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1 Revista dos Sistemas Agroflorestais-Centro Ecolgico Litoral Norte-PDA/PPG7/MMA- Dezembro de 2003 Revista dos Sistemas Agroflorestais Dom Pedro de Alcntara, dezembro de 2003 Centro Ecológico/Litoral Norte [email protected] telfax (051) 6640220 Dom Pedro de Alcantara, RS Laércio Ramos Meirelles, coordenação Equipe: Ana Luiza Carvalho Barros Meirelles CristianoMotter Nelson Bellé Comitê Gestor do Projeto Organização, texto, edição e Projeto Gráfico: Jorge Luiz Vivan Desenhos e fotos não creditadas: Jorge Luiz Vivan Apoio: Subprograma Projetos Demonstrativos PDA/PPG7/ MMA Vilmar Bock da Luz Ronilda Magnus da Luz Antnio Borges Model Noema de M. L. Model Jorge da Silva Machado Alzira da Rosa Machado Mauri Fernandes Martins Regina Estefem Evaldt Valdeci Steffen Evaldt Zelma Evaldt Sergio Carlos Webber Elena Webber Osmar da Silva Oliveira Ivonete Alves da Silva Malaquias Klen Rosangela da Silva Lopes Maria Helena O. Gomes Jœlio da Silva Roldªo

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1Revista dos Sistemas Agroflorestais-Centro Ecológico Litoral Norte-PDA/PPG7/MMA- Dezembro de 2003

Revista dos SistemasAgroflorestais

Dom Pedro de Alcântara, dezembro de 2003

Centro Ecológico/Litoral [email protected]

telfax (051) 6640220

Dom Pedro de Alcantara, RS

Laércio Ramos Meirelles, coordenaçãoEquipe:

Ana Luiza Carvalho Barros Meirelles

Cristiano Motter

Nelson Bellé

Comitê Gestor do Projeto

Organização, texto, edição e Projeto Gráfico:

Jorge Luiz Vivan

Desenhos e fotos não creditadas:

Jorge Luiz Vivan

Apoio: Subprograma Projetos Demonstrativos PDA/PPG7/M M A

Vilmar Bock da Luz

Ronilda Magnus da Luz

Antônio Borges Model

Noema de M. L. Model

Jorge da Silva Machado

Alzira da Rosa Machado

Mauri Fernandes Martins

Regina Estefem Evaldt

Valdeci Steffen Evaldt

Zelma Evaldt

Sergio Carlos Webber

Elena Webber

Osmar da Silva Oliveira

Ivonete Alves da Silva

Malaquias Klen

Rosangela da Silva Lopes

Maria Helena O. Gomes

Júlio da Silva Roldão

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3Revista dos Sistemas Agroflorestais-Centro Ecológico Litoral Norte-PDA/PPG7/MMA- Dezembro de 2003

SumárioIntrodução .......................................................................................... 4

Parte I................................................................................................. 8Um pouco de história: Agricultores na Mata Atlântica ..................................... 8Os primeiros agricultores .................................................................................. 8Chegam os colonizadores e imigrantes ............................................................... 9O asfalto e a moto-serra chegam à Floresta Atlântica ........................................ 11

Parte II ............................................................................................. 13Trazendo a floresta de volta para a agricultura: sistemas e práticas

agroflorestais no Litoral Norte do RS e Sul de SC ..................................... 13A floresta no quintal ....................................................................................... 13A roça que vira agrofloresta ............................................................................ 20Cercas e estacas-vivas ................................................................................... 20Faixas ou aléias ............................................................................................. 21Quebra-ventos .............................................................................................. 22Faixas de Retenção de Uso Múltiplo .................................................................. 23A floresta em um bananal ............................................................................ 24A floresta nativa na capoeira degradada ............................................................ 29

Parte III ............................................................................................ 34Errando e acertando: 12 dicas para uma propriedade rural agroflorestal ...... 34Lugar certo ................................................................................................... 34As espécies ................................................................................................... 35Os consórcios ................................................................................................ 35Sucessão ...................................................................................................... 36Manejo ......................................................................................................... 37Recursos genéticos ........................................................................................ 37Colheita ........................................................................................................ 38Processamento .............................................................................................. 39Mercado ....................................................................................................... 39

Parte IV............................................................................................. 42Depoimentos ................................................................................................ 42Sistema Agroflorestal na área Indígena em Talamanca, Costa Rica. ............ 42O Contraponto ............................................................................................... 45Horta Agroflorestal ...................................................................................... 46Índia: Agroflorestas num país de um bilhão de habitantes ........................... 48A Agrofloresta do Toninho ............................................................................ 52

Parte V .............................................................................................. 56Sete perguntas e roteiro para estar em dia com o Código Florestal do RS.....561)Posso derrubar capoeira? ............................................................................. 562)O que pode ser feito quando a capoeira ultrapassou este limite? ....................... 563)Posso cortar árvores na mata nativa? ............................................................ 564)Quais são áreas onde não posso fazer um florestamento visando corte raso ? .... 575)Quais são as áreas onde posso fazer um florestamento visando corte raso? ....... 576)Em plantios mistos agroflorestais (introduzidas e nativas) como devo proceder? 587)Quais são os passos para registrar um plantio agroflorestal (misto ou exclusivo)

com nativas? ............................................................................................. 58

Bibliografia Consultada ................................................................................. 60

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Introdução

A proposta de trabalhar com Sistemas Agroflorestaisna Região do Litoral Norte do RS e Sul de SC estevepresente desde os primeiros momentos do trabalho doCentro Ecológico na região. Já em abril de 1991, apartir de um convite feito pela Pastoral Rural, o CentroEcológico assessorou um curso no interior de Tôrressobre Agricultura Ecológica. Boa parte desta atividadefoi desenvolvida resgatando as práticas que serealizavam nos bananais antes do advento das�modernas� tecnologias do agrotóxico e dos adubosquímicos.

Este resgate demonstrou uma forte presença docomponente arbóreo nos bananais antigos, onde asvariedades tradicionais de porte alto conviviam comárvores selecionadas no desbaste da mata. Nestemesmo curso foi trabalhado a forma como oshabitantes originais desta região (indígenas) serelacionavam com a natureza e obtinham seusrecursos e alimentos, levando os agricultores eagricultoras a refletirem sobre suas próprias práticas.

Desde então se formaram na região dezenas degrupos de Agricultores Ecologistas, a maioria delestendo a banana como seu cultivo principal empequenas propriedades. A proposta técnica de

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Centro Ecológico/Litoral NorteSubprograma Projetos Demonstrativos PDA/PPG7/MMA

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intervenção nestes bananais foi deuma ecologização progressiva destesespaços, no sentido de que o manejopermitisse não apenas a progressivarecuperação da capacidade produtivados bananais, mas também deelementos da paisagem nativa, o quepassou a se viabilizar pelos SistemasAgroflorestais.

Nesta trajetória o Centro Ecológicocontou com a apoio de várioscolaboradores, os quais propiciaram

as condições materiais para que este trabalho dedivulgação, capacitação e mesmo fomento se fizessepossível. Dentre estes, contamos com um decisivoapoio do PD/A (Projeto Demonstrativo, categoria A),um dos componente do PPG7, Programa de Proteçãodas Florestas Tropicais do Ministério do Meio Ambiente.

Este projeto permitiu o acompanhamento técnico aosagricultores da região, não apenas dentro das mais de150 famílias de agricultores ecologistas, masalcançando outros agricultores que buscavamalternativas. Além de financiar insumos e atividades decapacitação e intercâmbio, o projeto propiciou umavanço significativo no número de agricultores quepassaram então a manejar seus bananais com técnicasde cobertura de solo, consórcios e aumento dediversidade, na perspectiva dos SistemasAgroflorestais.

Passado alguns anos já é possível visualizar avançossignificativos no manejo destes bananais. Onde antesse via uma monocultura de banana com o solodescoberto, hoje vemos bananais consorciados compalmito, dezenas de árvores nativas e o solo cobertocom adubos verdes das mais diferentes espécies. Alémdisso, re recupera e consolida um conhecimento emanejo mais refinado da regeneração de árvores e

ervas espontâneas que ocorrem noambiente da Mata Atlântica.

As conseqüências não se encerramapenas nas óbvias vantagensambientais. Passam também pelaprópria concepção de geração edifusão do conhecimento. Agora, osagricultores não apenas aplicamtecnologias geradas à revelia de seussaberes, mas são atoresfundamentais, onde seus

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conhecimentos, acumuladospor gerações, jogam um papelimportante no redesenho deseus agroecossistemas.

Esta transição se estendetambém à vantagensfinanceiras. Além daoportunidade de acessar ummercado diferenciado para osfrutos deste manejo, aincorporação de outrasespécies diversifica fontes derenda e estabiliza ingressos,agora não mais dependentes de uma única espécie. Osexemplos neste sentido vão desde espéciesintroduzidas de frutíferas, até o aproveitamento dopotencial das espécies nativas dentro de um novocontexto, como é o caso da extração de polpa dasfrutas do palmito juçara (Euterpe edulis Martius).

No sentido de potencializar a capacidade administrativados beneficiários do projeto e, no processo, enriquecera experiência como um todo, a gestão do projeto PDAque realizamos no Litoral Norte do Rio Grande do Sulcolocou os beneficiários como protagonistas,capacitando-os para a gestão de futuros projetos.

A materialização desta iniciativa foi a formação docomitê gestor do PDA. Este comitê, formado por umrepresentantes de cada grupo de agricultoresintegrados ao projeto, foi eleito pelos própriosagricultores. Em reuniões bimestrais os agricultores eagricultoras eleitas se encontraram para, dentro doslimites já estabelecidos, propor atividades, definirprioridades para aplicação de recursos, delegar tarefas,como compras de insumos ou representação dotrabalho, e avaliar o projeto em andamento.

Percebemos que estamos em um momento crucial natarefa de difundir e fomentar o Manejo Agroflorestalem nossa região. De um lado, cresce a pressãoeconômica sobre os fragmentos florestais aindaexistentes nas propriedades, visando suatransformação em área de bananal ou outras formasde uso.

Por outro lado, os enormes potenciais (a maior parteainda não realizados) da região começam a mostrarsua capacidade de reverter esta tendência: a força dosmercados locais e a demanda pelos produtos

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agroflorestais, como frutas frescas, polpas, plantasornamentais, medicinais e produtos olerícolas. Aliandoos produtos florestais não-madeiráveis à agroindústriade base local e ao ecoturismo, temos motivo paraacreditar que existe um outro caminho que não o deum anatagonismo entre o agricultor e a Mata Atlântica.

Uma das tarefas previstas neste projeto era aelaboração de uma revista, e é também através delaque se espera estimular técnicos e agricultores aconstruírem estes caminhos. Aqui são expostos algunsprincípios básicos que orientam práticas e sistemasagroflorestais, utilizando tanto exemplos locais comonacionais e internacionais, além de depoimentos deagricultores e técnicos.

Estes agricultores conseguiram gerar sistemasagroflorestais (SAF) bastante complexos ediversificados, numa síntese de seus saberes e do quefoi apropriado no processo do projeto. São estastécnicas e itinerários que estão relatadas aqui e queestão presentes, em diferentes medidas, em todas aspropriedades que assessoramos.

A revista inclui aspectos da legislação que orienta edisciplina este tipo de atividade, e quais osinstrumentos legais que devem ser utilizados. Para

isso, incluímos um anexo com osprincipais documentos que devem serprovidenciados para a execução dealgumas das atividades de implantaçãoe manejo de SAF.

Finalmente, desejamos que esta revistaseja uma janela de possibilidades paraas pessoas que vivem e desejamcontinuar vivendo neste pequenopedaço de paraíso terrestre, que é aMata Atlântica. Que esta revista sejauma pequena �janela agroflorestal�, poronde se enxergue não apenas opresente e futuro do agricultor e desuas necessidades, mas ambém aagricultura como opção e parte da Vidacomo um todo.

Laércio Meirelles, dezembro de 2003

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Parte IUm pouco de história:Agricultores na Mata Atlântica

Os primeiros agricultores

Quando um agricultor colhe produtos agrícolas noLitoral Norte do RS, o que ele vê é uma grandevariedade de espécies de plantas. O que muitos de nósnão sabe, entretanto, é que a maioria delas foramdomesticadas e eram cultivadas pelos habitantesindígenas do Brasil, entre eles os tupi-guarani, há maisde 1500 anos.

Além disso, muitas outras espécies foram trazidaspelos portugueses da Ásia, da África e das ilhas doOceano Índico e Oceania. Este lugares são chamadosCentros de Origem, que é o conceito que se usa para olugar onde mais se encontram parentes silvestres deuma determinada espécie que ali foi cultivada pelaprimeira vez. Alguns centros de origem de plantascultivadas são:

-A Índia e o Sudeste da Ásia, Polinésia e Melanésia,onde se acham parentes silvestres da banana, cana-de-açúcar, arroz, manga, côco, citrus;

-No Brasil, América do Sul e Central, onde temos amandioca, batata-doce, pimenta (Solanum) epimentões, feijões, batata (região dos Andes), fumo,abóbora, algodão, mamão, milho, inhames, abacaxi,goiaba, amendoim.

-Na África: café, inhames, milheto.

A informação que nos falta para apreciar ainda mais oque vemos é a sua verdadeira origem. Os povosindígenas brasileiros domesticaram grande parte destasespécies que hoje cultivamos. Além do mais, forameles que ensinaram os primeiros portugueses aprocessar a mandioca para tirar seu veneno, comoplantar milho, feijão, abóbora, pimenta, mamão eoutras árvores frutíferas em consórcio em roças.Ensinaram também quais eram as frutas da mata quepoderiam ser comidas, quais eram as melhores

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madeiras para cada uso, onde achar o mel das abelhassem ferrão, quais plantas eram remédios e quaisdavam as melhores fibras, corantes, resinas.

