istemas agroflorestais e agricultura familiar uma … · agroflorestais viáveis que poderiam ser...

10
SISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR: UMA PARCERIA INTERESSANTE RESUMO Os Sistemas Agroflorestais (SAFs) têm sido amplamente divulgados como modelos de exploração agropecuária que muito contribuem para a sustentabilidade da exploração agrícola atual. Para que modelos agrícolas possam ser assim classificados esses devem seguir a definição dos SAFs, no qual é necessário o uso de plantas arbóreas, arbustivas e herbáceas, consorciadas com espécies agrícolas e forrageiras com ou sem a presença animal, mas obrigatoriamente associadas às espécies florestais. Tais modelos se tornam alternativas interessantes para pequenos agricultores que buscam obter uma exploração economicamente viável intensiva. Utilizando-se de uma diversidade de plantas de vários estratos, numa mesma área, para atingirem o resultado esperado, esses produtores devem ter como aliado imprescindível o manejo adequado e tecnicamente embasado. No Estado de São Paulo essa discussão ganhou ainda maior destaque pela possibilidade de uso de modelos de SAFs nas áreas de Reserva Legal, apoiados por lei em fase de regulamentação. O uso de SAFs exige uma maior difusão de técnicas desenvolvidas, um comprometimento maior de políticas públicas de implantação e escoamento de produção. Sendo assim, o presente trabalho tem por objetivo traçar considerações sobre o assunto e apresentar alguns modelos de Sistemas Agroflorestais já implantados viáveis para instalação por pequenos agricultores. Palavras-chave: desenvolvimento sustentável, pequena propriedade, sistemas agrosilvipastoril, reserva legal.

Upload: others

Post on 01-Aug-2020

4 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

SISTEMAS AGROFLORESTAIS E

AGRICULTURA FAMILIAR: UMA PARCERIA

INTERESSANTE

RESUMO

Os Sistemas Agroflorestais (SAFs) têm sido amplamente divulgados como modelos de exploração agropecuária que muito contribuem para a sustentabilidade da exploração agrícola atual. Para que modelos agrícolas possam ser assim classificados esses devem seguir a definição dos SAFs, no qual é necessário o uso de plantas arbóreas, arbustivas e herbáceas, consorciadas com espécies agrícolas e forrageiras com ou sem a presença animal, mas obrigatoriamente associadas às espécies florestais. Tais modelos se tornam alternativas interessantes para pequenos agricultores que buscam obter uma exploração economicamente viável intensiva. Utilizando-se de uma diversidade de plantas de vários estratos, numa mesma área, para atingirem o resultado esperado, esses produtores devem ter como aliado imprescindível o manejo adequado e tecnicamente embasado. No Estado de São Paulo essa discussão ganhou ainda maior destaque pela possibilidade de uso de modelos de SAFs nas áreas de Reserva Legal, apoiados por lei em fase de regulamentação. O uso de SAFs exige uma maior difusão de técnicas desenvolvidas, um comprometimento maior de políticas públicas de implantação e escoamento de produção. Sendo assim, o presente trabalho tem por objetivo traçar considerações sobre o assunto e apresentar alguns modelos de Sistemas Agroflorestais já implantados viáveis para instalação por pequenos agricultores.

Palavras-chave: desenvolvimento sustentável, pequena propriedade, sistemas agrosilvipastoril, reserva legal.

Page 2: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

INTRODUÇÃO

Entende-se por pequena propriedade aquela com área de até 30 (trinta) hectares, explorada mediante o trabalho pessoal do proprietário e de sua família, admitida a ajuda eventual de terceiro e cuja renda bruta seja proveniente, no mínimo, em 80 (oitenta) % da propriedade.

