, econmicos e polticos. Dessa maneira, ser possvel a crtica escola

    excludente e a construo de aes realmente propositivas em nome da justia social. Ou seja, no se busca somente que se ateste a existncia das diferenas, mas sim que estas sejam reconhecidas, valorizadas e apoiadas no sentido de preservao, respeito e acesso aos direitos de cidadania dos sujeitos que elas representam.

    Assim como nas etapas anteriores da Educao Bsica, preciso conhecer o pblico do Ensino Mdio, tendo em vista, de modo geral, melhorias via polticas pblicas e, de modo especfico, melhorias espaciais e de relaes humanas na escola. No que se pode chamar de uma crise no Ensino Mdio, percebe-se ainda no decorrer das duas ltimas dcadas, poucas aes de promoo de uma cidadania poltica e social. Fortes exemplos disso nas escolas, como demonstram Abramovay e Castro (2003) so as explcitas aes de discriminao entre professores e estudantes, inclusive, a racial.

    Para alm dos problemas a enfrentar nas escolas, h professores que reagem s adversidades, propem, insistem e executam aes em prol de mudanas, apesar de muitas iniciativas serem isoladas, sem continuidade e com visibilidade mnima. Mas muitas vezes com a persistncia do docente que no sucumbe apatia diante dos obstculos ou com o apoio de segmentos do movimento negro e mesmo organizaes no-governamentais (ONG) do continuidade s suas prticas. Para tanto, importante que o docente conhea os jovens e adolescentes em suas escolas, suas condies de vida e de aprendizagem e no mbito da diversidade. E nesse sentido, os membros de toda a escola precisam dialogar com esses sujeitos e por meio da interao perceber os caminhos pelos quais se formaram; seus smbolos, gostos e gestos. Da mesma forma, atentar para o que podem, os alunos, ensinar sobre a sua experincia tnico-racial.

    Ao trabalhar a pluralidade cultural presente em sala de aula o docente de Histria pode promover a desconstruo do mito da democracia racial e ao mesmo tempo ensinar como se constituram as diferenas no decorrer do tempo e como foram historicamente usadas para a incluso de uns e a excluso de outros. Dessa maneira, ao se relacionar o processo ensino-aprendizagem com a vivncia, valores e perspectivas dos alunos, viabilizam-se a insero da educao para as relaes tnico-raciais.

    Adolescentes e jovens possuem uma histria e precisam se reconhecer como

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    protagonistas dela. A aula de histria precisa ter essa funo. Apesar de possvel por meio de todas as reas de conhecimento, na Histria pode-se considerar um campo privilegiado para uma formao cidad. possvel a promoo de uma conscincia tica da diversidade ao se trabalhar com temas especficos de histria bem como com temas mais amplos como preconceito, racismo, discriminao, gnero e sexualidade, de forma interdisciplinar.

    De acordo com a LDB 9.394/96 e os Parmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio PCN-EM (BRASIL, 1999), a ltima etapa da Educao Bsica deve consistir em um espao e um tempo de formao geral bsica voltada para a cidadania e para o trabalho. Busca-se reconstruir a identidade do Ensino Mdio no qual o aluno seja concebido como um construtor de conhecimentos. Na busca pelo rompimento com modelos tradicionais de escolarizao e partindo da premissa de que a aprendizagem ocorre por meio de prticas interdisciplinares, os PCN-EM organizam os saberes escolares a partir de trs grandes reas de saber. So elas: Linguagens, Cdigos e suas Tecnologias; Cincias da Natureza, Matemtica e suas Tecnologias; e Cincias Humanas e suas Tecnologias. Nesta ltima grande rea encontram-se os conhecimentos de Filosofia, Sociologia, Antropologia, Poltica, Geografia e Histria.

    Na busca pela qualidade do ensino - o que envolve a promoo de uma educao histrica pluritnica e cultural - necessrio aproximar jovens e adolescentes do gosto pela escola e pelo ato de estudar. Para tanto, importante a diversificao de possibilidades de aprendizagem e por meio de linguagens diversas. Tanto interdisciplinarmente como na aula especfica de Histria, possvel trabalhar-se com msicas, poesias, histria em quadrinhos, literatura de cordel, movimento hip hop, maracatus, grupos teatrais e de danas, entre outras possibilidades que podem revelar ou simplesmente exteriorizar traos ancestrais e de identidade.