Os guaranis nos deram a tradicional erva-mate e seumétodo de processamento. A técnica de o plantio degrãos, usando um instrumento de madeira com pontaendurecida no fogo é de origem indígena, e foi a�plantadeira� oficial dos imigrantes por muito tempo,antes que estes tivessem acesso à enxadas de aço.

O próprio melhoramento do milho, da batata, damandioca e de outras espécies foi feito pelos povosindígenas (e continua sendo feito onde esteconhecimento não se perdeu). Nas suas antigasregiões de domínio, foram eles que provavelmentedeixaram concentrações de �palmares� de butiá noscampos arenosos da fronteira sul e litoral sul, asconcentrações de castanhais na Amazônia, pequizais epalmares de macaúba no Xingú.

Uma pequena parte desse saber segue hojetransmitido entre as diferentes gerações de imigrantese sobreviventes indígenas. Entretanto, grande parte jáfoi perdido na dominação e massacre à que foramsubmetidos estes povos, desde que suas terras foramtomadas nos últimos 500 anos. Seus saberes e modode vida foram considerados �atrasados� e assimrelegados ao esquecimento e abandono.

Entretanto, sem o � atrasado� saber indígena, osimigrantes europeus que chegaram com suas plantasque eram nativas das regiões temperadas (como trigo,cevada, aveia, beterraba, uva, linho) teriam perecidode fome neste � Novo Mundo�. Por isso, não apenas énosso dever reconhecer a origem deste legado desaber indígena, mas também recuperar e valorizar ossaberes dos primeiros agricultores brasileiros, eentender e apoiar a luta dos povos nativos do país quenos adotou e que nos sustentou nos últimos 500anos.

Chegam os colonizadores eimigrantes

No século XVIII, na década de 1770, face aos conflitoscom os espanhóis, os portugueses construíram umfortim no atual Morro do Farol, em Torres, RS.Imigrantes portugueses provenientes da Ilha dosAçores foram atraídos para a área, após o final dos

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conflitos. Já no século XIX, m0ais precisamente em1826, os imigrantes alemães chegaram ao sul do Brasile instalaram-se, entre outras regiões do estado, naárea que hoje constitui o município de D. Pedro deAlcântara, seguidos por italianos provenientes deCaxias do Sul, por volta de 1880. Os indígenas jáhaviam se refugiado mais para o interior, nas florestasde pé-de-monte e vertentes da Serra Geral.Entretanto, contatos e conflitos com os indígenas aindaaconteciam, segundo os relatos da época.

Esta história, onde se misturam os saberes doscolonizadores, imigrantes e dos povos indígenas, podeser vista nas plantas que habitam ainda hoje os quintaistradicionais da região. Neles, encontramos no estratomais baixo o mangarito, a taioba, o abacaxi e o ananássilvestre, e a pimenta (todos indígenas).

Temperos e medicinais também aparecem, tantonativos (cipó-mil-homem, erva-de-são-joão) como deorigem européia (camomila, manjerona, tanchagem).Depois, no estrato arbustivo e intermediário, vem ocafé, a banana, os citrus (introduzidos), a goiaba, ajaboticaba, o mamão, o palmito (nativos).

No estrato superior, vem as árvores nativas (cedro,crindiúva, camboatá-vermelho, ingá), árvores de frutade porte alto, como a fruta-do-conde, o abacateiro (daAmérica Central e México). A nogueira (Aleuritesmollucana) aparece muitas vezes, herança dos quintaisdos açorianos, que a utilizavam como fonte de óleopara sabão e iluminação.

Subindo como cipós nas árvores ainda tem o cará-moela e o maracujá (indígenas). Cada família herda dageração anterior algumas espécies, e assim oconsórcio de espécies que vemos nos quintais contaum pouco da história das inúmeras gerações que jápassaram por aquele lugar.

A cada quintal que é destruído para dar lugar à grama-de-jardim ou árvores exóticas, uma parte da história,da biodiversidade nativa e da biodiversidade agrícola seperde, junto com o conhecimento ligado à elas. É oque se chama de �erosão genética e cultural�.

Por isto mesmo é que juntar os saberes da antigaagricultura dos indígenas e dos imigrantes com amoderna agricultura de base ecológica é tãoimportante. Esta é a base para ser entendida e

Abaixo, diversidade em umbananal manejado como sistemaagroflorestal. Ao explorarespécies com diferentes estratose tipos de enraizamento, o efeitode estabilização do solo seacentua.

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aperfeiçoada quando falamos de sistemasagroflorestais sustentáveis. Esta sustentabilidade, que éeconômica, ambiental e cultural, é uma preocupaçãodesta �nova forma de fazer agricultura�.

O asfalto e a moto-serra chegam àFloresta Atlântica

A Floresta Atlântica foi manejada e utilizada nestaregião meridional desde 1500 anos atrás (antes deCabral e dos portugueses) até o final dos anos 1940. Oacesso precário fazia com que apenas produtoscultivados em roças de derrubada e queima, deproporções relativamente reduzidas, e que erampassíveis de conservação (mandioca, cachaça,madeira, boi vivo) fossem comercializáveis. Quando oasfalto chegou na década de 1950, ligando a região aPorto Alegre e São Paulo pelo litoral, trouxe junto aenergia elétrica e a transformação de pequenas vilas depescadores em cidades-balneários.

Toda a lógica de mercado entrou com força na região,mudando a agicultura. Bananais cobriram as encostas esubstituíram parte dos canaviais, enquanto o arroz e ogado ocuparam as várzeas. Ao mesmo tempo vieramos agrotóxicos e os adubos químicos, e com asderrubadas e capinas, a exposição do solo nasencostas em maior escala. Grandes enxurradas(cabeças d�água), que vinham originadas das encostasdesmatadas da Serra Geral, levaram povoados inteirose ceifaram vidas humanas num passado recente.

Enquanto que de 1500 a 1940 apenas 4,62% dacobertura florestal do Estado do RS havia sido perdida,entre 1940 e 2000 a floresta foi devoradarapidamente, e em 1995 restavam apenas 6,7% detoda a cobertura florestal original do Estado do RS. Foielaborada então nos anos 80 a primeira lei que reguloua intervenção humana no domínio da Floresta Atlântica,e ela foi declarada Patrimônio da Humanidade em1988.

No dias de hoje, enquanto os preços de insumoscontinuam subindo e os preços dos produtos agrícolasestabilizam ou são rebaixados, os agricultores sãoforçados a abrirem mais área de lavoura. O espaço queainda resta são áreas em estado de regeneração comocapoeiras e capoeirões, muito frequentementeocupando encostas de alto declive.

Acima, deslizamento embananal, muncípio deMorrinhos do Sul, RS. Arestrição para cultivos emdeclives acentuados não éuma invenção arbitrária delegisladores ambientais. Pelocontrário, cultivar encostas,mesmo com cultivos perenes,exige um profundoconhecimento ecológico paracompor sistemas complexosque estabilizem o solo eevitem desastres ambientaise econômicos.

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As leis ambientais, por sua vez, tentam proteger o querestou de áreas ainda preservadas. Porém, sem umapolítica de extensão rural florestal e agroflorestal ou deformação de técnicos e agricultores que estimule estetipo de uso da terra, as ameaças e os problemas irãocontinuar e, inclusive, se agravar.

Entre eles, a extração ilegal de palmito, que em algunsestados é feita numa padrão de crime organizado, comcortadores de plamito armados e �teritórios�disputados entre os grupos. A introdução desta espécieem SAF, e o uso da fruta para a extração de polpasimilar ao popular �açaí� do Norte acenam comopossibilidades de conservação de matrizes, já que apalmeira passa a interessar como frutífera, e não maisapenas como fonte de palmito. Esta possibilidade jáestá em construção no âmbito deste projeto, além deiniciativas em SP, PR, SC e RS.

As madeiras nobres continuam desaparecendo dosraros remanescentes de Mata Atlântica onde elas aindaexistem. Isto faz com que sejam cada vez mais rarasas matrizes de boa qualidade de espécies como, porexemplo, o louro (Cordia trichotoma) e o cedro(Cedrela odorata). Isto trará consequências trágicaspara a exploração deste recurso dentro de SAF, emesmo em florestas naturais manejadas.

Sem muita informação e espremidos pela criseeconômica, muitos agricultores se revoltam contra asleis ambientais, sem se dar conta de todos os fatoresque o estão empurrando para este conflito. Naverdade, ele luta contra um ecossistema riquíssimoque, manejado adequadamente, traria prosperidadeeconômica e equilíbrio ambiental. Apesar de umarelativa oferta de crédito para implementação de SAF, aassistência técnica oficial, em termos gerais, não temmostrado interesse em promover uma formaçãoespecífica nem priorizar o tema em suas estratégias.Mesmo as organizações não governamentaisdedicadas ao tema tem dificuldades para expandir emescala regional técnicas e sistemas agroflorestais, namedida em que recursos, pessoal e mesmo aatualização técnica é deficiente.

É justamente neste �olho de furacão� de conflitosocial, econômico e ambiental, e dentro destescondicionantes que os sistemas agroflorestaisaparecem hoje como uma das estratégiaspara o desenvolvimento sustentávelda agricultura no ecossistemaMata Atlântica.

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Parte II

Trazendo a floresta de voltapara a agricultura: sistemas epráticas agroflorestais noLitoral Norte do RS e Sul de SC�Eu queria morar na mata, mas a mata era longe. Aíresolvi trazer a mata para perto de casa, e instalei aquiminha agrofloresta�.

Eliseu Silva Spielo, ACEVAM, Mampituba, SC.

A floresta no quintal

Os quintais tem sido, durante milênios, o eixo dasegurança alimentar e �poupança� em tempos de crisedas famílias rurais. Eles fornecem verduras, pequenosanimais domésticos, frutas e carbohidratos, e é delesque vem boa parte das vitaminas, sais minerais e partedas necessidades de proteína e amido consumidaspelas famílias rurais mais isoladas.

O quintal também funciona como uma espécie de�maternidade� de adaptação de espécies. O agricultorou agricultora traz espécies nativas ou mesmo obtidasde outras famílias, observando e testando a planta poralgum tempo. Mais tarde, se aprovadas em suascaracterísticas para plantio, serão os quintais asprimeiras fontes de material reprodutivo para o cultivo.

Também são os quintais agroflorestais uma espécie depoupança de emergência e fonte de renda suplementar,t a n t o através de plantas como animais domésticos

que podem ser comercializados in naturaou processados. Esta é uma

estratégia global daagricultura tradicional.Embora seja maisconhecida e estudada naAmérica Central e Ásia,onde as origens destessistemas remonta hámilhares de anos, elapode ser observadainclusive nos quintais daregião de Torres.

Representação das analogiasestruturais entre a vegetaçãonatural e um sistemaagroflorestal do sul bahiano.Adaptado de Vivan(1998).

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Quando escolhemos o local do quintal, temos queobservar a orientação solar, a umidade e o tipo de soloque vamos utilizar. Todas as espécies tem suascaracterísticas de tamanho e hábitos, como perderfolhas no inverno, brotar cedo ou tarde, aguentarpodas, atrair pássaros, serem altas e retas, oupequenas e abertas.

Cada espécie também tem suas preferências deumidade, luz, calor e nutrientes. Para aproveitar opotencial de cada planta, é fundamental conhecer bemcada uma delas e suas características, afim de fazer ascombinações corretas de plantas e do espçao e tempoque elas irão ocupar no quintal agroflorestal.

Radiação (luz e calor)

a) Áreas ensolaradas, irão imitar clareiras. Nelas,entram espécies que gostam de muita luz, comofolhosas no inverno, hortaliças de origem européia,feijões, temperos e medicinais, ornamentais e

Um quintal agroflorestal iráapresentar alguns componentescaracterísticos, tais como: cercasvivas(1) que podem ser podadas(2)e que tenham múltiplasutilidades, como tutorar plantastrepadoras e fertilizar o solo(3). Aárea mais ensolorada irá abrigarconsórcios de cultivos anuais(4), eas áreas mais sombreadas cultivostolerantes à esta condição(5). Áreasmais úmidas serão utilizadas paraespécies anuais e perenes quenecessitam destes ambientes(6),enquanto outras irão preferir asbordas mais ensolaradas edrenadas(7) ou sombreadas(8).Toda a drenagem deve ser dirigidapara um tanque(10), onde plantasaquáticas(9) farão a filtragem,reduzindo a perda de nutrientes dosistema e a conseqüentecontaminação que ela acarreta.

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forrageiras para pequenos animais, além de frutíferasde pequeno porte, como a goiaba. Este é o espaçotambém para algumas espécies de hábito trepador,como feijões e maracujá, este último podendo sertreinado para subir em árvores maiores.

b)Áreas de sombra rala, ou abertas pela podacriteriosa das árvores dominantes. Aqui entramespécies do estrato intermediário ou de portearbustivo, com as mais diversas utilidades, comoárvores e arbustos frutíferos (como o café) epalmeiras. Algumas ornamentais, da família das epífitas(bromélias e orquídeas), das pteridófitas(samambaias), helicônias (caités), e musáceas(bananeiras ornamentais) encontram aí seu lugarcerto.

c)Áreas de sombra intensa, abaixo das grandesárvores, são adequadas a um número menor mas nãomais importante de espécies, a maior parte delasornamentais ou medicinais. A trança-de-cigano e acapeba são duas delas.

Fertilidade

Um quintal pode ser surpreendentemente diverso emtermos de fertilidade do solo. Cabe à quem o manejaidentificar estas diferenças e colocar as plantas nosseus tipos de solo preferido. As fontes de nutrientespara o solo do quintal são:

a) Localmente produzido. Grandes árvoresrepresentam um aporte importante de folhas e outros

Na imagem ao lado, uma habitação�mimetizada� junto à paisagem doTrópico Úmido através de um típicoQuintal Agroflorestal. A casa foiinstalada num pasto, na borda deuma floresta. O quintal reconstituiua estrutura da floresta, porém comuma composição de espécies emvários estratos que cumprefunções de uso humano direto eindireto, como sombra(confortoclimático), alimentação, lenha,medicinais, temperos, entreoutras. Região de Golfito, CostaRica.