Os Sistemas Agroflorestais constituem sistemas de uso e ocupação do solo em que plantas lenhosas perenes (árvores, arbustos, palmeiras) são manejadas em associação com plantas herbáceas, culturas agrícolas e/ou forrageiras e/ou em integração com animais, em uma mesma unidade de manejo, de acordo com um arranjo espacial e temporal, com alta diversidade de espécies e interações ecológicas entre estes componentes. Nesses modelos de exploração agrícola são utilizadas culturas agrícolas e/ou pastagens com espécies florestais. Essas últimas são partes fundamentais e devem integrar tais sistemas de exploração, portanto, a não ocorrência de espécies florestais não caracteriza a exploração agrícola como agroflorestal e sim como sistemas de consorciação de culturas agrícolas ou integração lavoura pecuária. Embora o uso de Sistemas Agroflorestais esteja aumentando nas áreas nacionais, muito deve ser feito tanto na adequação técnica dos modelos escolhidos como na adoção de políticas agrícolas, que amparam o produtor a fim de que ele possa obter maior benefício desse modelo de agricultura.

A agricultura familiar fundamentada no uso de área de exploração agrícola reduzida, exige uma grande conscientização do agricultor na escolha do modelo de e x p l o r a ç ã o a d o t a d o , p a r a g a r a n t i r a s u a sustentabilidade ao longo dos anos. Isso se deve ao fato de que a atividade agropecuária nessas áreas será intensiva, procurando-se obter o máximo de rendimento econômico possível por área. Mas concomitantemente a essa ação deve-se buscar a reposição adequada e satisfatória de nutrientes, a implantação de práticas de conservação do solo e diversificação de culturas e espécies florestais usadas.

O Sistema Agroflorestal é uma opção interessante e extremamente viável na escolha de modelos pelo pequeno produtor. É o seu melhor aliado, pois as árvores sempre tiveram um papel importante na vida dos homens tanto no fornecimento de produtos (madeira, mel, produtos medicinais) como de benefícios indiretos. Entre os benefícios indiretos estão os de bem estar e saúde pública (sombra, umidade do ar, temperatura e poluição atmosférica), proteção dos solos e dos mananciais, bem como outros benefícios

sociais (turismo, educação ambiental). A importância das árvores contra as mudanças climáticas vem ganhando destaque nos últimos anos, pois elas são excelentes sequestradoras de carbono ao captarem o CO2 atmosférico no processo de fotossíntese e

mantendo esse carbono fixado por um longo período já que a madeira é extraída após alguns anos quando podem ser empregadas na construção civil e fabricação de móveis.

Atualmente as florestas também assumem um papel de destaque como insumo energético, além de promoverem a fixação de carbono na biomassa (Castanho Filho, 2008). A destruição das florestas nos leva a vivenciar cenários catastróficos como a erosão do solo e consequentemente o assoreamento dos cursos de água, além da perda da biodiversidade e dos biomas brasileiros. Em regiões tropicais, alguns sistemas atuais de uso da terra são inapropriados para o meio ambiente. Dentre os prejuízos ambientais ocasionados pelo uso inadequado da terra os de maior importância são: elevada radiação solar e intensa erosão (mesmo regiões áridas), redução da fertilidade natural dos solos, elevado custo de insumos e o surgimento de áreas degradadas. Embora hoje existam muitos elementos agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras, principalmente nas propriedades de agricultura familiar, ainda faltam dados sobre esses sistemas de produção, tanto na escolha das espécies adequadas como na adequação à legislação existente.

O agricultor deve escolher uma variedade de espécies adaptadas à região e promover uma boa interação entre elas. O uso adequado do meio físico, vertical e horizontalmente é fundamental. Também deve levar em conta as necessidades de mercado e analisar a sua viabilidade econômica.

O investimento deve ser compatível com a

produção esperada. Essa produção deve ser de fácil

comercialização. O modelo deve ser ecologicamente

equilibrado para contribuir com a sustentabilidade do

S i s t e m a A g r o f l o r e s t a l i m p l a n t a d o e d o

desenvolvimento social. Algumas dificuldades do SAF devem ser

vencidas para que tenha sucesso. A diversidade de

produção requer uma especialização na mão-de-obra

empregada e uma articulação entre os produtores no

momento da compra de insumos para instalação das

culturas e comercialização do produto. Nesse sentido,

a mão-de-obra deve ser capacitada, para que o manejo

e a exploração sejam racionais, eficientes e

econômicos.

Page 3: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

O sucesso depende muitas vezes do agricultor que, amparado tecnicamente, deve ter o espírito inovador e investigativo para experimentar novas formas de associação de culturas e/ou animais, mas sem deixar de ser atento e cauteloso na observação dos resultados e problemas que possam surgir. Os conhecimentos práticos, aliados ao conhecimento científico, dão uma grande contribuição na condução dos plantios.

