revista esquinas - nº44 - alimentação

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REVISTA-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA FACULDADE CÁSPER LÍBERO #44 - 2º SEMESTRE DE 2008 Agrodesperdício Aqui, em se produzindo, muito se perde: R$ 12 bilhões por ano ECONOMIA & NEGÓCIOS Por que a comida virou alvo do mercado financeiro SEÇÕES: Doces, Música, Serviço, Língua, Saúde, Mitos, Noite, Beleza, Livros, Ali na Esquina ARTE Refeições temperadas pela estética SOCIEDADE Temos a maior rede de bancos de leite materno, mas ainda faltam doadoras MEDICINA O problema dos sem-paladar e dos que procuram a redução de estômago

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A Revista Esquinas é um órgão laboratorial do curso de Jornalismo da Faculdade Cásper Líbero. A revista é semestral, e a cada edição as matérias giram em torno de um tema específico. Na edição 44 nosso tema foi Alimentação!

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Page 1: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

REVISTA-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA FACULDADE CÁSPER LÍBERO#44 - 2º SEMESTRE DE 2008

AgrodesperdícioAqui, em se produzindo, muito se perde: R$ 12 bilhões por ano

economiA & negóciosPor que a comida virou alvo do mercado financeiro

seções: Doces, música, serviço, Língua, saúde, mitos, noite, Beleza, Livros, Ali na esquina

ArteRefeições temperadas pela estética

socieDADeTemos a maior rede de bancos de leite materno, mas ainda faltam doadoras

meDicinAO problema dos sem-paladar e dos que procuram a redução de estômago

CAPA.indd 3 21/11/2008 11:26:22

Page 2: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

EDITORIAL.indd 2 21/11/2008 11:28:15

No início do segundo semestre de 2008, fui convidada para editar um novo número da revista Grandes Reportagens, encartada no jornal O Estado de S. Paulo. Trata-se de uma publicação temática, de periodicida-de ainda indefinida, cujo projeto editorial prevê o aprofundamento de temas de vital importância para o mundo contemporâ-neo. Tive oportunidade de conhecê-la e o privilégio de editá-la, como colaboradora, no início do ano, quando o tema escolhi-do foi “megacidades”. Mas, desta vez, não pude aceitar a empreitada: o tema do jor-nal, “alimentos”, estava demasiadamente próximo ao tema já eleito pelos estudantes de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero para esta edição de Esquinas: “comida”. Embora o tratamento do assunto em am-bas as revistas evidentemente não fosse o mesmo, haveria, aqui e ali, pontos de tangenciamento entre algumas pautas e reportagens. Como professora responsável por este órgão laboratorial, me pareceu que não seria nem ético, muito menos pedagó-gico, envolver-me com os dois trabalhos simultaneamente.

Isso é da profissão. Freqüentemente, um determinado fato, personagem ou tema cresce tanto em importância que é normal que mais de um veículo invista em sua abordagem. Quando Veja e IstoÉ eram as

Revista-laboratório do curso de Jornalismo da Faculdade Cásper Líbero

Fundação Cásper LíberoPresidente Paulo CamardaSuperintende Geral Sérgio Felipe dos Santos

Faculdade Cásper LíberoDiretora Tereza Cristina VitaliVice-DiretorWelington AndradeCoordenador de Jornalismo Carlos Costa

Professora responsávelRosangela Petta

MonitoriaEditoresJulia AlquéresPriscila ZuiniDesignerRenata Miwa

CapaAntonio Costa

Participaram desta edição Adriana Carvalho, Alexandre Facciolla Aline Guimarães Lacerda, Aline Rapassi, Ana Cristina Kleindienst, Ana Júlia Castilho, Ana Laura Ferrareze, Ana Lúcia Silva,Ana Paula de Deus, Ana Paula Perche, André de Melo, Anna Carolina Oliveira, Anna Malatesta, Antonio Costa, Beatriz Nantes, Bonie Santos, Bruna Stuppiello, Camila Chevitarese, Camila Mendonça, Carolina Becker, Carolina Giovanelli,Caroline Arice, Daniela Rosolen, Daniella Dolme, Débora Centoamore, Diogo Bercito, Eduardo Zanelato, Eloá Orazem, Felipe Lessa, Fernanda Bonadia, Fernanda de Almeida Silva, Fernando Gonzalez, Flavio Oliveira, Gabriella de Lucca, Gustavo Sanches, Gustavo Uribe, Helda Ruiz, João Cotrim, José Roberto Gomes, Karina Sérgio Gomes, Kelly Bruna Ferreira, Laisa Pereira, Leonardo Paraíso, Lidia Zuin, Lívia Maria Lucas, Lucas Bombana, Lygia Haydée, Maíra Chao, Mariana Agunzi, Mariane Bettistetti, Marília Pedroso, Marina Consiglio, Mariana Palma, Mariana Pereira, Monali Bassoli, Mônica Pestana, Natália Guaratto , Nathalia Garcia, Nathalie Franco,Paulo Scheuer, Pedro Araújo, Priscila Haikal, Priscila Pires, Rafael Bergamaschi, Rafael de Queiroz, Rafael Onori, Sarah Mund, Talita Teixeira, Thaís Gama, Thaís Lima, Thiago Dias, Thiago Faé, Vanessa Sarzedas, Vinícius Saccomani, Wilson Saiki

AgradecimentosAdalton Diniz, Ana Paula de Deus, Carlos Costa, Carlos Praça, Gabriella de Lucca, Gilberto Maringoni, Jorge Barreto, Luana Alves, Welington Andrade

ImpressãoEskenazi Indústria Gráfica Ltda.Av. Miguel Frias e Vasconcelos, 1023Jaguaré — São PauloTelefone: (11) 3766 4011Fax: (11) 3768 5501

Núcleo de RedaçãoAvenida Paulista, 900 — 5º andar01310-940 — São Paulo — SP Tel.: (11) 3170-5874E-mail: [email protected]: www.facasper.com.br/jo/esquinas

grandes concorrentes entre as semanais, lá pelos anos 1980, surpreendíamo-nos ao ver capas com imagens idênticas, às vezes até com as mesmíssimas chamadas. Os conteúdos, evidentemente, nem sempre eram parecidos – não raro, eram diame-tralmente opostos, graças a suas diferen-tes vocações editoriais. Tal fato, no entan-to, confirma apenas que a imprensa, quan-do bem feita, foca-se no que ocorre em seu momento histórico, fazendo uma escolha pela relevância de temas inadiáveis.

Foi exatamente isso o que mais me im-pressionou (positivamente) na coincidên-cia entre o tema selecionado pelo Estadão e o trazido pelos alunos da Cásper: nossos jovens, ainda tão verdes, estão tão atentos quanto os experientes profissionais de um dos maiores jornais do mundo. Descon-tando-se a distância entre o resultado das reportagens de uns e de outros – pois em Esquinas há apenas o naturalmente imper-feito exercício do aprendizado, em que a descoberta brota entre a tentativa, o erro e a refeitura –, esta edição enche de orgulho os professores que, dia após dia, procuram aproximar o estudantado da nossa realida-de social, cultural e profissional.

E assim vamos para mais um ano de sa-borosa experimentação.

Até 2009.

ossos e sabores

ROSANGELA PETTA

oFíCio

EDiToRiAL

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 03

a complexa questão do

desperdício: abordada, ao

mesmo tempo, pelos alunos da

Cásper e pelos experientes

jornalistas do Estadão

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do

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Page 3: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

No início do segundo semestre de 2008, fui convidada para editar um novo número da revista Grandes Reportagens, encartada no jornal O Estado de S. Paulo. Trata-se de uma publicação temática, de periodicida-de ainda indefinida, cujo projeto editorial prevê o aprofundamento de temas de vital importância para o mundo contemporâ-neo. Tive oportunidade de conhecê-la e o privilégio de editá-la, como colaboradora, no início do ano, quando o tema escolhi-do foi “megacidades”. Mas, desta vez, não pude aceitar a empreitada: o tema do jor-nal, “alimentos”, estava demasiadamente próximo ao tema já eleito pelos estudantes de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero para esta edição de Esquinas: “comida”. Embora o tratamento do assunto em am-bas as revistas evidentemente não fosse o mesmo, haveria, aqui e ali, pontos de tangenciamento entre algumas pautas e reportagens. Como professora responsável por este órgão laboratorial, me pareceu que não seria nem ético, muito menos pedagó-gico, envolver-me com os dois trabalhos simultaneamente.

Isso é da profissão. Freqüentemente, um determinado fato, personagem ou tema cresce tanto em importância que é normal que mais de um veículo invista em sua abordagem. Quando Veja e IstoÉ eram as

Revista-laboratório do curso de Jornalismo da Faculdade Cásper Líbero

Fundação Cásper LíberoPresidente Paulo CamardaSuperintende Geral Sérgio Felipe dos Santos

Faculdade Cásper LíberoDiretora Tereza Cristina VitaliVice-DiretorWelington AndradeCoordenador de Jornalismo Carlos Costa

Professora responsávelRosangela Petta

MonitoriaEditoresJulia AlquéresPriscila ZuiniDesignerRenata Miwa

CapaAntonio Costa

Participaram desta edição Adriana Carvalho, Alexandre Facciolla Aline Guimarães Lacerda, Aline Rapassi, Ana Cristina Kleindienst, Ana Júlia Castilho, Ana Laura Ferrareze, Ana Lúcia Silva,Ana Paula de Deus, Ana Paula Perche, André de Melo, Anna Carolina Oliveira, Anna Malatesta, Antonio Costa, Beatriz Nantes, Bonie Santos, Bruna Stuppiello, Camila Chevitarese, Camila Mendonça, Carolina Becker, Carolina Giovanelli,Caroline Arice, Daniela Rosolen, Daniella Dolme, Débora Centoamore, Diogo Bercito, Eduardo Zanelato, Eloá Orazem, Felipe Lessa, Fernanda Bonadia, Fernanda de Almeida Silva, Fernando Gonzalez, Flavio Oliveira, Gabriella de Lucca, Gustavo Sanches, Gustavo Uribe, Helda Ruiz, João Cotrim, José Roberto Gomes, Karina Sérgio Gomes, Kelly Bruna Ferreira, Laisa Pereira, Leonardo Paraíso, Lidia Zuin, Lívia Maria Lucas, Lucas Bombana, Lygia Haydée, Maíra Chao, Mariana Agunzi, Mariane Bettistetti, Marília Pedroso, Marina Consiglio, Mariana Palma, Mariana Pereira, Monali Bassoli, Mônica Pestana, Natália Guaratto , Nathalia Garcia, Nathalie Franco,Paulo Scheuer, Pedro Araújo, Priscila Haikal, Priscila Pires, Rafael Bergamaschi, Rafael de Queiroz, Rafael Onori, Sarah Mund, Talita Teixeira, Thaís Gama, Thaís Lima, Thiago Dias, Thiago Faé, Vanessa Sarzedas, Vinícius Saccomani, Wilson Saiki

AgradecimentosAdalton Diniz, Ana Paula de Deus, Carlos Costa, Carlos Praça, Gabriella de Lucca, Gilberto Maringoni, Jorge Barreto, Luana Alves, Welington Andrade

ImpressãoEskenazi Indústria Gráfica Ltda.Av. Miguel Frias e Vasconcelos, 1023Jaguaré — São PauloTelefone: (11) 3766 4011Fax: (11) 3768 5501

Núcleo de RedaçãoAvenida Paulista, 900 — 5º andar01310-940 — São Paulo — SP Tel.: (11) 3170-5874E-mail: [email protected]: www.facasper.com.br/jo/esquinas

grandes concorrentes entre as semanais, lá pelos anos 1980, surpreendíamo-nos ao ver capas com imagens idênticas, às vezes até com as mesmíssimas chamadas. Os conteúdos, evidentemente, nem sempre eram parecidos – não raro, eram diame-tralmente opostos, graças a suas diferen-tes vocações editoriais. Tal fato, no entan-to, confirma apenas que a imprensa, quan-do bem feita, foca-se no que ocorre em seu momento histórico, fazendo uma escolha pela relevância de temas inadiáveis.

Foi exatamente isso o que mais me im-pressionou (positivamente) na coincidên-cia entre o tema selecionado pelo Estadão e o trazido pelos alunos da Cásper: nossos jovens, ainda tão verdes, estão tão atentos quanto os experientes profissionais de um dos maiores jornais do mundo. Descon-tando-se a distância entre o resultado das reportagens de uns e de outros – pois em Esquinas há apenas o naturalmente imper-feito exercício do aprendizado, em que a descoberta brota entre a tentativa, o erro e a refeitura –, esta edição enche de orgulho os professores que, dia após dia, procuram aproximar o estudantado da nossa realida-de social, cultural e profissional.

E assim vamos para mais um ano de sa-borosa experimentação.

Até 2009.

ossos e sabores

ROSANGELA PETTA

oFíCio

EDiToRiAL

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 03

a complexa questão do

desperdício: abordada, ao

mesmo tempo, pelos alunos da

Cásper e pelos experientes

jornalistas do Estadão

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Page 4: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

SUMÁRIO

06 A PREÇO DE BANANA OU A PESO DE OURO?Alguns países perderam, outros ganharam com o aumento do preço dos alimentos no primeiro semestre deste ano

10 PARA ONDE VÃO AS SOBRASO que acontece com os alimentos que não são consumidos tanto em casa quanto em restaurantes na cidade de São Paulo? A maior parte vai direto para a boca do lixo

14 COMIDA ILEGALCada vez mais os paulistanos escolhem barraquinhas de rua para realizar refeições diárias. A fiscalização deste tipo de comércio ainda é pequena perto dos perigos que ele oferece

18 HORA DO RECREIOUma vida saudável precisa começar cedo. Pensando nisso, algumas escolas assumiram a responsabilidade de ensinar as crianças a comerem melhor

34 SACRIFÍCIO POR UM NOVO CORPOÉ longa a caminhada para os que decidem emagrecer através da cirurgia de redução do estômago

38 REINVENÇÃO DA COMIDAA ciência que estuda as reações envolvidas no preparo de uma receita ajuda a resolver problemas, como o do suflê murcho

04 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

10 44

30 UMA VIDA SEM GOSTOA ageusia é o distúrbio das pessoas que não sentem gosto, e que acabam comendo não por prazer, mas por necessidade

18

22 ALIMENTO IN NATURAO leite materno é a primeira e principal fonte de nutrientes dos recém-nascidos. Por esse motivo, os bancos de leite têm função essencial na hora de garantir a doação

26 MUITO ALÉM DA INSOSSA SOPINHAA antiga idéia de que comida de hospital é ruim está mudando com o empenho dos hospitais em melhorar os cardápios

40 DIETAS ALTERNATIVASDiferentes maneiras de se alimentar que vão além de uma simples saladinha de alface

44 75 ANOS DE HISTÓRIASPatrimônio da cidade de São Paulo, hoje o Mercadão, além de ser um grande centro de vendas, é também um ponto turístico

SUMARIO.indd 2 24/11/2008 11:49:17

50 007 À MANGERO crítico e editor de gastronomia do Guia Quatro Rodas, Ricardo Castanho, conta como o prazer de comer virou uma profissão

58 NO TOPODe ajudante de garçom a sócio de um dos restaurantes mais caros da cidade, a ascendente trajetória de Ricardo Trevisani

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 05

50 6052

52 LOUCOS POR PANELASA explosão dos cursos superiores de gastronomia deve-se à exigência do mercado e ao charme que envolve a atividade

56 O LUGAR DELAS É NA COZINHAAs mulheres mostram que podem ser chefs e ocupar cargos que antes eram dominados pelos homens

32 LÍNGUA

SEÇÕES

03 EDITORIAL

21 DOCES

29 SERVIÇO

25 MÚSICA

37 SAÚDE

42 MITOS

43 NOITE

47 BELEZA

55 LIVROS

66 ALI NA ESqUINA

48 MERCADO EM EXPANSÃOA onda de alimentos orgânicos é cada vez maior. Atualmente, 20% das famílias brasileiras consomem este tipo de produto

60 BELEZA SE PÕE À MESAOs caprichos e as inspirações dos chefs na hora de fazer e decorar um prato os aproximam de verdadeiros artistas

SUMARIO.indd 3 22/11/2008 12:50:03

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SUMÁRIO

06 A PREÇO DE BANANA OU A PESO DE OURO?Alguns países perderam, outros ganharam com o aumento do preço dos alimentos no primeiro semestre deste ano

10 PARA ONDE VÃO AS SOBRASO que acontece com os alimentos que não são consumidos tanto em casa quanto em restaurantes na cidade de São Paulo? A maior parte vai direto para a boca do lixo

14 COMIDA ILEGALCada vez mais os paulistanos escolhem barraquinhas de rua para realizar refeições diárias. A fiscalização deste tipo de comércio ainda é pequena perto dos perigos que ele oferece

18 HORA DO RECREIOUma vida saudável precisa começar cedo. Pensando nisso, algumas escolas assumiram a responsabilidade de ensinar as crianças a comerem melhor

34 SACRIFÍCIO POR UM NOVO CORPOÉ longa a caminhada para os que decidem emagrecer através da cirurgia de redução do estômago

38 REINVENÇÃO DA COMIDAA ciência que estuda as reações envolvidas no preparo de uma receita ajuda a resolver problemas, como o do suflê murcho

04 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

10 44

30 UMA VIDA SEM GOSTOA ageusia é o distúrbio das pessoas que não sentem gosto, e que acabam comendo não por prazer, mas por necessidade

18

22 ALIMENTO IN NATURAO leite materno é a primeira e principal fonte de nutrientes dos recém-nascidos. Por esse motivo, os bancos de leite têm função essencial na hora de garantir a doação

26 MUITO ALÉM DA INSOSSA SOPINHAA antiga idéia de que comida de hospital é ruim está mudando com o empenho dos hospitais em melhorar os cardápios

40 DIETAS ALTERNATIVASDiferentes maneiras de se alimentar que vão além de uma simples saladinha de alface

44 75 ANOS DE HISTÓRIASPatrimônio da cidade de São Paulo, hoje o Mercadão, além de ser um grande centro de vendas, é também um ponto turístico

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50 007 À MANGERO crítico e editor de gastronomia do Guia Quatro Rodas, Ricardo Castanho, conta como o prazer de comer virou uma profissão

58 NO TOPODe ajudante de garçom a sócio de um dos restaurantes mais caros da cidade, a ascendente trajetória de Ricardo Trevisani

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 05

50 6052

52 LOUCOS POR PANELASA explosão dos cursos superiores de gastronomia deve-se à exigência do mercado e ao charme que envolve a atividade

56 O LUGAR DELAS É NA COZINHAAs mulheres mostram que podem ser chefs e ocupar cargos que antes eram dominados pelos homens

32 LÍNGUA

SEÇÕES

03 EDITORIAL

21 DOCES

29 SERVIÇO

25 MÚSICA

37 SAÚDE

42 MITOS

43 NOITE

47 BELEZA

55 LIVROS

66 ALI NA ESqUINA

48 MERCADO EM EXPANSÃOA onda de alimentos orgânicos é cada vez maior. Atualmente, 20% das famílias brasileiras consomem este tipo de produto

60 BELEZA SE PÕE À MESAOs caprichos e as inspirações dos chefs na hora de fazer e decorar um prato os aproximam de verdadeiros artistas

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EVOLUÇÃO DO PREÇO* DO ARROZ EM TODO O MUNDO

06 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

ECONOMIA & NEGÓCIOS

De janeiro a julho de 2008, o preço do ar-roz teve um aumento de 96,8% no mercado internacional e de 35,1% no Brasil. No pe-ríodo, foi o alimento que mais subiu, mas não o único. No primeiro semestre do ano, houve uma elevação mundial dos preços dos alimentos. E a isso se deu o nome de crise de alimentos. “Essa crise tem uma na-tureza distinta, porque não é causada por uma ruptura da oferta”, afirma Antonio Marcio Buainain, professor de economia da Unicamp. Para ele, há “um ciclo de cresci-mento continuado da economia mundial”, resultado da incorporação de milhões de pessoas ao mercado, o que faz elevar o consumo de alimentos no planeta.

Esse crescimento da economia expres-sou-se também na crise financeira mun-dial, que teve início nos Estados Unidos em setembro deste ano. Com o aumento do poder aquisitivo e, conseqüentemente, do consumo, os norte-americanos passaram a gastar mais. O número de financiamen-tos cresceu. Assim, acumularam muitas dívidas, e não tiveram condições de quitar todas elas. Isso levou à falência impor-tantes instituições financeiras, como o Lehmann Brothers. O governo americano teve de realizar operações de salvamento, o que elevou os gastos públicos e fez com que reduzisse o número de empréstimos. “Agora tem uma menor quantidade de di-nheiro circulando no sistema, a qual cria um problema com crédito e investimento”, explica José Carlos Tubino, representante da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) no Brasil.

“A crise financeira coloca um pouco de

água na fogueira da crise dos alimentos”, afirma Buainain. Para ele, a crise finan-ceira tem impacto direto em dois fatores que vinham contribuindo para a alta dos preços dos alimentos. “Primeiro, coloca a perspectiva de redução da demanda devi-do à desaceleração, que parece inevitável, da economia mundial. Segundo, reduz o componente especulativo que também vi-nha alimentando a elevação dos preços”.

MAIS CRISE À VISTA No Brasil, segundo Tubino, já é possível observar os efeitos da crise financeira mundial. “Os agricultores estão tendo problemas para receber o cré-dito da colheita do próximo ano”. Ele expli-ca que os produtores brasileiros não estão tendo os mesmo investimentos que tive-ram para a safra deste ano. “Se não tiver-mos investimentos para o próximo plantio e para a colheita de 2009, significará uma intensificação na crise de alimentos”.

De acordo com Buainain, além do au-mento de consumidores, cresceu a deman-da de produtos agrícolas para a produção de biocombustíveis. São os três Fs: food (comida), fieder (ração animal) e fuel (com-bustível). “O aumento dos três Fs produz uma reestruturação no mercado e os pre-ços se elevam”. Entretanto, ele explica que, diferentemente do ocorrido nos EUA – o chamado etanol do milho – a produção de biocombustíveis não contribuiu para o au-mento dos preços no Brasil. “Não se pode dizer que a cana está sendo produzida às custas do alimento, pois ambos estão cres-cendo”, assegura o professor da Unicamp.

Segundo Fernando Homem de Mello, professor de agro-economia da USP, a crise * em dólares por tonelada

de alimentos tem origem na definição dos programas de bicombustíveis no mundo todo, principalmente nos Estados Unidos. “O problema começou na safra norte-ame-ricana de 2006, quando o mercado perce-beu que não haveria milho suficiente para as duas funções: alimentar e a da nova demanda por energia biocombustível, que vem do etanol do milho”, afirma Homem de Mello. “Então, os preços começaram a explodir, em dólares, na Bolsa de Chicago”. O professor explica que na safra seguinte, em 2007, o país não tinha terras disponí-veis para expandir a área plantada, então o milho teve de competir com a soja. Resulta-do: o preço de ambos aumentou.

Essa tendência conjunta de elevação de

Em 2007, a economia mundial perdeu 57 milhões de toneladas de cereais e grãos, por problemas climáticos. Isso obrigou os países produtores a restringirem as exportações, fazendo o preço do arroz disparar no mercado internacional e servir à especulação dos investidores � nanceiros.

335,3OUT/ 07

a preço de

REPORTAGEM ANA CRISTINA KLEINDIENST e JULIA ALQUÉRES (3o ano de Jornalismo)GRÁFICO RENATA MIWA (2o ano de Publcidade e Propaganda)

Como o aumento do custo dos alimentos em 2008 elevou a comida à categoria de commodity no mercado global

ou a peso de BANANAOURO?

ECONOMIA.indd 2 22/11/2008 11:26:39

fonte: Conab

FEV/0824,6

MAI/0833,2

JUN/0832,5

O AUMENTO DA COTAÇÃO* NO BRASIL

* em reais por saca de 50 kg

O arroz foi o produto agrícola brasileiro cuja cotação mais cresceu entre julho de 2007 e junho de 2008, ultrapassando a sempre bem cotada soja, e todos os outros grãos, como o milho, o feijão e o trigo. Além disso, com medo da ocorrência de um desabastecimento interno, em abril, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento resolveu suspender temporariamente a exportação do arroz.

378,0DEZ/ 07

393,4JAN/ 08

481,1FEV/ 08

672,6MAR/ 08

1.015,2ABR/ 08 1.009,3

MAI/ 08

834,6JUN/ 08 799,0

JUL/ 08

fonte: Conab. Elaboração: GAP/DIMAC/Ipea

JUL/0832,2

DEZ/0721,8

MAR/0822,5

OUT/0722,8

De outubro de 2007 a julho de 2008, o preço internacional do arroz aumentou 138,29%, fenômeno que ocorreu em diversos países exportadores, em maior ou menor grau – no Brasil, por exemplo, o preço do arroz no atacado subiu 41,22%, no mesmo período. Enquanto a saca de 60 quilos da soja, o grão mais exportado pelo país, aumentou 28,92%. Simultaneamente, a cotação do dólar diminuiu 11,65% em todo o mundo, e o preço do barril de petróleo, embora tenha sofrido altas consideráveis, aumentou 65,43%, menos da metade da valorização do arroz.

SOBE-DESCE

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 07

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Page 7: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

fonte: Conab

FEV/0824,6

MAI/0833,2

JUN/0832,5

O AUMENTO DA COTAÇÃO* NO BRASIL

* em reais por saca de 50 kg

O arroz foi o produto agrícola brasileiro cuja cotação mais cresceu entre julho de 2007 e junho de 2008, ultrapassando a sempre bem cotada soja, e todos os outros grãos, como o milho, o feijão e o trigo. Além disso, com medo da ocorrência de um desabastecimento interno, em abril, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento resolveu suspender temporariamente a exportação do arroz.

378,0DEZ/ 07

393,4JAN/ 08

481,1FEV/ 08

672,6MAR/ 08

1.015,2ABR/ 08 1.009,3

MAI/ 08

834,6JUN/ 08 799,0

JUL/ 08

fonte: Conab. Elaboração: GAP/DIMAC/Ipea

JUL/0832,2

DEZ/0721,8

MAR/0822,5

OUT/0722,8

De outubro de 2007 a julho de 2008, o preço internacional do arroz aumentou 138,29%, fenômeno que ocorreu em diversos países exportadores, em maior ou menor grau – no Brasil, por exemplo, o preço do arroz no atacado subiu 41,22%, no mesmo período. Enquanto a saca de 60 quilos da soja, o grão mais exportado pelo país, aumentou 28,92%. Simultaneamente, a cotação do dólar diminuiu 11,65% em todo o mundo, e o preço do barril de petróleo, embora tenha sofrido altas consideráveis, aumentou 65,43%, menos da metade da valorização do arroz.

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campo e foram para a cidade”, exemplifica Buainain. “No campo, eles eram produtores auto-suficientes e, na cidade, viraram con-sumidores”, conclui. Um fenômeno muito parecido com esse acontece na Índia. O país, com uma população de cerca de 1,148 bilhão de habitantes, passa hoje por um processo de elevação de renda e redução de pobreza que tem como consequência o aumento do consumo de alimentos.

Tubino faz outra análise da crise. Para ele, não se pode desconsiderar que fatores climáticos foram responsáveis pela queda na oferta de alimentos em 2008. Dois exem-plos foram as enchentes que ocorreram no Estado de Iowa, principal área produtora de milho norte-americana, e o furacão de Meinmar, que atingiu áreas produtoras de arroz no sudeste da Ásia.

Mauro de Resende Lopes, pesquisador e membro do Conselho Consultivo do IBRE/Fundação Getúlio Vargas, afirma que só no ano passado o mundo perdeu 57 milhões de toneladas de cereais e grãos forrageiros. Então, países exportadores de alimentos, em alerta, restringiram a remessa externa a fim de proteger o abastecimento interno. A Tailândia e o Vietnã, países produtores de arroz, suspenderam a exportação do produto. “O arroz chegou a 500 dólares a tonelada, coisa que nunca se viu na histó-

08 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

preço deve-se a existência do que Buainain chama de “vaso comunicante” entre os di-versos cereais. “Nos Estados Unidos, se o preço do milho sobe, planta-se mais milho e, conseqüentemente, menos soja e menos trigo, já que os três competem em área plantada”, diz o professor da Unicamp. “O resultado disso é que o preço da soja e do trigo também sobe”, completa.

É a Bolsa de Chicago que determina os preços internacionais. No Brasil, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), os principais grãos que subiram de preço, entre janeiro e julho de 2008, além do arroz, foram: a soja (21,5%) e o fei-jão (20,9%). Essas porcentagens referem-se ao preço pago ao produtor, ou seja, ao valor do grão na porteira da fazenda.

MAIS EMERGENTES A população mun-dial, hoje, é de 6,6 bilhões de pessoas. Se-gundo o relatório Situação da População Mundial 2007, divulgado pelo Fundo de População das Nações Unidas (Unfpa), em 2030, a população urbana chegará a 4,9 bi-lhões, enquanto a rural diminuirá em apro-ximadamente 28 milhões. Tal movimento se deve à entrada de países muito popu-losos e de economia próspera no mercado mundial. “A China é hoje um grande playerdo mercado internacional. Nos últimos 20 anos, 300 milhões de chineses deixaram o

ria”, afirma Mauro de Resende Lopes. O arroz é a base de alimentação da Ásia

e sua comercialização internacional repre-senta 5% do consumo mundial. Por ser um mercado muito estreito, segundo Resende Lopes, “se a produção cair 10%, o preço sobre 20%”. Nesse sentido, quem tinha ar-roz para exportar, proibiu a exportação e “quem precisava de arroz, como a Índia e a Bolívia, correram para o mercado e encon-traram pouco produto com preço alto”.

O aumento dos preços para o brasileiro traduziu-se na elevação do valor da cesta básica. “Só no Brasil ela aumentou pura e simplesmente 50%, de um ano, um ano e meio pra cá”, afirma o professor da USP. Entretanto, segundo Mauro Resende Lo-pes, “se o preço da cesta subiu, é porque o poder aquisitivo do povo segurou. Houve maior sustentação de preço”.

Buainain explica que a alta dos preços não foi tão considerável em nosso país, porque o salário mínimo cresceu em ter-mos reais. Em março de 2008, passou de R$380 para R$415. “A economia brasileira vem passando por uma fase muito positiva. Inclusive a renda vem crescendo até aci-ma da inflação”. Ele explica que tem mais gente das famílias trabalhando, já que o desemprego caiu, aumentando o nível de ocupação. Além disso, “os programas de

PRINCIPAIS EXPORTADORES DE PRODUTOS BÁSICOS

Entre os 14 produtos considerados como básicos para a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e que movimentam mais dinheiro para os países exportadores estão alimentos, matéria-prima para produção de biocombustíveis (como o óleo de palma), bebidas (destilados e vinhos) e também cigarros. Os produtos alimentícios representam uma parte signi� cativa: 6 dos 14 produtos. Dentro do grupo, a soja, o milho e o trigo são os grãos que mais renderam dólares para os países exportadores só em 2004. Naquele ano, a exportação de soja rendeu US$ 6.692.044 de dólares para os Estados Unidos e a de milho US$ 6.137.514. E o trigo não � cou muito atrás: US$ 5.180.994. Em nosso país, também em 2004, a remessa de soja para o exterior gerou US$ 5.394.907. Além dos grãos, as carnes também são parte importante dessa lista, sendo vendidas principalmente pela Austrália e Dinamarca. Nesses países, elas movimentam pouco menos da metade dos dólares ganhos com a soja nos EUA, por exemplo. No mesmo patamar de valores das carnes, estão os alimentos industrializados. carne bovina

trigo

milho

soja

alimentos industrializados

carne de porco

EUA

BRASIL

ARGENTINA

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proteção social também se consolidaram e hoje atingem uma camada muito grande da população”. Para Bauainain, professor da Unicamp, “isso tudo serve de colchão protetor para a crise no Brasil”. Do mesmo modo, Fernando Homem de Mello acredita que o salário mínimo e o programa Bolsa Família deram uma amortecida nos “efei-tos deletérios dos preços dos alimentos”.

BOM PARA O BRASIL Ainda de acordo com Buainain, por ser um grande produ-tor agropecuário, o nosso país está entre aqueles que ganham com a crise de ali-mentos. Isso porque a alta dos preços cria incentivos para que os produtores elevem a produção. Para Fernando Homem de Mello, esse novo ciclo da economia abre a oportu-nidade de aumentar a renda da agricultura como um todo. “Nós estamos iniciando um ciclo de crescimento agrícola baseado na exportação de grãos”. Além disso, o profes-sor da USP lembra que o Brasil ainda tem terras a serem exploradas pela agricultura, principalmente na área de cerrado.

Para o professor Buainain, a crise atin-ge os países que produzem menos e depen-dem de importação: “Quem sofre mais é quem não pode pagar a conta”. “O grande problema desse novo ciclo que está ocor-rendo são os consumidores pobres”, reite-ra Homem de Mello. “A África é quem sofre

mais. E os pobres da América Latina, por-que além de serem importadores líquidos de alimentos, não têm grandes fontes de renda para pagar a conta”, diz Bauainain.

A Venezuela, segundo ele, não perde tanto porque, apesar de importar grãos e cereais, é um dos principais países produ-tores e exportadores de petróleo. “Então, pode pagar a elevação do custo das impor-tações de alimentos”, afirma.

Para José Carlos Tubino, representante da FAO no Brasil, “a crise é um problema particularmente dos pobres das áreas ur-banas, que dependem de compra”. Ele afir-ma que no final do ano passado para o iní-cio deste ano, o número de pessoas abaixo da linha da pobreza somava 923 milhões, sendo que em 2002 esse número era de 842 milhões. “Aumentou muito mais na África Subsaariana e na Ásia”, diz. Segundo ele, 37 países demandam assistência devido a crise de alimentos. “Eles são importadores de praticamente tudo”, justifica.