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materiais orgânicos. Resíduos de poda de cercas vivas,árvores fertilizadoras e ervas espontâneas ouintroduzidas com este fim são outra fonte importante.Elas podem ser usadas diretamente como cobertura desolo para frutíferas, ou então adicionadas à outrosresíduos de cozinha para compostagem evermicompostagem, visando cultivos de ciclo curto,como hortaliças e grãos.

b)Via animais transformadores. Uma criação deanimais domésticos de pequeno porte (coelhos,galinhas, gansos, marrecos, porquinhos-da-Índia e atémesmo porcos) recicla parte dos resíduos domésticose outros produtos não aproveitáveis diretamente pelosseres humanos, os quais eles consomem e que vem defora dos quintais. Além de serem convertidos emproteínas pelos animais domésticos, os dejetos destesserão depois transformados por insetos, minhocas,fermentos e bactérias, os quais ajudarão no processode compostagem.

Criações domésticas bem manejadas não irão produzirnem moscas nem cheiro. O segredo é entender que acombinação certa de luz e calor, umidade e nutrientestambém funciona para a decomposição de resíduosorgânicos. No caso, a ausência ou excesso deradiação, umidade ou nutrientes pode reduzir avelocidade de decomposição e provocar acúmulo deresíduos não transformados, dando oportunidade paratransformadores não desejados, como ratos, moscas,baratas e outros.

Para que um sistema de criação em pequeno espaçofuncione, se deve buscar o máximo de informaçãosobre a espécie e suas demandas e hábitos sociais.Uma vez que os animais tenham à sua disposição luz,alimento e abrigo adequados, bem como espaço paraexprimir seus hábitos comportamentais (ciscar, seexercitar, tomar sol, cavar, tomar banho de areia, barroou água, construir ninhos), as doenças serão raras e aprodução será otimizada.

Outro ponto importante é identificar espécies perenesque possam servir de alimento para a criação, e que seincorporem ao sistema, seja como cerca viva, estratoarbustivo ou mesmo dominante. O princípio básico éque os animais domésticos devem complementar enão competir por espaço ou alimentos cultivados comos seres humanos. Animais felizes e bem alimentadosserão motivo de orgulho para quem os maneja e fontede saúde e alegria para a família.

Acima, plantio de tinhorão emquintal agroflorestal, Dom Pedrode Alcântara, RS. Abaixo, sistemaintensivo que consorcia citrus,ingá, pithaya (Echinocereusconglomeratus) utilizandogliricídia (Gliricidia sepium) comoestaca viva, e galinhas para omanejo das ervas e insetos.Ticuantepe, Nicarágua.

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c)Via aportes externos. Trazer matéria orgânica deuma fonte externa pode ser necessário, mas não podeser a única fonte de fertilizantes para o quintal. Paraotimizar o uso de esterco comprado ou de outromaterial orgânico trazido de fora, pode-se prepararfertilizantes líquidos ou incorporar este material aoprocesso de compostagem. Minhocas evermicompostagem também são uma técnica preciosaneste sentido.

Outro material importante são as cinzas. Entretanto, épreciso ter muito cuidado com duas coisas: (1)usarpouco e então com maior frequência; e (2)conhecer aorigem, porque a queima de plásticos, jornais erevistas resulta em cinzas contaminadas por produtosde alta periculosidade, como metais pesados edioxinas.

Umidade

O quintal pode ser identificado e dividido em zonas:

a)De alta umidade e exposição solar. Nestesespaços, pode ser instalado um pequeno tanque paraplantas aquáticas. Ele pode ser o destino final dosistema de tratamento dos efluentes domésticos,depois de passar pelo tanque séptico e por uma vala detratamento com raízes. Além de ser um importanterefúgio de espécies, pode produzir em suas bordasalimentos (frutas) e ornamentais, além de ser o filtrobiológico final da água utilizada e préviamente tratadaem fossa séptica pela habitação, antes de que elaretorne à natureza.

b)De umidade constante. Uma vala de infiltraçãopara tratamento de esgoto doméstico é um espaçoartificial com esta característica. Outro ponto assim éonde correm águas de chuva ou se acumula umidade(sem ser encharcado). Algumas espécies, como abananeira, se beneficiam desta condição de umidadeconstante. Gramíneas de crescimento rápido tambémpodem ser usadas, pois irão produzir grande biomassa,que pode ser dirigida para cobertura do solo ou paraalimentar animais.

c)Áreas secas e ensolaradas. Uma vez que sepossa irrigar e adubar com facilidade, estas zonaspoderão receber toda sorte de hortaliças introduzidas.Caso contrário, existem plantas mais adaptadas àpouca água, como os cactus que produzem frutos

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comestíveis (como tuna ou figo-da-índia, Opuntia sp.).Assim, seja em regiões de clima seco ou em pontosdistantes da irrigação, espécies adaptadas (cactáceas eárvores) poderão ser alí instaladas, ao invés de hortasque consomem água e mão-de-obra para irrigar.Prevendo os períodos muito quentes, é interessanteplantar espécies como o guandú, de porte arbustivo,que irão fazer um pouco de sombra e permitir quealgumas espécies sensíveis ao sol ainda possam sercolhidas em parte do verão.Um quintal agroflorestalfuncional é assim o fruto de um aprimoramentocontínuo de quem o maneja, no sentido de:

-conhecer o terreno;-conhecer espécies (vegetais e animais);-conhecer os ciclos climáticos, de modo a ajustarpodas e plantios;-conhecer a sucessão e os consórcios, de modo asempre encontrar um lugar adequado para cada plantaou consórcio, ou para criar o espaço sem ter que

Numa visão geral de umapropriedade, podemos identificardiferentes maneiras de comoespécies perenes e arbóreo-arbustivas irão se integrar aoagroecossistema. Esta integraçãose dará desde o nível do entornoda casa (quintal) até as áreas defloresta nativa. Pastos para animaise aves são divididos por cercasvivas que servem como abrigo,alimento e sombra, além decorredores naturais, e o mesmosistema cerca a propriedade.

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remover espécies e comprometer o funcionamento dotodo.-experimentar e observar o comportamento dasespécies cultivadas e nativas.

Um quintal é um microcosmos onde a família eprincipalmente as crianças irão ter seus primeiroscontatos com o ambiente natural. É nele que terão suaprimeiras lições de reciclagem, de convívio e respeitopara com a flora e fauna nativas, de respeito para coma água e os alimentos que se colhem, e com amaravilha que os ciclos da Vida nos presenteiam. Não éà toa que grandes figuras da humanidade tiveram seusmomentos de iluminação embaixo de árvores, e queos quintais estejam tão presentes na memória deescritores e de todos nós. Se na Ásia os quintaisfamiliares eram sagrados, podemos pensar que, numasociedade como a nossa, que cada vez mais se afastada grande teia da vida que a nutre, eles nunca foramtão necessários.

Pomares e cultivos anuais sãoconsorciados, sucedidos ouprotegidos por vegetação nativaou implantada, e existe umatransição suave e corredoresentre as áreas de agricultura e aas áreas naturais de conservaçãoe preservação.

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A roça que vira agrofloresta

O conceito de Sistemas Agroflorestais é bastanteamplo, e a integração de árvores e arbustos emsistemas agrícolas pode ter como resultado umsistema bastante complexo e diversificado, ou bemmais simples. O que irá definir esta complexidade ousimplificação está não apenas no saber do agricultor eda informação que ele acumula, mas em uma série defatores. Por exemplo:

-Sistemas bastante complexos e diversificados,embora desejáveis, podem ser difíceis de manejarquando se conhece pouco sobre as espécies ou não setem mão de obra suficiente (tanto em saber fazercomo em tempo).

-Sistemas muito simplificados podem não sersustentáveis, permitindo que o solo sofra erosão, queervas indesejáveis cresçam no espaço aberto, ou queas plantas sejam mais sucetíveis à doenças e insetos,além de produzirem menos possibilidades de consumoou venda de produtos. Assim, a diversidade de umSistema Agroflorestal deve ser produto de muitodiálogo e informação, o que poderá mais facilmenteresultar em modelos apropriados. Neste sentido,podemos falar de várias técnicas agroflorestais que,combinadas, podem enriquecer em muito áreas quesão geralmente reservadas apenas para plantiosanuais, como mandioca, milho, feijão e outros cultivos.

Cercas e estacas-vivas

Altamente difundidas na América Central e Ásia, elasaparecem em poucas regiões do Brasil. Algumasregiões tem exemplos interessantes, onde são usados,por exemplo:

-ananás-do-mato (Bromeliaceae) separando potreiros;-moirões vivos de plátano (Acer sp.) que suportamparreirais no Sul;-dracena, Pau-de-macaco, Malvaviscus e Ora-Pro-Nobis (Pereskia sp.) no Sul e Sudeste;-palma (Cactaceae), sabiá, mulungú (Erytrinamulungú), aveloz e sisal no Nordeste semi-árido.-eritrina e gliricídia no sul da Bahia e regiões daAmazônia.

A lista é imensa, e cada agricultor pode fazer suaprópria lista de espécies locais que podem ser usadassozinhas ou em combinações para surtir o efeitodesejado. Estas espécies irão substituir os postes e

Na página oposta, o ananás-do-mato (Ananas sp.), umparente selvagem do abacaxi enativo da Mata Atlântica, usadocomo cerca-viva. Acima, sabiá(Mimosa sp.), e abaixo gliricída.

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estacas que delimitam áreas residenciais, de pastoreio,hortas ou cultivos, eventualmente suportando arames.

As cercas-vivas podem transformar-se em estacas-vivas, servindo como tutor para espécies trepadorasperenes ou anuais, diminuindo os custos deimplantação deste tipo de sistema. Algumascaracterísticas desejáveis em espécies selecionadaspara este fim são:

-propagação por estacas de pequeno e grande porte;-grande capacidade de rebrote após podação;-folhas comestíveis para o gado ou de baixa relação C/N, de modo a poder ser usada como fertilizadora;-madeira fácil de cortar;-resistência à insetos e doenças.

Faixas ou aléias

São geralmente compostas por espécies de portearbustivo ou intermediário, plantadas em altadensidade em faixas num campo de cultivo. O objetivopode ser mais simples ou mais complexo, ou menosamplo. Por exemplo:

-fertilizar o solo através de podas regulares;-fornecer forragem para animais e depois retornar oesterco;reter o solo em encostas e aumentar a infiltração;-até constituir uma fonte de utilidades múltiplas,inclusive como corredores da vida silvestre.

As aléias podem ser, portanto, diversificadas ou de umaúnica espécie. Algumas das características desejadaspara espécies a serem usadas em aléias simples:

-crescimento rápido ou propagação fácil por sementes,estacas ou mudas;-bom potencial de rebrote após podação;-fixadora de nitrogênio ou de alta associação commicorrizas;-raízes profundas;-folhas de baixa relação C/N, de modo a servir comofertilizadora para espécies de ciclo anual.

É claro que quanto mais diversificada a aléia, mais elairá cumprir funções ecológicas e fornecer produtosalternativos. É comum que aléias em quintaisagroflorestais sejam extremamente diversificadas,enquanto aléias em áreas de cultivo mais extensivo,como culturas anuais, sejam mais simples.

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Quebra-ventos

Assim como as aléias, os quebra-ventos podem ter asmais variadas composições, além de usos múltiplos.Fornecer uma barreira física encabeça a lista decaracterísticas desejáveis às espécies que irão comporum quebra-vento. Porém, é necessário ter em menteque um quebra-vento protege até 7 vezes sua altura,mas que ele não deve formar uma barreira sólida, poisesta irá produzir turbulência e danos aos cultivos quese pretende proteger. O quebra-vento deve serprojetado de modo a reduzir a velocidade do vento.Assim, barreiras em forma de zigue-zague são maiseficientes do que barreiras retilíneas, e devem prevervários estratos (plantas altas e retas, baixas ecopadas), pois o vento deve ter sua velocidadereduzida em todo o perfil a ser protegido. Algumascaracterísticas desejáveis das espécies para este fim:

-rápido crescimento;-não quebrar galhos facilmente;-resistência à fogo;-madeira utilizável;-produtora de frutos, pólen, flores ou abrigo parafauna;-enraizamento profundo;-caducifólia, no caso de proteger espécies muitosensíveis ao sombreamento.

Na representação acima: aléiassimples irão produzir lenha,fertilização, forrageamento deanimais ou peixes. Aléiascomplexas irão funcionar contraa erosão superficial provocada porchuva e vento, aumentandotambém a capacidade deinfiltração do solo. Cercas-vivas deporte arbustivo poderão cumprirvárias dessas funções, e quebra-ventos biodiversos poderãoconsituir-se como parte decorredores de fauna e flora numapaisagem ocupada por talhõessemi-permanentes de cultivosanuais, pastagens, pomares eaçudes. O objetivo sempre éaumentar a produção debiomassa, moderar fatores comoradiação e umidade, e cadaecossistema e contexto sócio-econômico e cultural definiráespécies e seu manejo. Nodesenho acima, umarepresentação de como se podecombinar diferentes espécies emdiferentes graus de complexidade.

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Faixas de Retenção de Uso Múltiplo

Este é um típico sistema de consórcio de espéciesperenes com cultivo de grãos em regiões declivosas.Nas encostas do maciço dos Himalaias, na Ásia, épossível observar terraços formados para cultivo degrãos estabilizados por árvores e arbustos. O mesmosistema foi usado nos Andes e pelos Astecas em suachinampas. As espécies a serem usadas foramselecionadas ao longo de centenas de anos, porcritérios como capacidade de diminuir o impacto daschuvas torrenciais; valor alimentício para os animais eseres humanos; capacidade de rebrote, este últimopensando no uso alternativo como fonte de lenha efertilização.