O associativismo entre produtores é uma alternativa sábia para vencer as dificuldades da cadeia produtiva, que vai desde a obtenção de sementes até a entrega do produto ao consumidor. O cooperativismo facilita a compra de insumos, faz uso racional de equipamentos, racionaliza as atividades pós-colheita e promove um escoamento eficiente dos produtos. A demanda por mão-de-obra é concentrada no momento de implantação do SAF, portanto, a prática de mutirões é sempre indicada por alguns autores como sendo de grande valia para grupos de produtores que trabalham com culturas semelhantes nos SAFs.

Como limitações técnicas para a implantação de SAFs, podem-se citar: a existência de poucos estudos das interações biofísicas entre os componentes do sistema que são de cunho multidisciplinar, poucos conhecimentos sobre os arranjos, combinações de espécies e manejo dos SAFs, alto custo das pesquisas de médio e longo prazos, inadequação dos serviço de extensão rural e pequena disponibilidade de germoplasma específico, pois o melhoramento genético das espécies agrícolas e florestais sempre foi direcionado para o monocultivo.

Para amenizar esses problemas enfrentados na

fase de implantação, manejo e comercialização das

culturas, os órgãos competentes devem promover uma

maior difusão de tecnologia disponível, oferecer apoio

aos agricultores por meio de legislação, políticas

públicas e incentivos para financiamentos.

DISCUSSÃO

Propriedade familiar e agricultura familiar

A Propriedade Familiar é definida pelo artigo 4.º, inciso II, da Lei n.º 4.504/64 como: “o imóvel rural que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e

tipo de exploração, e eventualmente trabalhada com a ajuda de terceiros (Estatuto da Terra).”

O conceito de propriedade familiar é fundamental para entender o significado de Módulo Rural. O conceito de módulo rural é derivado do conceito de propriedade familiar e, sendo assim, é uma unidade de medida expressa em hectares, que busca exprimir a interdependência entre a dimensão, a situação geográfica dos imóveis rurais e a forma e as condições do seu aproveitamento econômico. A Pequena Propriedade é o imóvel rural de área compreendida entre um e quatro módulos fiscais. Módulo fiscal, por sua vez, é estabelecido para cada município, e procura refletir a área mediana dos Módulos Rurais dos imóveis rurais do município. Esses valores variam para cada município e região

Para Guanziroli et al.(2001), citado por Colla et al.

(2008), enquadram-se na categoria de agricultores familiares os produtores que têm a direção dos trabalhos realizados na propriedade feita pelo próprio produtor rural e mão-de-inserir hífen antes da palavra (mesmo que fique em outra linha) regra nova ortográfica -obra familiar utilizada em proporção maior do que a contratada. Sendo esse trabalho de grande importância para a revalorização do meio rural, pois une a eficiência econômica com a eficiência social e contribui para a melhoria das condições de vida no campo. Segundo o Censo de 1997, 85,2% das propriedades brasileiras se enquadravam na categoria de agricultores familiares, ocupando 30,5% da área total nacional e respondendo por 50,9% da renda na safra de 1995/1996. Essas propriedades empregam mais de 2,5 milhões de pessoas no cenário nacional e para Guilhoto et al.(2006) um terço

do agro negócio nacional origina-se da produção agropecuária realizada pela agropecuária familiar.

Abramovay (1997) ressalta que o conceito de agricultura familiar não deve ser confundido equivocadamente com “produção de baixa renda”, pequeno produção ou agricultura de subsistência, conceitos esses que carregam uma carga de preconceito. O conceito de agricultura familiar deve remeter a um conceito de agricultura social, ambiental e economicamente viável e competitivo.

A busca de novos modelos com alternativas rentáveis e inovadoras empregando novas culturas e melhoria do escoamento da produção surge como uma necessidade, pois segundo dados de Agroanalysis (1998), os preços dos produtos como o arroz, feijão e milho tiveram redução de 3,55%, 3,59% e 3,52%, respectivamente, de 1990 a 1996 afetando os agricultores familiares diretamente que tiveram acesso restrito às políticas públicas e que estavam voltados à produção de alimentos básicos (Colla et al., 2008).