Por esses motivos, entidades interna-cionais, como a FAO e o Banco Mundial, se-gundo Homem de Mello, “estão chamando a atenção no mundo desenvolvido para que modere as suas ambições na área de bi-combustíveis”. Em junho de 2008, a Cúpula da FAO em Roma tinha o objetivo de tratar de dois temas fundamentais: as mudanças

climáticas e a bioenergia na segurança ali-mentar. Segundo Tubino, como o encontro ocorreu no meio da crise de alimentos, o tema da alta dos preços tornou-se central.

Reafirmou-se, neste ano, a meta que já havia sido projetada em 1996, na Cúpula Mundial da Alimentação: reduzir pela me-tade a pobreza extrema e a fome até 2015. Além disso, o representante da FAO no Bra-sil disse que a comunidade internacional se comprometeu a doar 700 milhões de dó-lares para amparar os países que sofrem com a crise. Quando esse dinheiro vai che-gar, ninguém sabe, já que, segundo Tubino, a atual crise financeira norte-americana pode fazer com que os países desenvolvi-dos não estejam mais dispostos a doar.

Homem de Mello acredita que a desace-leração econômica, conseqüência da crise financeira atual, e a regularização climá-tica nos Estados Unidos vêm provocando o declínio dos preços dos alimentos desde agosto. Segundo a Carta de Conjuntura do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em julho a inflação brasileira atin-giu 6,4% e, em agosto, 6,2%. Essa queda foi causada pela comida, responsável por 30% do índice de inflação medida pelo Ipea. A saca de 60 quilos de soja, por exemplo, custava R$ 54,54 em julho de 2008, caindo para R$ 46,61 três meses depois.

DINAMARCA

AUSTRÁLIA

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DESPERDÍCIO

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DESPERDÍCIO

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para onde vão as

No Brasil, são jogadas no lixo 39 mil tonela-das de alimentos por dia, quantidade sufi-ciente para alimentar, com café da manhã, almoço e jantar, cerca de 19 milhões de pes-soas. Isso faz do país o líder mundial em desperdício de alimentos, segundo a Orga-nização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). Dos 43,8 milhões de toneladas de lixo gerados pelo Brasil anual-mente, 26,3 são de alimentos.

De acordo com dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais, o desperdício de ali-mentos é estimado em 1,4% do PIB nacional. Isso equivale a US$ 1 bilhão por mês.

Só na cidade de São Paulo, 60% do lixo produzido é orgânico, ou seja, composto por restos de alimentos. Segundo uma pes-quisa realizada, em 2002, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Ins-tituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge)e a Associação Paulista de Supermer-cados, 20% dos alimentos que entram nas residências são jogados fora todos os dias. Mas é possível dar outro destino aos alimen-tos que não seja o lixo?

ALTERNATIVAS Uma das primeiras ini-ciativas é o programa “Mesa Brasil”, desen-volvido pelo Serviço Social do Comércio de São Paulo (Sesc-SP) e iniciado em 1994. Com mais de 500 instituições atendidas, o progra-ma arrecadou no último ano 385 toneladas de alimentos. Segundo Luciana Curvello, co-ordenadora do programa, os alimentos que iriam para o lixo matam a fome de 93 mil pessoas. “Trabalhamos com cerca de 670 doadores e a cada ano conseguimos levar o alimento a um maior número de pessoas”, afirma. Além do trabalho de distribuição do alimento, o “Mesa Brasil” oferece ofici-nas de culinária aos doadores, funcionários, ajudantes e instituições atendidas. “Todos devem estar informados sobre como fazer

o transporte, a manipulação e a seleção dos alimentos”, afirma Luciana.

A organização não-governamental Banco de Alimentos trabalha com o mesmo objeti-vo. São arrecadados, a cada mês, cerca de 40 toneladas de comida que, possivelmen-te, iriam para o lixo. Esse alimento passa por um processo de triagem em que nutri-cionistas profissionais fazem a seleção do que ainda pode ser consumido. Depois, são distribuídos em instituições já cadastradas pela ONG. Segundo Isabel Marçal, coordena-dora operacional da ONG, “todos os dias, na parte da manhã, os alimentos são recolhi-dos nos doadores (sacolões, feiras, super-mercados, padarias) e a tarde são levados às instituições atendidas (creches, asilos, centros de apoio).” Essa prática, conhecida como colheita urbana, além de fazer com que o alimento chegue mais rápido, assegu-ra e atesta sua higiene.

Atividade parecida é feita pela Compa-nhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, a Ceagesp. Lá também existe um banco de alimentos em que alguns produto-res e comerciantes doam seus excedentes. Apenas no varejo, a companhia movimenta 250 toneladas de alimentos por mês. Segun-do Marcos Antonio dos Santos, coordenador do banco, apenas 50 dos 3.000 varejistas fa-zem doação dos excedentes. Este número pode variar devido a doações esporádicas. Ele afirma que os alimentos sobressalen-tes da feira-livre da Ceagesp, que acontece às quartas-feiras, aos sábados e domingos, também podem ser doados ao banco.

Neste trabalho desde março de 2008, Marcos Antonio acredita ter conscientizado alguns produtores e comerciantes a doarem as sobras. “O número de doadores aumen-tou desde que cheguei aqui. Só em agosto deste ano foram arrecadadas 114 tonela-das de alimentos”, ressalta. Dentre as ins-

SOBRASO Brasil joga fora R$12 bilhões em comida por ano e 64% de tudo o que é plantado termina no lixo

REPORTAGEM JOÃO COTRIM e VINÍCIUS SACCOMANI (3o ano de Jornalismo) IMAGEM ANTONIO COSTA (3o ano de Jornalismo)

Os restos da Ceagesp são doados para

instituições cadastradas. O que sobrar é armazenado

no fundo do terreno da Companhia e segue

para o aterro de Itapevi

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Dos 3000 comerciantes da Ceagesp, apenas 50 fazem doações ao banco de alimentos da estatal

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tituições atendidas pelo banco estão asilos, associações de amparo à criança, creches e projetos sociais espalhados pela cidade.

Vale lembrar que os alimentos arrecada-dos por estes bancos são os chamados in natura, ou seja, alimentos naturais como frutas, verduras e legumes. No caso do pro-grama “Mesa Brasil” e da ONG Banco de Ali-mentos, há uma exceção para os produtos industrializados como o iogurte, o macar-rão e o açúcar. Caso estejam dentro do pra-zo de validade e inviolados, também podem ser levados para as instituições atendidas. Alimentos já preparados que sobram em estabelecimentos comerciais, como nos res-taurantes, não são aproveitados. “Nós preci-

saríamos de uma estrutura grandiosa para receber o alimento pronto. Isso demandaria outro tipo de transporte e armazenamento que não temos hoje”, afirma Isabel Marçal.

Mas esse não é o único problema. De acordo com o Código Civil Brasileiro, os res-taurantes são os responsáveis por qualquer problema causado pelos alimentos doados. Isso, segundo Isabel, inibe a doação de boa fé dos estabelecimentos comerciais.

Essa história poderia ser diferente se um Projeto de Lei de 1998 fosse aprovado. Atendendo uma solicitação do Sesc e impe-trado pelo então senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE), o Estatuto do Bom Samaritano propunha a isenção da responsabilidade aos

restaurantes que doassem alimentos. Após 11 anos de tramitação na Câmara e no Sena-do, o projeto de lei, que passou a ser o PLS 4747, foi arquivado em fevereiro de 2007.

Akemi Noda, proprietária do restauran-te self-service Pimenta Rosa, na zona sul de São Paulo, sente na pele essa situação. Dia-riamente, toda a sobra de comida é jogada no lixo. “No começo, ficava sem fome de ver a comida indo para o lixo”, afirma. O moti-vo do descarte é o mesmo de tantos outros proprietários: o medo de que a doação pos-sa fazer mal a alguém e que a responsabi-lidade caia sobre o seu estabelecimento. O único produto do restaurante Pimenta Rosa que não tem o lixo como destino e pode ser reaproveitado é o óleo usado em frituras. Recolhido, ele vai para uma empresa onde é transformado em sabão e detergente.

A PARTE DOS RESTAURANTES Em al-guns restaurantes, as sobras são aproveita-das de outra maneira. No tradicional Terra-ço Itália, no centro de São Paulo, a produção para o serviço a la carte depende da deman-da, e o nível de descarte é muito baixo. Em compensação, é no buffet do almoço execu-tivo que sobram mais alimentos. “Aqui te-nho 32 funcionários e a comida que sobra do buffet vai para o consumo deles no dia”, afirma Roberto Adler, gerente geral do res-taurante. Segundo ele, o maior desperdício é na mesa do funcionário, pois ele sempre pega mais comida do que realmente iria consumir. E o que fica no prato tem como destino final o lixo.

Carla Hon, proprietária do restauran-te self-service Cozinha & Companhia, na zona sul de São Paulo, trabalha da mesma maneira. A comida que sobra alimenta seus funcionários. Mesmo assim, muita comida vai para o lixo. Porém, ressalta que algumas coisas podem ser reaproveitadas: “O arroz que sobra vira bolinho no dia seguinte.” Mas ela adverte que é preciso ter muita cuida-do quando se coloca para o consumo dos clientes. “Se tenho dúvida sobre a qualidade de algum alimento, não tenho outra saída a não ser jogá-lo no lixo”, afirma.

Já na rede de restaurantes Bom Prato, gerenciada pelo governo do Estado de São Paulo, há um rígido controle na quantidade de comida que é feita e servida à população, evitando que o alimento seja jogado fora. São servidas diariamente 42.320 refeições nas 30 unidades espalhadas pelo Estado.Uma das mais movimentadas é a da Rua

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Dos 3000 comerciantes da Ceagesp, apenas 50 fazem doações ao banco de alimentos da estatal

12 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

tituições atendidas pelo banco estão asilos, associações de amparo à criança, creches e projetos sociais espalhados pela cidade.

Vale lembrar que os alimentos arrecada-dos por estes bancos são os chamados in natura, ou seja, alimentos naturais como frutas, verduras e legumes. No caso do pro-grama “Mesa Brasil” e da ONG Banco de Ali-mentos, há uma exceção para os produtos industrializados como o iogurte, o macar-rão e o açúcar. Caso estejam dentro do pra-zo de validade e inviolados, também podem ser levados para as instituições atendidas. Alimentos já preparados que sobram em estabelecimentos comerciais, como nos res-taurantes, não são aproveitados. “Nós preci-

saríamos de uma estrutura grandiosa para receber o alimento pronto. Isso demandaria outro tipo de transporte e armazenamento que não temos hoje”, afirma Isabel Marçal.

Mas esse não é o único problema. De acordo com o Código Civil Brasileiro, os res-taurantes são os responsáveis por qualquer problema causado pelos alimentos doados. Isso, segundo Isabel, inibe a doação de boa fé dos estabelecimentos comerciais.

Essa história poderia ser diferente se um Projeto de Lei de 1998 fosse aprovado. Atendendo uma solicitação do Sesc e impe-trado pelo então senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE), o Estatuto do Bom Samaritano propunha a isenção da responsabilidade aos

restaurantes que doassem alimentos. Após 11 anos de tramitação na Câmara e no Sena-do, o projeto de lei, que passou a ser o PLS 4747, foi arquivado em fevereiro de 2007.

Akemi Noda, proprietária do restauran-te self-service Pimenta Rosa, na zona sul de São Paulo, sente na pele essa situação. Dia-riamente, toda a sobra de comida é jogada no lixo. “No começo, ficava sem fome de ver a comida indo para o lixo”, afirma. O moti-vo do descarte é o mesmo de tantos outros proprietários: o medo de que a doação pos-sa fazer mal a alguém e que a responsabi-lidade caia sobre o seu estabelecimento. O único produto do restaurante Pimenta Rosa que não tem o lixo como destino e pode ser reaproveitado é o óleo usado em frituras. Recolhido, ele vai para uma empresa onde é transformado em sabão e detergente.

A PARTE DOS RESTAURANTES Em al-guns restaurantes, as sobras são aproveita-das de outra maneira. No tradicional Terra-ço Itália, no centro de São Paulo, a produção para o serviço a la carte depende da deman-da, e o nível de descarte é muito baixo. Em compensação, é no buffet do almoço execu-tivo que sobram mais alimentos. “Aqui te-nho 32 funcionários e a comida que sobra do buffet vai para o consumo deles no dia”, afirma Roberto Adler, gerente geral do res-taurante. Segundo ele, o maior desperdício é na mesa do funcionário, pois ele sempre pega mais comida do que realmente iria consumir. E o que fica no prato tem como destino final o lixo.

Carla Hon, proprietária do restauran-te self-service Cozinha & Companhia, na zona sul de São Paulo, trabalha da mesma maneira. A comida que sobra alimenta seus funcionários. Mesmo assim, muita comida vai para o lixo. Porém, ressalta que algumas coisas podem ser reaproveitadas: “O arroz que sobra vira bolinho no dia seguinte.” Mas ela adverte que é preciso ter muita cuida-do quando se coloca para o consumo dos clientes. “Se tenho dúvida sobre a qualidade de algum alimento, não tenho outra saída a não ser jogá-lo no lixo”, afirma.

Já na rede de restaurantes Bom Prato, gerenciada pelo governo do Estado de São Paulo, há um rígido controle na quantidade de comida que é feita e servida à população, evitando que o alimento seja jogado fora. São servidas diariamente 42.320 refeições nas 30 unidades espalhadas pelo Estado.Uma das mais movimentadas é a da Rua

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Geralda Aparecida, 71 anos, e Dona Dulcinéia, 50 anos, não se conhecem. Mas, todo final de semana vão à feira da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) em busca do que sobra. A maioria dos alimentos que não são vendidos é jogada no chão. E da mesma forma que, há minutos atrás, pessoas os escolhiam nas gôndolas, as duas os escolhem no chão. Os alimentos não têm mais valor financeiro, mas para elas ainda possuem o valor nutricional. É com o olhar atento que Dona Dulcinéia, desempregada há quatro anos, anda pela feira, com a sobrinha de 3 anos Beatriz, buscando os melhores alimentos. Segundo ela, alguns

varejistas não deixam as pessoas pegarem os que ficam no chão. “A gente tem que pedir antes”, afirma. “Essa comida que eles jogam é boa, nunca fez mal para mim nem para ninguém da minha família”, conta Geralda. Moradora da Vila Leopoldina, ela diz que todo fim de semana vai à feira e abastece a geladeira com esses alimentos e com outros que acaba comprando. “O lixo daqui é muito rico, eles não precisavam fazer isso”, afirma. No entanto, os alimentos que não são aproveitados vão para o aterro. A empresa responsável por essa coleta é a Construban e o destino dessa comida é o aterro sanitário da cidade de Itapevi, a 35 quilômetros da capital paulista.

O lIxO quE vAI à MEsA

O programa “Mesa Brasil”, do sesc-sP, oferece transporte

para levar alimentos doados a mais de 500 intituições

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 13

25 de Março, no centro da capital paulis-ta. Segundo Ludmilla Vargas, nutricionista da unidade, o combate às sobras é intenso. “Aqui temos um cálculo para que não seja desperdiçado tanto alimento”.

Todas as refeições são compostas de arroz, feijão, carne, farinha de mandioca, salada, legumes, suco, frutas e pão. Calcula-se, a partir da quantidade nutricional diária necessária para uma pessoa, as porções mé-dias que são servidas aos clientes.

Apesar do índice baixo de desperdício, Ludmilla lembra que o descarte ainda exis-te. “Há uma diferença entre sobra e resto. A sobra é o alimento excedente que não saiu da panela. Já o resto é aquilo que foi servi-do e não foi consumido.” Segundo ela, é no resto que se dá o maior desperdício do res-taurante. Aproximadamente 15% da comida servida é jogada no lixo.

NA MESA DE CASA O desperdício de alimentos não acontece só nos restaurantes. De acordo com uma estimativa da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a Em-brapa, uma família de classe média joga no lixo 182,5 quilos de alimentos por ano, o su-ficiente para alimentar uma criança durante seis meses. Como se não bastasse, 61% dos alimentos in natura adquiridos pelo consu-midor são jogados no lixo, segundo a As-sociação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe).

Para Carlos Eduardo Oliveira Júnior, membro do Conselho Regional de Econo-mia de São Paulo (Corecon-SP), poucas são as informações divulgadas na mídia sobre como aproveitar melhor os alimentos. “O

desperdício já faz parte da cultura do bra-sileiro que joga no lixo sem se preocupar. Ele não separa nem o próprio lixo, que dirá a comida”. Segundo o economista, a fartura na produção de alimentos no Brasil barateia o custo desses produtos primários e facilita o desperdício. “Se o valor dos alimentos fos-se um pouco mais elevado, o consumidor pensaria duas vezes antes de jogar comida fora”, esclarece Oliveira Júnior.

O engenheiro de alimentos Nilo Sérgio Sabbião Rodrigues concorda com esta teo-ria. “No Brasil, o alimento é adquirido muito facilmente e por um preço baixo. A pessoa que compra um pé de alface, por exemplo, não tem a mínima preocupação se tiver que

jogá-lo no lixo, pois sabe que na próxima es-quina encontrará outro em condições iguais ou melhores”, destaca. O professor da Fa-culdade de Engenharia de Alimentos da Uni-versidade Estadual de Campinas (FEA-Uni-camp) ressalta que toda prática depende da consciência de cada um. É assim que países como Itália e Inglaterra fazem para comba-ter o desperdício. Lá cada comunidade ou bairro tem um banco de alimentos, financia-dos pelo governo. Uma equipe de nutricio-nistas separa o que ainda é consumível e en-caminha às pessoas pobres de cada região. Junta-se a isso a isenção de responsabilida-de ao doador de boa fé que pode oferecer os alimentos sem culpa ou medo algum.

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Verifique as condições de higiene e limpeza, como o uso de luvas e uniforme, do vendedor e do local de venda e de consumo de alimentos nas ruas

14 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

DENÚNCIA

No município de São Paulo, a Lei 11039/91, que permitia o comércio ambulante de ali-mentos em vias e logradouros públicos, foi regulamentada pelo Decreto n°42.600/02, que determina que a fiscalização do comér-cio ambulante de alimentos é responsabili-dade das subprefeituras. Elas concedem aos ambulantes o Termo de Permissão de Uso (TPU), permitindo a comercialização dos ali-mentos, e possuem equipes de fiscais que verificam o cumprimento das normas.

No momento da fiscalização, o vende-dor deve comprovar a existência de produ-tos de limpeza para a própria higienização e de seus utensílios. Só é autorizado o uso de recipientes com tampas, e deve haver unidades frigoríficas para o armazenamen-to de alimentos, como molhos e local para guardar até 50 litros de água. O carrinho também precisa apresentar pia e tanque es-peciais, já que é proibido o despejo de água em vias públicas.

QUEM NÃO CORRER, PAGA Um comer-ciante encontrado operando sem licença e sem essas exigências pode ter seu carri-nho e mercadorias apreendidos pela fisca-lização. Itens do comércio de armarinhos e miudezas ficam disponíveis por 30 dias para retirada, que só pode ser feita após dar entrada em um pedido e mediante o paga-mento de multa de R$ 87,20. As bebidas al-coólicas apreendidas são destruídas e os ali-mentos perecíveis que estiverem com prazo de validade vencido são descartados. Já os que estiverem dentro da validade estipulada

pelo fabricante são doados a instituições de caridade cadastradas na subprefeitura do local da apreensão.

Quando o veículo tem licença para tra-balhar em Pirituba, mas está vendendo na Paulista, por exemplo, o proprietário paga multa que varia entre R$ 174,40 e R$436. Caso não tenha licença, acrescentam-se ao valor da penalidade 10 unidades fiscais, que correspondem a R$ 872.

Os vendedores ambulantes que podem comercializar alimentos são divididos em três categorias, de acordo com o Decreto nº 40.342/01. Os efetivos são aqueles que exercem sua atividade carregando a merca-doria junto ao corpo e em circulação, como vendedores de balas. Os de ponto móvel são os que possuem o auxílio de veículos auto-motivos ou de propulsão humana, como é o caso dos vendedores de pipoca e de milho. E os de ponto fixo, que vendem comida em barracas não removíveis, em local definido pela Administração Pública Regional (sub-prefeituras), como as barracas de frutas.

Os que vendem em carrinhos de hot dog, no entanto, são regulamentados por outra lei, a 12.736/98. Neste caso, não cabe a subprefeitura, mas sim à Coordenação de Vigilância em Saúde (Convisa) fazer a fisca-lização. Para este tipo de comércio é neces-sário obter o Cadastro Municipal de Vigilân-cia Sanitária (Cmvs) e há alguns requisitos a mais. É preciso, por exemplo, ter cobertura para que o veículo fique limpo, manter os alimentos longe de insetos e roedores para

Alimentos vendidos na rua podem conter milhões de microorganismos nocivos à saúde e a fiscalização deste comércio ainda é escassa

DE bEM COM AsAÚDE

Crianças, idosos e gestantes devem evitar se alimentar nas ruas, pois constituem grupo de risco, ou seja, apresentam características que os tornam mais suscetíveis a contaminações

REPORTAGEM MAÍRA LIE CHAO e SARAH MUND (3o ano de Jornalismo) IMAGEM LAISA BEATRIS (2o ano de Jornalismo) e RENATA MIWA (2o ano de Publicidade e Propaganda)

comidailegal

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ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 15

evitar contaminação, e ter boa iluminação.A Covisa orienta as subprefeituras quan-

to à elaboração das normas que estabelecem os requisitos sanitários. Tais condições es-tão baseados nas recomendações da Organi-zação das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) para alimentos servidos na rua. Para ser um candidato a vendedor ambulante o interessado precisa: residir no município, passar por exame médico anual-mente, possuir equipamento conforme as condições estabelecidas pelas normas es-pecíficas e obter o certificado do curso de boas práticas, oferecido gratuitamente pela Supervisão de Vigilância em Saúde (Suvis).

Segundo o presidente do Sindicato dos Comerciantes Ambulantes, Aurélio de Oli-veira, os comerciantes precisam ser licen-ciados pela prefeitura para que cumpram regras básicas, sobretudo de saúde e hi-giene. “Para comercializar legalmente, o ci-dadão deve se submeter a leis municipais, estaduais e da vigilância sanitária. Ele deve fazer vistoria do equipamento que usa, da qualidade dos produtos e, inclusive, deve se submeter a exames médicos”, afirma. Se-gundo ele, isso colabora para que haja um comércio ambulante de qualidade.

PROBLEMA DE SAÚDE “Normalmente, comer na rua é um grande risco à saúde pela falta de acesso dos manipuladores a locais para lavarem as mãos e irem ao banheiro”, afirma Elizabeth Torres, professora do De-partamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo

(FSP-USP). “Além disso, os pratos que têm alimentos de origem animal, como cachor-ros-quentes e yakissobas, estão mais susce-tíveis a contaminação e deterioração”, diz.

Katy Gama, 23 anos, é estudante de Ad-ministração e costuma comer na rua antes da aula, devido aos preços acessíveis e a praticidade, mas já passou por problemas. “Já tive disenteria e já fui parar no PS [pron-to socorro] por causa de um cachorro quen-te. O pastel aqui na rua Vergueiro é muito bom, mas também depende do dia. Se você der sorte, pega o óleo fresquinho. Mas tem dia que está um sebo”, conta.

Elizabeth afirma que comer nessas bar-raquinhas pode ser muito perigoso. Segun-do ela, os alimentos de origem animal, por serem completos nutricionalmente facilitam o crescimento de micróbios – como bacté-rias, mofos e leveduras – já que oferecem um ambiente propício para sua prolifera-ção. “Em princípio, os alimentos de origem vegetal seriam mais seguros, assim como os processados seriam mais seguros que os crus”, sugere a professora. Aurélio concor-da e diz que por isso aconselha os comer-ciantes a trocarem as barracas de comidas quentes por outras de frutas frescas.

Foi apostando nisso que Edivaldo Álva-res Viera montou sua barraquinha de fru-tas na esquina da Avenida Paulista com a Avenida Brigadeiro Luis Antonio. “Fruta é saúde. O pessoal gosta mais e a prefeitura persegue menos”, explica. Ele garante que vai às 5h da manhã buscá-las no Ceasa. Às

A fiscalização da venda de alimentos nas ruas só é feita

mediante denúncia, por isso, muitos ambulantes continuam

trabalhando normalmente

ilegal

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8h um empregado monta a barraquinha no local e quando Edivaldo chega, é só organi-zar os produtos e começar a vender.

Mirela Barbosa de Lima e Nathália dos Santos vendem açaí com frutas em carrinhos refrigerados na região da Lapa. Elas andam por ruas mais movimentadas, como a Doze de Outubro. “Nós não temos regulamenta-ção da prefeitura, mas temos um contrato com a empresa”, conta Mirela. De acordo com o contrato mostrado pela comercian-te, a empresa de onde vêm os produtos é a Ice Mix Amazônia, localizada na Rua Cavoá, 283. Mas é tudo informal. “Quando baixa a fiscalização é pernas para que te quero. Se eles [os fiscais] pegarem, apreendem o carri-nho”, completa a ambulante.

FORA DA LEI Segundo o Artigo 19 do Decreto nº 40.342/01, a atividade de ambu-lante, qualquer que seja a categoria, somen-te poderá ser exercida mediante a emissão, pela respectiva administração regional, do Termo de Permissão de Uso (TPU). Novas TPUs não são mais emitidas para ambulan-tes que preparam alimentos, com exceção dos preparados em veículos automotivos, como o cachorro quente. Isso acontece por-que só eles são obrigados a realizar cursos de cuidados com higiene, além de atender aos requisitos técnicos exigidos pela legis-lação vigente. “Para assegurar a saúde dos consumidores, já que nas ruas não há con-dições de higiene para o preparo de comida foi que a prefeitura proibiu esse tipo de co-mércio”, informa Clóvis Aparecido Vicente, coordenador da Unidade Técnica de Fiscali-

zação da Subprefeitura da Lapa (UTF), a sub-prefeitura que mais apreende mercadorias no município de São Paulo.

Segundo Antônio Carlos Tavarez, que trabalha no Departamento de Apreensão da Subprefeitura da Lapa, os vendedores regu-lamentados são fiscalizados somente atra-vés de denúncias e os não-regulamentados ficam a cargo dos fiscais identificados por jalecos azuis com o nome da subprefeitura que circulam pelas ruas todos os dias che-cando as condições de higiene dos vende-dores legalizados e apreendendo as merca-dorias dos que não têm licença. “Mas não conseguimos dar conta de tudo. Há muitas reclamações e os ambulantes ilegais avan-çam nos horários em que os fiscais estão al-moçando, por exemplo, ou antes ou depois do expediente”, reclama Tavarez.

Duas caminhonetes, uma kombi e um caminhão saem acompanhados de três via-turas da Guarda Civil Metropolitana (CGM) para fazer um horário diferenciado de ser-viço na tentativa de pegar comerciantes ile-gais desprevenidos. Após as primeiras apre-ensões a informação já chega aos ouvidos de outros vendedores, via celular. Todos os ambulantes fiscalizados recebem uma ficha amarela, com a identificação de seus produ-tos, que são lacrados pelos fiscais.

Tudo que foi apreendido é levado para o depósito da subprefeitura. Lá o material é identificado e armazenado, para que os comerciantes possam retirar seus produtos em até 30 dias, depois de pagar uma multa. Mas, na maioria das vezes, o valor supera o

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O consumidor também deve ficar atento e verificar as condições do local

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dos equipamentos e mercadorias.Willis Rodrigues vende frutas na Barra

Funda há seis meses e durante a apreensão de sua mercadoria e carrinho jogou fora a identificação que o fiscal lhe forneceu: “Toda semana eles levam [o carrinho], nem compensa ir lá buscar, o jeito é comprar ou-tro para poder continuar vendendo”.

Josivaldo Alves da Silva, 30 anos, ven-de sanduíches; Pedro dos Santos Mendes, 20 anos, frita pastéis; José Ramos, 18 anos, vende milho cozido; e Elioneide da Costa e Gilson Trindade se revezam entre as tapio-cas e as bebidas. Embora vendam produtos diferentes na entrada da Uninove Vergueiro, todos reclamam da mesma coisa: a atitude dos fiscais. “Os rapa, os militar, passam aqui todos os dias da semana e já chegam falando sai fora, sai fora. E aí é correr ou perder tudo”, relata Josivaldo. Questionado sobre a regulamentação exigida pela prefei-tura, Pedro rebate: “Eles não dão licença na prefeitura. Eu passei uma semana acampa-do em frente a prefeitura em 2003, mas eles não quiseram nem saber”.

Embora não regulamentados, esses tra-balhadores já possuem órgãos que os asses-soram, como o Sindicato dos Trabalhado-res da Economia Informal, o Sindicato dos Trabalhadires Ambulantes e o Centro de Apoio aos Pequenos Empreendimentos de São Paulo. “Chega aqui um monte de cida-dão querendo trabalhar. Mas eu já desisti e às vezes até estimulo eles a montarem o seu negócio sem a autorização da prefeitura. Só falo para cumprirem com a obrigação de

sustentar um comércio benéfico para a saú-de. Se depender da prefeitura, o sujeito vai ficar desempregado para sempre”, reclama o presidente do Sindicato dos Trabalhado-res Ambulantes, Aurélio de Oliveira.

FIQUE EsPERtO Segundo a professora do Departamento de Nutrição da USP, Eli-zabeth Torres, e orientações da Covisa (Co-ordenação de Vigilância em Saúde), existem alguns cuidados que podem ser tomados na hora de comer na rua. Verificar a higiene e as condições do local de venda e de consu-mo é um deles. Outra dica é perguntar ao vendedor qual a procedência dos alimentos oferecidos e quem são os fornecedores. Es-sas são estratégias para saber se os alimen-tos estão bons para consumo.

Além disso, é importante observar como o alimento é preparado, já que com a corre-ria do dia-a-dia as pessoas não costumam reparar se o comerciante está usando uten-sílios limpos. A partir disto, observe tam-bém se o vendedor está com as mãos e o uniforme limpos, usando luva e protegendo o cabelo com uma rede.

A temperatura também merece atenção. Alimentos quentes devem ter temperatu-ra mínima de 60ºC, os refrigerados devem ser mantidos à 10ºC e os congelados a no máximo -18ºC. Vale lembrar que qualquer cidadão pode denunciar más condições de higiene e limpeza em pontos de venda de alimentos nas ruas. Basta entrar em conta-to com a Prefeitura de São Paulo ou com a Covisa pelo telefone 156 ou pelo site http://sac.prefeitura.sp.gov.br.

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 17

A Subprefeitura da Lapa é uma das que mais faz apreensões

na cidade de São Paulo

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dos equipamentos e mercadorias.Willis Rodrigues vende frutas na Barra

Funda há seis meses e durante a apreensão de sua mercadoria e carrinho jogou fora a identificação que o fiscal lhe forneceu: “Toda semana eles levam [o carrinho], nem compensa ir lá buscar, o jeito é comprar ou-tro para poder continuar vendendo”.

Josivaldo Alves da Silva, 30 anos, ven-de sanduíches; Pedro dos Santos Mendes, 20 anos, frita pastéis; José Ramos, 18 anos, vende milho cozido; e Elioneide da Costa e Gilson Trindade se revezam entre as tapio-cas e as bebidas. Embora vendam produtos diferentes na entrada da Uninove Vergueiro, todos reclamam da mesma coisa: a atitude dos fiscais. “Os rapa, os militar, passam aqui todos os dias da semana e já chegam falando sai fora, sai fora. E aí é correr ou perder tudo”, relata Josivaldo. Questionado sobre a regulamentação exigida pela prefei-tura, Pedro rebate: “Eles não dão licença na prefeitura. Eu passei uma semana acampa-do em frente a prefeitura em 2003, mas eles não quiseram nem saber”.

Embora não regulamentados, esses tra-balhadores já possuem órgãos que os asses-soram, como o Sindicato dos Trabalhado-res da Economia Informal, o Sindicato dos Trabalhadires Ambulantes e o Centro de Apoio aos Pequenos Empreendimentos de São Paulo. “Chega aqui um monte de cida-dão querendo trabalhar. Mas eu já desisti e às vezes até estimulo eles a montarem o seu negócio sem a autorização da prefeitura. Só falo para cumprirem com a obrigação de

sustentar um comércio benéfico para a saú-de. Se depender da prefeitura, o sujeito vai ficar desempregado para sempre”, reclama o presidente do Sindicato dos Trabalhado-res Ambulantes, Aurélio de Oliveira.

FIQUE EsPERtO Segundo a professora do Departamento de Nutrição da USP, Eli-zabeth Torres, e orientações da Covisa (Co-ordenação de Vigilância em Saúde), existem alguns cuidados que podem ser tomados na hora de comer na rua. Verificar a higiene e as condições do local de venda e de consu-mo é um deles. Outra dica é perguntar ao vendedor qual a procedência dos alimentos oferecidos e quem são os fornecedores. Es-sas são estratégias para saber se os alimen-tos estão bons para consumo.

Além disso, é importante observar como o alimento é preparado, já que com a corre-ria do dia-a-dia as pessoas não costumam reparar se o comerciante está usando uten-sílios limpos. A partir disto, observe tam-bém se o vendedor está com as mãos e o uniforme limpos, usando luva e protegendo o cabelo com uma rede.

A temperatura também merece atenção. Alimentos quentes devem ter temperatu-ra mínima de 60ºC, os refrigerados devem ser mantidos à 10ºC e os congelados a no máximo -18ºC. Vale lembrar que qualquer cidadão pode denunciar más condições de higiene e limpeza em pontos de venda de alimentos nas ruas. Basta entrar em conta-to com a Prefeitura de São Paulo ou com a Covisa pelo telefone 156 ou pelo site http://sac.prefeitura.sp.gov.br.