As faixas de retenção oferecem muitas possibilidades, eo tipo de faixa (composição, densidade de plantas,altura das árvores) depende do uso da terra entre asfaixas e a exposição solar, entre outros fatores. Adeclividade também irá definir faixas mais largas oumais estreitas. Quando o meio da faixa (o terraço) écultivado com frutíferas ou espécies tolerantes àsombra, a composição das faixas podem ser maiscomplexas, formadas por plantas que produzem frutassilvestres, condimentos, medicinais e forrageiras. Jápara pequenas propriedades que tem seu eixo básicoem grãos, estas faixas deverão ser constituídas deuma proporção maior de espécies fertilizadoras, deporte baixo ou que tolerem poda intensa, raízes densase produção alta de biomassa. Algumas espécies temmúltiplos usos (como a amora-preta Morus nigra), oque pode otimizar o uso da área mesmo nestes casos.

Na foto abaixo, campos de cultivode trigo irrigado nos arredores deBeijing, China. A região de Beijing éfrequentemente atingida portempestades de pó e ventos secosque causam grande evaporação deágua e danos à cultivos, animais epropriedade. Na rota dos fortesventos secos originados nasestepes da Mongólia e no degradadoPlanalto de Loess, os cultivos anuaissão protegidos por quebra-ventos,geralmente com espécies demúltiplo uso. O pó pode chegar,através das correntes de altitude(jet streams), ao Japão e Pacífico, ejá alcançaram San Francisco, naCosta Oeste dos Estados Unidos.

Montanhas a 150km de Beijing, aporta de entrada das tempestadesde pó oriundas da Mongólia.

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A floresta em um bananal

A banana é uma espécie mundialmente conhecida porsua aptidão para compor sistemas agroflorestais. Noseu centro de origem, a bananeira é uma planta desub-bosque, o que significa que ela é tolerante àsombra. Sua folhas grandes e planas são feitas paracapturar com eficiência a luz do sol embaixo dasárvores. A forma das folhas, com uma calha central,captura a água tanto da condensação (neblina eumidade do ar) como do gotejamento das árvoresacima dela. Esta calha dirige tudo para a touceira. Asfolhas são protegidas em cima e mais ainda embaixopor cera, que ajuda a evitar fungos e afasta o excessode água e a lixiviação de nutrientes.

Entretanto, é preciso conhecer outros detalhes. Abananeira é originária de locais de solo bastante fértil ecom umidade de solo constante, e apresenta sintomasnegativos quando o ambiente tem limitações nestesaspectos.

Isto muitas vezes confunde o agricultor: ao encontrarbananeiras amareladas e improdutivas embaixo deárvores, ele pode avaliar que o problema é sombra,quando a causa vem de outros limitantes, comoexcesso de umidade ou falta de fertilidade. Ao removera árvore, o sintoma não apenas não desaparece comopode se agravar, pois se aumenta a velocidade dovento, os danos em folhas e se perdem as folhas daárvore e seu efeito fertilizador.

Trabalhos de pesquisa com bananeiras atacadas porSigatoka Negra comprovaram o que a prática dosagricultores já percebia: um certo nível desombreamento beneficia a bananeira e a torna maisresistente à doenças, inclusive amentando o tamanhodos cachos e o teor de potássio nas folhas (veja tabelae gráfico nas páginas 26-27).

O primeiro passo para um bananal agroflorestal éencontrar uma exposição adequada (norte, noroesteou nordeste), umidade constante sem encharcamentoe solo fértil.

O segundo é, se necessário, recuperar o solo comespécies como o feijão-bravo-do-ceará, mucuna,guandú e outras. Se o solo é suficientemente fértil eabaixo dos 25o de inclinação, então cultivos anuais(feijão, milho, abóbora, mandioca, batata-doce)

Ingazeiro (Inga marginata) comosombra e fertilização em bananalrecém-implantado. Dom Pedrode Alcântara, RS.

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poderão ser cultivados nas entrelinhas da banana.Numa roça cercada por floresta, muitas espéciesnativas irão se beneficiar do ambiente da roça ecomeçarão a regenerar. Além disso, espécies deespecial interesse poderão ser plantadas, pensandotanto no espaço que fica abaixo das bananas, comoaqueles estratos intermediários e dominante. Umaenorme lista de espécies já é conhecida dosagricultores para cada um destes estratos. Já aquantidade e densidade de espécies que irão formar oconsórcio com a banana depende dos objetivos doagricultor e das possibilidades da área.

De modo geral, quando se tem um solo muito fértil ebananeiras muito viçosas e produtivas, os produtorespreferem ter blocos de banana abertos ao solpontilhados por árvores de grande porte. Quando osolo é menos fértil ou menos apropriado para bananas,sistemas mais diversificados são usados, paraaproveitar melhor o potencial do lugar com outroscultivos.

Isto não é uma regra, já que em condições muito boasde luz, calor, umidade e nutrientes se pode ter sistemasagroflorestais bananeiros com uma grande diversidadede espécies. Parâmetros de pesquisa apontam quemais que 50% de sombra tende a reduzir a produção(ver Garnica, 2000). Isto pode ser aceitável se outrosprodutos (frutas, por exemplo) passarem a rendertanto ou mais que a banana .

O manejo de poda de árvores no estrato dominante éa maneira para se manter a sombra e fertilizar a área.Na definição da quantidade e qualidade das árvores queirão fazer fertilização ou permanecer como sombra,entram vários fatores. São preferidas árvores de fustelongo e copa reduzida, uso múltiplo, que não liberemresinas que atraem insetos que atacam a banana, oufungos que prejudicam a aparência. Outra característicaimportante é que não quebrem galhos facilmente comventos e que tenham hábito caducifólio (perderinteiramente as folhas uma vez por ano). Osresultados podem ser comparáveis à fertilizaçãoconvencional.

A resposta à poda ou a característica caducifólia sãopor isso importantes. A poda deve ser realizada deacordo com a fisiologia de cada planta, e isto significaque algumas toleram podas freqüentes e quase totais.Os agricultores tem mantido até 70% da copa dasespécies como regra de poda para as mais resistentes(aroeira-Schinus terebentifolia) enquanto outras, como

Banana-maçã sendo implantadacom cobertura verde de mucunapreta (Mucuna phaseoloides).Dom Pedro de Alcântara.

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algumas espécies de ingá-feijão, toleram apenas podasanuais ou bianuais, que não ultrapassem 60% da copa.Estes são saberes atualmente obtidos pela observaçãodos agricultores e que constituem um campo aberto àpesquisa.

As árvores que terão uso como madeira sãoselecionadas a partir do próprio banco de regeneraçãoou implantadas, quando não há matrizes próximas. Oobjetivo é ter uma árvore de grande porte a cada 20-25m, o que gerará uma densidade final de 40-50árvores por hectare. O critério de seleção de espécies

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Análisis químico del suelo (promedio de 3 repeticiones) del lote de plátanosembrado bajo sombra y a plena exposición solar (Tame, 1998).

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Acima: Sintese de trabalho naColômbia que fez a avaliação deseveridade (%) de Sigatoka Negraem folhas de bananeiraimplantadas em plena exposiçãosolar e em sombreamento,comparando o efeito de fertilizaçãopor podas versus fertilizantesquímicos no solo e em tecido foliar.Puente de Tabla, Arauca, Colômbia,1998. Adaptado de Garnica, A. M.(1999).

Evaluación de tejido foliar de plantas de plátano establecidos bajo sombríoy a plena exposición solar sobre la severidad de la Sigatoka Negra. Tame.1999.

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madeiráveis inclui a qualidade da madeira e a perdacíclica de folhas, o que facilita o manejo, já que árvoresde grande porte não terão que ser podadas.

Nos estratos intermediários é importante areintrodução e a regeneração de palmito, emdensidades variáveis. O objetivo é obter umadensidade de até 800 indivíduos e até 50-60 adultosreprodutivos/ha, o que permitirá que apenas o manejoda regeneração seja suficiente para manter o palmitono sistema (Dos Reis et al., 2000). Bromélias,orquídeas e outras ornamentais podem serintroduzidas em nichos especiais, como touceirasantigas de banana, tocos, troncos de árvores emesmo vasos dispostos no chão podem ser usados.As entrelinhas e o �olho� antigo das touceiras debanana são usadas para bromélias, e árvores de ciclolongo são estacas vivas para as orquídeas.

A fertilização obtida com as podas pode sersuplementada por insumos aceitos pela certificaçãoorgânica. No Litoral Norte é comum o uso de cama deaviário (4 t/ha), calcário de conchas (1 t/ha),micronutrientes (B e Zn) e fosfato de rochas (0,5t/ha)nos setores do bananal que necessitam serrecuperados. A operação de �limpeza� de folhas secase talos velhos é casada com os objetivos dafertilização. Nas duas roçadas anuais, que visamfacilitar o trânsito no bananal, se pode fazer também aretirada de folhas secas e o raleio de brotos, visandomanter 3 gerações por touceira, no espaçamentopadrão de 2,5m x 2,5m. Todo este material (ervasroçadas, desbrotes, folhas e talos secos) passam acompor a liteira e entram na reciclagem de nutrientesdo SAF.

As bordas do bananal, por sua vez, pode ser cercadaspor mata nativa ou quebra-ventos. No caso dequebra-ventos, já foi citado como se pode aumentar aeficiência, serviços ecológicos e produtos de umquebra-vento. No caso de a borda ser uma matanativa, a melhor estratégia é enriquecer a borda damata com ornamentais nativas, palmiteiros, tucum,uricana (Geonoma gamiova, palmeira de alto potencialcomo ornamental), madeiras de lei e outras espéciesde interesse.

Estes são roteiros praticados pelos gruposassessorados pelo Centro Ecológico Litoral Norte, eque foram oportunizados no âmbito do ProjetoManejo Agroflorestal/PDA. Sua efetividade em reduzire prevenir danos provocados pela Sigatoka Amarela

Atividade prática de poda deespécies fertilizadoras em dia decampo promovido pelo projeto.Dom Pedro de Alacântara, RS.

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(Mycosphaerella musicola Leach) está sendo avaliadaem projeto de pesquisa participativa (RS-Rural), e osprimeiros resultados indicam uma melhoria geral doestado dos bananais (Schmitt et al., 2003).

Finalmente, o grande desafio destes sistemas de usoda terra é uma produção à custos compatíveis com ossistemas em monocultivo, bem como confirmar asvantagens já percebidas empiricamente promovendo omonitoramento participativo de indicadores emprocessos que combinem pesquisa quantitativa equalitativa.

A floresta nativa na capoeiradegradada

A primeira coisa a fazer é entender o que houve nopassado com a vegetação daquele lugar onde hojetemos uma �capoeira�. A intensidade e extensão comque a área foi utilizada pode interferir em muito na suacapacidade de regenerar naturalmente e, também, aosesforços de �enriquecimento� promovido pelo serhumano. Basicamente, vamos lidar com asconseqüências ecológicas dos erros do passado.

Quando uma área é �minerada� até a exaustão dentrode um ambiente, os efeitos podem ser muito difíceis dereverter a curto prazo. É comum que tanto as plantasmatrizes como seus dispersores principais estejamausentes. Um solo que tenha perdido sua capa superiorprovavelmente perdeu fertilidade e banco de sementesdo solo, o que agrava ainda mais a situação.

Vejamos o caso do palmiteiro. Ele é uma espécie deciclo longo (pode alcançar mais de 100 anos), e seinstala no sub-bosque sombreado da mata. Suasemente é alimento básico e sustentação de toda umacadeia trófica no ecossistema. É pesada e por isso édisseminada por fauna específica, como aves de maiorporte (sabiás, gralhas, tucanos, araçaris), além demamíferos tanto terrestres (pacas, cotias, ratos)como arborícolas (serelepes, cacheiros, gambás) evoadores (morcegos). Junto com outras espécies devalor madeireiro (cedro, louro, canjerana, canelas),esta espécie foi sistematicamente eliminada para aprodução de palmito em conserva, sendo hojeencontrada em uma pequena fração de sua área dedistribuição original na Floresta Atlântica.

Acima, polinizadores essenciais:abelhas sem ferrão (meliponídeos),as quais necessitam de ocos emárvores e áreas pouco perturbadas.Abaixo, bromélias nativas sendomultiplicadas em bananal paraposterior reintrodução elicenciamento de manejo.

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Os maiores problemas atualmente para o palmiteirosão:

-a extração ilegal através de roubo organizado, quecausa a eliminação das matrizes e interrompe aevolução genética da espécies e o processo desucessão em grandes extensões;-a extensão das áreas modificadas pelodesmatamento, que reduzem a eficiência daregeneração natural;-a caça e predadores introduzidos (cães e gatos) queeliminam disseminadores terrestres.

O resultado são os �vazios ecológicos�. Estes �vazios�são espaços na estrutura da vegetação (nos seusdiferentes �andares�) que não tem mais as espéciesque deveriam ter. Estes espaços passam a serocupados por outras espécies, geralmente exóticascom disseminação mais eficiente, ou que tem suasmatrizes próximas ao �vazio�. Esta é a gênese dascapoeiras �estacionadas�, onde a sucessão não podeavançar em complexidade por falta de sementes(material genético), somada aos danos à fertilidade dosolo, umidade, exposição à vento e à predadores.

O resultado é a noção comum a muitos agricultores deque �esse mato não adianta nada, está sempre igual�. -Falhas de comunicação e falta de assistencia técnica,agilidade nos órgãos licenciadores e mesmo legislaçãoadequada consolidam o desinteresse em mudar estequadro. O �vazio�, considerando apenas as questõesecológicas, acontece porque, ao final do ciclo daspioneiras e secundárias que estão presentes, não hácontinuidade de sucessão. Geralmente, não resta naárea material genético apropriado, e o território é hostilaos disseminadores. Finalmente, à tudo isto se somamoutros fatores de estresse (solo pobre, vento, excessode radiação) que reduzem as chances deestabelcimento de plantas nativas de ciclos maisavançados da sucessão.