Page 4: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

Para os autores é necessário que haja uma adoção de políticas públicas criando mecanismos alternativos de escoamento dessa produção e uma diversificação da produção por meio da agroindustrialização. A escolha do melhor mecanismo de comercialização leva em consideração a oferta, condições climáticas e comportamento sazonal do produto. Colla et al. ( 2008) apontam as feiras-livres como um canal de distribuição importante na comercialização de produtos provenientes da agricultura familiar, pois apresentam uma relação mais estreita com o consumidor e uma melhor rentabilidade dos produtos comercializados.

A agregação de valores aos produtos obtidos, valorizando a produção regionalizada diferenciada na tentativa de superar a restrição de escala imposta pela pequena propriedade e a diversificação da produção tornando os produtores menos susceptíveis à sazonalidade, devem ser importantes preocupações dos produtores que se enquadram como produtores familiares.

Sistemas agroflorestais

O termo “Sistema Agroflorestal” (SAF) corresponde a uma forma de uso da terra e manejo dos recursos naturais, nos quais espécies lenhosas (árvores, arbustos, palmeiras) são utilizadas em associação com cultivos agrícolas ou animais, na mesma área, de maneira simultânea ou em uma sequência temporal (Montagnini, 1992).

Para Nair (1989) e Young (1990) o Sistema

Agroflorestal (SAF) é um sistema de uso da terra com a introdução ou retenção deliberada de árvores em associação com outras culturas perenes ou anuais e/ou animais, apresentando mútuo benefício ou alguma vantagem comparativa aos outros sistemas de

agricultura resultante das interações ecológicas e econômicas. Pode apresentar várias disposições em espaço e tempo, e deve utilizar práticas de manejo compatíveis com o produtor.

Peneireiro (2008) afirma que a floresta é composta por várias espécies, que se desenvolvem em diferentes contextos (nichos) e ocupam o espaço vertical de forma bastante completa, com seus estratos, de acordo com a necessidade específica de cada uma

dessas espécies, em luz, direta ou filtrada, fazendo com que a energia do sol seja aproveitada da melhor maneira possível. Nos SAFs as plantas cultivadas são introduzidas em consórcio, de forma a preencher todos os nichos, inclusive, considerando nessa combinação,

espécies nativas remanescentes, espécies da regeneração ou reintroduzidas. Além de combinar as

espécies no espaço, combinam-se os consórcios no tempo como no processo de sucessão natural de

espécies, em que os consórcios se sucedem uns após outros, num processo dinâmico, dependendo do ciclo de vida das espécies. Outro aspecto fundamental é a introdução de alta diversidade de espécies, replicando uma característica marcante de ecossistemas da Mata

Atlântica, o bioma original. A classificação dos SAFs se baseia nos critérios de

arranjos espacial e temporal, na importância e no papel dos componentes, no planejamento da produção ou na produção do sistema, e suas características socioeconômicas (Nair, 1985 appud Santos 2000). Os Sistemas Agroflorestais, segundo Bernardes (2008), podem ser classfificados de acordo com seus componentes em Silviagrícola ou agrossilviculturais, (Espécies florestais e culturas agrícolas) (Figura1); Silvipastoril ( Espécies florestais e forrageiras para alimentação animal) ou (espécies florestais, forrageiras e animais) (Figura 2) e Agrossilvipastoril ( Espécies florestais, culturas agrícolas e forrageiras para alimentação animal)(Figura 3).

De acordo com a disposição das espécies no campo os modelos podem ter uma grande variação, consistindo desde sistemas mistos adensados como quintais caseiros, mistos de baixa densidade, como os sistemas agrissilvipastoris, em faixas ou contínuos ou ainda ao acaso. E de acordo com a disposição das espécies no tempo, os SAFs podem ser simultâneos ou sequenciais.