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A Subprefeitura da Lapa é uma das que mais faz apreensões

na cidade de São Paulo

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Page 18: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

INFÂNCIA

Segundo a Associação Brasileira para o Es-tudo da Obesidade e da Síndrome Metabó-lica (Abeso), cerca de 15% das crianças têm obesidade atualmente. Este transtorno mos-tra-se cada vez mais como um problema de saúde pública e a preocupação em manter a meninada saudável não cabe mais somente aos pais. Por isso, as escolas já não são lo-cais de livre consumo de guloseimas, como

rantes, salgadinhos processados e doces. Grandes colégios particulares da cidade

de São Paulo, preocupados em garantir o bem estar dos alunos, estão transferindo a responsabilidade das cantinas para empre-sas terceirizadas. O Colégio São Luís é um exemplo deles. A escola começou a mudar a rotina dos alunos em 2005, quando passou a direção da cantina para a franquia School Cook, do grupo GRSA, que começou o orien-tar os alunos sobre o que comer.

“Somente a turma do integral recebe aulas de orientação nutricional. Quem sabe, em outro momento, nós conseguiremos abrir para outros períodos”, diz Joyce San-tos, nutricionista da School Cook. Essas au-las têm como objetivo incentivar os alunos a experimentarem alimentos diferentes da dieta diária a que estão acostumados.

NADA DE REFRIGERANTE Além disso, no São Luís há o programa “Opção Equili-brada”, que consiste na fixação de cartazes e distribuição de panfletos com dicas para que os alunos consumam produtos como açaí e barras de cereais, que podem ser comprados na cantina. Outra atitude toma-da pela empresa é a de não vender salgados fritos e salgadinhos processados e, às quar-tas-feiras, ninguém toma refrigerantes. Os alunos ainda ficam com o pé atrás em rela-ção a essa decisão. “É uma iniciativa boa até, mas eu acho que é para vender mais o suco, que é um pouco mais caro do que o refrige-rante”, opina Lucas Azevedo, 15 anos, aluno

doces, salgadinhos e refrigerantes.Como crianças e adolescentes fazem

pelo menos uma refeição no colégio, as instituições, tanto públicas quanto particu-lares, começaram a perceber que poderiam interferir positivamente na rotina alimentar dos alunos, oferecendo comidas mais sau-dáveis, como frutas, salgados assados, e re-duzindo, aos poucos, o consumo de refrige-

REPORTAGEM THAIS LIMA (1o ano de Jornalismo) e LUANA ALVES (4o ano de Jornalismo)IMAGEM ANA JÚLIA DE SOUZA (1o ano de Jornalismo)

A preocupação com a sáude está mudando o cardápio de escolas públicas e particulares

Hora dorecreio

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do primeiro ano do Ensino Médio. No restaurante do colégio, a preocupa-

ção em divulgar uma alimentação balancea-da continua. No almoço, são servidos quatro tipos de sucos e quatro tipos de saladas. Ar-roz e feijão fazem parte do cardápio todos os dias. “Uma vez por semana, a gente co-loca arroz integral, também para incentivar esse tipo de alimento, que não é hábito do brasileiro”, acrescenta Joyce. São ofereci-das, ainda, carne vermelha e branca, sempre grelhadas. A fritura é permitida com mode-ração. “A gente não tira totalmente do car-dápio. Mas, o programa faz com que a gen-te limite muito mais a adição de frituras”, ressalta a nutricionista da School Cook. Para fechar o almoço, duas sobremesas são servi-das, um doce com baixo teor calórico, como gelatina ou flan, e uma fruta.

O aluno é a preocupação principal na hora da montagem do cardápio. “Aqui, como tem crianças, precisa ter uma quantidade maior de carboidratos, pela energia que elas gastam”, explica Joyce. Existe a preocupação da aceitabilidade da comida pelas crianças menores. “A gente faz algumas adaptações dos alimentos, que a gente sabe que a crian-ça não vai aceitar. Por exemplo, batata ao molho funghi, não é habito de uma criança comer. Então a gente tira o molho e deixa só a batata”, exemplifica a nutricionista.

Para os professores, uma alimentação mais saudável não serve apenas para re-duzir o peso, mas também para melhorar

o rendimento do aluno em sala. “Alimento saudável sempre ajuda. Salgadinho, essas coisas, dá um pouco de cansaço na criança”, afirma a professora Ana Cristina Marra, que dá aula para os alunos do ensino integral no Colégio São Luís. O professor João Marcello Almeida completa: “Eu acho importante eles terem opção de alimentos saudáveis e acho que isso influencia na medida em que eles têm uma rotina de alimentação. Tendo uma alimentação saudável, acho que melhora, sim, o rendimento deles”.

Os pais também têm papel fundamen-tal na reeducação alimentar das crianças. “Quando eu era um bebezinho, fui crescen-do comendo fruta. Assim aprendi a comer”, explica Viktória da Silva, de 8 anos, aluna do São Luís. Porém, esse tipo de atitude ainda é minoria. Na lancheira dos alunos, prevale-cem os alimentos com pouco valor nutricio-nal, como bolacha recheada, refrigerantes e salgadinhos. Infelizmente, as escolas ainda não conseguem interferir nesse nível. “A gente ainda não tem esse contato tão pró-ximo com os pais. O colégio não tem, por exemplo, algum programa em que podemos indicar aos pais como montar uma lanchei-ra mais saudável”, lamenta Joyce.

Nas escolas estaduais, o processo de educação nutricional é o mesmo. “Eu educo o filho para que ele eduque o pai”, diz An-dréia Regina dos Santos, nutricionista pelo Estado há 8 anos. “Eu falo na sala de aula que eles têm que comer alimentos saudá-

veis. Mas o pai manda na lancheira biscoito recheado, iogurte, refrigerante. Então, tudo o que eu falo vai por água abaixo”, afirma a nutricionista. A mobilização dos pais para essa questão não é tarefa fácil. “Imagina numa reunião de pais em que só 10% com-parecem. A adesão é muito pequena. Então, nós distribuímos material informativo para os alunos levarem para casa”, explica. Esse tipo de iniciativa visa melhorar também a qualidade de vida em casa.

ComIDA DE vERDADE Na rede estadual de ensino, mudam-se os hábitos dos alunos também através da merenda. Ela é oferecida aos matriculados no Ensino Fundamental, de primeira até a oitava série, da Escola Es-tadual Lasar Segall. Para alunos do período integral, a alimentação é distribuída em três refeições: lanche da manhã, o almoço e o lanche da tarde. “Temos uma estimativa de atender 65% das necessidades nutricionais dos alunos enquanto eles estão no período escolar”, diz Andréia. “Eu não posso estimar que ele alcance todas as calorias durante o tempo em que está na escola. Não é uma re-alidade de todos, tem gente que vai na esco-la só para comer”, lamenta.

A preocupação do governo estadual em oferecer alimentos mais saudáveis começou em 2004, com a implantação do projeto “Sir-va-se”. O aluno pode colocar o alimento que preferir em seu prato, com a utilização do balcão térmico. Além disso, são ministradas aulas de orientação nutricional. O objetivo

A rede estadual de ensino tem programas para melhorar a alimentação dos alunos, mas

não os obrigam a mudar seus hábitos

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INFÂNCIA

Segundo a Associação Brasileira para o Es-tudo da Obesidade e da Síndrome Metabó-lica (Abeso), cerca de 15% das crianças têm obesidade atualmente. Este transtorno mos-tra-se cada vez mais como um problema de saúde pública e a preocupação em manter a meninada saudável não cabe mais somente aos pais. Por isso, as escolas já não são lo-cais de livre consumo de guloseimas, como

rantes, salgadinhos processados e doces. Grandes colégios particulares da cidade

de São Paulo, preocupados em garantir o bem estar dos alunos, estão transferindo a responsabilidade das cantinas para empre-sas terceirizadas. O Colégio São Luís é um exemplo deles. A escola começou a mudar a rotina dos alunos em 2005, quando passou a direção da cantina para a franquia School Cook, do grupo GRSA, que começou o orien-tar os alunos sobre o que comer.

“Somente a turma do integral recebe aulas de orientação nutricional. Quem sabe, em outro momento, nós conseguiremos abrir para outros períodos”, diz Joyce San-tos, nutricionista da School Cook. Essas au-las têm como objetivo incentivar os alunos a experimentarem alimentos diferentes da dieta diária a que estão acostumados.

NADA DE REFRIGERANTE Além disso, no São Luís há o programa “Opção Equili-brada”, que consiste na fixação de cartazes e distribuição de panfletos com dicas para que os alunos consumam produtos como açaí e barras de cereais, que podem ser comprados na cantina. Outra atitude toma-da pela empresa é a de não vender salgados fritos e salgadinhos processados e, às quar-tas-feiras, ninguém toma refrigerantes. Os alunos ainda ficam com o pé atrás em rela-ção a essa decisão. “É uma iniciativa boa até, mas eu acho que é para vender mais o suco, que é um pouco mais caro do que o refrige-rante”, opina Lucas Azevedo, 15 anos, aluno

doces, salgadinhos e refrigerantes.Como crianças e adolescentes fazem

pelo menos uma refeição no colégio, as instituições, tanto públicas quanto particu-lares, começaram a perceber que poderiam interferir positivamente na rotina alimentar dos alunos, oferecendo comidas mais sau-dáveis, como frutas, salgados assados, e re-duzindo, aos poucos, o consumo de refrige-

REPORTAGEM THAIS LIMA (1o ano de Jornalismo) e LUANA ALVES (4o ano de Jornalismo)IMAGEM ANA JÚLIA DE SOUZA (1o ano de Jornalismo)

A preocupação com a sáude está mudando o cardápio de escolas públicas e particulares

Hora dorecreio

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do primeiro ano do Ensino Médio. No restaurante do colégio, a preocupa-

ção em divulgar uma alimentação balancea-da continua. No almoço, são servidos quatro tipos de sucos e quatro tipos de saladas. Ar-roz e feijão fazem parte do cardápio todos os dias. “Uma vez por semana, a gente co-loca arroz integral, também para incentivar esse tipo de alimento, que não é hábito do brasileiro”, acrescenta Joyce. São ofereci-das, ainda, carne vermelha e branca, sempre grelhadas. A fritura é permitida com mode-ração. “A gente não tira totalmente do car-dápio. Mas, o programa faz com que a gen-te limite muito mais a adição de frituras”, ressalta a nutricionista da School Cook. Para fechar o almoço, duas sobremesas são servi-das, um doce com baixo teor calórico, como gelatina ou flan, e uma fruta.

O aluno é a preocupação principal na hora da montagem do cardápio. “Aqui, como tem crianças, precisa ter uma quantidade maior de carboidratos, pela energia que elas gastam”, explica Joyce. Existe a preocupação da aceitabilidade da comida pelas crianças menores. “A gente faz algumas adaptações dos alimentos, que a gente sabe que a crian-ça não vai aceitar. Por exemplo, batata ao molho funghi, não é habito de uma criança comer. Então a gente tira o molho e deixa só a batata”, exemplifica a nutricionista.

Para os professores, uma alimentação mais saudável não serve apenas para re-duzir o peso, mas também para melhorar

o rendimento do aluno em sala. “Alimento saudável sempre ajuda. Salgadinho, essas coisas, dá um pouco de cansaço na criança”, afirma a professora Ana Cristina Marra, que dá aula para os alunos do ensino integral no Colégio São Luís. O professor João Marcello Almeida completa: “Eu acho importante eles terem opção de alimentos saudáveis e acho que isso influencia na medida em que eles têm uma rotina de alimentação. Tendo uma alimentação saudável, acho que melhora, sim, o rendimento deles”.

Os pais também têm papel fundamen-tal na reeducação alimentar das crianças. “Quando eu era um bebezinho, fui crescen-do comendo fruta. Assim aprendi a comer”, explica Viktória da Silva, de 8 anos, aluna do São Luís. Porém, esse tipo de atitude ainda é minoria. Na lancheira dos alunos, prevale-cem os alimentos com pouco valor nutricio-nal, como bolacha recheada, refrigerantes e salgadinhos. Infelizmente, as escolas ainda não conseguem interferir nesse nível. “A gente ainda não tem esse contato tão pró-ximo com os pais. O colégio não tem, por exemplo, algum programa em que podemos indicar aos pais como montar uma lanchei-ra mais saudável”, lamenta Joyce.

Nas escolas estaduais, o processo de educação nutricional é o mesmo. “Eu educo o filho para que ele eduque o pai”, diz An-dréia Regina dos Santos, nutricionista pelo Estado há 8 anos. “Eu falo na sala de aula que eles têm que comer alimentos saudá-

veis. Mas o pai manda na lancheira biscoito recheado, iogurte, refrigerante. Então, tudo o que eu falo vai por água abaixo”, afirma a nutricionista. A mobilização dos pais para essa questão não é tarefa fácil. “Imagina numa reunião de pais em que só 10% com-parecem. A adesão é muito pequena. Então, nós distribuímos material informativo para os alunos levarem para casa”, explica. Esse tipo de iniciativa visa melhorar também a qualidade de vida em casa.

ComIDA DE vERDADE Na rede estadual de ensino, mudam-se os hábitos dos alunos também através da merenda. Ela é oferecida aos matriculados no Ensino Fundamental, de primeira até a oitava série, da Escola Es-tadual Lasar Segall. Para alunos do período integral, a alimentação é distribuída em três refeições: lanche da manhã, o almoço e o lanche da tarde. “Temos uma estimativa de atender 65% das necessidades nutricionais dos alunos enquanto eles estão no período escolar”, diz Andréia. “Eu não posso estimar que ele alcance todas as calorias durante o tempo em que está na escola. Não é uma re-alidade de todos, tem gente que vai na esco-la só para comer”, lamenta.

A preocupação do governo estadual em oferecer alimentos mais saudáveis começou em 2004, com a implantação do projeto “Sir-va-se”. O aluno pode colocar o alimento que preferir em seu prato, com a utilização do balcão térmico. Além disso, são ministradas aulas de orientação nutricional. O objetivo

A rede estadual de ensino tem programas para melhorar a alimentação dos alunos, mas

não os obrigam a mudar seus hábitos

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do programa é a autonomia de escolha. “Ás vezes, dá a entender que o aluno vai pegar muito mais do que ele necessita. E não, por-que eles são ensinados em sala de aula. Eu acho que um dia ou outro ele pode pegar um pouquinho mais, mas a noção de ali-mentação saudável é dada de sala em sala”, diz a nutricionista Andréia Regina.

MEXENDO O CORPO Mais do que so-mente a mudança de hábitos alimentares, Andréia faz questão de enfatizar que a ati-vidade física precisa ser aliada a programas de alimentação saudável para a redução da obesidade infantil. “As aulas de educação fí-sica mudaram muito. Os professores jogam uma bola e falam ‘olha, molecada, joga fu-tebol aí’. Então, não tem mais aquela intera-ção, não tem um gasto de energia”, critica.

Ela sugere que ocorra uma melhoria no calendário de atividades físicas, não só para os alunos, mas para toda a população. “Tem o dia do Agita Galera [programa coordenado pelo Estado que dedica a última sexta-feira do mês de agosto ao ensino e incentivo da atividade física entre alunos, trabalhadores e idosos em escolas e parques da cidade].Mas uma andorinha não faz verão. Você tem 365 dias e coloca-os para pular só em um, acaba não surtindo efeito. Acho que ativi-dades mais interativas deveriam acontecer dentro da escola”, opina.

Isso tem de sobra na Escola Municipal de Educação Infantil Clara Nunes, no bairro do Socorro, na zona sul da cidade. Lá, as ativi-dades esportivas e de interação contam com parquinho ao ar livre, pátio grande e muitos brinquedos para divertir as 180 crianças de

4 a 6 anos que estudam em dois períodos diferentes. Mas a sensação entre todas elas é a horta. Criada em 1987, ela só passou a contar com a participação das crianças em 2006. “A gente fez um projeto já há alguns anos e só depois que ele acabou entrando com mais força”, conta Nanci Venâncio, di-retora da escola há 22 anos. Segundo ela, os alunos da Emei participam de todo o pro-cesso da horta. “Desde escolher o que vão plantar, colocar as sementes, acompanhar o desenvolvimento e colher é feito por elas. Tem que ver a farra quando elas colhem al-guma coisa”, conta.

COM A MÃO NA MASSA Mas nem tudo é só brincadeira. Com um programa bem es-truturado, a escola usa a horta para estimu-lar a alimentação das crianças. “Incentivan-do-as a plantar elas vão começar também a pegar gosto em se alimentar e ver pratos coloridos”, acrescenta Nanci. Célia Maria Vi-selli, coordenadora da escola, ressalta o in-teresse das crianças no projeto. “Elas ficam cada vez mais empolgadas. Agora elas até trazem sementes para serem plantadas sem nem pedirmos”, entusiasma-se.

Além de ensinar as crianças a se alimen-tarem bem, a preocupação com o desper-dício faz parte da orientação. Assim como nas escolas estaduais, as municipais tam-bém trabalham com o sistema self-service. Como as crianças são menores, monitores ficam sempre por perto acompanhando e instruindo. A reciclagem de alimentos tam-bém é ensinada aos alunos na Emei Clara Nunes. Cascas de frutas e outros alimentos orgânicos são separados pelas crianças para

a compostagem doméstica, que produz o adubo necessário para a própria horta. “E detalhe: as crianças aprenderam que isso a gente não joga mais fora”, diz Nanci

Para os pais, a participação em ativida-des como a horta faz com que as crianças criem consciência da importância do ali-mento e, também, do meio ambiente. “Elas aprendem que plantando ajudam a comple-mentar a alimentação e que cuidando das árvores o ar fica mais puro. Eles criam um carinho por tudo isso”, explica Valdir Ama-ro da Silva, pai de Vinicius, que estuda há dois anos na Emei Clara Nunes.

No entanto, as 2.248 unidades de ensino municipais não alimentam as suas crianças só com o que vem das hortas. O “Programa de Alimentação Escolar” fornece 1,8 milhão de refeições por dia e busca criar cardápios levando em consideração o valor nutricio-nal, a variedade e o sabor da comida.

Com programas como o “Merenda Le-gal” e o “Sábado na Escola”, as Secretarias Municipais de Gestão e de Educação tentam aproximar os pais da alimentação e do co-tidiano escolar de seus filhos. O primeiro incentiva a participação dos pais na elabo-ração do cardápio, que é divulgado depois na internet. O segundo oferece atividades nas escolas para toda a família.

Dessa maneira, os familiares participam efetivamente da vida escolar e alimentar dos pequenos e também aprendem. “Com a questão da alimentação é a mesma coisa, a criança pode estimular a família a criar há-bitos mais saudáveis. Elas levam para casa o que aprendem aqui”, conclui a diretora.

Os alunos da Emei plantam o próprio alimento e os do São Luis

têm aula de orientação nutricional

“Elas levam para casa o que aprendem aqui”, dizNanci Venâncio, educadora

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REPORTAGEM Bruna Stuppiello, Carolina BeCker e kelly ferreira (1º ano de Jornalismo)

IMAGENS kelly ferreira (1º ano de Jornalismo) e renata MiWa (2º ano de publicidade e propaganda)

DOCES

eSQuinaS 2º SeMeStre 2008 21

nada de brigadeiro, beijinho, pudim ou torta de chocolate. Hoje, há sobremesas muito mais exóticas, feitas até com pétalas de rosas

é DE COmEr

Payard Patisserie & Chocolat

mACArONS DE ÁGUA DE rOSAS

originários dos monastérios italianos do século XVi, os macarons de água de rosas eram exclusividade da corte de Catarina di Médicis e, posteriormente, foram popularizados por freiras carmelitas. a receita tradicional é composta por farinha de amêndoas e claras de ovos. o chef francês françois payard acrescentou um toque inusitado a essa iguaria: a água de rosas. a unidade custa r$ 1,25 e o sabor leve agrada os clientes. “os macarons são muito requisitados aqui na loja. por conter licor em sua fórmula, a maioria de seus consumidores são adultos”, afirma fábia, atendente da franquia do Shopping iguatemi.

Sorveteria SorokoSOrVETE DE PéTALAS DE rOSAS

Desenvolvido por Maria regina Soroko, uma das proprietárias da sorveteria, o sorvete é composto basicamente por três ingredientes: pétalas de rosas, xarope e água de rosas. emgeral, ainda é acompanhado por geléia de flores. É preciso de um cuidado grande com as frágeis rosas. elas são importadas do líbanoe cultivadas aqui no Brasil em estufas a fim de preservar o cheiro e o gosto natural. asobremesa, servida há mais de dez anos pela casa, custa r$ 2,75 (a bola) e é considerada uma das principais atrações do local. Muitas pessoas vão ao estabelecimento somente para apreciar o sorvete, principalmente as mulheres. “atualmente este sorvete não pode faltar, devido ao seu cheiro apaixonante e ao sabor que irradia”, afirma Maria regina.

Premier CakeTrUFAS DE CHÁ VErDE

Graças aos inúmeros benefícios que traz a saúde, como a queima de gorduras e a ativação do sistema imunológico, o uso do matchá (chá verde) é comum na culinária japonesa. o confeiteiro Shinobu Sasaki aproveitou esta tradição e aderiu o ingrediente à trufa. por r$ 80 o quilo, a mistura de chocolate branco, leite em pó e chá verde resulta em um sabor levemente amargo. “Geralmente as pessoas que consomem já tem certo conhecimento sobre o produto. Dentre as que provam por curiosidade, praticamente metade acaba gostando”, afirma Jully lumi, sócia da doceria.

Casa ZilannaBOLO DE mACArrÃO

a receita que veio de longe é de origem israelita. Dela fazem parte dois ingredientes fundamentais: espaguete e geléia de frutas. inspirando-se neste doce, a Casa Zilanna, empório frequentado por muitos judeus moradores do bairro de Higienópolis, resolveu criar uma receita própria. assimnasceu um bolo inusitado, cuja massa é feita a partir de macarrão aletria e coberta com suspiro, nozes e, também, damasco. “nós estilizamos a receita, tornando o doce mais fino”, afirma ana Manoel Gonçalves, proprietária do estabelecimento. De textura peculiar e sabor agradável, a fatia do bolo de macarrão da Casa Zilanna custa r$ 3,50 e atrai os mais variados clientes.

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REPORTAGEM Bruna Stuppiello, Carolina BeCker e kelly ferreira (1º ano de Jornalismo)

IMAGENS kelly ferreira (1º ano de Jornalismo) e renata MiWa (2º ano de publicidade e propaganda)

DOCES

eSQuinaS 2º SeMeStre 2008 21

nada de brigadeiro, beijinho, pudim ou torta de chocolate. Hoje, há sobremesas muito mais exóticas, feitas até com pétalas de rosas

é DE COmEr

Payard Patisserie & Chocolat

mACArONS DE ÁGUA DE rOSAS

originários dos monastérios italianos do século XVi, os macarons de água de rosas eram exclusividade da corte de Catarina di Médicis e, posteriormente, foram popularizados por freiras carmelitas. a receita tradicional é composta por farinha de amêndoas e claras de ovos. o chef francês françois payard acrescentou um toque inusitado a essa iguaria: a água de rosas. a unidade custa r$ 1,25 e o sabor leve agrada os clientes. “os macarons são muito requisitados aqui na loja. por conter licor em sua fórmula, a maioria de seus consumidores são adultos”, afirma fábia, atendente da franquia do Shopping iguatemi.

Sorveteria SorokoSOrVETE DE PéTALAS DE rOSAS

Desenvolvido por Maria regina Soroko, uma das proprietárias da sorveteria, o sorvete é composto basicamente por três ingredientes: pétalas de rosas, xarope e água de rosas. emgeral, ainda é acompanhado por geléia de flores. É preciso de um cuidado grande com as frágeis rosas. elas são importadas do líbanoe cultivadas aqui no Brasil em estufas a fim de preservar o cheiro e o gosto natural. asobremesa, servida há mais de dez anos pela casa, custa r$ 2,75 (a bola) e é considerada uma das principais atrações do local. Muitas pessoas vão ao estabelecimento somente para apreciar o sorvete, principalmente as mulheres. “atualmente este sorvete não pode faltar, devido ao seu cheiro apaixonante e ao sabor que irradia”, afirma Maria regina.

Premier CakeTrUFAS DE CHÁ VErDE

Graças aos inúmeros benefícios que traz a saúde, como a queima de gorduras e a ativação do sistema imunológico, o uso do matchá (chá verde) é comum na culinária japonesa. o confeiteiro Shinobu Sasaki aproveitou esta tradição e aderiu o ingrediente à trufa. por r$ 80 o quilo, a mistura de chocolate branco, leite em pó e chá verde resulta em um sabor levemente amargo. “Geralmente as pessoas que consomem já tem certo conhecimento sobre o produto. Dentre as que provam por curiosidade, praticamente metade acaba gostando”, afirma Jully lumi, sócia da doceria.

Casa ZilannaBOLO DE mACArrÃO

a receita que veio de longe é de origem israelita. Dela fazem parte dois ingredientes fundamentais: espaguete e geléia de frutas. inspirando-se neste doce, a Casa Zilanna, empório frequentado por muitos judeus moradores do bairro de Higienópolis, resolveu criar uma receita própria. assimnasceu um bolo inusitado, cuja massa é feita a partir de macarrão aletria e coberta com suspiro, nozes e, também, damasco. “nós estilizamos a receita, tornando o doce mais fino”, afirma ana Manoel Gonçalves, proprietária do estabelecimento. De textura peculiar e sabor agradável, a fatia do bolo de macarrão da Casa Zilanna custa r$ 3,50 e atrai os mais variados clientes.

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Sociedade

alimentoiN NaTURa

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ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 23

alimentoTURa

O Brasil tem o maior número de bancos de leite humano do mundo, mas ainda faltam doações

Com 193 unidades de bancos de leite hu-mano (BLH) e 39 postos de coleta, o Brasil distribuiu, em 2007, 96.451,3 litros do lí-quido, provenientes de 193.696 mães e doa-dos para 276.739 bebês, segundo dados da Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano do Ministério da Saúde. No entanto, o país vive uma situação bastante delicada. No Es-tado de São Paulo, que possui 51 unidades e sete postos de coleta – a maior rede do país – os responsáveis pelos bancos de leite re-clamam que o estoque nunca conseguiu ser suficiente para suprir a demanda.

“No Banco de Leite Humano do Hospital e Maternidade Leonor Mendes de Barros e em outros localizados em maternidades de alto risco, precisaríamos do triplo do volu-me, assim atenderíamos a demanda inteira e sobraria estoque para a externa”, explica a Dra. Maria José Guardia Mattar, coordena-dora dos bancos de leite humano do Estado de São Paulo. O Ministério da Saúde tam-bém não tem dados de qual a quantidade necessária de leite para atender todos que precisam, mas atualmente, faz campanha para aumentar em 25% a quantia de líquido coletado. Também de acordo com dados do Ministério, as demandas pelo leite variam porque, quando os bancos de leite conse-guem atender um maior número de bebês hospitalizados, outras requisições, como para crianças alérgicas, começam a surgir.

aiNda falTa leiTe Os motivos para a oferta insuficiente de leite nos BLHs são muitos. Para a Dra. Maria José, o apoio do governo é fraco. “Seria importante se tivés-semos a ajuda da Secretaria Estadual de Saúde”, afirma. “Fazemos muitas palestras para maternidades interessadas em implan-tar BLHs, mas tudo o que é feito é com os recursos das próprias instituições”, explica. Além disso, segundo a Dra. Ana Cristina Freitas de Vilhena Abrão, diretora do Cen-tro de Incentivo e Apoio ao Aleitamento Ma-terno (Ciaam), “o problema não é a falta de mães aptas a serem doadoras, mas sim de mulheres que saibam e que queiram doar”.

Porém, as mães também encontram difi-culdades para serem doadoras. Cintia Maria Ribeiro, 33 anos, doadora de leite do BLH do Hospital São Paulo, diz que só tomou co-nhecimento do processo de doação porque

Talitha, prematura de 6 meses, recebe leite pela seringa até que tenha força para sugar o peito da mãe

REPORTAGEM ELOÁ ORAZEM e LEONARDO PARAÍSO (3o ano de Jornalismo)IMAGEM HELDA RUIZ (3o ano de Rádio e TV)

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se interessou pelo assunto. “Eu que fui atrás para poder doar. Acho muito triste jogar lei-te fora sabendo que tem criança recém-nas-cida precisando”, conta.

Cintia também aponta alguns empeci-lhos que podem desestimular as mulheres. “É complicado tirar leite. Eu não consigo co-locar um copo embaixo do peito e tirar de gotinha em gotinha”, afirma. Por isso, conta com o apoio de um equipamento especial para a extração, comprado por ela, que per-mite a retirada de uma maior quantidade do líquido. Os bancos de leite possuem o equi-pamento, mas não permitem que as mulhe-res os levem para casa e o preço inviabiliza que muitas doadoras o comprem – os usa-dos custam cerca de R$600.

aS doadoRaS A enfermeira Joana Saioko Watanabe, supervisora do BLH da Maternidade Leonor de Barros Mendes, afir-ma que as mulheres só doam o excedente, para que seu bebê não fique sem leite. Para doar, a mãe precisa amamentar apenas o seu filho e fazer um cadastro no BLH mais próximo de sua casa. Muitas unidades con-tam com um programa domiciliar, em que uma viatura vai até a casa da pessoa buscar o frasco com o leite. A doadora não pode ingerir mais que dez cigarros por dia nem consumir acima de duas doses de bebida alcoólica. Além disso, a mãe também deve

estar em bom estado de saúde e não pode fazer tratamento com medicamentos.

loNgo pRoceSSo Os frascos de vidro que receberão o leite devem estar esterili-zados e serem fechados com uma tampa plástica. A mulher precisa retirar acessó-rios, como pulseiras, prender os cabelos com uma touca ou um lenço, colocar sobre o nariz e a boca uma máscara, lavar as mãos e os antebraços e secá-los com papel des-cartável ou com uma toalha limpa, antes de retirar o leite da mama. O descumprimento das recomendações dos bancos de leite no momento da coleta pode levar ao descarte de boa parte das doações.

Só no ano passado, 26,26% de todo o leite recolhido no país foi descartado. “Se ti-ver um pêlo ou um pedaço de pele do peito que caiu, o leite não é mais adequado para o consumo”, exemplifica a enfermeira Joana Saioko Watanabe. No banco de leite humano do Hospital São Paulo, onde o número mé-dio de doadoras é de 10 a 15 por mês, a Dra. Ana Cristina Freitas diz que a quantidade desperdiçada pode passar de 50% no mês.

Quando chega ao banco de leite, o ali-mento é avaliado a fim de saber para qual recém-nascido ele é mais adequado. “Se eu preciso que o bebê engorde, eu dou um leite mais calórico”, explica Joana. Se aprovado, o líquido passa por um processo de pasteuri-

zação, em que é aquecido, em banho maria, a 62,5ºC por 30 minutos, para eliminar os agentes patogênicos, como as bactérias. O líquido, normalmente, é repassado àqueles que nasceram com menos de 34 semanas, ou com peso abaixo de um quilo e meio.

Elisângela Aparecida, 29 anos, deu à luz Talitha quando estava no sexto mês de gravidez. A menina, que nasceu com pouco mais de 600 gramas, está na Unidade de Te-rapia Intensiva (UTI) Neo-Natal do Hospital Leonor de Barros Mendes, no Belém, zona leste da capital. Atualmente, pesa um quilo e meio e ingere 30 ml de leite de três em três horas. Como Talitha ainda não consegue fa-zer o movimento de sucção, o alimento é dado primeiramente por uma seringa, até o momento em que ela se cansa e passa a receber o restante do leite via sonda.

Parte do líquido é coletado pela mãe. “Quando ela nasceu, eu tinha muito leite”, afirma Elisângela. “Eu tirava em casa, enchia um frasco por dia, mas agora sem o estímu-lo dela mamando, a quantidade que eu pro-duzo diminuiu”. O líquido necessário para completar os 30 ml que Talitha recebe é do-ado. “Se dependesse só do meu leite, não se-ria o suficiente”, diz a mãe. São casos como este que demonstram a importância da doa-ção. Para a Dra. Ana Cristina, “a luta começa com a conscientização das mulheres”.

Além de amamentar o filho Laio, Cintia Ribeiro doa seu leite para o Hospital São Paulo

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REPORTAGEM camila mamede (3º ano de Jornalismo)

música

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O cardápio musical do som ambiente de restaurantes paulistanos

Degustea música

memphis Burgerelvis Presley está presente nas paredes, nas comidas e – é claro – nas músicas que tocam na lanchonete memphisBurger. O cardápio do restaurante tem uma seção especial com sanduíches inspirados no cantor: o elvis e o Priscila Burguer. O motivo é simples, ele é o ídolo do proprietário Renato Noschese. Todos os pratos são saboreados com trilha sonora apropriada: durante a tarde são exibidos dVds de shows do cantor, além de uma jukebox que toca músicas das décadas de 1950 e 1960. Shows ao vivo com cantores que interpretam elvis acontecem às quintas, sextas e sábados, a partir das 20h30. além das canções do elvis, o memphis Burger também diversifica o som ambiente com hits de outras bandas, como os Beatles.

Bossa NuevaNeste bar é possível tanto ouvir chegade Saudade quanto comê-la. Para os ouvidos, a canção considerada o marco inicial da bossa nova. Para o estômago, um prato de picadinho com arroz, ovo pochê, farofa, pastel e banana à milanesa. O restaurante Bossa Nueva serve quitutes típicos de bares, e também pratos elaborados, como as opções da seção cPBdo cardápio, a “comida Popular Brasileira”. de quarta a sábado, há música ao vivo. Os estilos variam entre bossa nova e jazz. e aqueles que tiverem mais coragem pode subir ao palco e cantar.