O fracasso de introdução de espécies destes ciclos éassim fácil de entender, já que a espécie é introduzidaem ambiente inadequado. Se um cedro, por exemplo,for implantado numa mata fechada ou numa áreaaberta e degradada, o resultado será o mesmo: umcrescimento pobre e um consequente ataque defungos e brocas. Ele pode estar no lugar certo, mas nomomento errado da sucessão. Porém, se ele forimplantado numa capoeira em regeneração que tenhasuficiente fertilidade e umidade, ele irá crescer reto esem danos, pois os inimigos naturais da broca que oatacam serão atraídos pela vegetação, ele próprio

Acima, cedro crescendo emsincronia no bananal, sem ataquede broca do ponteiro, Morrinhos doSul. Abaixo, uma amostra dopotencial de crescimento de Cordiatrichotoma em bananais.Mampituba, RS.

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estará equilibrado nas suas necessidades de nutrição eambiente.

O palmiteiro tem uma estratégia diferente: ficavegetando, com baixo crescimento quando instaladoem mata fechada. Ele só cresce realmente quando temmais que 30% de luz disponível. Quando as espéciesque estão fechando o estrato dominante completaremo ciclo e começarem a perder ramos e galhos, abrindomais luz e trazendo nutrientes, o processo desucessão sincroniza e ele terá um impulso decrescimento.

De modo geral, um enriquecimento de capoeira que jápassou dos 3m de altura na Mata Atlântica deve visarprodutos florestais não madeiráveis, uma vez que háseveras restrições para corte raso de vegetação nesteestágio. O enriquecimento pode se dar apenas nasbordas, para que a natureza faça o resto,ou se aproveitando as áreas maisabertas. Estão áreas são as que estãocobertas por vegetação rala, ou ondeárvores secas e em final de ciclo podemser podadas sem caracterizar corte raso,minimizando o impacto ambiental.

Em ambos os casos, a chave do sucessono estabelecimento das espécies ésincronizar o tempo e o espaço dasucessão da espécie que vamosreintroduzir e observar radiação, umidadee nutrientes disponíveis, além de avaliarbem que tipo de intervenção estareintrodução pede. Conhecer bem estasplantas, como já foi dito, é fundamental,e elas estão agrupadas por suascaracterísticas em:

Espécies que são �oportunistas declareiras�. A maior parte das espéciesmadeiráveis e frutíferas nativas estãonesta categoria. O enriquecimento decapoeiras, capoeirões ou áreas naturaiscom espécies que tenham estacaracterística implica em criar ouencontrar nichos de luz, umidade,nutrientes, e pouca perturbação,evitando locais expostos à mudançasabruptas de temperatura, vento econcorrência por espaço.

Espécies dos estratos dominante e intermediáriopresentes em bananais agroflorestais, listadospor ordem de frequência (indivíduos/ha)

Banana-prata (Musa acuminata, AAB) 1372-2100

Palmito (Euterpe edulis) 515

Carobinha (Jacaranda puberula) 166Sobragi (Colubrina glandulosa) 111-198

Embiruçú(Pseudobombax grandiflorum) 111Ingá (Inga marginata ) 110

Abacateiro (Persea americana) 55-111Mamão (Carica papaya) 66-80

Cafezeiro (Coffea arabica) 47Embaúba (Cecropia glaziowii) 38-78

Cedro (Cedrela fissilis) 47-55Citrus (Citrus spp) 66

Canela (Ocotea puberela) 55Licurana (Hyeronima alchorneoides) 49

Alecrim (Machaerium stipitatum) 22-166Capororoquinha (Myrsine coreacea) 66

Açoita-cavalo (Luehea divaricata) 55Camboatá-branco (Matayba eleagnoides)55

Capororoca (Myrsine umbellata) 39Crindiúva(Threma micrantha) 47

Gerivá (Syagrus rommanzofiana) 22-39Camboatá-vermelho(Cupania vernalis) 33

Canjerana (Cabralea canjerana) 11-55Acerola(Malpighia glabra) 11

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Isto pode ser obtido pela poda seletiva da vegetaçãoexistente, ou pelo plantio de espécies protetoras(como o ingazeiro) numa borda de mata. Pode ser umerro eliminar árvores secas, já que elas atraem muitospássaros que trazem sementes e fertilizantes nas suasfezes, além de polinizadores importantes.

Espécies umbrófilas. Esse é um grupo menor masnão menos importante das espécies conhecidas eexploradas. São espécies que necessitam de um graumoderado à alto de sombreamento nos estágiosiniciais de sua implantação, e que poderão demandarum grau maior ou menor de luminosidade ao longo deseu ciclo de vida. A erva-mate é um exemplo destecomportamento dinâmico. Ela pode se instalar em umambiente de muito baixa luminosidade, desenvolver-secom luminosidade média, e vegetar praticamente comexposição total. Porém, seu nicho ótimo são asclareiras de floresta que lhe propiciem um processodinâmico de luz e sombra e proteção contra ventos eextremos de temperatura e radiação. É neste ambienteque as folhas da erva-mate produzem mais saponinase menos taninos, resultando em um produto demelhores características. É neste ambiente tambémque alguns cogumelos, bromélias, orquídeas, palmeirase ervas medicinais necessitam de sombra desde o inícioaté o final de seus ciclos de vida, e a luminosidadeexcessiva danifica seu metabolismo ou o inviabiliza.Estas espécies constituem o eixo básico dos chamadosprodutos florestais não-madeiráveis que podem sermanejados em sistemas agroflorestais maduros ou emáreas de conservação.

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Adaptado de Vivan, J.L. Magalhães, R., Miller, P.R.M. (2002).

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Na região do Litoral Norte e Sul de SC, viveiristas quetrabalham com ajardinamento cultivam o gerivá(Syagrus romanzoffiana) em consórcio com árvorespara posterior comercialização das plantas comoornamental; a samambaia-prêta já é cultivada emanejada em quintais e capoeiras, com excelentequalidade e em processo de licenciamento ambiental;orquidófilos utilizam o ambiente da mata para�depositar� sementeiras de orquídeas e recolhê-lasquando já desenvolvidas.

Este tipo de manejo é preferencial para as chamadas�áreas-tampão� em áreas protegidas. Por este termoentendemos todas as áreas que serão manejados demodo que a intervenção humana não implique emcorte raso, mas apenas extração controlada deindivíduos. Entre os produtos possíveis de se obternestes sistemas estão:

-óleos, resinas e essências;-temperos;-fibras;-ornamentais;-cogumelos;-corantes;-frutas e castanhas.

Este tipo de trabalho é especialmente importante nasÁreas de Proteção Ambiental (APA), que são:

-declividades acima de 45 graus;-margens de rios, lagos e nascentes;-áreas de restinga que fixam dunas ou estabilizammanguezais;-bordas de tabuleiros ou chapadas;-áreas com altitudes acima de 1800m;-áreas de reservas indígenas.

Nestes espaços, o enriquecimento deve se limitar àsespécies nativas no padrão e densidade originais que aespécie já apresentava na região, caso não hajapresença de matrizes próximas. Já em áreas demanejo liberado, o adensamento pode ser maior,sempre que a espécie tenha a característica natural deocorrer em formações mais ou menos homogêneas.

É bom lembrar que determinadas espécies, como ocedro, a canjerana, a canela sassafrás e outras,quando cultivados em formações adensadas, podemapresentar problemas fitossanitários. Aprender com anatureza de cada lugar é a regra de ouro de qualquerforma de agricultura que se pretenda sustentável.

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Saber o que existe: conhecer para não perder

Seria uma sabotagem ao processo de sucessãopisotear, podar ou eliminar valiosas espécies dasucessão terciária que já estão se estabelecendo semcustos, quando do preparo da área para a reintroduçãode outras espécies.

O que resolve esta questão é um levantamentoexpedito da composição botânica. Para as condiçõesdo agricultor, isto nada mais é do que caminhar numalinha que corte transversalmente a área a serenriquecida. Nela, iremos primeiro identificar todas asárvores estabelecidas (maiores que 3m). Ao mesmotempo, iremos parar a cada 5m e tentar identificar,num espaço de 1m quadrado, quais as espécies queestão regenerando.

Introduzir plantas e sementes. Feita a avaliação,e sabendo do potencial da regeneração presente, oagricultor pode pensar no que pode ou não serintroduzido, e como fazê-lo sem perder o preciosotrabalho feito pela natureza. Ferramentas adequadas(escadas, serras de poda, facões) podem sernecessários quando se quer (e se pode) estabelecerum sistema mais intensivo. Numa situação onde aconservação seja a preocupação maior, apenasdispersar sementes e proteger os dispersores pode sera melhor solução. Espécies como o ingá, o palmito, eoutras com sementes abundantes podem ser usadasnestes casos.

Aspectos legais. Em áreas protegidas ou depreservação permanente, qualquer operação deretirada de indivíduos de qualquer estrato deve estarorientada por um Plano de Manejo Florestal aprovadopelo órgão competente. Evite problemas e consulte umtécnico da área.

Cercamento. O cercamento pode ser necessário paraevitar a entrada de gado. Algumas cercas elétricas sãode baixo custo e são bastante eficiente para manteranimais domésticos de difícil controle (como porcos egalinhas) por cercas comuns.

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Parte III

Errando e acertando: 12 dicaspara uma propriedade ruralagroflorestal

Lugar certo

É aquele onde a agricultura já modificou a paisagem, jáque, no ambiente da Mata Atlântica, com exceção dosbanhados, praias, dunas de areia e encostas rochosasde grande declive, praticamente todo lugar é lugar deárvores. O que acontece é que o ser humano modificao ambiente para introduzir as espécies das quaisdepende, e muitas vezes faz isso no lugar errado, sejapor desconhecimento ou por pressão econômica. Emambos os casos, o desastre tarda mas não falha.

Para reverter seus erros, o agricultor pode começarplantando cercas-vivas e quebra-ventos, depoisimplantar aléias e faixas de retenção. Aos poucos iráaprendendo como manejar a complexidade, e logo terápomares com muitas espécies e estratos, aindaaproveitando as entrelinhas para produtos agrícolasanuais.

O �lugar certo� é regenerar o que foi destruído, nãodestruir mais área para implantar um sistemaagroflorestal. Isto coloca uma ordem de prioridade,onde derrubar capoeirões está na última ordem, ereconquistar lavouras degradadas por anos de mau usoestá em primeiro.

As espécies

O agricultor tem milhares de opções para compor umsistema agroflorestal ou mesmo para práticas simples,como uma cerca viva ou o sombreamento de umapastagem. O importante é que ele conheça muito bemas plantas que escolhe, pois os resultados vem amédio e longo prazo, e nada pior do que esperar 5anos para ver que plantou a espécie errada.

Também, deve se evitar o chamado �olho-grande�: aoapostar tudo numa única espécie frutífera, esquecer

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que ela precisa de quebra-ventos e fertilização, outrasárvores que forneçam abrigo para os insetos quecontrolam outros insetos. Neste sentido, eliminar umpequeno capão de mato que estava, na percepção doagricultor, �atrapalhando� um plantio de frutíferas é umerro tanto de �escolher o lugar�, como de �escolher asespécies�. As consequências, sem dúvida, virão naprópria produção do que ele queria �melhorar�. Alémdisso, ao plantar uma única espécie, se corre o risco deque uma frustração de safra causada pelo climaprovoque uma crise financeira.

Os consórcios

Justamente pelos motivos que se colocam para aescolha das espécies, é que é tão importante saberquais são os consórcios adequados. Quatro fatoresregulam os consórcios: arquitetura, tolerância àsombra, exigências em termos de solo e umidade eafinidade no tempo da sucessão.

A banana se dá muito bem com o louro, o cedro e alicurana, por exemplo. Os citrus se dão muito bem como ingazeiro, e o café é excelente companheiro dabanana. O feijão trepador se beneficia do convívio como milho, e o aipim tolera e se beneficia da mucunapreta. O guandú protege árvores pequenas como olouro e mesmo os citrus, e a batata-doce, o mangaritoe a taioba vão muito bem no meio do bananal que temboa umidade e terra fértil, já o maracujá precisa deárvores que atraiam e hospedem a mamangava, que éa principal polinizadora de suas flores. A lista é imensa,e está disponível no saber popular para quem soubervarrer de cima o preconceito e entender o que está portrás de uma espécie �ruim� de consórcio.

O palmiteiro já foi acusado de �acabar com o bananal�.Felizmente, como mostra a experiência em geral,trata-se apenas da falta de um manejo adequado ou,em alguns casos, preconceito puro, desprovido dequalquer razão. Perguntar a muitas pessoas que vivemem diferentes situações é muito importante parachegar à uma conclusão apropriada.

Sucessão

A idéia fundamental é que uma pessoa, com bomconhecimento das espécies, observação da mata eexperiência em agricultura, tem todas as condiçõespara criar consórcios eficientes, porque vai entender os

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princípios básicos da sucessão vegetal. Isto é básicopara os sistemas agroflorestais, onde consórcios vãose sucedendo na área implantada, o que vai dando àquem o maneja muitos produtos e serviços, mas cobraconhecimento e manejo.

Mas o principal é que estas combinações e sequênciasde plantios estejam produzindo um ambiente sadio.Isto se traduz em termos de produtos que nãonecessitam pulverizações, solo que mantém afertilidade e não sofre com erosão, diversidade deespécies, controle natural de insetos e doenças, epresença auto-regenerada de fauna e flora nativas.Quando o agricultor consegue levar seu sistema aoponto em que a regeneração acontece sem suainfluência direta, espalhando sementes e instalandoárvores de interesse do produtor, então o manejo desucessão foi um sucesso.