Os SAFs sequenciais ocorrem de forma que haja

um intervalo de tempo entre a colheita da primeira

cultura e a semeadura da cultura subsequentes. Já para

os simultâneos podem-se observar que existem várias

situações: duas culturas com a mesma época de plantio

e colheita (SAF coincidente), culturas de mesma época de

semeadura e épocas diferentes de colheita

(concomitantes). Um exemplo interessante de SAFs de

culturas concomitantes é o plantio de palmeira real e

palmito jussara para obtenção de palmito sob plantio de

eucalipto (Figura 4) onde a cultura do palmito é extraída

com cinco anos, portanto antes do término do primeiro

ciclo do eucalipto que se dá com sete anos.

Outro modelo de SAF é o sobreposto quando ocorre a semeadura de uma cultura antes do final do ciclo de uma cultura já instalada no local e cuja colheita será feita após o término do ciclo da primeira cultura instalada. Ainda temos o modelo interpolado no qual

durante o ciclo de uma cultura perene temos a implantação de culturas de ciclo menor. Por exemplo, o cultivo de culturas anuais sob árvores de seringueira ou eucalipto.

Page 5: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

Figura 1. Modelo Silviagrícola ou agrissilvicultura (Fonte: Abdo, 2008)

Figura 2. Modelo Silvipastoril (Fonte: Bernardes, 2008)

Figura 3. Modelo Agrossilvipastoril (Fonte: Bernardes, 2008)

Figura 4. Palmeira real sob plantio de eucalipto. (Abdo, 2008)

Levando-se em consideração aspectos ecológicos e econômicos, os SAFs podem ser classificados como protecionistas ou produtivos quando visam à comercialização dos produtos obtidos. Esses últimos podendo ainda ser classificados em SAFs comerciais, intermediários e subsistencial dependendo da destinação da produção, para mercado externo e ou de subsistência da família produtora (Santos, 2000).

Existem vários tipos de SAFs: quintais agroflorestais, cultivo de faixas em culturas perenes,

taungya, aléias, multiestratos, capoeira melhorada, cerca viva, árvores em pasto, pastagens em plantações florestais entre outras (Santos, 2000) e (Bernardes, 2008).

As árvores utilizadas em SAFs podem ter diversas funções: arborização de pastos e culturas, barreiras vivas, cercas vivas, quebra-ventos, revegetação

de áreas degradadas, fonte de proteína para animais, adubação verde, bosque de proteção, fornecimento de

matriz energética para obtenção de biocombustíveis, apicultura, forragem, alimentação e celulose (Santos, 2000). Ainda pode-se ressaltar o uso dessas espécies para obtenção de resinas, óleos essenciais, utilização de princípios ativos medicinais, obtenção comercial

de frutos etc. As intervenções de manejo demandam conhecimento sobre as espécies exigindo observação

e precisão por parte dos agricultores.

Page 6: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

O conhecimento acerca das espécies tem outro aspecto interessante: quanto mais o agricultor conhece a espécie e seu uso, mais retorno pode ter do SAF, seja para uso da família (alimentação, medicamentos, artesanato), para alimentação dos animais ou como uso de espécieschave sendo repelentes ou atratoras de fauna e/ou insetos e para a destinação final do produto obtido (Penereiro, 2008). Para Castanho Filho (2008), embora, o uso da madeira e seus resíduos no Estado de São Paulo como fonte energética seja pequeno, este apresenta um grande potencial de crescimento. O plantio de árvores na propriedade pode reduzir os custos de produção agrícola devido aos menores gastos na conservação de solos e combate de pragas e doenças, substituição de material para cercas e construções, fonte alternativa para abastecimento energético e rendas alternativas com a madeira explorada e subprodutos. Essa situação também leva a uma menor pressão na utilização de florestas nativas como fonte de matéria- prima, principalmente para energia.

Modelos de sistemas agroflorestais

já instalados

A diversidade de espécies empregadas na instalação de SAFs e o longo período entre a fase de implantação e a obtenção de dados sobre a produção das culturas, principalmente quando temos o plantio das espécies florestais na fase inicial do projeto, levam a uma falta de dados conclusivos sobre iniciativas de sucesso com SAFs. Fato esse que salienta a necessidade de difusão de iniciativas dessa natureza para que os agricultores possam adaptar resultados positivos já obtidos às condições de sua região, seu poder econômico e possibilidade de comercialização dos produtos finais.