BrooklyN restauraNtea cada vinte minutos, as luzes do restaurante se apagam e metade da equipe dos garçons se transforma em elenco. Os “garçons cantores” dançam e entoam temas de musicais consagrados na Broadway, como Fantasma da Ópera, ou canções de Frank Sinatra. as apresentações começam às 21h e a escolha das músicas é feita na hora entre os cantores e o músico que estiver ao piano, conta Neide morais, gerente de compras do restaurante. É possível descobrir os nomes das canções em um cardápio musical, e até fazer pedidos. “Já pedi para ouvir ‘Seasons of love’, do musical Rent, meu favorito”, conta o estudante Rafael dip. “a comida é boa, mas o diferencial é a música”, justifica.

laNchoNete Da ciDaDea década de 1960 inspirou o cardápio e a decoração da lanchonete da cidade. aespecialidade da casa são os hambúrgueres, assados no carvão, como o Tropicália e o leblon. mastambém é possível escolher o marta Rocha, um misto quente de peru e queijo branco. Para acompanhar, as paredes do local contém diversas quinquilharias antigas como um Topo Gigio, ou miniaturas do carro Bel air. Tudo combinando com a trilha sonora, quase sempre uma bossa nova: Vinícius, Tom, beijinhos, peixinhos, barquinhos...

O restaurante combina comida japonesa com karaokê. Para cantar, é necessário reservar previamente o salão de música, que funciona de segunda a quarta, para grupos de até 30 pessoas. Nathália Santos, caixa do restaurante, conta que a maioria dos grupos vai ao Tendai para comemorar aniversários, assim há a certeza de ouvir ao menos um ‘Parabéns a você’ por noite. asmúsicas do grupo mamonas assassinasestão entre as mais cantadas.

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REPORTAGEM camila mamede (3º ano de Jornalismo)

música

eSQUiNaS 2º SemeSTRe 2008 25

O cardápio musical do som ambiente de restaurantes paulistanos

Degustea música

memphis Burgerelvis Presley está presente nas paredes, nas comidas e – é claro – nas músicas que tocam na lanchonete memphisBurger. O cardápio do restaurante tem uma seção especial com sanduíches inspirados no cantor: o elvis e o Priscila Burguer. O motivo é simples, ele é o ídolo do proprietário Renato Noschese. Todos os pratos são saboreados com trilha sonora apropriada: durante a tarde são exibidos dVds de shows do cantor, além de uma jukebox que toca músicas das décadas de 1950 e 1960. Shows ao vivo com cantores que interpretam elvis acontecem às quintas, sextas e sábados, a partir das 20h30. além das canções do elvis, o memphis Burger também diversifica o som ambiente com hits de outras bandas, como os Beatles.

Bossa NuevaNeste bar é possível tanto ouvir chegade Saudade quanto comê-la. Para os ouvidos, a canção considerada o marco inicial da bossa nova. Para o estômago, um prato de picadinho com arroz, ovo pochê, farofa, pastel e banana à milanesa. O restaurante Bossa Nueva serve quitutes típicos de bares, e também pratos elaborados, como as opções da seção cPBdo cardápio, a “comida Popular Brasileira”. de quarta a sábado, há música ao vivo. Os estilos variam entre bossa nova e jazz. e aqueles que tiverem mais coragem pode subir ao palco e cantar.

BrooklyN restauraNtea cada vinte minutos, as luzes do restaurante se apagam e metade da equipe dos garçons se transforma em elenco. Os “garçons cantores” dançam e entoam temas de musicais consagrados na Broadway, como Fantasma da Ópera, ou canções de Frank Sinatra. as apresentações começam às 21h e a escolha das músicas é feita na hora entre os cantores e o músico que estiver ao piano, conta Neide morais, gerente de compras do restaurante. É possível descobrir os nomes das canções em um cardápio musical, e até fazer pedidos. “Já pedi para ouvir ‘Seasons of love’, do musical Rent, meu favorito”, conta o estudante Rafael dip. “a comida é boa, mas o diferencial é a música”, justifica.

laNchoNete Da ciDaDea década de 1960 inspirou o cardápio e a decoração da lanchonete da cidade. aespecialidade da casa são os hambúrgueres, assados no carvão, como o Tropicália e o leblon. mastambém é possível escolher o marta Rocha, um misto quente de peru e queijo branco. Para acompanhar, as paredes do local contém diversas quinquilharias antigas como um Topo Gigio, ou miniaturas do carro Bel air. Tudo combinando com a trilha sonora, quase sempre uma bossa nova: Vinícius, Tom, beijinhos, peixinhos, barquinhos...

O restaurante combina comida japonesa com karaokê. Para cantar, é necessário reservar previamente o salão de música, que funciona de segunda a quarta, para grupos de até 30 pessoas. Nathália Santos, caixa do restaurante, conta que a maioria dos grupos vai ao Tendai para comemorar aniversários, assim há a certeza de ouvir ao menos um ‘Parabéns a você’ por noite. asmúsicas do grupo mamonas assassinasestão entre as mais cantadas.

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gastronomia

Gateau de bacalhau, feito com batatas as-sadas e azeitonas, e brownie de chocolate. Ambos estão no cardápio do hospital Sírio Libanês e são os pratos mais pedidos pelos pacientes. “Cada dia tem um prato diferen-te, é muito refinado e é bem saboroso”, diz Sueli Andrade, 58 anos, internada desde o dia 15 de outubro de 2008 no hospital. “Gosto muito do caldo de mandioquinha, gosto de cenoura sautê e do filé”, exemplifi-ca. Segundo Adriana Vasti, nutricionista do hospital há três anos, a preocupação com o gosto dos alimentos só surgiu quando nutri-cionistas e até chefs de cozinha começaram a elaborar o cardápio no lugar da enferma-gem. “Com os enfermeiros, a cozinha se acostumou a fazer sempre sopinha e canja, então veio essa fama de ter restrição de to-dos os ingredientes”, explica.

Com a intenção de inovar, montando um cardápio mais gastronômico e refinado, o hospital teve a idéia de chamar um chef

Com a mudança de cardápio, hoje cada vez mais diversificado, a comida dos hospitais deixou de ter má fama

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REPORTAGEM fernanda de almeida e talita borelli (3o ano de Jornalismo) IMAGEM laisa beatris (2o ano de Jornalismo)

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Mesmo para os pacientes que não

podem mastigar, há pratos diferenciados

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para trabalhar diretamente na cozinha com os funcionários do Grupo de Soluções em Alimentação (GRSA), empresa terceirizada que presta serviço para o Sírio Libanês. O cardápio foi então elaborado pelo chef Pa-trick Ferry, do Hotel Sofitel, e por Adriana Vasti. “O chef não lida só com as coisas de preparo, mas ele tem que dominar a equipe. Acho que ele passa mais essa troca de ex-periência com os cozinheiros, tem a mesma linguagem que eles, então, incentiva a equi-pe”, comenta a nutricionista.

Neste ano, o cardápio de Patrick Ferry está sendo reestruturado por uma nova chef, Ana Carolina Alves. A idéia é elaborar comidas mais caseiras e menos refinadas, já que, segundo Adriana, muitos pacientes re-clamam do exagero de alguns pratos, como a carne de pato e o cordeiro.

Junto com a nutricionista, a nova chef é responsável por dar vida nova aos menus. “Eu, como nutricionista, sei o que pode e o

que não pode nos cardápios de acordo com a dieta dos pacientes, coisa que o chef não domina, mas ele pode ajudar com a criativi-dade”, explica Adriana. Enquanto ela cuida de lista de restrições alimentares de cada paciente, Ana Carolina entra com a inova-ção para combinar alimentos, temperos e aromas. “Eu coordeno toda a preparação dos alimentos”, diz a chef. “Puxo a orelha dos funcionários da cozinha quando algu-ma coisa não dá certo e elogio quando sai como quero”, acrescenta.

Já no Hospital Emílio Ribas as regras de cuidados com pacientes de doenças infecto-contagiosas não permitem muita sofistica-ção. Mesmo assim os profissionais abusam da criatividade, como no caso das crianças, que recebem atenção especial. Além dos dias já estipulados para a batatinha frita, o cachorro quente e a pizza, pelo menos uma vez por mês acontece o “dia especial”: uma equipe de voluntários escolhe um tema e

decora todo o quarto andar do hospital, tra-balhando junto com a cozinha, que prepara as refeições seguindo a mesma temática.

até no visual No Hospital Sírio Liba-nês, além de servirem a comida em prato de louça, a refeição é toda decorada. Dessa forma, segundo a nutricionista Adriana, a maioria dos pacientes quase não tem a sen-sação de estar em um hospital e alguns che-gam até a se recuperar mais rapidamente. “A apresentação do prato ajuda na hora de comer e a variedade é muito boa”, afirma a paciente Rosina Rotulo Davelli, 87 anos, internada desde o dia 8 de outubro.

Já a realidade do Emílio Ribas é diferen-te. Como atende pessoas com doenças infec-to-contagiosas, todo material que entra no quarto do paciente não pode ser reutilizado. Por isso, não é possível que sejam usadas baixelas, como em outros hospitais. Apesar disso, algumas pesquisas com os internos permitiram aos profissionais escolherem o

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recipiente mais adequado para armazenar as refeições, sem prejudicar a apresentação das mesmas. Miriam Aparecida Favalli, nu-tricionista e funcionária do Hospital Emílio Ribas, assegura que a mudança das quenti-nhas foi responsável por uma nova relação dos pacientes com as refeições: “Aquele ma-terial metálico não é apresentável, tem chei-ro forte e, muitas vezes, mudava o gosto da comida”. “Então, a gente priorizou essas embalagens plásticas claras que valorizam muito mais a refeição”, afirma.

trabalHo de equPe No Sírio, 160 funcionários trabalham na cozinha prepa-rando os pratos dos 305 pacientes interna-dos. Todos os dias são servidos mais de mil pratos, sendo que cada paciente faz cinco refeições, do café-da-manhã ao lanche no-turno. Já no Emílio Ribas, em turnos do dia, noite e finais de semana, os 65 profissionais são divididos por atividades. Por exemplo, fazer saladas, sucos e sobremesas para a preparação das seis refeições diárias. Lá, eles contam com a ajuda da empresa ter-ceirizada Le Baron, que apesar de não tra-balhar com um chef de cozinha, oferece funcionários que auxiliam no trabalho das nutricionistas do hospital.

“A empresa terceirizada faz uma suges-tão de refeições para nós, o Estado - que é o contratante – e nós podemos fazer modi-ficações antes de definir o cardápio final”, explica Miriam. A idéia é que não haja re-petição dos tipos de refeições, já que os pacientes ficam internados durante muito tempo no hospital e podem enjoar da co-mida. “Ficaria extremamente desagradável o nosso paciente comer todo dia a mesma coisa”, comenta a nutricionista. De acordo com ela, os pratos são elaborados segundo

as diferentes dietas dos pacientes. Em algu-mas, como no caso dos pacientes que não podem ingerir sal, os funcionários costu-mam abusar do uso de ervas para deixar as quentinhas mais saborosas.

cuidados esPeciais Como a média de nutricionistas é de um para cada andar, há uma convivência mais assídua dos pro-fissionais com seus pacientes, permitindo, na medida do possível, atender aos pedi-dos que não estejam nos cardápios. “Nor-malmente, os pedidos são extremamente simples”, conta Miriam. “Se o paciente não aceitar nada do que é oferecido, o nutricio-nista verifica o que ele quer, dentro do que a gente pode oferecer, manda o pedido para a produção. Na cozinha, eles tomam as provi-dências para fazer e mandar para o pacien-te”, explica a nutricionista.

Quando a reportagem da EsquInAsesteve no hospital Sírio Libanês, o cardápio A (servido aos pacientes que não possuem restrições alimentares) era composto por uma salada de endívia com macedônia de legumes, filé mignon Welington (recheado com cogumelo paris e envolto em massa folhada) e cenoura glaceada em suco de la-ranja. De sobremesa, os pacientes podiam apreciar profiteroles de ricota com doce de leite e calda de framboesa. No Emílio Ribas era dia de frango xadrez e yakissoba no pra-to principal, além da salada, arroz, feijão, sopa e batatinha salsa. Depois da refeição principal, mousse de chocolate ou gelatina. Tudo acompanhado de suco de laranja.

É tanta sofisticação e diversidade que as refeições dos hospitais de São Paulo lem-bram até os pratos oferecidos em grandes restaurantes. Combinações que estão muito além de uma sopinha insossa.

A nutricionista Adriana e a chef Ana Carolina trabalham juntas na elaboração dos pratos do Hospital sírio Libanês

Filé Mignon recheado com cogumelo envolto em massa folhada

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É possível e saudável aproveitar as partes dos alimentos que normalmente vão para o lixo

Jogar fora, não

CasCa do maraCuJáRica em fibras e minerais, a casca do maracujá contém pectina, uma fibra que auxilia no processo digestivo. A nutricionista Maria de Fátima Nunes Marucci explica que esta fibra se une ao colesterol e à glicose dos alimentos e, por não ser absorvida pelo organismo, ajuda a eliminar esses componentes do corpo junto com as fezes. Uma das formas de consumir a casca é fazer uma farinha que pode ser acrescentada em comidas e bebidas.

Cabelo de milhoOs fios que revestem a espiga do milho, e que jogamos fora ao debulhá-la, também podem ser aproveitados na hora das refeições. Uma das melhores maneiras de consumir o cabelo do milho é colocando-o em água fervente para preparar um chá. “Ele é ótimo, pois é diurético”, explica Larissa Martins, nutricionista do Sesi. O brasileiro produz quase um quilo de lixo doméstico por dia e o máximo aproveitamento dos alimentos não vale apenas para as camadas mais pobres da população. “Orientar as pessoas a aproveitarem melhor os alimentos vale para qualquer nível sócio-econômico”, diz Maria de Fátima.

sementes de JaCaPara quem nunca reparou, as sementes de jaca são bastante semelhantes às do pinhão e podem ser consumidas da mesma maneira: basta cozinhá-las até que fiquem macias e depois descascá-las. Ricas em ferro, as sementes desta fruta podem ser usadas como complemento na alimentação de quem tem anemia. De qualquer forma, a nutricionista e professora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FMU/USP), Maria de Fátima Nunes Marucci, lembra que precisamos de todos os tipos de nutrientes durante as refeições para manter o ritmo do dia-a-dia. “Nenhum alimento sozinho vai garantir a saúde das pessoas. Precisamos ingerir alimentos de todos os grupos da pirâmide alimentar”, destaca.

talo de agriãoAssim como outros talos, pode ser incluído em farofas, bolinhos e tortas, substituindo até a folha do agrião. O importante é ser criativo e não desperdiçar. “O lixo do Brasil é um dos lixos mais nutritivos do mundo. O prato fica pequeno e o lixo transbordando Muita gente fala em reaproveitamento, na verdade, precisamos fazer um aproveitamento integral dos alimentos”, afirma Larissa Martins, nutricionista e instrutora do programa de educação nutricional “Alimente-se Bem” do Serviço Social da Indústria (Sesi).

Saiba como utilizar ao máximo os alimentos com receitas produzidas pelo programa “Alimente-se Bem” do Sesi

Modo de Preparo:Cozinhe 2 xícaras de chá de sementes de jaca até ficarem macias. Retire a pele e corte em lâminas. Faça um vinagrete com 1 xícara e meia de chá de tomate sem pele, 1/2 xícara de chá de cebola picada, 2 colheres de sopa de vinagre, salsa picada e 4 colheres de sopa de óleo. Junte as sementes, acrescente o sal e sirva gelado. Rende 6 porções e leva 1 hora para ficar pronto.

Semente de Jaca ao VinagreteModo de Preparo:Corte 3 maracujás ao meio e reserve a polpa. Retire a casca e corte a parte branca em tiras finas. Deixe de molho por um dia. Escorra e lave. Faça uma calda com 1 xícara de chá de açúcar, 1 xícara e meia de chá de água e 1/4 de suco de maracujá, feito com a polpa. Adicione as cascas de maracujá e canela em casca e deixe cozinhar até que fiquem macias. Sirva gelado. Esta receita rende 6 porções e leva cerca de 30 minutos para ficar pronta.

doce de caSca de maracuJá

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 29

rePortagem MARIANA AGUNZI (3º ano de Jornalismo)

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É possível e saudável aproveitar as partes dos alimentos que normalmente vão para o lixo

Jogar fora, não

CasCa do maraCuJáRica em fibras e minerais, a casca do maracujá contém pectina, uma fibra que auxilia no processo digestivo. A nutricionista Maria de Fátima Nunes Marucci explica que esta fibra se une ao colesterol e à glicose dos alimentos e, por não ser absorvida pelo organismo, ajuda a eliminar esses componentes do corpo junto com as fezes. Uma das formas de consumir a casca é fazer uma farinha que pode ser acrescentada em comidas e bebidas.

Cabelo de milhoOs fios que revestem a espiga do milho, e que jogamos fora ao debulhá-la, também podem ser aproveitados na hora das refeições. Uma das melhores maneiras de consumir o cabelo do milho é colocando-o em água fervente para preparar um chá. “Ele é ótimo, pois é diurético”, explica Larissa Martins, nutricionista do Sesi. O brasileiro produz quase um quilo de lixo doméstico por dia e o máximo aproveitamento dos alimentos não vale apenas para as camadas mais pobres da população. “Orientar as pessoas a aproveitarem melhor os alimentos vale para qualquer nível sócio-econômico”, diz Maria de Fátima.

sementes de JaCaPara quem nunca reparou, as sementes de jaca são bastante semelhantes às do pinhão e podem ser consumidas da mesma maneira: basta cozinhá-las até que fiquem macias e depois descascá-las. Ricas em ferro, as sementes desta fruta podem ser usadas como complemento na alimentação de quem tem anemia. De qualquer forma, a nutricionista e professora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FMU/USP), Maria de Fátima Nunes Marucci, lembra que precisamos de todos os tipos de nutrientes durante as refeições para manter o ritmo do dia-a-dia. “Nenhum alimento sozinho vai garantir a saúde das pessoas. Precisamos ingerir alimentos de todos os grupos da pirâmide alimentar”, destaca.

talo de agriãoAssim como outros talos, pode ser incluído em farofas, bolinhos e tortas, substituindo até a folha do agrião. O importante é ser criativo e não desperdiçar. “O lixo do Brasil é um dos lixos mais nutritivos do mundo. O prato fica pequeno e o lixo transbordando Muita gente fala em reaproveitamento, na verdade, precisamos fazer um aproveitamento integral dos alimentos”, afirma Larissa Martins, nutricionista e instrutora do programa de educação nutricional “Alimente-se Bem” do Serviço Social da Indústria (Sesi).

Saiba como utilizar ao máximo os alimentos com receitas produzidas pelo programa “Alimente-se Bem” do Sesi

Modo de Preparo:Cozinhe 2 xícaras de chá de sementes de jaca até ficarem macias. Retire a pele e corte em lâminas. Faça um vinagrete com 1 xícara e meia de chá de tomate sem pele, 1/2 xícara de chá de cebola picada, 2 colheres de sopa de vinagre, salsa picada e 4 colheres de sopa de óleo. Junte as sementes, acrescente o sal e sirva gelado. Rende 6 porções e leva 1 hora para ficar pronto.

Semente de Jaca ao VinagreteModo de Preparo:Corte 3 maracujás ao meio e reserve a polpa. Retire a casca e corte a parte branca em tiras finas. Deixe de molho por um dia. Escorra e lave. Faça uma calda com 1 xícara de chá de açúcar, 1 xícara e meia de chá de água e 1/4 de suco de maracujá, feito com a polpa. Adicione as cascas de maracujá e canela em casca e deixe cozinhar até que fiquem macias. Sirva gelado. Esta receita rende 6 porções e leva cerca de 30 minutos para ficar pronta.

doce de caSca de maracuJá

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rePortagem MARIANA AGUNZI (3º ano de Jornalismo)

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MEDICINA

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uma vidasem gostoSó nos Estados Unidos existem mais de 20 milhões de pessoas que não sentem gosto nem cheiro, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). Mais conhecidas pelo nome de ageusia e anosmia, as anoma-lias daqueles que sofrem de falta de paladar e de olfato, respectivamente, são mais cor-riqueiras do que se imagina e interferem de forma decisiva na vida dos afetados. “Não há mais o cheiro do pão quente pela manhã, da chuva no asfalto”, afirma o empresário Vinícios André Gouveia, 40 anos, que há mais de dez sofre de anosmia. “Até o sexo é difícil para mim. Você está com a sua namo-rada e não sente o seu cheiro”.

Na maioria das vezes, o que os pacien-tes acreditam ser um distúrbio de paladar é, na verdade, uma alteração olfativa. “Muitos pacientes vêm ao hospital com queixas de que não sentem mais o gosto dos alimen-tos”, afirma Henry Ugadin Koishi, otorrino-laringologista do Hospital das Clínicas de São Paulo. “Quando faço um diagnóstico e revelo que o que eles sofrem é na verdade da ausência de olfato, eles levam um susto”, comenta. O médico explica que isso é co-mum, já que nós costumamos usar menos o olfato que o paladar no dia-a-dia e confun-dimos os dois sentidos.

“Um alimento não é só gosto, mas é também cheiro, perfume e aroma”, explica o doutor Henry. Assim, quando comemos alguma coisa, tanto o nosso paladar quan-to o nosso olfato são ativados. Embora seja difícil diferenciar um sentido do outro, cada um deles age de maneira independente: o paladar determina o gosto (ou sabor) do alimento, enquanto o olfato determina o cheiro. O primeiro é identificado no cortéx cerebral e o segundo no lobo temporal. A dificuldade em distinguí-los está no fato de que ambos são determinados pelas mesmas substâncias químicas presentes nos alimen-tos. Além disso, os dois estão ligados ao sistema límbico, responsável pela abstração dos sentidos e pela memória.

“O cigarro e o álcool afetam tanto a gus-tação como a olfação, danificando as mu-cosas nasais e as terminações nervosas de ambos os sentidos”, afirma o doutor Lídio Granato, otorrinolaringologista do Hospital Santa Catarina. “Os vapores que se despren-dem do álcool podem queimar as células ol-fativas e modificar as papilas gustativas”.

AtÉ UMA PANCADA Os distúrbios po-dem ser resultado de lesões bioquímicas e físicas nas regiões sensitivas neurais. Se-gundo o doutor Afonso Celso, otorrinola-ringologista da Universidade de São Paulo (USP), num acidente uma pessoa pode sofrer lesões no centro nervoso, principalmente se acontecer alteração na bainha de mielina. “Como no fio elétrico, que tem aquela capi-nha de plástico isolante, os nervos têm uma camada isolante que é a mielina”, afirma o médico. “Quando essas camadas são des-truídas, os estímulos começam a ter curtos-circuitos, passam de um nervo para outro e distorcem as sensações”, explica.

É o que aconteceu com Alessandra Ris-den, que, ao sofrer um acidente de moto, em 2006, teve parte de seus canais neurais da-nificados. “Durante os três primeiros meses não sentia cheiro nem gosto”, diz ela. “Des-de então venho recuperando aos poucos o olfato”, conta. Há ainda outras causas. “Dia-betes, deficiência de vitamina A, problemas imunológicos, distúrbios psicóticos, depres-são, mal de Alzheimer, entre outros, podem causar anomalias nas regiões sensitivas”, exemplifica o doutor Lídio Granato.

No caso do paladar, a primeira provi-dência a ser tomada pelos médicos é fazer a identificação das categorias das papilas gustativas (estruturas presentes na língua e que são responsáveis pelo gosto), para que seja possível mensurar o estágio da enfer-midade e quais regiões foram afetadas.

“A atrofia da mucosa bucal e a reação anômala de substâncias químicas interfe-rem nas vias que transformam a sensação gustativa, gerando alterações de gustação”,

explica o doutor Afonso Celso. Segundo o doutor Henry Koishi, procedimentos cirúr-gicos na região bucal ou ainda infecções li-gadas à região do ouvido médio, local por onde passam os nervos gustativos, também podem alterar a percepção de gostos.

Os distúrbios ligados ao paladar são mais difíceis de serem constatados e trata-dos que os olfativos. “Têm papilas para as sensações do doce, salgado, amargo e áci-do. Pode-se perder toda a percepção para o ácido, mas as outras continuarem íntegras”, elucida Afonso Celso. “Além disso, a língua tem duas metades independentes, sendo necessária que uma lesão afete os seus dois lados para se ter realmente a chamada ageu-sia, ou perda total do paladar”, ressalta.

fIM Do PrAzEr Um dos primeiro sin-tomas é a falta de apetite, já que o sabor do alimento se torna insípido ou desagradável. “O ato de comer para essas pessoas é um sacrifício, porque estão sempre comendo al-guma coisa de gosto ruim”, lembra Afonso Celso. O médico explica ainda que a maioria dos pacientes come por necessidade física, já que o prazer pelo sabor não existe mais. Por isso, chega um momento em que eles acabam comendo qualquer coisa, sem se importar se gostam daquilo ou não.

Infelizmente há mais vítimas de distúr-bios sensitivos que locais para tratá-las. “Há menos de 10 clínicas ao redor do mundo ap-tas a curar esses pacientes”, afirma o médi-co americano Robert Henkin, que dirige em Washington a The Smell and Taste Clinic e é considerado pela Associação Médica Inter-nacional (IMA) o maior especialista na área. “Muitos médicos acreditam que as queixas de seus pacientes são problemas mais li-gados à vaidade que a males de gravidade médica, ignorando que eles podem mudar a vida das pessoas da mesma forma como uma cegueira ou surdez”, afirma. Ele diz ainda que recebe muitos pedidos de ajuda de pacientes brasileiros que não encontra-ram por aqui tratamentos eficazes.

Álcool, cigarro e até uma pancada na cabeça podem causar a perda do paladar REPORTAGEM GUSTAvo URIbE (2o ano de Jornalismo) e LyGIA HAydéE (3o ano de Jornalismo)

IMAGEM RENATA MIwA (2o ano de Publicidade e Propaganda)

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1 2

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1

o CAMINHo Do PALADAr

2

Ao comer uma bolacha de sal, por exemplo, as substâncias químicas que provocam o gosto, presentes no alimento, se dissolvem na saliva, que as levam até o botão gustativo, situado nas papilas gustativas

No receptor gustativo, os sinais químicos do alimento interagem com moléculas protéicas, gerando reações químicas. Estas estimulam a liberação de neurotransmissores capazes de provocar sinais elétricos que são levados para o cérebro por um nervo

4

3 A informação contida no neurônio presente no nervo chega na ponte, no núcleo do trato solitário. Neste momento, há uma comunicação entre neurônios e um deles leva a informação para o tálamo.

Então, temos uma sensação difusa, ainda não localizada. A informação parte agora para o córtex cerebral.

5 Acontece neste local a sensação localizada. Sentimos, enfi m, o sabor salgado da bolacha.

MAPA DA LÍNgUA

AMARGo

doCE

SALGAdo

AZEdo

gostoMuitas pessoas não sabem distinguir o paladar do olfato e, por isso, acabam confudindo os dois sentidos. Eles estão sim relacionados, já que as mesmas substâncias químicas presentes no alimento determinam tanto o gosto quanto o cheiro daquilo que foi ingerido. Porém, o paladar e o olfato agem de forma independente um do outro. Cada um deles realiza um caminho diferente em nosso corpo. Enquanto o gosto é determinado pelo cortéx cerebral, quem nos faz sentir o cheiro do alimento é o lombo temporal.

Nervos

Núcleo da célula

Receptor gustativo

BotÃo gUstAtIVo

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línguaREPORTAGEM diogo bercitto, gabriella de lucca (3º ano de Jornalismo)e José roberto gomes (1º ano de Jornalismo)IMAGENS gustavo sanches (3º ano de Publicidade e Propaganda)

letras na cozinhaPequenas histórias de como surgiram algumas expressões idiomáticas que se baseiam em nomes de alimentos, como farinha, arroz e até pitanga

Chorar as pitangasSignificado: reclamar, contar

os problemasa palavra “pitanga”, segundo o escritor e professor de Pós-graduação e Pesquisa da universidade estáciode sá, deonísio da silva, veio do tupi-guarani “piranga”, que se refere à cor vermelha. também é a palavra que os índios utilizam para nomear uma criança rosada. “em Portugal, se diz ‘chorar lágrimas de sangue’,” conta o professor. “no brasil, acabou se transformando, por influência da cor vermelha da fruta, em ‘chorar as pitangas’”, explica. segundo ele, isso tornou a expressão portuguesa menos dramática por aqui.

Significado: fácil, simplesMaMão CoM açúCar

Provavelmente, essa expressão vem do costume de preparar doces feitos de açúcar e mamão, que são fáceis de fazer. deonísio da silva conta que antigamente as pessoas não se preocupavam muito em fazer dieta, então “era comum servir esses doces como sobremesaao final das refeições”.

Significado: falar bobagensFalar abobrinhas

a antiga nota de mil cruzeiros era conhecida por “abobrinha”, porque tinha um tom amarelado que lembrava o legume. “a inflação fez com que perdesse completamente o valor”, esclarece o escritor e professor de Pós-graduação e Pesquisa da universidade estácio de sá,deonísio da silva. a abobrinha passou, assim, a ser desvalorizada também.

Significado: fazer duas coisas ao mesmo tempo

assoviar e Chupar Cana

o professor de lingüística da Puc-sP, bruno dallari, afirma que basta imaginar alguém tentando chupar a cana e assoviar ao mesmo tempo. “ele não consegue”, diz. a expressão provavelmente surgiu nos engenhos, durante o período de produção de cana-de-açúcar, nos séculos Xvi e Xvii.

a tradição de jogar arroz em recém-casados veio da china e se tornou algo comum em praticamente todos os matrimônios da sociedade atual. “oarroz de festa é quem está sempre em todas as comemorações e reuniões, que se tornou indiferente”, afirma o professor bruno dallari.

arroz de Festa Significado: estar em todas

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Significado: a mesma coisa,tão ruim quanto

Farinha do MesMo saCo

“Já se dizia na Roma antiga que ‘hominis sunt ejusdem farinae’, o que se transformou no francês em ‘c’est sont des gens de la même farine’, ou seja, ´são pessoas da mesma farinha´”, diz o professor Deonísio da Silva. A expressão foi também muito utilizada pelo escritor francês Honoré Balzac. O saco foi uma adição da língua portuguesa com suas peculiaridades – o substantivo está, aliás, presente em outros ditos como “puxar o saco” e “encher o saco”.

Significado: fazer outra coisaplantar batatas

Esta expressão surgiu em Portugal na forma de um conselho: “vá plantar batatas”. Conforme explica o escritor e professor de Pós-Graduação e Pesquisa da Universidade Estácio de Sá, Deonísio da Silva, o país, voltado às navegações, à pesca e ao vinho, demorou para desenvolver a atividade agrícola. Assim que as pequenas indústrias entraram em decadência, tudo o que restava aos portugueses era, literalmente, plantar batatas.

Significado: não dar em nadaaCabar eM pizza

No final dos anos 1980, a frase “no Brasiltudo acaba em samba, menos em SãoPaulo, onde tudo termina em pizza” era utilizada na cidade numa referência ao destino dos paulistanos no final da noite. Como afirma o professor do departamento de letras da Universidade Federal de São Carlos, Oto Araujo Vale, a difusão da expressão para todo o país ocorreu pouco depois, em 1992, durante a CPI que investigou as ligações entre o presidente da época, Fernando Collor, e seu tesoreiro de campanha, Paulo CésarFarias. Oto Araujo conta que “houve um depoimento decisivo da secretária da empresa de um sócio de PC Farias”. Quando perguntaram quais os motivos que a levaram falar, “a secretária disse algo como ‘Eu não posso aceitar que toda essa investigação termine numa pizza’”, lembra o professor.

Significado: desordem, badernaFesta do Caqui

A Festa da Uva, hoje conhecida como Expo São Roque, que é realizada anualmente na cidade de mesmo nome, foi o ponto de partida da expressão. A comercialização de vinhos baratos e de baixa qualidade e o ambiente pouco sofisticado fizeram com que os frequentadores do evento começassem a chamá-lo de festa do caqui. Esta fruta, segundo o professor Bruno Dallari, “traz em seu nome uma ênfase maior de bagunça, de má organização e, por isso, foi utilizada na expressão”.

A expressão, para Deonísio da Silva,veio da dificuldade de se descascar um abacaxi utilizando a boca, como fazem as crianças quando querem saborear frutas como a laranja, a mexerica, o pêssego e a maçã. O abacaxi precisa ser descascado com uma faca, tarefa que a criança não consegue desempenhar sozinha. Dessamaneira, o ditado passou a designar um problema de difícil solução. “EmPernambuco pode se referir, também, a uma pessoa que dança mal”, acrescenta.

desCasCar uM abaCaxi Significado: resolver um problema

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saúde

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Segundo a Associação Brasileira para o Es-tudo da Obesidade e da Síndrome Metabóli-ca (Abeso), das 25 mil cirurgias de redução de estômago feitas no ano passado, apenas 2700 foram realizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Hospital do Mandaqui, lo-calizado na zona norte de São Paulo, é uma das 53 unidades hospitalares no Brasil que oferece a operação gratuitamente. Mensal-mente, o núcleo de obesidade do hospital realiza uma reunião que explica o longo processo da intervenção bariátrica. Dela participam pessoas que sofrem de obesida-de mórbida, ou seja, quem atinge 50 quilos, ou mais, acima do peso ideal, e quer realizar a redução de estômago.

“A cirurgia é apenas uma parte de um processo de recuperação e exige mudança de hábitos”, afirma o doutor Sizenando Er-nesto de Lima, coordenador do Núcleo de Obesidade do Hospital do Mandaqui. Segun-do ele, nos últimos 10 anos, das 7 mil pes-soas que participaram da pré-triagem, pro-cesso que tem como finalidade constatar a real necessidade do procedimento cirúrgico, apenas 723 passaram pela operação. O can-didato é avaliado por uma equipe que conta com um assistente social, um psicólogo, um nutricionista e o próprio cirurgião.

Só pode ser considerado apto para a ci-rurgia quem se enquadrar em critérios pré-vios, como: ter grau de obesidade 3, ou seja, índice de massa corporal (IMC) acima de 40 Kg/m2 – o índice de uma pessoa de peso ideal fica entre 18,5 e 25 Kg/m2 – e apre-sentar doenças derivadas ou agravadas pela obesidade, as chamadas co-morbidades. “Eu sofria de pressão alta, cansaço e dor nas pernas, tudo causado pelo sobrepeso”, ex-plica Adriana Fuentes Lobo, 34 anos, geren-te administrativa, que realizou a cirurgia há dois anos, eliminando todo esse desconfor-to e 50 dos 105 quilos.