    A multiplicidade de linguagens contribui para que alunos e professores vivenciem prticas de corporeidade ao utilizarem todo o corpo como veculo de comunicao. O que os corpos comunicam possibilitam ao docente trabalhar com seus alunos a histria de povos e culturas de diferentes referenciais civilizatrios. Inocncio (2001) mostra a importncia de tais aspectos em decorrncia da discriminao e dos esteretipos que tm sido alvo o corpo negro. Torna-se assim importante o reconhecimento do que os corpos comunicam como um meio valorizador de identidade. Alm disso, o aluno ao sair da posio de conforto que lhe d o mobilirio escolar, mais precisamente a sua carteira na sala de aula, tem a possibilidade de experimentar novas vivncias que podem ajud-lo a superar limites e preparar-se para os

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    desafios impostos por uma sociedade ainda marcada por desigualdades. Ao participar de experincia escolar voltada para o tema da discriminao racial e com base em teatralizao, ICS, aluno do Ensino Mdio, afirmou:

    Em relao a minha aprendizagem foi maravilhosa porque no meu ensino fundamental eu conheci que o negro era uma parte a mais de beleza na histria do Brasil e com a pea tive a oportunidade de conhecer o que o negro passou e passa at hoje para ser livre do preconceito, racistas ... Com relao a minha pessoa busquei mim empenhar no mximo possvel porque era uma oportunidade nova que eu estava tendo para demonstrar que era capaz de fazer. (ICS, 2 C, 2005)

    De forma semelhante, CCC, registrou sua aprendizagem acerca da histria da escravido no Brasil e sua satisfao acerca do xito do projeto aps a superao das dificuldades de um trabalho em equipe marcada pela diversidade de ideias e aes. A aluna do 2 ano do Ensino Mdio de escola pblica de Sergipe declarou:

    Para mim a pea foi muito legal eu aprendi varias coisas com o tema que fala da escravido apesar de no ser o tempo da escravido de no existi mais como nos tempos passados mais h um pouco. E o melhor foi reviver aquele tempo e passarmos, no pelo sofrimento deles daquele tempo, mais deu pra sentir um pouco na pele. E passarmos tambm por um trabalho de equipe e vimos como difcil a convivncia com muita gente, com pensamentos diferentes, aes diferentes e comportamentos. Teve muita briga, mais foi muito legal saiu do jeito que ns queria, foi timo. (CCC, 2 B, 2005)

    Em termos de possibilidades, importante salientar o trabalho a partir de projetos disciplinares ou interdisciplinares de mdio ou longo prazo, que levem em considerao as peculiaridades dos alunos. Estas, sem dvida, representativas da histria e cultura africanas, indgenas, europeias, de mulheres, de jovens etc. Dessa forma, no espao coletivo da escola, o docente compromissado com uma educao histrica plural abre caminhos para uma formao tica e esttica geral e de formao para o trabalho, posto que possibilita aos seus alunos, o estabelecimento de relaes mais prximas do cotidiano, ao pr todos em contato para exposio e discusso de opinies bem como negociao de aes em meio construo

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    e implementao de projetos coletivos de aprendizagens. Em outros termos, os estudantes do Ensino Mdio precisam ser considerados participantes ativos do seu prprio processo de formao e, portanto, protagonistas da sua prpria histria. Do contrrio, a busca destes pela EJA ser cada vez maior, no no sentido de buscar nesta modalidade de ensino respostas mais agradveis ao seu processo de formao, mas um meio mais fcil e rpido de concluir a difcil etapa de escolarizao bsica. Tal postura decorre de uma ideia preconcebida e equivocada de que a EJA mais condescendente para aqueles que no conseguem ver sentido na escola.

    De acordo com a LDB n. 9394/96, Art. 4, inciso VII, dever do Estado ofertar educao escolar regular para jovens e adultos com caractersticas e modalidades adequadas s suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se, inclusive, as condies de acesso e permanncia na escola aos que forem trabalhadores48.

    O professor ao atuar na Educao de Jovens e Adultos (EJA) precisa estar ciente de que as prticas pedaggicas podero estender-se desde a promoo do domnio da alfabetizao at o nvel de conhecimento equivalente ao Ensino Mdio. Esse fato consiste j si em um desafio, pois se sabe que os professores que atuam nesta modalidade de ensino so, em grande parte, licenciados em diferentes reas de conhecimento os quais, no perodo de formao inicial no se apropriaram de mecanismos voltados para a alfabetizao, por exemplo.