A seguir são apresentados alguns modelos já implantados e que possuem até o presente momento dados significativos para avaliação. Em experimento relatado por Bernardes (2008), onde foi realizado o plantio de milho, feijão e mandioca em área no quarto

ciclo da cultura de eucalipto, aproximadamente 28 anos, numa região de baixa aptidão agrícola que apresentavam solos de tabuleiros costeiros, sem irrigação e controle de pragas e doenças, foi realizado o

preparo de solo para um novo reflorestamento de eucalipto utilizando-se rebaixador de tocos, subsolagem a 80 cm e barra pré-plantio. O plantio das culturas agrícolas foi realizado na segunda quinzena de março de 2004. Segundo o autor, foi observado que o

milho teve um grande aproveitamento do adubo destinado ao eucalipto.

As plantas perto do eucalipto apresentaram produtividade muito superior quando comparadas ao restante da parcela (Figura 5) Os resultados da área de observação implantada indicam a complementaridade do uso do ambiente disponível (solo e clima) pelos cultivos envolvidos (eucalipto, feijão, milho e mandioca). Com as produtividades obtidas para os componentes milho e feijão e considerando as médias de produtividade dos plantios em área total para essas culturas no Espirito Santo, pode-se concluir que, apesar do reconhecimento dos benefícios dos SAFs, o entendimento sobre o seu uso em condições específicas e sobre sua capacidade de gerarem benefícios ainda são limitados.

Figura 5. Plantio de milho entre eucalipto (Fonte: Bernardes, 2008)

Também pelo mesmo autor foi verificado um

aumento no teor de matéria orgânica, K, Ca, Mg e no V% em solos onde foi implantado seringueira em SAFs intercalada com mandioca, feijão, milho, batata-doce, mamão, cacau e açaí quando comparada com a cultura da seringueira intercalada com Pueraria phaseoloides e

campo cultivado continuamente. Uma outra opção apresentada por Bernardes

(2008) é a utilização da cultura de eucalipto como quebra-vento de cafeeiro. Foram realizados dois experimento, o primeiro com duas linhas de café , intercaladas entrelinhas simples de árvores de eucalipto e 11 linhas intercalares de cafeeiros ( Figura 7). No segundo experimento foram intercaladas cinco linhas de café entre duas linhas, e eucalipto em uma área de monocultivo de café.

Page 7: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

E s s e s e x p e r i m e n t o s d e m o n s t r a m a compatibilidade do eucalipto com culturas agrícolas de forma sustentável promovendo inclusive uma geração de renda complementar para as famílias envolvidas no projeto e com o desenvolvimento satisfatório das culturas. Também pelo mesmo autor temos a citação de opções de plantio intercalar de mandioca entre eucalipto na época do corte da cultura e a alternativa de plantio de feijão plantado em área total para cobertura do solo com e sem introdução de mamão que seria uma renda extra.

Figura 6. Plantio de seringueira com Pueraria phaseoloides

Figura 7. Plantio de eucalipto como quebra vento na cultura de café (Fonte: Bernardes, 2008)

O autor apresenta ainda o modelo de plantio em SAF das culturas de seringueira, cacau e banana.( Figura 8).

Figura 8. Plantio de SAF com seringueira, cacau e banana ( Fonte: Bernardes , 2008)

Um experimento semelhante foi implantado no Polo Apta Centro Norte, em Pindorama, SP, onde foram utilizadas plantas de banana e cacau sombreadas por árvores farinha seca e tipuana (Figura 9).

Figura 9. Cultura do cacau sombreada atualmente por farinha seca e tipuana e por bananeira durante a fase de implantação, área do Polo

Centro Norte, Pindorama, SP.

Page 8: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

Santos (2000), avaliando Sistemas Agroflorestais em áreas degradadas por pastagens na Amazônia, concluiu que além de economicamente viável, esses sistemas são benéficos para recuperar essas áreas. O modelo multiestrato com introdução de diversas espécies arbóreas definidas pelo autor como frutíferas perenes (mogno, castanha-do-brasil e teca) e semiperenes (araçá-boi, jenipapo, acerola e maracujá) e com cultivo de arroz no primeiro ano juntamente com cupuaçu, apresentou maior desempenho pelo valor comercial das espécies adotadas. O oferecimento de produtos madeireiros e não madeireiros contribuem no sucesso do empreendimento, pois proporcionam fluxo de caixa maior ao agricultor, flexibilidade de comercialização e otimização de mão-de-obra. A produção de culturas em SAFs pode superar o monocultivo em termos de produtividade se for adotado manejo adequado.