Ao ser classificado, cada paciente fica de quatro a cinco anos na fila de espera. Durante esse período, são realizadas ava-liações periódicas com o intuito de garantir todas as condições favoráveis à operação.

Em alguns casos, os médicos exigem que o paciente perca 10% do peso que tem para diminuir os riscos da cirurgia. Em outros, precisa ganhar alguns quilos.

“A cirurgia bariátrica é a melhor e última solução contra a obesidade mórbida, mas só se recorre a ela quando todos os outros tratamentos conhecidos falharam”, enfatiza o doutor Sizenando. A professora de edu-cação física Vanessa Ribeiro, 22 anos, que em dois anos saltou de 132 para 68 quilos, conta que utilizou vários métodos para en-frentar a doença antes de operar. “Eu tentei remédios prescritos por endocrinologistas, homeopatas, nutricionistas, dieta da lua, re-dução de carboidratos, fora academias, na-tação e todo tipo de esporte”, afirma.

Segundo dados da Abeso, a taxa de mor-talidade referente às operações é baixa, se restringe a 1% dos casos, as taxas de recaída são inferiores a 5% e as de seqüelas funcio-nais são raras. Há, no entanto, alguns dis-túrbios digestivos incômodos como a diar-réia, que atinge um número significativo de operados. Ocorrem, também, alterações no organismo, como deficiência de ferro ou vi-tamina B12. Por isso, é necessária a ingestão de vitaminas por toda a vida.

Reeducação alimentaR Se seguida a risca, a orientação nutricional – desde o acompanhamento pré-operatório até o pós-operatório – tem o poder de reduzir em até 40% o peso do paciente. O doutor Sizenando explica que “a reeducação alimentar pede três coisas básicas: comer em pedaços pe-quenos, mastigar bem e não comer doces”. Mas os cuidados devem começar já no perí-odo pré-operatório, quando a nutricionista investiga e mapeia o histórico e o comporta-mento nutricional de cada paciente.

No caso de Davi Ferreira dos Santos, 24, técnico de informática, seu maior proble-ma era ficar longos períodos do dia sem se alimentar e quando chegava a noite, comia exageradamente. A desorganização levou Davi aos 208 quilos. Para sua surpresa, a nutricionista recomendou que ele comesse o dia todo em pequenas quantidades. “Eu já

REPORTAGEM ADRIANA CARVALHO, NATÁLIA GUARATTO e MARIANA BATTISTETTI (2o ano de Jornalismo)IMAGEM ADRIANA CARVALHO (2o ano de Jornalismo)

sacRifícioHá um longo caminho desde a decisão de passar por uma cirurgia de redução de estômago até alcançar o resultado final

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Candidatos a cirurgia participam de palestras que explicam a operação bariátrica

ifício poR um novo

coRpo

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36 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

tinha falado com milhares de médicos, mas quando eu comecei a me alimentar várias vezes por dia, eu vi a diferença e foi aí que eu comecei a perder peso”, conta Davi.

Do início do tratamento até o dia em que foi operado, ele perdeu 25 quilos. “Eu brinco que peso a gente deve eliminar e não perder, porque aquilo que se perde um dia você acaba achando”, diz. A orientação nu-tricional pré-operatória deve ser otimizada por atividades corporais intensas e acompa-nhamento psicológico. “Tem que emagrecer aos poucos para não sofrer desnutrição”, ensina o doutor Sizenando.

caRdápio balanceado Logo que sai da mesa de cirurgia, a pessoa se submete a uma dieta líquida que deve vigorar durante todo o primeiro mês após a operação. Neste período, os pacientes só podem ingerir be-bidas isotônicas, chás, gelatina diet e água de coco. Depois, passa para uma dieta pas-tosa, em que são incorporados alimentos com pequenos resíduos sólidos, como caldo de feijão. Aos poucos o operado volta a co-mer normalmente, mas deve evitar doces e alimentos gordurosos.

Deve-se, também, comer em intervalos pequenos durante o dia todo. “Eu tomo 30 mililitros de caldo e já me sinto bem. Sinto como se tivesse ido a uma churrascaria e dado meu melhor”, conta Davi.

No caso da Vanessa, o cardápio mudou muito. Ela reduziu o consumo de calorias de 2500 para 1200 por dia. Para que isso fosse possível, criou o hábito de substituir alimentos ricos em açúcares e em gorduras por frutas e outros alimentos mais nutriti-vos. No entanto, ainda há a vontade de co-mer aquele bolo de chocolate. Para que isso não se torne um tormento, ela programou

os finais de semana para poder saciar es-sas vontades: “Apenas nesses dias minha alimentação foge um pouco de controle e eu como massa, fast-food e doces. Mas cla-ro que de maneira controlada e sempre em quantidades bem reduzidas”.

Adriana também precisou se adaptar. “Para evitar a anemia, passei a comer coisas que não me atraíam, como coração de gali-nha, fígado e beterraba”, conta. “Minha ali-mentação se tornou mais saudável, troquei doces e frituras pelos legumes e verduras”.

apRendizado Muitas pessoas temem a cirurgia bariátrica por acreditarem que ela tira o prazer de comer. “Comer uma coxinha hoje em dia não é a mesma coisa que antes. Logo eu já fico enjoada”, confessa a gerente Adriana. Para o doutor Sizenando, esse pen-samento é errado. “As pessoas comem por três motivos: necessidade, vontade e dese-jo. Comer uma caixa de bombom inteira por desejo e não se sentir satisfeito é uma doen-ça”, diz. “A cirurgia de redução não muda a cabeça de ninguém”, acrescenta.

A compulsão alimentar leva muitos pa-cientes a engordarem depois da cirurgia. Por isso, uma equipe multidisciplinar com a ajuda de psicólogos é importante para diagnosticar e tratar esses vícios. “Ultima-mente, eu tenho sonhado com carne assa-da com batatas, mas o que eu sinto não é fome, é vontade. E a vontade tem que ser subjugada”, diz Davi, que já emagreceu 15 quilos três meses após a cirurgia. Mais do que um instrumento para a eliminação de peso, a reeducação alimentar é um processo de aprendizado. “A gente estimula um hábi-to saudável para os obesos em recuperação, que seria para qualquer outra pessoa”, diz a nutricionista Renata Saggion Bortoluzzo.

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AL“Para evitar a anemia, passei a comer coisas que não me atraíam, como coração de galinha”, diz Adriana Fuentes Lobo

Após a cirurgia de redução de estômago, feita em 2006, Adriana perdeu 50 dos 105 quilos

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REPORTAGEM THAIS FOLEGO (3º ano de Jornalismo)

iMAGEM RENATA MIWA (2º ano de Publicidade e Propaganda)

SAÚDE

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O mal de Alzheimer é uma doença degenerativa que compromete o cérebro provocando diminuição da memória, dificuldade no raciocínio e alterações comportamentais. Segundo Vanderli Marchiori, o consumo regular de amendoins pode diminuir em até 67% os riscos de desenvolvimento da doença. “Uma substância presente no amendoim, os fitosterois, inibe a degeneração das células nervosas e reduz a oxidação”, afirma.

AmEnDoim

As doenças cardiovasculares matam anualmente 17,5 milhões de pessoas em todo o mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Quem não quiser fazer parte dessa estatística pode ajudar o coraçãoconsumindo alimentos ricos em ácidos graxos Ômega-3, como o salmão. “Eles atuam na redução do colesterol ruim, o LDL, diminuindo a agregação plaquetária que causa o entupimento das veias arteriais, além de reduzir os níveis de triglicérides [gorduras]”, explica Daniel Magnoni, cardiologista e nutrólogo do Hospital do Coração.

SAlmãoEstá estressado? Se você não tiver tempo para ir pescar, como

sugere o ditado, quatro xícaras de chá verde por dia ajudam. “Os

teatinos, componente fitoterápico presente no chá, reduzem o

nível do hormônio cortisol no organismo”, explica a nutricionista

especialista em fitoterapia, Vanderli Marchiori. O cortisol,

produzido pelas glândulassupra-renais, ficou conhecido como o hormônio do estresse, pois em grandes quantidades pode provocar o aumento da

pressão arterial, dos batimentos cardíacos e a retenção de líquido

e gordura no corpo.

Chá-vErDE

A menopausa é caracterizada pela diminuição da produção dos hormônios femininos (estrogênio e progesterona) pelos ovários e, para algumas mulheres, o início

de sintomas como ondas de calor, suor excessivo, depressão,

ansiedade e insônia. “As isoflavonas, substância contida na soja e seus derivados, podem ser

uma opção para mulheres na pós-menopausa”, afirma a Dr. Fabiana.

Segundo ela, as isoflavonas são hormônios vegetais que,

por terem uma estrutura semelhante ao estrogênio,

podem agir como ele no corpo.Contudo, a nutricionista adverte: qualquer conduta adotada neste

período, como uma terapia de reposição hormonal, precisa ser recomendada por um médico.

SojASegundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), o câncer causa cerca de 8 milhões de mortes por ano no mundo. Uma das formas de prevenir a doença é ingerindo alimentos ricos em licopeno, composto responsável pela coloração vermelha do tomate. “O licopeno é uma das substâncias com maior poder antioxidante, sugerido na prevenção da carcinogênese [formação de câncer], pois protege moléculas como o DNA”, explica a nutricionista doutora em Ciência dos Alimentos, Fabiana Poltronieri. Uma pesquisa da Universidade do Estado de Ohio (EUA) demonstrou que homens que consomem mais produtos de tomate têm um risco menor de desenvolver câncer de próstata.

tomAtE

Comer pode ser o remédio para uma vida saudável

Farmácianatural

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Page 38: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

A Gastronomia Molecular permite extrapolar na cozinha e até transformar uma feijoada em esfera comestível

REPORTAGEM MARIANA LIMA (3o ano de Jornalismo)e NATHALIE FRANCO (1o ano de Jornalismo)

CIÊNCIA

reinvenção

Equipamentos como o Gastrovac, que permite cozimento à vácuo, auxiliam os chefs na criação de novos pratos

Três ovos grandes, uma pitada de sal, uma colher de sopa de limão e óleo. Coloque os ingredientes no liquidificador, menos o óleo, batendo ligeiramente. Com cuidado, destampe o recipiente e vá acrescentando o óleo até dar o ponto, que é quando a massa fica endurecida. Eis a receita básica para se fazer uma maionese tradicional, certo? Nem tanto. Pelo menos não para a Gastronomia Molecular que testa as dicas usadas em re-ceitas e que foram passadas de geração em geração. Desenvolvida em 1988 pelo físico-químico francês Hervè This e pelo físico húngaro Nicholas Kurti, a Gastronomia Mo-lecular é a aplicação da ciência na cozinha, com a intenção de confirmar ou desmistifi-car crendices como a do acréscimo posterior do óleo durante o preparo da maionese.

A partir da análise das reações físicas e químicas que acontecem na interação en-tre os alimentos, This e Kurti propuseram a consolidação de um modo certo de con-ceber determinado prato, facilitando, dessa maneira, o cotidiano da cozinha.

“Como declarado diversas vezes pelo professor Hervè This, a Gastronomia Mo-lecular se propõe a ajudar na tarefa das cozinheiras domésticas e dos cozinheiros de restaurantes”, explica Enrique Renteria, presidente da Sociedade Brasileira de Gas-tronomia Molecular (Sbgm), fundada em 2007. Para isso, ficou estabelecida uma pa-dronização de informações sobre o preparo e o aprofundamento da técnica de cozinhar para se obter um resultado perfeito.

EVOLUÇÃO NAS PANELAS A relação da ciência com a cozinha teve início em 1794, quando o físico anglo-americano Benjamin Thompson escreveu sobre a importância da aplicação científica na culinária. “O estudo é muito antigo. Gastronomia Molecular é o nome que ganhou na sua mais recente en-carnação”, afirma Enrique. “Existe uma tra-dição no estudo dos fenômenos, tanto para alimentos frios quanto quentes. Há aproxi-madamente dez anos a divulgação na im-prensa dos resultados obtidos pela ciência colaborou para tornar as constatações mais visíveis ao público”, diz.

Para a professora de Cozinha Contem-porânea da faculdade Anhembi Morumbi,

Marina Queiroz, com os avanços nos estu-dos, a área de gastronomia deixou de ser considerada cientificamente pouco séria e isso fez com que os cozinheiros passassem a aprimorar suas técnicas e, consequente-mente, seus pratos.

No Brasil, os restaurantes D.O.M, do chef Alex Atala, e o Eñe, dos chefs de origem ca-talã Sergio e Javier Torres Martinez, conhe-cidos como os “Gêmeos de Ouro”, preparam refições completas seguindo a Gastronomia Molecular. Para tanto, fazem uso de novas técnicas de cozimento a baixa pressão to-mando como ponto de partida o Gastrovac, uma máquina compacta de cozimento a vá-cuo que preserva as características originais dos alimentos. O equipamento mantém a textura de uma maçã embebida em vinho ao mesmo tempo que agrega à fruta o aroma e sabor da bebida, por exemplo.

Apesar disso, técnicas e equipamentos como esse ainda não chegaram ao seu auge por aqui. “A cozinha do Brasil ainda está muito aquém do nível de evolução dos pa-íses europeus”, explica Marina.

O chef espanhol Ferran Adrià desponta como referência no ramo. Seu restaurante, El Bulli, elevou a cozinha espanhola ao pos-to de melhor do mundo pela terceira vez, de acordo com a revista britânica Restaurant.Adrià alcançou a fama principalmente por sua técnica de “desconstrução”, em que reinventa pratos, mudando sua temperatu-ra e consistência. No El Bulli, normalmente as reservas para um jantar devem ser feitas com até três anos de antecedência.

Por trás deste sucesso existem muitas pesquisas: seu estabelecimento só abre por seis meses. No resto do ano faz experiências, definindo o que será tendência na próxima temporada. Combinações aparentemente inconcebíveis, como alho e café, sorvete de bacon ou mingau de escargot tornam-se possíveis na maioria dos restaurantes que figuram na lista dos ‘mais mais’, como o in-glês Fat Duck e o frânces Pierre Gagnaire.

Mas não são só as cozinhas profissio-nais que podem preparar pratos com per-feição. “Para preparar um alimento com os recursos da Gastronomia Molecular eu pos-so simplesmente usar uma frigideira. O que

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interessa são as reações presentes na pre-paração, é atingir o ponto ideal para fazer a receita dar certo”, afirma Enrique Renteria. “Mas, às vezes, é preciso medir a temperatu-ra de um suflê, por exemplo. Daí o cozinhei-ro faz uso de um medidor termoelétrico”.

SErá qUE ALIMENtA? Com toda a preocupação em torno da alquimia dos ali-mentos, o valor nutritivo dos pratos fica em segundo plano, de acordo com Andréa Esquivel, especialista em nutrição clínica e gastronomia, membro do Grupo de Nutri-ção Humana (Ganep). “A Gastronomia Mole-cular tem que ser o início para que a gente possa melhorar o visual, entendendo que a comida precisa ser bonita, impactante, mas ela não pode ser apenas plástica, ela precisa ser, antes de mais nada, nutritiva”, diz.

Segundo ela, a simples substituição de um elemento por outro, a fim de facilitar ou inovar o andamento de uma receita, não pode ser a idéia principal para a formulação dos pratos. Um exemplo é a experimentação feita pelo irmão de Adrià, que era químico. Depois de conhecer as idéias de Hervè This, ele revolucionou transformando o macarrão do estado sólido para o líquido, o que é pos-sível do ponto de vista da física e da quími-ca. “Só que não tem como ele avaliar se isso interfere na nutrição. E interfere”, afirma.

Inventor da esferificação, que é a trans-formação de alimentos antes líquidos em esferas, como a gema do ovo, Adrià recebe mais críticas da nutricionista: “Ele pode pe-gar uma feijoada, por exemplo, bater e for-mar um creme que ficará dentro da frágil película da esfera. Acontece que para conce-ber a esfera, ele precisa usar cálcio. Na feijo-ada há muita carne, alimento rico em ferro. Cálcio e ferro, quando juntos, não podem ser absorvidos. Então a comida fica linda, porém nada nutritiva”, explica. Para ela, não podemos ter uma visão hedonista do ato de comer, porque, assim, a alimentação fica descartável. “E ela é muito mais importan-te para merecer apenas o enfoque estético”, acrescenta Andréa Esquivel.

Porém, a prioridade de chefs como Adrià não é a nutrição, mas sim o jogo de sensações envolvidas em seus pratos. Mar-celo Ozi, cozinheiro que conheceu a Cozi-

nha Contemporânea e a Gastronomia Mo-lecular numa viagem à Espanha, esclarece: “essa culinária tem que ser vista como uma experiência gastronômica, na qual o cliente espera esse momento com o desejo de pro-var um prato que ele nunca comeu antes”. As pessoas não vão ao El Bulli para matar a fome, mas para experimentar uma nova forma de degustação, como nos desfiles de moda, em que as roupas da passarela ja-mais são vistas nas ruas. “Você marca, fica três anos na lista de espera e quando chega sua vez é um acontecimento, como se fosse um casamento”, acrescenta a professora da Anhembi Morumbi, Marina Queiroz.

O qUE VALE É EXPErIMENtAr O pro-fessor Enrique Renteria concorda. “Não é que a Gastronomia Molecular despreze o valor nutricional. Ela busca fazer com que a ‘saída’ dos pratos seja acertada, ou seja, que não haja o risco de um suflê, por exem-plo, ficar mais farto de um lado do que do outro”. O ponto mais importante, ressalta-

do pelo presidente da Sbgm, é que tanto o cozinheiro quanto a dona-de-casa consigam entender quais as dicas passadas de gera-ção para geração que surtem efeito e quais podem ser descartadas.

Segundo ele, Hervè This testou mais de 25.000 recomendações em livros de receitas para desvendar os mistérios da preparação dos alimentos e facilitar a vida de quem cos-tuma prepará-los. Atualmente, em países como a França, setores ligados à engenharia de alimentos de universidades dão continui-dade aos estudos de Kurti e This. Um grupo de Gastronomia Molecular, do College de France, também está empenhado em desco-brir como alcançar o resultado perfeito no preparo dos alimentos.

O principal objetivo é ajudar os cozi-nheiros para que nada dê errado durante a preparação da receita. E, assim, resolver problemas como o bolo queimado, o suflê murcho ou o abacate que ‘preteja’. Tanto na cozinha de casa quanto na profissional.

O molusco com algas, do El Bulli, é servido em forma de espuma

Ferran Adrià , o melhor chef do mundo, reinventa pratos a partir de

técnicas da ciência da cozinha

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interessa são as reações presentes na pre-paração, é atingir o ponto ideal para fazer a receita dar certo”, afirma Enrique Renteria. “Mas, às vezes, é preciso medir a temperatu-ra de um suflê, por exemplo. Daí o cozinhei-ro faz uso de um medidor termoelétrico”.

SErá qUE ALIMENtA? Com toda a preocupação em torno da alquimia dos ali-mentos, o valor nutritivo dos pratos fica em segundo plano, de acordo com Andréa Esquivel, especialista em nutrição clínica e gastronomia, membro do Grupo de Nutri-ção Humana (Ganep). “A Gastronomia Mole-cular tem que ser o início para que a gente possa melhorar o visual, entendendo que a comida precisa ser bonita, impactante, mas ela não pode ser apenas plástica, ela precisa ser, antes de mais nada, nutritiva”, diz.

Segundo ela, a simples substituição de um elemento por outro, a fim de facilitar ou inovar o andamento de uma receita, não pode ser a idéia principal para a formulação dos pratos. Um exemplo é a experimentação feita pelo irmão de Adrià, que era químico. Depois de conhecer as idéias de Hervè This, ele revolucionou transformando o macarrão do estado sólido para o líquido, o que é pos-sível do ponto de vista da física e da quími-ca. “Só que não tem como ele avaliar se isso interfere na nutrição. E interfere”, afirma.

Inventor da esferificação, que é a trans-formação de alimentos antes líquidos em esferas, como a gema do ovo, Adrià recebe mais críticas da nutricionista: “Ele pode pe-gar uma feijoada, por exemplo, bater e for-mar um creme que ficará dentro da frágil película da esfera. Acontece que para conce-ber a esfera, ele precisa usar cálcio. Na feijo-ada há muita carne, alimento rico em ferro. Cálcio e ferro, quando juntos, não podem ser absorvidos. Então a comida fica linda, porém nada nutritiva”, explica. Para ela, não podemos ter uma visão hedonista do ato de comer, porque, assim, a alimentação fica descartável. “E ela é muito mais importan-te para merecer apenas o enfoque estético”, acrescenta Andréa Esquivel.

Porém, a prioridade de chefs como Adrià não é a nutrição, mas sim o jogo de sensações envolvidas em seus pratos. Mar-celo Ozi, cozinheiro que conheceu a Cozi-

nha Contemporânea e a Gastronomia Mo-lecular numa viagem à Espanha, esclarece: “essa culinária tem que ser vista como uma experiência gastronômica, na qual o cliente espera esse momento com o desejo de pro-var um prato que ele nunca comeu antes”. As pessoas não vão ao El Bulli para matar a fome, mas para experimentar uma nova forma de degustação, como nos desfiles de moda, em que as roupas da passarela ja-mais são vistas nas ruas. “Você marca, fica três anos na lista de espera e quando chega sua vez é um acontecimento, como se fosse um casamento”, acrescenta a professora da Anhembi Morumbi, Marina Queiroz.

O qUE VALE É EXPErIMENtAr O pro-fessor Enrique Renteria concorda. “Não é que a Gastronomia Molecular despreze o valor nutricional. Ela busca fazer com que a ‘saída’ dos pratos seja acertada, ou seja, que não haja o risco de um suflê, por exem-plo, ficar mais farto de um lado do que do outro”. O ponto mais importante, ressalta-

do pelo presidente da Sbgm, é que tanto o cozinheiro quanto a dona-de-casa consigam entender quais as dicas passadas de gera-ção para geração que surtem efeito e quais podem ser descartadas.

Segundo ele, Hervè This testou mais de 25.000 recomendações em livros de receitas para desvendar os mistérios da preparação dos alimentos e facilitar a vida de quem cos-tuma prepará-los. Atualmente, em países como a França, setores ligados à engenharia de alimentos de universidades dão continui-dade aos estudos de Kurti e This. Um grupo de Gastronomia Molecular, do College de France, também está empenhado em desco-brir como alcançar o resultado perfeito no preparo dos alimentos.

O principal objetivo é ajudar os cozi-nheiros para que nada dê errado durante a preparação da receita. E, assim, resolver problemas como o bolo queimado, o suflê murcho ou o abacate que ‘preteja’. Tanto na cozinha de casa quanto na profissional.

O molusco com algas, do El Bulli, é servido em forma de espuma

Ferran Adrià , o melhor chef do mundo, reinventa pratos a partir de

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Page 40: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

comportamento

Vegetariano. Vegano. Microbiótico. Macro-microbiótico. Naturalista. Higienista. Bio-genista. A lista daqueles que seguem dietas alternativas é grande e a falta de informa-ção faz com que muitas pessoas não saibam aceitá-las, tampouco distingui-las. “Vege-tariano come em todo lugar que carnívoro come”, afirma Marly Winckler, 53 anos, pre-sidente da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB). Ela é vegetariana desde 1982 e vegana desde 1995, e, em seu trabalho, busca des-mistificar que a comida vegetariana é insos-sa e que o grupo ingere apenas alface.

Sérgio Greif, 33 anos, biólogo e mestre em nutrição humana pela Unicamp, refor-ça que vegetariano não se alimenta apenas com folhas. Ele é vegano desde 1998 e afir-ma que os onívoros (aqueles que não têm restrição e comem de tudo) que convivem com vegetarianos têm receio de qual comi-da servir em casa ou em qual lugar ir comer com alguém que não ingere carne.

cor e equilíbrio Para a nutricionista supervisora de nutrição clínica do Instituto Dante Pazzaneze de Cardiologia, Mônica Romualdo, a chance da pessoa ingerir to-dos os nutrientes necessários aumenta com um consumo diversificado de alimentos, bem como buscando o equilíbrio entre eles.

“Nem tanto carboidrato, nem tanta proteí-na”, afirma. Para ela, é possível viver sem carne, mas é preciso encontrar outras fon-tes para suprir as quantidades ideais de vi-taminas, minerais e nutrientes.

No caso dos veganos, que além de não comerem carne, como os vegetarianos, não consomem qualquer produto (alimentício ou não) de origem animal, há uma carência inevitável de vitamina B12 que precisa ser eliminada. “A gente não consegue equilibrar a vitamina B12 só com os alimentos de ori-gem vegetal”, alerta a nutricionista.

Outra ressalva feita por ela é a respeito do ferro, pois embora ele possa ser adquiri-do no consumo de vegetais – desde que se coma muitas folhas – este não é prontamen-te absorvido, como o da carne. Ela explica que é preciso ter cuidado, pois, apesar de existirem elementos que auxiliam a absor-ção desse ferro, como a vitamina C, outros, como o cálcio, acabam competindo com ele, o que atrapalha a eficácia da sua absorção.

A preocupação nutricional é ainda maior com crianças, grávidas ou idosos, pois pos-suem uma saúde mais delicada. Na casa do casal Daniela Cordeiro de Souza, 24 anos, e Caio Cezar Mayer Azevedo, 24 anos, há um cuidado especial com as crianças. Isabela, 6

anos, e Bernardo, 1 ano, já adotam uma die-ta não convencional. Na alimentação diária, muitas frutas, legumes, verduras e grãos, todos frescos, e leite de soja produzido em casa. Segundo a mãe, o garoto não costuma ficar doente, a não ser “pequenos resfriados naturais”. Assim como o irmão, Isabela, fi-lha de Daniela e enteada de Caio, é saudável e segue a dieta vegana. Ao ser questionada se sente vontade de comer carne, a pequena não hesita e diz que “não”. Mas ao pergun-tar sobre o chocolate, produto que tem leite e que, por isso, não pode ser ingerido pelos veganos, afirma que às vezes tem desejo. “Ela já teve momentos de muita vontade”, afirma Daniela. “Mas a gente vai colocando como algo natural”, explica.

O casal decidiu mudar seus hábitos ali-mentares há dois anos, após assistir ao ví-deo Não Matarás, produzido pelo Instituto Nina Rosa, que faz campanhas pela defesa dos animais. Quando estava grávida de Isa-bela, aos 18 anos, Daniela ela era apenas vegetariana, e quando ficou grávida do Ber-nardo, já adotava a dieta vegana.

Caio, por sua vez, vem de uma família acostumada a comer bife mal passado no café da manhã. Ele explica que a adoção do modo de vida vegetariano veio após conhe-

REPORTAGEM FERNANDA BONADIA (3o ano de Jornalismo) e LIVIA MARIA LUCAS (2o ano de Jornalismo)IMAGEM ALExANDRE FACCIOLLA (2o ano de Jornalismo)

DietasalternativasA opção por não consumir carne vai além da alimentação, é também um estilo de vida

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comportamento

Vegetariano. Vegano. Microbiótico. Macro-microbiótico. Naturalista. Higienista. Bio-genista. A lista daqueles que seguem dietas alternativas é grande e a falta de informa-ção faz com que muitas pessoas não saibam aceitá-las, tampouco distingui-las. “Vege-tariano come em todo lugar que carnívoro come”, afirma Marly Winckler, 53 anos, pre-sidente da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB). Ela é vegetariana desde 1982 e vegana desde 1995, e, em seu trabalho, busca des-mistificar que a comida vegetariana é insos-sa e que o grupo ingere apenas alface.

Sérgio Greif, 33 anos, biólogo e mestre em nutrição humana pela Unicamp, refor-ça que vegetariano não se alimenta apenas com folhas. Ele é vegano desde 1998 e afir-ma que os onívoros (aqueles que não têm restrição e comem de tudo) que convivem com vegetarianos têm receio de qual comi-da servir em casa ou em qual lugar ir comer com alguém que não ingere carne.

cor e equilíbrio Para a nutricionista supervisora de nutrição clínica do Instituto Dante Pazzaneze de Cardiologia, Mônica Romualdo, a chance da pessoa ingerir to-dos os nutrientes necessários aumenta com um consumo diversificado de alimentos, bem como buscando o equilíbrio entre eles.

“Nem tanto carboidrato, nem tanta proteí-na”, afirma. Para ela, é possível viver sem carne, mas é preciso encontrar outras fon-tes para suprir as quantidades ideais de vi-taminas, minerais e nutrientes.

No caso dos veganos, que além de não comerem carne, como os vegetarianos, não consomem qualquer produto (alimentício ou não) de origem animal, há uma carência inevitável de vitamina B12 que precisa ser eliminada. “A gente não consegue equilibrar a vitamina B12 só com os alimentos de ori-gem vegetal”, alerta a nutricionista.

Outra ressalva feita por ela é a respeito do ferro, pois embora ele possa ser adquiri-do no consumo de vegetais – desde que se coma muitas folhas – este não é prontamen-te absorvido, como o da carne. Ela explica que é preciso ter cuidado, pois, apesar de existirem elementos que auxiliam a absor-ção desse ferro, como a vitamina C, outros, como o cálcio, acabam competindo com ele, o que atrapalha a eficácia da sua absorção.

A preocupação nutricional é ainda maior com crianças, grávidas ou idosos, pois pos-suem uma saúde mais delicada. Na casa do casal Daniela Cordeiro de Souza, 24 anos, e Caio Cezar Mayer Azevedo, 24 anos, há um cuidado especial com as crianças. Isabela, 6

anos, e Bernardo, 1 ano, já adotam uma die-ta não convencional. Na alimentação diária, muitas frutas, legumes, verduras e grãos, todos frescos, e leite de soja produzido em casa. Segundo a mãe, o garoto não costuma ficar doente, a não ser “pequenos resfriados naturais”. Assim como o irmão, Isabela, fi-lha de Daniela e enteada de Caio, é saudável e segue a dieta vegana. Ao ser questionada se sente vontade de comer carne, a pequena não hesita e diz que “não”. Mas ao pergun-tar sobre o chocolate, produto que tem leite e que, por isso, não pode ser ingerido pelos veganos, afirma que às vezes tem desejo. “Ela já teve momentos de muita vontade”, afirma Daniela. “Mas a gente vai colocando como algo natural”, explica.

O casal decidiu mudar seus hábitos ali-mentares há dois anos, após assistir ao ví-deo Não Matarás, produzido pelo Instituto Nina Rosa, que faz campanhas pela defesa dos animais. Quando estava grávida de Isa-bela, aos 18 anos, Daniela ela era apenas vegetariana, e quando ficou grávida do Ber-nardo, já adotava a dieta vegana.

Caio, por sua vez, vem de uma família acostumada a comer bife mal passado no café da manhã. Ele explica que a adoção do modo de vida vegetariano veio após conhe-

REPORTAGEM FERNANDA BONADIA (3o ano de Jornalismo) e LIVIA MARIA LUCAS (2o ano de Jornalismo)IMAGEM ALExANDRE FACCIOLLA (2o ano de Jornalismo)

DietasalternativasA opção por não consumir carne vai além da alimentação, é também um estilo de vida

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cer Daniela, e que a passagem para o vega-nismo não foi fácil, com alguns momentos de recaída em que consumia sorvete, o ali-mento mais difícil de abandonar em sua opinião. Hoje em dia não sofre mais, já que produz o próprio sorvete com soja.

Foi pensando na dificuldade em encon-trar produtos voltados para os veganos e também por conta dos altos preços desses alimentos que o casal decidiu criar, em julho de 2007, a Vovó Vegana, uma microempresa que produz alimentos congelados, salgadi-nhos e doces para festas, cestas e pratos especiais, como a ceia de Natal.

macromicrobióticos Se para Sér-gio Greif, a alimentação do ser humano se baseia nos cereais e nas leguminosas, para os seguidores da dieta macromicrobiótica a alimentação vai um pouco além. Antes co-nhecida apenas por “macrobiótica”, a dieta prevê a medida ideal de yin (energia fria e negativa) e yang (energia quente e positiva) na montagem dos pratos. O que, segundo seu criador o japonês George Oshawa, po-deria manter o corpo sempre são e em equi-líbrio, evitando doenças.

No Brasil, o grande difusor da cultura macromicrobiótica foi seu discípulo, Tomio Kikuchi, que veio para cá em 1955, e des-

de 1968 possui a Escola de Nutrição Satori, localizada no bairro da Liberdade, em São Paulo. José Prado, 56 anos, macromicrobi-ótico há 30, assegura que esta dieta auxi-lia no equilíbrio interior, na diminuição do consumismo e traz também benefícios sig-nificativos para a saúde, como a proteção contra doenças cardíacas.

Mesmo sem ter uma pirâmide alimentar única e imutável, os alimentos consumidos no dia-a-dia costumam ser óleos vegetais, feijão, algas, verduras, grãos (como arroz, cevada, trigo, aveia e milho) e produtos à base de farinha de trigo (como massas). Al-guns itens são de consumo ocasional, como os peixes e frutos do mar, sal marinho, mo-lho de soja, doces à base de grãos ou fru-tas, sementes, castanhas, nozes e frutas. Já a carne vermelha e a de frango, o ovo e os laticínios são indicados somente no período em que a pessoa está mudando de dieta.

nÃo tÃo Diferentes Embora seja adepta da dieta naturalista – que come ali-mentos sem manipulação ou adição de ele-mentos químicos –, Solange Zecchini, 51 anos, argumenta que não obriga as duas filhas a mudarem a alimentação nem entra em conflito com o marido por suas diferen-ças alimentares. “Meu marido gosta [de car-

ne] e minhas filhas também”, diz. Embora diga sofrer ao ver as filhas consumindo car-ne, ela afirma que tenta ensinar o que acre-dita, mas sem provocar qualquer agressão. “Não deixo de ir a um churrasco, nem de ir na casa de alguém porque vai ter um chur-rasco”, garante Solange.