Entretanto, se a cada etapa é necessário introduzirmuito esterco e fazer muita capina, proteger cultivoscom pulverizações, além de repor mudas quemorreram, então é melhor conversar com os amigos ecom os técnicos, dar uma passeada pela mata nativa,observar, pensar e checar o que está sendo feitoerrado.

Manejo

Muitas vezes, o insucesso de um sistema agroflorestalestá ligado ao manejo, ou à falta dele. Um bananalabandonado no meio de uma capoeira não é umsistema agroflorestal. O manejo implica em remover asplantas doentes, enriquecer com árvores que irão fazero futuro da área (sucessão), podar árvores queestejam sombreando em excesso, e fazer isso pararenová-las, não para matá-las. Cada espécie tem suascaracterísticas, e conhecê-las é a única maneira defazer a coisa certa no tempo certo. De modo geral, amaior parte das espécies reage melhor à podas feitasno inverno. Além do mais, poucas toleram podassuperiores à 70% da copa, e podar 30% da copa éuma regra geral para evitar a morte da planta.

Ainda se deve saber que as madeiráveis não devem terseu topo podado, e que os galhos podados paraformar o fuste devem ser cortados rentes, para evitara entrada de fungos e a desvalorização e até queda daárvore no futuro.

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É importante também reconhecer que algumas áreassão impróprias para a banana ou outras frutíferas, edevem ser deixadas para regeneração, ou entãoimplantadas com outras espécies nativas que poderãoproduzir mais naquele espaço.

Recursos genéticos

A maior parte dos agricultores que habita o LitoralNorte do RS não está aqui há mais de 200 anos. Istosignifica que, embora já haja um respeitávelconhecimento sobre as espécies nativas e cultivadas,muito ainda há para aprender. Num dos centros deorigem e diversidade da bananeira, a Malásia, osquintais tradicionais podem ter mais de 50 variedadesde banana, e mais de 10 usos alimentares diferentes.

O mamão, por sua vez, foi domesticado pelos povosindígenas há pelo menos 4 mil anos, enquanto oseuropeus o conhecem há menos de 500 anos.Enquanto se cultivam menos de 10 variedades demandioca em toda a região, uma única roça decaboclos e indígenas na Amazônia pode chegar a 40variedades.

Tudo isto nos mostra que devemos ter uma grandecuriosidade sobre as espécies, suas características eseus usos. Ninguém melhor que o agricultor paraobservar o comportamento das espécies e variedadese campo, e fazer a avaliação de seu comportamento.

Portanto, o agricultor deve buscar informações sobreas espécies tanto no saber tradicional e indígena,quanto junto aos técnicos e pesquisadores da área.Esta ponte de saberes pode apontar as melhoresestratégias para obter o material genético maisadequado, como conservá-lo e, eventualmente, comofazer seu aprimoramento na propriedade.

O imenso potencial de produtos da Mata Atlântica estaaí. O processo de erosão genética e de saberestambém e cabe, portanto, tanto a ação local eindividual, como a luta por políticas públicas. Ambasdevem prever a conservação in situ da biodiversidade eda agrobiodiversidade, não somente em áreasprotegidas e unidades de conservação, mas tambémem quintais, sistemas agroflorestais e áreas protegidasparticulares.

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Colheita

Cada produto agroflorestal tem suas caracterísiticas.Em outras palavras, não se pode colher frutas depalmito como se colhem uvas, e nem bananas comofossem batatas. A colheita começa com a escolha dolugar correto para cada espécie e consórcio, sempretendo em mente os ciclos da planta, sua arquitetura eo que vamos colher.

Caminhar horas dentro da mata para colher algunscachos de palmito pode ser inviável, ou transportarcachos de 40kg de banana num terreno acidentadopode resultar em tudo, menos frutos de qualidade.Ocafé sombreado, por exemplo, deve ser colhidomaduro, o que demanda mão de obra e atenção. Umespaçamento inadequado pode dificultar o acesso ecriar um impasse parao transportar da colheita. Demodo geral, árvores um pouco mais altas assustamagricultores acostumados à culturas anuais. Entretanto,é bom lembrar que os melhores e mais tecnificadospomares de maçã da Austrália e Nova Zelândia temárvores de mais de 5m de altura, onde as frutas sãocolhidas de escada. Tudo é uma questão de custo/benefício: se o esforço é compensado por uma colheitafarta, a altura e a mão de obra não são problema, masparte da solução. Historicamente, os sistemasagroflorestais tem sido a resposta para se produzircolheitas fartas, emprego e renda em regiões onde aescassez de terra, de insumos ou o climadesfavorecem os monocultivos. A escolha das espéciescertas, combinando fatores ambientais, econômicos eculturais é a chave do sucesso.

Processamento

Se o agricultor pretende agregar valor ao seus cultivos,ao escolher uma espécie que só pode ser vendidafresca, ele deve antecipar como será a colheita e oescoamento da produção, para qualidade eapresentação do produto. Do mesmo modo, aoplantar café pensando em qualidade, por exemplo, eledeve planejar não apenas a colheita, mas seuprocessamento adequado, que envolve pelo menosdespolpamento e secagem. Frutas frescas devemprever resfriadores, despolpadores e congeladores paraarmazenamento de polpa, bem como transporte emcaixas com isolamento térmico ou refrigeração,dependendo do tempo e distância. Cada espécie temum grau de complexidade de processamento diferente.O produtor tem que pensar que o maquinário ou

A agregação de valor aos principaisprodutos implica emprocessamento com padrão dequalidade que viabilize acomercialização em qualquermercado. Agroindústria Morro Azul,Família Scheffer, Morrinhos do Sul.

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instrumentos necessários e o custo de mão-de-obraestão ligados:

-à rapidez com que o produto deteriora;

-ao tipo de produto que se quer obter (conserva, doce,geléia, polpa, extrato alcoólico, óleo essencial,gordura);

-como ele se conserva após processado, e como eledeve ser transportado.

Mercado

Um aspecto fundamental para o sucesso de umatransição �agroflorestal� da agricultura hoje praticadana Mata Atlântica passa pelo acesso dos agricultoresao mercado. Mas o que é o mercado?

Podemos pensar no mercado como o fluxo principal daeconomia que demanda produtos, e toda a rede depoder e interesses que o forma. Por exemplo, asmadeireiras e fábricas de papel e celulose; os criadoresde gado, usinas de açúcar e álcool, a cadeia produtivado café, do cacau, da banana e os grandes atacadistase distribuidores que controlam preços nacional einternacionalmente.

Também fazem parte do mercado as atividades ilegais,como o roubo de ornamentais nativas, o tráfico deanimais silvestres, o roubo de palmito e a rede decoleta e venda de samambaia-preta, hoje em processode mudança e legalização no Rio Grande do Sul. Opalmito roubado é servido em um restaurante, madeiraextraída ilegalmente é transformada em móveisvendidos em lojas de grife, e animais silvestres vãopara coleções e jardins exóticos no Brasil e no exterior.Podemos pensar na incrível demanda de produtos queacelera o desaparecimento de madeiras nobres,palmiteiros e ornamentais (como as orquídeas), e dasflorestas que cobriam grande parte da faixa costeirabrasileira até 50 anos atrás.

Porém, o mercado também pode ajudar. Ao valorizarprodutos locais e o saber que os gera, os potenciaisdas espécies, a riqueza e diversidade dos quintaisagroflorestais e de seu potencial para atenderdemandas locais e regionais pode se concretizar, efazer uma grande diferença nas economias familiares eregionais. Este processo de mudança pode começar a

A banana passa de qualidade diferenciadaabre outras janelas de mercado, como polpade frutas, o �açaí� de palmito, legumesdesidratados, farinhas, doces e conservas.Uma política pública que, além de fiscalizar,ofereça recursos e apoio técnico pode, amédio prazo, mudar o atual quadro deconflito de uso de recursos naturais naMata Atlântica.

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se desenhar com o palmiteiro nos bananais, além dasamambaia-preta, outra espécie ainda extraídailegalmente em grandes volumes. Para que as boasinciativas se consolidem, é necessário que se conduza,como é a proposta embutida no projeto PDA,projetos-piloto que possam servir de referência àpolíticas públicas.

Um dos grandes dilemas para gerar, regulamentar emesmo acessar mercados sustentáveis está nacertificação dos produtos dos sistemas agroflorestais.A Rede Ecovida, que congrega dezenas deorganizações não-governamentais para um processode certificação participativa, empenha-se hoje emdelinear uma estratégia de certificação agroflorestal.

O principal limite hoje é o reconhecimento por parte dalegislação desta metodologia de certificação.Internacionalmente e dentro do país, empresas estãocertificando produtos como café, açúcar, madeira dereflorestamento ou de manejo sustentável, extraçãode palmito e açaí, frutas para sabões, resinas,borracha, essências, plantas medicinais e outrosprodutos, como o mel de abelhas sem ferrão.

Porém, o grande desafio não é apenas certificar, master como protagonistas os principais interessados ebeneficiários, que são os produtores e consumidores.Os parceiros neste tipo de empreitada se reúnem hojeprincipalmente na ANA (Articulação Nacional em

De modo geral, a experiêncialocal mostra que odesenvolvimento e consolidaçãode mercado para um produtoleva 2-3 anos. A banana-passadiferenciada (feita com banana-prata, seca em tempo reduzido ecom cor natural) agora conquistaseu merecido espaço, e logo estetrabalho será direcionado para apolpa de palmito, o �açaí� depalmito.

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Agroecologia), que congrega dezenas de ONGS,movimentos sociais e organizações de agricultores emtodo o terrritório nacional. Internacionalmente, oMAELA (Movimento Agroecológico da América Latina eCaribe) também se organiza para consolidar, difundir elegitimar a certificação participativa.

Na prática, a certificação participativa obedece osmesmos roteiros e exigências seguidos pelascertificadoras �neutras�. Entretanto, busca envolver osatores locais em todos os processos eresponsabilidades. A certificação passa a ser umaavaliação e supervisão constante, voltada muito maispara o aperfeiçoamento de práticas e sistemas do quepara apenas uma ação fiscalizatória de um eventualinspetor.

O que a sociedade espera é que o trabalhodemonstrativo que realiza inspire políticas públicas. Nocaso, programas que ajudem a valorizar o trabalhoque gerações de agricultores vem fazendo,conservando espécies de uso agrícola ou de outrosusos e interesses, bem como a paisagem que as gerouao longo de milhares e até milhões de anos.

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Parte IV

Depoimentos

Aqui colocamos alguns depoimentos de viagens eexperiências pessoais sobre Sistemas Agroflorestaisdo pessoal envolvido no projeto PDA. Bom proveito!

Sistema Agroflorestal na áreaIndígena em Talamanca,Costa Rica.

Por Cristiano Motter, Centro Ecológico/Litoral Norte

Numa visita realizada no mês de setembro de 2003à Costa Rica, pudemos conhecer um pouco daagricultura daquele país, e perceber como osSistemas Agroflorestais estão presentes no cotidianode boa parte dos agricultores familiares.

Em Talamanca, na Zona Atlântica Sul, existe umareserva indígena com mais de 3.000 famílias vivendocom produção de banana e cacau para comércio, alémde dezenas de outras frutas para subsistência. Nestaárea, cerca de 1.200 famílias se organizaram na APPTA Foto: Cristiano Motter

Eritrina podada em forma decandelabro em café sombreado.Turrialba, Costa Rica.

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(Asociación de los Pequeños Productores deTalamanca), onde estes comercializam banana e cacaupara Europa, EUA além de estarem presentes tambémno mercado interno. O volume comercializado debanana é de 400 toneladas/mês, entre fruta in naturae purê, o qual é processado em uma agroindústriaterceirizada. Esta venda de purê de banana é realizadaao longo do ano e representa 60% do volumeproduzido pelos produtores.

Na medida em que a comercialização foi aumentando,as exigências por parte das certificadoras aumentaramna mesma proporção. Para fazer frente a estas

exigências, a APPTAdesenvolveu um Sistema deControle Interno (SIF, siglaem inglês), o que permitebaratear os custos dacertificação, atendendo asimposições dascertificadoras.

Um trabalho muitoimportante e prioritário paraa APPTA é o manejoagroflorestal nos bananais.Desde 1981 a Sigatoka-negra já estava espalhadaem toda costa do Caribe e

Foto: Cristiano Motter

Foto: Cristiano Motter

Acima, café sombreado porlouro (Cordia trichotoma);abaixo, bananal agroflorestalpróxima à Costa do Caribe.

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os agricultores tiveram que se adaptar a esta novarealidade. O que presenciamos é que a banana conviveperfeitamente com a doença em uma sombracontrolada de 40 a 50%. Essa sombra é proporcionadapor espécies arbóreas nativas, basicamente em trêsextratos acima das folhas de banana.

Outras espécies como lichia (Litchi sinensis), côco, cafée cacau são vistas em consórcio nos SAF. Além dasombra, é feito uma pulverização de microorganismoseficientes (EM) nas folhas duas vezes por mês. Dizemos agricultores que também é muito importante cortara ponta das folhas quando estão 30% secas e cortarfora a folha quando tiver 70% seca para diminuir aesporulação de fungos e sua transmissão pelo ar.Fazendo essas práticas, os agricultores produzembanana de qualidade para exportação, sem maioresproblemas com a Sigatoka Negra.

Quando uma touceira de banana é produzidaorganicamente fora da sombra, ela não chega a dar o2° cacho, pois seca antes de completar o ciclo.Também eles observam, que a touceira que está nasombra, demora um pouco mais para soltar o cacho,mas depois que solta, vai levar menos tempo paracolher, porque a planta tem mais reservas e maisfolhas para fazer a fotossíntese, dando assim umamaior qualidade de frutos. Já nas plantas que estão apleno sol, o dano foliar é maior e a capacidadefotossintética baixa muito, chegando ao ponto deinviabilizar a cultura.