Para efeito de cálculo da área necessária para se obter uma determinada produtividade comparando-se a cultura em sistema de monocultivo e em SAFs deve-se utilizar o conceito de equivalência de uso da terra representada pela fórmula (Bernardes, 2008):

Esse valor nos dará a área necessária para obtenção da mesma produção em monocultivo comparada a um ha de SAF.

A seguir algumas fotos de SAFs já implantados:

Figura 11. Seringueira e Palmito Jussara (Fonte: Brioschi. V Ciclo de Palestra sobre a Heveicultura Paulista)

Onde: N = número de cultura do SAF

Figura 10. Plantio de maracujá cultivado entrelinhas de seringueira (Fonte: Bernardes, 2008)

Figura 12. Plantio de filas duplas de seringueira ( 13,0 x 3.0 x 2,5 m) (Fonte: Bernardes,2008)

N

EUT = produtividade da cultura i em monocultivo

produtividade da cultura i no SAF

i = 1

Page 9: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

Figura 13. Café arborizado por coco e seringueira, experimento realizado na área do Polo Apta Centro Norte, Pindorama, SP.

Figura 14. Café sombreado por seringueira na área do Polo Apta Centro Norte, Pindorama, SP.

Figura 15. Plantio de café entre seringueira (Fonte: Brioschi. V Ciclo de Palestra sobre a Heveicultura Paulista)

Figura 16. Plantio de milho entre seringueira (Fonte: Brioschi. V Ciclo de Palestra sobre a Heveicultura Paulista)

Legislação e órgãos promotores de

SAFs

O Código Florestal dá possibilidades de implantação de sistemas agroflorestais em pequenas propriedades e manejo sustentável na área da reserva legal. A área de reserva legal deve ser pelo menos 80% da propriedade agrícola na Amazônia Legal, 35% da propriedade agrícola do Cerrado da Amazônia Legal e 20% da área da propriedade para as demais localidades. Isso significa que na Amazônia Legal o SAF é a condição mais racional para o desenvolvimento sustentável e a monocultura se tornaria inviável. Mas, também nas demais localidades onde ocorre a predominância da monocultura, a fragmentação dos remanescentes florestais é intensa e exige um trabalho de reflorestamento com embasamento técnico adequado e eficiente para recuperá-las. Nessas áreas o uso de SAFs pode ser uma alternativa mais viável e promissora uma vez que a utilização de culturas agrícolas juntamente com plantios de espécies nativas oferecem um rendimento extra aos agricultores, amortizando os custos de implantação do reflorestamento, oferecendo uma renda extra com os produtos obtidos ao longo dos anos e uma melhor proteção do solo com uma cobertura mais rápida e eficiente. No Estado de São Paulo, a Secretaria do Meio Ambiente em conjunto com A Secretaria da Agricultura estão viabilizando o uso de sistemas agroflorestais em até 50% da reserva legal que necessita de reforestamento (Lei nº 12.927/08, relativa à introdução de plantas exóticas e uso de SAFs na área de reserva legal).

Page 10: ISTEMAS AGROFLORESTAIS E AGRICULTURA FAMILIAR UMA … · agroflorestais viáveis que poderiam ser empregados na implantação de Sistemas Agroflorestais, nas propriedades brasileiras,