O cuidado em orientar os filhos também faz parte da vida do psicólogo Fernando Travi, 56 anos. “Minha influência nos hábi-tos de vida de meus filhos foi e é forte, mas não é rígida”, diz. Ele adota uma dieta híbri-da entre a biogenia e a higienia. Travi expli-ca que é sutil a diferença entre elas. “Na bio-gênica o foco é mais forte na qualidade dos alimentos. A orientação higienista está mais centrada na combinação de alimentos”.

Nas duas dietas estão presentes alimen-tos crus, frutos frescos e secos, vegetais, sementes, grãos germinados e algas. A es-colha feita pelo psicólogo determina que as refeições sejam realizadas duas vezes ao dia, entre as 11h e às 20h. De manhã toma um copo de suco de laranja ou água, almoça saladas cruas, que são o prato mais impor-tante, e em geral, com nozes, castanhas e sementes. No começo da noite, apenas fru-tas. Com 1,74 m e 67 quilos, ele garante que se sente mais saudável e rejuvenescido.

Um grupo de pessoas se reuniu na Avenida Paulista para celebrar o Dia Mundial Vegano

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Dos que podem fazer mal aos que embelezam: mitos e verdades sobre alguns alimentos

Você acredita?

“É mais difícil quebrar um mito que um átomo”, brinca o médico da Abran, Dr. Durval Ribas Filho. Assim como ele, a nutricionista da Universidade de São Paulo (USP), Jéssica Mascaretti, afirma que a combinação de manga com leite não faz mal. A história começou na época da escravidão, quando os senhores espalharam o mito para que os escravos não misturassem a fruta com o leite,já que eram produtos caros.

MANGA COM LEITE FAZ MAL?

Comer é como meditar: é preciso atenção, concentração e um ambiente tranqüilo. “O fato de comer realizando outra atividade, como ver TV, trabalhar, realizar discussões de trabalho, faz com que o indivíduo desvie sua atenção e coma mais rápido sem perceber”, explica a Dra. Lara. Por ingerir quantidades maiores do que o organismo precisa, a digestão poderá ficar prejudicada. Além disso, a médica atenta para o agravante do ganho de peso. Daniel Bandoni, nutricionista da USP, concorda: “Se você assiste à TV, você não presta atenção na quantidade que ingere”.

FAZ MAL COMER VENDO TV?

Para quem não consegue comer sem beber algo, esta é uma boa notícia. É consenso entre os especialistas que beber água durante as refeições não engorda. Isso não se aplica a refrigerantes e sucos adoçados, por terem alto teor calórico. A Dra. Lara Cunha alerta que consumir este tipo de bebida durante as refeições pode ainda dificultar a digestão. Mas o Dr. Durval explica que apesar das bebidas gaseificadas poderem dilatar o estômago “isso não interfere diretamente no ganho de peso”.

BEBER NAs REFEIçõEs AuMENTA A BARRIGA?

PEPINO TIRA OLHEIRA?A salada nossa de cada dia ajuda, sim, a deixar nossa pele mais viçosa desde que acompanhada de uma dieta equilibrada, garante o médico nutrólogo, presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), Dr. Durval Ribas Filho. Por ser refrescante e liberar vitaminas A e K, o pepino melhora o fluxo sangüíneo local, minimizando as olheiras. A Dra. Lara Natacci Cunha, explica que ele é um vegetal rico em antioxidantes, pois estimula a excreção das toxinas.

PIPOCA DIMINuI TPM?A pipoca, assim como o chocolate, possui carboidratos que ajudam a manter o humor sob controle. “O que diminui a TPM são esses alimentos que aumentam a quantidade de serotonina [molécula que auxilia na comunicação entre os neurônios]”, explica o Dr. Durval. O nutricionista Daniel Bandoni discorda e afirma: “Não tem efeito direto”.

CHá VERDE EMAGRECE?Pode incluir a folhinha no cardápio. Apesar das divergências sobre o quanto e o porquê do chá ajudar na perda de peso, há consenso quanto à veracidade deste efeito. A bebida possui substâncias termogênicas, que ajudam a ativar o metabolismo. A Dra. Lara acredita que, por aumentar o gasto energético, o chá “favorece a perda de peso”. Para o nutricionista Bandoni, é o efeito diurético da folha que causa o emagrecimento.

+ = ?

MITOsREPORTAGEM CAMILA MeNDONçA (2º ano de Jornalismo)IMAGENS ReNATA MIwA (2º ano de Publicidade e Propaganda)

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Dos que podem fazer mal aos que embelezam: mitos e verdades sobre alguns alimentos

Você acredita?

“É mais difícil quebrar um mito que um átomo”, brinca o médico da Abran, Dr. Durval Ribas Filho. Assim como ele, a nutricionista da Universidade de São Paulo (USP), Jéssica Mascaretti, afirma que a combinação de manga com leite não faz mal. A história começou na época da escravidão, quando os senhores espalharam o mito para que os escravos não misturassem a fruta com o leite,já que eram produtos caros.

MANGA COM LEITE FAZ MAL?

Comer é como meditar: é preciso atenção, concentração e um ambiente tranqüilo. “O fato de comer realizando outra atividade, como ver TV, trabalhar, realizar discussões de trabalho, faz com que o indivíduo desvie sua atenção e coma mais rápido sem perceber”, explica a Dra. Lara. Por ingerir quantidades maiores do que o organismo precisa, a digestão poderá ficar prejudicada. Além disso, a médica atenta para o agravante do ganho de peso. Daniel Bandoni, nutricionista da USP, concorda: “Se você assiste à TV, você não presta atenção na quantidade que ingere”.

FAZ MAL COMER VENDO TV?

Para quem não consegue comer sem beber algo, esta é uma boa notícia. É consenso entre os especialistas que beber água durante as refeições não engorda. Isso não se aplica a refrigerantes e sucos adoçados, por terem alto teor calórico. A Dra. Lara Cunha alerta que consumir este tipo de bebida durante as refeições pode ainda dificultar a digestão. Mas o Dr. Durval explica que apesar das bebidas gaseificadas poderem dilatar o estômago “isso não interfere diretamente no ganho de peso”.

BEBER NAs REFEIçõEs AuMENTA A BARRIGA?

PEPINO TIRA OLHEIRA?A salada nossa de cada dia ajuda, sim, a deixar nossa pele mais viçosa desde que acompanhada de uma dieta equilibrada, garante o médico nutrólogo, presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), Dr. Durval Ribas Filho. Por ser refrescante e liberar vitaminas A e K, o pepino melhora o fluxo sangüíneo local, minimizando as olheiras. A Dra. Lara Natacci Cunha, explica que ele é um vegetal rico em antioxidantes, pois estimula a excreção das toxinas.

PIPOCA DIMINuI TPM?A pipoca, assim como o chocolate, possui carboidratos que ajudam a manter o humor sob controle. “O que diminui a TPM são esses alimentos que aumentam a quantidade de serotonina [molécula que auxilia na comunicação entre os neurônios]”, explica o Dr. Durval. O nutricionista Daniel Bandoni discorda e afirma: “Não tem efeito direto”.

CHá VERDE EMAGRECE?Pode incluir a folhinha no cardápio. Apesar das divergências sobre o quanto e o porquê do chá ajudar na perda de peso, há consenso quanto à veracidade deste efeito. A bebida possui substâncias termogênicas, que ajudam a ativar o metabolismo. A Dra. Lara acredita que, por aumentar o gasto energético, o chá “favorece a perda de peso”. Para o nutricionista Bandoni, é o efeito diurético da folha que causa o emagrecimento.

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MITOsREPORTAGEM CAMILA MeNDONçA (2º ano de Jornalismo)IMAGENS ReNATA MIwA (2º ano de Publicidade e Propaganda)

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REPORTAGEM José edgar e FerNaNdo goNZaLes (1º ano de Jornalismo)

NOITE

esQUINas 2º seMesTre 2008 43

Bar do JustoCEsTINha dE pErNIl

Tradicional da zona norte de são Paulo, o boteco aproveitou a antiga receita de pernil acebolado com pão e criou as cinco empadinhas recheadas de pernil. então, surgiu a Cestinha de Pernil. “eu e o chefe de cozinha arthur criamos a cestinha um mês antes do Boteco Boêmia de 2007”, conta o gerente Walter ribeiro. “desde a premiação do petisco muita gente vem especialmente para comê-lo”, afirma. em uma sexta-feira, por exemplo, são vendidas cerca de 80 porções da cestinha de Pernil no Bar do Justo.

EsCONdIdINhOBar Original

No bar original, surgiu o clássico escondidinho, um aperitivo feito de carne-seca com abóbora. “ele é a principal referência do bar”, afirma o gerente daniel Fialdini. “são vendidas de 30 a 40 porções em um dia bom”, calcula Fialdini. a repercurssão foi tão boa, que dois novos sabores foram criados: calabresa e bacalhau. “o escondidinho conquistou o público e, para mantermos os clientes satisfeitos, criamos essas duas variações do prato”, explica.

pasTEl dE FEIjOadaBarBirô

da pequena cidade de Cristina, sul de Minas gerais, veio a inspiração para o boteco localizado há cinco

anos na terra da garoa. de lá também vieram ingredientes, que hoje fazem parte da receita de alguns petiscos, como o Pastel de Feijoada, criado por Maria de Fátima Kauage, nascida na cidade de Cristina e dona do BarBirô. elamisturou a famosa feijoada de Minas com um das iguarias mais tradicionais da capital paulista. assim, surgiu o Pastel de Feijoada. a porção vem com oito mini-pastéis, que ainda são acompanhados por torresmo e pimenta. “Vendemos cerca de 70 porções, a receita mineira do feijão transformado em pastel agradou o público”, conta osvaldo Cunha, mais conhecido como Vavá, gerente do bar. “as pessoas vem ao BarBirô só para experimentar essa novidade”, afirma.

Bar AstorMadElEINEs

o petisco foi inspirado nas receitas francesas de Brasserie: cremes em porções pequenas dispostos em panelinha de ferro. No boteco, que fica na Vila Madalena, os clientes podem apreciá-las em diferentes sabores: lingüiça e gorgonzola, frutos do mar e rabada com polenta e agrião. “as madeleines são relativamente novas, têm somente dois anos e meio. são petiscos contemporâneos”, afirma Fialdini, que também gerencia o Bar astor. em média, durante a semana, são vendidas 350 porções.

de boteco Bares paulistanos que são famosos não pelas bebidas, mas sim pelos petiscos que servem em boteco

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CIDADE

Nos fins de semana, o movimento do Mercadão quase triplica

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De abrigo para soldados na Revolução de 1932

a ponto turístico, a trajetória do Mercado

Municipal de São Paulo

REPORTAGEM DÉBORA FERRARI (1o ano de Jornalismo) e FELIPE LESSA (3o ano de Jornalismo) IMAGEM ALEXANDRE FACCIOLLA (2º ano de Jornalismo) e HELDA RUIZ (3o ano de Rádio e TV)

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 45

São 12.600 m² de área construída em um terreno na Rua da Cantareira, no Centro de São Paulo, próximo à Rua 25 de Março. O Mercado Municipal Paulistano, o Mercadão, vende 600 toneladas de alimentos todos os dias em 290 bancas, com cerca de 1.600 funcionários. Em média, 17 mil visitantes passam por lá nos dias de semana. Esse nú-mero pode chegar a 50 mil nos fins de se-mana e feriados. Com todo esse movimento, o mercado fecha apenas duas horas por dia: das 20h às 22h, para limpeza.

Dezoito portas dão entrada ao edifício, que é dividido por pequenas ruas que ser-vem de endereço para as bancas. Quatro clarabóias permitem que a iluminação seja praticamente toda natural, raramente as lu-zes são acesas durante o dia. Nas paredes há 32 painéis subdivididos em 72 vitrais com cenas da vida rural paulistana dos anos 1920. Antes de se fixar neste endereço, o co-mércio era feito na rua e, naquela época, era conhecido como Mercado Caipira. Pequenas embarcações chegavam num cais à beira do rio Tamanduateí e os produtos eram vendi-dos em barracas. O cheiro era muito forte, por causa dos restos do matadouro munici-pal que eram carregados pelas águas.

A chegada dos estrangeiros, provocada pelo fim da escravidão, a ascensão de uma pequena classe média e da elite do café fi-zeram com que os costumes locais adquiris-sem contornos europeus. “A cidade ganha uma nova forma de viver com uma sofisti-cação de costumes que serão copiados da França e da Itália”, explica Olga von Simson, professora de História da Universidade de Campinas (Unicamp) e especialista em pre-servação da memória. A construção de hos-pitais e a criação de políticas de promoção da saúde faziam parte deste processo. Nes-ta época, o Mercadão descumpria com as condições básicas de higiene e limpeza.

A família de Américo Quintas, 65 anos, viu todas estas mudanças. O pai dele tinha uma banca no Mercado Caipira. Quando o entreposto foi desativado, em 1930, os Quintas se mudaram para o Mercado Mu-nicipal, inaugurado em 1933. Américo foi trabalhar com o pai, ainda nos anos 1950,

e por ali ficou “porque a aposentadoria não dá para pagar as contas”. A Casa Quintas de Feijoada mantém até hoje o mármore de Carrara do piso e do balcão. Havia grande expectativa em relação ao lançamento do prédio que viria a ser o principal entreposto comercial da cidade, mas a Revolução Cons-titucionalista de 1932 adiou este momento.

O prédio foi utilizado como bunker pe-los soldados paulistanos. Como se não bas-tasse, parte dos vitrais foi destruída pelos militares que treinavam tiro ao alvo na cabe-ça das figuras pintadas. Foram dois meses de trabalho para reconstruir as imagens que eram assinadas pelo artista plástico russo Conrado Sorgenicht Filho.

À FRANCESA O Mercadão foi projetado pelo arquiteto paulista Ramos de Azevedo, que hoje empresta seu nome à praça que fica em frente ao Teatro Municipal, também desenhado por seu escritório. O projeto teve como inspiração as grandes estações de trem parisienses, mas há referências da escola espanhola e grega. “Era o que se es-tava adotando nos prédios públicos da épo-ca, como o Palácio das Indústrias e o Teatro Municipal. Era a moda da época. Além disso, era o estilo que São Paulo escolheu para re-presentar o que havia de mais monumental na cidade, que a associasse com qualquer cidade desenvolvida européia”, explica Re-nato Cymbalista, professor de História da Arquitetura da Escola da Cidade.

Mas o período de glamour não durou muito e nos anos 1960 o Mercado Municipal começa a dar sinais de decadência, princi-palmente com a construção de outros cen-tros de distribuição, como a Ceagesp e os “mercadões” dos bairros, como o da Lapa, o de Santo Amaro e o de Pinheiros. “O mer-cado acabou perdendo espaço para outros centros mais bem localizados, ou até mesmo descentralizados. Com isso, ele perdeu um pouco a função estratégica de abastecimen-to que tinha antes”, diz Olga von Simson.

Em 1973, o mercado quase foi demolido. A prefeitura havia alegado, mais uma vez, que o prédio não seguia as normas de higie-ne e segurança. Depois da luta dos feirantes para não perderem seu local de trabalho, foi

feito um registro no Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artísti-co e Turístico (Condephaat) ainda naquele ano, o que impediu a destruição.

Desde então, algumas pequenas refor-mas foram feitas, até que um projeto mais consistente de revitalização fosse realizado. Com isso, o status do Mercadão começou a mudar de decadente centro comercial a ponto turístico. Essa mudança se deve ao plano da prefeitura para revitalizar o centro de São Paulo. Antônio Quintas, o irmão mais velho de Américo Quintas, acredita que “as mudanças pelas quais passou o Mercadão são as mesmas da capital de São Paulo”.

Após a restauração, cada vez mais visi-tantes começaram a aparecer. “O mercado virou sim uma atração turística e nós de-vemos nos readequar, tirar proveito disso. O mercado vive de gente de fora”, afirma Fernanda Freitas, vice-presidente da Asso-ciação da Renovação do Mercado Municipal Paulistano (Renome). Tanto que, segundo ela, a rede de fast-food Habib’s já tentou abrir um restaurante lá, mas foi impedida por um decreto que proíbe que grandes re-des abram filiais no local para não prejudi-car o pequeno comerciante.

poNto DE ENCoNtRo Mas isso não significa que o Mercadão tenha perdido seu papel. Agora, o espaço tem se tornado cada vez mais um ponto de encontro para quem gosta de gastronomia e procura temperos exóticos ou algum ingrediente que não se encontra facilmente nos supermercados da cidade. A banca do Seu Quintas, por exem-plo, vende todo tipo de carne e variações de receitas para feijoadas. Já para quem gos-ta de paella, a loja do Renato Batista, que leva seu nome, tem tudo o que vai para den-tro do fogareiro na hora de fazer a receita: mariscos de vários tipos, camarões, arroz arbório, peixes, lagostins. Na banca, pode-se encontrar até consultoria gratuita para quem estiver em dúvida de como preparar a especialidade espanhola.

O perfil do consumidor do Mercadão também mudou. Durante a semana predo-mina a visita de donos de bares, lanchone-tes e pessoas que compram para revender.

75 anos de HIStÓRIAS

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CIDADE

Nos fins de semana, o movimento do Mercadão quase triplica

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De abrigo para soldados na Revolução de 1932

a ponto turístico, a trajetória do Mercado

Municipal de São Paulo

REPORTAGEM DÉBORA FERRARI (1o ano de Jornalismo) e FELIPE LESSA (3o ano de Jornalismo) IMAGEM ALEXANDRE FACCIOLLA (2º ano de Jornalismo) e HELDA RUIZ (3o ano de Rádio e TV)

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 45

São 12.600 m² de área construída em um terreno na Rua da Cantareira, no Centro de São Paulo, próximo à Rua 25 de Março. O Mercado Municipal Paulistano, o Mercadão, vende 600 toneladas de alimentos todos os dias em 290 bancas, com cerca de 1.600 funcionários. Em média, 17 mil visitantes passam por lá nos dias de semana. Esse nú-mero pode chegar a 50 mil nos fins de se-mana e feriados. Com todo esse movimento, o mercado fecha apenas duas horas por dia: das 20h às 22h, para limpeza.

Dezoito portas dão entrada ao edifício, que é dividido por pequenas ruas que ser-vem de endereço para as bancas. Quatro clarabóias permitem que a iluminação seja praticamente toda natural, raramente as lu-zes são acesas durante o dia. Nas paredes há 32 painéis subdivididos em 72 vitrais com cenas da vida rural paulistana dos anos 1920. Antes de se fixar neste endereço, o co-mércio era feito na rua e, naquela época, era conhecido como Mercado Caipira. Pequenas embarcações chegavam num cais à beira do rio Tamanduateí e os produtos eram vendi-dos em barracas. O cheiro era muito forte, por causa dos restos do matadouro munici-pal que eram carregados pelas águas.

A chegada dos estrangeiros, provocada pelo fim da escravidão, a ascensão de uma pequena classe média e da elite do café fi-zeram com que os costumes locais adquiris-sem contornos europeus. “A cidade ganha uma nova forma de viver com uma sofisti-cação de costumes que serão copiados da França e da Itália”, explica Olga von Simson, professora de História da Universidade de Campinas (Unicamp) e especialista em pre-servação da memória. A construção de hos-pitais e a criação de políticas de promoção da saúde faziam parte deste processo. Nes-ta época, o Mercadão descumpria com as condições básicas de higiene e limpeza.

A família de Américo Quintas, 65 anos, viu todas estas mudanças. O pai dele tinha uma banca no Mercado Caipira. Quando o entreposto foi desativado, em 1930, os Quintas se mudaram para o Mercado Mu-nicipal, inaugurado em 1933. Américo foi trabalhar com o pai, ainda nos anos 1950,

e por ali ficou “porque a aposentadoria não dá para pagar as contas”. A Casa Quintas de Feijoada mantém até hoje o mármore de Carrara do piso e do balcão. Havia grande expectativa em relação ao lançamento do prédio que viria a ser o principal entreposto comercial da cidade, mas a Revolução Cons-titucionalista de 1932 adiou este momento.

O prédio foi utilizado como bunker pe-los soldados paulistanos. Como se não bas-tasse, parte dos vitrais foi destruída pelos militares que treinavam tiro ao alvo na cabe-ça das figuras pintadas. Foram dois meses de trabalho para reconstruir as imagens que eram assinadas pelo artista plástico russo Conrado Sorgenicht Filho.

À FRANCESA O Mercadão foi projetado pelo arquiteto paulista Ramos de Azevedo, que hoje empresta seu nome à praça que fica em frente ao Teatro Municipal, também desenhado por seu escritório. O projeto teve como inspiração as grandes estações de trem parisienses, mas há referências da escola espanhola e grega. “Era o que se es-tava adotando nos prédios públicos da épo-ca, como o Palácio das Indústrias e o Teatro Municipal. Era a moda da época. Além disso, era o estilo que São Paulo escolheu para re-presentar o que havia de mais monumental na cidade, que a associasse com qualquer cidade desenvolvida européia”, explica Re-nato Cymbalista, professor de História da Arquitetura da Escola da Cidade.

Mas o período de glamour não durou muito e nos anos 1960 o Mercado Municipal começa a dar sinais de decadência, princi-palmente com a construção de outros cen-tros de distribuição, como a Ceagesp e os “mercadões” dos bairros, como o da Lapa, o de Santo Amaro e o de Pinheiros. “O mer-cado acabou perdendo espaço para outros centros mais bem localizados, ou até mesmo descentralizados. Com isso, ele perdeu um pouco a função estratégica de abastecimen-to que tinha antes”, diz Olga von Simson.

Em 1973, o mercado quase foi demolido. A prefeitura havia alegado, mais uma vez, que o prédio não seguia as normas de higie-ne e segurança. Depois da luta dos feirantes para não perderem seu local de trabalho, foi

feito um registro no Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artísti-co e Turístico (Condephaat) ainda naquele ano, o que impediu a destruição.

Desde então, algumas pequenas refor-mas foram feitas, até que um projeto mais consistente de revitalização fosse realizado. Com isso, o status do Mercadão começou a mudar de decadente centro comercial a ponto turístico. Essa mudança se deve ao plano da prefeitura para revitalizar o centro de São Paulo. Antônio Quintas, o irmão mais velho de Américo Quintas, acredita que “as mudanças pelas quais passou o Mercadão são as mesmas da capital de São Paulo”.

Após a restauração, cada vez mais visi-tantes começaram a aparecer. “O mercado virou sim uma atração turística e nós de-vemos nos readequar, tirar proveito disso. O mercado vive de gente de fora”, afirma Fernanda Freitas, vice-presidente da Asso-ciação da Renovação do Mercado Municipal Paulistano (Renome). Tanto que, segundo ela, a rede de fast-food Habib’s já tentou abrir um restaurante lá, mas foi impedida por um decreto que proíbe que grandes re-des abram filiais no local para não prejudi-car o pequeno comerciante.

poNto DE ENCoNtRo Mas isso não significa que o Mercadão tenha perdido seu papel. Agora, o espaço tem se tornado cada vez mais um ponto de encontro para quem gosta de gastronomia e procura temperos exóticos ou algum ingrediente que não se encontra facilmente nos supermercados da cidade. A banca do Seu Quintas, por exem-plo, vende todo tipo de carne e variações de receitas para feijoadas. Já para quem gos-ta de paella, a loja do Renato Batista, que leva seu nome, tem tudo o que vai para den-tro do fogareiro na hora de fazer a receita: mariscos de vários tipos, camarões, arroz arbório, peixes, lagostins. Na banca, pode-se encontrar até consultoria gratuita para quem estiver em dúvida de como preparar a especialidade espanhola.

O perfil do consumidor do Mercadão também mudou. Durante a semana predo-mina a visita de donos de bares, lanchone-tes e pessoas que compram para revender.

75 anos de HIStÓRIAS

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Page 46: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

Apesar do nome, o lugar não vende apenas cereais, mas uma variedade de produtos naturais e integrais, como chás, temperos, pães, derivados de soja, frutas secas e cristalizadas, laticínios, conservas, entre outros.Diversidade é a palavra chave para entender o local. Se quiser pimenta, por exemplo, é preciso chamá-la de Malagueta, Cumari, Biquinho, Mista, Molho ou Seca, sob pena de ficar perdido entre tantas opções. Na rua Santa Rosa, uma das mais tradicionais da região, quase não há espaço que não seja aproveitado. Uma loja fica grudada na outra. Também é fácil encontrar empórios mais sofisticados, que chegaram atraídos pela perspectiva de revitalização do centro, lado a lado com armazéns quase improvisados e

tendas de frutas nas calçadas.No polígono entre as Ruas Mercúrio, Santa Rosa, Assunção e da Alfândega, alguns produtos podem ser encontrados por até metade do preço praticado no Mercado Municipal. O quilo do alho nacional, por exemplo, sai por R$ 5,50, e no Mercadão custa cerca de R$ 12. Um dos estabelecimentos mais conhecidos da região é o mercado Cerealista Helena. Luís Cláudio, responsável pelas vendas da loja, afirma que são vendidos diariamente cerca de 150 quilos de cereais matinais no varejo e duas toneladas no atacado. Na lista de clientes do local estão alguns lojistas do Mercado Municipal, que, por questões éticas e mercadológicas, ele se nega a revelar.

ZONA CEREALISTA

Sem contar o movimento dos atacadistas, sendo que vários destes também têm ban-cas na Ceagesp. O movimento lá quase não pára: das 7h às 18h funcionam as bancas do varejo, e das 20h às 7h, as do atacado.

PASSEIO DE FIM DE SEMANA Quando chega o sábado tudo muda. O freqüentador passa a ser aquele que busca um programa cultural: seja pela arquitetura, história ou pelos quitutes. “Eu amo cozinhar, então ve-nho aqui comprar bacalhau, quinua, trufas brancas e alguns tipos de azeites que não encontro tão facilmente”, conta Antônio Ex-querría, publicitário, 43 anos.

Já o turista alemão Alfred Meissel, estu-dante, 23 anos, prefere as comidinhas ven-didas nas lanchonetes: “Eu comi um pastel de bacalhau e outro de carne-seca com abó-bora. Achei bem diferente o gosto, muito bom. Apesar de meio caro, não?”. Os preços,

tanto dos produtos como das comidas, não são muito convidativos. Um prato de baca-lhau com legumes para duas pessoas chega a custar R$ 90 no Hocca, o restaurante mais tradicional do mercado.

Mas nem só de bacalhau vive o Merca-dão. Em que outro local o paulistano po-deria encontrar frutas como sapoti, pitaya, abacaxi gomo de mel ou physalis? E se o consumidor quiser saborear uma carne di-ferente, como marreco, avestruz, jacaré ou javali? É por lá que se encontra tudo isso e mais uma imensa variedade de produtos exóticos e até desconhecidos da maioria das pessoas que frequentam o local.

Contudo, todo tipo de carne vendido precisa ter procedência garantida. “Os pro-dutos são todos certificados pelo Ibama. É tudo criado em cativeiro, nada é de caça”, assegura Fábio dos Santos Bispo, funcioná-

rio do açougue Porco Feliz. A fiscalização é feita pela própria ad-

ministração do mercado e conta com uma equipe de médicos, veterinários e nutricio-nistas que passam a cada dois meses pelas bancas checando as condições de higiene e conservação dos produtos. Caso encontrem produtos sem o CIF (Certificado de Inspeção Federal), ou que estejam estragados, a mer-cadoria é recolhida.

A inserção urbana do Mercadão expli-ca muito do espírito paulistano. Construí-do com o objetivo de mostrar grandeza, o Mercado Municipal foi, aos poucos, sendo esquecido, talvez por falta de memória pú-blica. Agora, foi reformado para se transfor-mar num ponto turístico. Mas, a região ao redor continua degradada e passa por um lento processo de revitalização que envolve todo o centro de São Paulo.

O mezanino de 2000m² não

fazia parte do projeto original

do Mercadão

46 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008Colaboraram Raquel Porangaba e Talita Xavier

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REPORTAGEM AnnA cArolinA oliveirA e dAnielA rosolen (3º ano de Jornalismo)

iMAGEM renAtA miwA (2º ano de Publicidade e Propaganda)

BELEZA

EmuLsão dE LArAnjAA vitamina c presente na laranja alivia os impactos do envelhecimento e clareia manchas. segundosílvia mussolini, muitos fabricantes optam por uma emulsão de vitamina c para áreas como a dos olhos,

pois existem estudos que provam que o ingrediente ajuda na produção e no restabelecimento do colágeno, proteína importante para manter a firmeza da pele.

máscArAdE cAviAr

A substância marinha promove rejuvenescimento, amenização de manchas e uma recuperação rápida da pele desidratada, já que estimula a produção de colágeno e elastina. “os compostos responsáveis por esses efeitos são as proteínas, sais minerais e as vitaminas. todos eles têm um efeito antioxidante, que ajuda no rejuvenescimento e também dá brilho e vitalidade à pele”, aponta a esteticista Geralda lemes.

HidrAtAntE dE morAngoo extrato da fruta tonifica a pele por conter vitamina c. mas, o sucesso dos cosméticos que utilizam o morango está mais ligado à sensação de bem estar transmitida pela fragância. “o cheiro do alimento

estimula os transmissores do cérebro ligados à sensação de prazer e transmitem ao corpo a idéia de conforto e aconchego”, diz a coordenadora do curso de técnica e cosmética do senac.

XAmPu dE cHocoLAtEos cosmetologistas descobriram que o chocolate puro pode ser usado em produtos de beleza, como o xampu. Além de hidratar os cabelos, o próprio alimento funciona como um neurocosmético capaz de aliviar o estresse. entretanto, para a

dermatologista da escola Paulista de medicina, ilka nagasse, a divulgação de produtos à base de chocolate se deve mais a uma estratégia de marketing.

ÓLEo dE AmêndoAs“o óleo puro de amêndoas umidifica a pele e ajuda na retenção hídrica. esses dois efeitos combinados são ótimos para evitar estrias porque facilitam a produção de elastina”, afirma silvia mussolini.seguna ela, um pote pequeno do produto puro custa em média

r$ 50. entretanto, é raro encontrá-lo, já que normalmente o que há no mercado são misturas de óleos minerais com a essência da semente.

EsfoLiAntEdE vinHo

o vinho, bebida que já era utilizada sabiamente pelos gregos em banhos, virou moda entre os cosméticos. “Além de atuar como um neurocosmético, pela sua característica olfativa inebriante, quando utilizado em tratamentos de peeling ou esfoliação, pode proporcionar uma troca celular mais rápida e maior luminosidade da pele”, explica sílvia mussolini,coordenadora do curso de técnicae cosmética do senac.

esQUinAs 2º semestre 2008 47

cosméticos feitos à base de alimentos podem fazer bem ao corpo e à pele

vaidosasmuLHErEs

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Page 48: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

meio ambiente

Segundo o Ministério da Agricultura, Pe-cuária e Abastecimento (Mapa), o mercado mundial de alimentos orgânicos movimen-tou, em 2004, US$ 26,5 bilhões. Só no Brasil foram mais de US$ 100 milhões. E neste ano o crescimento deve ser ainda maior, depois que o presidente Luis Inácio Lula da Silva assinou um decreto que regulamenta a pro-dução orgânica no país.

Para a coordenadora de Agroecologia do Ministério da Agricultura, Teresa Cristi-na de Oliveira Saminez, este é um momen-to importante para aprimorar este tipo de cultura no país. “O Brasil tem um destaque importante no mundo por termos muitos produtores”, afirma. “Nosso país é o quinto maior produtor de orgânicos. Se contarmos o agroextrativismo da Amazônia, passa a ser o segundo”, ressalta a coordenadora-execu-tiva da Associação de Agricultura Orgânica

(AAO), Araci Kamiyama.Dados do Mapa indicam que existem

cerca de 15 mil produtores orgânicos em uma área de 800 mil hectares. Atualmente, a região Sul detém 68% desta produção, segui-da pela Nordeste, com 13%, e a Sudeste, com 10%. O Brasil também exporta alimentos orgânicos para diversos países, como Ho-landa, EUA, Canadá e França. Os produtos mais comprados são café, açúcar, castanha de caju e óleos vegetais. Para Araci, há uma boa aceitação do mercado externo devido a variedade de nossa produção interna. “Te-mos muitos tipos de frutas. O café, a soja e o açúcar são muito procurados também”, diz. “O Brasil produz 60% do que é consumi-do no mercado mundial”, afirma.

SaÚDe em PRimeiRo LUGaR Com o crescimento da produção, a população pas-sa a ter mais acesso a estes produtos. Uma pesquisa feita pela Latin Panel, em 2007, indica que 20% dos domicílios brasileiros já consomem alimentos orgânicos, como a soja, o café, o açúcar, a carne e até mesmo o vinho. Ainda de acordo com a pesquisa, 54% dos consumidores afirmam que optam pelo produto orgânico por considerá-lo mais saudável. A coordenadora de agroecologia do Mapa acrescenta que a preocupação não é apenas com a saúde individual. “O consu-mo está relacionado principalmente com a saúde, tanto individual quanto coletiva. A primeira porque existem pessoas que que-rem um produto livre de contaminantes e a coletiva, por uma questão ambiental, de preservação do meio ambiente”, diz. “E isso se deve também ao atributo de qualidade do produto orgânico, que está relacionado ao seu processo natural de produção”, afirma.