Outro ponto que nos chamou a atenção, é o cuidadocom a fruta na colheita e pós-colheita. Tudo é feitopara não haver um arranhão sequer e principalmentepodridão da coroa. A lavagem e aplicação de produtosfungicidas naturais é especialmente importante.

Uma outra instituição que conhecemos foi o CATIE(Centro Agricultura Tropical � Investigación yEnseñanza), que faz pesquisa para desenvolver SAFem café, entre outras linhas. Por enquanto estãousando poucas espécies, com destaque para a Eritrinacomo espécie arbórea fertilizadora e de sombra. Atendência, entretanto, é buscar uma maiordiversificação com espécies nativas que já estão sendoavaliadas. Para o café, também é de fundamentalimportância ter sombra em suas folhas para diminuir asdoenças e a adubação que vem de fora dapropriedade, e a eritrina � e o ingazeiro - contribuemde forma excelente para este objetivo.

A Costa Rica é umpequeno país queaprendeu a tirar proveitode sua imensabiodiversidade.Condensado em umterritório que é menor que1/3 do Estado do RS, opaís tem ecossistemasextremamente diversos,como o Trópico Seco,Trópico Úmido, Florestasde Altitude (BosqueNuboso), FormaçõesCoralinas, Páramos deAltitude (acima de2.500m) e Manguezais.

Vulcões ativos e praiasespetaculares completamo cenário, e fazem doecoturismo a maior fontede renda do país, juntocom a exportação de café(um dos melhores domundo), frutas eornamentais, além deoutros produtos agrícolas.

Entretanto, mesmo umaparente paraíso tem seusproblemas: as florestasque não estão dentro deunidades de conservaçãocontinuam sendo cortadasrapidamente, e relaçõesdesfavoráveis de comérciocom os países ricospoderão arruinarrapidamente a base socialde classe média que éformada pela agriculturafamiliar bem sucedida.

Na página ao lado, averdadeira �riqueza dasnações�: o Bosque TropicalÚmido, na região deGolfito, fronteira com oPanamá (abaixo) e oBosque Seco, dentro doParque Nacional SantaRosa, Guanacaste (noalto), na fronteira com aNicarágua.

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A experiência da AFAORCA (Asociación deFamilias Orgânicas de los Cerros Caraigres)também foi muito interessante. Elesexportam café de 1° qualidade para Europae EUA em forma de grãos secos eclassificados. Tem as propriedades bemdiversificadas para não depender somentedo café como estratégia de fonte de rendae produtos para alimentação. Tambématendem feiras locais onde vendem o cafétorrado e moído que não é exportado.

O Contraponto

Outra experiência que conhecemos foi umafazenda que tem 400 ha de banana eoutros 400 de abacaxi. Aí pudemosobservar os problemas do manejoconvencional. Na Costa Rica chove muito eos solos encharcam facilmente, problemaque a banana não tolera. Por outro lado,existem períodos que podem ficar algumtempo (mais de mês) sem chover.Praticamente todas as fazendas fazemgrandes valos para drenar o excesso deágua sobre o solo e, as que tem condições,colocam grandes irrigações para controlar aumidade e manter a regularidade e padrãode produto para o mercado. Isso tem umcusto altíssimo que nem semprerecompensa.

Nestes sistemasconvencionais sãofeitas pulverizaçõessemanais aéreascom fungicidassistêmicosalternados paracontrolar aSigatoka-negra.Isso representa umcusto de 30% detodo o custo deprodução. Ospequenosagricultores com100 ha para baixo,não estão maisconseguindo seviabilizar nestesistema.

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Horta Agroflorestal

Por Valdeci Evaldt Steffen, Grupo Apemsul � Associaçãodos Produtores Ecologistas de Morrinhos do Sul,Comunidade Três Passos

Comecei a participar do grupo em 1996 quando foiformado. O grupo começou a fazer feiras, onde erapossível vender de tudo tipo de produtos.Começamos a partir daí a diversificar a propriedade,principalmente as hortas.

Durante esse processo, fui participando de cursos eintercâmbios, e começamos a ver que era possíveldiversificar ainda mais a mesma área cultivada, porexemplo: Começamos a plantar frutíferas como acarambola, lichia, jaca, caqui, acerola, goiaba,mamão, banana de várias variedades, tucum,palmito, bacupari, jabuticaba, laranja azeda paradoce, temperos, condimentos e medicinais. Muitasmudas e alguns insumos foram comprados comrecursos do Projeto PDA, e tivemos oficinas e cursospara discutir os plantios. Fizemos uma visita ao Sul daBahia, onde pude ver na propriedade do Sr. ErnstGotsch, em Piraí do Norte os consórcios de árvores,frutas e hortaliças.

Assim fomos ganhando confiança, pois já nossashortas eram sempre pedaços pequenos plantados nomeio do bananal e em outras áreas do morro queeram mais planas e de terra boa. Fomos entãoplantando todas essas árvores frutíferas e outrasnativas. Elas são plantadas em consórcio comhortaliças, milho, feijão,arroz de sequeiro, aipim eabacaxi. Ao todo são maisde 50 variedades cultivadasem toda a propriedade, sãousadas para a subsistênciada família e comercializaçãodo excedente. Algumasfrutas ainda nãocomeçaram a produzir.

O espírito dessadiversidade, é aproveitar omáximo de espaço possívelque temos na propriedade,tanto no solo como noespaço aéreo, aproveitando

As bananeiras começaram a serintroduzidas de modo a aproveitar aadubação dos canteiros.Pseudocaules e folhas fornecemmaterial orgânico de alta qualidade,e as bananas são vendidas ouprocessadas na agroindústria, sendotransformada em passas e doces.

Foto: Cristiano Motter

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assim, os diferentes estratos e principalmente asvantagens disso, como por exemplo, os temperos ea cenoura na sombra do milho nas épocas quentesdo ano. A adubação que se faz para uma cultura, éfeita também para a que está do lado, fazendo comque pouco se perde por erosão. O abacaxi necessitade sombra, por isso foi plantado feijão-guandú,caqui, carambola, acerola e outras nativas para fazersombra e aproveitar o espaço.

Todos agricultores conhecem a dificuldade que existepara produzir hortaliças no verão por causa do calor.Quando planto árvores frutíferas e nativas no meioda horta, também estou preocupado em melhorar oclima para as hortaliças e outras espécies, a sombraque as árvores de porte pequeno dão, diminui atemperatura perto do solo, mantém mais a umidadee seguram um pouco o vento, sem falar quecolhemos de tudo o que gostamos.

Nos últimos tempos, estou usando como adubaçãoum composto feito de esterco de gado, aviário,

fosfato natural, calcáreo de conchas e cinza, tudo issoé misturado e fermentado através de um fermentofeito em casa com material orgânico que recolho nochão da mata. Esse adubo é chamado de �Adubo daIndependência.� Com isso, estou melhorando muitominha horta, aumentado a produção, e com um customenor, por aproveitar mais o esterco de gado, queantes ia fora. Assim, melhoramos a alimentação dafamília e aumentamos a renda.

Também tenho bastante palmiteiro plantado no meiodo bananal, muitos deles já produzindo frutos. A idéiaque temos é produzir a polpa a partir das frutas, e as

primeiras experiênciasderam muito certo, comapoio de alunos daagronomia e professores daUFSC (Universidade Federalde Santa Catarina). Assim,vamos combinando horta ebananal, todos com amesma idéia agroflorestal, ehoje cada vez aprendemosmais e desenvolvemosnovas idéias, sempre commuita diversidade eprodução de boa qualidade.

Palmiteiros, frutíferas introduzidase consórcios de hortaliças, com umfragmento florestal ao fundo.Segundo Valdeci, �as vagensficaram muito bonitas embaixo dospalmiteiros, parecem até queforam mais adubadas�.

Foto: Cristiano Motter

Goiaba sendo instalada junto aocanteiro de beterrabas. Foto:Cristiano Motter

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Índia: Agroflorestas num paísde um bilhão de habitantes

Por Jorge Luiz Vivan, Doutorando do Programa de PGem Recursos Genéticos Vegetais, UFSC,Florianópolis, SC, assessor do Centro Ecológico.

A índia é um dos países mais populosos do planeta,só perdendo para a China, sendo que em área temum terço do território dos Estados Unidos. Durante omês de agosto de 2003 tive a oportunidade devisitar o Sul da Índia, estado de Tamil Nadu. Nasoficinas de sistemas agroflorestais e no trabalho decampo, tive oportunidade de conhecer umacivilização que conseguiu praticar agricultura nummesmo lugar por mais de 4 mil anos.

O que primeiro chama a atenção é que todas asestradas são ladeadas por árvores plantadas, muitashá mais de 400 anos. Mas não são quaisquerárvores: a maior parte é constituída por tamarindo(Tamarindus indicus), muito resistente ao clima secoe quente da região, a Banyan tree, uma espécie deficus que é sagrado para o Hinduísmo, o neem(Azedirachta indica) e mangueiras. Estas espéciestem em uma enormidade de usos e estãofirmemente enraizadas na cultura popular e nareligião.

Nas regiões baixas ao leste, existe a �zona desombra da chuva�, fenômeno causado pelasmontanhas (os �Ghats�). Neste ambiente, onde sepode passar mais de 9 meses sem chuva, os SAFfornecem lenha (mais de 30% da energia consumidana Índia), frutas, forragem para o gado, quebra-ventos, temperos, tinta, flores (usadas todas asmanhãs pelas mulheres como adorno e paraperfumar o cabelo), remédios, e abrigo para osanimais sagrados, principalmente o macaco-de-bonnet e os pavões. É incrível, mas os pequenosbosques sagrados de 0,5 até 15ha que circundam ostemplos hinduístas e de onde nada pode ser retirado,resistiram ao tempo e à pressão demográfica, eainda abrigam macacos, pavões, pequenospapagaios e esquilos.

Talvez seja pouco para um subcontinente que temrinocerontes, tigres, jaguares, ursos, búfalosselvagens, crocodilos e os últimos leões asiáticos.Entretanto, temos que levar em consideração queesta é uma zona rural que tem entre 300 e 500

Foto: Alfonso Robles Gil. Hot Spots,The Nature Conservancy

Macaco de Bonnet

Tamarindos em Kanchypuram

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habitantes por km quadrado, exatas 10vezes mais que as áreas maisdensamente povoadas do Litoral Norte doRS. Uma palavra define a razão destasobrevivência: sistemas agroflorestais eum respeito religioso pela natureza, pelomenos por parte dela.

Nas áreas mais altas dos Ghats Ocidentaischove mais regularmente, entre 1500m e2500m. Lá se cultivam café, pimenta-do-reino, hortaliças, frutas subtropicais etropicais e até algumas de climatemperado, como maçãs e peras. A matanativa ainda abriga uns poucos tigres e ourso-preguiça (sloth bear), mas a açãohumana cada vez mais diminui o espaçodestes animais.

Assim como na Mata Atlântica, algumasmadeiras são extremamente perseguidasneste ecossistema de montanha, e este éo caso do sândalo da Índia (Santalumyasi). A madeira é de cor marfim e temum grão perfeito para móveis eesculturas, além de aroma perfumado ebrilho. Esta combinação o tornoucobiçado demais desde temposimemoriais. Do Nepal, país vizinho à Índia,o sétimo Dalai Lama retirou uma árvore

de sândalo, à qual ele doou ao Imperador Qianlong, daDinastia Qing (1644-1911), na China. O tronco media3m de diâmetro e 26m de comprimento, e foitransportado das florestas do Nepal até Beijing. Umaestátua de Buda foi entalhada nele, a qual se encontranum templo, nos arredores da capital chinesa. Hoje, osândalo é protegido pelo governo indiano e imune aocorte, mas existem redes de roubo de madeira

organizadas que desafiam a polícia eque tem aliados nas comunidades deagricultores, que se sentiramprejudicadas pela proibição de cortedo sândalo.

Como se pode perceber trabalhandocom os técnicos e agricultoresindianos, a sabedoria do povo ruraltradicional e tribal é grande, mas apressão econômica é cada vez maior.Acentuando-se no período em que osingleses dominaram a Índia, asflorestas estão sendo saqueadas eameaçadas, os recursos sendo

Acima: estátua de 18m de alturaentalhada em peça única desândalo intitulada �O FuturoBuda�. Está localizada no Salão daInfinita Felicidade, Beijing, China.Extraído de: Beijing Scenic Spotsand Historical Sites. ChinaTourism Publishing House.

Abaixo, sul da Índia. NGS Maps.

West

ern

Ghats

KeralaTamilNadu

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dilapidados, e o solosendo exposto. O reflexomaior deste processohoje está nadisponibilidade de água. Apouca quantidade e abaixíssima qualidadeameaça o futuro detodos indianos. Poçosestão secando ou sendocontaminados por metaispesados e agroquímicos,alguns rios simplesmentedesapareceram, eplantios de côco e mangacom mais de 25 anos deidade estão morrendopela seca.

A Índia é centro deorigem de muitasespécies, entre elas a banana, e podemos ver muitasespécies nativas e muitos usos diferentes para ela. Ossistemas tradicionais de plantios anuais utilizam muitasestratégias agroflorestais e de consórcios. O guandú,por exemplo, é amplamente utilizado em consórcios,sendo o amendoim seu principal parceiro nas lavouras.A Acacia nilotica (originária do Egito) foi introduzida naregião mais seca, e hoje é utilizada como forrageirapara o gado. Os produtos dos quintais são vendidosem feiras: henna, jasmim, frutas e legumes. Nas áreasirrigadas do sul são plantados principalmente milheto,muitas variedades de arroz, gergelim e black gram(Phaseolus aureus). Estefeijão-mungo é cozido,moído e combinado comarroz em um pãozinho.Este é deixado crescer edepois é cozido no vapor.Ao combinar de maneirainteligente amido eproteína, além de doiscultivos muito bemadaptados ao clima, eleenriquece a dieta diáriados indianos do sul, juntocom muita pimenta.