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os Sistemas Agroflorestais podem ser uma ótima opção para o pequeno agricultor e para o equilíbrio ecológico das propriedades o que o torna uma opção que poderá ser amplamente adotada em propriedades que tenham sua forma de produção classificada como agricultura familiar. Como benefício na adoção de SAFs pode-se citar a variabilidade de espécies utilizadas nos modelos de plantio, a melhoria da capacidade produtiva da terra, otimização da utilização dos recursos naturais disponíveis, se adaptado às condições ecológicas e dos produtores, obtendo assim uma maior produção por unidade de área. A diversificação de culturas ocasiona uma melhora significativa das propriedades físicas, químicas e biológicas do solo por meio de ciclagem de nutrientes e controle de erosão. Protege o solo da ação desagregante do impacto das gotas de chuva e contribui para a redução da amplitude de variação de temperatura e umidade local protegendo, em alguns casos, inclusive as culturas do efeito de geadas em regiões mais frias. As condições criadas pelo uso de diversas espécies de diversos estratos possibilitam o desenvolvimento de culturas que são beneficiadas pelo sombreamento como cacau, café, cupuaçú e palmito. Economicamente a diversificação da produção em diferentes épocas do ano pode ocasionar uma diminuição de riscos econômicos, melhor distribuição temporal e maior conforto do trabalho. Para que o cenário seja de sucesso vale salientar que o agricultor deve adequar as culturas à sua capacidade de investimento, interação entre espécies, condições edafoclimáticas regionais e condições favoráveis de escoamento pela comercialização. Essas opções devem ser fundamentadas e amparadas por políticas agrícolas implantadas pelo setor público a fim de favorecer a adoção desses modelos .

A não observação desses fatores pode aumentar ainda mais os entraves para a adoção dos SAFs. A diversificação de produtos exige um conhecimento técnico mais complexo e um custo de implantação mais elevado e uma maior dificuldade de mecanização que pode encontrar no pouco conhecimento técnico, aliado a falta de tradição dos agricultores, uma barreira à alta produtividade que esperada, desestimulando a adoção e difusão desses novos modelos. A produtividade por área de cada cultura deve ser avaliada, levando-se em conta a nova situação. A diminuição da produção por componente do consórcio não pode ser avaliada isoladamente, pois na mesma área poderemos obter um rendimento maior ao longo do tempo quando incorporamos novas culturas no local e os ganhos ecológicos ambientais devem ser contabilizados mesmo

que de difícil mensuração. A exploração de espécies florestais também deve ser feita de forma a causar o menor dano possível às culturas agrícolas implantadas nos SAFs.

REFERÊNCIAS

ABDO, M. T. V.N. 2008. Visita técnica a SAFs com eucalipto e palmeiras, propriedade particular em São Francisco Xavier. Relatório. São Paulo, 2008.

MONTEIRO, M.J. Preços Agrícolas: 30 anos de queda, Rev. Agroanalysis, Rio de Janeiro, Instituto Brasileiro de Economia, Centro de Estudos Agrícolas. Fundação Getúlio Vargas, fevereiro, p.26-27, 1998.

BERNARDES, M. S. 2008. Sistemas Agroflorestais. In:

XXXIII SECITAP. Jaboticabal: UNESP, Palestra

CASTANHO FILHO, E. P. 2008. Floresta e bioenergia. Informações Econômicas, IEA v. 38, n.2: p.52-67.

CENSO AGROPECUÁRIO. 1997. Rio de Janeiro: IBGE.

COLLA, C.; STADUTO, J.A.R; DA ROHA JR., W, F.; RINALDI, R.N. 2008. Escolha da feira livre como canal de distribuição para produtos da agricultura familiar de Cascavel, estado do Paraná. Informações Econômicas 38,

n.2: p.7-17..

GUILHOTO, J. J. M. et al. 2006. A importância do agronegócio familiar no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural. Rio de Janeiro 44 n.3: p. 355-382.

MONTAGNINI, F. ANO??Sistemas Agroflorestales: principios y aplicaciones en los trópicos. San Jose, Costa Rica: II CA.622p.

NAIR, P. K. R. 1989. Agroforestry systems in the tropics.

Dordrecht: Kluwer Academic, 664p. ( Foresry

Sciences,31)

PENEIREIRO, F. M. 2008. Cuidando da natureza,

cuidamos da humanidade. Palestra proferida no Segundo

M ó d u l o d o P r o j e t o “ F o r m a ç ã o d e a g e n t e s

multiplicadores Socioambientais na Bacia do Xingu”.

Disponível no site www.socioambiental.org

SANTOS, M. J. C. 2000. Avaliação econômica de quatro

modelos agroflorestais em áreas degradadas por pastagens na

Amazônia ocidental. Piracicaba: ESALQ-USP, 75p.

(Dissertação de mestrado).

YOUNG, A. 1990. Agroforestry for soil conservation,

Nairóbi: ICRAF, 276p.