Apesar do crescimento do consumo, es-tes alimentos ainda enfrentam um obstácu-

A preocupação com a saúde é o principal motivo do crescimento da venda de produtos orgânicos no país

REPORTAGEM JULIA ALQUÉRES e PRISCILA ZUINI (3o ano de Jornalismo)IMAGEM LAISA BEATRIS (2o ano de Jornalismo)e RAfAEL dE QUEIRoZ (3o ano de Jornalismo)

mercado emexPanSão

Na feira do Parque da Água Branca, todos os alimentos orgânicos são certificados, como a castanha de Manicoré

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Page 49: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 55

lo para chegar ao consumidor: o preço. “A diferença de preço é também em função da demanda que é maior do que a oferta”, ex-plica Teresa Cristina. Normalmente, os or-gânicos são 40% mais caros do que um pro-duto normal. O quilo do tomate caqui, por exemplo, custa cerca de R$5,45, se for sem agrotóxicos pode sair a R$11 nos supermer-cados. “As pessoas acham que é caro mas, na verdade, trabalhamos com condições justas”, defende a coordenadora da AAO. Já Teresa Cristina afirma que são os interme-diários que encarecem o produto final: “Na etapa de conversão do produtor [período em que começa a adotar práticas de plantio or-gânico, desintoxicando o solo e aprendendo a trabalhar com a agricultura orgânica] o custo torna-se alto, mas depois que passa já não é tão elevado. São os supermercadistas que encarecem o produto”.

É DIA DE FEIRA No entanto, essa dife-rença de valor não vai direto para o bolso do produtor. Um estudo realizado pelo Mi-nistério da Agricultura, em janeiro de 2007, confirma que a diferença média entre o va-lor destinado ao produtor e o que o consu-midor paga pode chegar a 250%. Por isso, as feiras de alimentos orgânicos, como a do Parque da Água Branca, que acontece nas manhãs de terças-feiras, sábados e domin-gos, pode ser uma alternativa para quem busca um produto livre de agrotóxicos. “O preço do produto orgânico é mais caro e esse diferencial vai ser maior quanto maior for a distância entre o produtor e o consu-midor. Mas, em feiras, essa diferença já não é tão grande”, afirma a coordenadora de agroecologia do Ministério da Agricultura.

“No começo a feira era bem mais cara, ao longo do tempo, com o aumento do número de produtores, os preços baratearam”, afir-ma Marília Reis, 57 anos, freqüentadora da feira do Parque da Água Branca há 15 anos. Entre os alimentos que costuma comprar todos os sábados estão verduras, legumes, bolacha sem glúten e mel. Para Cecília Wars-chauer, 46 anos, o local oferece produtos que dificilmente são encontrados em outros lugares, como a acelga chinesa. E afirma que frequenta a feira especialmente para com-prar morango e tomate: “São produtos que normalmente são vendidos com muito agro-tóxico, então aproveito para comprar aqui”.

A feira é organizada há 17 anos pela Associação de Agricultura Orgânica (AAO). Para Araci, o diferencial está na diversida-de de produtos que são encontrados por lá. “Nós trabalhamos muito observando o hábi-to de consumo do paulistano e para ofere-cer o maior mix de produtos possível”, diz. “Se ele vier à feira e só encontrar folhagens talvez não venha mais. Então, ele vem por-que encontra frutas, cereais, pães, uma va-riedade que ajuda a trazer o consumidor”,

explica a coordenadora-executiva da AAO. Além das folhages, do tomate e do mo-

rango, um produto muito vendido na feira é a castanha. Nativa de Manicoré, município brasileiro do estado do Amazonas, a semen-te demora 14 dias para chegar a São Paulo e, na feira, é vendida pelo manauara Virgí-lio Pereira. O quilo da castanha sem casca, pronta para o consumo, ou um vidro de azeite de castanha, custa R$ 30. Já a farinha não sai por menos de R$ 20 o quilo.

Se os preços são altos, as recompensas parecem ser grandes. Virgílio ressalta que a semente faz muito bem à saúde. Possui, por exemplo, vitamina E, boa para os olhos e selênio, um sal mineral que combate os radicais livres. “É muito boa para reduzir o colesterol”, acrescenta o vendedor.

Os produtos que vêm da agricultura orgânica podem

ser até 40% mais caros do que outros em supermercados

20% dos domicílios brasileiros consomem produtos orgânicos

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Ricardo Castanho, crítico e editor de gastronomia do Guia Quatro Rodas, conta como fez 1900 refeições sem ser notado

50 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

à manger

Às 13h30, Ricardo Castanho chega, sem despertar atenção, para avaliar mais um restaurante. Como um agente secreto, que não pode ser identificado durante a operação, ele escolhe uma mesa tranqüila, pede o cardápio e analisa a especialidade do local. Antes de dar as primeiras garfadas, o crítico analisa a apresentação do prato. Depois, checa se a temperatura da comida está adequada. Os ingredientes devem estar quentes e colocados sobre recipiente aquecido. Por fim, experimenta. Castanho pega os talheres e cutuca, corta, olha, reolha e põe na boca. Mastiga, mastiga, pensa, mastiga, reflete. Come os ingredientes separados, depois todos juntos, para avaliar a harmonia do conjunto. Com essa investigação minuciosa, ele consegue perceber quais são os erros e os acertos.

Ricardo Castanho trabalha há dez anos no Guia Quatro Rodas e há quatro é editor de gastronomia. Apesar de já ter feito cerca de 1900 refeições profissionalmente, diz que não cansou da atividade: “Não canso nem de avaliar nem de fazer isso socialmente”. Com exceção dos olhos azuis, o crítico não revela seu rosto aos leitores. O anonimato garante que ele seja atendido como qualquer outra pessoa. “É importante comer a mesma comida que qualquer cliente comum comeria, para saber a qualidade”, ressalta. Castanho falou à ESQUINAS sobre quais os critérios de avaliação de um crítico de restaurantes.

007REPORTAGEM KARINA SÉRGIO GOMES (3° ano de Jornalismo)

ENTREVISTA

Bia Parreiras

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ESQUINAS O que é ser um crítico de restaurantes?RIcARdO cASTANhO É ir comer antes e indicar para as pessoas o que comer depois. Um crítico honesto faz isso sempre de maneira anônima. Chega sem avisar no restaurante, faz a refeição como qualquer cliente comum para conseguir captar uma idéia da qualidade da comida. Mas você só consegue ter essa idéia visitando e revisitando o lugar. Você tem momentos diferentes no mesmo restaurante, às vezes, muito bons, às vezes ruins e para chegar a uma média do lugar só indo várias e várias vezes.ESQUINAS Qual foi sua preparação para se tornar crítico de gastronomia?cASTANhO Eu já era há quatro anos repórter do Guia Quatro Rodas quando assumi a editoria. E sempre gostei muito mais de avaliar restaurantes do que hotéis e atrações. Talvez muito mais do que eu tenha aprendido em livros, leituras especializadas, a melhor escola foi esse trabalho no Guia. Primeiro, por ter referências de uma mesma coisa exaustivamente, o que é muito bacana para você estipular o que é o padrão de excelência de cada produto. Segundo, ter a chance de comer receitas no local de origem, de onde vinham os ingredientes, de onde as pessoas tinham o domínio de fazer a receita há gerações. E o maior aprendizado veio do contato diário com chefs e donos de restaurantes, pois com as visitas à cozinha, que como repórter eu tinha que fazer, acabei aprendendo muito com a experiência prática desses profissionais. ESQUINAS Antes de ser crítico, tinha muita coisa que você não gostava de comer?cASTANhO Quando entrei no Guia tinha. Não gostava de nada com jiló, que eu passei a gostar comendo boas receitas com o ingrediente no Nordeste. Quiabo eu também não curtia muito, mas comi boas receitas em Minas Gerais, por exemplo. Aprendi que não existe comida ruim, existe comida mal feita. ESQUINAS Ainda há algo que você não goste?cASTANhO Tem coisas que eu não comeria com muita freqüência. Mas que eu diga que não gosto, nenhuma.ESQUINAS E o que você não comeria com frequência?cASTANhO Buchada de bode, por exemplo. Porque é um prato pesado e não é muito bem-feito geralmente. E acho que continuaria não comendo muito jiló e quiabo. Mas eu já comi muito essas coisas e minhas preferências não influenciam a minha avaliação. Pelo contrário, se este ingrediente estiver presente e for bem utilizado, acho que até melhora minha opinião em relação ao cozinheiro.ESQUINAS Onde você aprendeu a comer esses alimentos que não faziam parte do seu dia-a-dia?cASTANhO O jiló eu não consigo me lembrar. Quiabo, eu comi um ótimo num restaurante chamado Xapuri, em Belo Horizonte. Buchada de bode era uma coisa que eu não esperava comer na vida. Mas comi uma, na Buchada do Gato, na periferia de Garanhuns, que eu fiquei emocionado. Porque uma das coisas mais felizes da vida de um crítico é comer uma receita difícil, de alguém que você não espera que vá sair algo muito bom, e se surpreender com isso. É uma emoção acima de comer até num restaurante três estrelas [classificação máxima para um restaurante].ESQUINAS O que é essa emoção? O que você sente?cASTANhO É quando você se surpreende comendo uma receita. O que não está ligado a comer algo diferente, muito complexo. Às vezes, pode ser uma coisa prosaica, super simples, mas que tem um elemento que foge do comum, que provoca uma sensação que você não está acostumado a sentir. Uma das últimas vezes que eu me emocionei foi no Kinoshita [restaurante japonês,

“Aprendi que não existe comida ruim, existe comida mal feita”

em São Paulo]. Comi um camarão inteiro, grelhado, só temperado com sal. O chef colocou o camarão na minha frente e disse que tinha sido pescado naquela manhã. É comum dizerem isso, mas, na boca, eu ia saber se era verdade. Quando eu o coloquei na boca, estava com um frescor, assim, estúpido. É um tanto prosaico, mas para quem está acostumado a encontrar camarão congelado, com gosto de geladeira, comer só o camarão, com o sabor real, sabor de camarão, sem nenhum tempero, ou molho para enganar o cliente. Isso é uma coisa emocionante.ESQUINAS Qual foi a melhor refeição que você já fez?cASTANhO É difícil dizer a melhor refeição que eu fiz. Fiz várias ótimas. Eu brinco que há refeições que me levaram às lagrimas. Sabe quando você come quase chorando? Comi muito bem nos restaurantes três estrelas, indicados no Guia Quatro Rodas. É difícil dizer qual é a mais tocante. Mas não está ligado a comer em lugares caros ou chiques. A buchada de bode, da Buchada de Gato mesmo, foi uma das refeições mais emocionantes que já fiz, e é um lugar simples e que paguei super barato pela refeição, acho que uns R$ 5 pela buchada e uma garrafa de água.ESQUINAS Qual foi a que mais lhe decepcionou?cASTANhO Várias me decepcionam. Mas o que mais me decepciona, hoje, é comer em restaurantes em

que a comida é muito ruim e você paga muito caro. Acho que a grande decepção, não só para mim, como crítico, mas para todas as pessoas é pagar muito caro por uma comida medíocre. Eu acho que isso acontece muito, especialmente aqui, em São Paulo, o principal pólo gastronômico do Brasil. Eu já comi muito mal em várias regiões do Brasil, mas aqui também. ESQUINAS Você que está acostumado com a alta gastronomia, também vai a restaurantes fast-food?cASTANhO De vez em quando [risos]. Até por força da necessidade. A gente vive no mundo em que cada vez as pessoas têm menos tempo para se alimentar. O pior é que as pessoas comem, cada vez mais, de forma automática, apenas para saciar a necessidade primária de se alimentar, ter energia para viver. E acabam fazendo isso sem muita reflexão sobre o que estão comendo. Acho que esse é o grande inimigo do restaurante e das pessoas, que ficam menos rigorosas com o que comem, dando espaço para quem cozinha mal e que tem produto ruim.ESQUINAS Você consegue desligar o seu lado de crítico quando não está avaliando?cASTANhO É uma coisa que acaba tomando conta de você. Você põe o garfo na boca e as referências vêm, por mais que seja a comida da minha mãe. O que não significa que eu não vou gostar da comida dela. Afinal, é a comida da minha mãe, com a cara dela, com o sabor dos temperos que ela costuma usar. Eu não deixo de gostar, mas eu consigo separar. Apesar de, às vezes, pensar: “Poxa, mas o camarão podia ser de melhor qualidade, né, mãe?” [risos].ESQUINAS Afinal, depois de tantas refeições, o que é comer para você?cASTANhO Muito prazer. Mesmo a trabalho. Não canso nem de avaliar nem de comer socialmente.

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educação

Neste ano foram abertas mais de 600 vagas em cursos de gastronomia em São Paulo

Uma faca para desossa, outra para legumes, colheres de medida, pinça para peixe, bate-dor de arame (o fouet), termômetro, balança digital portátil e espátulas. Esse é o material escolar básico dos 360 alunos que passam no vestibular da Universidade Anhembi Mo-rumbi para o Curso Superior Tecnológico em Gastronomia, que tem duração de dois anos. Em 2008, o campus da Vila Olímpia passou a oferecer mais 150 vagas e, de acor-do com o coordenador do curso do campus do Centro da Anhembi, Profº Francisco Re-belo, a sua unidade chegou ao número máxi-mo de turmas neste ano. Um total de 28.

A mensalidade atual da graduação é de R$ 1615 e o uniforme obrigatório para os estudantes, formado por dólmã (jaque-ta), avental de cintura, calça, chapéu, lenço e touca, pode ser encontrado em uma loja dentro da própria universidade pelo preço de R$ 150. Há kits com mais de uma dólmã que vão de R$ 250 a R$ 380.

No Centro Universitário Senac não é di-ferente. Dependendo da unidade, o custo do curso varia de R$ 1352 a R$ 1665 por mês e a procura é grande. Em 2001, quando se ini-ciaram as primeiras turmas de gastronomia, nos campi de Águas de São Pedro e Campos do Jordão, a relação candidato/vaga era de 2,5. No vestibular de janeiro de 2008, essa relação foi de seis estudantes por vaga.

De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira do Ministério da Educação (Inep/MEC), apenas na cidade de São Paulo quatro universidades tiveram seus cursos superio-res de tecnologia em gastronomia autoriza-dos pelo governo em 2008, o que soma mais de 600 novas vagas. “A gastronomia virou uma moda”, acredita a professora Camila Landi, coordenadora do curso das Faculda-des Hotec, que teve início em 2002.

“Falar e entender de gastronomia pas-sou a ser símbolo de status”, acrescenta

REPORTAGEM ANA PAULA DE DEUS (3o ano de Jornalismo)IMAGEM RENAtA MiwA (2o ano de Publicidade e Propaganda)

loucos por panelas

Na Hotec há 24 laboratórios para aulas práticas, como a de confeitaria

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Marcelo Néri, coordenador do curso de gas-tronomia do campus Vila Nova da Anhem-bi. “A profissão de cozinheiro passou a ser valorizada, os chefs ganharam a mídia”, diz ele. Não só o glamour explica o aumento da oferta e da procura por cursos superiores em gastronomia. A profissionalização do mercado tem sua fatia de participação no boom gastronômico. “Existe uma necessi-dade muito grande de profissionais que atuem de forma técnica, que vão entrar no mercado e entender a correta manipulação do alimento, o planejamento de compras, o desenvolvimento de produtos, o controle de custo”, afirma o Profº Francisco Rebelo.

Para Ingrid Schmidt-Hebbel, coordena-dora do curso superior em gastronomia do Senac, os clientes têm se tornado mais exi-gentes porque o contato com outras culturas é maior e, conseqüentemente, a comparação entre restaurantes do Brasil e do exterior também cresce. Essa mudança de perfil dos clientes é outra das razões do aumento da profissionalização em gastronomia.

novos chefs O chef Mauro Maia, do restaurante Supra, localizado no bairro Itaim Bibi, foi um dos alunos da primeira turma do curso superior de gastronomia da

Anhembi Morumbi, em 1999. Ele conta que eram apenas duas classes, uma de manhã e outra à noite, cada uma com 24 alunos que trabalhavam em duplas. Maia lembra que, como ele, a maioria dos alunos eram profis-sionais de outras áreas.

Atualmente, o perfil dos alunos do cur-so está mais amplo. Quase metade é cons-tituída por jovens recém-saídos do Ensino Médio. Há aqueles que já trabalham com gastronomia e querem um diploma, os que desistiram de outro curso e também os que já têm formação em outra área, mas querem mudar de carreira. “Tenho advogado que quer abrir um bistrô, um publicitário que quer trabalhar com fotografias de comida”, exemplifica Franscisco Rebelo, coordenador do curso do campus do Centro da Anhembi. “Muitas vezes eles levam a profissão deles para um paralelo com a gastronomia”, diz.

Um exemplo é Flávia Carolina Vicente, 25 anos, que se forma em Tradução e In-térprete neste ano e vai prestar vestibular para gastronomia em 2009. “Me arrependo muito, pois [Tradução e Intérprete] não é o curso que eu queria”, afirma. “Vou prestar gastronomia porque tenho paixão por cozi-nhar, é algo que sempre me interessou”.

A relação candidato/vaga para o curso de gastronomia

do Senac passou de 2,5 em 2001, para 6 em 2008

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educação

Neste ano foram abertas mais de 600 vagas em cursos de gastronomia em São Paulo

Uma faca para desossa, outra para legumes, colheres de medida, pinça para peixe, bate-dor de arame (o fouet), termômetro, balança digital portátil e espátulas. Esse é o material escolar básico dos 360 alunos que passam no vestibular da Universidade Anhembi Mo-rumbi para o Curso Superior Tecnológico em Gastronomia, que tem duração de dois anos. Em 2008, o campus da Vila Olímpia passou a oferecer mais 150 vagas e, de acor-do com o coordenador do curso do campus do Centro da Anhembi, Profº Francisco Re-belo, a sua unidade chegou ao número máxi-mo de turmas neste ano. Um total de 28.

A mensalidade atual da graduação é de R$ 1615 e o uniforme obrigatório para os estudantes, formado por dólmã (jaque-ta), avental de cintura, calça, chapéu, lenço e touca, pode ser encontrado em uma loja dentro da própria universidade pelo preço de R$ 150. Há kits com mais de uma dólmã que vão de R$ 250 a R$ 380.

No Centro Universitário Senac não é di-ferente. Dependendo da unidade, o custo do curso varia de R$ 1352 a R$ 1665 por mês e a procura é grande. Em 2001, quando se ini-ciaram as primeiras turmas de gastronomia, nos campi de Águas de São Pedro e Campos do Jordão, a relação candidato/vaga era de 2,5. No vestibular de janeiro de 2008, essa relação foi de seis estudantes por vaga.

De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira do Ministério da Educação (Inep/MEC), apenas na cidade de São Paulo quatro universidades tiveram seus cursos superio-res de tecnologia em gastronomia autoriza-dos pelo governo em 2008, o que soma mais de 600 novas vagas. “A gastronomia virou uma moda”, acredita a professora Camila Landi, coordenadora do curso das Faculda-des Hotec, que teve início em 2002.

“Falar e entender de gastronomia pas-sou a ser símbolo de status”, acrescenta

REPORTAGEM ANA PAULA DE DEUS (3o ano de Jornalismo)IMAGEM RENAtA MiwA (2o ano de Publicidade e Propaganda)

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Na Hotec há 24 laboratórios para aulas práticas, como a de confeitaria

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Marcelo Néri, coordenador do curso de gas-tronomia do campus Vila Nova da Anhem-bi. “A profissão de cozinheiro passou a ser valorizada, os chefs ganharam a mídia”, diz ele. Não só o glamour explica o aumento da oferta e da procura por cursos superiores em gastronomia. A profissionalização do mercado tem sua fatia de participação no boom gastronômico. “Existe uma necessi-dade muito grande de profissionais que atuem de forma técnica, que vão entrar no mercado e entender a correta manipulação do alimento, o planejamento de compras, o desenvolvimento de produtos, o controle de custo”, afirma o Profº Francisco Rebelo.

Para Ingrid Schmidt-Hebbel, coordena-dora do curso superior em gastronomia do Senac, os clientes têm se tornado mais exi-gentes porque o contato com outras culturas é maior e, conseqüentemente, a comparação entre restaurantes do Brasil e do exterior também cresce. Essa mudança de perfil dos clientes é outra das razões do aumento da profissionalização em gastronomia.

novos chefs O chef Mauro Maia, do restaurante Supra, localizado no bairro Itaim Bibi, foi um dos alunos da primeira turma do curso superior de gastronomia da

Anhembi Morumbi, em 1999. Ele conta que eram apenas duas classes, uma de manhã e outra à noite, cada uma com 24 alunos que trabalhavam em duplas. Maia lembra que, como ele, a maioria dos alunos eram profis-sionais de outras áreas.

Atualmente, o perfil dos alunos do cur-so está mais amplo. Quase metade é cons-tituída por jovens recém-saídos do Ensino Médio. Há aqueles que já trabalham com gastronomia e querem um diploma, os que desistiram de outro curso e também os que já têm formação em outra área, mas querem mudar de carreira. “Tenho advogado que quer abrir um bistrô, um publicitário que quer trabalhar com fotografias de comida”, exemplifica Franscisco Rebelo, coordenador do curso do campus do Centro da Anhembi. “Muitas vezes eles levam a profissão deles para um paralelo com a gastronomia”, diz.

Um exemplo é Flávia Carolina Vicente, 25 anos, que se forma em Tradução e In-térprete neste ano e vai prestar vestibular para gastronomia em 2009. “Me arrependo muito, pois [Tradução e Intérprete] não é o curso que eu queria”, afirma. “Vou prestar gastronomia porque tenho paixão por cozi-nhar, é algo que sempre me interessou”.

A relação candidato/vaga para o curso de gastronomia

do Senac passou de 2,5 em 2001, para 6 em 2008

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No ano em que Rebelo começou a lecio-nar, a Anhembi tinha apenas duas cozinhas para as aulas práticas. Hoje já são 11, di-vididas em cozinha quente, fria, padaria e confeitaria, além das duas salas de enologia (ciência que estuda o vinho), do centro de pesquisa e da sala climatizada para produ-ção de chocolate. Já o curso da Hotec ofere-ce 24 laboratórios para os 250 alunos que entram na faculdade a cada semestre, com espaços também para confeitaria, padaria, cozinhas fria e quente, sala e bar.

além da sala de aula Por volta de 70% da grade das faculdades de gastrono-mia é composta por matérias práticas. A preocupação é grande em relação ao que o mercado irá exigir do aluno.

Por isso, as disciplinas costumam ser atualizadas com freqüência. Na Hotec, por exemplo, foi adicionado ao conteúdo da disciplina de Cozinha Contemporânea, o es-tudo do food styling, ramo da gastronomia focado na estética da comida.

Na Anhembi, a disciplina de Serviços em Eventos e Buffets foi remontada porque, segundo o coordenador Rebelo, “São Pau-lo é um mercado que tem muitos eventos por hora”. Os graduandos aprendem, por exemplo, a montar diferentes tipos de bu-ffet, como o self-service ou empratado (pra-

to montado servido diretamente na mesa). “Assim estarão aptos a realizar um coquetel party, um lançamento de livro ou uma ver-nissage”, explica Rebelo.

estágios e oportunidades De acordo com Schmidt-Hebbel, coordenadora do curso no Senac, o mercado para o es-tudante formado em gastronomia é muito amplo. Há vagas para o profissional em par-ques temáticos, hospitais, consultoria, cate-ring (refeições para meios de transporte, em aviões, por exemplo) e, claro, em restauran-tes. “E mesmo que haja um número maior de pessoas formadas, os bons profissionais, que passaram pelas boas instituições serão absorvidos pelo mercado”, ressalta.

As 360 horas de estágio são obrigatórias no curso de gastronomia. Os alunos come-çam a estagiar no segundo semestre, quando já adquiriram uma noção básica das tarefas da profissão, como higiene e manipulação de alimentos, estrutura e funcionamento de uma cozinha. Na maioria das vezes, como lembra Camila Landi, os estágios acontecem na cozinha, onde os estudantes trabalham como auxiliares do chef.

O salário não é dos melhores. Alguns restaurantes pagam aos alunos, por no mínimo 30 horas semanais, uma ajuda de custo mensal de aproximadamente R$ 300,

e outros nem remuneram os estudantes. “Muitos restaurantes aceitam estagiários, mas 99% deles não te pagam nada”, diz Gil-berto Men Torraca, 27 anos, que terminou a faculdade em julho deste ano e hoje estagia no restaurante Martin Berasategui, em San Sebastián, na Espanha.

Escolher os aprendizes não é fácil, ain-da mais porque muitos não têm a noção do que é, na prática, ser um chef de cozinha. “Imagina o que é soltar uma mesa com oito pessoas sendo que um pediu um robalo que cozinha em oito minutos, outro é um risoto que cozinha em seis minutos, outro é uma massa com camarão e o camarão cozi-nha em três minutos?”, indaga o chef Mau-ro Maia. “E você tem que terminar tudo no minuto zero, os oito ao mesmo tempo para não esfriar nada”, explica.

Ele conta que é comum ouvir de candi-datos ao estágio questionamentos sobre a possibilidade de não trabalhar nos finais de semana e, que em alguns casos, o pessoal da cozinha costuma apostar quantos dias o novo estagiário vai agüentar no batente. “Se você quer tirar férias no final do ano, não quer trabalhar de sábado e domingo, vai fazer outra coisa na vida”. É o preço pago por todo o glamour que envolve aqueles que trabalham com gastronomia.

As aulas práticas também fazem parte do curso da Anhembi, cuja a mensalidade é de R$1615

“Entender de gastronomia passou a ser símbolo de status”, diz Marcelo Néri, coordenador do curso na Anhembi

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Para comer com os olhosQuando o assunto é comida, as prateleiras das livrarias se mostram tão interessantes quanto as dos supermercados

REPORTAGEM Rafael ONORI e thIagO faé (2º ano de Jornalismo)

LIVROS

De Jill Fullerton-SmithBaseado em um documentário produzido pela BBC, e transmitido no Brasil pelo canal gNt em março de 2008, A Verdade Sobre a Comida, da cineasta Jill fullerton-Smith, é uma investigação sobre a influência da dieta em diferentes aspectos da nossa vida. Na obra, Jill distingue o que é fato e o que é mito sobre a alimentação e os conceitos de vida saudável. a cenoura realmente

faz bem à visão? O vinho tinto faz bem ou mal à saúde? essas são algumas das perguntas respondidas. a autora também aborda a relação entre alimentação, sexualidade e tPM, além de analisar os efeitos diretos da ingestão de cafeína, açúcar e álcool na nossa saúde.

A VERDADE SOBRE A COMIDA

De Michael PollanSucesso de vendas e crítica nos eUa, o livro do jornalista Michael Pollan propõe a volta à alimentação tradicional, orgânica e saudável dos nossos avós. Crítico, o autor denuncia as contradições da produção de alimentos norte-americana e suas suspeitas relações com cientistas, o sistema de saúde, órgãos governamentais de regulamentação e a mídia. O jornalista ataca desde restaurantes fast-food até as barras de cereais.

EM DEFESA DA COMIDA

De Rex Pickettescrito pelo roteirista Rex Pickett, o livro deu origem ao filme Sideways – entre umas e outras,de 2004. Pickett conta a história de dois amigos, Miles e Jack, que resolvem passar uma semana seguindo a rota dos vinhedos do Vale de Santa Inez, na Califórnia, antes que Jack se case. entre reflexões sobre o passado e os problemas de cada um, a dupla conhece Maya e terra, mulheres que irão mudar suas vidas.

AMIgOS E VInhO,MuLhERES à PARtE

De Carole MatthewsO chocolate pode ajudar alguém a enfrentar problemas com um namorado infiel, um chefe paquerador ou um casamento morno? Segundo lucy e suas amigas – autumn, Nadia e Chantal – a resposta é sim. Juntas, as quatro mulheres fundaram O clube das chocólatras, título do romance da escritora britânica Carole Matthews. Na mini-associação localizada num elegante bairro londrino, o grupo se reúne para tentar resolver os problemas do dia-a-dia.

O CLuBE DAS ChOCóLAtRAS

De Raul Lodyalimentar o corpo e a alma é um objetivo comum a algumas religiões, como o Candomblé e a Umbanda. O ato de comer adquire uma dimensão sobrenatural, pois representa um ritual de entrega e comunicação entre os homens, os deuses e seus antepassados. No livro Santo também come, o pesquisador Raul lody percorre o Brasil para desenvolver um abrangente

estudo sobre a culinária das religiões afro-brasileiras, desvendando o cerimonial que combina comida, música e dança. é leitura obrigatória não somente para iniciados na religião, mas também para quem tem interesse em conhecer um pouco mais sobre a cultura africana.

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ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008 57

cozinha

“A chef Renata Braune falava para eu trazer o tomilho e eu pegava o alecrim”, diverte-se. A experiência foi enriquecedora a ponto de, três anos mais tarde, Tatiana assumir o cargo de chef no restaurante Bazzar, no Rio de Janeiro, liderando a equipe da qual fazia parte no emprego anterior.

Os funcionários, que inicialmente riam de sua inexperiência, aos poucos passaram a respeitá-la. A chef conta que aprendeu ra-pidamente a liderar com o apoio de seus su-bordinados. “Eu cheguei para a equipe e fa-lei: ‘Gente, nunca chefiei. Sei cozinhar, mas não sei chefiar. Então, me ajudem’”, lembra. Essa atitude foi fundamental para a criação de um vínculo com eles. Quanto ao domínio masculino na área gastronômica, Tatiana diz que nunca sofreu preconceito por ser mulher e acredita que hoje o mercado en-contra-se equilibrado entre os sexos.

SEM ORGULHO Os desafios físicos do trabalho não parecem ser um empecilho no dia-a-dia das duas chefs. Elas garantem que não dispensam a ajuda masculina quando precisam fazer algo. “Acho que temos um pouco de dificuldade para carregar peso. Mas, para mim, não há vergonha ou proble-ma em pedir para o funcionário fazer isso. Eu já vi algumas mulheres que querem ser super fortes. Eu não tenho isso, não”, asse-gura a chef Tatiana.

Quando se tornou proprietária do res-taurante dos pais, Silvia sentiu-se motivada a adaptá-lo ao padrão italiano: “No início, a casa era classificada como fast-food. Eu e meu irmão, Lamberto, transformamos o menu a partir de nossas raízes.” No início da sua carreira, viajou para a Itália em busca

de receitas que só profissionais locais con-seguiam executar, como diferentes moldes de corte de massa e molhos artesanais. Ain-da hoje, Silvia retorna todo ano à procura de novidades na culinária italiana.

Apesar das dificuldades diárias, as chefs estão contentes com a posição que ocupam e têm planos para expandir os ne-gócios. “Estou 100% feliz. Adoro de paixão e estou realizada porque consegui montar o Boa. Acho que o sonho de todo chef é ter o próprio restaurante”, comemora Tatiana. “Para fazer um nome, formar uma equipe, uma linha de trabalho, demora alguns anos. Depois de um tempo, você percebe: esse é meu público, meu nicho e minha linguagem. Mas, leva um tempo para se descobrir isso”, destaca Silvia. Segundo ela, pode demorar cinco anos para formar uma equipe confiá-vel e o dobro do tempo para se fixar.

Foi aos poucos que ela aprendeu a con-ciliar sua vida pessoal, inclusive a materni-dade, com a profissional. “Um chef não tra-balha sozinho, a equipe é muito importante porque ele também tem vida pessoal. Quan-do minha filha nasceu, eu já tinha 10 anos de Vinheria, então comecei a vir em horários mais tranqüilos”, constata.

Novas viagens e projetos fazem parte da vida dessas chefs atualmente. As priorida-des da proprietária do Boa Bistrô & Bem-Es-tar são aumentar o movimento do restau-rante, consolidar sua equipe profissional e montar um novo cardápio de comida con-temporânea: “Estou fazendo um cardápio legal para a crítica e para o tipo de cliente que tenho”. Tatiana diz que se interessa e busca referências na culinária oriental, prin-

cipalmente na tailandesa e na vietnamita. A chef da Vinheria Percussi tem planos

de ampliação de seu restaurante e conside-ra fundamental manter-se atualizada sobre novas tendências e linguagens. Até porque, segundo ela, seu público é bastante exigente e só se contenta com uma legítima culinária italiana. “O público que vem aqui gosta da Itália e conhece o país”, ressalta.

AOS NOVOS CHEFS Para os que se atrevem a encarar essa profissão, as chefs concordam que, antes de tudo, é necessário apreciar o ambiente gastronômico como um todo, desde o momento de preparar os pra-tos até o de lidar com o público.

Na opinião de Tatiana, quem deseja se tornar chef precisa de algo além de consul-tar livros de gastronomia, deve estagiar com cozinheiros de diferentes estilos e experiên-cias. “Aprendi 90% do que sei estagiando com os chefs, o resto com a escola FrenchCulinary Institute”, conta. Para ela, o estagi-ário ideal deve demonstrar iniciativa e para avaliá-lo em seu restaurante costuma apli-car um questionário com perguntas sobre os dados e interesses pessoais dos candida-tos, como o tipo de comida que gosta.

Silvia, por sua vez, acredita que algumas coisas são fundamentais para complemen-tar a formação de um chef, como conheci-mento de outros idiomas. “O chef deve ser, no mínimo, bilíngüe, por causa da literatu-ra. No Brasil, temos pouquíssimos livros de gastronomia em português”, afirma. Outro ponto importante, segundo ela, é viajar pelo mundo e, principalmente pelo Brasil, em busca de receitas regionais. “Se você é sol-teiro ainda, faça. Vá viajar!”, sugere.

Tatiana e Silvia afirmam que ter um restaurante é o sonho da maioria dos chefs

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Mulheres mostram que podem ser chefs e ocupar cargos que antes eram dominados pelos homens

REPORTAGEM ANNA MALATESTA (3o ano de Jornalismo), NATHALIA GARCIA e WILSON SAIKI (1º ano de Jornalismo)

O lugarCARREIRA

delas é nacozinha

Utensílios pesados, altas temperaturas, pos-tura de liderança, dedicação integral, con-corrência, contratempos e estresse. Estas são as condições de trabalho dos chefs de cozinha. Será que para as mulheres seria um empecilho lidar com tudo isto? Inicialmen-te dominada pelos homens, a gastronomia abre cada vez mais espaço para o sexo fe-minino. Tatiana Szeles, 32 anos, e Silvia Per-cussi, 44 anos, são exemplos de mulheres que encontraram na cozinha uma maneira de entrar no mercado de trabalho.