Se atravessarmos asaltas montanhas (GhatsOrientais) em direção aooeste, se sai da �sombrada chuva� e se chega ao

Acima, aula de educação ambientalpara crianças embaixo da árvoresagrada Banyan.

Abaixo, feira perto de Kodaikanal,região acima dos 2.000m (a bancatinha sapoti, maçã, abacate, jaca,banana, tudo produzido na mesmaregião!)

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Estado de Kerala. Esteé famoso na Índiaporque sucessivosgovernos estaduais deorientação socialistaestimularam osquintais agroflorestaiscomo estratégia desegurança alimentar egeração de emprego erenda, e porque amedicina tradicionalque usa fitoterápicos(Ayurvédica) faz partedo atendimento oficial.

O sucesso foi tantoque, mesmo sendo oestado mais populosodo segundo país maispopuloso do mundo,

Kerala tem excelentes índices sociais e culturais, tudoisso no ambiente de uma floresta tropical úmidadensamente povoada. Com todos os problemasambientais que a Índia conhece, Kerala é um exemplode como se pode incorporar o saber local e jogar afavor da diversidade e do ecossistema, e não apenascontra ele.

Como a maior parte do país tem sérios problemas deágua, duas frases estão todo o dia na televisão e naagenda das organizações: coletar a água, reflorestar

as encostas. Semrecuperar o sistemaancestral (de mais de 2mil anos) de pequenosaçudes que promoviama recarga dosaquíferos, e sem umpolítica de reflorestar e�agroflorestar� asencostas, 1 bilhão depessoas corre o riscode ficar sem água parabeber nos próximos 10anos. A perda de solofértil, florestas ebiodiversidade poderá,de modo assustador,jogar no caos pelafome e sede culturasque resistiram pormilênios à invasores ecolonizadores.

Agricultor de Chennai visitandoescola agrícola em Kodaikanal: cafésombreado com árvoresmadeiráves e fertilizadoras, compimenta-do-reino usando asárvores como estaca-viva.

Abaixo, participantes do Semináriojunto ao tronco de um jambolãonativo gigante, num remanescentede floresta de montanha (sholas),em Kodaikanal.

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A Agrofloresta do Toninho

Por Antonio Borges Model, Comunidade do Côco, DomPedro de Alcântara.

Há mais de 10 anos atrás eu estava em meu bananal eobservei que as bananeiras perto de uma figueiragrande eram muito bonitas, melhores que as daredondeza. Na época, pensei: �puxa, se dá bananaassim com a figueira, imagina cortando!�.

Por sorte, o corte foi sendo adiado e então, entre1994 e 1995, começamos a participar de cursos ereuniões que o Centro Ecológico estava promovendocom apoio da Pastoral, organizando uma associaçãode agricultores ecologistas na região de Torres. Eununca fui muito adepto dos venenos, e quandocomecei a perceber que as árvores podiam serbenéficas para o bananal, resolvi ir aprendendo mais e

Sobragi (Colubrina glandulosa)

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fazendo minhas experiências.

Nestes anos participei de vários cursos, de algunsintercâmbios e contei com a assistência dos técnicosdo Centro Ecológico e outros apoiadores. Tudo isso emais a minha observação diária do bananal foi medando a idéia de como manejar o sistema.

Meu bananal não está sobre o que se pode chamar deterra de primeira (veja a tabela acima). Pelo menos30% da área com banana tinha sido muito usada pelosantigos donos com culturas anuais, com fogo eenxada. Algumas áreas de bananal haviam sidoabandonadas, pois o Mal-do-Panamá havia tomadoconta. Fui aos poucos fazendo meu plano: Observeique algumas destas áreas podiam ser recuperadas, ecomecei a trabalhar num sistema de recuperação dasáreas com o que hoje chamamos de manejoagroflorestal. Primeiro, fui identificando quais as áreasque ainda davam banana bonita, e estas foram sendominha fonte de renda imediata. As outras foram sendo�reconquistadas� aos poucos da doença, com ajudadas árvores, adubação orgânica e ervas nativas.

Num dos primeiros sistemas que implantei, fiz umconsórcio de abacaxi, banana maçã, banana prata eadubos verdes, como guandú e feijão de porco. Muitasárvores regeneraram, como a licurana, acapororoquinha, o alecrim e outras. Fui deixando tudo

Análise química dos solos (0-20cm), segundo zoneamento estabelecido pelo agricultor (Z1,Z2,Z3).O parâmetro utilizado no zoneamento foi porte, tamanho de cachos (Z1>Z2>Z3).

Argila pH P K M.O Al Ca Mg Al+H(%) (H2O) mg/l mg/l % cmol/L cmol/L cmol/L cmol/L

Zona 1 36 6 36 117 3,6 0 10,3 6,2 2,8Zona 2 33 5,7 33 96 2,8 0 8,1 2,8 3,4Zona 3 32 5,8 32 130 2,2 0 8,6 3,8 2,7

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Distribuição dos palmiteiros nobananal, segundo uma vistaaérea. A irregularidade fica porconta de rochas expostas epresença de árvores ou outracondição que não permite quese instale o plamiteiro.

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e depois manejando com podas,usando as folhas como adubo econtrolando a luz. Plantei hibiscopara cortar o vento, e por maisde 3 anos colhi abacaxi e bananadaquela área. Fazia ainda aaplicação de urina de vaca noabacaxi e fui melhorando o solotambém com esterco, mas empouca proporção.

Com os projetos queconseguimos, como o PDA,passei a usar também fosfatonatural e um pouco de calcárionas áreas, e até algunsmicronutrientes. Como eu tinhaalgumas matrizes de sobragi naárea, passei a plantar esta árvoreem espaçamento mais ou menosde 10m a 15 m entre elas. Comas feiras, passei a plantar mamãonativo amarelo, que fuiselecionando a semente entre osmais doces.

Eu mesmo faço as mudas demamão e palmito, que planto emtodo o bananal, e contrato umajudante nos períodos de maiortrabalho. Com o projeto PDAconseguimos também muitas mudas de árboresdiferentes, e hoje eu me orgulho de ter uma grandediversidade de espécies, não apenas que eu plantei,mas que os pássaros e animais também ajudam aplantar. Os aracuãs, sabiás, gralhas, tucanos e muitasoutras espécies, inclusive macaco-prego temaparecido, graças ao manejo e à um entendimentocom os vizinhos para deixar os bichos em paz.

Mais recentemente, há uns 6 anos, comecei a plantar,além de mais árvores nativas de tudo quanto é tipo,palmiteiro. Faço as mudas em saquinhos com duasplantas, e vai então para o bananal com 3 folhas numespaçamento de mais ou menos 5mx5m, às vezesmenos. Um bananal na nossa região é sempre cheiode pedras e manchas de solo mais fraco, mais forte,mais úmido, mais seco. Por isso, procuro identificarestas áreas e ver o que está acontecendo: que ervasestão crescendo, que árvores regeneram, como secomporta a banana. Daí ajusto meu manejo: maisadubação orgânica, mais ou menos sombra, mais oumenos palmito e árvores.

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Minha filha, agora casada, trabalhou anos vendendo naFeira da Coolméia, em Porto Alegre, mudas e arranjosflorais produzidos no quintal de nossa casa. Nossobananal é longe da casa, a mão de obra é pouca e oquintal é pequeno, mas ela conseguiu manter umarenda muito boa com sua atividade. Por isso minhaespecialidade é mesmo a banana e o mamão, colhidossempre no ponto, com todo o cuidado para otransporte e amadurecimento.

O palmiteiro está quase começando a dar cacho, e aíteremos outra fonte de renda com a fruta, já que sepode extrair a polpa, que é muito saborosa esemelhante ao açaí que se come no Norte. Aqui aspessoas na zona rural ainda não tem o costume doaçaí, como o pessoal chama a polpa. Nosso maiordesafio é parar os ladrões que chegam até em dia clarode semana para roubar palmito e depois envasarescondido ou mesmo vender �por fora�. Sofro só empensar que cortem meus pés de palmito.

Sem uma atitude forte por parte da fiscalização, todoeste esforço que estamos fazendo para trazer de voltao palmito para a Mata Atlântica poderá ser em vão, esó vai alimentar a ladroagem. Acredito que todos osagricultores tem que se conscientizar, e os órgãosambientais apoiarem este tipo de iniciativa, porquecada vez mais ela poderá mudar a situação dobananicultor. Este é o que todos esperamos emrelação aos nossos sistemas agroflorestais: produzirbanana de qualidade, mas também ter outras opçõesde renda de no curto, médio e longo prazo.

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Parte VSete perguntas e roteiro paraestar em dia com o CódigoFlorestal do RS**(com base na lei vigente até dezembro de 2003)

1)Posso derrubar capoeira?

-O Código Florestal do RS (2003) impede o corte raso(eliminação completa) de qualquer formação vegetalna Mata Atlântica com mais de 3m de altura.

2)O que pode ser feito quando acapoeira ultrapassou este limite?

-O mesmo código prevê Manejo Ajardinado eEnriquecimento de Capoeiras, os quais estipulamdetalhadamente as técnicas admitidas. Este é oprecedente legal e ecologicamente admitido paraimplantação de Sistemas Agroflorestais nestassituações.

3)Posso cortar árvores na matanativa?

-Pode, mas apenas para consumo e no limiteestipulado pela legislação para cada caso.. Mesmo paraas espécies nativas que estão na lista das ameaçadasde extinção (entre elas a araucária, a canela preta,sassafrás, a imbuia, a figueira de folha fina, o xaxim),se pode utilizar (para consumo) reservas nativas. Osdetalhes podem mudar e estão disponíveis na páginada internet da Secretaria de Meio Ambiente, mas oroteiro básico é:

-Espécies nativas podem ser abatidas dentro de ummáximo de 15m3 por propriedade ou posse numperíodo de 5 anos;

-A preferência é para aproveitamento de exemplares

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mortas ou tombadas por causas naturais;

-A retirada deve ser não superior à 20% do estoque deexemplares adultos;

-O requerimento para autorização de corte deveráconter dados de altura. DAP, volume por tora e totalpor espécie, relação de árvores selecionadas,previamente identificadas com plaquetas numeradas ejustificativa de utilização;

-A autorização tem prazo de validade de 60 diaspodendo ser prorrogada por mais 30 com justificativa;

-A autorização é emitida após vistoria do órgãoambiental responsável (DEFAP, no RS).

4)Quais são áreas onde não possofazer um florestamento visando corteraso ?

-A menos de 30m de cursos d´água ou a 50m denascentes;-Em encostas entre 25 e 45 graus;-Como �reserva legal�;-Como �reposição florestal�, atendendo processojudicial (termo de ajuste de conduta).

5)Quais são as áreas onde posso fazerum florestamento visando corte raso?

-A princípio, qualquer área, mesmo as enquadradascomo Área de Proteção Permanente poderão receberum florestamento para este fim. Entretanto, temos queficar atentos para o tipo de manejo nestas áreas:

-Nunca poderemos fazer corte raso em áreas deproteção permanente (APP). Porém, podemos fazermanejo de frutas, cascas, sementes e partes deplantas que não impliquem em corte raso e que foramPLANTADAS;

-Em áreas que não são enquadradas como APP,qualquer tipo de manejo é admitido.

Porém, o agricultor deve obter o Certificado de FlorestaNativa Plantada e, por ocasião do manejo de corte ecolheita, deve solicitar a Autorização de Corte com o

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(DEFAP) e Guias de Transporte (IBAMA).

6)Em plantios mistos agroflorestais(introduzidas e nativas) como devoproceder?

-Da mesma forma que no caso de plantio exclusivo denativas.

7)Quais são os passos para registrarum plantio agroflorestal (misto ouexclusivo) com nativas?

-O primeiro passo é a obtenção do Certificado deIdentificação de Floresta Plantada com espécie Nativa(CIFPEN). Este é obtido seguindo o seguinte roteiro:

-Laudo descrevendo:

-Número de indivíduos plantados;-Localização por coordenadas GPS;-Área;-Declividade;-Citar a que não se encontra em APP ou descrever aforma de utilização de modo que não caracterizarcorte raso e sim sequêncial;-Forma de plantio;-Declaração de que a área não tem vínculo a outroscompromissos legais (reposição florestal, porexemplo).

Croqui 1, contendo:

-indicação de Norte;-comunidade e sede do município ou estrada geral;-coordenadas (preferencial) da sede da propriedade;-distância da estrada;

Croqui 2, da propriedade, contendo:

-Indicação de coordenadas da área plantada (GPS);-caminhos ou acessos;-indicar área de preservação próximas;-referencia à corregos, açudes, cercas, benfeitorias;-Taxa (guias) � alvará se for mais de 25ha;-Telefone;-Documento do imóvel;-Registro atualizado (3 meses) do imóvel;-Arrendatário registrado na certidão do registro deimóveis;

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-Registro de posse; não se registra o plantio nacertidão;

Não se aceitam:

-Cópias não autenticadas;-Contratos de compra e venda;-Registro no INCRA;

O último passo é encaminhar então ao DEFAP e reter onúmero do protocolo, e depois aguardar vistoria doDEFAP. Uma vez estando a floresta em ponto deutilização:

Solicitar o Alvará e Autorização de Transporte deProduto Florestal (ATPF).

Para isto, é necessário um requerimento com:

-número de espécies;-data do corte e transporte (a PATRAM será informadae se concede o espaço de 24h para levar até aagroindustria/processamento);-citar número de protocolo e número de certificado deidentificação (número constante no documentoanterior: CIFPEN);-cópia dos croquis 1 e 2;-cópia do alvará (após encaminhado);-guia.

A maior parte dos formulários, roteiros e taxas citadasaqui estão no anexo que acompanha a revista. Maioresdetalhes podem ser encontrados no anexo. Na páginada Secretaria Estadual de Meio Ambiente na Internet sepode buscar mais informações e todos os formuláriose roteiros.O endereço é:

http://www.sema.rs.gov.br/sema

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