    Dentro desse quadro, aes promotoras de uma educao para as relaes tnico-raciais podem ser vividas a partir mesmo do reconhecimento de que a questo tnico-racial est presente na EJA por meio da presena dos estudantes. Esse aspecto importante de ser considerado uma vez que apesar de a EJA est presente na legislao educacional e contar com experincias desenvolvidas tambm por organizaes no-governamentais, ainda no tm sido postas em prtica temticas que ressaltem conhecimentos e valores de diferentes etnias, principalmente, indgena e de origem africana.

    Muitos alunos chegam a EJA desmotivados e na iminncia da desistncia. Parte deles, h anos afastados da escola e, por vezes, alvos de processos de excluso, precisam ser bem recebidos pelo corpo funcional da escola. O ato de acolh-los e incentiv-los a permanecer na instituio de ensino torna-se em si j uma ao para uma educao das relaes tnico-raciais.

    Em termos mais especficos de prticas pedaggicas imprescindvel que estas

    48 A EJA no nvel de Ensino Fundamental direciona-se para o pblico maior de quinze anos. O nvel do Ensino

    Mdio direcionado para jovens a partir dos dezoito anos.

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    possuam um carter dialgico e scio-interacionista onde a problematizao da vida cotidiana dos jovens e adultos encontrem lugar. Mas os alunos da EJA no so simples portadores de conhecimentos prvios. Tais discentes so tambm produtores de cultura. Dessa forma, vivncias familiares, sociais, profissionais, religiosas, entre outras, so importantes de serem trabalhadas como ponto de partida para a promoo de uma aprendizagem significativa.

    Por meio da valorizao dos saberes dos estudantes, eles se sentem respeitados e incentivados a buscar conhecimentos e a participar de processos coletivos de aprendizagem. Garante-se Educao de Jovens e Adultos, assim, seu carter de incluso social. A efetivao desse quadro e tendo em vista tambm a educao para as relaes tnico-raciais requer prticas pedaggicas que potencializem a oralidade e considerem a avaliao da aprendizagem como processo.

    A atuao docente na EJA precisa ser compreendida como um meio para garantir condies de igualdade de oportunidades a homens e mulheres do pas, permitindo a estes uma vivncia cidad. As exigncias para tanto no so apenas epistemolgicas e pedaggicas, so igualmente ticas, uma vez que se deve buscar a desconstruo de aes e sentimentos velados de inferioridade e superioridade.

    Dessa forma que se pode afirmar que, em todos os nveis da Educao Bsica, a articulao da educao para as relaes tnico-raciais com o processo ensino-aprendizagem em Histria pode ser bem sucedida e por caminhos os mais diversos. Quatro aspectos destacam-se nesse sentido e no que concerne docncia: a apropriao de conhecimentos tericos; a adoo de diferentes prticas didtico-pedaggicas; a utilizao de recursos didticos diversos; e a vivncia por meio de uma postura sensvel e tica frente s necessidades dos alunos e das escolas.

    Os conhecimentos tericos referem-se tanto queles de cunho histrico quanto de fundamento pedaggico. O domnio de contedos da histria condio imprescindvel para que o professor promova reflexes, esclarecimentos e problematizao dos eventos humanos com a devida relao vida prtica do aluno. O domnio de conhecimentos pedaggicos por sua vez necessrio para instrumentalizar o docente dando-lhe condies de agir de forma contextualizada junto a seus alunos tendo em vista avanos no processo de aprendizagem dos discentes. Nesse sentido, a adoo de diferentes prticas didtico-pedaggicas, inclusive com o uso de diferentes linguagens bem como de recursos didticos diversos, ocorrer sem que a explicao histrica dos eventos seja fragilizada. Por fim, mostra-se como no menos importante a necessidade do estabelecimento de uma vivncia sensvel, marcada por relaes

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    de alteridade e empatia no ambiente escolar. Ao se trabalhar com um pblico plural, portador de caractersticas procedentes de diferentes referenciais civilizatrios, torna-se imprescindvel sensibilidade para a compreenso e o tratamento das aes e do imaginrio dos estudantes. Enfim, sensibilidade e tica configuram-se tambm como ingredientes necessrios para a articulao entre a educao das relaes tnico-raciais e o ensino de Histria na Educao Bsica.

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