Descendente de italianos, Silvia é chef e proprietária da Vinheria Percussi, que fun-ciona há 20 anos em Pinheiros. Ela chegou a cursar desenho industrial, mas devido aos seus vários interesses ainda não sabia que caminho seguir: “Eu gostava de um monte de coisa e falava ‘não sei o que fazer. Gosto de comida, de arte, de decoração, de dese-nho e até de medicina. Eu gosto de tudo”.

O que acabou por nortear sua carreira foi um imprevisto. Uma greve de ônibus em 1989 impossibilitou a chegada dos funcio-nários ao restaurante de seus pais, obrigan-do-a a assumir o comando da cozinha. “Ja-mais achava que ia ficar aqui para sempre, achava que esse emprego não ia conseguir me dar tudo o que eu gostava”, lembra. Por fim, a atividade satisfez suas vocações ar-tísticas. “No restaurante você tem contato com pessoas, tem que ser criativo o tempo inteiro, tanto na estética de salão, quanto na montagem dos pratos”, justifica.

Quando Silvia iniciou sua carreira prati-camente não havia representantes do sexo feminino. Para ela, muita coisa mudou nes-se período. “No começo era assim: ‘nossa,

que diferente, uma chef mulher’. Elas figu-ravam quase como uma coisa exótica, hoje é menos”, assegura. Além disso, revela que as mulheres estão sujeitas a uma abor-dagem diferente no ramo. “Acho que em homem ninguém chega fazendo uma brin-cadeirinha. Com a gente sempre acontece, mas nunca deixei de ser bem tratada. Até fui muito bem recebida pelos colegas e pela imprensa”, garante.

PROFISSÃO: CHEF Já Tatiana Szeles, que adquiriu o Boa Bistrô & Bem-Estar no começo deste ano, queria ser médica, in-fluenciada pela profissão do pai. Reprovada dois anos consecutivos no vestibular, viu a nutrição como uma alternativa para perma-necer, ao menos, na área de saúde. Apesar de não ter gostado muito da faculdade, logo no primeiro semestre do curso percebeu que seus interesses estavam mais voltados à alimentação. Mesmo que inicialmente a fa-mília não aprovasse a decisão, comentários, como “Meu Deus, tanto estudo para virar co-zinheira”, não a abalaram. A chef já havia se dado conta de que esta seria sua profissão. Seu pai, orgulhoso com os resultados, aca-bou tornando-se sócio do empreendimento que funciona no bairro Cerqueira César.

“Você vai ficar chocada com o que eu vou te falar, mas eu não vejo nenhuma di-ficuldade”, afirma Tatiana, sobre o ingresso na profissão. Para ela, o principal empecilho estava relacionado à falta de experiência. Após um estágio de quatro meses com Alex Atala no restaurante Filomena, teve a opor-tunidade de ser assistente na cozinha do Le Chef Rouge, em 1997. Neste período era co-mum Tatiana confundir alguns ingredientes.

Silvia (acima) e Tatiana

(abaixo) não dispensam ajuda com

os utensílios pesados

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cozinha

“A chef Renata Braune falava para eu trazer o tomilho e eu pegava o alecrim”, diverte-se. A experiência foi enriquecedora a ponto de, três anos mais tarde, Tatiana assumir o cargo de chef no restaurante Bazzar, no Rio de Janeiro, liderando a equipe da qual fazia parte no emprego anterior.

Os funcionários, que inicialmente riam de sua inexperiência, aos poucos passaram a respeitá-la. A chef conta que aprendeu ra-pidamente a liderar com o apoio de seus su-bordinados. “Eu cheguei para a equipe e fa-lei: ‘Gente, nunca chefiei. Sei cozinhar, mas não sei chefiar. Então, me ajudem’”, lembra. Essa atitude foi fundamental para a criação de um vínculo com eles. Quanto ao domínio masculino na área gastronômica, Tatiana diz que nunca sofreu preconceito por ser mulher e acredita que hoje o mercado en-contra-se equilibrado entre os sexos.

SEM ORGULHO Os desafios físicos do trabalho não parecem ser um empecilho no dia-a-dia das duas chefs. Elas garantem que não dispensam a ajuda masculina quando precisam fazer algo. “Acho que temos um pouco de dificuldade para carregar peso. Mas, para mim, não há vergonha ou proble-ma em pedir para o funcionário fazer isso. Eu já vi algumas mulheres que querem ser super fortes. Eu não tenho isso, não”, asse-gura a chef Tatiana.

Quando se tornou proprietária do res-taurante dos pais, Silvia sentiu-se motivada a adaptá-lo ao padrão italiano: “No início, a casa era classificada como fast-food. Eu e meu irmão, Lamberto, transformamos o menu a partir de nossas raízes.” No início da sua carreira, viajou para a Itália em busca

de receitas que só profissionais locais con-seguiam executar, como diferentes moldes de corte de massa e molhos artesanais. Ain-da hoje, Silvia retorna todo ano à procura de novidades na culinária italiana.

Apesar das dificuldades diárias, as chefs estão contentes com a posição que ocupam e têm planos para expandir os ne-gócios. “Estou 100% feliz. Adoro de paixão e estou realizada porque consegui montar o Boa. Acho que o sonho de todo chef é ter o próprio restaurante”, comemora Tatiana. “Para fazer um nome, formar uma equipe, uma linha de trabalho, demora alguns anos. Depois de um tempo, você percebe: esse é meu público, meu nicho e minha linguagem. Mas, leva um tempo para se descobrir isso”, destaca Silvia. Segundo ela, pode demorar cinco anos para formar uma equipe confiá-vel e o dobro do tempo para se fixar.

Foi aos poucos que ela aprendeu a con-ciliar sua vida pessoal, inclusive a materni-dade, com a profissional. “Um chef não tra-balha sozinho, a equipe é muito importante porque ele também tem vida pessoal. Quan-do minha filha nasceu, eu já tinha 10 anos de Vinheria, então comecei a vir em horários mais tranqüilos”, constata.

Novas viagens e projetos fazem parte da vida dessas chefs atualmente. As priorida-des da proprietária do Boa Bistrô & Bem-Es-tar são aumentar o movimento do restau-rante, consolidar sua equipe profissional e montar um novo cardápio de comida con-temporânea: “Estou fazendo um cardápio legal para a crítica e para o tipo de cliente que tenho”. Tatiana diz que se interessa e busca referências na culinária oriental, prin-

cipalmente na tailandesa e na vietnamita. A chef da Vinheria Percussi tem planos

de ampliação de seu restaurante e conside-ra fundamental manter-se atualizada sobre novas tendências e linguagens. Até porque, segundo ela, seu público é bastante exigente e só se contenta com uma legítima culinária italiana. “O público que vem aqui gosta da Itália e conhece o país”, ressalta.

AOS NOVOS CHEFS Para os que se atrevem a encarar essa profissão, as chefs concordam que, antes de tudo, é necessário apreciar o ambiente gastronômico como um todo, desde o momento de preparar os pra-tos até o de lidar com o público.

Na opinião de Tatiana, quem deseja se tornar chef precisa de algo além de consul-tar livros de gastronomia, deve estagiar com cozinheiros de diferentes estilos e experiên-cias. “Aprendi 90% do que sei estagiando com os chefs, o resto com a escola FrenchCulinary Institute”, conta. Para ela, o estagi-ário ideal deve demonstrar iniciativa e para avaliá-lo em seu restaurante costuma apli-car um questionário com perguntas sobre os dados e interesses pessoais dos candida-tos, como o tipo de comida que gosta.

Silvia, por sua vez, acredita que algumas coisas são fundamentais para complemen-tar a formação de um chef, como conheci-mento de outros idiomas. “O chef deve ser, no mínimo, bilíngüe, por causa da literatu-ra. No Brasil, temos pouquíssimos livros de gastronomia em português”, afirma. Outro ponto importante, segundo ela, é viajar pelo mundo e, principalmente pelo Brasil, em busca de receitas regionais. “Se você é sol-teiro ainda, faça. Vá viajar!”, sugere.

Tatiana e Silvia afirmam que ter um restaurante é o sonho da maioria dos chefs

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perfil

O empresário Trevisani no restaurante Gero, do qual se tornou sócio em 2008

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REPORTAGEM Carolina giovanelli e Daniela Dolme (2o ano de Jornalismo)IMAGEM rafael De queiroz (3o ano de Jornalismo)

NO TOpOTrevisani começou como ajudante de garçom aos 17 anos. Hoje, é sócio de rogério fasano em um dos restaurantes mais sofisticados de São Paulo

O garoto Ricardo, hoje com 44 anos, não ima-ginava que o gosto por almoços em família, com seus pais Jacyra e Antônio, observan-do e ajudando sua avó italiana a cozinhar nhoque e tortinhas de maçã, o faria se apai-xonar pelo mundo da culinária. “Eu sempre gostei, curtia essa coisa em casa mesmo”. Não demorou muito para que as cenas tão corriqueiras se tornassem um ofício.

Aos 17 anos, enquanto cursava o Ensino Médio, Trevisani arrumou um emprego no restaurante italiano Don Fabrizio, da família Tatini, na Alameda Santos. “Comecei como cumim, como a maioria aqui começa, que é ajudante de garçom”, afirma. Foi nessa épo-ca também que passou por um dos cons-trangimentos de sua carreira: “Derrubei um copo cheio de suco de laranja em um clien-te, graças a Deus, conhecido e amigo, que comentou: ‘Muito obrigado, eu estava mor-rendo de calor’”, lembra o empresário.

Cerca de um ano e meio depois, o ini-ciante quis alçar vôos maiores e decidiu ba-ter na porta do Fasano, o restaurante mais fino de São Paulo já naquela época. “Fui na cara e coragem pedir um emprego”, diz Ri-cardo. “Cheguei lá, bati na porta e me deram a oportunidade”, relembra.

O responsável por contratá-lo foi o se-nhor Viti, gerente do restaurante no começo da década de 1980, que também o apresen-tou à família – ao pai, Fabrizio Fasano, e ao filho, Rogério Fasano, donos do grupo. Não demorou muito para que o esforço e a dedi-cação empregados no serviço destacassem o novo cumim da casa. “Fui conquistando meus espaços, conhecendo o Rogério, e mesmo Seu Fabrizio”, conta Trevisani. “Des-de lá a gente tem um relacionamento muito bacana“. A relação empregado-patrão evo-luiu para uma parceria, tanto na vida profis-sional de Ricardo, quanto na pessoal.

fOra dO país Quando o Fasano fechou para mudar de endereço, Trevisani tomou uma decisão que resultou em um “período maravilhoso” de sua vida: mudou-se para a Itália. Lá ficou por nove anos, onde trabalhou na cozinha de três restaurantes na região de

Verona. Além disso, fez diversos cursos de gastronomia e de vinho. “A Itália foi minha faculdade. Tive a oportunidade de trabalhar com grandes chefs”, explica. Trevisani se re-fere aos italianos Mauro Treccane e Luciano Boseggia, que hoje tem um restaurante no shopping Pátio Higienópolis.

NO cOmaNdO Mesmo fora do país, Ri-cardo manteve contato com a família Fasa-no, e quando voltou da Itália, em 1995, foi convidado para administrar o novo restau-rante da rede, o Gero. O Grupo Fasano ainda era pequeno e Rogério queria expandir seus negócios. Ao mesmo tempo, Ricardo mos-trava cada vez mais competência na área. O circuito foi crescendo, “abriu o Gero Café, a Forneria, o Bareto, e eu participei”, lembra Trevisani. “Sempre chamei a responsabilida-de para essas coisas e tive uma participação muito ativa em todas essas aberturas de ca-sas do grupo”, enfatiza.

Foi no início do Gero que apareceu Ma-nuel Jardim, caixa do restaurante e empre-gado de Ricardo há 14 anos. Para ele é um prazer poder trabalhar com o chefe. “Ele é muito profissional e justo. Quando ele está aqui o trabalho flui. Ele gosta de ser perfei-to, ou pelo menos tentar”, conta Manuel.

Depois de sete anos no comando do Gero, Ricardo abriu dois restaurantes na ci-dade de Riviera de São Lourenço – o Gaiana e o Mare Monti – que servem também comi-da italiana e segundo ele “estão indo muito bem comercialmente”, com um quadro de 120 funcionários ao todo. Sua esposa Már-cia, 49 anos, ajuda na administração no es-critório em São Paulo, e Trevisani está mais presente na cidade litorânea nos feriados, fins de semana e alta temporada.

Entretanto, mesmo cuidando dos pró-prios negócios e de todos os outros empre-endimentos da família Fasano, ele afirma que o Gero é seu “quartel general”. “Saio, faço algumas aberturas de casas, fico fora seis meses, um ano. Já até morei dois anos no Rio de Janeiro. É assim: abre, eu saio, e depois volto pra cá”, conta.

O dia-a-dia de Ricardo é bastante atri-

bulado, pois são muitas responsabilidades e pessoas para liderar. “É pesado, porque eu faço parte da operação e ainda tenho que ficar um pouco no administrativo. É can-sativo, mas a gente tem um time. Tem que trabalhar. E quando você faz com prazer, é tudo lindo!”, garante.

Mesmo com tantos afazeres, segundo Tânia Silva, atual assistente administrativa e empregada de Trevisani há nove anos, ele consegue dar conta do recado muito bem. “Ele chama a nossa atenção de maneira enérgica quando encontra erros, mas não deixa nada de rancor ou mau humor para o dia seguinte”, afirma.

O TraBaLHO cOmpENsa Depois de 20 anos com a família Fasano, Ricardo ganhou o prêmio máximo de reconhecimento por seu trabalho: 20% do restaurante Gero, que completa 15 anos de casa em 2009. “Agora como sócio, só muda no papel, na verdade. Porque o comportamento, a atitude, o pro-fissional, continua como era”, afirma. “Acho que o sucesso é isso, você encarar o negócio como se fosse seu”, orgulha-se.

De cumim a dono de restaurante, Ricar-do Trevisani se sente um vencedor. Para ele, é muito gratificante chegar até esse ponto através de tanto trabalho. Ele ainda tem pla-nos para o futuro, porém nada que inclua abandonar o grupo Fasano e seus negócios. “Eu adoro estar aqui, gosto muito de fazer parte dessa família”, afirma.

Além de ser praticamente um membro da família Fasano, o administrador de res-taurantes também construiu a própria. Atu-almente mora no bairro de Indianópolis, em São Paulo, com sua esposa Márcia, seus dois filhos, Nicolau e Tadeu, de 11 e 9 anos res-pectivamente, e sua cadela maltês Dani.

Por enquanto, os pequenos ainda não vêem o restaurante como uma possibilidade profissional, já que o pai trabalha muito e não tem muito tempo para ficar com eles. “Eles ficam com ciúmes, porque querem o pai junto com eles”, conta o empresário. “Então, isso ainda é uma coisa que eles não enxergam com bons olhos”, acredita.

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arte

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A preocupação com a apresentação de um prato ganhou mais ênfase nas cozinhas com o surgimento da Nouvelle Cuisine francesa, que sucedeu a culinária clássica e previa uma harmonia maior entre o alimento, sua apresentação e a louça usada para servi-lo. Dessa maneira, surgiu um maior cuidado com a decoração do prato.

O chef Fabrice Lenud, dono da pâtisserie Douce France, que fica na Alameda Jaú, não descarta a importância da apresentação do prato, mas acredita que visual e gosto de-vem caminhar juntos. “Não estamos aqui para fazer um showroom, para brilhar, mas para satisfazer o cliente”, explica. Para ele, a estética é fundamental no momento de or-ganizar os doces no balcão, que devem se destacar individualmente. “Tudo deve ser impecável”, afirma. Essa perfeição, segundo ele, é da natureza da confeitaria. E Fabrice se interessou pelos doces justamente por isso. “O que sempre me instigou foi saber como é que as marcas digitais de quem fa-zia não ficavam nos doces”, lembra.

OBRA DE ARTE Com o tempo, outras co-zinhas passaram a adotar este estilo e incre-mentar seus pratos com um quê de obra de arte. Para o chef Píer Paolo Picci, do restau-rante Picci, adaptar a cozinha italiana a esse tipo de apresentação não foi uma tarefa tão difícil. “A cozinha clássica italiana pode ser chamada de pobre por usar poucos ingre-dientes, o pão, o alho o azeite e eles se pre-ocupam muito com o sabor da comida e um pouco menos com a estética. Hoje, isso vem mudando”, explica. Depois de viajar à Itá-lia, Píer esteve na Espanha e diz que a culi-

Para os grandes chefs a estética do prato é parte essencial de uma refeição. Mas sem deixar de lado a importância do sabor

Para o chef Fabrice Lenud, da Pâtisserie Douce France, os doces devem ter uma

aparência simples e natural

REPORTAGEM JULIA ALQUÉRES e PRISCILA ZUINI (3o ano de Jornalismo) IMAGEM RENATA MIWA (2o ano de Publicidade e Propaganda)

beleza se põeà mesa

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ESQUINAS 1º SEMESTRE 2008 11

A preocupação com a apresentação de um prato ganhou mais ênfase nas cozinhas com o surgimento da Nouvelle Cuisine francesa, que sucedeu a culinária clássica e previa uma harmonia maior entre o alimento, sua apresentação e a louça usada para servi-lo. Dessa maneira, surgiu um maior cuidado com a decoração do prato.

O chef Fabrice Lenud, dono da pâtisserie Douce France, que fica na Alameda Jaú, não descarta a importância da apresentação do prato, mas acredita que visual e gosto de-vem caminhar juntos. “Não estamos aqui para fazer um showroom, para brilhar, mas para satisfazer o cliente”, explica. Para ele, a estética é fundamental no momento de or-ganizar os doces no balcão, que devem se destacar individualmente. “Tudo deve ser impecável”, afirma. Essa perfeição, segundo ele, é da natureza da confeitaria. E Fabrice se interessou pelos doces justamente por isso. “O que sempre me instigou foi saber como é que as marcas digitais de quem fa-zia não ficavam nos doces”, lembra.

OBRA DE ARTE Com o tempo, outras co-zinhas passaram a adotar este estilo e incre-mentar seus pratos com um quê de obra de arte. Para o chef Píer Paolo Picci, do restau-rante Picci, adaptar a cozinha italiana a esse tipo de apresentação não foi uma tarefa tão difícil. “A cozinha clássica italiana pode ser chamada de pobre por usar poucos ingre-dientes, o pão, o alho o azeite e eles se pre-ocupam muito com o sabor da comida e um pouco menos com a estética. Hoje, isso vem mudando”, explica. Depois de viajar à Itá-lia, Píer esteve na Espanha e diz que a culi-

Para os grandes chefs a estética do prato é parte essencial de uma refeição. Mas sem deixar de lado a importância do sabor

Para o chef Fabrice Lenud, da Pâtisserie Douce France, os doces devem ter uma

aparência simples e natural

REPORTAGEM JULIA ALQUÉRES e PRISCILA ZUINI (3o ano de Jornalismo) IMAGEM RENATA MIWA (2o ano de Publicidade e Propaganda)

beleza se põeà mesa

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O chef Tsuyoshi Murakami foi eleito o melhor chef do ano pela

revista Veja São Paulo

“Pra mim, o prato é um palco”, diz Tsuyoshi

Murakami, chef do restaurante Kinoshita

nária deste país já tem um cuidado maior com a apresentação dos pratos. “A cozinha espanhola não tem uma bagagem tão gran-de quanto a italiana e a francesa, mas vem crescendo”, conta. “E eles sim se preocupam muito com a técnica de cozimento, a monta-gem e a estética nos pratos”, explica.

Já no Japão, a simplicidade deve reinar na cozinha. São poucas misturas, alimentos preparados de forma simples e saudável. O chef Tsuyoshi Murakami, que comanda o restaurante Kinoshita, diz que aprendeu em sua terra-natal a importância de saber lidar com os alimentos. “Acho que a inspiração vem um pouco do nosso berço, do nosso registro de culinária ou dessa coisa do sen-so estético que a gente tem desde criança”, conta. “Acho que a pessoa tem que ter essa flexibilidade do que você tem no seu berço para você poder se expressar no prato. Para mim, o prato é um palco”, explica.

Eleito o melhor chef do ano pela revista Veja São Paulo, Murakami conta que o con-ceito de seu restaurante, a Kappo Cuisine, depende também da apresentação do pra-to. “A Kappo foi a culinária que influenciou tanto a culinária italiana como a francesa. Principalmente esteticamente, a nova co-zinha francesa foi totalmente japonesa, o senso do simples, do zen, do nada”, explica Murakami. “Eu sempre brinco que se um dia alguém conseguir definir o que é Kappo isso seria mentira, porque isso eu faço o cliente sentir aqui no restaurante”, brinca.

GOSTO E VISUAL Para Píer, a importân-cia da estética faz parte do todo da refeição. “Antes de você comer, você olha o prato e se ele estiver com um aspecto visual muito bonito, você come com muito mais vontade. A sensação olfativa e a visual chegam antes da gustativa e isso é com qualquer coisa”, diz. Murakami lembra que o sabor ainda é o principal em um prato: “Primeiro o gosto, sendo cozinheiro, primeiro para mim, é o gosto. Porque é frustrante você ver um ne-gócio tão bonito e quando você põe na boca, está meio devagar, meio desequilibrado”.

Na culinária japonesa é muito importan-te que o chef esteja em harmonia com aqui-lo que está preparando, Murakami explica que o uso de alimentos frescos e orgânicos dão à comida um toque especial e a partir daí o cozinheiro tem liberdade para criar. “Eu dou o mesmo valor ao processo de ser cozinheiro, hoje as faculdades de gastrono-mia estão lotadas e a galera já sai achando que é assim”, afirma o chef. “Vaidade, ego, narcisismo, preconceito, orgulho. Calma, isso afeta no prato, depois fica aquele prato cheio de informação”, conclui.

Fabrice Le Nude concorda com a idéia de Murakami. “Existe a tendência de colocar o doce como uma jóia, um veludo, um doce só, eu acho que isso é para inflar o ego do chef”, conta o confeiteiro que diz acreditar

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No restaurante japonês Kinoshita, os pratos são

servidos com poucos enfeites. Para o chef, o que

vale é a simplicidade

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O chef Tsuyoshi Murakami foi eleito o melhor chef do ano pela

revista Veja São Paulo

“Pra mim, o prato é um palco”, diz Tsuyoshi

Murakami, chef do restaurante Kinoshita

nária deste país já tem um cuidado maior com a apresentação dos pratos. “A cozinha espanhola não tem uma bagagem tão gran-de quanto a italiana e a francesa, mas vem crescendo”, conta. “E eles sim se preocupam muito com a técnica de cozimento, a monta-gem e a estética nos pratos”, explica.

Já no Japão, a simplicidade deve reinar na cozinha. São poucas misturas, alimentos preparados de forma simples e saudável. O chef Tsuyoshi Murakami, que comanda o restaurante Kinoshita, diz que aprendeu em sua terra-natal a importância de saber lidar com os alimentos. “Acho que a inspiração vem um pouco do nosso berço, do nosso registro de culinária ou dessa coisa do sen-so estético que a gente tem desde criança”, conta. “Acho que a pessoa tem que ter essa flexibilidade do que você tem no seu berço para você poder se expressar no prato. Para mim, o prato é um palco”, explica.

Eleito o melhor chef do ano pela revista Veja São Paulo, Murakami conta que o con-ceito de seu restaurante, a Kappo Cuisine, depende também da apresentação do pra-to. “A Kappo foi a culinária que influenciou tanto a culinária italiana como a francesa. Principalmente esteticamente, a nova co-zinha francesa foi totalmente japonesa, o senso do simples, do zen, do nada”, explica Murakami. “Eu sempre brinco que se um dia alguém conseguir definir o que é Kappo isso seria mentira, porque isso eu faço o cliente sentir aqui no restaurante”, brinca.

GOSTO E VISUAL Para Píer, a importân-cia da estética faz parte do todo da refeição. “Antes de você comer, você olha o prato e se ele estiver com um aspecto visual muito bonito, você come com muito mais vontade. A sensação olfativa e a visual chegam antes da gustativa e isso é com qualquer coisa”, diz. Murakami lembra que o sabor ainda é o principal em um prato: “Primeiro o gosto, sendo cozinheiro, primeiro para mim, é o gosto. Porque é frustrante você ver um ne-gócio tão bonito e quando você põe na boca, está meio devagar, meio desequilibrado”.

Na culinária japonesa é muito importan-te que o chef esteja em harmonia com aqui-lo que está preparando, Murakami explica que o uso de alimentos frescos e orgânicos dão à comida um toque especial e a partir daí o cozinheiro tem liberdade para criar. “Eu dou o mesmo valor ao processo de ser cozinheiro, hoje as faculdades de gastrono-mia estão lotadas e a galera já sai achando que é assim”, afirma o chef. “Vaidade, ego, narcisismo, preconceito, orgulho. Calma, isso afeta no prato, depois fica aquele prato cheio de informação”, conclui.

Fabrice Le Nude concorda com a idéia de Murakami. “Existe a tendência de colocar o doce como uma jóia, um veludo, um doce só, eu acho que isso é para inflar o ego do chef”, conta o confeiteiro que diz acreditar

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Para o chef do restaurante Picci, a estética de um prato pode influenciar no seu sabor

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Para o chef do restaurante Picci, a estética de um prato pode influenciar no seu sabor

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“Se o prato estiver com um aspecto visual

bonito, você come com mais vontade”,

diz Pier Picci, chef do restaurante Picci

Pier acredita que a montagem de um prato exige

concentração e paciência

no “simples, mas bem feito”. Para ele, o que vale é uma aparência limpa e colorida – sem o uso de corantes –, já que a maioria dos do-ces são direcionados às crianças. “No fundo, todos nós somos crianças. E como a confei-taria remete para a infância, tudo tem que ser um jogo”, explica Le Nude.

Nesse sentido, os doces feitos por Fabri-ce apelam para o lado lúdico. Uma de suas criações é o bolo twister, em formato de qua-drado, possui quatro círculos coloridos em sua superfície. O doce foi inspirado no jogo twister, em que um tapete cheio de círculos coloridos é estendido no chão e os partici-pantes devem colocar as mãos e os pés de acordo com a indicação da roleta. “Acho que esse é o espírito da confeitaria”, afirma. “O que me interessa é dar prazer, ver as pesso-as babarem na frente da vitrine, as crianças meladas de chocolate”. Fabrice costuma di-zer que fabrica lembranças e não apenas um produto alimentício, por isso, a aparência é tão importante, para que fique na memória. “Tem que ser engraçado”, conclui.

HORA DE CRIAR O processo de inven-ção de um prato pode exigir meses de um chef. “Mesmo para um prato que já existe eu sempre procuro montar uma ou duas ve-zes antes para ver como fica. Se você tem uma idéia na cabeça você nunca sabe se ela vai dar certo na prática. Mesmo tendo uma base, você precisa experimentar muitas ve-zes para o prato chegar como você imagi-nou”, conta Píer. E alguns nunca dão certo. “Quando eu cheguei no Brasil, eu vi uma foto de um peixe com uma roda em cima e eu tentei fazer com tapioca, mas nunca con-segui. Até hoje eu tento”, diverte-se.

Já o chef do Kinoshita diz que prefere o básico e não costuma inventar muito para enfeitar um prato: “Eu adoro calça jeans com camiseta branca, não penso muito não, é sempre igual. Tem três elementos e um molho, é muito natural, já é muito tempo fazendo isso e vai sem pensar”. Para as ten-tativas de inovação que não saem como o planejado, o chef japonês tem sempre uma carta na manga. “Tem sim o original e o que-rer. Pensar num negócio que eu vi que era uma escultura lá na Pinacoteca e você chega e não consegue, aí você ainda muda o dis-curso e diz que foi o que o artista pensou originalmente, mas não conseguiu na escul-tura, eu consegui aqui”, assegura.

Para o confeiteiro Fabrice, os chefs são artesãos. Fabrice se inspira nas viagens que faz para elaborar os doces. Ele conta que quando passou de avião pela Cordilheira dos Andes e observou aquele “monte branco de neve”, logo teve a idéia de fazer um bolo com aquela cor e formato, assim nasceu o Andina (cremoso de manga com maracujá, envolto por uma mousse de coco). “Talvez sejamos artistas, mas é uma arte menor. É uma arte efêmera”, opina.

divulgação

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REPORTAGEM ANDRÉ DE MELO E PAULO SCHEUER (2° ano de Jornalismo)IMAGEM RAFAEL DE QUEIROZ (3º ano de Jornalismo)

ALI NA ESQUINAALI NA ESQUINAALI NA ESQUINAALI NA ESQUINA

Um salão pouco iluminado. Garrafas de azeites, whiskys, vinhos, latinhas de cerveja, flâmulas de clubes de futebol e fotografias de personalida-des da política nacional, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e a neta de Getúlio Vargas, Celina do Amaral Peixoto. Há de tudo pendurado nas paredes da pizzaria mais antiga de São Paulo. E é nesse ambiente que João Do-nato Neto recebe os clientes da Castelões.

Fundada em 1924, o estabelecimento her-dou o nome da equipe de futebol de várzea que, após as partidas dos fins de semana, fre-qüentava o sobrado no número 126 da rua Jairo Góis, onde até hoje funciona a pizzaria.

Atualmente, a Castelões sobrevive entre o comércio têxtil que expulsou os imigrantes das redondezas e o ruído ensurdecedor das cen-tenas de caminhões que chegam diariamente para abastecer a Zona Cerealista, a poucos quar-teirões dali. “Até os anos setenta mais ou menos, famílias que vieram da Itália ainda moravam aqui, mas o comércio começou a se infiltrar. A divulgação é feita no boca-a-boca. No bairro, não temos muitos clientes”, explica Neto.

Mesmo assim, a casa consegue manter um público fiel. “Já estamos atendendo à quarta ge-ração”, ressalta Neto, com a segurança de quem mantém a fama do local em meio a decadência da região. Walter Mancini, proprietário da rede de restaurantes Famiglia Mancini, comprova a qualidade do local. “A Castelões faz parte da história da minha vida, até hoje é uma casa que remete a minha juventude. Eu acho a pizza de-les única. O convívio com eles alimentou meu sonho de ter uma pizzaria”, afirma.

Filho de Vicente Donato, ex-garçom da casa que se tornou sócio majoritário, João preserva as tradições das pizzas de seu pai: a borda deve ser sempre alta e a massa grossa. Apenas 12 sa-bores estão disponíveis no cardápio. A pizza de mussarela com calabresa, que leva o nome da casa, é uma das mais vendidas. Pizzas doces e bordas recheadas são proibidas.

Nos fins de semana, a pizzaria costuma fi-car lotada, principalmente de famílias, que se encontram para apreciar as massas feitas arte-sanalmente. As reservas devem ser feitas com antecedência e a chance de encontrar fregue-ses de outros bairros, estados ou até mesmo de fora do país é grande. João Donato costuma ressaltar que até os turistas norte-americanos e europeus costumam freqüentar a casa durante suas estadias no Brasil. E adoram, é claro.

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Castelões

No cardápio da Castelões só há espaço para as pizzas tradicionais, como a marguerita e a calabresa

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REPORTAGEM ANDRÉ DE MELO E PAULO SCHEUER (2° ano de Jornalismo)IMAGEM RAFAEL DE QUEIROZ (3º ano de Jornalismo)

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Um salão pouco iluminado. Garrafas de azeites, whiskys, vinhos, latinhas de cerveja, flâmulas de clubes de futebol e fotografias de personalida-des da política nacional, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e a neta de Getúlio Vargas, Celina do Amaral Peixoto. Há de tudo pendurado nas paredes da pizzaria mais antiga de São Paulo. E é nesse ambiente que João Do-nato Neto recebe os clientes da Castelões.

Fundada em 1924, o estabelecimento her-dou o nome da equipe de futebol de várzea que, após as partidas dos fins de semana, fre-qüentava o sobrado no número 126 da rua Jairo Góis, onde até hoje funciona a pizzaria.

Atualmente, a Castelões sobrevive entre o comércio têxtil que expulsou os imigrantes das redondezas e o ruído ensurdecedor das cen-tenas de caminhões que chegam diariamente para abastecer a Zona Cerealista, a poucos quar-teirões dali. “Até os anos setenta mais ou menos, famílias que vieram da Itália ainda moravam aqui, mas o comércio começou a se infiltrar. A divulgação é feita no boca-a-boca. No bairro, não temos muitos clientes”, explica Neto.

Mesmo assim, a casa consegue manter um público fiel. “Já estamos atendendo à quarta ge-ração”, ressalta Neto, com a segurança de quem mantém a fama do local em meio a decadência da região. Walter Mancini, proprietário da rede de restaurantes Famiglia Mancini, comprova a qualidade do local. “A Castelões faz parte da história da minha vida, até hoje é uma casa que remete a minha juventude. Eu acho a pizza de-les única. O convívio com eles alimentou meu sonho de ter uma pizzaria”, afirma.

Filho de Vicente Donato, ex-garçom da casa que se tornou sócio majoritário, João preserva as tradições das pizzas de seu pai: a borda deve ser sempre alta e a massa grossa. Apenas 12 sa-bores estão disponíveis no cardápio. A pizza de mussarela com calabresa, que leva o nome da casa, é uma das mais vendidas. Pizzas doces e bordas recheadas são proibidas.

Nos fins de semana, a pizzaria costuma fi-car lotada, principalmente de famílias, que se encontram para apreciar as massas feitas arte-sanalmente. As reservas devem ser feitas com antecedência e a chance de encontrar fregue-ses de outros bairros, estados ou até mesmo de fora do país é grande. João Donato costuma ressaltar que até os turistas norte-americanos e europeus costumam freqüentar a casa durante suas estadias no Brasil. E adoram, é claro.

66 ESQUINAS 2º SEMESTRE 2008

Castelões

No cardápio da Castelões só há espaço para as pizzas tradicionais, como a marguerita e a calabresa

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Page 68: Revista Esquinas - nº44 - Alimentação

“No Brasil, são jogadas no lixo 39 mil toneladas de comida por dia, quantidade suficiente para alimentar 19 milhões de pessoas com café da manhã, almoço e jantar.”página 11

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